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INTRODUÇÃO À INTERPRETAÇÃO DAS ESCRITURAS Pr.Alberto Simonton 2014

Introdução à Hermenêutica Bíblica

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INTRODUÇÃO À INTERPRETAÇÃO DAS

ESCRITURAS

Pr.Alberto Simonton 2014

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INTRODUÇÃO1 É verdade que toda denominação possui o seu conjunto de doutrinas, e às vezes ocorrem diferenças grandes entre umas e outras. Mas se a Bíblia é uma só, porque tantas diferenças? A razão que traz à tona tantas diferenças de doutrinas é a interpretação dos textos da Escritura. Mas este fato não é novo, já desde os tempos de Jesus havia diferentes interpretações das Escrituras (Lc 10:26; Mt 22:23; 5:21, 27, 33, 38, 43; At 23:6-8). Hoje em dia temos a mesma situação, onde os grupos religiosos, ainda que todos igualmente evangélicos, se dividem devido às interpretações. Existe um modo de interpretação correta ou todos estão corretos? Como saber qual a interpretação correta? Na verdade é impossível que tenhamos duas interpretações de um texto bíblico, e que os dois estejam corretos. Forçosamente um estará errado!

A Reforma Protestante, diferente do que fazia a Igreja Católica na época, permitia e incentivava o cristão a estudar e examinar a Escritura. Contudo, hoje em dia este conceito é mal interpretado pelos cristãos, que acham que podem dizer o que quiser dos textos bíblicos. É preciso considerar que há um equívoco a respeito deste conceito. Livre Exame das Escrituras é diferente de “livre interpretação das Escrituras”. O Livre Exame das Escrituras é um direito pela qual a Reforma aprovou e ainda sustenta. Todos têm o direito de examinar as Escrituras, e de estudá-la. Mas a “livre interpretação das Escrituras” é um engano, um erro terrível. Ninguém pode alegar ter o direito de interpretar a Bíblia como bem entender. A “livre interpretação das Escrituras” é uma postura arrogante e herética. Difere inclusive do propósito que a própria Escritura tem, que é revelar os planos divinos. Ora, como poderíamos chamar de Revelação uma Escritura que pode significar qualquer coisa para qualquer um?!! Certamente que Deus não tem este propósito em mente. Ele revelou a verdade. E a verdade como tal não pode ser duas ou três sobre determinado assunto, mais somente uma.

Diante disto tudo, visto que a interpretação da Bíblia é um assunto de suma importância, pois é a partir da interpretação que vamos obter toda doutrina, e visto que a Reforma protestante sempre afirmou o direito ao livre exame das Escrituras por parte de todo cristão, devemos então aprender um pouco das regras de interpretação da Bíblia por pelo menos duas razões: 1º- Podermos utilizar estas regras em nosso cotidiano quando estudamos (examinamos) as Escrituras; 2º- Ao sermos ensinados acerca de algum ponto doutrinário podermos testar sua veracidade. TIPOS DE LEITORES

Nem todo mundo se apercebe do fato de que a leitura de qualquer texto sempre envolve um processo de interpretação. Ou seja, não é possível compreender um texto, qualquer que seja, sem que haja antes um processo interpretativo ― quer esse texto seja um jornal, quer seja a Revista Veja, quer seja a Bíblia. A leitura sempre envolverá um processo de interpretação ― ainda que esse processo seja inconsciente e nem sempre as pessoas estejam alertas para o fato de que um processo de compreensão está em andamento. A Bíblia é um texto. Ela é a Palavra de Deus, mas ela é um texto. Como tal, ela não foge a essa regra.

A compreensão de um texto pode ser difícil em razão de fatores não apenas objetivos, mas também subjetivos; isso quer dizer que muitas vezes o problema não está no texto, mas no próprio leitor. Ao doutor da lei, que havia perguntado sobre o que devia fazer para herdar a vida eterna, Jesus responde perguntando: “QUE ESTÁ ESCRITO? COMO LÊS?”

Assim, vamos nos concentrar primeiramente não no texto bíblico, mas no leitor. Há pelo menos três tipos de leitores que podem aqui ser mencionados: LEITORES AQUÉM DA LETRA: são leitores que não chegam a perceber nem mesmo aquilo que se acha na letra do texto; isso pode ocorrer tanto em virtude de uma leitura mais apressada, como por falta de maior atenção e concentração da mente na escrita, quanto por causa de alfabetização deficiente. LEITORES LITERALISTAS: Aqueles que se prendem ao texto de maneira errada. São leitores que, apesar de serem capazes de fazer uma leitura perfeita, sob os aspectos da correta pronúncia das palavras, da pontuação e acentuação, todavia, permanecem, como se diz, ao pé da letra.

1 Esta apostila não possui a devida citação das fontes bibliográficas utilizadas.

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LEITORES ALÉM DA LETRA: Leitores que vão além da letra em sentido tendencioso, de fazer o texto dizer aquilo que já preconceberam em sua mente. LEITURA INTERPRETATIVA: A significação de certos textos, a ser percebida na leitura, poderá ser, em sentido mais comum e bem genérico, literal ou figurada; as interpretações literal e figurada poderão estar erradas ou certas, dependendo isso da natureza dos textos de que são tiradas. Há textos cuja leitura conduz naturalmente o leitor a uma interpretação literal, ao passo que outros já se apresentam como afirmações de sentido evidentemente figurado (Mt 4:2; Jo 19:28; 6:61; 7:37).

Vejamos como uma só letra pode mudar o sentido de uma frase, e como a mesma frase pode ter vários sentidos. Pense sobre as seguintes frases:

1. “Ele está dando bola a ela.”

2. “Ele está dando a bola a ela.”

O que significa frase n0 1.? Como você definiria “bola” na frase n0 1.?

O que significa frase n0 2.? Como você definiria “bola” na frase n0 2.?

A palavra “bola” não pode ser definida ou entendida isoladamente. Ela tem que ser compreendida como parte da frase “dando bola”. Se tentarmos definir “bola” isoladamente é bem provável que vamos perder o sentido original. Alguém que não conhece bem a gíria contemporânea, ou expressões idiomáticas brasileiras dos anos ‘80 e ‘90 poderia pensar que a frase está simplesmente gramaticalmente errada, faltando um artigo antes da palavra “bola”.

Notamos que “bola” na frase n0 1 pode ser traduzida de três formas:

“paquera” - “Ele está paquerando ela”

(Neste caso seria uma moça ou mulher em quem o sujeito está mostrando interesse.)

“veneno” - “Ele está dando veneno a ela”

(Neste caso “ela” seria uma cadela e “bola” teria o significado de veneno para cachorros.)

“suborno” - “Ele está dando suborno a ela.”

(Neste caso “ela” seria um guarda de trânsito ou outra autoridade e “bola” teria o significado de suborno.)

