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"Quando o homem beijou a lua" “No momento em que o Homem chegou à Lua, a Lua estava a dormir profundamente, depois de ter passado várias noites agitada por estranhos pesadelos. Quando acordava, não conseguia recordar-se deles, mas sentia o desconforto que os sonhos maus costumam deixar-nos no corpo, na memória e até à flor da pele." José Jorge Letria, in "Quando o Homem Beijou a Lua", Alfragide, Oficina do Livro, 2009 O dia dos namorados chegou e a Lua recebeu uma carta. Ao abrir a carta a Lua encontrou as seguintes palavras: Lua é o teu nome, Lua fica-te bem. Lua, eu amo-te, mas não contes a ninguém. A partir desse dia, a Lua deixou de ter pesadelos e só pensava em quem seria o seu admirador secreto. Como é que a Lua não podia contar a ninguém se, ela própria, não sabia quem era? Cada dia que passava a Lua pensava mais no seu admirador. Os pesadelos deram lugar a sonhos fantásticos em que o admirador era um cantor, um poeta, um príncipe, um cavaleiro de armadura...Mas o tempo foi passando e a Lua não sabia mais nada dele. Até que um dia a Lua teve um visitante, um asteróide que tinha saído da sua órbita. A Lua nunca tinha visto um asteróide tão pequeno e tão intrometido, que decidido a descobrir o seu segredo, começou a pressioná-la com falinhas mansas, implorando-lhe que contasse o seu segredo. O asteróide olhou a Lua com um ar solene e começou a contar a história do seu coração. Contou-lhe que se tinha apaixonado por uma estrela. E não era nenhuma outra, senão a estrela polar, por isso tinha iniciado uma jornada, em busca dela. Porém, a viagem já durava há muito tempo e o pequeno asteróide nunca obtivera quaisquer resultados e, por isso, receava nunca mais voltar a vê-la. Ao ouvir isto, a Lua, decepcionada, decidiu continuar a procurar o seu admirador secreto. Desceu do espaço, veio até próximo de nós. Era dia de Carnaval e vivia-se a magia da fantasia, todos se empenhavam para arranjar um disfarce. O admirador secreto da Lua soube que a sua amada tinha vindo passar esta época do ano junto dos Homens, aqui bem pertinho de nós. Como ele a admirava imenso fantasiou-se de Sol, pois assim poderia aproximar-se mais e andar sempre com ela. Quando a Lua avistou o Sol sentiu um aperto no seu coração e no seu pensamento. - O Sol, aqui? Não percebo… Não pára de me perseguir… Que estranho! A Lua, curiosa com a situação, aproximou-se do Sol e perguntou-lhe: - Olhe, desculpe, ando à procura do meu admirador, por acaso não o viu? - Por acaso até o vi. A Lua muito atrapalhada, responde: - Pode-me dizer onde, por favor? - Sim, posso... estou mesmo aqui. A Lua não queria acreditar no sucedido e ficou espantada. O Sol acrescentou: - Então, não me dizes nada? Ficaram a falar e, por fim, foram tomar um sorvete. Até que um dia o Sol desapareceu. A Lua já estava farta de esperar e, então, decidiu ir à procura do seu verdadeiro admirador secreto. No dia seguinte, falou com o pássaro Kúru que era feiticeiro e algum feitiço que lhe pedissem, ele concretizava. Assim sendo, a Lua pediu-lhe para se tornar

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"Quando o homem beijou a lua"“No momento em que o Homem chegou à Lua, a Lua estava a dormir

profundamente, depois de ter passado várias noites agitada por estranhos pesadelos. Quando acordava, não conseguia recordar-se deles, mas sentia o desconforto que os sonhos maus costumam deixar-nos no corpo, na memória e até à flor da pele."

José Jorge Letria, in "Quando o Homem Beijou a Lua", Alfragide, Oficina do Livro, 2009

O dia dos namorados chegou e a Lua recebeu uma carta. Ao abrir a carta a Lua encontrou as seguintes palavras:

Lua é o teu nome,Lua fica-te bem.Lua, eu amo-te,mas não contes a ninguém.

A partir desse dia, a Lua deixou de ter pesadelos e só pensava em quem seria o seu admirador secreto. Como é que a Lua não podia contar a ninguém se, ela própria, não sabia quem era? Cada dia que passava a Lua pensava mais no seu admirador. Os pesadelos deram lugar a sonhos fantásticos em que o admirador era um cantor, um poeta, um príncipe, um cavaleiro de armadura...Mas o tempo foi passando e a Lua não sabia mais nada dele.

