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COMPREENDENDO O GÊNERO
Língua Portuguesa - Redação
Lista 1 – Pág. 1 de 16
Colégio Integral – 8º ano – 4º bimestre - 2013
Conto
O conto é, como a crônica, um texto de base narrativa. Tem, como objeto, histórias fictícias ou acontecimentos reais apresentados ficcionalmente.
O conto apresenta uma determinada estrutura básica, com os elementos
característicos de uma narrativa, como você pode ver sinalizado à margem do Texto
VIII, “Os homens que viraram barbantes”.
Esquematizando, temos:
Título (curto e sugestivo)
Introdução - Localização espaço-temporal (onde/quando?)
- Situação inicial (o quê?)
Desenvolvimento - Complicação ou conflito gerador
- Clímax
Conclusão - Desfecho da história
A figura do narrador
Em um conto, o narrador pode ser um personagem, um narrador participante dos
fatos (foco narrativo em 1ª pessoa). Leia o exemplo:
“Foi de incerta feita – o evento. Quem pode esperar coisa tão sem pés nem cabeça? Eu
estava em casa, o arraial sendo de todo tranquilo. Parou-me à porta o tropel. Cheguei à
janela.” (Guimarães Rosa, parágrafo inicial de F a m i g e r a d o )
O narrador pode ser apenas um observador que conta um fato que se passou em
determinado tempo e lugar (foco narrativo em 3ª pessoa). Leia o exemplo:
“Daí, com medo do crime, esquipou, mesmo com a noite, abriu grandes pernas. Mediu
o mundo. Por tantas serras, pulando de estrela em estrela, até aos seus Gerais.” (Guimarães Rosa, parágrafo final de R e c a d o d o m o r r o )
A seguir, você vai ler um conto em que poderá observar esses elementos.
Os homens que se transformavam em barbantes
Localização Havia uma cidade, grande, desenvolvida. As pessoas
que moravam lá eram saudáveis, simpáticas e alegres. Não
me lembro o nome da cidade, porque eu tinha quinze anos
quando passei por ela, levado por meu pai. Nessa época, não
me preocupava com o nome, mas sim com os lugares
propriamente.
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Des
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olv
imen
to
Intr
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Situação inicial
Complicação
(conflito gerador) Desenvolvido
conflito
Clímax
Língua Portuguesa - Redação
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Acontece que, certo dia, um habitante desta cidade
saiu de casa, pela manhã, dirigindo-se alegremente ao
emprego. Fez todas as coisas de praxe. Cumprimentou os
vizinhos, o barbeiro da esquina, o vendeiro, os colegas no
ponto de ônibus, agradeceu ao motorista, ao ascensorista,
sentou-se em sua mesa.
Nesse dia, no fim do expediente, o homem notou que
seu pulso esquerdo parecia mais fino. “Bobagem. Impressão.
Acho que estou cansado demais.” Foi para casa, jantou, viu
telenovela, dormiu. Na manhã seguinte, o pulso tinha se
afinado mais. E suas canelas pareciam de criança. Chamou a
mulher. Ela ficou tão impressionada, que o homem se
arrependeu de ter mostrado. Não havia dor, apenas fraqueza.
Partiu para o emprego. Contente, cumprimentando as
pessoas e agradecendo ao motorista e ao ascensorista. No
meio da tarde, porém, não conseguiu trabalhar. O pulso
estava fino e dobrava-se. Maleável, sem consistência. O
homem, envergonhado, puxou a manga da camisa. O mais
que pode, para que os colegas não vissem.
Mas viram. Porque o homem tinha o corpo
transformado. A cabeça, única coisa normal, caiu sobre a
mesa. O torso não era mais grosso que um lápis, suas pernas
e braços, finos como cordéis. Mas ele estava lúcido,
coerente, o cérebro não tinha sido perturbado. Além do
impacto, e da surpresa ante o estranho, o homem continuava
o mesmo. Levado para casa, chamaram o médico. E o
médico chamou outro médico. Porque:
– Não é o primeiro. É o terceiro, nesta semana.
