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    O QUE UM AUTOR?, DE FOUCAULT,E A QUESTO HOMRICA

    Teodoro Renn Assuno*Universidade Federal de Minas Gerais

    RSUM: Ce bref article (ou plutt bauche) veut prsenter defaon minimale la position thorique de Michel Foucault sur laquestion de lauteur (telle quelle est expose dans son texte Quest-ce quun auteur?) et, partir de l, essayer de penser la question du nomdauteur Hme ros (Homre) en grec ancien, et de manirecomplmentaire la question de luvre littraire que ce nomdauteur dsigne, cest--dire essayer dbaucher une premireposition densemble sur la vieille et insoluble question homrique.

    MOTS-CLS: auteur; Foucault; question homrique.

    ue o texto da conferncia de Michel Foucault sobre O que umautor? no Collge de France (a convite da Sociedade Francesa de Filosofia),no dia 22 de fevereiro de 1969,1 possa ter se tornado um marco tericobsico tambm para se pensar esta questo no domnio da Antiguidadegreco-romana o que atesta, por exemplo, o pargrafo inicial do Prefcio,

    * [email protected] Estes dados esto melhor explicitados na verso de Quest-ce quun auteur?publicada no n. 9 da revista Littoral (cf. Foucault, M. Quest-ce quun auteur? Littoral.Paris, n. 9, p. 3-32, 1983). Utilizamos tambm a verso deste texto publicada novolume I (1954-1969) de Dits et crits [cf. Foucault, M. Quest-ce quun auteur? In:______. Dits et crits I (1954-1969). Paris: Gallimard, 1994, p. 789-821]. A traduodeste texto para o portugus (O que um autor?) que consultamos (e s vezesmodificamos) a de Ins Autran Dourado Barbosa, publicada em Ditos & Escritos III(cf. Foucault, M. O que um autor?. In: ______. Ditos & Escritos III. Trad. InsAutran Dourado Barbosa. Rio de Janeiro: Forense Universitria, 2009, p. 264-298).

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    assinado por Claude Calame e Roger Chartier, da coletnea Identitsdauteur dans lAntiquit et la tradition europenne.2 O modesto objetivo destebreve artigo apenas o de apresentar sucintamente a posio de Foucaultsobre o tema e, a partir da (mas com dados mais precisos sobre ocaso), tentar pensar ( maneira de um primeiro e rpido esboo) o quequer dizer o celebrrimo nome de autor Homero, velha e exemplarquesto de autoria que mobilizou, sem nenhuma soluo definitiva,mais de dois milnios de comentrios, tendo se tornado conhecida comoa questo homrica.3

    Para introduzir, ento, bsica e didaticamente este esboo (nosupondo, da parte do leitor, nenhum conhecimento prvio do texto daconferncia de Foucault), farei um pequeno recorte e colagem depassagens decisivas deste texto dando, por meio da citao, a palavraao prprio Foucault para uma primeira definio de sua posio tericasobre o autor (a partir da questo do nome):

    2 Cf. Calame, C.; Chartier, R. (Org.). Prface. In: ______. Identits dauteur danslAntiquit et la tradition europenne. Grenoble: Jrme Millon, 2004a, p. 9: Por ocasio deuma interveno clebre sobre a noo de autor, Michel Foucault propunha substituira identificao tradicional do autor com um indivduo particular pela noo defuno-autor. Privado de sua independncia e de sua vontade criadora individual,o autor se torna assim uma construo que se elabora em relao com formaesdiscursivas particulares. Mas, no pargrafo seguinte, Calame e Chartier observam,com alguma precauo, que (...) esta identidade autoral textual remete a um contextoinstitucional que assume figuras bem diferentes segundo as culturas e segundo aspocas (cf. Calame e Chartier, op. cit., 2004a, p. 9). Sempre que no indicadas, astradues de textos em lngua estrangeira (no presente artigo) so de minha autoria.3 Uma boa introduo (por sua clareza e inteligncia) questo homrica sendotambm uma boa introduo obra que primeiro demonstra a composio formulare, portanto, a oralidade de Homero, ou seja: obra de Milman Parry a Introduo(Introduction) de Adam Parry coletnea em lngua inglesa das obras do pai Themaking of the homeric verse (cf. Parry, A. Introduction. In: Parry, M. The making of the homericverse. Oxford: University Press, 1971, p. ix-lxii). Referncias teis mais recentes soo artigo de Frank Turner The homeric question em A new Companion to Homer(cf. Turner, F. The homeric question. In: Morris, I; Powell, B. (Org.). A newCompanion to Homer. Leiden: Brill, 1997, p. 123-145) e tambm os vrios artigos quecompem a primeira seo A. The homeric question (unitarians, analysts, neo-analysts) do volume I de Homer: critical assessments, editado por Irene J. F. de Jong [cf.de Jong, I. J. F. (Org.). A. The homeric question (unitarians, analysts, neo-Analysts).In: ______. Homer: critical assessments. London: Routledge, 1999. Vol. I, p. 1-161].

