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Instrumentos – Profa. Dra. Hilma Khoury - UFPA/IFCH/FAPSI Produzido em Novembro/ 2006. 3ª. Revisão em Maio/2012 1 COMO CONSTRUIR QUESTIONÁRIOS PARA PESQUISA 1 Hilma Tereza Tôrres Khoury 2 O questionário é o instrumento de pesquisa que se utiliza quando se faz a opção por perguntar, ao invés de observar como meio para compreender o comportamento humano (Babbie, 1999). Em geral pergunta-se sobre um determinado tópico, visando medir interesses, preferências, opiniões, atitudes ou aspectos da personalidade (Günther, 1999). Qualquer empreendimento neste sentido deve estar fundamentado em uma “teoria sobre o construto ou objeto psicológico para o qual se quer desenvolver um instrumento de medida” (Pasquali, 1999, p.37). A medição é uma etapa muito importante da pesquisa científica, pois possibilita que se cumpram com suas principais metas: a descrição e a explicação. Medem-se "as distribuições empíricas de valores nas variáveis (descrição) e as associações entre as variáveis para explicar essas distribuições de valores" (Babbie, 1999, p. 179). O questionário possibilita a medição descritiva. A medição visando explicação, ou seja, associação entre variáveis é realizada por meio de procedimentos estatísticos. No entanto, ao escolher um tipo de medição para descrever o objeto a ser investigado, o pesquisador deve levar em conta o tipo de análise estatística que pretende. Isto porque, dados provenientes de medições nominais e ordinais permitem testes estatísticos não- paramétricos 3 , enquanto que dados oriundos de medidas intervalares e de razão permitem também testes paramétricos. Os testes paramétricos, sendo mais poderosos que os não- paramétricos, possibilitam inferências mais complexas (Günther, 1999). Mas antes de discorrer sobre os níveis de medida, algumas considerações sobre os tipos de variáveis se fazem necessárias. Há duas grandes classificações de variáveis: categóricas e quantitativas. As variáveis categóricas nomeiam e identificam categorias e sub-categorias de variáveis. Simplesmente dispõem os objetos (pessoas, animais ou coisas) provenientes de um conjunto de dados em categorias que descrevem suas características - p.ex. gênero, status conjugal, ocupação profissional e grau de escolaridade. As variáveis quantitativas assumem valores numéricos que representam quantidades reais; assim sendo, permitem operações matemáticas tais como soma ou média - p.ex. altura; idade; salário, anos de escolaridade (Moore, 2000). Atualmente, com os programas de computador, costumam-se atribuir valores 1 Texto elaborado para subsidiar a disciplina Teoria e Prática de Pesquisa em Psicologia Social, ministrada pela autora para o Curso de Psicologia da Universidade Federal do Pará (UFPA). 2 Psicóloga, Doutora em Psicologia, Professora Associada na Universidade Federal do Pará. 3 As estatísticas paramétricas e não-paramétricas permitem que se façam inferências a partir dos dados, ou seja, permitem que se vá além da mera descrição. Porém, as estatísticas pararnétricas são mais exigentes que as nao-paramétricas quanto à normalidade da distribuição da amostra e quanto à natureza das variáveis medidas. A distribuição normal é sensível ao tamanho da amostra e testes paramétricos exigem, além disso, variáveis quantitativas.

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Instrumentos – Profa. Dra. Hilma Khoury - UFPA/IFCH/FAPSI Produzido em Novembro/ 2006. 3ª. Revisão em Maio/2012 1

COMO CONSTRUIR QUESTIONÁRIOS PARA PESQUISA1

Hilma Tereza Tôrres Khoury2

O questionário é o instrumento de pesquisa que se utiliza quando se faz a opção por

perguntar, ao invés de observar como meio para compreender o comportamento humano

(Babbie, 1999). Em geral pergunta-se sobre um determinado tópico, visando medir interesses,

preferências, opiniões, atitudes ou aspectos da personalidade (Günther, 1999). Qualquer

empreendimento neste sentido deve estar fundamentado em uma “teoria sobre o construto ou

objeto psicológico para o qual se quer desenvolver um instrumento de medida” (Pasquali,

1999, p.37).

