View
214
Download
0
Category
Preview:
Citation preview
1
TERRITÓRIO, TERRITORIALIDADES E LUTA PELA TITULAÇÃO DE COMUNIDADES TRADICIONAIS: O CASO DA COMUNIDADE DE
CONTENDA/VIANA/MARANHÃO
Lenôra Conceição Mota Rodrigues Universidade Federal do Maranhão - UFMA
lenora.motta@hotmail.com
Juscinaldo Goes Almeida Universidade Federal do Maranhão - UFMA
juscinaldogoes@hotmail.com
Marcelino Silva Farias Filho Universidade Federal do Maranhão - UFMA
marcelinobrasil@msn.com
Resumo O presente trabalho analisa distribuição da terra e a luta pela titulação dos territórios de comunidades tradicionais da Baixada Maranhense, tomando como lócus empírico a comunidade Contenda, localizada no município de Viana, MA. A comunidade possui uma área de 1.070 hectares e nela vivem 55 famílias que se autodefinem como remanescentes de quilombo. Segundo seus moradores era um espaço de produção de cana-de-açúcar que funcionava com mão-de-obra escrava. Os procedimentos metodológicos utilizados foram levantamento de material bibliográfico acerca de trabalhos já realizados na área de estudo, consulta de dados secundários mais gerais sobre a Baixada Maranhense e específicos sobre o município de Viana constantes no Censo Agropecuário 2006 do IBGE, além de realização de trabalho de campo na referida comunidade, ocasião em que foram realizadas entrevistas e registros fotográficos. Palavras-chave: Distribuição da Terra. Comunidades Tradicionais. Contenda. Viana – MA. Introdução A distribuição da terra tem ocorrido historicamente de forma desigual e injusta no Brasil
e em particular no Maranhão. Tal situação tem gerado concentração de terras e de todos
os recursos naturais com potencialidade de ser convertido em mercadorias a partir do
seu uso por quem concentra estas riquezas. Diante desta situação comunidades
tradicionais, a exemplo de indígenas, remanescentes de quilombos, ribeirinhos,
quebradeiras de coco babaçu e demais comunidades tradicionais lutam pela
regularização de seus territórios apropriados tanto material como simbolicamente nos
quais estas habitam há várias gerações.
Neste contexto, estão inseridas as comunidades tradicionais1 da Baixada Maranhense e,
2
em particular, a comunidade Contenda localizada no município de Viana. A referida
comunidade, que se autodefine como remanescente de quilombos, possui uma área de
1.070 hectares e de acordo com informações de seus moradores, era um espaço de
produção de cana de açúcar que funcionava com mão de obra escrava.
Para melhor compreender o processo de ocupação territorial desta região é interessante
fazer uma abordagem histórica e geográfica da Baixada Maranhense, tendo por mote
alguns trabalhos relativos a estudos já realizados sobre a referida área de estudo.
Dentre estes trabalhos, pode-se citar o que discorre a respeito de uma insurreição de
escravos no município de Viana, considerado um acontecimento de grandes proporções
ocorrido no ano de 1867 na Baixada Maranhense (Araújo, 2006). Este trabalho dá uma
significativa contribuição para se compreender o processo de ocupação desta região, que
está diretamente associada à economia açucareira a partir das grandes plantações de
cana-de-açúcar e consequentemente de inúmeros engenhos instalados nesta parte do
estado, mas diretamente associada à criação de gado bovino mais tardiamente.
Conforme Almeida e Mourão (1976), após a decadência do sistema monocultor
exportador gerado pela economia colonial, se teve, a partir de finais do século XIX e
início do século XX, nas áreas do litoral e nas áreas da Baixada do Golfo Maranhense, a
formação de um campesinato gerado pela libertação dos escravos que passou a se
dedicar a uma agricultura de subsistência com base no trabalho familiar, em terras do
próprio latifúndio.
O grande proprietário voltava-se, basicamente, para a pecuária extensiva, tirando o
restante de sua renda do aforamento da terra ao campesinato e da comercialização do
babaçu, este coletado e beneficiado pela unidade familiar camponesa (Almeida;
Mourão, 1976). Este trabalho torna-se importante pelo fato de demonstrar que a região
da Baixada Maranhense constitui uma das áreas de ocupação mais antiga do Maranhão.
Estas regiões mais antigas, com variações locais, possuem como traços característicos
um mesmo modelo básico de unidade econômica, onde o latifúndio sobrevive da
exploração do trabalho camponês, ao nível da produção agrícola, da pecuária, da coleta
do babaçu e da comercialização desses produtos (Almeida; Mourão, 1976).
Sá (2007) ressalta que a ocupação colonial se concentrou desde os franceses, em torno
da Ilha de São Luis e a partir da Ilha de Tapuytapera, futura Santo Antonio de
Alcântara, no continente, a noroeste da ilha que, em 1627, já era sede da capitania do
mesmo nome. Prossegue a autora informando que foi a partir desse núcleo que se deu a
3
ocupação da Baixada Ocidental maranhense que, por suas condições ecológicas e
socioeconômicas, constituiu-se progressivamente numa unidade regional específica. Até
o final do século XVII, o povoamento se concentrou no litoral e na Baixada, através do
estabelecimento de algumas fazendas de gado, principalmente próximo a Alcântara e
nos baixos cursos dos rios Grajaú, Pindaré, Mearim, Itapecuru e de uns poucos
engenhos de açúcar, em sua maioria na Ilha de São Luís, em Alcântara e no vale do
Itapecuru (Sá, 2007).
Outro estudo de destaque realizado na região da Baixada Maranhense diz respeito a uma
situação reconhecida pelos informantes e pelos os que os cercam, como terra de índio
num grande território localizado em sua maior parte no município de Viana, mas
englobando ainda os municípios de Matinha e Penalva (Paula Andrade, 2008). Neste
trabalho, a autora levanta a hipótese da referida data ter sido concedida aos índios
Gamela, uma nação indígena extinta, por meio de uma carta régia de Data de Sesmaria,
no período Pombalino, na segunda metade do século XVIII.
