View
2
Download
0
Category
Preview:
Citation preview
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO CEARÁ MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO LIMINAR IMPETRANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO IMPETRADO: JUIZ DE DIREITO DA 1.ª VARA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO
CEARÁ, por seus Promotores de Justiça em exercício junto à Promotoria
de Justiça de Execução Penal e Corregedoria de Presídios da Comarca de
Fortaleza, com fundamento no art. 5.°, inciso LXIX, da Constituição
Federal, da Lei n.º 12.016/2009 e art. 32, inciso I da Lei n.º 8.625/93,
interpõe o presente MANDADO DE SEGURANÇA com pedido liminar
contra ato do Excelentíssimo Senhor Luiz Bessa Neto, Juiz de Direito da 1.ª
Vara de Execução Penal e Corregedoria de Presídios da Comarca de
Fortaleza, oriundo de decisão proferida nos autos do processo de execução
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
penal n.º 0049350-34.2008.8.06.0001, o que o faz com supedâneo nas
razões fático-jurídicas abaixo relacionadas:
DA LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. DA ADEQUAÇÃO E DO CABIMENTO DO MANDAMUS.
A legitimidade ad causam do Ministério Público
para a impetração de mandado de segurança, por intermédio dos Promotores
de Justiça oficiantes na Vara de Execução Penal e Corregedoria de Presídios
da Comarca de Fortaleza, exsurge da expressa previsão legal do art. 32,
inciso I, da Lei n.º 8.625/93.
Por força do citado dispositivo legal, tem o
Promotor de Justiça legitimidade para impetrar o mandamus perante os
tribunais locais, iniciando, na segunda instância, esta ação impugnativa
autônoma, cabendo, a partir de então, aos titulares do cargo de Procurador
de Justiça, acompanhá-la no desdobramento da função ministerial. Eis o
teor da mencionada regra, in verbis:
“Art. 32. Além de outras funções cometidas na
Constituição Federal e Estadual, na Lei
Orgânica e demais leis, compete aos
Promotores de Justiça, dentro de suas esferas
de atribuições:
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
“I - impetrar habeas corpus e mandado de
segurança e requerer correição parcial,
inclusive perante os Tribunais locais
competentes”.
Disposição idêntica foi repetida no art. 75, inciso
I, da Lei Complementar Estadual n.º 72, de 12 de dezembro de 2008, o qual
dispõe:
“Art. 75. Além das atribuições previstas nas
Constituições Federal, Estadual e demais Leis,
compete aos Promotores de Justiça exercer as
atribuições do Ministério Público junto aos
Órgãos jurisdicionais de primeira instância,
competindo-lhes ainda:
“I – impetrar habeas corpus, mandado de
segurança e de injunção e requerer correição
parcial, inclusive perante os Tribunais
estaduais”.
O extinto Tribunal de Alçada Criminal do Estado
de São Paulo pontificou:
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
“Pacífica a legimatio ad causam e a plena
capacidade postulatória do Promotor de Justiça
para impetrar mandado de segurança
diretamente na instância superior, quanto mais
havendo violação de direito líquido e certo
carente de amparo legal, e a presença do fumus
boni juris e periculum in mora” (TACRIM/SP,
Rel. Ribeiro Machado, in RT 648/296).
No mesmo diapasão, tem-se julgado oriundo do
Superior Tribunal de Justiça, guardião da inteireza dos termos contidos na
legislação federal:
“MANDADO DE SEGURANÇA.
IMPETRAÇÃO POR PROMOTOR DE
JUSTIÇA JUNTO A TRIBUNAL LOCAL. I. O
art. 32, inc. I, da Lei n° 8.625, de 12.02.1993
(Lei Orgânica Nacional do Ministério Público)
admite às expressas que o Promotor de Justiça
impetre mandado de segurança perante os
Tribunais locais. (STJ, RMS 5.370-9/SP, 4.ª
Turma, Rel. Min. Barros Monteiro, in DJU
29.05.1995).
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
Ao mais, vislumbra-se plenamente adequado o
remédio heróico para a obtenção da tutela jurisdicional pretendida.
Com efeito, é pacífico o entendimento segundo o
qual é cabível mandado de segurança contra ato judicial de qualquer
natureza, quando violador de direito líquido e certo, e não exista
possibilidade de coibição eficaz pelos recursos comuns. Mesmo que
previsto o recurso, mas sendo este destituído de efeito suspensivo, autoriza-
se o uso concomitante do mandamus para obstar a ilegalidade, conferindo-
lhe aludido efeito.
De fato, não há outro meio adequado para
impugnar, eficazmente, a decisão ilegal, porquanto o agravo em execução,
nos termos do artigo 197 da Lei da Execução Penal, é destituído de efeito
suspensivo.
Especificamente sobre a legitimidade do
Ministério Público para propor mandado de segurança visando à concessão
de efeito suspensivo no agravo em execução, há que se considerar que,
dentre as funções ministeriais, encontram-se aquelas que visam tutelar a
coletividade, devendo ser-lhe reconhecidas não só a legitimidade como a
própria capacidade postulatória em feitos desta natureza.
Deitando luzes sobre a questão, os Tribunais de
Justiças vaticinaram em acórdãos vazados nos seguintes termos:
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
“MANDADO DE SEGURANÇA. EFEITO
SUSPENSIVO A RECURSO QUE NÃO O
TEM. AGRAVO DO ART. 197 DA LEP.
PRESENÇA DOS REQUISITOS
AUTORIZATIVOS. CONSEQUENTE
CONCESSÃO DAQUELE EFEITO A
TÍTULO EXCEPCIONAL. Nada impede a
concessão de segurança para,
excepcionalmente, atribuir-se efeito suspensivo
ao agravo a que se refere o art. 197 da Lei nº
7.210/84 (Lei de Execução Penal), desde que
postos à mostra os requisitos do fumus boni
iuris e do periculum in mora, o que não atrita
com a Súmula 267 do Sumo Pretório” (TJMG,
4.ª Câmara Cível, Rel. Des. Hiparco Immesi, p.
em 04/04/2002).
“MANDADO DE SEGURANÇA.Impetração
por Promotor de Justiça buscando a concessão
de efeito suspensivo a recurso de agravo em
execução interposto contra decisão que,
aplicando a Lei n.° 9.714/98, que deu nova
redação ao art. 44 do Código Penal, substitui a
pena privativa de liberdade imposta
definitivamente a condenado por tráfico de
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
entorpecente por pena restritiva de direitos.
Decisão teratológica. Ordem concedida” (TJSP,
4ª Câm. Crim, MS n.° 276.920-3, Rel. Des.
Passos de Freitas, j. em 20.04.1999).
“MANDADO DE SEGURANÇA. Legitimidade
ativa do Ministério Público para impetração.
Cabimento contra ato judicial passível de
recurso para a este emprestar efeito suspensivo
quando não o tiver e a execução do decisum
venha acarretar danos de difícil reparação.
Segurança concedida” (TJDFT, Câmara
Criminal, MS n.º 673196/DF (88368), Rel. Des.
Otávio Augusto. j. 21.08.1996, in DJU
29.10.1996, p. 19.357).
“MANDADO DE SEGURANÇA.
IMPETRAÇÃO PELO MINISTÉRIO
PÚBLICO, QUE TEM LEGITIMIDADE
ATIVA, VISANDO À OBTENÇÃO DE
EFEITO SUSPENSIVO EM RECURSO EM
SENTIDO ESTRITO CONTRA DECISÃO
CONCESSIVA DE PRISÃO CAUTELAR
DOMICILIAR. OCORRÊNCIA. O Ministério
Público tem legitimidade ativa para impetrar
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
mandado de segurança visando à obtenção de
efeito suspensivo em recurso em sentido estrito
contra decisão concessiva de prisão cautelar
domiciliar. (TACRIMSP, 8.ª Câmara,
Mandado de Segurança nº 350.288/1, Rel.
Ericson Maranho. j. 16.12.1999).
Por sua vez, o Superior Tribunal de Justiça tem
confirmado o entendimento ora demonstrado, conforme se depreende do
aresto abaixo trasladado:
“PENAL. PROCESSUAL PENAL.
MANDADO DE SEGURANÇA IMPETRADO
PARA DAR EFEITO SUSPENSIVO A
AGRAVO. ATO DE RELATOR. LIMINAR.
HABEAS CORPUS. I. O pedido de habeas
corpus é contra a liminar deferida pelo Relator,
não se podendo ingressar no mérito do
mandado de segurança, sob apreciação pelo
Tribunal estadual. II. Presentes o fumus boni
iuris e o periculum in mora, é de se deferir
liminar em mandado de segurança, visando dar
efeito suspensivo a recurso de agravo. III.
Constrangimento ilegal não configurado. IV.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
Habeas corpus conhecido, pedido deferido”
(RSTJ, 107/331).
Com efeito, não poderia ser outro o entendimento
a ser abraçado, haja vista que é plena a capacidade postulatória do
Ministério Público no processo penal, notadamente nas hipóteses em que
age como dominus litis.
Ora, se a Promotoria de Justiça pode requerer
diligências, se pode manifestar recurso contra decisão que não agasalha a
pretensão que deduziu, pode, à evidência impetrar ação de segurança contra
decisório judicial nas hipóteses em que o writ se apresente como substituto
de recurso.
O tratadista JULIO FABBRINI MIRABETE, em
sua festejada obra sobre a execução penal, ensina, litteratim:
“Não concedeu a lei ao agravo em execução o
efeito suspensivo sob o fundamento teórico de
que, como regra geral, não haverá dano
enquanto se aguarda a decisão do recurso
atacável interposto pela parte. Entretanto,
apesar da orientação em geral de que, sendo o
despacho atacável por meio de recurso próprio,
incabível é o mandado de segurança, tem-se
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
admitido que, presentes o fumus boni iuris e o
periculum in mora, deve-se admitir o mandamus
impetrado pelo agravante para dar efeito
suspensivo ao agravo em execução” (autor cit.,
in Execução Penal. 11ª Ed.,Editora Atlas, São
Paulo, 2004, p. 820).
DOS FATOS
O sentenciado ELISMAR MENDES
GONÇALVES, qualificado na inclusa guia de recolhimento que instrui o
presente mandamus, foi condenado à pena de 08 (oito) anos e 02 (dois)
meses de reclusão, pelo cometimento do hediondo crime de tráfico ilícito de
entorpecentes, catalogado no art. 33 c/c art. 40, inciso I, da Lei n.°
11.343/2006.
O delito foi perpetrado no dia 02 (dois) de
fevereiro do ano de 2007, vale dizer, já sob a vigência da Lei n.° 8.072/90,
sujeitando o sentenciado aos rigores do citado diploma legal.
Durante o cumprimento de sua pena, fixada
inicialmente no regime fechado, pleiteou, através de seu procurador, a
progressão do regime prisional, obtendo o benefício de progressão para o
regime semiaberto em data de 20 (vinte) de julho próximo passado.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
Posteriormente, ingressou com pedido de
homologação de trabalho externo, o que após a averiguação de praxe e
constatação da veracidade da proposta de emprego e capacidade
empregatícia da empresa, mereceu parecer favorável do Ministério Público,
sendo que o sentenciado ELISMAR MENDES GONÇALVES deveria
permanecer com a obrigação de recolhimento ao cárcere nos dias feriados
e finais de semana.
Não obstante a regra legal, o mm. Juiz da 1ª. Vara
de Execução Penal desta Comarca de Fortaleza, ora autoridade apontada
como coatora, deferiu o trabalho externo pleiteado, ao mesmo tempo em
que concedeu ao Sr. ELISMAR MENDES GONÇALVES a prisão
domiciliar, a qual sequer foi objeto de pedido formulado pela defesa do
sobredito apenado, tendo isentado este completamente de cumprir sua pena
com o recolhimento nos períodos de folga como determina a legislação
pertinente (cópia anexa).