Na segunda frase, entendemos naturalmente que a palavra “bola” provavelmente se refere a um objeto esférico, provavelmente de borracha ou couro. Sem ver mais detalhes, é provável que concluímos que se trata de um jovem e uma moça ou um homem e uma mulher envolvidos num jogo com uma bola. Mas, até a idade das pessoas, e o tipo de objeto (uma bola de basquete, de futebol, ou de tênis?) são desconhecidos sem maiores detalhes. Somente na primeira frase podemos ver três significados diferentes, cada um deles inteiramente legítimos, mas cada um completamente diferente. Como é que vamos saber qual o significado verdadeiro? Temos que olhar o contexto, as frases que vêm antes e depois. Temos que ver de qual assunto o autor está tratando. Com isso vemos como o sentido de não somente uma palavra, mas de uma frase inteira pode mudar tanto, embora tratemos das mesmas palavras na mesma sequência, na mesma forma. Observamos que a definição da palavra nestas duas frases não tem a ver com sua etimologia em si. Ou seja, a palavra “bola” não é definida pela sua raiz. Ela é definida pelo contexto. Observamos também que o

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significado da palavra nas duas frases é determinado por uma simples letra. O uso ou não de um simples artigo como “a” pode mudar completamente a definição de uma palavra e o significado de uma frase inteira.

Vale a pena observar que não estamos tratando aqui de uma frase complicada no meio de um obscuro texto bíblico. Estamos tratando de uma frase comum na língua portuguesa atual, usando uma expressão contemporânea. Observemos outro exemplo de que um texto pode refletir vários significados de acordo como enxerga o leitor:

Um homem rico estava muito mal, agonizando. Pediu papel e caneta. Escreveu assim: 'Deixo meus bens a minha irmã não a meu sobrinho jamais será paga a conta do padeiro nada dou aos pobres.' Morreu antes de fazer a pontuação. A quem deixava a fortuna? Eram quatro concorrentes.

1) A irmã fez a seguinte pontuação: Deixo meus bens à minha irmã. Não a meu sobrinho. Jamais será paga a conta do padeiro. Nada dou aos pobres. 2) O sobrinho chegou em seguida. Pontuou assim o escrito: Deixo meus bens à minha irmã? Não! A meu sobrinho. Jamais será paga a conta do padeiro. Nada dou aos pobres 3) O padeiro pediu cópia do original. Puxou a brasa pra sardinha dele: Deixo meus bens à minha irmã? Não! A meu sobrinho? Jamais! Será paga a conta do padeiro. Nada dou aos pobres. 4) Aí, chegaram os descamisados da cidade. Um deles, sabido, fez esta interpretação: Deixo meus bens à minha irmã? Não! A meu sobrinho? Jamais! Será paga a conta do padeiro? Nada! Dou aos pobres. Como é fácil observar, o texto pode ser interpretado de diversas maneiras. Nós é que fazemos sua pontuação, e damos muitas vezes o significado que queremos e não o que pretendia o autor do texto. Isso pode fazer toda a diferença.

É NECESSÁRIO INTERPRETAR A BÍBLIA?

Ao começar nosso estudo devemos ainda nos perguntar se é realmente necessário interpretar a Bíblia. Algumas pessoas afirmam que não. Alguns acham que a Bíblia já foi escrita numa linguagem pura e simples de entender. Afinal, a Bíblia não é a Palavra de Deus para o povo de Deus? Deus nos mandaria uma mensagem difícil de entender?

A verdade é que o que é de mais importante na Bíblia, o evangelho puro e simples, é tão simples que pode ser compreendido por qualquer pessoa com as condições básicas de lógica e raciocínio. O evangelho foi divulgado no começo apenas verbalmente e até hoje continua sendo a mesma história simples e poderosa. Mas, isto não muda o fato de que há partes da Bíblia que são difíceis mesmo de compreender.

Como já vimos anteriormente, todo leitor é um intérprete. Mas ler não implica necessariamente em entender. Quando não há barreiras na compreensão de um texto, a interpretação é automática e inconsciente. Mas isso nem sempre ocorre. De conformidade com a doutrina reformada da “clareza ou perspicuidade das Escrituras”, a Bíblia é substancialmente, mas não completamente clara. As verdades básicas necessárias à salvação, serviço e vida cristã são evidentes em um ou outro texto, mas nem todos os textos das Escrituras são igualmente claros.

Por ser um livro divino-humano, inspirado por Deus, mas escrito por homens, admite-se que há dificuldades de ordem espiritual e de ordem humana para a compreensão das Escrituras. Isto significa que a compreensão das Escrituras não é necessariamente automática e espontânea. É, sim, o resultado da ação iluminadora do Espírito Santo, por um lado, e por outro, do estudo diligente da língua e do contexto histórico em que foi escrita.

O próprio apóstolo Pedro fala da dificuldade que o leitor pode ter ao ler as Escrituras. Ele afirma isto em relação às cartas do apóstolo Paulo dizendo:

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[...] como igualmente o nosso amado irmão Paulo vos escreveu, segundo a sabedoria que lhe foi dada, ao falar acerca destes assuntos, como, de fato, costuma fazer em todas as suas epístolas, nas quais há certas cousas difíceis de entender, que os ignorantes e instáveis deturpam...” (2 Pedro 3:15,16).

Aqui vemos Pedro afirmando três verdades importantes:

1. Nem tudo nas cartas de Paulo era complicado;

2. Há certas coisas “difíceis de entender” nas cartas dele;

3. Sempre existe a possibilidade de alguém “deturpar” a Palavra de Deus (ou seja, corromper ou perverter). Se a Palavra de Deus fosse inteiramente simples e clara para compreender, jamais seria possível alguém deturpá-la.

Se o próprio apóstolo Pedro, com todo seu conhecimento e experiência, poderia dizer que havia coisas nas cartas de Paulo que até ele admitia serem “difíceis de entender”, então é de se esperar que um cristão leigo e sem treinamento hoje teria também dificuldade em entender estas e outras coisas. Devemos lembrar aqui, que Pedro e os leitores de sua época, diferente de nós hoje, não tinham que lidar com as mesmas diferenças de cultura ou língua quando eles liam as cartas de Paulo.

Vejamos a seguir que há indícios claros e objetivos na Escritura, no sentido de que Deus sabia que sua Palavra precisaria ser interpretada. De fato, a frase “... que quer dizer...” ocorre diversas vezes no NT geralmente em relação à tradução de uma frase ou palavra do hebraico ou aramaico: (Mat 1:23; 27:33; Mar 5:41; 15:22; 15:34; João 1:38; 1:41; 1:42; 9:7; 20:16; Atos 4:36; 9:36). Esta frase é uma característica do evangelho de João, ocorrendo cinco vezes.

1. Jesus teve que interpretar ou explicar várias vezes parábolas ou outras coisas que ele disse para os discípulos (Mat 13:36; 15:15 Mc 4:34; Luc 24:27; João 16:17-20, 29);

2. Jesus teve que corrigir a falsa interpretação dos fariseus e escribas a respeito de vários assuntos das Escrituras ( Mt 5:21-48);

3. Jesus criticou os líderes religiosos por não compreenderem o significado de certas ideias ou frases (Mat 9:13; 12:27);

4. Paulo mostrou a necessidade de interpretar (1Cor 2:13-14); 5. O eunuco precisava que alguém explicasse as Escrituras para entender o significado do texto de Isaías

(Atos 8:26 ).