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    Gostaria, inicialmente, de evocar em poucas palavras os problemassuscitados pelo uso do nome do autor. O que o nome do autor? Ecomo ele funciona? Longe de dar a vocs uma soluo, indicareisomente algumas das dificuldades que ele apresenta. (...) [Por exemplo pois] (...) a que aparecem as dificuldades particulares do nomedo autor , a ligao do nome prprio com o indivduo nomeado e aligao do nome do autor com o que ele nomeia no so isomorfasnem funcionam da mesma maneira. Eis algumas dessas diferenas.Se eu me apercebo, por exemplo, de que Pierre Dupont no temolhos azuis, ou no nasceu em Paris, ou no mdico etc., no menos verdade que esse nome, Pierre Dupont, continuar sempre ase referir mesma pessoa; a ligao de designao no ser modificadada mesma maneira. Em compensao, os problemas colocados pelonome do autor so bem mais complexos: se descubro que Shakespeareno nasceu na casa que hoje se visita, eis uma modificao que,evidentemente, no vai alterar o funcionamento do nome do autor. Ese ficasse provado que Shakespeare no escreveu os Sonnets (Sonetos)que so tidos como dele, eis uma mudana de um outro tipo: ela nodeixa de atingir o funcionamento do nome do autor. E se ficasseprovado que Shakespeare escreveu o Organon de Bacon simplesmenteporque o mesmo autor escreveu as obras de Bacon e as deShakespeare, eis um terceiro tipo de mudana que modificainteiramente o funcionamento do nome do autor. O nome do autorno , pois, um nome como os outros. (...)Estas diferenas talvez provenham do seguinte fato: um nome deautor no simplesmente um elemento em um discurso (que podeser sujeito ou complemento, que pode ser substitudo por um pronomeetc.); ele exerce um certo papel em relao ao discurso: assegura umafuno classificatria; tal nome permite reagrupar um certo nmero detextos, delimit-los, deles excluir alguns, op-los a outros. Por outrolado, ele relaciona os textos entre si; Hermes Trismegisto no existia,Hipcrates, tampouco no sentido em que se poderia dizer queBalzac existe mas o fato de que vrios textos tenham sido colocadossob um mesmo nome indica que se estabelecia entre eles uma relaode homogeneidade ou de filiao, ou de autenticao de uns pelosoutros, ou de explicao recproca, ou de utilizao concomitante.4

    4 Cf. Foucault, op, cit., 2009, p. 271-273 (traduo modificada). Foucault concluidizendo que o nome do autor (...) manifesta a ocorrncia de um certo conjunto dediscursos, e refere-se ao status desses discursos no interior de uma sociedade e deuma cultura. O nome do autor no est localizado no estado civil dos homens, noest localizado na fico da obra, mas na ruptura que instaura um certo grupo dediscursos e seu modo singular de ser. Consequentemente, poder-se-ia dizer queh, em uma civilizao como a nossa, um certo nmero de discursos que so

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    Quando, na sequncia, Foucault sugere que os critrios para adefinio do autor pela crtica literria tradicional esto prximos dosda exegese crist, ele se reporta aos critrios de So Jernimo em Deuiris illustribus, os quais, de algum modo (ou seja: com a exceo doltimo dos quatro), situam no interior da prpria obra (como tambmo faz Foucault quanto aos tipos discursivos) sem a necessidade deremeter ao indivduo histrico e jurdico que a criou a noo de autoria:

    O nome como marca individual no suficiente quando se refere tradio textual. Como, pois, atribuir vrios discursos a um nico emesmo autor? Como fazer atuar a funo autor para saber se se tratade um ou de vrios indivduos? So Jernimo fornece quatro critrios:se, entre vrios livros atribudos a um autor, um inferior aos outros, preciso retir-lo da lista de suas obras (o autor ento definidocomo um certo nvel constante de valor); alm disso, se certos textosesto em contradio de doutrina com as outras obras de um autor (oautor ento definido como um certo campo de coerncia conceitualou terica); preciso igualmente excluir as obras que esto escritasem um estilo diferente, com palavras e formas de expresso noencontradas usualmente sob a pena do escritor ( o autor como unidadeestilstica); devem, enfim, ser considerados como interpolados ostextos que se referem a acontecimentos ou que citam personagensposteriores morte do autor (o autor ento momento histrico definidoe ponto de encontro de um certo nmero de acontecimentos).5

    providos da funo autor, enquanto outros so dela desprovidos. Uma cartaparticular pode ter um signatrio, ela no tem autor; um contrato pode ter umfiador, ele no tem autor. Um texto annimo que se l na rua em uma parede terum redator, no ter um autor. A funo autor , portanto, caracterstica do modo deexistncia, de circulao e de funcionamento de certos discursos no interior deuma sociedade (cf. Foucault, op. cit., 2009, p. 274, traduo modificada). Ao tentardefinir os discursos que, na nossa cultura, portam a funo autor, Foucault privilegianeles o carter de objetos de apropriao, e nestes o que poderia ser chamado deapropriao penal: Os textos, os livros, os discursos comearam a ter realmenteautores (diferentes dos personagens mticos, diferentes das grandes figurassacralizadas e sacralizantes) na medida em que o autor podia ser punido, ou seja, namedida em que os discursos podiam ser transgressores (cf. Foucault, op. cit., 2009,p. 274-275). Esta dimenso jurdico-moral certamente no desprezvel (permitindoa Foucault definir a literatura moderna, a partir do incio do sculo XIX,precisamente pelo imperativo da transgresso), mas ela talvez subestime um pouco,na definio dos direitos do autor, a importncia material de um mercado ampliadode livros (sobretudo a partir da inveno da imprensa e da possibilidade dereproduo mecnica inumervel dos discursos na forma objetal do livro).5 Cf. Foucault, op. cit., 2009, p. 277.

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    Voltemos agora, j minimamente informados (ou esclarecidos)pela problematizao conceitual de Foucault, para o caso de Homerocomo autor. Antes de tentarmos pensar, com Foucault, o que designa onome prprio Homero como nome de autor (questo correlata dadefinio, no caso, da obra potica correspondente), caberia indagarprimeiramente se {Omhro" (Homerus em latim, Homero emportugus), em grego, um nome prprio ordinrio, e se no, ou seja:se for um nome convencional forjado, qual poderia ser o seu sentido.