Sabe-se da existência nesta comarca de Fortaleza
de unidade prisional para recolhimento dos sentenciados em regime
semiaberto, a saber: o IPPOO I, o qual, inclusive, abrigava o sentenciado
ELISMAR MENDES GONÇALVES até a concessão de trabalho externo e
prisão domiciliar conferida ao mesmo pela autoridade impetrada.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
Inconformado, interpôs o Ministério Público, a
tempo e modo, o competente agravo em execução, nos moldes do art. 197,
da Lei 7.210/84 (cópia anexa), que, contudo, não goza de efeito suspensivo,
motivo pelo qual, em defesa da sociedade, impetra-se a presente ordem, a
fim de se atribuir o necessário efeito suspensivo à referida via recursal, até o
julgamento do apelo, evitando-se que o Sr. Elismar Mendes Gonçalves
esteja cumprindo (sic) sua pena, sem que haja qualquer obediência aos
mandamentos legais contidos na Lei de Execução Penal.
DO DIREITO
Visa-se pela execução fazer cumprir o comando
emergente da sentença penal condenatória, e na execução penal, assim
como na aplicação da lei penal, o magistrado está jungido pelo principio da
legalidade.
A matéria referente à prisão domiciliar encontra-se
regulada no art. 117 da Lei nº 7.210/84, e sua concessão restringem-se às
hipóteses ali previstas. Dispõe o referido artigo:
“Art. 117. Somente se admitirá o recolhimento
do beneficiário de regime aberto em residência
particular quando se tratar de:
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
“I – condenado maior de 70 (setenta) anos;
“II – condenado acometido de doença grave;
“III – condenada com filho menor ou deficiente
físico ou mental;
“IV – condenada gestante”
Como se viu, o rol de hipóteses é taxativo,
numerus clausus.
Dessa forma, entende o Ministério Público, por ser
o rol de hipóteses do art. 117 taxativo – numerus clausus - não ser cabível a
concessão, da forma como estipulada na decisão interlocutória que
concedeu ao sentenciado Elismar Mendes Gonçalves o beneplácito da
prisão domiciliar em razão da superlotação da colônia agrícola ou industrial
ou de casa de albergado, ou mesmo, pela precariedade dos estabelecimentos
prisionais existentes e a esse fim destinadas.
Cediço que a crise instalada na execução penal não
se restringe à situação dos sentenciados, refletindo, também, na segurança
pública.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
A parcela ordeira da população, que financia com
o pagamento de impostos, taxas etc, a estruturação de um sistema que
idealiza, busca e não atinge, é também atingida, vítima do medo, do crime e
também da inércia/ineficiência dos poderes instituídos, ineficazes ante a
incontida ascensão do império em que reina absoluta a ilicitude penal.
Nesse ponto, oportuno citar dois elementos
pinçados de um rol de fatores que Rui Stocco denominou ‘causas
supralegais de impunidade’: o ‘sistema prisional inadequado em todo o
país’ e a ‘carência de penitenciárias, casas de detenção e institutos penais’.
Nesse azo, dúvida não resta de que a impunidade
conturba o estrato social ao transitar em todas as suas camadas, permeando,
trespassando e rompendo sua formação moral e enfraquecendo sua
estrutura.
Se a permanência em residência particular do
condenado à pena no regime aberto, sem qualquer controle ou fiscalização
por parte da Administração, já significaria a total impunidade pelo crime
praticado, acarretando graves prejuízos à defesa social, mais ainda no caso
sob exame, em que a autoridade impetrada concedeu o benefício da prisão
domiciliar ao sentenciado Elismar Mendes Gonçalves, sem justificar em
que consiste a excepcionalidade da medida, olvidando-se de que descabe
prisão domiciliar em cumprimento de pena no regime semiaberto.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
Nesse sentido, tem-se o escólio lapidar do saudoso
JULIO FABBRINI MIRABETE:
“A prisão domiciliar foi introduzida no Brasil
pela Lei n.° 5.256, de 6-4-1967, para recolher o
preso provisório à própria residência nas
localidades onde não houver estabelecimento
adequado ao recolhimento dos que têm direito
à prisão especial. Com introdução do regime
aberto na legislação penal, efetuada pela Lei n°
6.416, de 24-5-77, e diante da inexistência de
locais adequados para o cumprimento da prisão
albergue, os aplicadores da lei penal
depararam-se com penosas alternativas:
admitir o alojamento noturno em celas
superlotadas das cadeias públicas; não
conceder o regime, embora o sentenciado
estivesse em condições de adequar-se a ele; ou
conceder a prisão domiciliar, com o
recolhimento em sua própria residência. Não
havendo o Poder Público diligenciado para a
construção de estabelecimentos destinados ao
regime aberto em todas as comarcas, juízos e
tribunais passaram a conceder a chamada
‘prisão albergue domiciliar’, transformada em
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
verdadeiro simulacro da execução da pena pela
inexistência de qualquer controle ou
fiscalização na obediência das condições
impostas. A prisão albergue domiciliar passou,
assim a ser forma velada de impunidade, de
que os juízes lançavam mão em último recurso,
na impossibilidade de o benefício ser desfrutado
em local adequado.
“Com a finalidade de evitar a concessão
indiscriminada de prisão domiciliar, fato que
contribuiu para o descrédito do regime aberto,
com graves prejuízos à defesa social, a Lei de
Execução Penal destinou-a exclusivamente aos
condenados que estejam nas condições especiais
previstas expressamente, distinguindo as duas
espécies de prisão em regime aberto: a prisão
albergue e a prisão domiciliar. Dispõe o art. 117
dispõe que "somente” se admitirá o
recolhimento domiciliar em residência
particular quando se tratar de condenado que
esteja em uma das situações estabelecidas no
referido dispositivo, e esclarece a exposição de
motivos da lei que o regime aberto, salvo essas
exceções, "não admite a execução da pena em
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
residência particular” (autor cit., in Execução
Penal. 9.ª Edição, Editora Atlas, São Paulo, p.
381).
O Supremo Tribunal Federal assim já se
pronunciou sobre o tema em tablado:
“HABEAS CORPUS. PRISÃO ALBERGUE
DOMICILIAR. INEXISTÊNCIA, NA
COMARCA, DE CASA DE ALBERGADO. (...)
O Plenário do Supremo Tribunal decidiu que o
benefício da prisão-albergue só poderá ser
deferido ao sentenciado ‘se houver’, na
localidade da execução da pena, Casa de
Albergado ou outro estabelecimento que se
ajuste às exigências legais do regime penal
aberto. A impossibilidade material de o Estado
instituir Casa do Albergado não autoriza o
Poder Judiciário a conceder a prisão-albergue
domiciliar fora das hipóteses contempladas,
‘em caráter estrito' no art. 117 da Lei de
Execução Penal. (...) A norma legal
consubstanciada no art. 117 da Lei de Execução
Penal instituiu situações subjetivas de
vantagem, que apenas beneficiam aqueles
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
sentenciados cujas condições pessoais estejam
nela previstas. Constituindo regra de direito
singular, torna-se ela inextensível e inampliável
a situações outras que lhe sejam estranhas. As
normas legais positivadoras do regime penal
aberto revestem-se de conteúdo programático e
só incidirão plenamente, inclusive para efeito
de deferimento do benefício da prisão-albergue,
a partir do momento em que se torne
materialmente possível, com a existência de
Casa de Albergado ou de estabelecimento
similar, a execução da pena nesse regime”
(STF, in RT 731/500).
Com efeito, se é verdade que, por conta de
deficiência estrutural do sistema carcerário, aos sentenciados não se pode
obrigar o cumprimento de pena em regime mais gravoso do que aquele a
que estejam condenados, também é verdade que é defeso ao magistrado
estender o alcance da prisão domiciliar a hipóteses não previstas na lei,
mais ainda no caso em apreço em que o sentenciado condenado por crime
de tráfico ilícito de entorpecentes, equiparado a crime hediondo, cumpre
pena no regime semiaberto.
Certamente, decisões de tal natureza contribuem
para a sensação de impunidade no meio social, haja vista a indevida
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
substituição da pena privativa de liberdade em prisão domiciliar, sem
observância das disposições legais alusivas à matéria.
Ademais, registre-se que não há qualquer
fiscalização eficiente que garanta o cumprimento da pena dos sentenciados
que hoje cumprem reprimenda no regime semiaberto e que foram
contemplados com a prisão domiciliar nos moldes em que concedeu a
autoridade coatora.
Ora, a inexistência do estabelecimento adequado
não impede que o condenado cumpra sua pena no estabelecimento
existente, no regime a que faz jus, nos moldes previstos pela legislação
pertinente.
Em síntese, a questão nuclear do vertente
mandamus cinge-se à discussão quanto à possibilidade de deferimento da
prisão domiciliar sob o argumento de superlotação dos presídios e
consequente escassez de condições dignas propiciadas pelo Estado, ou seja,
fora dos casos elencados no art. 117 da LEP, que estabelece seu cabimento
nas hipóteses de condenado maior de setenta anos, acometido de doença
grave, condenada com filho menor ou deficiente ou, ainda, em se tratando
de gestante.
Trazendo à colação precedente do Órgão
Colegiado do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, infere-se
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
que a alternativa adotada pelo mm. Juiz impetrado não encontra respaldo
jurídico:
“EXECUÇÃO. PRISÃO DOMICILIAR.
LOTAÇÃO DE PRESÍDIO. HIPÓTESE NÃO
CONTEMPLADA. CASSAÇÃO. O agravado
não se enquadra em qualquer dos itens do
artigo 117 da mesma legislação: ele não é maior
de setenta anos, não está gravemente doente e
não é mulher nas condições dos itens III e IV. A
concessão da prisão domiciliar teve como base a
superlotação do presídio da comarca. O
Supremo Tribunal Federal, a quem cabe zelar
pelo cumprimento da Constituição, já decidiu,
em sessão plenária, que o benefício da prisão-
albergue só poderá ser deferido ao sentenciado,
se houver, na localidade de execução da pena,
casa do albergado, ou outro estabelecimento
que se ajuste às exigências legais do regime
penal aberto. A impossibilidade material de o
Estado instituir casa do albergado não autoriza
o Poder Judiciário a conceder a prisão-albergue
domiciliar, fora das hipóteses contempladas, em
caráter estrito, no art. 117 da LEP.
Excepcionalmente, aceitam-se a concessão do
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
benefício na forma deferida. Não é caso. Aqui,
chama-se a atenção que a punição do apenado
está longe de terminar (27 de agosto de 2013), é
decorrente da prática de vários crimes
acontecidos entre os anos de 2005 a 2007. Além
disso, em 31 de março de 2009 fugiu e
permaneceu vários meses foragido, sendo
recapturado em julho. DECISÃO: Agravo
ministerial provido. Unânime” (TJRS, 7.ª
Câmara Criminal, Agravo n.º 70036054500,
Rel. Des.: Sylvio Baptista Neto, j. em
20/05/2010).
Efetivamente, descabe conferir elasticidade ao rol
previsto no art. 117 da Lei de Execução Penal, não havendo como estender
indiscriminadamente as hipóteses de cabimento da prisão domiciliar a todos
os casos em que o sentenciado cumpre reprimenda em regime semiaberto.
Por óbvio que tal questão diz respeito diretamente
às políticas de investimento da Administração Pública para que sejam
atingidos os objetivos da pena, sendo de conhecimento geral que os
estabelecimentos são desprovidos de condições adequadas, o que,
contudo, por si só, não gera direito ao cumprimento da reprimenda no
domicílio do condenado, inviabilizando por inteiro o Direito Penal
enquanto instrumento de controle social.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
Embora a doutrina e a jurisprudência reconheçam
a possibilidade de se estender de forma criteriosa o benefício da prisão
domiciliar a hipóteses não previstas pelo dispositivo, no caso dos autos o
Juiz da 1.ª Vara de Execução Penal da Comarca de Fortaleza deixou de
justificar em que consistia a excepcionalidade, considerando
exclusivamente a pessoa do sentenciado, da concessão do benefício da
prisão domiciliar ao Sr. Elismar Mendes Gonçalves, nem mesmo atentando
para o fato do mesmo cumprir a pena no regime semiaberto, o qual é
incompatível com a benesse da prisão domiciliar, nem mesmo para a
natureza do crime praticado, tráfico ilícito de entorpecentes.
Dessa forma, a se dar guarida ao decisum
concessivo de prisão domiciliar ao sentenciado ELISMAR MENDES
GONÇALVES, estar-se-á permitindo que o mesmo, efetivamente, deixe de
cumprir a reprimenda penal que lhe foi aplicada depois de todo o desenrolar
do devido processo legal, contribuindo, sobremaneira, para a sensação de
impunidade e insegurança no seio da sociedade.
