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Análise para discussão – Última versão em 16.11.2013 Decreto n. 8.135, de 04 de novembro de 2013 – Status de Assunto de Segurança Nacional para comunicações da administração pública federal. Danilo de Morais Veras Foram aproximados 5 (cinco) meses transcorridos entre a denúncia de espionagem estadunidense, realizada por Edward Snowden, até a publicação do Decreto n. 8.135, de 04 de novembro de 2013, que dispõe “sobre as comunicações de dados da administração pública federal, direta, autárquica e fundacional, e sobre a dispensa de licitação nas contratações que possam comprometer a segurança nacional”. Tal rapidez revela que o assunto povoou os corredores do Congresso Nacional e a agenda da Presidenta, a qual, dentre os países da América Latina vítimas do monitoramento ilegal (México, Venezuela, Argentina, Colômbia e Equador), foi a primeira a editar norma específica. Em linhas gerais o Decreto é bastante simples. Três artigos. O primeiro dedicado a estabelecer quais entidades estarão submetidas ao novo regramento (administração federal direta, autárquica e fundacional), quais os serviços deverão ser “estatizados” (redes de telecomunicações e serviços de tecnologia da informação), bem como quais entidades estarão habilitadas a prestá-los (órgãos ou entidades da administração pública federal, incluindo empresas públicas e sociedades de economia mista da União e suas subsidiárias). O segundo, prevendo a possibilidade contratação dos serviços por dispensa de licitação, tendo-se em vista a preservação da segurança nacional (inc. IX, art. 24 da Lei n. 8.666/93). O terceiro trata da vigência dos dispositivos, estabelecendo o prazo de 120 (cento e vinte) dias para os efeitos do art. 1º e desde a data de publicação, no caso do art. 2º. Inexistem dúvidas quanto às entidades submetidas ao regulamento. Deverão proceder a contratação de tais serviços a administração federal direta, autárquica e fundacional. Quanto aos serviços, ficam excluídos os serviços de serviço móvel pessoal (celulares) e o serviço telefônico fixo comutado 1 (LDI 2 e LDN 3 ), ou seja, o serviço de “telefonia fixa”. A princípio, a preocupação do Decreto não é o serviço de telefonia, mas no de dados transmitidos por intermédio dos serviços de correio eletrônico, considerando a confiabilidade de programas, equipamentos e a segurança do armazenamento de dados. Os detalhes acerca da prestação de tais serviços serão disciplinados por ato interministerial da (i) Defesa, (ii) Planejamento, Orçamento e Gestão e (iii) Comunicações, o qual versará sobre as peculiaridades das 1 Serviço de telecomunicação realizado através da transmissão de voz e de outros sinais destinados à comunicação entre pontos fixos determinados, utilizando processos de telefonia. 2 Serviço de Longa Distância Nacional. 3 Serviço de Longa Distância Internacional.

Nota ao Decreto n. 8.135 4 de nov de 2013

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Foram aproximados 5 (cinco) meses transcorridos entre a denúncia de espionagem estadunidense, realizada por Edward Snowden, até a publicação do Decreto n. 8.135, de 04 de novembro de 2013, que dispõe “sobre as comunicações de dados da administração pública federal, direta, autárquica e fundacional, e sobre a dispensa de licitação nas contratações que possam comprometer a segurança nacional”. Tal rapidez revela que o assunto povoou os corredores do Congresso Nacional e a agenda da Presidenta, a qual, dentre os países da América Latina vítimas do monitoramento ilegal (México, Venezuela, Argentina, Colômbia e Equador), foi a primeira a editar norma específica.

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Page 1: Nota ao Decreto n. 8.135   4 de nov de 2013

Análise para discussão – Última versão em 16.11.2013

Decreto n. 8.135, de 04 de novembro de 2013 – Status de Assunto de

Segurança Nacional para comunicações da administração pública federal.

Danilo de Morais Veras

Foram aproximados 5 (cinco) meses transcorridos entre a denúncia de

espionagem estadunidense, realizada por Edward Snowden, até a publicação do

Decreto n. 8.135, de 04 de novembro de 2013, que dispõe “sobre as comunicações

de dados da administração pública federal, direta, autárquica e fundacional, e sobre

a dispensa de licitação nas contratações que possam comprometer a segurança

nacional”. Tal rapidez revela que o assunto povoou os corredores do Congresso

Nacional e a agenda da Presidenta, a qual, dentre os países da América Latina vítimas

do monitoramento ilegal (México, Venezuela, Argentina, Colômbia e Equador), foi a

primeira a editar norma específica.

