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A política econômica modernizadora do PRR e a muda nça na forma de dominação
Luiz Roberto Pecoits Targa (FEE, Brasil) * Maria Lúcia Leitão de Carvalho** (Secretaria de Estado da Coord. e Planejamento, Brasil)
Paulo Roberto Dias Pereira*** (Secretaria de Estado da Coord.e Planejamento, Brasil) 1. INTRODUÇÃO
Este texto tem como propósito fundamental o de examinar os fenômenos de ordem política
ocorridos no Rio Grande do Sul e em São Paulo na transição do sistema escravagista para o sistema capitalista
(1888/89-1930).
Para fazer isso, dar-se-á um tratamento privilegiado à questão da política econômica –
especialmente, da política fiscal – nas duas regiões, uma vez que se considera ser esta fundamental para
esclarecer, principalmente durante a transição considerada, a natureza da relação Estado-sociedade que vigeu em
cada sociedade regional. O que se quer mostrar é que houve uma diferença radical nas condutas políticas das
elites dessas duas sociedades. E que, em conseqüência, as políticas fiscais foram visceralmente diversas. Isso
quer dizer que tanto a ação arrecadatória do Estado quanto os gastos realizados exerceram-se sobre/ou
beneficiaram classes com posições diversas no espectro social de cada região. Isso vai mostrar, também, que as
fontes de legitimação do poder em cada região, bem como a própria natureza deste, tornaram-se radicalmente
diversas nas duas sociedades.
Assim, enquanto em São Paulo permaneceu e, mesmo, aprofundou-se uma conduta
patrimonialista e oligárquica na orientação da política econômica, no Rio Grande do Sul, houve um
rompimento radical com este tipo de comportamento. Pois neste último caso, a classe que praticava
aquela forma de dominação (e a respectiva forma de legitimação) – representada no Partido
Republicano Rio-Grandense (PRR), que assumiu o governo estadual no início da República1– fora
derrotada na guerra civil, em 18932, e desse modo, a elite que tomou o poder foi forçada a
desenvolver uma forma nova de ação no contexto político do Brasil. Foi assim que o PRR
estabeleceu uma forma de dominação racional-burocrática e com ela, a correspondente forma de
legitimação. Assim, a elite que tomou o poder no Sul promoveu uma alteração radical na relação do
Estado com a sociedade meridional, e com isso, modernizou a forma de dominação. Ou seja, esta
* Economista e Historiador, Técnico da Fundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser do Estado do Rio Grande do Sul. ** Economista, Técnica em Planejamento do Departamento de Planejamento Estratégico da Secretaria da Coordenação e Planejamento do Estado do Rio Grande do Sul. *** Historiador, Técnico em Planejamento do Departamento Planejamento Estratégico da Secretaria da Coordenação e Planejamento do Estado do Rio Grande do Sul. 1 Sobre as características e peculiaridades do PRR ver, entre outros autores: Pinto (1986, p. 13;21); Targa (1996, p. 42-46); Carvalho (1996, p. 184-188); Pereira (1996, p. 215-216). 2 A Revolução de 1893 constituiu-se na guerra civil mais violenta ocorrida na história brasileira; nela se lutou a favor e contra uma concepção e uma prática, defrontando-se, de um lado, os republicanos positivistas que, então, controlavam ainda precariamente o aparelho de Estado no Rio Grande do Sul e, por outro, os maragatos, onde se agrupavam tanto os dissidentes republicanos quanto, e mesmo principalmente, os membros liberais e os conservadores dos antigos partidos monárquicos. Os republicanos positivistas instalados no Governo do Estado procuravam impor às elites pecuárias gaúchas uma Constituição positivista, que haviam feito referendar por uma Assembléia Constituinte eleita fraudulentamente (TARGA, 1996, p. 81).
alteração da forma de dominação introduziu uma dimensão de modernidade no campo político
regional.
Com base no anterior, mostrar-se-á, através do exame das políticas econômicas do Rio
Grande do Sul e de São Paulo, que no primeiro realizou-se uma mudança na forma de dominação e
que no outro permaneceu-se na mesma. Para compreender-se isso deve-se partir da estrutura
tributária imperial encontrada pelas elites dirigentes regionais no início da República, verificar como
essas elites se comportaram frente a tal estrutura, que reformas tributárias realizaram e suas razões
para isso. Enfim, se as reformas atingiram ou não os seus objetivos.
O mais importante, no entanto, será depreender, das ações (de arrecadar e de gastar)
dessas elites, a natureza da sua relação com as respectivas sociedades, os tipos de projetos políticos
a que se propuseram e as suas efetivas capacidades em implementá-los. Como fundamento para o
exame dessas questões pode-se avançar que os projetos políticos podem servir a dois propósitos
antagônicos: o de manter a sociedade e a economia tal como são ou o de alterá-las. Ou seja, a
política econômica pode alimentar tão-somente a reprodução da classe que está no poder, como
ocorreu no caso paulista, ou pode privilegiar a reprodução ampliada de outras classes sociais, tal
como se deu no Rio Grande do Sul.
Para mostrar isso, dar-se-á, em primeiro lugar, uma visão geral da posição dos dois Estados no
federalismo fiscal da Primeira República. Verificar-se-á aí, que somente eles detiveram uma posição excepcional
no panorama geral do Brasil, pois, eles foram os Estados da Federação que mais sofreram a drenagem de
recursos por parte da União –entendendo-se por isso o fato de que somente aí a União retirou muito mais (em
tributos) do que gastou. E se a pujante atividade agroexportadora pode explicar o fenômeno em São Paulo, ele
permanece uma incógnita intrigante no caso do Rio Grande do Sul. Logo depois, ver-se-á como esta drenagem
foi possível no caso do Rio Grande do Sul. Aparecerão aqui as condutas modernizadoras do PRR na gestão
pública e na sua relação com a sociedade sul-rio-grandense através da reforma tributária empreendida, dos gastos
realizados e das políticas de isenção tributária adotadas. Todos estes fenômenos permitem que se identifique a
alteração na forma de dominação.
2. RIO GRANDE DO SUL E SÃO PAULO NO FEDERALISMO FISCAL BRASILEIRO DA
PRIMEIRA REPÚBLICA (1889-1930)
Estabelecida a República, a Assembléia Constituinte foi a arena de definição do tipo de
federalismo fiscal que seria consagrado na Constituição. Debateram-se, entre outros temas, as questões
vinculadas à descentralização do poder e à autonomia dos Estados e, conseqüentemente, a capacidade de coletar
tributos e de decidir quanto à alocação de recursos a ser atribuída às esferas da administração pública (a federal e
a estadual).
A Constituição Federal de 1891 delimitou o alcance dessas questões. Ao atribuir maiores
poderes e um significativo grau de autonomia aos Estados-membros da Federação, conseqüentemente transferiu-
lhes também a responsabilidade sobre algumas funções antes sob o encargo do poder central. Essa autonomia,
no entanto, conhecia certos limites, na medida em que o Governo Federal concentrava em suas mãos
determinados instrumentos de política econômica com larga influência sobre o comportamento da economia
agroexportadora dominante, e cujo manejo estava fora da jurisdição estadual.
Coube à União, nesse sentido, dispor sobre as políticas cambial e monetária, políticas
estas que interessavam sobremaneira aos agentes econômicos exportadores, uma vez que uma
economia com inflação e desvalorização cambial aumentava os seus rendimentos em relação aos de
quaisquer outros agentes internos não exportadores. Para os Estados restou um campo muito
estreito de atuação em política econômica, pois este ficou restrito à política tributária.
Com relação à política tributária, a competição por fontes de receitas foi um traço
constante que marcou as relações fiscais entre os governos, no período da Primeira República. O
considerável grau de descentralização favorecido pela Constituição permitiu que uma parcela
significativa das rendas anteriormente administradas pelo poder central passasse para as alçadas
estadual e local. O ponto principal de conflito quanto a esse aspecto centrava-se nas acusações dos
Estados com respeito à invasão federal nos seus direitos de tributação, ao mesmo tempo em que
acusações contrárias (da União em relação aos Estados) também eram comuns – o que se devia,
especialmente, ao fato de não haver uma clara atribuição de competência de arrecadação de alguns
impostos. Os Estados, premidos pelos novos encargos administrativos que lhes couberam, sentiam a
necessidade crescente de avançar sobre as receitas federais. Segundo assinala Pena (1991, p. 42-
43), dentro desse contexto, o poder central “via escorregar de seus cofres recursos que considerava
imprescindíveis ao seu sustento, e era obrigado a conviver com Estados que deles se apropriavam
mas que, ao mesmo tempo, pensavam ser esta apropriação insuficiente”.
No que tange à estrutura da Receita, as principais fontes de arrecadação com que
contou a União constituíram-se, basicamente, em impostos sobre as importações, sobre o consumo,
sobre a circulação, sobre a renda (a partir da década de 20), e em receitas provenientes da
indústria, bem como a taxa federal do selo. Coube aos governos estaduais a faculdade de decretar
impostos sobre as exportações, sobre bens imóveis, sobre a transmissão de propriedade, sobre
indústrias e profissões, sobre taxas de selo, quando emanadas dos respectivos governos. Era
vedada aos Estados a tributação de bens e rendas federais, ou de serviços sob o encargo da União.3
Do ponto de vista fiscal os representantes dos Estados exportadores e os defensores de
uma União forte sustentaram, na Assembléia Nacional Constituinte, a formação de um federalismo
relativamente indefinido, onde tanto havia ambigüidades na definição da matéria tratada quanto não
ficavam rigidamente esclarecidas as distribuições de tributos e despesas entre a União e os Estados,
conforme já se ressaltou. É importante exemplo do primeiro caso o imposto dito de “Exportação” que
3 Num breve resume extraído de Costa (1994, p.67) com relação à partilha de recursos que passou a vigorar com a República, pode-se destacar o seguinte: a Constituição de 1891 inovava em relação ao sistema adotado no período imperial, principalmente pelo fato de prever a discriminação das fontes básicas de taxação da União e dos Estados; mantinha, porém, uma área de competência cumulativa a ser explorada por ambos. O sistema implantado, conforme a autora, “(...) pressionado pelos condicionantes estruturais da base agrário-exportadora, não era capaz de equacionar satisfatoriamente as finanças da União nem de promover uma federação equilibrada. Seriam melhor aquinhoados aqueles Estados que possuíssem bens exportáveis competitivos no mercado internacional, capazes, portanto, de se valerem do imposto de exportação. Tais Estados – São Paulo em particular, mas não exclusivamente – poderiam avançar na construção da esfera pública em suas regiões (forças públicas, sistemas educacionais e de saúde) e defender sua autonomia frente à União”. E cita o caso do Rio Grande do Sul que, mesmo não sendo um Estado eminentemente exportador, explorou “de forma peculiar” a sua estrutura fiscal (através do Imposto Territorial). As áreas estagnadas e decadentes, particularmente os Estados do Nordeste, “se debateriam entre a dependência da União e o recurso à ilegalidade” (o caso, por exemplo, da cobrança de impostos interestaduais e da taxação das exportações sob múltiplos disfarces).
tanto podia ser cobrado sobre as mercadorias que se destinassem efetivamente ao mercado
internacional quanto àquelas que eram escoadas para os demais mercados regionais do País. Um
exemplo concreto do segundo caso é que se era aos Estados que cabia tributar as Indústrias e
Profissões, a União, buscando ampliar suas fontes de receita, criou taxas federais sobre as mesmas
Indústrias e Profissões (Lei Federal n. 29.009, de 31-12-1914), ocasionando a eliminação de um
grande número de contribuintes que não tinham condições de suportá-las, especialmente a partir de
1923 (CARVALHO; PEREIRA, 2000). Ou seja, a ambigüidade e a ausência de discriminação rígida
de competências tanto permitiu que vigorasse um sistema impositivo que sobrepôs tributação e
taxação, quanto conviveu diretamente com a bi-tributação e com a sobretaxação.
A ambigüidade permitiu também longas querelas, que se estenderam por toda a Primeira
República, em torno de impostos sobre o trânsito interestadual de produtos – os chamados impostos
interestaduais – cuja cobrança, embora vedada pela Constituição, estendeu-se além dos limites da
Primeira República, só sendo definitivamente suprimida com a Constituição de 1934 (MAHAR, 1977,
p. 246-247). Estes impostos sobre “importações internas”, que estiveram incorporados às relações
entre as unidades da Federação durante todo o período, tanto tiveram por origem as necessidades
fiscais dos Estados com parcos recursos de arrecadação quanto serviram à prática de políticas
protecionistas. Ou seja, a ambigüidade criou a possibilidade da guerra fiscal entre os Estados. Essa
guerra resultou na criação de barreiras alfandegárias internas ao longo do País4, entravando a
circulação das mercadorias e com isso constituindo-se em um dos mais importantes elementos
procrastinadores da integração do mercado interno nacional.
Desse modo, se aos Estados exportadores5 (com posições monopolísticas no mercado
internacional) coube a parte do leão das receitas do País – aquelas provenientes do Imposto de
Exportação – , à União couberam as receitas do Imposto de Importação. E esta fonte de receitas da
União permaneceu a mais importante até o final do período, malgrado essa tivesse criado, ao longo
da Primeira República, vários outros impostos e taxas com a finalidade de fornecer-se fundos
invadindo, inúmeras vezes, a esfera de competência dos Estados. Essas disputas de recursos entre a
União e os Estados tinham sua explicação na simplicidade da economia agrário-exportadora, onde
praticamente inexistia um mercado interno. Desse modo, a melhor fonte das receitas estatais era o
comércio exterior, pois os impostos indiretos básicos de Importação e de Exportação eram, ambos,
de fácil controle e recolhimento, uma vez que os procedimentos administrativos da arrecadação
concentravam-se nos próprios portos.
Contra aquela posição dos Estados exportadores na Assembléia Nacional Constituinte, e
que terminaria por ser vitoriosa na Constituição Federal6, mobilizaram-se os Estados que eram
“exportadores internos”, ou seja, os que vendiam sua produção não no mercado internacional mas
nos das outras regiões do País. Entre estes encontravam-se os Estados produtores de açúcar do
Nordeste e o Rio Grande do Sul (CARVALHO; PEREIRA, 2000). A tentativa destes em alterar o texto
4 Assim, por exemplo, quando os produtos rio-grandenses eram tributados por um Estado, o Governo do Estado do Rio Grande do Sul, em represália, tributava a entrada das mercadorias dele provenientes . 5 Os Estados exportadores e os respectivos produtos eram: São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro (café); Amazonas e Pará (borracha); Bahia (cacau).
constitucional, principalmente através das propostas de Júlio de Castilhos7, no sentido de estabelecer
uma clara discriminação das competências fiscais da União e dos Estados, acabou sendo derrotada
na Assembléia Constituinte.
Se o Imposto de Exportação ficou sendo a mais importante fonte de receitas dos
Estados exportadores, ele tornava-se um enorme problema para os Estados ditos “exportadores
internos”. Grosso modo, no primeiro caso, o imposto era transferível ao consumidor final no mercado
internacional (resultante, sobretudo, da posição de monopólio), mas quando o escoadouro eram os
mercados de outros Estados, seu efeito era o de elevar os preços e reduzir a demanda. Na própria
voz da época, este era um imposto “anti-econômico”, pois que tanto onerava o produtor quanto
produzia receitas muito instáveis, porque dependiam das condições de mercado (CARVALHO, 1996,
p. 194-195). Na prática, ao elevar o preço do produto e reduzir a demanda, o imposto também
forçava a contração da base tributável (tratavam-se de bens-salário). Isso era realmente um mau
negócio para os Estados “exportadores internos”.
