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PR E F E I T U RA D A C I D A D E D O R I O D E J A NE I RO
S ECRETAR IA MUN I C I PAL DE ADM IN I S TRAÇÃO
SUBSECRETARIA DE ESTUDOS E PESQUISAS EM ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
CONCURSO DE MONOGRAFIA
TEMA: INOVAÇÕES NA GESTÃO PÚBLICA MUNICIPAL DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO
PRÊMIO CARLOS LACERDA
GESTÃO DEMOCRÁTICA DA CIDADE:
A IMPORTÂNCIA DO POSTO DE ORIENTAÇÃO URBANÍSTICA E SOCIAL
NA MANUTENÇÃO DO PROGRAMA FAVELA-BAIRRO
POR: YACAMIM HANA TUPI
RIO DE JANEIRO
OUTUBRO/2007
i
RESUMO
Esta monografia trata da aplicação da boa prática de métodos e estratégias para o
planejamento de ações técnicas na esfera pública municipal, especificamente, no
trabalho realizado no Posto de Orientação Urbanística e Social1 - POUSO - da
Secretaria Municipal de Urbanismo.
Na verdade, trata-se de uma política pública, tendo em vista, ser um instrumento
voltado para coordenação de ações e programas públicos que trabalham
transversalmente aspectos políticos, jurídicos, ambientais, urbanísticos e sociais, de
forma que resulte em compromisso público entre o Estado e a sociedade, objetivando
modificar uma situação em uma área especificam promovendo a eqüidade.
O trabalho se debruça sobre a experiência empreendedora realizada no POUSO
que apresenta em sua dinâmica elementos de ação planejadores, pedagógicos e
integradores para a conformação de uma prática inovadora no espaço público e na
esfera pública no trato com a chamada “cidade informal”, comumente conhecida pela
denominação de Favelas.
Em função da argumentação propõe-se um referencial teórico e instrumental de
Administração Pública Municipal o que constitui num importante diferencial no trato da
esfera local a fim de subjugar a feição tradicional, caracteristicamente técnico-funcional
em prol do Novo Modelo Gerencial de Administração Pública (New Public
1 Em dezembro de 2005, o programa recebeu o Prêmio Medellín no 1º Concurso Latino-Americano e do
Caribe para a Transferência de Boas Práticas, organizado pela Fundação Hábitat Colômbia em parceria
com a Prefeitura de Medellín no Fórum Ibero-Americano e do Caribe sobre Melhores Práticas.
ii
ii
Management - NPM) mais especificamente na Gestão Orientada a Resultados –
GEOR conjugada ao projeto político e abordagem de gestão da Administração Pública
Societal.
METODOLOGIA
Trata-se de uma pesquisa pautada no enfoque sistêmico com direcionamento de
natureza teórico-qualitativa, que objetiva analisar conteúdos teórico-conceituais e os
discursos dos profissionais da equipe a fim de fundamentar os procedimentos viáveis à
análise, interpretação, organização e sistematização dos dados.
No que diz respeitos aos discursos, estes foram oriundos de entrevistas realizadas
com os profissionais da área com o objetivo de subsidiar e aprofundar o entendimento
do objeto de estudo a partir da visão dos diversos saberes envolvidos, já que se trata de
uma equipe interdisciplinar.
Por conta do objetivo da investigação, o estudo expõe uma revisão de literatura,
sobretudo no entendimento da concepção de inovação e no processo de
desenvolvimento de uma política pública urbana.
Para poder discorrer o estudo sobre Inovação e Empreendedorismo na Gestão
Pública Municipal, baseei-me em REZENDE E CASTOR (2006), MAÑAS (1993) e FARAH
(2006) que apontaram a base conceitual necessária para entender a inovação enquanto
iniciativa na esfera local para o enfrentamento dos problemas de interesse público
requerendo um enfrentamento que ultrapasse a capacidade de ação isolada do Estado.
CASTRO (1999) e SOUZA (2000) foram o respaldo intenso no percorrer de toda a
monografia, por analisar com muita propriedade o processo democrático e participativo
de trabalho no interior das favelas enquanto caráter diferenciador e por isso inovador no
processo de inserção do poder público, através da operacionalização descentralizada dos
iii
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 4
CAPÍTULO I – PRESSUPOSTOS BÁSICOS 5
CAPÍTULO II – O PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DA INOVAÇÃO: O POSTO
DE ORIENTAÇÃO URBANÍSTICA E SOCIAL 8
2.1. INTRODUÇÃO 8
2.2. RECONHECIMENTO DE UM PROBLEMA 8
2.2.1. FAVELA: DE CASO DE POLÍCIA À POLÍTICA PÚBLICA 9
2.3. PLANEJANDO A ESTRATÉGIA DE SOLUÇÃO DO PROBLEMA 10
2.3.1. FASE DE IMPLANTAÇÃO: DE LOTEAMENTOS IRREGULARES AOS NOVOS BAIRROS 11
2.3.2. FASE DE ACOMPANHAMENTO: A INSERÇÃO DO POUSO 12
CAPÍTULO III - VIABILIZANDO UMA GESTÃO DEMOCRÁTICA 15
3.1. INTRODUÇÃO 15
3.2. A GESTÃO DO PROCESSO DE TRABALHO 15
3.3. A RACIONALIDADE DAS DIFERENTES PARTES INTERESSADAS NA GESTÃO 17
3.3.1. POUSO NA COMUNIDADE: AÇÕES 18
3.4. PONTOS DE AVALIAÇÃO: REFLEXÕES SOBRE AS LIÇÕES APRENDIDAS NOS DESAFIOS 25
CONCLUSÃO 28
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 30
ANEXOS 32
4
INTRODUÇÃO
A apreensão em torno da regularização fundiária das aglomerações subnormais -
favelas - para a real incorporação na cidade formal traz a este estudo análises e
interlocuções por conta da prática sistematizada e executada nos Postos de Orientação
Urbanística e Social nas comunidades que foram contempladas pelas ações do Programa
Favela-Bairro.