Os jornais noticiaram o fato e as notícias trouxeram à
luz novos casos. Pela cidade inteira, acontecia aquilo, as
pessoas se adelgaçavam, tornavam-se frágeis. Em pouco
tempo, outro fato surgiu, ao lado dos homens que se
transformavam em barbantes. Eram os que se
transformavam em vidro. Tinham que ter muito cuidado, ao
andar pela rua, ao trabalhar, porque podiam se quebrar com
qualquer batida. Vez ou outra, os homens de vidro se
desfaziam. Em plena rua, à vista de todos. Como o vidro
blindex que se estilhaça por inteiro.
2
Co
ncl
usã
o
Des
env
olv
imen
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Desenvolvido
clímax Desfecho
Língua Portuguesa - Redação
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Colégio Integral – 8º ano – 4º bimestre - 2013
Aquela população alegre, saudável, descontraída,
começou a viver apavorada. Sem saber se, a qualquer
momento, o vírus (seria vírus?) podia atacar. Mudando a
pessoa em vidro ou barbante. Muitos começaram a se
mudar, indo para cidades distantes. A secretaria de saúde
analisou o ar, a água, tudo, em busca das causas. Mas o ar
era bom, não poluído. E as águas vinham de nascentes puras
ou de poços artesianos límpidos. Pensou-se que algumas
pessoas podiam estar colocando elementos venenosos na
comida ou em caixas de água. Investigações nada
concluíram.
E até hoje, nada se sabe. A cidade parece estar se
habituando à possibilidade de eventualmente alguém se
transmutar. Não causa mais surpresa quando um barbante é
levado pelo vento ou, em dias de chuva, é tragado pela
enxurrada. Ou quando os vidros se liquefazem, no momento
em que uma pessoa vira a esquina ou dá um esbarrão noutra.
A população se acostumou. Parece que o homem se adapta
às piores condições, conformando-se com os
acontecimentos. Naquela cidade, tudo é muito frágil, a vida
humana tem a espessura de um fio. Ou é delgada como um
vidro. Mas isto vai se constituindo na normalidade. BRANDÃO, Ignácio de Loyola. Cadeiras proibidas. São Paulo: Global, 1998.
EXERCÍCIOS
1- O conto é composto, além do título, de 9 parágrafos. Observe, à esquerda do texto, os
elementos da narrativa ou como o conto se desenvolve ao longo dos parágrafos. Releia
cada parágrafo e responda:
a) Onde se dá o fato narrado?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
b) Qual é a situação inicial?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
c) Qual é o conflito gerador?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
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Língua Portuguesa - Redação
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Colégio Integral – 8º ano – 4º bimestre - 2013
d) Qual é o clímax da história?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
e) Como se dá o desfecho?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
____________________________________________________________________
2- Nesse conto, o narrador conta os fatos que se sucederam, sem deles participar, como
narrador apenas observador – uma narrativa em terceira pessoa. No início, porém, ele
fala na primeira pessoa, presente no lugar onde ocorreram os fatos. Transcreva o trecho
onde isso se dá.
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
3- Para falar de uma realidade bem humana, a desumanização e a perda da
individualidade em uma cidade grande, o autor faz uso de elementos do imaginário
fantástico. Que fato, no conto, nos permite classificá-lo como um conto fantástico.
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
4- Em dois momentos do conto o autor faz uso do recurso do discurso direto, ou seja, o
registro direto do pensamento ou da fala de personagens. Transcreva os trechos em que
isso ocorre. Diga que sinal gráfico marca cada um e de que personagens se registra o
pensamento ou a fala.
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
5- Localize o parágrafo em que ocorre uma mudança de situação no modo de viver das
pessoas da cidade e transcreva o trecho que revela a mudança.
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
6- As causas dos estranhos acontecimentos na cidade foram determinadas? Sim ou não?
Explique.
______________________________________________________________________
__________________________________________________________________
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Língua Portuguesa - Redação
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Colégio Integral – 8º ano – 4º bimestre - 2013
Apresentamos, a seguir, o início de dois contos de escritores brasileiros. Escolha UM deles
e dê continuidade à narrativa.
Trecho 1
Sempre me chamou a atenção, aquela senhora. Ela almoça no mesmo restaurante que eu. Todos
os dias, à mesma hora, vejo-a entrar, sozinha, elegante em sua roupa escura, quase sempre de gola
rulê, os cabelos muito brancos presos num coque. Pisa o chão de lajotas com passos incertos, o
corpo muito magro um pouco encurvado, como se carregasse um peso invisível – ou um segredo.
