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Cadernos de Resumos
De 9 a 13 de maio de 2017 Faculdade de Letras
UFMG
Caderno de Resumos ‐ 2
Conferências
Claus Clüver (Indiana University, EUA) Título: Textos intermídias e problemas da tradução: os ‘ideogramas’ concretos brasileiros Resumo: Antes do acordo de nomear seus poemas experimentais de “poemas concretos” os poetas paulistanos que nos anos 1950 publicaram seus trabalhos na revista noigandres costumavam chamá‐lhes de “ideogramas”. Uma das vozes mais importantes orientando o seu trabalho foi a de Ezra Pound, poeta que tinha publicado o longo ensaio de Ernesto Fenollosa sobre o ideograma chinês e que tinha usado esse termo também para aspectos de seus próprios Cantos. Os ideogramas concretos brasileiros eram textos intermídias que exploraram a aparência visual de seu material altamente reduzido e também as possibilidades de sonorização assim conseguidas, muitas vezes resultando em “ideogramas verbivocovisuais”. Ler tais textos implica cultivar novas técnicas de leitura. Traduzir tais textos, que dependem tanto de suas qualidades materiais e de sua gramática e sintaxe espaciais, para outro idioma occidental parece ser uma tarefa desafinante — e consequentemente vários tradutores têm enfrentado tal desafio. Este ensaio pretende analisar as estruturas de alguns ideogramas concretos brasileiros, explorar as razões porque os poetas ligaram seus trabalhos, via Fenollosa‐Pound, com o ideograma chinês, e estudar como tradutores tem os convertido para seu próprio idioma de maneiras mais ou menos convincentes.
Irina Rajewsky (Freie University, Alemanha) Título: Intermediality and Transmediality: Separating the Fields Resumo: Current research in processes of medial exchange, entanglement, or transformation abounds in overlapping terms referring to relations between arts or media. 'Intermediality' has certainly been one of the most successful and prevalent terms to emerge from the respective debates of the past 25 years. As a term and research paradigm it gained momentum in the 1990s and has ever since resonated in widely diverse disciplinary contexts. However, recent years have also seen the rapid rise of another term germane to this overall conceptual field, namely 'transmediality'. Currently, the latter appears to be settling the race in its favour. Some publications consider the success of the term transmediality as an invigorating paradigm shift from 'inter‐' to 'transmediality'. However, others are under the impression that the issue of the debate is simply to launch a new 'buzzword' in the wake of the frequently and speedily proclaimed 'turns' in the humanities. "Nothing appears to be more boring than yesterday's paradigm", as Jens Zwernemann (2007) states. He thus raises the question, whether 'transmediality' is but a new catchphrase applied to substitute the seemingly worn 'intermediality'. The success of the new terminology has doubtlessly been furthered by the international eminence of 'transmedia storytelling' as a concept and global cultural (as well as economically lucrative) practice. It should be kept in mind, however, that the terminology ('transmedia', 'transmedial', or 'transmediality') asserted itself both within and outside the US‐American debate in a variety of academic fields. This has resulted in different uses and notions of 'transmedia/l/ity' as terms or research perspective. On the one hand, this holds true for the application of 'transmediality' or related terms (e.g., transmedialization, transmediation) as coined within the framework of the intermediality debate. On the other hand, also newly established and increasingly flourishing research areas such as 'transmedial narratology' have been utilising the terminology approx. since 2004/2005. Approaches to transmedia storytelling and transmedial narratology are linked by a significant factor: The terminology itself (i.e., 'transmedia'/'transmedial'/'transmediality') has thus far hardly been scrutinised in either field. Lacking controversy, pertinent publications obviously see no need to disambiguate the respective terminology. They apparently perceive it as sufficiently clarified or self‐explanatory. "Transmedia, used by itself, simply means 'across media'", as Henry Jenkins put it in 2011. However, from the intermediality debate’s perspective it is not quite that simple. Inter‐ and transmediality are obviously two closely related categories which have become even more intertwined in the context of recent theoretical discourse. Against this backdrop, the crucial question remains how inter‐ and transmediality relate to or can be defined against one another. My paper will discuss this question with a focus on the 'intermediality‐transmediality‐divide' from a narratological point of view. I will show that and why it is, indeed, heuristically beneficial to differentiate between intermediality and a transmedially‐oriented research perspective.
Caderno de Resumos ‐ 3
Véronique Plesch (Colby College, EUA) Título: The Wall and the Skin: Writing and Rewriting on a Border Zone Resumo: Walls and skin act as boundaries but also as surfaces that can receive marks, even though they are not intended as the support for texts. The research I have been conducting for several years now concerns the graffiti that were inscribed on the pictorial bodies of saints. As has been theorized by psychoanalysts (cf. ANZIEU, Le moi‐peau) and anthropologists (cf. GELL, Wrapping in images: tattooing in Polynesia), the skin acts as a border for the body and a place where messages from the outside and from the inside can be inscribed: translating the impact of and reactions to the outside world – indeed, communicating between the inside and the outside. In my lecture, I will focus on the practice of tattooing, while also considering enlightening parallels between tattooing and graffiti and between the skin and the wall, I will be reflecting upon the kind of exchanges that take place on (in) the skin, how this border is crossed, and for what purposes and results.
Walter Bernhart (Graz University, Áustria) Título: From Orpheus to Bob Dylan: the story of “words and music” Resumo: The story of the relationship between words and music is a fascinating one of changing tendencies to either convergence or distance between the two forms of communication, depending on whether aesthetic dispositions and cultural conditions favour the merging or the drifting apart of both media. Thus, “syncretistic” and “separatist” phases in the development of the arts can be observed, as manifested, in Western cultural history, by the impressive span of intermedial interaction extending from early mythical origins to most current contemporary manifestations. The great variety of forms of interrelationship between words and music, as systematized by “word and music studies”, can be viewed from the syncretistic vs. separatist perspective, and after a general presentation of the typological framework of “words and music”, the talk focuses on the Western song tradition from this perspective, discussing such distinctions as “interpretive” vs. “non‐interpretive” songs, or “text‐setting” vs. “socio‐cultural activity”.
Mesas Redondas
Anelise R. Corseuil (UFSC)
Título: Adaptações que viajam: a recriação de espaços e geografias em Julieta (Pedro Almodóvar) Resumo: Narrativas literárias têm sido adaptadas a contextos e meios diversos, contextos culturais e históricos em mídias que comumente extrapolam o cinema e a televisão. As adaptações que viajam no tempo e no espaço, cruzando fronteiras culturais e históricas, como, por exemplo, Abril despedaçado e Rei Lear, revelam processos de exclusão, hibridização e apropriação envolvidos em textos adaptados. Interculturação, transnacionalidade e hibridização (HUTCHEON, Uma teoria da adaptação) permeiam as adaptações de narrativas que viajam de um lugar a outro, sugerindo um campo rico de pesquisa, tanto para entendermos o contexto de origem como o de recepção. A adaptação de Julieta (2016) de Pedro Almodóvar baseia‐se em três contos de Alice Munro “Ocasião”, “Daqui a pouco” e “Silêncio”, reunidos em seu livro de contos Fugitiva (2006). Julieta nos permite uma rica análise dos processos de adaptação, que envolvem apropriações e estéticas marcadamente opostas, de um contexto canadense para um cenário espanhol, realçadas pela estética de Almodóvar. O trabalho busca analisar comparativamente o filme Julieta com os contos adaptados de Munro, o processo de transnacionalização e hibridização do filme adaptado e a importância da estética de Almodóvar neste cenário de transformações.
Caderno de Resumos ‐ 4
André Melo Mendes (UFMG) e Mirian Sousa Alves (CEFET‐MG) Título: O Pacto em Grande Sertão: traduções nas artes plásticas, quadrinhos e televisão Resumo: Sessenta anos atrás, foi lançado um dos livros ais importantes da literatura brasileira: Grande Sertão: Veredas, escrito pelo mineiro Guimarães Rosa. Ao longo da sua história, essa obra inspirou inúmeros trabalhos críticos e traduções para outras mídias. Para muitos, obra “intraduzível”, Grande Sertão: Veredas sempre representou um desafio para aqueles que se atreveram a adaptá‐la para outras mídias. Apesar do fracasso de muitos, outros tiveram melhor sorte, como as 71 imagens que Arlindo Daibert criou nos anos 1980, a famosa minissérie da Globo (1985), veiculada como parte das comemorações da emissora, e a premiada adaptação para os quadrinhos realizada por Eloar Guazzelli e Rodrigo Rosa em 2014. Nessas transcriações da obra de Rosa, pode‐se afirmar que os artistas/criadores/produtores conseguiram resultados de indiscutível qualidade. Mesmo em trechos difíceis, como a representação do Pacto com o Diabo realizado pelo protagonista da história, o jagunço Riobaldo. No livro, não é possível afirmar com certeza se houve ou não o pacto e essa tensão estende‐se por toda a narrativa, influenciando decisivamente a vida do jagunço. Fato é que após o suposto pacto, ele retorna ao acampamento e assume a chefia do grupo de jagunços, liderando‐os até conseguirem a tão desejada vingança, matando Hermógenes. Nessas três obras citadas, esse momento é muito bem‐sucedido e merece uma análise mais aprofundada. Neste trabalho interessa‐nos especialmente analisar como um dos pontos de maior tensão na história, o momento em que o personagem principal, Riobaldo, tenta fazer um pacto com o Diabo, foi traduzido nessas diversas mídias, procurando perceber similaridades e afastamentos e que ganhos e perdas essas transcriações trouxeram ao texto rosiano.
Celina Moreira de Mello (UFRJ)
Título: Berlioz, música descritiva e escrita romanesca Resumo: Serão discutidas questões relativas a conceitos e modos de recortar objetos de pesquisa na área de Letras, suscitadas pelo projeto EST.RE.LA – Estudo das relações entre literatura e arte:Berlioz romancista?, que desenvolvo atualmente na Universidade Federal do Rio de Janeiro, apoiado com bolsa de produtividade do CNPq e que propõe, como provocação, um Berlioz romancista. No contexto da fraternidade das artes celebrada pelos românticos franceses, na emulação e na rivalidade, destaco a dupla persona de Hector Berlioz que se fundamenta em um exercício de criação que integra a composição de música descritiva e uma escrita romanesca. Essa leitura é complementada por alguns resultados de pesquisa de fontes realizada na Hemeroteca da Fundação Biblioteca Nacional, por ocasião de um estágio de capacitação.
Eduardo Campolina (UFMG)
Título: A técnica nas artes nos séculos XX/XXI: John Cage e a música, Gerhard Richter e a pintura Resumo: O processo criativo depende fundamentalmente de um saber fazer. Esse saber fazer, desde as origens da civilização ocidental na Grécia antiga, foi associado à téchne, que com o passar do tempo fixou sua tradução no vocábulo “técnica”. Um estudo do desenvolvimento do conceito de técnica na filosofia ocidental permite compreendê‐lo como uma superposição de categorias, várias delas já participando de suas origens gregas, como conhecimento (epistéme), racionalidade (lógos), precisão (akribeia), inspiração (theíamoîra). O século XX assistiu a uma transformação radical do fazer artístico devido à proposta conceitual inaugurada por Marcel Duchamp, que teve como consequência uma total revisão e ampliação do conceito de técnica. Encontramos nos séculos XX/XXI criadores que apresentam uma técnica nitidamente afetada por essa transformação, apesar de ainda poderem ser estudados pelas categorias que inauguram o conceito na Grécia antiga. O foco da presente comunicação está na análise de aspectos de obras e do pensamento de dois criadores – John Cage na área da música, e Gerhard Richter na área das artes visuais – na tentativa de compreender como se organiza a técnica de cada um deles, como se articulam os componentes básicos que as constituem, e em que aspectos podem ser traçados paralelos assim como oposições em seu modo de operação. Cage abala o ambiente musical na década de 1950 por introduzir a manifestação do acaso em suas obras. Ele radicaliza, colocando em xeque a obra enquanto produto, e a técnica enquanto meio. Gerhard Richter, nascido em 1932 e ainda vivo, trabalha com o acaso e precisão lado a lado. A técnica de “raspagem”,
Caderno de Resumos ‐ 5
inaugurada em 1979, potencializa o acaso; as pinturas sobre fotografia lidam com precisão e imprecisão ao mesmo tempo. Colocar lado a lado esses dois criadores pode ser um meio de ampliar a compreensão da técnica nas artes contemporâneas.
Élcio Cornelsen (UFMG) Título: Imagem e memória da shoah no cinema, ou imagem e memória da ditadura no cinema Resumo: Imagem e imaginação: podemos partir desses conceitos para pensarmos sobre a representação da violência em geral e, especificamente, sobre a representação fílmica da violência. A shoah – termo hebraico que significa catástrofe, e que é utilizado em substituição a “holocausto”, termo grego associado à noção de sacrifício – é considerada nos estudos sobre a violência como um evento‐limite, a catástrofe por excelência. Por seu transbordamento, a shoah impõe desafios à representação. Nesse sentido, o cineasta francês Claude Lanzmann marcou época com o filme que leva o título de Shoah, um mega‐documentário de 10 horas de duração, que tem como estrutura básica a entrevista e o relato testemunhal. Por assim dizer, Lanzmann propõe com seu filme uma recusa às imagens da violência, um gesto contrário ao chamado “mal de arquivo”. Nossa contribuição visa, pois, a analisar tal recusa às imagens da violência, estética e eticamente empregada no documentário de Claude Lanzmann, e que se expressa paralelamente a outros filmes de ficção como Kapo (1959), de Gillo Pontecorvo, Holocaust (1978), de Martin Chomsky, e Schindler’s list (1992), de Steven Spielberg, além do documentário Nuit et brouillard (1955), de Alain Resnais.
Elisa Amorim (UFMG)
Título: Ficção e fotografia: breve reflexão a partir das obras de Atxaga, Cortázar e Rulfo Resumo: Este trabalho propõe a análise de possíveis diálogos entre fotografia e ficção, desde a presença da imagem como elemento materialmente interposto ao texto literário ou como objeto de descrição verbal. Em qualquer um desses contextos, a foto permite que se tracem articulações entre ficção e realidade, especialmente quando se apresenta como um testemunho do passado que desencadeia processos de rememoração. Por outro lado, a imagem fotográfica, contrariando a função que lhe é historicamente atribuída de testemunho do real, também pode ser aquilo que desestabiliza a narrativa e rompe com a verossimilhança. A partir de uma perspectiva teórica que dialoga com o pensamento de Joan Fontcuberta, Walter Benjamin e Didi‐Huberman, pretende‐se analisar de forma comparativa a presença ou interferência da fotografia em obras de Bernardo Atxaga, Julio Cortázar e Juan Rulfo.
Flavio Barbeitas (UFMG)
Título: Ainda restará essa “flor”? Representações contrastantes da música em duas obras literárias Resumo: Presto con fuoco é o título de um romance do italiano Roberto Cotroneo, centrado na figura de um grande pianista de concerto que se vê às voltas com a descoberta de um possível manuscrito da Balada nº4, de Frédéric Chopin. Afora as questões diretamente ligadas ao desenvolvimento de um enredo que remotamente guarda características do romance policial, o livro se revela muito mais como uma longa e articulada reflexão sobre a música, particularmente sobre a vida mental e o modo de expressão que tipificam o músico concertista. Nesse sentido, é inevitável o seu enquadramento no tipo de obra literária que procura se aproximar, abordar, descrever, traduzir o que é próprio de outra linguagem artística. A “música” que emerge do romance de Cotroneo, embora sensível e inteligentemente tratada, permanece fiel àquela condição do inapreensível e do inefável tão cara à tradição estética ocidental. Sem propriamente refutar ou desprezar essa condição nuclear, mas ambientando‐a numa contemporaneidade que lhe é espantosamente hostil, um livro de memórias, escrito pela oboísta (e também jornalista) Blair Tindall, Mozart in the jungle: sex, drugs and classical music, já transformado em série televisiva, demonstra o que pode restar da especializada e refinada prática musical erudita ao chocar‐se com a impiedosa engrenagem do art business e com a teia de vícios que obscurece o já normalmente velado mundo das orquestras sinfônicas. A comunicação proposta, estimulada também pelo cruzamento suplementar e produtivo das linguagens
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artísticas e midiáticas implicadas, pretende analisar a especificidade, o sucesso e os limites das representações do universo musical nas referidas obras.
Flora Sussekind (Fundação Casa de Rui Barbosa/UNIRIO – FCRB)
Título: Observações sobre formas de presença da escrita em cinco artistas brasileiros contemporâneos: Elizabeth Jobim, Gustavo Speridião, Joana Cesar, Luiz Ernesto e Nuno Ramos Resumo: Esta comunicação visa observar a expansão da presença da escrita no trabalho de alguns artistas plásticos brasileiros: seja pela presença textual como segmento em diálogo interno com a figura, como em Luiz Ernesto; seja pela inscrição despedaçada, pelo aviso urgente, mimetizando propositadamente a ocupação dos muros das cidades, como acontece na pintura de Gustavo Speridião; seja pela invenção de uma escrita pictórica em código próprio, como faz Joana Cesar, ou ainda Elizabeth Jobim. Isso é observado sem que a escrita se apresente literalmente, mas como intensificação de um modo temporal de percepção de uma junção metódica de telas, de um método já definido pela própria artista como ideogrâmico. Almeja‐se, ademais, uma nova incursão na obra de Nuno Ramos, destacando desta vez, em alguns de seus trabalhos, a tensão entre palavra falada e inscrita.
James Cisneros (Université de Montréal)
Título: Media nostalgia in Latin American cinema Resumo: This paper analyzes how emerging digital filmmaking practices are remediating earlier forms of audiovisual expression. In our approach to this “media nostalgia,” a term we borrow from Laura Marks and Katharina Niemeyer, we will discuss contemporary Latin American films that have placed the imitation of analogical photographs, video or television images at the center of their narrative or aesthetic frameworks. More specifically, we will situate these films’ deliberate focus on recuperating outdated images within regional debates on social and political memory, including ongoing discussions on the specific role of media in retaining and transmitting the past. Several recent films – including Pablo Larraín’s trilogy on the Chilean dictatorship (2008‐2012), A cidade é uma só?, by Adirley Queirós (Brazil, 2011), and Esteban Sapir’s La antenna (Argentina, 2007) – present tacit or explicit comments on several issues relating to digital media’s effect on memory: on the manipulability of the archive, once its contents are translated into digital code; on the waning of the analogical index, often read in political terms as the physical trace of the missing object; and on the growing difficulty to distinguish an original photograph from its digital imitation, with an implied loss of historicity for both images. In analyzing how each film frames these issues, we will ask, using terms identified by Svetlana Boym, whether the media nostalgia being displayed is reflexive or restorative.
Júlio Castañon Guimarães (Fundação Casa de Rui Barbosa)
Título: Escrita com forma e cor na poesia concreta Resumo: Proponho discutir como a escrita da poesia concreta implica o recurso a elementos provenientes de outros campos que não o literário, não somente como referência, mas como componentes da elaboração dos poemas. Esse aspecto foi com frequência exposto nas várias abordagens programáticas do movimento. Interessa, portanto, verificar como sua apropriação se faz pela intervenção em diferentes dados que entram em jogo nessa elaboração. Das artes plásticas à música, passando pelo projeto gráfico, o poema concreto – muitas vezes efetivamente um poema‐quadro – constrói tipograficamente objetos que de variadas formas se relacionam com essas práticas. A noção de intervalo, bem como a noção de suporte, tal como expostos por Anne‐Marie Christin, constituem uma possibilidade de enfoque dessas questões na escrita tipográfica do concretismo.
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Luci Collin (UFPR) Título: A transmissão da música na poesia de Moya Cannon Resumo: A premiada poeta irlandesa Moya Cannon (Dunfanaghy, 1956), com uma produção que inclui cinco coletâneas de poesia até o presente momento, vem recebendo constante atenção da crítica e do público leitor. Sua poesia tem sido amplamente comentada, sobretudo em termos da relação que estabelece com os estudos de ecocrítica e história. Contudo, entre as perspectivas críticas mais contempladas ou mesmo entre e as características mais usualmente apontadas como marcantes da poesia de Cannon, pouco se aprofunda no fato de essa poesia apresentar uma intensa relação com a música, desde a expressão musical na Natureza, a transmissão ancestral de ritmos e canções ao longo da história da coletividade humana até a presença do fenômeno musical na contemporaneidade. Assim, para além da música em termos de ‘inspiração’ temática, o trabalho pretende investigar como a música alimenta a sensibilidade poética de Cannon, como o tratamento da linguagem poética é afetado ou balizado por essa relação e, sobretudo, como a poeta pensa e se apropria desse espaço de intermidialidade e trânsito entre as linguagens musical e literária reconfigurando‐o enquanto “espaço de transmissão” de essencialidades poéticas.
Luciana Monteiro de Castro Silva Dutra (UFMG)
Título: A canção como hipertexto Resumo: O trabalho desenvolvido em nossa pesquisa busca a realização de possíveis releituras da canção de câmara brasileira, visando a percepção de potenciais conectivos deste gênero musical com finalidades de realização de sua performance. Com bases teóricas no dialogismo bahktiniano e em teorias de rede, este processo se desenvolve por meio de abertura das obras ao reconhecimento de suas relações inter e hipertextuais, desde as leituras das relações texto‐música às mais diferentes leituras criativas que viabilizam conexões do texto e da música ao contexto, em suas variantes de espaço, tempo, mídias e agentes. Nesta busca, podemos ser capazes não apenas de fundamentar uma performance nas análises de relações entre texto literário / texto musical, mas nas conexões destes meios constitutivos da obra com outros externos a ela, associados às artes cênicas, às artes plásticas, à elaboração de novas narrativas, às colagens interartes e mesmo às tecnologia da edição e transcrição musical.
Márcia Arbex (UFMG)
Título: Cruzamento de olhares no estúdio do artista: Michel Butor, Man Ray e Olivier Debré Resumo: Este trabalho pretende investigar a relação de justaposição da imagem fotográfica e do texto poético nos álbuns fotoliterários de Michel Butor: L'Atelier de Man Ray (2005) e Dix regards sur l'atelier désert d'Olivier Debré (2000). Nesses livros há um intenso cruzamento de olhares, acentuado pela disposição em díptico, criando uma relação especular entre as mídias que vai além da ilustração, da transposição ou da descrição. Embora a imagem seja geradora do texto, nenhuma hierarquia se instaura entre eles; ao contrário, o texto pode se tornar ilustração e a fotografia, legenda, num processo de contaminação transgressiva. É no intervalo entre o visto e o lido, no percurso do olhar entre as duas mídias, que se monta e se desmonta o sentido.
Maria do Carmo Veneroso (UFMG) Título: Tudo, no mundo, existe para resultar em um livro, ou diálogos e cruzamentos entre obras enciclopédicas Resumo: Neste trabalho serão privilegiadas as relações interartes, abrangendo também atravessamentos transdisciplinares entre as artes e outras disciplinas, tendo como principal referência as relações entre palavras e imagens em obras enciclopédicas. Serão estabelecidos diálogos entre livros de artista, como a Enciclopédia Visual, de Wlademir Dias Pino e João Felício dos Santos, e a Encyclopedia, contemporary art in the world (2010), de Jean‐Benoît Lallemand, pertencentes à Coleção Especial de Livros de Artista da Biblioteca Universitária da UFMG, e livros antigos, considerados “raros” ou “especiais”, como a Encyclopédie de Diderot
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e d’Alembert, pertencente à Coleção de Obras Raras e Especiais da mesma Biblioteca. O desejo enciclopédico de apreender todo o conhecimento do mundo pode ser aproximado da ambição não alcançada, de Stéphane Mallarmé, de realizar um livro absoluto. O poeta acreditava “que tudo, no mundo, existe para chegar a um livro”. Porém, essa vontade de conter todo o conhecimento traz em si a própria impossibilidade de fazê‐lo. Neste trabalho, o conhecimento enciclopédico será abordado como uma tentativa do ser humano de abarcar o conhecimento universal, focalizando o enciclopedismo em livros de artista, por artistas que criam enciclopédias como um desejo utópico de abarcar o conhecimento universal e por aqueles que, inversamente, questionam essa possibilidade.
Márcio Seligmann‐Silva (UNICAMP) Título: “Fotografia é a destruição da história”: Flusser e a vitória da memória sobre a história na era das imagens técnicas Resumo: Para Vilém Flusser as imagens técnicas são como “aspiradores de pó” que sugam toda a história: elas aceleram o tempo e transformam o todo em uma imagem congelada. Trata‐se para ele de uma imagem “mágica” e da realização de uma redenção judaico‐cristã. As imagens técnicas permitem a superação do que ele via como a clausura do mundo histórico, marcado pela textolatria. Elas permitem remontar o universo a partir de sua decomposição imagética, como se as imagens (constituídas de “calculi”, pixels) fossem pedras de lego. O trabalho apresentará essa escatologia mística judaica de Flusser sobre as imagens mágicas redentoras, levando em conta também o seu credo (que ele também considerava judaico) segundo o qual, ao invés de pensarmos na imortalidade das almas, deveríamos apostar que “sobreviveremos na memória dos outros”. Que memória seria essa e o que significaria sobreviver em um mundo pós‐histórico, esvaziado de sua visão temporal, são algumas das questões que teremos de enfrentar.
Marcio Serelle (PUC‐MG)
Título: Crítica da adaptação Resumo: O problema da crítica da adaptação já aparece esboçado pelo menos desde a década de 1940, no texto “Adaptation, or the cinema as digest”, de André Bazin. Nele, o teórico coloca em questão qual seria o campo disciplinar de um crítico que se dispusesse a analisar uma “obra” formada por um construto de diferentes formas de arte (no caso, o romance e suas adaptações teatral e fílmica). Vários estudiosos da adaptação (Stam, Xavier, Hutcheon, entre outros) têm proposto caminhos críticos, por meio, por exemplo, do dialogismo, do cotejo feito a partir de categorias narratológicas ou de modos de engajamento dos leitores/espectadores/usuários. Esta comunicação pretende: 1. historicizar, em estudos do campo, propostas de análise e interpretação do fenômeno da adaptação; 2. definir algumas competências e possíveis parâmetros para a prática da crítica da adaptação; 3. refletir sobre a função desse tipo de crítica e as formas como ela pode ser praticada e contribuir para o debate cultural em campos de comunicação mais ampla, como o jornalismo.
Cecília Nazaré de Lima (UFMG) e Mônica Pedrosa de Pádua (UFMG)
Título: Confluências e interações intermidiáticas em música, literatura e pintura: Schubert, Müller e Friederich; Debussy, Verlaine e Monet Resumo: Textos musicais, literários e pictóricos possuem, cada qual, sua maneira própria de significar, inerente aos tipos de suportes que os veiculam. A linguagem literária, por exemplo, apoia‐se em referentes, o que, de certa forma, dirige nossa interpretação. Os textos musicais e pictóricos, por sua vez, com possibilidades de significações não governadas por convenções, admitiriam um tipo de apreciação analítica que pudesse ser traduzida em linguagem verbal? Ao confrontarmos mídias distintas, uma das grandes questões que se levanta, para além das tipologias de textos intermidiáticos, é a de como encontrar maneiras de leituras que utilizem parâmetros comuns, para que possamos avaliar seus pontos de confluência ou distanciamento, bem como suas maneiras de interação. Neste trabalho, adentramos nessa discussão tomando como objetos de estudo as canções Gute Nacht, de Franz Schubert (1797‐1828), e L’ombre des
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arbres, de Claude Debussy (1862‐1918), por nós consideradas tanto uma transposição de mídias como uma combinação de seus textos poético e musical. Posteriormente, comparamos essas canções com pinturas contemporâneas a elas, dos artistas Caspar David Friedrich (1774‐1840) e Claude Monet (1840‐1926), procurando destacar possíveis aproximações entre essas músicas e essas pinturas. Para nos auxiliar nesse processo, partimos das categorias midiáticas de Rajewsky e Clüver, bem como de ideias de Nattiez e Mangel. Para pensarmos as maneiras de interação entre as mídias e seus pontos de confluência, utilizamos nossa proposta metodológica que constitui a imagem como um operador de leitura para as diferentes mídias. Trabalhamos com imagens mentais de características sensoriais diversas, visuais, auditivas, cinestésicas, cenestésicas, que podem ser percebidas em suas resultantes imagéticas: tempo, espaço, movimento e sentimento. Apreendemos, por meio deste trabalho, imagens de grande poder expressivo que revelam interseções entre os múltiplos campos artísticos, podendo ampliar o universo perceptivo das obras de arte e auxiliar nos processos interpretativos de seus apreciadores.
Samuel Paiva (UFSCar)
Título: Cinema como música para os olhos Resumo: Considerando teóricos e artistas que puseram em pauta conexões entre o cinema com outras artes ou mídias, Eisenstein é um ponto de inflexão, sendo Alexander Nevsky (1938), filme que ele realizou em colaboração com Sergei Prokofiev, um dos seus destaques, enquanto busca de sinestesia, cruzamento de sensações, uma experimentação a partir da perspectiva do cinema como “música para os olhos”, conforme alguns pesquisadores da intermidialidade já apontaram (PETHÖ, 2011). Partindo desta premissa, a ideia da comunicação é problematizar a perspectiva de uma arqueologia das mídias audiovisuais pautadas pelas relações entre cinema e música, investigando possibilidades de construção de um método historiográfico elaborado com a intermidialidade e possível de considerar distintos tempos e lugares. Nesse sentido, ao pensamento teórico e à criação de Eisenstein naquele momento da transição do cinema silencioso para o sonoro, serão contrapostas produções do cinema brasileiro contemporâneo como, por exemplo, o filme Cartola – música para os olhos (Lírio Ferreira, Hilton Lacerda, 2007), cuja montagem retoma a história do músico, assim como do samba, em sua relação com diversos momentos da história do cinema brasileiro. Tal recorte nos leva a cogitar, no âmbito da música como “atração” cinematográfica, as relações entre imagens e sons enquanto sensações diversas obtidas em função das possibilidades técnicas possíveis nos seus respectivos tempos e espaços, mas com relações entre si. A comunicação é um resultado parcial da pesquisa Towards an Intermedial History of Brazilian Cinema: Exploring Intermediality as a Historiographic Method, uma parceria entre pesquisadores da University of Reading, na Inglaterra (com apoio da AHRC) e da Universidade Federal de São Carlos, no Brasil (com apoio da FAPESP)
Solange Ribeiro de Oliveira (UFMG)
Título: Intermidialidade em Água viva de Clarice Lispector Resumo: O trabalho analisa as relações entre a arte abstrata e o romance Água viva, de Clarice Lispector. Recorre inicialmente à noção de pintura abstrata, que, recusando a referência ao mundo exterior, concentra‐se em seus próprios meios, tais como forma, cor, volume e textura. Transposto para a literatura, esse tipo de arte igualmente privilegia recursos específicos, que, nesse caso, se reduzem à manipulação artística da linguagem verbal. É o que ocorre no romance Água viva. Recebido, e talvez concebido, desde o início, como obra abstrata, seu texto harmoniza‐se com o de criação abstrata nas artes visuais. Desprezando referências ao mundo exterior, implícitas na existência de enredo e personagens, concentra‐se na palavra, que é seu material específico. Não se pode, entretanto, esquecer que, mesmo quando abstrata, a arte não dispensa uma estruturação formal, criada pelo artista para obras específicas. O mesmo se aplica à literatura abstrata. Também ela carece de uma estruturação, que se manifesta de diversas formas em obras diferentes. Em Água viva o elemento estruturante constitui‐se de uma série de imagens recorrentes, que conferem ao texto uma organização despercebida ao leitor menos atento. Essas imagens revelam‐se tão mais importantes pelo fato de também remeterem à temática existencial que domina toda a ficção de Clarice.
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Thaïs Flores Nogueira Diniz (UFMG)
Título: Do sagrado ao profano: A Última Ceia, de Yinka Shonibare Resumo: Adaptação, em seu sentido mais amplo, sempre descreveu a capacidade dos ajustes, sejam eles humanos, culturais ou biológicos. Adaptar é um meio de sobreviver, progredir ou simplesmente mudar. Assim como a mitologia, vista como um método para adaptar as crises da humanidade e os mistérios do universo a formas narrativas e imagísticas, transportadas através de várias culturas e períodos históricos, os textos bíblicos e religiosos também têm sido adaptados ao longo dos séculos em forma de produtos como pinturas, textos literários, esculturas etc, todos se comportando como ilustração de fatos que fizeram/fazem parte da cultura (ou da fé) ou como comentários sobre eles. Mais recentemente porém, essa prática sofreu transformações: em vez de exercerem o papel de simples comentário, as adaptações dos textos bíblicos passaram a se comportar como instrumentos de crítica. O objetivo desse trabalho é analisar uma obra do artista nigeriano Yinka Shonibare‐‐inspirada na célebre pintura de Leonardo da Vinci, A Última Ceia‐‐ que faz uma crítica às mazelas da sociedade contemporânea.
Vera Casa Nova (UFMG)
Título: Texto e imagem em O esplendor dos contrários, de Arthur Omar. Resumo: O texto e a imagem: dois momentos do arquivo fotográfico da Amazônia. Uma eco‐estética que o antropólogo visual Arthur Omar representa em suas fotos. A cor e os fluxos da imagem nas paisagens mostradas. A emoção na ponta dos olhos. O limiar filosófico.
Paineis Intermídia
Ana Cláudia Munari Domingos (UNISC) Título: Entre linguagens: remidiação ou transmidiação Resumo: Segundo Lars Elleström, o processo de transmidiação, da midiação de conteúdo que fora anteriormente midiado, se dá pela passagem de características midiáticas compostas entre diferentes tipos de mídia, processo que sempre envolve algum grau de transformação. Um dos exemplos mais claros de transmidiação é a adaptação da literatura para o cinema, em que certas características midiáticas conseguem navegar de uma mídia a outra. Presente em diversos produtos culturais contemporâneos, a transmídia designa um fenômeno em que cada mídia conta uma parte distinta da narrativa e contribui de maneira única para o todo. Nela, a transferência de características midiáticas garante a coesão da história, a fim de que cada produto de mídia seja reconhecido como parte integrante de uma franquia. Este estudo pretende examinar a distinção entre a adaptação e a transmídia a partir da conceituação de Elleström e investigar o lugar desta última no campo de estudos da intermidialidade.
André Soares Vieira (UFSM) Título: Adaptação e relações transficcionais em Psycho: romance, filme e série Resumo: Ao retomar algumas das categorias de relações transtextuais de Gérard Genette, tais como intertexto e hipertexto, Richard Saint‐Gelais amplia o debate afirmando a existência de relações transficcionais entre os textos. Nessa perspectiva, a transficcionalidade não seria definida como uma relação entre textos, mas entre ficções: o mundo fictício‐diegético manter‐se‐ia vivo em livros, filmes, peças de teatro, ballets, videogames, etc. Com efeito, a tipologia genettiana restringe‐se a relações textuais em detrimento da dimensão ficcional. Se, para Genette, a hipertextualidade é uma relação de imitação e de transformação entre textos, a transficcionalidade seria uma relação de “migração” de dados diegéticos. Trata‐se daquilo que Saint‐Gelais apresenta como “fenômeno por meio do qual ao menos dois textos, de mesmo autor ou não, remetem conjuntamente a uma mesma ficção, seja pela
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retomada de personagens, pelo prolongamento de uma intriga prévia ou pelo compartilhar do universo ficcional” (SAINT‐GELAIS, 2011, p. 7). Este trabalho pretende, assim, observar os modos como algumas das categorias transficionais previstas por Saint‐Gelais, sobretudo a prequela e a expansão, categoria essa já prevista por Genette em Palimpsestes, se apresentam no trânsito entre a adaptação do romance Psycho (1959), de Robert Bloch, para o filme homônimo de Alfred Hitchcock (1961) e o seriado televisivo Bates Motel (2013), de Anthony Cipriano.