Além desta fundamentação bíblica acerca da necessidade de interpretar as Escrituras, podemos ainda exemplificar a necessidade de se interpretar corretamente observando erros grosseiros de interpretação:

A) Sobre o relato de Adão e Eva, considero realmente difícil entendê-lo como um relato histórico propriamente dito. Entendo Adão como o "primeiro homem", ou a humanidade como um todo, e a Queda de Adão como a queda de todo ser humano. Nesse ponto, o conceito de angústia, trabalhado sobretudo por Kierkegaard em seu livro O conceito de angústia e por Heidegger em Ser e tempo, pode nos ajudar a compreender o relato do Gênesis sobre a queda de Adão. Em poucas palavras, tal queda diria respeito à própria emergência da consciência humana, ao "cair em si" do homem, à descoberta do si próprio e da precariedade que é inerente à condição humana. Veja que uma tal leitura não deixa de ter certa historicidade, uma vez que a emergência da consciência no homem ocorreu no tempo. Nesse mesmo sentido poderíamos compreender a referência de Paulo e até mesmo a ulterior teologia desenvolvida sobre o assunto. Ainda como diz Kierkegaard (cf. Doença para a morte), o pecado não estaria propriamente relacionado com uma falha moral ou contra Deus, antes diria respeito à precariedade ("herança" de Adão) que caracteriza o ser humano, incapaz de encontrar em si mesmo ou por suas próprias forças o fundamento de sua existência (Deus);

B) Outros casos: Um pregador que pregou contra o parto cesariana sem dor, com base em (Gênesis 3.16 - "com dor darás à luz filhos"). Uma senhora da sua igreja contra-argumentou, lembrando que ele tinha ar condicionado no gabinete e a Bíblia diz: "No suor do teu rosto comerás o teu pão"; Outro pregou contra a

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prática de esportes, baseando-se em (1 Timóteo 4.8 - "... o exercício corporal para pouco aproveita"); Um outro pregou em (2 Samuel 11.2 - "... E viu do terraço a uma mulher que se estava lavando"). Falou contra a televisão. Nela, vemos o que não devemos ver. Veio um outro e pregou sobre "e todo olho o verá" (Ap 1.7) e mostrou o valor da televisão via satélite. E aí, compro televisão ou não?; Quando questionei um mórmon sobre poligamia, ele respondeu biblicamente, com os exemplos de Abraão, Isaque, Jacó, Davi e outros; Ouvi certa vez uma pregação sobre o casamento de Isaque relatado em (Gn 24). O pregador disse que o servo de Abraão era um "tipo" do Espírito Santo, e que Rebeca é um símbolo da Igreja;

C) Por exemplo: lemos em Efésios 5.18: Não vos embriagueis com vinho. Alguém poderia dizer: Paulo proíbe que nos embriaguemos com vinho, mas acho que não seria errado embriagar-se com cerveja, rum, ou outra droga. O padrão desejado é a proibição da embriaguez com qualquer bebida alcoólica, e não apenas com vinho. O mandamento para não nos embriagarmos com vinho é apenas parte desse padrão. Ele envolve todas as bebidas alcoólicas atuais, assim como os narcóticos — mesmo que Paulo não fizesse ideia da existência dessas substâncias nem de como elas entrariam no corpo humano.

Algo típico deste abuso das Escrituras é a preguiça. Isto é, a maioria das pessoas simplesmente não dão o devido trabalho de ler o contexto ou examinarem os significados bíblicos. E mesmo quando estas pessoas são confrontadas com evidências convincentes contrárias a suas posições, elas freqüentemente respondem descaradamente: “Esta é apenas a sua interpretação”. Este tipo de resposta soa como se todas as interpretações fossem arbitrárias, como se todas as interpretações fossem igualmente plausíveis. Esta visão é claramente falsa.

Veja a seguinte sentença como exemplo: “Minha mãe gosta de manga”. Esta sentença não pode significar “Meu pai é um mecânico de automóveis”. “Mãe” não significa “Pai”; “gostar” não significa “ser”; “manga” não é um sinônimo de “mecânico de automóveis”. A língua não pode ser distorcida desta forma. Agora, sem um contexto, há contudo, duas opções distintas para a sentença em vista. Ou “Minha mãe gosta do fruto da mangeira” ou “Minha mãe gosta de vestimenta que não deixa os ombros (ou, os braços) expostos”. Qual é a opção certa? A única forma de saber é observar o contexto da afirmação, ou perguntar ao autor da sentença! Ambas opções são feitas na interpretação bíblica. Algumas vezes o contexto resolve o problema, outras vezes, quanto mais conhecermos a respeito do autor, mais capazes seremos para determinarmos o seu significado.

O distanciamento existente entre nós e os textos bíblicos tornam a sua interpretação necessária para a Igreja. Este distanciamento é perceptível em vários aspectos:

DISTANCIAMENTO TEMPORAL. A Bíblia está distante de nós há muitos séculos. Seguindo a postura do cânon tradicional, o último livro foi escrito por volta do final do século I da Era Cristã. Assim, não devemos pensar que um livro de 2000 anos pode ser lido como quem lê a Revista Época, em que a última edição saiu no sábado passado. Há esse fenômeno do distanciamento temporal, que precisa ser levado em consideração.

DISTANCIAMENTO CONTEXTUAL. Os livros da Bíblia foram escritos para atender a determinadas situações. Várias delas já se perderam no passado. Por exemplo, o uso do véu não é um problema nosso aqui no Brasil. O ataque do próprio gnosticismo nas igrejas da Ásia Menor, o contexto de invasão do profeta Habacuque, o propósito de Marcos, a antipatia dos judeus para com os ninivitas na época de Jonas, todas essas situações distintas produziram a literatura que depois se tornou canonizada, e que nós chamamos de Escritura. Várias dessas situações nos são estranhas, não existem hoje. Dessa forma, além de ser um livro que foi escrito há 2000 anos, foi um livro escrito para atender a determinados problemas que não são os mesmos enfrentados hoje.

DISTANCIAMENTO CULTURAL. O mundo que os escritores da Bíblia viveram não existe mais. Ele está em um passado distante, com suas características, sua cosmovisão, seus costumes, tradições e crenças. Nós vivemos hoje em um Brasil de tradição ocidental, influência europeia, americana e uma série de outras influências de um mundo completamente estranho àquele em que viveram os autores do Antigo Testamento e do Novo Testamento.

DISTANCIAMENTO LINGUÍSTICO. As línguas em que a Bíblia foi escrita também não mais existem. Já não se fala

mais o hebraico bíblico, o grego koiné ― mesmo nos países onde a Bíblia foi escrita. Então, essas línguas já não

são mais faladas ou conhecidas, a não ser através de estudo.

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DISTANCIAMENTO AUTORIAL. Nós devemos ainda reconhecer que teríamos uma compreensão mais exata da

mensagem se os autores da Bíblia estivessem vivos. Eu, por exemplo, gostaria de pegar o celular e ligar para

Pedro e perguntar para ele o que ele quis dizer quando afirma que Jesus foi pregar aos espíritos em prisão, ou

ligar para Paulo e perguntar o que ele quis dizer quando ele fala dos que se batizam pelos mortos, ou ainda o que

Mateus quis dizer quando registrou a frase em que Jesus afirma que não cessariam de percorrer todas as cidades

de Israel antes que viesse o Filho do homem. Eu gostaria de pegar o celular ou mandar um e-mail para os autores

da Bíblia e tirar algumas dúvidas. Isso não é possível.

DISTANCIAMENTO NATURAL. A Bíblia também é um livro divino, e esse fato faz com que também outro fenômeno do distanciamento apareça. A distância entre Deus — o autor último das Escrituras — e nós é imensa. Ele é Senhor, o criador de todas as coisas no céu e na terra. Nós somos suas criaturas imitadas, finitas. A nossa condição de seres humanos impõe limites à nossa capacidade de entender e compreender as coisas de Deus, ainda que reveladas em linguagem humana. Existe um distanciamento natural entre nós e o texto bíblico pelo fato de que ele é a Palavra de Deus, é a revelação de Deus. Ele é “totalmente outro”, a alteridade de Deus. A diferença entre Deus e nós faz com que a sua revelação careça de estudo, de aproximação da maneira certa.

