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Prezados leitores do Boletim da SBNp,
Mais uma vez o Boletim da SBNp está recheado com informações e curiosida-
des sobre a Neuropsicologia brasileira! Na primeira sessão, temos o prazer
apreciar o texto intitulado “A inflamação da dor social” escrito por Pedro Pi-
nheiro-Chagas, mestrando pela Universidade Federal de Minas Gerais e aluno
visitante no Departamento de Neuropsicologia da Universidade de Graz
(Austria).
Seguindo nossa tradicional sessão de entrevistas, nesse mês de junho, o en-
trevistado do mês é o Dr. Paulo Brito, Professor de Neurologia da Universida-
de de Pernambuco (UPE) e o primeiro presidente da SBNp fora do eixo Rio -
São Paulo.
No primeiro relato de pesquisa, contamos com a colaboração dos autores Na-
ra Côrtes Andrade e Neander Abreu Universidade Federal da Bahia - UFBA
com os dados preliminares do estudo: “Adaptação transcultural do Teste de
Conhecimento Emocional avaliação neuropsicológica das emoções”. Já
o segundo relato intitulado: “Funções Executivas em crianças e adolescen-
tes com diagnóstico de Transtorno do Espectro do Autismo (TEA)”, é es-
crito pela doutoranda Fernanda Rasch Czermainski da Universidade Federal
do Rio Grande do Sul - UFRGS.
Aproveitem bastante!
Equipe Boletim da SBNp
Editorial
Nesta edição:
BOLETIM SBNp
Gestão 2011-2013 -Edição Junho - 2012
Texto Inicial:
A inflamação da dor social
Relato de pesquisa I
Adaptação transcultural
do Teste de Conhecimen-
to Emocional
Relato de pesquisa II
Funções Executivas em
crianças e adolescentes
com diagnóstico de Trans-
torno do Espectro do Autis-
mo (TEA)
Entrevista do mês
Paulo Roberto de Brito
Marques
NEUROeventos
III Reunião Anual do Institu-
to Brasileiro de Neuropsico-
logia e Comportamento
SBNp!
Sociedade Brasileira de Neuropsicologia - www.sbnp.com.br
qualquer estímulo que ameaça a
estabilidade dos laços sociais se
reverte de um caráter extrema-
mente aversivo. Por exemplo,
Bolby (1969) mostrou que a sepa-
ração de um bebê de seu cuida-
dor produz um profundo estresse
emocional, provocando comporta-
mentos como gritar e chorar, os
quais também são manifestações
comuns na experiência de dor
física.
No primeiro trabalho que sistema-
ticamente investigou a relação
entre dor física e social
(Eisenberger & Lieberman, 2003),
os autores mostraram que uma
experiência de rejeição social,
eliciada por meio de um paradig-
ma experimental que simulava
uma interação lúdica entre indiví-
duos, associou-se a ativações
das porções dorsais do córtex
cingulado anterior. Crucialmente,
essas regiões são superponíveis
àquelas recrutadas pela dor crôni-
ca em pacientes com câncer, por
exemplo. Mais recentemente, foi
mostrado que doses do analgési-
co paracetamol reduzem o senti-
mento de dor social (DeWall et
“Doem-me a cabeça e o universo.”
Fernando Pessoa
A semelhança entre a dor física
e dor social não é apenas meta-
fórica, mas também neurofisioló-
gica. Uma das teorias mais im-
portantes sobre os mecanismos
psicológicos da dor propõe uma
distinção entre dois componen-
tes: o sensorial e o afetivo
(Rainville et al, 1997). O primeiro
está relacionado à intensidade do
estímulo doloroso, enquanto que
o segundo está associado às
sensações emocionais derivadas
da dor. No trabalho seminal de
Rainville et al. (1997), os autores
apresentam uma evidência empí-
rica dessa dissociação, mostran-
do que o córtex cingulado anteri-
or, mas não o córtex somatosen-
sorial, é ativado quando o des-
conforto do estímulo doloroso
varia e a sua intensidade perma-
nece a mesma.
