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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ
VANESSA DA SILVA PEREIRA
O DIREITO AO ESQUECIMENTO À LUZ DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL DE 1988
CURITIBA
2015
VANESSA DA SILVA PEREIRA
O DIREITO AO ESQUECIMENTO À LUZ DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL DE 1988
Projeto de trabalho de conclusão de curso apresentada ao curso de direito da faculdade de ciências jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito.
Orientador: Doutor André Peixoto de Souza.
CURITIBA
2015
TERMO DE APROVAÇÃO
VANESSA DA SILVA PEREIRA
O DIREITO AO ESQUECIMENTO À LUZ DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL DE 1988
Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado e aprovado para obtenção do título de Bacharel no
Curso de Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.
Curitiba, ____de________de 2015.
_______________________________________
Prof. Doutor Eduardo de Oliveira Leite
Coordenador do Núcleo de Monografias
Universidade Tuiuti do Paraná
Orientador:________________________________
Prof. Dr. André Peixoto de Souza
Faculdade de Ciências Jurídicas
Universidade Tuiuti do Paraná
Prof. ____________________________________
Faculdade de Ciências Jurídicas
Universidade Tuiuti do Paraná
Prof.____________________________________
Faculdade de Ciências Jurídicas
Universidade Tuiuti do Paraná
DEDICATÓRIA
Aos dois homens da minha vida: Willian e Enzo,
amores verdadeiros! Sentido de tudo.
AGRADECIMENTOS
Ao professor André Peixoto de Souza, de quem tive o privilégio de ser aluna
e que aceitou me orientar. Acredito que existem dois tipos de lecionadores, aqueles
que ensinam e os que inspiram. Os da primeira leva qualquer um o pode ser, porem,
o ato de inspirar é raro e para poucos. A grandeza de um bom mestre não está no
conteúdo que ele consegue passar para o aluno. E sim, na forma que ele consegue
instigar ao conhecimento, à vontade de ir além, não por obrigação, mas pelo prazer
de percorrer o brilho do caminho que chamado deste o provocou.
Muito obrigada professor André, tenha certeza que nesse curso o seu
brilhantismo sempre me inspirou. Ensinou-me que o conhecimento é uma escolha
pessoal, não uma alternativa que se busca por vaidade, como se fosse um selo de
qualidade. Fez-me entender que não existe uma resposta certa para tudo, alias
existem várias repostas espalhadas por aí, por isso existe a necessidade de sempre
questionar. O horizonte do conhecimento é vasto. Por isso, não podemos parar.
Precisamos sempre caminhar!
“Ao redor de dois pontos candentes, gira toda a vida do
gênero humano: o indivíduo e a coletividade.
Compreender a relação entre ambos, unir
harmoniosamente essas duas grandes potências que
determinam o curso da história, pertence aos maiores e
mais árduos problemas com que a ciência e a vida se
defrontam. Na ação, como no pensamento, prepondera
ora um, ora outro dentre esses fatores”.
GEORG JELLINEK
RESUMO
Esta pesquisa pretende uma análise da legislação pertinente ao nosso ordenamento jurídico ao cabimento do “Direito ao Esquecimento”, recentemente reconhecido em duas decisões independentes do Superior Tribunal de Justiça. Parte de uma premissa das garantias aos já reconhecidos direitos à intimidade, à liberdade de imprensa e à dignidade da pessoa humana. Esse novo tema foi debate nacional primeiramente pelo Enunciado 531 da VI Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal, o qual o inseriu no rol dos direitos da personalidade expresso no artigo 11 do Código Civil.
O direito de ser esquecido, por sua vez já vem a ser tema bastante abordado em cortes superiores de outros países. Baseia-se no entendimento que entre as garantias da pessoa está o direito ao anonimato, decorrido a passagem do tempo da circulação da notícia do fato. Faz-se um contrapeso entre noticias que envolva somente a vida privada do particular de outras que tenham relevância histórica para a sociedade. Logo, é necessário interpretar os conceitos referentes à vida privada, o interesse público, bem como a dignidade da pessoa humana.
Conclui-se que o interesse público da informação não prescreve. O decorrer do tempo não tem o condão de apagar a história, de modo que a proteção buscada pelo requerente ao “esquecimento” encontra tutela na esfera privada, já suficientemente garantida na Lei. Por fim, algumas breves considerações acerca do direito da intimidade na moderna sociedade tecnológica.
Palavras-Chave: Direito ao esquecimento. Direito de ser deixado em paz. Sociedade da Informação. Privacidade. Liberdade de Imprensa. Direito de Informação.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO........................................................................................................07
2 O DIREITO AO ESQUECIMENTO E SEUS FUNDAMENTOS APLICADOS AOS
CASOS ONCRETOS.................................................................................................10
2.1 Precedentes e o Enunciado 531 do CJF ............................................................10
2.2 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e Sua Aplicabilidade Ao Direito de
Ser Esquecido............................................................................................................13
2.3 Direito de Imprensa e Expressão Versus Direito a Privacidade...........................14
3 DIREITO COMPARADO: CASOS INTERNACIONAIS E NACIONAIS................19
3.1 Apreciação no Âmbito Internacional.....................................................................19
3.2 Chacina da Candelária.........................................................................................21
3.3 Caso Aída Curi....................................................................................................23
4 A SOCIEDADE NA ERA DA INFORMAÇÃO .......................................................25
4.1 O Papel da Internet na Vida Moderna e sua Interferência na Intimidade.............25
4.2 A Mídia e a superexposição da Vida Privada.......................................................27
4.3 Sites de Busca, Facebook e Youtube: o uso indiscriminado e as novas formas de
se relacionar...............................................................................................................28
CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................31
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..........................................................................34
7
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como pretensão analisar a aplicação do princípio de
“Direito ao Esquecimento”, diretamente ligado ao princípio constitucional da
dignidade da pessoa humana, bem como o aos direitos da personalidade. Tema
este já trazido à discussão nacional devido à edição pelo Conselho de Justiça
Federal de um enunciado reconhecendo-o como uma extensão dos direitos da
personalidade.
As interpretações das decisões de julgados dos ministros do Superior Tribunal
de Justiça trouxeram a necessidade de rediscussão dos conceitos de vida privada,
dignidade da pessoa humana e liberdade de imprensa, de forma a motivar este
trabalho. Buscando compreender o posicionamento do novo “direito de ser
esquecido” na ordem jurídica brasileira. Valendo-se também do direito comparado,
através de decisões estrangeiras, a saber, dos tribunais superiores europeus e
norte-americanos, que foram percursores ao reconhecimento ao direito da pessoa se
resguardar da republicação de acontecimentos que envolvam sua vida pregressa.
O presente estudo aborda o Direito ao Esquecimento acerca da edição do
Enunciado 531 da VI Jornada de Direito Civil do Centro de Estudos Judiciários do
Conselho da Justiça Federal, o qual determina que: “A tutela da dignidade da
pessoa humana na sociedade da informação inclui o direito de esquecimento”. O
qual asseguraria uma possível discussão a cerca da forma como certos fatos
passados venham a ser recordados. O Enunciado faz parte de uma orientação
doutrinária, envolvendo entendimento majoritário de doutrinadores convocados, que
ao interpretarem o Código Civil, nesse caso, incluíram o direito ao esquecimento
como um direito de personalidade (artigo 11 do Código Civil).