DISTANCIAMENTO ESPIRITUAL. O aspecto espiritual envolvido na interpretação das Escrituras é demonstrado claramente em passagens bíblicas tais como (1Coríntios 2:14 e 2Coríntios 4.3-6). Nestes textos o apóstolo Paulo ensina claramente a absoluta incapacidade do homem natural (não regenerado) de compreender a revelação de Deus. A razão desta incapacidade é a cegueira espiritual em que se encontra como resultado da queda do homem do seu estado original, e resultado também da ação diabólica. E a cura desta cegueira não é intelectual, mas espiritual. Só o Espírito Santo pode fazer resplandecer a luz do Evangelho da glória de Cristo num coração em trevas.

Outro texto que demonstra o caráter espiritual envolvido na interpretação das Escrituras é (2Coríntios 3.14-15). Neste texto o apóstolo Paulo explica que os judeus tinham como que um véu embotando os seus olhos espirituais, de modo que não podiam compreender o significado do que liam, por causa da incredulidade. Como este véu pode ser retirado? Pela conversão, responde o apóstolo no verso seguinte: ‘‘Quando, porém, algum deles se converte ao Senhor, o véu é retirado.’’

Mesmo o crente precisa da ação iluminadora contínua do Espírito Santo para progredir na compreensão das Escrituras. Seu coração não está embotado como o dos judeus descrentes; nem seu entendimento está obscurecido, como o dos gentios incrédulos. Mas ainda há muito a compreender; e a ação iluminadora do Espírito Santo permanece indispensável. Com esse propósito o apóstolo Paulo orava insistentemente pelos crentes, a fim de que Deus lhes iluminasse mais e mais, para compreenderem mais profundamente a natureza do evangelho e a suprema riqueza da sua graça. (Ef 1.16-19).

Como podemos facilmente concluir depois de todas estas informações, é realmente necessário

interpretar a Bíblia. Mas como pode o leitor se preparar para esta obra de interpretação? Ora, por haver sido escrita em línguas humanas, em contextos históricos, sociais, políticos e religiosos específicos, o conhecimento adequado da língua e do contexto histórico também é necessário para uma melhor interpretação e compreensão das Escrituras. Logo, devido as estes distanciamentos vistos anteriormente acima, para compreensão adequada das Escrituras faz-se necessários requisitos de natureza espiritual bem como requisitos de natureza intelectual. Ambos são necessários e imprescindíveis.

Orare e labutare foram palavras empregadas por Calvino para resumir a sua concepção hermenêutica. Com estes termos ele expressou a necessidade de súplica pela ação iluminadora do Espírito Santo e do estudo diligente do texto e do contexto histórico, como requisitos indispensáveis à interpretação das Escrituras. Com o mesmo propósito, Lutero empregou uma figura: um barco com dois remos, o remo da oração e o remo do estudo. Palavras e figuras como estas revelam a consciência que os reformadores tinham do caráter divino-humano das Escrituras e o equilíbrio fundamental que caracteriza a hermenêutica reformada da Palavra de Deus.

É nesse ambiente que nós afirmamos que interpretar é tentar transpor o distanciamento em suas várias formas de chegar ao sentido original do texto ― à intenção do autor ― com o objetivo de transmitir o significado para os dias de hoje. É aqui que reside a tarefa hermenêutica.

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DEFINIÇÃO DE HERMENÊUTICA

DEFINIÇÕES:

1. Hermenêutica é a ciência e a arte da interpretação. Hermeneu significa “interpretar” ou a “arte” e “técnica” da interpretação. A origem da palavra relaciona-se com a mitologia grega. Não foi por acaso que se deu o nome de Hermes ao membro Olimpo, mensageiro e arauto e interprete dos deuses e, entre outras coisas, protetor da linguagem, da escrita, das artes e das ciências;

2. Hermenêutica é a ciência que nos ensina os princípios, as leis e os métodos de interpretação;

3. Hermenêutica, é a disciplina que estuda e sistematiza os princípios e técnicas, com as quais, partindo de determinados pressupostos, se busca compreender o sentido original do texto bíblico;

OBJETIVO:

Neste sentido, o objetivo da hermenêutica é descobrir e sistematizar os princípios e métodos apropriados para a compreensão do sentido que o autor intentou transmitir aos seus leitores originais.

CORRENTES INTERPRETATIVAS

Como é natural, a hermenêutica como método de estudo possui várias correntes interpretativas. Em cada uma delas vemos um modo diferente de enxergar e de alcançar o significado dos textos bíblicos. Com certeza somente um deles é correto, visto que não podemos chegar à mesma conclusão de um texto por vias interpretativas diferentes, pois uma estará equivocada em algum ponto.

E além do mais, ainda que chegássemos a uma mesma interpretação de um texto por meios hermenêuticos diferentes, devemos lembrar-nos de que é nosso dever buscar o método correto de interpretação e não somente os seus resultados. Um método errado de interpretação em algum momento chegará em uma conclusão errada. Vejamos agora alguns dos métodos de interpretação conhecidas. Não veremos todas, mas somente algumas para nosso conhecimento, discernimento e reflexão sobre a importância de se seguir um método correto.

A HERMENÊUTICA ALEGÓRICA

Como vimos a pouco, as Escrituras possuem dois aspectos: o texto escrito em linguagem humana em contextos humanos; contudo, seu conteúdo é de origem divina (os escritores foram inspirados). Assim, há sempre o risco de se dar uma ênfase errada na interpretação do texto bíblico.

Por exemplo, muitos grupos na história da interpretação bíblica se caracterizaram por superenfatizar o caráter espiritual (místico) das Escrituras, em detrimento do seu caráter humano. Esta corrente distingue-se especialmente pela insatisfação generalizada com o sentido natural, literal das Escrituras. Dois dos textos mais explorados são (2Coríntios 3.6): ‘‘... a letra mata, mas o Espírito vivifica’’ e (1Coríntios 2.7): ‘‘...falamos a sabedoria de Deus em mistério’’. O maior perigo dessa corrente de interpretação é o subjetivismo e o misticismo. Nenhuma das duas passagens mencionadas prescreve a supremacia de sentidos "espirituais" e ocultos da Escritura sobre sentidos naturais e óbvios. (2Coríntios 3.6) faz um contraste entre os dois ministérios ou alianças exercidos por Moisés e por Cristo; (1Coríntios 2.7) trata do mistério de Deus, que é Cristo, mistério agora revelado. Nada há nestas passagens que exaltem sentidos ocultos da Escritura, disponíveis apenas aos "espirituais" ou avançados. Este método pode fornecer esplêndidas interpretações, mas rouba o real significado do texto, desviando a atenção do leitor do seu verdadeiro sentido, que o Espírito Santo intentou transmitir.

O caráter fantasioso deste método de interpretação fica manifesto na conhecida interpretação alegórica de Orígenes da parábola do bom samaritano (Lc 10.30-37). Segundo ele, o homem atacado pelos ladrões simbolizava Adão (a humanidade); Jerusalém, os céus; Jericó, o mundo; os ladrões, o diabo e suas hostes; o sacerdote, a lei; o levita, os profetas; o bom samaritano, Cristo: o animal sobre o qual foi colocado o homem

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ferido, o corpo de Cristo (que suporta o Adão caído); a estalagem, a igreja; as duas moedas, o Pai e o Filho; e a promessa do bom samaritano de voltar, a segunda vinda de Cristo.