Nessa esteira de raciocínio, veja-se decisão do
Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:
“AGRAVO EM EXECUÇÃO. PRISÃO
DOMICILIAR. SUPERLOTAÇÃO DOS
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
PRESÍDIOS. INDEFERIMENTO. A prisão
domiciliar tem cabimento nas hipóteses do art.
117 da LEP. Embora a doutrina e a
jurisprudência reconheçam a possibilidade de
se estender de forma criteriosa o benefício a
hipóteses não previstas pelo dispositivo, o caso
dos autos não se reveste de excepcionalidade
que justifique a sua concessão. A alegação de
precárias condições das casas prisionais não
determinam, por si só, a possibilidade de prisão
domiciliar Questão relacionada às políticas da
Administração Pública” (TJRS, 7.ª Câm.
Crim., 70041423062/RS, Rel. Des. Naele Ochoa
Piazzeta, data de julgamento: 28/04/2011, data
de publicação: DJ 04/07/2011).
Assim, não obstante a polêmica que o tema
encerra, não se pode concordar com a concessão da prisão domiciliar fora
dos casos legais, pois trata-se de verdadeiro simulacro de cumprimento
da pena, sem qualquer fiscalização estatal, o que contribui,
decisivamente, para o descrédito de todo o sistema jurídico-penal e dificulta
a reinserção do condenado ao convívio social.
Por outro lado, a ausência momentânea de vagas
para o cumprimento de pena no regime semiaberto ou aberto não autoriza a
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
concessão da prisão domiciliar fora das hipóteses expressamente previstas
em lei.
Os julgados abaixo colacionados corroboram a
pretensão deduzida pelo Ministério Público. Seja demonstrado, pois:
“A concessão de prisão domiciliar restringe-se
às hipóteses previstas no art. 117, da Lei de
Execução Penal, não sendo suficiente, para
tanto, a ausência de estabelecimento adequado
para o cumprimento da pena em regime
aberto." Ementa parcial (TJMG, 2.ª Câm.
Crim., RAG 000.271.473-1/00, Rel. Des. José
Antonino Baía Borges, j. 10.04.2003).
“Destinar-se o condenado por roubo
qualificado (com emprego de armas), em
regime prisional semiaberto, a cumprir pena
em sua própria residência, sem qualquer
controle ou fiscalização, sob a alegação de
inexistência de Casa do Albergado ou Colônia
Agrícola Industrial na Comarca, significa
simplesmente instituir a total impunidade. Só se
admite a prisão domiciliar nas estritas hipóteses
do art. 117 e incisos da Lei 7.210/84. Recurso
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
conhecido e improvido” (TJMG, 1.ª Câm.
Crim., RAG 000.329.090-5/00, Rela. Desa
Márcia Milanez, j. 29.04.2003).
“EXECUÇÃO PENAL. AGRAVO. REGIME
PENITENCIÁRIO. CONDENAÇÕES A
SEREM CUMPRIDAS EM REGIME SEMI-
ABERTO E ABERTO. PRISÃO
DOMICILIAR. INADMISSIBILIDADE.
INOCORRÊNCIA DE QUALQUER DAS
HIPÓTESES PREVISTAS NO ART. 117 DA
LEP. A Lei de Execução Penal destinou a
prisão domiciliar exclusivamente aos
condenados que estejam nas condições especiais
previstas expressamente no seu art. 117.
Inteligência da Súmula 28 da jurisprudência
predominante nesta 1.ª Câmara Criminal.
Recurso a que se nega provimento’ (TJMG, 1.ª
Câm. Crim., RAG 000.305.736-1/00, Rel. Des.
Tibagy Salles, j. 27.05.2003).
“EXECUÇÃO PENAL. PENA DE
RECLUSÃO. PRISÃO DOMICILIAR.
PRESSUPOSTOS. INEXISTÊNCIA. LEP,
ART. 117. BENEFÍCIO DO TRABALHO
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
EXTERNO. CONCESSÃO DE OFÍCIO.
Somente é admissível o cumprimento de pena
em residência particular se o condenado
beneficiário do regime aberto, enquadra-se em
uma das situações previstas no art. 117, da Lei
de Execução Penal” (STJ, 6.ª Turma, HC nº
17035-SP, Relator Min. Vicente Leal, in DJ
11/03/2002, p. 281).
“HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL.
REGIME ABERTO. AUSÊNCIA DE CASA
DE ALBERGADO NO LOCAL DE
CUMPRIMENTO DA PENA. PRISÃO
DOMICILIAR. IMPOSSIBILIDADE. I. A Lei
de Execução Penal traz em caráter estrito em
seu art. 117, as hipóteses em que se permitirá a
um condenado a regime aberto cumprir sua
sanção em domicílio particular. II. A
impossibilidade material do Estado instituir
casa de albergado não autoriza de forma
alguma o poder judiciário a conceder a prisão-
albergue domiciliar fora das hipóteses
enumeradas no artigo supracitado. III. Ordem
conhecida e denegada à unanimidade de votos
(TJMA, 2.ª Câm. Crim., HC 019457/2003 -
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
(47.160/2003), Rela. Desa. Nelma Celeste Sousa
Silva Sarney Costa, j. 13.11.2003).
Em verdade, o Ministério Público concorda com
aqueles que defendem que uma boa saída para o caso em tela, para se evitar
o ‘estado de impunidade’ consagrado pela restituição prematura da
liberdade como no caso em análise, mas, ao mesmo tempo, não se desviar
da finalidade da pretensão executória, seria a de se ajustar as condições do
regime semiaberto para cumprimento da reprimenda por parte do paciente
em algum estabelecimento penal, permitindo-se, se for o caso, o trabalho
externo, bem como a freqüência de cursos.
Digno de nota que, recentemente, a autoridade
impetrada editou as Portarias n.° 004/2011 e 006/2011, mediante as quais
concedia prisão domiciliar a todos os condenados primários em
cumprimento de pena no regime semiaberto, o que mereceu pronta
intervenção do Ministério Público que através do writ n° 0005717-
68.2011.8.06.000 questionou a ilegalidade das referidas Portarias, em razão
do teor das mesmas ferir de morte o disposto no art. 117, da Lei de
Execução Penal e legislação penal aplicável à espécie.
Cumprindo-nos informar que a Desa.
FRANCISCA ADELINEIDE VIANA, relatora do mandamus junto ao
Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, concedeu a liminar pleiteada,
suspendendo os efeitos das Portarias n°s 004/2011 e 006/2011, inclusive,
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
emprestando-lhe efeito ex tunc, de modo a suspender a prisão domiciliar a
presos no regime semiaberto e que tenham por fundamento as referidas
Portarias (cópia anexa).
DO DIREITO LÍQUIDO E CERTO
O artigo 67 da Lei 7.210/84 estabelece que o
Ministério Público fiscalizará a execução da pena, oficiando no processo
executivo.
Dessume-se daí que o Ministério Público, na
qualidade de custos legis, possui o direito líquido e certo de exigir que a
execução penal obedeça aos ditames da Lei.
Na hipótese vertente, o juiz da execução,
arvorando-se na qualidade de legislador positivo, invadiu a esfera de outro
poder, ao conceder a prisão domiciliar no regime semiaberto, quando a
hipótese somente é de ser deferida no caso de cumprimento de pena no
regime aberto e nos casos excepcionais previstos no art. 117, da Lei de
Execução Penal.
Decidindo desta forma, a autoridade coatora feriu
direito líquido e certo do Ministério Público no tocante à correta execução
da pena.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
Entendimento diverso implicaria em interpretação
verdadeiramente contra legem, como, lamentavelmente, ocorreu na hipótese
impugnada pela via recursal adequada.
DA LIMINAR
Presentes se encontram os requisitos do art. 7º,
inciso III, da Lei 12.016/2009, necessários ao deferimento da medida
liminar ora pleiteada.
Deveras, a manutenção da decisão guerreada até o
julgamento do agravo em execução já interposto acarretará graves prejuízos
à execução penal, haja vista que o preso continuará a cumprir a pena,
ilegalmente, em prisão domiciliar, fora do rol taxativo do art. 117 da Lei de
Execução Penal.
Aguardar o julgamento do recurso próprio – ao
qual a lei não confere efeito suspensivo - importará na manutenção de uma
intolerável ilegalidade, razão por que, para salvaguardar o aludido direito
líquido e certo do Ministério Público, enquanto órgão incumbido pela
fiscalização da execução penal, violada pela decisão ilegal, revela-se
imprescindível a concessão da segurança, inclusive liminarmente,
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
conferindo-se efeito suspensivo ao recurso aviado no curso da execução
penal.
Ademais, mister ponderar que o provimento
ulterior do agravo poderá prejudicar a própria recuperação do sentenciado, o
qual, após permanecer em prisão domiciliar, poderá ser novamente
regredido para o regime fechado, além de contribuir para o já insustentável
sentimento de impunidade reinante no País.
E o periculum in mora é indubitável, no momento
em que, com a concessão de prisão domiciliar para o condenado em
questão, que praticou crime de tráfico de droga, equiparado a hediondo,
estará a sociedade, como um todo, sujeita aos seus efeitos, qual seja, o
convívio regular com este, podendo sofrer as eventuais conseqüências dele.
Presente, pois, o primeiro requisito exigido para a
concessão da liminar, qual seja, o periculum in mora.
Por seu turno, o fumus boni juris consubstancia-se
no próprio dispositivo legal, que, expressamente, prevê a prisão domiciliar
somente nas hipóteses previstas no art. 117 da Lei de Execução Penal, o
que, frise-se, não é o caso dos autos, visto que o Sr. Elismar Mendes
Gonçalves cumpre pena atualmente no regime semiaberto, por conseguinte,
não se enquadra em nenhum das hipóteses previstas no art. 117, já referido,
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
o qual contém rol taxativo para concessão de prisão domiciliar a
condenados que cumprem pena no regime aberto.
DO PEDIDO
Em razão de todo o exposto, o Ministério Público
requer:
i) a concessão de medida liminar, conferindo-se ao
agravo em execução, já interposto junto à 1.ª Vara de Execução Penal e
Corregedoria de Presídios, o necessário efeito suspensivo, para o fim de
sustar, desde já, os efeitos da r. decisão proferida pela autoridade coatora,
que concedeu ao sentenciado Elismar Mendes Gonçalves a prisão
domiciliar, não obstante o mesmo cumprir pena em regime semiaberto,
determinando os recolhimentos nos dias de folga e feriados;
ii) seja, posteriormente, notificada a autoridade
coatora para prestar as informações que entenda necessárias, nos termos do
art. 7º, inciso I, da Lei 12.016/2009;
iii) seja o presente mandado de segurança
processado na forma da lei e, ao final, concedida a segurança, conferindo-se
efeito suspensivo ao agravo em execução já interposto, para fins de que a
decisão do juiz a quo, que concedeu a prisão domiciliar ao preso Elismar
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
Mendes Gonçalves, nos autos da ação de execução penal n° 0049350-
34.2008.8.06.0001, seja suspensa até o julgamento do mencionado recurso.
Embora inestimável, dá-se à causa o valor de R$
200,00 (duzentos reais), exclusivamente para efeitos fiscais.
Nestes Termos,
Pede Deferimento.
Fortaleza-CE, 02 de setembro de 2011.