O conceito de dor social foi inici-
almente proposto por Panksepp
(1998) para explicar a emergên-
cia de um sistema de integração
emocional para afetos sociais em
mamíferos. Com o aumento ex-
ponencial na complexidade das
estruturas sociais de cooperação
ao longo do processo evolutivo, a
necessidade de ligação social
tornou-se inexorável para os se-
res humanos (Macdonald & Le-
ary, 2005). Consequentemente,
al., 2010).
Mas quais são os mecanismos
neurofisiológicos e neurocogniti-
vos da sobreposição entre dor
física e dor social? Uma boa pis-
ta está na investigação da intera-
ção entre sistema imune e siste-
ma neurológico, particularmente
nos mecanismos fisiológicos do
estresse. Um trabalho recente
apostou nessa direção e encon-
trou resultados muito interessan-
tes. Slavich, Way, Eisenberger &
Taylor (2010) mediram a concen-
tração de citocinas pró-
inflamatórias em participantes
depois de um paradigma indutor
de estresse. Semanas depois,
parte dos participantes foi sub-
metida a um paradigma de exclu-
são social dentro da máquina de
ressonância magnética funcional.
Os resultados mostraram que a
indução de estresse provoca um
aumento da concentração de
citocinas pró-inflamatórias e, re-
plicando dados anteriores, a in-
dução de rejeição social ativa
regiões do córtex cingulado ante-
rior e da insula anterior. Final-
mente, os autores encontraram
uma correlação positiva entre
aumento da concentração de
citocinas pró-inflamatórias e ativi-
dade do córtex cingulado anterior
e da insula anterior. Isto é, aque-
les indivíduos que foram mais
sensíveis (mais aumento da ativi-
dade inflamatória) ao estressor
psicológico, também foram mais
sensíveis (maior atividade do
córtex cingulado anterior e insula
anterior) à rejeição social.
A inflamação da dor social
Por: Pedro Pinheiro-Chagas
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Continua
o aumento de riscos ambientais
(violência pública) explicam parte
significativa da maximização dos
níveis de ansiedade na sociedade
americana nos últimos 50 anos
(Twenge, 2000).
A consiliência entre neurociência
e imunologia certamente irá nos
ajudar a entender melhor os me-
canismos subjacentes à sobrepo-
sição entre dor física e dor social.
Consequentemente, intervenções
neuropsicológicas e psiquiátricas
mais eficazes poderão ser desen-
volvidas para o tratamento de
psicopatologias internalizantes,
bem como para o manejo de sin-
tomas internalizantes comuns nas
doenças que provocam dor crôni-
ca.
Referências: HaBolby, J. (1969). Attachment &
Lost, Vol. I: Attachment. New York: Basic Books.
DeWall, C. N., MacDonald, G., Webs-
ter, G. D., Masten, C. L., Baumeis-ter, R. F., Powell, C., Combs, D., et al. (2010). Acetaminophen Re-duces Social Pain. Psychological Science, 21(7), 931-937.
Eisenberger, N. I., Lieberman, M. D.,
Williams, K. D. (2003). Does rejec-tion hurts? An fMRI study of social exclusion. Science, 302(5643), 290-292.
Macdonald, G., Leary, M. R. (2005).
Why does social rejection hurt? The relationship between social and physical pain. Psychological Bulletin, 131(2), 202-223.
Panksepp, J. (1998). Affective neu-
roscience: The foundations of human and animal emotions. New York: Oxford University Press.
De maneira geral, a literatura
indica que estímulos psicológico
estressores modulam a circuita-
ria envolvendo o giro do cíngulo
anterior e a ínsula anterior rela-
cionada tanto ao processamen-
to da dimensão afetiva da dor
física, quanto da dor social. Es-
sa circuitaria teria um papel de
regulação da atividade imunoló-
gica, atuando na produção de
citocinas pró-inflamatórias atra-
vés de suas projeções para o
hipotálamo. O hipotálamo pos-
sui conexões com regiões do
tronco cerebral (substância cin-
zenta periaquedutal, ponte e
nervo vago), estruturas respon-
sáveis pela produção de acetil-
colina que atua na expressão
de citocinas. A atividade infla-
matória, por sua vez, desenca-
dearia sintomas internalizantes
(sickness behavior), a qual cro-
nificada, poderia contribuir para
o aparecimento de psicopatolo-
gias tais como ansiedade e de-
pressão.