Essa forma tomada pela Federação consubstanciou-se em um quadro extremamente
variado das finanças públicas dos diversos Estados. Pode-se formar uma idéia da desigualdade nas
suas capacidades arrecadadoras (e, conseqüentemente, nas suas capacidades de gastar) bem como
das suas respectivas capacidades desiguais para criar um setor público estadual através dos
coeficientes da Tabela 1, do Apêndice Estatístico – que indicam a participação de cada Estado no
total das Receitas e das Despesas totais realizadas pelo conjunto dos Estados8. Os coeficientes
são expressivos (isto é, acima de 100/1.000, durante o período examinado) somente nos casos de
dois dos Estados que estavam exportando café para o mercado internacional – São Paulo e Minas
Gerais.9 E é neste contexto que ganham relevância os resultados atingidos pelo Rio Grande do Sul,
inicialmente baixos mas que, à partir de 1917, elevaram-se acima de 10 % da arrecadação total dos
Estados. O que chama a atenção é que este foi o único Estado não exportador e “exportador interno”
6 Faz-se referência, aqui, à indefinição na discriminação das competências de arrecadação de alguns tributos entre os níveis federal e estadual. 7 As propostas dos representantes do Rio Grande do Sul, liderados por Júlio de Castilhos, traduziam demandas por um grau de autonomia para os Estados da Federação muito maior do que aquele que ficou consagrado na Constituição e na prática política da Primeira República. E essa autonomia era diretamente afetada pelo relacionamento do Governo estadual com a União. Este posicionamento é expresso na forma contundente pela qual eles discutiram a partilha de recursos entre as esferas de governo, defendendo, entre outras coisas, uma demarcação rigorosa entre os impostos federais e os estaduais, para evitar a dupla taxação. Essa, e outras propostas encaminhadas não foram, em sua grande parte, acatadas na elaboração final da Constituição, influenciada significativamente pela Bancada paulista, e bastante voltada para os interesses defendidos pelo Estado de São Paulo em termos de sua concepção geral. 8 O IBGE analisou as finanças públicas estaduais a partir da construção de coeficientes que indicam a participação de cada Estado nas Receitas e nas Despesas Totais realizadas pelo conjunto dos Estados do Brasil. A partir disso, criou médias decenais para quatro subperíodos: 1897 a 1906, 1907 a 1916, 1917 a 1926 e 1927 a 1936 (IBGE, 1939/1940). Estão excluídas desses agregados todas as receitas e despesas federais e municipais em cada Estado. 9 Este fato é, seguramente, expressão do peso das receitas do Imposto de Exportação nas Receitas Totais dos Estados exportadores, pois, para o primeiro intervalo (1897-1906), ainda comparecem com este nível os exportadores de borracha (Pará e Amazonas), cujo ciclo de produto encerrava-se então. É o mesmo caso do Estado da Bahia, cujas receitas provenientes das exportações de cacau seriam as responsáveis pelo nível do seu coeficiente em todos os períodos. Neste último caso, porém, o nível atingido é bastante inferior ao dos exportadores de café, embora ainda se destaque face aos resultados dos demais Estados.
que conseguiu tal desempenho, fato que é expressão de um aumento progressivo da capacidade de
arrecadação do Executivo gaúcho no período 1897-1930. Isso pode ser corroborado através do
exame da distribuição da Receita Pública Nacional entre os entes federativos (Tabela 2, do Apêndice
Estatístico). Durante o período mencionado, o Estado do Rio Grande do Sul expandiu a sua
capacidade arrecadadora em 732%, enquanto o de São Paulo o fez em 310%, e a União, em
somente 175%. Muito diverso foi o desempenho do conjunto dos demais Estados (todos, exclusive
Rio Grande do Sul e São Paulo), cujos governos não conseguiram expandir suas capacidades senão
em 96%. Esta expansão das capacidades arrecadadoras no Rio Grande do Sul e em São Paulo
refletiu-se em um aumento das participações relativas desses dois Estados no total da Receita
Pública Nacional (definida como o total das receitas estaduais e das federais)10 em prejuízo do
agregado formado por todos os demais Estados da Federação (Tabela 3, do Apêndice). Assim, o Rio
Grande do Sul teve a sua participação aumentada de 2,02%, em 1897, para 5,98%, em 1930, e São
Paulo, de 10,17% para 14,85%, no mesmo período. A União, por sua vez, teve a sua participação
praticamente estabilizada em cerca de 62%, nesse intervalo de tempo, embora entre 1902 e 1913
esta tenha ultrapassado os 70%. Em decorrência disso, pode-se afirmar que o conjunto dos demais
Estados perdeu participação na Receita Nacional – de 24,25%, em 1897, para 16,89%, em 1930.
Desse modo, enquanto em 1897, as receitas somadas de São Paulo e do Rio Grande do Sul
correspondiam a cerca de 50% das receitas dos demais Estados, em 1930 as receitas destes dois
Estados superavam em 23% as dos demais. Por outro lado, contrapondo-se o total dos Estados
(incluindo-se aí Rio Grande do Sul e São Paulo) com a União constata-se, no período analisado, uma
situação de relativo equilíbrio ou de certa estabilidade do ponto de vista da apropriação da Receita
Pública pelas esferas federal e estadual, conforme se depreende dos seguintes dados: em 1897, as
participações dos Estados e da União na Receita Pública Nacional eram de 36,44% e 63,56%,
respectivamente, alterando-se para 37,72% e 62,28%, em 1930. Ou seja, pode-se concluir que a
descentralização fiscal ocorrida a partir de 1891 se deu em benefício de pouquíssimos Estados,
notadamente do Rio Grande do Sul e de São Paulo, aprofundando significativamente disparidades
fiscais regionais que já existiam (CARVALHO; PEREIRA, 2000).
Para resolver o problema dos Estados que não possuíam receitas suficientes para cobrir
seus gastos, a União realizou transferências internas através de dois tipos de procedimentos. Por um
lado, arrecadava mais do que gastava nos Estados com boa capacidade de arrecadação e, por outro
lado, gastava mais do que arrecadava naqueles que viviam em dificuldade crônica. Neste quadro de
procedimentos, somente em São Paulo e no Rio Grande do Sul a União arrecadava mais do que
gastava. Estes dois Estados foram os únicos transferidores líquidos de recursos para a União durante
a Primeira República. E em São Paulo, a disparidade entre o montante arrecadado e o efetivamente
gasto foi muito maior (CARVALHO; PEREIRA, 2000).
Os dados disponíveis permitem destacar algumas evidências neste sentido. A primeira, a
de que no Rio Grande do Sul, no período de 1901 a 1913, a receita arrecadada pela União situou-se,
em geral, entre 50 % e 60 da Receita Pública Total (União, Estados e Municípios); a arrecadação
10 Estão excluídos da análise os dados relativos às Receitas dos Municípios, em razão da incompatibilidade das séries históricas disponíveis, em termos dos períodos abrangidos. Em função disso, o conceito de Receita Pública Nacional
estadual situou-se, por sua vez, entre 25% e 30% da mesma Receita Total e as receitas municipais
ficaram em torno de 20% daquele total. Ou seja, entre as três esferas de poder, foi a União que ficou
com a maior parte da arrecadação pública no Rio Grande do Sul (Gráfico 1, do Apêndice Estatístico).
A segunda evidência consiste em que, em São Paulo, no período de 1889 a 1914, as
despesas da União situaram-se, aproximadamente, entre 5.000 contos de réis e 25.000, enquanto
que as suas receitas estiveram, aproximadamente, entre 20.000 contos de réis e 150.000 contos de
réis (Gráfico 2, do Apêndice).
Finalmente a terceira mostra que, nos anos para os quais foi possível dispor de dados
comparáveis, ou seja, em 1909, 1914, 1921, 1922, 1924 e 1925, sempre as arrecadações da União
foram muito superiores aos seus gastos, nos dois Estados. Assim, no primeiro ano mencionado, a
União arrecadou 67.952 contos de réis em São Paulo, contra um gasto de 12.620 contos de réis; no
Rio Grande do Sul, a arrecadação federal foi de 26.462 contos de réis e os gastos, da ordem de
11.584 contos de réis (Tabela 4 ).
Em suma, do ponto de vista geral do federalismo fiscal brasileiro, se não causam
espanto as transferências líquidas de São Paulo para a União, elas consistem em uma curiosidade
impressionante no caso do Rio Grande do Sul, pois uma economia regional não exportadora e que
vinha a debater-se em uma crise que se alongava por mais de uma década revelava-se também
capaz de realizar essas transferências. A explicação, certamente, deve ser buscada na eficiência do
Governo dos positivistas, qual seja, na sua conduta modernizadora quanto à condução dos negócios
públicos, pois, uma economia com as características da rio-grandense, e em crise, não teria sido
capaz de permitir esses níveis de arrecadação se fosse dirigida, como alhures o eram todas as
regiões do País, por uma elite de conduta oligárquica e patrimonialista.
Isso poderá ser melhor demonstrado na seção que se segue.
aqui utilizado corresponde ao somatório da Receita Total (inclusive a financeira) dos Estados e da União.
3. A POLÍTICA ECONÔMICA MODERNIZADORA DO PRR
Tem-se aqui como objetivo fornecer alguns elementos indispensáveis para que se
cumpra o propósito de mostrar que a forma pela qual o PRR conduziu o Governo do Estado evidencia
que houve uma mudança na forma de dominação no Rio Grande do Sul. Isso será demonstrado
tanto através da gestão burguesa do Estado de tamanho mínimo, superavitário e eficiente na
arrecadação e nos gastos, quanto no fato de terem sido adotadas atitudes, face à sociedade, que
foram absolutamente diversas das condutas oligárquicas dos dirigentes do Partido Republicano
Paulista (PRP), em São Paulo.
A gestão do Estado empreendida pelo PRR pautou-se pela austeridade administrativa e
financeira. Com esse objetivo, o Governo perseguiu incansavelmente o equilíbrio orçamentário, para
o que era indispensável a precisão nas previsões, de tal modo que os valores orçados (de receita e
de despesa) nunca se afastassem significativamente dos valores efetivamente realizados. Para
atingir tais propósitos, funcionou como um mecanismo assaz eficiente a divisão do orçamento em
ordinário e extraordinário , fundamental, inclusive, para a programação da despesa.11 Com base
nesse mecanismo, a atitude do Governo do Estado foi extremamente crítica em relação ao uso
abusivo dos impostos, à aceitação sistemática do déficit e ao apelo a empréstimos – considerados
estes últimos como um recurso extremo, lícitos segundo rígidos critérios de julgamento, e desde que
encaminhados para aplicações produtivas(CARVALHO, 1996, p. 190-191). E mais, o PRR entendeu
que o papel da Assembléia dos Representantes não poderia ser jamais o de aumentar os gastos
públicos, senão o de restringi-los severamente (PEREIRA, 1996, p.222)12.
Tais orientações eram completamente distintas das práticas orçamentárias que, à época,
adotavam os demais Estados brasileiros – calcadas, freqüentemente, nos déficits e no apelo a
empréstimos –, e das quais o Estado de São Paulo lançou mão quase invariavelmente.
Assim, a atitude do Governo gaúcho frente às finanças públicas teve como regra
constante a subordinação da despesa à receita, usando da máxima prudência na previsão da
arrecadação e na programação das despesas, o que determinou, na prática, como conseqüência
direta, uma situação predominantemente superavitária dos orçamentos estaduais durante a Primeira
República (CARVALHO, 1996, p. 190-191; 207).13 Ela foi, seguramente, uma postura única no Brasil
irresponsavelmente patrimonialista de então.
Para desenvolver com maior clareza as questões mencionadas, serão considerados
vários aspectos da experiência do Governo gaúcho em matéria de política econômica. Em primeiro
11 A regra a ser seguida era a de que a despesa ordinária (associada, basicamente aos gastos com administração, justiça, segurança e educação) estaria vinculada, estrita e rigorosamente, aos elementos da receita ordinária. Nesse sentido, as despesas classificadas como adiáveis seriam consideradas despesas extraordinárias, a serem atendidas na dependência das condições do Tesouro e a juízo do chefe do Governo – conforme foi expresso em diversas oportunidades nos documentos governamentais (ver, por exemplo, o Relatório do Secretário Estadual da Fazenda de 1920 (RELAT. 1920, p. III) e o Relatório do Diretor Geral do Tesouro do Estado de 1921 (RELAT. 1921, p.504). 12 A posição do PRR estava consubstanciada no Relatório do Diretor Geral do Tesouro do Estado do Rio Grande do Sul de 1899: “... o mais eficaz é o de suprimir a causa principal desse furor de gastar, isto é, a iniciativa parlamentar em matéria de despesas. O papel dos Deputados não é por certo o de propor novas despesas, ou de aumentar as que são propostas pelo Governo, mas o de as fiscalizar e reduzir o mais possível.”(RELAT. 1899, p.46), conforme assinala Pereira (1996, p.222). 13 Uma abordagem mais aprofundada dessas questões, bem como a análise dos dados que deram origem às afirmações aqui feitas são encontradas em Carvalho (1996, p. 190-193; 207-208).
lugar, examinar-se-á a reforma realizada sobre o sistema tributário herdado do Império, a qual foi
periodicamente retomada e aperfeiçoada para atender, simultaneamente, tanto as necessidades de
uma fiscalidade eficiente, quanto as demandas e as críticas dos contribuintes – e nesse exame já
aparecerá a mudança da forma de dominação praticada pelo PRR. A seguir, tratar-se-á mais
detidamente dos limites das reformas empreendidas e dos resultados que foram alcançados através
dessas reformas. Nesse sentido, três tipos de resultados serão destacados: a política de
desoneração fiscal das exportações gaúchas; a distribuição da carga fiscal do Imposto Territorial
entre os segmentos mais importantes da sociedade gaúcha; e a direção que tomaram os gastos
públicos (extraordinários) no período dominado pelo PRR, mostrando então os segmentos sociais
que foram por estes beneficiados.
Como contrapartida, e para evidenciar, através da comparação, as peculiaridades do Rio Grande do
Sul, será examinado, em um trabalho complementar a esse, o comportamento do Estado de São
Paulo frente a situações congêneres.
3.1- A Reforma Tributária: as formas do Imposto Ter ritorial (1902-1913-1925)
Os republicanos do PRR possuíam um conjunto de idéias consolidadas sobre a gestão
estatal e sobre a organização do orçamento estadual. Em primeiro lugar, eles já haviam definido,
muito antes de chegar ao poder do Estado, no seu programa de 188414, que os impostos indiretos,
entre eles o de Exportação (um dos mais importantes impostos imperiais) eram prejudiciais à
sociedade, pois que incidiam sobre a riqueza gerada. Fazia também parte de sua proposta uma
estrutura tributária do Estado que fosse calcada sobre os impostos diretos, os únicos, no entender
deles, capazes de promover a eqüidade fiscal e de permitir a fiscalização dos contribuintes. Com
base nessa concepção, o imposto direto sobre a propriedade territorial (rural e urbana) parecia-lhes o
único capaz de promover a justiça fiscal (CARVALHO,1996, p.194). Havia, pois, na área tributária, um
projeto decidido a substituir os impostos indiretos pelos diretos, ou seja, tributando diretamente a
propriedade e não, indiretamente, a produção.