Visando desvelar o processo de trabalho enquanto resultado de várias ações e
objetivando um melhor entendimento em torno do nosso objeto de estudo, esta
monografia encontra-se dividida em três capítulos:
O primeiro configura-se em pressupostos de análises primordiais para a
compreensão da inovação enquanto um processo dinâmico de redefinição de ações e
estratégias, especificamente, no âmbito da administração pública.
O segundo situa o leitor no aporte teórico que justifica a linha de ação escolhida e da
processualidade pertinente no reconhecimento de problemas acerca do tema favela até a
conformação e implantação das estratégias em prol da sistematização das fases para o
tratamento do objeto de estudo.
O último capítulo apresenta elementos tais como a ação pedagógica e a cooperação
social que envolvem a gestão e todo o processo de trabalho realizado pelos Postos com
o objetivo de manter a urbanização e a transformação numa área municipal regularizada
inserida nos parâmetros urbanos como qualquer outro bairro formal da cidade,
propostas de intervenção do programa Favela-Bairro.
5
CAPÍTULO I – PRESSUPOSTOS BÁSICOS
1.1. EMPREENDEDORISMO E INOVAÇÃO: INTER-RELAÇÃO E CONCEPÇÃO
Rezende e Castor (2006) afirmam que os municípios, as prefeituras e as
organizações públicas podem ser vistas como um empreendimento. E para conquistar o
sucesso, necessita de empreendedores que de acordo com os autores, trata-se de pessoas
com diferenciais emanados de espírito empreendedor e desta forma são capazes de
oferecer soluções diferenciadas e alternativas peculiares.
A correlação do empreendedorismo com a inovação se dá tendo em vista que o
empreendedor é quem realiza, gera resultados positivos embasados em conceitos
sedimentados.
Peter Drucker define o empreendedor como sendo a pessoa que cria algo novo,
diferente, muda ou transforma valores, não restringindo o seu empreendimento a
instituições exclusivamente econômicas. É essencialmente inovador, com capacidade
para conviver com risco e incertezas envolvidas nas decisões.
Envolve ainda criação de serviços, produtos ou mercados que superam os já
existentes, com eficiência e custo reduzido, além de ser um tomador de decisões,
indivíduo com iniciativa, agressividade e faro para oportunidades, anseia para geração
de resultados e agrega valores acima do esperado no mesmo contexto sócio-político e
econômico, ainda sendo colocado com alto prestígio perante os outros envolvidos. Em
resumo, são vistos como agentes de mudanças, que identificam e criam chances, que
inovam.
Não sendo, portanto, um organizador de recursos – gerente - mas alguém voltado
para a definição de contextos (Dornelas, 2001). O empreendedor é um administrador
com visão clara dos propósitos na direção das atividades mais adaptadas aos seus
objetivos estratégicos (Rezende e Castor, 2006).
6
Essa correlação de empreendedorismo com inovação é entendida como:
“fazer ‘diferente’ com valor agregado, sem necessariamente ser novo... Neste
sentido, o município, a prefeitura ou organização pública inovadora é a que presta
um serviço ou oferece um produto com valor agregado” (Rezende e Castor, 2006).
E avaliam mais sobre o conceito de inovação, dizendo que para tal, requer processo
enquanto premissa trata-se, portanto, de uma metodologia englobando, também, a
definição de suas fases, seus produtos e seus pontos de avaliação.
Para Mañas (1993) o processo de desenvolvimento de inovação pode começar no
reconhecimento de um problema e também na exigência de solução a eles. Para que
esse processo ocorra faz-se necessário passar por alguns estágios que são: pesquisa
básica, pesquisa aplicada, desenvolvimento, teste ou avaliação, fabricação ou
acondicionamento, marketing ou disseminação. E no que envolve o cidadão temos os
estágios de: tomada de consciência, identificação, ajuste, combinação (seleção); adoção
ou comprometimento; implementação e aceitação.
A inovação vem sendo associada ao propósito democratizante, por conta disto Farah
(2006:55) afirma que:
“A inovação democrática é provavelmente o aspecto mais significativo do papel
que assume, progressivamente, os governos locais. Cremos que essa obrigação
inovadora responde a três desafios diferentes: o da participação do cidadão, o da
cooperação social e o da integração das políticas urbanas”.
Jacobi e Pinho (2006) enfatizam que a inovação é um dos componentes centrais de
“experiência de gestão municipal democrática” e a dimensão democrática é componente
central da inovação em governos locais. Endossando esta colocação, Farah (2006) tece
algumas considerações sobre experiências inovadoras como sendo aquelas que:
7
“proponham uma inversão de prioridades na aplicação dos recursos públicos;
trabalhem com a participação popular; considerem as características culturais,
regionais, valorizando-as, incentivando-as e resgatando a utilização de tecnologias
populares tradicionais; otimizem os recursos públicos, preocupando-se com a
transparência administrativa e com o acesso dos cidadãos à informação;
preocupem-se com a preservação do meio ambiente e equilíbrio ecológico;
democratizem as decisões no seio do aparato administrativo; apontem um potencial
pedagógico, educativo ou organizativo; contribuam para a melhoria dos serviços
públicos e qualidade de vida.”
Desta forma, apresentaremos nos próximos capítulos uma gestão orientada tanto
para a busca da eficiência como para a busca da perspectiva social do desenvolvimento.
8
CAPÍTULO II – O PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO DA
INOVAÇÃO: O POSTO DE ORIENTAÇÃO URBANÍSTICA E SOCIAL
2.1. INTRODUÇÃO
Ao trazer a concepção de inovação fundamentada na visão de modelo de eficiência
pautada no modelo econômico vigente, compreendemos porque a Reforma do Estado e
a passagem do modelo burocrático de administração para o modelo gerencial, envereda
para a teoria da nova gestão pública (New Publica Management –NPM) que pressupõe
aplicar nas organizações públicas os modelos de gestão da iniciativa privada e vivenciar
os conceitos de administração estratégica e de empreendedorismo, também define
princípios para possibilitar a classificação das estratégias municipais: reestruturação,
reengenharia, reinvenção, realinhamento e reconceituação (Jones & Thompson, 2000).
Somados ao exposto, nosso foco de ação está atrelado aos padrões de governança e
governabilidade evidenciados numa vertente societal voltada para uma dimensão
sociopolítica que enfatiza a participação social, a estrutura do aparelho de Estado e o
paradigma de gestão, através da gestão das demandas do público-alvo por meio de
canais viabilizadores da participação da população.