Outro exemplo do caráter fantasioso desse método de interpretação pode ser percebido nas diferentes interpretações alegóricas atribuídas às duas moedas mencionadas nessa parábola: o Pai e o Filho, o Antigo e o Novo Testamento, os dois mandamentos do amor (a Deus e ao próximo), fé e obras, virtude e conhecimento, o corpo e o sangue de Cristo, etc.

A HERMENÊUTICA INTUITIVA

Os hermeneutas intuitivos caracterizam-se por identificar a mensagem do texto com os pensamentos que lhes vêm à mente ao lê-lo, sem contudo dar a devida atenção à gramática, ao contexto e às circunstâncias históricas, geográficas, culturais, religiosas, etc. Uma versão moderna do método de interpretação intuitiva pode ser verificada na prática de abrir as Escrituras ao acaso para pregar ou encontrar uma mensagem para uma ocasião específica, sem o devido estudo do texto e do seu contexto histórico.

A HERMENÊUTICA EXISTENCIALISTA

O importante não é a intenção do autor, nem o que o texto falou aos seus leitores originais, mas o que fala a nós, hoje, no nosso contexto: esse é o sentido do texto. Para a hermenêutica existencialista o importante mesmo não é o texto, mas o que está por trás dele. Não interessa tanto o que o texto diz (historicamente), mas o que ele quer dizer (existencialmente).

A HERMENÊUTICA REFORMADA

A corrente reformada de interpretação das Escrituras posiciona-se entre as duas correntes extremas já consideradas. Caracteriza-se pelo equilíbrio resultante do reconhecimento do caráter divino-humano das Escrituras. Ou seja, emprega princípios gerais e métodos linguísticos e históricos coerentes com o caráter divino-humano da Palavra de Deus. Em função disso, os intérpretes desta corrente reconhecem a necessidade da iluminação do Espírito falando através da própria Palavra, ao mesmo tempo em que admitem a necessidade de interpretação gramatical e histórica das Escrituras.

Um modo mais resumido de explicar as regras de interpretação das igrejas reformadas é dizer a designação deste método. Ele é chamado de método de interpretação histórico-gramatical. Ou seja, é o modo de interpretação que leva em consideração a história e a gramática.

A- Com o termo histórico, queremos dizer que o intérprete leva em consideração a cultura, contexto

histórico dos ouvintes e do escritor, geografia, situação política, situação religiosa...; B- Com o termo gramatical, queremos dizer que o intérprete leva em consideração o significado das

palavras, contexto das palavras, sintaxe, figuras de linguagem...

Por certo você já ouviu dizer: “cada um tem a sua própria interpretação da Bíblia”. Entretanto, a Reforma e a teologia reformada não concordam com esta linha de raciocínio. Só há um método de interpretação correto segundo o pensamento reformado, e este é o “histórico-gramatical”. Todos os demais métodos de interpretação são falhos e redundarão em doutrinas distorcidas.

O PAPEL DO ESPÍRITO SANTO

Tendo falado da necessidade e da importância da hermenêutica, deixe-me mencionar agora uma questão de grande importância: Qual é o papel do Espírito Santo na interpretação da Bíblia? A relação do Espírito Santo com a hermenêutica é uma questão polêmica entre os evangélicos hoje. A nível popular, sempre houve um grande mal-entendido sobre o papel do Espírito. Muitos cristãos acreditam que se eles simplesmente orarem, o Espírito Santo lhes dará a interpretação apropriada.

Para os protestantes históricos, que levam a Bíblia a sério, o Espírito Santo é a terceira pessoa da trindade, que foi dado pelo Pai à igreja para conduzi-la. O próprio Jesus disse que, quando o Espírito Santo vier, ele haverá de conduzir a toda a verdade, e haverá de nos guiar, e nos levar ao conhecimento dEle. E aqui eu faria

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uma pergunta para começar, tendo em vista a seguinte situação. Se numa sala eu colocasse dez ateus que não acreditam em Deus, mas que são absolutamente bem versados em grego, hebraico, aramaico, história, arqueologia, sociologia, antropologia, literatura clássica, grego clássico, latim, pais da igreja — eles dominam completamente a Ciência da Religião, mas são ateus — e desse a eles o texto de (1Coríntios 15), quando Paulo diz: “... o que farão os que se batizam pelos mortos... ”, para que eles interpretassem. E se, do mesmo modo, numa sala ao lado, eu colocasse dez irmãos, santos irmãos de Deus, homens de Deus, crentes, de oração, de jejum, mas que mal soubessem ler a Bíblia direito, e fizesse a mesma coisa dando a versão em português e fazendo a mesma pergunta sobre o texto de (1Coríntios 15), referente ao batismo pelos mortos. Quem vocês acham que é o grupo que terá melhor condição de dar a resposta correta?

Grande parte da interpretação e do trabalho da hermenêutica se resume à aplicação simples de regras e independe da espiritualidade da pessoa. É uma questão de aplicação de regras, é uma questão de gramática, é uma questão de sintaxe, é uma questão de comparação com outros textos, é uma questão de bom senso e, em grande parte, independe da espiritualidade. Todavia, ao dizer isso, nós não estamos negando o papel do Espírito Santo na compreensão das Escrituras. Na minha tradição (cristã reformada calvinista), quando nós falamos do papel do Espírito Santo na interpretação, nós entendemos que não é função do Espírito Santo transmitir ao intérprete conhecimento novo, mas fazer com que ele compreenda salvadoramente esse conteúdo. Será que jejum, oração e comunhão com Deus substituem o papel da gramática, do estudo do grego, da história, da arqueologia? Será que uma coisa substitui a outra? A julgar pela qualidade da pregação de alguns irmãos “espirituais”, eu diria que não. Afinal, boa parte da exegese e da interpretação é aplicação de regras, de normas, porque estamos lidando com um texto, e nós precisamos aplicar as regras dessa maneira. Todavia, como hermeneutas cristãos, o Espírito Santo não pode ser deixado de lado quando nós pensamos em nossa tarefa de interpretação do texto. A INTERPRETAÇÃO DAS ESCRITURAS

A esta altura é preciso esclarecer que não veremos todas as regras de interpretação que existem, porém, veremos algumas fundamentais. Aprenderemos de início algumas “regras gerais de interpretação”, as quais devem ser consideradas e utilizadas em qualquer texto bíblico. Ou seja, estas regras procuram abranger a interpretação de todos os tipos de textos da Bíblia – do Antigo ou do Novo Testamento. Em seguida nos deteremos em algumas “regras específicas de interpretação” as quais dizem respeito a como interpretar os diferentes tipos de texto encontrados na Bíblia (ex: texto poético, narrativa, doutrina...).

PRINCÍPIOS GERAIS DE INTERPRETAÇÃO O que se quer dizer com REGRAS GERAIS DE INTERPRETAÇÃO é que elas são regras aplicáveis a Bíblia por

inteiro. Elas se fazem presentes como sustentáculos das outras. São universais em sua natureza.