Angelo Mazzucchelli (UFMG) Título: Romances híbridos de Graham Rawle Resumo: O profissional responsável pela configuração física de uma obra literária – isto é, sob a forma de livro – é o designer gráfico. Existe um consenso de que o projeto gráfico de um livro que contém uma obra literária deve ser neutro: o signo escrito não deve se sobressair – uma suposta garantia de que a mensagem original do autor não será deturpada. Este modelo de trabalho não admite uma participação efetiva e expressiva do designer gráfico na obra como um todo. Não só em âmbito literário, mas de modo geral, teorias modernistas que moldaram (e ainda moldam) a profissão validam essa neutralidade de conduta do designer gráfico em favor da objetividade. Mas teorias pós‐modernistas da área questionaram esse anonimato que confina o horizonte criativo da profissão, e propuseram que a participação desse profissional nos projetos fosse mais efetiva e expressiva. Esta proposição alcançou a esfera da literatura: em meados da década de 1990, respaldados por tais teorias pós‐modernistas, alguns designers gráficos assumem também o papel de escritores. Surge um novo modelo de narrativa denominado romance híbrido, que se caracteriza pela exploração integrada de texto e imagem, de modo que esta última seja incorporada efetivamente à narrativa. A imagem, nesse contexto, não tem um caráter elucidativo, não é um mero acessório. Duas obras que exemplificam narrativas híbridas são Diary of an amateur photographer: a mystery e Woman’s World: a graphic novel, ambas do escritor e designer gráfico britânico Graham Rawle. As páginas de ambos os livros se caracterizam por uma visualidade fragmentada; Rawle utiliza a colagem como procedimento técnico e produz um amálgama que funde texto e imagem.
Anna Stegh Camati (Uniandrade) Título: Sonho de uma noite de verão: do texto de Shakespeare à ópera de Benjamin Britten Resumo: Situada na interface do teatro, da música e das artes visuais, a ópera é constituída pela fusão de diversas linguagens. Nesse sentido, a palavra e a música se fundem em um novo idioma no discurso operístico. Além disso, é preciso considerar a importância de outras especificidades na composição da cena operística, como o trabalho de expressão facial e corporal dos atores, as coreografias, os bailados, a contribuição da pintura, escultura e recursos audiovisuais, que interferem na gênese da criação artística. A presente pesquisa objetiva refletir sobre a encenação, dirigida por Peter Hall em 1981, da ópera Sonho de uma noite de verão de Benjamin Britten, criada a partir da peça homônima de Shakespeare. Os diálogos intermidiáticos entre o texto shakespeariano e o espetáculo operístico (filmado em DVD) serão investigados à luz de considerações teóricas de influentes críticos como Claus Clüver, Irina Rajewsky e outros.
Aurora Gedra Ruiz Alvarez (Mackenzie) Título: Interações entre artes e mídias digitais Resumo: A tecnologia digital marca presença no final do século XX e no início do XXI, apontando novos rumos para os meios de comunicação, os serviços, as ciências, as artes etc. É sobre a sua participação nesta última área que nos interessa tratar neste estudo. O espectro de contribuições das tecnologias digitais nas artes é amplo e bastante representativo. Por isso elegemos apenas alguns casos para examinar neste trabalho: a performance (a dança), a escultura, a arquitetura e a pintura, combinadas com efeitos visuais, criados pela holografia, pelo desenho gráfico e por outras técnicas afins. Tendo como
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suporte teórico, os estudiosos da Intermidialidade, especialmente Claus Clüver e Irina Rajewski, bem como os pesquisadores das novas tecnologias, Pierre Lévy e Píer Luigi Capucci, dentre eles, discutiremos as trocas e negociações entre as mídias e as tecnologias, os recursos de expressão utilizados em cada um dos exemplos selecionados e os efeitos de sentidos possíveis que essas combinações e intermidiações produzem.
Brunilda Reichmann (Uniandrade) Título: Em busca do texto perdido? As sedutoras séries televisivas Resumo: Dentre séries televisivas voltadas a dramas políticos – tais como The Good Wife (2009), Homeland (2011), Scandal (2012), Designated Survivor (2016) – House of Cards (2013), criada por Beau Willimon e baseada na trilogia publicada por Michael Dobbs (1989), escritor inglês, e na série homônima da BBC (1990), criada por Andrew Davies, é uma das mais impactantes, politicamente falando. As características mais notáveis dessas produções são as motivações egoístas, inescrupulosas e criminosas que comandam as aspirações, convicções e decisões políticas tomadas por aspirantes a líder da nação. Na trilogia de Dobbs, de pouco impacto para leitores de outros países, ele próprio chefe pessoal da primeira‐ministra Margaret Thatcher em 1987, descortina‐se a atmosfera de rivalidade, corrupção e criminalidade entre parlamentares que almejam a queda do líder político na Inglaterra e o cargo de primeiro‐ministro. Na série da BBC, o vínculo com Thatcher e a aspiração ao cargo de primeiro‐ministro são também estabelecidos. Essas duas produções tiveram pouco alcance internacional. A maxissérie da Netflix, no entanto, alcançou um sucesso extraordinário, tanto em seu país como fora dele. O espaço ficcional é os Estados Unidos e o regime, presidencial. Desta forma, o cargo almejado é a presidência da república. Essas produções, desde os romances de Dobbs, trazem consigo ecos de peças de Shakespeare, principalmente de Ricardo III, Macbeth e Otelo. Nesta apresentação vamos nos concentrar, no entanto, no processo de adaptação dos romances para a série da BBC e desses dois para a série da Netflix. É um trabalho embasado em estudos de McFarlane, Clüver, Diniz, Rajevski, Hutcheon, dentre outros, e trata principalmente da intermidialidade (adaptação dos romances políticos para a TV) e da interculturalidade (adaptação das duas primeiras produções para a maxissérie que retrata outra época e outro país, com cultura diferenciada).
Camila Figueiredo (UFSJ) Título: Entre transmidiação e transmidialidade: reflexões sobre a transferência de características midiáticas Resumo: Segundo Lars Elleström, o processo de transmidiação (a midiação de conteúdo que fora anteriormente mediado) se dá pela passagem de características midiáticas compostas entre diferentes tipos de mídia, processo que sempre envolve algum grau de transformação. Um dos exemplos mais claros de transmidiação é a adaptação da literatura para o cinema, em que certas características midiáticas conseguem navegar de uma mídia a outra. Presente em diversos produtos culturais contemporâneos, a transmídia designa um fenômeno em que cada mídia conta uma parte distinta da narrativa e contribui de maneira única para o todo. Nela, a transferência de características midiáticas garante a coesão da história, a fim de que cada produto de mídia seja reconhecido como parte integrante de uma franquia. Este estudo pretende examinar a distinção entre a adaptação e a transmídia a partir da conceituação de Elleström e investigar o lugar desta última no campo de estudos da intermidialidade.
Cássia Macieira (Grupo Intermídia) Título: Teatro de Animação: intermidialidades Resumo: O diretor Álvaro Apocalypse, do Grupo Giramundo Teatro de Bonecos, no Festival de Inverno da UFMG em 1994, criou o espetáculo, Antologia Mamaluca – obra homônima (sátira) do escritor Sebastião Nunes. A obra literária é polissêmica e oferece ao leitor a pluralidade, com suas colagens carregadas de sentido, fazendo correspondência com a fase profissional publicitária do poeta, o que
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justifica a imensa picturalidade da obra, com colagens, tanto verbais, picturais, quanto visuais (imagem e texto ). Sebastião Nunes (1938) editou grande parte de sua produção literária em dois volumes (Antologia Mamaluca I e II), que apresentam um auto grau de picturalidade, com narrativa curta, palavras inacabadas, cortes abruptos. Nessas poesias pode‐se dizer que o sentido é preenchido pelo leitor; há, ainda, frases, provérbios, paratextos, palavrões do cotidiano presentes no imaginário coletivo. A princípio, não se pode dizer qual é o tipo de diálogo entre texto e imagem que se encontra – oposição, subordinação, coordenação ou fusão – mas certamente, o procedimento de saturar um texto com outros signos encantou o diretor Álvaro Apocalypse (1937‐2003) ao adaptar o texto de Nunes para o teatro de bonecos.
Célia Arns de Miranda (UFPR) Título: Diálogo entre a linguagem visual e a teatral: O grito de Munch em A dama do mar de Bob Wilson Resumo: Bob Wilson colocou nos palcos brasileiros em 2013 um texto de Susan Sontag, A dama do mar, reescrito a partir da obra homônima do norueguês Henrik Ibsen. Dentre as diversas camadas de metáforas sobrepostas para representar a ruína dos personagens em cena, destaca‐se uma imagem recorrente e pujante de Ellida com os braços projetados para frente com as mãos espalmadas revelando uma expressão de espanto e terror. A paisagem sonora evoca, em muitos momentos de tensão, o grasnar de gaivotas, as ondas arrebentando nas rochas, risadas e sons fortes estridentes, ruídos ensurdecedores, muitas vezes, coincidindo com o blackout e a elevação do volume do som nas mudanças de cenas. O objetivo desta pesquisa é estabelecer uma relação dialógica entre a imagem de Ellida descrita acima e o quadro de Edvard Munch, O grito (1893). O embasamento teórico será desenvolvido a partir dos pressupostos estabelecidos por Genette, Kristeva, Clüver, Rajewski, Warburg, dentre outros.
Chantal Herskovic (UFMG/ UNI‐BH) Título: A intermidialidade nas narrativas gráficas Resumo: Pretendo analisar a obra A comédia trágica ou a tragédia cômica de Mr. Punch (1995), criada por Neil Gaiman e Dave McKean, utilizando como referência os estudos da intermialidade. A intermidialidade abrange análises que incluem a combinação de mídias, referências midiáticas e transposições midiáticas que podem ser observadas em algumas obras em quadrinhos. A obra escolhida é uma graphic novel, uma novela gráfica, uma história em quadrinhos para leitores maduros, que está além do formato tradicional de quadrinhos e que combina os elementos dos quadrinhos e de sua sintaxe, com imagens criadas a partir de técnicas mistas e colagens. A arte sequencial, termo estabelecido por Will Eisner para as graphic novels e histórias em quadrinhos em geral, cita uma narrativa gráfica para contar uma história combinando diversas técnicas narrativas. Em A comédia trágica ou a tragédia cômica de Mr. Punch, além da arte sequencial criada, há uma miríade de imagens e combinações que fazem referências a outras mídias e que utilizam as técnicas citadas por Eisner, além de se apropriar de elementos característicos do teatro de bonecos. A obra cruza narrativas de apresentações teatrais com a história vivida pelo protagonista e seus conflitos. Um olhar da perspectiva dos estudos da intermidialidade contribui com os estudos sobre histórias em quadrinhos, indo além da discussão sobre a arte sequencial, e iniciando um debate sobre as histórias em quadrinhos enquanto mídia plurimidiática.
Cristine Fickelscherer de Mattos (Mackenzie) Título: Narrativa pós‐moderna e referência fílmica: confluências e colaborações Resumo: O intercâmbio entre as linguagens literária e cinematográfica é antigo e consabido. Seu direcionamento, por razões históricas, a princípio, foi naturalmente dos livros para os filmes, mas o tempo inverteu o fluxo das trocas e a cultura imagética contemporânea empresta muito do seu brilho à literatura atual através da adoção de alguns de seus expedientes. O presente trabalho propõe um olhar sobre esse intercâmbio mais recente, tendo por foco a presença de referências intermidiáticas – tal como as definiu Irina Rajwesky – do cinema na chamada literatura pós‐moderna. Na pós‐modernidade, as duas
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linguagens encontram, devido a referências intermidiáticas cruzadas, um lugar de confluências e colaborações. A título de exemplo, serão apontados dois casos que nos fornecerão uma base para a reflexão a respeito dessa relação. Também será preciso identificar elementos literários pós‐modernos. No que tange a essa questão, podemos dizer que alguns aspectos da narrativa contemporânea, embora discutíveis e ainda sob forte ponderação em vista de seu caráter recente, já mostram certa constância que nos permitem delineá‐los como característicos. A partir dessa base comparativa, a reflexão aqui proposta aponta para a coincidência entre alguns aspetos recorrentes da literatura pós‐moderna e certos expedientes próprios da linguagem cinematográfica. Mais do que o propósito de identificar fatores comuns em ambas as linguagens, o trabalho almeja indagar sobre a função que a presença de referências fílmicas desempenha em tal produção literária, como ferramenta ou recurso, a alimentar tendências e propósitos gerais da narrativa contemporânea.
Eliana Lourenço de Lima Reis (UFMG) Titulo: Escrevendo com a luz: as obras de Jitish Kallat Resumo: O artista indiano Jitish Kallat tem produzido obras baseadas na transposição de textos de importantes figuras históricas da Índia para outras mídias, como os discursos de Nehru, Gandhi e de Vivekananda que compõem a série intitulada Public Notice. Este trabalho focaliza sobretudo duas obras baseadas em recursos de luz: Public Notice 3 (feito em luzes de LED e exposto no Art Institute of Chicago desde 2010) e Covering Letter, em exposição no Philadelphia Museum of Art até março de 2017, composto por uma projeção de vídeo em uma cortina de vapor. Pretende‐se discutir não só como se dão essas transposições, mas também seu significado político e ético.
Erika Viviane Costa Vieira (UFVJM) Título: Novelizações de Hamlet: adaptação e questões de intermidialidade Resumo: Lars Elleström (2017) reconhece as adaptações fílmicas de peças de teatro e romances como as arquetípicas e, por isso, seriam as mais investigadas. Entretanto, as questões de adaptação ultrapassam a relação romance‐para‐filme. Após a obra paradigmática da teoria da adaptação de Linda Hutcheon (2006), vários outros gêneros e mídias passaram a figurar entre as obras a serem analisadas, embora um dos gêneros ainda negligenciados seja a novelização, ou o ato de se transformar em romance obras previamente criadas para outras mídias, tais como filmes, séries de TV, quadrinhos, videogames, entre outros. Certamente Shakespeare não escreveu em forma de romance, mas sim para o teatro, na forma de textos dramatúrgicos para serem declamados e ganharem vida nos palcos. Este trabalho pretende discutir questões relativas à adaptação do texto dramático de Hamlet para os romances brasileiros O resto é silêncio de Erico Veríssimo (1943), em que a peça de Shakespeare é evocada no título, que remete à última frase dita por Hamlet antes de morrer, e Hamlet ou Amleto? de Rodrigo Lacerta (2015), que foi premiada como melhor adaptação em sua categoria no Prêmio Jabuti de 2015. Pretende‐se considerar as diversas implicações advindas deste processo adaptativo relacionadas à transposição midiática e à narratividade. Como embasamento teórico, pretende‐se evocar a categorização de Irina Rajewsky (2012), que trata a adaptação como transposição intermidiática, e a transmidialidade de Elleström (2017).
Fernanda Isabel Bitazi (Mackenzie) Titulo: A composição estética nas adaptações quadrinizadas dos clássicos literários: uma questão de tradução? Resumo: Desde 2006, ano em que o Governo Federal incluiu os quadrinhos, pela primeira vez, nos editais do PNBE (Programa Nacional Biblioteca na Escola), uma produção específica desse hipergênero – as adaptações quadrinizadas dos clássicos literários – voltou a ser publicada, em grande escala, no Brasil. Além de ter deflagrado discussões acadêmicas mais sistematizadas sobre a viabilidade de seu uso na formação leitora de crianças e jovens, tal surto editorial acentuou ainda mais o debate entre os que tratam qualquer adaptação apenas como uma cópia do original literário e os que a enxergam como produção cuja apreciação e entendimento independe de sua estreita relação com o hipotexto. No caso
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das adaptações quadrinizadas, uma das consequências dessas duas polarizações ideológicas está em que elas se valem, por vezes, de um mesmo conceito – o de tradução – para referendarem seus posicionamentos: para os que costumam detratar as adaptações, somente as que parecem uma tradução do hipotexto (ou as que lhe são fiéis não apenas em relação a seu enredo, mas também à sua estética) merecem ser lidas; para os que as defendem como produto cultural autônomo, sua designação por meio do termo “tradução” (em vez de simplesmente “adaptação”) parece ter a intenção de conferir‐lhes respeitabilidade e promover sua aceitação. Assim sendo, partindo dos pressupostos teóricos de Claus Clüver sobre a transposição intersemiótica e a tradução interlingual, de Haroldo de Campos sobre a tradução, de Tereza Barbosa sobre a distinção entre “HQ como tradução” e “adaptação em HQ” e de Lielson Zeni acerca da indistinção entre tradução e adaptação, este trabalho pretende demonstrar que a originalidade e a autenticidade das adaptações quadrinizadas não dependem do quão fidedignas elas são a seus textos‐base, mas, sim, do modo como elas reconfiguram o enredo e/ou a estética desses textos mediante seus próprios meios estéticos e, quando julgados necessários, por meio de princípios pertencentes ao campo da tradução (tradução considerada em seu sentido tradicional).
Isabella Santos Mundim (IFB)
Título: Representatividade e empoderamento nas narrativas de escravidão: da literatura às mídias audiovisuais Resumo: Este trabalho investiga como criadores pertencentes a grupos minoritários traduzem experiências de exclusão e violência em narrativas de representatividade e empoderamento. O foco são duas narrativas de escravidão de 2016 – o romance The Underground Railroad, de Colson Whitehead e a série televisiva Underground, de Misha Green e Joe Pokaski – que se propõem o desafio de reelaborar criticamente o passado. Neles, Whitehead e a dupla Green e Pokaski lembram o que a América esqueceu, retratam a experiência da servidão do ponto de vista de quem a viveu e a experiência do senhor branco do ponto de vista de quem ele escravizou. Nessa perspectiva, The Underground Railroad e Underground superam o mero registro e apontam para acontecimentos e pessoas ausentes do relato dominante. Para além da versão oficial, emergem aí contranarrativas da nação comprometidas com a construção da memória dos Estados Unidos a partir do viés da margem e da resistência.
Júlio Alessi (UNI‐BH) Título: A construção de novos mundos através do som: o uso do design sonoro e suas relações intermidiáticas no game para dispositivos móveis DarkEcho. Resumo: Este trabalho propõe um estudo de caso do game DarkEcho, para dispositivos móveis, em que a interface gráfica é articulada prioritariamente pela linguagem sonora, o que é incomum no universo dos games, em que a imagem tem geralmente maior destaque, ficando o som em segundo plano. Na análise do jogo, foram levantadas diversas possibilidades do uso do som na mediação do processo audiovisual, na recriação de um mundo de terror e suspense, em um processo de remediação e alusão a diversos símbolos do gênero através de uma experiência sonora imersiva e interativa.
Maria Clara Versiani Galery (UFOP) Título: Salomé em espaços estéticos distintos do modernismo Resumo: A reiteração da lenda de Salomé em espaços estéticos distintos no final do século dezenove até a primeira guerra mundial é uma das manifestações mais marcantes da estética decadentista. Entre os exemplos mais marcantes, as telas de Gustave Moreau, em que Salomé aparece dançando seminua e coberta de joias diante Herodes, impressionaram diversos autores, tais como Gustave Flaubert, Stéphane Mallarmé, Joris‐Karl Huysmans e Oscar Wilde. Instigados pela figura da princesa da Judeia, cada um deles abordou a figura bíblica de modo distinto. Mas foi Wilde que produziu a obra de maior impacto: em sua peça teatral Salomé, Wilde mapeia uma complexa tradição cultural em que estão subjacentes ideias sobre estética, erotismo e transgressão, questões fundamentais para o modernismo do século vinte. Salomé foi uma das primeiras obras encenadas por Max Reinhardt, em 1902, no início da carreira do
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importante diretor. Impressionado pelo espetáculo de Reinhardt, Richard Strauss compôs a ópera homônima e inovadora, que chocou as plateias com a longa sequência da dança dos sete véus, sustentada por uma orquestração musical agressiva e dissonante, como se Strauss estivesse representando o embate entre forças apolíneas e dionisíacas (HUTCHEON e HUTCHEON, 2003), ressaltando, dessa forma, o erotismo transgressor de Salomé. A proposta de trabalho aqui em tela pretende elaborar uma reflexão em torno das manifestações da lenda de Salomé em espaços estéticos distintos do modernismo, privilegiando a obra de Wilde e o diálogo que a peça estabelece com a pintura de Moreau e a ópera homônima de Strauss. Pretende‐se demonstrar como o topos da transgressão norteia o diálogo tecido entre imagem, texto e música.
Marilia Andrés Ribeiro (UFMG) Título: Intermidialidade na poética de Márcio Sampaio Resumo: Proponho discutir a relação intermidiática entre a crítica, a poesia e as artes visuais na poética de Márcio Sampaio. Este personagem desempenhou um papel importante no contexto artístico de Minas Gerais desde os anos 1960, quando atuou junto ao grupo de jovens poetas da Revista Ptyx e participou da Semana Nacional de Poesia de Vanguarda (1963) em Belo Horizonte. Fez várias exposições de desenhos e pinturas, participou de salões e bienais de São Paulo e atuou como crítico no Suplemento Literário de Minas Gerais. Foi também curador do Museu de Arte da Pampulha e do Palácio das Artes nos anos 1960/70 e professor da Escola de Belas Artes da UFMG nos anos 1980/90. Até hoje atua no circuito artístico como pesquisador da arte de Minas e curador de exposições históricas, a exemplo de Neovanguardas (2007) e Entre Salões (2010) que ocorreram no Museu de Arte da Pampulha, em parceria com Marconi Drummond. Sua obra tem origem nos movimentos de arte concreta e poema‐processo, mesclando poesia, artes visuais, poemas objetos, propostas conceituais e crítica criativa. Culmina na série Galeria Antropofágica, onde Márcio Sampaio faz uma releitura de obras de diversos artistas consagrados, entre eles Ticiano, Veermer, Goya, Manet, Ingres, Mondrian, Malevich, Tarsila, Guignard, Amilcar e Lygia Clark. Nessa série sua crítica é permeada pela ironia inteligente, visando questionar o sistema, o mercado e a produção de arte. Um dos temas discutido em sua exposição retrospectiva, realizada no Museu Mineiro (1983) foi “a ironia do possível face à crise”. Recentemente, Márcio Sampaio fez a doação generosa de seu acervo arquivístico e bibliográfico para a implantação do Centro de Referência das Artes Plásticas em Minas Gerais no Museu Mineiro, possibilitando aos estudiosos realizar novas pesquisas sobre a arte brasileira. A presença de Márcio Sampaio é exemplar no contexto da história da arte mineira como poeta, artista, crítico, pesquisador e educador; por isso, sua obra merece estudos transdisciplinares e intermidiáticos
Miriam Vieira (UFMG) Título: Da arquitetura para a literatura: perspectivas teóricas de transmidiação Resumo: A interação entre a arquitetura e o ser humano, em seu alto grau, é capaz de desafiar alguns modelos de comunicação midiáticos. De acordo com o arquiteto Steen Eileen Rasmussen (1957), uma edificação só atinge seu fim quando, ao ser vivenciada em sua plenitude, torna‐se palco para as atividades do dia‐a‐dia. Samambaia, a casa modernista que inspirou o poema ganhador de prêmio Pulitzer de Elizabeth Bishop, “Song for the Rainy Season” (1960), é um dos principais elementos da narrativa do romance Flores raras e banalíssimas: a história de Lota de Macedo Soares e Elizabeth Bishop (1995), de Carmen Oliveira. Mas como a potencialidade de uma edificação pode ser revelada em um texto literário? Quais são as especificidades da mídia arquitetura a serem transmidiadas pela literatura? Para responder tais questionamentos, vou me valer do estudo da transferência de características em uma transformação de mídias desenvolvido por Lars Elleström (2014).
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Silvia Maria de Sousa (UFF) Título: Intermidialidade na ficção televisiva: o caso da minissérie Justiça Resumo: A pesquisa em torno dos objetos midiáticos tem se ocupado com grande produtividade das relações entre mídias. Fontanille (2007) aponta para a necessidade de “une caractérisation de l’acte de langage par lequel un médium peut être appelé à l’interieur d’un autre” (FONTANILLE, 2007, p. 108). Esse ato de linguagem é constitutivamente complexo, já que há múltiplas possibilidades de construção de objetos intermidiáticos, em função de diferentes suportes, práticas e estratégias significativas. Vários são os modos de estabelecer “referências intermidiáticas” (RAJEVSKI, 2012, p.25). O presente trabalho parte da premissa de que a produção de obras ficcionais midiáticas tem sido regida pelo imperativo da intermidialidade. O emprego em larga escala da intermidialidade erige uma práxis enunciativa que euforiza a citação de diferentes mídias, a mescla de procedimentos próprios de múltiplos suportes e materialidades, a incorporação dos procedimentos expressivos de diferentes linguagens. Para refletir sobre o uso da intermidialidade em produções televisivas, a pesquisa toma como objeto a série Justiça, exibida na Rede Globo entre os dias 22 de agosto e 23 de setembro de 2016. Na série, quatro histórias sobre crimes, condenações e arrependimentos são contadas através do cruzamento entre os personagens e da alternância entre os pontos de vista dos diferentes protagonistas. Este trabalho problematiza, por meio da noção semiótica de aspectualização, a relação entre a estrutura narrativa da minissérie e a estratégia enunciativa usada na transmissão, a saber a distribuição dos diferentes pontos de vista pelos dias da semana. Acreditamos que a estratégia enunciativa adotada confere densidade aspectual ao enunciado aproximando‐o do ciberdrama (MURRAY, 2003), ao permitir, entre outras coisas, que o enunciatário possa optar entre assistir à série integralmente ou concentrar‐se nos programas narrativos de um dos personagens, acompanhando apenas um determinado dia da semana. Além disso, observaremos como o especial “Justiça – visão 360 graus”, disponível no portal Gshow, propõe um resumo da minissérie por meio de ferramentas interativas.
Sílvia Maria Guerra Anastácio (UFBA) Título: Criação de mídia sonora a partir de livro de receitas culinárias para pessoas com deficiência visual Resumo: A criação de audiolivros faz parte do escopo de estudos de tradução audiovisual (Gambier, 2007) da contemporaneidade e o presente artigo tem como tema a análise do processo de construção (Salles, 2006) de uma mídia sonora, que busca dar acesso a receitas culinárias para pessoas com deficiência visual. Trata‐se de uma complexa rede semiótica em que signos de linguagens diversas entram em confluência para a realização de uma empreitada na qual sujeitos desse público alvo são coautores da mídia sonora em questão. Com uma parceria entre integrantes de um grupo de pesquisa da Universidade Federal da Bahia, o Pro.Som (Tradução, processos de criação e mídias sonoras) e a professora da disciplina de Autonomia para a Vida do CAP (Centro de Apoio Pedagógico ao Deficiente Visual) de Salvador, juntamente com sua respectiva classe de alunos com deficiência visual, está sendo criado um audiolivro de receitas culinárias para facilitar o dia‐a‐dia desses alunos. O referido grupo dessa disciplina escreveu dez receitas para serem gravadas em áudio, sendo que cada uma delas está relacionada com histórias de vida dos próprios alunos‐autores, partindo‐se do pressuposto de que as lembranças que tais receitas evocam, na verdade, ajudam as pessoas a construírem a sua identidade (Horta,2015). Esse processo de escritura demandou um cuidadoso trabalho de sensibilização dos alunos para que se dessem conta da necessidade de incluir, em suas histórias, apelos aos sentidos visual, auditivo, olfativo, gustativo e táctil para dar mais vivacidade e concretude às suas narrativas, que seriam roteirizadas (Maciel, 2003) para textos visando interpretação por atores e gravados em mídias sonoras (Huwiler, 2010). O gênero escolhido para tal audiolivro foi a peça radiofônica, um teatro invisível para a mente em que música, vozes, silêncios, ruídos diversos e efeitos sonoros se combinam para seduzir e interessar o ouvinte (Horst, 1980). A passagem das histórias primeiramente escritas e gravadas em vídeo para um audiolivro é um processo de adaptação (Hutcheon, 2006) complexo, que merece ser investigado.
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Sirlei Santos Dudalski (UFV) Título: Sobre os estudos da adaptação: o caso do Shakespeare no Canadá Resumo: A presença de adaptações shakespearianas no teatro, na literatura, no cinema, na televisão e em outras mídias é recorrente na contemporaneidade, além de ser um fenômeno comum em todos os países. O Canadá, entretanto, destaca‐se pela quantidade e diversidade de suas produções. O projeto canadense de adaptações de Shakespeare (CASP) lista mais de 450 peças inspiradas na obra do autor ou adaptadas dela. O presente trabalho tem por finalidade refletir sobre os estudos da adaptação tendo como foco as adaptações das principais tragédias de Shakespeare feitas no Canadá anglófono. Será discutido o termo adaptação, sua relação com outros termos intercambiáveis e a importância das reflexões propostas para os estudos de intermidialidade.
Valéria Rocha Aveiro do Carmo (Faculdade de Tecnologia Mauá) Título: Arte e tecnologia: enigmas e significações compartilhadas Resumo: O estudo proposto tem como objetivo realizar a análise do conto A máscara da morte rubra (The Masque of the Red Death), de Edgar Allan Poe, e da tela Karl Johan ao anoitecer de Edvard Munch, acessados pelos websites http://www.gargantadaserpente.com/ e http://www.edvardmunch.org/, por meio de uma abordagem que considera, além do diálogo entre os textos, a entrada do leitor através dos meios digitais, enfatizando os contextos que dão suporte à difusão dessas obras. Considere‐se que o âmbito temático plasma o universo do mistério e do macabro organizado e estruturado no conteúdo dos mencionados textos, tornando‐o elemento crucial para as analogias traçadas. Focado esse cotejo entre as obras, empreita‐se, então, uma reflexão sobre a linguagem da arte sendo divulgada por meios eletrônicos. Ao interpelar as formas de acesso aos bens culturais, pretende‐se discutir as relações entre arte e mídia, tratando a lógica da interatividade e do pensamento complexo, nessa rica teia de hiperlinks que tornam as escolhas do leitor um componente do fazer interpretativo. Intenta‐se, ainda, propor um questionamento acerca da possibilidade de fuga do olhar quando da visita a uma tela em espaço virtual. A riqueza de recursos presentes em uma galeria não presencial, ou em um site planejado para a popularização da literatura, favorece o esforço de abrir os olhos e analisar aquilo que se vê, em profundidade, ou é um convite à dispersão? O processo de construção da compreensão das obras para atingir as estruturas profundas e examinar mecanismos intermidiáticos se dá à luz de uma abordagem teórico‐crítica dos fenômenos e relativa à filosofia da linguagem.
Vanessa Brandão (UFMG) Título: Do facebook para o livro – fluxo intermídias e redes digitais como espaço para a escrita (poética) do cotidiano Resumo: Na cultura de convergência, o fluxo de circulação de textualidades midiáticas com engajamento da audiência pode reconfigurar a produção literária. Esse trabalho pretende investigar o movimento de trânsito da produção literária na internet para o espaço mais canônico da literatura – o espaço do livro. A experiência singular do autor que se fez escritor em seu perfil no Facebook: Anderson França, o Dinho (Rio em Shamas, 2016, Editora Objetiva) revela a apropriação poética desse espaço, criando uma fresta (nos termos de Barthes) por onde emerge uma escritura “poética do cotidiano”. A partir da perspectiva da intermidialidade, colocam‐se vários cruzamentos entre literatura e mídias sociais digitais: entre gêneros (da crônica à biografia, da comédia à tragédia), entre linguagens (do texto escrito, imagético e multimídia) e entre meios (da internet ao livro).
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Comunicações Coordenadas
Abbie Reese (Pesquisadora e cineasta) Título: Monastic silence and a visual dialogue: a cloistered nun’s first‐person documentary Resumo: In my interdisciplinary relationship‐ and research‐based para‐ethnographic practice, I explore individual and cultural identity, public and private performances, and the liminal phase through a rite of passage into a new social role. Since 2005, I have been granted rare and continued access to a strict religious order of cloistered nuns who seek anonymity. I also began interviewing a young woman – Heather – in 2005 as she contemplated a supernatural “calling” to monastic life. In 2011, she joined the same cloistered community in Rockford, Illinois. A metal grille separates the enclosure from our world, literally and symbolically. I have been granted unique access to make photographs and record video within the enclosure. Co‐authorship and shared authority underpin my artistic and para‐ethnographic practice; wanting to extend our collaboration, I obtained permission to lend Heather, renamed Sister Amata, a video camera. (Both names are aliases she selected to reflect the nuns’ value of anonymity.) A former blogger and painter, Sister Amata has a sophisticated visual aesthetic. Thus, as a director works with a cinematographer, I gave Sister Amata assignments to document the monastery’s rich material culture, record impressionistic moving images, and turn the camera on herself to make video diaries as she assimilated into the 800‐year‐old religious order and transitioned into full membership in the heterotopia. My relationship with the nuns is embedded in the work: Our 11‐year engagement informed the framings and recordings. I have now equipped the nuns with video editing software. Drawing upon the same footage, Sister Amata and I are editing separate videos. The two pieces will be shown side‐by‐side in an installation – the narratives delineated, echoed, and repeated in the Siamese works.The digital projection (and its foregrounding of hypermediacy) will attract viewers to engage with the material through the video pieces that will function as a dialectical visual dialogue.
Adilson Antônio Barbosa Júnior (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: Vanguarda, memória e esquecimento: leitura dos profilogramas de Augusto de Campos Resumo: O termo “vanguarda”, tal como se consolidou no campo artístico, apresenta uma ampla gama de significações: é empregado, nos mais variados contextos, para designar movimentos muito distintos e, assim, qualifica obras e artistas que não apresentam afinidades entre si. Contudo, na miríade de contextos e acepções em que o termo é utilizado, há um fator de grande recorrência: o da ruptura. Ele aparece sob a égide das noções de novidade, avanço, originalidade, futuro, etc. Tais noções, índices de uma concepção linear do tempo, contribuem para que o artista de vanguarda seja visto como necessariamente oposto aos conceitos de memória e tradição. Neste trabalho, pretendemos questionar o caráter absoluto dessa oposição que separa vanguarda e memória, experimentalismo e tradição. Em lugar de uma ruptura extremista com o passado, o vanguardista pode promover uma alteração significativa da maneira como o repertório da tradição é lido. Desse modo, o experimentalista, ao invés de romper radicalmente com o passado, estimula um rearranjo das relações de memória e esquecimento que se mantêm com a tradição. Assim, relativiza‐se a ideia de uma temporalidade única e linear, e observa‐se um conjunto de temporalidades que se interseccionam no presente, coexistindo em uma espécie de diacronia que o historiador ReinhartKoselleck denominou “sincronia do assincrônico”. Nessa perspectiva, analisaremos quatro profilogramas de Augusto de Campos, um dos fundadores do movimento da Poesia Concreta. Os profilogramas, realizados entre 1966 e 1974, compõem‐se de imagens sobrepostas, fragmentadas e retrabalhadas – em que figuram Ezra Pound, Vladimir Maiakóvski, Anton Webern, John Cage, Sôusandrade e Patrícia Galvão, a Pagu. Essas obras dialogam com a poesia escrita de Augusto de Campos e sintetizam a relação multitemporal e cosmopolita desse poeta de vanguarda, e do próprio movimento concretista, com a tradição.