A medição é uma etapa muito importante da pesquisa científica, pois possibilita que se

cumpram com suas principais metas: a descrição e a explicação. Medem-se "as distribuições

empíricas de valores nas variáveis (descrição) e as associações entre as variáveis para explicar

essas distribuições de valores" (Babbie, 1999, p. 179). O questionário possibilita a medição

descritiva. A medição visando explicação, ou seja, associação entre variáveis é realizada por

meio de procedimentos estatísticos.

No entanto, ao escolher um tipo de medição para descrever o objeto a ser investigado,

o pesquisador deve levar em conta o tipo de análise estatística que pretende. Isto porque,

dados provenientes de medições nominais e ordinais permitem testes estatísticos não-

paramétricos3, enquanto que dados oriundos de medidas intervalares e de razão permitem

também testes paramétricos. Os testes paramétricos, sendo mais poderosos que os não-

paramétricos, possibilitam inferências mais complexas (Günther, 1999).

Mas antes de discorrer sobre os níveis de medida, algumas considerações sobre os

tipos de variáveis se fazem necessárias. Há duas grandes classificações de variáveis:

categóricas e quantitativas.

As variáveis categóricas nomeiam e identificam categorias e sub-categorias de

variáveis. Simplesmente dispõem os objetos (pessoas, animais ou coisas) provenientes de um

conjunto de dados em categorias que descrevem suas características - p.ex. gênero, status

conjugal, ocupação profissional e grau de escolaridade. As variáveis quantitativas assumem

valores numéricos que representam quantidades reais; assim sendo, permitem operações

matemáticas tais como soma ou média - p.ex. altura; idade; salário, anos de escolaridade

(Moore, 2000). Atualmente, com os programas de computador, costumam-se atribuir valores

1 Texto elaborado para subsidiar a disciplina Teoria e Prática de Pesquisa em Psicologia Social, ministrada pela autora para o Curso de Psicologia da Universidade Federal do Pará (UFPA). 2 Psicóloga, Doutora em Psicologia, Professora Associada na Universidade Federal do Pará. 3 As estatísticas paramétricas e não-paramétricas permitem que se façam inferências a partir dos dados, ou seja, permitem que se vá além da mera descrição. Porém, as estatísticas pararnétricas são mais exigentes que as nao-paramétricas quanto à normalidade da distribuição da amostra e quanto à natureza das variáveis medidas. A distribuição normal é sensível ao tamanho da amostra e testes paramétricos exigem, além disso, variáveis quantitativas.

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numéricos a variáveis categóricas, a fim de facilitar a organização e a análise dos dados (p.ex.

1 = masculino; 2 = feminino). Contudo, estes números jamais representarão quantidades;

nesses casos, não faria sentido calcular média, por exemplo.

As variáveis quantitativas se dividem em discretas e contínuas. São discretas quando

representam quantidades que se apresentam em unidades não fracionáveis, ou seja, varia em

passos discretos dentro de um determinado intervalo. Por exemplo, número de filhos; só se

pode ter 1, 2 ou 3; ninguém tem 1,5 filhos. São contínuas quando representam quantidades

que podem se apresentar fracionadas em unidades e sub-unidades, ou seja, podem assumir

qualquer valor em um intervalo dado. Por exemplo, idade, salário, altura, peso, hora. Uma

pessoa com 60 anos de idade pode ter 60 anos, 8 meses e 5 dias. A hora em que um aluno

chegou na sala de aula pode ter sido às 13 horas, 40 minutos e 15 segundos.

1. Níveis de Medição

l.1. Nominal: os números servem apenas para distinguir as categorias que compõem

uma variável.

Exemplo: Sexo

Masculino (1), Feminino (2)

1.2. Ordinal: os números refletem uma ordenação entre as categorias componentes de

uma variável. Há hierarquia, mas não se conhece a distância (o intervalo) entre os postos.