Sim, porque os segredos vergam as costas, pesam como fardos. E, ao olhar, para ela, desde a
primeira vez, fui tomada pela sensação de que tinha algo a esconder.
(Seixas, Heloisa. Contos Mínimos. Rio de Janeiro: Record, 2001)
Trecho 2
O telefonema pegou-a de surpresa. Atendeu com impaciência, os olhos presos a um livro que tinha
nas mãos, uma história policial que não conseguia parar de ler. Era bom estar sozinha, lendo um
livro de suspense numa noite de ventania. O sábado já estava quase no fim e ela ali, presa àquelas
paginas. O som do telefone era uma intromissão, um estorvo. Atendeu a contra gosto.
(Seixas, Heloisa. Contos Mínimos. Rio de Janeiro: Record, 2001)
INSTRUÇÕES:
a) Antes de escrever, imagine o conflito, ou seja, a situação problemática que as personagens
viverão, e como ocorrerá sua superação. Além disso, planeje a organização dos fatos, estruturando o
enredo em partes (introdução, complicação, clímax e desfecho). Aproveite que a introdução já está
feita e capriche nos demais elementos.
b) Fique atento ao FOCO NARRATIVO empregado no trecho e mantenha-o em sua redação.
c) Ao redigir, empregue a variedade padrão da língua.
d) Sua redação deve ter entre 25 e 50 linhas.
e) Ao terminar o texto, passe-o a limpo – à tinta. Não se esqueça de revisá-lo e de lhe dar um
TÍTULO adequado (de acordo com o texto produzido).
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Conto
Proposta de Produção
Língua Portuguesa - Redação
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Entendendo um pouco mais do gênero conto...
I) ENREDO
Enredo – É a organização especial dos fatos narrados, de modo a provocar
determinados efeitos sobre o leitor. Dentro de um texto narrativo, é o conteúdo do qual
esse texto se constrói. O enredo, também chamado de trama, tem sempre um núcleo,
que chamamos de conflito. É esse conflito que determina o nível de tensão (expectativa)
aplicado na narrativa. É no enredo que se desenrolam os acontecimentos que formam o
texto (tecido).
O enredo é o esqueleto da narrativa, a sua base. Se não há enredo não há
narrativa, não há personagens, não há tempo e nem espaço. É com base nele, portanto,
que os demais itens que compõem a estrutura da narrativa vão se formando e se
relacionando para a construção de um texto coerente e lógico.
A organização dos fatos narrados pode acontecer de duas formas diferentes:
Linear: Disposição cronológica dos acontecimentos e ações;
Não linear: inversão da ordem, avanços, recuos, cortes, saltos no tempo, elipses.
Leia o texto abaixo, de Fernando Sabino, e observe como o autor desenvolveu o
enredo, chegando a um desfecho surpreendente:
PRETO E BRANCO
Perdera o emprego, chegara a passar fome, sem que ninguém soubesse; por
constrangimento, afastara-se da roda boêmia que antes costumava frequentar –
escritores, jornalistas, um sambista de cor que vinha a ser seu mais velho companheiro
de noitadas.
De repente, a salvação lhe apareceu na forma de um americano, que lhe oferecia
emprego numa agência. Agarrou-se com unhas e dentes à oportunidade, vale dizer, ao
americano, para garantir na sua nova função uma relativa estabilidade.
E um belo dia vai seguindo com o chefe pela Rua México, já distraídos de seus
passados tropeços, mas, tropeçando obstinadamente no inglês com quem se entendiam –
quando vê do outro lado da rua um preto agitar a mão para ele.
Era o sambista seu amigo.
Ocorreu-lhe desde logo que ao americano poderia parecer estranha tal amizade, e
mais ainda: incompatível com a ética ianque a ser mantida nas funções que passara a
exercer. Lembrou-se num átimo que o americano em geral tem uma coisa muito séria
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Conto Compreendendo o gênero
Conto
Língua Portuguesa - Redação
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chamada preconceito racial e seu critério de julgamento da capacidade funcional dos
subordinados talvez se deixasse influir por essa odiosa deformação. Por via das dúvidas,
correspondeu ao cumprimento de seu amigo da maneira mais discreta que lhe foi
possível, mas viu em pânico que ele atravessava a rua e vinha em sua direção, sorriso
aberto e braços prontos para um abraço.