O objetivo principal deste trabalho, tem como foco maior abordar e verificar
se, frente aos princípios constitucionais pode-se encontrar uma colisão ao se limitar
a liberdade de expressão e a liberdade de imprensa pela proibição de divulgação de
8
fatos passados, sob uma ótica do direito da dignidade da pessoa humana. Seria este
mais relevante do que aquele?
O “Direito ao Esquecimento” que abordaremos seria o que trata da
delimitação de uma interferência na vida privada da pessoa, mas que, contudo, que
não permita que seja anulado o direito de caráter público da informação. Deste
modo, a problemática passa a ser um estudo utilizado a cada caso concreto, de seus
fatos e objetivos, para somente assim discutir possível prejuízo que o seu
alargamento excessivo de entendimento possa trazer.
Almeja-se, também, fazer uma breve analise acerca do surgimento na
sociedade pós-moderna da necessidade de controle sobre os fatos pretéritos, como
uma maneira de mostrar-se perfeito e infalível, talvez por conta do momento em que
vivemos, a chamada era tecnológica, em que a imagem e informação se tornam o
principal produto a ser “consumido”. No período em que as informações são
consideradas bens de grande valia, a sociedade muda, e passa a buscar maior
proteção a este objeto. Discute-se o “direito de esquecer” em colisão ao direito de
informação, ambos amparados por princípios constitucionais, o primeiro como uma
faceta da dignidade humana, já o segundo busca preservar a história e a liberdade
de expressão.
Através de decisões nacionais proferidas recentemente, este tema entrou na
pauta doutrinária nacional, porem ainda não há posicionamento. Nesse sentido, o
assunto torna-se um direito que até aqui era inexistente no nosso ordenamento
jurídico, pois ele limita um direito constitucionalmente reconhecido e muito defendido
na doutrina, a liberdade de imprensa. Como imperativo para o entendimento desse
novo direito torna-se necessário a interpretação e estudo dos acórdãos, bem como
adaptá-los a cada caso concreto.
Por fim, para fins didáticos, o trabalho foi dividido em dois tópicos, com uma
exposição crítica do assunto. O primeiro analisa o direito ao esquecimento nos casos
concretos e os entendimentos com seus devidos fundamentos, bem como
precedentes internacionais do direito comparado, com amolde aos casos brasileiros.
O segundo busca tratar os conceitos envolvendo a tese do “Direito ao
Esquecimento”, através da hermenêutica, analisar a interpretação literal dos
9
institutos, tais qual o “direito de ser deixado em paz” e a “dignidade da pessoa
humana”, e compreender os aportes para o surgimento do mesmo e os
desdobramentos que dele advêm.
10
2 O DIREITO AO ESQUECIMENTO E SEUS FUNDAMENTOS APLICADOS AOS
CASOS CONCRETOS
2.1 Precedentes e o Enunciado 531 do CJF
Os atos passados de um indivíduo tem o condão de repercutirem
eternamente, a modo de tornarem-se penas perpetuas?
O “Direito ao Esquecimento” é um tema que já vem sendo aplicado na
doutrina internacional, basicamente discutindo a possibilidade de apagar
informações veiculadas através dos meios de comunicações, os quais lhe tragam
cargas negativas sobre a pessoa. No Brasil, o assunto começou a ensaiar alguns
passos a respeitos, grande contribuição trouxe a edição do Enunciado 531 pelo
Conselho de Justiça Federal incluindo-o entre os direitos da personalidade. E
ganhou destaque com a sua aplicação a dois casos julgados pelo Superior Tribunal
de Justiça, desta forma, começou-se a definir os seus contornos no âmbito nacional.
Importa desde já compreender a amplitude que se deu ao direito de ser
esquecido, bem como, com os precedentes internacionais que de alguma forma
motivaram o seu reconhecimento.
Assim como Norberto Bobbio, ao se questionar acerca na natureza do
progresso do ser humano com foco na criação dos direitos do homem, depõe que
não há uma única resposta aos problemas propostos; não se pretende apresentar a
única solução possível aos casos aqui estudados, porque em constante evolução o
Direito, de modo que não pode ser tratado em termos absolutos. Cabem as palavras
do autor: "A única informação que considero poder fazer com certa segurança é que
a história humana é ambígua, dando respostas diversas segundo quem interroga e
segundo o ponto de vista adotado por quem interroga." (1992, p. 53).
Desta forma, aqui não serão esgotadas todas as possibilidades decisórias.
Posto isso, buscou-se analisar as vertentes do “Direito ao Esquecimento” com uma
ótica crítica, como veremos adiante.
Em 2009 já se vira julgado pela 2ª Turma Recursal de Belo Horizonte, em que
se entendeu que “uma verdade mantida no ar por muito tempo pode tornar-se ilícita”,
11
quando o papel da informação a qual a sociedade tem direito já tiver esgotado a sua
função, acredita-se que a sua republicação dos mesmos fatos viola garantias
constitucionais de direito de intimidade e imagem da pessoa (TJ/MG, 2009). Apesar
de ainda não levar o nome de “Direito ao Esquecimento”, surge ali um primeiro
esboço do tema no Brasil.
O direito de “ser esquecido”, com o argumento de que nenhuma pessoa deve
ser obrigada a conviver eternamente com os fantasmas de seus erros e culpas, que
após cumprir sua pena e estar quites com a sociedade o individuo tem direito a
reingresso a uma vida normal, e que mesmo ao se tratar de uma informação
relevante não deve ser obrigado a conviver eternamente com o ônus dos erros
passados, sendo marginalizado novamente decorrente de um mesmo fato.
A discussão sobre a necessidade do surgimento um “direito ao esquecimento”,
como forma de proteger as pessoas da repercussão negativa e potencialmente
prejudicial por conta de atos passado, especialmente atualmente, com o advento da
internet produzindo a facilidade e rapidez às informações, já gera um debate na
doutrina. A preocupação com a tutela da intimidade tem levado alguns países a criar
mecanismos de controle de divulgação, dentro ou fora da internet, de informações
que envolvam a imagem e privacidade.
Para frear à abusividade da divulgação da informação os julgadores nesses
casos tem se lançado da utilização do princípio da razoabilidade. No ano de 2013 a
edição do Enunciado 531 da VI Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça
Federal (CJF), consagrou o “Direito ao Esquecimento”, entre os direitos da
personalidade que é versado no Código Civil em seu artigo 11. Logo na sequencia
verifica-se pela primeira vez a sua utilização por uma corte superior brasileira.
Extrai-se do novo enunciado (CJF, 2013, p. 1): “A tutela da dignidade da
pessoa humana na sociedade da informação inclui o direito ao esquecimento”. Uma
norma que garante e protege a imagem e vida privada, que por extensão também se
aplicaria à preservação de informações de fatos passados do indivíduo.
Ademais, no entender de alguns doutrinadores, vivemos num momento em
que a sociedade vive um “hiperinformacionismo”, isto no que refere-se ao fato de
12
informações circularem ao alcance de todos por tempo indeterminado, ajudado pelas
tecnologias, o que acaba por eternizar na memória do homem.