Ex1: Classe Social

Baixa (1), Média (2), Alta (3).

Ex2: Preferências por atividades de lazer – sair para dançar, ir ao cinema, assistir à

televisão, ir ao barzinho com amigos.

Primeiro lugar (1), segundo lugar (2), terceiro lugar (3), quarto lugar (4).

Ex3: Escalas tipo Likert.

Concordo Fortemente (5), Concordo Moderadamente (4), Nem concordo, nem

discordo (3), Discordo Moderadamente (2), Discordo Fortemente (1)

1.3. De Intervalo: A distância (intervalo) entre duas categorias é conhecida e

constante, diferente da medição ordinal, onde os números indicam tão-somente uma

hierarquia. Assim, no exemplo acima, pode-se dizer que aquela pessoa gosta mais de sair para

dançar do que de ir ao barzinho. Porém, a medida ordinal não permite determinar o quanto ela

gosta de dançar. Para saber o quanto alguém prefere alguma coisa ou o quanto concorda com

uma afirmação, há que se utilizar a medição de intervalo. Na medida intervalar, "as distâncias

entre os pontos têm significado real" (Babbie, 1999, p. 187), pois "os intervalos entre as

alternativas têm tamanho conhecido e podem ser comparados" (Günther, 1999 p.249).

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Ex.1: Medição por Índices - Em uma escala para medir atitudes com relação ao aborto,

composta por 20 itens (10 favoráveis; 10 desfavoráveis), avaliados em uma escala de 5

pontos, tipo Likert (1=discordo fortemente; 2=discordo moderadamente; 3=nem concordo,

nem discordo; 4=concordo moderadamente; 5=concordo fortemente), às respostas dos

participantes foram atribuídos pontos de 1 a 5. Os pontos obtidos em cada item foram

somados e compuseram um índice que varia de 20 a 100 pontos, de tal forma que, quanto

mais pontos alguém fizer, mais favorável será ao aborto. Uma pessoa com 60 pontos é mais

favorável ao aborto do que outra com 40 e, além disso é 20 pontos mais favorável do que esta.

Ex.2: Um exemplo bem ilustrativo da medição de intervalo é a medida do coeficiente

de inteligência (QI). Se uma pessoa tem QI de 60 e outra de 120, além de poder dizer que a

segunda é mais inteligente que a primeira, posso dizer que o QI da segunda é maior que o da

primeira em 60 pontos.

Ex.3: No exemplo anterior sobre as preferências de lazer, o pesquisador poderia

solicitar a ordenação das preferências de lazer e, ao mesmo tempo, pedir aos respondentes que

expressassem em percentagens (0% a 100%) o grau de sua preferência para cada uma

daquelas atividades de lazer.

1.4. De Razão: Assemelha-se a medição de intervalo, porém, tem um ingrediente a

mais. Conhece-se a razão, a proporção em que uma categoria é maior que a outra. Além disso,

permite relação entre grandezas da mesma espécie.

Ex1: A pessoa que tem 50 anos tem mais idade do que quem tem 25 anos; tem 25 anos

a mais; e tem o dobro da idade da segunda (razão 2:1), portanto, é duas vezes mais velha.

Ex2: Uma pessoa com renda mensal de R$6000,00 ganha mais que outra com renda de

R$2000; ganha R$4000,00 a mais que esta; e seu salário é o triplo do salário desta (3:1),

portanto, seu poder aquisitivo é três vezes maior.

No exemplo do QI, não posso dizer que uma pessoa que tenha um QI de 120 tenha o

dobro da inteligência de outra com um QI de 60.