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Adriana de Castro Dias Bicalho (Professora, UFMG) Título: Histórias preternaturais das criaturas inquietantes: do Teatro das Criaturas Resumo: Na aurora da era moderna ocidental, a exegese do Grande Livro da Natureza frutificou artifícios que, urdidos sob os preceitos da doutrina da similitude, remodelaram o mundo em inauditas versões das histórias naturais – nelas, o casamento entre imagem e texto, apadrinhado pelas transformações da técnica, amalgamou o saber oriundo dos lapidários, herbários e bestiários, das viagens, das fábulas, dos mitos, dos hábitos, da culinária, da filosofia natural, da medicina, dos emblemas e também da observação direta das criaturas e fenômenos. Habitam essas histórias naturais uma vasta comunidade de criaturas‐imagem a atravessar os tempos sob distintos juízos e práticas que permanentemente reconfiguram o que delas se pode saber e perceber. Histórias preternaturais das criaturas inquietantes estuda a migração dessas criaturas‐imagem ao longo das descontinuidades epistêmicas: amealhadas pelo afã enciclopédico, admiradas por suas peculiaridades, proscritas por sua excessiva dimensão imaginativa, esquecidas e emaranhadas ao erro e à anedota, recalcadas e renascidas como impressão inquietante. Nessa tarefa, Histórias preternaturais das criaturas inquietantes inverte o protagonismo dos textos, tão frequente na historiografia, e põe‐se a auscultar as imagens. Vale‐se da caixa catóptrica da similitude para atualizar os artifícios que permitem pensar as criaturas‐imagem: a biblioteca como encarnação do pensamento, o teatro da memória como máquina de pensar e de ativar as potências ancestrais das imagens, a doutrina das assinaturas como aproximação das imagens e entre imagens. Essa comunicação trata especificamente do Teatro das Criaturas, que é a interseção na qual as criaturas‐imagem são ativadas, isto é, rompem com seus contextos para revelar suas afinidades proscritas. O Teatro das Criaturas é uma máquina de ver e tem afinidades com máquinas semelhantes como o Teatro da Memória de Giulio Camillo (1480‐1544), exposto em sua obra L’Ideadeltheatro (1550), com as coleções de maravilhas e curiosidades dos séculos XVI e XVII, com o tratado sobre organização de coleções de Samuel Quiccheberg (1529‐1567), Inscriptionesveltitulitheatriamplissimi (1565), e com a arena da Biblioteca Warburg.
Adriana Sales Zardini (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: A popularização de Jane Austen nas Redes Sociais Resumo:Nos últimos vinte anos a escritora inglesa Jane Austen tem ganhado notoriedade graças às tecnologias digitais. Antes mesmo da popularização das Redes Sociais de Internet (RSI), Austen era tema de pesquisas e grupos de discussão literária. Entretanto, quando os filmes baseados em sua obra alcançaram os cinemas de todo o mundo nos anos de 1990, a autora se tornou mais conhecida. Desde então, seu nome vem ganhando espaço, principalmente, nas RSI. Redes estas que são compostas por pessoas que se unem para compartilhar apreço por sua produção literária e pelas adaptações realizadas para o cinema e a televisão. Em 2017, ao completar duzentos anos de sua morte, Jane Austen continua viva em todas as partes do mundo através de seus leitores que se apoderam das RSI para celebrar seu nome. Desde lista de discussões acaloradas e sites dedicados à autora em meados da década de 1990, passando pela popularização dos blogs, até a reunião do seu Fandomem comunidades no Facebook, o nome da escritora está cada vez mais globalizado. Este trabalho é parte de uma pesquisa de doutorado (em andamento) e tem como objetivo apresentar uma análise do fenômeno midiático referido anteriormente. De modo geral, é possível perceber que existe um fluxo de informações constantemente retroalimentadas por seus fãs que se apoderam das mais diversas redes para compartilhar tudo o que for relativo ao universo Austen. Já que veiculam informação e reúnem todo um aparato social e cultural, as RSI difusoras da literatura, em sua intermidialidade, acabam gerando novos desdobramentos em um meio tão profícuo como o digital.
Adriano Mattos Corrêa (Professor, UFMG) Título: 2029, fábula da extinção: uma tradução entre arquitetura e literatura Resumo: A partir de investigações empreendidas pelo grupo de pesquisa e extensão da Escola de Arquitetura da UFMG: Tradução&Arquitetura, elaborou‐se uma publicação, em parceria com a editora Mosca‐Brabu da Guiné Bissau/Lisboa (lançada em fevereiro de 2017 em Portugal), a qual propõe construir uma relação
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intermidiática entre os domínios da arquitetura e da literatura. Este trabalho conta com especulações e a colaboração de diversos investigadores, de variados interesses e de diferentes localidades. Uma aventura literária ficcional, costurada a muitas mãos, que pretende fazer especulações críticas sobre o nosso modo de viver e de compartilhar o nosso território comum. Trata‐se, afinal, de pensar e propor modos de fazer arquitetura e atuar como arquiteto através da produção de literatura de ficção, através de uma proposta literária da construção miúda de uma narrativa ficcional. Esta se faz diferente da informação produzida, consumida e publicada em profusão via eventos sucessivos, editada por mídias diversas, e estampada na lisura brilhante das telas conectadas globalmente; há frestas possíveis para uma aposta na potência das histórias contadas nos livros – “os livros você pode fechá‐los e dizer: Espere um pouco aí...” (como disse o personagem Faber da ficção de Ray Bradbury em Fahrenheit 451). E ainda, este escrito configura‐se também um “ensaio” que, diferente dos “ensaios acadêmicos” (muitas das vezes produtores de um discurso cifrado propagador de uma crítica hegemônica, excludente e compartilhada apenas entre seus pares), investiga e produz, através de uma aposta literária e de uma abordagem ficcional, uma crítica aos nossos modos de viver. 2029 desafia e provoca: o que esperar dos arquitetos dos nossos próximos dias? O desenho deste texto literário é um exercício de “tradução”: de um ensaio acadêmico em uma ficção, de um tempo presente em uma projeção futura, de uma realidade próxima em uma distopia... Como Ezra Pound em seus Cânticos, tal “tradução” é parte de uma conversa inventada, de falas esgarçadas, atravessadas por vozes e tempos diversos: TRADUZIR é TRAIR.
Alan Brasileiro de Souza (Estudante de pós‐graduação, UnB) Título: Inventário de memórias: relações interartísticas entre literatura e fotografia em K.: relato de uma busca, de Bernardo Kucisnki Resumo: Este estudo propõe uma leitura do romance K.: relato de uma busca, de Bernardo Kucinski (2011), com o objetivo de discutir o modo como é dada a ver nessa obra a presentificação de um diálogo entre a linguagem literária e a linguagem fotográfica. Para tanto, partimos, em um primeiro momento, da compreensão de que o narrador de Kucinski ao desenvolver o motivo gerador do romance – o percurso da busca empreendida por K., protagonista da narrativa, por sua filha Ana Rosa Kucinski – organiza o seu relato também como uma forma de recuperar e fixar verbalmente no texto a imagem e a memória de Ana Rosa, militante política desaparecida pela Ditadura Militar que vigeu no país entre os anos de 1964 e 1985. Nesse sentido, observamos que, diante da impossibilidade da existência “física” do corpo da personagem feminina no tempo presente do romance, o narrador acessa nas memórias pessoais e coletivas eventos passados para recriar narrativamente a imagem de Ana Rosa na malha heterodiscursiva do texto. Em um segundo momento, entendemos que, em tal processo, as imagens focalizadas pelo olhar do narrador são organizadas discursivamente na superfície da página romanesca e, posteriormente, capturadas pelo leitor quando da leitura da obra como índices de uma existência da personagem em momentos do passado, evidenciando, assim, o caráter fragmentário dessas imagens. Ainda nesse sentido, compreendemos que as mesmas imagens atuam também como organizadoras de efeitos de sentido no romance. No percurso do entendimento que aqui desenvolvemos, propomos, com base nas reflexões de Louvel (2012) e Barthes (1984), que é a partir da análise do processo de descrição da imagem de Ana Rosa efetuado pelo narrador que uma carga pictural pode ser observada no texto de Kucinski, colocando‐nos, desse modo, diante de uma evocação da imagem fotográfica (e de seus elementos constitutivos) pela palavra literária.
Alex Martoni (Pós‐doutorando, UFF) Título: Materialidades da comunicação: atmosferas, tradução e intermidialidade Resumo: A dissolução do paradigma epistemológico sujeito/objeto se notabiliza como um dos fenômenos mais sensíveis à estética contemporânea. Em seu lugar, novos instrumentos operatórios têm sido propostos com o objetivo de constituir modos de reflexão atentos às relações produzidas nas complexas articulações entre as dimensões material, afetiva e cognitiva, tais como “forças de encontro” (teoria dos afetos), “sistema/ambiente” (teoria das mídias), e “atmosfera/Stimmung” (teorias da arte e da literatura). É dentro dessa perspectiva que este trabalho tem como objetivo refletir sobre a noção de atmosfera como categoria estética e sua produtividade para os estudos de intermidialidade. Pensar a atmosfera como uma modalidade
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da experiência estética não só nos permite compreender, de forma mais consistente, problemas próprios ao domínio da intermidialidade, como o papel da infraestrutura material do signo no processo de construção de sentidos, como também nos abre novas hipóteses de investigação nos domínios dos estudos de tradução e adaptação.
Alexandra Robaina dos Santos (Estudante de pós‐graduação/Grupo Intermídia, UFF) Título: Projeto transmídia como experiência semiótica: análise do Porta dos Fundos e suas estratégias transmidiáticas em diferentes níveis de pertinência Resumo: As novas formas de produção e distribuição de conteúdo são ferramentas potentes utilizadas nos novos modos de narrar para promover envolvimento. No atual contexto de convergência de mídias, a experiência semiótica erigida nas chamadas narrativas transmídias (JENKINS, 2009) se caracteriza pelo comportamento migratório do público, que se desloca pelas diferentes plataformas em busca de elementos relacionados a uma narrativa. No presente trabalho, laçamos mão da proposta desenvolvida por Jaques Fontanille, designada como “Semiótica das Práticas”, para descrever, em diferentes níveis de pertinência, as estratégias mobilizadas no projeto transmídia da franquia Porta dos Fundos. A partir da metodologia desenvolvida pela semiótica discursiva, procuramos compreender como o papel da instância do enunciatário, considerado pela teoria como sujeito co‐produtor do discurso, muda à medida que este é solicitado em toda sua extensão corpórea, isto é, como uma presença que circula não apenas por diferentes textos, mas também por diferentes cenas predicativas. Para além disso, ao compreender que o sentido é construído como um percurso semântico resultante da movimentação em diferentes espaços, analisamos essa transposição a partir de elementos de coesão, relação hierárquica entre as narrativas, projeções das instâncias enunciativas e vetores tensivos. Ao final, com base na descrição das narrativas transmídias do grupo Porta dos Fundos, propomos o nível de pertinência a que pertence o projeto.
Alice Bicalho de Oliveira (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: A memória dos animais no Bestiáriomaxacali Resumo: O presente trabalho parte de um estudo comparativo de duas edições (uma realizada pela Azougue em 2009 e a outra em 2013 pela Editora UFMG) dos cantos do Gavião Espírito e dos povos Morcego e Hemex – espíritos do povo autointitulado Tikmu´um para se deter em um dos livros deste corpus, o Bestiário maxacali. Analisaremos o lugar ritual dos cantos registrados, bem como os dois modos que os pesquisadores maxacalis escolheram para a publicação destes que, mais que simples cantos, são a corporificação de espíritos animais: a escrita e o desenho. Considerando o contexto de produção dos cantos, sua relação com os animais espíritos e os animais caça, e a quase ausência destes últimos nas terras maxacalis, a questão central deste trabalho é avaliar como a ideia de bestiário, do modo como se constitui na tradição ocidental, fica abalada com tal publicação por meio da transformação das distinções entre seres reais e imaginários (ao percebermos que os animais apresentados no livro como reais existem mais em cantos do que em carne e osso) e finalmente da quebra da concepção de “vivo” atrelada à cadeia carbônica (já que no Bestiário, por exemplo, ao lado de pássaros são representados helicópteros). A análise do imbricamento entre cantos e imagens se apresenta aqui como meio de vislumbrar de que modo é realizada a representação de animais como fruto de uma memória coletiva que atravessa os saberes compartilhados entre humanos e não humanos.
Ana Carolina Ferreira Fernandes (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: The representation of domestic space in the graphic novel Fun home Resumo: The idea of home has always been closely associated with the foundation of the family, as an idealized place of care, permanence, stability and shelter. Bearing in mind this culturally inscribed meanings of the home, while acknowledging, nevertheless, the possibilities of disruption, this study aims to investigate the representation of the domestic space in Alison Bechdel’s 2006 graphic memoir Fun home. Her novel centers on her relationship with her father Bruce, both of whom, as queer subjects, must negotiate their gender and
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sexual identities within the realm of the public and private spheres. As suggested by the title, images of the home emerge prominently in the narrative and bring the contradictions and ambivalences of the domestic space into question. The pictorial significance given to the house in Bechdel’s work underscores its symbolic significance as a place simultaneously marked by affective affiliations as well as a continuous tension. Fun home, belonging to the graphic novel genre, relies on writing and drawings to construct its spatial representation, bringing the author’s understanding of home to a visual dimension. Mediated through images, Bechdel’s literary creation is located within a structure of representation that provides the resources to consider its visual signifiers and explore the relationship between text and the graphic medium. My work intends to create an analysis of how the space of the home is portrayed, constructed and resignified in the narrative, drawing from critical assessments that approach the issue of how home conventionally appears in forms of artistic production and how these dominant conceptions can be destabilized.
Ana Lúcia Beck (Pesquisadora, UFRGS) Título: The young Man and the Sea Resumo: In Harley’s documentary With the entire sea to swim, based on his audio diary, Brazilian artist José Leonilson (1957‐1993) wonders if his art would ever be as beautiful as the poem he had just quoted. Great reader of poets like Cavafy (Lagnado 1998, 113/133) and showing close affinity with Brazilian poets Leminski and Ana Cristina Cesar, Leonilson exposes in such questioning a desire towards poetry, apparently viewed as something distinct from his own production in regard to the presence of verbal elements. The artist who elaborated Fisherman of words, a painting where a solitary subject fishes German words out of the water, produced many drawings, paintings and textiles full of loosen words and sentences, short poems and longer texts even, whose interrelation with the visual and endeavour on language approximate his artistic production to poetry much more than he anticipated. Such inter‐art elaborations are of significant contribution to any discussion regarding the relations between word and image, especially considering that they expose the difficulty faced by the artist to conceptualize his own production. We intend, therefore, to investigate the different relations developed in Leonilson’s production between verbal and visual elements, while also relating it to other artists like Leon Ferrari, Mira Schendel and Henri Michaux, amongst others. We aim to address inter‐media productions executed by single artists taking Clüver’s and Hoek’s notions of combination, integration and transformation, as reference to attempt the categorization of Leonilson’s pieces as hybrid production whose constituency might prove exemplary for any discussion regarding the relations between art and poetry.
Ana Luiza Fernandes (Estudante de pós‐graduação, PUC‐Rio) e João Queiroz (Professor, UFJF) Título: Quarenta clics em Curitiba –Fotolivro de literatura como fenômeno intermidiático Resumo: Quarenta clics em Curitiba, publicado em 1976, é um raro, quase sem precedentes, fotolivro de literatura brasileira. Realizado colaborativamente por Paulo Leminski e Jack Pires, o exemplar é feito de quarenta fotografias “combinadas” a quarenta poemas, dispostos em folhas soltas de idênticas dimensões. Cada fotografia de Pires divide a folha/prancha com um poema de Leminski, cuja estrutura e proposta literária identifica‐se, estilística e historicamente, com o haicai, gênero poético de origem japonesa. Paulo Leminski, principal representante da tradição japonesa em língua portuguesa, encontra no haicai a principal moldura estético‐filosófica para suas criações: uma linguagem coloquial, enxuta, e a preocupação com a captura do “instante poético”. Na obra do poeta, considerado um dos mais importantes escritores brasileiros da segunda metade do século XX, Quarentaclicsaparece como seu único experimento intermidiático com fotolivro e sua primeira publicação como haicaísta. Contudo, o exemplar sequer é mencionado em antologias dedicadas ao gênero “fotolivro”, ou em publicações especializadas, e ainda é negligenciado pela crítica e historiografia literárias. Uma vez que o fotolivro é um complexo de relações entre duas ou mais mídias, são os estudos sobre intermidialidade (intermedialstudies) o domínio teórico e conceitual considerado mais adequado para sua abordagem. O objetivo deste trabalho é apresentar Quarentaclicsem Curitiba como um fenômeno de intermidialidade, e como um importante caso de fotolivro de literatura brasileira. Aplicamos, portanto, conceitos de intermidialidade aQuarenta clicse dedicamos alguns parágrafos à breve análise de certas pranchas, exemplos do “denso acoplamento” criado entre poesia verbal (haicai) e fotografia.
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Ana Paula Orlandi Mourão Delfim (Estudante de pós‐graduação, USP) Título: Poesia em disco no Brasil: a experiência do Selo Festa Resumo: Pretendo falar sobre a gravação de poesia em disco no Brasil a partir da experiência do Selo Festa, pequena gravadora fundada em 1955, no Rio de Janeiro, pelo jornalista Irineu Garcia (1920‐1984) e pelo livreiro Carlos Ribeiro (1908‐1993). A gravadora manteve, principalmente nos primeiros anos de vida, uma estreita ligação com a literatura, mais especificamente com a poesia. A coleção de estreia é uma prova desse vínculo. Entre 1955 e 1957, Poesia Brasileira lançou 13 LPs, sempre com uma dupla de poetas, cada um ocupando um dos lados do disco, recitando os proprios poemas. Sao eles (por ordem de lancamento): Carlos Drummond de Andrade e Manuel Bandeira, Paulo Mendes Campos e Vinıcius de Moraes,Abgar Renault e Augusto Frederico Schmidt, Guilherme de Almeida e Onestaldo Pennafort,Álvaro Moreyra e Olegario Mariano,Ascenco Ferreira e Vargas Netto, Emílio Moura e Menotti del Picchia, Adalgisa Nery e Cassiano Ricardo, Cecilia Meireles e Guilherme de Almeida,Joao Cabral de Melo Neto e Murilo Mendes,RosalinaCoelho Lisboa e Gilberto Amado e, por fim, Manuel Bandeira e Sérgio Milliet. Além de registrarem para a posteridade a voz de poetas jovens e veteranos, Irineu Garcia e Carlos Ribeiro convidaram intelectuais para assinar o texto de contracapa dos discos da coleção, como Paulo Mendes Campos e Sérgio Milliet, e também recrutaram artistas plásticos e gráficos para compor as capas, a exemplo de Di Cavalcanti, Lygia Clark, PotyLazzarotto e AthosBulcão. Vale dizer que, ao todo, o Selo Festa colocou no mercado por volta de 103 discos entre 1955 e 1970 – além dos mais de 60 LPs de poesia –, lançando também gravações de teatro, literatura, música popular e música erudita.
André Araújo de Menezes (Estudante de pós‐graduação, CEFET‐MG) Título: Fronteiras permeáveis: correspondências entre a literatura de Hilda Hilst e a pintura de Iberê Camargo Resumo: A correspondência das artes é um fato tão antigo em nossa cultura que aponta para o início da nossa civilização. O termo “écfrase”, que tem suas origens na Antiguidade, é um recurso utilizado em descrições de obras de arte e também como exercício retórico. Na atualidade, no âmbito dos estudos literários intermidiáticos, a “écfrase” é entendida como um conceito de descrição pictural ou iconotexto. Esse conceito, considerado um fenômeno da intermidialidade, vem sendo usado para definir um tipo de relação entre a literatura e outras artes e mídias. Segundo Márcia Arbex, “sabemos que a fronteira entre literatura e as artes visuais são permeáveis, que o espaço onde a letra e a imagem se encontram – ou se desencontram – é múltiplo e híbrido”. Este trabalho pretende estudar as relações entre palavra e imagem, entre o legível e o visível, entre literatura e pintura, mais especificamente, entre o conto “Lázaro” do livro Fluxo‐Floema (1970) de Hilda Hilst e as pinturas No vento e na terraI e II (1991) de Iberê Camargo, que pertencem à fase do retorno do artista à figuração. Toma‐se como mote inicial para o estudo a construção da imagem do corpo em ambas as obras, de modo a transitar pela literatura da autora e pela pintura de Iberê, potencializando essas correspondências através de relações intermidiáticas. A transcriação de imagens simbólicas e ideias filosóficas da pintura para a literatura dramática e vice‐versa será discutida à luz de perspectivas teóricas formuladas por Claus Clüver, Liliane Louvel e Márcia Arbex que ampliaram o âmbito dos conceitos de “écfrase” e transposição intersemiótica na contemporaneidade.
Andréia Shirley Taciana de Oliveira (Estudante de pós‐graduação, CEFET‐MG) Título: Portuguesia: escrita, corpo e voz Resumo:Este trabalho tem por objetivo analisar as confluências e interações entre a literatura e as mídias presentes no DVD encartado no livro Portuguesia: contrantologia, de Wilmar Silva. Neste, 101 poetas portugueses, brasileiros e africanos de língua oficial portuguesa apresentam‐se em leituras performáticas ao oralizarem os seus poemas, cujos sentimentos e emoções se tornam mais nítidos para os leitores e espectadores ao serem visualizados no vídeo. Para analisá‐lo, utilizamos o conceito de performance de Paul Zumthor e o conceito de videopoesia proposto por Giorgio diMarchis, visando estabelecer relações entre as poéticas e as performances dos poetas elencados no livro e no DVD, no sentido de identificar as diferenças de recepção do poema ao ser recitado pelo poeta na forma impressa do livro e ouvir/vê‐lo sendo declamado pelo seu autor, cujo corpo, movimentos, gestos e expressões possuem diversos significados; assim também as
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imagens contidas nesse DVD dizem da escolha dos temas e dos espaços para cada poeta. Cabe destacar, ainda, que a forma como foram organizados os momentos de transposição de fronteiras, tão importantes para a língua e para a cultura dos poetas que participam do DVD, possibilita‐nos a intercomunicação, muitas vezes invisível, entre o espaço da produção da obra artístico‐literária, de um lado, e do espaço cultural, de outro.
Augustto Corrêa Cipriani (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: ALTERAR: um estudo dos dípticos de Gigolô de Bibelôs, de Waly Salomão Resumo: Gigolô de Bibelôs, publicado em 1983, é o segundo livro do escritor baiano Waly Salomão, que chama a atenção para a exploração da materialidade do livro e da visualidade da escrita, através das ilustrações, das diferentes tipografias utilizadas e, especialmente, pelo uso consciente do díptico. A partir da utilização de Stéphane Mallarmé dos dípticos em Un coup de dés, essa comunicação pretende explorar como o livro de Waly Salomão subverte a proposta de Mallarmé do díptico enquanto “página expandida”, tendo em vista a tensão e a clivagem que se opera entre as páginas de Gigolô de Bibelôs. Diferentemente do poema de Mallarmé, a obra de Waly Salomão enfatiza a dobra do livro, num movimento que ora aproxima ora distancia os textos presentes nas páginas. Tal proposta é evidenciada a partir do cotejamento de poemas, letras de música e textos visuais que exploram o tema da “alteração”, que se revela a partir do uso da tipografia. Em Gigolô de Bibelôs, bem como em seus “babilaques”, por exemplo, “ALTERAR” se apresenta como um signo verbal e visual que sintetiza sua poética. É, pois, partindo desse signo que essa comunicação intenta demonstrar como os dípticos presentes no livro de 1983 revelam procedimentos poéticos e visuais que perpassam a obra de Waly Salomão – seja desde seus primeiros trabalhos com “palavras‐destaque”, por exemplo, até seus últimos livros, em que a visualidade da página ganha protagonismo na significação geral da obra. Gigolô de Bibelôs, por fim, ao trazer à tona a dobra do livro enquanto elemento de significação, remete à própria materialidade do livro enquanto códex, fazendo com que esse livro seja um caso exemplar para se pensarem as relações entre literatura e seu suporte.
Barbara Cristina Marques (Professora, UEL) Título: Das Passagens: cinema, literatura, teatro e vídeo em Alain Resnais Resumo: Este trabalho surge de uma série de inquietações referentes às práticas estéticas que se mostram híbridas na convergência com outras linguagens, mídias, dispositivos e materialidades. Noções como Intermedialidade, Remediação (remediation, de Bolter e Grusin, 1999), Convergências, Hibridismo ou Hibridação, Midiatização/Mediação, têm aparecido com frequência nos estudos compreendidos em várias áreas das humanidades e das artes. Nessa direção, proponho uma reflexão de Vous n’avez encore rien vu (2012), de Alain Resnais, a levantar como hipóteses: a) de que modo se pode pensar em uma inflação de imagens que se fazem na repetição a partir do entrecruzamento com o texto literário, o teatro e o vídeo; b) qual o regime dessas imagens em cascatas a acompanhar o processo de encadeamento da narrativa; c) em que medida o filme esboça uma situação narrativa que se multiplica no campo visual em razão de um agenciamento que se faz pela alternância com outras “telas”.
Beatriz Schmidt Campos (Estudante de pós‐graduação, UnB) Título: A melopoética no romance Todas as manhãs do mundo Resumo: Todas as manhãs do mundo (1993) de Pascal Quignard é um romance interartístico que tem como característica principal a presença da música na literatura. Ainda que a obra seja ficcional, seu personagem principal, SainteColombe, é um compositor real que viveu no período barroco e a narrativa gira em torno de sua relação com a música. Neste trabalho pretendemos analisar as relações entre as duas artes no referido romance por meio da melopoética, proposta disciplinar apresentada por Steven Paul Scher (1970) e difundida por Solange Ribeiro de Oliveira (2002), que aborda as intercessões entremúsica e literatura por meio de três vias de estudo: a presença da música na literatura,na qual uma obra literária apresenta obras, comentários musicais e personagens músicos; a sincronia entre música e literatura,pela qual melodia e poesia coexistem – um exemplo é a ópera –; e ainda, a presença da literatura na música, que consiste em composições musicais
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baseadas em textos. Seguindo essa abordagem, temos a intenção de aprofundar no pensamento filosófico e no conceito de mímesis do período barroco, pois o personagem principal apresenta uma visão muito própria de “música” na busca da forma mais perfeita de interpretar uma obra quando ensina seu pupilo a ouvir e a entender uma composição mediante a observação dos sons e das cores da natureza. Além disso, há a possibilidade de analisarmos o referido romance no sentido de aproximar sua estrutura narrativa de uma “fuga”, (forma musical originada no período barroco). Para tanto, apoiar‐nos‐emos em uma outra categoria apresentada por Oliveira (2002): o estudo músico‐literário que propõe a análise de obras literárias que utilizam conceitos musicais em sua forma, como, por exemplo, um romance que apresenta a estrutura de uma sonata. Por fim, pretendemos adentrar em questões de espiritualismo presentes na narrativa, que influenciam o isolamento social do personagem e, consequentemente, sua relação com a música.
Biagio d’Angelo (Professor, UNB) Título: Proust e Boltanski: a obsessão pelas coisas Resumo: Com frequência Christian Boltanski cita Marcel Proust em suas entrevistas. E, como o próprio Proust, também Boltanski está à procura obsessiva de respostas sobre questões fundamentais da índole humana: como e por que descrever a morte? Ela pode ser aceita fora do parâmetro artístico? O que implica o distanciamento de coisas e seres queridos? Que mudança acontece ante a ausência? Por que, para restituir vida (se assim se pode dizer) é necessário um trabalho sobre a memória? A memória permite reconstituir o objeto de amor ou é uma ilusão estética? Porém, enquanto Proust tenta resolver a obsessão pela memória numa fulguração epifânica em que se reúne e se condensa todo o tempo perdido, em Boltanski manifesta‐se a consciência de uma divisão entre o eu e a realidade e, especialmente, a impossibilidade de que um Ideal possa preencher o vazio criado pelo sujeito. Boltanski acredita ainda na função redentora (no sentido psicanalítico) da arte. Os objetos e a memória a eles ligada reescrevem a Recherche proustiana em um arquivo antropológico que tenta lançar luz sobre zonas obscuras do Eu, e é disso que pretende tratar a investigação proposta nesta comunicação.
Bruno Guimarães Martins (Professor, UFMG) Título: A Sociedade Petalógica e performance literária no Brasil oitocentista Resumo: Paul Zumthor identificou modificações da oralidade em seu contato com a escritura como uma “oralidade mista”, o que lhe permitiu observar a poética da voz na “literatura” medieval. Por sua vez, nossa crítica literária já derramou muito de sua tinta acusando o fenômeno da oralidade, quase sempre como um incômodo ao sistema intelectual ou à literatura. Para nos desvencilhar das armadilhas impostas pela oposição entre escrita e oralidade, é necessário considerar aspectos que constituem qualitativamente a voz, ou seja, apreender o acontecimento histórico e literário a partir de sua “vocalidade”. Nesse sentido, buscaremos por sutilezas da voz, muitas vezes borradas pela escrita da história. Trata‐se então de buscar não só o que, mas como os membros da conhecida Sociedade Petalógica falavam e escutavam, liam e escreviam. Tal investigação parte dos registros impressos das sessões, publicados por Francisco de Paula Brito na Marmota Fluminense entre 1852 e 1858, exemplos da performance no cotidiano literário em meados do século XIX.
Carla Cristina de Araújo (Pesquisadora / Grupo Intermídia) Título: Música e dança no “Rondel do Alentejo”, de Almada Negreiros Resumo: A obra de Almada Negreiros presta‐se, com muita facilidade, aos estudos de interação entre as artes. Almada Negreiros foi poeta, contista, romancista, pintor, desenhista, caricaturista, dramaturgo, ator, bailarino, coreógrafo, figurinista, tapeceiro, vitralista e crítico de arte. Foi, enfim, um grande agitador cultural, que, juntamente com Fernando Pessoa, Santa‐Rita Pintor, Amadeo de Souza‐Cardoso, Eduardo Viana e tantos outros, fez da Lisboa do início do século XX o palco para tantas mudanças culturais. Sua obra estabelece laços com as de outros artistas e com quase todas as modalidades de arte. Sendo assim, estabelece relações intermidiáticas em mais de um nível, seja na recorrência ao mesmo tema na poesia, como no desenho e na pintura, por exemplo, seja na referência a obras de outros artistas, contemporâneos seus ou não. O “Rondel
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do Alentejo”, composto em 1913, é um poema cujo apelo para a música e a dança impõe‐se à sua leitura, despertando no seu leitor a percepção auditiva da música e fazendo com que ele, praticamente, visualize os movimentos da dança. Não bastasse isso, a publicação do poema, que se deu nove anos mais tarde, no segundo número da revista Contemporânea, de 1922, vem acompanhada de dois desenhos do próprio poeta, que, além de evocarem as imagens sonora e visual de música e dança dadas por sua simples leitura, estabelece o liame com mais uma modalidade artística, o desenho. A partir dessas observações, e com a fundamentação teórica dos estudos de intermidialidade propostos por Irina Rajewsky e ClausClüver, podemos falar em referências intermidiáticas e em transposição midiática. E é isso que a comunicação proposta pretende dar a conhecer.
Carolina de Souza Leal (Estudante de pós‐graduação, UFF) Título: Sobre o deslocamento: o percurso do imaginário de “Morte e vida severina” entre artes e mídias Resumo: Esse trabalho tem por objetivo discutir as questões da tradução e dos contágios intermediais por meio do percurso do imaginário de “Morte e vida severina” entre diferentes artes e mídias. Entende‐se a relação da literatura com outros meios não como uma experiência de adaptação de uma obra literária a outras mídias, mas de deslocamento das possibilidades do imaginário entre materialidades, recepções, tempos e técnicas. Sendo assim, percorrer as versões de uma obra é também caminhar pelas críticas feitas à obra, que promovem atualização, expansão e sobrevivência por meio de novos modos de recepção da obra. O processo de tradução entre diferentes meios é crítico do imaginário, na medida em que expõe suas possibilidades, e recriador das possibilidades de recepção, uma vez que gera novas versões. Assim, expande e transforma a própria obra. Para discutir tais questões, faremos alguns apontamentos acerca dos enfoques das seguintes versões de “Morte e vida severina”: o poema de João Cabral de Melo Neto, de 1955; a montagem teatral do Teatro da Universidade Católica de São Paulo, em 1965; o documentário de Zelito Viana, em 1977; o teleteatro de Walter Avancini, de 1981; os quadrinhos de Miguel Falcão, de 2005; e a animação de Afonso Serpa, de 2011. Perceberemos os contágios que realizam entre si e suas diferenças.
Caroline A. S. Fernandes (Estudante de pós‐graduação, UFPR) Título: Palavras e imagens como espaços ficcionais no livro Onde vivem os monstros, de Maurice Sendak Resumo: O presente trabalho busca discutir os processos de comunicação que se estabelecem no livro infantil de Maurice Sendak, Onde vivem os monstros (Cosac Naify, 2009). Pretende‐se identificar como as ilustrações, através da expansão que realizam, interferem sobre a diagramação, materialidade do livro e em seu layout, discutindo dessa forma não apenas o artefato mas também o que configura o livro ilustrado contemporâneo. No movimento que executam dentro do livro, palavras e imagens produzem novos sentidos e possibilidades de leitura. Dentre essas possibilidades, há, ao mesmo tempo, uma interação e conflito entre o aspecto civilizado e o selvagem, presentes no espaço ficcional protagonizado no livro pelo menino Max. No embate interno que vive o personagem, verificamos a atração pelo selvagem, como um escape da comunicação verbal, posta aqui como forma de domesticação e espaço de poder da mãe. Junto da expressão do selvagem, que demarca o espaço onírico e imaginário da aventura do menino, há uma jornada do “eu”, assim como a fuga para dentro desse espaço subjetivo, necessário para lidar com seus sentimentos intensos de ira e voracidade. Nesse local mágico, edificado na evolução das ilustrações do livro, encontramos as expressões mais intensas das emoções do personagem, expressas não apenas em sua ferocidade mas também moldados nas figuras dos monstros que habitam esse lugar. Unida a todas essas expressões, a obra dialoga com o próprio pacto ficcional, encenando a entrada do leitor na obra literária na forma que o protagonista do livro adentra seu ambiente inventado, na maneira que mergulha cada vez nas imagens que se expandem, justamente, para lhe dar passagem, para que junto do protagonista, o leitor também adentre o lugar onde vivem os monstros.