Na analise do Conselho da Justiça Federal, o direito de ser esquecido surgiu
no âmbito do direito penal, mais precisamente no campo das condenações criminais,
defendendo que o sujeito que foi apenado e que já cumpriu a punição como
consequência de um ato ilícito cometido, não deve essa dívida já saldada, punida
perpetuamente. Devido ao fato disso contrariar, a Constituição da República
Federativa do Brasil, a qual expressamente veda as penas perpétuas (art. 5º, XLVII,
b), sendo assim, os registros da condenação não podem estender-se além da
punição. O que também interferiria no direito à ressocialização do ex-detento, por
exemplo.
A inclusão do direito ao esquecimento no Código Civil Brasileiro teria um
condão de permitir uma discussão referente a finalidade que é dada aos
acontecimentos pregressos da vida da pessoa, o que aqui não se quer atribuir a
ninguém uma forma apagar fatos ou de reescrever nova história. Desta forma, um
dos objetivos pretendente do enunciado é o de proteger a intimidade e vida privada
do indivíduo, dando-lhe autonomia para poder decidir e o que ele quer, ou não quer,
que os outros saibam sobre a sua vida. Ou seja, toda a informação que nascer no
âmbito de privacidade de alguém, mesmo que disponibilizada em algum momento,
não deixa de ser privada, mesmo após o passar do tempo, caso sua permanência
for contrário ao interesse do afetado, este possui o direito da retirada de circulação a
notícia.
Para a ministra do STJ Eliana Calmon, os entendimentos referente a esse
novo direito reconhecido entra em sintonia com momento atual em que vivemos,
porque respondem ao problema da observância constante a que estamos expostos
devidos ao meios de comunicação. Disse ela em entrevista à Rádio STJ:
O homem do século XXI tem como um dos maiores problemas a quebra da sua privacidade. Hoje é difícil nós termos privacidade. Por quê? Porque a sociedade moderna nos impõe uma vigilância constante. Isto faz parte da vida moderna. Agora, esse século XXI trabalha e tem dificuldade de estabelecer quais são os limites dessa privacidade. Até quando eu posso me manter com a privacidade sobre o meu agir, sobre os meus dados, e até que ponto esta privacidade termina por prejudicar a coletividade. (CALMON, 2013 apud RADIO..., 2013).
13
No mesmo viés, o desembargador federal Rogério de Meneses Fialho
Moreira, do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, em entrevista à revista o Dia de
Brasília, considerou que a interpretação mais adequada ao instituto seria a
parcimônia na sua utilização e que o seu intuito seria o de garantir a proteção da
intimidade da pessoa, porem não pretendia excluir notícias de relevância ao
interesse público.
Em suas palavras:
No campo criminal, a reabilitação apaga completamente os efeitos do crime cometido. Mas no mundo dos fatos, não se pode negar que o evento ocorreu. Quando o crime foi de repercussão midiática, ainda mais difícil se torna a solução. Muitas vezes o fato ganha repercussão de tal monta que se torna parte da história ou ainda inspira produção literária e cinematográfica. Os provedores de pesquisa na internet poderiam, por exemplo, bloquear a menção ao nome de Ronald Biggs quando a busca demanda a frase “assalto ao trem pagador”? O nome do coronel Ubiratan Guimarães, que restou absolvido e hoje é falecido, poderia ser suprimido das matérias jornalísticas a respeito do julgamento, dias atrás, de outros policiais pelo chamado “massacre do Carandiru”? Os réus condenados na ação principal atinente ao furto ao Banco Central, em Fortaleza, após dois anos do cumprimento da pena, poderiam pleitear a retirada de seus nomes de toda a sociedade da informação, quando até mesmo um filme com atores consagrados nacionalmente foi feito a respeito do episódio? A resposta, evidentemente, seria negativa. Nessas hipóteses, o direito à informação e à preservação da história deve ter a primazia em relação ao resguardo da imagem dos envolvidos, pois não se trata de fatos atinentes à privacidade ou à vida íntima. (MOREIRA, 2013 apud DIREITO..., 2013).
Parece incontroverso que o direito de ser esquecido, como forma de limitar a
liberdade de expressão e de imprensa, junto com o direito de ser informado, no seu
entender, entra em colisão no caso de divulgação de informações que podem
repercutir negativamente a percepção de uma pessoa pela sociedade, mas que
sejam elas relevantes historicamente.
2.2 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e Sua Aplicabilidade Ao Direito De
Ser Esquecido
A Constituição Federal de 1988 traz um alargamento acerca do
reconhecimento dos direitos da personalidade, ao passo que a carta Magna elevou
14
em sentido amplo o direito da dignidade da pessoa humana como um princípio
fundamental.
Neste sentido, decorrem todos os outros direitos em torno de um foco
principal que é a valoração da dignidade da pessoa, como estabelece Edilson
Pereira de Farias (1996, p. 47):
O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana refere-se às exigências básicas do ser humano no sentido de que ao homem concreto sejam oferecidos os recursos de que dispõe a sociedade para a mantença de uma existência digna, bem como propiciadas as condições indispensáveis para o desenvolvimento de suas potencialidades.
Tanto a sociedade como o Estado tem por sua finalidade o homem, desta
forma nada mais justo do que a Constituição Federal lhe garanta a proteção à sua
dignidade.
O importante disso é ressalvar que ninguém deve estar fadado ao peso de ser
lembrado eternamente pelos erros passados. Coisa que, numa dimensão infinita
pode com certeza ferir o princípio da dignidade da pessoa. A partir disso, torna-se
possível dizer que o ordenamento jurídico brasileiro admite o direito ao
esquecimento como uma garantia da pessoa humana. Por outro lado, que também
admite a livre manifestação da informação e do acesso a ela, ou seja, um direito a
integridade intelectual do indivíduo. Desta forma, o direito ao esquecimento não é
um direito absoluto, deve-se ponderar a cada caso concreto. E por tratar-se de uma
analise um tanto quando polemica, ainda demandará de bastante tempo e muito
debate.
2.3 Direito de Imprensa e Expressão Versus Direito à Privacidade
O direito de receber informações consiste em um direito de liberdade
resguardado como condição a todos os cidadãos, não depende de raça, credo ou
convicção ideológica, e sua principal finalidade é o fornecer embasamento para a
construção de opinião própria sobre assuntos públicos.
15
Nas palavras de José Afonso da Silva (2005, p. 246):
Nesse sentido, a liberdade de informação compreende a procura, o acesso, o recebimento e a difusão de informações ou ideias, por qualquer meio, e sem dependência de censura, respondendo cada qual pelos abusos que cometer. O acesso de todos à informação é um direito individual consignado na Constituição, que também resguarda o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional (art. 5º, XIV).
A liberdade de expressão é resguardada por um conjunto de direitos que
permite a divulgação de pensamentos e informações, pelos meios de comunicação,
seja através do jornalismo, televisão, rádio, internet, ou qualquer outra forma de
transmitir o livre pensamento humano. Além destes, incluem-se a arte, música e
também de expressões não verbais.
De acordo com George Marmelstein (2013, p. 121):
[...] é um instrumento essencial para a democracia, na medida em que permite que a vontade popular seja formada a partir do confronto de opiniões, em que todos os cidadãos, dos mais variados grupos sociais, devem poder participar, falando, ouvindo, escrevendo, desenhando, encenando, enfim, colaborando da melhor forma que entenderem.
A respeito da liberdade de expressão, Paulo Gustavo Gonet Branco (2012, p.