    Mas, antes mesmo disso, poderamos pensar que o nome{Omhro" por exemplo, enquanto o do autor da Ilada e da Odisseia talvez nem sempre tenha sido associado a esses dois poemas e quenem por isso eles j no existissem ou estivessem sendo gestados. Ahiptese de uma obra literria (e, poderamos dizer, de uma obra-prima)sem um autor designado por um nome prprio pode parecer absurda eescandalosa aos hbitos de leitura contemporneos, para os quais segundo Foucault o anonimato literrio no suportvel (...); ou saceitvel na qualidade de enigma, mas no para os hbitos de (diramospensando no caso grego arcaico e clssico) audio inteligente em umapoca remota (houve um tempo) em que segundo o mesmoFoucault esses textos que hoje chamaramos de literrios (narrativas,contos, epopeias, tragdias, comdias) eram aceitos, postos em circulao,valorizados sem que fosse colocada a questo do seu autor; e o anonimatono constitua dificuldade, sua Antiguidade, verdadeira ou suposta, erapara eles garantia suficiente. Se retomarmos agora (com um poucomais de especificidade) a questo da autoria em Homero, lembraremosque Martin L. West, no artigo The invention of Homer,6 sugereprimeiramente que esta autoria para a Ilada e a Odisseia datvel apenasa partir de 520 a.C., quando a sua recitao integral (e apenas dos doispoemas) foi instituda por Hiparco como um evento importante dasGrandes Panateneias em Atenas. Ou seja: a partir do sculo VIII ou VIIa.C., poca do acabamento da composio, at esta data provvel dainstituio de uma atribuio de autoria, algo como um sculo e meiose passaria sem nenhuma prova de que algum fosse considerado seuautor.7 Mas como diz West contextualizando minimamente namaioria das literaturas antigas, ao menos em suas fases mais arcaicas, oanonimato ou a regra ou, ao menos, um lugar-comum. No temos

    6 Cf. West, M. L. The invention of Homer. Classical Quarterly. London, v. XLIX, n. 2,p. 364-382, 1999.7 Cf. West, op. cit., 1999, p. 364.

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    ideia de quem escreveu a maioria dos livros do Antigo Testamento, comexceo dos Profetas. No temos nomes de autores para a maioria dapica babilnica, ou para as obras da literatura hitita ou ugartica, oupara o Mahabharata, ou para o Beowulf, ou o Nibelungenlied, ou os poemasdo Elder Edda.8 Ao que, escolhendo um exemplo caro tanto a Foucaultquanto a Borges, acrescentaramos tambm uma obra monumental (eepisdica) como As mil e uma noites.

    hegemonia deste modo contemporneo de leitura (sempreansiosamente caa do autor de uma obra ou discurso) Foucaultresponde, na concluso de sua conferncia, com a seguinte e instrutivafantasia: Pode-se imaginar uma cultura em que os discursos circulasseme fossem aceitos sem que a funo autor jamais aparecesse. Todos osdiscursos, sejam quais forem seu status, sua forma, seu valor e seja qualfor o tratamento que se d a eles, se desenvolveriam no anonimato domurmrio. qual se poderia associar esta outra, mais explicitamentefantstica (mas igualmente reveladora), de Jorge Luis Borges ao concebero universo de Tln: Nos hbitos literrios tambm todo-poderosa aideia de um sujeito nico. raro que os livros estejam assinados. Noexiste o conceito de plgio: estabeleceu-se que todas as obras so obrade um nico autor, que intemporal e annimo.9

    Mas, antes tambm de entrarmos na questo do nome prprio{Omhro" (Homero), caberia lembrar outro fato fundamental:diferentemente de outros nomes de autor na poesia grega arcaica (comoos de Hesodo, Safo, Slon ou Tegnis), que aparecem no prprio textodos poemas como designando a personagem do autor (o mais das vezesna terceira pessoa) como uma espcie de selo (ou sphrgis) de garantia, onome {Omhro" jamais aparece, por exemplo, na Ilada e na Odisseia (oumesmo nos chamados Hinos homricos), assim como a supor umaidentidade entre o narrador annimo e o autor destes dois poemas (oque, como o exemplo mais recente do narrador de la recherche dutemps perdu de Marcel Proust nos adverte, no um dado to bvio) nada sabemos em particular (absolutamente nenhum dado biogrfico)do seu narrador objetivo e impessoal (e que jamais se nomeia), seno desua relao com a Mousa (Musa), divindade invocada em cada promiocomo uma instncia religiosa de autorizao do discurso, e quepoderamos interpretar a partir da sugesto por Marcel Detienne, no

    8 Cf. West, op. cit., 1999, p. 365.9 Cf. Borges, J. L. Tln, Uqbar, Orbis Tertius. In: ______. Fices. Trad. CarlosNejar. In: ______. Obras completas I. So Paulo: Globo, 1998, p. 484.

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    segundo captulo de Les matres de vrit, de leitura do nome comummousa como palavra cantada ou palavra ritmada10 como adivinizao da prpria arte de compor ritmando palavras, ou seja: deuma tradio de aedos ou cantores que exerce anonimamente sua arteatravs de geraes. Mas ainda no caso dos poetas gregos arcaicoscujos nomes e alguns dados da histria pessoal aparecem nos prpriospoemas (e de cuja existncia histrica seria uma temeridade duvidar,mesmo que os testemunhos biogrficos sejam lendrios) parece,segundo a fecunda proposio de Foucault, mais adequado considerar onome de autor como a designao de uma certa viso de mundo e estilode composio presentes em tais ou tais poemas, do que como oindivduo histrico (retravel o mais das vezes a partir de elementospresentes nos prprios poemas) que os teria composto.11

    Aps estas primeiras observaes, que ajudam a situar melhor(ainda que brevemente) a questo da autoria em Homero, voltemos nossa questo inicial sobre o nome prprio {Omhro" (Homero) e,em seguida, da sua designao de (ou correspondncia a) um conjuntode composies ou poemas, ou seja: a sua obra. Comecemos, ento,pela questo do nome, apresentando duas hipteses (do ltimo quartodo sculo XX) de dois grandes estudiosos de poesia grega arcaica (cujosmtodos e pontos de vista, alis, no coincidem): a de Martin L. Westno artigo j citado The invention of Homer12 e a de Gregory Nagy nosuplemento The name of Homer ao captulo 17 do livro The best ofthe Achaeans.13

    West, em seu artigo citado, comea observando que {Omhro" no um nome grego ordinrio ( {Omhro" is not a regular Greek name)e que nenhuma outra pessoa assim chamada conhecida antes da poca

    10 Cf. Detienne, M. II: La mmoire du pote. In: ______. Les matres de vrit dans laGrce archaque. Paris: Franois Maspero, 1967, p. 10-11.11 Para uma breve viso de conjunto da questo do autor na Grcia arcaica e clssica(incluindo a historiografia) ver o artigo de Claude Calame Identits dauteur lexemple de la Grce classique: signatures, nonciations et citations no livro jcitado Identits dauteur dans lAntiquit et la tradition europenne (cf. Calame, C.; Chartier,R. Identits dauteur lexemple de la Grce classique: signatures, nonciations etcitations. In: __________ (Org.). Identits dauteur dans lAntiquit et la tradition europenne.Grenoble: Jrme Millon, 2004b, p. 11-39).12 Cf. West, op. cit., 1999, p. 364-382.13 Cf. Nagy, G. Supplement (Chapter 17): the name of Homer. In: ______. The bestof the Achaeans. Baltimore: Johns Hopkins University Press, 1979, p. 297-300.