Analisando as diversas atividades econômicas desenvolvidas pelo grupo estudado,
Paula Andrade (2008) chama atenção para o fato de que a chamada Terra dos Índios
está localizada em uma região de lagos e de campos que se inundam no período
chuvoso, além de rios, igarapés, açudes, todos abundantes com várias espécies de
peixes.
Ainda conforme a autora, esses campos da Baixada Maranhense que inundam no
período chuvoso, sempre foram recursos abertos, havendo consenso, mesmo entre
grandes e pequenos criadores, quanto ao seu usufruto comum. O seu consequente
cercamento, principalmente para criação de búfalos - que vem se agravando nos dias
atuais – vem subvertendo essas regras tradicionais de usufruto comum e afetando uma
das atividades econômicas mais importantes dos camponeses da região a pesca (Paula
Andrade, 2008).
Procedimentos Metodológicos Conforme Ferreira (2003), a metodologia relaciona-se à execução da pesquisa,
compreendendo o detalhamento das formas e elementos que serão utilizados para
obtenção das informações necessárias ao desvendamento do problema levantado, o qual
se constitui objeto de estudo.
4
Para realização do presente trabalho, que é fruto de pesquisas que os autores atualmente
vêm desenvolvendo na Microrregião da Baixada Maranhense1, destacam-se como
atividades importantes: levantamento de material bibliográfico concernente a trabalhos
já realizados sobre a presente área de estudo, dentre os quais é possível destacar: Paula
Andrade (2008); Araújo (2006); Almeida e Mourão (1976); Feitosa (1983); Costa
(1982); Franco (2008); Farias Filho (2006); Farias Filho e Correa (2011); Farias Filho et
al. (2012).
O referido trabalho contribui para compreensão do espaço geográfico da Baixada
Maranhense considerando as relações espaciais, históricas, sociais, ambientais e
econômicas. Foi realizado ainda trabalho de campo no município de Viana, mais
especificamente na comunidade Contenda. Nesta ocasião foram realizadas entrevistas
(gravadas ou não), registros fotográficos e anotações em caderno de campo. Convém
ressaltar ainda o levantamento de informações secundárias, a exemplo dos dados do
Censo Agropecuário divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE) sobre a presente área de estudo.
Estudos sobre os aspectos geográficos da região: contribuições para análise da ocupação e a (re) produção no território da Baixada Maranhense No que concerne a trabalhos relativos a uma abordagem acerca dos aspectos geográficos
da Baixada Maranhense, Feitosa (1983) em estudos sobre a evolução geo-histórico-
cultural do Maranhão destaca que cerca de 90% da superfície do estado é composta de
rochas sedimentares cuja acumulação foi iniciada na era Paleozóica, com definição do
seu perfil a partir do período Siluriano. Dentro da classificação do relevo maranhense, a
denominada Planície Flúvio - Marinha é representada pela área da Baixada Maranhense
sujeita a inundações durante as enchentes dos rios: Pindaré, Mearim, Itapecuru e Munim
(Feitosa, 1983).
Ainda segundo o autor anteriormente citado, a referida planície estende-se em forma de
arco acompanhando os contornos do Golfão Maranhense imediatamente ao sul da
Planície Costeira, entre esta e a região sublitorânea, delimitada pelos baixos cursos dos
rios Turiaçu, a oeste, e Munim, a leste. Nesta planície estão situados os lagos e várzeas
inundáveis da Baixada Maranhense.
Já Costa (1982) em estudos sobre a Baixada Maranhense ressalta que esta ocupa uma
vasta área estimada em torno de 20.000 km², compreendendo os baixos cursos dos rios
Mearim, Pindaré, Pericumã, Grajaú e Turiaçu, constituindo uma gigantesca depressão
5
de terras alagadas, que se estende por vários municípios do estado situados na Pré
Amazônia Maranhense.
Para Costa (1982), no que se refere ao processo de povoamento da Baixada
Maranhense, várias tribos históricas contribuíram para povoar a região, a saber: os
coroas vermelhas, do Turi, dos quais quase nada se sabe; os Guajajaras do Pindaré ao
Mearim; os Tabajaras do Mearim e os Tupinambás do litoral; os gamelas e os barbudos,
do Mearim e do Itapecuru. Os jesuítas exploraram o Pindaré, formando com os índios
Guajajaras as missões de Conceição de Maracu (Viana) em 1684 e São Francisco
Xavier de Carará, atual município de Monção (Costa, 1982).
De acordo com Sá (2007) desde o inicio do processo de povoamento da região da
Baixada, ocorreu aí outra forma de exploração econômica, representada pelas unidades
produtivas organizadas pelas ordens religiosas que participaram da empresa
colonizadora. O seu desdobramento histórico desembocou na formação de um tipo de
campesinato livre comunal, cuja vigência efetiva, na área, se estende até o inicio da
década de 1970.
Segundo Farias Filho (2012), tanto na Microrregião da Baixada Maranhense como em
outras, com o declínio econômico do algodão, da cana de açúcar e principalmente após
a abolição da escravatura, no ano de 1888, os negros na condição de livres passaram a
constituir as localidades denominadas terras de preto, neste sentido a Baixada
Maranhense é uma região de monoculturas. O declínio da agricultura seguiu
ininterrupto pelo século XIX, sendo que no inicio do século XX a pecuária assumia
maior importância como a atividade econômica da região.
Conforme Franco (2008) percebe-se que a área da Baixada Maranhense se expressa
como uma extensa depressão estacionária das águas fluviais. A área em questão conta
ainda com a combinação de um aglomerado hídrico mesclado de lagos, rios, enseadas,
campos inundáveis e regiões estuarinas e também de um conjunto geoespacial formado
por terras firmes onde se destacam acidentes geográficos distintos, como ilhas,
penínsulas, pontas, estreitos e pequenos morros (Franco, 2008).