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Clara Matheus Nogueira (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: Letters of 140 characters: understanding adaptations from literary texts into social media websites as remediation of epistolary novels Resumo: In the beginning of the 21stcentury, with the popularization of websites that promote and facilitate the creation of content – such as blogs, vlogs, and podcasts –, new genres of literary productions made their debut, including adaptations from literary works into social media websites. Having Such tweet sorrowas a pioneer, a performance of Romeo and Juliet on Twitter, by the Royal Shakespeare Company, these adaptations have been calling attention to the many differences they have in relation to traditional media, especially when it comes to their interactive and “real time” aspect. However, this presentation is also aimed at discussing these productions within the literary tradition from which they sprung, discussing the similarities they bear with a canonized storytelling paradigm: the epistolary novel. In Remediation, Bolter and Grusin state that remediation is “a defining characteristic of the new digital media” (p. 45), and they consider it to be “the formal logic by which new media refashion prior media forms” (p. 273) and promise to offer “a more immediate or authentic experience” (p. 19). Certainly, the productions under discussion do not convey meaning through the use of letters in the traditional sense, however, if one considers that the many forms of electronic correspondence are a remediation of the written letter, it seems suitable to consider literary adaptations into social media websites a remediation of the epistolary novels. Therefore, borrowing concepts from the intermediality studies, such as remediation, will make possible for us to discuss these adaptations in their relation with other media practices, not as “brand‐new” cultural products, as they are usually described.
Constantino Luz de Medeiros (Professor, UFMG) Título: A estética do efeito e a especificidade das artes no Laocoonte (1766) de Gotthold Ephraim Lessing Resumo: Em sua obra Laocoonte (1766), Gotthold Ephraim Lessing caracteriza a especificidade das artes verbais e visuais de acordo com as plataformas empregadas e o efeito sobre o leitor, ouvinte ou audiência. Ao mesmo tempo que discute as considerações que Johann Joachim Winckelmann havia feito sobre a estatuária em suas Reflexões sobre a arte antiga (1755), o pensador alemão retoma o famoso paragone entre as artes ocorrido no Renascimento italiano, no qual tomaram parte autores como Leonardo da Vinci, Leon Battista Alberti, LodovicoCastelvetro, Baldassare Castiglione, entre outros. O intuito central do texto de Lessing é definir a especificidade das artes, demonstrando que as artes verbais se concretizam no tempo, enquanto as artes visuais dão‐se no espaço, de modo que a discussão clássica sobre qual dessas artes seria a mais elevada deixa de ter validade; assim também, a determinação sobre o efeito extraído delas deve levar em consideração seus media. Autores como Johann Wolfgang Goethe consideram que Lessing havia libertado tanto a arte quanto a crítica de arte do paradigma clássico do ut picturapoesis ao demonstrar que é impossível refletir sobre um fenômeno artístico sem observar seu efeito. Esta comunicação tem como objetivo principal refletir sobre o papel fundamental de GottholdEphraimLessing na teoria do efeito e na discussão sobre a especificidade das artes no século XVIII, demonstrando que, ao mesmo tempo que pode ser considerado um dos primeiros teóricos dos media, Lessing antecipa reflexões acerca do efeito da literatura sobre o leitor que somente tomariam corpo no século XX, com a teoria da Escola da Recepção.
Daiane Carneiro Pimentel (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: Imagem‐personagem: a descrição pictural em Relato de um certo Oriente, de Milton Hatoum Resumo: Embora não apresente nenhuma imagem material em suas páginas, a obra Relato de um certo Oriente, de Milton Hatoum, realiza um profícuo diálogo com as artes visuais. A falta de ilustrações que concretizassem o universo ficcional do romance de Hatoum torna ainda mais explícita a capacidade de a literatura, com seus recursos próprios, fazer com que o leitor produza imagens mentais. Ao desenvolver essa capacidade literária de estimular o imaginário, acredito que o romance em questão preserva o valor da Visibilidade, tal como o definiu Italo Calvino. Incluída por Calvino na lista de valores que a literatura deveria conservar na contemporaneidade, a Visibilidade diz respeito ao processo imaginativo que se dá normalmente na leitura e que parte do texto verbal em direção à imagem. Assim, por meio da escrita, imagens materialmente
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ausentes – invisíveis, portanto – podem adquirir visibilidade. Em Relato de um certo Oriente, o processo imaginativo que caracteriza a Visibilidade é estimulado por meio de diversas estratégias, entre as quais destacarei a descrição pictural, conceito cunhado por Liliane Louvel. Mais especificamente, será abordada a descrição pictural de personagens, a qual é verificada no romance quando os narradores empregam elementos provenientes das artes visuais para referir‐se a um personagem e/ou o comparam a objetos de arte. Em tais ocasiões, sobressai a subjetividade do observador, cujo olhar enquadra personagens como se eles fossem uma obra pictórica, fotográfica ou escultórica. Por meio de um detalhamento descritivo em que aspectos como luz, cor e volume são enfatizados, a linguagem torna‐se imagética. Ademais, os personagens são percebidos pelos narradores como verdadeiras imagens, imagens essas que, não raramente, caracterizam‐se pela estetização e pela estranheza.
Daniella Carneiro Libânio de Almada (Estudante de pós‐graduação/Grupo Intermídia, Université Paris‐Nanterre – Paris X / Bolsista CAPES Brasil) Título: Obra de arte total e intermidialidade: convergências e conceituação Resumo: Para o compositor alemão Richard Wagner a verdadeira obra de arte total foi a tragédia, que não apenas unificava as diferentes expressões artísticas, mas estava em conformidade com o que havia de mais “profundo” e “nobre” para os gregos. A obra de arte do futuro deveria ser, segundo Wagner, o nascimento de uma nova consciência, em que homem e natureza estivessem reunidos, tal como o espírito grego. Para esta comunicação, traçaremos o percurso do conceito de “obra de arte total” (Gesamtkunstwerk) desde a sua origem, no romantismo alemão, passando pelo ideal modernista – com as vanguardas artísticas – e chegando até os dias atuais, onde vem ganhando forças como uma nova possibilidade conceitual para as artes contemporâneas. Refletiremos acerca da utopia wagneriana, bem como sobre as diferentes possibilidades apresentadas por tal conceito, principalmente no que diz respeito a uma verdadeira colaboração entre as artes, conforme apresentado pelo compositor alemão nos ensaios A obra de arte do futuro e Arte e revolução, ambos de 1849. Nessa discussão, ressaltaremos os pontos de contato, convergências e divergências entre os ideais da arte total e os estudos interartes e intermídia, uma vez que o conceito de “obra de arte total” já traz, em si, uma questão intermidiática, apesar de a intermidialidade não pressupor necessariamente uma obra de arte total. Para ilustrar as nossas reflexões, trataremos de exemplos tais como a ópera, a arquitetura e montagens contemporâneas de exposições de arte. Ao final, buscaremos delinear uma reflexão mais aprofundada sobre essa possibilidade teórica, uma vez que o referido conceito apresenta um grande potencial a ser explorado pelos estudos da intermidialidade.
Daniella Aguiar (Professora, UFU) e João Queiroz (Professor, UFJF) Título: From Gertrude Stein to contemporary dance: time and syntax in intersemiotic translation Resumo: Our aim here is to analyze how two important properties of Gertrude Stein’s portraits (related to cubist visual experiments and Jamesian theory of mind) are intersemiotic translated into two contemporary dance pieces: Always now slowly(2010), by Lars Dal Pedersen, and ,e [dezepisódiossobre a prosatopovisual de gertrude stein] (2008), by Daniella Aguiar and JoãoQueiroz. The first piece is divided into three parts and had its debut at Dansescenen, Copenhagen. The first part is a female duet mostly based on the portrait A Valentine to Sherwood Anderson (1923); the second one is a male duet mostly based on the portrait If I told him: a completed portrait of Picasso (1923); the third one is a quartet based on the playThree sisters who are not sisters (1943). ,e [dezepisódiossobre a prosatopovisual de gertrude stein] had its debut at Teatro Vila Velha, Salvador, Brazil. It is a duet divided into small semi‐independent episodes, and it is based on the following Stein’s portraits Orta or one dancing (1912), If I told him: a completed portrait of Picasso (1923), and the plays Four saints in three acts (1934), and Listen to me (1936). In those pieces, different choreographic approaches were used to explore Steinean syntactic and temporal properties, mainly related to the regular use of insistence and repetition in several organization levels, such as singular movements, movement sequences, motor tasks, sound objects, light behavior and so on. Here we analyze some of these approaches, explain how they are related to Stein’s work, and compare different choreographic transpositions.
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Davidson Maurity Lima Araújo (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: O corpo como uma escritura: as identidades não‐hegemônicas reveladas por Diane Arbus. Resumo: O presente trabalho propõe uma análise das fotografias de Diane Arbus (1923‐1971), fotógrafa norte‐americana considerada “thephotographeroffreaks” (fotógrafa das aberrações), que retratava em seus trabalhos aqueles e aquelas que escapavam de um padrão estabelecido e fugiam de uma norma vigente, tipos tipicamente marginalizados. Arbus resolveu olhar de perto essas pessoas, a fim de jogar luz, como no momento do disparo do flash, sobre as suas existências, num processo de criações de outras realidades possíveis. A partir de textos que enfocam questões de gênero e identidade, bem como textos sobre a história da arte, falaremos sobre a representação desses sujeitos queers, pós‐modernos, fragmentados e em processo constante de devir e como a fotografia faz vibrar o olhar e a percepção para a diferença.
Deborah Walter de Moura Castro (Professora, UFMG) Título: Leitura de uma página em branco Resumo: O interesse desta pesquisa nasce da observação e possibilidades de leitura de algumas experiências artísticas construídas em torno de uma fusão entre palavra e silêncio. No mundo da arte, a interação desses conceitos adquire formas diversas dependendo do meio em que se inserem. O objetivo desta apresentação é propor uma leitura de obras que se definem pela página em branco, reverenciada por seu suporte. Essa pesquisa apresenta análises propondo uma leitura do que a princípio parece ilegível, do que é geralmente entendido como uma ausência ou falta. Porém, a leitura de uma página em branco é um exercício de reconhecimento do que está presente. Na leitura da página em branco, nota‐se que ela não revela o nada, mas é capaz de abarcar uma infinidade de possibilidades, todas as cores do espectro. Para direcionar essa leitura, a análise toma como base os livros Reading theillegiblee Nomedium, do escritor e poeta americano Craig Dworkin. Segundo Dworkin, obras aparentemente ilegíveis são analisadas considerando elementos passíveis de leitura, o que ele chama de substrato. Quando a página em branco se apresenta despida, ela revela o substrato, não como um significante transparente, mas como um objeto com propriedades materiais, detentor de histórias e potencial significante. A partir daí, a página em branco no universo da arte permite leituras análogas à letra no universo literário, o que torna necessária a ponte entre esses dois universos. O valor da página em branco para a literatura é a fascinação do indeterminado, da escuridão que paradoxalmente está no branco que ofusca, nos caminhos tortuosos que oferece e na potencialidade da criação. Algumas das obras escolhidas para ilustrar a leitura da página em branco estão Sherazade (2007), do brasileiro HilalSamiHilal, e Trenzinho (1965), de Mira Schendel.
Dennys Silva‐Reis (Estudante de pós‐graduação, UnB) Título: Literatura e escultura: transições, transformações, transposições Resumo: A escultura foi uma das primeiras estéticas a serem reconhecidas como arte. Ela existe desde os primeiros povos e pode‐se dizer que ela acompanhou a humanidade mesmo quando esta não tinha ainda história, ou seja, data da pré‐história. Entretanto, percebe‐se que a valorização dessa arte diminuiu porque, de um lado, vê‐se um interesse maior pelas novas formas de arte e, de outro lado, ela se tornou um objeto de museificação, o que faz dela alvo de uma admiração institucionalizada e igualmente objeto de difícil criação quando se observa sua maneira de produção. Pensando a relação da escultura com a literatura, vê‐se que esta última é a “responsável” – além do museu – de continuar a valorizá‐la. É por isso que nossa pesquisa tem como objetivo recuperar os vínculos entre literatura e escultura no Ocidente, em particular na América Latina. Do ponto de vista dos estudos interartísticos, almejamos mostrar de que maneira as duas artes se encontram ou se afastam. Além disso, são reconhecidas ao menos três tipos de transposições interartísticas entre os dois campos, a saber: a ekphrasis, a adaptação e a tematologia/temática. Discutindo os conceitos de poema‐objeto, instalação, afeto escultural, dentre outros, notamos que as transmutações entre os dois domínios artísticos são muito ativas na contemporaneidade.
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Edimara Lisboa (Estudante de pós‐graduação, USP) Título: O ambiente interiorano na modernidade: reflexões sobre as Angélicas de Lúcio Cardoso e Manoel de Oliveira Resumo: A sobrevivência de gestos aristocráticos no meio rural e nas cidades pequenas – seja no espaço mineiro, no caso do escritor brasileiro Lúcio Cardoso (1912‐1968), seja no espaço portuense, no caso do cineasta português Manoel de Oliveira (1908‐2015) – é tematizada de modo coincidente em duas obras gestadas em meados do século XX, nitidamente atentas ao contexto pós‐guerras mundiais e que buscaram, numa onomástica irônica, maneiras de problematizar as encruzilhadas entre tradição e modernidade no ambiente interiorano. Esta comunicação apresentará resultados parciais da minha pesquisa de doutorado em andamento, a qual empreende um estudo comparativo entre o texto da peça Angélica, de Lúcio Cardoso – escrita em 1945 e encenada pela primeira vez no Teatro de Bolso, sob direção dele, em 1950 –, e o filme O estranho caso de Angélica, de Manoel de Oliveira – cuja primeira versão do roteiro foi escrita em 1952 sob o título Angélica, mas que, por diversas razões, só veio a ser realizado em 2010. Colocando de lado a ultrapassada preocupação com fontes e influências, para discutir afinidades subterrâneas atinentes a uma mesma geração de artistas católicos ocidentais, pretende‐se analisar a relação entre a dubiedade que o nome celestial das duas diferentes protagonistas ganha no confronto com suas características infernais e o similar comprometimento artístico desses dois autores de língua portuguesa em apreender uma realidade social historicamente localizada, mas transcendentalmente apreciável no que se refere à experiência místico‐religiosa e à fascinação pelo mistério da morte, pela oscilação entre bem e mal, e pelos obstáculos para a compreensão da natureza humana.
Elaine Barros Indrusiak (Professora, UFRGS) Título: Cinebiografias literárias: adaptando e questionando o histórico e o ficcional Resumo: Esta comunicação tratará de cinebiografias, um dos mais antigos e formulaicos gêneros cinematográficos. Popularizadas na época de ouro dos estúdios hollywoodianos e, como tal, marcadas por um forte pendor comercial, tais obras não deixam de oferecer complexidades dignas de escrutínio. O subgênero das cinebiografias de escritores, em particular, aproxima, em um mesmo texto, cinema, história e literatura, dando margem a questionamentos acerca de autoria, representação e mesmo quanto à natureza e à função do literário, por vezes fazendo interagir em um mesmo universo narrativo representações de autores e de seus personagens ficcionais. Com isso, tais obras enquadram‐se perfeitamente no conceito de metaficção historiográfica (HUTCHEON, 1990), voltando‐se sobre si mesmas em busca das raízes e formas do discurso histórico para concluir que tais raízes e formas subjazem, também, as narrativas ficcionais. Ao ficcionalizar figuras históricas e historicizar personagens ficcionais, a metaficção historiográfica problematiza os papéis da arte e da história, do fato e da ficção, bem como os limites da linguagem e da representação. Cinebiografias literárias também desafiam preconcepções acerca de valor cultural, uma vez que se valem de meios de comunicação de massa para retratar gênios literários a partir de novos e insuspeitados ângulos, reforçando a natureza humana de grandes figuras históricas e artísticas, por vezes questionando identidades, ou mesmo configurando “próteses de memória” (BURGOYNE, 1997) para rostos não tão conhecidos do grande público. Assim, paradoxalmente, tais obras reforçam a “morte do autor” (BARTHES, 1977) ao mesmo tempo que reiteram concepções biografistas e românticas do literário. Com isso, essas interessantes adaptações histórico‐literárias reposicionam tanto obras literárias quanto seus criadores dentro de sistemas culturais, renovando e ampliando públicos e até mesmo transformando poetas de outrora em celebridades pós‐modernas.
Érica de Lima Melo Garcia (Pesquisadora/Grupo Intermídia)
Título: Do livro à cena: intermidialidade no teatro para crianças Resumo: A presente comunicação tem por objetivo apresentar algumas considerações a respeito das relações entre palavras e imagens nos livros infantis O pato, a morte e a tulipa e A grande questão, de Wolf Erlbruch, e sobre o processo de adaptação destes para teatro no espetáculo Mas que história é essa?, do Grupo Real
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Fantasia. O espetáculo, que funde circo e teatro através da figura e técnicas do clown, estreou e cumpriu temporada em 2008, no Galpão Cine Horto.
Fabricio Vaz Nunes (Professor, UNESPAR/EMBAP) Título: A tormenta encenada: as ilustrações de Fritz Eichenberg para O morro dos ventos uivantes, de Emily Brontë Resumo: O trabalho aborda a interpretação visual do romance O morro dos ventos uivantes, de Emily Brontë, pelo ilustrador Fritz Eichenberg no conjunto de xilogravuras incluídas na edição estadunidense de 1945, publicada pela editora RandomHouse. Nascido em Colônia, na Alemanha, em 1901, mas desenvolvendo a sua carreira nos Estados Unidos a partir de 1933, Eichenberg empregou, em várias entrevistas acerca do seu trabalho, o termo “diálogo” para se referir às relações estabelecidas entre os diferentes elementos visuais incluídos nas ilustrações, entendidas como construções de cenas. É a partir desse conceito de diálogo que são consideradas, neste trabalho, as articulações significantes entre os elementos visuais em cada imagem, como também as relações estabelecidas entre as ilustrações de Eichenberg e o texto de Brontë. A análise das relações entre o texto e as ilustrações coloca em destaque alguns dos elementos decisivos na estrutura do romance, como a subjetividade turbulenta dos personagens e também sua relação com a natureza ‒ aspecto que, como demonstrado em artigo de Margaret Homans (1978), possui um importante papel na economia narrativa do romance, tornando‐se uma espécie de figuração metafórica das perturbações psicológicas dos personagens. Essas representações textuais aparecem materializadas nas ilustrações a partir da leitura e interpretação efetuadas pelo ilustrador, aqui compreendidas como “síntese ativa”, expansão do conceito de “síntese passiva” delineado pela teoria da recepção do texto literário de Wolfgang Iser em sua obra O ato da leitura (1996). Consideradas em seu conjunto, as ilustrações apontam, ainda, para os paralelismos, contrastes e resoluções do romance, dialogando assim com a própria estrutura narrativa de O morro dos ventos uivantes. A pesquisa desenvolvida busca, pois, demonstrar alguns dos procedimentos empregados na ilustração literária, entendida como um caso específico de intermidialidade que coloca em diálogo a literatura e as artes visuais.
Fernanda Barini Camargo (Estudante de pós‐graduação, UNESP‐Araraquara) Título: Arquétipos do feminino no cinema de Manoel de Oliveira: uma leitura das relações especulares em O princípio da incerteza e Espelho mágico Resumo: O longevo cineasta português Manoel de Oliveira (1908‐2015) ficou bem conhecido na história mundial do cinema pelas suas originais transposições de textos literários para a tela. Dentre as suas mais produtivas parcerias está, a par da que manteve sempre com o presencista José Régio, a da prolífica escritora Agustina Bessa‐Luís, nortenha também ela. Nesta comunicação, pretendemos lançar luz sobre alguns aspectos relevantes da construção de personagens femininas que Manoel de Oliveira extraiu de narrativas de Agustina, nomeadamente no seu díptico cinematográfico constituído pelos filmes O princípio da incerteza (2002) e Espelho mágico (2005), respectivamente inspirados nos romances agustinianos Joia de família (2001) e A alma dos ricos (2002). Veremos como elementos específicos da linguagem cinematográfica – a exploração da cor em diversas tonalidades, a iluminação, o enquadramento, o close‐up, a movimentação ou a fixação da câmera, a articulação de banda sonora às imagens, o corte e a montagem dos planos etc. – dão azo a que o cineasta acentue ou transforme características mais ou menos evidentes das protagonistas dos romances, e como ele inverte ludicamente os perfis dessas personagens em Espelho mágico, filme que, como o nome indica, reflete especularmente (invertidos, portanto) os mesmos arquétipos do feminino (o da santa e o da devassa) que víamos em O princípio da incerteza, encarnados nas mesmas atrizes nas duas películas: Leonor Baldaque e Leonor Silveira. Que tipo de interpretação dos textos de Agustina essas inversões especulares do cineasta sugerem, é o que esperamos apontar, evidenciando assim como cinema e literatura podem se iluminar reciprocamente.
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Fernanda Cecilia Campos Coimbra (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: Arquivo de passagem ‐ Uma análise sobre a coleção de santinhos de falecimento de Milton Ferreira Resumo: A proposta consiste na análise da coleção de santinhos de falecimento de Milton Ferreira, exposta em sua casa, na zona rural de Arcos/MG, propondo reflexões sobre o papel da fotografia e dos textos de homenagem presente na construção dos santinhos e sua re‐significação a partir da instalação construída e exposta por Milton. Na casa é possível identificar uma variedade de coleções de objetos pessoais, que no todo acabam diluídos em um grande arquivo. As coleções possuem uma relação estreita com os arquivos que produzimos diariamente, pois são vivos e estão em constante mutação. A questão da memória é evidente, especificamente na relação que produz na sua noção como acúmulo. O foco será o mural construído na entrada da residência. Utilizando santinhos confeccionados como notas de falecimento, Milton cria um painel, pregando‐os na parede principal da casa. Os santinhos potencializam o que todo arquivo guarda: o esquecimento, a corrosão e a memória. Desse modo, esse seu novo arquivo neutraliza a história presente em cada santinho e retira sua função, conferindo liberdade imaginativa e interpretativa ao espectador. Os santinhos de falecimento são impressos que utilizam uma fotografia do morto que represente a sua aparência ou que tragam sensação de felicidade e paz. As fotografias costumam vir acompanhadas de letras de músicas, versículos bíblicos ou homenagens. São uma lembrança física, associada à vida do falecido, e por isso podemos considerá‐lo como um objeto biográfico e de valor afetivo. A entrega dos santinhos é parte dos ritos de passagem da morte e, tendo ou não um caráter religioso, marca, para os que ficam, um momento de despedida e de transição na vida. O morto vai para sempre continuar presente, eternizado através de imagem e escrita: nas fotografias e na honra dos seus ensinamentos, que através dos santinhos se tornam sacralizados.
Fernando de Oliveira Magre (Estudante de pós‐graduação, USP) Título: A música‐teatro de Gilberto Mendes à luz da intermidialidade: a sistematização de uma metodologia analítica Resumo: “Música‐teatro” é um gênero limítrofe surgido nos anos de 1960 que consiste em um teatro musicalmente organizado, criado a partir de conceitos e técnicas composicionais musicais, de modo que música e movimento se relacionem de maneira igualitária (REBSTOCK, 2012; SALZMAN e DÉSI, 2008). Gilberto Mendes (1922‐2016) foi um compositor pioneiro neste gênero no Brasil, e um dos seus inventores em nível internacional. Em nossa pesquisa, constatamos que a música‐teatro é, por essência, um gênero intermidiático, posto que sempre envolve ao menos duas mídias diferentes. Além disso, observamos que Gilberto Mendes tem obras de música‐teatro que se encaixam dentro das três categorias de intermidialidade descritas por Irina Rajewsky (2012): combinação de mídias, referências intermidiáticas e transposição midiática. A partir dessa constatação, buscamos sistematizar uma metodologia analítica capaz de observar o processo composicional de Mendes e a maneira como ele estabelece sentidos a partir dos processos intermidiáticos. Em relação à “combinação de mídias”, analisamos a forma adotada por Mendes para colocar em contato diferentes mídias. Para tal, utilizamos paralelamente a teoria de multimídia musical de Nicholas Cook (1998), investigando se as mídias se relacionam em consonância, complementaridade ou contestação. O processo de “referências intermidiáticas” foi observado na maneira como Mendes utiliza técnicas musicais na organização de estruturas cênicas, ou, por outro lado, como utiliza técnicas extramusicais na organização de elementos musicais. Por fim, a “transposição midiática” foi observada enquanto método composicional, especialmente na transposição de quadros, poemas visuais ou poemas semióticos para obras músico‐teatrais. Através deste trabalho, apresentamos a metodologia por nós desenvolvida para a análise de obras de música‐teatro de Gilberto Mendes, atentos especificamente para a utilização das categorias de intermidialidade. Além disso, buscamos aumentar o diálogo entre os estudos de intermidialidade e a musicologia, oferecendo uma forma de analisar processos composicionais presentes na música‐teatro e em gêneros similares.
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Fernando Luis Cazarotto Berlezzi (Estudante de pós‐graduação, Mackenzie) Título: Das páginas da Bíblia à tela da TV: a transposição literária na minissérie A história de Ester Resumo: Transpor obras literárias para veículos audiovisuais é algo tão antigo como o próprio cinema, possuindo uma longa tradição que se iniciou com o cinema mudo e se prolongou até o sonoro. Ora, se foi prática comum a relação entre a literatura e as outras artes, nomeadamente o cinema, onde existe, de fato, inúmeras adaptações de textos escritos, não é de admirar que quando a televisão iniciou as suas emissões regulares, perante a necessidade de criar uma grelha de conteúdos, seguisse esse exemplo. Adaptar uma obra literária para a TV significa preencher os requisitos técnicos que compõem a confecção de um roteiro com o próprio livro. Como ocorre no processo de moldar‐se algo, geralmente precisamos deixar um elemento de fora ou inserir o que seja necessário, o que caiba durante o processo. Ao mesmo tempo em que o cenário se mostra favorável às adaptações bíblicas para o meio audiovisual, sendo perceptível o interesse tanto do público quanto de produtores, constata‐se que há uma escassez de pesquisas sobre o tema específico, o que revela a importância desta pesquisa acadêmica. Este trabalho discorre sobre a adaptação feita pela ficção seriada televisiva da obra literária bíblica do Livro de Ester. O objetivo geral: verificar que tipo de alteração ocorre no processo de transposição do texto bíblico para outras mídias. Objetivos específicos: análise da questão ideológica no texto e no vídeo, a construção dos personagens, cenários e o enredo e identificar os recursos utilizados na minissérie que a aproximaram ou a distanciaram do texto literário. A pesquisa na qual se funda esta apresentação desenvolve‐se da seguinte maneira: leitura do livro bíblico de Ester e do roteiro da minissérie, e por último assistir a minissérie com o objetivo de verificar os elementos de narrativa e de sua transposição para a televisão na minissérie A história de Ester da rede Record.
Fernando Macedo Rodrigues (Professor, UEMG) Título: A utilização de recursos tecnológicos nas práticas informais de aprendizagem musical Resumo: Esta pesquisa destina‐se ao estudo das adaptações e aplicações das práticas informais de aprendizagem musical numa escola pública. O intuito é conhecer a articulação desses processos, seus procedimentos e suas inter‐relações, visando auxiliar a atuação dos professores e do ensino musical de uma maneira geral. Através deste estudo qualitativo (MERRIAN, 2009) conjuntamente com a utilização de técnicas etnográficas de coleta de dados, poderemos traçar as possibilidades de adaptação e aplicação das técnicas informais de aprendizagem musical nas escolas de música. A pesquisa contou com a formação de grupos de alunos nas oficinas de música realizadas numa escola pública de Ensino Médio, na região norte de Belo Horizonte/MG, no ano de 2014, e encontra‐se na etapa de finalização. Nesses grupos foram aplicadas, estudadas e discutidas as principais práticas informais de aprendizagem musical que, segundo Green (2008), são explicadas assim: a aprendizagem informal geralmente começa com a música que os próprios aprendizes escolheram; utiliza a cópia de gravações de ouvido como recurso de aquisição de habilidades; acontece de maneira solitária ou conjuntamente com pares ou em grupo; tende a ser assimilada com exemplos musicais do “mundo real”; integra escuta, performance, improvisação e composição em todo o processo de aprendizagem (GREEN, 2008, p.10). Como os primeiros resultados destacamos a utilização dos telefones celulares por parte dos alunos como principal meio de escolha, escuta e compartilhamento das suas músicas. Os alunos relataram que durante o seu aprendizado eles utilizaram de plataformas da internet – por exemplo, <cifraclub.com.br>, que traz vídeos demonstrativos com o passo‐a‐passo sobre como tocar uma música em instrumentos diversos, e o <youtube.com>, que traz vários vídeos demonstrando como se tocar uma determinada música. Evidencia‐se aqui a importância do entendimento das possibilidades de utilização desses recursos tecnológicos como instrumentos para o enriquecimento do ensino musical.
Flávia Almeida Vieira Resende (Pesquisadora, UFGD) Título: Técnica mista para lembrar: Sin título: técnica mixta, de Yuyachkani, e a história peruana Resumo: Este trabalho propõe uma análise do espetáculo teatral Sin título: técnica mixta, criação coletiva do grupo peruano Yuyachkani, estreado em 2004 e revisado em 2015. Acreditando que “combatir el olvido es una manera de hacer justicia”, Yuyachkani constrói, na peça, um espaço de memória, que revisita a história do
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Peru, sobretudo em dois momentos marcantes de violência (principalmente contra a população indígena do país): a Guerra do Pacífico, contra o Chile, entre 1879 e 1883, e o mais recente Conflito Armado Interno, entre 1980 e 2000. Embora apresente uma dramaturgia, no sentido de um roteiro a ser seguido, o espetáculo convida o espectador a transitar livremente pelo espaço (um galpão, sem assentos para o público), a se deter segundo a sua vontade, e a interagir com informações e estímulos visuais e sonoros. Como o título da obra evidencia, apesar de se aproximar da linguagem das artes plásticas, neste espetáculo são utilizadas diversas técnicas de composição, o que faz com que ele possa ser lido como “teatro performativo”. A performance, esse conceito amplo e caro à contemporaneidade, tem sido frequentemente utilizada para ler os trabalhos de Yuyachkani. Isso não apenas pela mistura de linguagens e pela atuação estética do grupo em manifestações políticas, mas também pela aproximação de Yuyachkani com práticas da cultura andina, de difícil classificação ante os conceitos da arte ocidental, mas mais bem assimiladas pela ideia de “performance”. Sob diversas influências e com um trabalho que congrega múltiplas linguagens, Yuyachkani apresenta, em Sin título, um convite a revisitar a história peruana, sobretudo de massacre às populações indígenas, com imagens que mesclam informações jornalísticas (programas de televisão, jornais, livros de história) e um tratamento estético e ritualístico, com a performance dos atores em cena, com pinturas e escritos nas paredes, com instalações visuais, com a utilização de bonecos e máscaras.
Flávia Ferreira de Paula (Estudante de Pós‐graduação, UFMG) Título: Metodologia de análise de texto e imagens em narrativas infantis ilustradas orientada para os Estudos da Tradução Resumo: A pesquisa apresentada nesta comunicação afilia‐se à Linguística Sistêmico‐Funcional (LSF) e aos Estudos da Tradução, e apresenta uma metodologia de análise das relações lógico‐semânticas (RLS) texto‐imagem em narrativas infantis ilustradas em textos originais (TOs) e textos traduzidos (TTs). O objetivo é analisar como os diferentes sistemas semióticos (linguagem e imagens) no estrato da expressão operam conjuntamente para gerar o significado realizado no estrato do conteúdo nessas narrativas. Os textos analisados são narrativas publicadas originalmente em língua inglesa e suas respectivas traduções para o português brasileiro, identificando‐se, assim, configurações de operações prototípicas desses textos e verificando‐se como elas acontecem em TOs e em TTs. A metodologia é composta basicamente de quatro etapas: 1) digitalização dos textos e das imagens; 2) segmentação dos textos em orações e anotação das mesmas em planilhas eletrônicas de acordo com as categorias da representação da experiência (metafunção ideacional), com base em Halliday e Matthiessen (2014); 3) numeração e anotação das imagens de acordo com as categorias da representação da experiência (metafunção ideacional), com base em Kress e van Leeuwen (2006); 4) mapeamento das RLS texto‐imagem, de acordo com Halliday e Matthiessen (2014), com base na comparação das anotações dos significados ideacionais do texto verbal e das imagens, nos TOs e TTs. As contribuições do estudo são: 1) elucidação de questões relativas à constitutividade (papel essencial) e ancilaridade (papel auxiliar) da linguagem verbal em narrativas infantis ilustradas; e 2) com a contemplação de TOs e TTs, o desenvolvimento de uma metodologia e de metalinguagem, com base em modelos publicados, com o objetivo de se compreenderem os fenômenos de produção textual nos diversos níveis de contextualização da tradução.
Flávia Rodrigues Monteiro (Estudande de pós‐graduação/Grupo Intermídia, UFMG) Título: The Bard’s song of ice and fire: Shakespearean resonances in Game of thrones Resumo: The plots and characters developed by Shakespeare survived the oblivious nature of time through several rewritings that belong to different media. Works from fantasy literature and their own rewritings present resonances from the Bard; the TV series Game of thrones is an example. George R. R. Martin, author of the books in which the series is based, confessed that Shakespeare is one of his sources of inspiration along with historical facts such as the Wars of the Roses, which also worked as inspiration for some of Shakespeare’s history plays. The analysis of Game of thrones exposes several parallels regarding characters and plots from Shakespearean plays. The main theme of the series, the pursuit of the power that emanates from throne and crown, echoes Shakespearean history plays and tragedies. Another famous trait of the series, the diverse and creative ways in which the characters die, finds equivalence in the playwright’s work. In addition,
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Shakespearean characters share the archetypical qualities of some characters in Game of thrones. The shadow of Hamlet, the son that tries to find his way to avenge his father’s death, hovers over the Stark siblings. Girls that disguise themselves to survive in a strange environment, such as Twelfth Night’s Viola, are represented by Arya Stark. King Lear’s Edmund, the bastard son who is willing to kill his father along with his sibling, reverberates in Ramsay Bolton. These are just some of the aspects that contribute to the popularity and increasing interest of modern audiences in Game of thrones, mirroring the popularity of Bard during his time and through the centuries. Therefore, Martin’s rewriting and its transposition to TV result in the update of Shakespeare to modern audiences as they instigate and aid the approach of these audiences to the Bard’s legacy.