De acordo com Günther (1999), a Escala tipo Liket, muito utilizada para

levantamentos de atitudes e opiniões, embora seja uma escala ordinal, pode ser tratada como

medição intervalar para efeito de análise estatística. Günther (1999) argumenta que, na

prática, "a variabilidade nos intervalos não afeta o poder inferencial de uso de estatísticas

paramétricas com dados da escala Likert" (p.252). No entanto, adverte que "esta flexibilidade

não se estende à interpretação de médias baseadas em intervalos variáveis" (p.252),

recomendando a utilização da moda e da mediana ao invés da média para esses casos.

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2. Apresentação das escalas de medida ao participante

Ao apresentar o questionário aos participantes, o pesquisador não precisa mostrar-lhe

números ou pedir-lhe que escreva, ou escolha números. Números são muito abstratos e podem

causar dificuldade para certos participantes, tais como crianças e adultos com baixo grau de

instrução. Além disso, podem tornar o questionário cansativo para qualquer um. Assim, o

pesquisador poderá utilizar outros recursos e guardar os números apenas para quando for

alimentar o banco de dados.

Por exemplo, se o interesse do pesquisador é saber a ordem de preferência por certas

atividades de lazer como ir ao cinema, sair para dançar, assistir à TV e ir ao barzinho com

amigos, poderá pedir ao participante que escolha as atividades a partir de uma lista e escreva o

nome das atividades dentro de círculos de tamanhos diferentes, deixando claro para ele que o

círculo maior corresponde à atividade preferida em primeiro lugar e assim por diante, até o

círculo menor, que corresponde à atividade preferida em quarto lugar, dentre quatro

apresentadas.

Exemplo:

No exemplo acima, o participante ordenará suas preferências conforme o tamanho do

círculo. Para o pesquisador, no momento de alimentar o banco de dados, o círculo maior

poderá corresponder ao número 1 e o menor, ao número 4, ou vice-versa.

Esta maneira de trabalhar com medição ordinal, mas também com outras formas de

medição, pode variar utilizando-se outros recursos tais como pirâmides invertidas, escadas,

cones, quadrados de tamanhos diferentes, etc.

No caso de a coleta de dados ser realizada por meio de entrevista, o pesquisador pode

utilizar outras estratégias. Por exemplo, ao invés de pedir que o participante escreva suas

preferências dentro do círculo, o pesquisador pode apresentar-lhe quatro cartelas retangulares

de igual tamanho, contendo os nomes das quatro atividades de lazer investigadas, e solicitar

que ele as ordene, arrumando-as sobre a figura de uma escada ou de uma pirâmide. É só usar

a criatividade e muitas estratégias surgirão.

No caso de escalas tipo Likert, como a do exemplo acima (discordo fortemente;

discordo moderadamente; nem concordo, nem discordo; concordo moderadamente; concordo

fortemente), bastaria o participante marcar com um X a alternativa que corresponde à sua

Dançar Cinema Barz

TV

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opinião com relação ao aborto. Ao alimentar o banco de dados, se o pesquisador pretender

identificar atitude favorável ao aborto, pode atribuir o número 5 para a alternativa concordo

fortemente, o número 3 para a alternativa nem concordo nem discordo e o número 1 para

alternativa discordo fortemente. Assim, quanto mais pontos o sujeito fizer, mais favorável ao

aborto ele será. Dependendo do objeto investigado, as alternativas de resposta podem ser

outras que não os graus de concordância. Por exemplo, podem variar de não se aplica a se

aplica totalmente, ou de excelente a péssimo, ou, ainda, de nunca a freqüentemente, onde o

ponto de não comprometimento seria, respectivamente, se aplica em parte, razoável e

algumas vezes.

3. Tipos de Questões

3.1.Declarações: são uti1izadas para determinar o grau em que os respondentes

apóiam determinada atitude ou perspectiva. É feito por meio de escalas de concordância, por

exemplo, escalas tipo Likert.

Ex: Praticar a eutanásia é o mesmo que matar.

