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1 UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES PUBLICIDADE E PROPAGANDA A ALIENAÇÃO DA REALIDADE ATRAVÉS DO USO E MANIPULAÇÃO DE ESTEREÓTIPOS PELA MÍDIA

Monografia - Teoria da Comunicação

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A alienação da realidade através do uso de estereótipos pela mídia. - Prof. Dr. Vinícius Romanini

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES

PUBLICIDADE E PROPAGANDA

A ALIENAÇÃO DA REALIDADE ATRAVÉS DO USO E

MANIPULAÇÃO DE ESTEREÓTIPOS PELA MÍDIA

SÃO PAULO

2010

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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES

PUBLICIDADE E PROPAGANDA

Débora Smid Rozão

A ALIENAÇÃO DA REALIDADE ATRAVÉS DO USO E

MANIPULAÇÃO DE ESTEREÓTIPOS PELA MÍDIA

Artigo da disciplina Teoria da Comunicação,

curso de Publicidade e Propaganda, Escola de

Comunicações e Artes, Universidade de São

Paulo.

Prof. Dr. Anderson Vinícius Romanini

SÃO PAULO

2010

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“Bem ou mal utilizada, a imagem artística, quer estática

(como na pintura ou fotografia), quer dinâmica (como no

teatro ou cinema), é uma arma capaz de alterar hábitos,

costumes, opiniões e modos de vida de muitos,

simultaneamente; sem dúvida, uma poderosa arma

política e ideológica.” (SALLES, 2010)

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RESUMO

ROZÃO, Débora S. A alienação da realidade através do uso e manipulação de

estereótipos pela mídia.

Prof. Orientador: Anderson Vinicius Romanini; São Paulo: USP, 2010, 17 fl., Artigo.

O seguinte trabalho baseia-se na apresentação e análise da mídia e seu aspecto

influenciador do ponto de vista dos indivíduos, atendo-se principalmente aos estereótipos que

a mesma divulga, e, por vezes, manipula, com exemplificação na idealização da beleza

humana e possível distorção da mesma.

Palavras-chave: mídia . influência . estereótipo . beleza . photoshop

ABSTRACT

ROZÃO, Débora S. The alienation of reality through stereotypes use and manipulation by

the media.

Prof. Guide: Anderson Vinicius Romanini; São Paulo: USP, 2010, 4 p., Article.

        The following work is based on both presentation and analyses of general media and

media influential aspect over people point of view, sticking, primarily, with stereotypes

promoted and, sometimes, manipulated by the one, using as example the human beauty

idealization and its possible distortion.

Key words: media . influence . stereotype . beauty . photoshop

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO 6

2. A INFLUÊNCIA DA MÍDIA SOBRE A SOCIEDADE 6

2.1. A MÍDIA NORMATIVA: ESTEREOTIPIA E IDEALIZAÇÃO 8

2.1.1. Estereotipia 9

2.1.2. A idealização através da estereotipia 9

3. A MÍDIA E O BELO 10

3.1. A BELEZA HUMANA SEGUNDO A MÍDIA 11

4. EXAGEROS NOS ESTEREÓTIPOS: A MANIPULAÇÃO DA FOTOGRAFIA 13

4.1. O FENÔMENO CHAMADO PHOTOSHOP 13

4.2. LIMITE 14

5. CONCLUSÃO 15

REFERÊNCIAS 16

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1. INTRODUÇÃO

É impossível negar o fato de que atualmente a mídia bombardeia constantemente os

indivíduos com sua imensa quantidade de informações. São notícias sendo divulgadas a cada

instante sobre fatos ocorrentes nas mais diversas partes do mundo; anúncios apresentando

produtos que são lançados em busca de convencer o consumidor de que estes são ainda

melhores que seus antecessores; novelas e filmes apresentando diferentes realidades e modos

de vida; enfim, uma infinidade de mensagens sobre qualquer espécie de tema, que afloram

veículos midiáticos afora até atingirem a vida de cada um que tenha contato com os mesmos.