Outro importante trabalho realizado na Baixada Maranhense foi o de Farias Filho
(2006) sobre o cultivo de arroz em sistema de vazante nos municípios de Monção e
Igarapé do Meio. Segundo o autor, o cultivo de arroz, no sistema de vazante, possui
grande importância socioeconômica e é caracterizado, na Baixada Maranhense, pela
baixa utilização de insumos químicos, onde os trabalhos são, normalmente, realizados
6
por mão-de-obra familiar, com o uso de instrumentos simples e em pequenas áreas.
Concernente ao desenvolvimento de praticas agrícolas na Baixada Maranhense, Farias
Filho e Correia (2011) ressaltam que, estando assentado predominantemente na
Formação Itapecuru e parcialmente nos Aluviões Flúvio - Marinhos, a região apresenta
na maior parte de seu território solos com limitações para o desenvolvimento de praticas
agrícolas o que implica em reflexos sociais e econômicos, já que a principal atividade
econômica da região é a agricultura e a pecuária que dependem diretamente dos
atributos físico-químico dos solos para o seu sucesso.
Análise da distribuição de terra no território da Baixada Maranhense a partir dos dados do Censo Agropecuário 2006 Neste estudo será analisada a distribuição de terras a partir dos dados do Censo
Agropecuário (IBGE) do ano de 2006, relativos à Baixada Maranhense e mais
especificamente ao município de Viana. Tal abordagem torna-se fundamental, pois a
partir destes dados oficiais pode-se lançar mão de analises acerca da situação da
distribuição da terra e a condição legal da mesma, considerando a quantidade e área dos
estabelecimentos agropecuários da Microrregião da Baixada Maranhense e do
município de Viana.
Tabela 1: Número e área dos estabelecimentos agropecuários segundo a condição legal das terras na Baixada Maranhense
Condição legal das terras
Nº de
estabelecimentos
%
Área dos estabelecimentos
(em hectares)
%
Próprias
15.679
37,75
494.055
73,89
Terras concedidas por órgão fundiário ainda sem titulação definitiva
2.167
5,22
38.260
5,72 Arrendadas 5.145 12,39 56.565 8,46 Em parceria 1.083 2,61 16.846 2,52 Ocupadas 7.575 18,24 62.923 9,41 Total 41.534 100,00 668.649 100,00 Fonte: IBGE, Censo Agropecuário 2006.
Analisando-se a tabela acima, relativa à situação das terras na Baixada Maranhense,
observa-se que as consideradas terras próprias despontam como maioria. Tanto no que
diz respeito ao número dos estabelecimentos agropecuários (15. 679 ou 37,75%) quanto
em hectares, ou seja, 494.055 mais precisamente 73, 89% do total. Esta categoria (terras
7
próprias) segundo descrição do IBGE (2006) seriam aquelas de propriedade direta do
agricultor. A partir da análise destes dados supõe-se que na Baixada Maranhense há
uma expressiva quantidade de terras concentrada em mãos de poucos proprietários, que
para o IBGE está no segmento da agricultura não familiar.
Outra categoria que nos dados do Censo Agropecuário relativos à Baixada Maranhense
chama a atenção se refere às denominadas terras ocupadas, apresentando 7.575
estabelecimentos e área de 62.923 ha. Nesta categoria, conforme classificação do
próprio Censo Agropecuário está incluída propriedades pertencentes a terceiros, pela
qual o produtor nada paga pelo seu uso (ocupação, posse ou cessão). Depreende que os
agricultores inseridos nesta categoria são os mais suscetíveis a uma possível ação de
grilagem, pelo fato dos mesmos não possuírem o documento de posse dessas áreas.
Na tabela 2, são apresentados os dados do Censo Agropecuário concernentes ao
município de Viana - MA, cuja situação não foge à regra da observada em toda
Microrregião da Baixada Maranhense.
Tabela 2. Número e área dos estabelecimentos agropecuários segundo a condição legal das terras no município de Viana – MA
Condição legal das terras
Nº de
estabelecimentos
%
Área dos estabelecimentos
(em hectares)
%
Próprias 1.204 38,26 34.871 82,64 Terras concedidas por órgão fundiário ainda sem titulação definitiva
197
6,26
798
1,89 Arrendadas 309 9,82 4.883 11,57 Em parceria 102 3,24 82 0,19 Ocupadas 552 17,54 1.565 3,71 Total 3.147 100,00 42.198 100,00 Fonte: IBGE, Censo Agropecuário 2006.
Observa-se que as terras próprias constituem maioria, tanto no que se refere ao número
dos estabelecimentos (1.204 ou 38,26), como no tamanho da área, a saber: 34.871 e
82,64%. Em seguida aparece a categoria terras arrendadas contendo 552
estabelecimentos e ocupando uma área de 4.883 hectares. Estas áreas se enquadram no
domínio das terras cuja propriedade é de terceiros e que estava sendo explorada pelo
agricultor, mediante pagamento, previamente ajustado, de uma quantia fixa, em dinheiro
ou sua equivalente em produtos.
8
A tabela 3, apresenta dados que permitem fazer uma análise da situação da agricultura
na Baixada Maranhense segundo a utilização das terras classificadas em dois
segmentos, sendo agricultura familiar3 e agricultura não familiar tendo por base os
dados do Censo Agropecuário 2006.
Tabela 3. Número e área dos estabelecimentos agropecuários por utilização das terras e agricultura familiar na Baixada Maranhense. Utilização das
terras Nº de
estabelecimentos % Área dos estabelecimentos
(em hectares) %
Agricultura familiar
39.263
94,53
291.715
43,63
Não familiar 2.271 5,47 376.934 56,37 Total 41.534 100,00 668.649 100,00 Fonte: IBGE, Censo Agropecuário 2006.
A tabela acima é bem significativa, pois dar uma dimensão da distribuição da
quantidade e área dos estabelecimentos da agricultura familiar e não familiar na
presente área de estudo. Analisando tais dados salta aos olhos a quantidade de
estabelecimentos da agricultura familiar, ou seja, 39.263 contra 2.271 da não familiar.