HUGO VASCONCELOS XEREZ JOSÉ EVILÁZIO ALEXANDRE DA SILVA Promotor de Justiça Promotor de Justiça SANDRA VIANA PINHEIRO Promotora de Justiça
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
PEÇAS QUE INSTRUEM O MANDADO DE SEGURANÇA, TODAS EM CÓPIA: 1. Guia de Recolhimento; 2. Denúncia; 3. Sentença condenatória de primeiro grau; 4. Parecer ministerial e decisão do Juízo da 1ª. Vara de Execução Penal desta Comarca de Fortaleza; 5. Pedido de autorização de trabalho externo; 6. Parecer do Ministério Público; 7. Decisão concessiva da prisão domiciliar; 8. Intimação do Ministério Público; 9. Agravo em execução já interposto.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO CEARÁ MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO LIMINAR IMPETRANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO IMPETRADO: JUIZ DE DIREITO DA 1.ª VARA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO
CEARÁ, por seus Promotores de Justiça em exercício junto à Promotoria de
Justiça de Execução Penal e Corregedoria de Presídios da Comarca de
Fortaleza, com fundamento no art. 5.°, inciso LXIX, da Constituição
Federal, interpõe o presente MANDADO DE SEGURANÇA com pedido
liminar visando cassar os efeitos das Portarias n.° 004/2011 e 006/2011,
datadas respectivamente de 22/06/2011 e 28/07/2011, ambas expedidas pelo
senhor Juiz de Direito da Vara de Execução Penal e Corregedoria de
Presídios, Luiz Bessa Neto, um dos juízes responsáveis pela execução penal
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
nesta Comarca de Fortaleza em razão de as ditas portarias serem nulas,
abusivas e ilegais, pelas seguintes razões abaixo relacionadas:
DOS FATOS E DO DIREITO
O Excelentíssimo Magistrado Luiz Bessa Neto, titular
da 1.ª Vara de Execução Penal e Corregedoria de Presídios deliberou, por
intermédio da Portaria n° 004/2011 (cuja cópia segue anexa), em extinguir o
regime semiaberto nesta Comarca de Fortaleza, determinando que a partir 21
de junho de 2011, todos os sentenciados primários, indiscriminadamente,
que estivessem cumprindo pena no regime semiaberto, passassem a cumprir
suas reprimendas em prisão domiciliar.
Posteriormente, o mesmo juiz editou a Portaria n.°
006/2011, datada de 28 (vinte e oito) de julho deste ano de 2011, em que
esclarece que somente teriam direito a gozar o “benefício emergencial”, os
sentenciados primários e desde que os crimes por eles praticados não fossem
hediondos ou a eles equiparados.
Entretanto, e não obstante o conhecimento e a
preocupação do autor das Portarias atacadas por meio do presente writ, em
relação aos problemas enfrentados pelo sistema prisional da Comarca de
Fortaleza, tal questão não pode ser deliberada de modo genérico e abstrato
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
pelo Poder Judiciário, cuja função não se confunde com a do Poder
Legislativo, encarregado de editar normas genéricas para toda a população.
Visa-se pela execução fazer cumprir o comando
emergente da sentença penal condenatória, e na execução penal, assim como
na aplicação da lei penal, o magistrado está jungido pelo principio da
legalidade.
A matéria referente à prisão domiciliar encontra-se
regulada no art. 117 da Lei nº 7.210/84, e sua concessão restringe-se às
hipóteses ali previstas. Dispõe o referido artigo:
“Somente se admitirá o recolhimento do beneficiário
de regime aberto em residência particular quando se
tratar de:
I - condenado maior de 70 (setenta) anos;
II - condenado acometido de doença grave;
III - condenada com filho menor ou deficiente físico ou
mental;
IV - condenada gestante”.
Como se viu, o rol de hipóteses é taxativo, numerus
clausus.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
Dessa forma, entende o Ministério Público que não é
cabível a concessão, da forma como estipulado por meio das Portarias
atacadas, de prisão domiciliar em razão da inexistência de colônia agrícola
ou industrial ou de casa de albergado, ou mesmo, pela precariedade dos
estabelecimentos prisionais existentes e a esse fim destinadas.
Cediço que a crise instalada na execução penal não se
restringe à situação dos sentenciados, refletindo, também, na segurança
pública.
A parcela ordeira da população, que financia com o
pagamento de impostos, taxas etc, a estruturação de um sistema que idealiza,
busca e não atinge, é também atingida, vítima do medo, do crime e também
da inércia/ineficiência dos poderes instituídos, ineficazes ante a incontida
ascensão do império em que reina absoluta a ilicitude penal.
Nesse ponto, oportuno citar dois elementos pinçados
de um rol de fatores que Rui Stocco denominou ‘causas supralegais de
impunidade’: o ‘sistema prisional inadequado em todo o país’ e a ‘carência
de penitenciárias, casas de detenção e institutos penais’.
Nesse azo, dúvida não resta de que a impunidade
conturba o estrato social ao transitar em todas as suas camadas, permeando,
trespassando e rompendo sua formação moral e enfraquecendo sua estrutura.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
Se a permanência em residência particular do
condenado à pena no regime aberto, sem qualquer controle ou fiscalização
por parte da Administração, já significaria a total impunidade pelo crime
praticado, acarretando graves prejuízos à defesa social, mais ainda no caso
sob exame, em que as Portarias editadas pelo Douto Juízo da Vara de
Execução Penal e Corregedoria de Presídios da Comarca de Fortaleza,
estendem o benefício da prisão domiciliar, indistintamente, a todos os
condenados primários em cumprimento de pena no regime semiaberto, sem
atentar para a análise do caso individual, notadamente, a natureza do crime
levado a efeito pelos beneficiários do “benefício emergencial”.
Nesse azo, Julio Fabbrini Mirabete (in Execução
Penal, 9ª edição, Editora Atlas, p. 381):
“A prisão domiciliar foi introduzida no Brasil pela Lei
n° 5.256, de 6-4-1967, para recolher o preso provisório
à própria residência nas localidades onde não houver
estabelecimento adequado ao recolhimento dos que
têm direito à prisão especial. Com introdução do
regime aberto na legislação penal, efetuada pela Lei n°
6.416, de 24-5-77, e diante da inexistência de locais
adequados para o cumprimento da prisão albergue, os
aplicadores da lei penal depararam-se com penosas
alternativas: admitir o alojamento noturno em celas
superlotadas das cadeias públicas; não conceder o
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
regime, embora o sentenciado estivesse em condições
de adequar-se a ele; ou conceder a prisão domiciliar,
com o recolhimento em sua própria residência. Não
havendo o Poder Público diligenciado para a
construção de estabelecimentos destinados ao regime
aberto em todas as comarcas, juízos e tribunais
passaram a conceder a chamada ‘prisão albergue
domiciliar’, transformada em verdadeiro simulacro da
execução da pena pela inexistência de qualquer
controle ou fiscalização na obediência das condições
impostas. A prisão albergue domiciliar passou, assim a
ser forma velada de impunidade, de que os juízes
lançavam mão em último recurso, na impossibilidade
de o benefício ser desfrutado em local adequado.
“Com a finalidade de evitar a concessão
indiscriminada de prisão domiciliar, fato que
contribuiu para o descrédito do regime aberto, com
graves prejuízos à defesa social, a Lei de Execução
Penal destinou-a exclusivamente aos condenados que
estejam nas condições especiais previstas
expressamente, distinguindo as duas espécies de prisão
em regime aberto: a prisão albergue e a prisão
domiciliar. Dispõe o art. 117 dispõe que "somente” se
admitirá o recolhimento domiciliar em residência
particular quando se tratar de condenado que esteja
em uma das situações estabelecidas no referido
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
dispositivo, e esclarece a exposição de motivos da lei
que o regime aberto, salvo essas exceções, "não admite
a execução da pena em residência particular.”
Na jurisprudência de nossa Excelsa Corte a questão
da prisão-albergue domiciliar assim vem sendo vista:
“Habeas corpus. Prisão albergue domiciliar.
Inexistência, na comarca, de Casa do Albergado. (...)
O Plenário do Supremo Tribunal decidiu que o
benefício da prisão-albergue só poderá ser deferido ao
sentenciado ‘se houver’, na localidade da execução da
pena, Casa de Albergado ou outro estabelecimento que
se ajuste às exigências legais do regime penal aberto. A
impossibilidade material de o Estado instituir Casa do
Albergado não autoriza o Poder Judiciário a conceder
a prisão-albergue domiciliar fora das hipóteses
contempladas, ¿em caráter estrito' no art. 117 da Lei
de Execução Penal. (...) A norma legal
consubstanciada no art. 117 da Lei de Execução Penal
instituiu situações subjetivas de vantagem, que apenas
beneficiam aqueles sentenciados cujas condições
pessoais estejam nela previstas. Constituindo regra de
direito singular, torna-se ela inextensível e inampliável
a situações outras que lhe sejam estranhas. As normas
legais positivadoras do regime penal aberto revestem-
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
se de conteúdo programático e só incidirão
plenamente, inclusive para efeito de deferimento do
benefício da prisão-albergue, a partir do momento em
que se torne materialmente possível, com a existência
de Casa de Albergado ou de estabelecimento similar, a
execução da pena nesse regime” (STF in RT 731/500)
(ementa parcial).
Se é verdade que, por conta de deficiência estrutural
do sistema carcerário, aos sentenciados não se pode obrigar o cumprindo de
pena em regime mais gravoso do que aquele a que estejam condenados,
também é verdade que é defeso ao magistrado estender o alcance da
prisão domiciliar a hipóteses não previstas na lei, mais ainda no caso em
apreço em que o faz mediante a edição de portarias, sem qualquer
observância ao caso concreto em que se outorgará o dito ‘benefício
emergencial’, reformando, sem qualquer interposição de recurso, a sentença
proferida pelo juízo da condenação e contribuindo para a sensação de
impunidade no meio social, haja vista a indevida substituição da pena
privativa de liberdade em prisão domiciliar, sem observância das disposições
legais alusivas à matéria.
Ademais, registre-se que não há qualquer fiscalização
eficiente que garanta o cumprimento da pena dos sentenciados que hoje
cumprem reprimenda no regime semiaberto.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
Ora, a inexistência do estabelecimento adequado não
impede que o penificado cumpra sua pena no estabelecimento existente, no
regime a que faz jus, nos moldes previstos pela legislação pertinente.
Em síntese, a questão cinge-se à discussão quanto à
possibilidade de deferimento da prisão domiciliar sob o argumento de
superlotação dos presídios e consequente escassez de condições dignas
propiciadas pelo Estado, ou seja, fora dos casos elencados no art. 117 da
LEP, que estabelece seu cabimento nas hipóteses de condenado maior de
setenta anos, acometido de doença grave, condenada com filho menor ou
deficiente ou, ainda, em se tratando de gestante.
Trazemos à colação, nesse sentido, precedente do
Órgão Colegiado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:
"EXECUÇÃO. PRISÃO DOMICILIAR. LOTAÇÃO
DE PRESÍDIO. HIPÓTESE NÃO CONTEMPLADA.
CASSAÇÃO. O agravado não se enquadra em
qualquer dos itens do artigo 117 da mesma legislação:
ele não é maior de setenta anos, não está gravemente
doente e não é mulher nas condições dos itens III e IV.
A concessão da prisão domiciliar teve como base a
superlotação do presídio da comarca. O Supremo
Tribunal Federal, a quem cabe zelar pelo
cumprimento da Constituição, já decidiu, em sessão
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
plenária, que o benefício da prisão-albergue só poderá
ser deferido ao sentenciado, se houver, na localidade
de execução da pena, casa do albergado, ou outro
estabelecimento que se ajuste às exigências legais do
regime penal aberto. A impossibilidade material de o
Estado instituir casa do albergado não autoriza o
Poder Judiciário a conceder a prisão-albergue
domiciliar, fora das hipóteses contempladas, em
caráter estrito, no art. 117 da LEP. Excepcionalmente,
aceitam-se a concessão do benefício na forma deferida.
Não é caso. Aqui, chama-se a atenção que a punição do
apenado está longe de terminar (27 de agosto de 2013),
é decorrente da prática de vários crimes acontecidos
entre os anos de 2005 a 2007. Além disso, em 31 de
março de 2009 fugiu e permaneceu vários meses
foragido, sendo recapturado em julho. DECISÃO:
Agravo ministerial provido. Unânime” (Agravo Nº
70036054500, Sétima Câmara Criminal, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Sylvio Baptista Neto, Julgado
em 20/05/2010).
Efetivamente, descabe conferir elasticidade ao rol
previsto no art. 117 da Lei de Execução Penal, não havendo como estender
indiscriminadamente as hipóteses de cabimento da prisão domiciliar a todos
os casos em que o sentenciado cumpre reprimenda em regime semiaberto.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
Por óbvio que tal questão diz respeito diretamente às
políticas de investimento da Administração Pública para que sejam atingidos
os objetivos da pena, sendo de conhecimento geral que os
estabelecimentos são desprovidos de condições adequadas, o que,
contudo, por si só, não gera direito ao cumprimento da reprimenda no
domicílio, inviabilizando por inteiro o Direito Penal enquanto instrumento
de controle social.
