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Web-Revista SOCIODIALETO • www.sociodialeto.com.br Bacharelado e Licenciatura em Letras • UEMS/Campo Grande M e s t r a d o e m L e t r a s • U E M S / C a m p o G r a n d e I S S N : 2 1 7 8 - 1 4 8 6 • V o l u m e 2 • N ú m e r o 2 • n o v e m b r o 2 0 1 2
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VARIAÇÃO DAS PLOSIVAS BILABIAIS NAS REDES SOCIAIS DE
FALANTES DO HUNSRÜCKISCH EM CONTATO COM O
PORTUGUÊS BRASILEIRO
Claudia Camila Lara (UFRGS)1
ccamilalara@yahoo.com.br
RESUMO: O objetivo desse estudo é analisar a realização variável das plosivas bilabiais (/p, b/) da fala
em português brasileiro nas redes sociais pessoais de habitantes da zona rural do município de Estrela,
Rio Grande do Sul. O fenômeno linguístico desse estudo é a consoante vozeada que pode sofrer
desvozeamento (baile~paile) e a desvozeada que pode sofrer vozeamento (princezinha~brincezinha).
Dessa forma, será analisada a fala de dez informantes pertencentes a uma pesquisa de mestrado a partir
das entrevistas sociolinguísticas em que foi gravada a fala espontânea com o entrevistador. Os
informantes relacionam-se pelas comunidades de prática, segundo Eckert (2000) para estabelecerem as
redes sociais pessoais, conforme Milroy (1987, 2003). Pretende-se verificar, qualitativamente, os graus de
interação entre os informantes, sendo que os graus foram adaptados da escala de 1 – 4 (-) de Blake &
Josey (2003). Quantitativamente os dados da fala dos informantes serão submetidos ao pacote
computacional VARBRUL, na versão GoldVarb X. Com isso, se verifica estatisticamente os fatores
linguísticos e extralinguísticos que condicionam a realização das plosivas bilabiais. Como resultado dessa
interação entre os informantes, ressalta-se que a troca das plosivas bilabiais (/p, b/) ocorre com os
informantes mais velhos que permanecem na comunidade. Os jovens deslocam-se para trabalhar em
centros urbanos onde a frequência da aplicação da variação já não é, provavelmente, marcada.
Palavras-chave: Contato linguístico português-hunsrückisch; Variação das plosivas bilabiais; Redes
sociais pessoais.
ABSTRACT: The aims of this study is to analyze the performance of the variable bilabial plosive (/ p, b
/) speech in Brazilian Portuguese in personal social networks of rural people from Estrela, Rio Grande do
Sul. The linguistic phenomenon is a voiced consonant may suffer voiceless (baile~paile) and the voiceless
may suffer voicing (princezinha~brincezinha). Thus, we will analyze the speech of ten informants
belonging to a research from sociolinguistic interviews in which spontaneous speech was recorded with
the interviewer. Informants relate to communities of practice, according to Eckert (2000) to establish
personal social networks, as Milroy (1987, 2003). It is intended to verify, qualitatively, the degree of
interaction between the informants, and the degrees were adapted from a scale of 1 - 4 (-) Blake & Josey
(2003). Quantitative data from the speech of informants will be submitted to VARBRUL computational
package, the version GoldVarb X. With this, there is statistically extralinguistic and linguistic factors that
constrain the realization of bilabial plosives. As a result of this interaction between the informants, it is
noteworthy that the exchange of bilabial plosives (/ p, b /) occurs with older informants who remain in the
community. Young people move to work in urban centers where the frequency of applying the change no
longer is probably checked.
Keywords: Portuguese-hunsrückisch language contact; Variation of bilabial plosives; Personal social
networks.
1 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Letras – Teoria e Análise Linguística da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Apoio: Bolsista de Mestrado CAPES.
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1 Introdução
Os falantes de qualquer língua, ao se comunicarem entre si e em sua comunidade
de fala, se utilizam de sons variados, vocábulos e estruturas que podem ser realizadas de
diferentes formas. Portanto, uma variedade linguística é concebível como um conjunto
de variantes que coocorrem em uma dada língua, segundo Berruto (2010). Ao se
comunicarem, os falantes precisam fazer certas escolhas em suas produções de fala.
Para tais escolhas, o falante pode estar em contato com outras formas de produção de
fala diferentes das preferidas em sua comunidade linguística. Além disso, pode utilizar
as formas do seu ambiente linguístico conforme a situação em que se encontra para
estabelecer um sentimento de pertença a um determinado grupo social.
Neste trabalho objetiva-se analisar a realização variável das plosivas bilabiais
(/p, b/) da fala em português brasileiro de dez habitantes da zona rural do município de
Estrela, no Rio Grande do Sul, verificando como o relacionamento em rede, dos
mesmos, é influenciado pelas práticas sociais advindas das comunidades de prática dos
habitantes dessa comunidade de fala. Justifica-se, dessa forma, esse estudo uma vez que
esse e outros reflexos do contato linguístico português-alemão são difundidos na
variação e no uso do português e da língua minoritária de imigração alemã
Hunsrückisch.
