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CENTRO UNIVERSITÁRIO DE BELO HORIZONTE – UNI-BH
Relações Internacionais
NATHÁLIA ROCHA FERREIRA
FORMAS DE DOMINAÇÃO DA MASSA E GOVERNOS
TOTALITÁRIOS:
(HITLER E MAO TSE -TUNG)
Belo Horizonte – MG
2008
NATHÁLIA ROCHA FERREIRA
FORMAS DE DOMINAÇÃO DA MASSA E GOVERNOS
TOTALITÁRIOS:
(HITLER E MAO TSE -TUNG)
Trabalho apresentado à disciplina Monografia II do 8º período do curso de Relações Internacionais do Centro Universitário de Belo Horizonte - Uni-BH, como requisito para aprovação.
Orientadora: Alexandra Nascimento
Belo Horizonte - MG
2008
NATHÁLIA ROCHA FERREIRA
FORMAS DE DOMINAÇÃO DA MASSA E GOVERNOS TOTALITÁRIOS:
HITLER E MAO TSE-TUNG
Monografia apresentada ao Curso de Relações Internacionais do Centro Universitário de Belo Horizonte –UNI-BH. Orientador: Alexandra do Nascimento Passos
Monografia defendida e aprovada em: 15 de dezembro de 2008 Banca examinadora: __________________________________________________ Prof. Dawison Elvécio Belém Lopes DCJPG/UNI-BH __________________________________________________ Prof. Túlio Sérgio Henriques Ferreira DCJPG/UNI-BH
Sinceros agradecimentos aos meus professores que ao longo da
graduação contribuíram para o meu crescimento acadêmico e
pessoal. E agradeço em especial, minha orientadora Alexandra do
Nascimento Passos, pela confiança e incentivo.
“Se vivêssemos com os direitos que recebemos da natureza e segundo
os preceitos que ela ensina, seríamos naturalmente submissos a nossos
pais, súditos da razão, mas escravos de ninguém” (ETIENNE DE LA
BOÉTIE)
RESUMO
O projeto apresentado tem como objetivo estudar as formas de dominação de regimes
totalitários sobre as massas populares. Através da dominação, consentida em diversas áreas da
sociedade. Nesse contexto, a análise do projeto abordará diferentes conceitos para este líder,
que através de três principais óticas será abordado primeiramente por Hannah Arendt, como
líder totalitário; por Weber, como líder carismático, e, por fim, por La Boétie, como tirano.
Mediante análise histórica dos casos estudados, poderá ser observada uma linha de
ação característica dos governos totalitários. Mesmo sendo estes governos, com ideologias
políticas antagônicas, podemos observar essa postura convergente entre os líderes dos casos
estudados.
Nota-se, nesse projeto, que não se pode explicar a servidão da massa somente através
do poder coercitivo, mas sim através da imagem de um líder carismático mistificado e
cultuado. De qualquer forma este líder não alcançaria a Revolução sem antes existir uma
abertura em um Estado falido.
PALAVRAS CHAVE: Dominação – Totalitarismo – Líder carismático – Servidão voluntária
LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Vendas inglesas de ópio para a China........................................... 35
SUMÁRIO
CAPÍTULO I – Fundamentação Teórica...................................................................05
1.1 O totalitarismo...........................................................................................................06
1.1.2 Totalitarismo e propaganda....................................................................................09
1.2 Os tipos de dominação...............................................................................................11
1.2.1 Racional Legal......................................................................................................11
1.2.2 Racional Legal Patriarcal......................................................................................12
1.2.3 Carismática............................................................................................................13
1.3 Servidão Voluntária..................................................................................................15
CAPÍTULO II – Histórico........................................................................................19
2.1 Alemanha..................................................................................................................20
2.2 China..........................................................................................................................34
CAPÍTULO III – Análise.........................................................................................47
ANEXO...................................................................................................... 61
BIBLIOGRAFIA.......................................................................................64.
5
INTRODUÇÃO
O trabalho apresentado tem por objetivo estudar regimes totalitários – sua origem e
formação – visando entender como estes governos se erguem e conquistam a servidão
voluntária da massa. O projeto apresentado propõe o estudo dos meios de dominação
utilizados pelos líderes totalitários. Tomando como referência a história vivida pela Alemanha
no período entre guerras até a queda de Hitler e a história da China pré-revolucionária até a
morte de Mao Tse-tung, os regimes totalitários serão analisados a partir do pensamento de três
principais autores: Hannah Arendt, Weber e Etienne de La Boetie.
O primeiro capítulo utilizará os autores acima citados como forma de sustentação teórica
às idéias defendidas ao longo do trabalho. O primeiro conceito se dedicará a entender o que
são os regimes totalitários, o segundo especificará o que é o líder carismático e sua relação
com a massa, e por fim, o terceiro discorrerá sobre a servidão voluntária que buscará explicar
porque os homens se sujeitam à tirania.
O segundo capítulo será dedicado a descrever historicamente os antecedentes de uma
revolução política que terá como princípio uma anterior desordem nacional, e a ascensão
destes dois partidos: nazista e comunista, objetos de estudo do projeto.
O terceiro capítulo terá o objetivo de analisar as informações recolhidas ao longo do
projeto para, por fim, estudar com maior profundidade e especificidade os governos acima
citados, utilizando a teoria para explicar os fatos ocorridos e analisando os discursos feitos
pelos dois governantes. Neste capítulo cada característica dos governos totalitários, líder
carismático e servidão voluntária será demonstrada através dos acontecimentos históricos.
Será também analisada a tendência que Estados falidos, descritos por Jackson (1990), tentem
para a revolução.
6
CAPÍTULO 1
1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
1.1 O Totalitarismo
A fundamentação teórica do trabalho será dividida em três principais conceitos, sendo uma
delas o totalitarismo presente nos governos de Hitler e Mao Tse-Tung1. Assim como para a
autora Hannah Arendt(1989), Bobbio(2000) caracteriza o totalitarismo como uma política uni
partidária de massa, onde o líder possui domínio total sobre a sociedade em todas as áreas:
política, comportamento social, economia, cultura, acesso as informações, cultura, arte e tudo
aquilo que afeta a sociedade dentro de um Estado. Esse domínio existe para que segundo La
Boétie (1986) a sociedade permaneça em estado de servidão voluntária, mantendo o controle
social dentro do domínio do governante tirano. A conquista e domínio da massa tornam-se,
então, imprescindíveis para a formação de um governo totalitário. Arendt descreve essa
importância.
Os movimentos totalitários são organizações maciças de indivíduos atomizados e isolados. Distinguem-se dos outros partidos e movimentos pela exigência de lealdade total, irrestrita, incondicional e inalterável de cada membro individual. (ARENDT, 1989 : 373)
Para que os movimentos totalitários se tornem um dia um partido único no governo, é
preciso primeiramente recrutar seus membros entre a massa que teoricamente não possui
acesso aos acontecimentos políticos do país, ou aparentemente são indiferentes. O primeiro
1 No período em que a autora Hanna Arendt escreve, a China ainda está iniciando seu processo de mudança governamental, por isso é somente citada em seu livro a possibilidade de Mao Tse-Tung ser um futuro governante totalitário, mas ela não aprofunda seus comentários já que neste período Hanna Arendt ainda não possui informações suficientes para caracterizá-lo com tal.
7
caso pode ser enquadrado pelos camponeses da China, recrutados por Mao Tse-Tung, e o
segundo se encaixa, segundo a autora, na perspectiva alemã que passava por uma forte crise
econômica, tornando a massa por conseqüência aparentemente ausente das decisões políticas
do país. Esta massa alemã é, segundo Arendt (1989), excluída e esquecida pelos outros
partidos de direta.
A ascensão de governos totalitários na Europa fez cair por terra duas ilusões que os países
democráticos europeus tinham: a primeira de que a porcentagem da população que não se
envolvia na política era minoria; e a segunda é que essas massas neutras realmente não se
importavam com a política de seus países. Hitler conseguiu primeiramente força neste grupo,
que se revelou uma grande massa engajada no partido nazista, fortalecendo-o cada vez mais.
Após recrutar a massa, o movimento totalitário tenta acabar com as classes dentro do país
para que haja uma unificação entre proletários e burgueses. Estas extintas classes deverão ter
um objetivo comum contra um inimigo externo. No caso da China, existe ainda a influência
marxista2 :
Os nossos interesses e as nossas tarefas consistem em tornar a revolução permanente, até que seja eliminada a dominação das classes mais ou menos possuidoras, até que o proletariado conquiste o poder do Estado, etc. Para nós não se trata de reformar a propriedade privada, mas de aboli-la; não se trata de atenuar os antagonismos de classe, mas de abolir as classes: não se trata de melhorar a sociedade existente, mas de estabelecer uma nova (MARXM/ENGELS,1989:42)
Essa teoria marxista visará à extinção das classes com o objetivo de acabar com a exploração
burguesa sobre o proletariado, e em nível internacional, ela se torna uma luta contra o
imperialismo estrangeiro. Em sua obra, Mao Tse- tung (1982) adapta o que seria a teoria
marxista-lenista para a realidade Chinesa:
2 Segundo CHAUÍ, Marilena (1999) as idéias de La Boetie em Servidão Voluntária, tiveram influência na teoria marxista. Apesar de Rothbard ter afirmado no artigo sobre Servidão Voluntária que La Boetie não aprofunda na discussão sobre anarquia, outro autor existente no texto: (Bonnefon, op. cit., "Introduction," p. xliii. In s hort, even Bonnefon, reacting gingerly to the radical nature and implications of La Boetie's work, classified it as anarchist.) afirma existir sim um viés anarquista em LaBoetie.
8
Numa sociedade sem classes, cada indivíduo, como membro da sociedade, colabora com os demais, estabelece com eles determinadas relações de produção e realiza uma atividade de produção, a fim de resolver os problemas da vida material dos homens.” (MAO TSE-TUNG 1982: 79)
Na Alemanha, a extinção das classes significou um colapso no sistema partidário que já
não tinha mais razão de existir. Com a ausência das classes, os partidos não tinham que
defender o conflito de interesses entre os diversos grupos, isso facilitou a consolidação do
partido único alemão liderado por Hitler.
Visto que para um governo que se intitula totalitário é necessário “acabar com a existência
autônoma de qualquer atividade” (ARENDT,1989: 372). A proibição de qualquer atividade
autônoma no governo totalitário inclui, entre outras, expressão política, ideológica, cultural ou
religiosa que se opõem às idéias do novo líder. Construindo um pensamento e comportamento
padronizado, fica mais fácil o domínio da massa.
Para a padronização do comportamento, é necessária a utilização de uma disseminação
homogenia das idéias revolucionárias. E esta será feita através da propaganda política.
9
1.1.2 Totalitarismo e propaganda:
Após a utilização da propaganda pelos governos totalitários com o objetivo de persuadir a
massa, a palavra “propaganda” ganhou significado pejorativo de enganação e ilusão, caindo
em descrédito:
A propaganda pode ser definida como difusão deliberada e sistemática de mensagens destinadas a um determinado auditório e visando a criar uma imagem positiva ou negativa de determinados fenômenos (pessoas, movimentos, acontecimentos, instituições, etc.) e a estimular determinados comportamentos. A propaganda é, pois, um esforço consciente e sistemático destinado a influenciar as opiniões e ações de um certo público ou de uma sociedade total. (BOBBIO,2000:1018)
No período anterior a consolidação do Estado totalitário, a propaganda possui um objetivo
bem específico: é preciso dialogar com a massa de forma plausível, já que neste momento
ainda existem influências externas dentro do país que podem fazer oposição ao governo. Neste
período o acesso à informação é gerado por vários meios além do Estado. Já no período em
que o Estado já se consolidou como um governo totalitário, a propaganda terá o papel de
manter a massa apoiando o governo através de propagandas muitas vezes ilusórias. Neste
período, o governo já possui total domínio também sobre a imprensa nacional.
A propaganda poderá também ser utilizada como meio de tirar a atenção dos problemas
internos e engrandecer as façanhas e o poder do governante em regiões distantes das áreas
urbanas3 e onde a massa não terá condições de descobrir a real situação do país. O fato de a
população possuir tanta crença nestes governantes gera uma credibilidade cega em relação às
propagandas. Neste contexto, Bobbio (2000) afirma que a idéia de manipulação de grandes
massas através da propaganda surgiu no século XX com os governos totalitários.
Quando Arendt (1989) escreve: “todo programa político definido que trate de assuntos
específicos em vez de referir-se a questões ideológicas que serão importantes durante séculos
3 Os judeus e primeiramente os comunistas foram levados para campos de concentração longe de Berlim, o centro urbano da Alemanha.
10
é um entrave para o totalitarismo” (ARENDT, 1989: 373), ela demonstra como os governos
totalitários estão voltados para uma ideologia grandiosa, que pretendem trazer resultados a
longo prazo. Neste contexto, a luta pela ideologia nazista ou comunista existe por um objetivo
maior, que será reconhecido no futuro. E é neste argumento de “uma vida melhor no futuro”
que Mao Tse-Tung e Hitler se apóiam para conseguir o apoio da massa. Seguem abaixo os
discursos de Hitler e Mao Tse-Tung justificando a invasão da Áustria e Tibet.
Versión de Hitler, 1938 “Nuestra tarea ahora se llevará a través del trabajo, a través de la industria, a través del esfuerzo común y de encontrarnos unidos para resolver los grandes problemas sociales, culturales y econômicos y sobre todo, para desarrollar más y más a Áustria y ponerla como uma avanzada de sentimiento y de La fuerza de voluntad Nacional Socialista.” Hitler,hablando,marzo 15, 1938 em Viena (WALKER,1966:33) Version de Pekín, 1959 “El Comitê Preparatório para la Región Autônoma de Tibet, debe, de acuerdo com la Constituición, com las aspiraciones de las masas del pueblo y com las característias sociales, económicas y culturales del Tibet, llevar a cabo, paso por paso, reformas democráticas y librar al pueblo del Tibet del sufrimiento, para poder poner las bases em la construcción de um próspero Tibet socialista.” “Resolución” Congresso Nacional del Pueblo, abril 28, 1959 (WALKER,1966:33)
Se verificarmos os 25 pontos (em anexo) do programa do partido nazista pode-se perceber
quão ambiciosos são os objetivos apresentados à massa. No caso da China, o Plano
Qüinqüenal4 apresentou objetivos mais específicos que acabaram por comprometer o governo
e a ideologia comunista de Mao Tse-Tung, que ao longo dos anos perdeu força no novo
contexto mundial. As décadas de 70 e 80 marcaram o começo da crise para os Estados
comunistas, que já não conseguiam mais alcançar as altas taxas de crescimento vistas
anteriormente e nem conseguiam acompanhar os avanços científicos tecnológicos vistos nos
4 O Plano Qüinqüenal de Mao Tse-Tung foi auxiliado pela URSS, e possuía objetivos puramente econômicos com o desenvolvimento industrial do país. Já o Plano Quadrienal de Hitler visava uma economia de guerra para a Alemanha.