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    helenstica,14 lembrando, em seguida, que para os antigos [este nome]sugeria o sentido de refm (de o{mhra, normalmente um neutro plural),e havia vrias estrias explicando como ele passou a ser assim chamadoaps ter sido dado como um refm por uma ou outra cidade. Masno se pode acreditar que algum receberia o nome Refm por estaou alguma outra razo, e de todo modo a formao masculina (do nome) linguisticamente suspeita. foro, o historiador de Kme, que queriaque Homero fosse um cimeano, alegou que o{mhro" era uma palavracimeana para cego, e que Homero foi nomeado assim por esta razo.Mas no h prova que sustente a existncia de uma tal palavra; e ainda,enquanto Cego pode servir como um cognome, como no caso deAppius Claudius Caecus (nascido Crassus) ou Divdumo" oJ tuflov", ningumo recebeu como um nome autossuficiente.15 O passo seguinte de West(para a recuperao do sentido do nome) considerar a antiga corporaode rapsodos que chamavam a si mesmos de Homerdai e que so pelaprimeira vez mencionados na literatura existente por Pndaro naSegunda Nemeia, [que] os descreve como os cantores de versoscosturados, rJaptwn ejpevwn ajoidoiv, o que claramente uma parfrasede rJaywidoiv.16 No comentrio a este nome, um escoliasta de Pndaro dizque ele era o nome dado antigamente aos membros da famlia de Homero(...), mas depois ele foi dado tambm aos rapsodos, que no mais traavamsua descendncia a partir de Homero. Particular-mente proeminente(entre eles) era Cineto (Knaithos) e sua escola, que, dizem, comps muitosversos e os inseriu na obra de Homero.17 O exemplo ento citado o doHino homrico a Apolo, no qual o narrador se apresenta como um homemcego, (que) habita a rochosa Quios,/ e cujas canes, todas elas, se distinguirono futuro.18 (v. 172-173).

    West sugere ento duas possibilidades plausveis para a relao entreos nomes Homerdai e Hmeros: 1) Houve um dia um poeta chamadoHomero, e os Homerdai foram nomeados a partir dele e 2) No haviaum Homero original, os Homerdai no foram nomeados a partir de umapessoa (...), mas inventaram um Homero como seu ancestral ou fundador.19

    14 Cf. West, op. cit., 1999, p. 366.15 Cf. West, op. cit., 1999, p. 366-367.16 Cf. West, op. cit., 1999, p. 367.17 Cf. West, op. cit., 1999, p. 368.18 Hino homrico a Apolo, v. 172-173. In: West, M. L. (Ed. e trad.). Greek epic fragments.Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 2003.19 Cf. West, op. cit., 1999, p. 373.

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    Mas, aduzindo em seguida20 que em nenhum perodo histrico uma famliaportou este nome e que os nomes gregos em -ivdai eram caractersticospara grupos profissionais (como a corporao mdica dos Asclepadesem Cs, que reivindicavam descendncia de Asclpio, ou em Creta oscantores chamados Ametordai, que eram supostos descender de Amtor, oinventor do tipo de cano de amor que eles cantavam), West acaba elegendoa segunda opo como a nica plausvel, o que todavia ainda deixa inexplicadosos dois nomes. Para a questo do sentido do radical oJmhr- em grego,West aps sugerir o sentido bsico (a partir das razes oJm- + ajr-) de ajustarjunto, unir-se (por exemplo, as Musas na Teogonia, v. 39, cantam paraZeus fwnhi oJmhrevousai, com as vozes em unssono) e descart-locomo um ideal possvel para cantores que recitavam Homero no emcoro, mas individualmente21 ir se apoiar em Marcello Durante quelembra a existncia de um bosque sagrado JOmavrion perto de Hlice naAcaia, dedicado a Zeu" JOmavrio", e onde a Confederao acaia mantinhasuas assembleias comuns. O nome, ele mesmo, significa Praa daUnio; na poca romana ele foi substitudo pelo mais perspcuoJOmaguvrion, o lugar da oJmhvguri" ou panhvguri". A assembleia de todoo povo para um festival comum em um centro (...) era o lugar naturalpara performances de rapsodos e competies entre eles, como ilustrado pelo festival paninico de Delos, e posteriormente pelasPanateneias em Atenas.22 A partir desta instituio festiva, os poetas(ou cantores) teriam passado a se chamar de *oJmavrioi, ou coletivamenteJOmarivdai, em forma jnica JOmhrivdai. Analogamente, o nome dolendrio poeta (ou aedo) Thamyris ou Thamyras est relacionado palavraelica arcaica qavmuri" que significa assembleia, ajuntamento do povo.23

    Gregory Nagy, para quem a partir das pesquisas de Parry eLord sobre a composio formular homrica no modo da oralidade ahiptese de uma longa tradio potica mais plausvel do que a de umindivduo criador, sugere uma leitura do nome Hme ros como nomeconvencional indicando uma concepo arcaica do poeta e de sua funo.Hm-eros, nome construdo a partir da raiz verbal *ar- como em ar-ar-sko,ajustar, encaixar, designaria aquele que ajusta [o canto] em conjunto.24

    20 Cf. West, op. cit., 1999, p. 374.21 Cf. West, op. cit., 1999, p. 374-375.22 Cf. West, op. cit., 1999, p. 375.23 Cf. West, op. cit., 1999, p. 375-376.24 Cf. Nagy, op. cit., 1979, p. 297-298.