2.2. RECONHECIMENTO DE UM PROBLEMA
Em 2001, o IBGE apontava na cidade do Rio de Janeiro a existência de
aproximadamente 500 favelas, mas o Instituto Pereira Passos já contabilizava mais de
700. Essa disparidade numérica envolve divergências conceituais e encobre a
multiplicidade das questões sociais2 envolvidas no processo de favelização. Esse
processo é crescente e não poderia mais ser ignorado pelo poder público, já estava mais
2“A questão social não é senão as expressões do processo de formação e desenvolvimento da classe operária e de seu ingresso no cenário político da sociedade, exigindo seu reconhecimento como classe por parte do empresariado e do Estado. É a manifestação, no cotidiano da vida social, da contradição entre o proletariado e a burguesia, a qual passa a exigir outros tipos de intervenção mais além da caridade e repressão”. IAMAMOTO, Marilda Vilela & CARVALHO, Raul. Relações Sociais e Serviço Social no Brasil: esboço de uma interpretação histórico-metodológica. São Paulo, Cortez, 1983
9
do que na hora de tratá-lo dentro do escopo formal, é isso que provam os números e que
constata a História. É o que veremos a seguir.
2.2.1. Favela: de caso de polícia à política pública
Inserida na dinâmica do contexto urbano que indica um conjunto de casebres ou
cortiços amontoados, Abreu (1993) aponta que a primeira favela ou “favela original”
adveio com o Morro de Santo Antônio3. Esta favela conheceu o processo histórico que
acometeria o tratamento da questão social lá posta: caso de polícia, ações de remoções e
incêndios criminosos até sua total eliminação, quando o morro foi arrasado na década de
504.
Somente nos anos 60, mais especificamente no governo do egrégio Carlos Lacerda,
vislumbrou-se um projeto mais “ambicioso” de remoção com a criação dos novos
conjuntos habitacionais construídos na periferia da cidade – Vila Kennedy e Vila
Aliança. Ainda naquele período ocorreu o que Pixioline (2001) denominou de tentativa
de uma política “mais abrangente”, através da criação do Banco Nacional de Habitação,
responsável pela remoção de barracos e famílias.
No que diz respeito às experiências de remoção acentuavam-se no debate
internacional a questão da moradia e das cidades, com a realização da Primeira
Conferência Internacional do Habitat em 1976 quando estabeleceu-se que a remoção em
massa sairia da agenda das políticas habitacionais.
A conjuntura dos anos 80 vem acompanhada de um processo de abertura política e
com o fim do período militar, refletiram-se em políticas habitacionais menos
autoritárias. A partir do processo de transição democrática, as propostas de urbanização,
há tanto reivindicadas, foram incorporadas às políticas federais. Inicia-se, portanto, a
3 De uma realidade adensamento de fluxo migratório Norte-Sul, nas décadas de 1940 e 1950
10
percepção de que a favela foi um lamentável resultado do desenvolvimento industrial
somado a um crescimento urbano veloz e isento de planejamento, acrescidos a isto
temos as reiteradas tentativas de erradicá-las e que acumularam diversos pontos falhos.
Foi neste contexto que as políticas de legalização apareceram.
Sinopticamente, alcançamos a década de 90 e como abordaremos no próximo item,
inicia-se uma nova perspectiva para lidar com o fenômeno da favelização.
2.3. PLANEJANDO A ESTRATÉGIA DE SOLUÇÃO DO PROBLEMA
Em 12 de março de 1990 o prefeito Marcelo Allencar sanciona o decreto 9218 que
rege as obras existentes de construção, modificação e acréscimo em lotes, lotes de vila
ou em parcelas de lote. Com esta medida a Prefeitura visava a criação de regras
especiais de loteamento, de validade transitória de forma que simplifique os trâmites a
serem seguidos para obtenção destas legalizações, tendo em vista, os seguintes
problemas da cidade: ausência de correspondente construção de unidades
habitacionais;a existência de um grande número de obras em unidades residenciais,
executadas sem licença e a dificuldade na comercialização de imóveis devido a essa
situação de irregularidade.
Jorge Mario Jáuregui5 diz que pensar urbanisticamente a integração das favelas
implica conceber a tarefa como parte do Projeto Urbano que envolve uma estratégia de
reconquista da cidade visando sua rearticulação. Esta idéia de projeto urbano pressupõe
a formulação de uma estratégia espacial (comandada pelos projetos de estruturação
urbana) e de uma estratégia social (baseada na mobilização da população para a
participação na definição dos programas e no acompanhamento de todo o processo),
através das quais busca-se tornar as partes excluídas dos benefícios da vida urbana,
4 Ver artigo de Vaz, Lílian Fesseler e Jacques, Paola Berenstein. Pequeno histórico das favelas no Rio de Janeiro, disponível no site www.anf.org.br. Agência Nacional de Favelas.
11
ambientes favoráveis para o convívio e a inserção social. As áreas de favela abrangem
no Rio de Janeiro um terço de sua população, aproximadamente 1.500.000 de pessoas,
necessitam ser vistas enquanto Projetos Especiais que conjugam todas as escalas e
problemas característicos de um meio muito complexo como é aquele de uma
megacidade.
Estes projetos tratam de criar “pólos de centralidade” capazes de estender o efeito
urbano também para as áreas do entorno, conectando e integrando as favelas aos bairros
vizinhos.
2.3.1. Fase de Implantação: De Loteamentos Irregulares aos Novos Bairros
Tendo origem no Plano Estratégico da Cidade, o Programa Favela-Bairro coordenado
pela Secretaria Municipal de Habitação desde 1994, conta com o financiamento do
Banco Interamericano de Desenvolvimento, demonstrando que naquele momento a
administração buscou adotar uma nova política de tratamento com as favelas em
substituição aos antigos projetos.