E os indivíduos, por sua vez, já dependentes dessas informações e adaptados ao seu

fluxo, permitem-se captá-las, muitas vezes sem impor-lhes sequer um filtro; resultando em

sua absorção indiscriminada de signos sem atestar previamente a veracidade dos mesmos, e

provocando consequente alienação da perspectiva de realidade para muitos.

Assim, discutir-se-á neste artigo o aspecto que proporciona à mídia seu caráter

influenciador, o modo como a mesma é capaz de restringir o ponto de vista das pessoas

através da utilização de estereótipos e o modo através do qual a mesma, por vezes, abusa de

sua coerção para com os indivíduos, criando uma nova realidade que não condiz com o

mundo, principalmente no que se refere à beleza humana.

2. A INFLUÊNCIA DA MÍDIA SOBRE A SOCIEDADE

Tentar discutir o aspecto influente exercido pela mídia sobre a constituição da opinião

dos indivíduos trata-se já de uma negação de um fato.

Como a tecnologia e o conhecimento, a mídia avança a cada dia barreiras que antes se

julgavam intransponíveis e expande-se mais e mais vida do ser humano adentro: de seu estilo

impresso, veio com o passar dos anos o rádio, o cinema, a televisão, até o fenômeno

denominado “internet”, que vem alastrando-se desenfreadamente, sendo ainda indefinidos

seus efeitos e abrangência. E, dessa forma, torna-se então cada vez mais presente no cotidiano

do homem, tal qual em suas relações com os demais; ao mesmo tempo em que faz-se também

a base de sua práxis, causando que o mesmo seja já incapaz de viver sem ela.

Independente do conteúdo veiculado nessas mídias, que varia de programas a filmes

ou comerciais, tem-se sempre por traz dos mesmos, por mais inofensivos que pareçam, o

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intuito da transmissão de alguma mensagem, como não deixa de lembrar Kirkpatrick (1997)

em seu texto em defesa da propaganda:

“Todos os artigos de jornais e revistas, bem como todos os programas de rádio ou

televisão, são discursos comerciais produzidos com o propósito explícito de induzir

uma ‘transação comercial’; toda a comunicação em mídia, em outras palavras,

contém ‘mensagens puramente comerciais’.” (KIRKPATRICK, 1997)

Isso ao que o autor se refere como “mensagens puramente comerciais” pode ser

também encarado como qualquer ideia que se deseje transmitir, independente de seu

seguimento. Podem ser citados como exemplos a utilização das mídias e da publicidade para

divulgação dos ideais nazistas na Alemanha em meados do século XX, e a circulação de

jornais ou revistas clandestinos nas fábricas brasileiras no início do mesmo século que criaram

uma onda de revolta operária capaz de questionar as péssimas condições dos trabalhadores.

Assim, vê-se que essa influência de opiniões não diz respeito apenas aos interesses

comerciais, mas também a qualquer interesse ideológico, o que permite a disseminação de

pensamentos sobre política, cultura, esportes, moda, ou qualquer outro assunto.

Além do mais, temos que se se considerar Bakhtin (1981) e sua teoria de reflexão e

refração da realidade nos indivíduos através dos signos, e levar-se em conta Schaff (1974), ao

estabelecer que pensamento e linguagem são elementos indissociáveis; obtém-se que qualquer

forma de interação social que se estabeleça através de linguagem, – que é, aliás, o elemento

primordial da dinâmica social – traz em si, por si própria, uma inerente bagagem ideológica.

Portanto, a mídia e os meios de comunicação em massa, por seu caráter difusor de

informações através da utilização da linguagem – seja esta pictórica, oral ou escrita, – são,

inegavelmente, consideráveis influenciadores dos pensamentos dos que se deixam por eles

atingir, ou mesmo dos indivíduos que não se atinjam diretamente mas convivam com os

atingidos.