Quando se lança olhar para o tamanho da área dos referidos estabelecimentos, é onde se
observa a grande discrepância existente. Os classificados na categoria da agricultura não
familiar, a pesar de apresentarem um número menor de estabelecimentos, ou seja 2.271
(5,47%) concentra a maior extensão com área de 376. 934 hectares, o que significa a
ocupação de 56,37% das terras. No segmento da agricultura familiar, são 39.263
estabelecimentos agropecuários (94,53%) ocupando uma área de 291. 715 hectares (43,63).
Quando se direciona a mesma analise feita acima especificamente para o município de
Viana, depreende-se que essa realidade não sofre alteração, como se pode observar na
tabela 4.
Tabela 4. Número e área dos estabelecimentos agropecuários por utilização das terras e agricultura familiar no município de Viana – MA.
Utilização das terras
Nº de estabelecimentos
%
Área dos estabelecimentos (em hectares)
%
Agricultura familiar
2.971
94,41
16.387
38,83
Não familiar 176 5,59 25.811 61,17 Total 3.147 100,00 42.198 100,00 Fonte: IBGE, Censo Agropecuário 2006.
9
O número dos estabelecimentos da agricultura familiar constitui 94,41% ocupando uma
área de 16.387 hectares. Já os estabelecimentos da agricultura não familiar são apenas
176 estabelecimentos, que por sua vez ocupam a expressiva área de 25.811 hectares (61
estabelecimentos, ou 17%). A análise dos dados acima deixa claro que há tanto na
Baixada Maranhense, quanto mais especificamente no município Viana, uma grande
quantidade de agricultores familiares produzindo em escassa quantidade de terras.
A análise dos dados acerca da distribuição desigual das terras no território da Baixada
Maranhense e do município de Viana se faz necessário para compreender a formação
dos territórios e das territorialidades das comunidades tradicionais da região, que está
relacionada tanto a presença indígena quanto posteriormente a ocupação pela produção
açucareira e pecuária. Tal distribuição é desigual e contraditória, pois nesse processo,
vários conflitos foram surgindo e atingindo as comunidades tradicionais que vivem na
região há muitas gerações, desde o processo de ocupação territorial da Baixada
Maranhense.
O território foi “invadido” por grupos que buscam ampliar o domínio em terras
devolutas, nas áreas dos campos naturais, babaçuais e se apropriaram destes bens
praticando diversas atividades indevidas e iniciaram um processo de muitos conflitos
com comunidades que se identificam como tradicionais, quilombolas, ribeirinhos,
posseiros, quebradeiras de coco e ainda com movimento sindical e sociais (Almeida et
al, 2012).
Considerações acerca da área de estudo: território e territorialidades e a luta pela titulação da comunidade Contenda, Viana – MA
Em algumas áreas de colonização antiga, onde se verificou o funcionamento do sistema
da grande exploração agrícola, teriam a sua referencia histórica marcada pelo processo
de derrocada de grandes propriedades pertencentes a particulares ou a ordens religiosas,
sendo que estas tinham no trabalho escravo o seu principal contingente de força de
trabalho. Com a desagregação dessas grandes propriedades, ex-escravos e libertos
mantiveram-se nessas terras, por meio das doações ou aquisições, reproduzindo um tipo
de campesinato no qual a noção de terra comum prevaleceu como elemento invariante
(Souza Filho, 2008).
Estes territórios estão ocupados secularmente e no decorrer do tempo as comunidades
vivenciam diversos conflitos na luta pela titulação dos mesmos. Desse modo, o controle
10
desses territórios constitui o núcleo central de suas lutas, que incluem também o
respeito pelas suas especificidades culturais, pela autonomia para decidir o seu futuro e
pela proteção dos seus conhecimentos tradicionais (Escobar; Pardo, 2005). Nessa
perspectiva de autonomia, identidade e formação de territorialidades na Baixada
Maranhense: As comunidades tradicionais têm um legado de luta e resistência na formação dos territórios tradicionais e construção de territorialidades, vinculadas à natureza. A terra para estas populações é fundamental na produção do conhecimento que orienta o seu modo de vida baseado na história entre gerações transmitindo através da cultura e modos de produção a construção da identidade desses grupos sociais o conhecimento tradicional é fundamental para a organização do espaço geográfico (Almeida et al, 2012, p. 164).
A comunidade de Contenda no município de Viana (Figura 01) na Microrregião da
Baixada Maranhense, se autodefine remanescente de quilombo, aciona as suas
ancestralidades e resiste no processo de ocupação histórica para defender a titulação do
território, nesse contexto, Anjos (2008, p. 117) contribui dizendo que:
No Brasil, os remanescentes de antigos quilombos, “mocambos”, “comunidades negras rurais”, “quilombos contemporâneos”, “comunidades quilombola” ou terra de preto” referem-se a um mesmo patrimônio territorial e cultural inestimável e que somente recentemente passaram a ser reconhecidos pelo Estado por algumas autoridades e organismo oficiais (Anjos, 2008, p.117).
Nesta perspectiva a comunidade busca garantir o que está assegurado na Constituição
Federal de 1988, no artigo 68 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias e
no Decreto nº 4. 887, de 20 de novembro de 2003, que regulamenta o procedimento
para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras
ocupadas por remanescentes dos quilombos e assim também como o Estado do
Maranhão, assegura na Constituição Estadual no Art. 229 – O Estado reconhecerá e
legalizará, na forma da lei, as terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos
quilombos. Para Anjos (2008, p.116) “as demandas históricas e os conflitos com o
sistema dominante têm imprimido a esse tipo de estrutura espacial exigindo de
organização e instituição de auto-afirmação política, social, econômica territorial”.
11
Figura 01: Mapa de localização da Comunidade de Contenda, Viana – MA
Fonte: Elaborado por SANTOS, Maxswel Silva (2012). Esta demanda é histórica da reivindicação da comunidade com apoio do Sindicato dos
Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Viana, esta organização sindical trava desde a
década de 1970 a luta pela terra e pelos direitos desta categoria. Nesse processo de
reivindicação exigem do Estado do Maranhão a titulação e reconhecimento da
propriedade definitiva dos territórios que estão ocupados por distintas comunidades
tradicionais. A comunidade quilombola Contenda foi titulada em 11 de agosto de 2011,
e registrada no Cartório do 1º oficio extrajudicial de Viana em 29 de agosto de 2011. O
Estado do Maranhão, através do Instituto de Colonização e Terras do Maranhão
(ITERMA).