Francisca Luciana Sousa da Silva (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: Partitura midiática: do mito à música, vozes do passado numa ópera brasileira contemporânea Resumo: Na presente comunicação, que parte de investigação em curso no doutorado em Estudos Literários, apresentamos uma das óperas da multiartista Jocy de Oliveira, pioneira no desenvolvimento de um trabalho multimídia no Brasil. Em sua ópera Kseni, a Estrangeira (2003‐2006), ela retoma o mito de Medeia sob um viés político, cujo foco assenta na condição feminina, a exemplo da tragédia ática: uma bárbara, estrangeira por excelência, imigrante, há muito exilada de tantas pátrias, sem pátria segura para onde ir ou regressar. A reflexão sobre o mito é reportada à atualidade, ao mundo globalizado e ao poder hegemônico de destruição da memória, do ser humano, da própria terra, ferida, violada, ultrajada como esta Medeia. A vídeo‐ópera, no plano musical, parte de uma melodia medieval anônima em Langue d’Oc também inspirada no referido mito. A proposta, segundo a artista, é resgatar sua qualidade medieval ampliada por conceitos contemporâneos e o uso extensivo da voz humana acompanhada de instrumentos tradicionais e étnicos, assim como meios eletroacústicos. Compõe‐se de cinco cenas sem interrupção, além de contar com vídeos como cenário virtual. Trata‐se de uma montagem híbrida, mesclando elementos futuristas (figurino da orquestra, por exemplo) com notas clássicas e medievais (especialmente nas partituras, mas também na composição de algumas cenas). Por meio de uma breve análise crítico‐comparativa, sugerimos uma releitura do que ora chamamos “partitura midiática” nesse trabalho de Jocy: um princípio de linearidade em sua textura caótica pós‐moderna. Entre os autores visitados para esse fim, estão Roland Barthes e Michel Butor, tomando alguns conceitos referentes à imagem (sobrevivência, anacronismo) e à escrita (poética e musical) como gesto nesse processo de criação/invenção, além de Zygmunt Bauman, Didi‐Huberman, Tatlow, Sadie e Tyrrell.
Francisco Romário Nunes (Estudande de pós‐graduação, UFBA) Título: Abbas Kiarostami: imagens e fluxos poéticos Resumo: O trânsito poético do cineasta iraniano Abbas Kiarostami (1940‐2016) incorpora a produção cinematográfica, fotográfica e de poesia. Nesse sentido, Kiarostami cria uma obra constelar, rizomática, em que o fluxo poético atravessa a palavra e a imagem e reverbera no olhar do receptor que participa ativamente da criação de sentidos. Assim, este trabalho dedica‐se a refletir acerca da arte de Kiarostami, colocando em rotação uma produção visual que se conecta com o sensível, com o mínimo de recursos. Na coletânea de cinquenta e duas fotografias, As estradas de Kiarostami (2004), por exemplo, a paisagem do norte do Irã surge através de linhas, curvas e sombras; o enquadramento é rasurado para criar rastros. As fotografias estabelecem um fluxo poético, um devir na perspectiva de Deleuze (1995), um movimento de desterritorialização. Nessa perspectiva, seu trabalho é marcado pela relação interarte, em que aparecem conexões múltiplas e várias; combinações que se articulam tanto por meio de uma linguagem multifacetada. Sua poesia, portanto, é uma corrente contínua de (des)encontros. Nesse âmbito, nosso olhar de leitor também entra no fluxo, e navega nas margens das mídias que se interpenetram através do lirismo das criações do diretor iraniano.
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Fred Izumi Utsunomiya (Professor, Mackenzie) e Fernando Luis Cazarotto Berlezzi (Estudante de pós‐graduação, Mackenzie) Título: Uso de podcasts como apoio didático no ensino superior: descrevendo uma experiência em cursos de graduação presenciais Resumo: Podcasts são arquivos digitais de áudio disponibilizados para audição em dispositivos ou aparelhos eletrônicos, como MP3 players, smartphones, computadores etc. Geralmente seus conteúdos têm formato e linguagem parecidos com programas radiofônicos. Este trabalho sintetiza um experimento financiado pelo MackPesquisa – um programa de fomento de pesquisa da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM) – realizado em 2016 com alunos voluntários de cursos de Comunicação do Centro de Comunicação e Letras da UPM. Nesse projeto os alunos foram convidados a ouvir uma série de podcasts idealizados e produzidos pelos professores das disciplinas em questão, dias antes de uma avaliação escrita na qual seria cobrado esse determinado conteúdo. A finalidade dos áudios era a de ajudar os ouvintes a relembrar os conceitos apresentados nas aulas e que seriam objeto da prova. O formato dos podcasts explorou a imaginação dos alunos de forma lúdica, pois simulava diálogos entre estes justamente sobre o conteúdo ministrado no período pelos professores. Dias após a prova, foi realizada pesquisa de opinião junto aos alunos que se manifestaram a respeito da proposta. O projeto todo teve como intenção ampliar a compreensão sobre o uso de podcasts em situações de ensino‐aprendizagem e conhecer a opinião discente a respeito do recurso, que integra o rol de novas tecnologias de informação e comunicação. Entende‐se que é papel primordial do professor propor o uso de novas abordagens pedagógicas para o aprimoramento de sua proposta metodológica de ensino. No âmago desta proposição está um processo de planejamento, criação e produção de conteúdos elaborados a partir de textos escritos pelo próprio docente. A transposição de conteúdo de aula para a forma oral mediada pela tecnologia através do texto escrito é o aspecto de intermidialidade deste trabalho.
Geane Alzamora (Professora, UFMG)
Título: Mídia, intermídia, transmídia: apontamentos à luz da semiótica peirceana Resumo: O assunto desta comunicação gira em torno da noção peirceana de médium, fundada no processo de mediação, ou semiose, que envolve a determinação oriunda de um signo precedente (seu objeto) e a representação, por associação (experiência colateral), de um signo posterior, seu interpretante. A mediação sígnica ocorre em dois níveis: entre objeto e interpretante, pela mediação do signo; e entre uma cadeia sígnica (signo‐objeto‐interpretante) e outra, pela mediação do interpretante. Com base nessa perspectiva, tratamos mídia como arranjo midiático que individualiza uma cadeia sígnica em contínuo processo de transformação. Trata‐se de processo reticular de mediações sobrepostas que atualiza e particulariza certo conjunto de aspectos materiais, institucionais, textuais, estéticos, culturais, sociais e econômicos. Em contexto de conexões digitais, cada arranjo midiático é suficientemente coeso para se diferenciar de outros que lhe servem de referência, mas necessariamente poroso e pervasivo para se adaptar à semiose intermídia, que opera em dinâmica de afetação mútua. A semiose intermídia eventualmente dá lugar a processos de mediação transmidiáticos, os quais permeiam arranjos midiáticos variados em múltiplas associações que expandem, modificam e aprofundam o universo narrativo pela ação integrada de produtores oficiais e de consumidores. Tomamos a incompletude produtiva dos interpretantes como parâmetro conceitual para compreender o modo pelo qual as dinâmicas associativas em rede, aqui relacionadas à noção peirceana de experiência colateral, configuram hábitos de ação que desenvolvem e atualizam processos de mediação transmidiáticos em continuidade intermídia. Assim, a semiose transmídia é desdobramento da semiose intermídia e ambas operam em continuidade com base na porosidade e na pervasividade que caracterizam os arranjos midiáticos em conexões digitais.
Giovana Berbert Lucas (Estudante de pós‐graduação, UFV) e Gerson Luiz Roani (Professor, UFV) Título: A fuga de Bach: interlocução entre literatura e música no romance de Pedro Eiras Resumo: Na obra Bach, publicada em 2014, de autoria do escritor português contemporâneo Pedro Eiras, observamos como seus capítulos, protagonizados por personalidades históricas, se interseccionam formando
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uma narrativa híbrida e polifônica sobre a vida e obra do compositor Johann Sebastian Bach. O diálogo com a matéria musical se dá tanto no nível do conteúdo, posto que se fundamenta na biografia e nas composições do músico alemão, como também percebemos essa relação no nível estrutural do romance, pois sua organização correlaciona‐se ao gênero musical da “fuga”, ora considerado um processo composicional, ora um tipo de composição. A fuga foi constantemente usada por Bach e foi consagrada por ele através da peça inacabada A arte da fuga. A partir dessa interlocução entre literatura e música, almejamos analisar como se dá o processo de escritura do romance Bach em relação às características musicais e estruturais da fuga, tais como as ideias melódicas repetidas, as inúmeras vozes em volta da exposição de um sujeito e a estrutura exposição‐desenvolvimento‐fechamento. Dessa forma, procuramos estabelecer paralelos entre Bach e a fuga, oferecendo ao leitor uma possibilidade de leitura desse romance hipercontemporâneo que revisita a vida e obra do compositor de Leipzig. Por meio de nossa análise, postulamos que há interação entre as linguagens artísticas manifestada no conteúdo da obra e no processo estrutural do livro por meio dos traços da fuga explorados nesta pesquisa. Além disso, percebe‐se como o termo “fuga” toma um duplo significado na obra, pois o autor, além de inter‐relacionar sua estrutura textual à matéria musical, também realiza uma “fuga” (aqui interpretada como verbo) do músico alemão, já que Johann Sebastian não protagoniza diretamente nenhum dos capítulos da obra que leva seu nome.
Gracinéa I. Oliveira (Professora, FACISA‐BH) Título: Música e poesia na obra de Lucas José d’Alvarenga Resumo: Nesta comunicação, pretende‐se analisar as relações intertextuais entre alguns poemas (improvisos) do livro Poezias (1830), de Lucas José d’Alvarenga, com algumas modinhas/lundus do século XVIII/XIX ou cantigas de roda. Esta análise será norteada pela teoria da melopoética (SCHER, 1992), aplicada aos estudos da crítica cultural (OLIVEIRA, 2001). A melopoética abrange dois campos complementares: o técnico ou formalista e o cultural. Enquanto o primeiro apoia‐se em noções teóricas, críticas e metodológicas subjacentes à especificidade da literatura e da música (OLIVEIRA, 2002), o segundo é cultural. Sendo assim, tenciona‐se examinar a relação entre esses poemas e músicas, levando em consideração o contexto sociocultural do final do século XVIII e início do século XIX no Brasil. Nesse período de muitas transformações artísticas, literárias e políticas, novas formas poéticas e musicais aqui se formaram, consolidaram‐se e expandiram‐se como a modinha e o lundu (TINHORÃO, 2010). Nesse contexto, boa parte da poesia de Alvarenga (1830) foi produzida em saraus musicais em salões particulares da época, visto que o autor, além de poeta, era repentista. Mas, além do estudo desses aspectos culturais, será feita, como já afirmado, uma análise das relações intertextuais entre alguns improvisos e modinhas/lundus. Para isso, serão comparados alguns poemas de Alvarenga (1830) com músicas desses gêneros. O corpus musical será constituído de coleta dessas músicas já efetuada por pesquisadores como Mário de Andrade, Modinhas imperiais (1964); Milene Antonieta Coutinho Maurício, As mais belas modinhas (1976); Mozart de Araújo, A modinha e o lundu no século XVIII (1963), e outras obras que se fizerem necessárias.
Heidrun Führer (Professora/Grupo Intermídia, Lunds Universitet) e Janneke Schoene (Pesquisadora, Münster Universität) Título: Beuys’ Hut und “ZIEHN SIE DEN BEUYS AUS!” Resumo: Performance art is discussed as pure authentic, mostly because of its liveness, as argued by Erika Fischer‐Lichte who denies any form of mediation. But, within the concept of staging, the artist’s body is a ‘persona’; thus, in the process of significant acting, it is an intentional sign and media product. In other words, staging is a representational technique of authentic artifice. Taking German artist Joseph Beuys as example, the relationship between performance, authenticity and representation will be discussed by the process of authorial storytelling. The aim of the first talk is to show how Beuys epitomises this oscillation between presentation and representation: By staging himself with attributes like his hat he performs a stereotype rather than being an ‘autobiographical’ subject. Beuys’ artistic identity is a constitutive performance of an aesthetic construction. As a theoretical alternative to the mediation / immediacy opposition, we propose a concept of performative (de‐)construction as process.
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Isadora Bellavinha Maciel (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: Antes que você parta pro teu baile: Ana Cristina Cesar, do texto poético à performance cênica Resumo: Ana Cristina Cesar, em sua dissertação de mestrado Literatura não é documento, analisa os conceitos ou representações do literário no cinema documental sobre autores durante o período militar e aponta manifestações que rompem com uma relação que se pretende direta e objetiva entre o texto, o autor e a tela. Nesse sentido, “desafinar o coro dos contentes” significa assumir a parcialidade da leitura: ao invés de retratar, expor, naturalizar, opta‐se por subjetivar, metaforizar, encenar, intervir criticamente. Quando se toma o texto poético como matéria‐prima de um processo intermidiático, sua transposição para o cinema ou para o teatro se dá de modo inteiramente distinto da transposição de um texto narrativo, desbravando, talvez, caminhos ainda mais imprevistos na mídia de destino. Como atuar um poema? Ritmo, cadência, métrica, conteúdo, visualidade concreta, espaçamentos – como lançar os dados da grafia do livro à fisicalidade do ator, à efemeridade das imagens em movimento? A presente pesquisa tem como objetivo esmiuçar, a partir de sua proposta intermidiática, o desenvolvimento da peça teatral Antes que você parta pro teu baile, elaborada pelo Grupo Pira Poesia no Rio de Janeiro entre 2012 e 2015, e que se propõe uma transposição criativa da obra da poeta carioca Ana Cristina Cesar. Este trabalho amplia o pensamento defendido por Haroldo de Campos de uma “tradução como criação e como crítica” – ou ainda: transcriação – em direção à “intermidialidade como cruzamento de fronteiras” (segundo Irina Rajewsky), da poesia à performance cênica. Tomando o corpo humano como meio e denominador comum da experiência de criação – nada se escreve, se pinta ou se encena sem o corpo ‐ este estudo sugere procedimentos técnicos de desdobramento do texto poético para a plurimidialidade do teatro.
Izabela Baptista do Lago (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: A mise en scène da pintura: a transposição de O ateliê do pintor de Courbet para o teatro Resumo: O presente trabalho analisa sob a perspectiva dos estudos teóricos da intermidialidade a transposição da tela de Courbet O ateliê do pintor para uma peça teatral, realizada por Marianne Nahon, publicada em um livro com ilustrações do artista Charles Matton. A passagem do quadro de pintura para a mídia teatral envolve ricas e complexas relações intermidiáticas, que serão abordadas a partir da investigação dos recursos utilizados para a transposição. Em um segundo momento, realizaremos uma breve análise da composição do livro em que a peça foi publicada, em especial o cotejo texto‐imagem das ilustrações que o compõem e suas relações com a obra de Courbet.
Jéssica Luíza de Sousa Ribas (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: O movimento anacrônico da imagem na cena teatral Resumo: Este trabalho tem como objetivo discutir a questão temporal trazida pela imagem provinda da cena teatral, utilizando a definição de anacronismo empregada pelo filósofo francês Didi‐Huberman em seu texto Diante do tempo (2011), com a ideia de diferentes tempos que uma imagem pode conter. Ainda que a anacronia só se efetue a partir de um ir e vir que ocorre entre os tempos, ressaltar a palavra “movimento” funcionou como uma tentativa de acentuar seu significado no contexto teatral. Um movimento do anacronismo, portanto, que se apresente também no campo do visível, como imagem em cena, extrapolando o campo das ideias. Para melhor aplicação da proposta, esta investigação centrou‐se em torno de uma personagem “imagem‐malícia” (DIDI‐HUBERMAN, 2005) retirada do espetáculo O deszerto, do Coletivo Mulheres Míticas, que estreou sua montagem em dezembro de 2016, livremente inspirada no romance El desierto (2005) do premiado escritor chileno Carlos Franz. Dessa forma, esta pesquisa se deteve sobre a análise da representação de Claudia, uma jovem que, por sua obstinação em rememorar uma época da qual ela não faz parte diretamente, traz à tona o passado da mãe, uma ex‐juíza exilada de seu país no período ditatorial. É Claudia que, na ficção e no espaço físico teatral, em matéria e por meio de memórias e recordações, promove uma reunião de tempos por imagens literárias e plásticas (ROJO, 2016) que se formam dos dispositivos utilizados na cena. Interessa‐nos refletir, neste estudo, de que modo os conflitos temporais na cena teatral permitem que épocas sejam revisitadas, anacronicamente, e possam assim propor arranjos circunstanciais que
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interfiram nos modos de fazer e pensar dos sujeitos como forma de ressignificar a história, de “renovar o pensamento” (DIDI‐HUBERMAN, 2012).
João Luiz Teixeira de Brito (Estudante de pós‐graduação, UFBA) Título: Trânsito de formas [o corpo] na linguagem pop em Nirvana Resumo: O presente trabalho, como parte de uma pesquisa de doutoramento em Literatura e Cultura, reflete sobre a natureza da linguagem pop anglofônica, em seu caráter de poluição, no sentido em que suas formas transitam sem remorso entre os diversos âmbitos e mídias nos quais o pop se propaga, caracterizando assim uma linguagem ambivalente, fluida e resistiva. Esse trânsito pode, afinal, ser notado através de certas formas estéticas recorrentes na experiência dessa linguagem. Como objeto de análise desses fenômenos, apresentamos o trabalho de uma banda norte‐americana dos anos de 1990, o Nirvana, e as potências dialógicas abertas por sua obra musical e audiovisual com outras emergências artísticas norte‐americanas nas artes plásticas, na literatura e no cinema; nomeadamente, com as obras de Andy Warhol, da geração literária Beat e do cineasta David Cronenberg (este, canadense, produziu seus filmes nos Estados Unidos). A dimensão política dessa linguagem pop também nos interessa, na medida em que estabelecemos um diálogo teórico com a obra A sobrevivência dos vaga‐lumes (2011), do filósofo Georges Didi‐Huberman, para enxergarmos a experiência estética ambivalente propiciada pela arte pop como potencial tanto holofote quanto vaga‐lume. Em nossa linha de pensamento, o corpo (obra e indivíduo) é a própria resistividade e fluência dessa linguagem, respectivamente, como barreira e luz. Essa temática é explorada ao longo das obras de todos os autores que nos propusemos a estudar, emergindo em formas diversas, resistivas e potentes. Embora seja primordialmente o trabalho de Didi‐Huberman que nos oriente, de modo a lidar também com as questões próprias da tradução e do caráter intermidiático do presente estudo, bem como analisar a experiência dessas formas em processos contemporâneos de transculturação e alteridade, apresentamos referências ao trabalho de outros teóricos como Paul Ricouer, Walter Benjamin, Gilles Deleuze, Irina Rajewsky, Ieda Tucherman e Roland Walter.
João Paulo Andrade (Estudante de pós‐graduação, UEMG) Título: Memories are made of this: memória e presença segundo Nan Goldin e Hans Ulrich Gumbrecht Resumo: Apesar da dupla limitação temporal da vida humana pelo nascimento e morte, algo pode ser retido, resguardado e potencializado. Da condição finita da existência humana surge um desejo pela presença, por uma relação com aquilo que não está dado e que não está na esfera do sentido. É a partir desse pressuposto que iremos articular um paralelo entre as fotografias da artista americana Nan Goldin e os escritos do autor alemão Hans Ulrich Gumbrecht. O gesto de ambos reverbera um desejo de produção de presença. Apresentaremos a série fotográfica The ballad of sexual dependency (1979‐2004) pensando em que medida a ausência é superada pela presença imposta por suas fotografias. Apresentadas sem qualquer preocupação com a linearidade, tendo como pano de fundo uma trilha sonora que remete diretamente à alta carga emocional, confessional e biográfica de sua obra. A relação com Gumbrecht se dará na medida em que, a partir de seus escritos, podemos encontrar indicações do que seja essa produção de presença. Pensaremos também sobre como esse exercício de (auto)narrativa da artista se efetiva presentificando ausências, apesar da iminência do desaparecimento. Registro enquanto memória é dado incontornável do trabalho da artista, marca desse desejo compartilhado com seus espectadores: desejo de desproteger‐se do esquecimento através de seus instantâneos, e de testar os limites da própria vida: como continuar vivendo apesar da imposição ostensiva da morte? Como a imagem pode ser esse refúgio, guardando uma história e contando‐a com a mesma intensidade das experiências vividas? Que tipo de experiências a presença é capaz de introduzir em nossa relação com o mundo?
Júlia Carolina Arantes (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: O contato das coisas díspares: a justaposição em Nuno Ramos Resumo: Este trabalho pretende abordar a técnica da justaposição a partir de uma seleção de obras plásticas e literárias do artista Nuno Ramos. De acordo com o crítico de arte Alberto Tassinari, em Gestar, justapor,
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aludir, duplicar (1997), o método da justaposição é observável em pinturas de Nuno Ramos em que são amalgamados materiais na tela em branco, desde tintas a pedaços de coisas, ultrapassando os limites bidimensionais. As obras se avolumam, estendendo‐se em largura, profundidade e altura. Tassinari salienta que os elementos conglutinados na tela não se deixam misturar, tornar uma massa homogênea, resguardando suas diferenças, suas heterogeneidades. Neste estudo, em um primeiro momento, investigaremos como a técnica da justaposição se expande para outros trabalhos plásticos, além da pintura. Em um segundo momento, apuraremos se o método da justaposição se desdobra igualmente na obra literária de Nuno Ramos, principalmente no texto “Tocá‐la, engordar, pássaros mortos”, do livro Ó (2008). Buscaremos mostrar como, indissociavelmente, a forma e o conteúdo do texto apontam para o método da justaposição. Refletiremos, portanto, sobre esse modo operatório de colocar coisas díspares em contato, ainda assim mantendo a singularidade desses corpos que se tocam. Essa discussão se desdobrará no terceiro momento, por fim, em que versaremos sobre o tocar, eixo temático do texto supracitado do livro Ó, a partir da leitura de Le sens du monde (1993), de Jean‐Luc Nancy. Para o filósofo francês, a justaposição, o contato, a contiguidade dos corpos assume um sentido mais amplo, funcionando como modo operatório de todas as coisas do mundo e, em última instância, é o próprio sentido do mundo.
Júlio Abreu (Estudante de pós‐graduação, CEFET‐MG) Título: Profilogramas de Augusto de Campos e os pintores concretos Resumo: Esta comunicação tem como objeto o livro Profilogramas (Perspectiva, 2011), de Augusto de Campos, e sua relação com as artes visuais. Trata‐se de uma série composta de nove poemas: “fiaminghi” (1985), “sacilotto” (1986), “geraldo” (1986), “cordeiro” (1993), “fejer” (1993), “maurício” (1996), “charoux” (1996), “judith” (2000) e “wollner” (2002). O conjunto dos profilogramas compõe‐se de 21 poemas divididos em quatro grupos publicados em quatro livros: Viva vaia: poesia 1949‐1979, Despoesia, Não – poemas e Rimbaud livre. Os nove profilogramas agrupados posteriormente no livro homônimo homenageiam alguns dos expoentes que participaram da I Exposição Nacional de Arte Concreta (Enac), no Museu de Arte Moderna de São Paulo, em dezembro de 1956, e no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, em 1957. Nos poemas, o autor usa dos nomes dos artistas para dar título às peças: Hermelindo Fiaminghi (1920‐2004), pintor, desenhista, designer gráfico e professor; Luís Sacilotto (1924‐2003), pintor, escultor e desenhista; Geraldo de Barros (1923‐1998), pintor e fotógrafo; Waldemar Cordeiro (1925‐1973), pintor, escultor, desenhista, paisagista e crítico de arte, que organizou em 1952 o Grupo Ruptura; Kazmer Fejer (1923‐1989), escultor e químico industrial; Maurício Nogueira Lima (1930‐1999), pintor, arquiteto e professor; Lothar Charoux (1912‐1987), pintor, desenhista e professor; Judith Lauand (1922), pintora e gravadora; e Alexandre Wollner (1928), designer gráfico. Profilogramas são “poemas que tentam ser biogramas. Retratos poéticos que têm a ver com a personalidade daqueles em que se inspiraram”, como define Augusto de Campos. Assim, a comunicação procura mostrar os procedimentos usados por Augusto de Campos para retratar esses artistas homenageados, mas pretende mostrar também a relação dos procedimentos visuais, como a cor e a tipografia usadas pelo poeta para criar uma imagem análoga com o trabalho dos artistas retratados.
Larissa Degasperi Bonacin (Professora, UNIANDRADE/PR) Título: Sombras manauaras: análise do espaço na adaptação para os quadrinhos da obra Dois irmãos, de Milton Hatoum Resumo: O espaço é um dos conceitos que se ampliaram e modificaram com a contemporaneidade, sendo reinterpretado pela sociedade que o constrói, destrói e dele se apropria. O presente estudo pretende discutir de que forma o conceito de espaço foi apropriado e ressignificado na adaptação de autoria de Fábio Moon e Gabriel Bá da obra Dois irmãos, de Milton Hatoum, para os quadrinhos. Como suporte teórico serão utilizados, principalmente, os conceitos de Gérard Genette, Linda Hutcheon, Irina Rajewski, Luis Alberto Brandão, Will Eisner e Waldomiro Vergueiro, dentre outros. Pretende‐se, ao final da pesquisa, compreender de que forma o espaço na obra Dois irmãos foi reapropriado e traduzido pelos quadrinistas, e quais os diálogos possíveis entre a adaptação e a obra literária. Não somente será abordada a cidade de Manaus – de ontem, de hoje, e da memória –, mas também o casarão onde viveu a família e o qual foi palco de todas as felicidades e agruras sofridas por todos. Ainda será discutido como o desenvolvimento do enredo e das personagens se relaciona com o próprio desenvolvimento histórico‐social, do espaço urbano e dos espaços pessoais. Procurar‐se‐á
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compreender como a obra foi atualizada, ressignificada em sua narrativa a partir da linguagem sequencial, de recursos tais quais a estilização do desenho, a construção dos personagens, a caracterização dos cenários, figurinos e adereços, a ausência de ênfases cromáticas, o papel do narrador, a composição das páginas e dos quadrinhos, e, principalmente, o papel do espaço. Além disso, acredita‐se ser possível mostrar como as adaptações literárias para os quadrinhos não são simples retratos da obra, mas sim uma nova obra, aberta a tantas interpretações e ressignificações quanto aos traços utilizados em sua composição.
Lauren S. Weingarden (Professora/Grupo Intermídia, Florida State University) Título: Mediating Experiential Aesthetics: A Case Study for Installation Art at Inhotim Resumo: This paper addresses intermediality from two positions. From a practical perspective, Installation art, by nature, is not only multisensory, but multimedial. These works variously incorporate music and video tracks, hi‐tech computers and assemblages of everyday objects, and texts and images. The performative arts are also incorporated by the active spectator, upon whose participation Installation art solely depends. From a theoretical perspective, I seek to establish a rubric for defining and describing, what I call, “experiential aesthetics,” which also applies to modalities of Installation practices in other artistic forms (music, performing arts, film, literature). In modeling an interart experiential aesthetics, I mediate Installation artworks through transdisciplinary models: Affect theory (the study of the visceral, biological portion of emotion), Cognitive Poetics (the study of information processing in literature), and Neuroaesthetics (the study of neural responses to art viewing). Brazil’s outdoor museum Inhotim (Brumadinho, MG) and its collection of Installation artworks, housed in separate pavilions throughout its botanical gardens, provides the experiential data for modeling an “experiential aesthetics.” In this setting, our passage through spatial, topographical and physical transitions is marked by tactile, perceptual, auditory, and ambulatory sensations, generated by the artworks. Inhotim also allows for filling an aesthetic gap effected by Neuroaesthetics’ empirical studies. These studies are based on traditional static art forms and on vision as the conduit for aesthetic cognition. What they have not explored is the transformative‒ both psychic and physical‒experience encountered in contemporary Installation art which engages real‐time bodily movement. This embodied dynamic gains aesthetic prominence when Neuroaesthetics is mediated by Affect theory and Cognitive Poetics. Using specific examples of Installation artworks at Inhotim, I demonstrate how the affective power of these artistic constructs alter our cognitive understanding of not only the work at hand but also the quotidian realities in which we are engaged.
Leonardo da Silva (Estudante de pós‐graduação, UFF) Título: Canção e intermidialidade Resumo: Há dois fatores atrelados a mídias de maneira geral: os objetos da cultura – enquanto discursos – e a comunicação – dadas certas configurações peculiares de mídias semióticas que a concretizam. Os discursos estão vinculados a instâncias enunciativas específicas. A comunicação pressupõe um suporte material que a efetiva, por vezes, exerce influência sobre a estruturação da mensagem comunicacional, ou até certo ponto a determina. Nessa direção, a canção popular, um dos principais objetos de nossa cultura, está muito fortemente vinculada a mídias como o gramofone, o rádio, a televisão e a internet. Não obstante a canção pode ser entendida como uma “combinação de mídias”, na intersecção de letra, música (melodia, harmonia e ritmo), voz, performance (RAJEWSKI, 2012). Investigamos a instigante travessia da tradição oral ao domínio fonográfico, radiofônico, televisivo e cibernético (TATIT, 2008; TINHORÃO, 2014), a complexidade da mediação em função das novas tecnologias e sistemas de produção, do suporte material, para compreender as transformações estéticas promovidas pela articulação ou confluência entre artes e mídias contemporâneas. Neste trabalho, queremos pensar o lugar da canção popular na relação entre mídias, a relação da canção com outras artes e de que modo o advento das mídias analógicas, tais como gravação e ampliação de sons e da voz, cinema, e digitais, digitalização e processamento, divulgação pelos canais da internet, por exemplo, de que modo isso favoreceu a consolidação da canção como uma expressão intermedial da poesia (MÜLLER, 2012). Para tanto, a canção caipira nos oferece um proveitoso exemplo do itinerário de convergências e transições dos meios técnicos / tecnológicos.
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Leonardo David de Morais (Estudante de pós‐graduação, CEFET‐MG) Título: Poesia e fotografia: (im)possíveis interseções Resumo: As interseções entre a imagem e a palavra tomando o livro como suporte de materialização dessas linguagens têm sido exploradas, sistematicamente, por alguns autores e editores desde o surgimento da prensa de Gutenberg. Das vanguardas europeias à literatura brasileira, imagem e palavra, mais especificamente, poesia e fotografia, vêm sendo utilizadas de maneira sensível por nomes relevantes da cena poética na edição de parte significativa de suas obras. Em livros como Paranoia, que traz poemas do paulista Roberto Piva e fotografias do artista plástico Wesley Duke Lee, e Quarenta clics em Curitiba, cujos versos do poeta curitibano Paulo Leminski vêm acompanhados pelas imagens fotográficas de Jack Pires, a presença – por vezes, harmoniosa, por vezes, tensa – de versos e fotografias ocupando/dividindo o espaço da página não deixa de provocar e mesmo ampliar o olhar dos leitores mais atentos para as possibilidades de recepção advindas do entrecruzamento dessas linguagens. Nesse sentido, este trabalho intenciona apresentar, sem a pretensão de exaurir o tema, uma visada que consiga apreender algumas convergências e divergências perceptíveis nos elementos constituintes desses livros. Para tal empresa, será utilizado o conceito de coerência intersemiótica, construto teórico a partir do qual se busca avaliar o grau de coerência entre texto e ilustração. O objetivo é o de contribuir para a fomentação de uma perspectiva crítica que esteja atenta para as interseções entre linguagens a princípio distintas, mas não antitéticas, no âmbito literário e editorial brasileiros.
Lucas Costa Fonseca (Estudante de pós‐graduação, CEFET‐MG) Título: Imagem e memória em Viajo porque preciso, volto porque te amo Resumo: Este artigo busca investigar como se opera a relação entre imagem e memória no filme Viajo porque preciso, volto porque te amo (2009), de Karim Aïnouz e Marcelo Gomes, no documentário que o precedeu e no livro publicado em 2016. Deleuze afirma que as imagens podem ser constantemente atualizadas na medida em que quebram os vínculos sensório‐motores presentes nas imagens‐movimento e os subordinam aos signos ótico‐sonoros das imagens‐tempo. O interesse do espectador em perceber somente os clichês da imagem e nunca a imagem por inteiro faz com que ela sempre tenha algo não visto, não percebido. Esse contínuo cair em clichês, promovido pelos encadeamentos das imagens‐movimento, e a tentativa de traspassá‐los através de situações óticas e sonoras puras, fazem com que as imagens estejam em incessante mudança, assim como o tempo, e é tarefa dos realizadores submeterem o movimento ao tempo em seus filmes. Em Viajo porque preciso, os diretores empregaram imagens gravadas em 1997 durante uma viagem que fizeram ao sertão nordestino, com o objetivo de filmar o que os emocionasse. Fruto da vontade de conhecer um sertão que só sabiam de memórias e conversas de família, a viagem rendeu um documentário, em 2004, e um livro, em 2016, publicado sete anos após o longa. As imagens no formato impresso do livro também podem ser analisadas pelos critérios da filosofia de Deleuze, pois sua disposição sequencial e articulação as tornam móveis e adequadas à ideia de imagem‐movimento. As mesmas imagens, portanto, serviram a objetos diferentes, ao passo que as memórias ouvidas antes da viagem e das gravações se transformaram em outras, atualizadas como as imagens que as representam, explicitando, assim, a possibilidade de serem utilizadas em obras e tempos diversos. Nesse sentido, pretende‐se verificar, a partir da teoria de Deleuze, como objetos distintos podem adotar as mesmas imagens, fazê‐las perdurarem no tempo e contribuírem para a construção de novos significados e memórias.
Lucas da Cunha Zamberlan (Estudante de pós‐graduação, UFSM) Título: A Europa é uma festa: a influência do estilo Art déco em Pathé‐Baby, de António de Alcântara Machado Resumo: Este trabalho apresenta como objetivo construir uma relação entre a narrativa de viagem Pathé‐Baby, do escritor modernista brasileiro António de Alcântara Machado, e o estilo Art déco, materializado esteticamente em obras artísticas, publicidade, moda e objetos de decoração que pautaram boa parte das produções culturais europeias dos anos 1920 e 1930. Para tanto, recrutamos um aporte teórico baseado em autores como Duncan (2000), Eco (2010), Fauchereau (2015) e Barthes (2005) com o intuito de investigar as singularidades do Art déco – e a marcante afinidade que o estilo estabelece com as vanguardas europeias – buscando dimensionar: a) o seu complexo e fecundo alcance estético, em harmonia com o período de
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profundas transformações sociais, políticas e econômicas em que esteve em voga; b) os elementos particulares que o definem e; c) de que maneira esses traços tão bem definidos são impressos no texto literário de António Alcântara Machado, engajado em elaborar uma obra que apreendesse os contornos mais vivos e pulsantes das cidades francesas, italianas, portuguesas e espanholas que havia visitado. A partir dos resultados obtidos, é possível compreender não só a relevância do Art déco na composição da paisagem europeia, mas principalmente a estreita ligação que as características visuais mantêm com a escrita nesse livro em que tudo aponta para o casamento entre imagem e texto.