A reforma concebida não se resumia a isso, entretanto; era muito mais radical, na
medida em que não apenas propunha a criação de uma estrutura tributária baseada nos impostos
diretos, mas, também, que todo o ônus da tributação recaísse sobre a propriedade da terra. Tal
proposta implicava substituir todos os impostos, tanto os indiretos como os diretos, por um imposto
único, a incidir sobre a propriedade da terra. Isso se traduziu na decisão de extinguir o imposto
indireto sobre as exportações e, também, o imposto direto que incidia sobre a transmissão de
propriedade, substituindo-os pelo imposto direto considerado o mais justo e eqüitativo – o Imposto
Territorial.15
O Imposto Territorial foi implantado pelo Presidente do Estado e levado à discussão
da Assembléia de Representantes do Rio Grande do Sul, na legislatura de 1902. Grassava, então,
a crise fiscal que estourara na virada do século, caracterizada por uma queda significativa na
14 Bases do Programa dos Candidatos Republicanos – 1884 (Liedke, 1972, p.13)
Receita Tributária estadual que, de um valor de 10 mil contos de réis, em 1899, desabara para 7,8
mil contos de réis, em 1901, voltando a atingir o patamar anterior somente em 1908 (cerca de
10,8 mil contos de réis). A arrecadação do Imposto de Exportação, por sua vez,
aproximadamente no mesmo intervalo de tempo – entre 1898 e 1901 –, havia despencado de 4,4
mil contos de réis para 3 mil contos, considerados todos esses valores em termos nominais16
(ALMEIDA; CARVALHO; PEREIRA; 1998a , p. 279; 291; 295). Essa situação reforçou a
convicção na necessidade de uma reforma tributária – e, fundamentalmente, na substituição de
tributos pretendida – tendo por base argumentos da seguinte ordem: sob o aspecto econômico, o
propósito de amparar as indústrias e de proteger o comércio, pela concessão de isenções e de
reduções das taxas que pesavam sobre as exportações; sob o aspecto fiscal, a urgência em fundar
o regime orçamentário sobre uma base mais estável que a propiciada pelo Imposto de
Exportação; sob o aspecto doutrinário, a justiça fiscal da aplicação de um imposto – o Imposto
Territorial – sobre a matéria considerada pelo PRR como a mais própria a ser tributada – a terra
(CARVALHO, 1996, p. 195).
A implantação da reforma, em 1902, envolveu concretamente a adoção de medidas
no sentido de uma substituição gradativa do Imposto de Exportação e do Imposto de
Transmissão de Propriedade – as duas maiores fontes da arrecadação estadual até então
(representando cerca da metade da Receita Total do Estado, em conjunto) – pelo Imposto
Territorial sobre a Propriedade Rural. Tal substituição implicava, na realidade, transferir os
maiores encargos relativos à arrecadação da produção e do comércio para a propriedade rural
agrícola e pecuária (CARVALHO, 1996, p. 195).
A introdução do Imposto Territorial, ao ter a sua cobrança assentada uma parte sobre
a área e a outra proporcional ao valor venal da propriedade, gerou resistências por parte de
considerável parcela dos contribuintes, especialmente nos anos iniciais, em que as benfeitorias
estavam incluídas no cálculo do valor venal. Tal inclusão afetava, principalmente, os produtores
agrícolas, na medida em que esse procedimento acabava por deslocar o ônus da tributação dos
proprietários para os arrendatários ou locadores. Por outro lado, e contra os propósitos de
15 No caso da pretendida extinção do imposto direto sobre a transmissão de propriedade, o propósito implícito era o de evitar uma dupla taxação sobre a propriedade fundiária, frente à instituição do Imposto Territorial, o que era considerado indesejável pelo PRR. 16 Para aquilatar a real dimensão dessas afirmativas, é importante destacar dois fatos importantes: o primeiro, o de que a Receita Tributária constituiu, até a década de 20, o subgrupo responsável pela principal parcela da arrecadação estadual, contribuindo, até então, com mais de 80% da Receita Total do Estado, e com mais de 95% das Receitas Ordinárias. A partir de 1920 começou a manifestar-se uma alteração nesse quadro, com uma participação crescente das Receitas Industriais ; o segundo, representado pelo expressivo atrelamento da arrecadação tributária e, conseqüentemente, da Receita Total do Estado, ao comportamento das receitas decorrentes do Imposto de Exportação – responsáveis por mais de 40% da Receita Tributária, em média, entre 1893 e 1903 (conforme pode ser constatado nas Tabelas 5 e 6 do Apêndice Estatístico).
implantação do tributo, a sistemática adotada de avaliação e de cobrança fazia, ao que tudo
indica, com que os pequenos proprietários rurais – especialmente os da zona da antiga
colonização alemã, onde as terras alcançavam o mais alto valor venal por hectare, em todo o
Estado – contribuíssem com parcela significativamente maior na arrecadação, em relação à
proporção de terras que possuíam (MINELLA, 1979, p. 68), situação que será melhor examinada
mais adiante. Isso foi agravado, pelo menos até 1913, pela inclusão das benfeitorias no cômputo
do valor venal, englobando-se aí a própria moradia dos agricultores. Tal realidade representava
uma distorção na idéia subjacente à implementação do imposto, já que o objetivo não era o de
onerar os pequenos proprietários, mas, sim, o de taxar, proporcionalmente, mais as grandes
propriedades improdutivas.
No que diz respeito ao Imposto de Exportação, é necessário ter em mente que, no
período que se estende do início da República até 1893, havia sido mantida a taxação sobre as
exportações vigente durante o Império, compreendendo uma taxa única de 4% sobre o valor
exportado de todos os gêneros produzidos no Estado, sem prejuízo das taxas também cobradas
pelo Governo Central (de 9%, 6% e 5%), atingindo-se, portanto, alíquotas de 13%, de 10% e de
9% sobre os produtos que eram objeto de comércio externo. A partir de 1893, a arrecadação do
Imposto de Exportação passou à órbita exclusiva do Governo Estadual, e a taxa única foi
substituída por taxas diversificadas (de 4%, 6% e 10%), de acordo com a classe a que
pertencesse a mercadoria exportada, incidentes sobre todos os gêneros de produção do Rio
Grande do Sul a serem vendidos para outros Estados ou para países estrangeiros. Entretanto,
mesmo que com a República as taxas tenham sido reduzidas, ainda assim os administradores
pensavam serem elas exorbitantes e que deveriam ser ainda menores e, mesmo eliminadas.
Assim, no decorrer do período várias alterações foram introduzidas nas taxas, em
termos do seu valor e da incidência das mesmas sobre os produtos componentes da pauta,
refletindo – tanto as reduções como as isenções concedidas ou a eventual manutenção de
alíquotas mais elevadas – a política de incentivo às exportações então praticada pelo Governo
gaúcho17 (ALMEIDA; CARVALHO; PEREIRA, 1998b, p. 107).
Ao final da Primeira República, a maioria absoluta dos principais produtos
integrantes da pauta de exportações do Rio Grande do Sul estavam totalmente isentos do
imposto, sem quaisquer ônus além do pagamento de uma insignificante Taxa de Expediente.
17 A partir de algumas modificações iniciais, o Imposto de Exportação foi arrecadado às mesmas taxas (de 2%, 3%, 5%, 6% e 9%) até 1923. Nesse ano, a alíquota de 5% foi reduzida em 1%, passando a vigorarem, a partir de então, as taxas de 2%, de 3%, de 4%, de 6% e de 9% (ALMEIDA; CARVALHO; PEREIRA, 1998b, p. 107).
O Imposto de Transmissão de Propriedade também teve as suas taxas reduzidas e
várias isenções concedidas. Além de procurar atenuar os efeitos de uma dupla taxação sobre a
propriedade, frente à instituição do Imposto Territorial, estava também por trás dessa política,
ao que parece, o objetivo de dar à terra, via a desoneração da sua transmissão, a faculdade de ser
mobilizada com mais facilidade, revertendo a seus detentores recursos “(...) para quaisquer
iniciativas progressistas, se aproximando [a terra], quanto possível, da riqueza móvel”18
(CARVALHO, 1996, p. 197).
A substituição radical de tributos inicialmente desejada não se efetivou conforme o
esperado, e a evolução do Imposto Territorial foi lenta, embora segura, sem que este chegasse a
assumir, até o final do período, o papel que a princípio lhe fora reservado, o de substituir
totalmente o Imposto de Exportação e o Imposto de Transmissão de Propriedade. Paralelamente,
foram adotadas medidas paulatinas no sentido de diminuir, aos poucos, a representatividade dos
impostos a serem por ele substituídos na arrecadação estadual. Ainda assim, o propósito de
assentar o sistema tributário principalmente sobre receitas provenientes dos tributos diretos foi
atingido.19
As etapas de implantação do Imposto Territorial no Rio Grande do Sul e as
discussões, as críticas e as demandas que as rodearam são bastante exemplificativas das
características do processo de dominação instaurado pelo PRR durante a sua gestão, no Estado.
Concretamente, a proposta do Presidente do Estado decompunha a cobrança do tributo em duas
partes, uma constituída por uma alíquota de 0,2%, que incidiria sobre o valor venal da
propriedade rural (incluindo todas as benfeitorias e construções) e, outra, de 10 réis por hectare,
que incidiria sobre o tamanho da propriedade rural (MINELLA, 1985, p.29). Estes valores
vigoraram para a cobrança do imposto no ano de 1902.
Em novembro de 1903, na ocasião em que uma proposta de alteração dessas
alíquotas estava em discussão na Assembléia, foi lido um documento denominado
“Representação do Clube Gaúcho de Bagé”, onde um grupo de pecuaristas do Sudoeste do
Estado expunha aos Deputados a sua contra-argumentação à criação do imposto. Nele, os
pecuaristas declaravam ter chegado ao limite do que seria suportável sofrer como imposição do
Estado, considerando o Territorial um imposto injusto e defendendo a manutenção do Imposto
de Exportação. Alegavam, nesse sentido, que seria um erro por parte do Governo pensar que
este último era pago pelos produtores rurais, pois que quem o pagava eram os consumidores;
18 Conforme consta no Relatório do Secretário da Fazenda de 1909 (RELAT. 1909). 19 Sobre as formas pelas quais o Governo gaúcho desenvolveu o processo de deslocamento da ênfase da tributação estadual dos impostos indiretos – nos quais, tradicionalmente, se assentavam os sistemas tributários da União e dos Estados , no período examinado – para a tributação direta, ver Carvalho (1996, especialmente às páginas 198-201).
além do mais, segundo eles, mesmo que ele recaísse sobre o produtor, era um imposto justo
dado que estaria incidindo sobre o rendimento da propriedade e não sobre a propriedade em si
(MINELLA, 1985, p.30). É muito sugestivo o fato de que, num documento proveniente da
Oposição, já estivesse consubstanciada a necessidade de justificar racionalmente a posição
defendida para que esta pudesse ser considerada pelo PRR, fato que era reflexo, seguramente,
dos procedimentos do próprio PRR. Assim, o documento apoiava-se em texto de um economista
(Leroy Beaulieu) que sustentava que o Imposto de Exportação era pago pelos consumidores e
que ele era um bom substituto, em países novos (e exportadores) como o Brasil e a Argentina,
para o imposto Territorial (MINELLA, 1985, p.30).
Como resposta às pressões do “Clube Gaúcho de Bagé” o Presidente do Estado
promulgou a lei de alteração das alíquotas do Imposto Territorial, aumentando-as em relação às
que haviam sido por ele decretadas no ano anterior (MINELLA, 1985, p. 32), sob a
argumentação de que esse tributo deveria ser, não só “a fonte mais abundante da receita, a base
sólida e ampla do sistema orçamentário, mas também o sucedâneo natural das taxas indiretas”20
justificando a elevação das taxas pelo fato de que a arrecadação fornecida pelo novo imposto em
1902 havia sido inexpressiva. Assim, a partir de 1903, as alíquotas foram alteradas para 0,25%
sobre o valor venal da propriedade, e 30 réis por hectare.
Concomitantemente, os Deputados haviam reduzido de 7% para 5% a alíquota do
imposto sobre a Transmissão da Propriedade, o que era uma das reivindicações do “Clube”
(MINELLA, 1985, p. 33). E, por decreto21 o Governo suprimiu ou reduziu as alíquotas do
Imposto de Exportação para inúmeros produtos, entre os quais podem ser destacados o charque e
a banha (cujas alíquotas passaram de 6% para 2%), os couros (de 10% para 9%) e o arroz e a
farinha de mandioca, que passaram a ser isentos22 .
A forma inicial assumida pelo Imposto Territorial, no entanto, sofreu críticas
generalizadas tanto por parte dos grandes proprietários pecuaristas da Campanha, quanto dos
pequenos proprietários da Zona Colonial23 e dos plantadores da lavoura capitalista de arroz irrigado.24
A resistência ao pagamento do imposto consubstanciou-se em dívidas dos contribuintes que se
acumulavam, principalmente na sub-região Colonial (MINELLA, 1985, p.33). Uma crítica generalizada
20 Ver os Anais da Assembléia de Representantes de 1903 (ANAIS, 1903, p.21). 21 Decreto n.658, de 15 de outubro de 1903. 22 Para um exame detalhado da política de incentivo fiscal às exportações gaúchas via desoneração fiscal praticada pelo Governo estadual no decorrer da Primeira República, ver Almeida; Carvalho; Pereira (1998b ). 23 Os colonos conseguiram, imediatamente após a criação do imposto, isenção para a propriedade cuja arrecadação total do imposto (valor venal e extensão) fosse inferior a 1 mil-réis, fato este concretizado no Decreto n. 601, de 05 de março de 1903 do Presidente do Estado do Rio Grande do Sul. 24 O arroz irrigado era um produto novo que se expandia rapidamente no Sul sobre uma parte das terras da pecuária (ao longo da margem oeste da Lagoa dos Patos e através da Depressão Central). As exportações de arroz, que haviam
proveniente dos pecuaristas era a de que o imposto incidia indiscriminadamente sobre terras de
diferentes qualidades; outra, originária da sub-região Colonial e dos plantadores de arroz, era a de
que as benfeitorias (inclusive as residências dos colonos) não eram discriminadas em relação ao
valor do solo, recaindo, portanto, também sobre elas a incidência do imposto.
O caso das benfeitorias interessava sobremaneira aos produtores capitalistas de arroz irrigado, em
sua maior parte, arrendatários. Estes precisavam realizar pesados investimentos em engenhos de beneficiamento
do grão, em canais de irrigação, em bombas d’água e sistema elétrico para viabilizar sua produção. E é por isso
que eles articulavam, nessa lavoura, interesses industriais (equipamentos) e bancários (crédito) (MINELLA,
1985, p. 39-41). O grupo de empresários formado em torno dos negócios da produção de arroz constituiu-se,
rapidamente, em poderoso grupo de pressão sobre o poder público na defesa de seus interesses. E esse grupo
adquiria grande importância, dentro da visão do PRR, não só porque a sua produção articulava modernas
aplicações de capital, como porque a expansão acelerada da atividade arrozeira sobre terras de pecuaristas
atendia aos requisitos de modernização agrária que eram propostos pelo Governo gaúcho.