De acordo com ITERMA, a planta do imóvel georreferenciado, está com seguinte
registro: imóvel Gleba Contenda, ocupante Associação de Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais Remanescente do Quilombo São Jorge do Povoado Contenda.
Assim, a “titulação deve ser entendida como ferramenta, na manutenção dos laços
culturais e étnicos dessas comunidades” (PVN, 2005, p. 25). A dimensão territorial é de
1.070,0259 hectares onde vivem 55 famílias. De acordo com as informações das
pessoas mais idosas, onde atualmente está situada a comunidade de Contenda, existiu há
mais ou menos 100 anos na área uma produção de cana de açúcar. Na manutenção do
território e de suas territorialidades, a comunidade ao longo do tempo está (re)
12
conhecendo os bens materiais e imateriais deixado por seus ancestrais e fortalecendo a
sua identidade territorial4 enquanto remanescente de quilombo, exigindo os seus direitos
étnicos e reconhecimento do Estado. Para Malcher (2009), as comunidades quilombolas
passam a se organizar politicamente, buscando ressignificar uma ancestralidade comum
que possibilita a construção de uma história compartilhada.
Com a titulação do território, atualmente existe um limite territorial para as diversidades
de atividades referentes a estas demandas, com isto, estão tentando fazer a gestão do
território e afirmação da territorialidade quilombola, na valorização da cultura e da
identidade de forma mobilizada e articulada internamente, o grupo está fortalecendo as
ações coletivas na comunidade e externamente estão n processo de articulação com o
Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras, Associação das Comunidades Negras
Rurais Quilombolas do Maranhão, e principalmente com as demais comunidades que se
autodefinem quilombolas no município de Viana, onde estão mobilização com o
propósito de fortalecer a luta pela manutenção dos territórios, exigindo os direitos
garantidos na Constituição Federal e Estadual, assim como decretos e demais
instrumentos jurídicos.
Posteriormente ao processo de titulação pelo ITERMA, os comunitários estão buscando
o reconhecimento junto a Fundação Cultura Palmares, fundada em 1988, é uma
instituição vinculada ao Ministério da Cultura, esta tem a finalidade de promover e
preservar a cultura afro brasileira.
Em Contenda observa-se a autoafirmação da identidade quilombola com mais ênfase a
partir da identificação do patrimônio material e imaterial.
Na construção da identidade5 territorial da comunidade, surgi elementos importantes
nesse processo, a exemplo de materiais antigos encontrados na área, que segundo os
moradores, seriam resquícios de construções que remontam ao período de
funcionamento do sistema da grande exploração agrícola na região (Figuras 2 e 3).
13
Figura 2: Segundo informações dos moradores, os artigos em ferro fundido (parte inferior da fotografia) seriam peças de um antigo engenho que existiu na área da comunidade
Fonte: Rodrigues (2012). Figura 3: Resquícios de construções antigas encontradas pelos moradores.
Fonte: Rodrigues (2012).
Estes materiais foram encontrados pelos moradores da comunidade quilombola
Contenda no momento em que os mesmos estavam desmatando a vegetação para
fazerem seus plantios agrícolas. Registram ainda que seus antepassados falavam que
naquele território existia uma produção de cana de açúcar. Estes materiais foram
14
encontrados próximo de onde existia uma espécie de caminho que de acordo com o
registro das pessoas mais idosas, era local de passagem dos carros-de-bois, que
transportavam a cana de açúcar que era cultivada para os engenhos da região. Na
comunidade nota-se que as relações com o espaço foram sendo construídas há muitos
anos, onde produzem e reproduzem os seus bens materiais e imateriais construindo as
territorialidades na defesa dos territórios.
Nesta perspectiva, cabe refletir sobre os conceitos de território e territorialidade tendo
em vista que ambos nas últimas décadas se constituem em importante campo de debates
no âmbito das Ciências Sociais, sobretudo na Geografia. E também por se constituírem
em importantes ferramentas teóricas para melhor compreensão da presente proposta de
estudo.
Como destacado por Haesbaert (2007a), o território envolve sempre, ao mesmo tempo,
uma dimensão simbólica, cultural, através de uma identidade territorial atribuída pelos
grupos sociais, como forma de “controle simbólico” sobre o espaço onde vivem, sendo
também, uma forma de apropriação.
Enquanto a territorialidade, além de incorporar uma dimensão mais estritamente
política, diz respeito também às relações econômicas e culturais, haja vista está
intimamente ligada ao modo como as pessoas utilizam a terra, como elas próprias se
organizam no espaço e como elas dão significado ao lugar (Haesbaert, 2007b).
O território de Contenda: reflexões sobre a diversidade da produção camponesa
Na comunidade Contenda o acesso aos recursos da natureza se dar em regime de uso
comum6, uma prática adotada pelas comunidades tradicionais. Para a combinação da
escolha do espaço para o plantio agrícola, os remanescentes da comunidade
quilombola, desenvolvem as suas atividades produtivas baseados no sistema de corte e
queima, este exige que o calendário agrícola local, inicia com a escolha do espaço para
fazer a roça, daí segue o mês de agosto com a prática de derrubada da vegetação (roçar).
Em outubro começam a queimar. No mês de novembro/dezembro inicia retirada da
madeira de dentro do roçado para fazer as cercas, ainda no mês de dezembro plantam o
milho (tradicionalmente plantam antes do natal), segundo os mais idosos, plantar nesse
período a produção fica melhor.