Luis Carlos Barroso de Sousa Girão (Estudante de pós‐graduação, PUC‐SP) Título: Arquivos de criação à mostra: práticas comunicativas em exposição no projeto literário de Suzy Lee Resumo: A presente proposta de comunicação reflete o fazer artístico de Suzy Lee com imagens que emanam palavras, sons e a imaginação. A artista‐narradora da Coreia do Sul é detentora de prestígio internacional na área da literatura infantil e juvenil com suas publicações em narrativas pictóricas, ou seja, sem fazer uso de textos verbais. A book‐artist, como prefere ser chamada, também é incentivadora constante de discussões acerca do objeto livro ‐ uma de suas inspirações ‐ em suas múltiplas facetas no desenvolvimento da percepção artística, tanto de crianças quanto de adultos. No contexto de tal atividade criativa e crítica em âmbito intermidiático das artes literárias, propomos uma breve reflexão sobre as práticas comunicativas de Suzy Lee tomando como base teórica o pensamento em processo desenvolvido pela pesquisadora e semioticista brasileira Cecilia Almeida Salles, na especificidade que envolve os arquivos de criação presente nos títulos Arquivos de criação: arte e curadoria (2010) e A complexidade dos processos de criação em equipe: uma reflexão sobre a produção audiovisual (2016). Ao expor índices de pensamento em criação por meio de falas, palestras, seminários, entrevistas, eventos, publicações em seus site e blog pessoais e mesmo no seu ensaio teórico sobre livros‐imagem, o referencial A trilogia da margem: o livro‐imagem segundo Suzy Lee (2012), Suzy Lee nos fornece uma mostragem das camadas armazenadas e constituintes de seu projeto poético. Por fim, propomos uma mostragem das obras de arte dessa artista, que se tornam literárias em pleno processo de elaboração, sob uma perspectiva crítica que leva esse mesmo processo criativo em consideração.
Luiz Henrique Vieira (Estudante de pós‐graduação, Grupo Intermídia, UFMG) e José Marcio Lara (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: Retrato, idealização e memória Resumo: Em 1946, em uma Varsóvia ainda arruinada pela guerra, Michael Nash produz, na Grunwald Square, uma fotografia que pode ser recebida como um “texto” sobre uma das possíveis vocações do retrato fotográfico: isolar o retratado (do contexto histórico) da paisagem real, a fim de inseri‐lo em um cenário idealizado (fictício). O que se vê nessa fotografia é uma senhora sendo fotografada diante de um pano de fundo bucólico, posicionado em uma praça recoberta de neve e, ao fundo, edificações destroçadas pela guerra. Essa metafotografia de Nash nos auxilia na investigação de retratos de estúdio realizados até as primeiras décadas do século XX, nos quais, a fim de referenciar o retrato pictórico, se optou pelo uso de panos de fundo pintados, representando, sobretudo, paisagens, ou mesmo interiores que se abrem para jardins ou paisagens mais panorâmicas (abrangentes). Se desde os primórdios da fotografia, fotógrafos retratistas passaram a adotar e a recomendar, em manuais de fotografia, o uso de tais panos de fundo, nos cabe, hoje, investigar a razão (ou razões) dessa escolha. A proposta desta comunicação é apresentar uma descrição da referida foto, assim como uma narrativa a partir da imagem, interpretando a escolha daquela senhora ao se fazer retratar daquela maneira, investigando o significado que pode ser atribuído ao pano de fundo, e especulando sobre possíveis recepções, no futuro, do retrato que estava sendo produzido durante o registro fotográfico de Nash. A imagem é abordada como a sugestão de alguma coisa da ordem da memória, resultando na criação da narrativa de uma memória – o que pode ser aproximado da descrição pictural, a partir das colocações de Liliane Louvel, para tratar da descrição de uma imagem através de um texto.
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Mail Marques de Azevedo (Professor Pesquisador, UNIANDRADE) Título: William Blake: o gênio intermidiático oitocentista no romance indiano do século XXI. Resumo: William Blake encontrou na associação da arte de engraving com a poesia o meio ideal para expressar sua genialidade. O desejo de gravar, ao invés de imprimir, texto e ilustração de seus poemas concretizou‐se na invenção notável do que ele próprio denominou “impressão iluminada” (illuminated printing). Pintor, desenhista e gravurista notável, Blake desenvolve em seu verso fulgurante o pensamento profético de um visionário. Fatos da vida de Blake e traços de sua personalidade, a um tempo intempestiva e mística, são apropriados pela escritora indiana Rukmini Bhaya Nair que o transforma em personagem do romance Mad Girl’s Love Song (2003), em cujo enredo convive com Sylvia Plath e D.H. Lawrence. A arte intermidiática de William Blake e a função de Blake‐personagem em um romance pós‐colonial são os objetos desta comunicação que se concentra, particularmente, na análise da condição esquizofrênica do colonizado. Nenhum evento midiático em si, afirmam Bolton e Grusin, parece desempenhar sua tarefa cultural isolado de outras mídias. Mais ainda, a “remediação” de mídias anteriores, que caracteriza a mídia digital de hoje, está presente nos últimos séculos da representação visual no ocidente. Analisa‐se, pois, na impressão iluminada de Blake a presença dos imperativos de immediacy e hypermediacy exigidos pela cultura midiática de nossos dias, com base nos catálogos que escreveu para sua exposição fracassada de 1809. Em paralelo, estuda‐se a apropriação da arte e da personalidade de Blake no romance, cuja narradora em primeira pessoa, uma jovem indiana esquizofrênica, invade a vida de Blake como um anjo de asas de vidro que o protege e inspira. Da consideração das obras de Blake introduzidas no romance, deduz‐se o pensamento do artista sobre a liberdade física e espiritual do ser humano, que Bhaya Nair canaliza para colocar em evidência a negação desse direito aos povos colonizados.
Marcelo Eduardo Rocco de Gasperi (Professor, UFSJ) Título: Efeito comunhão Resumo: O presente trabalho pretende fazer uma breve reflexão acerca do exercício performático Efeito comunhão, do grupo artístico Transeuntes: Estudos sobre performance, da Universidade Federal de São João Del‐Rei (UFSJ), de Minas Gerais (MG). Em meados de 2014, tal grupo inicia uma pesquisa em rede colaborativa acerca dos eixos norteadores “religiosidade, religião e usura da fé”. Partindo de tais temáticas, o grupo se apropriou de múltiplas referências no campo artístico, extrapolando o âmbito cênico a fim de dialogar com outras áreas do conhecimento. Neste espectro, o grupo buscou referências renascentistas, tendo como mote, para este trabalho específico, o quadro A última ceia de Leonardo da Vinci (século XV), performatizando tal obra a partir de uma visão contemporânea acerca desta pintura. Sendo assim, o grupo propôs uma comunhão a partir da ideia de ceia, comendo e bebendo coletivamente como parte da vivência. O resultado parcial da ação foi a realização de uma série fotográfica levada ao Centro Cultural da UFSJ, postada também em blogs do grupo e nas redes sociais. Parte das referências conceituais acerca deste projeto incide sobre as noções de performatividade (FÉRAL, 2008). Pode‐se dizer que dentro da vasta área de estudos das intervenções urbanas, as noções de performatividade vêm para contribuir de maneira um pouco mais vetorizada com as discussões acerca das intervenções. Neste aspecto, a noção tradicional de personagem dá lugar a uma atuação não representativa, na diluição entre o real e o ficcional, abrindo novas compreensões sobre as camadas do corpo do ator que, por sua vez, transita entre discursos abertos e processuais. Com isto, a união entre os corpos dos performers ao redor dos eixos norteadores descritos implicou nesta ação, uma proposta localizada entre diferentes artes e mídias.
Márcio Ronei Cravo Soares (Professor, FACISA‐BH) Título: Uma vida, em Hollywood, dura 20 segundos Resumo: Este artigo pretende apresentar algumas notas a respeito de certa estética cinematográfica hollywoodiana, localizando‐a no contexto histórico‐cultural da pós‐modernidade, a partir de textos de José Sousa Miguel Lopes (2007), Jair Ferreira dos Santos (2001) e Luciano Zajdsnajder (1994). Convém sublinhar o fato de que a menção geográfica ao distrito de Los Angeles é meramente ilustrativa. Quando pensamos na
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cinematografia hollywoodiana, está em jogo uma forma estética, uma concepção artística cujos padrões são replicados em várias partes do mundo. Em seguida, tendo como referência a relação entre imagem e música, será dada atenção a uma forma narrativa peculiar da produção fílmica, o videoclipe musical, produto audiovisual maciçamente difundido a partir dos anos 1980, normalmente feito para a divulgação de canções gravadas por artistas de diversos gêneros. Em certo sentido, e não obstante o fato de que o videoclipe não mantém, hoje, a audiência de décadas anteriores, o grande alcance de público já obtido pode ser visto como um dado que aproxima o consumo de videoclipes e de filmes hollywoodianos. Em um último momento deste texto, serão feitas algumas considerações analíticas sobre o videoclipe Imitation of life, da banda de rock R.E.M. Com essas considerações, interessa assinalar pontos de aproximação e de afastamento da estética cinematográfica de Hollywood, o que evidencia certo ponto de tensão entre o produto fílmico‐musical feito para o consumo em grande escala, normalmente veiculado por redes de televisão, e um discurso de problematização desse mesmo modus operandi dos produtos feitos em série, com destaque para a produção fílmica.
Marcos Daniel de Melo Ferreira (Estudante de pós‐graduação, CEFET‐MG) Título: As lentes do diabo: O imaginário técnico a partir da fotografia na transposição midiática do conto As babas do diabo para o filme Blow‐Up Resumo: A proposta do artigo é tratar do imaginário técnico que envolve a transposição midiática – subcategoria de intermidialidade proposta por Irina Rajewski – da obra literária do escritor argentino Julio Cortázar, As babas do diabo, para a produção cinematográfica Blow‐Up do cineasta italiano Michelangelo Antonioni. A fotografia, técnica comum e fundamental às duas obras, se apresenta tanto no livro quanto no filme como dispositivo ordenador de uma pretensa inteligibilidade do mundo por meio da ampliação de imagens impressas produzidas a partir de um cenário captado pelo olho do obturador. Na perspectiva de Gilbert Durand, o imaginário é definido como o principal designador de um trajeto antropológico formador de imagens que faz circular os imperativos pulsionais do sujeito e suas adequações ao meio objetivo. Ao imaginário, não escapa a racionalidade produzida a partir das imagens técnicas (fotografias, códigos genéticos, estruturas celulares captadas pelos microscópios, etc.). Perscrutando a convergência entre técnica e imaginação (fotografia e imaginário) propomos refletir sobre como a racionalidade técnica opera através do imaginário no filme de Antonioni tendo como fonte o conto de Cortázar e faz com que a literatura se relacione com artes outras; a saber, a fotografia.
Marcus Santos Mota (Professor, UnB) Título: Audiocenas e xamanismo: estudo pré‐composicional para a série Composições, de W. Kandinsky Resumo: Esta comunicação apresenta os resultados iniciais de projeto de pesquisa em andamento, financiado pelo CNPq e desenvolvido no Laboratório de Dramaturgia da Universidade de Brasília, que parte do conjunto de 10 pinturas chamadas Composições por Kandinsky. O projeto consiste em um processo criativo que integra o planejamento, elaboração e realização de uma dramaturgia intermedial, a partir das pinturas e dos textos tanto teóricos quanto poéticos que explicitam a poética de Kandinsky. Para cada uma das pinturas é produzida, após estudos pré‐composicionais, uma trilha que sonora que é o roteiro para o vídeo online que apresenta um mapeamento de cada pintura. O produto final é um vídeo online com os sons e as imagens em movimento. Neste primeiro momento, partimos de um diferencial desta pesquisa que é a intensa relação de Kandinsky com o xamanismo, especialmente com a leitura do Kalevala. Com sua estética associacionista e multissensorial, o Kalevala constitui‐se como horizonte fundamental para o deciframento e fruição das propostas e realizações de Kandinsky. Como maneira de ratificar este horizonte fundamental, apresentamos e discutimos os materiais iniciais deste projeto de pesquisa, frisando como as relações entre texto (Kalevala), pintura (Composições) e música (trilha) são redimensionadas a partir das opções criativas. Para tanto, apresentamos os esboços dos estudos pré‐composicionais inicias e como estes foram alterados a partir da entrada das referências do Kalevala.
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Maria A. Monteiro Bessana (Pesquisadora, Faculdade Cásper Líbero) Título: Os sertões: a tradução francesa e as representações de Canudos Resumo: Obra seminal da literatura brasileira, Os Sertões, a campanha de Canudos, de Euclides da Cunha, publicado originalmente em 1902, tornou‐se amplamente conhecida no exterior por meio das várias traduções em diversos idiomas, sobretudo, a partir da década de 1990. Neste trabalho analisamos as ilustrações da capa das três edições francesas dessa obra: a primeira (em 1993) e a terceira (em 2012), ambas em formato brochura, e a segunda (em 1997), formato livro de bolso, todas publicadas pela editora Métailié e de autoria de Jorge Coli e Antoine Seel. Segundo Gérard Genette, a capa é o suporte para epitextos, como título, nome do autor, logomarca da casa publicadora, nome do(s) tradutor(es), imagens (ilustrações, fotografias etc.), entre outros elementos. Quer na tradicional forma impressa, quer no ambiente virtual, blogs, sites e e‐books, a capa é o primeiro contato, a primeira impressão que o potencial comprador/leitor tem do meio livro. Depois de ter seu potencial descoberto no fim do século XIX, a capa tem sido largamente explorada, o que levou, inclusive, ao desenvolvimento do conceito de gradability (ou o quão potencialmente um livro pode ser atrativo e “agarrável” quando exposto ao público). Lastreado nos conceitos de Leo van Hoeck e de Claus Clüver de transposição intersemiótica e, sobretudo, de écfrase, este trabalho decompõe, descreve e analisa os elementos constitutivos das imagens usadas nas capas referidas anteriormente, procurando compreender os processos de produção de sentido resultantes da relação entre os sistemas semióticos verbal e não verbal e identificando os elementos pinçados do texto e sua leitura pelos ilustradores para elaborarem as imagens dessas composições.
Maria Angélica Amâncio (Pós‐doutoranda/Grupo Intermídia, USP) e Luís Fernando Amâncio (Pesquisador independente) Título: Muito mais do que bonecos: um paralelo entre o filme Um time show de bola, de Juan José Campanella, e o conto Memorias de un wing derecho Resumo: O objetivo deste trabalho é analisar determinadas escolhas do diretor Juan José Campanella em seu processo de transposição do conto Memorias de un wing derecho (1985), de Roberto Fontanarrosa, para o filme Um time show de bola (Metegol, Argentina/Espanha/EUA/Reino Unido, 2013). Nesse intuito, emprega‐se a teoria relativa ao processo de adaptação, como o trabalho de Jeanne‐Marie Clerc e Monique Carcaud‐Maccaire, a categorização de Irina Rajewsky, além de dados extraídos de periódicos atuais e de estudos acerca dos efeitos do futebol sobre a sociedade. Campanella parte de um conto de cinco páginas para transformá‐lo em um longa‐metragem de uma hora e quarenta minutos de duração. Essa transição temporal imediatamente liberta o cineasta de uma possível exigência de “fidelidade” e permite que o roteiro – escrito pelo diretor, juntamente a Eduardo Sacheri, Gastón Gorali e Axel Kuschevatzky – acrescente níveis diegéticos à narrativa de Fontanarrosa, explore psicologicamente determinados personagens, acrescente informações que simplesmente não estavam no conto porque não cabiam na estrutura sucinta desse gênero literário. Acredita‐se que as transformações operadas em relação à obra inicial refletem não apenas particularidades das mídias cinema e literatura, mas também determinado contexto social, “referências intermidiáticas” provenientes do arquivo cultural particular do diretor, especificidades do mercado cinematográfico, bem como a influência esperada sobre um determinado público‐alvo – a partir, sobretudo, da reconfiguração dos personagens e da distribuição de suas características principais. Esta pesquisa pretende também refletir sobre a transformação do jogador em “garoto‐propaganda” e sobre as diferentes relações estabelecidas entre o futebol, o cinema e o sistema de estrelado – ou star system.
Maria Cecília Bruzzi Boechat (Professora, UFMG) Título: Cenas de piquenique: das artes plásticas a um conto de Aluísio Azevedo. Resumo: Breve comentário sobre a relação de um conto do escritor brasileiro Aluísio Azevedo, publicado na última década do século XIX e o impressionismo francês – mais especificamente, com a tela Le déjeuneur sur l’herbe, de Édouard Manet. A princípio, portanto, tratar‐se‐á de mostrar a migração de um tema da pintura impressionista (o tema do piquenique) para a esfera da narrativa literária brasileira, mostrando não apenas a
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inserção do conto nessa tradição, mas também a configuração fundamentalmente estática da narrativa, fazendo com que ela se concentre no traçado de uma cena, ou, em outros termos, de uma tela ou quadro. Com isso, tornar‐se‐á possível avançar e propor um exercício de comparação de técnicas da pintura impressionista com procedimentos narrativos, propriamente literários, encontrados em uma narrativa de cunho introspectivo e impressionista, na medida que, construída a partir do acompanhamento das impressões da personagem, resulta no traçado de uma espécie de paisagem íntima que, ao mesmo tempo, é projetada na paisagem externa, também subjetivada. Fechando a análise, a reflexão se direcionará para a análise da confluência entre o caminho aberto pelo impressionismo no movimento geral das artes do século XX rumo à superação do verismo realista do século XIX e a passagem, no fim do século XIX, do conto realista para o ‐ assim denominado por Massaud Moisés – conto moderno. Nesse ponto, pretende‐se focar a atenção no reconhecimento da mútua influência dos campos da pintura e da literatura em um passo importante da história da prosa brasileira do século XIX.
Maria do Carmo Nunes Rolla ‐Tai (Estudante de pós‐graduação/Grupo intermídia, UFMG) Título: O dialogo entre o texto e a iluminura em A Linguagem dos Pássaros. Resumo: Este trabalho visa examinar a relação entre a história Palavras de um sufi a um filho aflito pela morte de seu pai, do poeta persa medieval Attar, e a imagem Cortejo Fúnebre, cuja autoria, é atribuída ao artista persa Bihzad. Tais obras estão inseridas no manuscrito A Linguagem dos Pássaros ou Mantiq al‐Tayr, hoje parte do acervo de Arte Islâmica do Metropolitan Museum de Nova York. As descobertas sobre a influência do Sufismo, corrente mística derivada do Islã, sobre a produção de Attar e Bihzad, é determinante de uma experiência criativa pautada numa nova concepção de imaginário como forma de conhecimento e recepção.
Maria do Céu Diel de Oliveira (Professora, UFMG) Título da comunicação: A arte da memória e as máquinas para lembrar Resumo: Estudos na arte da memória têm sido um movimento que embasa pesquisas e pensamentos na contemporaneidade. Imagens são veículos de programas político‐visuais. Em sua obra, Mary Carruthers busca as relações das metáforas basilares da memória com o discurso. Procuro migrar estes conceitos para o mundo das imagens. Neste artigo elencarei os pensamentos de Carruthers e outros estudiosos sobre as metáforas basilares da memória, ou seja, a construção de máquinas para lembrar.
Maria Isabel Rios de Carvalho Viana (Estudante de pós‐graduação, CEFET‐MG) Título: Do palco para a tela: alguns aspectos da transposição de Dancing at Lughnasa para o cinema Resumo: A peça Dancing at Lughnasa, do dramaturgo irlandês Brian Friel, foi apresentada pela primeira vez em 1990 no Teatro Abbey, considerado o Teatro Nacional da Irlanda. Como uma peça memorialista, apresenta um narrador, o adulto Michael, que conta a história de sua família composta majoritariamente por mulheres. Ao narrar suas memórias individuais, Michael aborda também fatores importantes para a memória coletiva irlandesa, dentre eles, o início do processo de modernização da Irlanda. Com um tom nostálgico, Michael apresenta uma Irlanda rural afetada pela industrialização e pela chegada da tecnologia e todos os sacrifícios familiares relacionados a essas mudanças. Em 1998, Dancing at Lughnasa, depois de ser apresentada na Broadway e ganhar quatro prêmios Tony, incluindo o de melhor peça, foi adaptada para o cinema com o mesmo título. Obras homônimas, tanto a primeira apresentação da peça quanto o filme foram produzidos por Noel Pearson, produtor irlandês de teatro e cinema. Os créditos iniciais indicam tratar‐se de um filme baseado na peça original de Brian Friel dirigido por Pat O´Connor, tendo como roteirista Frank McGuinness. À luz da semiótica de Pierce e das discussões empreendidas sobre o conceito de tradução, tradução cultural e tradução intersemiótica, este trabalho tem como objetivo analisar alguns aspectos da transposição do teatro para o cinema, aspectos estes que vão além da problemática da linguagem, adquirindo uma amplitude que envolve também fatores culturais e estéticos do contexto da produção e da expectativa de recepção da obra cinematográfica.
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Marta Castello Branco (Professora, UFJF) Título: Intermidialidade e música na obra de Vilém Flusser Resumo: Ao desenvolver os conceitos de ferramenta, instrumento, máquina e aparato, Vilém Flusser apresenta uma verdadeira arqueologia de objetos técnicos. Relacionando sua criação a parâmetros do corpo humano, apresenta‐se a “ampliação” do cérebro, causada pelos aparatos, que atinge seu ápice através dos computadores e se constitui como ponto decisivo na genealogia de objetos técnicos, determinando a constituição de uma nova criatividade denominada tecnoimaginação, relacionada (e necessária) à forma de lidar com novas mídias, que instaura também, uma nova comunicação entre os homens. A tecnoimaginação é apresentada por Flusser através da música de câmara, que significa a instituição de uma criatividade partilhada pelos homens, mediada por um fundamento comum – como uma partitura serviria de base a improvisações coletivas e transformadas a cada performance, estabelecendo memórias constantemente reprogramadas. Partindo da fixidez de um instrumento, cuja materialidade amplia um parâmetro específico do corpo humano e não permite nenhuma transformação durante seu uso, Flusser cria uma transição entre usos passados de objetos técnicos e os conduz à era das mídias contemporâneas. Através da música de câmara, revela um senso de continuidade presente na história da música, sendo ela uma história da relação entre mídias: assim como o instrumento mantém referências relacionadas aos parâmetros do corpo, a introdução de mídias eletrônicas e o uso de computadores compõe a mesma continuidade; tanto através da reafirmação, quanto da negação de parâmetros acústicos. Como J.E.Müller, Flusser atesta que ainda que certas mídias não estejam mais presentes, sua referência abre novas dimensões da experiência. Ao apontar para a coexistência de mídias, suas transformações e referências, Flusser se aproxima também de Rajewsky, além de apresentar noções sobre como a intermidialidade transforma nossa percepção da arte e as experiências ofertadas pela mesma. Neste sentido, a obra de Flusser revela a música como território de intermidialidade por excelência.
Melissa Cobra Torre (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: Imagem e escrita em "Sognando con Dacosta", de Antonio Tabucchi Resumo: O presente trabalho procura discutir como o escritor italiano Antonio Tabucchi frequentemente se utiliza da pintura como elemento essencial para a criação de algumas de suas obras. Dessa forma, tendo como objeto principal o conto “Sognando con Dacosta”, presente no livro Racconti con figure deste mesmo autor, pretende‐se refletir como Tabucchi estabelece uma relação intermidiática entre imagem e escrita ao tomar uma pintura como ponto de partida para a criação de cada um dos contos de que esse livro é composto. Para isso, este trabalho se propõe analisar o texto “Sognando con Dacosta”, proporcionando a discussão no que diz respeito à descrição pictural na obra de Antonio Tabucchi. Como apontado pelo próprio autor, a estreita relação estabelecida entre seu fazer literário e a esfera do visível deve ser destacada, já que algumas de suas obras de maior relevância como Tristano muore e Il gioco del rovescio devem sua escrita, em certa medida, aos quadros El perro, de Goya, e Las Meninas, de Velázquez, respectivamente, os quais assumem um papel essencial na construção narrativa. O conto “Sognando con Dacosta”, objeto deste estudo, se origina da pintura intitulada A caça ao anjo, de António Dacosta. Nesse texto, Tabucchi entra no sonho do pintor português, compartilhando com este sua experiência. É nesse sentido que o escritor italiano tece um fio que conecta as pinturas de Dacosta umas às outras, criando sua narrativa a partir da descrição dessas telas. A atmosfera onírica que perpassa o conto cria as condições necessárias para que o escritor italiano, ficcionalizado, entre em cada um dos quadros de Dacosta e interaja com seus personagens. Dessa forma, a cada cena, Tabucchi pede ao pintor que passem a um outro sonho para que, assim, entrem em um quadro diverso.
Michela Perígolo Rezende (Estudante de pós‐graduação, UFMG) e Renata Baracho (Professora, UFMG) Título: Um estudo sobre a representação da arquitetura: a visão de mundo definindo tecnologias Resumo: O presente estudo procura evidenciar a arquitetura como linguagem a ser apreendida e vivenciada de forma diferenciada em múltiplas culturas e épocas, de forma a apontar para a existência de diferentes visões de mundo. Deste modo, esta elaboração pesquisa as variações existentes na representação da arquitetura de modo a gerar sempre ontologias diferentes. Esta constatação, a nosso ver, evocaria a que motivação inicial a
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concepção e o uso de técnicas de representação da arquitetura responderiam. Neste percurso pretendemos esclarecer nossa hipótese onde diferentes visões de mundo determinam a criação de tecnologias de representação distintas, argumento este que não aceitaria uma resposta linear e evolucionista, mas antes, esta seria heterogênea e policromática, tal qual o real parece responder. No ensino do desenho em arquitetura é comum a abordagem onde as técnicas da perspectiva renascentista são vistas como as mais apuradas e desenvolvidas até hoje inventadas, o que, consequentemente, coloca outras tantas representações conhecidas historicamente, como a perspectiva plana egípcia, a perspectiva radial hindu, a perspectiva inversa bizantina, ou a perspectiva múltipla chinesa de forma secundária ou incompleta. Neste processo, a representação da arquitetura pode ser vista como um conhecimento construído e ensinado como um processo de decodificação de uma linguagem ou código que permitirá a comunicação e existência da arquitetura em suas várias instâncias, da criação à execução. Na formatação deste conhecimento, contudo, mostra‐se crucial e de difícil discernimento não deixar que a técnica abafe ou direcione o processo do projeto. Um novo viés sobre a temática da percepção e representação humana abrirá sempre possibilidades de maior aproximação desta realidade caleidoscópica a fim de descortinar diferentes ontologias, pensamento este tão caro para as atuais condutas de política patrimoniais.
Miguel de Ávila Duarte (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: Palavras que desencadeiam processos: o texto‐partitura na confluência entre música, literatura, artes plásticas e performance Resumo: A emergência de uma modalidade de trabalhos classificados por vezes como textos‐partitura, instruções para performance ou ainda word events, no âmbito da vanguarda novaiorquina do início dos anos 1960, consiste em um interessante marco da diluição das fronteiras midiáticas que caracteriza o campo contemporâneo das artes. Partindo das discussões a respeito do significado, utilidade e eficácia das múltiplas formas de notação musical – cuja faceta mais radical era naquele momento representada pela chamada New York School, agrupada em torno de John Cage e da ideia de música experimental – uma série de músicos e artistas plásticos (incluindo Christian Wolff, La Monte Young, George Brecht, Yoko Ono e Alison Knowles) passa a utilizar a escrita comum como meio de notação de peças musicais, instalações e performances. A proximidade de tal forma de escrita com a literatura e, em especial, com a poesia, passa a ser explorada sistematicamente em livros como Grapefruit de Yoko Ono e o livro‐caixa Water Yam de George Brecht, compostos de textos que podem ser compreendidos simultaneamente como instruções para perfomances e/ou instalações e pequenos fragmentos líricos. Sob o ponto de vista da intermidialidade, é bastante interessante que em meio a tal rede de artistas, organizada em torno da palavra/movimento Fluxus por George Maciunas, encontra‐se o próprio criador do termo “intermídia”, o artista e teórico Dick Higgins. Cabe ressaltar ainda que tal prática de notação não‐específica de nenhuma arte ou mídia, depois de cair em declínio e relativo esquecimento a partir de meados dos anos 1970, tem sido retomada por um conjunto cada vez mais maior de compositores e artistas a partir da primeira década do séc. XXI, como, por exemplo, a rede internacional de músicos neo‐cageanos Wandelwaiser e a exposição conceitual Do it, organizada pelo curador suiço Hans Ulrich Obrist.
Mônica de Freitas (Estudante de pós‐graduação, UFV) e Sirlei Santos Dudalski (Professora/Grupo Intermídia, UFV) Título: Shakespeare na sétima arte: a transposição midiática entre Macbeth e A floresta que se move Resumo: Esta pesquisa tem como objetivo estabelecer um estudo comparativo entre a peça Macbeth, do dramaturgo inglês William Shakespeare, e sua adaptação para o cinema brasileiro A floresta que se move (2015), do diretor e roteirista Vinícius Coimbra com o roteiro, também, de Manuela Dias. Claus Clüver (2006), em Inter textos / Inter artes / Inter media aborda o estudo da Literatura Comparada propondo o diálogo entre a Literatura com as outras artes. Para o autor, todo tipo de arte faz parte de uma estrutura sígnica que, de certa forma, é também um texto. Logo “um balé, um soneto, um desenho, uma sonata, um filme e uma catedral, todos figuram como ‘textos’ que se ‘leem’” (CLÜVER, 2006, p.15). A partir dessa premissa, pretendemos realizar um estudo sobre quais as estratégias cinematográficas utilizadas para transpor a peça Macbeth para A floresta que se move (2015), pois como afirma Thaïs Flores Diniz (2005), o cinema apresenta formas próprias de sua mídia para adaptar uma história. Enfim, através dos estudos de adaptação, interartes
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e da tradução intersemiótica, propostos por Linda Hutcheon (2013), Robert Stam (2008), Claus Clüver (2006), Thaïs Flores Diniz (2005), Daniel Fischlin, Mark Fortier (2000) e Irina Rajewsky (2005) pretendemos reafirmar a ideia de que faz parte do processo natural da construção da arte o diálogo intertextual e intermidiático e que todas as formas de arte devem ser vistas de modo equalizado, sem hierarquias. Portanto, este trabalho propõe desmistificar a ideia de que a adaptação é uma mera “cópia” do texto‐fonte e demonstrar como o cinema nos possibilita mais uma nova forma de experienciar o texto shakespeariano.
Nathália Izabela Rodrigues Dias (Estudante de pós‐graduação, UFMG) e Márcia Arbex (Professora/Grupo Intermídia, UFMG) Título: A écfrase e seus desdobramentos em L’emploi du temps, de Michel Butor Resumo: O trabalho investiga os desdobramentos da descrição na narrativa L’emploi du temps (1956), de Michel Butor, a partir do conceito de écfrase, segundo Hamon (1991), e de função estrutural, definida por Bertho (2015). Em especial, a análise das descrições de uma tapeçaria, que retoma o mito de Teseu, e de um vitral, que reproduz uma cena bíblica de Caim e Abel, evidencia como essas representações determinam estruturalmente o romance em questão. Pretende‐se salientar como as imagens sintetizam de maneira extremamente simbólica determinados aspectos do livro de Butor, já que as écfrases destacadas correspondem ao que se denomina mise en abyme, pois produzem certo efeito de duplicação da história, de jogo de espelhos, que faz com que se tenha uma narrativa dentro de outra. À guisa de conclusão, será demonstrado que as representações descritas desempenham função que vai além da simples ornamentação textual, dado que o narrador, Jacques Revel, se enxerga na figura de Teseu. Além disso, enquanto estagiário em uma cidade desconhecida, Jacques interpreta a história bíblica de Caim e Abel como narrativa fundadora do local onde reside e como reflexo de seus habitantes. A referência pictural no livro é feita de forma emblemática, por meio da qual a obra de arte é o suporte para a inserção dos mitos no texto. Assim, as descrições minuciosas de produções artísticas inseridas no texto literário colocam sob os olhos do leitor representações das representações observadas pelo narrador. Os mitos, por fim, tanto o de Teseu quanto a narrativa bíblica de Caim e Abel, aparecem de modo enigmático, porém, com tamanha força que acabam por influenciar e organizar o cotidiano de Revel.
Neurivaldo Campos Pedroso Junior (Professor, UEMS) Título: Estudos interartes e estudos intermídias: o suave convívio Resumo: A discussão que pretendo desenvolver neste trabalho é a seguinte: a investigação mais pontual sobre a relação entre os tradicionais estudos interartes e os recentes estudos intermídias ou de intermidialidade. Minha reflexão pretenderá demonstrar os pontos de convergências e divergências entre aquelas duas práticas de se investigar as manifestações artístico‐culturais do passado e do presente. Nos últimos anos, muitos pesquisadores têm sugerido a substituição da rubrica “estudos interartes” por ‘estudos intermídias ou de intermidialidade” que, em tese, seria uma nomenclatura mais abrangente e poderia abarcar tanto a arte do passado quanto as produções atuais, que muitos ainda hesitam em classificar como “arte”. Apesar dos esforços em prol dessa virada terminológica e conceitual, entendo, na esteira das reflexões de Irina O. Rajewsky, que a produtividade dos estudos intermídias ou de intermidialidade deve muito à trajetória comparativa aberta pelos estudos interartes, seja na formulação de mecanismos metodológicos seja na elaboração de uma reflexão teórico‐crítica para se proceder à comparação entre artes e mídias distintas. Na verdade, pretendo demonstrar que, na relação binária estudos interartes x estudos intermídias, estes não devem adotar uma atitude parricida com relação aos primeiros. Ao contrário, a relação entre aquelas duas formas de se investigar e comparar as diferentes artes e mídias deve ser a de parceria, reatualizando práticas comparativas constituídas e consagradas que, examinadas agora sob outros prismas, apontam para novas perspectivas de pesquisas interartísticas e intermidiáticas.
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Nikoleta Kerinska (Professora, UFU) Título: Linguagens gráficas do desenho contemporâneo: ensejos de intermídia Resumo: A partir dos anos 50 e 60 as práticas artísticas se diversificam e intensificam de maneira inédita em busca de novas formas de pensar as questões conceituais, estéticas e filosóficas da arte. O hibridismo das categorias artísticas numa convergência cada vez mais próxima entre arte e vida, e, a ampliação de maneira contundente das possibilidades técnicas dos artistas são talvez as características mais fortes dessas novas tendências aglomeradas sob o termo arte contemporânea. Neste contexto o desenho vive uma abertura e desdobramento enquanto linguagem sem precedentes na historia da arte. O termo “desenho sem papel” é usado por Richard Conte para designar as práticas do desenho, que abandonam os suportes tradicionais em busca de formas expressivas inéditas. A presente comunicação propõe uma reflexão sobre o conceito de intermídia, tendo como referência as reflexões de Richard Conte e os trabalhos de três artistas: Hervé Bacquet, Patrícia Claro e Gianluigi Toccafondo. As linguagens gráficas desenvolvidas por esses artistas operam no limiar do desenho contemporâneo, fazendo uso de um leque de mídias, que estendem as propriedades e as características da linguagem do desenho para outros domínios, tais como: o filme, a instalação ou a imagem interativa. Podemos pensar esses trabalhos como formas de desenho contemporâneo, ou, ao contrário, as características principais desses trabalhos exigem situa‐los entre as mídias, redefinindo desta forma o próprio território do desenho? Esta questão será confrontada a algumas ideias curadorias e reflexões teóricas sobre o desenho hoje, e as suas afirmações enquanto linguagem autônoma no campo da arte contemporânea.