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    Nagy lembra tambm que Rdiger Schmitt reuniu um materialmostrando que a raiz indo-europeia *tek(s)- (cujo sentido tambm ode ajustar, encaixar) era empregada tradicionalmente para indicar aatividade de um carpinteiro (ou, em particular, de um construtor decarros) e tambm metaforicamente a atividade de um poeta: assim comoum construtor de carros ajusta em conjunto o carro que ele fabrica,assim tambm o poeta ajusta em conjunto o seu poema ou canto.25

    Voltando ao dossi grego da raiz *ar-, Nagy lembra que nos textos em linearB a palavra para roda de carro a-mo = hrmo, por sua etimologia um nomeabstrato (ajustamento), derivado da raiz verbal *ar- como em ar-ar-sko,ajustar, encaixar,26 e que em Ilada V, 59-60 aparece o nome homricoHarmondes, filho de Hrmon (raiz *ar-), patronmico de um Tktn,Carpinteiro (raiz *tek[s]-). O sentido tcnico de Harmondes paraleloao de harmone, juntura (no trabalho da madeira: por exemplo OdisseiaV, 248), mas esta ltima palavra tem tambm o sentido social de acordo(p. ex., Ilada XXII, 255) assim como tambm um sentido musicalcorrespondendo aproximativamente nossa noo de harmonia (p. ex.,Sfocles fr. 244 Pearson).27 Nagy conclui dizendo que a raiz *ar- emHmeros denota tradicionalmente a atividade de um poeta assim como ade um carpinteiro, e este duplo valor semntico corresponde estritamente tradio indo-europeia, que consiste em comparar a msica/ poesiacom a carpintaria, por meio da raiz *tek(s)-.28 Curiosamente, comolembra Nagy em uma nota (13n.1), enquanto o grego tem o nome tkhne(arte) associvel raiz verbal *tek(s)- e o latim o nome ars associvel raiz verbal *ar-, o grego tem o verbo ar-ar-sko derivado da raiz *ar-,enquanto o latim tem o verbo texo (construir no latim arcaico, e tecerno latim mais recente) associado raiz *tek(s)-.29

    Vemos, assim, que estas duas hipteses para o nome de autor Hmerostendem a desconsider-lo como um nome prprio designando umindivduo, e apontam antes para um sentido convencional em relao coma prpria funo do poeta: ou aquele que designado a partir do local dereunio (e de festividade) em que os cantores faziam suas performances edisputavam concursos (hiptese de West), ou aquele que designado como

    25 Cf. Nagy, op. cit., 1979, p. 297-298.26 Cf. Nagy, op. cit., 1979, p. 298.27 Cf. Nagy, op. cit., 1979, p. 299.28 Cf. Nagy, op. cit., 1979, p. 300.29 Cf. Nagy, op. cit., 1979, p. 300.

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    o que ajusta [o canto] em conjunto, segundo uma tradio indo-europeiaque aproximava a arte do poeta do carpinteiro (hiptese de Nagy).30

    Resta, enfim, perguntar rapidamente (questo complementardecisiva) a quais poemas o nome de autor Homero era (ou pode ser)associado. Antecipamos aqui o que a instituio de Hiparco nas GrandesPanateneias parece indicar a partir de ento: apenas a Ilada e a Odisseia.Mas antes e mesmo depois disso, uma srie de antigos poemas picoscomo a Tebaida ou a Focaida, assim como os poemas do Ciclo pico Troiano

    30 Que os prprios gregos, no entanto, tenham considerado Hmeros um nomeprprio designando um indivduo histrico (como se necessitassem da figurasimblica de um fundador para a sua primeira grande tradio potica, ou de umautor para narrativas modelares como a Ilada e a Odisseia) o que atesta a tradiomtico-biogrfica mais tardia das vrias Vidas de Homero. No consideramos, porm,que estas narrativas biogrficas possam ter alguma incidncia histrica efetiva sobrea questo da autoria, mesmo que elas no deixem de ser em si (enquanto novosmitos que contam de algum modo a histria da difuso de Homero na Grcia) umevento histrico. Pois, tal como sugere Nagy em Lade pique en auteur: la traditiondes Vies dHomre [cf. Nagy, G. Lade pique en auteur: la tradition des ViesdHomre. In: Calame, C.; Chartier, R. (Org.). Identits dauteur dans lAntiquit et latradition europenne. Grenoble: Jrme Millon, 2004, p. 41-67], (...) estas narrativasso mitos e no eventos histricos relativos a Homero. No entanto, o fato de quefalemos de mitos no significa que as Vidas estejam desprovidas de realidade histrica.Apesar de os diferentes Homeros representados nas Vidas serem sem dvidaconstrues mticas, a criao do mito em torno de Homero pode ser consideradaem si como um evento histrico. As afirmaes sobre Homero que se encontram nasVidas podem ser consideradas como uma prova dos diversos modos de apropriaoda poesia homrica por diferentes centros culturais e polticos por toda a parteatravs do mundo grego antigo (cf. Nagy, op. cit., 2004, p. 43-44). Tendo em vista ombito limitado (mas j vastssimo) do esboo que este meu artigo, basta aquiassinalar uma primeira posio quanto a este material (que, portanto, no ser aquiobjeto de nenhum comentrio mais especfico), material consultvel no volume Vdas Homeri Opera da Oxford [cf. Allen, T. (Org.). IV. Vitae. In: ______. Homeri Operavol. V. Oxford: University Press, 1986a, p. 184-268] cuja bibliografia hoje tambmno pequena e que exigiria a abertura de um outro dossi. Que me seja permitidoindicar (para esta questo) ao menos o segundo captulo (Homer) do j conhecidolivro de Mary R. Lefkowitz, The lives of the Greek poets (cf. Lefkowitz, M. R. 2. Homer.In: ______. The lives of the Greek poets. London: Duckworth, 1981, p. 12-24), e doisteis artigos de Jaume Portuls, De Vita Homeri (cf. Portuls, J. De Vita Homeri.Mtis Revue danthropologie du monde grec ancien. Paris, vol. IX-X, p. 351-357, 1994/ 1995)e Gnalogies dHomre [cf. Portuls, J. Gnalogies dHomre. In: Auger, D.;Sad, S. (Org.). Gnalogies mythiques. Nanterre: Centre de Recherches Mythologiquesde Paris X, 1998, p. 327-336].