15
O plantio inicia em janeiro com o arroz e a mandioca e no final do mês se inicia o
processo de capina da roça, dependendo do tamanho do espaço vai de fevereiro a março,
esse calendário segue com atividades até o período da colheita da produção. No
processo de organização da produção camponesa, as famílias se articulam para
desenvolver algumas atividades trocando diárias, a vantagem deste sistema de
organização é que desenvolvem as atividades na roça com mais agilidade. Organizam
de forma combinada os dias de trabalho e nesse processo o dono do serviço é
responsável pela alimentação de todos (as) envolvidos (as) nas atividades do dia e as
mulheres trabalham fazendo a comida. Elas trabalham também no corte de arroz,
limpando coivaras, plantando, capinando e na colheita, quando chegam em casa ainda
desenvolvem as atividades domésticas. Assim como esta divisão de trabalho é definida,
em diversas comunidades camponesas ocorrem também em Contenda, embora em
algumas situações de trabalho das mulheres são vistas como “ajudas”, elas trabalham
nas atividades desenvolvidas na produção camponesa na comunidade quilombola. Para
os autores Renk; Badalotti; Winckler (2010), existe descontentamento nessa relação de
gênero quanto a questão da divisão de trabalhos das atividades exercidas na roça e em
casa, argumentando que: Para as mulheres mais velhas a dupla jornada de trabalho torna-se normal, já para as gerações mais jovens a luta por um mundo melhor e mais justo é uma necessidade, sendo que as mesmas demonstram grande descontentamento por possuírem uma dupla jornada de trabalho, e neste sentido buscam alternativas como as de adquirirem um maior espaço produtivo no grupo familiar, ocorrendo em muitos casos descontentamento entre os pais e maridos. (RENK;BADALOTTI;WINCKLER, 2010, p. 60)
As mulheres quilombolas de Contenda estão inseridas na diversidade das atividades
camponesas desenvolvidas na agricultura, na pesca, na criação de animais, cultivo de
verduras, na plantação de vegetação frutíferas permanentes cultivadas nos quintais de
coco da Bahia, manga, limão, caju, laranja, acerola, goiaba, abacate dentre outros.
Acerca da diversidade da pratica das atividades de produção camponesa, exercida pela
comunidade quilombola a pesca é parte destas atividades que são praticadas de diversos
modos de uso e manejo estes recursos comuns da comunidade e apropriados por outras
comunidades do entorno, a exemplo o acesso desta ao rio denominado Herculano, que
passa por dentro do território de Contenda, conforme relatos dos quilombolas, o rio é
usado para pescar e colocar a mandioca de molho, por quilombolas de Contenda e
16
algumas pessoas de outras comunidades, que buscam estes recursos para atender as
suas, dentre as comunidades estão São Felipe, Curral de Vara, Itapera e Santa Isabel.
Nota-se a pratica da pesca com a técnica de tapagem (obstrução do corpo hídrico para
captura dos cardumes) e jogam a água fora (retirada da água de poções para captura de
todos os organismos aquáticos).
Este manejo tem resultado em impactos ambientais, no rio Herculano, onde é possível
visualizar o assoreamento7, este impacto a comunidade identifica como o entupimento
do rio, processo que tem acelerado com a retirada da mata ciliar, os restos de madeiras
utilizados na construção da tapagem.
Os relatos indicam a diminuição da quantidade de peixes neste rio e do volume de água
nos últimos anos o volume da água tem reduzido, em período de estiagem alguns
poções tem secado, o que não ocorria anteriormente.
A respeito dos efeitos negativos do assoreamento Vieira & Silva (2012, p. 6), dizem
que o “assoreamento reduz o volume de água, torna-a turva e impossibilita a entrada de luz
dificultando a fotossíntese e impedindo renovação do oxigênio para algas e peixes,
conduzindo rios e lagos ao desaparecimento”. Evitar e controlar erosões no solo, além de
manter as matas ciliares intactas é a melhor receita para evitar assoreamento, estes
procedimentos para preservar, reabilitar e recuperar se faz necessário, buscar apoio em
novas praticas que sensibilize a população que usa e maneja estes recursos da natureza, para
que não perca mais qualidade ambiental Vieira & Silva (2012), estes são acessados como
recursos comuns pelas comunidades. É importante lembrar que estes recursos que a
qualidade e quantidade disponível natureza. Os impactos identificados no curso do rio
Herculano, estão implicando na redução da alimentação dos quilombolas que pescam
para se alimentar.
Para os quilombolas o acesso a terra, a água, a vegetação disponível, são recursos de uso
comum que são apropriados para diversas atividades na produção camponesa, onde eles
tem identificado que estes recursos já não dispõem de quantidade e qualidade para
atender as suas demandas sociais, econômicas, culturais, espaciais e ambientais.
A cobertura vegetação tem sido manejada com mais intensidade para as praticas
agrícolas, onde após roçada é queimada, o que exige uma ação com planejamento para
controlar o fogo, e evitar a queima de mais vegetação além da que está derrubada,
assim também como não atingir os animais. Efeitos que resultam em desequilíbrio
ecológico, o que pode potencializar o impacto na biodiversidade atingindo a fauna e
17
flora. Esta pratica tem viabilidade quando há grandes extensões de terras disponíveis, e
pouco uso permitindo a regeneração da vegetação necessário para reestabelecer o
ecossistemas.
Considerações finais Na luta e resistência pelo controle de seus territórios habitados secularmente estão os
remanescentes de quilombos, indígenas, posseiros, acampados, quebradeiras de coco,
ribeirinhos, sem terras, entre outros, cuja mobilização tem sido criminalizada em todo
território nacional. Essa criminalização está caracterizada pela violência que grupos
dominantes travam contra as comunidades tradicionais, fato que está elevando o índice
de violência no campo maranhense.
O estado do Maranhão é um caso emblemático de luta e resistência de inúmeras
comunidades tradicionais pela titulação dos seus territórios e manutenção de suas
praticas matérias e simbólicas erigidas nestes espaços. Neste contexto está inserida a
comunidade de Contenda localizada no município de Viana que se autodefine como de
remanescente de quilombo onde no processo de luta e exigência de seus direitos buscou
a titulação do seu território e manutenção de suas territorialidades, para continuarem
produzindo e reproduzindo materialmente e imaterialmente.