A cidade de Estrela, localizada no Vale do Taquari, Região Sul do Brasil,
recebeu a partir de 1855 os primeiros imigrantes alemães que se estabeleceram nas
Picadasi recebidas para morar e trabalhar, de acordo com Hessel (1983). Umas dessas
Picadas que foram repassadas aos colonos alemães é a atual Linha Glória, comunidade
pertencente à zona rural de Estrela. Essa comunidade foi escolhida para esse estudo
como a comunidade de fala porque é uma das comunidades mais antigas colonizadas
pelos imigrantes alemães. Bem como pelo fato de que no passado a comunidade, por
sua localização geográfica limítrofe com outros municípios, foi também o lugar de
importante escoamento da produção de alimentos.
Na interação dos teuto-brasileirosii com a população de outras colonizações, a
luso, a afro, a italiana, por exemplo, o imigrante alemão foi estereotipado pela sua fala,
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caracterizando-o como a fala da alemoadaiii
. Portanto, trocar as letras, ou seja, falar
trocando o fonema [b], plosivo bilabial vozeado, por [p], plosivo bilabial que sofre o
desvozeamento, ocorrendo em (baile~paile), e vice-versa, é uma marca considerada
pejorativa na fala dos descendentes alemães. Esse fenômeno linguístico, a variação do
uso das plosivas bilabiais (/p, b/), segundo Gewehr-Borella (2012, p. 2) configura uma
marca social bastante estigmatizada, com conotações negativas relacionadas aos
falantes de línguas de imigração alemã, vista como “fala de colono”. Por isso, o estudo
da variação das plosivas bilabiais (/p, b/), na comunidade de fala escolhida é de suma
importância uma vez que nem todos os informantes de que foi coletada a fala
apresentam essa troca, pois não generaliza, assim, a fala de todos os habitantes do meio
rural.
O trabalho está organizado em cinco seções, sendo a primeira a introdução que
se refere à abordagem do indivíduo enquanto parte integrante de uma sociedade e da
forma linguística desta para com um determinado grupo.
Na segunda seção serão apresentados os pressupostos teóricos que norteiam este
trabalho, como principais autores e pesquisadores relacionados aos estudos de
sociolinguística – variação linguística, redes e práticas sociais.
A terceira seção constitui-se da metodologia empregada para análise de regra
variável quanto à troca das plosivas bilabiais (/p, b/) e para o estudo qualitativo do
relacionamento em rede dos informantes em relação às práticas sociais dos mesmos na
comunidade de fala.
Discutem-se, na quarta seção, os dados obtidos através das entrevistas e
gravação espontânea de fala dos informantes da pesquisa. Por fim, na quinta seção,
serão traçadas as considerações finais deste trabalho.
2 Pressupostos teóricos
2.1 Sociolinguística – variação linguística
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Esse estudo, da troca das plosivas bilabiais (/p, b/), segue os pressupostos do
Modelo da Teoria da Variação na Teoria Linguística. Assim, a sociolinguística tem por
objeto de estudo os padrões de comportamento linguísticos observáveis dentro de uma
comunidade de fala e os formaliza analiticamente através de um sistema heterogêneo,
constituído por unidades e regras variáveis.
Dessa forma, Faraco (1998) define o termo sociolinguística como:
[...] o estudo das correlações sistemáticas entre formas lingüísticas variantes
(isto é, entre diferentes formas de dizer a mesma coisa) e determinados
fatores sociais, tais como a classe de renda, o nível de escolaridade, o sexo, a
etnia dos falantes.
Com a sociolingüística, amplia-se o estudo da variação lingüística,
acrescentando-se à dimensão geográfica (da dialetologia) a dimensão social
com fator de diferenciação lingüística (FARACO, 1998, p. 115).
Observa-se na definição apresentada por Faraco (1998) que uma comunidade de
fala não é entendida como um grupo de pessoas que falam exatamente da mesma forma,
mas que compartilham traços linguísticos que distinguem seu grupo de outros.
Labov (2008 [1972]) norteia a concepção de comunidade de fala para delimitar o
locus social do uso da língua. Para Labov (1972, p. 158) uma comunidade de fala não
pode ser concebida como um grupo de falantes que utiliza as mesmas formas; ela é
mais bem definida como um grupo que compartilha as mesmas normas em relação à
língua. Ou seja, a comunidade de fala para esse estudo, Linha Glória, engloba falantes
de diferentes comunidades de prática em que, ao mesmo tempo, interagem entre si e
comunicam-se da mesma forma.
Para Camacho (2006, p. 50), a variação linguística não é o resultado aleatório
de um uso arbitrário e inconsequente dos falantes, mas um uso sistemático e regular de
uma propriedade inerente aos sistemas linguísticos, que é a possibilidade de variação.