Embora a doutrina e a jurisprudência reconheçam a
possibilidade de se estender de forma criteriosa o benefício em pauta -
prisão domiciliar - a hipóteses não previstas pelo dispositivo, no caso dos
autos o Juiz da 1.ª Vara de Execução Penal e Corregedoria de Presídios da
comarca de Fortaleza editou as Portarias n.° 004/2011 e 006/2001, deixando
de analisar cada hipótese isoladamente e, por conseguinte, de verificar, caso
a caso, a excepcionalidade que justifique a concessão da benesse, vez que o
fez de forma indiscriminada a todos os condenados primários e que estejam
em gozo do regime semiaberto.
Dessa forma, a se dar vigência às malsinadas
Portarias, farpeadas pelo presente mandamus, estar-se-á permitindo que, em
caso de condenados, desde que primários, e que tenham praticado crimes
revestidos de violência contra a pessoa, como por exemplo, homicídio
simples e roubo qualificado pelo emprego de arma de fogo e concurso de
pessoas, deixem de cumprir as reprimendas penais, aplicadas depois de todo
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
o processamento do devido processo legal, contribuindo, sobremaneira, para
a sensação de impunidade e insegurança no seio da sociedade.
Nessa esteira de raciocínio, vejamos decisão do
Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:
AGRAVO EM EXECUÇÃO. PRISÃO
DOMICILIAR. SUPERLOTAÇÃO DOS
PRESÍDIOS. INDEFERIMENTO. A prisão domiciliar
tem cabimento nas hipóteses do art. 117 da LEP.
Embora a doutrina e a jurisprudência reconheçam a
possibilidade de se estender de forma criteriosa o
benefício a hipóteses não previstas pelo dispositivo, o
caso dos autos não se reveste de excepcionalidade que
justifique a sua concessão. A alegação de precárias
condições das casas prisionais não determina, por si
só, a possibilidade de prisão domiciliar Questão
relacionada às políticas da Administração Pública”
(70041423062/RS , Relator: Naele Ochoa Piazzeta,
Data de Julgamento: 28/04/2011, Sétima Câmara
Criminal, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia
04/07/2011)
Assim, não obstante a polêmica que o tema encerra,
não se pode concordar com a concessão da prisão domiciliar fora dos casos
legais, pois trata-se de verdadeiro simulacro de cumprimento da pena,
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
sem qualquer fiscalização estatal, ressalte-se, fato que contribui para o
descrédito de todo o sistema jurídico-penal e dificulta a reinserção do
condenado ao convívio social.
Por outro lado, a ausência momentânea de vagas para
o cumprimento de pena no regime semiaberto ou aberto não autoriza a
concessão da prisão domiciliar fora das hipóteses expressamente previstas
em lei.
Sobre o tema, o Ministério Público ainda salienta:
"A concessão de prisão domiciliar restringe-se às
hipóteses previstas no art. 117, da Lei de Execução
Penal, não sendo suficiente, para tanto, a ausência de
estabelecimento adequado para o cumprimento da
pena em regime aberto." Ementa parcial (TJMG -
RAG 000.271.473-1/00 - 2ª C.Crim. - Rel. Des. José
Antonino Baía Borges - J. 10.04.2003).
“Destinar-se o condenado por roubo qualificado (com
emprego de armas), em regime prisional semiaberto, a
cumprir pena em sua própria residência, sem
qualquer controle ou fiscalização, sob a alegação de
inexistência de Casa do Albergado ou Colônia
Agrícola Industrial na Comarca, significa
simplesmente instituir a total impunidade. Só se
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
admite a prisão domiciliar nas estritas hipóteses do
art. 117 e incisos da Lei 7.210/84. Recurso conhecido e
improvido” (TJMG - RAG 000.329.090-5/00 - 1ª
C.Crim. - Relª Desª Márcia Milanez - J. 29.04.2003).
“EXECUÇÃO PENAL - AGRAVO - REGIME
PENITENCIÁRIO - CONDENAÇÕES A SEREM
CUMPRIDAS EM REGIME SEMI-ABERTO E
ABERTO - PRISÃO DOMICILIAR -
INADMISSIBILIDADE - INOCORRÊNCIA DE
QUALQUER DAS HIPÓTESES PREVISTAS NO
ART. 117 DA LEP - A Lei de Execução Penal destinou
a prisão domiciliar exclusivamente aos condenados
que estejam nas condições especiais previstas
expressamente no seu art. 117. Inteligência da Súmula
28 da jurisprudência predominante nesta 1ª Câmara
Criminal. Recurso a que se nega provimento" (TJMG
- RAG 000.305.736-1/00 - 1ª C.Crim. - Rel. Des. Tibagy
Salles - J. 27.05.2003).
"EXECUÇÃO PENAL. PENA DE RECLUSÃO.
PRISÃO DOMICILIAR. PRESSUPOSTOS.
INEXISTÊNCIA. LEP, ART. 117. BENEFÍCIO DO
TRABALHO EXTERNO. CONCESSÃO DE
OFÍCIO. - Somente é admissível o cumprimento de
pena em residência particular se o condenado
beneficiário do regime aberto, enquadra-se em uma
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
das situações previstas no art. 117, da Lei de Execução
Penal". Ementa Parcial (STJ, HC nº 17035-SP, 6ª
Turma, Relator Min. Vicente Leal, Fonte: DJ DATA:
11/03/2002 PG: 00281).
“HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL.
REGIME ABERTO. AUSÊNCIA DE CASA DE
ALBERGADO NO LOCAL DE CUMPRIMENTO
DA PENA. PRISÃO DOMICILIAR.
IMPOSSIBILIDADE. I - A Lei de Execução Penal traz
em caráter estrito em seu art. 117, as hipóteses em que
se permitirá a um condenado a regime aberto cumprir
sua sanção em domicílio particular. II - A
impossibilidade material do estado instituir casa de
albergado não autoriza de forma alguma o poder
judiciário a conceder a prisão-albergue domiciliar fora
das hipóteses enumeradas no artigo supracitado. III -
Ordem conhecida e denegada à unanimidade de votos
(TJMA - HC 019457/2003 - (47.160/2003) - São
Bernardo - 2ª C.Crim. - Relª Desª Nelma Celeste Sousa
Silva Sarney Costa - j. 13.11.2003).
Em verdade, o Ministério Público concorda com
aqueles que defendem que uma boa saída para o caso em tela, para se evitar
o ‘estado de impunidade’ consagrado pelas Portarias guerreadas, mas, ao
mesmo tempo, não se desviar da finalidade da pretensão executória, seria a
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
de se ajustar as condições do regime semiaberto para cumprimento da
reprimenda por parte do paciente em algum estabelecimento penal,
permitindo-se, se for o caso, o trabalho externo, bem como a freqüência de
cursos.
Referida solução, aliás, vem sendo adotada com total
êxito pela Vara de Execuções Criminais desta Comarca, e plenamente aceita
pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça:
“HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL.
CUMPRIMENTO DE PENA EM REGIME MAIS
GRAVOSO DO QUE AQUELOUTRO ESTABELECIDO
NO DECRETO CONDENATÓRIO. INEXISTÊNCIA DE
VAGAS. ADEQUAÇÃO AO COMANDO DA
SENTENÇA. ORDEM DENEGADA. I. O regime imposto
na sentença deve informar a sua execução, não
importando, contudo, em constrangimento ilegal o tempo
de permanência necessário à transferência do condenado
do estabelecimento próprio da prisão provisória para
aqueloutro ajustado ao regime decretado na condenação
imposta. II. Tal tempo deve subordinar-se ao princípio da
razoabilidade, que faz injustificável transferência que se
retarde por mais de 30 dias. III. Compete ao Juiz, à luz da
norma insculpida no artigo 66, inciso VI, da Lei de
Execuções Penais, que lhe reclama zelo pelo correto
cumprimento da pena, decidir sobre a questão da
inexistência de vaga ou de estabelecimento adequado,
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
adotando providência para ajustamento da execução da
pena ao comando da sentença. IV. Em se mostrando zeloso
o Magistrado na execução da sentença, ajustando o
cumprimento da pena ao regime adequado, ainda diante da
ausência de vaga no estabelecimento próprio, não há falar
em constrangimento a ser reparado pelo remédio heróico.
V. Ordem denegada” (STJ - HC 21599/MG - 6ª Turma -
Rel. Min. Hamilton Carvalhido - Decisão Unânime - j.
18/12/2002 - DJU 17/03/2003, p. 290).
Ademais, não bastassem todos os vícios já apontados
e a ausência de juridicidade de todos os fundamentos em que se sustentam os
atos inquinados, o simples fato de extinguir o regime semiaberto na comarca
de Fortaleza, instituindo indiscriminadamente a prisão domiciliar não só é
ilegal, por negar vigência ao Código Penal, que prevê como sendo três os
regimes de cumprimento da pena (artigo 33 do Código penal), bem como
nega vigência à Lei de Execução Penal, que prevê a concessão de prisão
domiciliar em casos específicos, possuindo, para tanto, um rol taxativo
(artigo 117 da Lei de Execução Penal).
De mais a mais, as Portarias ora farpeadas também
criam a situação esdrúxula de reformar, sem qualquer interposição de
recurso, a sentença penal condenatória que aplicou a pena privativa de
liberdade, ao se conceder ao sentenciado a falaciosa prisão domiciliar sobre
a qual não há qualquer fiscalização por parte do Estado.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
De se entender, pois, que as Portarias n.° 004/2011 e
006/2011 deram ao artigo 117 da Lei da Execução Penal um alcance que
este efetivamente não tem, alem de negar vigência ao artigo 33 do Código
Penal, na medida em que revoga tacitamente o regime semiaberto aos
condenados primários ao criar uma espécie anômala de ‘prisão domiciliar’.
Registre-se, ainda, que já ocorreu caso de concessão
de prisão domiciliar a condenada por tráfico ilícito de entorpecentes – crime
equiparado a hediondo, como se pode observar da decisão em anexo
proferida nos autos da ação de execução penal n° 85-36.2011.8.06.0136/0,
tudo isso com fundamento na Portaria n° 004/2011, tendo sido a aludida
decisão, devidamente, agravada pelo Ministério Público e reformada pelo
juiz sentenciante (ver documento em anexo).
Ademais, observa-se que o ato praticado pelo
Impetrado não tem o caráter da jurisdição, pois configura um ato
administrativo (Portaria). Neste sentido, temos uma situação que viola a
hierarquia das normas, pois, segundo a pirâmide kelseniana, temos no
vértice da mesma a Constituição; logo abaixo temos as leis e na base
piramidal temos as normas infra-legais.
No caso in comento, o ato administrativo praticado
pelo Impetrado (Portarias) violou a Lei de Execução Penal, conforme já
demonstrado supra, fato este que é inaceitável, configurando, inclusive, um
ato teratológico.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
O Ministério Público entende, portanto, que o
Impetrado, na condição de Juiz de Execução Penal, poderia, NO CASO
CONCRETO E NO EXERCÍCIO DA JURISDIÇÃO, interpretar a LEP no
sentido de possibilitar eventual prisão domiciliar para os casos de
condenados em regime semiaberto. Entretanto, é inadmissível que o
Impetrado, NO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO ADMINISTRATIVA, ignore a
LEP e o CPB e CRIE UMA NOVA MODALIDADE DE CUMPRIMENTO
DA PENA PARA OS APENADOS EM REGIME SEMIABERTO.
Igualmente de tomo destacar que as Portarias, cuja
nulidade e ilegalidade pretende a Promotoria de Justiça sejam declaradas,
contém em seu nascedouro erro formal que a eiva de mácula insanável, na
medida em que ao conceder prisão domiciliar para todos os presos em
regime semiaberto, sem qualquer audiência com os demais Juízes de Direito
das Varas de Execução Penal, com a Corregedoria Geral e com a Presidência
do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, a autoridade,ora coatora, incidiu
em erro ao tratar da questão de forma isolada e pessoal, alijando os demais
protagonistas, incluindo entre tais o Ministério Público, o Poder Legislativo
e o Poder Executivo, a também deliberar sobre a atual situação dos
estabelecimentos prisionais localizados no território cearense.
Nesse aspecto, especificamente em relação ao Poder
Judiciário, confirmando a participação da Corregedoria Geral e do próprio
Tribunal de Justiça em questões como a de que ora se trata, o parágrafo
único do art. 72 da Lei Estadual n.º 12.342/94 (Código de Divisão e de
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
Organização Judiciária do Estado do Ceará estabelece que a Corregedoria
Geral de Justiça, quando das correições, ‘observada a falta de higiene,
segurança ou aparelhamento, representará ao Tribunal de Justiça para a
adoção das providências indispensáveis’.