Concordo muito Concordo um pouco Tanto Faz Discordo um pouco Discordo muito

3.2. Perguntas Abertas: as respostas são livres. São escritas em espaço apropriado ou

solicitadas verbalmente. As respostas a perguntas abertas devem ser codificadas ou

categorizadas antes de se entrar com os dados em um banco. A desvantagem deste tipo de

pergunta é que dificultam a análise das respostas, demandam mais esforço e tempo para

alimentar o banco de dados e, além disso, podem ocorrer respostas irrelevantes para os

objetivos do pesquisador. A vantagem é que permite melhor percepção sobre atitudes e

preferências do respondente, além de fornecer informações não previstas pelo pesquisador,

porém úteis para o objetivo da pesquisa.

Ex: O que pensa sobre a eutanásia?

3.3. Perguntas Fechadas: as respostas são induzidas. O respondente escolhe uma

alternativa de resposta a partir de uma lista apresentada. Este tipo de pergunta tem a vantagem

de permitir maior uniformidade de respostas, além de ser mais fácil de processar, facilitando a

análise estatística dos resultados. A principal desvantagem deste tipo de pergunta é que as

alternativas de resposta correm sempre o risco de não abarcar todas as alternativas possíveis,

por mais exaustivo que se tenha sido na escolha das categorias de respostas. Por isso, em

geral, há a alternativa

Outros ________________

Especifique, por favor

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Questões fechadas exigem que as categorias de respostas sejam mutuamente

excludentes. Respostas múltiplas criarão dificuldade no processamento dos dados (Babbie,

1999).

4. Principais regras para a elaboração de questões ou itens

4.1. Clareza e Objetividade: o item deve ser compreensível, até para o extrato mais

baixo da população-alvo. O item ou questão deve ser-elaborado de tal forma que permita ao

respondente lê-lo rapidamente, entender seu propósito, e dar uma resposta sem dificuldade

(Pasquali, 1999). Portanto, dê preferência a frases curtas (menos de 25 palavras) e a

expressões simples e inequívocas, a fim de evitar má interpretação.

Além disso, evite gírias, pois estas podem não ser inteligíveis para todos os membros

de uma população, ou "ofender o extrato mais sofisticado" (Pasquali, 1999, p.49). Além disso,

pode causar má impressão, vindo a prejudicar a pesquisa, pois o participante pode ficar

desmotivado ou se recusar a continuar respondendo. No entanto, a linguagem típica da

população-alvo deve ser utilizada, afinal, "a preocupação aqui é a compreensão das frases

(que representam tarefas a serem entendidas e, se possível, resolvidas), não sua elegância

artística” (Pasquali, 1999, p.49).

4.2 Evitar Duplicidade: evitar questões ou itens que contenham mais de uma idéia.

Itens que trazem explicações de termos, razões ou justificativas, acabam por introduzir várias

idéias e normalmente geram confusão (Pasquali, 1999).

Ex: Abomino a eutanásia porque é uma forma de assassinato.

O respondente pode ficar confuso e não saber se concorda ou discorda do item, pois

pode abominar a eutanásia, mas não porque a considera uma forma de assassinato e sim por

outra razão. Nesse caso, seria melhor desdobrar este item em dois e dizer:

Abomino a prática da eutanásia.

A eutanásia é uma forma de assassinato.

4.3. Evitar itens Negativos: frases negativas em geral conduzem a má interpretação e

a confusão. “É melhor afirmar a negatividade do que negar uma afirmação" (Pasquali, 1999,

p.49).

Ex: A prática da eutanásia não se deve aceitar.

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Seria melhor dizer:

Considero inaceitável a prática da eutanásia.

4.4. Relevância: evite fazer perguntas sobre temas pouco conhecidos ou que não

digam respeito aos respondentes, pois se corre o risco de obter respostas inventadas e,

conseqüentemente, ter a pesquisa invalidada (Babbie, 2001). Além disso, examine

cuidadosamente o objetivo da pesquisa para construir itens ou questões pertinentes ao

objetivo proposto e úteis a ele.

4.5. Evite Direcionar respostas: "a maneira como os dados são procurados determina

a natureza dos dados recebidos" (Babbie, 1999, p. 193).