Pensou rapidamente em se esquivar – não dava tempo: o americano também se
detivera, vendo o preto aproximar-se. Era seu amigo, velho companheiro, um bom
sujeito, dos melhores mesmo que já conhecera – acaso jamais chegara sequer a se
lembrar de que se tratava de um preto? Agora, com o gringo ali a seu lado, todo branco
e sardento, é que percebia pela primeira vez: não podia ser mais preto. Sendo assim,
tivesse paciência: mais tarde lhe explicava tudo, haveria de compreender. Passar fome
era muito bonito nos romances de Knut Hansun, lidos depois do jantar, e sem credores á
porta. Não teve mais dúvida: virou a cara quando o outro se aproximou e fingiu que não
o via, que não era com ele.
E não era mesmo com ele.
Porque antes de cumprimentá-lo, talvez ainda sem tê-lo visto, o sambista abriu
os braços para acolher o americano – também seu amigo. SABINO, Fernando. A mulher do vizinho. 7. Ed. Rio de Janeiro, Record, 1962 .p.163-4
Agora, responda as questões a seguir:
01. No primeiro parágrafo do texto, o narrador relata uma mudança de estado que
ocorreu na vida do personagem central da narrativa.
a) Identifique o estado anterior e o posterior.
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b) Qual a atitude desse personagem diante do novo estado?
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02. O segundo parágrafo relata ainda uma nova mudança de estado referente ao
personagem central.
a) Em que consiste essa mudança?
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______________________________________________________________________
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b) Que personagem, basicamente, desencadeou essa mudança?
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03. Considerando que o emprego na agência era sua salvação, que expediente adotou o
novo empregado para garantir sua estabilidade?
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04. Numa passagem posterior (3º §), já esquecido dos dias de desempregado, o
personagem central sente-se ameaçado.
a) Em que consiste essa ameaça?
______________________________________________________________________
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b) Explique por que ele se sente ameaçado.
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05. Como o personagem central correspondeu ao cumprimento do sambista?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
06. Quando pensou que o sambista vinha ao seu encontro para abraçá-lo:
a) Qual a atitude que ele tomou?
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______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
b) Transcreva, do texto, uma passagem em que o personagem procura justificar sua
indiferença perante o negro.
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07. O desfecho da narrativa é inesperado. Se soubesse desse desfecho, o personagem
teria tomado a atitude que tomou? Justifique. _____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
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II) FOCO NARRATIVO
Foco narrativo é o ângulo por meio do qual o narrador conta a história. Os mais
comuns são dois: foco narrativo em primeira pessoa e em terceira pessoa.
Sendo personagem, esse narrador não pode conhecer tudo Foco narrativo
1ª pessoa
Foco narrativo
3ª pessoa
o que acontece na história. Ele só pode contar o que viu ou
o que ouviu de outras personagens, fazer suposições e
interpretações.
Onisciente: quando o narrador conhece tudo sobre as
personagens, inclusive seus sentimentos e pensamentos.
Esse narrador pode relatar fatos ocorridos, ao mesmo
tempo, em diferentes lugares.
Objetivo (observador ou limitado): quando o narrador
apenas observa exteriormente as personagens, sem
conhecer seus pensamentos. Esse foco narrativo é usado
mais raramente pelos autores.
Agora, leia o conto abaixo:
A menina dos fósforos
Fazia um frio terrível, nevava e começava a escurecer. Era a última noite do ano,
a noite de Ano Bom. No frio e na escuridão, andava, pela rua, uma garotinha pobre,
descalça, de cabeça descoberta. Ao sair de casa, tinha chinelos nos pés. Mas os chinelos
eram grandes demais, sua mãe os havia usado antes, e, de tão grandes que eram, a
menina os perdera ao atravessar a rua correndo, no momento em que dois carros
passavam a toda velocidade. Não conseguira encontrar um dos chinelos, e o outro um
rapaz levara, dizendo que o usaria como berço quando tivesse filhos.
Lá ia, pois, a menina, com os pezinhos nus, arroxeados de frio. Trazia num velho
avental certa porção de fósforos e segurava um pacotinho deles na mão. O dia inteirinho
ninguém lhe comprara um só palito de fósforo, ninguém lhe dera um níquel. Sofrendo
frio e fome, a pobrezinha, andando pela rua, parecia apavorada. Os flocos de neve
caíam-lhe sobre os longos cabelos louros, que formavam graciosos cachos em torno da
nuca – mas a menina estava longe de pensar em cabelos bonitos.