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    (que Aristteles na Potica j no considerava como de Homero),31 eramconsiderados como podendo ser tambm de Homero, e o prprioAristteles no famoso captulo IV da Potica considera o Margtes, umpoema cmico pardico de que nos restaram escassos fragmentos, comosendo de Homero (havendo ainda a questo dos Hinos homricos quejamais foram atribudos a um outro autor). Se pensarmos nos critriosobjetivos e internos obra sugeridos por Foucault como modo deatribuio de autoria, seramos levados a pensar que do ponto de vistado nvel de excelncia, da unidade de estilo e viso de mundo (ou daconstruo formular e dos temas) a Ilada e a Odisseia (grandes e elevadasnarrativas de heris construdas em hexmetros dactlicos) se distinguemnitidamente como um conjunto de outros poemas tambm atribudosa Homero.

    Poderamos comear dizendo que poemas picos como a Focaidaou a Tebaida (e os Epgonos) no so afins Ilada e Odisseia simplesmentepor no tratarem da gesta da guerra de Troia; assim como poemascmicos como o Margtes ou a Batalha dos sapos e dos ratos (Batracomiomaquia)diferem elementarmente da Ilada e da Odisseia por visarem ao riso,algo que mesmo com a presena de elementos cmicos em episdiospontuais (como a cano do adultrio de Afrodite e Ares, ou o pardicoduelo de mendigos na Odisseia) o conjunto da narrativa da Ilada ou oda Odisseia, com seu tom elevado e mais prximo da tragdia, jamaispretende causar. Quanto aos Hinos homricos, como o prprio nomehino o indica bem, a diferena fundamental em relao Ilada e Odisseia o fato de serem cantos menores dedicados a uma divindade enarrando episdios que definem seu campo de ao e modo de ser, eno grandes narrativas em que as aes dos deuses s se justificam porcontraste com as dos heris mortais, que so os verdadeirosprotagonistas.

    31 Ao opor, no captulo XXIII da Potica (1459a-1459b), a unidade da ao em Homero(neste contexto apenas a Ilada e a Odisseia,) ao carter episdico das composies doCiclo diferena fundamental de estrutura narrativa entre estes dois conjuntos Aristteles (na traduo de Eudoro de Souza) diz: Os outros poetas, todavia,compuseram seus poemas, ou acerca de uma pessoa, ou de uma poca, ou de umaao com muitas partes, como, por exemplo, o autor dos Cantos Cprios e daIlada Pequena (cf. Aristteles. Potica. Traduo, introduo e comentrios deEudoro de Souza. Lisboa: Imprensa Nacional/ Casa da Moeda, 2000, p. 139); (parao texto grego, cf. Aristotelis. De arte poetica liber. Recognovit Rudolfus Kassel. Oxford:University Press, 1965, p. 39).

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    Quanto s diferenas da Ilada e da Odisseia em relao aos poemasdo Ciclo pico Troiano (ou seja e em ordem: as Cprias, a Etipida, a PequenaIlada, o Saque de Troia, os Retornos e a Telegonia, poemas de que restaramapenas esparsos fragmentos e os resumos de Proclo, e que narrariamem ordem cronolgica os episdios da gesta troiana no presentesdiretamente na Ilada e na Odisseia),32 j atribudos pelos comentadoresantigos desde Aristarco aos poetas mais novos ou neteroi (ou ainda apoetas individuais nomeados por exemplo, por Proclo como Arctinode Mileto, Lesques de Mitilene, Agias de Trezn e Eugmon de Cirene),o conhecido artigo The epic cycle and the uniqueness of Homer deJasper Griffin33 pode nos sugerir uma pista, ajudando a precisar melhora singularidade da viso de mundo e do estilo homricos.

    32 Para um primeiro acesso a este material podem ser consultados: (para o textogrego) o j citado volume V das Homeri Opera da Oxford [cf. Allen, T. (Org.). II.Cyclus. In: ______. Homeri Opera vol. V. Oxford: University Press, 1986b, p. 93-151]; (para o texto grego e uma traduo em lngua inglesa) a edio mais recente deMartin L. West, para a Loeb classical library, dos Greek epic fragments [cf. West, M. L. (Ed.e trad.). Greek epic fragments. Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 2003]; e(para uma traduo espanhola) a edio de Alberto Bernab-Pajares, para a Bibliotecaclsica Gredos, dos Fragmentos de pica griega arcaica (Bernab-Pajares, A. (Org. e trad.).Fragmentos de pica griega arcaica. Madrid: Gredos, 1979), sendo tambm consultveise utilssimas as introdues, notas e bibliografias tanto da edio de Alberto Bernab-Pajares quanto da edio de Martin L. West. Quanto s complexas relaes domaterial mtico dos poemas do Ciclo com a Ilada e a Odisseia, que tambm exigiriama abertura de um outro dossi, indicaremos apenas, neste breve esboo, uma primeirae plausvel posio de que certos trechos ou episdios da Ilada e da Odisseia entrecujos exemplos mais evidentes esto a meno do juzo de Pris (ver Cprias) ou damorte de Aquiles por Pris e Apolo (ver Etipida) na Ilada, ou a estria do cavalo demadeira (ver Pequena Ilada e Saque de Troia) e as dos retornos de Nestor e Menelau(ver Retornos) na Odisseia evidenciam que ambas estavam bem informadas (e seapropriaram) desta tradio, mas a conformaram a seus propsitos narrativosprprios, ou seja e basicamente: histria da clera de Aquiles e do retorno deUlisses. Para esta questo, cuja bibliografia hoje tambm numerosa, ainda podemser muito teis obras, j de algum modo datadas, como Le cycle pique dans lcoledAristarque de Albert Severyns (cf. Severyns, A. Le cycle pique dans lcole dAristarque.Lige: Bibliothque de la Facult de Philosophie et Lettres de lUniversit deLige, 1928) e Die Quellen der Ilias de Wolfgang Kullmann (cf. Kullmann, W. DieQuellen der Ilias. Wiesbaden: Steiner, 1960).33 Cf. Griffin, J. The epic cycle and the uniqueness of Homer. The Journal of HellenicStudies. Cambridge, v. XCVII, p. 39-53, 1977.