- Evite questões do tipo: Você discorda da eutanásia? Este tipo de questão

sugere a resposta desejada, desacreditando a objetividade dos resultados.

- Evite identificar atitude ou posição com pessoas ou instituições de prestígio

ou de má reputação. Podem ocasionar um viés, respectivamente, positivo ou

negativo.

Ex: Você acha que a CNBB está certa em repudiar a eutanásia?

Em um país predominantemente católico como o Brasil, isso provavelmente

produziria um apoio maior a essa questão do que se ela não tivesse sido identificada com a

Conferência Nacional dos Bispos do Brasil.

- Evite adjetivos que rotulam, por exemplo, liberal ou ateu, pois podem

produzir um viés não intencional em função da carga positiva ou negativa que

carregam algumas culturas.

- Evite palavras ou frases carregadas de emoção:

Ex: A eutanásia deve ser banida do planeta.

4.6. Variedade: o uso repetido das mesmas palavras ou termos pode provocar

confusão, cansaço e aborrecimento. Por isso, varie a linguagem, adotando palavras sinônimas.

No caso de escalas de preferência, formular metade dos itens favorável e a outra

metade desfavorável ao objeto que está sendo medido, a fim de evitar o erro de resposta

estereotipada à esquerda ou à direita da escala de resposta (Pasquali, 1999).

4.7. Prefira expressões de reação Modal: evite utilizar expressões extremadas, ou que

indiquem a intensidade da resposta. Dê preferência a palavras onde a maioria possa se

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encaixar de alguma forma. "A intensidade da reação do sujeito é dada na escala de resposta.

Se o próprio item já vem apresentado de forma extremada, a resposta na escala de respostas já

está viciada" (Pasquali, 1999, p. 50).

Ex: É extremamente cruel aprovar a eutanásia. Ou, Jamais aceitarei a eutanásia

Dizer, simplesmente, É cruel aprovar a eutanásia teria mais chances de produzir

variabilidade nas respostas em uma escala de 5 pontos, por exemplo.

4.8. Credibilidade (validade aparente): formular o item de tal maneira que não pareça

"ridículo, despropositado ou infantil" (Pasquali, 1999, p.50), pois pode conduzir a atitude

desfavorável para com o questionário, afetando negativamente as respostas. Por exemplo, um

participante idoso pode se sentir desprestigiado com formulações infantis.

Ex: Coitadinho do paciente terminal, pode ter sua vida tirada antes da hora.

4.9. Garantir que o participante seja capaz de responder às questões formuladas:

evite pedir informações que as pessoas não têm como lembrar ou como calcular de forma

precisa, pois pode obter respostas não confiáveis.

Ex: Quantas horas por mês você costuma passar diante da TV?

Seria melhor elaborar pergunta fechada, de uma forma que o participante tenha como

avaliar e com alternativas de respostas passíveis de aproximação com a verdade. Por exemplo:

Quantas horas por dia você costuma passar diante da TV?

( ) 0 a 1 hora ( ) 1 a 2 horas

( ) 2 a 3 horas ( ) 3 a 4 horas

( ) mais de 4 horas.

5. Organização do questionário

5.1. Ordenamento das questões: “a ordem na qual são feitas as perguntas pode afetar a

resposta, bem como toda a coleta de dados. Por exemplo, a presença de uma pergunta pode

afetar as respostas a perguntas subseqüentes” (Babbie, 1999, p.205).

Ex. perigo da poluição/perigo para o país (poluição será mais citada); avaliação da

religiosidade no geral/perguntas sobre aspectos específicos da religiosidade (respostas

buscarão consistência com avaliação anterior).

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Contudo, a aleatorização da ordem das perguntas não resolve este problema, ao

contrário, pode criar dificuldades devido à mudança constante do foco de atenção. A solução

é o pré-teste (Babbie, 1999).

- As perguntas iniciais não devem ser ameaçadoras, nem colocar o participante

em situação difícil ou constrangedora (ex. comportamento sexual, uso de

drogas).