Outro argumento a corroborar a iniciativa pessoal e
subjetiva do Juiz de Direito da 1.ª Vara de Execução Penal e Corregedoria de
Presídios é afirmar que, apesar de já haver outros 2 (dois) magistrados
titulares com atuação na área de execução penal quando da elaboração dos
atos inquinados de ilegalidade, nenhum dos juízes assinou as multicitadas
Portarias.
Deitando luzes sobre a questão ora apresentada, o
Conselho Nacional de Justiça, nos autos do PCA n.º 200810000002397, de
relatoria do Conselheiro Jorge Antonio Maurique, pontificou:
“O problema, portanto, é macro, sistêmico, mundial e
complexo, não apenas restrito aos estabelecimentos
prisionais do caso em tela e, à toda evidência, não
sendo resolúvel por meio de medidas isoladas, sejam
adotadas por magistrado, em sua atividade
fiscalizatória e correcional da execução penal, seja por
parte deste Conselho, em seu papel de controlador dos
referidos atos. Para um problema de tamanha
grandeza, faz-se mister soluções igualmente complexas
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
e tomadas com suporte de um número maior de
pessoas e instituições. Se há algo de errado com o
sistema, é necessário que este sistema seja alterado; o
que não se pode permitir é que este mesmo sistema
seja subvertido em sua ordem, sob pena de que seja
instaurada uma situação de desordem, de
antidemocracia e de supressão do diálogo institucional.
Em resumo, incorre-se no risco de se inviabilizar o
próprio sistema prisional, por pior que seja seu
modelo atual, ainda mais por que praticamente não há
no Brasil estabelecimento carcerário que não tenha
excedido seus limites. É infelizmente a triste realidade
que se atesta diariamente nos noticiários nacionais e
nas atividades correcionais judiciais.
(...)
“Por outra banda, não é de competência isolada do
Poder Judiciário a definição das políticas públicas
atinentes à administração penitenciária, não podendo,
ainda, se imiscuir nos assuntos pertinentes ao Poder
Executivo, sob pena de violar o princípio da separação
dos Poderes (art. 2º da CF/88). A questão é
fundamentalmente de eleição de prioridades
governamentais de competência do Poder Executivo,
cuja efetivação possui seus mecanismos próprios no
atual regime democrático. Qualquer invasão dessa
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
competência poderia criar situação de conflito que
eventualmente poderá redundar em usurpação dos
critérios de oportunidade e conveniência privativos da
Administração. É ela que detém o planejamento de
curto, médio e longo prazo, na busca da melhor
acomodação dos presos, não se mostrando razoável
desconsiderá-los mediante tomada de medidas graves
e de enorme repercussão no sistema como um todo,
como ocorre no caso de uma interdição prisional”
Quanto ao mais, não bastasse o vício da iniciativa das
Portarias guerreadas pelo presente writ, imperioso registrar que não é dado
ao Poder Judiciário expedir portaria cujos paradigmas são completamente
diversos daqueles estipulados no Código Penal e na Lei de Execução Penal.
Com efeito, é inolvidável que quando da expedição de
qualquer portaria – ato tipicamente regulamentar, de cunho infralegal – deve
haver obediência estrita aos ditames constitucionais vigentes e aos limites e
requisitos estabelecidos nas leis que regulamentam a matéria, não havendo
qualquer espaço para subjetivismo.
Sobre a impossibilidade de o Poder Judiciário
estabelecer atos normativos, inaugurando a ordem jurídica, sem qualquer
parâmetro constitucional e legal, o Desembargador Amaral e Silva pontifica:
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
Não é atribuição do Judiciário ditar normas de caráter
geral, mas decidir, no caso concreto, a aplicação do
Direito Objetivo. Juiz não é legislador, não elabora
normas de comportamento frente às regras de conduta
da vida social. Essas geralmente decorrem do processo
legislativo, reservado pela constituição a outra órbita.
(in Estatuto da Criança e do Adolescente comentado. São
Paulo, Malheiros, 1992, p. 450)
DO DEFERIMENTO DA LIMINAR REQUESTADA
Por todo o exposto, considerando a flagrante
ilegalidade das Portarias n° 004/2011 e 006/2001, vez que contrariam
frontalmente o artigo 117 da Lei de Execução Penal, dando ao citado
dispositivo um alcance que efetivamente não possui, além de criar uma nova
modalidade, anômala, de prisão domiciliar, extinguindo tacitamente o
regime semiaberto e o regime aberto aos condenados primários, requer o
Ministério Público seja deferida liminarmente o sobrestamento dos efeitos
das Portarias n° 004/2011 e 006/2011, da lavra do Excelentíssimo Senhor
Juiz Luiz Bessa Neto, a fim de torná-las sem efeito, inclusive, devendo a
liminar ter efeitos ex tunc em relação às concessões de prisão domiciliar a
condenados em regime semiaberto por força das referidas Portarias.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
Nesse azo, o requisito do fumus boni iuris resta
configurado por meio da ilegalidade manifesta dos atos ora guerreados.
Por sua vez, o periculum in mora se manifesta por
meio da insegurança no meio social, acaso os sentenciados do regime
semiaberto sejam postos em liberdade, sem qualquer fiscalização por parte
do poder público.
Nesse contexto, o cumprimento de pena no regime
domiciliar, mesmo que em desconformidade com normas legais ínsitas na
Lei de Execução Penal e Código Penal, acarretará a extinção da pena, razão
pela qual se mostra urgente a cassação dos efeitos das Portarias nos casos em
que a mesma já foi aplicada, bem como nos casos futuros, de forma a
garantir o cumprimento da pena privativa de liberdade como determinado
em lei.
DO PEDIDO
Em razão de todo o exposto, requer o Ministério
Público:
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E
CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
i) seja a presente ação admitida, concedendo-se a
liminar requerida (art. 7º, III, da Lei nº 12.016/2009) para cassar os efeitos
das Portarias objurgadas que extinguiram o regime semiaberto na comarca
de Fortaleza e determinaram que todos os apenados primários sob este
regime passassem a cumprir suas reprimendas em prisão domiciliar e, ao
final, a concessão definitiva da segurança.
ii) seja notificada a autoridade coatora para que preste
as informações de estilo, na forma do art. 7º, inciso I, da Lei nº 12.016/2009.
Dá-se à presente causa o valor de R$ 1.000,00 (hum
mil reais).
Fortaleza, 05 de agosto de 2011.
SÍLVIO LÚCIO CONRADO CORREIA LIMA JOSÉ EVILÁ ZIO ALEXANDRE DA SILVA Promotor de Justiça Promotor de Justiça SANDRA VIANA PINHEIRO HUGO VASCONCELOS XEREZ Promotor de Justiça Promotor de Justiça
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
EXMO. SR. JUIZ DE DIREITO DA VARA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA/CE Autos Processuais. nº 2000753-78.2000.8.06.0001 O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ, pelos Promotores de Justiça que esta subscrevem, no uso de suas atribuições legais, inconformado com a decisão de fls. 151/153 dos autos, que deferiu ao sentenciado ASSIS PEREIRA DA SILVA prisão domiciliar, vem, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência interpor AGRAVO EM EXECUÇÃO, com fundamento no art. 197 da Lei nº 7.210/84. Requer que, recebido este, já com as inclusas razões, possa Vossa Excelência retratar-se, revogando a prisão domiciliar concedida. Assim não entendendo, aguarda-se o regular processamento do recurso e seu encaminhamento ao Egrégio Tribunal de Justiça deste Estado. Para a formação do instrumento, seguem em anexo os seguintes documentos: 1) Guia de Recolhimento de fls. 04/05 dos autos; 2) Denúncia de fls. 06/08 dos autos; 3) Sentença condenatória de primeiro grau de fls. 19/24 dos autos; 4) Parecer ministerial de fls. 135 dos autos; 5) decisão do Juízo da Vara de Execução Penal desta Comarca de Fortaleza de fls. 137 dos autos; 6) Pedido de autorização de trabalho externo de fls. 147 dos autos; 7) Decisão concessiva do trabalho externo e da prisão domiciliar de fls. 151/152 dos autos; e 8) Certidão da Secretaria da Vara de Execução Penal. Termos em que Pedem deferimento. Fortaleza/CE, 02 de setembro de 2011. HUGO VASCONCELOS XEREZ JOSÉ EVILÁZIO ALEXANDRE DA SILVA Promotor de Justiça Promotor de Justiça SANDRA VIANA PINHEIRO Promotora de Justiça
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
Autos Processuais nº 2000753-78.2000.8.06.0001 Execução Penal Agravante: Ministério Público do Estado do Ceará Agravado: ASSIS PEREIRA DA SILVA RAZÕES DE AGRAVO EM EXECUÇÃO E. Tribunal C. Câmara DD. Procurador de Justiça O sentenciado ASSIS PEREIRA DA SILVA, devidamente qualificado nas peças que instruem o presente recurso, foi condenado à pena de 17 (dezessete) anos de reclusão, pelo cometimento do crime de latrocínio (art. 157, § 3º, parte final, c/c art. 29, todos do Código Penal). É o que se infere da cópia da r. sentença condenatória de fls. 19/24 dos autos proferida pelo Juízo da Comarca de Acopiara. Muito embora tenha cumprido pouco mais de 1/6 (um sexto) de sua condenação, no curso da execução penal, o sentenciado pleiteou a progressão de seu regime prisional, tendo obtido
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
progressão para o regime semiaberto em data de 01/12/2010, consoante decisão de fls. 137 dos autos da execução penal n° 2000753-78.2000. Posteriormente, a Defensora do sentenciado ingressou com pedido de homologação de trabalho externo, consoante se vê às fls. 147 dos autos. O Douto Juízo da então Vara Única de Execução Penal e Corregedoria de Presídios, olvidando-se da atividade fiscalizatória do cumprimento da pena por parte do Ministério Público, deixou de abrir vista dos autos a fim de que o pedido fosse analisado pelo Ministério Público. Na seqüência, através do decisum de fls. 151/152 dos autos, o Douto Juízo da então Vara Única de Execução Penal e Corregedoria de Presídios desta Comarca de Fortaleza, sem ao menos determinar fosse averiguada a veracidade da oferta de emprego e a capacidade empregatícia da empresa, concedeu autorização para que o latrocida ASSIS PEREIRA DA SILVA exercesse atividades laborais junto à LIVRARIA E PAPELARIA ENCONTRO DOS LIVROS, bem como extra petita concedeu ao mesmo o beneplácito da prisão domiciliar, dispensando o sentenciado de se recolher junto ao estabelecimento prisional nos dias de folga. Sabe-se que a prisão domiciliar, segundo dispõe o art. 117, da LEP, é prevista para presos em cumprimento de pena no regime aberto e nas hipóteses excepcionais previstas em seus incisos, não contemplando a Lei de Execução Penal e a legislação penal pertinente a prisão domiciliar para sentenciados que cumprem pena no regime semiaberto. Assim, o MM. Juiz de Direito prolator da decisão de fls. 151/152 dos autos, ora agravada, contrariando frontalmente o citado dispositivo legal, entendeu por deferir o benefício da prisão domiciliar ao sentenciado e autorização para o trabalho externo, não obstante, não houvesse sido elaborado nem mesmo mandado de averiguação, nem tivesse sido oferecido o parecer do Ministério Público. Inconformado, interpõe o Ministério Público, a tempo e modo, o presente agravo em execução, a fim de obter a reforma da r. decisão impugnada, nos moldes da lei. Sustenta o ilustre magistrado que subscreve a r. decisão impugnada, em resumo: “Ante ao exposto, tendo em vista a data da oferta, concedo o Trabalho Externo ao apenado Assis Pereira da Silva, posto satisfazer as exigências legais, bem como, excepcionalmente, a prisão domiciliar, devendo permanecer recolhido à sua residência nos finais de semana e feriados e no período noturno nos dias úteis, isto é, dias de trabalho, em razão da interdição do AMANARI, publicada no DJ n° 213, em 16/11/2009”. Com tais argumentos (contrários à lei), concedeu ao sentenciado ASSIS PEREIRA DA SILVA, o beneplácito da prisão domiciliar, não obstante a sua condenação por crime hediondo e sem apresentar qualquer justificativa para a excepcionalidade da medida concedida ao sentenciado em comento. Salienta-se, inicialmente, que o pedido formulado pelo reeducando, por intermédio de sua procuradora, invocara, única e exclusivamente, a homologação de trabalho externo, no entanto,
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
indo muito mais além, o então Juízo da Vara de Execução Penal e Corregedoria de Presídios concedeu ao latrocida ASSIS PEREIRA DA SILVA o benefício da prisão domiciliar, desobrigando-o de qualquer recolhimento em estabelecimento prisional. Visa-se pela execução fazer cumprir o comando emergente da sentença penal condenatória, e na execução penal, assim como na aplicação da lei penal, o magistrado está jungido pelo principio da legalidade. A matéria referente à prisão domiciliar encontra-se regulada no art. 117 da Lei nº 7.210/84, e sua concessão restringem-se às hipóteses ali previstas. Dispõe o referido artigo: “Somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular quando se tratar de: I - condenado maior de 70 (setenta) anos; II - condenado acometido de doença grave; III - condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental; IV - condenada gestante”. Como se viu, o rol de hipóteses é taxativo, numerus clausus. Dessa forma, entende o Ministério Público que não é cabível a concessão, da forma como estipulada na decisão interlocutória que concedeu ao sentenciado ASSIS PEREIRA DA SILVA, o beneplácito da prisão domiciliar em razão da interdição do AMANARI, posto que atualmente o IPPOO I acolhe os sentenciados em cumprimento de pena no regime semiaberto. Cediço que a crise instalada na execução penal não se restringe à situação dos sentenciados, refletindo, também, na segurança pública. A parcela ordeira da população, que financia com o pagamento de impostos, taxas etc, a estruturação de um sistema que idealiza, busca e não atinge, é também atingida, vítima do medo, do crime e também da inércia/ineficiência dos poderes instituídos, ineficazes ante a incontida ascensão do império em que reina absoluta a ilicitude penal. Nesse ponto, oportuno citar dois elementos pinçados de um rol de fatores que Rui Stocco denominou ‘causas supralegais de impunidade’: o ‘sistema prisional inadequado em todo o país’ e a ‘carência de penitenciárias, casas de detenção e institutos penais’. Nesse azo, dúvida não resta de que a impunidade conturba o estrato social ao transitar em todas as suas camadas, permeando, trespassando e rompendo sua formação moral e enfraquecendo sua estrutura.