Assim, o sistema linguístico e seu uso representam a manifestação da linguagem no
contexto social e em diversas situações, como formais ou informais. As situações de uso
da língua, da comunidade de fala em questão, são apresentadas em forma de
comunidades de prática como: Escola, Coral, Bolão, Ginástica, Teatro, Grupo de 3ª
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Idade, Apostolado da Oração, Vôlei, Clube de Mães e Igreja, bem como através das
relações de ocupação, Local; Outras e/ou Aposentada(o).
Portanto, a inserção do Modelo da Teoria da Variação na Teoria Linguística
constrói-se no momento em que Weinreich, Labov & Herzog (2006 [1968]),
reconhecem o axioma da heterogeneidade ordenada. Para tal, a língua é vista como
objeto da heterogeneidade ordenada, tanto diacrônico ou sincronicamente, uma vez que
esta se torna a base da teoria da mudança linguística que supera o axioma da
homogeneidade estruturalista da linguística histórica.
2.1.1 Análise de regra variável
A sociolinguística tem por objeto de estudo os padrões de comportamento
linguístico observáveis dentro de uma comunidade de fala e os formaliza analiticamente
através de um sistema heterogêneo, constituído por unidades e regras variáveis.
Os falantes têm suas escolhas preferidas e estas, segundo Brescancini (2002)
explana que obedecem a um padrão sistemático regulado por regras especiais. As regras
variáveis expressam em um fenômeno linguístico as variáveis, contemplando os
elementos, fatores condicionadores, linguísticos e sociais.
A análise de regra variável é uma análise quantitativa, uma vez que suporta o
tratamento de dados e de índices numéricos que revelam a influência dos fatores
linguísticos e extralinguísticos na aplicação da regra.
A regra variável apresenta as variantes. As variantes são modos de dizer a
mesma coisa de diferentes formas.
A regra variável definida, para esse estudo, é a análise do comportamento
variável das plosivas bilabiais (/p, b/) do português. Esse fenômeno linguístico é
influenciado por fatores linguísticos e extralinguísticos, os sociais, para ter a frequência
de aplicação.
2.3 Redes Sociais
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Abordar a definição de redes sociais pessoais implica uma definição prévia de
comunidade a partir de Labov (2008 [1972], p. 342) que não se utilizou do termo
comunidade, mas o referiu como categoria de identidade local.
A visão de Milroy (1987) está de acordo com a de Cohen (1982), que evidencia
comunidade como „localismo‟, um forte sentimento de pertencimento a uma área da
cidade como sua, por exemplo. Os autores Battisti, Dornelles Filho, Lucas & Bovo
(2007, p. 7):
Esse sentimento nasce de valores simbólicos na área construídos, é uma
manifestação dependente do território na medida em que a contiguidade
física, a vida na vizinhança e as interações sociais ali realizadas diariamente
sustentam as normas sociais, entre elas as de uso linguístico, assim definem
localismo.
No entanto, Milroy (1987) não deixa de apresentar a posição de Frankenberg
que assinala para outra forma de se perceber o pertencimento, ou não, de um indivíduo
em uma comunidade que seria o não seguimento das normas locais e dos valores
estabelecidos pelo grupo. Para demonstrar esse exemplo pode-se utilizar do conflito
existente nos aspectos linguísticos, estudados por Labov, entre Vineyarders e os turistas
que chegam para o verão na Ilha de Martha‟s Vineyardiv
, estado de Massachusetts, nos
Estados Unidos.
Diferentemente da concepção de comunidade por Labov, o estudo de Blom and
Gumperz em Milroy (1987) na cidade de Norway, no estado norte-americano de
Carolina do Sul, atentou para a descrição dos padrões linguísticos de grupos
preexistentes dentro de uma área territorial definida.
E, finalizando a definição de comunidade, estudos de psicologia social, como o
de Ryan apud Milroy (1987) têm percebido que a língua ou o dialeto próprio de baixo
prestígio étnico e status de um grupo é símbolo de poder da identidade de um grupo.
Ressalta-se a importância da definição anterior uma vez que as redes sociais
pessoais se estabelecem dentro de uma comunidade local. Com isso, afirma Labov
(2008 [1972], p. 342) que em comunidades rurais (ou em bairros periféricos), a
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identidade local é uma categoria de pertencimento extremamente importante – muitas
vezes, impossível de reivindicar e difícil de conquistar.
Portanto, Milroy (1987) busca em Blom e Gumperz a observação a partir de dois
tipos de redes sociais: 1) em falantes de baixo status e membros de redes sociais
„fechadas‟ em que há maior interação entre esses falantes dentro de um território
definido e os contatos são mais próximos, pois todos se conhecem e 2) em falantes de
um grupo social privilegiado, elite, que têm as redes sociais „abertas‟ porque se movem
além das fronteiras territoriais e não necessariamente se conhecem.
As figuras (1) e (2) ilustram os dois tipos de redes sociais referidos
anteriormente, a partir de estudos de Milroy (1987, 2003). Entende-se nestas figuras que
um indivíduo está representado por A em θ (ponto central da rede) e outras pessoas
localizam-se nos pontos. O contato estabelecido entre eles dá-se através das linhas.