11
países capitalistas. Segundo Weber (2004), este tipo de crise estatal pode significar o início da
crise também do líder carismático.
1.1 OS TRÊS TIPOS PUROS DE DOMINAÇÃO (WEBER)
Em seu livro, Max Weber (2004) legitima três tipos puros de dominação: a Burocrática, a
Tradicional e a Carismática. Esta ultima será utilizada como base teórica para alguns
conceitos estudados ao longo da pesquisa. Para Weber, o conceito de dominação consiste na
“...probabilidade de encontrar obediência para ordens específicas (ou todas) dentro de
determinado grupo de pessoas.” (WEBER, 2004: 139)
1.2.1 Dominação Legal ou Burocrática
Em virtude da existência de um estatuto, seu tipo mais puro é a dominação burocrática e
sua idéia básica é que qualquer direito pode ser modificado através de um estatuto
corretamente sancionado. Neste tipo de dominação, a obediência existe em virtude de uma
regra estatuída que estabeleça quem deve ser obedecido e em qual medida. E nesta
dominação quem ordena fica também sujeito ao regulamento por ele estabelecido.
O tipo de dominação legal está situado na estrutura moderna do Estado e municípios,
assim como dentro de uma empresa capitalista privada. Mas o tipo mais puro – a burocracia –
não é sempre exclusivo na dominação legal. Existem ainda associações políticas como os
“monarcas” ou os “presidentes” que foram eleitos pelo povo e não são considerados
funcionários contratados. A burocracia eletiva é uma característica dos Estados modernos e,
principalmente, dos Estados democráticos.
12
1.2.2 Dominação Tradicional ou Patriarcal
O tipo mais puro da dominação tradicional é a patriarcal que baseia sua fidelidade em
virtude da dignidade própria do “senhor”, santificada pela tradição. Segundo Weber (1991),
caso o “senhor” não puna qualquer tipo de violação, a sua legitimidade do próprio domínio
seria colocada em risco. As normas e direito deste tipo de dominação vêm através do
reconhecimento e de um estatuto que sempre existiu legitimamente.
Existem, porém, duas modalidades deste tipo de dominação: a estrutura puramente
patriarcal que possui dependência pessoal do “senhor”, sendo estes: (filhos, escravos, servos,
eunucos e plebeus); e a outra estrutura é a estamental, os servidores não são pessoalmente do
senhor, e sim pessoas independentes cuja administração é feita por conta própria.
A forma de dominação do primeiro exemplo (do pai de família, o chefe daquela
sociedade) possui o tipo mais puro da dominação tradicional, já o segundo exemplo está muito
mais ligado à dominação legal do poder administrativo.
1.2.3 Dominação Carismática
A dominação carismática de Weber (1991) se caracteriza em virtude da devoção afetiva
ao líder que possui qualidades excepcionais como: poderes mágicos (o profeta), revelações ou
heroísmo (o herói guerreiro), e poder intelectual ou de oratória (o demagogo). Qualidades tais
que ao se juntarem - o herói guerreiro e o demagogo – na figura de um só homem, servirá de
ponto de apoio para o surgimento do totalitarismo do século XX através de Hitler e Mao Tse-
Tung, que foram guerreiros e demagogos.
A autoridade carismática baseia-se na “crença” no profeta ou no “reconhecimento” que encontram pessoalmente o herói guerreiro, o herói da rua e o demagogo, e com eles cai. E, todavia, sua autoridade não deriva de
13
forma alguma desse reconhecimento por parte dos submetidos, mas ao contrário: a fé e o reconhecimento são considerados um dever, cujo cumprimento aquele que se apóia na legitimidade carismática exige para si, e cuja negligência castiga. Sem dúvida, a autoridade carismática é uma das grandes forças revolucionárias da História5, porém em sua forma totalmente pura tem caráter eminentemente autoritário e dominador (WEBBER, 1991:136).
Tomando como referência a história vivida na Alemanha pré II Guerra Mundial e na
China pré Revolução comunista no século XX, será analisada a ascensão de líderes
carismáticos ao poder. Segundo Weber (2004), o líder carismático é caracterizado pelos seus
poderes quase sobrenaturais, que lhes é dado através da percepção dos dominados.
Denominamos “carisma” uma qualidade pessoal considerada extracotidiana (na origem, magicamente condicionada, no caso tanto dos profetas quanto dos sábios curandeiros ou jurídicos, chefes de caçadores e heróis de guerra) e em virtude da qual se atribuem a uma pessoa poderes ou qualidades sobrenaturais, sobre-humanos ou, pelo menos, extracotidianos específicos ou então se toma como enviada por Deus, como exemplar e, portanto, como “líder” . O modo objetivamente “correto” como essa qualidade teria de ser avaliada, a partir de algum ponto de vista ético, estético ou outro qualquer, não tem importância alguma para nosso conceito: o que importa é como de fato ela é avaliada pelos carismaticamente dominados – os “adeptos”. (WEBER, 2004 :159)
O tipo ideal6 Weberiano – a autoridade carismática – encontra sua “expressão formal” em
Adolf Hitler e Mao Tse Tung, líderes que, apoiados em distintas ideologias, dominaram as
massas, fazendo com que a maior parcela destas apoiasse7 seus atos, entendidos por eles como
necessários para atingir os objetivos da grande nação.
5 Grifo nosso. 6 Cabe ressaltar que “o tipo ideal só existe como utopia e não é, nem pretende ser, um reflexo ou uma repetição da realidade, muito menos um modelo do que deveria ser o real, o que nunca corresponde exatamente ao que se vê no conceito típico-ideal, mas pode ser explicado por ele em seus traços considerados essenciais” (QUINTANEIRO, 1995: 133). 7 Ver Arendt (1989): “É muito perturbador o fato de o regime totalitário, malgrado o seu caráter evidentemente criminoso, contar com o apoio das massas. Embora muitos especialistas neguem-se a aceitar essa situação, preferindo ver nela o resultado da força da máquina de propaganda e de lavagem cerebral, a publicação, em 1965, dos relatórios, originalmente sigilosos, das pesquisas de opinião pública alemã dos anos 1939-44, realizadas então pelos serviços secretos da SS (Meldungen aus dem Reich Auswahl aus den Geheimen Lageberichten des Sicherheitsdienstes der S.S. 1939-1945 [ Relatórios do Reich. Seleção dos relatórios sigilosos colhidos pelo Serviço de Segurança da S.S], Neuwied & Berlin,1965), demonstra que a população alemã estava
14
O líder carismático tem que provar o merecimento do carisma todo o tempo, caso
contrário, sua autoridade perde força e valor perante os dominados. No caso da China, Walker
(1966) explica o perigo do esquecimento da sociedade através do merecimento carismático. O
fato de o governo conseguir êxitos significativos em suas políticas durante um longo período,
justifica o uso da violência contra o próprio povo chinês e aumenta a confiança da massa no
governo totalitário e em suas ideologias impostas.
Se por muito tempo não há provas do carisma, se o agraciado carismático parece abandonado por seu Deus ou sua força mágica ou heróica, se lhe falha o sucesso de modo permanente e, sobretudo, se sua liderança não traz nenhum bem–estar aos dominados, então há a possibilidade de desvanecer sua autoridade carismática.” (WEBER, 2004: 159)
Apesar de o líder carismático ter sempre que evitar qualquer tipo de calamidade mantendo
sempre o bem-estar do povo, o hábito é descrito por Weber (1991), assim como por La Boétie
(1986) como um ponto fundamental para a existência do domínio. Para o primeiro, a crença na
legitimidade é a junção do hábito tradicional com o prestígio carismático – que vem através
das façanhas heróicas - já para o segundo, o hábito fará com que a massa se esqueça de sua
natureza libertária, e seja dominada facilmente.
Outro ponto de convergência entre os autores citados acima é a legitimação do domínio,
ou seja, o líder somente será legitimado enquanto a massa o obedecer e o enxergar como um
líder. Por isso é fundamental a existência de meios de controle social utilizados na Alemanha
e na China, para a manutenção da obediência da massa.
Durkheim (BOUDON, 2000), que apresenta o conceito de “educação moral” como sendo:
“o conjunto dos recursos materiais e simbólicos de que uma sociedade dispõe para assegurar a
conformidade do comportamento de seus membros a um conjunto de regras e princípios
prescritos e sancionados” (BOUDON, 2000:101), pode ter sua idéia complementada por La
notavelmente bem informada sobre o que acontecia com os judeus ou sobre a preparação do ataque contra a Rússia, sem que com isso se reduzisse o apoio dado ao regime.
15
Boétie (1986), que descreve a liberdade como sendo um bem natural do ser humano. Dessa
forma, a relação de obediência voluntária pode assim ser entendida como uma coerção física
ou social para manter a relação entre dominantes e dominados.
1.3 O Discurso da Servidão Voluntária (ETIENNE DE LA BOÉTIE)
A execução de domínio de um governante sobre a sociedade somente é possível
quando a própria sociedade o permite e deposita sua confiança neste líder. Desta maneira,
Etienne de La Boétie, (1975) discute porque o povo obedece a um governante tirano; a
natureza libertária dos seres humanos, de forma que esta obediência seja contrária à natureza
humana; e a corrupção tirânica para manutenção desta tirania.
La Boétie (1986) questiona a obediência cega de milhares de pessoas em relação a um
único homem que através da tirania controla, manipula, corrompe e escraviza seus próprios
súditos. Essa obediência, segundo ele, não pode ser por pura e simples covardia. A princípio, a
servidão é mantida contra a vontade do povo e através da força.8 Passado o período de
resistência, o povo se acostuma a servir, e os filhos destes servos já nascerão servos, tendo
nunca conhecido a liberdade. Sendo assim, a servidão passa a ser voluntária de forma
irracional e habitual. “Entretanto, o hábito, que em todas as coisas exerce um império tão
grande sobre todas as nossas ações, tem principalmente o poder de ensinar-nos a servir”
(CLASTRES et al , 1986:84)
Este senhor, porém, só tem dois olhos, duas mãos, um corpo e nada além do que tem o último habitante do número infinito que tem nossas cidades. O que
8 Neste ponto faz-se diferença entre governos totalitários e ditaduras. Segundo Arendt (1989), as ditaduras na Europa não chegam ao estágio de governos totalitários, pela falta de material humano, que obriga as ditaduras a moderar o uso da força. “Por isto, também o nazismo, antes do início da guerra, ficou tão aquém do seu similar russo em matéria de coerência e crueldade, uma vez que nem sequer o povo alemão era suficientemente numeroso para permitir o completo desenvolvimento dessa nova forma de governo.”
16
tem a mais que vós são os meios que lhe ofereceis para destruir-vos (CLASTRES et al, 1986:78)
O tirano, que em princípio é um ser humano comum para La Boetie (1986), apenas possui,
de diferente, os meios de destruição do povo, que o próprio povo lhe fornece. Um tirano sem o
apoio do povo é somente mais um homem, mas quando lhe é dado uma “qualidade pessoal
extracotidiana” (Weber, 1999), este homem se torna um Deus, que utiliza seus súditos para
serem seus ouvidos, suas mãos e seus pés9 perante outros súditos. Nesta relação, o tirano
consegue realizar a manutenção de seu poder, através da ajuda do próprio povo.
La Boetie (1986) acredita na natureza libertária do ser humano, por isso afirma que,
quando ocorre a servidão voluntária ao tirano, é pela força ou por promessas ilusórias feitas ao
povo. A obediência voluntária é um fato contrário à esta natureza libertária do ser humano, e o
hábito que a dominação traz com o tempo acaba nos ensinando a servir. “Se vivêssemos com os
direitos que recebemos da natureza e segundo os preceitos que ela ensina, seríamos naturalmente
submissos a nossos pais, súditos da razão, mas escravos de ninguém”10
La Boetie (1986) faz diferença entre três tipos de maus príncipes tiranos: o primeiro
príncipe é aquele que conquista outro reino pela força através da guerra; o segundo tipo são os
príncipes que possuem seu reino pela sucessão da raça, estes “consideram os povos a eles
submetidos como seus servos hereditários” (CLASTRES et al ,1986:82) e, finalmente, o
terceiro tipo é aquele príncipe eleito pelo povo. Viciado pelo sentimento de grandeza, deseja
não mais sair desta posição, pelo contrário, deseja reverter seu governo em “despotismo
hereditário” (ROTHBARD, 1975). Este tipo de tirano afasta as idéias libertárias que poderiam
surgir em meio ao povo e poderia até mesmo, segundo La Boetie (1986), superar os outros em
barbárie, já que não conseguem encontrar outra maneira de impor sua tirania, que não seja
9 As mãos que são utilizadas para golpear e os pés que destroem e varrem as cidades, vem do próprio povo contra eles mesmos, a maior arma de um tirano, são seus súditos. 10LA BOÉTIE, Etienne de; CLASTRES, Pierre; LEFORT, Claude; CHAUÍ, Marilena de Souza. Discurso da servidão voluntaria. 3a ed. São Paulo: Brasiliense, 1986. 239p. (Elogio da filosofia )
17
pela força. É importante ressaltar que o movimento de governos totalitários, que mescla força
e carisma, surge a partir do século XX com governos como o de Hitler, Stalin e Mao Tse-
Tung.
Um risco que deve ser combatido pelos tiranos são os livros e as doutrinas, que oferecem a
liberdade da razão e discernimento, trazendo idéias libertárias que podem despertar nos
homens o sentimento de dignidade e revolta contra o tirano. Ao ler os estudos de La Boetie
(1986), podemos perceber a idéia de que estes sentimentos de liberdade advêm da natureza
humana, e foram esquecidos pela covardia e pelo “hábito de servir”, para ele, todas as coisas a
que o homem se acostuma, e se adapta torna-se natural, até mesmo a servidão. Através da
doutrinação passada entre as gerações, Hitler e Mao Tse-Tung foram totais em sua dominação,
direcionando o pensamento da massa e restringindo a liberdade de expressão.
As propagandas e os discursos feitos por estes líderes carismáticos influenciam na
“escolha” ideológica do povo. Nestes dois casos, na Alemanha e na China, a ideologia nazista
e a comunista foram expostas de maneira a convencer o povo que aquela era a ideologia que
traria a salvação do país, por isso, o povo deveria lutar por está ideologia, e contra qualquer
outra que a negue.