REGRA 1: Trabalhe partindo da pressuposição de que a Bíblia tem autoridade. A Bíblia é autoridade suprema em matéria de fé e prática e independe do testemunho de homens ou da igreja. A igreja não determina o que a Bíblia ensina, mas a Bíblia determina o que a igreja deve ensinar; REGRA 2: A Bíblia interpreta a própria Bíblia. Ou seja, a Bíblia é seu próprio intérprete. Ela é que possui a autoridade e condição de explicar o conteúdo e significado dela mesma. Quando você estudar a Bíblia, deixe-a falar por si mesma. Não lhe acrescente nem subtraia nada. Ela se auto-interpreta, elucidando, assim, suas passagens mais difíceis. Uma passagem obscura não pode ser autoritativamente determinado nem por tradição, nem por decisão eclesiástica, nem por argumento filosófico, nem por intuição espiritual, mas sim, unicamente, por outras partes das Escrituras que expliquem e esclareçam o seu sentido. Compare Escritura com Escritura; deixe a Escritura explicar a Escritura. O melhor comentário sobre a Bíblia é a própria Bíblia.

Compare os princípios encontrados com o restante das Escrituras. Se houver reafirmação da verdade, principalmente no Novo Testamento, devemos ensiná-la com convicção. Essa regra é chamada pelos intérpretes de "analogia das Escrituras", e, bem utilizada, evita uma série de erros grosseiros de interpretação. O intérprete

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realiza o seu trabalho convicto de que a Escritura não se contradiz. Algumas verdades são difíceis de conciliar, mas isso não significa que sejam excludentes. REGRA 3: A fé salvadora e o Espírito santo são-nos necessários para compreendermos e interpretarmos bem as Escrituras. Embora ser cristão não seja garantia de que você interpretará com precisão todas as passagens da Bíblia, é fundamental para entender adequadamente a verdade espiritual; REGRA 4: A Bíblia não deve ser interpretada a luz da experiência pessoal, mas a experiência pessoal deve ser interpretada a luz da Bíblia. Permita que a palavra de Deus interprete e amolde as suas experiências, em vez de você interpretar a Escritura a partir das suas experiências; REGRA 5: Os exemplos bíblicos só tem autoridade quando amparados por uma ordem. Os mandamentos da Bíblia tem autoridade para toda gente; não assim os exemplos bíblicos, a não ser que sejam amparados por uma ordem;

REGRA 6: Cada cristão é livre para estudar a Bíblia.

REGRA 7: Discernir bem o que é PRESCRITIVO e o que é DESCRITIVO nas Escrituras a fim de saber o que é obrigatório a nós e o que não é obrigatório, mas foi apenas referido. Se um texto não é prescritivo, mas apenas descritivo, então não podemos utilizá-lo com uma ordem, ou como uma norma; É preciso distinguir entre texto descritivo e texto prescritivo. Descritivo é o texto que descreve algo, narra um acontecimento. O fato de algo ser contado na Bíblia não significa que o mesmo é regra para hoje. Os relatos históricos, por exemplo, transmitem-nos preciosas lições espirituais. No entanto, não devemos tirar deles doutrinas absolutas para nós hoje. Só podemos tirar doutrina de história se houver concordância dos textos bíblicos doutrinários, principalmente nas epístolas do Novo Testamento. Prescritivo é o texto que traz regras, ensinamentos e mandamentos para nós hoje. Vemos nas Escrituras passagens destinadas claramente à instrução e doutrinamento;

REGRA 8: As doutrinas não devem ser baseadas em um ou mesmo em poucos versos que possuam sentidos obscuros; REGRA 9: Na interpretação devemos diferir entre o que é contradição e o que é paradoxo. Paradoxos existem nas Escrituras, contradições não;

REGRA 10: Aquilo que é implícito sempre deve ser interpretado à Luz do que é explícito; nunca deve ser o contrário. Isto é, se um texto específico parece ter uma ideia ou lição implícita, não devemos aceitar a implicação como correta se for contrária a algo que é declarado explicitamente em outro lugar da Bíblia;

Ao iniciar nosso processo de interpretação da Bíblia o ideal é que sejamos metódicos. Ou seja, devemos dar um passo de cada vez seguindo uma ordem lógica e interdependente. Abaixo colocamos quatro partes básicas no estudo correto da Bíblia:

1º OBSERVAÇÃO: Responde à pergunta: “que vejo?” Aqui o estudante da Bíblia aborda o texto como um detetive. Nenhum pormenor é sem importância; nenhuma pedra fica sem ser virada. Cada observação é cuidadosamente arrolada para consideração e comparações posteriores; 2º INTERPRETAÇÃO: Que responde à pergunta: “Que significa?” Aqui o intérprete bombardeia o texto com perguntas como: “Que significavam estes pormenores para as pessoas às quais foram dados?” “Por que o texto diz isto?” “Qual a principal ideia que ele está procurando comunicar?”; 3º CORRELAÇÃO: Que responde à pergunta: “Como isto se relaciona com o restante daquilo que a Bíblia diz”? O estudante da Bíblia deve fazer mais do que examinar somente passagens individuais. Deve coordenar o seu estudo com tudo mais que a Bíblia diz sobre o assunto. A precisa compreensão da Bíblia sobre qualquer assunto leva em conta tudo que a Bíblia diz sobre aquele assunto; 4º APLICAÇÃO: Que responde à pergunta: “Que significa para mim?” Esta é a meta dos outros três passos. Um especialista nessa área disse-o sucintamente: “Observação e interpretação sem aplicação é aborto”. Tradicionalmente, a hermenêutica reformada reconhece a necessidade de aplicarmos o texto bíblico às diversas

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situações em que nos encontramos, mas vê essas aplicações não como "sentidos" novos e múltiplos de um mesmo texto, mas como a significação do sentido único de um texto para as diversas situações da vida.

Quando falamos de interpretação, o Espírito Santo não concede nova revelação, e sim iluminação. Não há nova verdade a ser acrescentada sobre o texto bíblico. Há nova iluminação, ou seja, são-nos mostrados novos aspectos da verdade que são relevantes para a nossa situação atual. A verdade é apenas uma. As aplicações dessa verdade é que são diversas. Somos incumbidos de entender a verdade e, sob a unção do Espírito de Cristo aplicá-la. Não fomos chamados para descobrir novas coisas, mas para ensinar as velhas e maravilhosas verdades de forma nova, pois elas são sempre necessárias em nossa geração. SIGNIFICADO O autor pretendia comunicar suas informações. Valeu-se, então, de um código de linguagem para transmitir sua mensagem. O significado não pode ser alterado, pois o autor, levando em consideração suas possibilidades de interpretação, submeteu-se conscientemente às normas de linguagem com as quais o leitor está familiarizado. Da mesma maneira, os textos produzidos pelos autores das Sagradas Escrituras, movidos pelo Espírito Santo, têm implicações que abrangem o significado específico que eles, conscientemente, procuraram transmitir. Isso é razoável, uma vez que o leitor deverá compreender a linguagem utilizada.

IMPLICAÇÕES

As implicações ultrapassam os significados originais. O autor não estaria ciente de novas circunstâncias. Apesar disso, elas se enquadram legitimamente no padrão de significado pretendido pelo autor. Em (Gálatas 5.2) lemos: “Eu, Paulo, vos digo que, se vos deixardes circuncidar, Cristo de nada vos aproveitará...”. O significado específico está bem claro. Se os cristãos da Galácia cedessem às pressões dos judeus e se submetessem à circuncisão, estariam renunciando a fé, recusando a graça de Deus em Cristo e procurando, consequentemente, estabelecer uma relação diferente com Deus, baseada em suas próprias obras.