Fig. 1 – estrutura de rede pessoal de alta densidade Fig. 2 – estrutura de rede pessoal de baixa densidade
Fonte: Milroy (2003, p. 2)
As características estruturais das redes sociais pessoais são densidade, clusters
(grupos) e multiplexityv, subdividida em multiplex e uniplex, segundo Milroy (2003).
As redes sociais pessoais podem estabelecer uma conexão de alta ou de baixa
densidade. Para uma rede relativamente densa há um grande número de indivíduos
conectados entre eles por mais de uma forma de ligação, ou seja, os membros desta
rede, localmente ou não, podem estar em contato por motivos de amizade, parentesco ou
vínculo empregatício, esta é uma rede social pessoal multiplex.
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Uma rede pessoal de baixa densidade, uniplex, pode ser associada a membros
locais de um grupo em uma única forma de contato.
De acordo com Milroy (2003) a ancoragem de uma rede social é vista quando
cada pessoa é um foco de onde partem as linhas para os pontos, ou seja, para outras
pessoas. Afirma-se que pertencer a uma rede social de zona de primeira ordem é
estabelecer laços fortes enquanto que em uma rede social de zona de segunda ordem são
laços fracos que determinam a conectividade dos indivíduos.
A figura (3) aponta para uma rede social pessoal densa, multiplex, zonas de
primeira e segunda ordem:
Fig. – 3 rede social pessoal densa, multiplex, zonas de primeira e segunda ordem
Fonte: Milroy (2003, p. 2)
Já em (4) vê-se uma rede social pessoal de baixa densidade, uniplex:
Fig. – 4 rede social pessoal de baixa densidade, uniplex
Fonte: Milroy (2003, p.3)
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Nesse sentido, os autores Blake & Josey (2003) foram à Ilha de Martha‟s
Vineyard, estudada por Labov na década de 60, para analisar a forma do ditongo /ay/
cerca de quarenta anos depois nesta comunidade.
Os pesquisadores aproximaram sua amostra, inclusive limitando a pesquisa para
homens entre as faixas etárias similares as do estudo de Labov. No entanto,
estabeleceram uma forma de mensurar o grau de interação entre os informantes de
forma que estipularam os graus em uma escala de 1 – 4 (-). O grau (1) corresponde a
uma situação de intensa comunicação entre os indivíduos, diariamente no trabalho,
escola ou em casa. (2) atribui-se para uma forte relação, uma comunicação regular entre
os indivíduos; o grau de relacionamento (3) está para uma relação considerada “entre
amigos”, de conversa ocasional e o grau (4) representa que os indivíduos se conhecem,
porém não há um contato dinâmico. O sinal negativo (-) indica que a relação desses
indivíduos começa a ficar difícil, áspera a partir de certo tempo.
Blake & Josey (2003) concluíram, nesse estudo de revisitação à comunidade
pesquisada por Labov, que como a situação socioeconômica de Martha‟s Vineyard
mudou em função dos turistas as atitudes tradicionais dos Vineyarders também se
modificaram a ponto de estarem perdendo-se. A consequência que se destaca nesse
cenário é uma diminuição na característica fundamental da fala de Martha‟s Vineyard,
ou seja, a oposição marcada na pronúncia do ditongo [ay] comparada à fala dos turistas.
Esta mudança significativa foi constatada por Blake & Josey (2003) como uma
mudança em progresso, pois a centralização do ditongo /ay/ diminuiu e uma explicação
para isso vê-se nas atividades econômicas voltadas ao turismo. Tal conclusão corrobora
com a afirmação de Labov (2008 [1972], p. 57) de que o grupo das antigas famílias de
origem inglesa tem sido submetido a pressões vindas de fora: seus membros estão
lutando para manter sua posição independente diante de um persistente declínio da
economia e diante do assédio ininterrupto dos veranistas.
2.4 Práticas sociais
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Estudar as comunidades de práticas sociais implica ao observador, pesquisador,
como requisito inicial certa familiaridade com a comunidade estudada e tal processo
desenvolve-se através do trabalho de campo. O pesquisador deve ter atenção à visão que
os próprios membros da comunidade têm, em relação aos aspectos estruturais sociais da
comunidade, sobre o lugar deles nessa estrutura e sobre o lugar da comunidade no
mundo como um todo.
O termo comunidade de prática implica o desenvolvimento de atividades pelos
indivíduos, mesmo que eles possam circular dentro e fora da comunidade. Os membros
devem criar laços para que dividam suas experiências, práticas, conhecimentos entre
eles, segundo Eckert (2000).
Para Eckert (2000), os membros de uma comunidade de prática devem ter um
engajamento como uma corporação, em que um grupo de pessoas age como se fossem
um só grupo buscando alcançar os seus objetivos em comum ou influenciar o
comportamento dos indivíduos do grupo através das relações pessoais. Dessa forma,
cada indivíduo tem a sua participação na comunidade, podendo ser de forma marginal
ou central. A forma de participação varia de acordo com as atividades praticadas nos
grupos, se em um deles é de forma marginal, em outro grupo poderá ser de forma
central. Também, o que contribui para as diferentes formas de participação são as
categorias como classes sociais, idade, etnia, gênero produzidas e reproduzidas em
conjunto nos grupos.