El Premier Chou En-lai en su mensage al Congreso Nacional del Pueblo: El imperialismo de los Estados Unidos há hecho todo el mal que há podido. Es el agresor más grande que há conocido la historia, el enemigo más feroz de la paz mundial y el principal puntal de las fuerzas reaccionarias del mundo. Los pueblos y naciones de todo el orbe que quieran hacer revolución y liberarse, todos los países y pueblos que quieran alcanzar su independência y salvaguardar su soberania y todos los países y pueblos que quieran defender la paz mundial, deben dirigir lo más enconado de su lucha contra el imperialismo de los Estados Unidos. Peking Review, enero 1, 1965 (WALKER,1966:47)
Sobre a corrupção tirânica, La Boetie (1986) afirma que uma força vital para os tiranos
não são as armas, mas sim um grupo de quatro ou cinco homens que o apóiam e que para ele
18
sujeitam todo o país as suas ordens. Estes homens, segundo ele, acabam dominando o próprio
chefe, influenciando em suas ações cruéis e realizando prazeres pessoais através do poder
adquirido. A pirâmide do poder que inicia com o tirano se abre para mais quatro ou cinco
homens de confiança – que se beneficiam com o poder - e dominam mais cem cada um, e
assim sucessivamente; dessa forma a influência de poder do soberano se espalha por todas as
camadas da sociedade. “E, no entanto, quando penso nessa gente que adula o tirano com
baixeza para explorar ao mesmo tempo sua tirania e a servidão do povo, surpreendo-me quase
tanto com sua estupidez quanto com sua maldade.” (CLASTRES et al ,1986:101)
Mesmo estes “homens de confiança” não podem permanecer tranqüilos em relação à
opressão tirânica. Segundo La Boetie (1986), estes mesmos homens ensinaram ao tirano que
ele tudo pode, e não existe lei ou direito – dentro de seu território – que o impeça de realizar
suas vontades, o tirano é visto como o senhor de todos.
19
CAPÍTULO II
Histórico
Ao longo deste capitulo, serão observadas as diferenças históricas e políticas dos partidos
nazista e comunista chinês. Dentre diversas características, o texto discorrerá sobre as
condições políticas e econômicas de cada país, o tipo de luta travada antes da chegada ao
poder, os oponentes encontrados ao longo de suas histórias, a disposição da massa para a luta
e a durabilidade de suas revoluções.
Algumas características convergentes entre os dois objetos de estudo, tais como a
existência de um Estado falido pré-revolução, o controle político e social existente nos
governos totalitários e, principalmente, a utilização da propaganda como base para o governo
conseguir dominar a massa poderão ser observadas ao longo deste capítulo.
Os alemães, a princípio, possuem como principal inimigo os grupos comunistas dos
bairros proletários, que disputavam o apoio ideológico da massa urbana. Após a ascensão e
fortalecimento do partido, seu maior oponente foram os países que fizeram parte da Aliança e
que conseguiram fazer ruir o Terceiro Reich. Veremos na história da China e do partido
comunista, que a luta através da guerrilha campesina foi travada ao longo dos anos fora da
área urbana e ocorreu de forma gradual, mas duradoura.
É importante observar neste capítulo que, apesar de todo o controle social e a utilização da
força como meio de coerção, nenhum dos regimes estudados emprega somente a política do
terror – observada nas ditaduras autoritárias. A propaganda e o discurso demagogo são a
principal arma para a “Servidão Voluntária”.
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1.2 Alemanha
A crise pós Primeira Guerra Mundial
Este capítulo tem como objetivo apresentar o contexto histórico da Alemanha pós-
Primeira Guerra Mundial. Será estudada a ascensão de um líder carismático e totalitário, que
disseminou suas idéias com grande êxito no país. A história alemã será permeada pela história
vivida por Hitler de 1919 até a queda do terceiro Reich.
O recorte histórico tem início com a derrota alemã na Primeira Guerra Mundial quando
Hitler, assim como outros muitos compatriotas que não se conformam com a fraqueza de seus
governantes e, decidem se envolver efetivamente com a política alemã. No futuro, ele se
tornará um dos chefes militares mais influentes da história, e modificará as relações de força
dentro da Europa.
A vida de Hitler inicia na Áustria, onde nasceu e viveu uma vida de operário e artista
ambulante, dormindo em parques e sobrevivendo de sopas que eram distribuídas
gratuitamente. Ao mudar-se para Munique, Hitler esperava uma vida melhor, e, em 1914 ele
se alista no exército como voluntário para lutar na Primeira Guerra Mundial até o seu fim.
Ao fim da primeira guerra, a crescente insatisfação do povo com o governo acabou
levando a derrubada da antiga ordem política imperial, surgindo assim a República de
Weimar11. “A 9 de novembro de 1918, sob a pressão das greves e das manifestações de rua, o
regime imperial desabara numa tarde” (RICHARD,1993.16). As manifestações, greves,
passeatas que surgiram após a Primeira Guerra, foram sufocadas por Friedrich Ebert –
chanceler que assumiu a direção de governo após a queda de Guilherme II12. Desta república
11 A nova república foi declarada na cidade de Weimar, por isso a intitulação de República de Weimar. 12 Através de Guilherme II, imperador do 2° Reich, a Alemanha apóia o Império Austro-Húngaro contra a Rússia, o que acaba por empurrar o país à I Guerra Mundial.
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surgiram dois poderes concorrentes: a república “social” este representada pelos democratas, e
a república “socialista” que surgiu em nome da esquerda, extrema esquerda e das massas. Em
regra, as instituições democráticas se fundamentam em eleições de sufrágio universal, mas
neste caso a república se fundou em uma aliança de influência que as camadas sociais mais
altas tinham sob Guilherme II. Segundo Lionel Richard (1993), o último imperador
representante do 2° Reich alemão entregou a futura república nas mãos de partidos
antidemocratas de direita.
Com a queda do Império, a Alemanha inicia sua nova fase sem instituições legais ou
constituição própria. Quando após as eleições para representantes da Assembléia de
Constituintes, Ebert decide enviar estes representantes eleitos a um local seguro longe do caos
que se instaurou em Berlim, a cidade escolhida foi Weimar. Em 31 de Julho de 1919, surge a
nova República de Weimar com instituições e a constituição nacional definidas. Durante seu
livro, Hitler descreve a situação do país em seus primeiros anos de República:
Em março de 1919, voltamos de novo para Munique. A situação era insustentável. A continuação da revolução se tornara fatal. A morte de Eisner13 tinha tido apenas o efeito de apressar os acontecimentos, provocando a ditadura dos conselhos, ou, melhor, um domínio temporário dos judeus, objetivo que tinham em vista aquêles que provocaram a revolução (HITLER 1983:137)14
Apesar das tentativas de aumento de influência e poder nos bairros operários de Berlim, o
partido comunista ainda não possui o grande apoio da massa. No ano de 1920 partidários
comunistas tentam derrubar a República de Weimar sem sucesso.
“É em Berlim que um grupo de conspiradores, que rodeia os militares Kapp e Ludendorff, no sábado 13 de março de1920, se apodera dos prédios governamentais. Todavia, é também em Berlim que o grupo é rapidamente isolado pela intervenção não das autoridades no poder, mas da população. Antes mesmo que o governo reagisse, os sindicatos proclamam a greve geral:
13 Kurt Eisner, era descendente de judeus e pertenceu a presidência dos social-democratas independentes no início da República de Weimar. 14 KAMPF, Mein. Adolf Hitler: Minha luta. São Paulo: Moraes, 1983.
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nada de gás, eletricidade ou água. Por ordem de Kapp, cartazes são espalhados pela cidade, anunciando que todo grevista está sujeito a pena de morte. Nada acontece. A 17 de março, Kapp é obrigado a desistir e foge para a Suécia” (RICHARD, 1993.:21).
A falta de apoio da população logo sufoca o golpe, demonstrando a credibilidade do
partido de direita e a ascensão da força operária não comunista no país.
Desde o início de sua vida política no partido Nacional Socialista, Hitler dirigiu suas
forças para conquistar a massa, principalmente dos bairros operários. A importância dada a
este grupo de pessoas é justificada em seu livro “Mein Kampf”:
Se, portanto, a solução favorável do futuro alemão está em ligação íntima com a conquista nacional da grande massa do nosso povo, deve ser esta a mais alta e importante tarefa de um movimento, cuja eficiência não se deve esgotar na satisfação de um movimento, mas deve submeter toda a sua ação a um exame sobre as conseqüências futuras prováveis (Hitler 1983.:216)
Neste mesmo período da década de 20, após o fracasso do golpe e a rígida punição que
sofrem os partidos comunistas, fica evidenciada a tendência alemã – governo e sociedade –
para o apoio aos partidos de direita. Em 1925, após tentativa de golpe de Estado pelo partido
nacional socialista, Hitler é preso, condenado a sete anos de prisão, e somente cumpre nove
meses até a sua libertação. Em contrapartida, membros de partidos de esquerda e extrema
esquerda são severamente punidos por acusações que são consideradas de menor risco à
manutenção da nova República. Desde este período, o medo de um governo comunista na
Alemanha abriu espaço para o crescimento e o fortalecimento de partidos como o nacional
socialista de Hitler.15
Junto com a instabilidade política, a crise financeira que se arrasta desde o fim da Primeira
Grande Guerra produz crescente aumento no número de desempregados, em Berlim e no
subúrbio. A hiperinflação que se estendeu por anos devido à emissão de moeda para
pagamento da dívida de guerra também agravou a crise econômica e social do país. Este 15 Em seu livro “Mein Kampf”Hitler, considera que para a grandeza de um partido (ou de qualquer outra organização) é importante cultivar a intolerância a todas as outras organizações, desta forma a massa será convencida de que somente eles estão com a razão.
23
cenário foi marcado pela disparidade entre dois grupos; de um lado os estrangeiros
(principalmente russos) que trocavam sua moeda com um grande lucro dentro da Alemanha, e,
do outro lado a fome e a miséria vivida pelos alemães que moravam na cidade mais cara do
mundo.
Com base nestas insatisfações, em 1920 são criados por Gottfried Feder, “economista
amador e político maluco” (ARENDT, 1989: 374), os vinte e cinco pontos do programa do
partido nazista, que objetivava o fortalecimento do nacionalismo alemão. Dentre estes, os
pontos 7, 8 e 18 (ver anexo I) atacam diretamente os estrangeiros, enfatizando aqueles que
chegaram à Alemanha com o objetivo de tirar proveito da situação de crise no país, com o
capital especulativo. Em 1924, o país conseguiu se restabelecer vivendo em uma relativa paz e
prosperidade, mas em 1929 a crise mundial atingiu novamente a Alemanha, fazendo com que
grupos industriais e grandes bancos falissem, gerando novamente instabilidade e centenas de
desempregados no país. Neste contexto, a proposta do partido nazista recebe a atenção da
opinião pública. Ao longo do tempo, milhões de desempregados que surgiram com a crise
foram se juntando ao Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães, liderado por
Adolf Hitler, na esperança de eliminar os problemas sociais e políticos alemães. Para atrair a
atenção deste novo público, Hitler serviu-se de propagandas que mesclavam nacionalismo e
exaltação do líder.
Pela primeira vez após a crise de 29, treze nazistas entram para o conselho municipal,
dentre eles, Joseph Goebbels, ministro da propaganda de Hitler, que possui grande destaque
dentro do partido. Com o auxílio da propaganda de Goebbels, os vinte e cinco pontos
seduziram a massa com promessas de emprego, crescimento econômico e levante da grande
nação alemã.
Segundo Richard (1993), autor do livro “Berlim, 1919-1933: a encarnação extrema da
modernidade”, os principais emigrantes que tiveram condição de se tornar a burguesia na
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Alemanha e explorar o proletariado foram os russos que carregaram com eles algum dinheiro
e alguns objetos. No caso dos judeus, os que conseguiram imigrar para a Alemanha, somente
possuíam pouco mais que a roupa do corpo, fazendo assim, parte do proletariado e aumentado
o número de miseráveis na cidade.
O sétimo ponto do programa do Partido Nacional-Socialista refere-se à expulsão destes
estrangeiros que são considerados um peso para o Estado. Com uma política de bem-estar
social, Hitler acredita que o governo tem por obrigação prover os bens necessários para o
bem-estar da sociedade. Caso o governo não consiga executar plenamente seu dever, devem-
se expulsar os estrangeiros. Com o agravamento da crise e o aumento dos desempregados na
Alemanha, os vinte e cinco pontos do partido nazista ganham notoriedade entre as classes
operárias.
Com a crise alemã, cada vez mais o clima de instabilidade política progredia na medida
em que a escalada da violência entre os partidos opositores aumentava. Houve, porém, um
conflito direto principalmente entre dois partidos: os comunistas e os nazistas, que ganhavam
notoriedade na política alemã. Desde o século XIX, quem dominava os bairros de operários
eram os partidos comunistas, que tinham grande influência também nos sindicatos. A classe
operária era a razão do choque entre os dois partidos, já que representava para ambos, a força
de base do movimento revolucionário. Neste clima de disputa partidária criaram-se forças
paramilitares com o objetivo de desacreditar o partido opositor e tentar impor a própria
ideologia. Além da propaganda política, que tinha um forte apelo entre a massa operária, a
violência generalizada também foi utiliza por comunistas e nazistas. A respeito deste clima de
batalha entre forças paramilitares, o promotor da República de Weimar declarou:
Entre os partidários do partido comunista e os do partido nacional-socialista, no bairro chamado “Fischerkietz” (Toca dos Pescadores), trava-se uma guerrilha sangrenta, na qual os dois adversários se insultam, se ameaçam e se atacam, sem que seja possível dizer quem deve ser considerado o agressor. (RICHARD, 1993: 23).
25
Muito do que se viu na política de Hitler foi antecipado em seu livro “Mein Kampf”,
escrito alguns anos antes durante o período em que esteve preso por tentativa de golpe. As
técnicas do conflito e da violência faziam parte do plano nazista para conquistar a massa. De
acordo com Hitler, ao aumentar a diferença e a intolerância entre organizações diferentes fica
mais fácil persuadir a massa de que apenas um lado está certo. Em certa ocasião, Goebbels
declarou: “o sangue sempre fora o melhor cimento, e os uniria nas lutas futuras” (RICHARD,
1993: 151).
A defesa dos bairros operários se tornou um tema de grande relevância para o partido
comunista, já que nunca outro partido ameaçara de tal forma a hegemonia vermelha nestas
regiões. Para combater o partido nazista nos bairros de influência comunista, os militantes
saiam às ruas em busca de qualquer sinal de filiação ao partido nazista – uniformes e insígnias
– para confiscar e repreender quem desse apoio ao partido rival.
No ano de 1932, a imprensa comunista, que após a queda do Segundo Reich deteve grande
parte dos jornais do país, conseguiu atingir grande parte da população chegando a publicar
uma lista dos “antros nazistas do crime” (RICHARD, 1993:153), com os dizeres: “a
autodefesa é um direito legítimo em caso de agressão” (RICHARD; 1993: 153). À medida que
o partido nazista crescia nos bairros operários, a tensão aumentava. Ao propor aos habitantes
locais um boicote e manifestações contra as “tabernas nazistas”16, o partido comunista acabou
alastrando uma onda de violência generalizada.