Nora Vaz de Mello (Pesquisadora, CEFET‐MG) Título: Interartes: o encontro das linguagens poéticas em espetáculo de dança contemporânea. Resumo: Este trabalho abre uma discussão no campo dos estudos interartes ao estabelecer uma leitura comparada das linguagens poéticas presentes no espetáculo Terra Brasilis (1999). Isto é, a poesia em prosa, da obra literária homônima (1999) do escritor mineiro Rogério Zola Santiago com a coreografia de dança contemporânea criada pela companhia de dança Movimento, de Belo Horizonte, analisada em mídia filmada. No texto de Terra Brasilis, Santiago (1999) questiona a vida cotidiana de imigrantes brasileiros, com seus valores adquiridos em nosso país e a impotência perante a realidade avassaladora do contexto social da cidade de Boston, nos Estados Unidos. A construção da narrativa acompanha de maneira não linear a história desses indivíduos, que se encontram numa estação após perderem o último trem. Enquanto esperam a chegada de um novo dia, no compartilhamento de espaço‐tempo, a trama desenrola‐se retratada por meio das linguagens corporal, visual e sonora. Essa poética foi a inspiração para a concepção coreográfica, em dança contemporânea, pela companhia de dança Movimento (1985‐2001), que já possuía uma trajetória artística de trabalhos coreográficos baseados em textos literários e de práticas intermidiáticas apresentadas no cenário nacional e internacional. Esse tema exige que se use o termo interartes nos aspectos artísticos dessa produção, devido ao encontro de diferenciadas linguagens como a literatura, a dança, o teatro e a música. O uso do conceito de intermidialidade será pontuado para abranger a tecnologia e as interrelações entre as diversas mídias que, quando aliadas à coreografia de dança contemporânea, complementam a ilusão sensorial da cena analisada. Assim, a análise coreográfica em questão, baseada nesses fundamentos, aponta as possibilidades que se abrem no campo interartes ao observar como os fenômenos semióticos são percebidos na dança contemporânea e na poesia promovendo novos sentidos.
Olga Valeska Soares Coelho (Professora, CEFET‐MG) Título: “Intercorporalidade”: a voz e o corpo na poesia dançada Resumo: Atualmente, os parâmetros de criação artística e literária estão sendo questionados e revistos, sendo que, cada vez mais os artistas buscam associar linguagens híbridas, atravessadas por diversos códigos. Assim, vemos que a produção artística e cultural se encontra marcada pelo que se convencionou chamar de interartes e intermídia, ou seja, uma produção que vai além dos limites convencionais entre as artes e as mídias. Observando esse contexto, proponho a análise de obras que fazem entrecruzamento entre linguagens heterogêneas em processos tradutórios, trazendo um desafio para os leitores contemporâneos. Além disso,
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proponho analisar o lugar do corpo nesse tipo de produção poética pensando também a atualização de textos literários, por meio de performances que envolvam o movimento, o gesto e a voz. Como objeto específico desse trabalho pretendo analisar a performance Tributo a “Blanco”de Octavio Paz realizada no dia 17 de setembro de 2016 no Centro de Referência da Juventude de BH como parte da programação do Sarau da Conferência municipal literatura, leitura, livros e bibliotecas da Prefeitura de Belo Horizonte. Trata‐se de uma iniciativa do Núcleo de e Experimentação em Poéticas do Corpo e do Movimento‐COMTE/CEFET‐MG que integra pesquisadores de diversas áreas do conhecimento como música, dança, literatura e artes plásticas. Ora, Tributo a “Blanco” de Octavio Paz é uma performance que partiu do empenho de realizar uma tradução semiótica do poema Blanco (na voz do próprio autor) para a linguagem da dança. Assim, como instrumental teórico para a análise, pretendo, em um primeiro momento, fazer uso da semiótica de Pierce. Além disso, pretendo lançar mão das categorias de Laban sobre o movimento, além de conceitos como “corpomídia”, “intermídia” e “interartes”.
Patricia Franca‐Huchet (Professora, UFMG) Título: A voz: infância, linguagem e experiência Resumo: Esta proposta discute a apresentação de trabalho como forma de expressão artística, moldada no aprendizado de pesquisas com a voz. As palestras, conferências e as apresentações de trabalho se inscrevem em uma história do gênero oral e organizam um laço particular entre locutor e auditor. Se o que se diz é trabalhado por um discurso que assegura uma certa eficiência da palavra, elas também o fazem por uma postura, por dicção e teatralização. Esta proposição para o Colóquio Internacional Escrita, som, imagem encara a conferência, ou a apresentação de trabalho como abertura ao campo das artes visuais, cênicas e literárias. É possível transmitir o saber através de seus contornos moventes? Disposta nesse espectro, a apresentação para este colóquio mostra uma das camadas de meu trabalho que é pensar sobre a infância, sua imagem e como trabalhar com a criação de um universo que dialogue com essa fase da vida. A pesquisa em andamento sobre os Quatro Fotógrafos me levou a trabalhar a questão da infância de meus heterônimos, a condição vivida por cada um nesta época, como foi o caso dos dois primeiros: Zenon e Maël. Mostro este diálogo através do trabalho Diminutas — fragmentos, imagens e pequenas montagens originam fotografias — e, lembrarei uma passagem do livro de Thomas Mann, Doutor Fausto, quando descreve o menino Nepomuk (Nepomuceno) em uma relação com a linguagem e a experiência da voz e da imagem.
Paulo Custódio de Oliveira (Professor, UFGD) Título: Um tempo literário no cinema Resumo: Esta comunicação se propõe fazer uma leitura do personagem central do filme O homem duplicado (2014), de Denis Villeneuve. Tanto este filme quanto o livro que o inspirou são narrativas insólitas porque recusam a organização tradicional da narrativa que aspira um final explicativo ou que condense as contradições. O personagem é uma eloquência da “indecidibilidade” gerada – principalmente – por uma recusa tácita à cronologia. O observador reconhece a aporia temporal criada pelo diretor, as imagens que surgem aos olhos não podem ser tributadas a uma realidade (representação do presente) nem a uma imaginação (representação do passado). Como artefato estético, o filme se alimenta desse intervalo e extrai dele suas últimas consequências. A presença do passado corresponde a um recuo do presente, tornando complexo o tempo do homem duplo. Mas qual é a natureza do passado e como se dá sua relação com o presente deslizante? Uma pergunta que dá ao filme um tom alucinatório e uma conduta imagética especialmente articulada para provocar um incômodo narrativo e intervir no pensamento do observador. Esse processo de composição cinematográfica surpreendente se apropria de elementos do romance de José Saramago (2002) e produz uma narrativa cujo insólito se torna uma alavanca sensível do pensamento mobilizando‐o no fluxo e configurando‐se como um intercessor (VASCONCELLOS, 2006). Nesse tempo surpreendente pode‐se dizer, a partir das taxionomias montadas por Gilles Deleuze em Cinema II – A imagem‐tempo (2005), que o filme não é uma narrativa que instrui o comportamento de um corpo, mas um corpo, cuja vivência atualizada se expande pela suspensão temporal, tornando‐se narrativa.
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Paulo Eduardo Lannes Souza (Estudante de pós‐graduação, UnB) Título: Uma teoria da memória em Les pléiades, de Marx Ernst Resumo: A comunicação que ora apresento faz parte de minha pesquisa de pós‐graduação sobre a memória em obras modernas literárias e pictóricas. Se o surrealismo pode ser pensado, de acordo com o manifesto artístico lançado em 1924 por poeta francês André Breton, como um “automatismo psíquico puro pelo qual se pretende exprimir, quer verbalmente, quer por escrito, quer por qualquer outra maneira, o funcionamento real do pensamento”, pode‐se afirmar que, de alguma forma e em algum nível, a arte acaba refletindo sobre a teoria da memória e se refletindo nela. Partindo desse pressuposto, tenho como interesse discutir, neste trabalho, a representação surrealista das aporias da memória humana a partir dos elementos a princípio dispostos de maneira caótica da colagem Les pléiades, criada em 1921 pelo artista alemão Marx Ernst. Nesta obra é possível perceber a construção de um conjunto sólido de informações que se relacionam com o tema de maneira singular, uma vez que o contraste entre as cores e as imagens presentes (o corpo feminino, a pedra, o fundo azul, o risco vermelho) permite uma ampla significação do conjunto no que diz respeito às possibilidades de resgatar e recriar as lembranças adquiridas pelo artista ao longo do tempo. Dessa forma, é possível identificar o trabalho de Ernst em encontrar uma significação que não poderia ser verificada no mundo real ou em um universo de figuras ordenadas de modo racional. Para alcançar o objetivo, utilizarei a abordagem de Paul Ricœur em A memória, a história, o esquecimento (2007), acerca de uma teoria da memória, e de Giulio Carlo Argan em Arte Moderna (1992), a fim de fundamentar a análise estética da obra.
Pedro Gomes Dias Brito (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: Tramas do íntimo e do social: usos da fotografia em Les années, de Annie Ernaux Resumo: Em 2008, a consagrada escritora francesa Annie Ernaux publica Les années. Após uma experimentação com a fotografia em L’usage de la photo (2005) – em que as imagens fotográficas são o ponto de partida para a escrita do texto literário –, Ernaux retoma a associação entre essas duas mídias no livro de 2008. Nele, a descrição de uma imagem introduz cada uma das treze sequências que narram a experiência da passagem do tempo entre a década de 1940 e 2006, em uma auto‐sócio‐biografia – como a própria escritora caracteriza a parcela mais recente de sua produção literária, que se constrói na interseção entre a literatura e a investigação sociológica e histórica. Interessa‐nos, nesta comunicação, a análise da incorporação da fotografia – que aparece textualmente, sobretudo, em écfrases – nessa exploração do passado e da memória. Procuraremos examinar como a sequência de fotos constitui um álbum de família, agente da procura de si e do questionamento de uma subjetividade estável. Ao mesmo tempo, temos um álbum que extrapola os limites da intimidade e traz à tona a memória de um contexto mais amplo, histórico‐social. Nosso estudo será balizado, por exemplo, pelas reflexões proposta por Boris Kossoy, que, em Realidades e Ficções na Trama Fotográfica, pensa nas articulações entre fotografia, documento, representação e memória e na natureza ambígua dessa mídia, que flui, segundo o pesquisador, entre realidades e ficções, sendo uma “ficção documental”. Já Sylvie Jopeck discute acerca dos contatos e paralelos entre a escrita (auto)biográfica e a fotografia, em La photographie et l’(auto)biographie. Estudaremos ainda os diferentes estatutos atribuídos à fotografia ao longo de Les années, examinando tanto a mutabilidade da tecnologia e da materialidade fotográficas ao longo do século XX e do início do XXI, o que se entrevê nas écfrases, quanto as transformações dos lugares atribuídos a ela nas esferas familiar e social.
Pedro Martins (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: Intersemiose da canção: panorama e exemplos Resumo: Reconduzir o estudo da canção ao campo musical. Eis a tarefa que define minha trajetória do bacharelado em estudos literários ao doutorado em música. Falamos prosaicamente em “música” para nos referirmos à canção. Não obstante, o debate do tema se sedimentou antes entre a crítica literária e as humanidades. Ora, trazer à musicologia questões que lhe são absolutamente pertinentes tem o efeito de perguntar que lacunas musicólogos e etnomusicólogos podem preencher a fim de ampliar o entendimento da canção como objeto (também) musical. Prestigiada em áreas diversas, a canção recebe por vezes tratamento
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aquém das possibilidades que se oferecem à apreciação do gênero. Pela via do culturalismo, o objeto se torna em mero gatilho temático, mediador da reflexão sobre fatos históricos e sociais. Dissociam‐se, pois, os estratos poético e musical, restando análise assaz empobrecida, e mesmo contraproducente. Na outra ponta do equívoco, a via formalista, as estruturas são aprisionadas no microcosmo da descrição técnica, tomadas como um fim em si mesmas. Dessa forma, desvelar os sentidos que se abrem com a trama intersemiótica da canção exige arrojo teórico e metodológico. Trata‐se de um gênero que insta por abordagem transdisciplinar, em que o sentido possa emergir do movimento entre o poético e o musical à luz do processo histórico. Compartilho apontamentos para um modelo de análise da canção que procura, no espaço estético, o sentido profundo da forma em direção à cultura. Vislumbro uma musicologia que, tendo superado a obsessão pelo formalismo, carece, agora, de reconciliação parcial com a forma, ao menos no sentido adorniano de uma “historiografia inconsciente de nosso tempo”. Para ilustrar esta discussão, pinçarei excertos de análise da dissertação que encerra meus esforços de pesquisa durante o mestrado: A canção tropicalista: um percurso crítico.
Priscila Célia Giacomassi (Estudante de pós‐graduação, UFPR) Título: Diálogos interartes na produção artística da família Taunay em viagens pelo Brasil no século XIX Resumo: Em 2016 completou‐se o bicentenário da chegada da missão artística francesa no Brasil. Entre seus integrantes estava Nicolas Antoine Taunay, que aqui trabalhou por um tempo, produzindo pinturas sobre o novo e exuberante mundo. Quando retorna para a Europa, deixa no Brasil seus filhos, Felix e Adrien Taunay, também pintores. Visconde de Taunay corresponde à terceira geração da família e herda o gosto por desvendar o território brasileiro registrando‐o também com a mesma sensibilidade estética. Faz com palavras o que seu pai, tio e avô faziam com o pincel: traça um quadro do Brasil enquanto nação que surgia. O principal objetivo deste trabalho é explorar o diálogo entre literatura e pintura na produção artística da família Taunay em suas viagens ao/pelo Brasil do século XIX nas obras Inocência (1872) e A Retirada da Laguna (1872), destacando a importância de tais registros literários e picturais enquanto elementos constitutivos da identidade nacional brasileira. O caráter intermidiático da produção artística dos Taunay pode ser explorado a partir da análise de elementos narrativos nas pinturas e também elementos picturais na obra literária do Visconde. Além de transposição midiática e combinação de mídias, Irina Rajewsky menciona o termo “referências intermidiáticas” como categoria de intermidialidade e é esta o foco dessa proposta, uma vez que diz respeito à evocação ou imitação de elementos de uma mídia por meio de outra. Em outras palavras, é como se uma mídia pudesse ser lida em outra, neste caso, como se a literatura pudesse ser apreciada como pintura, ou até mesmo como uma cena teatral ou cinematográfica em várias situações das obras de Visconde de Taunay, as quais se apresentam inundadas de elementos picturais e mesmo cênicos, revelando como o escritor foi indelevelmente influenciado pela sua família de artistas.
Raquel de Matos Andrade (Estudante de pós‐graduação, UFOP) Título: Empoderamento feminino: a mudança de foco narrativo entre romance e adaptações de Wuthering Heights Resumo: As artes carregam em si registros de seus contextos: a memória social reside nas mais diferentes formas de mídia, direta ou indiretamente. Ao analisar o romance de Emily Brontë, Wuthering Heights, e três de suas adaptações fílmicas, de épocas distintas (especificamente 1939, 1992 e 2011), é possível perceber como estas obras trazem, cada uma à sua maneira, indícios de um empoderamento feminino, que pode ser percebido na mudança do foco narrativo. As escolhas feitas pela autora no século XIX para criação de seus personagens e o enredo, assim como as opções feitas pelos diretores dos filmes, dizem muito do contexto histórico social no qual os artistas se encontram inseridos. No romance de Brontë, conhecemos de início o personagem do senhor Lockwood, o primeiro narrador. Ele pede para que a senhora Dean lhe conte tudo o que sabe sobre Heathcliff, proprietário da casa onde agora reside. Neste momento, a senhora Dean assume a narrativa, que segue o ritmo imposto por Lockwood: ela fala (e se cala) quando este assim determina. Os dois dividem a narrativa do romance, em uma espécie de histórias paralelas: uma sobre o presente e a outra sobre o passado. Pode‐se ver isto como um recurso narrativo, mas pode‐se também enxergar nesta escolha uma espécie de denúncia feita por Brontë: assim como ela precisou usar um pseudônimo masculino, a história da senhora Dean precisava ser intermediada por Lockwood. Nas adaptações fílmicas é possível perceber
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mudanças nesta narrativa: Lockwood perde, a cada adaptação, a importância no enredo. A história é contada de forma cada vez menos dependente deste mediador masculino. Estudar estas mudanças pode auxiliar na compreensão das modificações dos contextos nos quais as obras foram criadas e como elas representam as diferentes realidades dos artistas.
Rebeca Pinheiro Queluz (Estudante de pós‐graduação, UFPR) Título: Shakespeare e quadrinhos digitais: Macbeth por Mya Gosling Resumo: Esta comunicação tem como objetivo analisar os quadrinhos do blog Good Tickle‐Brain, da bibliotecária e cartunista Mya Gosling. A autora, que começou a postar seu trabalho no Facebook e, posteriormente, criou um blog, traz como tema principal a obra de Shakespeare. Ela ficou conhecida, sobretudo, por resumir os enredos das peças shakespearianas em três quadros (que ela chama de Three‐panel plays). Nossa atenção será direcionada especialmente para os quadrinhos referentes a Macbeth. Gosling reconta a peça escocesa cena a cena, além de desenhar quadrinhos que têm alguma relação com a peça (em uma seção intitulada Stand‐Alone Macbeth comics), seja por destacar um personagem secundário (como o jovem Siward), um monólogo como “O amanhã, o amanhã e o amanhã” (ato 5, cena 5), imaginar um canto de natal das bruxas, um cartão do dia dos namorados ou os conselhos amorosos que Lady Macbeth daria. Na passagem de uma mídia para a outra, a estrutura narrativa é modificada, transformada e recriada. Desse modo, a partir do embasamento teórico dos trabalhos de Irina Rajewski, Linda Hutcheon e Claus Clüver, queremos propor uma reflexão sobre o diálogo intermidial entre a literatura e os quadrinhos, observando como se dão essas transformações, quais características se destacam no produto final, e como a forma e as mediações técnicas e gráficas podem recriar o conteúdo. Em outras palavras, buscamos um olhar crítico para compreender como Gosling se apropria da informação verbal literária e propõe uma releitura em uma narrativa elaborada por meio de uma sequencialidade de imagens no meio digital. Além disso, exploramos os diálogos intertextuais, as alusões, citações, paródias, sátiras e ecos, por meio das falas, da caracterização das personagens, da estilização dos desenhos, da ambientação.
Renata Costa Leahy (Estudante de pós‐graduação, UFBA) Título: Desfiles de moda: interações artísticas e artisticidade esumo: Os desfiles de moda são fruto da evolução da mostra de roupas por meio de manequins humanos, um tipo de apresentação de novas coleções de moda iniciado pelo criador da alta costura parisiense, o estilista inglês Charles Frederick Worth, no final do século XIX. Desde então, os desfiles de moda passaram da simples caminhada de corpos vestidos femininos, em frente às clientes das maisons, a arranjos elaborados de diversos elementos e suportes, como música, cenário, projeções e arte digital, locação, maquiagem, acessórios, coreografia e as próprias roupas, que podem ser mais cotidianas ou experimentais. Hoje, os desfiles de moda se constituem em eventos complexos de tipos variados, ora considerados como espetáculos e verdadeiros “minidramas completos” (DUGGAN, 2002), ora se aproximando da chamada performance art (DUGGAN, 2002; CIDREIRA, 2012; COHEN, 2002), mas que possui sua forma geral própria. Assim, através da análise do primeiro desfile da Chanel em Cuba, realizado em 2016, buscaremos evidenciar a forma “desfile de moda” enquanto apresentação que congrega elementos diversos, no jogo entre referências de reconhecimento e de inventividade, ou seja, com “artisticidade” (CIDREIRA, 2005). Uma elaboração que visa, ao mesmo tempo, concretizar uma mostra de novidades vestimentares e sustentar sua divulgação mercadológica, através das ideias e conceitos apresentados como conclusão e êxito de um processo (PAREYSON, 1993, 2001), resultado multissensorial da relação entre elementos cênicos, movimentos corporais e do corpo vestido em ação imerso nesse ambiente.
Renata Soares Junqueira (Professor, UNESP Araraquara) Título: Paisagens enquadradas: a paisagem como alegoria no cinema épico de Glauber Rocha Resumo: O cinema de Glauber Rocha (1939‐1981) é, todo ele, constituído de procedimentos disjuntivos aptos a sustentar uma descontinuidade diegética que é muito similar àquela preconizada por Brecht no seu teatro
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épico e que tem também intenção política afim à do dramaturgo alemão, visando igualmente ao distanciamento crítico de um espectador que se quer pensante e ativo. Dentre os seus diversos recursos epicizantes há um que tem chamado especial atenção da crítica, qual seja, o tratamento alegórico dado à paisagem nacional (mar, floresta tropical, caatinga etc.) que o cineasta manipula para a enquadrar em planos que sugerem tanto a cena teatral, captada com câmera fixa, quanto "tableaux" que parecem evocar conscientemente a arte da pintura e a da fotografia. Nesta comunicação perscrutarei os possíveis sentidos das paisagens alegóricas de Terra em transe (1967) e O dragão da maldade contra o santo guerreiro (1969) – os dois filmes mais expressivos, já na fase da (auto)crítica pós‐1964, do espírito combativo do cineasta engajado –, procurando compreender os seus específicos enquadramentos à luz das lições brechtianas que Glauber abertamente valorizava. Extraídas de um conjunto de estereótipos representativos do nacional‐popular (Ismail Xavier chama‐os de “alegorias do subdesenvolvimento”), essas paisagens parecem problematizadas, em toda a obra glauberiana, pela articulação propriamente cinematográfica a que são submetidas por meio do enquadramento, da montagem e de uma associação disjuntiva de imagem e banda sonora. Resta saber se há efetivamente, nos filmes da fase pós‐1964, uma inversão do otimismo revolucionário que tais alegorias carregam em obras da fase pré‐1964 do cineasta, nomeadamente em Barravento (1961) e Deus e o diabo na terra do sol (1964). É este o questionamento que suscita as reflexões que ora proponho.
Ricardo de Araujo Soares (Estudante de pós‐graduação, UFBA) Título: O videogame enquanto forma expressiva de arte: uma análise da exposição L’art dans le jeu vidéo – l’inspiration française Resumo: L’art dans le jeu vidéo ‐ l’inspiration française foi uma exposição realizada pelo Art Ludique Museo, em Paris, entre os meses de setembro de 2015 e abril de 2016. Contou com cerca de 800 obras e instalações (ART LUDIQUE, 2015), entre rascunhos, ilustrações, pinturas em aquarelas, esculturas tradicionais e digitais, além de painéis animados que demonstravam as etapas da concepção e do fazer artístico que antecedem o jogo finalizado. O foco da exposição não estava, portanto, no videogame em si, mas sim nesses elementos artísticos que compuseram ou que contribuíram para a sua forma final, geralmente voltada para o entretenimento, que deixa muitas vezes em segundo plano a sua dimensão artística. Quando esses elementos, criados por artistas de áreas diversas – escultor, ilustrador, músico entre outros –, são expostos no espaço do museu, essa dimensão artística do videogame vem à tona de maneira evidenciada, ainda mais quando levamos em consideração que os museus são espaços que tradicionalmente conferem autenticidade às obras de arte. Portanto, podemos observar que a exposição L’art dans le jeu vidéo – l’inspiration française exemplifica a noção de arte no videogame ao expor etapas essenciais do seu complexo processo criativo e artístico. Nesta comunicação, discutiremos a possível contribuição da exposição L’art dans le jeu vidéo – l’inspiration française na compreensão do videogame enquanto forma expressiva de arte em nossa era, ao tempo em que abordaremos a ideia de obra de arte total (WAGNER, 2003), considerando que ao videogame convergem todas as formas de artes que o precedem.
Roberta Kelly Paiva Diniz (Pesquisadora/Grupo Intermídia, UFMG) Título: A dança em consonância com as artes: o exemplo do Fauno em Nijinsky Resumo: Partindo do princípio defendido por Walter Moser em seu texto “As relações entre as artes: por uma arqueologia da intermidialidade” (2006, p.42‐65) de que toda arte é veiculada por uma (ou mais) mídia(s) e, por conseguinte, de que o próprio cruzamento entre artes é, por si só, também um cruzamento intermidiático, proponho nesta apresentação uma breve análise sobre o que pode ser qualificado como um diálogo intermidiático entre dança, pintura e poesia conforme percebido na peça coreográfica L’après‐midi d’un faune (1912), concebida pelo dançarino russo Vaslav Nijinsky. Tal peça, homônima ao poema de Stéphane Mallarmé (1876), antes de uma coreografia nos moldes clássicos, pode ser considerada um “poema coreográfico”, como inclusive a descrevem críticos da obra nijinskyana (a exemplo de Jean‐Michel Nectoux); além disso, verifica‐se que ela se configura em uma sequência imagética de “poses plásticas”, levando‐nos ainda à possibilidade de comparar seu criador a um verdadeiro artista plástico. Tal constatação traz consigo alguns pressupostos midiáticos sobre os quais pretendo lançar pistas de reflexão a fim de esclarecer a sugestão de uma leitura propriamente intermidiática do balé em questão. A presente proposta consiste, pois, em última instância, em
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mais um estudo de caso sobre o fenômeno que entrelaça as artes e, inevitavelmente, sua(s) mídia(s) nesta rede de imbricamentos que compõem o que chamamos de intermidialidade.
Roberto Bezerra de Menezes (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: A experiência do olhar: a descrição pictural em Sérgio Sant’Anna Resumo: Os textos “A mulher nua”, “A figurante” e “Contemplando as meninas de Balthus”, de Sérgio Sant’Anna, reunidos sob o desígnio de “textos do olhar”, são exemplos evidentes de uso da descrição pictural, pois são estruturalmente construídos sob a atenção de um narrador que, não identificado em nenhum dos casos, se põe a olhar imagens. A partir desses três textos, propomos uma análise dos usos da descrição pictural baseados na poética do iconotexto, de Liliane Louvel. Tal poética parte do princípio de que a imagem deve ser evocada por um texto, estabelecendo uma relação entre “imagem‐imaginário‐imaginação” (2006, p. 191). O iconotexto pressupõe a coexistência da imagem e do texto, um entrelugar que faz uso da dialogia para gerar sentidos. Essa atitude, entretanto, não faz com que o iconotexto esteja “numa situação de ancoragem no real, mas estaria duplamente desligado, passando a evoluir no centro da representação e não mais num sistema normativo, em que o plano da representação entra ainda em interseção com o plano da realidade” (2006, p. 192‐193). Passa‐se, assim, da relação significante/significado para a relação significante/significante/significado. Os três textos de Sérgio Sant’Anna fazem usos diferentes da descrição, o que nos permite também afirmar a necessidade de análise dos dispositivos presentes para se mesurar as nuances do pictural ali instauradas. Pois, como propõe Louvel, é preciso, em conjunto com o objeto analisado, substituir a análise de cunho subjetivo para critérios com rigor. Assim, convém olhar de perto os três textos para, com eles, se verificar de que modo o pictural se revela; quais os efeitos e quais as diferenças e semelhanças no uso.
Roniere Silva Menezes (Professor, CEFET‐MG) Título: Toques de tambores: o Brasil de Orson Welles e Waldo Frank Resumo: Este texto propõe‐se a investigar o documentário It’s all true, de Orson Welles e o livro South american journey, de Waldo Frank, produzidos a partir de viagens dos norte‐americanos ao Brasil, em 1942, dentro do projeto político e cultural empreendido pelo governo Franklin Roosevelt intitulado “Política da boa vizinhança”. Como Vinicius de Moraes conviveu com os dois autores, tendo desenvolvido grande amizade com Orson Welles – e escrito crônicas sobre o diretor – e viajado pelo Norte e Nordeste brasileiros acompanhando o escritor Waldo Frank, textos do poeta contribuirão com nossas discussões. Algumas fotografias da norte‐americana Genevieve Naylor, feitas no Brasil no mesmo período, também ajudarão nas análises. Objetiva‐se, no ensaio, refletir, por meio da Literatura Comparada e dos Estudos Interartes – tomando como contraponto o período da Segunda Guerra Mundial, a “Política da boa vizinhança” e a Ditadura Vargas – sobre a presença de imagens e sons ligados à arte e à cultura popular – principalmente negra – nas obras do corpus. Conceitos ligados ao campo da memória e do arquivo embasarão as reflexões. Serão analisadas questões relativas às ideias de “democracia racial” e aos conceitos de “comum” e “comunidade”. Temas concernentes à música popular receberão atenção especial no trabalho. A ideia do “olhar estrangeiro” sobre o Brasil torna‐se dado importante no ensaio; no entanto, a “audição estrangeira” será ressaltada. O cineasta e o escritor geram problemas com a política norte‐americana e brasileira, pois fogem aos roteiros previamente definidos sobre o que deveria ser registrado no país. A cultura negra, que precisava ser “camuflada”, termina por constituir aspecto central de suas criações.
Rosana Campos Leite Mendes (Estudante de pós‐graduação, UnB Pós LIT/ FAPEMAT) e Rosemar E. Coenga (Professor, UNIC/IFMT) Título: Orfanato da srta. Peregrine para crianças peculiares (2011), de Ransom Riggs e O lar das crianças peculiares (2016), de Tim Burton: literatura, filme e fotografia pelo olho mecânico. Resumo: A presente comunicação abordará a imagem fotográfica presente na obra Orfanato da srta. Peregrine para crianças (2011), de Ransom Riggs e no filme O lar das crianças peculiares (2016), do diretor Tim Burton
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inspirado nesse mesmo livro. Na narrativa de ficção de Riggs, fotografias antigas servem de paisagem originária para palavras/imagens que adquirem corpo e realidade. Especificamente, o presente trabalho, cujos preceito teórico central são os estudos interartes (Arbex, Oliveira, Diniz, Clüver e outros) e os estudos da fotografia enquanto campo de plurissignificação (Barthes, Benjamin, Brizuela, Kossoy, Fabris, Samain, Rancière e outros) busca falar do fotográfico submerso na escrita literária e fílmica. A fotografia enquanto documento intencional na obra literária e igualmente evidente na narrativa cinematográfica esforça‐se por se projetar como algo não silenciado. O valor mágico que opera também entre realidade e falseamento e entre o antes e o depois tem a ver com a magia e mistério daquilo que se registra com a câmera. Por esse horizonte, de imbricações do mundo fictício e ordinário, a imagem fotográfica em seu discurso estético, literário e cinematográfico, apropria‐se, desde o seu surgimento, do “algo arrancado” que institui fragmento inacabado do “isso foi”. O objetivo desse trabalho é refletir sobre o campo interartístico e como os objetos fotográficos afirmam realidades que se revelam e se escondem na construção de ficções.
Roseli Barros Cunha (Professora, UFC) Título: Um olhar sobre Schneewittchen/ Blancanieves/ Branca de Neve à luz dos estudos sobre Intermidialidade Resumo: Em 2012, Schneewittchen – ou Branca de Neve, como a conhecemos em português –, dos irmãos Jacob e Wilhelm Grimm, ganha mais uma releitura. O filme espanhol Blancanieves, do diretor Pablo Berger, é inspirado no conto (mais especificamente, Märchen) recolhido da tradição oral pelos filólogos alemães. Neste artigo, trabalhamos com o conto a partir de duas traduções para o português do Brasil, a saber, a de Tatiana Belinky (2013) e a de Christine Röhrig (2014). Examinamos as relações intermidiáticas entre as obras literária e cinematográfica à luz dos estudos de Irina Rajewsky (2012) e Claus Clüver (2011), principalmente, no que se refere à caracterização da personagem principal, Branca de Neve, de seus pais, do lugar e da época onde ocorre a ação tanto do conto quanto do filme. Na produção de Berger, personagens, espaço e tempo contidos na obra dos Grimm são evidentemente ressignificados a partir de elementos do flamenco e das touradas, associados à cultura tradicional cigana presente, por sua vez, na tradição popular do sul da Espanha. A presença desses elementos faz com que a obra dialogue com outras produções bastante conhecidas sobre tais temáticas e os estereótipos que se perpetuam em relação a elas tanto na Espanha quanto fora dela ao longo de séculos. Analisamos como ocorre o processo de ressignificação e de que modo ela discute ou não conceitos e preconceitos sobre elementos populares e tradicionais muito associados ao que se costuma entender por “cultura espanhola”, principalmente a partir do apoio teórico de Rafael Jover (2007), Francisco Aix Gracia (2002) e Gerhard Steingresse (2002).
Samia Tavares de Souza (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: Testemunho, ética e fotografias da dor na autobiografia Ligeiramente fora de foco, de Robert Capa. Resumo: Neste presente trabalho serão apresentadas relações entre testemunho, ética e fotografias da dor na autobiografia Ligeiramente fora de foco, do fotógrafo Robert Capa. Publicada pela primeira vez em 1947, esta obra apresenta várias das reflexões de Capa sobre sua prática enquanto fotografo de guerra, e, portanto, enquanto fotografo da dor e sobre as imagens que ele produz. Trata‐se igualmente de uma obra com forte teor testemunhal, uma vez que nela o autor também narra suas experiências vividas como participante em vários momentos importantes no desenrolar da Segunda Guerra Mundial (1939‐1945). Procuraremos, portanto, problematizar as relações entre fotografia, dor e testemunho e analisar brevemente como estas permeiam a autobiografia de Capa. Igualmente procuraremos apontar a forma a partir da qual as imagens produzidas por Capa durante a Segunda Guerra Mundial (1939‐1945), que ilustram sua autobiografia, se inter‐relacionam com a narrativa textual do autor de suas experiências vividas durante o conflito, reforçando o teor testemunhal da obra e nos debruçaremos sobre as relações entre a estética fotográfica de Capa e sua postura ética profissional, ambas explicitadas como sendo profundamente pautadas pela proximidade e pelo envolvimento do fotógrafo com relação aos eventos históricos traumáticos retratados. Capa constrói, portanto, uma obra onde texto e imagem se conjugam em um discurso profundamente simpático a aquelas pessoas comuns, sejam civis tentando reconstruir suas vidas ou soldados arriscando a vida, que foram afetados pelo conflito de forma mais devastadora. Como arcabouço teórico deste trabalho acerca da autobiografia de Capa e suas relações éticas e
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testemunhais serão utilizadas reflexões tecidas por Didi‐Huberman, Gagnebin, Hobsbawn, Levi, Rancière, Sontag, dentre outros.