Ainda para a autora, a identidade individual emerge deste processo do indivíduo
na articulação da comunidade de prática, bem como a identidade da comunidade de
prática emerge através do engajamento dos indivíduos.
Os autores Battisti, Dornelles Filho, Lucas & Bovo (2007) vão ao encontro da
definição de Eckert, principalmente, quanto às características das comunidades de
prática que são sustentadoras para as relações das redes sociais dos indivíduos. Dessa
forma, os autores afirmam no estudo “A palatalização das oclusivas alveolares e a rede
social dos informantes”, na cidade de Antônio Prado, que:
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a configuração das redes sustenta-se em práticas sociais de motivação
histórica, social e econômica; essas práticas associam-se a características do
próprio município de Antônio Prado, que vive um momento de transição
entre o tradicional e o moderno, mas que preserva com alguma força o
tradicional (BATTISTI, DORNELLES FILHO, LUCAS & BOVO, 2007, p.
26).
Outro exemplo é o estudo de Bovo (2004) realizado conforme a análise
quantitativa de regra variável que analisou o fenômeno da realização da vibrante
([r]ato::[ɾ]ato) de informantes da zona rural de Caxias do Sul. Em uma segunda etapa da
pesquisa, a autora buscou a análise qualitativa do trabalho caracterizando uma
comunidade de prática com o intuito de relacionar o valor social para o uso de tepe, [ɾ],
no lugar de vibrante, [r]. A estratégia de análise de Bovo (2004) perante a comunidade
de prática, Clube de Mães, deu-se pela participação de eventos ocorridos bem como de
entrevistas recontatadas com os informantes do Banco de Dados utilizado para o estudo.
Assim, a autora concluiu que o significado social aferido à variação da vibrante tem
relação indissociável do estudo das práticas sociais quanto ao uso da língua.
3 Metodologia
A partir das entrevistas sociolinguísticas em que foi gravada a fala espontânea
com o entrevistador verificou-se, na análise quantitativa, estatisticamente os fatores
linguísticos e extralinguísticos que condicionam a realização das plosivas, por meio do
pacote computacional VARBRUL, na versão GOLDVARB X. Bem como, pesquisou-se
a relação entre os informantes e as comunidades de prática para interpretar e constituir a
análise qualitativa.
A linha de estudo laboviana propõe o tratamento estatístico dos dados quanto à
variação do fenômeno linguístico e a análise qualitativa de Rede Social, conforme
Milroy (1987, 2003), são as ferramentas utilizadas para essa pesquisa.
Para a análise deste estudo foram contatados dez informantes, a seguir,
organizada a coleta de dados e elaborada a matriz de relacionamento em rede com base
nas comunidades de prática investigadas.
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3.1 Sujeitos
Os sujeitos deste estudo são parte de uma amostra de vinte e quatro informantes
pertencentes à pesquisa de mestrado em andamento. Portanto, dez informantes da
localidade de Glória pertencente à zona rural do município de Estrela/RS foram
investigados para este trabalho.
Para a constituição da amostra foram selecionados os dez informantes que
preenchessem as células de faixa etária: 15 – 30 anos; 31 – 46 anos; 47 anos ou mais;
escolaridade: ensino fundamental incompleto ou completo; ensino médio e ensino
superior; gênero: feminino e masculino; e ocupação, subdividida em três categorias:
Local (trabalham na comunidade em atividades agrícolas e em casa); Outras (deslocam-
se para outros lugares a fim de desenvolverem outras atividades profissionais) e
Aposentados (tanto os que se aposentaram na agricultura como os que se aposentaram
por outras profissões).
As variáveis linguísticas investigadas foram:
Contexto precedente: vazio, nasal bilabial, tepe alveolar, fricativa alveolar, vogal
anterior, vogal central, vogal posterior e lateral alveolar;
Contexto seguinte: vogal anterior, vogal central, vogal posterior, tepe alveolar, lateral
alveolar, fricativa, nasal, oclusiva.
Sonoridade da consoante-alvo: vozeamento e desvozeamento;
Tonicidade da sílaba: pré-tônica, tônica e pós-tônica;
Número de sílabas: monossílaba, dissílaba, trissílaba e polissílaba.
3.2 Coleta de dados
A pessoa ao aceitar o convite disponibilizou-se para os contatos posteriores em
que foram realizadas gravações espontâneas de fala e as entrevistas elaboradas em um
roteiro de perguntas sobre a comunidade: a participação do indivíduo nela; o convívio
diário no local; a ocupação com as atividades praticadas; as festividades relevantes para
os moradores, o ponto de vista sobre a comunidade e outras significações pessoais que o
indivíduo tem para com o local onde vive.