Além da utilização da força paramilitar, o partido nazista utilizava estrategicamente a
violência comunista como propaganda contra o próprio partido. De forma induzida, os
habitantes destes bairros e a população de Berlim enxergavam nestas ações violentas um
possível governo comunista violento. Dessa forma, assim que o partido nazista toma o poder e
extingue qualquer manifestação comunista, a sensação de “limpeza” e segurança é
16 Essas tabernas eram bases da SA que foram implantados dentro de regiões comunistas.
26
rapidamente sentida em Berlim. Durante a primeira fase do governo nazista uma alemã
descreve Berlim: “Não havia mais privações, não havia mais sofrimento; tínhamos tanta
segurança nas ruas que não fechávamos mais as portas a chave; não havia mais crimes como
antes.” (RICHARD; 1993: 158).
Com o avanço do partido nazista dentro dos bairros de operários, cada vez mais os
discursos de Hitler são ouvidos e aclamados. Tais discursos trazem como ponto máximo as
sugestões de “morte aos judeus”, “morte aos estrangeiros” e “abaixo o governo”. À medida
que Hitler utiliza do grande poder de oratória que tinha, a exposição do anti-semitismo crescia
em igual proporção com o partido nazista. No ano de 1932, o partido nazista consegue através
das urnas, o controle do Reichstag (Parlamento alemão): os nazistas subiram de treze cadeiras
para cento e sete e, mais tarde, para duzentas e trinta. Um ano depois, no dia 29 de Janeiro,
através de pressões feitas por industriais e militares, o presidente Hindenburg nomeia Hitler
para o cargo de chanceler da Alemanha, que logo é eleito primeiro-ministro.
O Triunfo da vontade17
Após a conquista do partido nazista, houve várias comemorações, exibições públicas e
discursos em que Hitler enaltecia a grandeza dos alemães e adquiria uma divindade
surpreendente descrita por alguns jornalistas estrangeiros da época:
É um surto religioso. Eles pensam que Hitler é Deus. Acredite ou não, uma mulher alemã assistiu ao meu lado ao espetáculo da Paixão; quando colocaram o Cristo na cruz, ela disse: ‘Ali está ele. É o nosso Fuher, o nosso Hitler!’ E, quando Judas recebeu as 30 moedas de prata, ela afirmou: ‘Aquele é Rohm18, que traiu o líder’. (TOLAND, 1978 :431)
Assim como este relato descrito por um visitante norte-americano e informado na revista
“Harper’s Bazaar”, outros também foram mencionados na mesma época em que ocorreu o
17 “Triunfo da vontade” é o título do filme nazista feito em 1934 que remete ao triunfo da vontade do povo no plebiscito, que coloca Hitler definitivamente no poder. 18 Rohm: antigo chefe do SA foi morto no início da era Hitler em 1934, acusado de tentativa de golpe de Estado. Assim como Rohm, outros antigos membros do partido nazista foram mortos, neste mesmo período.
27
espetáculo “Paixão de Cristo” na versão alemã em que se culpam os judeus pela morte de
Jesus.
À reatualização da memória heróica dos mártires, o discurso hitlerista encadeia a ansiedade dos vivos, para formar a comunidade mística do Reich. Nesse transe não há mais lugar para a razão: “Fostes vós os primeiros que acreditaram em mim... não foi a inteligência que tudo analisa, que tirou a Alemanha do abismo em que se encontrava, mas vossa fé...”. Discurso de Nuremberg 1935. (LENHARO, 1986 :45)
Durante esta primeira fase do governo, Hitler se preocupou em grande parte com sua
política externa, agindo de duas formas: tentando convencer os outros Estados que a
Alemanha não tinha a intenção de invadir qualquer país, utilizando de tratados e, internamente
através de programas bélicos secretos que poderiam aumentar seu poder perante os Estados
vizinhos.
Guiado pela empolgação do povo nas paradas militares, Hitler elevava cada vez mais
rápido o contingente do exército. Rumores alarmantes de uma possível infração ao Tratado de
Versalhes preocupavam principalmente a França, que possui fronteira com a Alemanha e
territórios em disputa como a região do Reno. Tais territórios pertenciam à Alemanha e foram
tomados como forma de pagamento das indenizações de guerra e entregues a diversos países,
entre eles a Lituânia. Ao mesmo tempo em que acelerava seu programa bélico, Hitler
apresentava inquestionável postura diplomática; recebia e discutia tratado com todos os países
(com exceção da Lituânia)19 para que a Alemanha conseguisse ganhar tempo para restabelecer
a sua força militar.
Até este momento, e durante longo tempo, a Inglaterra havia tomado uma postura de
imparcialidade em relação ao que estava acontecendo na Alemanha. As lideranças do governo
19 “Em nenhuma circunstância, celebraremos um acordo com um país que oprime a minoria germânica em Memel!” afirmou Hitler em uma conferência. Trecho retirado do livro: TOLAND, John. Adolf Hitler . Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1978
28
não pretendiam travar nenhuma batalha fora de seu território, já que até então Hitler não
expressava nenhuma vontade de conquista em terras da Coroa inglesa.
Todo o tempo Hitler mantinha o mesmo discurso de que o aumento de suas forças
militares era apenas para fins defensivos, e que seu grande inimigo se encontrava do lado
Leste europeu. Dentre as inúmeras explicações sobre a falta de recriminação dos Estados
vitoriosos sobre o avanço militar alemão, existe a justificativa da barreira que a Alemanha
poderia formar, impedindo o avanço comunista da URSS. Com este mesmo discurso, Hitler
declarou que tornaria o serviço militar universal e que aumentaria o seu exército em
momentos de paz para 300.00 homens. Esta decisão deixava claro que o Tratado de Versalhes
não seria mais respeitado com o argumento de que não foi o atual governo que assinou tal
tratado.
Ao longo dos acontecimentos, Hitler exigiu paridade militar com a Inglaterra e a
França. Neste período, a Alemanha já estava suficientemente forte para fazer tal exigência
sem que houvesse qualquer repreensão realmente capaz de barrar as intenções militares de
Hitler. Através de uma política de fait accompli20, Hitler conseguiu mais do que teria
conseguido o Ministério do Exterior alemão. Com um misto de diplomacia e a técnica da
“grande mentira” utilizada tanto para objetivos internos quanto externos, a Alemanha ganhou
tempo para se fortalecer na área econômica – a economia crescia com grande sacrifício e
ainda era muito dependente do grupo judeu – política e militar.
A França tentou uma reação através da Conferência em Stresa quando, apoiada por
Inglaterra e Itália, aprovou um comunicado conjunto de condenação ao rearmamento alemão e
a reafirmação dos princípios de Locarno, tratado celebrado dez anos antes, e que obrigava os
signatários a respeitar as fronteiras entre França, Bélgica e Alemanha, incluindo a zona
desmilitarizada do Reno.
20 fait accompli. Expressão francesa que significa um fato realizado, ou seja, uma ação que se realiza antes que outras partes envolvidas possam intervir.
29
Preocupado com um possível isolamento, Hitler se esforçou para garantir à Inglaterra que
não era necessário temer a Alemanha, e que a paz era desejada e necessária para seu país. Para
isso, estava disposto a celebrar tratados de paz com os países vizinhos e respeitar o Tratado de
Locarno em troca da possibilidade de uma frota naval com 35% da tonelagem da britânica.
Mais uma vez, a comunidade internacional acredita nas palavras de Hitler, que conseguiu
afastar o risco de um provável isolamento alemão e conquistou a simpatia de muitos. O jornal
da época, London Times, classificou o discurso feito por “sensato, direto e abrangedor”
(TOLAND, 1978: 445).
Enquanto, a Alemanha ganhava força em sua política externa, os ataques a judeus dentro
do país aumentavam. Muitos judeus burgueses já estavam enraizados na sociedade alemã,
mas, por não possuírem “sangue alemão”21, eram considerados estrangeiros. As leis de
proteção ao sangue alemão eram criadas continuamente.
Assim que a lei que proíbe casamentos e relações sexuais fora do matrimônio entre judeus
e cidadãos de sangue alemão fora colocada em prática, já havia outra lei sendo ordenada:
estava determinado que a cidadania alemã somente era reservada aos de sangue alemão ou aos
de sangue aparentado. Durante uma sessão extraordinária no Reichstag, Hitler declarou que
esta lei serviria para favorecer os judeus de forma a ajudar na criação de bases para uma
relação de tolerância entre os dois grupos. Em um tom de ameaça declarou também: “Se essa
esperança não for alcançada, e se prosseguir a agitação, no interior e no exterior da Alemanha,
seremos então forçados a reexaminar o assunto.” (TOLAND, 1978: 454).
Neste mesmo momento, a atenção mundial se voltou para as ações militares de Mussolini,
deixando de lado o problema judeu na Alemanha. Ao invadir a Etiópia, a Itália sofre a
21 Países como a Alemanha, considerados países antigos e fornecedores de imigrantes (até o século passado) adotam a lei de nacionalidade ius sanguinis (o nacional terá seus diretos garantidos através do sangue/descendência, independente de onde tenha nascido). Isso ocorre, para garantia de nacionalidade, por causa das frequentes emigrações ocorridas na Europa nos séculos passados. No período nazista, os judeus perderam a nacionalidade alemã, tornando-se apátridas, sendo assim, sem passaporte e sem proteção diplomática de qualquer país.
30
repreensão da comunidade internacional gerando sanções econômicas ao país. Em uma
postura pragmática, Hitler oferece ajuda militar secretamente ao Imperador Hailé Selassié,
apesar de negar qualquer ajuda publicamente. Em contrapartida, fornece à Itália matérias-
primas que lhe são negadas pelas sanções econômicas. Esta postura serviu também para que
Hitler testasse a reação britânica ao apoio que foi oferecido a Itália, e que desafiava a Liga das
Nações. Hitler percebe que a Inglaterra nada faria contra a Alemanha, podendo se tornar um
futuro aliado, ou pelo menos possuir uma posição neutra em futuro conflito.
Ao iniciar mais tarde a Segunda Guerra Mundial, Hitler contava com a imparcialidade
britânica, que poderia ter de fato permanecido caso não houvesse a troca do primeiro ministro
inglês no início da guerra. A imparcialidade e o apoio britânico durante todo este período já
descrito preocupavam Churchill desde o princípio, que via na equidade militar germânica e
britânica um futuro risco à paz regional.
Enquanto Hitler se preocupava com a política externa da Alemanha, já no ano de 1935
ocorriam alguns movimentos divergentes dentro do partido. Um grupo extremado exigia uma
postura mais firme – já prevista nos vinte e cinco pontos do partido nazista – em relação aos
judeus, e outro pequeno grupo, composto de pessoas influentes como os ministros de finanças,
do interior, da justiça, o dono do Banco do Reich entre outros, acreditavam que qualquer
repressão mais forte seria prejudicial à economia alemã. Para Toland (1978), autor do livro
“Adolf Hitler”, esta condescendência era apenas uma necessidade que o governo tinha de
utilizar a riqueza dos judeus, para alavancar a economia e desenvolver o seu projeto bélico.
No exterior, grupos judeus já boicotavam os produtos alemães. Tomando por base que
estes grupos possuíam grandes riquezas no mundo todo, era de se esperar que qualquer
repreensão por parte destes grupos judeus poderia afetar a frágil economia alemã. Ao longo
dos anos, a riqueza judia ajudou a financiar também o crescimento militar alemão.
31
No ano de 1938, em meio às pressões de ambos os lados, um jovem judeu, Herschel
Grynszpan, mata um Conselheiro alemão na tentativa de matar o Embaixador alemão em
Paris. Após ter os pais deportados para a Polônia, Grynszpan invade a embaixada alemã
chorando e dizendo: “Ser judeu não constitui um crime”, eu não sou cachorro. Tenho o direito
de viver, e o povo judeu tem o direito de existir na terra... de todos os lugares em que estive
fui expulso como um animal” (TOLAND, 1978: 605). Esta foi a justificativa motivacional que
alguns partidários procuravam para iniciar a “limpeza” anti-semita na Alemanha. Ao ser
noticiado sobre o incidente , Hitler se reuniu com Goebbels para discutir o assunto.
Após a conversa reservada, Goebbels anuncia que este fato isolado gerou desordens anti-
semitas pela Alemanha, e que não deveria ser desencorajado pela polícia alemã, caso se
propagasse. De acordo com Toland (1978) tudo deveria ser feito de forma que as
manifestações fossem espontaneamente vindas do povo. Este período da história foi
questionado por Himmler – chefe da Gestapo, após morte de Rohm – que afirmou não saber
se as ordens foram realmente dadas pelo Fuhrer ou se foi a vontade de Goebbels sendo feita.
Enquanto Himmler se contrapunha a desordem nacional, seu auxiliar direto enviava
ordens para dentro dos quartéis pedindo que se alastraram por toda a Alemanha. O autor do
livro “Adolf Hitler” (TOLAND 1978) descreve:
Heydrich enviou por telex mensagens urgentes a todos os quartéis e postos do SD (Serviço de Segurança) e da polícia, concitando-os a cooperar com os líderes do Partido e do SS, ‘em organizar manifestações’. Mandou também dizer que deveriam ser presos tantos judeus e, em especial, judeus ricos, quantos ‘fosse possível alojar nas cadeias existentes. Por enquanto, só devem ser aprisionados homens saudáveis, que não fossem demasiado idosos. Logo que fossem presos, cumpriria que se entrasse em contato com os campos de concentração apropriados, imediatamente, para que se transferissem, com toda a possível urgência, os prisioneiros aos cuidados de tais campos’ (TOLAND 1978: 605)
32
Após a ordem de Goebbels, a Noite de Cristal22 ficou marcada como o fim do anti-
semitismo velado. Lojas, sinagogas e residências foram saqueadas e incendiadas pelos
alemães e a polícia nada fazia para impedir. Durante a onda de violência, judeus foram presos
com o argumento de proteção a eles e os alemães classificados como um povo bárbaro pela
comunidade internacional.
Pouco tempo após a “Noite de Cristal”, a Alemanha entrou na Segunda Guerra
Mundial. O país que vinha sendo preparado desde a entrada de Hitler no poder estava tão forte
quanto qualquer outra potência internacional. A nova educação produziu, em grande escala,
um novo alemão com grande disposição e treinamento para o combate. Essa educação era
voltada para a “Juventude Hitlerista” que se baseava no desenvolvimento físico em detrimento
do intelectual, onde os jovens deveriam rejeitar os velhos líderes fracassados e seus princípios
enganosos.