É nesse novo trato com as favelas que se insere o Programa de Assentamento
Populacional, comumente chamado de Programa Favela-Bairro, que tem como
objetivos complementar ou construir a estrutura urbana principal (saneamento e
democratização de acessos) e oferecer condições ambientais de leitura da favela como
bairro da cidade (Cardoso, 2002), conforme o decreto no. 14.332, de 07 de janeiro de
1995. E tem como metas a integração social e a potencialização dos atributos internos
das comunidades. Na prática, isso se traduz, em absorver um milhão de habitantes que
são excluídos dos serviços urbanos em cidadãos da cidade.
5 www.jauregui.arq.br/favelas2.html
12
De acordo com Vasconcelos (2000) o Programa Favela-Bairro representa uma
tentativa ao poder público de enfrentamento de forma global da questão das favelas no
Rio de Janeiro. Como vimos a cidade convive com essa problemática há um século,
demonstrando o quanto a sociedade brasileira é capaz de marginalizar as camadas
populares em relação às riquezas produzidas. Por outro lado, essa situação evidencia
não somente a exclusão econômica, mas a exclusão política dos ‘favelados’, o que
tornou este problema de difícil solução.
2.3.2. Fase de Acompanhamento: a Inserção do POUSO
Em cada comunidade onde é implantando o Programa Favela-Bairro, instala-se uma
unidade pública descentralizada denominada de Posto de Orientação Urbanística e
Social (POUSO). Por conta de tal dinâmica temos 29 postos atuando em 60
comunidades, sendo elas: Andaraí, Jamelão, Borel, Casa Branca, Chácara do Céu,
Ladeira dos Funcionários, Parque Boas Esperança, Parque da Conquista, Parque São
Sebastião, Quita do Caju, Vila Clementa Ferreira, Canal das Taxas, Terreirão, Vila
Amizade, Grotão, Caixa d’Águara, Morro da Fé, Caracol, Paz, Sereno, Chácara de Del
Castilho, Dendé, Dique, Fernão Cardin, Floresta da Barra, Formiga, Candelária, Chalé,
Mangueira, Telégrafo, Mata Machado, Tijuaçu, Morro Azul, Morro União, Parque
Royal, Rocinha, Grota, Serrinha, Buriti, Congonhas, Faz Quem Quer, Moisés-Santana,
Morro do Sapê, São Miguel Arcanjo, Sossego, Divinéia, Três Pontes, Tuiuti, Chácara
do Céu, Vidigal, Pedra Bonita, Vila Canoas, Pereira da Silva, Vila do Céu, Vila São
Jorge, Candelária, Chalé, Mangueira, Telegráfo, Cachoeira Grande, Cachoeirinha, Cotia
13
e Santa Teresinha.
Fonte: www.rio.rj.gov.br/smu
De acordo com Tânia Castro6 o POUSO começou em 1990, mas na verdade só foi
oficializado através de decreto em 1996, no primeiro governo de César Maia, e só
passou a existir no organograma da Secretaria de Habitação em março de 1997, quando
foi criada uma nova estrutura, e o POUSO foi inserido como uma Coordenação de
Orientação e Regularização Urbanística das Áreas de Especial Interesse Social, ficando
na Secretaria de Habitação até meados de 2003 quando foi transferido para a de
Urbanismo.
Essa unidade pública de atendimento é composta por uma equipe de arquitetos ou
engenheiros e assistentes sociais e agentes comunitários que trabalham
interdisciplinarmente com o objetivo geral de orientar os moradores quanto à
preservação dos espaços públicos da comunidade e especificamente de garantir de
consolidação do novo bairro, manter dos equipamentos implantados, orientar novas
construções e controlar o crescimento das comunidades após as obras do Favela-Bairro.
Angariando também a função de se articular com órgãos que atuam no recolhimento de
lixo, instalação e manutenção da rede elétrica, fornecimento de água, tendo como
finalidade assegurar a presença dos serviços públicos nas comunidades.
Esmiuçando o objetivo do trabalho do POUSO, ele está inserido na dinâmica do
cotidiano social em fazer vigorar a legislação urbanística, orientar as novas construções
ou ampliações para evitar que sejam feitas em áreas públicas, locais de risco (encostas
de morro) e regiões protegidas por legislação ambiental (várzeas inundáveis ou
mangues), mantendo assim o alinhamento das ruas. O trabalho dos técnicos visa ainda
preservar o espaço público, livrando-o de invasões; manter o alinhamento das ruas,
6 Coordenadora da Coordenadoria de Regularização Urbanística – CRU.
14
escadarias e servidões; evitar que se construa em área de risco; controlar o crescimento
das comunidades (tanto horizontal quanto verticalmente) para que os equipamentos
implantados não se tornem insuficientes; elaboração de legislação urbanística para cada
novo bairro; reconhecimento de logradouros; planejamento local; orientação técnico-
construtiva no caso de novas construções; concessão de habite-se às unidades
habitacionais, licenciamento das novas obras, fiscalização, para que seja cumprida
legislação urbanística definida.
Estas áreas, atualmente, são tratadas pela legislação municipal através do Código de
Obras (que estabelece condições legais consideradas indispensáveis à aprovação da
construção das edificações residenciais) como Áreas de Especial Interesse Social
(favelas). 7
Vale a pena ressaltar que as chamadas Zonas de Especial Interesse Social (ZEIS) ou
Áreas de Especial Interesse Social (AEIS), têm por finalidade reconhecer a diversidade
de ocupações existente na cidade, de forma que permita integrar áreas tradicionalmente
marginalizadas e melhorar a qualidade de vida da população.
Então, a melhoria das condições urbanísticas e regularização fundiária têm seu ponto
de partida para um tratamento urbano, conferindo a estas áreas um plano específico de
urbanização, mediante suas características, de forma que padrões urbanísticos próprios
sejam determinados.
7 O Município do Rio de Janeiro possui dois regulamentos para construção de edificações: um voltado para as áreas de interesse estratégico (favelas) e outro que trata da cidade formal.
15
CAPÍTULO III - VIABILIZANDO UMA GESTÃO DEMOCRÁTICA
3.1. INTRODUÇÃO
Para que a solução dos problemas apontados no capítulo anterior sejam efetivadas
não basta somente a atuação do poder público, o que configura um agir das pranchetas
direto para áreas de atuação caracterizando-se em puramente tecnoburocrático. Mas de
superar esta forma de intervenção visando uma adesão dos segmentos interessados
(governabilidade), tendo em vista, uma nova forma de gestão, com a ênfase no local, na
participação e na cidadania.