Constatou-se, no desenvolvimento do estudo, que a comunidade enfrenta problemas
para desenvolver as atividades da produção agrícola, por falta de orientação técnica,
considerando que o sistema de cultivo praticado é baseado na derrubada e queima da
vegetação. Este manejo é viável onde tem disponibilidade de terras, o caso da
comunidade quilombola Contenda, a implicação está na dinâmica das áreas que foram
cultivadas onde a biodiversidade e as atividades biológicas estão intrinsecamente
ligadas nas funções essenciais para a recomposição é necessária, para que as terras
tenham capacidade de produção, após o período de pousio. Resultante do processo a
comunidade tem procurado a cada ano, as áreas mais baixas para praticar a agricultura,
o que tem aproximado as unidades de produção das culturas anuais, as nascentes, rios e
córregos. Estes impactos já estão sendo percebidos pela comunidade.
Diante do desequilibro da terra, sem a prática de outros sistemas mais viáveis, tem
surgido na produção os fatores que contribuído com a diminuição da produção, no ciclo
do cultivo tem surgido muitas ervas espontâneas nas áreas de produção.
18
Mais a comunidade tem referencias dentro do território de Contenda de áreas com
vegetação, que estão sendo protegidas no intuito de contribuir na reabilitação das
nascentes, rios e córregos, nessas áreas não estão sendo utilizados para a produção
agrícola, esses espaços estão recuperando com êxito, o que tem colaborado para a
comunidade se motivar na mobilização para recuperar outras áreas, com o exemplo da
revegetação, onde já tem vegetação de médio e grande porte.
Esse manejo inadequado no acesso aos recursos naturais tem implicações escassez de
água potável, a falta de assistência técnica pública e gratuita, e a omissão do Estado no
desenvolvimento do seu papel junto à sociedade. Identificamos nas atividades de
campos com quilombolas que tiveram outras experiências na diversidade da produção,
uma safra significativa em relação aos que, não tiveram a mesma oportunidade. Faz-se
necessária a intervenção do poder público, com políticas sociais, agrícolas, ambientais,
econômicas e de infraestrutura para o acesso à comunidade e transporte de mercadorias
e pessoas. Porem é fundamental refletir e viabilizar as condições para garantir a
manutenção, e o fortalecimento das territorialidades construída pelas comunidades
quilombolas, considerando que estão secularmente em seus territórios.
A partir da titulação do território a comunidade está motivada, mobilizada e mais
organizada, é perceptível a disposição na gestão do território na perspectiva do uso comum,
e estão promovendo ações potencializando a identidade quilombola.
Notas _________________ 1 De acordo com Almeida (2008), em 7 de fevereiro de 2007, através do Decreto n. 6040 foi instituída a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT). O referido decreto presidencial considera Povos e comunidades tradicionais como sendo “grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição” (Almeida, 2008). 2 A referida pesquisa faz parte de um trabalho de maior envergadura que ora vem sendo realizado na Microrregião da Baixada Maranhense no âmbito do GEPEPE (Grupo de Estudos e Pesquisas em Pedologia e Edafologia) vinculado ao curso de Geografia da Universidade Federal do Maranhão, sob a coordenação do Prof. Me. Marcelino Silva Farias Filho. Como primeiros frutos do referido trabalho foi lançado recentemente o livro O Espaço Geográfico da Baixada Maranhense. 1ª Ed. V.1. A Microrregião da Baixada Maranhense, pertencente à Mesorregião Norte do Maranhão, está situada na porção centro-norte da área de transição entre a Amazônia e o Nordeste brasileiro, possuindo uma parte expressiva da população maranhense, somando 563.895 habitantes e abrangendo 21 municípios, conforme dados do IBGE (2010). 3 O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) classifica a agricultura familiar de acordo com a Lei 11.326 que determina quatro módulos fiscais como sendo o limite máximo para um empreendimento familiar. Determina ainda que a mão de obra deve ser predominantemente da própria família e a renda
19
deve ser originada nas atividades da propriedade e a direção também tem que ser feita por um membro da família. 4 Identidade concebida aqui como a fonte de significados e experiência de um povo (CASTELLS, 1999). Conforme Haesbaert (2007a) a identidade territorial só se efetiva quando um referente espacial se torna elemento central para a identificação e ação política do grupo, um espaço em que a apropriação é vista em primeiro lugar a partir da filiação territorial, e onde tal filiação inclui o potencial de ser ativada, em diferentes momentos, como reivindicação política. 5 Nesta situação Cruz (2007) usa a expressão Identidades construídas predominantemente pautadas no espaço vivido (espaços de representação). Ainda conforme o referido autor, essas identidades são pautadas na apropriação simbólica-expressiva do espaço, nos “resíduos irredutíveis” ao domínio lógico-racional e estratégico-funcional do espaço: o uso, o vivido, o afetivo, o sonho, o imaginário, o corpo, a festa, o prazer. 6Designam situações nas quais o controle dos recursos básicos não é exercido livre e individualmente por um determinado grupo doméstico de pequenos produtores diretos ou por um de seus membros. Tal controle se dá através de normas especificas, combinado uso comum de recursos e apropriação privada de bens, que são acatadas, de maneira consensual, nos meandros das relações sociais estabelecidas entre vários grupos familiares, que compõe uma unidade social. Tanto podem expressar um acesso estável à terra, como ocorre em áreas de colonização antiga, quando evidenciam formas relativamente transitórias características das regiões de ocupação recente. Tanto podem se voltar prioritariamente para a agricultura, quanto para o extrativismo, a pesca ou para o pastoreio realizados de maneira autônoma, sob forma de cooperação simples e com base no trabalho familiar (Almeida, 2008). 7 O assoreamento é o acúmulo de areia, solo desprendido de erosões e outros materiais levados até rios e lagos pela chuva ou pelo vento. Quando isso ocorre, cabe às matas ciliares servirem de filtro para que este material não se deposite sob a água. Quando as matas são indevidamente removidas, rios e lagos perdem sua proteção natural e ficam sujeitos ao assoreamento, e ao desbarrancamento de suas margens, o que agrava ainda mais o problema. Referências ALMEIDA, Alfredo W. Berno de; MOURÃO, Laís. Questões agrárias no Maranhão contemporâneo. Pesquisa Antropológica. Brasília, 1976. ALMEIDA, Alfredo W. Berno de. Terra de quilombo, terras indígenas, “babaçuais livres”, “castanhais do povo”, faxinais e fundos de pasto: terras tradicionalmente ocupadas. 2ª ed. Manaus, AM: PGSCA – UFAM, 2008. ANJOS, Rafael Sanzio Araújo dos. Territórios étnicos: o espaço dos quilombos no Brasil. In: Santos, R. E dos (org.) Diversidade, espaço e relações sociais: o negro na Geografia do Brasil. Belo Horizonte: Autêntica, 2007, p. 116 - 117. ARAUJO, Mundinha. Insurreição de escravos em Viana – 1867. – 2ª ed. São Luís: Edições AVL, 2006. CASTELLS, Manuel. O poder da identidade. Tradução de Klauss Brandini Gerhardt. São Paulo: Paz e Terra, 1999. CCN/MA, Centro de Cultura Negra. Vida de Negro no Maranhão: uma experiência de luta organização e resistência nos territórios quilombolas. Coleção Negro Cosme. São Luis, 2005. COSTA, Cássio R. A Baixada Maranhense. São Luís: SIOGE, 1982.