334) assim dispõe:
A garantia da liberdade de expressão tutela, ao menos enquanto não houver colisão com outros direitos fundamentais e com outros valores constitucionalmente estabelecidos, toda opinião, convicção, comentário, avaliação ou julgamento sobre qualquer assunto ou sobre qualquer pessoa, envolvendo tema de interesse público, ou não, de importância e de valor, ou não [...].
Da mesma forma as liberdades de informação e expressão encontram
respaldo em documentos internacionais, como a Declaração Universal dos Direitos
Humanos, da ONU, diz em seu art. XIX que “toda pessoa tem direito à liberdade de
opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões
e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e
independentemente de fronteiras.”
No mesmo sentido, a Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de
San José da Costa Rica), de 1969, em seu art. 13:
16
1. Toda pessoa tem o direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito inclui a liberdade de procurar, receber e difundir informações e ideias de qualquer natureza, sem considerações de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer meio de sua escolha. 2. O exercício do direito previsto no inciso precedente não pode estar sujeito à censura prévia, mas a responsabilidades ulteriores, que devem ser expressamente previstas em lei e que se façam necessárias para assegurar: a) o respeito dos direitos e da reputação das demais pessoas; b) a proteção da segurança nacional, da ordem pública, ou da saúde ou da moral públicas. 3. Não se pode restringir o direito de expressão por vias e meios indiretos, tais como o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de imprensa, de frequências radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos usados na difusão de informação, nem por quaisquer outros meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de ideias e opiniões. 4. A lei pode submeter os espetáculos públicos a censura prévia, com o objetivo exclusivo de regular o acesso a eles, para proteção moral da infância e da adolescência, sem prejuízo do disposto no inciso II. 5. A lei deve proibir toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, racial ou religiosa que constitua incitamento à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência.
Justamente por tratar-se de instrumento de formação de opinião e a sua
grande influência em diversas esferas da sociedade, a imprensa, pode ser
considerada como um quarto poder, ao lado do Legislativo, do Executivo e do
Judiciário, segundo René Ariel Dotti (1980, p. 129).
A Constituição Federal de 1988, no seu capítulo V do título VIII
intitulado “Da Comunicação Social”, assim estabelece:
Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. § 1º - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV. § 2º - É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística. § 3º - Compete à lei federal: I - regular as diversões e espetáculos públicos, cabendo ao Poder Público informar sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada; II - estabelecer os meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente. § 4º - A propaganda comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, agrotóxicos, medicamentos e terapias estará sujeita a restrições legais, nos termos do
17
inciso II do parágrafo anterior, e conterá, sempre que necessário, advertência sobre os malefícios decorrentes de seu uso. § 5º - Os meios de comunicação social não podem, direta ou indiretamente, ser objeto de monopólio ou oligopólio. § 6º - A publicação de veículo impresso de comunicação independe de licença de autoridade.
Embora muitos possam não concordar com o termo “quarto Poder” da
imprensa, não se pode negar a força significativa que ela exerce na sociedade. Seja
para o bem ou para o mal. E o Estado Democrático de Direito, manifesta a liberdade
de pensamento do seu povo por todas as formas e por uma imprensa livre. Conduto,
sob outra vértice, a doutrina condiciona a verdade e o interesse social como limites
da liberdade de imprensa.
Para Judicael Sudário de Pinho (2003, p. 128):
A liberdade de informação refere-se essencialmente à informação verdadeira, assim ocorrendo porque a imprensa é formadora de opinião pública, com relevante função social, possibilitando o amplo desenvolvimento da liberdade de opção da sociedade para reforçar o regime democrático.
Resta claro, que ao falar-se de liberdade de expressão, principalmente no que
tange a atuação da imprensa, esta não deve ser falsa. A informação verdadeira é a
liberdade que a constituição visa proteger, pois o direito a ser informado, não
encontra respaldo ao direitos de liberdade de imprensa e expressão quando se está
diante de notícias irreais.
Utilizando a dignidade da pessoa humana como limitador às liberdades de
informação, de expressão e de imprensa, Paulo Gustavo Gonet (2012, p. 346)
expõe:
Respeita-se a dignidade da pessoa quando o indivíduo é tratado como sujeito com valor intrínseco, posto acima de todas as coisas criadas e em patamar de igualdade de direitos com os seus semelhantes. Há o desrespeito ao princípio, quando a pessoa é reduzida à singela condição de objeto, apenas como meio de satisfação de algum interesse imediato. O ser humano não pode ser exposto – máxime contra a sua vontade – como simples coisa motivadora da curiosidade de terceiros, como algo limitado à única função de satisfazer institutos primários de outrem, nem pode ser reificado como mero instrumento de divertimento, com vista a preencher o tempo de ócio de certo público. Em casos assim, não haverá exercício legítimo da liberdade de expressão, mas afronta à dignidade da pessoa humana.
18
Para Edilson Pereira de Farias (1996, p. 113), de acordo com a teoria
das esferas, trazida pela doutrina alemã, a vida privada estaria dividia em três
esferas. A primeira esfera chamada vida privada, a qual abrange o comportamento,
atitudes e fatos que o indivíduo não deseja compartilhar com os demais, isto incluem
até mesmo comportamentos fora do domicílio, resguardos apenas àqueles mais
próximos, que mantém contato com a pessoa. A segunda é a esfera confidencial ou
da intimidade, mais restrita ainda do que a anterior, aquilo que a pessoa leva em
caráter de confiança ao conhecimento de outra pessoa, fica excluído o público em
geral, apenas pessoas com as quais mantém certa intimidade. E por fim, a esfera do
secreto, inserida no centro da esfera privada, correspondente aos assuntos que não
devem chegar ao conhecimento nem mesmo dos mais íntimos. É a chamada vida
particular do indivíduo, em outras palavras, os seus segredos.
Em suma, a vida privada consistiria na vida pessoal do ser humano, em
aspectos íntimos, a saber, sentimentais, sexuais, religiosos, familiares além de
aspectos externos, mais amplos. A vida privada seria mais do que o ato apenas de
estar só. Envolve o relacionamento com um grupo seleto de pessoas, tais como
amigos pessoais e familiares.
19
3 DIREITO COMPARADO: ALGUNS CASOS INTERNACIONAIS E NACIONAIS
3.1 Apreciação no Âmbito Internacional
No cenário Internacional, a tese do direito ao esquecimento, não é utilizada
como forma de omitir ou apagar um histórico na esfera criminal, mas um
entendimento visto como direito de preservação da intimidade, bem como inserido
num contexto à de ressocialização.
No ano que data 1931, a Corte de Apelação da Califórnia marcou época no
julgamento do caso Melvin v. Reid. Melvin. No caso, Nelvin a autora da ação, tivera
sido no passado uma prostituta. E acusada por envolvimento em um homicídio, isto
no ano de 1918. Após o julgamento acabou por ser inocentada, devido ao fato de
comprovado a sua não participação no crime. Após o fato ela veio a casar-se,
mudando de vida, era uma pessoa bem quista na comunidade em que vivia, enfim
construiu uma nova vida, com família e amigos. De modo que muitos de seus
novos amigos e pessoas conhecidas desconheciam este fato passado de sua vida.