3.2. A GESTÃO DO PROCESSO DE TRABALHO
Para que o objetivo do trabalho seja alcançado entendemos que esse processo
encontra-se pautado em componentes estruturadores que integralizam uma cooperação
social, são eles: a comunidade, o poder público e a participação.
A partir deste tripé estabeleceu-se uma forma dinâmica para que os indivíduos sejam
engajados na ação social transformadora e que as estruturas e os mecanismos estruturais
da administração pública superem o caráter improvisador de suas ações e alcance o de
equalizador levando a uma ação gerencial transformadora que promova resultados, base
da Gestão Orientada a Resultados - GEOR.
A proposta do POUSO pauta-se exatamente em alterar as ações empíricas
distorcidas junto as áreas ditas “informais” e as engaja numa estrutura renovada de
pensar e agir com valores, atitudes e comportamentos do cotidiano.
Ao tratarmos de um processo inovador é importante refleti-lo enquanto uma gestão
estratégica que afeta a maneira de agir e pensar (racionalidade substantiva) de dirigentes
e funcionários que rebate diametralmente nas demandas e nas necessidades da
comunidade.
16
Desta forma o trabalho do POUSO tem um cunho proativo de agregar as análises
racionais de diálogo estratégicos por meio de um plano consensual sobre as prioridades
coletivas, as organizações e os compromissos.
Envolve também a questão do desenvolvimento a partir da esfera local – Gestão do
Desenvolvimento – entendendo que os processos de trabalho em âmbito local são
atividades contínuas, sistemáticas, permanente, participativo, ascendente, regionalizado,
descentralizado e integrado com os sujeitos (Costa e Cunha in Jacobi e Pinho, 2007:75)
com a participação dos sujeitos locais.
Essa participação é um exercício contínuo de poder das camadas populares, requer
estruturas de apoio próprias a esse exercício e criadas a partir dele para que aconteça de
forma organizada e ordenada a fim de que a soma dos esforços resulte no melhor
aproveitamento dos recursos disponíveis (idem:76).
O reconhecimento das características da região através de estratégias de
aproximação e inserção na comunidade são realizadas – como vermos mais adiante – e
acrescidas de um planejamento que considera as peculiaridades e o conhecimento
aprofundado das demandas localizadas.
Enquanto metodologia o trabalho é embaso no processo pedagógico que Souza
(2000) aponta como meio e instrumento de ação a partir das condições, peculiaridades
próprias da realidade de trabalho, dos objetivos a serem alcançados e das relações
pedagógicas entre o profissional e a população. Na prática torna-se um conjunto de
processos pedagógicos e meios técnicos definidos a partir da realidade comunitária e
dos seus objetivos de transformação social. Os referidos processos e meios expressam a
relação pedagógica, de troca e cooperação que se estabelece entre o profissional e a
população comunitária em função de objetivos que vão sendo estabelecidos pela
comunidade (Souza, 2000:140).
17
Aspectos operacionais, físicos da área, históricos da comunidade, equipamentos
sociais e funcionamento, econômicos e políticos, pedagógicos das ações desenvolvidas
são o eixo de sistematização exploratório que através de instrumentos e técnicas8 (vide
anexo) e articulação com as estruturas de apoio (nos remete a uma organização da força
social visando a racionalização e a ordenação dos recursos comunitários de modo a
servir melhor à população) embasam o plano de ação da realidade a ser trabalhada e
promover novos arranjos territoriais, repensando a divisão do território em termos de
sinergia.
E para a gestão trata-se de um modo de apoiar a gestão social do desenvolvimento
pelos agentes do desenvolvimento que buscam provocar mudanças estruturais no
modelo de desenvolvimento, tornando-o mais justo e solidário.
Tratamos aqui de uma nova configuração e organização territorial por meio de
priorização de redes interpessoais, sociais e culturais, conferindo dinamismo aos atores
locais.
3.3. A RACIONALIDADE DAS DIFERENTES PARTES INTERESSADAS NA GESTÃO
Como é o trabalho do POUSO no âmbito local? Como pensam seus profissionais?
De que forma traçar o agir profissional para que fique em consonância com os interesses
da administração pública e da comunidade? Como trazer uma gestão e uma discussão
societal num espaço marcado por carências, por condições de vida e reprodução
expropriantes e de um cotidiano alienador?
Apresentaremos a seguir, sumariamente, a fala e a colocação das diferentes
racionalidades profissionais em ação no trabalho do POUSO com o objetivo de
demonstrar que para um processo de inovação há de se apropriar e aprimorar as técnicas
8 São exemplos de instrumentos e técnicas: documental de informação, abordagem, observação, diálogo e
entrevista, reunião, palestra, pesquisa-ação.
18
empregadas, além de mediar as diferentes tensões que perpassam a efetivação de uma
prática de gestão territorial democrática.
3.3.1. POUSO na Comunidade: ações
Ao avaliar a ação do POUSO sob o cunho democrático, descentralizador e
desburocratizante do serviço público, o tratamos sob o ponto de vista da política social,
que de acordo com Souza a apreende como:
“a movimentação da população em suas áreas de moradia como tensão social
ou possíveis tensões, define mecanismos de controle que atuam cada vez mais
diretamente nessas áreas” (2000:14)
De acordo com a Coordenadora da Coordenadoria de Regularização Urbanística,
Tânia Castro, “O POUSO tem esse lado social aliado, que é o trabalho social
desenvolvido com os moradores, que passa muito por um trabalho educativo, todo feito
com metodologia de ação participativa que procura atingir todos os moradores, todos
criando representantes, setores dentro da comunidade por beco, por rua, por conjunto
de pequenas ruas, pequenos becos, divisão geográfica mesmo, espacial”.
A gente cria sistema de representação, capacita esses representantes que são
voluntários, e eles passam a ter reuniões sistemáticas com a equipe do POUSO, e
passam a ser a ponte entre o poder púbico e os moradores, eles pegam reivindicações
dos moradores e levam a mensagem do POUSO de volta para os moradores.”
Na verdade podemos notar que está sendo constituído um exercício de participação
social nos atos cotidianos dos moradores, em que são estabelecidas relações entre os
indivíduos e as instituições.