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No segundo momento reuniram-se as informações coletadas para a elaboração
da matriz de relacionamentos em rede. A partir dos estudos de Blake & Josey (2003) a
escala de 1 – 4 (-) foi adaptada para a escala de 1 – 4, como no estudo de Battisti,
Dornelles Filho, Lucas & Bovo (2007). Essa adaptação deu-se pelo fato de que, na
comunidade de Glória, o grau negativo (-) não foi necessário, pois todos os informantes
se conhecem, sabem localizar cada um, a sua residência e as atividades que faz.
Atribui-se, então, para os graus adaptados o valor máximo de conectividade (1)
para o convívio diário; (2) para a frequência de encontro semanal (regular) ou mensal
(eventual) e o valor mínimo de conectividade (3) para pouca frequência, ou seja,
encontro anual (raro) ou para os informantes sem vínculo atual.
Os graus estão subdivididos para melhor caracterizar a relação dos informantes,
por isso, cada grau compreende outras três subcategorias de relacionamento. Assim, o
grau (1) compreende: 1A – relacionamento familiar (marido, esposa, filha/filho,
irmã/irmão); 1B – vizinhos, amigos íntimos (próximos); e 1C – relação de trabalho ou
atividade nos grupos. No grau (2) as subdivisões estabelecem para 2A – relação de
parentesco (tia/tio, sobrinha/sobrinho, prima/primo); 2B – vizinhos, amigos que se
encontram, geralmente, no final de semana; e 2C – relação de trabalho ou atividade
mensal (eventual). O grau (3) estabelece para 3A – relacionamento de familiares com
pouca interação; 3B – vizinhos, amigos distantes; e 3C – uma relação em que os
informantes se conhecem, sabem uns dos outros e se localizam dentro da comunidade
de Glória ou que no passado já participaram de atividades, mas atualmente não se
interagem mais.
Os graus de relacionamento estão assim distribuídos no gráfico (1):
Gráfico – 1 graus de relacionamento em rede em Glória
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Fonte: da autora
Na terceira etapa, foram investigadas as comunidades de prática a que pertencem
os informantes. As dez comunidades de prática desenvolvidas na comunidade de fala
são: Escola; Coral; Bolão; Ginástica; Teatro; Grupo de 3ª Idade; Apostolado da Oração;
Vôlei; Clube de Mães e Igreja.
E, na última etapa, analisaram-se os graus de relacionamento em rede e as
comunidades de prática cujos informantes participam a fim de saber a influência de um
sobre o outro, principalmente, quanto à frequência, alta ou baixa, da aplicação do
fenômeno linguístico da troca das plosivas bilabiais (/p, b/).
4 Discussão e análise dos dados
Na análise quantitativa as variáveis linguísticas Contexto seguinte, Tonicidade
da sílaba e Número de sílabas não foram selecionadas pelo pacote computacional
VARBRUL, na versão GoldVarb X. A variável Contexto precedente foi selecionada por
apresentar ocorrências com Vogais e Vazio significantes. Exemplos: depende; rapadura;
obra; pouco e balneário. A variável Sonoridade da consoante-alvo apresentou o
processo de desvozeamento como condicionante, ou seja, a consoante vozeada sofreu
desvozeamento. Exemplos: baile ~ paile; trabalho ~ trapalho.
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Para a elaboração da matriz de relacionamento em rede, na análise qualitativa,
optou-se em estudar os fatores que condicionam a aproximação, ou não, dos indivíduos
em Glória. Esta aproximação é definida por Milroy (1987) como “laços fortes” e “laços
fracos” que influenciam o relacionamento.
Os fatores que se utilizou para a constituição da matriz de relacionamento em
rede foram a idade do informante (15 – 30 anos; 31 – 46 anos; 47 anos ou mais), a
escolaridade (EF - ensino fundamental incompleto ou completo; EM - ensino médio e
ES - ensino superior), o gênero (F - feminino e M - masculino) e a ocupação dos
informantes (Local - trabalham na comunidade em atividades agrícolas e em casa;
Outras - deslocam-se para outros lugares a fim de desenvolverem outras atividades
profissionais e Aposentados - tanto os que se aposentaram na agricultura como os que
se aposentaram por outras profissões).
A figura (5) contém a matriz dos graus de relacionamento em rede com base na
escala adaptada de Blake & Josey (2003) dos dez informantes, bem como a respectiva
idade, escolaridade e a ocupação de cada um. Ressalta-se que os informantes foram
referenciados pela letra inicial do nome e do sobrenome.
Fig. – 5 matriz de relacionamento em rede
Fonte: da autora
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A matriz da figura (5) representa uma rede de alta densidade e multiplex devido
ao fato de que todos os informantes se conhecem, grau (3) com 45 ocorrências do total
de 99, sabem onde moram e quais as atividades diárias que praticam, compartilham
momentos em conjunto ao desenvolverem as atividades. Este conhecimento sobre o
outro pode ser equiparado a zona de primeira ordem em que são estabelecidos laços
fortes porque os graus (1) e (2) apresentaram ocorrência significativa na matriz, sendo
respectivamente 28/99 e 26/99 ocorrências entre os informantes.