As sociedades contemporâ-
neas, nas quais o raciocínio
individualista é intensamente
cultivado, contêm muitos riscos
para a manutenção dos vínculos
sociais. Depressão, por exem-
plo, pode ser definida como um
mecanismo que atua na diminui-
ção do risco social quando a
probabilidade percebida de ex-
clusão é alta (Macdonald & Le-
ary, 2005). Uma importante me-
ta-análise mostrou que a dimi-
nuição das interações sociais e
Rainville, P., Duncan, G. H., Price, D.
D., Carrier, B., Bushnell, M.C. (1997). Pain affect encoded in hu-man anterior cingulate but not so-matosensory cortex. Science, 277(5328), 968-971.
Slavich, G. M., Way, B.M., Eisenber-
ger, N. I., Taylor, S. E. (2010). "Neural sensitivity to social rejection is associated with inflammatory res-ponses to social stress." Proc Natl Acad Sci USA 107(33): 14817-14822.
Twenge, J. M. (2000) The Age of An-
xiety? Birth Cohort Change in An-xiety and Neuroticism, 1952-1993. Journal of Personality and Social Psychology, 79 (6) 1007-1021.
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Pedro Pinheiro-Chagas
Possui Graduação em Psicologia (UFMG)
com período sanduiche na Universidade
de Wisconsin - Madison (EUA), onde tra-
balhou no Lab for Affective Neuroscience
coordenado pelo Prof. Richard Davidson.
Atualmente é mestrando no Programa de
Pós-Graduação em Neurociências da
UFMG sob a orientação do Prof. Vitor
Haase e aluno visitante no Departamento
de Neuropsicologia da Universidade de
Graz (Austria).
Carmen Junqué i Plaza da Uni-
versidade Autônoma de Barcelo-
na e do Hospital de San Pablo e;
no segundo momento, Laboratoi-
re Théophile-Alajouanine du Cen-
ter de Recherche du Center Hos-
pitalier Côtes-des-Neiges da Uni-
versidade de Montreal sob a ori-
entação do Professor Yves Joa-
nette, Bernadette Ska, Arlette
Poissant e demais estudiosos.
Estudei neuropsicologia das de-
mências, especialmente das do-
enças neurodegenerativas.
SBNp: Atualmente Paulo, qual
sua linha de pesquisa, trabalho
e filiação?
Paulo: Minha linha de pesquisa é
feita por mim e pelo meu grupo
de trabalho para estudar a corre-
lação entre a avaliação cognitiva
que faço e os resultados de ne-
cropsia dos pacientes em doen-
ças neurodegenerativas. Proce-
dendo assim, tenho hoje, 90 au-
tópsias, que foram acompanha-
das de forma pregressa a partir
de um diagnóstico clínico, com
avaliação neuropsicológica, estu-
do de neuroimagem, taxas san-
guíneas, evolução, complicações
e óbito. O meu grupo de trabalho
Recife, 27 de maio de 2012.
SBNp: Olá Paulo, tudo bem?
Gostaríamos que você falasse
um pouco para os leitores do
Boletim, sobre sua atuação
dentro da neuropsicologia.
Paulo: A minha atuação hoje den-
tro na neuropsicologia ocorre no
Núcleo de Neurologia do Compor-
tamento da Universidade de Per-
nambuco, criado por mim em
1996. Nesse núcleo, trabalho com
protocolo de avaliação adaptado
por mim do protocolo de Montreal
em doenças neurodegenerativas;
estudado na comunidade, cidade
de Olinda, em população com ida-
des entre 60 e 92 anos. O mesmo
protocolo é utilizado no Instituto
Paulo Brito, atendendo pacientes
com doenças neurodegenerativas
e em clínica privada, no processo
de avaliação com fins de tentativa
de reabilitação.