Até que um dia a Lua teve um visitante, um asteróide que tinha saído da sua órbita.

A Lua nunca tinha visto um asteróide tão pequeno e tão intrometido, que decidido a descobrir o seu segredo, começou a pressioná-la com falinhas mansas, implorando-lhe que contasse o seu segredo.

O asteróide olhou a Lua com um ar solene e começou a contar a história do seu coração. Contou-lhe que se tinha apaixonado por uma estrela. E não era nenhuma outra, senão a estrela polar, por isso tinha iniciado uma jornada, em busca dela.Porém, a viagem já durava há muito tempo e o pequeno asteróide nunca obtivera quaisquer resultados e, por isso, receava nunca mais voltar a vê-la.

Ao ouvir isto, a Lua, decepcionada, decidiu continuar a procurar o seu admirador secreto.

Desceu do espaço, veio até próximo de nós. Era dia de Carnaval e vivia-se a magia da fantasia, todos se empenhavam para arranjar um disfarce.

O admirador secreto da Lua soube que a sua amada tinha vindo passar esta época do ano junto dos Homens, aqui bem pertinho de nós. Como ele a admirava imenso fantasiou-se de Sol, pois assim poderia aproximar-se mais e andar sempre com ela.

Quando a Lua avistou o Sol sentiu um aperto no seu coração e no seu pensamento.- O Sol, aqui? Não percebo… Não pára de me perseguir… Que estranho!A Lua, curiosa com a situação, aproximou-se do Sol e perguntou-lhe:- Olhe, desculpe, ando à procura do meu admirador, por acaso não o viu?- Por acaso até o vi.A Lua muito atrapalhada, responde:- Pode-me dizer onde, por favor?- Sim, posso... estou mesmo aqui.A Lua não queria acreditar no sucedido e ficou espantada.O Sol acrescentou:- Então, não me dizes nada?Ficaram a falar e, por fim, foram tomar um sorvete.Até que um dia o Sol desapareceu.A Lua já estava farta de esperar e, então, decidiu ir à procura do seu verdadeiro

admirador secreto. No dia seguinte, falou com o pássaro Kúru que era feiticeiro e algum feitiço que lhe pedissem, ele concretizava. Assim sendo, a Lua pediu-lhe para se tornar

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humana, mas o Kúru respondeu-lhe que lhe faltava o ingrediente mais importante, a pena de Fénix, avermelhada.

A Lua lembrou-se, então, que tinha uma boa amiga de nome Bela, a Fénix. Chamou-a com a sua voz mágica e a Bela apareceu a voar como por encanto, até parecia uma leve pena brilhante a cair ligeiramente numa poça de água. A Lua explicou o sucedido e a Fénix, muito comovida, deu-lhe a pena mais bela do seu manto encantado. A Lua agradeceu-lhe e entregou a pena ao pássaro Kúru que logo fez a poção, dizendo as palavras mágicas. De repente... poof! A Lua acordava na cama, com pernas, braços e uma bela e expressiva cara.

Tinha chegado a hora de começar a busca do seu admirador secreto. Pensava constantemente "como é que eu vou encontrá-lo num mundo grande como este?"

Mal tinha acabado de meditar nestas palavras de desânimo, quando apareceu uma cegonha com uma caixa cor-de-rosa na boca. A Lua abriu-a e de lá saiu um menino com uma rosa. Ela perguntou-lhe quem era e ele respondeu-lhe, cheio de ternura, que era o seu admirador secreto.

A Lua, comovida, começou a chorar de alegria, pois o seu esforço tinha sido compensado.

Mas, nos dias seguintes, continuaram a aparecer cartas.Ao abrir uma delas, a lua encontrou as seguintes palavras:

Das telhas do meu telhadocaem águas sem choversão lágrimas que eu chorocom vontade de te ver.

A lua, ainda mais entusiasmada, começou a chorar de alegria. Passou noites acordada a tentar saber quem era. Passava horas a pensar nisso.

Até que ao fim de duas semanas recebeu uma outra carta, mas desta vez a dizer:

Minha lua bonita,minha flor,anda ter comigo à Invictase queres o meu amor.

Nesse mesmo instante, toda produzida, apressou-se no tempo e dirigiu-se ao local.

Foi o momento mais feliz da sua vida... pois quem iria pensar que o seu admirador era o mar?

A Lua nunca chegou a saber quem era verdadeiramente o seu admirador; porém, recebeu muitos galanteios, sentiu-se, inúmeras vezes, lisonjeada, pelo Sol, pelo Mar e pelos Humanos. Afinal, a Lua seduz e atrai corações, é de todos e não é de ninguém…!