Por parte do Governo, a maior barreira enfrentada para a implantação do imposto consistiu na
necessidade de elaboração do cadastro geral das terras, tarefa que, pela complexidade e pelo tempo que exigia,
levou-o a optar por outra solução – a da declaração dos contribuintes. Esse sistema, entretanto, revelou, aos
poucos, uma grande suscetibilidade a fraudes e incorreções nas declarações – as quais afloravam ao comparar-se
os valores declarados para fins de imposição do Imposto Territorial com os valores das terras praticados nas
transações inter-vivos, que eram tributadas através do Imposto de Transmissão da Propriedade.25
Para corrigir tais erros e, ao mesmo tempo, levando em conta as diferenças entre as
qualidades das terras, foi realizada uma primeira reformulação do Imposto Territorial, em 1912, na
qual os diferentes tipos de terra e os respectivos valores passaram a variar segundo os município do
Estado. Desse modo, o valor de cada tipo de terra passou a ser estimado em função dos valores
médios das transmissões inter- vivos em cada município, primeiro bienalmente e, logo depois, a cada
ano.
Em continuidade a essas mudanças, o Governo foi pressionado pela “Federação das
Associações Rurais do Rio Grande do Sul”, sediada em Pelotas (maio de 1913), a promover uma
alteração mais radical no Imposto Territorial levando em conta também a questão das benfeitorias. E
é justamente nas argumentações produzidas pelo Presidente do Estado, por Secretários de Estado e
pelos Deputados para justificar as modificações introduzidas sobre um imposto socialmente tão
controvertido que se manifesta uma das evidências punctuais mais convincentes sobre a forma de
dominação racional-burocrática implantada pelo PRR. As justificativas utilizadas foram, em sua
maioria, retiradas de obra de um intelectual uruguaio, Manuel Herrera y Reissig26 que, para
desenvolver seus argumentos sobre a necessidade de um imposto que confiscasse as rendas
fundiárias, lançava mão de três fontes básicas: em primeiro lugar, de um estudo do uruguaio Andres
Lamas sobre a legislação agrária de Rivadávia (através da qual o Estado uruguaio procurou
assegurar-se rendas por meio do estabelecimento do domínio das terras); em segundo lugar, das
sido pouco superiores a 33 contos de réis em 1903, atingiram quase 5.000 contos de réis, em 1913, quando o produto já ocupava a quinta posição na pauta de exportações do Rio Grande do Sul (MINELLA, 1985, p.39). 25 Conforme consta dos Anais da Assembléia de Representantes, 1913, p.55 (Anais, 1913). 26Manuel Herrera y Reissig, El Impuesto Territorial y la Reforma Tributária en Inglaterra, Montevidéo, 1913.
idéias do americano Henry George27, que propunha o estabelecimento de um imposto único
destinado a absorver todas as rendas fundiárias (DENIS, 1971, p.573, citado em TARGA, 2000);
finalmente, da Reforma Tributária inglesa que se iniciara em 1909 e que, entre outras coisas, isentava
as benfeitorias do cálculo do Imposto Territorial (MINELLA, 1985, p.34-35).
As respostas argumentadas dadas pelo Presidente do Estado às demandas por
alteração do Imposto Territorial28 – que utilizavam como fundamento a obra mencionada de Herrera Y
Reissig29 – concordavam com a necessidade de excluir as benfeitorias do valor venal do imóvel de
modo a não tributá-las, justificando essa posição sob a alegação de que o principal defeito do tributo,
tal como era praticado, era o de que “os proprietários não o pagavam, somente adiantavam”. A
preocupação expressa é a de que se desejava efetivamente tributar a propriedade da terra e não o
capital que nela viesse a se incorporar. E mais, não se desejava, nem mesmo, que fossem os
arrendatários que pagassem o imposto no lugar dos proprietários30.
No caso desses argumentos, não importa que o objetivo de fazer com que os
proprietários pagassem o imposto não fosse plenamente alcançável, nem mesmo de que a teoria só
fosse válida em contextos muito específicos; o que importa, verdadeiramente, é que tanto a
argumentação era tida por científica (ou seja, por racional) quanto que era através dela que se
legitimava a criação do imposto. Assim, em 1913, o Secretário da Fazenda justificava a existência
desse tributo dizendo considerar o seu pagamento como uma justa retribuição pela faculdade de
utilizar individualmente um bem que era social pela sua própria natureza.31
Um outro argumento muito interessante foi levantado pelos Deputados que defendiam a
reforma do imposto na Assembléia, argumento este também baseado no texto de Herrera y Reissig,.
Eles defenderam a idéia de que um imposto que fosse crescente sobre o valor da terra levaria os
proprietários a procurar compradores ou arrendatários e com isso eles seriam forçados a baixar o
preço da terra ou o do seu aluguel (MINELLA, 1985, p.35). Nessa argumentação, o Imposto Territorial
tanto serviria para baixar o valor do acesso à terra32 – porque levaria mais terras ao mercado –,
quanto serviria para forçar a entrada na produção de terras até então improdutivas. Acelerar o
processo de mercantilização da terra aparecia assim como um dos móveis, e, então, justificativa, da
política tributária.
E para avaliar-se a quais interesses servia a troca de um imposto indireto (no caso, o
Imposto de Exportação) pelo Imposto Territorial não é necessária nenhuma interpretação: a própria
Mensagem do Presidente torna isso explícito quando afirma que trabalho e capital não deveriam ser
tributados, o primeiro por causa da “carestia de vida”, e o segundo porque era escasso em países
novos33. E a fonte do Presidente, o citado Herrera y Reissig, ( que se baseava em outros autores
como Henry George e David Ricardo) afirmava que se a parte do produto social que cabia à renda da
27 Henry George, Progress and Poverty, USA, 1879. 28 Ver, por exemplo, a Mensagem do Presidente do Estado à Assembléia de Representantes de 1903. 29 Conforme os Anais da Assembléia de Representantes do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 1913 (ANAIS, 1913, p. 55). 30 Parece evidente que os legisladores do PRR tinham em mente a lavoura mecanizada de arroz. 31 Ver o Relatório do Secretário da Fazenda do Rio Grande do Sul de 1913 (RELAT. 1913, p. 56). 32 Ao baixar tanto o preço de venda quanto o valor do aluguel. 33Conforme consta nos Anais da Assembléia de Representantes de 1913 (ANAIS, 1913, p.55).
terra viesse a tornar-se “proporcionalmente excessiva” provocaria uma redução na parte que cabia ao
trabalho e ao capital e que para aumentar a parte destes últimos era forçoso diminuir “a participação
proporcional do proprietário no produto” (MINELLA, 1985, p.37).
O que interessa ao propósito que se tem, no argumento, não é seu acerto ou erro teórico
na questão da distribuição da renda, mas os interesses que, explicitamente, se diziam querer
preservar. É sabido que, quando se defendiam os rendimentos do trabalho e do capital contra a renda
da terra – e isso desde o início do século XIX, com David Ricardo –, estava-se, na verdade,
defendendo pura e simplesmente a acumulação capitalista. Então, no triângulo formado pelo trabalho,
pela terra e pelo capital, o PRR postara-se pelos interesses do último, e propunha um imposto que
pretendia confiscar a renda da terra.
Introduzidas as alterações, em 1913 as edificações e as benfeitorias haviam sido excluídas do
cálculo do valor venal da propriedade e as terras foram classificadas, conforme a sua qualidade, em três tipos,
para efeito de cobrança da parte do Imposto Territorial que incidia sobre a extensão da propriedade rural: as
terras de qualidade superior sofreriam uma imposição de 100 réis por hectare; as de qualidade média, de 45 réis
por hectare; e as de qualidade inferior, de 15 réis por hectare. Esse padrão foi adaptado à variedade de tipos de
terras existentes segundo cada município do Rio Grande do Sul, de acordo com uma avaliação anual estimada a
partir das transmissões das propriedades.
Finalmente, o Imposto Territorial sofreu ainda uma última reformulação em 1925 quando
foi suprimida a alíquota sobre a extensão das terras e quando a alíquota sobre o valor venal do
imóvel foi aumentada para 0,3 % com previsão de aumentos posteriores para 0,4 %34 ou 0,5%,
conforme é possível verificar nos Anais da Assembléia de Representantes do Rio Grande do Sul de
1925 (ANAIS, 1925, p.155). Por ocasião dos debates que cercaram essa nova modificação do tributo,
a argumentação dos Deputados da Comissão de Orçamento fez aparecer mais uma vez a questão do
proprietário de terras versus o produtor rural. Aparentemente para responder às críticas de que o
Governo era contra os estancieiros, eles assinalavam que era necessário distinguir na figura destes o
produtor do proprietário, uma vez que tanto na pecuária como na lavoura existiam, lado a lado, os
proprietários que eram produtores – e que, em assim sendo, aportavam melhorias às suas terras,
culturas e rebanhos – e os proprietários rentistas, cuja renda aumentava tão-somente por efeito dos
esforços dos outros (MINELLA, 1985, p.35).
Pelo exposto, pode-se constatar que a Reforma Tributária pretendida pelos dirigentes do PRR foi
implantada e modificada em várias etapas, com o fim de torná-la mais operacional e para atender às demandas e
críticas dos contribuintes. Para o que se quer demonstrar, no entanto, são muito relevantes tanto a concepção
racional da Reforma quanto as idéias sobre a relação Estado-sociedade que a legitimavam, a saber: justificativas
racionais, que eram tidas por científicas, para a criação do Imposto Territorial e a idéia de que era a renda da
propriedade da terra, e não a do capital ou a do trabalho, que deveria ser objeto de tributação, como uma forma
de redistribuir a renda gerada e de executar justiça fiscal.
3.2 – Os limites e os resultados da Reforma Tributá ria
34 Em 1929, a alíquota do imposto territorial passou a 0,4 % do valor venal da propriedade.
A Reforma Tributária implantada pelo PRR, em seu sentido amplo, por um lado, defrontou-se com
limites estreitos em relação aos objetivos de longo alcance que haviam sido almejados pelos seus mentores; por
outro lado, entretanto, produziu interessantes resultados, tanto ao nível da promoção das exportações, quanto ao
da própria arrecadação do Imposto Territorial. E ao confrontar-se estes últimos resultados com os da direção
tomada pelos gastos públicos associados à promoção do desenvolvimento econômico ver-se-á a forma
específica tomada pela política econômica do PRR. Isso será demonstrado nessa seção, em primeiro lugar,
através do exame dos limites da Reforma; logo depois, pela avaliação dos seus resultados; e, finalmente, pelo
confronto das fontes sociais das receitas com os grupos sociais beneficiados pelos gastos.
Os limites da Reforma Tributária empreendida pelo PRR foram estabelecidos pela capacidade
arrecadadora do Imposto Territorial face às necessidades fiscais do Governo. Isso se deve a que,
malgrado o sucesso na implantação do novo imposto, ele não foi capaz de fornecer arrecadações tais
que permitissem a eliminação dos dois outros importantes impostos que ele fora chamado a
substituir, o de Exportações e o de Transmissão de Propriedade – dado que havia um limite
econômico e político para expandir a base da incidência da tributação sobre as propriedades rurais
(pequenas e grandes). Mesmo assim, o novo tributo firmou-se gradativamente em uma posição
relevante entre as fontes estaduais de arrecadação, para o que também contribuíram as medidas
adotadas com relação aos impostos que por ele deveriam vir a ser substituídos, no sentido de
diminuir, aos poucos, a representatividade dos mesmos no total da receita pública do Rio Grande do
Sul. A despeito das modificações introduzidas, pode-se afirmar, entretanto, que até 1913, o Imposto
de Exportação e o Imposto de Transmissão de Propriedade ocupavam os primeiros postos, nessa
ordem, na Receita Tributária do Estado, enquanto o Imposto Territorial assumira já a terceira posição
em 1903 (conforme é possível constatar na Tabela 6 do Apêndice Estatístico)
A partir de 1914, o Imposto de Exportação passou a perder a sua predominância. O
Imposto de Transmissão de Propriedade, também objeto de uma política de isenções e de reduções
de taxas, manteve-se, entretanto, como uma das principais fontes da arrecadação estadual durante
toda a Primeira República, graças, principalmente, à valorização experimentada progressivamente
pela propriedade imóvel no Estado. Ao final do período (década de 20), esse tributo se constituía na
maior fonte de geração de receita, comprovando as dificuldades que implicaria a sua radical
substituição, juntamente com o Imposto de Exportação, pelo Imposto Territorial, conforme
preconizava inicialmente a reforma de 1902. O Imposto Territorial, por sua vez, nunca chegou a
alcançar 60% do que eram capazes de auferir os outros dois tributos reunidos, mesmo tendo sido
realizadas algumas revisões em suas taxas e nos critérios de cobrança durante o período, conforme
já se mencionou. Mesmo assim, em alguns anos do período considerado ele foi o responsável pelas
receitas mais importantes (Tabela 6), e isso, por si só, já pode ser considerado um resultado muito
interessante.
Assim, avaliando em linhas gerais a concepção do sistema tributário sul-rio-grandense, a
implantação da Reforma, as revisões posteriores e os resultados obtidos, pode-se constatar –
observando o comportamento dos impostos que, pela proposta inicial de substituição, deveriam ser
extintos – a prudência da atitude assumida pelo Governo gaúcho, quando, em nome do equilíbrio
das finanças, não os aboliu de um só golpe, no momento em que foi implantado o Imposto Territorial.
A observação da importância do Imposto de Exportação e do Imposto de Transmissão
de Propriedade na arrecadação tributária do Estado mostra quão difícil e comprometedor para as
finanças estaduais teria sido a sua abolição total e, também, dá uma dimensão da fase de
crescimento pela qual passava a economia gaúcha, dado que, a despeito das reduções e supressões
nas taxas dos impostos considerados – e especialmente o Imposto de Transmissão de Propriedade
– eles continuaram a constar entre os que maiores arrecadações traziam ao Tesouro.
Conseqüentemente, seria necessário um tempo considerável até que o Imposto Territorial fosse
capaz de compensar completamente a supressão dos outros dois.
Além dos tributos mencionados, a estrutura da Receita Tributária mostra, em todo o
período analisado, outras fontes arrecadatórias importantes, constituídas pelos impostos sobre as
Indústrias e Profissões, sobre o Consumo (cuja expansão deu-se paulatinamente sobre uma lista
crescente de produtos) e sobre as Heranças e Legados (Tabela 6 do Apêndice). Adicionalmente,
como forma de subsidiar a política de incentivo às exportações via desoneração fiscal, que se
intensificou crescentemente no decorrer da Primeira República, o Governo do PRR – embora
frontalmente contrário, por princípio, à criação de novos tributos, a não ser em casos especiais ou
com destinação específica para os recursos daí decorrentes – optou pelo aperfeiçoamento das fontes
de receita de que já dispunha e pela instituição de taxas com aplicação vinculada a determinados
gastos.