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
Se a permanência em residência particular do condenado à pena no regime aberto, sem qualquer controle ou fiscalização por parte da Administração, já significaria a total impunidade pelo crime praticado, acarretando graves prejuízos à defesa social, mais ainda no caso sob exame, em que a Autoridade impetrada concedeu o benefício da prisão domiciliar ao sentenciado ASSIS PEREIRA DA SILVA, sem justificar em que consiste a excepcionalidade da medida,olvidando-se que descabe prisão domiciliar em cumprimento de pena no regime semiaberto. Nesse azo, Julio Fabbrini Mirabete (in Execução Penal, 9ª edição, Editora Atlas, p. 381): “A prisão domiciliar foi introduzida no Brasil pela Lei n° 5.256, de 6-4-1967, para recolher o preso provisório à própria residência nas localidades onde não houver estabelecimento adequado ao recolhimento dos que têm direito à prisão especial. Com introdução do regime aberto na legislação penal, efetuada pela Lei n° 6.416, de 24-5-77, e diante da inexistência de locais adequados para o cumprimento da prisão albergue, os aplicadores da lei penal depararam-se com penosas alternativas: admitir o alojamento noturno em celas superlotadas das cadeias públicas; não conceder o regime, embora o sentenciado estivesse em condições de adequar-se a ele; ou conceder a prisão domiciliar, com o recolhimento em sua própria residência. Não havendo o Poder Público diligenciado para a construção de estabelecimentos destinados ao regime aberto em todas as comarcas, juízos e tribunais passaram a conceder a chamada ‘prisão albergue domiciliar’, transformada em verdadeiro simulacro da execução da pena pela inexistência de qualquer controle ou fiscalização na obediência das condições impostas. A prisão albergue domiciliar passou, assim a ser forma velada de impunidade, de que os juízes lançavam mão em último recurso, na impossibilidade de o benefício ser desfrutado em local adequado. “Com a finalidade de evitar a concessão indiscriminada de prisão domiciliar, fato que contribuiu para o descrédito do regime aberto, com graves prejuízos à defesa social, a Lei de Execução Penal destinou-a exclusivamente aos condenados que estejam nas condições especiais previstas expressamente, distinguindo as duas espécies de prisão em regime aberto: a prisão albergue e a prisão domiciliar. Dispõe o art. 117 dispõe que "somente” se admitirá o recolhimento domiciliar em residência particular quando se tratar de condenado que esteja em uma das situações estabelecidas no referido dispositivo, e esclarece a exposição de motivos da lei que o regime aberto, salvo essas exceções, "não admite a execução da pena em residência particular.” Na jurisprudência de nossa Excelsa Corte a questão da prisão-albergue domiciliar assim vem sendo vista: “Habeas corpus. Prisão albergue domiciliar. Inexistência, na comarca, de Casa do Albergado. (...) O Plenário do Supremo Tribunal decidiu que o benefício da prisão-albergue só poderá ser deferido ao sentenciado ‘se houver’, na localidade da execução da pena, Casa de Albergado ou outro estabelecimento que se ajuste às exigências legais do regime penal aberto. A impossibilidade material de o Estado instituir Casa do Albergado não autoriza o Poder Judiciário a conceder a prisão-albergue domiciliar fora das hipóteses contempladas, ‘em caráter estrito' no art. 117 da Lei de Execução Penal. (...) A norma legal
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
consubstanciada no art. 117 da Lei de Execução Penal instituiu situações subjetivas de vantagem, que apenas beneficiam aqueles sentenciados cujas condições pessoais estejam nela previstas. Constituindo regra de direito singular, torna-se ela inextensível e inampliável a situações outras que lhe sejam estranhas. As normas legais positivadoras do regime penal aberto revestem-se de conteúdo programático e só incidirão plenamente, inclusive para efeito de deferimento do benefício da prisão-albergue, a partir do momento em que se torne materialmente possível, com a existência de Casa de Albergado ou de estabelecimento similar, a execução da pena nesse regime” (STF in RT 731/500) (ementa parcial). Se é verdade que, por conta de deficiência estrutural do sistema carcerário, aos sentenciados não se pode obrigar o cumprindo de pena em regime mais gravoso do que aquele a que estejam condenados, também é verdade que é defeso ao magistrado estender o alcance da prisão domiciliar a hipóteses não previstas na lei, mais ainda no caso em apreço em que o sentenciado foi condenado por crime de latrocínio. Certamente, decisões de tal natureza contribuem para a sensação de impunidade no meio social, haja vista a indevida substituição da pena privativa de liberdade em prisão domiciliar, sem observância das disposições legais alusivas à matéria. Ademais, registre-se que não há qualquer fiscalização eficiente que garanta o cumprimento da pena dos sentenciados que hoje cumprem reprimenda no regime semiaberto e se encontram gozando do benefício da prisão domiciliar. Ora, a inexistência do estabelecimento adequado não impede que o sentenciado cumpra sua pena no estabelecimento existente, no regime a que faz jus, nos moldes previstos pela legislação pertinente. Em síntese, a questão cinge-se à discussão quanto à possibilidade de deferimento da prisão domiciliar sob o argumento de superlotação dos presídios e consequente escassez de condições dignas propiciadas pelo Estado, ou seja, fora dos casos elencados no art. 117 da LEP, que estabelece seu cabimento nas hipóteses de condenado maior de setenta anos, acometido de doença grave, condenada com filho menor ou deficiente ou, ainda, em se tratando de gestante. Trazemos à colação, nesse sentido, precedente do Órgão Colegiado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: "EXECUÇÃO. PRISÃO DOMICILIAR. LOTAÇÃO DE PRESÍDIO. HIPÓTESE NÃO CONTEMPLADA. CASSAÇÃO. O agravado não se enquadra em qualquer dos itens do artigo 117 da mesma legislação: ele não é maior de setenta anos, não está gravemente doente e não é mulher nas condições dos itens III e IV. A concessão da prisão domiciliar teve como base a superlotação do presídio da comarca. O Supremo Tribunal Federal, a quem cabe zelar pelo cumprimento da Constituição, já decidiu, em sessão plenária, que o benefício da prisão-albergue só poderá ser deferido ao sentenciado, se houver, na localidade de execução da pena, casa do albergado, ou outro estabelecimento que se ajuste às exigências legais do regime penal aberto. A impossibilidade material de o Estado
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
instituir casa do albergado não autoriza o Poder Judiciário a conceder a prisão-albergue domiciliar, fora das hipóteses contempladas, em caráter estrito, no art. 117 da LEP. Excepcionalmente, aceitam-se a concessão do benefício na forma deferida. Não é caso. Aqui, chama-se a atenção que a punição do apenado está longe de terminar (27 de agosto de 2013), é decorrente da prática de vários crimes acontecidos entre os anos de 2005 a 2007. Além disso, em 31 de março de 2009 fugiu e permaneceu vários meses foragido, sendo recapturado em julho. DECISÃO: Agravo ministerial provido. Unânime” (Agravo Nº 70036054500, Sétima Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sylvio Baptista Neto, Julgado em 20/05/2010). Efetivamente, descabe conferir elasticidade ao rol previsto no art. 117 da Lei de Execução Penal, não havendo como estender indiscriminadamente as hipóteses de cabimento da prisão domiciliar a todos os casos em que o sentenciado cumpre reprimenda em regime semiaberto em razão da interdição do AMANARI. Por óbvio que tal questão diz respeito diretamente às políticas de investimento da Administração Pública para que sejam atingidos os objetivos da pena, sendo de conhecimento geral que os estabelecimentos são desprovidos de condições adequadas, o que, contudo, por si só, não gera direito ao cumprimento da reprimenda no domicílio, inviabilizando por inteiro o Direito Penal enquanto instrumento de controle social. Embora a doutrina e a jurisprudência reconheçam a possibilidade de se estender de forma criteriosa o benefício em pauta - prisão domiciliar - a hipóteses não previstas pelo dispositivo, no caso dos autos o Juízo da então Vara Única de Execução Penal da Comarca de Fortaleza, deixou de justificar em que consistia a excepcionalidade da concessão do benefício da prisão domiciliar ao sentenciado ASSIS PEREIRA DA SILVA, nem mesmo atentando ao fato do mesmo cumprir a pena no regime semiaberto, o qual é incompatível com a benesse da prisão domiciliar, além do mais para a natureza do crime pelo mesmo praticado, ou seja, o crime de latrocínio. Dessa forma, a se dar guarida ao decisum concessivo de prisão domiciliar ao sentenciado ASSIS PEREIRA DA SILVA, estar-se-á permitindo que o mesmo, efetivamente, deixe de cumprir a reprimenda penal que lhe foi aplicada depois de todo o desenrolar do devido processo legal, contribuindo, sobremaneira, para a sensação de impunidade e insegurança no seio da sociedade. Nessa esteira de raciocínio, vejamos decisão do Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: AGRAVO EM EXECUÇÃO. PRISÃO DOMICILIAR. SUPERLOTAÇÃO DOS PRESÍDIOS. INDEFERIMENTO. A prisão domiciliar tem cabimento nas hipóteses do art. 117 da LEP. Embora a doutrina e a jurisprudência reconheçam a possibilidade de se estender de forma criteriosa o benefício a hipóteses não previstas pelo dispositivo, o caso dos autos não se reveste de excepcionalidade que justifique a sua concessão. A alegação de precárias condições das casas prisionais não determinam, por si só, a possibilidade de prisão domiciliar Questão relacionada às políticas da Administração Pública” (70041423062/RS ,
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