Samira Pinto Almeida (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: A presença da cena na literatura de Sérgio Sant’Anna Resumo: Com esse trabalho, pretendo discutir a construção da cena na literatura de Sérgio Sant’Anna a partir de conceitos caros ao campo das artes performáticas e, ainda, contemplá‐la à luz das novas formas de produção e recepção da cena no nosso mundo – formas propiciadas, sobretudo, pelo desenvolvimento tecnológico. Toda a obra de Sérgio Sant’Anna oferece em maior ou menor medida uma cena para contemplar através de personagens que assumem os papéis de ator e espectador na realidade ficcional. A leitura predominante da cena santaniana realizada pela crítica especializada a compreende ora como um recurso (um meio para atingir certa intenção estética), ora como o resultado de exercício metalinguístico. Se as personagens quebram com a ilusão ficcional ao representarem um papel diante do leitor, logo, não há dúvidas de que elas revelam seu caráter farsesco, seu corpo de palavras fruto da mímesis literária. Distinguindo de tal caminho já tão percorrido que submete a cena ao discurso da representação mimética (sem, contudo, negar a validade desse discurso), o meu interesse será ler a encenação como ponto fulcral a partir do qual a história se desenha. Uma vez que não aspiro restringir a cena a um mecanismo articulado que encerra a escrita em seus supostos limites, minha intenção será interpretá‐la como aspecto que fala intimamente sobre a nossa realidade, sobre o nosso mundo dado a ver como espetáculo. Nesse sentido, tentarei demonstrar que a cena se faz através da interação entre arte e “vida” (esta última, entendida na realidade ficcional também como arte, espetáculo), daí emergindo o pensamento sobre a criação artística em seu vasto sentido, sobre o prazer obtido por meio da contemplação do objeto criado; enfim, sobre as experiências proporcionadas pelos momentos de criação e de recepção.
Silvana Maria Pessôa de Oliveira (Professora, UFMG) Título: Livros transfigurados: a ficção de Agustina Bessa‐Luis, o cinema de Manoel de Oliveira Resumo: A relação entre a obra cinematográfica de Manoel de Oliveira, o longevo realizador português cujo cinema praticamente atravessou o século XX e a ficção de Agustina Bessa‐Luis, autora profícua de quase cinquenta romances, é bastante conhecida nos meios acadêmicos e tem merecido a atenção, de forma cada vez mais acentuada, de inúmeros estudiosos e pesquisadores do diálogo interartes. Dentre os seis filmes de Manoel de Oliveira realizados a partir da obra ficcional de Agustina, escolhi como objetivo para esta comunicação, analisar o conto A mãe de um rio, de Agustina, cotejando‐o com a transposição cinematográfica nele baseada feita por Manoel de Oliveira e materializada no filme Inquietude, de 1998. Para levar a cabo tal proposta almeja‐se analisar, a partir de um viés comparatista, as aproximações e distanciamentos entre os dois tipos de linguagem, com vistas a refletir tanto sobre os procedimentos estéticos que as constituem, quanto sobre os diferentes recursos e procedimentos técnicos que as distinguem e enformam. Neste sentido, sabe‐se que Manoel de Oliveira, em muitos casos, apropria‐se livremente do texto literário, transcriando‐o e readaptando‐o às circunstâncias da produção audiovisual. Em outros casos, como é o de A mãe de um rio, segue quase fielmente o texto literário que lhe serve de guia e roteiro. Numa primeira etapa, buscar‐se‐ á, nesta comunicação, analisar as semelhanças formais entre o texto escrito e o texto filmado, para observar em que medida a transposição criativa das linguagens se dá em observância a certos recursos e procedimentos oriundos do texto literário. Numa segunda etapa, investigar‐se‐á o atrito, a diferença que inevitavelmente se produz no processo de transposição de uma linguagem a outra. Num terceiro momento, objetivar‐se‐á refletir sobre o que se pode denominar uma “poética” do cinema de Manoel de Oliveira, com o fim de ressaltar e sublinhar sua singularidade técnica e de conteúdo, que o distinguem entre tantos outros realizadores do denominado “cinema de autor”.
Silvia Amélia Nogueira de Souza (Professora, CP/UFMG) Título: Manuscorte ou um jogo entre a palavra caligrafada e a imagem Resumo: A partir do pressuposto de que os materiais e suportes escolhidos para se escrever não são neutros,
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a escrita aporta, no seu modo de materializar a voz do texto, potencialidades e limites dados pelos instrumentos e pelos propósitos daquele que escreve. A presente comunicação objetiva discorrer sobre o uso da tesoura como ferramenta de criação “imagéticoverbal” observada em uma obra artística inédita, intitulada Manuscorte, da artista Sylvia Amélia, organizada sob a forma de um livro. Sob a perspectiva da intermidialidade pretende‐se analisar, por meio do objeto em questão, uma prática de escrita originária do ato de extrair do plano palavras caligraficamente recortadas. Esta operação, que ao invés de depositar o texto sobre o plano, extrai do plano o texto sob o qual se detém, acaba por gerar um resto, um ruído, um lado de fora da palavra. Toda palavra recortada carrega materialmente seu invólucro, seu continente. Nos deteremos nos processos combinatórios entre o escrever e recortar como ações que destinam textos que não se comportam como poemas visuais strito sensu, mas que conservam aproximações e contradições a estes, cabíveis de serem destrinchadas. Ao propor uma simbiose da palavra com a imagem, por meio do ato de “manuscortar”, se estabelece uma relação entre as duas frentes cabais, a verbal e a visual, por meio das quais, os enunciados tanto são concretizados pelo processo de significação no qual o sentido está sempre além da materialidade do texto, no lugar que costumamos chamar de entrelinhas, como nos deparamos com significantes textuais que não podem ser lidos. Por meio da análise das operações de permuta que envolvem o gesto, o sentido e a forma do texto, os modos de ler e ver são acessados em uma dança entre o visível, o legível e o indizível.
Sílvia Cristina Cópia Carrilho Silva Martins (Professora, Mackenzie) e Victor de Souza Vila (Estudante de pós‐graduação, Mackenzie) Título: Titanic: transposições das narrativas para o filme, para a Sociedade Histórica Brasileira do Titanic e para as páginas do Facebook. Resumo: Segundo a VI Jornada Intermídia, “a intermidialidade diz respeito não só ao que em geral se chama de ‘arte’, mas também às mídias e seus textos, que incluem não apenas as mídias impressas, mas também o cinema, a TV, o rádio, o vídeo, bem como as novas mídias eletrônicas e digitais[...]”. Em consonância ao tema da Jornada, o Trabalho de Conclusão de Curso de Publicidade e Propaganda do aluno pesquisador Victor de Souza Vila, sob a orientação da professora pesquisadora Sílvia Cristina, cujo tema é o Titanic e a Sociedade Histórica Brasileira do Titanic (SHBT), vai ao encontro desse assunto uma vez que envolve narrativas e suas transposições para outras mídias. Existem histórias poderosas e capazes de seduzir o mundo com seu encanto e seu fascínio e esse fato histórico ocorrido há mais de 100 anos ainda instiga e inspira inúmeras pessoas até os dias de hoje: o naufrágio do transatlântico R.M.S. Titanic. Desde o seu trágico fim até a atualidade, esse fato inspirou variadas narrativas e envolveu diferentes públicos e gerações, proporcionando uma “teia de informações” com significados, criando uma legião de fãs, admiradores e historiadores renomados no assunto. A apresentação desconectada dessas narrativas e públicos pode não fazer muito sentido, mas ao “conectá‐los” nessa “teia de informações” o universo mítico sobre o naufrágio do Titanic inspirou, no final do século passado, a produção do filme Titanic, de James Cameron, que proporcionou uma das maiores bilheterias de cinema da história. Aqui, logo de início, já se observa uma transposição: a dos acontecimentos para o filme, que podem produzir combinações de narrativas que também serão transpostas para a Sociedade Histórica Brasileira do Titanic (SHBT), um núcleo de estudos brasileiros dedicado majoritariamente ao legado do Titanic. Essa entidade tem uma página no Facebook – ela própria uma outra forma narrativa sobre o tema – e, a partir dessa página, há possibilidades de outras narrativas, virtuais ou não, mas todas tendo como ponto de referência o Titanic, quer seja pelos acontecimentos, pelas narrativas, pela simbologia ou pela mitologia. Este trabalho propõe‐se a estudar essa intermidialidade entre o filme e a SHBT, a partir de sua narrativa instituída por sua página no Facebook.
Solange Salete Tacolini Zorzo (Estudante de pós‐graduação, UnB) Título: A intermidialidade nos roteiros cinematográficos de Di Moretti Resumo: Para Di Moretti, premiado roteirista brasileiro, é imprescindível a presença poética na arte de escrever roteiros cinematográficos. De acordo com o escritor, o bom roteiro quer seja original ou adaptado é aquele que cultiva a sensibilidade humana e ela deve ser prioridade em sua elaboração. Esta pesquisa baseia‐se no diálogo entre duas obras escritas pelo roteirista cinematográfico Di Moretti: o documentário O menino grapiúna (1981), criado a partir do romance homônimo de Jorge Amado (2011) e a obra de ficção O pai da Rita
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(2011), inspirada na canção de Chico Buarque de Hollanda, A Rita (1966). Há entre as obras estudadas e suas transposições para as telas, uma relação de intermidialidade e não uma adaptação fílmica no sentido literal da palavra, apegada à fidelidade à obra originária. Há, se tomarmos a concepção de Solange Ribeiro de Oliveira (2012), o mesmo empreendimento “satânico” postulado por Haroldo de Campos quando ele cria o termo “transcriação”: em graus e formas diferentes, o poeta brasileiro proclama a intermidialidade como processo criativo fundamental que para Jakobson é a tradução intersemiótica que engloba códigos diferentes circulando neste caso entre a literatura, canção e cinema. Ainda parafraseando as palavras de Oliveira, a tradução das obras, no sentido amplo de releitura, reescrita, transcriação ou, como postulou Ismail Xavier no Congresso da ABRALIC em Belém (2015), “que outro nome merecer”, emerge como a grande catalisadora da criação poética em obras roteirizadas por um grande roteirista como Di Moretti. Afinal, como o próprio escritor afirma, não há originalidade, tudo já foi criado. Há, sim, outras formas de ver a realidade e montar a trama. E é através da intermidialidade que essas formas se concretizam.
Solange Viaro Padilha (Professora, FARESC) Título: Instâncias do fotográfico na narrativa de John Banville Resumo: O autor irlandês John Banville é conhecido pela sofisticação de sua linguagem. Seu texto, denso e metafórico, é pleno de referências intertextuais e interartísticas. Em seu processo composicional, entre outros recursos, o autor emprega elementos comuns às artes visuais. O objetivo desta pesquisa é ressaltar a aproximação com a fotografia existente na narrativa de Banville. O uso da luz, a presença de personagens que têm a fotografia como hobby ou profissão, a menção ao ato de registrar imagens por meio de uma câmara, o vocabulário pertinente ao campo imagético e a descrição de fotografias propriamente ditas são marcas que revelam tanto o percurso do olhar como também um modo de percepção da realidade e da representação. Seu texto – de forte apelo visual – discute as relações entre a vida e arte. Na sua obra, as imagens fotográficas configuram um poderoso elo de ligação entre o presente e o passado, a presença e a ausência, a vida e seu par antitético, a morte. O percurso de investigação que se propõe neste estudo está diretamente ligado à práxis compositiva adotada por Banville. Com base em estudos a respeito da imagem e do entrelaçamento dos códigos verbal e visual, esta pesquisa pretende verificar a relação da fotografia com outros elementos da narrativa banvilleana. Procuraremos averiguar de que maneira tanto o autor quanto os narradores de seus romances fazem uso da imagem fotográfica em seus escritos memorialísticos. Serão analisados os romances Ghosts (1993) e O mar (2005), e dois textos de não‐ficção, Prague Pictures: Portrait of a City (2003) e Time Pieces: A Dublin Memoir (2016). Utilizaremos como base teórica textos de Susan Sontag (2004), Roland Barthes (1981; 2012), Philippe Dubois (1993) e Jean‐Pierre Montier et. al. [org.] (2008).
Stephanie Martins Pinto da Costa (Estudante de pós‐graduação, UFJF) e João Queiroz (Professor, UFJF) Título: Intermidialidade em livros de realidade mista Resumo: Livros de realidade mista (mixed reality books) representam uma nova tecnologia para concepção, produção, e interpretação de textos literários ao combinar propriedades de livros impressos com mídias interativas digitais. Recentemente, tornou‐se mais relevante uma análise das propriedades digitais e interativas de Realidade Aumentada (RA) aplicadas a tais artefatos considerando as dimensões de intermidialidade, multimodalidade e transmidialidade observadas. Aplicações de Realidade Aumentada (a) combinam objetos reais e digitais no espaço físico real, (b) são interativas em tempo real, e (c) permitem percepção de objetos reais e digitais interligados. A associação de informações multimodais (efeitos visuais 2D e 3D, efeitos sonoros, experiência háptica) oferece ao leitor novos mecanismos de interação com a dimensão física da página impressa do livro. O propósito deste trabalho é descrever e analisar os mecanismos intermidiáticos observados em livros desta natureza. A principal metodologia utilizada baseia‐se em referências paradigmáticas da área, incluindo Claus Clüver, Werner Wolf, e Irina Rajewsky Estão entre os casos descritos e analisados: The house that Jack built, de Raphael Grasset (2008); Magic book, de Camille Scherrer (2008); The strange case of Dr. Jekyll e Mr.Hyde, adaptado por Martin Kovacovsky (2010).
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Tamer Thabet (Professor, UFVJM) Título: Videogame criticism from the structural to the postmodern Resumo: Videogames are multimedia constructions of audiovisual channels resembling these of film and employing different storytelling modalities that require more than reading, watching, and listening. This work is about structuralist and postmodernist frameworks of videogame criticism and is meant to investigate the paradigm shift in storytelling in videogames. The questions of game criticism are advancing from the structuralist models that explain gameplay as a psychological personal narrative experience to postmodern ones that describe how the player creates a meaning‐making process about imperfection. Structuralist thinking has initially helped understanding the very act of narration in videogames, which defies the traditional conventions of narratology. The player must participate in the storytelling, which means that the player assumes specific roles in the storytelling and so the various concepts of narration, characters, events, and time need reconsideration in the case of videogames. This in itself was a radical transformation in the communicative and transactional activity familiar in criticism. Videogames narratives have afforded their player a climactic sense of own violence or even an experience of a story about personal wickedness, but other emergent videogames tend to guide the player through the exploration of one’s own the imperfections and the very antihero within. This change in story matter has brought different ways of play and telling, which warranted that we consider postmodernist ideas in game criticism. The fact that the game is played – not read or watched – brings us to realize that literary demarcations of postmodernism might be after all quite suitable for coloring games as a narrative genre.
Tarcísio Fernandes Cordeiro (Professor, UFRB) Título: Diálogos (im)prováveis: as imagens de Flávio de Barros e Euclides da Cunha sobre a guerra de canudos Resumo: Neste estudo, objetiva‐se analisar imagens acerca do universo sertanejo nos registros literários, de Euclides da Cunha, e fotográficos, de Augusto Flávio de Barros, com destaque para os deslocamentos que atuam como fios entre memórias e identidades na construção de um imaginário relativo à guerra de Canudos. Para tanto, far‐se‐á uso do método de pesquisa comparado, no qual trataremos as manifestações e seus diferentes suportes, texto e/ou fotografia, enquanto discurso cultural. A rigor nos interessa problematizar os diálogos entre os diferentes registros do evento bélico que envolveu grande contingente militar e determinou a destruição do arraial e daquela população camponesa, em fins do século XIX, no sertão baiano. Flávio de Barros, fotógrafo da quarta e última expedição militar, capturou imagens do epílogo da guerra, produziu álbuns e organizou exposições com o material coligido. Entretanto, em que pese a repercussão imediata desses registros, o trabalho fotográfico não obteve um sucesso semelhante ao alcançado pela narrativa de Euclides da Cunha sobre o conflito. Registre‐se, contudo, que a primeira edição de Os Sertões, publicada em 1902, apresentava três fotografias de Barros, sem que os créditos ao fotógrafo fossem atribuídos. A obra de Cunha, inclusive, renomeia as fotos dando‐lhe novas conformações. Logo, neste contexto, questiona‐se as possíveis intersecções entre tais bases estéticas. A nosso ver, o fotógrafo desconhecido, com seu trabalho de fotodocumentalismo a serviço do exército brasileiro pode ter colaborado, em alguma medida, com a obra que consagrou o escritor. Por fim, acreditamos que os diálogos travados, pelo conjunto dessas imagens, nos permitam relativizar as fronteiras do conflito, pois, antes de um enredo estático, temos uma narrativa fluída que se (re)configura pelo jogo sempre impreciso das memórias e sua repercussão na produção de identidades.
Thaís Gonçalves Dias Porto (Estudante de pós‐graduação, UNESP Araraquara) Título: Os lugares e não‐lugares em Das Nackte Auge de Yoko Tawada Resumo: Yoko Tawada vem recebendo grande destaque no meio acadêmico devido à originalidade com que trata de temas frequentemente abordados na literatura contemporânea. A autora japonesa mudou‐se para a Alemanha no início dos anos oitenta a fim de seguir seus estudos germânicos e lá fixou sua carreira. Tawada escreve poesia, teatro, contos e romances, tanto em alemão como em japonês. A partir de seu olhar estrangeiro, a autora brinca com a língua alemã e escreve sobre o sujeito que se encontra geográfico e culturalmente deslocado na sociedade. Assim se encontra a personagem principal do romance Das Nackte Auge, uma jovem vietnamita que, por conta de um engano, acaba desembarcando em Paris no final na década
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de oitenta. Em meio à sociedade ocidental capitalista, a jovem se vê completamente excluída, principalmente devido à impossibilidade de comunicação com os locais. No entanto, a personagem encontra nas salas de cinema, mais especificamente nas personagens interpretadas pela atriz Catherine Deneuve, um local de refúgio da realidade, de identificação. Com o passar da narrativa, que é composta por treze capítulos que levam o título de um filme, a jovem vietnamita se vê cada vez mais envolvida pela ficção projetada nas telas dos cinemas parisienses, invertendo assim aquilo que Marc Augè classifica como lugar e não‐lugar. A sala de cinema, que, a princípio, se caracterizaria como um mero local de trânsito, ou seja, um não‐lugar, passa a ser um local de identificação, significação, até mesmo de comunicação, isto é, um lugar, segundo o conceito do antropólogo francês. A linguagem cinematográfica torna‐se o único elemento passível de compreensão da jovem. Tal habilidade é apresentada na obra de maneira crescente, incorporando, assim, a narrativa dos filmes à narrativa do romance, tornando‐a uma obra intermidiática.
Valquiria Pereira Alcantara (Estudante de pós‐graduação, USP) Título: Roald Dahl e Quentin Blake: o humor em Revolting rhymes e as traduções para o português Resumo: Roald Dahl é importante autor de literatura infantil em língua inglesa cuja obra continua celebrada anualmente em instituições de ensino no Reino Unido. O objetivo desse trabalho é, por meio de estudo comparativo, apresentar reflexões sobre possíveis relações que se estabelecem entre os textos verbal e visual na obra Revolting rhymes, bem como nas respectivas traduções brasileira Historinhas em versos perversos e portuguesa Histórias em verso para meninos perversos. A discussão a respeito das funções e relações presentes na obra e traduções analisadas baseia‐se nas observações de Luís Camargo em Ilustração do livro infantil e de Sophie Van der Linden em Para ler o livro ilustrado, pois apresentam de forma clara e objetiva definições relevantes para aqueles que desejam estudar não só ilustrações de livros infantis, mas também as conexões entre ilustrações e texto verbal. Encontra‐se no texto de Dahl não só o humor finamente construído principalmente por meio das escolhas lexicais, mas também o inesperado como o desfecho de sua versão para Chapeuzinho vermelho e o lobo, por exemplo. A comicidade resultante da articulação entre o texto de Dahl e as ilustrações de Quentin Blake interessa‐nos particularmente, pois Blake muitas vezes amplia o sentido da linguagem verbal com pequenos e surpreendentes detalhes. Como conclusão de nosso trabalho buscaremos melhor compreender, à luz das funções e relações elaboradas por Luís Camargo e Sophie Van der Linden, a recepção em língua portuguesa da obra analisada e como a rearticulação entre o texto verbal e as ilustrações da edição original inglesa contribui para a construção do efeito cômico em português, uma vez que a construção do humor está intimamente ligada às particularidades culturais.
Victor Hermann Mendes Pena (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: Uma explosão: palavras e imagens queimadas em um subúrbio negro: como a literatura e as artes leram os tumultos de Watts, em Los Angeles Resumo: Numa quarta‐feira de agosto, dois jovens negros são parados por um policial branco a duas quadras de seus lares, sob acusação de condução sob influência de álcool. O que poderia ser considerado até então ‐ e ainda hoje – uma cena corriqueira dos subúrbios de todo o mundo, resultara naquela noite de 1965 em algo diverso: a farda rasgada por Mrs. Rena Price, mãe de Marquette e Ronald Frye; seguida por 6 dias de tumulto em Watts, Los Angeles, resultando em 34 mortes, milhares de feridos e destruição estimada em 40 milhões de dólares.“An explosion – a formless, quite senseless, all but hopeless violent protest” – assim definira pejorativamente o relatório da Comissão McCone, do governador Pat Brown. Entretanto, enquanto os jornais se perguntavam se tratava‐se, enfim, de “baderna”, “rebelião” ou “insurreição”; até mesmo Martin Luther King restara algo perplexo diante de um fenômeno espontâneo sem palavra de ordem, acerca do qual se perguntava quanto à eficácia. Guy Debord, por sua vez, via no “absurdo” de Watts uma forma contundente de crítica do espetáculo. As palavras e imagens queimadas de Watts alimentaram, também, as artes e literatura. Se, hoje, movimentos como Black Lives Matter e a primavera secundarista são confrontados com a dúvida e fé nas palavras e imagens, imersas numa “pós‐verdade”; a proposta do presente seminário será revisitar Watts e examinar qual vínculo intermedial se dera entre diferentes meios para representar o protesto “sem forma e sem sentido” de Watts. Discutiremos autores como Thomas Pynchon, que supostamente visitara Watts na ocasião; Walter Mosley, criador do detetive negro Easy Rawlins, que desvendará um misterioso crime ocorrido
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durante os protestos; e também, o cinema neorrealista de Charles Burnett, morador de Watts; as assemblages com detritos, de Noah Purifoy; e o festival de música Wattstax, em comemoração de sete anos do rebelião.
Victor Melo Vale (Estudante de pós‐graduação, UFMG) Título: Música, linguagem e a potência de enunciação Resumo: Música e linguagem sempre constituíram expressões passíveis de aproximações teóricas e conceituais. A tradução, fenômeno presente no devir do homem e no cerne de seu ímpeto comunicativo, atestaria mais uma vez esse elo quando colocada frente a transcrição musical, fazendo com que ambas as práticas, por meio de uma dualidade especular, reconheçam‐se num modus operandi análogo. Contudo, a aproximação entre a tradução literária e a transcrição musical, já anunciada na análise da raiz etimológica de suas nomenclaturas, também nos leva a pensar em que esses processos se diferem. Para além das diferenças presentes na historicidade de cada uma destas atividades, a linguagem traz no seio de sua efetivação a semente do logos, todo seu potencial de designação que a torna essencial ao processo denotativo existente no interior do espaço das Ideias. Já a música, incapaz de expressar de forma delimitada, sempre foi mantida à margem de toda a problemática da verdade. Se o platonismo, no interior da atividade tradutória, divide o texto entre o que este designa, o sentido, e a carnalidade que suporta sua estrutura, a forma, cabe‐nos pensar como tratar a discussão sobre a transcrição musical através de uma aproximação conceitual com a linguagem e a tradução literária que não as coloque em vantagem por seus méritos referenciais, evidenciando‐as puramente por suas potências comunicativas. Aproximando‐nos dos trabalhos de Benjamin e Berman, encontramos um pensamento mais ético e filosófico sobre o problema da tradução, desvinculando‐a de sua suposta obrigação primal para com o sentido. Ao pensarmos a transcrição musical também no interior destes parâmetros, não apenas ajudamos a amadurecer a discussão sobre seus processos, como também evidenciamos o caráter filosófico desta atividade tão necessária à música ocidental europeia de tradição escrita.
Wellington Júnio Costa (Professor, UFS) Título: Os autorretratos escritos e desenhados de um misterioso caçador de passarinho Resumo: Em 1925, Jean Cocteau publica, em apenas 130 exemplares, Le Mystère de Jean L’oiseleur, um álbum com 31 autorretratos. No prefácio, o autor escreve: “Eu buscava várias maneiras de resolver um mesmo rosto”. Entre essas maneiras, Cocteau usa uma combinação de mídias (RAJEWSKY: 2012): desenho e escrita se juntam no mistério da autorrepresentação. Qual é a parte de um e de outra? O que revela a escrita? O que esconde o desenho? Qual é o efeito dessa combinação? O lápis que contorna o busto percebido no espelho é o mesmo que materializa pensamentos em aforismos, versos livres e micronarrativas. Aliás, o espelho do quarto é, segundo Serge Linarès (2007), o dispositivo que incita Jean Cocteau a se transpor em um terceiro, por insatisfação de si no reflexo da superfície cristalina. No papel, quase tudo é linha e, para Cocteau (1930), escrever é “desenhar, atar linhas, de tal maneira que elas se façam escrita, ou as desatar, de tal maneira que a escrita se torne desenho”. Além de linhas, alguns desses autorretratos comportam cores, sombreados e rasuras. As rasuras na escrita, não no desenho. A apreensão da imagem parece certeira, mas as palavras oscilam. No entanto, as duas linhas, a da escrita e a do desenho, combinam e são imprescindíveis na composição desses autorretratos, tão raros, já que somente depois de 91 anos voltam a ser editados na França, desta vez, em tiragem de 1000 exemplares numerados. Eis a ocasião para uma nova análise dos procedimentos de autorrepresentação de um artista multimídia avant la lettre.
Wendel Alves de Medeiros (Aluno de pós‐graduação, UECE) e José Albio Moreira de Sales (Professor, UECE) Título: Ensino de artes visuais e tecnologias digitais: produção e reflexão com imagens em trajetos virtuais Resumo: A rede internet firmou‐se como um ambiente de experimentos intermidiáticos, relacionados à comunicação e transferência de dados informacionais. Com a tecnologia mobile e seus gadgets, o acesso na World Wide Web (WWW) nos permite o uso de redes sociais e aplicativos, que congregam material digital, no formato de texto, fotografia e audiovisual. Tais possibilidades de troca de informações, consolidaram nossas ações em ambientes virtuais e nos trouxeram implicações que têm aguçado discussões em diferentes campos
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sociais. Nos cursos de licenciaturas em artes visuais, tem‐se investigado os impactos dessas tecnologias nos modos de produção e consumo das artes visuais, bem como no convívio em sociedade. O presente artigo trata‐se de uma Pesquisa Educacional Baseada em Arte (PEBA), caracterizada pela intermidialidade e implementada através do uso de tecnologia digital contemporânea de mapeamento, cartografia e fotografia do serviço Google Street View. O experimento/investigação consistiu na elaboração de um itinerário visual na web que foi complementado com reflexões, apresentadas na forma de textos. Os sujeitos colaboradores foram os discentes da disciplina de Arte & amp; Tecnologias Contemporâneas do Curso de Licenciatura em Artes Visuais do Instituto Federal do Ceará (CLAV/IFCE). O objetivo central do experimento/investigação é discutir possiblidades de apreciação, fruição, produção imagética e poética dos lugares/espaços selecionados ao longo de trajetos virtuais, compreendidos entre os endereços das casas dos colaboradores e o endereço do local de estudo destes, que foram obtidos por confluências de interações entre produções de artes visuais e diferentes mídias. Os resultados estão ligados à memória afetiva e o aumento da percepção visual, ao dar visibilidade à paisagem cotidiana outrora invisível. A análise efetuou‐se tendo como suporte teórico os escritos sobre web arte de Bulhões (2012); paisagens urbanas de Brissac (1996); fotografia contemporânea de Fatorelli (2013); a concepção de aparelhos de Flusser (1985) e a abordagem triangular de Barbosa (2010).
Yara Augusto (Pesquisadora, UFMG) Título: A plasticidade poética de Veinte poemas para ser leídos en el tranvía, de Oliverio Girondo Resumo: Liderança da vanguarda estética organizada em torno do Grupo Florida, colaborador frequente do periódico cultural Martín Fierro e criador engajado em contestar e reinventar formas e gêneros cristalizados, o poeta argentino Oliverio Girondo (1891‐1967) se destaca como um dos mais relevantes atores no processo de busca pela modernidade de pensamento e expressão artística na América Latina. Apesar de ser autor de obras soberbas, cuja escrita instiga e inquieta, bem como de ter desenvolvido uma estimulante trajetória como poeta e agitador cultural, o que o aproxima do Movimento Modernista e de seus representantes, Girondo segue bastante desconhecido do público brasileiro. Obra inaugural de sua poética, considerada o primeiro “livro de autor” da Argentina, Veinte poemas para ser leídos en el tranvía (Vinte poemas para serem lidos no bonde, 1922) consiste em um conjunto de relatos de suas viagens pela Europa e América. Para dar origem à criação sincrética, Girondo alternou‐se entre o traçado de signos verbais e visuais, pois se dedicou, concomitantemente, às práticas da escrita poética e da elaboração de imagens ilustrativas dos poemas. Além disso, faz‐se notório que o sentido da visão, o estrato visual e a dinâmica envolvida na percepção do visível são temas privilegiados no referido livro. A aproximação entre diferentes modalidades artísticas e a inter‐relação entre visual e verbal instauradas na obra constituiriam, também, uma via de trabalho em seus trabalhos posteriores. A par de conceitos relativos ao campo de estudos interartes/ intermidiáticos, este trabalho propõe um enfoque da interação entre visual e verbal nos processos de construção de sentidos que fundam a obra Veinte poemas para ser leídos en el tranvía. Para tanto, trataremos do livro, detendo‐nos, especialmente, no poema “Croquis en la arena” (Croqui na areia) e em sua respectiva ilustração, com o intuito de inquirir os mecanismos interartísticos/ intermidiáticos dessa obra de ruptura.
Yuri Bruscky (Pesquisador, UFP) Título: A poesia em ação: ruído e cotidiano na obra de Bernard Heidsieck Resumo: Este trabalho tem como objetivo analisar a produção do poeta sonoro francês Bernard Heidsieck, tendo como referência os conceitos de ruído e cotidiano, a partir da sua vinculação às mediações comunicativas e culturais performativamente experienciadas no mundo da vida, através das quais os sujeitos atuam e disputam espaços pela capacidade de significação da sua experiência, realçando seu caráter concreto e processual. As poéticas experimentais da voz surgidas ao longo do século XX tornaram‐se base de referência para um amplo espectro de práticas artísticas, denotando entre‐lugares sonoros/conceituais, gerando espaços de transformação à margem de padrões preconcebidos de criação e fruição poética, seja em composições interdisciplinares utilizando técnicas vocais estendidas, processamento eletroacústico para manipulação e espacialização do material sonoro, nas experiências que investigam a ambiguidade da linguagem oral e o potencial estético de expressões fonéticas, ruídos, articulações fisiológicas e da integração da voz com as particularidades acústicas do ambiente e à interseção com outras áreas artísticas, como a performance, o vídeo
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e a arte computacional, impulsionando de maneira radical a abertura à materialização dos processos artísticos nas práticas sociais e no cotidiano. Os territórios sonoros explorados nos Poèmes‐partitions (1955‐1965), Biopsies (1965‐1969) e Passe‐Partouts (1969‐2004) impõem‐se como instâncias significativas, sendo experienciados, reprocessados e delineados conforme as interações e a percepção dos espaços nos quais os sujeitos encontram‐se imersos. Essa noção de disputa no campo semântico, para além das discussões estritamente formais, toma vulto na produção heidsieckiana ao enfatizar o caráter dinâmico das mediações intersubjetivas constitutivas dos modelos de referência que classificam o mundo da vida cotidiana e fazem com que ele seja apreendido e significado de modos particulares pelos indivíduos. Reposicionam‐se, desse modo, os usos convencionais da voz e dos sons ambientes, redimensionando‐os simbolicamente, ensejando a possibilidade de embate pela capacidade de significação dos territórios sonoros do cotidiano.
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Comissão Organizadora
Comissão Organizadora: André Melo Mendes (Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas –UFMG) Cecília Nazaré (Escola de Música‐UFMG) Eliana Loureiro de Lima Reis (Faculdade de Letras‐UFMG) Flávio Barbeitas (Escola de Música‐UFMG) Márcia Arbex (Faculdade de Letras‐UFMG/CNPq) Maria do Carmo Freitas Veneroso (Escola de Belas Artes‐UFMG/CNPq) Miriam Vieira (Faculdade de Letras‐UFMG) Thaïs Flores Nogueira Diniz (Faculdade de Letras‐UFMG/CNPq) Comitê científico: Anna Stegh Camati (Uniandrade) André Melo Mendes (Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas –UFMG) Brunilda Reichman (Uniandrade) Cecília Nazaré (Escola de Música‐UFMG) Eliana Loureiro de Lima Reis (Faculdade de Letras‐UFMG) Flávio Barbeitas (Escola de Música‐UFMG) Maria do Carmo Freitas Veneroso (Escola de Belas Artes‐UFMG/CNPq) Miriam Vieira (Faculdade de Letras‐UFMG) Silvia Anastácio (UFBA) Solange Ribeiro de Oliveira (Faculdade de Letras‐UFMG/CNPq) Thaïs Flores Nogueira Diniz (Faculdade de Letras‐UFMG/CNPq) Colaboradores: Augustto Cipriani (discente pós‐graduação) Camila Augusta Pires de Figueiredo (UFJS, Grupo Intermídia) Clara Matheus Nogueira (discente pós‐graduação) Érika Vieira (UFVJM, Grupo Intermídia) Izabela Baptista do Lago (discente pós‐graduação) Pedro Gomes Dias Brito (discente graduação) Equipe de Design Gráfico: Chantal Herskovic Daniela Libânio Júlio Alessi Victor Hermann Equipe de divulgação: Cássia Macieira (mídias sociais) Marcos Paulo Araújo (website) Maria Viana Pinto Coelho (mídias sociais) Monitores (discentes graduação) Érica Sarsur (Coordenada dos monitores / discente pós‐graduação) Ana Paula Lima Ana Paula Pereira Anna Luiza Wendling Débora Maria Eduardo Siqueira Elisa Braga Gabriel Cardoso Gabriela Franca Castro
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Gabriela Luiza Torres Julia Tempesta Karina Rodrigues Letícia Ayenne Luisa Faria de Almeida Braga Luísa Machado Osório Pereira Lucas Trombeta Bosa Maria Viana Pinto Coelho Marlon Luan Mayra Garcia da Silva Natália Braga Tamires Nunes
PROMOÇÃO E APOIO
Grupo de Pesquisa Intermídia: Estudos sobre a Intermidialidade (UFMG/CNPQ) CAPES – Comissão de Aperfeiçoamento de Pessoal d Nível Superior CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico FAPEMIG – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais IEAT – Instituto de Estudos Avançados Transdisciplinares da UFMG PAIE – PROEX – Pró‐reitoria de Extensão da UFMG Programa de Pós‐Graduação em Estudos Literários da UFMG Programa de Pós‐Graduação em Música da UFMG Faculdade de Letras da UFMG Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG Escola de Música da UFMG Escola de Belas Artes da UFMG Centro de Extensão da Faculdade de Letras da UFMG Centro de Extensão da Escola de Belas Artes da UFMG UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS
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