Apesar de sabermos que a efetiva participação é aquela nas quais moradores
utilizam bens e serviços da comunidade, temos no processo de eleição dos
19
representantes voluntários, denominados Representantes de Rua, o estabelecimento de
relações significativas entre os moradores e a instituição.
Decerto, o movimento que está sendo estabelecido, pode ser entendido como a
gênese da formação de uma dinâmica de forças sociais em torno de preocupações e
interesses comuns, já que os moradores representam à ação da sociedade civil, mesmo
com a presença do POUSO enquanto poder público, estabelecendo-se, desta forma, a
relação Estado-Sociedade, que a partir da compreensão de Bravo,
“é mediatizada pelas políticas públicas, ação dos profissionais e movimentos
sociais, sendo estes últimos importantes para construção de políticas públicas
democráticas e para a conquista da cidadania” (1993:113).
Esse trato diferenciado corrobora para que tais ações propiciem a inclusão de novas
parcelas da população no âmbito da atenção da estatal, portanto, da cidadania – e pela
adoção da perspectiva de direitos (elementos centrais da própria noção de cidadania)
(Farah, 2006).
Se o processo social é norteador da cidadania conforme apontado por Souza, deve-
se atentar para a
“solidificação dos canais de comunicação e poder popular para que o Estado
se coloque a serviço do povo. Nesse sentido, muitas ações passam a ser legítimas,
mesmo como atividades não-legais, pois traduzem necessidades coletivas de grupos
legítimos” (Souza, 2000: 221).
Quando o profissional reconhece o caráter histórico do processo participativo das
comunidades, ele pode compreender melhor a atuação e a dinâmica que a caracteriza.
Retornando aos Representantes de Rua, pode-se reconhecer neles pontos de força e
atuação social já que são conhecedores dos conflitos comuns existentes com o sistema
dominante.
20
O que a autora propõe é a “repercussão participativa”, isto é, o estímulo da
comunidade para descobertas na área em que moram, que pode acontecer com a
presença ou não da Associação de Moradores.
“Eu acho que a tendência é melhorar, à medida que você está lá no dia-a-dia,
as pessoas vão incorporando mais todos os seus desejos de cidadão, porque a gente
embute neles que eles, o governo têm obrigação, mas também têm deveres para
com o governo, não é só receber aquele bem, o que ele vai dar em troca, a
manutenção daquele espaço, divulgando as coisas certas, as coisas erradas na
própria vizinha. Então eu acho que não é um trabalho que tenha fim é uma questão,
porque a educação permanente, educação não se educa hoje é vai embora, tem que
estar sempre trabalhando em cima daquilo.
E os outros profissionais já estão ajudando em relação a isso (arquitetos,
engenheiros).”Assistente Social do POUSO
Nessas comunidades, existe o grande potencial para a formação de grupos, como os
de jovens, de idosos, de estudantes, entre outros, que trabalhando de forma associada
apreenderam melhor o sentido do exercício de participação, fazendo com que almejem
renovações.
Visando uma melhor compreensão de como o POUSO trabalha os recursos
pedagógicos como grande aliado para difundir informação (vide anexo) a equipe atua
através de recursos pedagógicos que confluem com o estímulo dos moradores tais
como: planfetagem, folders, cartinhas para as crianças e através do Diploma Calçada
Limpa entregue aos moradores da comunidade, e do Certificado de Conclusão do Curso
de Capacitação.
Refletindo sobre a importância da construção do social, enquanto forma de se
constituir em sociedade, nas relações sociais, como Sposati (1998:64) bem expõe, o
21
social enquanto construção, isto é, processo histórico em franco movimento, nos mostra
o caráter do coletivo.
Montaño ao analisar a sociedade civil e vida cotidiana, constata que as duas são a
mesma coisa, e como ele mesmo afirma, o cotidiano não é exclusividade da sociedade
civil. É nesse ínterim de cotidianidade que temos a construção histórica, já que sem ela
é impossível pensar a existência do ser social (cf. Montaño 2003:260).
A questão da Associação de Moradores é vista por alguns profissionais como uma
possibilidade de estreitamento de relações, como relata a engenheira do POUSO Sandra
Regina da Costa Rodrigues, que já está no POUSO há três anos e fez a seguinte
observação:
“...vem cá, você vem aqui pra tomar o meu lugar? Porque muitos acham isso,
que o POUSO está indo pra lá para acabar com a Associação de Moradores, não
tem nada a ver uma coisa com a outra, a Associação é uma coisa importantíssima. O
POUSO está lá durante a semana em horário comercial, a Associação esta lá todos
os dias, em qualquer horário, então eles são um grande filtro de problemas que a
comunidade tem e eles podem nos passar. Eu acho ótimo que a associação nos
mande ofícios, precisamos disso, precisamos daquilo, que em cima disso eu vou
sentar com eles, isso dá pra gente pedir, isso aqui nós vamos pedir assim, vamos
pedir assado, oh muda aqui o ofício, não faz assim, faz assado, faz ser mais fácil a
gente conseguir. Oh tá pedindo no lugar errado...que eu mesma posso enviar isso
através de memorando pra cá e daqui a gente encaminha, eu reafirmo a solicitação
da Associação, estou dando uma força pra Associação pro pedido dela. Se ele quiser
mandar por conta própria, não estou aqui pra impedir ninguém de encaminhar o seu
pedido pra qualquer lugar, mas acho que se a gente está lá dentro, podemos dar esse
22
apoio, credibiliza melhor o documento, dá mais força, mais peso.” (Engenheira do
POUSO)
Seguindo o esclarecimento de Souza (2000), a associação de moradores, além de
reunir, também deveria movimentar intensamente a força social da população para os
interesses e preocupações sociais comuns, mas, como a própria autora ainda avalia
muitas vezes as associações distanciam-se dos reais interesses da população para
ligarem-se aos grupos dominantes e, desta forma, os moradores têm visto no trabalho do
POUSO, através dos Representantes de Rua, associado ao trabalho das Agentes
Comunitárias uma nova forma de agir e de reunir alguns interesses comuns, tendo em
vista que o trabalho realizado pelo posto almeja o cunho urbanístico mas, para que este
se desenvolva, é atrelado a este o trabalho de orientação social.