- Em questionários auto-administrados é melhor começar com as perguntas

mais interessantes. Os “dados demográficos mais insípidos” (Babbie, 1999,

p.206) tais como idade, sexo, etc devem vir no final do questionário, a fim de

não passar a impressão de um formulário rotineiro e conduzir a desmotivação.

- Em entrevistas, onde a comunicação entre entrevistador e entrevistado deve

ser estabelecida rapidamente ao primeiro contato, é o contrário. Após uma

breve introdução à pesquisa, deve-se pedir os dados demográficos, pois são

questões fáceis de responder e, em geral, pouco ameaçadoras. Depois, então,

perguntam-se sobre atitudes e assuntos mais sensíveis.

5.2. Grupos Lógicos: facilite as respostas do participante agrupando questões similares

ou que tratam do mesmo assunto ou sub-tema.

5.3. Evitar confrontos com os participantes: há uma tendência geral para a emissão de

respostas socialmente aceitáveis. Assim, elabore a questão de tal forma que o participante

perceba que pode expressar sua resposta de maneira conveniente.

Ex: Você praticaria a eutanásia?

Seria melhor fazer um preâmbulo como, por exemplo: São muitas as razões que

podem levar alguém a praticar a eutanásia, desde o alívio do sofrimento do doente até a

venda de órgãos para transplante (ou desde as mais nobres às mais condenáveis). Você

praticaria a eutanásia?

5.4. Questões abertas no fim do questionário: especialmente se o questionário é

extenso, pois questões abertas exigem mais tempo do participante para respondê-las, podendo

conduzir ao desinteresse.

5.5. Planeje as opções de resposta:

- Por exemplo, nas escalas tipo Likert, decidir se inclui o ponto de não

comprometimento. Se, por um lado, esta opção pode facilitar a resposta de

quem tem uma posição realmente neutra sobre o assunto em questão, por outro

lado pode favorecer certa tendência das pessoas a não assumir opiniões.

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- O mesmo é válido para alternativas de resposta do tipo não sei ou não tenho

opinião, ou não se aplica ou em dúvida.

5.6. Formatação do questionário:

- Distinguir questões de respostas, por exemplo, fazendo as perguntas em

letras normais e as opções de resposta em caixa alta e/ou negrito.

- Utilizar caixas de resposta, ao invés de espaços em branco. Por exemplo,

quadrados, círculos, parêntesis curvos ou retos.

- Se pedir que os participantes façam comentários, deixe espaço suficiente para

que escrevam.

- No caso de perguntas abertas, não coloque linhas para escrever, deixe o

espaço em branco. Linhas podem limitar a dimensão da resposta.

- Questões contingentes: algumas vezes é melhor fazer perguntas contingentes

do que obrigar todos os participantes a ler uma questão irrelevante para muitos

deles.

Se você quer saber algo específico de quem se aposentou por invalidez, por

exemplo, você pode perguntar qual a forma de aposentadoria do participante e

depois direcionar uma pergunta apenas para aqueles que se aposentaram por

invalidez. Esta segunda pergunta é denominada de contingente. “O uso apropriado

de perguntas contingentes pode facilitar a tarefa de responder um questionário e

também melhorar a qualidade dos dados produzidos” (Babbie, 1999, p.201).

Há várias formas de se fazer perguntas contingentes, mas o melhor formato é

aquele em que são “postas em caixas conectadas à pergunta base por setas a partir

das respostas apropriadas” (Babbie, 1999, p.201).

Ex. Qual a sua forma de aposentadoria?

( ) por tempo de serviço

( ) por idade

( ) por invalidez.

- Sempre agradeça a colaboração do entrevistado ao final e, se possível, peça-lhe para

fazer um comentário geral sobre o questionário.

- Torne seu questionário atrativo.

Se por invalidez, o que motivou a aposentadoria?

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• Se for auto-administrado não deve conter mais de quatro páginas; se for via

telefone, não ultrapassar dez minutos; se for entrevista, não exceder muito mais

que uma hora.