Contudo no ano de 1925, uma cineasta, lançou sem a sua permissão, o filme
chamado “The Red Kimono” ( Kimono Vermelho ) em que era baseado fatos que
contavam a sua história, inclusive o de se prostituir, o envolvimento no julgamento,
sendo que nem o seu nome foi preservado, lhe causando então diversos prejuízos,
motivo pelo qual propôs a ação contra todos os responsáveis pelo filme. Foi a
primeira nos Estados Unidos que versava sobre essa matéria. Apesar de no caso, a
sua apreciação não ser expressamente ao direito à privacidade de Melvin, a Corte
Americana julgou procedente, o entendimento de ser direito o de buscar e de
alcançar a felicidade (como um dos 30 direitos proclamados na declaração de
independência dos Estados Unidos da América), condenando como ilícito, o ato de
expor a vida pessoal como feito quando da divulgação do filme e da utilização de
seu nome real (EUA, 1931, p. 3).
No incidente que envolveu Melvin referente às informações sobre o
julgamento por homicídio, os julgadores decidiram sob o aspecto que somente isso
não lhe concederia o direito à ação, devido tratar-se de registros públicos e de
interesse também público.
20
Outro caso refere-se ao julgado pelo Tribunal Constitucional Alemão é o
chamado “caso Lebach”. Em 1969, quatro soldados alemães foram assassinados na
Alemanha, numa cidade chamada Lebach.
Após o julgamento, foram condenados três réus, sendo dois à prisão perpétua
e um a pena de seis anos de reclusão. Esse terceiro condenado cumpriu
integralmente sua pena e, ao sair da prisão, teve conhecimento que uma emissora
de TV iria exibir um documentário sobre o crime. Diante disso, propôs uma ação
para impedir a exibição do programa, no ano de 1973.
O Tribunal Constitucional Alemão, que decidiu no sentido que a proteção da
personalidade impede a exploração da imprensa, por tanto tempo, que a vida
privada neste caso concreto deveria ser preservado. Que a proteção da
personalidade deveria prevalecer em relação à liberdade de informação. Haja vista,
o fato de decorrido o tempo e o fato do crime já estava solucionado e julgado, o réu
ter cumprido a sua pena, o interesse em nomes e imagem não seria relevante, já a
reportagem poderia causar maiores prejuízos ao condenado, que precisava ter
condições de ressocialização, coisa que se tornaria mais difícil com a exposição do
caso novamente. Foi julgado procedente o pedido, e a emissora coibida de exibir o
documentário. O Tribunal Constitucional decidiu com base no direito
constitucionalmente protegido na Alemanha de “desenvolver a personalidade” e na
proporcionalidade entre o interesse de informação da população e a proteção da
privacidade, no sentido de que a imprensa não pode se utilizar para sempre de fatos
da vida privada do condenado, principalmente quando se possa identificar um
prejuízo à sua honra perante a sociedade. E ao seu direito de a ela se reintegrar.
(SCHWAB, 2006, p. 492).
O jurista e filósofo francês François Ost (2005, p. 160), escreveu:
“Uma vez que, personagem pública ou não, fomos lançados diante da cena e colocados sob os projetores da atualidade – muitas vezes, é preciso dizer, uma atualidade penal –, temos o direito, depois de determinado tempo, de sermos deixados em paz e a recair no esquecimento e no anonimato, do qual jamais queríamos ter saído”.
O direito ao esquecimento é tema que discute-se há anos na Europa e nos
EUA. A título de exemplo, Fraçois Ost cita a decisão, de 1983, do Tribunal de última
21
instância de Paris (Mme. Filipachi Cogedipresse) (ob. cit. p. 161), o entendimento foi
da seguinte forma:
“(...) qualquer pessoa que se tenha envolvido em acontecimentos públicos pode, com o passar do tempo, reivindicar o direito ao esquecimento; a lembrança destes acontecimentos e do papel que ela possa ter desempenhado é ilegítima se não for fundada nas necessidades da história ou se for de natureza a ferir sua sensibilidade; visto que o direito ao esquecimento, que se impõe a todos, inclusive aos jornalistas, deve igualmente beneficiar a todos, inclusive aos condenados que pagaram sua dívida para com a sociedade e tentam reinserir-se nela.”
3.2 Chacina da Candelária
O julgamento do caso da “Chacina da Candelária”, pelo Superior Tribunal de
Justiça foi o que deu o marco inicial ao direito de ser esquecido, pela primeira vez
utilizada numa corte brasileira. Com apoio no permissivo do Enunciado 531 da CJF,
bem como na extensão e tutela do princípio da dignidade da pessoa humana,
expresso no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal, foi que a 4a Turma do
Superior Tribunal de Justiça, por sua maioria, em meados de 2013, decidiu com
fulcro na tese do “Direito ao Esquecimento” foi relator o Ministro Luís Felipe
Salomão, Recurso Especial n. 1.334.097/RJ. O caso que fora ajuizado com o
proposto de condenar ao pagamento de indenização a emissora de TV, a empresa
Globo Comunicações, por desrespeito ao direito da personalidade. O recurso narra
o seguinte: Um dos investigados como suspeito dos homicídios, ocorridos em 23 de
julho de 1993 na cidade do Rio de Janeiro, em que ficou nacionalmente conhecido
como a "Chacina da Candelária" – ao ser absolvido ao final do julgamento por restar
provado a sua não participação – ingressou com ação contra a emissora de TV
devido a veiculação de um programa chamado “Linha Direta – Justiça”, apesar de
seu expresso não consentimento e pedido que não gostaria de ver seu nome ou
imagem expostos, o programa levou o episódio ao ar, divulgando o seu nome, rosto
, bem como toda a história que o envolveu como uma das figuras do fato. (STJ,
2013a, p. 1).
Em decisão de primeiro grau, o julgado reconheceu no caso uma necessidade
de balizar devido ao interesse público da notícia, o direito à informação, com o direito
a privacidade e ao esquecimento, foi considerado improcedente o pedido (STJ,
22
2013a, p. 1-2). Também se entendeu que a emissora não agiu com dolo. Tampouco
causou dano à imagem ou à honra na medida em que retratou fielmente o ocorrido,
relatando ainda absolvição e a inocência do investigado, pois o objetivo maior era
relatar os erros da polícia nesta investigação que culminou na acusação de três
pessoas inocentes, entre eles o autor. Já em recurso de apelação (TJ/RJ, 2008),
cujo acórdão foi relator o desembargador Eduardo Gusmão Alves Brito Neto, obteve-
se a reforma na sentença, a qual condenou a TV Globo no pagamento de danos
morais no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). Teve como entendimento a
possibilidade de que poderia se recontar a história da Chacina da Candelária sem a
divulgação de nomes.
Ainda de acordo com o Relator:
No âmbito da Constituição encontra-se um claro sinal no sentido de se preservar os interesses individuais do cidadão, porquanto está no art. 221 da Carta que a programação das emissoras deve atender ao respeito aos valores éticos sociais da pessoa e da família. Porque longe de acolher a prevalência constante do interesse coletivo sobre o particular, preocupa-se a Constituição em preservar o indivíduo, dotando-lhe de uma esfera mínima de proteção capaz de assegurar sua felicidade, objeto legítimo de desejo por todos e nesta qualidade protegidos pelo Estado (TJ/RJ, 2008, p. 5).
Opostos embargos infringentes e mantido o entendimento do tribunal,
justificou-se que, apesar do interesse social que se alegava, por o caso fazer parte
da história, e pelo caráter educativo, em que fatos horríveis como esses não devem
ser esquecidos pela população, alegou-se ser possível encontrar meios de veicular a
narrativa sem expor o investigado, ou então, poderia ter-se usado outro nome como
forma de proteção à imagem, o que não deixaria menos informado o público. Em
favor de um direito fundamental que merecia maior atenção. Esse direito foi
considerado pela turma julgadora como “Direito ao Esquecimento” ou o “direito de
ser deixado em paz” (TJ/RJ, 2009, p. 7-8).