SBNp: Como foi o caminho-
formação na sua área
(neurologia) e na neuropsicolo-
gia?
Paulo: Minha formação em Neu-
rologia foi feita em Recife e Barce-
lona; em Recife, com o Professor
Alcides Codeceira Jr. e, em Bar-
celona, com meu mestre, o Pro-
fessor Lluís Barraquer i Bordas da
Universidade Autônoma de Barce-
lona e do Hospital de San Pablo.
Minha formação em Neuropsicolo-
gia foi realizada em dois momen-
tos: primeiro em Barcelona, tanto
pelo meu mestre, Lluís Barraquer i
Bordas como pela Professora
é constituído por neuropatologis-
ta, imunologista, psicólogo e es-
tatístico. Como Professor, tenho
orientado trabalhos com os estu-
dantes a cada ano.
SBNp: Como foi o desafio de
ser o primeiro presidente da
SBNp fora do eixo RJ-SP?
Paulo: Não sei o que estava
acontecendo com a SBNp na
época que aceitei ser presidente.
Parecia que as pessoas presen-
tes na reunião queriam se ver
livre da responsabilidade, esse
foi o sentimento que tive naquele
momento. Foi difícil presidi-la
sem dinheiro e sem ajuda dos
colegas que fazem parte da
mesma: após a decisão do novo
presidente, todos desaparece-
ram para cuidar de suas obriga-
ções. Na mesma época, ocorreu
a superposição com o Congres-
so Latino Americano de Neu-
ropsicologia (SLAN) e nosso
Congresso Brasileiro de Neu-
ropsicologia. Na realidade, o
sentimento final é o de que funci-
onei como um “testa de ferro”,
mesmo sabendo disso tentei
divulgar a neuropsicologia no
Norte e Nordeste do Brasil. Sa-
bendo por onde andava, conse-
gui juntar a nossa SBNp com a
SLAN, e realizamos congresso
único das duas sociedades, sem
grandes dificuldades. Os maio-
res problemas estavam nas rela-
ções emocionais entre as pesso-
as e, não, na SBNp, exceto, a
situação financeira.
Paulo Roberto de Brito Marques Por: Cristina Yumi N. Sediyama
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Continua
não percebem o risco legal ao
qual estão submetidos.
As perspectivas para a neuropsi-
cologia pernambucana poderia
começar a partir da primeira avali-
ação neuropsicológica e acompa-
nhar a evolução das alterações
funcionais do córtex cerebral para
tentar melhorar a qualidade de
vida dos pacientes e da família.
Sabe-se que quando circuitos cor-
ticais específicos, tanto em áreas
terciárias como quaternárias do
córtex cerebral, são corretamente
estimulados surge uma resistên-
cia no seu declínio durante a neu-
rodegeneração. Esse trabalho
necessita de um conhecimento
profundo de neuroanatomia e
neurofisiologia cortical, aplicados
aos sintomas clínicos, os quais
são dificilmente vistos como sinais
clínicos, principalmente na fase
leve das doenças neurodegenera-
tivas. A etiologia das doenças
neurodegenerativas necessita de
uma nosologia para que possa
ser classificada. Portanto, a neu-
ropsicologia pernambucana deve-
ria limitar-se a sua competência,
pois, um ser humano, não é uma
máquina que se examina apenas
com testes.
SBNp: Qual o diferencial de sua
área de formação para a sua
prática clínica?
Paulo: Não existe diferencial en-
tre a minha área de formação e a
minha prática clínica porque sem-
pre acreditei que, em neurologia,
o conhecimento tem que partir do
ponto específico até atingir o obje-
tivo: assim todas as variáveis es-
tão correlacionadas.
SBNp: Qual a opinião do profis-
sional sobre a neuropsicologia
no contexto multidisciplinar?
SBNp: Atualmente, como vo-
cê percebe a neuropsicologia
brasileira hoje e suas pers-
pectivas?