No ano de 1922, a “Juventude Hitlerista” começa a ser desenvolvida pelo partido
nazista com o objetivo de moldar os futuros personagens do nazismo alemão. Por meio de
princípios, o programa conseguiu incutir nestes jovens pensamentos sobre a superioridade
alemã, o ódio aos judeus, a necessidade de expansão de seu território e recuperação destes,
perdidos após a Primeira Guerra Mundial. Havia também o convencimento para enaltecimento
e devoção ao líder.
Ao longo dos anos de governo, Hitler promoveu o desenvolvimento esportivo de toda a
Alemanha. No documentário “A vida secreta de Hitler”23, podemos perceber através de alguns
depoimentos que Hitler estava desde o princípio preparando secretamente o povo alemão para
a guerra. Em um destes depoimentos, é dito que a Alemanha tinha mais clubes de caça do que
animais para caçar. Havia também clubes de saltos, que foram responsáveis pela preparação
de muitos pára-quedistas alemães utilizados nas batalhas.
22 Deu-se este nome de Noite de Cristal por causa das inúmeras vidraças partidas, na noite em que iniciou a “caça aos judeus” na Alemanha 23 Ver bibliografia
33
Podemos também tomar como indício dessa preparação, a economia de guerra – plano
quadrienal, que estava sendo planejado por Hermann Goring, ministro da economia, ao longo
dos anos. Este plano consistia em um grande esforço econômico da massa para alimentar a
máquina de guerra que estava sendo preparada pelo Estado. Este plano não chegou a ser
concluído por causa da antecipação de algumas ações militares, que acabaram por iniciar a
guerra antes do período previsto.
A partir deste momento, Hitler dispôs toda a nação germânica para a luta contra um
inimigo maior: o estrangeiro. Neste momento da história, o povo alemão, manipulado por
propagandas de guerra nacionalistas, possuía disposição e preparação para esta nova guerra,
que viria para provar a supremacia alemã.
34
1.3 China
A segunda fase deste capítulo histórico dissertará sobre a crise imperial na China, e a
ascensão do Partido Comunista, que permanece no poder até os dias atuais. A história vivida
na China será contada juntamente com a ascensão do partido comunista de Mao Tse-tung, o
outro objeto de estudo proposto no projeto.
O corte histórico de interesse ao projeto de pesquisa terá início no século XIX - período
em que a China passa por uma longa fase de influência estrangeira - até a Revolução Cultural,
realizada no governo de Mao Tse-tung.
Após anos de monopólio inglês no oriente através da Companhia das Índias Orientais e do
próprio governo, a Inglaterra percebe que vem perdendo influência naquela região. As duras
restrições comerciais da dinastia Qianlong, e a crescente influência regional de outros países,
se tornaram uma ameaça ao comércio inglês.
Países como Portugal e Espanha já tinham territórios sob domínio naquela região, e países
como os EUA buscavam comerciar diretamente com o Oriente.
Percebendo que precisavam de uma base no extremo oriente, o governo inglês envia um
grupo diplomático para solicitar o direito de estabelecer uma residência diplomática em
Pequim. Em resposta, Qianlong enviou um édito ao rei britânico Jorge III, explicando que não
tencionava aumentar o seu comércio exterior, visto que não tinha interesse nos produtos
estrangeiros. Em carta Qianlong escreve:
Nunca demos valor a artigos engenhosos, nem temos a menos necessidade das manufaturas de seu país. Portanto, ó rei, no tocante à tua solicitação de enviar alguém para permanecer na capital, ao mesmo tempo que não está em harmonia com os regulamentos do Império Celestial, sentimos também muito que isso não trará nenhuma vantagem para o teu país.(SPENCE, 1996.:134)
35
Os anos que se seguiram no século XIX somente fez aumentar as restrições e as
dificuldades comerciais. A crescente demanda por produtos chineses – chás, porcelanas, sedas
e artigos decorativos- não foram compensados pela demanda chinesa por produtos
estrangeiros. O resultado foi uma crise na balança comercial de importação/exportação
ocidental, que já encontrava problemas em pagar pela mercadoria chinesa, em prata.
Para solucionar esse problema, os ingleses, que já haviam descoberto a existência do ópio
- droga que possui fins medicinais, tais como produção de morfina – disseminaram e
popularizaram este produto na China como fumo, causando vício e dependência da população
chinesa. Com este produto, os ingleses conseguiram diminuir o desequilíbrio na balança
comercial, e as vendas inglesas de ópio na China cresceram rapidamente, mesmo com a
proibição do novo governo da dinastia Qing no fim século XIX (vide tabela 1)24.
Na tentativa de evitar a entrada do ópio na China, cada vez mais o governo impõe
restrições a entrada da droga. Esse embate de interesses entre o governo chinês e o inglês
acaba gerando a Guerra do Ópio que perdurou por três anos, de 1839 à 1842. O resultado da
guerra foi a assinatura do Tratado de Nanquim, em 29 de agosto de 1842, que ocasionou no
24 SPENCE, Jonathan D.. Em busca da China moderna: quatro séculos de história. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. 817 p.
36
controle total inglês sobre o porto de Canton e a ilha de Hong Kong, entre outros portos
estratégicos. Outra importante conquista foi a nomeação para o cargo de diretor geral das
Alfândegas, um estrangeiro inglês.
Insatisfeitos com a dominação estrangeira e a fragilidade do governo perante os invasores,
o povo chinês tenta uma reação, que logo é sufocada e punida por forças anglo-francesas. Para
evitar outros levantes, no fim do século XIX, a interferência estrangeira aumenta dentro do
país. Antes mesmo de terminar este século, surge na Ásia uma nova potência regional
imperialista: o Japão. Devido a sua posição geográfica, o Japão acreditava possuir direitos
sobre a China.
No ano de 1894, a China sofre um ataque vitorioso japonês que anexou ao seu domínio: as
ilhas Formosa, dos Pescadores, a Península de Liang-Tiong e Port Arthur. Neste período, a
Coréia também é separada da China e declarada independente, sob o controle e apoio japonês.
Neste contexto, a dinastia Qing, sob grande pressão, opta pela abdicação do governo em
1912. Após a renúncia da dinastia Qing, a China passa por um período de incertezas políticas.
Spence (1996) descreve a situação chinesa:
Restou um vazio crucial no centro do Estado chinês, sem que houvesse quaisquer líderes de talento especial para preenchê-lo, mas apenas diversos agrupamentos com pretensões ideológicas rivais. O legado do colapso dinástico não foi uma república nova cheia de confiança, mas um período de guerra civil e desordem intelectual... (Spence, 1996.: 153)
E assim, a China entra na era moderna passando por diversas contradições políticas, a
partir até mesmo de seus intelectuais que possuem opiniões opostas a respeito da abertura do
país.
A dominação estrangeira produzia efeitos contraditórios na intelectualidade chinesa. Uma corrente tradicionalista encarava a cultura e as técnicas ocidentais como verdadeiras maldiçoes, responsáveis pela miséria
37
nacional25. Seu nacionalismo consistia da tentativa de preservação dos velhos valores e instituições. Uma corrente modernizante estimava que os males do país - inclusive sua debilidade ante os estrangeiros – advinham da resistência cultural chinesa26 à incorporação das técnicas e cultura liberal do Ocidente. (MAO TSE-TUNG, 1982:9)
A primeira corrente citada acima se refere ao grupo tradicionalista de intelectuais
confucianos. De acordo com Spence (1996), as obras de Confúcio serviam de base para a
“sabedoria ética” (SPENCE, 1996.:115) da sociedade chinesa. Além dos valores de lealdade e
devoção nas relações entre pais/filhos e funcionários/soberanos, o confucionismo servia para
unificar a massa rural, em obediência ao Estado. Contrapondo esta corrente tradicionalista,
existiu também a corrente modernizante. Composta por muitos chineses que tiveram contato
com a cultura estrangeira, este grupo de intelectuais acreditavam que a China deveria ser
modernizada, incorporando aspectos da cultura ocidental.
Neste período de conturbações políticas, em 1893, nasce Mao Tse-tung na província de
Hunan, no sul da China. Aos treze anos foi obrigado pelo pai a abandonar os estudos para
trabalhar na terra. Três anos mais tarde, contra a vontade do pai, Mao Tse-tung sai de casa e
volta a estudar. Ao sair de casa para completar os estudos, ele teve contato com movimentos e
discussões ideológicas, que o iniciaram na vida política.
Mao entrou para a vida militar em 1911 quando estourou a Revolução Xin Hai em apoio a
constituição de uma República. Com pretensões reformistas, a Revolução Xin Hai ocorreu nas
províncias do sul do país, através de homens da corrente modernizante. Esta revolução acabou
por forçar a queda da dinastia Quing, com o objetivo de estabelecer um novo tipo de governo:
a República.
Ao voltar para Hunan, Mao tem contato com a recém formada revista “Nova Juventude”.
Esta revista, que possuía idéias modernizantes e característica nacionalista revolucionaria, é
descrita por Mao Tse-tung: “a revista pregava a modernização do país como condição para
25 Grifo Nosso. 26 Grifo Nosso.
38
superar o atraso e a dominação estrangeira” (MAO TSE-TUNG, 1982:9). A “Nova
Juventude” atraiu alguns futuros membros do Partido Comunista Chinês.
O período que se estendeu até o movimento de Quatro de Maio, de 1919, foi marcado por
diversos conflitos entre governos rurais. A instabilidade política dentro do país abriu espaços
para a formação de lideranças regionais, mais fortes que o governo central. “Os ‘senhores de
guerra’ eram uma fração dos proprietários rurais que conseguiam organizar seus próprios
exércitos e impunham requisições militares e impostos à população, assegurando a ordem
interna”(MAO TSE-TUNG, 1982:13).
A situação de instabilidade política atingiu o seu auge quando, em 1919, na Conferência
de Versalhes, os direitos de Shandong (antigo domínio alemão) são transferidos ao Japão, sem
nem mesmo consulta à população local. O governo chinês que ajudou os Estados vencedores
com um exército de 100 mil homens, estava em Versalhes consentido acordo. No dia quatro
de maio, movimentos nacionalistas estudantis se levantam contra o governo que é obrigado a
voltar atrás e recusar o acordo. O movimento de Quatro de Maio assume também uma luta
pela democracia, na qual desdobramentos desse movimento levaram a uma radicalização do
movimento estudantil, e de um encontro entre estudantes de treze colégios e universidades,
que desenvolveram cinco resoluções:
“uma protestava contra o acordo sobre Shandong da conferência de Versalhes; a segunda buscava despertar ‘as massas de todo o país’ para um consciência da situação da China27; a terceira propunha a realização de um encontro de massa da população de Pequim; a quarta pedia a criação de uma união dos estudantes de Pequim; e a quinta convocava uma manifestação para a tarde do mesmo dia, em protesto contra os termos do Tratado de Versalhes” (SPENCE, 1996:306)
O Movimento de Quatro de Maio atraiu a atenção da IC (Internacional Comunista) que, a
partir do ano de 1920, passou a apoiar as revoluções antiimperialistas nos países atrasados,
27 Grifo Nosso
39
como forma de integrar estes movimentos à revolução socialista mundial. Em julho de 1921,
treze delegados fundam o Partido Comunista Chinês com um total de 57 membros. Mao Tse-
tung se tornou um dos delegados representando o grupo de Hunan.
Apesar do PCC não ter chegado a mil militantes (concentrados nas grandes cidades) até o
ano de 1925, outro partido vinha ganhando força dentro da China. O partido nacionalista de
Kuomintang foi responsável pela greve de 200 mil trabalhadores em Hong Kong (cidade
dominada pelos ingleses). A greve que durou dezesseis meses e objetivava um boicote contra
produtos ingleses foi também apoiada por Cantão, Shangai e outras cidades.
Fundado por Sun Yat-sen, o partido Kuomintang, que já controlava Cantão, através da
constituição de uma força paramilitar, sintetizava seus objetivos através de “Três Princípios do
Povo” nacionalismo, democracia e bem-estar popular. Através deste programa nacionalista,
Sun Yat-sem pretendia realizar a revolução democrática entre a burguesia da China. Em 1924,
estes pontos foram reinterpretados e entendidos como uma luta nacionalista antiimperialista,
através do apoio ao movimento operário e camponês.
O PCC, que até então era constituído em sua maioria de proletariado das grandes cidades -
de acordo com Mao Tse-tung (1982) até o anos de 1926 apenas 5% dos membros do partido
comunista pertenciam ao campo - decidiu junto com a IC se alinhar ao partido Kuomintang,
partido apoiado pelas baixas e médias classes28 burguesas.
Apesar dessa contradição, a decisão de unificar os dois partidos foi tomada pelo partido
comunista soviético que via nessa união uma forma de fomentar a revolução mundial e
garantir a segurança de suas próprias fronteiras, ameaçadas pelo Japão; uma força
28 Neste trecho faz-se diferença entre a burguesia nacional antiimperialista: composta pela média burguesia (classe que representa a relação capitalista de produção) e a baixa burguesia ( composta por camponeses, artesão e outros pequenos proprietários). A burguesia compradora que é descrita por Mao Tse-tung: “designa os grandes comerciantes, vinculados aos grandes negócios estrangeiros, que importam mercadorias para a venda interna no país.” (MAO TSE-TUNG, 1982 .:13)
40
anticomunista que crescia na região da Manchúria. Dessa forma, segundo Spence (1996), era
interesse da URSS o fortalecimento do Estado chinês para contenção da força japonesa
Na noite de 22 de março de 1927, um levante iniciado na cidade de Shangai (a maior
concentração industrial base imperialista do país), contou com a participação de mais de 800
mil trabalhadores que ocuparam a cidade. As tropas de Kuomintang – agora lideradas por
Chiang Kai-shek - em princípio se deslocou para a cidade em apoio ao levante; mas logo
iniciou conversações com membros da burguesia compradora, representantes estrangeiros e
grupos anticomunistas. Ao entrarem em acordo, estes dois grupos se juntaram para declarar
total repressão aos grupos comunistas. Instaurou-se na China um sangrento confronto entre o
partido Kuomintang, agora apoiado pelos grupos imperialistas, e o partido Comunista.
Após várias batalhas perdidas, Mao retira-se para as montanhas de sua cidade natal e incita
o Comitê Central a também movimentar o partido das cidades para o campo. Deste momento
em diante, o PCC abandona a luta nas cidades e percebe que a força pode vir do campo, a
grande massa chinesa. Inicia-se então uma corrente maoísta dentro do partido, que busca
através da luta guerrilheira e o apoio do campo, bases para enfrentar o poder estatal. “É no
decorrer dessas campanhas que Mao vai desenvolver suas técnicas de luta guerrilheira. Como
enfrentava inimigos bem superiores em número e armamento, evitava os combates frontais.”
(MAO TSE-TUNG, 1982:16). Ao levar a luta para o campo, Mao faz uma adaptação da teoria
marxista soviética, levando a luta de grupos proletários urbanos, para a realidade campesina
chinesa.