Para os gentios da Galácia, aceitar a circuncisão equivalia renegar a Cristo! Hoje essa interpretação é ponto pacífico no seio da Igreja. Contudo, as implicações desse versículo ainda são proveitosas. No século 16, Lutero tomou as indulgências e a penitência proclamadas pela Igreja Católica como uma tentativa de estabelecer uma relação com Deus dependente das próprias obras. Embora Paulo não estivesse ciente das circunstâncias ocorridas no século 16, Lutero estava certo das implicações implícitas no significado da epístola. No século 19 e 20, formaram-se grupos religiosos que proclamam a guarda do sábado como obrigatória para a salvação. As implicações do texto paulino são claras: não podemos misturar graça e fé com as obras da Lei. É estritamente pela fé que somos salvos - fé sem circuncisão, fé sem indulgências, fé sem penitências, fé sem guardar o sábado... PRINCÍPIOS GRAMATICAIS DE INTERPRETAÇÃO As REGRAS GRAMATICAIS DE INTERPRETAÇÃO são as que tratam diretamente do texto. A Bíblia foi escrita em linguagem humana e consequentemente deve ser interpretada gramaticalmente. Na interpretação gramatical o intérprete procede de duas maneiras: dedutivamente, começando do geral para o particular (parágrafo-sentença-palavra) ou indutivamente do particular para o geral (palavra isolada-sentença-parágrafo). A interpretação gramatical é importante porque a Bíblia foi inspirada verbalmente. Então, Deus quis comunicar sua mensagem através de palavras e sentenças dentro da estrutura da linguagem humana. Ele não quis oferecer para nós um labirinto esotérico de enigmas e mistérios, mas uma comunicação clara de sua verdade e vontade. Deus leva a sério cada palavra e sentença que ele inspirou nas Sagradas Escrituras. Além disso, como disse João Calvino: “A primeira preocupação do intérprete é permitir que o autor diga o que ele realmente disse, em vez de lhe impor o que acha que ele devia dizer”. É importante acrescentar que, sem uma interpretação gramatical, todo o processo de comunicação fica inviável. Para entendermos uma mensagem é preciso atentar para o significado das palavras. Senão, como compreender o quer nos foi dito?

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1. Qual é o significado das palavras? 2. Qual é a forma das palavras?(substantivo, Pronome, Adjetivo, Preposição, Verbo, Advérbio, Conjunção...) 3. Qual é a função das palavras? (Quando é a diferença entre “a casa fica na próxima rua” e “ele casa na semana que vem”?)

Nos enganamos se pensamos que a mera identificação das palavras no texto significa sua compreensão. É importante disciplinar a mente para perceber o que o autor está dizendo, qual é a sua tese, quais são os problemas que ele está resolvendo, qual é o falso ensino que ele está combatendo, qual é doutrina que ele está ensinando, qual é o evento que ele está narrando? Acompanhar o fluxo de ideias é fundamental para a compreensão do texto. Como podemos fazer isso?

1. Leia o texto diversas vezes. 2. Identifique o propósito do autor. 3. Encontre a ideia principal.

Vejamos uma série de perguntas e observações que devem ser feitas ao texto bíblico para a análise gramatical:

PANO DE FUNDO DA PASSAGEM

A. Qual o tema principal do livro? B. Quais os propósitos do autor? C. Qual o pano de fundo do autor? D. Qual o cenário histórico? E. Que tipo de literatura é essa? Parábola, poesia, apocalíptica, de ensino? F. Entendimento/Contexto dos Leitores - a quem o livro foi escrito? G. Uso de outros conceitos escriturísticos - Citações?

IDENTIFICAÇÃO DE TERMOS CHAVES

A. Liste as palavras “chave” na passagem; B. Os significados delas é claro? Como as traduções diferem nesse ponto? C. Consulte uma concordância para o significado das palavras nos idiomas originais; D. Examine o uso da palavra (no idioma original) pelo autor, e então em outros livros; E. Se for uma passagem do Novo Testamento, veja como os termos são usados no Antigo Testamento. Se do Antigo Testamento, veja como o conceito é levantado pelo Novo Testamento; F. Determina se a frase é um idioma da linguagem.

ESTUDO DO CONTEXTO

Ao estudarmos um texto devemos prestar atenção ao contexto a fim de entendê-lo melhor. Devemos estudar o contexto da seguinte forma: No mesmo versículo: Na Bíblia está escrito: “... não há Deus”. Todavia, o contexto esclarecedor, que pertence ao mesmo versículo, permite ver que tal afirmação não é da Bíblia, embora esteja na Bíblia. “Disse o néscio...”. Em outro versículo do mesmo capítulo: Na Bíblia também se diz: “... os que dormiram em Cristo estão perdidos”. Essa declaração sem seu contexto anuncia um verdadeiro desastre soteriológico; pois o texto estaria simplesmente afirmando a perdição dos que morreram em Cristo! Mas o contexto esclarecedor, que agora está em outro versículo, explica: “... se Cristo não ressuscitou...”. Em outro capítulo do mesmo livro: Diz a Bíblia: “... E conheceu Caim a sua mulher e ela concebeu e teve a Enoque”. Por causa deste texto, muitos leitores fazem a famosa pergunta: “Com quem se casou Cai”, se ele, após matar seu irmão, seria “filho único”? O contexto esclarecedor, agora mais remoto, diz que Adão “gerou filhos e filhas”. Portanto, Caim teve com quem se casar.

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Em outro livro do mesmo autor: Um assunto que não está muito claro em um livro, poderá estar melhor explicado em outro livro do mesmo autor. Quem quiser, por exemplo, entender a doutrina da ressurreição no pensamento de Paulo, não poderá ler somente as referências esparsas que o apóstolo faz a essa matéria na Carta aos Romanos, mas terá que ler também outras cartas por ele mesmo escritas, principalmente a Primeira carta aos Coríntios, em que um capítulo inteiro é dedicado a esta doutrina. Em outro autor: No caso da Bíblia, que é um conjunto de livros a formar uma unidade, o estudo de um mesmo assunto em autores diferentes ainda faz parte de uma contextualização intra-bíblica.

CONTEXTO IMEDIATO

A. Leia a passagem em pelo menos 3 traduções diferentes. B. O que precede e se segue imediatamente à passagem? C. Há algumas definições fornecidas pelo contexto imediato? D. Qual é o argumento principal do capítulo inteiro? E. Qual é o ponto principal da própria passagem? F. Qual é o entendimento consistente da passagem no contexto?

CONTEXTO AMPLO

A. O intérprete deve perguntar a si mesmo: A minha interpretação dessa passagem contradiz...

1. O próprio autor? 2. Outras passagens bíblicas? 3. O bom senso?

B. Quais outras passagens na Escritura lançam luz sobre os assuntos levantados nessa passagem?

REGRA 1: A Escritura tem somente um sentido, e deve ser tomada literalmente. Os textos da Escritura não possuem vários sentidos, mas somente um sentido. Nenhuma afirmação deve ser considerada como tendo mais de um sentido. O sentido do texto deve ser sempre aquilo que o autor quis dizer. Como pensava o reformador João Calvino: A primeira função de um intérprete é deixar o autor dizer o que ele diz, ao invés de atribuir a ele o que pensamos que ele deveria dizer.