Paulo: Não sei dizer como está
a neuropsicologia brasileira, eu
estou isolado, mas a pernambu-
cana poderia ir melhor: o meu
pronunciamento sobre o assun-
to, refere-se especificamente a
neuropsicologia das doenças
neurodegenerativas. Na área
que trabalho como Professor de
Neurologia da Universidade de
Pernambuco, Médico-
Neurologista do Hospital Uni-
versitário Oswaldo Cruz, Diretor
Científico do Instituto Paulo Bri-
to, Membro da Comissão Esta-
dual de Dispensação de Medi-
cação Excepcional para doença
de Alzheimer, Parkinson e na
Clínica Privada a neuropsicolo-
gia tem assumido uma respon-
sabilidade na cidade do Recife,
da qual, ela não tem competên-
cia. O assunto aqui chegou ao
ponto do Conselho Regional de
Psicologia (CRP) se manifestar,
de forma ética e educativa, a
tentar orientar os psicólogos
sobre a disciplina Neuropsicolo-
gia; por outro lado, o Conselho
Regional de Medicina também
está envolvido nos questiona-
mentos entre esse divisor de
águas. Fui convidado pelo Con-
selho Regional de Psicologia de
Pernambuco para fazer confe-
rência, para comemorar 50
anos de Psicologia no Estado.
O tema será para discutir as
questões neuropsicológicas
frente ao diagnóstico de doen-
ças neurodegenerativas. Eu e o
CRP tentaremos fazer um curso
de Educação Continuada para
orientar a grande população de
psicólogos que, ainda não es-
tão devidamente orientados e
Paulo: Seria de bom alvitre, em
primeiro lugar, definir o que é neu-
ropsicologia clínica, se é que é
possível. Qual seria o lugar da lin-
guagem na neuropsicologia; onde
começa e termina a memória ou a
praxia; quais os componentes cog-
nitivos e funcionais que estão en-
volvidos nas funções executivas. O
que se está avaliando? A partir
dessa formação profissional se
poderia entender melhor o papel
da neuropsicologia no contexto
multidisciplinar.
Obrigado ao atual Presidente da
Sociedade Brasileira de Neuropsi-
cologia pelo trabalho de resgatar a
história da nossa sociedade.
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Paulo Roberto de Brito Marques
Professor de Neurologia da Universidade de
Pernambuco (UPE). Médico-Neurologista
do Hospital Universitário Oswaldo Cruz da
UPE. Médico-Neurologista Membro da Co-
missão Estadual da Secretaria de Saúde de
Dispensação de Medicação Excepcional de
doença de Alzheimer e Parkinson. Diretor
Científico do Instituto Paulo Brito.
As emoções são fundamentais à adap-
tação da espécie humana, sendo ele-
mentos estruturantes das interações
sociais. Elas “são o centro das relações
das crianças, de seu bem-estar, senso
de self e sensibilidade moral e são cen-
tralmente ligadas à sua compreensão de
mundo e crescimento”. O conhecimento
ou compreensão emocional se refere à
capacidade de conhecer “expressões,
rótulos e funções das emoções”. Ele
favorece o desenvolvimento de uma
relação saudável do indivíduo com seu
contexto e está vinculado a inúmeras e
importantes dimensões do funcionamen-
to cognitivo e sócio-relacional dos seres
humanos. Maior habilidade em conheci-
mento emocional correlaciona-se a uma
melhor regulação emocional, habilidade
social, controle inibitório, habilidade ver-
bal e desempenho escolar; além de me-
nores níveis de agressividade, intera-
ções negativas entre pares e problemas
de comportamento.
Entretanto, uma revisão acerca dos tes-
tes psicológicos para crianças no Brasil
evidencia uma escassez deste tipo de
medida. Entre os 135 instrumentos apro-
vados para utilização pelo Sistema de
Avaliação de Testes Psicológicos
(SATEPSI) do Conselho Federal de Psi-
cologia, nenhum se dedica a mensurar
aspectos referentes ao conhecimento
emocional em crianças. O presente tra-
balho teve por objetivo: traduzir, adaptar
culturalmente e validar o Teste de Co-
nhecimento Emocional - EMT e encon-
tra-se em fase de desenvolvimento. Par-
ticiparão deste estudo 420 crianças de
escolas particulares e públicas dos muni-
cípios de Salvador, Belo Horizonte e São
Paulo.