Ao se refugiar no interior da China Mao, que foi nomeado comissário do Quarto Exército,
inicia a organização de um “Exército Vermelho” que rapidamente atrai centenas de seguidores
do campo. Com uma estratégia de perseguição a um inimigo em situações especificamente
desvantajosas, a guerrilha de Mao Tse-tung resistiu a quatro sucessivas campanha de cerco,
41
organizadas por Chiang Kai-shek. A cada vitória, o grupo comunista conseguia aumentar a
sua área de influência, aumentando também o número de partidários comunistas.
As regiões conquistadas pelo Exército Vermelho tinham estabelecidos novos governos
locais, e o confisco de terra dos antigos chefes políticos opressores dos camponeses. A região
das conquistas comunistas ficou conhecida como região do Soviete de Jiangxi, segundo
Spence (1996). E foi naquela região que, no outono de 1934, Chiang Kai-shek reuniu uma
força de um milhão de homens para cercar a força comunista. Sem forças para enfrentar
diretamente o exército regular do governo, o Exército Vermelho perdeu a região de domínio
comunista.
Ao final de um ano, o Exército Vermelho bateu em retirada em direção ao oeste na
província de Siikiang. Este período ficou conhecido com a Longa Marcha. Em meio a estes
acontecimentos, em janeiro de 1935, durante uma Conferência da PCC; Mao é nomeado líder
do partido.
Enquanto o governo se preocupava com o avanço comunista, o Japão expandia sua área de
influência na região norte do território chinês, a partir da Manchúria. Em princípio, Chiang
Kai-shek que contava com o apoio nazista na luta contra a expansão do comunismo, viu seu
aliado apoiar preferencialmente o Japão em uma ofensiva ao território Chinês em 1937.
Chiang Kai-shek então pede ajuda ao governo norte americano, que quer impedir um avanço
nipônico. Neste período a eminência da Segunda Guerra Mundial já estava latente entre os
países.
De forma contraditória, quem auxilia o governo na luta contra o Japão é novamente o
governo soviético de Stalin; que segundo Mao Tse-tung (1982), na visão do aliado soviético, a
única possibilidade de uma China independente era através das forças do Kuomintang. Dessa
forma, o partido comunista soviético formula uma política de submissão do PCC ao
Kuomintang, na medida em que este assumisse a guerra contra o Japão. Apesar dos constantes
42
artigos e proclamações feitas por Mao a despeito da incompetência de Chiang Kai-shek na
luta contra o imperialismo, o partido comunista aceita, por um tempo, se juntar às forças do
governo. “que cessem os ataques ao Exército Vermelho e se voltem todas as forças contra o
Japão, que se dêem liberdades para as massas populares, que se arme o povo” (MAO TSE-
TUNG, 1982:19).
O povo é armado e treinado pelos soviéticos. Mao, que permaneceu nas províncias rurais
do norte conduzindo a guerrilha armada, estocou durante esse período um grande número de
armas e material bélico oferecidos pela URSS e seus aliados. Ao fim da Segunda Guerra
Mundial, os conflitos entre nacionalistas do Kuomintang e comunistas são retomados. Para
Lanning (1999), estudioso de grandes líderes militares, Mao aproveitou o período de luta
armada contra um inimigo comum para consolidar sua imagem de protetor dos camponeses e
estocar armas para uma futura continuação da luta interna pelo controle da China.
À medida que a guerra foi chegando ao fim, uma coalizão entre EUA, URSS e Grã-
Betanha tentava criar em vão um governo único na China com o apoio dos dois grandes
partidos. Após a retirada japonesa, era preciso reocupar as terras abandonadas. Com o apoio
norte-americano, Chiang Kai-shek envia tropas para a região das províncias no norte-nordeste,
enquanto Lin Piao (ministro da Defesa da China de 1959 a 1971) aproveitou para se apropriar
do equipamento militar deixado pelos japoneses na Manchúria.
Após uma série de conflitos entre comunistas e nacionalistas, em 1949 o Exército
Vermelho, utilizando táticas guerrilheiras e concentrações de força, sai vitorioso em três
províncias chinesas. O exército de Chiang Kai-shek que já estava há muito tempo sendo
empurrado pelo exército comunista, é derrotado definitivamente por Mao Tse-tung.
Muitas dessas batalhas, apesar de estarem envolvidos milhares de soldados de cada lado, tiveram bem poucos mortos em razão de um antigo hábito de combate chinês que podemos chamar de "negociação e conversão". Em diversas ocasiões, exércitos inteiros de nacionalistas se entregaram sem disparar um tiro porque seus comandantes, sentindo-se inferiorizados em
43
forças e em ânimo, sem condições portanto de levar o combate às suas últimas conseqüências, decidiam-se por negociar a sua conversão, passando-se em massa com suas armas e bagagens para o lado dos maoístas.29
Em 20 de setembro de 1949, são reunidos todos os partidos políticos democráticos em
uma conferência que resultou na promulgação da constituição chamada de Programa Comum.
Mao Tse-tung, que já presidia o governo central, foi intitulado presidente da nova República
Popular da China, e após eleições, torna-se presidente. Já em 1950, são feitas três reformas: a
agrária, que dividiu a terra de grandes proprietários entre os camponeses; a reforma dos
casamentos, que proibia os contratos feitos pelos pais sem a vontade dos noivos; e a reforma
sindical urbana, que regulamentou a participação dos trabalhadores na gestão das empresas e o
seguro-desemprego.
Com a ajuda da URSS, é elaborado o primeiro plano qüinqüenal para 1953 à 1957. Mao
fará uma declaração sobre a ajuda soviética:
Não podíamos realizar a planificação, a construção e a instalação de fábricas para a indústria pesada. Não tínhamos experiência. A China não tinha especialistas [...] Estávamos obrigados a copiar do estrangeiro sem poder distinguir o bom do mau. [...] Só podíamos seguir cegamente a URSS...(MAO TSE-TUNG, 1982: 21)
De acordo com Spence (1966), o PCC utilizou de maciça propaganda para alcançar o
apoio da massa urbana. Foram criadas, nas grandes cidades, debates públicos que tratavam de
política, problemas militares, artes e educação. Através de pequenos grupos de estudos, a
massa foi inserida nos estudos políticos comunistas. Foram criados também comitês de rua
que eram responsáveis em organizar a população nas tarefas de limpeza de ruas, suprimento
de água, programas de saúde e segurança pública. O vício do ópio e a prostituição foram
controlados através de campanhas e com o apoio destes comitês regionalizados.
29 Retirado do site: http://educaterra.terra.com.br/voltaire/mundo/china_10.htm 29/11/2008 às 23:02
44
Apesar disso, no ano de 1956, surgiram protestos, greves operárias, reclamações
camponesas e criticas de intelectuais. Procurando prevenir eventuais críticas ideológicas, Mao
decide liberar críticas e descontentamentos, como forma de discutir e corrigir qualquer idéia
errada que o partido possa ter. Esta liberalização ficou conhecida como o Movimento das Cem
Flores. “Deixai desabrochar cem flores”, disse Mao Tse-tung (1982: 22).
A campanha das Cem Flores revelou constantes insatisfações da intelectualidade
direcionadas aos órgãos burocráticos estatais, e até mesmo a hegemonia do PCC. Este que
logo freou o movimento, prendeu os críticos e fez denúncias a respeito do perigo direitista.
Intelectuais que apresentavam idéias direitistas ou reacionárias eram enviados ao interior rural
para que pudessem, segundo Spence (1996), se reformarem através do trabalho. Em discurso
feito anos antes em 1949, Mao Tse-tung declarou:
Precisamente por termos conquistado a vitória, não devemos relaxar em momento algum a nossa vigilância contra as maquinações frenéticas dos imperialistas e seus lacaios que procuram vingar-se. Todo aquele que relaxa a vigilância desarma-se a si próprio politicamente, e acaba por ser reduzido a uma posição passiva. (MAO TSE-TUNG, 1972 .:75)
Em 1958 é aprovado o Grande Salto para Frente, que consistia em obter um grande
crescimento econômico e aumentar a participação popular nas decisões. Cria-se nos campos
meios de produção coletivizados autônomos. Nas grandes cidades busca-se aumentar o poder
das bases produtoras. Creditava-se a este movimento uma grande mobilização social, capaz de
compensar o atraso tecnológico chinês.
Este plano, que tinha como objetivo acelerar a economia industrial em um país com bases
camponesas, trouxe, através das comunas, uma nova forma de trabalho. Os camponeses
tiveram que se agrupar a grandes comunas agrícolas com objetivos industriais. Estas possuíam
pequenos fornos siderúrgicos instalados ao longo do território. Existiu neste período uma
euforia em relação à elevação dos números de produção agrícola; que foram mais tarde
45
desmistificados. Na realidade milhões de chineses morriam de fome por causa da
desorganização econômica gerada pelas comunas.
Essa política ocasionou na substituição do governo de Mao Tse-tung por Liu Shaoqi. Após
fracasso do plano das comunas, o partido decidiu voltar ao plano de crescimento gradual
econômico, já estabelecido. De acordo com Spence (1996), à medida que os investimentos
industriais cresciam na China, a exportação de grão para a URSS também aumentava. Era
preciso pagar cada vez mais por maquinarias pesadas para investir na industrialização chinesa;
enquanto isso, a fome matou mais de 20 milhões de chineses no campo entre 1959 a 1962.
Após a substituição do governo, Mao permanece em segundo plano até o início da
Revolução Cultural. Neste momento, o antigo líder do Exército Vermelho, ainda possui
grande força perante dentro do partido, por isso ele deixa as decisões internas para o partido,
mas continua liderando as relações externas chinesas.
Após anos de aliança, China e URSS entram em divergência após alguns acontecimentos
como: os ataques a Stalin feitos por Khruschev, no vigésimo congresso do partido comunista
feito alguns anos antes; a recusa em ajudar o governo a expulsar as últimas tropas resistentes
de Chiang Kai-shek da ilha de Quemoi; a ajuda soviética à Índia durante o conflito na
fronteira com a China e, por fim, a recusa em transferir tecnologia atômica para a China
causou um racha na longa união entre os dois países. Em 1960 acusações de ambos os lados
foram feitas em reuniões comunistas internacionais.
A partir dessa separação, a China tenta manter-se no cenário internacional como uma
liderança comunista dos países pobres. Nesta nova posição política, a Albânia recebe
significativa ajuda chinesa, assim como outros diversos países pobres interessados na
ideologia comunista. Esta ajuda vai desde apoio político, até financiamentos e assistência
industrial.
46
Outro movimento que marcou a história Chinesa foi a Revolução Cultural. Após a
denúncia feita por Mao de que havia um racha dentro do partido, este estimulou uma crítica
geral às velhas idéias. Os estudantes que há muito tempo eram reprimidos e controlados
severamente dentro das escolas, logo utilizaram esta abertura para criticar o autoritarismo de
qualquer autoridade educacional. Linshan, autor de “Anos Vermelhos”, conta sua experiência
escolar: “A obediência, a submissão aos professores e à direção da escola, esses eram os
critérios pelos quais se julgava se tal aluno era ou não ‘revolucionário’. Bania-se toda
espontaneidade.” (LINSHAN, 1988:44)
Na verdade, quando os acusávamos nossos professores se entrincheiravam atrás das autoridades, dizendo que elas eram responsáveis por tudo o que eles nos tinham feito sofrer, como por exemplo fazer dossiês da gente, aplicar severamente os regulamentos... Enquanto não atacássemos as autoridades da escola, nossas contas não estariam acertadas. (LINSHAN, 1988:44)
Dessa forma, Mao conseguiu levantar uma grande massa de estudantes que o seguiam
devotados ao Livro Vermelho escrito por ele. A quebra de velhas idéias culminou na união
estudantil contra todos que eram percebidos como reacionários. Em nível governamental, a
Revolução Cultural passa a questionar altos dirigentes do partido. Para Mao (1982), existiam
movimentos antagônicos entre as motivações da base (massa) e as regras escritas encontradas
em diferentes grupos que lutavam em nome da Revolução Cultural. Mao (1982) segue
afirmando que esse vazio entre essa diferença, pode ser preenchida pelo culto a personalidade
do chefe.
47
CAPÍTULO III
Análise
3.1 Características de governos totalitários
O presente capítulo tem como objetivo analisar os regimes totalitários da Alemanha e
China no século XX, encontrando neles semelhanças e distinções no que tange às suas formas
de agir. É pertinente ao trabalho que se faça, então, a distinção entre os tipos de ditaduras.
Bobbio (2000) aborda três tipos distintos: “ditadura autoritária”, “ditadura cesarista” e
“ditaduras totalitárias”.
A “ditadura autoritária” ou “simples” é baseada nos princípios tradicionais de poder
coercitivos tais como: exército, polícia, burocracia e magistratura; esta possui pouca
penetração na sociedade, e suas massas são apolíticas. Neste tipo de ditadura, o governo
consegue reprimir, somente pela força, quem se opõe abertamente.
As “ditaduras cesaristas” são exercidas por um chefe que busca apoio para conquistar e
exercer poder sobre a massa. O que diferencia esta das demais é a presença de um líder
carismático, que falta no ditador “Autoritário”, e a ausência de um partido único de massas,
instrumentos de controle e penetração ideológica na sociedade, presentes nas ditaduras
totalitárias.
Por fim, Bobbio (2000) aborda as “ditaduras totalitárias”, que além dos meios coercitivos
normalmente empregados, possuem um partido único de massa que os permite alcançar a
sociedade – através das propagandas – em um nível que as outras ditaduras não conseguem.
48
Estes governos possuem total controle sobre a política, educação, cultura, meios de
comunicação e instituições econômicas, além do total apoio da massa.
Algumas características fundamentais de governos totalitários são também descritas por
Walker (1966), que discute também o risco de um governo totalitário na China, fazendo um
paralelo com a história vivida na Alemanha. Walker (1966) que é professor de Relações
Internacionais e diretor do Instituto de Estudos Internacionais da Universidade da Carolina do
Sul; pretende neste estudo, alertar ao governo norte-americano o risco que existe na falta de
memória, ao confrontar a história vivida na Alemanha e o que possivelmente aconteceria na
China.
A ausência de freio legal em um governo autocrático é descrito por ele como o
menosprezo pelo direito escrito e pelos direitos individuais. Desde o período em que Mao Tse-
Tung tomou o poder, em 1949, não foi produzido na China um código de leis escritas, e
quando alguma lei foi produzida, nem sempre foi seguida pelo próprio partido. A lei nacional
que garantia a discussão do orçamento e economia do Estado, no Congresso Nacional do
Povo, por exemplo, não foi cumprida na China. De acordo com Arendt (1989), a Alemanha de
Hitler dissolveu o parlamento logo no início de seu governo implantando as novas leis de
acordo com os vinte e cinco pontos do partido nazista. Dessa maneira, podemos observar que
a lei é o líder.