Nesse sentido, já na primeira década do período, foram criadas, como receitas atreladas
a despesas específicas, a Taxa escolar de 5%, adicional a todos os impostos (vigorando a partir de
1905) e a Taxa Profissional de 2%, adicional a certos tributos (a partir de 1908), ambas com
aplicação especial nas atividades educacionais. A Taxa Profissional foi destinada exclusivamente a
auxiliar o ensino técnico-profissional ministrado pela Escola de Engenharia e pela Escola de
Agronomia e Veterinária, ambas de Porto Alegre, e pela Escola de Agronomia e Veterinária de
Pelotas, assumindo um caráter de subsídio a uma atividade que não era de responsabilidade
exclusiva do Estado, mas em cujo desenvolvimento e orientação este tinha o maior interesse. Foi,
entretanto, muito diferente o espírito que orientou a criação da Taxa Escolar. Esta, instituída com o
objetivo de prover recursos para o desenvolvimento do ensino primário – setor que estava sob a
exclusiva responsabilidade do Governo – representou um incremento significativo na arrecadação
(entre 5% e 6% da Receita Tributária na média do período) e contribuiu, nos anos imediatamente
posteriores à sua criação, para uma expansão considerável dos gastos com a educação pública
estadual, principalmente entre 1906 e 1914 (ALMEIDA; CARVALHO; PEREIRA, 1998b, p. 116-118).35
O fato, porém, de não ter podido realizar a substituição de impostos não atesta o
fracasso da reforma realizada, pois, em primeiro lugar, o Governo foi capaz de implantar um tipo de
tributo que gerava na classe proprietária (ou seja, na classe dominante) uma enorme resistência e
isso, por si só, já foi um retumbante sucesso. Em segundo lugar, porque as receitas dele decorrentes
contribuíram, de modo significativo, para tornar possível a desoneração das exportações do Estado
35 Ainda foram criadas outras taxas: em 1908, uma taxa adicional de 1% sobre exportações feitas pela Barra do Rio Grande (elevada para 1,5% em 1910); em 1910, uma taxa de expediente de 0,5% (logo depois aumentada para 1%) sobre gêneros exportados livres de direitos (ALMEIDA; CARVALHO; PEREIRA, 1998b, p.118).
através de uma renúncia fiscal que veio a tornar-se extremamente elevada (ALMEIDA; CARVALHO;
PEREIRA, 1998b, p.113-116)36.
A magnitude dessa renúncia fiscal foi de tal ordem que, a partir de 1917, as somas das
receitas dos impostos de Exportação e do Territorial passaram a ser sistematicamente menores37 que
a renúncia fiscal praticada sobre as exportações gaúchas (conforme pode ser verificado na Tabela 7
do Apêndice Estatístico). Isso quer dizer que, por um lado, houve uma política deliberada de
promoção das exportações que se apoiava nesta desoneração fiscal muito além do que permitiam os
limitados recursos orçamentários do Estado (conforme pode ser observado no Gráfico 3 do
Apêndice).De fato, os administradores públicos entendiam que a desoneração fiscal das exportações
era uma política protecionista às firmas exportadoras38. Por outro lado, coloca-se aí, também, a
questão da preservação do Imposto de Exportação no sistema tributário, qual seja, este tributo seguiu
existindo somente porque havia uma contribuição da receita das exportações da qual os
administradores não poderiam abrir mão, ou existia, também, uma outra explicação para isso?
Uma forma de elucidar essa questão pode ser dada pelo exame dos aspectos mais
relevantes que pautaram a política de exportações do PRR, pois eles são reveladores de outra
características interessantes da conduta de seus representantes. Estes, dentro de suas bases
doutrinárias, conceberam um tipo de Estado que tinha como orientações básicas tanto a
diversificação da produção, com o objetivo de atingir a auto-suficiência no abastecimento interno,
quanto a conseqüente diversificação da pauta das exportações, para reduzir a dependência do nível
de renda interno com relação ao desempenho das vendas nos mercados externos (compreendidos aí
também as realizadas em outras regiões do País). Tal postura se apoiava na constatação de que as
dificuldades da economia gaúcha, geradas pelas freqüentes crises enfrentadas pela pecuária em
geral e pelas charqueadas especificamente, eram características de economias baseadas
fundamentalmente nas exportações de um único produto (no caso, o charque). Ou seja, a
manutenção do nível de renda a partir das exportações de um único produto estaria associada,
freqüentemente, não só a uma situação de instabilidade, como também a uma situação de
dependência.39 Na verdade, os administradores do PRR definiam as exportações como “o excesso ou
a sobra do consumo estadual”, considerando-as positivas para a economia regional somente quando
se cumprissem as seguintes condições: estarem associadas à diversificação da pauta e não atuarem
em prejuízo do abastecimento do mercado estadual. Queriam, então, que fosse destinado à
36 A renúncia fiscal ao Imposto de Exportação praticada em um determinado ano é definida neste trabalho como sendo a diferença entre a arrecadação efetiva daquele tributo no ano considerado, face às taxas vigentes sobre cada um dos produtos exportados (sujeitas a um processo gradativo de reduções e de supressões) e uma arrecadação estimada com base nas taxas que vigorariam na ausência de tal política. Supõe-se, nesse caso, constantes para todo o período analisado (1901-1929) as alíquotas existentes em 1903 – considerado esse ano como base para efeitos do cálculo pretendido, por ser o exercício imediatamente anterior ao da efetiva e metódica implementação das políticas de substituição de tributos e de desoneração fiscal das exportações por parte do Governo gaúcho (ALMEIDA; CARVALHO; PEREIRA, 1998b, 114-115) 37 O ano de 1918 foi a única exceção. 38Conforme consta dos Anais da Assembléia de Representantes de 1903 (ANAIS, 1903, p.21). 39 Para efeitos desse trabalho consideraram-se como exportação todas as vendas efetuadas para os mercados externos à economia do Estado, incluindo-se aí tanto o mercado interno brasileiro quanto o mercado internacional (ALMEIDA; CARVALHO; PEREIRA, 1998b , p. 89).
exportação somente o excesso de produção que não pudesse ser absorvido internamente.40 Não se
pode deixar de assinalar, nesta passagem, a enorme diferença da concepção dos administradores do
PRR sobre as exportações estaduais daquela vigente nas economias monocultoras e
agroexportadoras das demais regiões do Brasil, onde o ato de exportar era a alma da economia
regional, viabilizando, então, inclusive o consumo (tanto o produtivo como o improdutivo). Tais
fundamentos serviram de base para a conduta adotada pelo Governo gaúcho com relação às vendas
externas.
Por um lado, para auxiliar na expansão das vendas ou no aumento de competitividade
dos produtos sul-rio-grandenses (que, neste caso, vinham sofrendo concorrência de produtos de
outros Estados) eram desoneradas as exportações – através da redução ou da supressão das taxas
que pesavam sobre as mesmas – enquanto, por outro lado, mantinham-se alíquotas elevadas,
desestimulando-as, no caso de produtos que apresentavam problemas para o abastecimento interno
do Rio Grande do Sul. Esta última característica da política adotada também é um fator que explica a
preservação do Imposto de Exportação, na medida em que este contribuía para evitar as crises de
abastecimento e o aumento do custo de vida na região. Esse aspecto da política fiscal do PRR
mostra que os administradores públicos possuíam um compromisso com a reprodução da população
sob sua responsabilidade.
Outra dimensão da conduta dos administradores do PRR pode ser deduzida da mesma
utilização da desoneração fiscal das exportações em períodos de grandes dificuldades
arrecadatórias. Um primeiro exemplo desse tipo de conduta pode ser colhido no momento em que a
política foi iniciada junto com a implantação do imposto Territorial. Neste período (1902-1903), já se
assinalou, grassava a crise fiscal, e o Imposto de Exportação era responsável por parte substancial
dos recursos arrecadáveis. Diante da situação fiscal do Estado poder-se-ia esperar que os
administradores, pelo menos, aguardassem o retorno dos resultados do novo imposto antes de iniciar
o processo de redução e de supressão de taxas sobre as vendas externas. Não foi assim que
procederam, e com isso, privilegiaram o desempenho da sociedade e não as finanças do Estado. Um
outro exemplo: entre 1914 e 1920, caíram muito, tanto o valor das exportações gaúchas quanto a
arrecadação total41, mas nem por isso o Governo interrompeu sua política e, para fazer frente à
situação, redimensionou drasticamente alguns dos principais itens da despesa pública, preservando
sempre um resultado orçamentário superavitário (ALMEIDA; CARVALHO; PEREIRA, 1998b, p.116-
119).
Quanto aos resultados da política adotada, são inegáveis os seus efeitos positivos sobre
o comportamento das exportações gaúchas, embora sejam eles de difícil mensuração direta. No
entanto, os objetivos de expandir as exportações e de diversificar a pauta exportadora foram
atingidos. Os dados disponíveis sobre a estrutura das exportações gaúchas no período examinado,
40 Ver, sobre isso, Relatório apresentado ao Presidente do Estado do Rio Grande do Sul pelo Secretário de Estado dos Negócios da Fazenda José de Almeida Martina Costa Júnior, em Porto Alegre, em 1902 (RELAT. 1902). 41 A queda de aproximadamente 40% experimentada pelas exportações do Rio Grande do Sul entre 1914 e 1915 refletiu-se sobre a Receita Tributária, a qual, atrelada que era ao comportamento das vendas externas, sofreu um impacto semelhante, caindo em mais de 30% no mesmo intervalo de tempo (conforme se observa no Gráfico 3 do Apêndice).
bem como o agrupamento dos produtos exportados segundo a sua procedência42 – a saber, produtos
derivados da pecuária tradicional, produtos oriundos da agropecuária colonial, lavoura capitalista do
arroz – permitem não só aquilatar com maior precisão o nível de diversificação experimentado pelas
vendas externas estaduais, como também possibilitam uma avaliação mais precisa do grau de
consonância entre os resultados obtidos e os propósitos explicitados pelos representantes do
Governo rio-grandense. Algumas constatações são possíveis, nesse sentido. Em primeiro lugar,
pode-se destacar não somente as magníficas taxas de expansão do arroz (de 34,5% ao ano, entre
1901 e 1929), como o crescimento da participação dos produtos provenientes da produção colonial
(que passaram de uma participação média de 28,5%, entre 1901 e 1913, para 35,4%, entre 1920 e
1929). Como contraponto, as mercadorias oriundas da pecuária tradicional perderam peso na pauta,
passando de uma participação de 61,4% para 45%, nos mesmos intervalos de tempo. Isso foi reflexo
de uma velocidade de expansão muito menor das exportações da sub-região da pecuária (de 3,7%
ao ano, entre 1901 e 1929), contra um crescimento médio anual de 6% para os produtos originários
da economia colonial, fato que evidencia que a pauta de exportações enriqueceu-se com produtos
que não eram os tradicionais da pecuária43 (ALMEIDA; CARVALHO; PEREIRA, 1998b, p. 96-110;
127-132).
Em resumo, confrontando a evolução do comportamento da pauta com o desenrolar do
processo de reduções e de isenções de taxas, pode-se identificar a convergência entre a
concretização da política de estímulo fiscal às exportações e os propósitos manifestados pelo
Governo gaúcho – dentro dos limites possíveis de ação governamental quanto a tais questões –, com
reflexos positivos sobre as vendas externas estaduais no período considerado. Assim, é indiscutível
que as exportações gaúchas experimentaram um impulso altamente significativo e um incremento
substancial especialmente na última década do período (1920-29), fase na qual a política de
estímulo fiscal às vendas externas se intensificou sobremaneira. Ao mesmo tempo, e também em
consonância com os propósitos do Governo, houve uma sensível diversificação da pauta, com a
ascensão significativa de alguns produtos alimentares oriundos do desenvolvimento da policultura e o
afloramento, entre as exportações, de alguns artigos mais elaborados, decorrentes da transformação
de matérias-primas regionais44 (ALMEIDA; CARVALHO; PEREIRA, 1998b, p. 108).
Considere-se, agora, um outro resultado da Reforma Tributária, qual seja, a forma que
tomou a arrecadação do Imposto Territorial segundo a sua distribuição pelas sub-regiões definidas
como pecuária tradicional, colonial alemã, colonial italiana45 e arrozeira. As evidências associadas a
42 Entende-se por “procedência”, no caso, a associação dos produtos exportados pelo Rio Grande do Sul com determinadas regiões consideradas “típicas” daquele tipo de produção (sem, entretanto, obedecer a uma maior rigidez quanto a tais localizações). Assim, por exemplo, associa-se a pecuária tradicional e os produtos dela derivados à região da Campanha e à Serra do Sudeste; a agropecuária colonial, às zonas de imigração alemã e italiana (norte e nordeste do território gaúcho); a lavoura capitalista do arroz, à Depressão Central e litoral ocidental da Lagoa dos Patos (ALMEIDA; CARVALHO; PEREIRA, 1998b, p. 102). 43 Todas as taxas mencionadas são taxas geométricas médias de crescimento, ao ano, nos períodos referidos. 44 Para ter acesso aos dados que permitiram as agregações dos produtos da pauta das exportações gaúchas nos grupos mencionados e possibilitaram as constatações referidas, bem como para um maior detalhamento do desenrolar da política governamental de incentivo fiscal às vendas externas no período da Primeira República, ver Almeida; ,Carvalho; Pereira (1998b, p. 89-145) 45 Informações disponíveis a partir de 1914.
isso, bem como outras constatações sobre os resultados da implantação deste tributo no Rio Grande
do Sul no período estudado são apresentadas a seguir.46
Em primeiro lugar, é possível verificar que, enquanto a área total tributada aumentou em somente
8%, com a maior parte deste aumento tendo sido realizado ainda no sub-período de implantação do imposto
(entre 1905 e 1914), o número de contribuintes mais do que duplicou entre 1905 e 1928 (aumento de 103%).
Essa expansão, no entanto, não foi homogênea, pois, neste período de 23 anos, o aumento do número de
contribuintes foi maior na sub-região da pecuária (108 %) do que na colonial alemã (51%), ou mesmo, do que na
arrozeira (73%) (TARGA, 2000).
Malgrado o hectare na sub-região colonial tivesse sempre atingido um valor venal muito
superior ao do hectare nas terras da pecuária (repercutindo em um valor médio superior do imposto
por hectare)47 não foi nesta sub-região que se realizou a maior arrecadação do Imposto Territorial. De
fato, a sub-região da pecuária tradicional foi a mais duramente atingida pelo imposto pois os
contribuintes das sub-regiões arrozeira e colonial alemã perderam participação nos totais tanto no
que diz respeito ao número de contribuintes quanto ao montante arrecadado do tributo. Tudo isso foi
seguramente reflexo, por um lado, de uma firme ação do Estado em relação aos pecuaristas,
justamente a classe que tentara praticar uma maior evasão à contribuição, parecendo evidenciar que
os objetivos de abrangência tributária e de mercantilização da terra tivessem sido gradualmente
atingidos na sub-região da pecuária tradicional. Por outro lado, era reflexo também da política de
isenções sobre o tamanho de propriedade, sobre as construções e as benfeitorias dos produtores das
outras sub-regiões. Isso quer dizer que foram as propriedades da pecuária tradicional que
contribuíram mais pesadamente para o montante arrecadado, o que pode ser evidenciado pelo fato
de que a arrecadação na sub-região da pecuária sempre foi maior que a soma das participações das
demais (TARGA, 2000).