Relator: Naele Ochoa Piazzeta, Data de Julgamento: 28/04/2011, Sétima Câmara Criminal, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 04/07/2011) Assim, não obstante a polêmica que o tema encerra não se pode concordar com a concessão da prisão domiciliar fora dos casos legais, pois se trata de verdadeiro simulacro de cumprimento da pena, sem qualquer fiscalização estatal, ressalte-se, fato que contribui para o descrédito de todo o sistema jurídico-penal e dificulta a reinserção do condenado ao convívio social. Por outro lado, a ausência momentânea de vagas para o cumprimento de pena no regime semiaberto ou aberto não autoriza a concessão da prisão domiciliar fora das hipóteses expressamente previstas em lei. Sobre o tema, o Ministério Público ainda salienta: "A concessão de prisão domiciliar restringe-se às hipóteses previstas no art. 117, da Lei de Execução Penal, não sendo suficiente, para tanto, a ausência de estabelecimento adequado para o cumprimento da pena em regime aberto." Ementa parcial (TJMG - RAG 000.271.473-1/00 - 2ª C.Crim. - Rel. Des. José Antonino Baía Borges - J. 10.04.2003). “Destinar-se o condenado por roubo qualificado (com emprego de armas), em regime prisional semiaberto, a cumprir pena em sua própria residência, sem qualquer controle ou fiscalização, sob a alegação de inexistência de Casa do Albergado ou Colônia Agrícola Industrial na Comarca, significa simplesmente instituir a total impunidade. Só se admite a prisão domiciliar nas estritas hipóteses do art. 117 e incisos da Lei 7.210/84. Recurso conhecido e improvido” (TJMG - RAG 000.329.090-5/00 - 1ª C.Crim. - Relª Desª Márcia Milanez - J. 29.04.2003). “EXECUÇÃO PENAL - AGRAVO – REGIME PENITENCIÁRIO - CONDENAÇÕES A SEREM CUMPRIDAS EM REGIME SEMI-ABERTO E ABERTO - PRISÃO DOMICILIAR - INADMISSIBILIDADE - INOCORRÊNCIA DE QUALQUER DAS HIPÓTESES PREVISTAS NO ART. 117 DA LEP - A Lei de Execução Penal destinou a prisão domiciliar exclusivamente aos condenados que estejam nas condições especiais previstas expressamente no seu art. 117. Inteligência da Súmula 28 da jurisprudência predominante nesta 1ª Câmara Criminal. Recurso a que se nega provimento" (TJMG - RAG 000.305.736-1/00 - 1ª C.Crim. - Rel. Des. Tibagy Salles - J. 27.05.2003). "EXECUÇÃO PENAL. PENA DE RECLUSÃO. PRISÃO DOMICILIAR. PRESSUPOSTOS. INEXISTÊNCIA. LEP, ART. 117. BENEFÍCIO DO TRABALHO EXTERNO. CONCESSÃO DE OFÍCIO. - Somente é admissível o cumprimento de pena em residência particular se o condenado beneficiário do regime aberto, enquadra-se em uma das situações previstas no art. 117, da Lei de Execução Penal". Ementa Parcial (STJ, HC nº 17035-SP, 6ª Turma, Relator Min. Vicente Leal, Fonte: DJ DATA: 11/03/2002 PG: 00281). “HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. REGIME ABERTO. AUSÊNCIA DE CASA DE ALBERGADO NO LOCAL DE CUMPRIMENTO DA PENA. PRISÃO DOMICILIAR. IMPOSSIBILIDADE. I - A Lei de Execução Penal traz em caráter estrito em seu art. 117, as
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
hipóteses em que se permitirá a um condenado a regime aberto cumprir sua sanção em domicílio particular. II – A impossibilidade material do estado instituir casa de albergado não autoriza de forma alguma o poder judiciário a conceder a prisão-albergue domiciliar fora das hipóteses enumeradas no artigo supracitado. III - Ordem conhecida e denegada à unanimidade de votos (TJMA - HC 019457/2003 - (47.160/2003) – São Bernardo - 2ª C.Crim. - Relª Desª Nelma Celeste Sousa Silva Sarney Costa - j. 13.11.2003). Em verdade, o Ministério Público concorda com aqueles que defendem que uma boa saída para o caso em tela, para se evitar o ‘estado de impunidade’ consagrado pela restituição prematura da liberdade como no caso em análise, mas, ao mesmo tempo, não se desviar da finalidade da pretensão executória, seria a de se ajustar as condições do regime semiaberto para cumprimento da reprimenda por parte do paciente em algum estabelecimento penal, permitindo-se, se for o caso, o trabalho externo, bem como a freqüência de cursos. Referida solução, aliás, vem sendo adotada com total êxito pela Vara de Execuções Criminais desta Comarca, e plenamente aceita pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça: “HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. CUMPRIMENTO DE PENA EM REGIME MAIS GRAVOSO DO QUE AQUELOUTRO ESTABELECIDO NO DECRETO CONDENATÓRIO. INEXISTÊNCIA DE VAGAS. ADEQUAÇÃO AO COMANDO DA SENTENÇA. ORDEM DENEGADA. I. O regime imposto na sentença deve informar a sua execução, não importando, contudo, em constrangimento ilegal o tempo de permanência necessário à transferência do condenado do estabelecimento próprio da prisão provisória para aqueloutro ajustado ao regime decretado na condenação imposta. II. Tal tempo deve subordinar-se ao princípio da razoabilidade, que faz injustificável transferência que se retarde por mais de 30 dias. III. Compete ao Juiz, à luz da norma insculpida no artigo 66, inciso VI, da Lei de Execuções Penais, que lhe reclama zelo pelo correto cumprimento da pena, decidir sobre a questão da inexistência de vaga ou de estabelecimento adequado, adotando providência para ajustamento da execução da pena ao comando da sentença. IV. Em se mostrando zeloso o Magistrado na execução da sentença, ajustando o cumprimento da pena ao regime adequado, ainda diante da ausência de vaga no estabelecimento próprio, não há falar em constrangimento a ser reparado pelo remédio heróico. V. Ordem denegada” (STJ - HC 21599/MG - 6ª Turma - Rel. Min. Hamilton Carvalhido - Decisão Unânime - j. 18/12/2002 - DJU 17/03/2003, p. 290). Digno de nota que, recentemente, a Autoridade impetrada havia editado as Portarias n°s 004/2011 e 006/2011, mediante as quais concedia prisão domiciliar a todos os condenados primários em cumprimento de pena no regime semiaberto, o que mereceu pronta intervenção do Ministério Público que através do writ n° 0005717-68.2011.8.06.000 questionou a ilegalidade das referidas Portarias, em razão do teor das mesmas ferir de morte o disposto no art. 117, da Lei de Execução Penal e legislação penal aplicável à espécie. Cumprindo-nos informar que a Exmª. Srª. Desª FRANCISCA ADELINEIDE VIANA, Relatora do mandamus junto ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, concedeu a liminar pleiteada, suspendendo os efeitos das Portarias n°s 004/2011 e 006/2011, inclusive,
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
emprestando-lhe efeito ex tunc, de modo a suspender a prisão domiciliar a presos no regime semiaberto e que tenham por fundamento as referidas Portarias (cópia anexa). Como se vê, mostra-se totalmente equivocado o entendimento esposado pelo MM Juiz de primeiro grau, na medida em que contrário à lei, à doutrina e à jurisprudência contemporâneas. Lado outro, causa espécie perceber como alguns segmentos da sociedade - inclusive através de autoridades constituídas - parecem relegar a memória da vítima e a dor dos respectivos parentes a um segundo plano, voltando seus olhos, com exclusividade, para o autor do crime, como se fosse uma vítima "do sistema". Sem perder de vista a natureza dos fatos que ensejaram a condenação do sentenciado e na esperança de que a memória da vítima não fique limitada a um frio RELATÓRIO DE NECRÓPSIA, confia o Ministério Público, enquanto defensor da sociedade e detentor de uma procuração moral da família da vítima, que o Poder Judiciário do Estado do Ceará, a exemplo das hipóteses análogas trazidas à colação, haverá de exigir o cumprimento da pena do reeducando nos termos da lei. Vale dizer, no regime semiaberto, mantendo a obrigação do recolhimento ao cárcere nos dias de folga, assim entendidos, os finais de semana e feriados. Agindo assim, em estrita consonância com a ordem jurídica vigente, evitar-se-á o que o autor Edílson Mougenot Bonfim, com seu costumeiro brilhantismo, denomina de "crime moral contra as famílias das vítimas": "E que regressão, e que paradoxo quando falamos em progresso...É bem verdade que antigamente a lei de Talião determinava: ´oculum pro oculo, dentem pro dente...´...Depois, as engrenagens da sociedade foram girando, e o conceito e a finalidade da pena, cambiante, foi sofrendo alterações, chegando-se, primeiro, a um apogeu, a um tal ponto de recrudescimento, de dureza, a uma tamanha barbárie, como aquela da Idade Média, das torturas, da inquisição, da fogueira, que a pena não conhecia limites e era desmedidamente aplicada. Depois, veio o chamado período iluminista, e o homem começou a questionar a idéia de pena cruel, sem medida, sem critério. Começou a queda. Se antes dera-se o excesso, depois veio a vacilação, e a pena, hoje, para muitos casos, ouso dizer, é tão pequena, que pena, pena mesmo, tenho é das vítimas, da sociedade, eis que as penas, muitas delas, extremamente desproporcionais aos delitos praticados, porque fracas, perderam qualquer força intimidativa que poderiam ter, já não tendo o condão de obstar, pela ameaça de sua aplicação, a ação do criminoso que se direciona ao ilícito...Então, a legislação foi se tornando ano a ano mais doce, mais ´pro reo´, e qual seria o limite, ou o ponto de parada? Pergunto-me se já não estaria agora havendo um excesso contrário...Antes dava-se o excesso de pena, a supressão de direitos e garantias individuais, agora o excesso de perdão; excesso de piedade, contra quem age sem nenhuma piedade. Excesso de blandícia, mesmo diante de quem corrói os laços da fraternidade social destilando o ódio ácido do crime...Antes o Estado respondia com um verdadeiro crime contra o criminoso, dada a inexistência de limites até éticos às penas aplicadas; agora, responde com um verdadeiro ´crime moral´contra as famílias das vítimas, que entregaram ao Estado o chamado ´jus puniendi´, na esperança de que este efetivamente puniria, mas, muitas vezes, tragadas pela dor, as famílias enlutadas são obrigadas a assistir à impunidade do malfeitor, e sentem-se logradas..." (trecho extraído da obra "No Tribunal do Júri", editora Saraiva).
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE EXECUÇÃO PENAL E CORREGEDORIA DE PRESÍDIOS DA COMARCA DE FORTALEZA
Segundo a clássica lição de Rui Barbosa, o sistema do controle difuso pode ser condensado em única regra: “A inaplicabilidade do ato inconstitucional do Poder Executivo, ou Legislativo, decide-se, em relação a cada caso particular, por sentença proferida em ação adequada e executável entre as parte” (Cf. Atos inconstitucionais (1893), Campinas: Russel, 2003, p. 102). Assim, enquanto não for modificado o disposto no art. 117, da Lei de Execução Penal com previsão de prisão domiciliar apenas para sentenciados em cumprimento de pena no regime aberto e em casos excepcionais, a vigência desse preceito persiste, nada impedindo, pois, que os juízes e tribunais o apliquem, mesmo porque as decisões do Supremo Tribunal Federal, ainda que reiteradas, só terão efeitos vinculantes em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário, quando as mesmas vierem a ser sumuladas, ou seja, aprovadas por decisão de dois terços e seus Ministros (Constituição da República, art. 103-A). Por derradeiro, vale mencionar a célebre frase de Rui Barbosa em discurso proferido perante a turma de 1920 da Faculdade de Direito de São Paulo, que ficou conhecido como Oração aos Moços - “Devemos tratar iguais com igualdade e desiguais com desigualdade na medida que se desigualam”. Justifica-se portanto o tratamento mais rigoroso ao infrator dos crimes hediondos. Ante o exposto, requer o Ministério Público seja o presente agravo em execução conhecido e, no mérito, provido, reformando-se a r. decisão de primeiro grau, a fim de que seja indeferida a prisão domiciliar e restabelecida a obrigação de recolhimento do sentenciado nos dias de folga junto ao estabelecimento prisional para presos em cumprimento de pena no regime semiaberto. Termos em que Pedem deferimento Fortaleza/CE, 02 de setembro de 2011. HUGO VASCONCELOS XEREZ JOSÉ EVILÁZIO ALEXANDRE DA SILVA Promotor de Justiça Promotor de Justiça SANDRA VIANA PINHEIRO Promotora de Justiça
Recommended