Todas as janelas estavam iluminadas, e chegava até a rua um aroma delicioso de
ganso assado, pois era a noite de Ano Novo. Nisso, sim, ela pensava.
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Língua Portuguesa - Redação
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Por fim, ela encolheu-se num canto, entre duas casas: uma delas avançava mais
sobre a rua que a outra. Sentou-se, encolheu as perninhas, mas continuava a sentir frio.
Não tendo vendido um único fósforo, não possuindo um único níquel, não ousava ir
para casa, onde o pai bateria nela. Além disso, também fazia frio na casa onde moravam
– uma casa sem forro, com o telhado cheio de fendas, por onde o vento sibilava, apesar
de haverem tapado muitas delas com palha e trapos. Suas mãozinhas estavam
enregeladas. Um pequenino fósforo lhes faria bem. Pudesse ela, com os dedos duros,
puxar um fósforo do pacotinho, riscá-lo contra a parede e aquecer os dedos! Conseguiu-
o, afinal; tirou um e riscou-o. Como o fósforo ardeu e crepitou! A chama clara e quente
parecia uma velhinha, quando a envolveu com a mão. Era uma luz estranha. A garotinha
imaginou estar sentada em frente a uma grande lareira de ferro, com adornos e um
tambor de latão polido. O fogo crepitava alegremente, e aquecia tanto... Que beleza! A
pequena já ia estendendo os pés, para aquecê-los também... quando a chama se apagou e
a lareira desapareceu. Ela estava sentada na rua, com um pedacinho de fósforo
queimado na mão.
Riscou novo fósforo, que ardeu, claro, brilhante. Onde o clarão incidiu, a parede
tornou-se transparente como um véu. Ela viu então o interior de uma casa, onde estava
posta uma mesa, com toalha muito alva e fina porcelana. O ganso assado fumegava,
recheado de ameixas e maçãs, e, o que foi ainda mais extraordinário, de repente o ganso
pulou da travessa e saiu cambaleando pela sala, com o garfo e a faca espetados nas
costas. Veio vindo assim até ao pé da menina pobre. Aí o fósforo se apagou, e só se via
a parede, grossa e fria.
Ela acendeu outro fósforo. Viu-se sentada sob os ramos da mais linda árvore de
Natal. Era ainda maior e mais enfeitada que a árvore que ela vira através da porta
envidraçada, na sala do rico negociante, no Natal passado. Milhares de velas ardiam nos
ramos verdes, e figuras coloridas, como as que adornam as vitrinas das lojas, a fitavam.
A pequena estendeu as mãos para o alto – mas nisto o fósforo se apagou. As velas de
Natal foram subindo, cada vez mais, e ela viu que eram estrelas cintilantes. Uma delas
caiu, traçando um longo risco de fogo no céu.
Deve ter morrido alguém – disse a pequena.
A velha avó, única pessoa que lhe quisera bem, mas que já estava morta,
costumava dizer: “Quando uma estrela cai, sobe aos céus uma alma.”
A menina tornou a riscar um fósforo contra a parede. No clarão produzido em
volta, ela viu, radiante e iluminada, a velha avó, meiga e bondosa.
Vovó! – gritou a pequena. – Leva-me contigo! Sei que não mais estarás aí
quando o fósforo se apagar. Desaparecerás, como a boa lareira, o delicioso ganso assado
e a grande, linda árvore de Natal!
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Língua Portuguesa - Redação
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Riscou às pressas o resto dos fósforos que havia no pacotinho, para ter a avó ali
a seu lado e retê-la. O clarão dos fósforos tornou-se mais intenso que a luz do dia.
Nunca a avó fora tão grande e bela. Ergueu a menina nos braços e as duas voaram,
felizes, para as alturas, onde não havia frio nem fome, nem apreensões, voaram para
junto de Deus.
Quando raiou a manhã, muito fria, encontraram, ali no cantinho, entre as duas
casas, a menina, com as faces coradas e um sorriso a brincar-lhe nos lábios. Estava
morta, gelada. Morrera de frio na última noite do ano velho. A aurora do Ano Novo
brilhava sobre o pequenino cadáver, que jazia com os fósforos nas mãos. Um maço
inteiro estava queimado.
Ela quis aquecer-se – disseram.