Dados mais conclusivos sobre essa questão podem ser fornecidos através dos
resultados do imposto médio arrecado por contribuinte, os quais mostram, em uma comparação entre
a sub-região colonial alemã e a da pecuária, por exemplo, que essa arrecadação foi três vezes maior
nesta última, em 1905, e que essa diferença ampliou-se para cinco vezes, em 1914, e para quatro
vezes, em 1928 (sempre em relação a 1905) (TARGA, 2000).
Esses resultados evidenciam que a arrecadação proporcionada pelo Imposto Territorial
realizou-se sobretudo sobre as propriedades pecuárias e que ela aprofundou-se ao longo do período.
Um olhar mais fino sobre os resultados dos municípios da região pecuária, onde existiam grandes
desigualdades internas à sub-região, torna evidente a magnitude dessa diferença. Assim, para dar
um único exemplo comparativo, se o contribuinte da sub-região colonial alemã arrecadava em média
7 mil réis , em 1914, o do município de Dom Pedrito arrecadava 72 mil réis (uma contribuição média
10 vezes maior), o de Bagé, 53 mil réis, o de Livramento, 65 mil réis e o de Uruguaiana, 58 mil réis.
Todos os municípios cujos proprietários contribuíram (em média) mais pesadamente pertenciam à
46 Os dados que permitem a formulação das constatações mencionadas encontram-se em Targa (2000) e Minella (1985). 47 Resultado do trabalho dos imigrantes que tornara essas terras, outrora de florestas desprezadas pelos pecuaristas, as mais valiosas do Rio Grande do Sul.
Campanha, reduto da oligarquia tradicional que havia fornecido os quadros dirigentes do Partido
Liberal no Império e que fornecia, agora, os do Partido Federalista (TARGA, 2000).
Em definitivo, pois, as evidências apontam no sentido de que foi a classe dos
pecuaristas a mais atingida pelo Imposto Territorial e não a dos agricultores alemães e italianos ou
os empresários plantadores de arroz. E uma vez que esses pecuaristas constituíam a classe social
da oligarquia rural rio-grandense, cuja fortuna e poder assentavam-se justamente sobre a grande
propriedade, esses dados lançam uma luz definitiva tanto sobre a não identidade entre os membros
do PRR e esta oligarquia rural quanto sobre o rompimento do PRR com uma política patrimonialista
que resguardasse os interesses da grande propriedade territorial no Sul.
Em suma, a política fiscal que se consubstanciou no Imposto Territorial e nas suas isenções, assim
como na desoneração das exportações revela que o PRR dispôs-se a tributar a grande propriedade territorial e a
aliviar a carga fiscal sobre os agricultores coloniais, bem como sobre as formas agrária, comercial e industrial do
capital.
Para encerrar o exame das reformas tributárias e nas suas derivações é interessante
verificar, finalmente, até que ponto os administradores do PRR tiveram sucesso na transformação do
sistema tributário originalmente calcado sobre os tributos indiretos para um sistema calcado sobre os
impostos diretos48. Por um lado, os impostos indiretos, que representavam quase 70% da Receita
Tributária do Estado em 1893, representavam em 1929 menos de 40% daquela arrecadação. Entre
estes, aqueles ligados às exportações, que representavam mais da metade da arrecadação tributária
estadual no início do período, em 1929 participavam com menos de 20% daquele total. Em
contrapartida, os impostos diretos, como conseqüência previsível e programada, tiveram a
participação significativamente aumentada, de cerca de 30%, para perto de 40%, no mesmo período,
conforme pode ser verificado na Tabela 8 do Apêndice Estatístico. Tal deslocamento correspondeu,
em última análise, à transferência da predominância dos tributos incidentes sobre o comércio externo
para a tributação sobre a propriedade – através do Imposto de Transmissão de Propriedade e do
Imposto Territorial – e sobre os rendimentos – por meio do Imposto sobre Indústrias e Profissões.
Isso determinou uma razoável ascensão dos impostos diretos, que tenderam a predominar, como
grupo, até o final da Primeira República, de forma coincidente com os objetivos que moveram as
mudanças empreendidas no sistema tributário sul-rio-grandense (CARVALHO, 1996,p. 199-200).
A outra alteração importante na área tributária consistiu na ascensão das receitas
provenientes das atividades industriais na composição das Receitas Ordinárias do Estado.49 Assim,
embora a Receita Tributária tenha constituído a principal fonte de arrecadação na maior parte do
período, nos anos finais (década de 20) manifestou-se um incremento considerável das Receitas
Industriais, atestando o crescimento e a diversificação da economia e uma substancial intensificação
48 Para fins de análise, as rubricas enquadradas nas categorias dos Impostos Indiretos e dos Impostos Diretos foram reunidas em algumas subcategorias. Assim, fazem parte dos Impostos Indiretos: (a) impostos ligados às exportações; (b) impostos ligados ao consumo; (c) outros impostos indiretos. Constituem os Impostos Diretos: (a) impostos com incidência sobre a propriedade; (b) impostos sobre o capital e os rendimentos. 49 As Receitas Ordinárias foram responsáveis por uma participação média de mais de 90% no total arrecadado, no período examinado. Considerando, por outro lado, os seus subgrupos – Receitas dos Impostos, Receitas Industriais e Receitas Patrimoniais – o primeiro deles foi o mais significativo, em termos de arrecadação durante todo o período,
da intervenção do Governo na condução desse processo. Essa alteração se deu, basicamente, em
função da incorporação à arrecadação estadual das receitas do porto e da barra de Rio Grande
(1919) e da Viação Férrea (1923) decorrentes das encampações desses serviços pelo Governo do
Estado, o que levou a que as Receitas Industriais passassem a contribuir com um montante superior
ao da Receita dos Impostos na constituição da Receita Total – 46,9% e 46,2%, respectivamente – ao
final do período (1929), conforme se verifica na Tabela 5 do Apêndice. Isso veio mais do que duplicar,
praticamente, o valor das Receitas Ordinárias, em termos nominais, a partir dos anos
2050(CARVALHO, 1996, p. 199).
O anteriormente exposto permite afirmar que os administradores do PRR tiveram um sucesso
bastante significativo no cumprimento da sua meta de tornar a arrecadação total do Estado e, em especial, a
Receita Tributária, menos dependentes do imposto indireto sobre as exportações. Mostra, também, o sucesso
alcançado no que respeito ao deslocamento da ênfase da tributação de uma predominância acentuada dos
impostos indiretos para os impostos diretos.
Um outro lado da moeda pode ser mostrado através da ação do Governo gaúcho no que tange aos
gastos públicos, no período da Primeira República. Nos primeiros anos (1893-1897) as prioridades da despesa
estatal estiveram totalmente dirigidas para a área militar, uma vez que mesmo após o término da Revolução
Federalista, em 1895, estes gastos continuaram ainda muito elevados. Cessadas, porém, as urgências militares, o
que se pode chamar de gastos com desenvolvimento econômico (ou gastos totais de desenvolvimento)51
ocuparam, de imediato, um lugar importante na despesa pública, pois que se expandiram a uma taxa média anual
de 8% entre 1897 e 1912, enquanto a despesa total do Estado não o fez senão a uma taxa anual de 4%. E estes
gastos constituíam uma proposta que o Presidente do Estado deixara clara em sua Mensagem à Assembléia de
Representantes de 1899, onde afirmava que após a justiça e a segurança eram “os trabalhos públicos que
constituíam a função mais essencial do Estado”, conforme assinala Pereira (1996, p. 220).52
Durante este período inicial, os gastos com desenvolvimento econômico foram
financiados através dos superávits orçamentários. Isso tanto mostra a importância que o Governo do
PRR atribuía aos gastos dessa natureza – classificados como gastos extraordinários,53 quanto torna
evidente que perseguir o equilíbrio orçamentário não era uma mera figura de retórica (ou um artifício
embora tenha crescido a participação das Receitas Industriais , especialmente a partir da década de 20, conforme se constata na Tabela 7, do Apêndice (CARVALHO, 1996, p. 205). 50 As Receitas Ordinárias passaram de aproximadamente 32 mil e 500 contos de réis em 1920 para 80 mil e 700 contos de réis em 1923, enquanto as Receitas Industriais, no mesmo período, ascenderam de um montante de 5 mil e 500 contos de réis para 43 mil e 150 contos de réis (CARVALHO, 1996, p. 199)., 51 Foram considerados gastos com desenvolvimento econômico os gastos orçamentários que buscaram modernizar a infra-estrutura econômica da região. A modernização traduziu-se em obras e serviços prestados pelo Governo do Estado, entre 1893 e 1929, na promoção do desenvolvimento da agricultura, da indústria e do comércio, na construção da infra-estrutura de transportes, nos investimentos em energia, na exploração de recursos minerais e na realização de obras de saneamento público (PEREIRA, 1996, p. 213). 52 O texto da Mensagem de 1899 continua explicando o papel do Estado e o da iniciativa privada nesta questão, do seguinte modo: “(...) enquanto a capitalização bem orientada e a concentração de grandes fortunas privadas não adquirem a necessária energia para empreender vastos melhoramentos materiais, força é que a intervenção do poder público se exerça tão amplamente quanto exigem as necessidades sociais, sem excluir, ao contrário estimulando sempre, a livre concorrência dos particulares. Debaixo desse ponto de vista, o engrandecimento material de nossa terra impõe-se à contínua atividade administrativa.” (conforme PEREIRA, 1996, p.220). 53 Observe-se que as despesas ordinárias do Estado (com administração, segurança, justiça, educação) eram asseguradas pelas receitas ordinárias, e que os gastos extraordinários dependiam dos resultados apresentados pela caixa do Tesouro do Estado, como já foi assinalado anteriormente.
contábil) do Governo, mas sim uma condição essencial para realizar esse tipo de despesa. A partir de
1914, foi criada uma fonte alternativa para financiar estes gastos – a Caixa de Depósitos
Particulares, cujo Decreto de criação continha, na sua exposição de motivos, o propósito de
concentrar as pequenas poupanças com vistas a investir em “obras públicas extraordinárias e
reprodutivas e depois em operações de crédito real ou em auxílios às indústrias rurais”, conforme cita
Pereira (1996, p. 223).
A importância atribuída pelo Governo aos gastos com desenvolvimento é comprovável
através do exame da evolução do seu comportamento em três subperíodos distintos, a saber: entre
1897 e 1912, estes gastos cresceram a uma taxa média de 8 % ao ano; entre 1912 e 1916, tiveram
uma forte retração, apresentando uma taxa negativa anual de 29 %; e entre 1916 e 1929, voltaram a
expandir-se aceleradamente, a uma taxa anual superior a 29 %.54 Observe-se, finalmente, o elevado
patamar atingido por esses gastos em 1929, quando eles equivaliam a 56 % da despesa total do Rio
Grande do Sul55, conforme assinala Pereira (1996, p. 224; 237-238) e pode ser verificado nas
Tabelas 9 e 10 do Apêndice Estatístico.
A análise de tal comportamento fica mais qualificada quando permite que se responda a
duas questões básicas: a primeira delas, associada aos setores que foram privilegiados através dos
gastos com desenvolvimento; a outra, relativa aos grupos sociais que se beneficiaram com os
mesmos.
Com relação à primeira questão, os dados demonstram que dois setores, em especial,
foram responsáveis pela parcela mais substancial desses gastos: a agricultura e os transportes(
conforme PEREIRA, 1996, p.224).
Os gastos com os programas de apoio ao setor agrícola cresceram, entre 1897 e 1912, a
uma taxa média anual de 15% e se, em 1897, eles absorviam pouco mais de 16% dos gastos totais
com desenvolvimento, em 1912 eles já alcançavam o patamar de 45% do total dos recursos aí
aplicados (Tabela 11 do Apêndice). Um dos programas mais importantes nesse sentido foi o de
colonização das terras devolutas pertencentes ao Estado do Rio Grande do Sul através de incentivos
estaduais à imigração espontânea (de nacionais e estrangeiros), que consistiam, essencialmente, na
garantia de acesso à terra a um custo muito baixo. No contexto dessa política, os gastos com a
demarcação das terras foram peça-chave do programa de colonização56(PEREIRA, 1996, p.224).
Mas o Governo lançou-se também em programas de fomento à agricultura. Para isso,
tanto criou, em 1898, a Estação Agronômica Experimental, em Porto Alegre, quanto estabeleceu
também incentivos aos agricultores dos núcleos coloniais que adquirissem instrumentos agrícolas
aperfeiçoados; em 1899, determinou que, em cada núcleo colonial, fosse demarcada uma área para
54 Para efeitos de comparação, é de destacar que, no período 1916-1929, a taxa média de expansão desse tipo de gasto foi, em São Paulo, da ordem de 10% ao ano. 55 E mais, em uma comparação especialmente relevante para essa grandeza, chama-se a atenção para o fato de que este montante foi, em 1929, de 37.244 contos de réis – enquanto em São Paulo era de 39.319 contos de réis – o que é um número verdadeiramente espantoso para o Rio Grande do Sul, dada a diferença de magnitude das respectivas despesas totais ( a do Rio Grande do Sul, da ordem de 66.050 contos de réis enquanto a de São Paulo, quase 2,5 vezes maior, atingindo o patamar dos 162.834 contos de réis) (PEREIRA, 1996, p. 238). 56 Esta demarcação deu-se em meio a uma enormidade de conflitos legais, pois grandes proprietários haviam tomado posse ilegítima de áreas de terras devolutas e precisavam ser legalmente desapossados. Estes fatos foram objeto de Mensagens do Presidente do Estado em 1902 e 1906 (conforme cita PEREIRA, 1996, p.224).
posterior estabelecimento de uma Estação Experimental de Agronomia57; em 1903, criou os Postos
Agronômicos nas Colônias de Guaporé e Ijuí; em 1907, instituiu uma escola de capatazes e uma
turma de professores ambulantes de agricultura (de acordo com PEREIRA, 1996, p.224). No final do
período (1929), no entanto, os gastos de fomento com o desenvolvimento agrícola representavam
somente 2,5 % dos gasto totais de desenvolvimento.
Essa queda de participação foi reflexo do crescimento das despesas com a infra-
estrutura de transportes, que iriam ocupar um lugar cada vez mais importante nos gastos com
desenvolvimento. Assim, já naquele período inicial, de 1897 a 1912, essas despesas cresceram a
uma taxa de 5,4% ao ano, tendo sido aplicados, em média, 60% dos recursos na construção e
reparação da rede rodoviária e 20% no sistema hidroviário. Representando 82,7% dos gastos de
desenvolvimento em 1897, atingiram o patamar de 63% desses gastos, em 1916; e, no final do
período, em 1929, representavam 97,4 % (Tabela 11) .