A Globo Comunicações e Participações S/A, sustentou em fase de recurso
especial a ausência de ilicitude, sendo que esses tipos de programas, documentário
ou filme sobre crimes são bastante comuns, também argumentou que não houve
invasão à privacidade, já eram públicos os fatos, além de já conhecido na
sociedade, fazendo parte do “acervo histórico do povo”, (STJ, 2013a, p. 4). Em
23
linhas gerais, a defesa pleiteou que o acolhimento de um direito ao esquecimento
configuraria em um imenso atentado contra a liberdade de expressão e o direito de
imprensa, representando a perda da memória e da própria história da sociedade
(STJ, 2013a, p. 17).
No seu voto, o Ministro Luís Felipe Salomão, reconhece o conflito entre a
liberdade de informação e de expressão e os direitos da personalidade que,
segundo o seu entender é consequência de opção constitucional:
De acordo com o ministro, neste caso, usurpou-se parcela do seu direito à
privacidade no sentido de direito de ser deixado em paz, quando se expôs
novamente ao público a informação que já teria sido apagada da lembrança pela
sociedade. Mesmo após ter exposto sua contrariedade a respeito.
3.3 Caso Aída Curi
Recurso Especial n. 1.335.153/RJ, caso em que os irmãos vivos de Aída Curi,
vítima de homicídio em 1958, em Copacabana/RJ, crime que ficou nacionalmente
conhecido época devido às circunstâncias em que ocorreu.
Foi ajuizada ação de indenização de danos materiais, morais e à imagem,
também contra a Globo Comunicações e Participações S/A, após novamente uma
matéria que foi veiculada cinquenta anos após o ocorrido (STJ, 2013b, p. 1).
Alegou-se, pelos familiares de Aída Curi que a exploração do caso pela
emissora fora ilícita, com cujo comercial da noticia, à custa da abertura de antiga
ferida da família e fazendo emergir a lembrança de tragédia familiar passada, além
de causar danos à imagem da falecida pelo seu uso comercial, mesmo sendo
notificada previamente a não fazê-lo. (STJ, 2013b, p. 1) Os fundamentos da defesa
foram os mesmos do caso anteriormente estudado. Seguindo para julgamento,
assim como ocorreu no caso da Chacina da Candelária, o Juízo de Direito da 47ª
Vara Cível da Comarca da Capital/RJ julgou improcedentes os pedidos dos autores,
tendo sido mantida a sentença por seus fundamentos em grau de apelação. (STJ,
2013b, p. 1).
24
O entendimento do Tribunal ao julgar improcedente, assim como em primeiro
grau, deve-se a consideração que “[...] a matéria jornalística não foi maliciosa nem
extrapolou o objetivo de retratar os fatos acontecidos” (TJ/RJ, 2010, p. 1). E
relevante o interesse da sociedade em crimes como esses, pois infelizmente,
estampam a realidade nacional, além de o fato ter sido um crime que marcou época
devido a sua comoção e ampla repercussão.
No recurso de apelação, Ricardo Rodrigues Cardozo, o relator aduziu que a
nova veiculação apenas fez reconstituiu a história, apenas com o uso de
informações que já eram públicas e estavam livres ao acesso de qualquer um que
desejasse (TJ/RJ, 2010, p. 4).
Ou seja, dois entendimentos, de casos que envolvem o “Direito ao
Esquecimento”, que ora julgou procedente, como no caso da Chacina da Candelária,
que sobrepôs o limite da intimidade, e em outro polo, o que se resguardou foi o
direito à informação. O Supremo Tribunal Federal, em breve se manifestara, sobre o
Caso Aída Curi. Até lá, ficamos com os questionamentos acerca desses dois
importantes direitos que possuem extrema importância na sociedade.
25
4 A SOCIEDADE NA ERA DA INFORMAÇÃO
4.1 O Papel da Internet na Vida Moderna e sua Interferência na Intimidade.
Atualmente vivemos numa era da velocidade de informação e dos meios de
comunicação. Com a evolução da internet e com ela a criação de várias redes
sociais, de sites, e outros portais de informação, bem como a difusão de jornais,
livros e revistas digitalizados, tornam a informação cada vez mais acessível e rápida,
seja ela verdadeira ou falsa, de cunho publico ou particular.
No livro “Direito à intimidade na Internet”, Marcelo Cardoso Pereira define: a
Internet é uma rede de redes (e de sub-redes) de computadores que possibilitam o
acesso e intercâmbio de informações, e mais que isso, é uma nova forma de
relacionamento entre as pessoas. (PEREIRA, 2004, p. 36-37).
Continua Pereira (2004, p. 141), ao dizer que vivemos hoje segundo a máxima
“informação é poder”, uma sociedade da informação, ou talvez uma sociedade
dependente da informação, considerada como um meio de disseminação de ideias,
concepções, notícias e acontecimentos, onde a Rede tem um papel fundamental na
arrecadação daqueles dados.
Desta mesma forma, Pereira (2004, p. 144) faz uma analise se o direito à
intimidade foi capaz de evoluir para se adequar a essa nova realidade que vivemos,
o uso cada vez mais constantes de tecnologias.
Os direitos que versam sobre a intimidade e a vida privada são direitos que
se misturam. Contudo, mesmo sendo conceitos que possam se confundir sob alguns
aspectos, eles são distintos, Ambos possuem diferenciação. A diferença está no fato
da intimidade pertencer a uma camada mais profunda do que o direito à vida
privada.
Acerca desta questão discorre Tércio Sampaio Ferraz (1993, 449):
26
A intimidade é o âmbito do exclusivo que alguém reserva para si, sem nenhuma repercussão social, nem mesmo ao alcance da sua vida privada que, por mais isolada que seja, é sempre um viver entre os outros (na família, no trabalho, no lazer comum). Não há um conceito absoluto de intimidade, embora se possa dizer que o seu atributo básico é o estar só, não exclui o segredo e a autonomia. Nestes termos, é possível identificá-la: o diário íntimo, o segredo sob juramento, as próprias convicções, as situações indevassáveis de pudor pessoal, o segredo íntimo cuja mínima publicidade constrange.
A cada dia mais surgem situações que envolvem informações contendo dados
pessoais, sobre os quais, o sujeito tem direito de controle, em especial referente às
informações que ele mesmo tenha disponibilizado nas mídias sociais. É claro que é
preciso levar em conta que não vivemos um mundo isolado. Vivemos cercados de
outras pessoas, opiniões diversas, e a privacidade é flexibilizada nesse contexto. É
justamente neste aspecto, o fato de vivermos em grupo, que surge a necessidade de
aceitação no homem. Nasce a ideia de que é preciso mostrar-se como alguém
perfeito e sem falhas aos demais. Essa é uma das características da modernidade
observada: a necessidade reconhecida pelo filósofo francês Gilles Lipovetsky (2004,
p.97) da auto realização plena, que resulta em uma ânsia de retirar da história tudo
aquilo que possa depreciar a visão de si próprio.