O EMT, dirigido a crianças de três a
seis anos de idade, é composto de qua-
tro tarefas que visam a mensurar os
componentes do conhecimento emocio-
nal receptivo (reconhecimento de ex-
pressões emocionais), expressivo
(rotulação destas expressões), além
de conhecimentos referentes a situações
que provocam emoção e expressão
emocional5, . Com a finalidade de avali-
ar a validade de critério deste instrumen-
to, estão sendo aplicadas uma escala de
regulação emocional, Emotion Regulation
Checklist; um teste de habilidade verbal,
Teste de Vocabulário Auditivo USP, além
do Child Behavior Checklist.
A adaptação transcultural do EMT foi
feita com base no guia da International
Test Commission. A tradução foi realizada
por três profissionais bilíngües com expe-
riência na atuação com neuropsicologia
infantil, dois deles com doutorado na área.
A retrotradução foi avaliada pelos autores
do instrumento através de uma escala
Likert, além de quatro juízes bilíngües
doutores em psicologia ou medicina. Uma
etapa de análise semântica foi realizada
junto a adultos brasileiros e crianças entre
três e seis anos, e verificou-se uma boa
compreensão dos itens por parte da popu-
lação alvo.
O estudo piloto já está em andamento no
município de Salvador. Dados prelimina-
res de 28 crianças, 50% do sexo masculi-
no e 50% do sexo feminino, apontam que
o desempenho no EMT correlaciona-se
significativamente com a idade (rs= 0,667,
p < 0,001), indicando que este instrumen-
to possui sensibilidade às diferentes fai-
xas etárias e, possivelmente uma boa
validade desenvolvimental. Crianças com
melhor habilidade em conhecimento emo-
cional apresentaram melhor desempenho
em tarefas de habilidade verbal (rs=
0,566, p = 0,002). Entretanto, não foram
verificadas correlações significativas com
a regulação emocional.
Estes dados são preliminares e refle-
tem a primeira etapa do trabalho de adap-
tação transcultural, validação e normatiza-
ção do Teste de Conhecimento Emocional
– EMT. Três equipes em diferentes capi-
tais do Brasil, Salvador – BA, Belo Hori-
zonte - MG e São Paulo – SP, estão finali-
zando o treinamento e coletando dados,
coordenados pelos autores do presente
estudo.
Referências
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Izard, C. E. (2001). Emotional intelligence or adaptive emotions? Emotion, 1(3), 249-257.
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Vijver, F. V. D., & Hambleton, R. K. (1996). Translating Tests : Some Practical Guidelines. Options, 1(2), 89-99.
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Sociedade Brasileira de Neuropsicologia - www.sbnp.com.br
Adaptação transcultural do Teste de Conhecimento Emocional (EMT):
avaliação neuropsicológica das emoções - dados preliminares
Nara Côrtes Andrade & Neander Abreu
Nara Côrtes Andrade Psicóloga formada pela Universidade Federal da Bahia - UFBA. Professora
da Universidade Católica do Salva-dor. Mestranda em Psicologia
do Desenvolvimento pela UFBA Membro do Grupo de Pesquisa em Neuropsicologia Clínica e Cognitiva
– Neuroclic
Neander Abreu Professor Adjunto – Instituto de Psi-
cologia. Universidade Federal da Bahia. Coordenador do Grupo de
Pesquisa em Neuropsicologia Clínica e Cognitiva – Neuroclic
dimento poderia contribuir para a
realização do diagnóstico diferencial
entre o TEA e outros transtornos do
desenvolvimento e entre indivíduos
com diferentes perfis neuropsicoló-
gicos dentro do espectro, como
também para a formulação de es-
tratégias clínicas e pedagógicas
mais adequadas às necessidades
dessa população clínica.