Um aspecto relevante para avaliar a dimensão real da expansão dos gastos voltadas
para o desenvolvimento deriva da análise da forma pela qual os mesmos foram territorializados no
Estado. Em 1898, já fora esclarecido que a ação governamental privilegiaria as ligações entre a sub-
região colonial e Porto Alegre. Assim, os investimentos no sistema rodoviário priorizavam uma rede
que possuía por centro Porto Alegre. A ação sobre o sistema hidroviário, destinada a melhorar a
navegabilidade dos rios, também centrava-se sobre aqueles que levavam à Capital: o Jacuí, o
Taquari, o dos Sinos e o próprio estuário do Guaíba (que banha Porto Alegre). Esta era, ao mesmo
tempo, a bacia hidrográfica da sub-região colonial. As sub-regiões contempladas por estes
investimentos públicos foram: o Planalto Oriental, a Depressão Central e a parte norte do Litoral. Em
1913, o Plano Geral de Viação do Estado tomou forma de lei58, confirmando o plano rodoviário
anterior e incluindo no plano hidroviário um novo rio, o Ibicuí (afluente do rio Uruguai no Planalto
Oriental), única hidrovia não pertencente ao sistema fluvial do Guaíba mas que, ainda assim, serve a
sub-região das Missões59(PEREIRA, 1996, p. 226). Portanto, nada estava previsto para atender a
sub-região da pecuária tradicional (Campanha e a Serra do Sudeste). O Plano estabelecia também
que o porto marítimo de Rio Grande seria a ligação da economia gaúcha com o Brasil e o Exterior.
Desse modo, se em 1916 os gastos com a infra-estrutura de transportes perfaziam 63,6
% dos gastos totais de desenvolvimento, distribuindo-se eqüitativamente entre rodovias (33,5%) e
hidrovias ( 30,1%), outro foi o quadro que se apresentava ao final do período (1929). Nessa ocasião,
as rodovias absorviam somente 7,5% daqueles gastos, enquanto as hidrovias respondiam por 20,2%
dos mesmos, e o sistema ferroviário, por 68,6%, conforme pode ser constatado na Tabela 11 do
Apêndice Estatístico.
O peso dos melhoramentos das hidrovias durante todo o período e o enorme peso dos
gastos com o sistema ferroviário que aparecem nos dados relativos ao ano de 1929, espelham uma
57 As funções das Estações Experimentais foram assim definidas no Decreto 182 do Presidente do Estado, em 1898: ensaiar novas técnicas agrícolas para as culturas já praticadas e desenvolver de culturas de novos produtos; analisar os tipos de solo do núcleo colonial e determinar os fertilizantes adequados; colocar em experimentação novos instrumentos agrícolas e máquinas modernas (PEREIRA, 1996, p.225). 58 Decreto 1958 de 19 de abril de 1913. 59 Os gastos efetivamente realizados nessas rodovias e hidrovias são comprováveis nos Relatórios da Secretaria da Fazenda do Rio Grande do Sul (1905, 1910 e 1911), conforme Pereira (1996, p. 225).
outra natureza da ação governamental do PRR. Uma vez diagnosticado o gargalo representado pela
precariedade do sistema de transportes e decidida a prioridade do seu melhoramento para o
desenvolvimento do Estado, o Governo incorporou ao patrimônio público e passou a gerir, em
primeiro lugar, o porto de Porto Alegre, em 1913, depois, o porto de Rio Grande, em 1919 e,
finalmente, a Viação Férrea, em 1923. Em assim sendo, as receitas (ditas industriais) e as despesas
resultantes dessas atividades passaram a integrar o orçamento público do Estado.
É possível concluir, então, que os gastos extraordinários do Governo orientaram-se, por
um lado, no sentido de alterar a estrutura econômica do Estado, fomentando o desenvolvimento da
agricultura (das duas sub-regiões coloniais e da arrozeira) e, desse modo, executando o projeto
econômico alternativo ao pecuário-exportador que vigira durante do Império. E, por outro lado, ao
intensificar os melhoramentos planificados dos sistemas de circulação das mercadorias e ao
favorecer e diversificar as exportações, ele criou dois pólos de concentração onde os capitais
comerciais exportadores do Leste do Estado seriam os grandes beneficiados: o porto fluvial de Porto
Alegre, em primeiro lugar, e, depois, o marítimo de Rio Grande.
4. CONCLUSÕES
Considerando o anteriormente exposto, é possível concluir que os administradores do
PRR apresentaram uma conduta política extremamente particular na Primeira República. Para
começar, eles se legitimaram não pelo voto, mas pela eficiência administrativa, conforme destaca
Pinto (1986, p.25), pela moralidade nos negócios públicos, pela clareza e transparência das contas
do Estado, pela prática do orçamento equilibrado e por promoverem, através de políticas econômicas,
o bem-estar material e o progresso da sociedade. Essa listagem não deixa dúvida nenhuma quanto à
ideologia burguesa professada pelos republicanos gaúchos, muito avançada e bem intencionada
quando posta em confronto com as práticas dos demais partidos republicanos do Brasil. Os grupos
políticos tradicionais não necessitavam dessa busca de uma legitimação outra que a dos votos,
mesmo que as eleições fossem fraudulentas por toda a parte do País. Além disso, a classe
dominante tinha-se como a única detentora possível dessa legitimidade. O monopólio do poder
político pelo sistema coronelístico legitimava-se “naturalmente” na detenção da propriedade. A busca
de um novo tipo de legitimação proposto pelos positivistas não se reduziu a meras palavras, eles o
concretizaram durante os 37 anos em que estiveram ininterruptamente no poder, no Rio Grande do
sul (1893-1930). Tal legitimação não tradicional, que se fazia pela probidade e pela eficiência, era
uma forma “pura” de legitimação burguesa (TARGA, 1996, p. 86).
Eles conseguiram os seus objetivos através do exercício da ditadura. Essa foi a ditadura
que empurrou o Rio Grande do Sul em direção ao mundo urbano e industrial. O pequeno grupo de
positivistas precisou recrutar quadros fora dos espaços sociais controlados ou sob a influência da
classe dominante tradicional. Foi buscá-los nos segmentos rurais que permaneciam à margem da
dominação política dos coronéis da fronteira, criou seus próprios coronéis nos campos do Planalto
Oriental; apoiou-se nas populações das zonas de colonização que precisavam do poder público para
legalizar a propriedade da terra e cujo crescimento econômico impulsionou com a estrada de ferro;
absorveu uma pequena burguesia urbana que se encontrava politicamente disponível (FRANCO,
1962, p. 195); contrariamente ao resto dos partidos republicanos, consagrou a intervenção do Estado
na economia contra os princípios contemporâneos do laissez-faire (LINS, 1964, p. 190); ; fomentou o
desenvolvimento industrial, protegendo a indústria nascente; encampou o único porto marítimo do
estado e a rede ferroviária estadual, para só citar algumas das suas ações mais relevantes. Além
disso, deliberadamente, diante da crise da pecuária e das charqueadas do Sul do Estado, ele
promoveu a diversificação econômica, ganhando com isso mais argumentos para resistir às
demandas de privilégios por parte das classes tradicionais.
De tudo o que se depreende do anterior, é possível afirmar que todos os
comportamentos políticos empreendidos pelos positivistas estavam profundamente marcados pela
modernidade (TARGA, 1996, p. 88). Eles foram obrigados a isso, pois alijaram do poder os únicos
que “por direito natural” poderiam pretender a ocupação do espaço político. É preciso não esquecer o
contexto geral; essas práticas e idéias aconteciam na ambiência gerada pelo agrarismo brasileiro
da época e seu muito recente desvencilhamento das peias da escravidão. Houve, inegavelmente, um
imenso contraste entre a velocidade do projeto político e social do PRR e o marasmo político do
Brasil de então, pois a mesmice da prática política imperial continuava dominante pelo Brasil afora, à
parte o ordenamento jurídico do Estado de direito burguês implantado pela República (SAES, 1985),
que pairava sobre tudo.
Essa absorção política de novas classes sociais, absorção plural malgrado o
enquadramento autoritário, era um indício seguro da modernidade dos republicanos positivistas. Eles
acreditavam, conservadoramente, que o Mundo estaria para sempre dividido entre o capital e o
trabalho mas que sobre o capital e a propriedade recaía a responsabilidade social pela geração de
emprego e de renda dignos, assim como de fornecer educação e cuidar da saúde da população.
Pensavam na responsabilidade social do capital e da propriedade, pensavam em ordem e progresso.
Dentro desses princípios, os positivistas conceberam o Estado como estando acima dos
interesses de grupos e classes e com isso puderam construir uma postura que era radicalmente
diversa do uso brasileiro tradicional do espaço político, sempre utilizado para a satisfação dos
interesses da oligarquia tradicional de cada região. E se puderam, com esses argumentos, rejeitar
demandas das classes dominantes da região, puderam também destinar recursos para classes e
grupos emergentes que lhes serviriam de apoio ou de clientela política. Mas, sobretudo, ao
apresentarem à sociedade um Estado que era árbitro e que se sobrepunha aos interesses
particularistas, um Estado que geria o bem comum, o interesse de todos, eles “construíam” o discurso
do próprio Estado burguês, aquele que é neutro (POULANTZAS, 1977), que paira acima das classes
e que “realmente” incorpora o bem comum, o interesse de todos. Conforme assinala Targa (1996,
p.89) o Estado que os positivistas apresentaram à sociedade gaúcha não era mais o Estado dos
grandes proprietários de terras, não era mais o Estado dos que possuem os grandes patrimônios, não
era um Estado de alguns, era o estado de todos. Eles realizavam assim a apresentação clássica
burguesa do seu Estado como sendo o de todos . E mais, os positivistas não só defenderam em
discursos esse tipo de Estado, eles o praticaram, pois o ideário lhes era absolutamente necessário
para enfrentar a maior e mais importante parcela da classe dominante regional, que estava excluída
do poder, e para criar os seus próprios grupos de apoio. Ou seja, não só discursado, esse foi
(TARGA, 1996, p. 89) “um Estado burguês praticado”.
Isso pode ser ilustrado a partir do resgate de vários pontos derivados do que se examinou
especificamente neste trabalho.
No que diz respeito às políticas públicas, pôde-se constatar que o Executivo gaúcho
interveio pesadamente na economia, evidenciando que a participação ativa do Estado se mostrou
imprescindível nesta passagem do sistema escravista para o capitalista.
Se, durante o Império patrimonialista, o poder político emanava da oligarquia tradicional da
Campanha e se eram as atividades econômicas dessa oligarquia, mesmo estagnadas, que
permaneciam as mais importantes e protegidas pelo poder público da província, muito diverso era o
panorama no final da Primeira República, onde eram as novas classes sociais (agricultores e
comerciantes das sub-regiões coloniais; empresários arrozeiros; capitais comerciais exportadores)
que apareciam como sendo as beneficiadas pela ação estatal. Isso decorreu de uma ação deliberada
dos governantes republicanos. Ou seja, diagnosticada a crise da economia regional, o Governo do
Rio Grande do Sul colocou-se à frente do processo de crescimento econômico, estimulando-o
ativamente, formulando um projeto para o futuro da respectiva sociedade e utilizando a política
econômica como um meio de transformar tanto a economia quanto a sociedade rio-grandense. Com
esse propósito, utilizou o orçamento e a política fiscal como ingredientes fundamentais da sua
intervenção, buscando conciliar a concentração da riqueza com o atendimento de interesses
coletivos, – funcionando a política, nesse sentido, como um instrumento de redistribuição dos ônus e
dos benefícios da intervenção praticada. Tributou pesadamente as terras da pecuária, acabando com
os privilégios da oligarquia tradicional; reduziu a carga fiscal ou isentou de impostos o capital
mercantil; e privilegiou, nos seus gastos, tanto a pesquisa agronômica para os pequenos proprietários
quanto a construção de uma infra-estrutura de transportes no território por eles ocupado. E mais,
estatizou os dois portos importantes da região e a estrada de ferro, por considerar que a iniciativa
privada estava sendo, ou incapaz de empreeender, ou prejudicial aos interesses da sociedade
gaúcha como um todo. Desse modo, o Governo estadual não só removeu dos objetivos do Estado a
proteção exclusiva dos interesses da grande propriedade territorial – abandonando a conduta
patrimonialista –, como tambémo estimulou a reprodução ampliada do capital comercial e da classe
dos pequenos proprietários. Utilizou para tal duas justificativas extraídas da doutrina positivista: o
princípio da neutralidade da intervenção estatal e o do atendimento aos interesses coletivos. Em
suma, pode-se afirmar que o governo dos positivistas no Rio Grande do Sul utilizou a sua
capacidade de tributar como instrumento redistributivo e não simplesmente como forma de captação
de recursos, ao mesmo tempo em que, através da sua política fiscal (entendendo-se como tal o seu
poder de coletar tributos e de decidir quanto à alocação de recursos) buscou privilegiar – como se
depreende pelas prioridades aí implícitas – os interesses burgueses da sociedade sul-rio-grandense.
Apêndice Estatístico Tabela 1
Coeficientes dos resultados da receita arrecad ada e da
Despesa efetuada pelos estados brasileiros por decê nios: 1897-1936 coeficientes % da receita sobre o Total % da despesa sobre o Total
Estados Da Receita dos Estados da despesa dos Estados 1897-1906 1907-
1916 1917-1926
1927-1936 1897-1906 1907-1916 1917-1926
1927-1936
São Paulo 292,6 303,5 344,8 377,9 291,6 354,2 391,5 429,4 RS 62,8 80,4 125,0 143,5 53,4 70,7 115,4 111,9
Minas 106,1 133,9 149,2 157,1 99,7 122,8 124,8 162,7 Subtotal 461,5 517,8 619,0 678,5 444,7 547,7 631,7 704,0 Demais Estados
538,5
482,2
381,0
321,5
555,3
452,3
368,3
296,0
Total 1.000,0 1.000,0 1.000,0 1.000,0 1.000,0 1.000 ,0 1.000,0 1.000,0
Fonte:IBGE, 1939/1940. Série Estatísticas Retrospectivas vol.1. Repertório Estatístico do Brasil Quadros Retrospectivos - Finanças Públicas V – Receita Arrecadada e Despesa Efetuada pelos Estados: 2. Resultados por decênios – 1897-1936. Tabela 2 Índice de crescimento real da Receita arrecadada pe la União, pelo Estado do Rio Grande do Sul, pelo Estado de São Paulo e pelos demais Estados da Federação , em anos selecionados
Anos Rio Grande do Sul São Paulo Estados (*) União 1897 100 100 100 100 1900 117 98 106 114 1905 148 211 123 201 1910 229 130 171 252 1915 171 150 116 122 1920 163 150 80 127 1925 481 258 141 204 1930 832 410 196 275
(*) Exclusive RS e SP Base: 1897=100 Fonte:IBGE, 1939/1940. Série Estatísticas Retrospectivas vol.1. Repertório Estatístico do Brasil Quadros Retrospectivos - Finanças Públicas V – Receita Arrecadada e Despesa Efetuada pelos Estados: 2. Resultados por decênios – 1897-1936.
Tabela 3
Divisão do Total da Receita Pública Nacional (exceto receita dos Municípios)
Anos Rio Grande do Sul São Paulo Estados (*) União
1897 2,02 10,17 24,25 63,56
1901 1,95 9,95 20,91 67,19
1905 1,64 11,79 16,34 70,23
1910 2,10 6,02 18,85 73,02
1915 2,78 12,25 22,54 62,43
1920 2,77 12,82 16,32 68,09
1925 4,86 13,15 17,16 64,83
1930 5,98 14,85 16,89 62,28
Nota: (*) Exclusive RS e SP. Fonte:IBGE, 1939/1940. Série Estatísticas Retrospectivas vol.1. Repertório Estatístico do Brasil Quadros Retrospectivos – Finanças Públicas V - Receita Arrecadada e Despesa Efetuada pelos Estados: 2. Resultados por decênios - 1897-1936.