Ainda continua LIPOVETSKY, (2004, p. 97):
Na era da felicidade, tudo o que inculca uma imagem depreciativa do eu, todas as denegações de reconhecimento, é atacado como ilegítimo, aparecendo como forma de opressão e de violência simbólica incompatível com o ideal de auto realização plena. Donde a multiplicação das exigências de ressarcimento por agravos coletivos, as expectativas de reconhecimento público, as reivindicações cada vez mais frequentes [sic] de um estado de vítima. As vindícias de reconhecimento particularista são indissociáveis do deal democrático moderno de dignidade humana – mas foi a civilização presentista que possibilitou as “políticas do reconhecimento” como instrumento de amor-próprio; as novas responsabilidades com relação ao passado; as novas querelas da memória (LIPOVETSKY, 2004, p. 97).
Percebe-se deste modo, como a nossa atualidade valoriza a perfeição social, a
vontade de se mostrar aos demais e a sociedade como alguém sem falhas, bem
sucedido em todos os sentidos, inclusive em relação às experiências passadas.
Essa busca incansável pela perfeição, faz parte da nossa cultura embutida em
imagens das revistas, televisão e mídias de modo geral. Desta forma, o anseio pela
27
aceitação também traz a vontade de que o passado da pessoa impecável, sem
espaço para erros. Talvez seja esta a explicação para a busca ao “Direito ao
Esquecimento”, como uma possibilidade de repintar a história pessoal da melhor
maneira, ou quem sabe, simplesmente preocupados como possam ver vistos pelos
outros.
4.2 A Mídia e a Sua Superexposição da Vida Privada
O aumento do espaço e destaque dados pela grande imprensa às notícias nos
últimos anos é inquestionável. Em frequência quase diária, assuntos envolvendo
assuntos como política, crimes ou celebridades tem sido manchete dos principais
jornais do País. São inúmeras reportagens de capas de revistas, matérias nos
principais telejornais e emissoras de rádio, portais da Internet e publicações
especializadas.
O papel influenciador da mídia sobre a população e os reflexos desta
influência sobre a liberdade democrática devem ser sobrepesados através de limites
que precisam ser respeitados pela liberdade de imprensa. A superexposição
midiática a qual todos estamos sujeitos podem eventualmente cercear e entrar em
choque com outros princípios constitucionais.
É importante salientar que tutela à intimidade não veio a macular o exercício
do direito à informação, ao contrário, aquela garantia se relativiza quando se tratar
de notícias de público ou a respeito de fatos históricos. Não é a censura que se quer
defender, ao contrário, a doutrina busca apenas uma defesa contra a abusividade do
exercício ao direito de informação. Vale também lembrar a declaração universal dos
direitos do homem, aprovada pela Assembleia Geral da ONU em 1948 resguarda
como princípios fundamentais eles o direito à intimidade e à vida privada.
No tocante ao nosso ordenamento jurídico, somente com o advento da
Constituição Federal de 1988 é que estes direitos foram alçados à categoria de
norma constitucional. Ocorre que, a vida privada está protegida constitucionalmente.
Mas o temor coletivo leva à ânsia de criação de novos e novos direitos, se apenas
isso fosse aumentar a sensação de segurança.
28
Atribui-se a Benjamin Franklin a frase: “Aqueles que abrem mão da liberdade
essencial por um pouco de segurança temporária não merecem nem liberdade nem
segurança.” Ou seja, ao tentar impedir que determinado fato histórico deixe de ser
divulgado ou publicado, não seria o mesmo que limitar a liberdade de expressão,
que também encontra espaço garantido constitucionalmente?
4.3 Sites de Busca, Facebook e Youtube: o uso indiscriminado e as novas formas de
se relacionar
Atualmente as tecnologias que estão conectadas à Rede mundial de
computadores enfrenta um dos grandes desafios, oferecer um controle eficaz quanto
à segurança à intimidade e a vida privada. Os sites de busca disponibilizam as
informações na rede, uma vez que fazem um apanhado do conteúdo desejado pelo
usuário de uma forma ágil e prática. No entanto, dependendo da situação, essas
informações, pode conter abuso em sua divulgação, a exemplo do site Google, que
expõe sem o conhecimento do criador inúmeros acessos a informações. A respeito
de invasões na esfera do direito à intimidade, o site de busca Google deve possuir
responsabilidade sobre todo conteúdo divulgado, pois ele cadastra páginas da
Internet através de um processo de procura que lista todo e qualquer site, sem a
autorização.
Sobre o conteúdo de informações divulgadas na Internet sem nenhum
controle, aponta Rodriguez ( 2008, p. 41):
Relevante é conhecer o direito à intimidade com sua manifestação positiva: não apenas proteger-se da intromissão, mas direito de o indivíduo controlar as informações que existam sobre si próprio. Ou ainda: o direito de não ter as informações sobre si próprio acessadas para uma finalidade que não aquela para a qual foi originariamente colhida. Difícil, porém útil: todos os órgãos públicos e os grandes órgãos privados devem desenvolver uma
política de clara de privacidade (e, de preferência, cumpri-la).
29
Outro instrumento de relacionamento na Rede que muitas vezes envolve-se
em polemicas devido utilização abusiva, como é caso do site de relacionamentos
Facebook. O site surgiu com o intuito de agregar uma grande comunidade virtual em
que em as pessoas, através de perfis, todos os usuários pudessem trocar
informações, compartilhar fotos e interesses comuns. Mesmo não sendo permitido
usuários menores de idade e o abuso de sua utilização, o que se observa na
realidade é uma grande falta de controle no conteúdo que é veiculado na rede. Da
mesma forma, que é comum o fato de pessoas exporem suas vidas nesses sites,
facilitando e sujeitando-se ao mau uso que possam ser feito através desses
conteúdos. Algumas situações pela falta de um controle atuante, tem feito muitas
pessoas cancelarem seus perfis na internet, muitas vezes após serem vítimas de
intromissão na sua vida particular.
Outra tecnologia que virou febre de comunicação através da Internet foi o site
de vídeos Youtube. Na página, permite-se gratuitamente que o usuário cadastrado
disponibilize vídeos ou faça acessos na web de número infindável de vídeos,
disponibilizando noticias em geral até imagens não permitidas, muitas vezes
capturadas em qualquer lugar, com a facilidade que os aparelhos celulares com
câmera, hoje proporcionam. Mais uma vez, essa tecnologia usada de forma abusiva,
sujeita a qualquer momento uma invasão à intimidade e à vida privada das pessoas,
pois imagens captadas sem a autorização nem conhecimento dos envolvidos,
podem ser transmitidas na internet para infinito números de pessoas.
No tocante à proteção jurídica da intimidade e a privacidade em face da
Internet dos novos modelos de comunicação tecnológicas, alguns debates
doutrinários na tentativa de elucidar o conflito existente. No mesmo sentido,
Alexandre de Morais (2004, p. 252), ao interpretar a legislação constitucional
brasileira, explica que não é absoluta a proteção do direito à informação, na medida
em que encontra limite nas condutas íntimas e pessoais, que carecem de fato de
interesse público. Assim, a proteção constitucional à informação não se verifica
quando da divulgação de informações de interesse puramente privado, ou de forma
vexatória ou humilhante. Ademais, ensina o autor: A Constituição Federal não
protege as informações levianamente não verificadas ou astuciosas e
propositadamente errôneas, transmitidas com total desrespeito à verdade, pois as
30
liberdades públicas não podem prestar-se à tutela de condutas ilícitas (MORAES,
2004, p. 252).