A interpretação literal, no contexto, é a única interpretação verdadeira. Se você não tomar literalmente a passagem, todos os tipos de interpretação fantasiosa podem resultar disso. Quando você encontrar uma passagem para a qual o contexto indica uma interpretação literal, e você preferir dar-lhe outra interpretação, não literal, avalie cuidadosamente os seus motivos. Com toda a sinceridade que lhe for possível, responda as seguintes perguntas: 1. Estarei pondo m dúvida que esta passagem é literal porque não quero obedecer-lhe? 2. Estarei interpretando esta passagem figuradamente porque ela não se enquadra na minha tendência teológica preconcebida?

O texto deve ser lido em seu sentido literal, a não ser que demonstre suficiente evidência, em si mesmo, de que deva ser interpretado de modo figurado ou simbólico. Interpretação literal, estritamente falando, significa que devemos interpretar a Bíblica assim como está escrito. Um substantivo é interpretado como substantivo e um verbo, como um verbo. Quer dizer que todas as formas usadas na redação da Bíblia devem ser interpretadas de acordo com as regras normais que regem tais formas. Distinga o sentido figurado do sentido literal. Linguagem figurada não quer dizer linguagem sem sentido ou ininteligível. Poesia deve ser tratada como poesia. Relatos históricos devem ser tratados com História. Parábolas como parábolas, hipérboles como hipérboles, e assim por diante. As principais figuras são: metáfora, metonímia, sinédoque, hipérbole, ironia, alegoria, símbolo, tipo, símile, eufemismo, prosopopéia e antropomorfismo. REGRA 2: Interprete as palavras no sentido que tinham no tempo do autor. (observar a etimologia e o uso corrente na época). REGRA 3: Interprete a palavra em relação à sua sentença e ao seu contexto.

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REGRA 4: Interprete a passagem em harmonia com o seu contexto. REGRA 5: Quando um objeto inanimado é usado para descrever um ser vivo, a proposição pode ser considerada figurada. (Jo 6:35; 8:12; 10;7; Sl 92:12; 51:7; Mt 26:26-28) REGRA 6: Deve o intérprete estar atento ao uso de símbolos, tipos, alegorias, e figuras nas Escrituras. Ao se deparar com eles, o intérprete deve considerar a explicação que a própria Escritura faz deles, e não, conceder sua própria explicação ou interpretação particular. PRINCÍPIOS HISTÓRICOS DE INTERPRETAÇÃO

Um dos grandes desafios da interpretação é cultural. A Bíblia foi escrita para pessoas de outro tempo. Isso pode parecer estranho, mas vou já explicar. Quando, por exemplo, o apóstolo Paulo sentou-se para escrever a sua carta aos efésios, ele não estava pensando nos cristãos brasileiros. Sua atenção estava voltada para pessoas do século I, que viviam dentro da cultura greco-romana-judaica. O mesmo podemos dizer do autor do Apocalipse. Quando João escreveu sua obra, utilizou uma linguagem simbólica que era comum principalmente aos cristãos judeus de seu tempo. Em sua época, eram comuns os escritos apocalípticos, que buscavam transmitir mensagens de reforço na fé em linguagem cheia de imagens e significados ocultos.

Hoje, quando lemos a Epístola aos Efésios ou o Apocalipse, ficamos às vezes desnorteados com algumas expressões e, pior ainda, podemos compreendê-las mal. Daí podemos inferir que a primeira tarefa do intérprete bíblico é entender o que as Escrituras significaram para os seus primeiros destinatários. A partir desse ponto, é que podemos estabelecer qual a aplicação da mesma para hoje. Assim, podemos dizer que seguir as REGRAS HISTÓRICAS DE INTERPRETAÇÃO é estudar o texto à luz das circunstâncias históricas do mesmo. Existe uma grande distância histórica e cultural entre os tempos bíblicos e o nosso tempo. Respeitar o contexto histórico e cultural é uma necessidade para a correta interpretação da Bíblia.

Qual a situação política, econômica e cultura do autor e seus leitores? Qual o objetivo do autor ao escrever o texto? Estas e outras perguntas deverão ser feitas ao texto a fim de compreendê-lo historicamente. O objetivo do intérprete é colocar-se no cenário do tempo em que o livro foi escrito e sentir com as pessoas envolvidas. Quais eram os interesses delas? Como via sua situação? E assim compreender melhor o sentido do que está escrito. REGRA 1: Desde que a Escritura originou-se num contexto histórico, só pode ser compreendida à luz da história bíblica.

1. Quem escreveu? 2. A quem foi escrita o texto? 3. Qual foi o quadro de fundo do escritor? Qual o tempo e o lugar em que escreveu? 4. Qual foi a experiência ou ocasião que deu origem à mensagem? 5. Quem são os principais personagens do livro? 6. Por que escreveu? 7. O que o autor queria dizer? Qual seu propósito?

REGRA 2: Os fatos ou acontecimentos históricos se tornam símbolos de verdades espirituais, somente se as Escrituras assim os designarem (1Co 10:1-4; Gl 4:22-24). REGRA 3: Um texto não pode significar o que nunca significou quando foi falado e escrito pela primeira vez. REGRA 4: O que a Bíblia descreve como acontecido a outros não precisa necessariamente acontecer conosco. REGRA 5: A Bíblia contém promessas que já se tornaram realidade na história.

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PRINCÍPIOS TEOLÓGICOS DE INTERPRETAÇÃO

As REGRAS TEOLÓGICAS DE INTERPRETAÇÃO são as regras que tratam da formulação doutrinária. Veja as

seguintes:

REGRA 1: A interpretação gramatical é a base para a teológica. Você precisa compreender gramaticalmente a Bíblia, antes de compreendê-la teologicamente. Você terá de compreender o que uma passagem diz, antes de extrair dela quaisquer conclusões doutrinárias. REGRA 2: Uma doutrina não pode ser considerada bíblica, a não ser que resuma e inclua tudo o que a Escritura diz sobre ela. Uma doutrina é verdadeiramente Bíblica quando inclui todo o ensino sobre o assunto. Nunca devemos ler passagens isoladas de todo o contexto das Escrituras. Apesar de muitos autores humanos terem contribuído para escrever a Bíblia, Deus é o seu Autor último. Este princípio tem implicações muito importantes. Primeiro, não devemos basear a doutrina ou ensinos morais num texto obscuro. As ideias mais importantes da Bíblia são declaradas mais de uma vez. Quando um texto aparece com o objetivo de ensinar algo obscuro ou questionável e não encontramos outras passagens que o apoiem, não devemos agregar muito peso a ele. Segundo, se uma passagem "parece" ensinar algo, porém outro texto claramente ensina alguma outra coisa mais, devemos procurar compreender essa passagem difícil à luz daquela que seja mais fácil de compreender. Isto é, podemos determinar o significado de um verso obscuro examinando o ensino claro de toda a Escritura. REGRA 3: Quando parecer que duas doutrinas ensinadas na Bíblia são contraditórias, aceite ambas como escriturísticas, crendo confiantemente que elas se explicarão dentro de uma unidade mais elevada (Trindade; dupla natureza de Cristo; a origem do mal; Soberania e Deus e responsabilidade humana). As doutrinas das Escrituras não podem contradizer-se. Sendo assim, se alguém interpreta um texto de forma a confrontar outra doutrina, o intérprete deve então procurar saber onde errou em sua interpretação; REGRA 4: O conteúdo da revelação bíblica veio de forma progressiva, portanto, devemos respeitar o contexto revelacional de cada texto.