20
CRUZ, Valter do Carmo. Territorialidades, identidades e lutas sociais na Amazônia. In: ARAÚJO, Frederico G. Bandeira; HAESBAERT, Rogério (org.). Identidades e territórios: questões e olhares contemporâneos. Rio de Janeiro: ACCESS, 2007. ESCOBAR, Arturo; PARDO, Mauricio. Movimentos sociais e biodiversidade no Pacífico colombiano. In: SANTOS, Boaventura de Sousa (org.). Semear outras soluções: os caminhos da biodiversidade e dos conhecimentos rivais. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005. FARIAS FILHO, Marcelino S. O avanço do uso agrícola das várzeas frente à degradação das terras altas: uma análise da realidade da APA da Baixada Maranhense. In: V Simpósio Internacional e VI Simpósio Nacional de Geografia Agrária. Questões Agrária na Panamazônia do XXI: Usos e Abusos do Território, 2011. p. 12-17. FARIAS FILHO, Marcelino S. Caracterização e avaliação da cultura do arroz em sistema de vazante na Baixada Maranhense. Dissertação (Mestrado). Programa de Pós-Graduação em Agroecologia. UEMA, 2006. ALMEIDA, Juscinaldo G. et al. Questões agrárias e migração de trabalhadores rurais na Baixada Maranhense. In: FARIAS FILHO, Marcelino S. (org.). O espaço geográfico da Baixada Maranhense. São Luis, MA: JK Gráfica Editora, 2012. FEITOSA, Antonio C. O Maranhão primitivo: uma tentativa de reconstrução. São Luís: Editora Augusta, 1983. FRANCO, José Raimundo C. Sistema lacustre vianense: ensaios de modelos conceituais para os lagos do município de Viana-MA. Dissertação (Mestrado). Programa de Pesquisa e Pós-Graduação em Sustentabilidade de Ecossistemas. UFMA, 2008. HAESBAERT, Rogério. Identidades territoriais: entre a multiterritorialidade e a reclusão territorial (ou: do hibridismo cultural à essencialização das identidades. In: ARAÚJO, Frederico Guilherme B. de; HAESBAERT, Rogério (orgs.). Identidades e Territórios: questões e olhares contemporâneos. Rio de Janeiro: Access, 2007a. HAESBAERT, Rogério. Território e multiterritorialidade: um debate. In: Revista GEOgraphia. UFRJ. Ano IX – nº 17, 2007b. MALCHER, Maria Albenize Farias. Identidade Quilombola e Território. III Fórum Mundial de teologia e Libertação Presentations at the 3rd World Forum on Theology and liberation, Belém, 2009. Disponivel em: http://www.wftl.org/pdf/046.pdf. Acessoem 30 de junho de 2012. MESQUITA, Benjamin Alvino de. Desenvolvimento econômico recente do Maranhão: uma análise do crescimento do PIB e perspectivas. São Luís: IMESC, 2008. Disponível em: http://www.imesc.ma.gov.br/docs/CADERNOSIMESC7.pdf. Acessado em 31/03/2012. São Luís: UEMA, 2002.
21
PAULA ANDRADE, Maristela de. Terra de Índio: identidade étnica e conflito em terras de uso comum. São Luís: EDUFMA, 2008. RENK, Arlene Anélia; BADALOTTI, Rosana Maria; WINCKLER, Silvana. Mudanças socioculturais de gênero e inter-geracionais: o caso do campesinato no Oeste Catarinense. VIII Congresso Latino- Americano de Sociologia Rural, Porto de Galinhas, 2010. Disponivel em: http://www.alasru.org/wp-content/uploads/2011/07/GT9-Arlene-An%C3%A9lia-Renk.pdf. Acessado em 02 de julho de 2012, p.60. SÁ, Laís Mourão. O pão da terra: propriedade comunal e campesinato livre na Baixada Ocidental Maranhense. Coleção Antropologia e Campesinato no Maranhão. GERUR/PPgCS. São Luís: EDUFMA, 2007. SOUZA FILHO, Benedito. Os pretos de Bom Sucesso: terra de preto, terra de santo, terra comum. São Luis: EDUFMA, 2008. VIEIRA, Carla Iamara de Passos; SILVA, Teresa Cristina Ferreira. Análise dos impactos ambientais no Parque Ambiental Encontro dos Rios em Teresina-PI (Problemas socioambientais urbanos e rurais). IN: XIII SIMPÓSIO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA FÍSICA APLICADA DE DE VICOSA, 2009. Disponivelhttp://www.geo.ufv.br/simposio/simposio/trabalhos/trabalhos_completos/eixo11/013.pdf. Acessado em 02 de julho de 2012, p.6.
Recommended