Surge, então, a partir deste ponto, outra observação importante ao estudo das mídias,

que é o fato de que, devido a sua tamanha influência e atual abrangência de grandes

contingentes populacionais, ela se torna também um agente homogeneizador de opiniões, o

que explica o raciocínio de Barbéro (apud TRINDADE, 2007) ao dizer que as mídias “são

elementos reguladores das relações sociais e estão na própria base da constituição dessas

relações”. Pois, se se tem que o conteúdo transmitido por determinado veículo, através de sua

programação, é único para todos os que o “consomem”; as ideologias que ali se encontram e a

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partir dali disseminar-se-ão são as mesmas, o que resultará em um grande compartilhamento

de ideias por estes “consumidores”, e em uma subsequente massificação de sua opinião,

implicando-lhes uma considerável perda de subjetividade. Canclini (1995) observa esse

fenômeno ao dizer que as sociedades atuais “manifestam-se principalmente como

comunidades hermenêuticas de consumidores, ou melhor, como conjuntos de pessoas que

compartilham gosto e pactos de leitura em relação a certos bens (gastronômicos, desportivos,

musicais), os quais lhes fornecem identidades comuns”.

Portanto, as mídias não apenas influenciam as pessoas em sua individualidade, como

também são capazes de manipular as ações de comunidades inteiras, ditando os assuntos que

devem pautar, o modo como devem interagir, a maneira mais adequada para se trajar, como

devem se alimentar, entre outros aspectos, mesmo que imperceptíveis.

2.1. A MÍDIA NORMATIVA: ESTEREOTIPIA E IDEALIZAÇÃO

Tendo-se conhecimento da influência da mídia na mentalidade dos indivíduos, em

suas ações ou constituição de suas opiniões, deve-se ressaltar a sua imanente possibilidade de

direcionamento das mesmas, e consequente aspecto manipulador da realidade; fato que ilustra

Motter (2002) ao descrever a possibilidade com os temas que possui a imprensa no seguinte

excerto:

“a ideologia da imprensa retorna ao cotidiano, onde exerce seu controle,

disseminando temas que ela privilegia para iluminar campos de sentidos e destacar

assuntos para as interações verbais do cotidiano, que ela mantém, substitui, amplia,

dilui, planta, ou apaga pelo silêncio” (MOTTER, 2002) [grifos meus]

E, do mesmo modo que há esta manipulação temática pela imprensa, ocorre também

um suposto direcionamento das ideias em tudo o mais que a mídia divulgue, seja isto a moda,

as tendências, o partidarismo político, o ponto de vista dos fatos; impossibilitando, de certo

modo, que os indivíduos criem suas próprias interpretações do mundo sem que sejam

influenciados. E uma das formas mais correntes pela qual acontece essa sua atuação sobre a

percepção dos indivíduos é a criação e divulgação de estereótipos.

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2.1.1. Estereotipia

Um erro que pode ser comum a muitos é a associação entre os termos “estereótipo” e

“preconceito”, tratando ambos como portadores de uma só significação. Ao contrário do que

muitos julgam, o estereótipo não é algo negativo: trata-se antes de uma simplificação da

realidade para que a mesma possa ser compreendida por todos; entendendo-se que é

impossível a estes presenciar toda a variedade de signos existentes, conhecendo-os

efetivamente.

Exemplo típico do fenômeno de estereotipia é a maneira como todos sabem o que é

uma explosão, mesmo que nunca tenham presenciado alguma. Isto acontece por que alguma

vez alguém que já tenha presenciado uma explosão, ou tenha ouvido falar a respeito, narrou-

lhes as qualidades e efeitos da mesma.

Se se observar o sistema no qual o homem vive e foi criado, perceber-se-á que o

mesmo se repete em diversos aspectos de seu cotidiano, como no processo de educação

familiar ou escolar, em que nada menos que uma diversidade de estereótipos são-lhe

transmitidos a fim de ajudar-lhe a compreender melhor o mundo.