Em linhas gerais o Decreto é bastante simples. Três artigos. O primeiro

dedicado a estabelecer quais entidades estarão submetidas ao novo regramento

(administração federal direta, autárquica e fundacional), quais os serviços deverão

ser “estatizados” (redes de telecomunicações e serviços de tecnologia da

informação), bem como quais entidades estarão habilitadas a prestá-los (órgãos ou

entidades da administração pública federal, incluindo empresas públicas e

sociedades de economia mista da União e suas subsidiárias). O segundo, prevendo a

possibilidade contratação dos serviços por dispensa de licitação, tendo-se em vista

a preservação da segurança nacional (inc. IX, art. 24 da Lei n. 8.666/93). O terceiro

trata da vigência dos dispositivos, estabelecendo o prazo de 120 (cento e vinte) dias

para os efeitos do art. 1º e desde a data de publicação, no caso do art. 2º.

Inexistem dúvidas quanto às entidades submetidas ao regulamento. Deverão

proceder a contratação de tais serviços a administração federal direta, autárquica e

fundacional. Quanto aos serviços, ficam excluídos os serviços de serviço móvel

pessoal (celulares) e o serviço telefônico fixo comutado1 (LDI2 e LDN3), ou seja, o

serviço de “telefonia fixa”. A princípio, a preocupação do Decreto não é o serviço de

telefonia, mas no de dados transmitidos por intermédio dos serviços de correio

eletrônico, considerando a confiabilidade de programas, equipamentos e a

segurança do armazenamento de dados. Os detalhes acerca da prestação de tais

serviços serão disciplinados por ato interministerial da (i) Defesa, (ii) Planejamento,

Orçamento e Gestão e (iii) Comunicações, o qual versará sobre as peculiaridades das

1 Serviço de telecomunicação realizado através da transmissão de voz e de outros sinais destinados à comunicação entre pontos fixos determinados, utilizando processos de telefonia. 2 Serviço de Longa Distância Nacional. 3 Serviço de Longa Distância Internacional.

Page 2: Nota ao Decreto n. 8.135   4 de nov de 2013

Análise para discussão – Última versão em 16.11.2013

comunicações dos órgãos e entidades e a efetiva capacidade da administração

pública federal ofertar satisfatoriamente as redes e os serviços.

Ponto interessante, no entanto, é a abrangência do Decreto ora em análise.

Ocorre que, segundo Edward Snowden, o interesse dos Estados Unidos da América

não estaria concentrados apenas em assuntos militares, mas também nos dados

sigilosos referentes à produção de petróleo e energia4, o que transformaria em alvos,

além do Ministério de Minas e Energia, a Petrobras (sociedade de economia mista),

a Eletrobras e outras entidades estratégicas nestes segmentos5 não abrangidas pelas

exigências registradas no ato da presidência.

A dispensa de licitação prevista no art. 2º vincula-se diretamente ao inc. IX, do

art. 24 da Lei n. 8.666/93, o qual prevê a dispensa de licitação “quando houver

possibilidade de comprometimento da segurança nacional, nos casos estabelecidos

em decreto do Presidente da República, ouvido o Conselho de Defesa Nacional”.

Atualmente, são dois os assuntos tratados por este inciso, o primeiro, pelo Decreto

n. 2.295, de 4 de agosto de 1997, com enfoque em armamento e desenvolvimento de

tecnologias, e o segundo, pelo recente Decreto n. 8.135, de 4 de novembro de 2013,

cujo foco concentra-se na comunicação de dados da administração direta,

autárquica e fundacional.

Atualmente, a principal fornecedora de serviços de transmissão de dados por

internet para o governo é o Serviço Federal de Processamento de Dados – Serpro,

empresa pública vinculada ao Ministério da Fazenda, criada em 1º de dezembro de

1964, pela Lei n. 4.516, com o objetivo de modernizar e dar agilidade a setores

estratégicos da Administração Pública brasileira, tendo por objeto a “prestação de

serviços em Tecnologia da Informação e Comunicações para o setor público”. Nesse

sentido, é razoável sustentar que a contratação do Serpro por dispensa de licitação

já poderia se dar pelo inc. VIII do art. 24 da Lei n. 8.666/93, com maior agilidade,

tendo-se em vista que o atendimento ao inc. IX requer que o Conselho de Defesa

Nacional se posicione acerca de cada contratação. A opção, no entanto, revela o

intuito da presidência em dar ao caso status de assunto da segurança nacional.

4 Conforme notícia publicada pelo site de notícias G1, disponível para consulta em http://g1.globo.com/mundo/noticia/2013/07/entenda-o-caso-de-edward-snowden-que-revelou-espionagem-dos-eua.html, acessado em 06 de novembro de 2013. 5 Neste sentido, reportagem da Epoca Negócios, disponível para consulta em http://epocanegocios.globo.com/Informacao/Acao/noticia/2013/11/dilma-autoriza-criacao-de-sistema-de-e-mail-do-governo-contra-espionagem.html, acessado em 06 de novembro de 2013.