Ademais, ensina MORAES, (2004, p. 252):
A Constituição Federal não protege as informações levianamente não verificadas ou astuciosas e propositadamente errôneas, transmitidas com total desrespeito à verdade, pois as liberdades públicas não podem prestar-se à tutela de condutas ilícitas.
31
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O “Direito ao Esquecimento” embora bastante discutido em cortes
internacionais, no cenário nacional é um tema recente. Entrou em pauta após duas
decisões proferidas pelos ministros do Superior Tribunal de Justiça, abordado como
um direito que o indivíduo tem a exigir que não sejam publicadas informações sobre
a sua pessoa, de forma abusiva. Assim, baseada na acepção do Conselho de
Justiça Federal de que o direito de ser esquecido está entre os direitos da
personalidade, e apoiada inclusive por precedentes internacionais e na reconhecida
opção antropocêntrica da Constituição Federal a qual coloca entre os fundamentos
da República a dignidade da pessoa humana.
O “direito de ser deixado em paz” do homem, lhe garante o direito ao
anonimato contra atos que lhe possa dificultar outras esferas de sua vida, por
exemplo, no que tange a ressocialização.
O “Direito ao Esquecimento” encontra lugar no ordenamento jurídico
brasileiro, em relação aos direitos constitucionais garantidores à vida privada e à
liberdade de comunicação e de imprensa. O que torna impossível a confrontar de
forma justa esses dois direitos antagônicos, sem que seja ponderada a razoabilidade
ao caso concreto.
Enquadra-se a privacidade na legitimamente que possui o indivíduo de evitar
o conhecimento de terceiros de certos aspectos de sua vida, por lhe fazer parte
única e exclusiva de sua intimidade, ao passo que o termo “ser deixado em paz”
possui uma amplitude muito mais abrangente, pois seria parte inerente ao direito de
todos, inclusive a liberdade de imprensa. Ou seja, sob outra vertente, até mesmo a
imprensa poderia invocar o “direito de ser deixado em paz” para publicar e informar
legitimamente tudo aquilo que for de interesse público. Neste sentido, qualquer tipo
de censura entre ambos, se faz necessária grande ponderação acerca dos fatos
envolvidos.
Dito isto, no caso da Chacina da Candelária, por exemplo, não se pode
obrigar o envolvido na época a prestar entrevista, tampouco que se fizesse uso de
sua imagem, familiares ou qualquer outra informação sem autorização.
32
Também, se torna inadmissível que imprensa ultrapasse seu direito/dever de
informar através de notícias sem cunho verossímil. Aliás, o que se espera de uma
imprensa é uma atuação com diligência para verificar a fonte, a veracidade dos fatos
e não causar danos à honra ou dignidade das pessoas.
Fica evidente que a proteção da privacidade, ou da personalidade, já encontra
resguardada no nosso ordenamento, sem a necessidade de que se enuncie o
“Direito ao Esquecimento” como um novo direito. Há que se compreender que o
chamado interesse público, de fatos já noticiados, pode ser através do passar do
tempo afastado da sociedade. Contudo, novamente, chega-se à conclusão que tal
direito de ser esquecido como uma barreira a publicação de conteúdo jornalístico,
também não caberia, pelo risco de interpretá-lo como uma forma de censura. Além
disso, se em algum momento aquele conteúdo passou a fazer parte da história
daquela sociedade através de sua divulgação, não faria mais tarde ser considerado
ilícito pelo mesmo motivo. Considera-se que a historicidade da notícia não
prescreve. Obviamente não se justifica ao se falar em abusividade, uso inadequado
da imagem da pessoa, o sensacionalismo da reportagem, tampouco qualquer tipo
de desrespeito ou agressão, seja a honra ou ao direito de personalidade, mas de
qualquer forma, aqui estamos a falar de institutos já protegidos pela lei. A dignidade
da pessoa humana nesse contexto, não pode ser vista apenas proteção
individualista, pois, também contempla a proteção da dignidade o direito de receber
informações sobre fatos que fazem parte da história ou até mesmo a respeito de
notícias a quem possam interessar.
Outrossim, invocar o “direito ao esquecimento” como uma proteção ao direito
de intimidade, também torna-se inútil (visto que a privacidade já encontra proteção
legal).
Finalmente, o argumento de que com a internet, na sociedade da informação
cause o receio de que esta nova tecnologia hoje muito valorizada , quando mal
utilizada possa causar dano à privacidade, jamais será uma justificativa absoluta a
limitação da liberdade ou a censura do exercício de um direito. Que o homem se
adapte à internet e não o contrário, pois ao criar novas formas de relacionamento, é
preciso que se leve a forma de se relacionar ao mundo virtual. Todos nós sabemos o
que é certo ou errado. Se uma pessoa sabe as regras de boa convivência na
33
sociedade, deveria sabê-lo também na rede. Importante também frisar que o fato de
a Rede possibilitar maior visibilidade do âmbito pessoal não torna lícita a invasão da
mesma, nem dá legitimidade à espionagem e ao abuso da mídia.
A própria Constituição Federal, com as sua cláusulas pétreas, bem como o
alcance da dignidade da pessoa humana, já alberga todos os dispositivos que
evocam esse novo “Direito de ser Esquecido”, sendo que a criação de um instituto
desse modo seria considerado como um censor, e maléfico à Democracia. Todavia,
a jurisprudência tem seu papel para elucidar as situações das mais diversas numa
sociedade. Embora a força de expressão “Direito ao Esquecimento”, possa ser
galgado como uma extensão aos direitos inerentes aos da personalidade, este só
encontra acolhimento na esfera privada, ou seja, não há que se falar em seu
alargamento no âmbito publico. Com isso, conclui-se que todas estas delimitações já
estão estruturadas dentro do nosso ordenamento jurídico brasileiro. E que o referido
“Direito ao Esquecimento” nada mais é que uma expressão, ou um sinônimo, o qual
cabe em alguns casos, os direitos inerentes da vida privada, os quais estes lhe
darão embasamento.
34
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RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Apelação. Autor
que, acusado de envolvimento na Chacina da Candelária, vem a ser absolvido pelo
Tribunal do Júri por unanimidade. Posterior veiculação do episódio, contra sua
vontade expressa, no programa Linha Direta, que declinou seu nome verdadeiro e
reacendeu na comunidade em que vivia o autor o interesse e a desconfiança de
todos. Conflito de valores constitucionais. Direito de Informar e Direito de Ser
Esquecido, derivado da dignidade da pessoa humana, prevista no art.1º, III, da
Constituição Federal. Apelação Cível n. 2008.001.48862. Apelante Jurandir Gomes
de França e Apelado Globo Comunicações e Participações S/A. Relator
Desembargador Eduardo Gusmão Alves de Brito Neto. Rio de Janeiro, 13 de
novembro de 2008. Disponível em:<http://www.tjrj.jus.br/>Acesso em: 09/ 2015.
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Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial n. 1.335.153/RJ. Recorrente Nelson
Curi e outros e Recorrido Globo Comunicações e Participações S/A. Relator Ministro
Luís Felipe Salomão. Brasília, 28 de junho de 2013b. Disponível em:
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09/2015
OST, François. O tempo do direito. Tradução Élcio Fernandes. Bauru, SP: Edusc,
2005.
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