Em comunidades onde a associação de moradores realmente representa aos
interesses dos moradores, a questão da participação aparece de forma mais intensa, pois
já existia uma base de reflexão e de ação de desenvolvimento comunitário, como afirma
Souza (2000). A importância da articulação do POUSO e a associação engrandecem na
medida que o lócus das associações são voltados para os limites de convivência dos seus
membros em torno da moradia (idem:217).
“A gente está sempre fazendo várias pesquisas e uma das pesquisas que eu fiz
foi à questão da representatividade e você fica boba como tem lugares que as
pessoas não identificam o líder.” (Arquiteta do POUSO)
Essa problemática com as associações de moradores na atualidade, vinculado com o
papel que elas vêm desempenhando de gerir serviços urbanos básicos, e muitas vezes,
junto a isso o que Fausto Neto (1994) aponta como fruto de favores e concessões,
sendo a associação de moradores base de relações clientelistas e políticas.
23
Desta forma existe uma dificuldade por parte dos moradores em reconhecer na
Associação de Moradores um líder, estabelecendo assim uma relação de distância e
indiferença, já que não atendem às necessidades e demandas das comunidades.
“Além de desgastes internos, o que se assistiu foi um processo de despolitização
dos conflitos e burocratização das organizações. Elas passam a ser “presas
fáceis” de interesses mais escusos, seja da política dominante e seus políticos
fisiológicos seja dos poderes paralelos gastados no interior das diferentes favelas”
(Fausto Neto, 1994:08).
Essa é uma forma que os moradores têm de perceber a realidade, pensando e agindo
neste local de forma ampla e desenvolvendo o exercício de poder no cotidiano,
ampliando a participação através de alianças.
“Todo tipo de demanda vai pro POUSO (até briga de marido e mulher) porque
é um posto da prefeitura dentro da comunidade e ali serão feitos os
encaminhamentos. Então, de lá, todos os problemas sociais da comunidade de
baixa renda vão para o POUSO e lá são encaminhados para os órgãos que
prestam diversos atendimentos. A gente busca estabelecer parcerias com outras
secretarias, com órgãos públicos em geral, com ONGs, com setor privado, tudo que
tem de recurso naquela região que possa estabelecer parcerias ou atrair
programas para comunidade. Esse trabalho é feito o tempo inteiro, então a gente
lida com um leque enorme de ações, todas ao mesmo tempo, mas na verdade o
nosso enfoque principal é a questão urbana” (Arquiteta do POUSO)
Sendo tratado por muitos como mera elaboração de atividades de cunho social, sem
ponderar o corte das causas mais internas do atraso e da dependência, seria em vão
tratar das políticas sociais sem cair no assistencialismo. Esta não é
24
“assumida como direito inalienável da população explorada, interpretada na
perspectiva da igualdade e da justiça social e, ao mesmo tempo, se atua contra as
grandes causas geradoras de exploração e da miséria, obviamente não se pode
falar de assistencialismo” (Alayón, 1992:54).
Trata-se de demonstrar que as políticas sociais estão apartadas do caráter
paternalista, desmobilizador, opressivo e obséquios políticos-partidários, mas que
encontra-se no campo do Estado e População.
O que diferencia a atuação da Associação de Moradores com o trabalho do POUSO é
apresentado no relato feito abaixo:
“Mas a nossa atuação não é política, política é associação de moradores, a
nossa atuação ali é política se você pensar que estender a questão de democracia,
democracia de verdade envolvendo a participação dos cidadãos na verdade é um
trabalho político, mas sem ser político-partidário de não estar envolvido com
nenhum presidente de associação. É realmente mobilizando a comunidade, é
envolvendo, é fazendo a comunidade participar, que é uma das coisas mais
importantes da democracia, do regime democrático que aqui a gente não tem.
Porque a gente está em democracia, porque a gente tem eleições e todos votam?
Mas, na verdade, a comunidade fica muito à parte das coisas. Porque o político
pula de um partido pra outro, enfim...
Mas no nosso trabalho a gente precisa .. como a gente vai estabelecer uma
relação, regras novas se a comunidade não estiver envolvida, como a gente vai
conseguir realmente que aquilo vai ser seguido? A gente está trabalho aqui pra quem
? Pro espaço? O espaço não corresponde a coisa nenhuma.” (Arquiteta do POUSO)
O que este relato nos aponta, aparece de forma mais esclarecedora com a citação de
Souza:
25
“Não se pode negar, a natureza política das associações de moradores. A
política é, sobretudo, um processo de opção que implica mecanismos de poder para
que as opções tenham condições de se efetivar enquanto realidade. A associação é
órgão basicamente político embora não deva ser partidário...” (Souza, 2000:218).
O trabalho dos profissionais (Assistente Social, Arquiteto e/ou Engenheiros)
envolvidos no POUSO não é de conformar o de uma Associação de Moradores, tende
em vista, que estes são representantes do poder público; mas sim, o de refletir sobre o
significado dos diversos agentes, das relações de poder existentes e do cunho
pedagógico de sua ação.
3.4. PONTOS DE AVALIAÇÃO: REFLEXÕES SOBRE AS LIÇÕES APRENDIDAS NOS
DESAFIOS
O POUSO atua na própria localidade, através de reuniões periódicas de moradores
por meio da seguinte dinâmica:
“São três reuniões em cada comunidade, dividia as ruas tudo certinho com as
agentes comunitárias, a gente tentava fazer três reuniões com a comunidade no
final do ano passado. Agora que eu consegui terminar a primeira, porque são três
etapas, três vezes em cada rua, agora que eu fechei a primeira porque a gente
marcava e tinha que desmarcar por causa da violência, por causa da ameaça do
tráfico. A gente já entregava o convite as pessoas diziam que não dava pra ir, não,
porque as coisas não estavam muito boas. Então, a gente tem que esperar acalmar
pra poder estar desenvolvendo este trabalho, quer dizer, depende da calmaria do
local.
A idéia é muito boa; agora você tem a grande barreira do tráfico, a gente tem
comunidades que tem POUSO sem tráfico, é uma maravilha é mais fácil pra
26
trabalhar. Mata Machado, Floresta da Barra, Recreio é uma maravilha.”