A afirmação de que a matriz da figura (5) representa uma rede social pessoal
densa multiplex baseia-se no fato de que há um grande número de indivíduos
conectados entre eles por mais de uma forma de ligação, ou seja, os membros desta
rede, localmente ou não, estão em contato por motivos de amizade, parentesco ou
desempenho de atividade em comum na comunidade.
Nos graus (1) e (2) verificam-se os laços mais fortes porque neles se encontram
as comunidades de prática, logo, a maioria dos indivíduos conecta-se múltiplas vezes,
por participarem de mais de uma comunidade de prática ou serem familiares íntimos.
Um exemplo disto são os informantes AS e CS que participam nas comunidades de
prática Coral e Igreja e são casados, portanto agregam-se os graus 1A e 1C. Um
exemplo que mescla os graus 1B e 2C é o dos informantes GS e AC que são vizinhos e
participam do grupo de Teatro.
Os resultados para o fator gênero, F e M, apontou que entre as mulheres (F) há 5
interações em que os laços estreitam-se de forma a ocorrer duas interações, enquanto
que nos homens (M) há 4 informantes que estreitam os laços em mais de uma relação.
Portanto, salienta-se que as mulheres apresentam mais laços de ligações na comunidade
do que os homens, pois o fator gênero demonstra uma ligeira diferença entre mulheres e
homens.
O fator ocupação dos informantes evidencia que 9 dos 10 entrevistados para esse
estudo tem a ocupação Outras (deslocam-se para outros lugares a fim de desenvolverem
outras atividades profissionais) como primeira opção, pois afirmam que na comunidade
não se tem trabalho para todos. Destacam, também, que precisam deslocar-se para o
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centro urbano ou para outros municípios da Região do Vale do Taquari a fim de
trabalhar em diversas profissões. Porém, os informantes que se deslocam para outros
lugares informaram que praticam atividades locais quando possível, ou seja, no final do
dia quando retornam para casa ou nos finais de semana. Esta característica é própria da
categoria Local (trabalham na comunidade em atividades agrícolas e em casa) em algum
momento do dia ou da semana.
A categoria Aposentados (tanto os que se aposentaram na agricultura como os
que se aposentaram por outras profissões) é citada por 2 informantes, IL e JG, que
alegam além de estarem aposentados desenvolvem, mesmo que informalmente, outras
atividades como o serviço de faxina e jardinagem e atividades locais na agricultura
familiar.
O fator idade varia entre os informantes de 17 a 59 anos, pois foram coletados
dados dentro das faixas etárias: 15 – 30 anos; 31 – 46 anos; 47 anos ou mais. Esse fator
é relevante nessa pesquisa porque tem demonstrado na fala dos mais jovens, os
informantes AC (17 anos), AL (18 anos), DM (23 anos) e GS (25 anos), o fato de que
são eles responsáveis pela mudança sonora da diminuição da frequência da troca das
plosivas bilabiais (/p, b/) no uso da língua portuguesa na comunidade. Esse ponto apoia-
se no fator ocupação, visto que, são eles também que desenvolvem outras atividades
profissionais, deslocando-se para centros urbanos, contatando com pessoas que,
provavelmente, não apresentam a variação das plosivas (/p, b/) no ambiente de trabalho.
As comunidades de prática Escola, Coral, Bolão, Ginástica, Teatro, Grupo de 3ª
Idade, Apostolado da Oração, Vôlei, Clube de Mães e Igreja foram selecionadas por
serem os polos de encontro mais salientados pelos informantes nas gravações
espontâneas de fala e nas entrevistas. Ora por apresentarem no passado, como a Escola e
o Bolão, relevância na comunidade, ora por atualmente concentrarem maior número de
frequentadores, por exemplo, Igreja, Coral, Apostolado da Oração e Teatro.
No posicionamento do 1º lugar a comunidade de prática Escola foi eleita pela
unanimidade como o grupo responsável pela maior interação dos informantes 10/10,
isso se deve porque todos os dez sujeitos da pesquisa relacionaram-se na escola, no
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passado quando foram membros do CPM (Conselho de Pais e Mestres), ex-alunos, mãe
ou pai de ex-alunos. O 2º lugar é a comunidade de prática Igreja em que 6/10
informantes praticam atividades como: GS, AS e IL preparam a liturgia nas missas; MK
é catequista e CS, JG frequentam as missas com regularidade.
A 3ª comunidade de prática que envolve 5/10 informantes é o Coral, tendo como
regente JG e os cantores AS, IL, MK e CS. Na 4ª posição houve um empate das
comunidades de prática Teatro e Apostolado da Oração com 4/10 informantes
participantes. O Teatro envolve GS, AC, CL e CS com atores da encenação tradicional
do Natal. As informantes GS, MK, AS e IL recebem mensalmente o material do
Apostolado da Oração, nota-se, portanto, que esta é uma prática feminina uma vez que
só mulheres podem associar-se no Apostolado da Oração.