Nesse sentido, foi realizada uma
pesquisa como parte do meu traba-
lho de Mestrado em Psicologia
(UFRGS), sob orientação das Pro-
fas Jerusa Fumagalli de Salles
(Núcleo de Estudos em Neuropsico-
logia Cognitiva – NEUROCOG) e
Cleonice Alves Bosa (Núcleo Inte-
grado de Estudos e Pesquisa em
Transtornos do Desenvolvimento –
NIEPED), com o objetivo de avaliar
as FE em um grupo de crianças e
adolescentes com diagnóstico de
TEA (n=11), comparado a um grupo
de crianças e adolescentes com
desenvolvimento típico (n=19) de
mesma idade, escolaridade e de-
sempenho de QI. O grupo TEA
apresentou desempenho inferior ao
grupo controle em todas as tarefas
utilizadas, sugerindo prejuízos en-
volvendo os componentes executi-
vos do planejamento, da inibição,
da flexibilidade cognitiva, da fluên-
cia verbal (semântica e ortográfica)
e da memória de trabalho. O estudo
concluiu que prejuízos nesses com-
ponentes executivos podem estar
relacionados às dificuldades obser-
vadas nos domínios interação soci-
al, comunicação e comportamento,
em indivíduos com TEA.
Referências
American Psychiatric Association (2012).
DSM-5 Proposed Criteria for Autism
Spectrum Disorder to Provide more Accu-
O autismo é um transtorno neuro-
desenvolvimental que compromete
o desenvolvimento global infantil,
caracterizado por prejuízos qualitati-
vos envolvendo os domínios intera-
ção social, comunicação e compor-
tamento (American Psychiatric As-
sociation, 2002; Wing, Gould, & Gill-
berg, 2011). A expressão Transtor-
no do Espectro do Autismo (TEA)
tem sido usada como referência aos
transtornos do desenvolvimento que
compartilham características do au-
tismo (Transtorno Autista, Transtor-
no de Asperger e Transtorno Global
do Desenvolvimento Sem Outra Es-
pecificação), sendo esse termo con-
soante com as propostas de mudan-
ças quanto à classificação diagnós-
tica desses transtornos (American
Psychiatric Association, 2012).
Pesquisas sobre o papel das fun-
ções executivas (FE) no TEA tive-
ram início a partir da constatação de
semelhanças entre os sintomas
cognitivos e comportamentais de
indivíduos autistas e de sujeitos
com transtornos frontais
(Pennington & Ozonoff, 1996). As
FE englobam processos cognitivos
complexos, necessários para a or-
ganização e adaptação do compor-
tamento ao ambiente em constante
mudança (Jurado & Rosselli, 2007).
Diversas pesquisas têm apontado
evidências de disfunções executivas
no TEA, tanto em crianças quanto
em adultos (Chan et al., 2009;
Geurts et al., 2004; Hill & Bird, 2006;
Towgood et al., 2009). No entanto,
há uma carência de estudos que
avaliem as FE em termos de com-
ponentes, auxiliando na compreen-
são dos aspectos executivos preju-
dicados e preservados nesse trans-
torno. Ressalta-se que esse enten-
rate Diagnosis and Treatment. Retrieved
in January, 20, 2012, from http://
www.dsm5.org/Documents/12-03%
20Autism%20Spectrum%20Disorders%
20-%20DSM5.pdf
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Avaliação Neuropsicológica das Funções Executivas em crianças e adolescentes com
diagnóstico de Transtorno do Espectro do Autismo (TEA)
Fernanda Rasch Czermainski
Bo
leti
m S
BN
p—
Ju
nh
o—
2012
Sociedade Brasileira de Neuropsicologia - www.sbnp.com.br
Fernanda Rasch Czermainski
Psicóloga, Mestre e Doutoranda em
Psicologia pela Universidade Federal
do Rio Grande do Sul (UFRGS)
Bo
leti
m S
BN
p—
Ju
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o —
2012
Sociedade Brasileira de Neuropsicologia - www.sbnp.com.br
III Reunião Anual do Instituto Brasileiro de Neuropsicologia
e Comportamento
A III Reunião Anual do Insti-
tuto Brasileiro de Neuropsico-
logia e Comportamento
(IBNeC) será realizado em
Florianópolis, na bela Ilha da
Magia, entre 20 e 22 de Se-
tembro de 2012.