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    Desconsiderando os comentrios estilsticos aprioristicamentepejorativos (e pouco demonstrativos) sobre a inferioridade literria dealguns fragmentos hexamtricos do Ciclo,34 concentremo-nos na crticade contedo (ou de repertrio temtico) dos fragmentos (e resumos)dos poemas do Ciclo por Griffin, apresentada introdutria egenericamente assim: O fantstico, o miraculoso e o romntico, todosexcederam no Ciclo os austeros limites aos quais a Ilada os confina.35

    Comecemos, por ser mais cmodo, pela nfase no romntico(desdobrada depois como a atitude relativa s mulheres e crianas) naqual alguma diferena (tal como apresentada por Griffin) de fatonotvel: jamais encontramos na Ilada os amores de Aquiles por Helena,a amazona Pentesileia ou a troiana Polxena (e mesmo seu amor a porBriseida se confunde com o fato de que ela seu gras, ou seja: sua partede honra dos despojos de guerra), assim como na Odisseia Ulisses, apsseu retorno taca, no desposa Caldica, a rainha dos Tesprotos (e noconcebe com ela um filho, Polpetes) ou mesmo chega a se apaixonarpelas ninfas Circe e Calipso (com as quais teria tido filhos: Telgono e ainda grio e Latino, segundo a Teogonia de Hesodo com Circe;Naustoo e Nausnoo ainda segundo a Teogonia de Hesodo comCalipso); e Telmaco no desposa Policasta, a filha de Nestor, ouNauscaa; ou ainda, rocambolescamente (como na Telegonia), aps termatado (sem o saber) seu pai Ulisses, Telgono desposa Penlope,enquanto Telmaco desposa Circe. Quanto Odisseia poderamos dizerque no s a proliferao de filhos de Ulisses parece contradizer o fatode que a linhagem de Laertes, Ulisses e Telmaco composta apenasde filhos machos nicos, como tambm a de que ela parece ameaar omodelo do casamento monogmico, em que o grande nico amor deUlisses de fato o por Penlope.

    Quanto ao fantstico e miraculoso, ainda que possamos dizerque a Ilada e a Odisseia so mais sbrias do que os poemas do Ciclo, serpreciso esclarecer com mais ateno como isso se d (os primeirosexemplos do fantstico no Ciclo por Griffin, como a fabulosa viso deLinceu, as filhas de nio ou as metamorfoses de Nmesis fugindo deZeus, no sendo, pois, conclusivos), j que episdios como o combatede Aquiles com um rio (o Escamandro) ou o de seus cavalos imortaisfalando esto presentes na Ilada, assim como as viagens de retorno deUlisses ou as de Menelau na Odisseia apresentam vrios seres fantsticos

    34 Cf. Griffin, op. cit., p. 48-52.35 Cf. Griffin, op. cit., p. 40.

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    (sem que o narrador jamais indique explicitamente, como o caso dasnarrativas de Ulisses-mendigo, que elas so inventadas).36 Este material(comparvel ao dos Mrchen, ou contos de fada) , no entanto, limitadopor um cdigo moral heroico (apoiado, por sua vez, na mortalidade eenvelhecimento) que estrutura basicamente ambos os poemas, dando-lhesuma verossimilhana e um realismo mais restritos que os humanizam,quando o domnio da ao no divino ou para-humano.37 Mas Griffintem razo quando diz que esto ausentes da Ilada elementos mgicos,dos quais depende a vitria dos Aqueus, como o Palladium (imagem dadeusa Atena) troiano ou o arco e as flechas de Filoctetes, ou ainda umapretensa armadura impenetrvel (como seria a de Aquiles) ou aindauma qualquer invulnerabilidade de um heri (como a de jax na Etipida).

    E chegaramos, enfim, a um ponto decisivo (do argumento deGriffin e tambm da viso de mundo homrica): a um qualquer podersobre-humano, que possa transcender a mortalidade (e o envelhecimento),tanto a Ilada quanto a Odisseia (as nicas excees sendo o post-mortemde Menelau na Plancie Elsea, e a imortalizao de Hracles cujosimulacro , porm, visto por Ulisses no Hades na companhia deuma das Graas, a Juventude) opem a inevitabilidade da morte e odestino comum no Hades (tal como indicado pelo dilogo de Aquilescom a psykh de Ptroclo no canto XXIII da Ilada e pela descrio doHades no canto XI da Odisseia). Mesmo a descendncia dos deuses,como o lcio Sarpdon (filho de Zeus) ou Aquiles (filho de Ttis), ouainda um favorito de Zeus como Heitor, todos devem inapelavelmentemorrer (sua maior honra possvel sendo apenas um funeral grandioso),sendo fundamental para o efeito trgico final da Ilada (e para cenascomo o dilogo de Aquiles com Licon, ou o com Pramo) no s amorte de Ptroclo (que transforma a atitude de Aquiles para com os

    36 Este fato invalidaria o argumento de uma diferena radical entre o ponto de vistado narrador e os das personagens, tal como sugerido por Griffin (para poderdesconsiderar, por exemplo, as viagens maravilhosas de Ulisses na Odisseia):Aristteles salienta que Homero pe muitas coisas nas bocas de seus personagens,quando ele prprio no quer assegurar sua verdade, e isso de modo mais notvel nasestrias contadas por Odisseu na Odisseia e nas reminiscncias de Belerofontepor Glauco no canto VI da Ilada. (cf. Griffin, op. cit., p. 40).37 Como um modelo preciso e inteligente deste tipo de abordagem, ver (em traduoinglesa) o estudo j clssico de Karl Reinhardt The adventures in the Odyssey,includo na coletnea Reading the Odyssey organizada por Seth Shein [cf. Reinhardt,K. The adventures in the Odyssey. In: Shein, S. (Org.). Reading the Odyssey.Selected interpretive essays. Princeton: Princeton University Press, 1996, p. 63-132].