Portanto, a estereotipia é um elemento auxiliar ao conhecimento, em geral; não

devendo assim ser resumida a “preconceito”, que embora se constitua por estereótipos,

relaciona-se muito mais a valores – culturais ou subjetivos – que os indivíduos atribuem aos

mesmos.

E a mídia, por sua vez, como potencial difusora de informações, faz-se um dos

principais auxiliares na divulgação de estereótipos na atualidade. Fato que comprova

Lippmann (1980) ao afirmar que “não pode haver dúvida de que o cinema esteja construindo

constantemente imagens que são, depois, evocadas pelas palavras que as pessoas leem nos

jornais”.

2.1.2. A idealização através da estereotipia

A questão, entretanto, não diz respeito à transmissão de estereótipos ou não pela

mídia, mas ao modo como ela os transmite às pessoas. Observa Sant’Anna (1999) que neste

quesito

“seus pecados mais graves são as distorções (evidentes ou dissimuladas) do gosto

popular, as simplificações primárias das ‘receitas de sucesso’, que pretendem

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interpretar as tendências da maioria quando, muitas vezes, apenas endossam ou dão

ênfase às exceções, aos desvirtuamentos, aos desvios de uma cultura em formação.”

(Sant’Anna, 1999)

Ou, melhor dizendo, o que ocorre muitas vezes é que os estereótipos repassados pela

mídia não condizem com a realidade dos indivíduos que os captam: são antes padrões ideais

mais ligados à cultura destes indivíduos que às suas vidas como elas são. Como é o caso da

representação da família feliz, reunida à mesa no almoço ou café da manhã, trocando sorrisos

e favores; aspecto cotidiano apresentado em sua forma mais agradável, mesmo que menos

vigente, aludindo ao que Alves (2010) trata por “mundos simbólicos dos sonhos e das

fantasias”. Fenômeno frequente não apenas nas propagandas, mas nos programas, nos artigos,

nas reportagens, ou qualquer outro meio pelo qual se possa transmitir uma ideologia, um

estereótipo, de forma a garantir sua adesão.

No entanto, a mídia, em geral, utiliza-se tão periodicamente de determinados

estereótipos, que os mesmos passam a serem aceitos como padrão vigente, uma espécie

norma, uma determinação da forma “certa” de ser. E partir daí surge a alienação dos

indivíduos, que não só aceitam estas normas, como também as aderem, passando a moldar

tudo o que vêem de acordo com as mesmas; tornando-se, assim, como descreve Fonseca

(2010), “analfabetos visuais incapazes de perceber imagens além daquelas que são divulgadas

e consagradas pela mídia”, mesmo que estas não condigam com sua realidade. Uma

exemplificação desse fenômeno normativo apresenta-se claramente naquilo ao que

vulgarmente denomina-se “padrão de beleza”.

3. A MÍDIA E O BELO

Observa Bertomeu (2010) que “vivemos numa época em que a estética se tornou

prioridade, reforçada por uma confluência entre tecnologia e cultura”. Basicamente tudo para

a sociedade faz-se julgado por sua beleza e

“esse cuidado estético não está ligado apenas uma elite social ou artística nem

atrelado a uma ideia de refinamentos. Esse apelo está presente em todas as coisas e

em todos os lugares e está mais acessível a uma grande parte da população.

Podemos observar esse refinamento das imagens no cinema, nos cartazes, na TV, na

internet, em capas de CD, em escritórios, restaurantes, shoppings centers, talão de

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cheques, cartões de crédito, entre milhares de elementos que fazem parte de nosso

cotidiano.” (BERTOMEU, 2010)

Este aspecto, entretanto, embora tenha sido acentuado, de fato, pela indústria

capitalista, que vem desde sempre procurando a diferenciação de seus produtos esteticamente

para conquistar consumidores e manter-se no mercado; não é algo recente: encontra-se em

meio a humanidade há muito mais tempo.