A programação do evento
conta com cursos pré-reunião
envolvendo diversas áreas da
neuropsicologia e neurociên-
cias, bem como temas de pa-
lestras envolvendo desde as-
pectos moleculares à aspec-
tos comportamentais com re-
presentantes de várias uni-
versidades brasileiras e inter-
nacionais de renome .
Durante a Reunião ocorrerá a
NeuroBright - Olimpíada em
neuropsicologia e neuroci-
ência comportamental, que
tem como objetivo principal
promover o diálogo entre di-
ferentes grupos de pesquisa,
estimulando o aperfeiçoa-
mento a formação dos alunos
e premiando as equipes ven-
cedoras.
A data limite para envio de
Resumos para a Reunião é o
dia 16/07/2012. Para maio-
res informações sobre a Reu-
nião e o regulamento para
inscrição no mesmo e na
NeuroBright, acesse o site:
http://www.ibnec.org/
Vitor Geraldi Haase (MG-UFMG)
Conselho Fiscal:
Carina Chaubet D’Alcante (SP-USP)
Gabriel C. Coutinho (RJ– Instituto D`OR)
Neander Abreu (BA-UFBA)
Representações Regionais:
Alagoas: Katiúscia Karine Martins da Silva
Bahia: Tuti Cabuçu
Ceará: Silviane Pinheiro de Andrade
Centro Oeste: Leonardo Caixeta
Minas Gerais: Jonas Jardim de Paula
Paraná: Amer Cavalheiro Handan
Pernambuco: Lara Sá Leitão
Rio de Janeiro: Flávia Miele
Rio Grande do Norte: Katie Almondes
Rio Grande do Sul: Rochele Paz Fonse-ca
Presidente:
Leandro Fernandes Malloy-Diniz (MG-UFMG)
Vice-Presidente:
Lúcia Iracema Zanotto Mendonça (SP-PUC-SP;USP)
Secretário:
Thiago S. Rivero (SP-UNIFESP)
Tesoureira:
Deborah Azambuja (SP)
Secretária Geral:
Camila Santos Batista (SP)
Tesoureira Geral:
Eliane Fazion dos Santos (SP)
Conselho Deliberativo:
Daniel Fuentes (SP-USP)
Jerusa Fumagalli de Salles (RS-UFRGS)
Paulo Mattos (RJ-UFRJ)
Santa Catarina: Rachel Schlindwein-Zanini.
São Paulo: Juliana Góis
Equipe do Boletim SBNp:
Coordenadora:
Cristina Yumi N. Sediyama (MG—Coordenadora)
Alexandre Nobre (RS)
Carina Chaubet D’Alcante (SP)
Gabriel Coutinho (RH)
Giuliano Ginani (York-UK)
Jessica Fernanda (RO)
Jonas Jardim de Paula (MG)
Juliana Burges Sbicigo (RS)
Maicon Albuquerque (MG)
Marcus Vinicius Costa Alves (SP)
Ricardo Franco de Lima (SP)
Sabrina Magalhães (PR)
SOCIEDADE BRASILEIRA DE NEUROPSICOLOGIA (SBNp)
GESTÃO 2011-2013
TORNE-SE SÓCIO DA SBNp!
Para você que quer se tornar sócio da SBNp,
confira algumas das vantagens:
Desconto no Congresso Brasileiro de Neuroposicologia
Acesso ao conteúdo em áudio e vídeo do XI Congresso Bra-
sileiro de Neuropsicologia
Desconto de 20% em livros sobre neuropsicologia da editora
Artmed
E muito mais!
Para maiores informações, consulte:
www.sbnp.com.br
Sociedade Brasileira de Neuropsicologia - www.sbnp.com.br
Tel: 0xx(11) 3031-8294
Fax: 0xx(11) 3031-8294
Email: sbnp@sbnp.com.br
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