Outra política comum de governos totalitários é levar o povo a um nacionalismo
exacerbado que possui relação direta com um projeto expansionista. Este discurso
demagógico pretende levar “o bem e a verdade” aos demais Estados. Os símbolos e o orgulho
de ser nacional são cultuados de tal forma que clamam pelo sacrifício máximo para a
concretização do ideal do Estado. Hitler descreve em seu livro “Mein Kampf” que as mortes
em vão ocorridas na Primeira Guerra Mundial, são sacrifícios oferecidos à Pátria em
49
obediência do dever. A análise de Walker (1966) sobre o nacionalismo chinês justifica sua
preocupação com o novo regime:
El nacionalismo chino ha sido llevado a tales extremos, bajo el reino de Mao Tse-Tung, que ya en 1960 fue un punto de gran preocupación entre los dirigentes soviéticos, cuyos recuerdos de los extremos del nacionalismo alemán siguen latentes. Los jefes chinos están ‘cegados por uma arrogância nacionalista’ dijo el líder soviético Suslov. (WALKER, 1966:58)
A doutrina única e universal é caracterizada por pontos simples de fácil entendimento para
a massa. Segundo Walker (1996), a versão marxista-leninista desenvolvida por Mao Tse-tung
possui interpretações próprias e simplistas do mundo. Assim como para Hitler ou Stalin, quem
não os apóia em suas doutrinas está contra eles e deve ser combatido (ou se está do “lado
bom” do mundo, ou se está do “lado mau” e fadado a sucumbir na história). Esta doutrina
simplista serve também para que o governante possa moldá-la e interpretá-la de acordo com
suas conveniências. Um país como a URSS pode, assim, passar de um grande aliado chinês,
para um inimigo imperialista conforme os interesses do governo. Hitler declarava que todos
devem trabalhar pelo bem comum – da raça ariana – e declarava guerra àqueles que se
opunham à sua doutrina. Em conformidade com Hitler, Mao Tse-tung também buscava uma
sociedade sem classes, na qual cada indivíduo fosse uma peça importante nessa engrenagem.
Uma sociedade unida, coesa, levaria ao crescimento de sua força: seja militar (objetivo
buscado por Hitler), seja a evolução do conhecimento humano (buscado na teoria marxista
como forma de acabar com as classes).
A restrição do conhecimento humano, segundo a teoria marxista, leva à manutenção e a
diferença entre as classes. Segundo Mao Tse-tung (1982), “Na sociedade de classes, cada
indivíduo existe como membro de determinada classe. E todo pensamento traz, sem exceção,
o selo de classe” (Mao Tse-tung, 1982:80). Ao minimizar o frágil conhecimento unilateral e
50
superficial das classes operárias; seria possível também diminuir as diferenças entre burgueses
e proletários.
La Boetie (1975) também aborda o tema ao descrever o tipo de homem que não esquece o
seu privilégio natural; a liberdade. Os homens que treinaram seus estudos através da
aprendizagem não possuem nenhuma satisfação com a servidão, mesmo que esta esteja bem
disfarçada. Dessa forma, estes homens se tornarão reacionários diante de um tirano.
Partindo deste conceito, pode-se dizer que a ideologia marxista seria a busca de uma
sociedade livre através do conhecimento humano. Em um trecho descrito por Mao Tse-tung
percebe-se claramente sua influência:
Durante um período muito longo na História, o homem esteve limitado a uma compreensão meramente unilateral da história da sociedade, porque, de um lado, a compreensão tendenciosa das classes exploradoras a distorcia constantemente, e, de outro, a produção em pequena escala limitava o horizonte humano (Mao Tse-tung, 1972: 80)
Esta busca pela liberdade da sociedade não foi, no entanto, característica dos governos de
Mao Tse-tung e Stalin, uma vez que estes, utilizando-se da interpretação da teoria marxista, se
converteram em ditadores que, em nenhum momento, permitiram a efetiva participação
popular. A educação formal foi incentivada por Mao Tse-tung, desde que disseminassem suas
idéias. Este fenômeno é claramente observado na Revolução Cultural chinesa, que tinha como
objetivo eliminar qualquer pensamento reacionário.
Um homem que consegue enxergar a real situação de exploração e servidão através da
educação consegue se libertar dos laços de exploração entre dominantes e dominados. Por isso
os governos totalitários travam batalhas contra qualquer outro tipo de ideologia, mantendo
assim uma doutrina única.
Como apoio para o pensamento único, o partido monopolizador exige de seus membros
total lealdade e obediência cega. Este recurso do partido único é utilizado para que a ideologia
51
penetre em toda a sociedade, de forma a reeducar o povo e disseminar as idéias do governante
sem que haja a possibilidade de idéias contrárias influenciarem a massa. Em seu “Discurso da
Servidão Voluntária”, La Boetie (1986) alega que o tirano não encontra melhor maneira de
consolidar seu poder e aumentar a servidão senão pelo afastamento das idéias divergentes e
libertárias já existentes no espírito dos súditos.
Segundo Walker (1966), um dos fatores que explica as atitudes arbitrárias e
“freqüentemente irracionais” dos regimes autoritários é a maneira como o ditador é adulado e
sua imagem glorificada. Para ele, este tipo de engrandecimento produz no governante um
sentimento de megalomania e loucura. La Boetie(1986) confirma este argumento quando diz
que o tirano, em um espírito de grandeza, passa a estar acima das leis, direito este que foi
entregue pelas mãos dos próprios súditos. O culto ao chefe é importante para manter a
obediência e aumentar o nacionalismo da massa. Segundo Weber (2004), esta massa que
enxerga neste líder, quase que um ser divino, exige também constantes provas de suas
qualidades extra cotidianas. Weber (2004) alerta para a importância da manutenção e
demonstração destas qualidades que nunca podem faltar; caso contrário ele correrá o risco de
perder o carisma e o apoio da massa.
Para que seja evidenciado como governo totalitário, o líder deve ser seguido a qualquer
preço, e por vezes sem questionamentos explícitos.
Ante este estandarte de sangre, que representa a nuestro Fuher, yo juro dedicar todas mis energias y mis fuerzas al salvador de mi país, Adolfo Hitler. Yo estoy dispuesto y listo a dar mi vida por él, ante Dios lo juro.” Juramento de los Jungvoll (juventudes) en la Alemania Nazista (WALKER, 1966: 67)
A guerra é um aspecto fundamental nos governos totalitários que utiliza da violência em
nome da paz. Para Mao Tse-Tung, que é um teórico da guerra e consegue disseminar suas
52
idéias, “el poder político se impone a fuerza de pistola”30 e não existe revolução sem
violência. Para o Chefe Maior do Exército Nacional de Libertação chinês, a guerra no Vietnã é
descrita como um sacrifício e um mal necessário, que oferece resistência à agressão
imperialista, caso essa resistência não existisse, a população se converteria em dóceis
escravos31. Para ambos os lideres estudados, existe uma glorificação da guerra. Para Hitler
(1983), estar nela para defender a Pátria é uma grande honra para qualquer cidadão.
O espírito militar da massa é desenvolvido durante o período de governo de Hitler e Mao
Tse-tung e as constantes demonstrações de força através das paradas militares ajuda a
engrandecer a disposição para a luta dos indivíduos. O desvio de parte de bens humanos e
econômicos para fins bélicos, com o apoio da massa, é também uma característica dos
governos totalitários que estão em constante estado de guerra contra um potencial inimigo. Na
Alemanha, Hitler mobilizou toda a população: cada um tinha um papel importante na
sociedade (produzir, reproduzir, educar e lutar) no apoio à guerra. Na China, assim como na
Alemanha, eram realizadas constantes paradas militares que eram utilizadas para demonstrar
força no âmbito doméstico e internacional. No caso da Alemanha serviu para unir ainda mais
o povo, em torno das políticas militares nazistas; este era um momento de acreditar novamente
na potência alemã que Hitler prometera.
Era exigido do povo treinamento militar – de forma evidente ou através do culto ao corpo
existente na Alemanha – para que assim estivessem preparados contra o inimigo. Após a
passagem por uma crise nacional, o medo latente de uma nova subjugação às vontades
estrangeiras faz com que o apoio e a disposição para a luta, façam parte da realidade da massa.
Os governos totalitários lutam durante todo o tempo contra um inimigo maior, e
necessitam sempre realizar “grandes feitos” 32. Se lhe faltam movimentos vitoriosos, o líder
correrá o risco de perder o apoio da massa. Por isso, com o artifício do monopólio das
30 WALKER, Richard L.. El peligro Chino. Chicago: American Bar Association, [1966]. 155 p 31 Faz-se referência a servidão voluntária de La Boetie 32 A intenção da propaganda é fazer também com que a massa sempre acredite nesta afirmação.
53
informações, os governos conseguem focar a atenção para um problema externo. O foco nos
problemas externos é também um meio utilizado para distrair a atenção da massa para a
importância das mudanças internas que impõem sacrifícios ao povo, mas que se justificam
com a busca por um bem maior.
Através da propaganda de massa, os líderes do século XX elevaram seu poder e seu
domínio através da manipulação da massa, que “dava seu aval às iniciativas do governo”
(LENHARO, 1986: 8). Para Lenharo (1986), o essencial da propaganda era compreender o
mudo e as vontades da massa, representando seu sentimento, de forma que essa massa seria
“tocada por uma vaga e sentimental nostalgia por algo forte que as complete” (LENHARO,
1986.: 48). Um meio utilizado pelas propagandas, segundo Arendt (1989), era a idealização e
manipulação em torno da imagem de um inimigo. “O judeu é abordado como um animal
perigoso – mãos aduncas, rosto encarniçado, olhar sádico e cúpido, vive sempre à custa dos
outros” (LENHARO, 1986.: 56). Para Arendt (1989), este artifício auxilia na unificação da
massa em torno do líder.
Por isso, Hitler, Stalin ou Mao Tse-Tung tomavam a mesma posição agressiva e hostil
quando qualquer nação estrangeira opinava sobre sua política. Apesar da massa não ter acesso
à imprensa estrangeira, as respostas a qualquer crítica eram revides com acusações hostis na
tentativa de desqualificar o oponente, dessa forma os tiranos tentam justificar os seus atos
perante a comunidade internacional e a sociedade doméstica. No livro “El Peligro Chino”
Walker (1966) ilustra este argumento com diversas respostas agressivas feitas pelo PCC:
El Premier Chou En-lai em su mensaje al Congresso Nacional del Pueblo: ‘El imperialismo de los Estados Unidos ha hecho todo el mal que ha podido. Es el agressor más grande que ha conocido la historia33, el enemigo más feroz de la paz mundial y el principal puntal de las fuerzas reaccionarias del mundo. Los pueblos y naciones de todo el orbe que quieran hacer revolución y liberarse, todos los países y pueblos que quieren alcanzar su independencia y salvaguardar su soberanía y todos los países y pueblos
33 Grifo nosso
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que quieran defender la paz mundial, deben dirigir lo más enconado de su lucha contra el imperialismo de los Estados Unidos.’ Peking Review, enero 1, 1965 (WALKER, 1966.; 47)
A essência humana descrita por La Boetie (1986) é naturalmente livre, então por que o
homem se sujeitaria a tirania? “Pois, para que os homens, enquanto neles resta vestígio de
homem, se deixem sujeitar, é preciso uma das duas coisas: que sejam forçados ou iludidos”
(CLASTRES et al,1986: 83). A “técnica da grande mentira”, que consiste no uso da propaganda
de maneira a manipular – negativamente ou positivamente – a verdade, se baseia em alguns
princípios: primeiramente, diga esta “verdade” a um número suficientemente grande, que
grande parte irá acreditar. Segundo La Boetie (1986), líderes tiranos possuem grande
habilidade de oratória e podem ser observadas em grandes discursos a céu aberto ou até
mesmo em pequenos grupos influentes. Através de seu poder de oratória e persuasão, Hitler
conseguiu ganhar tempo para colocar em prática sua política militarista; em segundo lugar,
repita esta “verdade” algumas vezes, para que convença algumas pessoas. Esta repetição
ocorre pelo monopólio dos meios de comunicação; em terceiro, diga esta “verdade” de
diferentes formas que convencerá aos outros; quarto ponto: acuse a outros.
O monopólio dos meios de comunicação será utilizado pelos governos totalitários para que
este se torne o único fornecedor de informações para a massa. As informações chegam à
massa de forma distorcida com o intuito de auxiliar no convencimento da ideologia imposta.
Jornais, revistas, rádio e filmes se tornam uma importante “arma” para a disseminação
ideológica e informação sobre os grandes feitos.
A propaganda possui vital importância para que o governo totalitário não se torne um
governo autoritário, descrito por Bobbio (2000), que faz diferença entre estes dois tipos,
através do apoio da massa. Segundo Arendt (1989), este apoio não seria conquistado apenas
pela força e sim pela disseminação e o convencimento ideológico, que utilizam principalmente
da propaganda como meio de difundir as idéias do regime.
55
A propaganda ideológica é vista por Bobbio (2000), assim como para La Boétie (1975),
como uma forma de pequenos grupos, manipularem as massas. La Boétie (1975) afirma, ainda,
que um tirano nunca empreende uma política injusta, sem que esta seja justificada com um
grande discurso a respeito do bem-estar público e bens comuns; a crença neste discurso e feita
através da propaganda de manipulação
Neste ponto, observa-se a contradição entre a ideologia marxista utilizada por Mao Tse-
tung e a realidade existente na China comunista. Por um lado, os marxistas (Mao Tse-tung,
1972) culpam a burguesia pela alienação histórica do proletariado, que, através da distorção,
provocava um conhecimento unilateral e superficial da classe mais fraca. Por outro lado,
temos Mao Tse-tung utilizando deste mesmo artifício em sua doutrina única e universal para
controlar a massa e criar uma nova identidade chinesa.