Na Antiguidade, como lembra Salles (2010), devido à proximidade ou à simples não-

dissociação entre a vida social e a vida espiritual, surge já o primeiro conceito de estética,

através do qual a beleza e a perfeição eram a própria representação do divino. Desse modo, na

Grécia Antiga, inspirados em seus deuses, artesãos estabeleceram os clássicos padrões de

proporção da figura humana e da arquitetura; ideais de equilíbrio, harmonia e proporção que

estabeleceram o padrão artístico durante o período renascentista, em que ressurgiram, e

arrastam-se, inclusive, até a atualidade.

O mesmo autor relaciona também o nascimento da própria arte à busca estética.

“uma vez dominada a técnica do registro por meio do desenho, o homem passou

então a desenvolver uma dimensão estética desses registros que não fosse apenas a

simples representação de algo, mas que traduzisse a ideia do belo, do aprazível, da

harmonia. Essa dimensão estética da representação foi denominada ‘arte’.” (Salles,

2010)

Por conseguinte, considerando-se tal demanda incessante pelo belo, a mídia, por

buscar sempre agradar aos públicos, não poderia simplesmente abster-se desse fator. E, por

isso, de modo a atender a mesma demanda, utiliza-se sempre dos padrões mais aceitos pela

sociedade: os padrões idealizados pela mesma; disseminando e inculcando,

consequentemente, nos indivíduos ainda mais esses estereótipos de beleza já existentes na

sociedade ou, surgida uma oportunidade, criando novos outros, dando-lhes cada vez mais

força e contribuindo para normatização da beleza idealizada.

3.1. A BELEZA HUMANA SEGUNDO A MÍDIA

Um dos principais estereótipos de beleza utilizado pela mídia é aquele que diz respeito

à beleza humana, sendo ao mesmo tempo, talvez, uma de suas mais fortes representações

estereotipadas e idealizadas.

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“É a idealização grega levada ao extremo. Corpos magros, malhados, botocados,

lipoaspirados, depilados, com dentes, pele e cabelos perfeitos”, como observa Fonseca (2010).

A autora lembra ainda das barrigas-tanquinho do filme norte-americano 300, dirigido por

Zack Snyder, que são nada mais que um reflexo de um padrão de beleza estabelecido pelos

escultores gregos e que vigora até os dias atuais no mundo ocidental. É o corpo humano ideal

que, por sua garantida aceitação, tornou-se o estereótipo preferido da mídia.

No entanto, essa beleza à qual as pessoas tanto admiram, transformada por elas em

arquétipos aos quais idolatrarão e nos quais basear-se-ão, são nada menos que exceções

geradas pelas manipulações pela mídia através de sua determinação e produção da aparência

de elencos para os filmes ou novelas, dos apresentadores para programas televisivos ou dos

modelos que irão aparecer em comerciais e estampar anúncios veiculados em mídias

impressas ou na internet.

Ou seja, se se considerar um editorial de moda de uma revista, por exemplo, tem-se

que seus modelos, após serem minuciosamente escolhidos de acordo com a harmonia dos

traços de seus rostos e algumas de suas características físicas, tais quais a magreza para a

mulher ou musculatura bem definida para os homens, que remetem aos padrões de beleza já

pré-estabelecidos, passam ainda por todo um preparatório: suas unhas são feitas, seus cabelos

arrumados, os detalhes de seu rosto destacados pela maquiagem, sua roupa designada por

estilistas, além de que o fotógrafo os instrui, dentro de toda uma angulação correta da

luminosidade, à pose que mais ressalta sua beleza. Assim, a fotografia dos mesmos que será

exibida ao final do processo e que inspirará os que a veem, tratar-se-á não apenas da imagem

destes modelos, mas de toda uma ambientação e da preparação dos mesmos; aspecto que,

ainda segundo Fonseca (2010), por estarmos “imersos em tanta informação visual [...] temos

preguiça de enxergar”.