Tabela 4
Participação dos Estados do Rio Grande do Sul e de São Paulo na Receita e Despesa Total realizada pela U nião em anos selecionados
Receita Despesa Ano SP RS SP RS
1909 (p) 18,9 7,4 2,83 2,60
1909(o) 15,7 - - -
1914(p) 20,0 4,8 5,11 4,48
1914(o) 20,0 8,2 0,00 0,01
1921(p) 29,9 6,7 - 3,70
1921(o) 26,8 6,3 - 0,00
1924(p) 21,9 5,2 8,05 4,15
1924(o) 25,0 4,2 0,53 0,91
1925(p) 22,9 4,8 7,88 3,86
1925(o) 31,6 5,3 0,08 0,49
(o) em ouro (p) em papel
Fonte: Relatório do Ministério dos Negócios da Fazenda, 1926.
Tabela 5
Participação percentual dos grupos e subgrupos da Receita Total do Rio Grande do Sul, 1893-1929
Grupos e Subgrupos da Receita Anos
1893 1905 1914 1923 1929
A- Receita Ordinária 89,51 97,3 86,58 92,73 93,64
A-1. Receita dos Impostos 89,26 86,66 85,7 41,35 46,22
A-2. Receitas Industriais 0,25 0,91 0,88 51,38 46,88
A-3. Receitas Patrimoniais 0 0 0 0 0,54
B- Receita Extraordinária 10,49 12,43 13,42 7,27 6,36
C- Total (A+B) 100,00 109,73 100,00 100,00 100,00
Fonte dos Dados Brutos: Balanços das Receitas e Despesas do Estado do Rio Grande do Sul publicados nos Relatórios Anuais dos Secretários da Fazenda.
Tabela 6 Dimensão percentual de impostos selecionados na Rec eita Tributária do Rio Grande do Sul: 1901-1929.
(em percentuais)
Impostos Ano
Sobre
exportações Territorial Sobre
Transmissão de
Propriedade
Sobre Indústrias e Profissões
Sobre Consumo
Sobre Heranças e
Legados
Somas dos Impostos
Selecionados
1901 39,05 0,00 18,08 14,67 7,62 7,25 86,68 1902 42,02 0,00 16,03 13,01 7,25 7,24 85,54 1903 38,67 10,44 15,42 11,52 6,46 6,93 89,45 1904 32,77 17,64 13,94 12,69 7,45 6,22 90,71 1905 27,89 17,89 13,42 13,07 6,95 6,57 85,78 1906 29,47 16,03 15,20 12,17 6,83 5,81 85,51 1907 29,15 15,00 17,09 11,94 5,51 5,54 84,24 1908 25,98 14,54 15,92 12,48 4,54 5,87 79,34 1909 24,03 14,67 17,18 11,16 4,25 6,30 77,57 1910 23,22 14,23 16,51 11,14 5,91 5,44 76,45 1911 21,50 14,23 18,24 10,88 6,93 5,39 77,19 1912 22,59 12,93 19,29 10,07 7,29 6,06 78,23 1913 19,94 16,26 17,76 10,07 7,54 6,14 77,71 1914 16,46 19,34 16,06 13,25 7,31 6,21 78,63 1915 15,96 19,09 17,60 13,18 7,42 5,75 79,01 1916 13,97 16,58 18,50 11,60 8,21 7,86 76,71 1917 13,12 16,16 20,43 11,21 7,07 6,30 74,28 1918 14,54 15,26 22,63 11,12 8,57 6,16 78,28 1919 15,19 13,24 26,55 10,28 7,88 5,78 78,93 1920 12,19 15,32 24,44 12,65 7,87 5,78 78,25 1921 9,86 13,67 15,11 11,07 6,03 7,21 62,95 1922 13,45 14,54 16,91 15,14 9,97 5,17 75,18 1923 16,50 12,44 15,00 13,23 8,20 6,69 72,05 1924 13,19 9,03 17,36 9,39 6,24 5,36 60,57 1925 12,09 9,83 18,22 9,06 7,56 5,64 62,40 1926 9,51 10,26 13,50 9,06 13,95 4,36 60,64 1927 9,49 11,31 15,00 9,40 13,55 5,74 64,49 1928 12,45 9,76 14,37 8,27 11,64 4,00 60,48 1929 10,52 11,94 11,74 11,87 16,31 4,15 66,52 Fonte:RELATÓRIOS da Secretaria da Fazenda do Estado do Rio Sul, 1901-1929. Anuário Estatístico da Exportação: 1920-1941 (1942). Porto Alegre, IBGE/ Órgão Regional DEE.
Tabela 7 Estado do Rio Grande do Sul
Receita Tributária, Exportação e Renúncia Fiscal estimada do Estado do Rio Grande do Sul: 1904-1929
(Valores em contos de réis)
Fiscal Receita Imposto de
Imposto
Anos Exportações estimada Tributária Exportação Territorial
1904 57183 1354 8855 2902 1562 1905 56665 1447 8495 2369 1520 1906 66233 1732 9249 2725 1483 1907 72857 1980 9927 2894 1489 1908 74529 2104 10870 2824 1581 1909 77125 2089 13185 3168 1934 1910 81959 2209 13595 3157 1935 1911 81393 2239 14459 3109 2058 1912 104968 3035 16441 3715 2125 1913 108101 3366 17125 3414 2784 1914 79320 2616 15127 2490 2925 1915 89048 2810 15509 2476 2961 1916 92310 3433 17599 2459 2918 1917 161740 6408 20535 2693 3319 1918 165764 6069 22024 3202 3361 1919 215572 8399 26682 4054 3534 1920 197879 8041 25952 3163 3977 1921 214959 8786 32960 3249 4507 1922 234071 9774 31554 4246 4588 1923 311151 13468 34723 5728 4321 1924 413942 17963 52690 6951 4759 1925 473997 20420 58635 7089 5764 1926 347445 14875 62193 5914 6380 1927 415916 13375 64564 6129 7304 1928 580723 25347 77789 9682 7592 1929 540793 23522 89854 9450 10731
Fonte: RELATÓRIOS da Secretaria da Fazenda do Estado do Rio Grande do Sul: 1904 a 1929.
ANUÁRIO ESTATÍSTICO DA EXPORTAÇÃO, 1920-1940 (1942). Porto Alegre, IBGE/Órgão Regional- DDE.
Tabela 8
Participação percentual das categorias de Impostos Indiretos e Diretos e de seus subgrupos
no total da Receita de Impostos do Estado do Rio Grande do Sul - 1893-1929
Categorias e subgrupos da Anos
Receita dos Impostos 1893 1905 1914 1923 1929
A. Impostos Indiretos 69,63 42,18 35,6 37,72 38,12
A-1. Ligados às Exportações 53,85 31,2 24,9 27,14 19,54
A-2. Ligados ao Consumo 10,73 7,51 7,79 8,2 16,31
A-3. Outros Impostos Indiretos 5,05 3,47 2,91 2,38 2,27
B. Impostos Diretos 30,16 51,32 54,87 47,37 39,7
B-1. Sobre a propriedade 20,45 38,25 41,62 34,14 27,83
B-2. Sobre o Capital e os Rendimentos 9,71 13,07 13,25 13,23 11,87
C. Subtotal 99,79 93,5 90,47 85,09 77,82
D. Outros Tributos (1) 0,21 6,5 9,53 14,91 22,18
E. Receitas dos Impostos 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00
Fonte dos Dados Brutos: Balanço das Receitas e Despesas do Estado do Estado do Rio Grande do Sul publicado nos Relatórios Anuais dos Secretários da Fazenda.
(1) Incluem-se aí alguns tributos não classificáveis nas categorias analisadas, incluindo taxas e
impostos com aplicações específicas.
(2) As participações elevadas do Item Outros Tributos devem-se, fundamentalemente, a algumas taxas (Taxa Escolar e Taxa Profissional) e também a alguns impostos incluídos na década de 1920
com vinculação específica com a conservação da infra-estrutura de transportes.
Tabela 9
Taxa geométrica média de crescimento real, por funç ões e programas selecionados, das despesas do Estado do Rio Grande do Sul, 1893-1929. (Em percentuais) Discriminação 1893-1897 1896-1912 1912-1916 1916-1929 Promoção do Desenvolvimento Econômico-GTD
181,51 8,24 (29,16) 29,88
Agricultura 161,69 15,76 (33,96) 6,16
Indústria e Comércio (11,71) 3,76 (2,89) 5,25
Infra-estrutura e serviços 336,52 5,23 (26,24) 34,20
Transportes - 5,40 (25,98) 34,08
Rodoviário - - (29,16) 15,75
Ferroviário - - - -
Hidroviário - - (12,66) 25,96
Diversas obras públicas - (8,11) - -
Enegia e Recursos Minerais (11,98) (8,80) (17,45) -
Saneamento Público - - - -
DESPESA GERAL DO ESTADO 0,78 4,17 (7,72) 13,09
Fonte dos Dados Brutos: Balanço das Receitas e Despesas do Estado do Rio Grande do Sul Publicado nos Relatórios Anuais dos Secretários da Fazenda.
Nota: Deflator: índice de preços 1912=100 (LOVE, 1982; Apêndice C, Coluna C1).
Tabela 10 Gastos por funções e programas selecionados anualmente do Estado do Rio Grande do Sul, 1893-1929.
(Em réis de 1912)
Discriminação 1893 1897 1912 1916 1929 Promoção do Desenvolvimento Econômico-GTD
23.792.992 1.505.453.092 4.940.612.109 1.244.317.942 37.244.111.710
Agricultura 5.348.736 250.464.288 2.248.368.368 438.068.781 952.611.714
Indústria e Comércio 15.193.300 9.231.625 16.059.825 14.284.604 27.765.524
Infra-estrutura e serviços 3.430.956 1.245.757.179 2.676.183.916 791.964.557 36.263.734.472
Transportes - 1.199.204.480 2.637.965.044 791.724.449 35.850.357.299
Rodoviário - - 1.657.024.042 417.224.142 2.794.062.431
Ferroviário - - - - 25.535.222.201
Hidroviário - - 643.583.998 374.500.307 7.521.069.667
Diversas obras públicas - 1.199.204.480 337.357.004 - -
Energia e Recursos Minerais 3.430.956 2.059.570 516.950 240.108 -
Habitação e Urbanismo - - - - 413.377.173
Saneamento Público - - - - -
Comunicações - 44.493.129 37.701.922 - -
DESPESA GERAL DO ESTADO 9.680.692.459 9.986.074.875 18.417.606.506 13.353.890.678 66.050.020.122
Fonte dos Dados Brutos: Balanço das Receitas e Despesas do Estado do Rio Grande do Sul, publicado nos Relatórios Anuais dos Secretários da Fazenda.
Nota: Deflator: índice de preços 1912=100 (LOVE, 1982; Apêndice
C, Coluna C1). Tabela 11
Percentuais de participação das funções e dos progra mas no total dos gastos com a promoção do desenvolvimento econômico (GTD) do Rio Grande do Sul, 1893-1929.
(Em percentuais)
Discriminação 1893 1897 1912 1916 1929 Promoção do Desenvolvimento Econômico-GTD
100,00 100,00 100,00 100,00 100,00
Agricultura 22,48 16,64 45,51 35,21 2,56
Indústria e Comércio 63,86 0,61 0,33 1,15 0,07
Infra-estrutura e serviços 14,42 82,75 54,17 63,65 97,37
Transportes - 79,66 53,39 63,63 96,26
Rodoviário - - 33,54 33,53 7,50
Ferroviário - - - - 68,56
Hidroviário - - 13,03 30,10 20,19
Diversas obras públicas - 79,66 6,83 - -
Enegia e Recursos Minerais 14,42 0,14 0,01 0,02 -
Habitação e Urbanismo - - - - 1,11
Saneamento Público - - - - -
Comunicações - 2,96 0,76 - -
Fonte dos Dados Brutos: Balanço das Receitas e Despesas do Estado do Rio Grande do Sul, publicado nos Relatórios Anuais dos Secretários da Fazenda.
Gráfico 1
Receita arrecadada no Rio Grande do Sul por esfera administrativa: União, Estados e Municípios - 1901-1913
0
10
20
30
40
50
60
70
1901 1902 1903 1904 1905 1906 1907 1908 1909 1910 1911 1912 1913
Fonte: Relatório da Secretaria da Fazenda do Estado do Rio Grande do Sul, 1913.
perc
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fera
s ad
min
istr
ativ
as
Federal
Estadual
Municipal
Gráfico 2
Receita e Despesa Federal realizada no Estado de São Paulo- 1889-1914
0
10000
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30000
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50000
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80000
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110000
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140000
150000
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170000
1889
1890
1891
1892
1893
1894
1895
1896
1897
1898
1899
1900
1901
1902
1903
1904
1905
1906
1907
1908
1909
1910
1911
1912
1913
1914
Fonte:Relatório da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo, 1916.
em c
onto
s de
réi
s
Receita Despesa
Gráfico 3Índice de crescimento real do valor das exportações, da Receita Tributária e da renúncia fiscal do
Estado do Rio Grande do Sul (1904-1929)
0
100
200
300
400
500
600
1904 1905 1906 1907 1908 1909 1910 1911 1912 1913 1914 1915 1916 1917 1918 1919 1920 1921 1922 1923 1924 1925 1926 1927 1928 1929
Receita
Exportação
Renúncia
Fonte dos dados brutos: RELATÓRIOS da Secretaria da Fazenda do Estado do Rio Grande do Sul - 1904-1929. ANUÁRIO ESTATÍSTICO DA EXPORTAÇÃO 1920-1941 (1942). Porto Alegre: IBGE/Órgão
Nota: Índice com base em 1904=100
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Negócios da Fazenda José Barboza Gonçalves. Porto Alegre, 1907 RELATÓRIO apresentado ao Presidente do Estado do Rio Grande do Sul, pelo Secretário de Estado dos
Negócios da Fazenda Alvaro Baptista. Porto Alegre, 1909. RELATÓRIO apresentado ao Presidente do Estado do Rio Grande do Sul, pelo Secretário de Estado dos
Negócios da Fazenda Candido José de Godoy. Porto Alegre, 1910. RELATÓRIO apresentado ao Presidente do Estado do Rio Grande do Sul, pelo Secretário de Estado dos
Negócios da Fazenda Candido José de Godoy. Porto Alegre, 1911. RELATÓRIO apresentado ao Presidente do Estado do Rio Grande do Sul, pelo Secretário de Estado dos
Negócios da Fazenda Octávio F. da Rocha. Porto Alegre, 1913. RELATÓRIO apresentado ao Presidente do Estado do Rio Grande do Sul, pelo Secretário de Estado dos
Negócios da Fazenda Antonio Marinho Loureiro Chaves. Porto Alegre, 1920. RELATÓRIO apresentado ao Secretário de Estado dos Negócios da Fazenda pelo Diretor Geral do Tesouro do
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