Ninguém sabia que maravilhas ela vira, nem imaginava o esplendor que a
cercara, com a velha avó, nas alegrias do Ano Novo.
ANDERSEN, Hans Christian. Contos de Andersen. Trad. Guttorm Hanssen, Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2002.
Atividades
01. Qual é o foco narrativo utilizado pelo autor? Justifique sua resposta.
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
02. Releia o parágrafo 14 do conto. Se o foco narrativo fosse outro, qual seria o
conhecimento do leitor sobre a morte da menina? Explique. _____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
III) PERSONAGENS
Ao escrever um conto, o autor pode escolher entre dois modos de apresentar as
personagens:
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Atividades
01. Qual foi o modo utilizado por Andersen para apresentar a personagem principal do
conto? Exemplifique com uma frase do texto. _____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
02. Preencha a ficha abaixo com os dados da personagem principal do conto.
PERSONAGEM
Características físicas: ______________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
O que fazia: ______________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
Como se vestia: ___________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
Como se sentia: ___________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
Língua Portuguesa - Redação
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Colégio Integral – 8º ano – 4º bimestre - 2013
06. Apesar da descrição tão pormenorizada, a personagem não recebeu um nome: ela é
apenas “uma garotinha pobre”, vendedora de fósforos.
Se os nomes individualizam as pessoas (são chamados nomes próprios) dão a elas uma
identidade, por que o autor deixou a pequena vendedora sem nome?
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
Nota: Quando uma personagem é criada para representar uma categoria ou grupo de
pessoas e de comportamentos, ou seja, como um exemplo, dizemos que é uma
personagem típica, ou simplesmente tipo.
07. O tom de compaixão, triste e meigo, do conto é acentuado pelos adjetivos utilizados
para caracterizar a menina e seu sofrimento. Retire do texto os adjetivos e locuções
adjetivas utilizados para:
a) Garotinha:
b) Pezinhos:
c) Avental:
d) Cabelos:
e) Cachos:
f) Mãozinhas:
g) Dedos:
IV) ESPAÇO
ESPAÇO é o lugar onde ocorrem os fatos que são narrados.
O espaço pode ser muito importante na construção de textos narrativos, bem
como podemos observar no conto “A menina dos fósforos”.
Pense no seguinte:
Será que a história seria a mesma se a garotinha não estivesse sozinha na rua, à
noite, em meio à neve e ao frio? Será que a história provocaria a mesma reação no leitor
se não ficasse clara a diferença entre o espaço ocupado pela menina e as casas com
lareiras, mesas fartas e belas árvores de Natal?
Os tipos de espaço
Em uma narrativa, há basicamente dois tipos de espaço:
Espaço físico (geográfico): é o lugar onde acontecem os fatos. No conto de
Andersen, o espaço físico é a rua de uma cidade do hemisfério Norte.
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Língua Portuguesa - Redação
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Colégio Integral – 8º ano – 4º bimestre - 2013
Espaço social: é o tipo de sociedade onde se encontram as personagens. O conto
“A menina dos fósforos” revela-nos um espaço social onde há pessoas que
vivem confortavelmente, enquanto outras vivem na absoluta miséria.
O espaço físico e o espaço social, por sua vez, podem ser reais ou ficcionais. Ou
seja, os fatos podem ocorrer num lugar e numa sociedade que de fato existem (espaço
real) ou num lugar e numa sociedade imaginários (espaço ficcional).
A descrição do espaço e a sequência de fatos
Nas narrativas ficcionais, é possível descrever o espaço de duas maneiras. O
narrador interrompe temporariamente a narração dos fatos e descreve o espaço ou
revela o espaço aos poucos, apresentando pequenos detalhes, à medida que os fatos se
desenrolam.
Para que se descreve o espaço
A descrição do espaço contribui para:
Situar as personagens em seu ambiente e/ou em sua época;
Criar atmosferas – de ternura, de suspense, de terror, de humor – que
envolvem os fatos narrados;
Dar efeito de realidade à narrativa.
ATIVIDADES
1. Quando descrevemos um espaço, um lugar, NÃO é necessário apresentar tudo que
ele contém ou todos os elementos que o envolvem (sons, cheiros, etc.). Ao contrário,
devemos:
Escolher alguns elementos do lugar - os mais adequados às finalidades do texto
e à atmosfera que desejamos criar;
Caracterizar esses elementos, utilizando sobretudo adjetivos e locuções adjetivas
que contribuam para criar a atmosfera desejada (de medo, de solidão, de
suspense, de humor, etc.).