A mídia pode até mesmo utilizar-se do processo inverso para estipular tais

estereótipos, às vezes, como no caso da novela brasileira “Bela, a feia”, produzida e veiculada

pela Rede Record no ano de 2009 e baseada em versões anteriores tais quais “Yo soy Betty, la

fea”, “Ugly Betty” ou “La fea mas bella”. Nas mesmas a figura feminina é representada

utilizando aparelhos dentários, para ressaltar o não alinhamento de sua dentição; com cabelos

mal arrumados, de forma a não se valorizarem; utilizando óculos, que associados ao aparelho

implicam em uma desarmonia de seu rosto; e com hábitos de pessoa não-refinada, humilde.

Aparece aí o estereótipo do feio, ou melhor: o estereótipo do não-belo. É como se se tratasse

de um manual de como não se deve ser.

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O efeito de ambas as exibições, no entanto, é o mesmo: tanto uma como a outra

idealizam a beleza do ser humano, ditando – considerado o caráter influenciador já discutido

da mídia – normas pelas quais os mesmos devem apresentar-se para que se enquadrem nos

padrões de beleza, para que sejam ditos belos.

4. EXAGEROS NOS ESTEREÓTIPOS: A MANIPULAÇÃO DA FOTOGRAFIA

Segundo observa Lippmann (1980), “as fotografias têm hoje sobre a imaginação a

espécie de autoridade que a palavra impressa tinha ontem e, antes dela, a palavra falada.

Parecem absolutamente reais”. Assim, ainda abordando a temática da beleza, conclui-se que

se antes se imaginava seus padrões e a partir do que se entendesse tentava-se segui-los;

atualmente, por meio da exibição fotográfica na mídia, não há ao menos a possibilidade de se

imaginar esses padrões: tem-se os mesmos já formados por retratos, completos em detalhes,

restando aos indivíduos apenas a possibilidade de se olhar no espelho e esperar que seu

reflexo pareça-se com o que mostra a fotografia.

Entretanto, estes padrões vem tornando-se cada vez mais duvidosos, nem sempre

podendo ser considerados reais, ou mesmo possíveis; e já não se trata apenas de uma

ambientação propícia e preparação dos modelos – como fora já discutido. Nos últimos anos, a

mídia tem se utilizado de novos artifícios para apresentar o padrão ideal nos estereótipos que

exibe, sendo um deles a manipulação digital das fotografias após serem tiradas através de

programas de computadores.

4.1. O FENÔMENO CHAMADO PHOTOSHOP

Com a evolução da informática e dos meios digitais ligados ou voltados a ela, tais

como a máquina fotográfica digital, tornou-se possível o desenvolvimento de programas que

tivessem como intenção principal a manipulação imagética. Estes eram inicialmente mais

voltados para um controle de brilho ou efeitos de foque para que se pudesse obter uma

imagem impressa melhorada. Porém, em uma sociedade já dominada pelo uso das fotografias,

houve a necessidade de um programa mais eficiente, que poupasse aos fotógrafos boa parte de

seu trabalho no momento de fotografar. Então, em 1990, surge um fenômeno conhecido

atualmente mundo afora como Photoshop.

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Adorado por uns, alvo principal da crítica de outros, o programa da marca Adobe,

Photoshop, conquistou seu lugar de destaque ao tornar possível a reparação de qualquer

aspecto que pudesse ser prejudicial a uma fotografia já existente.

Com ele tornou-se desnecessária toda aquela atenção para com o modelo escolhido ou

ambientação e iluminação na hora de fotografar. Não que os mesmos tenham sido totalmente

desconsiderados, mas o programa tornou possível não apenas a melhoria dos efeitos

superficiais da imagem já citados, como também possibilitou a manipulação do espaço em

que a fotografia fora tirada e modificação das características físicas do modelo que serviu a

esta. Assim, pode-se esconder ou disfarçar características que fujam ao estereótipo de beleza

adotado pela mídia, como cicatrizes, tatuagens, piercings, estrias, celulite, acne; sendo

também possível refazer os detalhes ligados ao formato do corpo do modelo, como

abrandamento de silhueta de mulheres, ou intensificação da definição dos músculos nos

homens. Isso tudo, quando feito por profissionais – gratificante para estes e terrível para os

receptores – de forma imperceptível a olhares amadores.