• Inclua bastante espaço em branco; cor (porém, não mais que duas); dois tipos

de caracteres, no máximo.

6. Confiabilidade e Validade

6.1. Confiabilidade: diz-se que um instrumento é confiável quando produz os mesmos

resultados ao ser aplicado repetidamente ao mesmo objeto ou à mesma população (ex. balança

x estimativa para calcular o peso). Mas, a confiabilidade não garante exatidão (a balança pode

estar adulterada).

“Há diversas técnicas para medir a confiabilidade de itens de questionários, mas os

métodos para maximizar a confiabilidade são bastante diretos. Faça apenas as perguntas cujas

respostas as pessoas provavelmente sabem, pergunte coisas relevantes para elas, e seja claro

no que está perguntando. O perigo é que as pessoas darão respostas – confiáveis ou não”

(Babbie, 1999, p.196).

6.2. Validade: grau com que uma medida empírica (instrumento) reflete

adequadamente o significado real do conceito considerado, ou seja, grau em que o

instrumento mede aquilo que se propõe medir (validade aparente). Daí a importância de se

definir operacionalmente os conceitos a serem medidos.

A análise fatorial é uma técnica estatística que mostra o que o instrumento está

medindo, ela determina quantos fatores o instrumento está, de fato, medindo e que itens

compõem cada fator (Pasquali, 1999).

- Validade de critério ou preditiva: baseia-se em critério externo, por exemplo,

“a validade de um teste escrito para motoristas é evidenciada pela relação entre

as notas que as pessoas obtêm no teste e sua competência para dirigir” (Babbie,

1999, p.197). Em geral o comportamento pode servir como padrão da validade

de critério para muitas medidas de atitude em pesquisa social.

- Validade de conteúdo: grau com que uma medição cobre a amplitude de

significados incluídos no conceito (ex. do teste de capacidade matemática).

- Validade de construção: modo como uma medida se relaciona a outras

variáveis num sistema de relações teóricas (ex. medida de autonomia entre

idosos, comparada com medida de independência).

Referências

Page 12: Instrumentos para Pesquisa

Instrumentos – Profa. Dra. Hilma Khoury - UFPA/IFCH/FAPSI Produzido em Novembro/ 2006. 3ª. Revisão em Maio/2012 12

Babbie, E. (1999). Métodos de pesquisas de survey. Belo Horizonte: UFMG.

Günther, H. (1999). Como elaborar um questionário. Em, L. Pasquali (Org.), Instrumentos

psicológicos: Manual prático de elaboração (pp.231-258). Brasília/DF: LabPAM

Moore, D. S. (2000). The basic practice of statistics. New York: W. H. Freeman and

Company.

Pasquali, L. (1999). Testes referentes a construto: Teoria e modelo de construção. Em, L.

Pasquali (Org.), Instrumentos psicológicos: Manual prático de elaboração (pp.37-71).

Brasília/DF: LabPAM.

Bibliografia Consultada

Babbie, E. (1999). Métodos de pesquisas de survey. Belo Horizonte: UFMG.

Günther, H. (1999). Como elaborar um questionário. Em, L. Pasquali (Org.), Instrumentos

psicológicos: Manual prático de elaboração (pp.231-258). Brasília/DF: LabPAM

Levin, J. (1978). Estatística aplicada a ciências humanas. São Paulo: Harper & Row do Brasil.

Moore, D. S. (2000). The basic practice of statistics. New York: W. H. Freeman and

Company.

Pasquali, L. (1999). Testes referentes a construto: Teoria e modelo de construção. Em, L.

Pasquali (Org.), Instrumentos psicológicos: Manual prático de elaboração (pp.37-71).

Brasília/DF: LabPAM.

SPSS Survey Tips (sem data). [traduzido para o português a partir do original em inglês, por

PSE – Produtos e Serviços de Estatística Ltda]. Lisboa/Portugal.