(Assistente Social do POUSO).”
A questão da metodologia de ação participativa articula a questão da
participação com o nível social. E reverter o quadro do fraco indício participativo dos
estratos socais mais carentes na organização social perpassa pelo trabalho social,
educativo.
Algumas comunidades são vitimadas pela questão da violência do tráfico de
drogas, que dificulta o trabalho dos profissionais que atuam no POUSO no que diz
respeito ao andamento agendado das atividades.
Para Fraga
“As favelas são territórios cujas estruturas físicas e sociais propiciam a
proliferação desta atividade ilegal. A ausência do Estado, mormente em relação à
segurança pública e políticas de inclusão, sua sinuosa topografia, obstáculo para
ações rápida dos órgãos de repressão, a desigualdade histórica marcante entre
seus moradores e os residentes em outras áreas da cidade, o isolamento de seus
habitantes face à dificuldade de acesso aos investimentos públicos, e a violência
policial histórica são elementos propícios ao desenvolvimento de atividades
ilegais” (2001:10).
De fato, o mesmo autor ainda analisa que as favelas estão mais próximas à cidade,
devido à maior integração à cultura e modalidades de lazer, porém a presença do
narcotráfico reterritorializou a favela, impondo limites, sitiando-a como seu espaço
físico.
“Dificuldade para eu começar trabalhar nenhuma, a dificuldade que a gente
encontra é dificuldade externa, não é da comunidade, é questão de briga de
traficantes com polícia, que atrapalha o seu trabalho porque com a políca na
27
comunidade, não dá pra ficar passeando, não dá pra trabalhar. A polícia entra eu
saio, quer dizer, eu me recolho fico dentro do POUSO porque pode estourar uma
bomba qualquer e eu vou estar ali.” (Engenheira do POUSO)
A possibilidade de um trabalho mais intenso e planejado se rompe quando segundo
Fausto Neto (1994), constata os limites do aparato institucional-legal na vida das
cidades.
“Então, a dificuldade que eu tenho de quem está começando agora é de um
trabalho que ainda está sendo construído, a gente tem ele no papel ,tem um ideal
que a gente quer seguir mas na prática, no dia-a-dia, está começando agora.”
(Assistente Social do POUSO)
Através dos relatos podemos constatar que a identidade social ainda está em
precípua construção, e que um trabalho mais articulado entre os POUSOS seria de
grande valia, até mesmo como um traço de experiência da prática profissional.
Concluindo, de acordo com Lima, “à medida que a população tenha condições
de expressar, através das reuniões, alguns de seus objetivos sociais, é que estarão se
efetivando os objetivos do serviço social, na linha da conscientização e da
participação social” (1980:131).
28
CONCLUSÃO
Vista como um aspecto positivo, a inovação contribui para a superação de formas de
dominação e de relação Estado-sociedade, baseadas no patrimonialismo e no
clientelismo, orientando-se para a universalização de procedimentos e para
democratização do acesso a serviços público e das oportunidades de participação nos
processos decisórios, além de contribuir para a efetiva resolução de problemas,
superando formas de atendimento ao cidadão ineficazes e meramente formais (Farah,
2006)
O decorrer do trabalho subsidiou o entendimento de que comparando o atual trato da
cidade informal com as velhas práticas, temos no POUSO uma prática inovadora e uma
racionalidade que vem se desenvolvendo enquanto viabilizadora de políticas públicas
sociais e urbanas à luz da Constituição Federal de 1988. Já que desde o fim do século
XVIII a questão da favela vinha sendo tratada como uma das “chagas” da cidade e
como “ameaça à ordem social”, à segurança e à saúde dos bairros circunvizinhos e só
agora, no final do século XX, recebeu o estudo e a atenção de uma equipe
muldisciplinar que através do trabalho das competências, habilidades e atitudes
propiciam uma atuação de forma interdisciplinar e intersetorial.
O que se procurou conduzir é o entendimento de que o trabalho realizado contribui
ao atendimento das demanda dos público-alvo no espaço onde estas são forjadas, além
de propiciar o envolvimento e participação dos serviços9 e da população.
No que concerne à Gestão é uma ação que instrumentaliza o planejamento e a
tomada de decisões, já que se trata de arranjos institucionais e organizacionais
descentralizados, através do trabalhados realizados pelos POUSOS. Aponta a melhoria
9 Integração com outras secretarias como é o caso da Secretaria Municipal de Assistência Social onde há
um trabalho de interlocução.
29
no desempenho dos programas e minimização dos fatores de risco para a sua
continuidade e sustentabilidade parametrizando o trato coisa da pública.
Destacamos aqui soluções técnicas, administrativas ou organizacionais introduzindo
a discussão de empoderamento; mudança no enfoque de como pensar a ação
propiciando a busca de novas soluções para problemas existentes, com enfoques
interdisciplinares e a orientação para o desenvolvimento integrado ou de
sustentabilidade ambiental, tratamos ainda da inclusão ativa e coletiva, abrangendo
participação e co-gestão na busca de soluções e no monitoramento de ações; articulação
com outros e novos arranjos institucionais, destacando a temática de parcerias, vínculos
e aliança; extensão e humanização de serviços, pioneirismo e respostas multitemáticas.
A inovação está no alcance de ser uma iniciativa implementada pela esfera local de
governo que configura verdadeira rede de atores e de entidades mobilizados em torno de
um ou mais problemas de interesse público, cujo enfrentamento ultrapassa a capacidade
de ação isolada do Estado. Assim a articulação em rede constitui, por si só, uma
inovação em relação ao modelo centrado em uma única agência estatal, assim como em
relação ao processo que excluía a sociedade civil das decisões (Jacobi e Pinho, 2006).
Temos no POUSO a iniciativa e o componente que rompe com a tradição de
trabalhar apenas com a cidade legal, dando início a uma nova era no urbanismo carioca,
passando agora a trabalhar com a cidade real10, é a gestão social articulando governança
e governabilidade e efetivando, através de um componente substantivo, o continuum das
políticas públicas.
10 Vide www.rio.rj.gov.br/smu/educacao/pouso.html
30
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