O trecho a seguir faz parte de um romance muito conhecido e nele o narrador
descreve uma estrada por onde passa.
Leia-o e responda às questões.
Diante de nós estendiam-se encostas verdejantes, margeadas por florestas e bosques
e, no alto das colinas, avistavam-se pomares ou casas residenciais de alguma fazenda.
Apesar de a estrada ser íngreme, a carruagem seguia com uma pressa que eu não podia
compreender, mas era evidente que o cocheiro queria chegar o mais depressa possível a
Borgo Prund. Eu fora informado de que aquele caminho é excelente no verão, mas que
ainda não fora reparado, depois dos danos sofridos durante o inverno.
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Língua Portuguesa - Redação
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Colégio Integral – 8º ano – 4º bimestre - 2013
...)
... afinal avistamos, diante de nós, a entrada do Passo do lado oriental. Nuvens
escuras e pesadas cobriam o céu, ameaçando tempestade. Tinha-se a impressão de que a
cadeia de montanhas separava duas atmosferas...
(...)
Árvores margeavam o caminho e, de novo, grandes rochedos surgiram de ambos os
lados. Apesar de estarmos abrigados, podíamos ouvir o sibilar do vento. O frio
aumentava e a neve começou a cair, em flocos muito finos. O vento ainda nos trazia o
latido dos cães, embora cada vez mais fracos. O uivo dos lobos parecia, ao contrário,
cada vez mais próximo.
a) Este trecho se inicia com uma descrição de espaço que cria uma atmosfera de
tranquilidade e beleza. Em que momento isso é alterado?
b) A partir do momento citado, que elementos foram escolhidos pelo narrador para
caracterizar a paisagem (o espaço físico) por onde passava? E quais dos cinco
sentidos foram utilizados para percebê-los?
c) Que atmosfera vai sendo criada por essa caracterização do espaço?
Agora, você é o contista e vai produzir um conto, ou seja, contar, por escrito, uma história. A história que você vai imaginar deve partir do assunto abordado no texto abaixo.
Você tem medo de quê?
O coração dispara e a respiração se torna ofegante. Ondas de calor percorrem todo o
corpo, as mãos tremem e a transpiração é tão intensa que as pessoas logo percebem sua
agitação.
Você tem tudo na ponta da língua para a reunião, mas, na hora H, mal consegue
balbuciar uma ou duas palavras. E aquela sua grande ideia, que você não teve coragem de
apresentar ao longo do encontro, é finalmente sugerida por um colega e saudada por todos
como a grande solução do problema. A reunião termina e você permanece ali, frustrado e
sentindo-se um completo incompetente. Uma única pergunta o atormenta: Por que eu não
falei? Por quê?
A maior parte dos medos relacionados ao dia-a-dia faz parte de um dos grupos mais
comuns de fobias, chamadas de sociais. O fóbico social tem dificuldade de se relacionar , não
consegue olhar nos olhos de seu interlocutor, conversar naturalmente com seus superiores,
falar em público, apresentar ideias ou sugestões, compartilhar tarefas. A característica mais
marcante desse tipo de fobia é o medo que a pessoa tem do julgamento dos outros.
( VOCÊ S.A., setembro 2001)
Conto
Proposta de Produção II
Língua Portuguesa - Redação
Lista 1 – Pág. 16 de 16
Colégio Integral – 8º ano – 4º bimestre - 2013
Escreva uma narração cujo protagonista, levado pelo medo, envolve-se em uma
situação cômica ou desagradável. Ilustre seu texto com discurso direto e discurso indireto.
Narre em primeira pessoa.
Use sua imaginação e sua criatividade, sem se esquecer do que vimos até aqui sobre os
elementos estruturais de um conto e sobre os elementos que ajudam a desenvolver a narrativa.
Não se esqueça também de dar um título ao seu conto.
Seu texto deverá ter no mínimo 20 e no máximo 40 linhas.
Após definir os elementos básicos da narrativa, o trabalho é organizá-los de forma
criativa, em linguagem adequada. Veja abaixo uma proposta para o planejamento de um
conto, lembrando que os elementos do enredo podem aparecer em diferentes momentos do
desenvolvimento da narrativa.
Conto
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