4.2. LIMITE

O problema maior de se proporcionar possibilidades, de fato, é que, ao não se estipular

limites para as mesmas, ora ou outra surgirá seu uso abusivo. É o caso extremo a que se

chegou quando a modelo considerada número 2 do mundo, Sasha Pivovarova, garota

propaganda da mundialmente renomada Dior, desconheceu-se em sua própria fotografia para

a campanha da coleção Inverno 2010 devido ao uso exagerado dos efeitos do Photoshop, cuja

utilização a mesma permite e concorda desde que seja para deixá-la mais bonita.

A mídia, em sua busca obsessiva por perfeição, manipula por vezes a realidade de

forma tão intensa e exagerada, que exacerba os limites do que se pode chamar real. Alguns

veículos da mídia empolgaram-se tanto com a possibilidade de idealizar suas imagens, que

atingiram o limite de tolerância de grande parte de profissionais ou receptores esclarecidos

sobre o assunto.

O deputado brasileiro Wladimir Costa, por exemplo, chegou a propor um projeto de

lei que previa multa entre 1500 e 50 mil reais para as agências de publicidade que se

utilizassem do Photoshop para manipularem imagens de pessoas em seus anúncios. As

mesmas deveriam passar a explicitar o uso do programa sob o aviso "Atenção: imagem

retocada para alterar a aparência física da pessoa retratada" (NOBRE, 2010).

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O discurso do mesmo foi o de que "em tempos de Photoshop, a manipulação de

imagens faz com que a fotografia seja muitas vezes radicalmente diferente da realidade.

Manchas na pele são apagadas, rugas são cobertas, quilos a mais são extirpados. É difícil a um

leigo perceber que o resultado final não é uma imagem original" (COSTA apud NOBRE,

2010), argumento justo e comprovado no caso da modelo.

5. CONCLUSÃO

Como reflete Bosi (1977) em um de seus artigos a respeito de estereótipos “o espírito

não deve imobilizar-se nem na aceitação, nem na negação, mas tem que se empenhar numa

vontade em luta contra o falso, numa vontade de consciência total e prática”. Desse modo, os

indivíduos não devem esperar que a mídia modifique seus estereótipos ou pare de transmiti-

los, até mesmo por que, como fora apresentado e discutido, ambos constituem a essência da

mesma, sendo impossível sua existência sem estes. E a idealização, embora lhe fosse um

aspecto dispensável à existência, faz parte de seu caráter, e sua extinção em nada auxiliaria,

tendo-se que os estereótipos ideais já se afixaram às mentalidades de todos.

De fato, a mídia revela seu cunho manipulador cada vez mais escrachadamente,

distorcendo o mundo de forma tal a gerar outra realidade, que os indivíduos começam a

perceber seu aspecto inatingível, mesmo que ainda se influenciem.

Portanto, a atitude de manter o equilíbrio entre o real e o ideal, abstendo-se ao

perfeccionismo grego ou via Photoshop, deve partir daqueles que recebem as informações

pela mídia. Não se trata de desconsiderar todos os estereótipos já existentes, pois como fora

refletido, isso seria um retrocesso no processo de conhecimento; mas apenas buscar, por meio

da observação atenta do mundo, transformar todos esses estereótipos, introduzidos na

sociedade principalmente pela mídia, em conhecimento efetivo, para que se formem a partir

daí não novos estereótipos, mas opiniões.

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REFERÊNCIAS

1. ARTIGOS

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BERTOMEU, J.V.C. et al. Criação visual e multimídia. São Paulo: Cengage Learning,

2010.

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São Paulo: Ed. EFRJ, 1995.

KIRKPATRICK, J. Em defesa da propaganda: argumentos a partir da razão do egoísmo ético e do capitalismo Laissez-Faire. São Paulo: 1977.

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MOTTER, M.L. Campo da Comunicação: cotidiano e linguagem. In: Bacegga, M.A. Gestão

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