Em 5º lugar, com 1/10 informantes, estão empatadas as comunidades de prática
Bolão, Clube de Mães e Vôlei. A informante IL participa das comunidades de prática
Bolão e Clube de Mães e a informante GS joga vôlei. Já as comunidades de prática
Ginástica e o Grupo de 3ª Idade não foram envolvidas nesse estudo porque não houve
informantes que praticassem atividades relacionadas a tais práticas sociais.
Por fim, verifica-se que as comunidades de prática são o meio pelo qual as redes
sociais pessoais de relacionamento dos informantes se fixam. No caso desse estudo, elas
também são fundamentais para o apontamento de que a fala coletada através da
gravação espontânea é influenciada quanto a variação das plosivas bilabiais (/p, b/).
Esse dado relevante da pesquisa se desvelou no momento em que nas comunidades de
prática que os jovens participam não há praticamente a troca das plosivas, a variação é
baixa. Tal fato pode ser argumentado pelo motivo de que esses jovens estabelecem
maior contato com pessoas de fora da comunidade de fala, ou seja, com pessoas que se
relacionam no trabalho nos centros urbanos que não aplicam a rega variável do
fenômeno linguístico. Enquanto que nas comunidades de prática movimentadas pelos
informantes das faixas etárias 31 – 46 anos; 47 anos ou mais a troca das plosivas
bilabiais (/p, b/) ocorre com frequência maior.
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Portanto, a frequência da aplicação do fenômeno linguístico da troca das
plosivas bilabiais caracteriza-se como baixa entre os jovens e com maior incidência da
frequência nas atividades envolvendo os informantes das faixas etárias 31 – 46 anos; 47
anos.
5 Considerações finais
A literatura tem evidenciado que estudos como os de variação linguística, redes
e práticas sociais de Labov (2008 [1972]), Milroy (1987, 2003), Eckert (2000), Blake &
Josey (2003) e Battisti & Lucas (2006), Battisti, Dornelles Filho, Lucas & Bovo (2007)
e Berruto (2010) têm contribuído para que se perceba a importância do espaço
geográfico circundado pela língua enquanto fonte motora de relacionamentos em rede
sociais pessoais através das comunidades de prática.
Dessa forma, alcançou-se o objetivo deste trabalho uma vez que se verificou
pela matriz de relacionamento em rede que as comunidades de prática são fundamentais
para que se estabeleça a conexão entre os indivíduos de uma localidade, no estudo a
localidade de Glória, e o fenômeno linguístico da variação das plosivas bilabiais (/p, b/)
na fala da língua portuguesa.
As comunidades de prática Escola, Coral, Bolão, Teatro, Apostolado da Oração,
Vôlei, Clube de Mães e Igreja revelaram que os laços entre os indivíduos estreitam-se
na medida em que se busca a interatividade dos membros destes grupos.
O resultado revelador da interação dos informantes, nessa pesquisa, foi a
mudança sonora que se iniciou na fala dos habitantes de Glória a partir dos mais jovens.
O fato de que esses informantes são responsáveis por diminuir a frequência da troca das
plosivas bilabiais (/p, b/) no uso da língua portuguesa tema ver com as relações de
trabalho e amizades criadas em outras comunidades de fala, nos centros urbanos, que
concentram características diferentes da fala dos informantes da pesquisa.
Ainda são poucas as observações a respeito das informações tão valiosas obtidas
nos contatos, conversas e entrevistas com os informantes, mas o bastante para incentivar
e aprofundar a pesquisa quando se olha para os dados com diversas perspectivas.
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Recebido Para Publicação em 30 de outubro de 2012.
Aprovado Para Publicação em 23 de novembro de 2012.
i As Picadas eram as localidades abertas na mata pelos colonos. Segundo Hessel (1983) o termo Picada
foi substituído por Linha, por exemplo, Picada Wolf passou a ser denominada Linha Wolf. A partir de
uma delimitação de terra, cada colono recebia uma pequena fração de terra, em torno de 25 hectares, para
se estabelecer com a família.
ii Sem outras conotações, o termo teuto-brasileiro é utilizado para designar aqueles que nasceram no
Brasil e são descendentes de imigrantes alemães, assim como os termos ítalo-brasileiro, afro-brasileiro ou
nipo-brasileiro.
iii Os descendentes de imigração alemã são assim denominados, de forma estereotipada, por aqueles que
são não-descendentes de imigrantes alemães e que chamam de alemoada os descendentes de imigração
alemã quando estes estão conversando entre os pares nas comunidades de prática.
iv Labov, na década de 60, desenvolveu um estudo na Ilha de Martha‟s Vineyard, nos Estados Unidos e
descreveu a reação dos moradores da Ilha (Vineyarders) com os turistas dos padrões de variação
linguística.
v A característica estrutural das redes sociais pessoais multiplexity (multiplex e uniplex) não foi traduzida
por motivos de fidelidade ao sentido na língua inglesa.
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