Aliado à propaganda, existe também a utilização do terror como forma de domínio da
massa. O povo que é governado por um líder totalitário está sujeito a um eterno estado de
vigilância governamental. No governo chinês, todos os estrangeiros eram vigiados, até mesmo
os conselheiros soviéticos não estavam imunes a esta vigilância. Arendt (1989) utiliza a
expressão “culpa por associação” para evidenciar o clima de terror criado por estes governos:
‘A culpa por associação’ é uma invenção engenhosa e simples: logo que um homem é acusado, os seus antigos amigos se transformam, nos mais amargos inimigos: para salvar a própria pele, prestam informações e acorrem com denúncias que ‘corroboram’ provas inexistentes, a única maneira que encontram de demonstrarem sua própria fidelidade. Em seguida, tentam provar que sua amizade com o acusado nada mais era que um meio de espioná-lo e delatá-lo como sabotador,,... (Arendt, 1989.:373)
La Boétie (1986) também discorre sobre o terror tirânico ao mencionar o controle social
que seu regime impõe. Em seu argumento, a massa tem o poder de se levantar contra a
dominação, mas, por medo e hábito, esta permanece em eterno estado de “servidão
voluntária” (La Boétie, 1975). É importante ressaltar que tudo que foi feito por estes líderes, o
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foi, se não com a ajuda, pelo menos com a condescendência da massa. Lenharo (1986) afirma
que a explicação de “anestesiamento coletivo” (LENHARO,1986.:9) seria insuficiente para
explicar o voluntarismo durante o Holocausto, a “solução final” era aceita e esperada pelos
anti-semitas. La Boetie (1986) descreve essa relação entre dominantes e dominados:
De onde tira os inumeráveis argus34 que vos espiam, se não de vossas fileiras? Como tantas mãos para golpear-vos, se ele não as empresta de vós? Os pés com que espezinha vossas cidades também não são os vossos? Tem ele poder sobre vós se não por vós mesmos? Como ousaria atacar-vos se não estivesse conivente convosco?35 Que mal poderia fazer-vos se não fôsseis receptadores do ladrão que vos pilha, cúmplices do assassino que vos mata, e traidores de vós mesmos? (Clastres et al 1986:79)
Arendt (1989) também reconhece no discurso de Hitler a relação existente entre
dominantes e dominados descrita acima por La Boetie (1986): “Tudo o que vocês são, o são
através de mim; tudo que eu sou, sou somente através de vocês” (Arendt, 1989: 375).
A utilização da propaganda como meio de disseminar uma nova ideologia
revolucionária pode ser empregada até um determinado período do movimento totalitário.
Após a tomada do poder, a disseminação superficial da ideologia revolucionária através da
propaganda terá que ser substituída pela doutrinação. É através da doutrinação que a ideologia
se perpetuará por anos, alcançando assim o objetivo que segundo Arendt (1989), todos os
regimes totalitários buscam.
“Quando o totalitarismo detém o controle absoluto, substitui a propaganda pela doutrinação e emprega a violência não mais para assustar o povo (o que só é feito nos estágios iniciais, quando ainda existe a oposição política), mas para dar realidade às suas doutrinas ideológicas e às suas mentiras utilitárias” (Arendt, 1989: 390)
Na busca por esse objetivo, regimes totalitários impressionam em sua forma hábil de
organizar a massa. Divididos em pequenos grupos de estudo sobre a ideologia e qualquer
outra atividade social, estes grupos contribuem para a vigilância social. A estrutura piramidal, 34 Argus, homem fabuloso de cem olhos. 35 Grifo nosso.
57
descrita por La Boétie (1986) como uma corrente interrupta que começa na massa e sobe até
o tirano, alcança desde um dirigente ligado ao líder até um simples camponês no interior do
país. La Boétie (1986) acredita também que neste tipo de organização social existe a busca
por interesses próprios de qualquer indivíduo que tenha uma pequena parcela de poder sobre o
grupo que lidera na estrutura. Sendo assim, ele afirma: “pelos ganhos e parcelas de ganhos que se
obtêm com os tiranos chega-se ao ponto em que, afinal, aqueles a quem a tirania é proveitosa são em
número quase tão grande quanto aqueles para quem a liberdade seria útil.” (CLASTRES et al, 1986
:100).
O poder e a importância conferidos a estas organizações sociais atendem aos seguintes
propósitos do regime totalitário: provar ao indivíduo sua impotência diante do poder
organizador do regime; levantar a confiança das lideranças do governo; servir como “arma” de
intimidação de visitantes e observadores estrangeiros; aumentar o interesse por parte das
lideranças e do povo em continuar apoiando o regime totalitário.
Para dominar toda a nação, não se pode afirmar que somente o terror e a propaganda
foram determinantes para a mudança de regime (apesar de que podemos considerar que estes
foram a base dos meios utilizados para alcançar a massa). Toda a sua força não teria o mesmo
efeito caso ambos os Estados – Alemanha e China – não tivessem passado por uma conjuntura
fundamental para a ascensão destas duas lideranças: a existência de um Estado falido, que,
segundo Jackson (1990), se caracteriza como um Estado que não pode salvaguardar
domesticamente algumas condições civis mínimas que um Estado deveria prover como a paz,
a ordem e a segurança.
A Alemanha pré-nazista, após a Primeira Guerra Mundial, passava por um momento de
desordem interna onde seus governantes não tinham mais controle sobre forças paramilitares e
a economia enfrentava um período de inflação exorbitante que aumentava o numero de
miseráveis no país. Para agravar a situação, o governo ainda tinha que pagar indenizações de
guerra aos países estrangeiros.
58
Na China existia o descontentamento com o governo imperial que já não dominava mais
áreas estratégicas do território. Os seus portos estavam dominados pelos estrangeiros a ponto
de ter como diretor geral das alfândegas um estrangeiro inglês. As cidades eram disputadas
entre países estrangeiros que ignoravam as fronteiras do Império. Grupos guerrilheiros
tomavam a frente no combate à invasão estrangeira. A disseminação do ópio pelos
estrangeiros contra a vontade imperial, que não sabia como evitar a entrada, também pode
demonstrar a fraqueza do Estado.
Estes estados fracos abriram espaço para que as ideologias nacionalistas infiltrassem na
sociedade, de forma que, após a chegada ao poder, quem não era militante era no mínimo
condescendente com o que estava acontecendo. A ideologia proposta por estes governos não
são pensamentos que surgiram de um único indivíduo, estas se caracterizam: “por um
conjunto de idéias e princípios, concepções, esperanças e emoções, unidos por um movimento
político radical numa época de crise.” (Bobbio, 2000: 809), Os carrascos voluntários de Hitler
não surgiram com o nazismo, estes apenas foram estimulados por um mito ariano que
declarava a superioridade do povo alemão e a inferioridade dos judeus que estavam se
enriquecendo a custa da miséria do povo ariano. Como o anti-semitismo já era um fato
presente na Alemanha, de acordo com Lenharo (1986):
Numerosos voluntários se antecipavam à exigência dos carrascos nazistas para fuzilar centenas de pessoas indefesas, e o faziam porque eram anti-semitas convictos e aprovavam integralmente a ‘solução final’ levada a cabo pelos nazistas (LENHARO, 1986 :09)
Fez-se apenas necessária a utilização de propagandas e doutrinas ideológicas anti-semitas
para fazer o povo entender qual era a raiz do problema alemão. Lenharo (1986) inicia esta
discussão ao afirmar que o essencial da propaganda nazista era atingir o emocional da massa,
captando a real vontade dela.
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O governo totalitário teve sua origem nos governos comunistas soviéticos, que serviram de
base para as diretrizes nazistas. “A esse respeito, Hitler diria no Mein Kampf (Minha Luta) que
havia aprendido muito com os métodos dos comunistas e não com sua doutrina” (LENHARO,
1986.:17). A ascensão do partido nazista é marcada por confrontos diretos com o partido
comunista e Hitler explica por que:
Mais do que qualquer outro grupo, os marxistas, ludibriadores da nação, deveriam odiar um movimento cujo escopo declarado era conquistar as massas que até então tinham estado a serviço dos partidos marxistas dos judeus internacionais. Só o título ‘Partido dos Trabalhadores Alemães’ já era capaz de irritá-los. (HITLER, 1983: 227)
O ódio ao oponente e o fanatismo ideológico são sempre incentivados por Hitler (1983)
que acredita que a conquista do povo somente ocorre quando, ao mesmo tempo em que se luta
pelo alcance dos próprios fins políticos, luta-se também contra o adversário do partido. É
importante lembrar que tanto a ideologia nazista de Hitler, quanto a comunista de Mao Tse-
tung afirmam que quem não está com eles, está contra eles.
“A história mostra que as guerras dividem-se em duas categorias: justas e injustas. Todas as guerras progressistas são justas, e todos as guerras que impedem o progresso são injustas. Nós, os comunistas, opomo-nos a todas as guerras injustas que impedem o progresso, mas não nos opomos às guerras progressistas, às guerras justas. E não só não nos opomos às guerras justas, como ainda tomamos activamente parte nelas. Como exemplo de guerra injusta temos a Primeira Guerra Mundial, onde as duas partes lutaram por interesses imperialistas, razão porque os comunistas do mundo inteiro se opuseram firmemente a ela.” (Mao Tse-tung, 1972.: 64) “O futuro do movimento depende do fanatismo, mesmo da intolerância, com a qual seus adeptos o defenderem como a única causa justa e defenderem-na em oposição a quaisquer outros esquemas de caráter semelhante.” (Hitler, 1983.:223)
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Mediante análise histórica dos casos estudados, pode-se observar uma linha de ação
característica dos governos totalitários. Para que ocorresse a ascensão do regime totalitário, foi
necessária primeiramente a existência de um governo anterior, fraco e incapaz de controlar o
seu próprio território. Mesmo sendo estes novos regimes, com ideologias políticas
antagônicas, podemos observar que ambos utilizaram como principal arma de atração da
massa, a propaganda política, que é caracterizada por Arendt (1948) como fundamental para a
construção dos partidos de massa no século XX.
Nota-se, também que não se pode explicar a servidão da massa somente através do poder
coercitivo, mas sim através da imagem de um líder carismático mistificado e cultuado. É
necessário que após o período de conquista da massa é importante que inicie uma nova fase de
doutrinação ideológica: está pretende ser mudança social e ideológica permanente no país.
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ANEXO
Program of the National Socialist German Workers' Party36
The program of the German Workers' Party is an epochal program.
The leaders reject the idea of setting up new goals after those included in the program have been achieved merely in order to make possible the further existence of the Party by artificially inducing discontent among the masses.
1. We demand the union of all Germans in a Great Germany on the basis of the principle of self-determination of all peoples.
2. We demand that the German people have rights equal to those of other nations; and that the Peace Treaties of Versailles and St. Germain shall be abrogated.
3. We demand land and territory (colonies) for the maintenance of our people and the settlement of our surplus population.
4. Only those who are our fellow countrymen can become citizens. Only those who have German blood, regardless of creed, can be our countrymen Hence no Jew can be a countryman.
5. Those who are not citizens must live in Germany as foreigners and must be subject to the law of aliens.
6. The right to choose the government and determine the laws of the State shall belong only to citizens. We therefore demand that no public office, of whatever nature, whether in the central government, the province. or the municipality, shall be held by anyone who is not a citizen.
We wage war against the corrupt parliamentary administration whereby men are appointed to posts by favor of the party without regard to character and fitness.
7. We demand that the State shall above all undertake to ensure that every citizen shall have the possibility of living decently and earning a livelihood. If it should not be possible to feed the whole population, then aliens (non-citizens) must be expelled from the Reich.
8. Any further immigration of non-Germans must be prevented. We demand that all non-Germans who have entered Germany since August 2, 1914, shall be compelled to leave the Reich immediately.
36 Retirado do site: http://www.yale.edu/lawweb/avalon/imt/nsdappro.htm
62
9. All citizens must possess equal rights and duties.
10. The first duty of every citizen must be to work mentally or physically. No individual shall do any work that offends against the interest of the community to the benefit of all.
Therefore we demand:
11. That all unearned income, and all income that does not arise from work, be abolished.
Breaking the Bondage of Interest
12. Since every war imposes on the people fearful sacrifices in blood and treasure, all personal profit arising from the war must be regarded as treason to the people We therefore demand the total confiscation of all war profits.
13. We demand the nationalization of all trusts.
14. We demand profit-sharing in large industries.
15. We demand a generous increase in old-age pensions.
16. We demand the creation and maintenance of a sound middle-class, the immediate communalization of large stores which will be rented cheaply to small tradespeople, and the strongest consideration must be given to ensure that small traders shall deliver the supplies needed by the State, the provinces and municipalities.
17. We demand an agrarian reform in accordance with our national requirements, and the enactment of a law to expropriate the owners without compensation of any land needed for the common purpose. The abolition of ground rents, and the prohibition of all speculation in land.
18. We demand that ruthless war be waged against those who work to the injury of the common welfare. Traitors, usurers, profiteers, etc., are to be punished with death, regardless of creed or race.
19. We demand that Roman law, which serves a materialist ordering of the world, be replaced by German common law.
20. In order to make it possible for every capable and industrious German to obtain higher education, and thus the opportunity to reach into positions of leadership, the State must assume the responsibility of organizing thoroughly the entire cultural system of the people The curricula of all educational establishments shall be adapted to practical life. The conception of the State Idea (science of citizenship) must be taught in the schools from the very beginning. We demand that specially talented children of poor parents, whatever their station or occupation, be educated at the expense of the State.
21. The State has the duty to help raise the standard of national health by providing maternity welfare centers, by prohibiting juvenile labor, by increasing physical fitness through the introduction of compulsory games and gymnastics, and by the greatest possible encouragement of associations concerned with the physical education of the young.
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22. We demand the abolition of the regular army and the creation of a national (folk) army.
23. We demand that there be a legal campaign against those who propagate deliberate political lies and disseminate them through the press. In order to make possible the creation of a German press, we demand:
(a) All editors and their assistants on newspapers published in the German language shall be German citizens.
(b) Non-German newspapers shall only be published with the express permission of the State. They must not be published in the German language.
(c) All financial interests in or in any way affecting German newspapers shall be forbidden to non-Germans by law, and we demand that the punishment for transgressing this law be the immediate suppression of the newspaper and the expulsion of the nonGermans from the Reich.
Newspapers transgressing against the common welfare shall be suppressed. We demand legal action against those tendencies in art and literature that have a disruptive influence upon the life of our folk, and that any organizations that offend against the foregoing demands shall be dissolved.
24. We demand freedom for all religious faiths in the state, insofar as they do not endanger its existence or offend the moral and ethical sense of the Germanic race.
The party as such represents the point of view of a positive Christianity without binding itself to any one particular confession. It fights against the Jewish materialist spirit within and without, and is convinced that a lasting recovery of our folk can only come about from within on the principle:
COMMON GOOD BEFORE INDIVIDUAL GOOD
25. In order to carry out this program we demand: the creation of a strong central authority in the State, the unconditional authority by the political central parliament of the whole State and all its organizations.
The formation of professional committees and of committees representing the several estates of the realm, to ensure that the laws promulgated by the central authority shall be carried out by the federal states.
The leaders of the party undertake to promote the execution of the foregoing points at all costs, if necessary at the sacrifice of their own lives.
64
BIBLIOGRAFIA
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http://www.epochtimes.com/9pingdownload/portuguese/9ping_portuguese_all.doc
http://educaterra.terra.com.br/voltaire/mundo/china_11.htm
Filmes:
A vida secreta de Hitler, David Lewis, Documentário 1958 Elenco: Eva Braun (archive footage) Adolf Hitler (archive footage) Westbrook Van Voorhis, Narrator Paula Wolf
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