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    companheiros de armas) e a de Heitor (que sela antecipadamente aderrota final dos Troianos), como a certeza da morte do prprio Aquiles(que no descrita diretamente na Ilada). Semelhantemente, na Odisseia,a escolha por Ulisses de Penlope, uma mulher mortal e sujeita aoenvelhecimento, e a recusa de uma ninfa imortal e sempre jovem comoCalipso (assim como a de sua promessa de torn-lo tambm imortal eno sujeito ao envelhecimento) indicam um ntido assumir a mortalidadee o envelhecimento como condies bsicas do mundo humano.38

    Diferentemente da Ilada e da Odisseia, nos poemas do Ciclo a transcendnciadesta mortalidade bsica torna-se uma possibilidade comum: na EtipidaMmnon, aps ser morto por Aquiles, imortalizado por Zeus, e Aquiles levado por Ttis para a Ilha Branca; nas Cprias Zeus d aos Discurosa imortalidade em dias alternados (enquanto na Ilada eles dois esto mortose enterrados), e rtemis torna Ifignia imortal, aps lev-la para Turide;na Telegonia, Circe imortaliza tanto Telmaco (com quem se casa), quantoPenlope e Telgono (que tambm tornam-se um casal).39

    O que Griffin, no entanto, se esquece de dizer que, complemen-tarmente mortalidade bsica dos heris, a Ilada e a Odisseia apresentamum modo limitado e demasiado humano (ou seja: cultural apenas) deimortalizao (e que supe tambm, muito ao modo da Grcia arcaica, avalorizao moral do espao pblico): a glria (klos) dos altos feitos de umheri (e no exatamente a sua morte) que ser transmitida de mododuradouro s geraes seguintes precisamente por meio de poemas (ou

    38 Ver para esta questo a parte dedicada a Calipso por Jean-Pierre Vernant em seuensaio Figures fminines de la mort en Grce (cf. Vernant, J.-P. Figures fmininesde la mort en Grce. In: ______. Lindividu, la mort, lamour. Paris: Gallimard, 1989, p.146-152) e retomada autonomamente com o ttulo em ingls The refusal ofOdysseus na j mencionada coletnea Reading the Odyssey [cf. Vernant, J.-P. The refusalof Odysseus. In: Shein, S. (Org.). Reading the Odyssey. Selected interpretive essays. Princeton:Princeton University Press, 1996, p. 185-189].39 Griffin (cf. op. cit., p. 42-43) conclui assim a apresentao destes exemplos (retomadabasicamente por mim neste pargrafo): O significado desta diferena enorme. Paraa Ilada, a vida humana definida pela dupla inevitabilidade da velhice e da morte;para os deuses, o oposto dos homens, a imortalidade e a eterna juventude so inseparveis.Os homens devem morrer: na juventude eles devem lutar, e se eles no so mortos,eles vivem apenas para ser velhos e desamparados. Os deuses permanecem parasempre jovens (). Isso o que faz a Ilada ao mesmo tempo verdadeira e trgica,e o procedimento muito diferente do Ciclo indica atitudes profundamente diferentespara com a natureza fundamental da vida e morte humana, e consequentementepara com o herosmo humano e a relao dos homens com os deuses.

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    narrativas ritmadas) como a Ilada e a Odisseia, o que de algum modo implicaque o heri mortal passa a depender do poeta para obter alguma existnciaou ser lembrado no futuro (e que o poeta, assim, simultaneamente tambmassegura a sua demasiado humana imortalizao atravs da glria de seuspoemas).40 Se , porm, esta mortalidade bsica dos heris o que lhesconfere uma grandeza moral inalcanvel pelos deuses, seria preciso dizerainda que a possibilidade sempre presente da morte o que confere a seusaltos feitos (e no exatamente sua morte) algum valor, pois estes altosfeitos celebrados supem o ainda estar em vida.41 Teramos, assim, duasmaneiras distintas de celebrao do heri (mas ambas supondo amortalidade), segundo o contexto e o protagonista do poema: na Ilada aglria trgica de Aquiles, que, aps a briga com Agammnon (razo daclera), perde seu mais amado companheiro na guerra contra Troia e vinga-se matando seu matador (Heitor), sabendo que assim ele mesmo ir morrerno campo de batalha (e conquistar alguma imperecvel glria); na Odisseia acontinuidade da vida de Ulisses, implcita na efetivao do retorno a taca ena do reencontro com Penlope e os seus, a qual sem necessariamenteimplicar em covardia (como demonstram vrios episdios das viagens e amatana dos pretendentes) pode contar com a piedade, a prudncia e aastcia do heri para (com muito sofrimento) ser assegurada e desta maneiratornar possvel no apenas sua reintegrao como rei sua comunidade(assim como seu amor por sua mulher) mas tambm a construo acabadada intriga do prprio poema.

    Mas para algum como West, que considera como muito distintoso estilo e a viso de mundo da Ilada e os da Odisseia, seria preciso(como j o faziam alguns eruditos germnicos) designar distintamente

    40 Foucault parece de algum modo consciente deste modelo fundador e tradicional(mesmo que no o pensando segundo o padro da composio e transmisso oral),quando o reprope para invert-lo na literatura moderna ou contempornea (cf.Foucault, op. cit., 2009, p. 268-269): O segundo tema ainda mais familiar: o parentesco daescrita com a morte. Esse lao subverte um tema milenar; a narrativa, ou a epopeia dos gregos, eradestinada a perpetuar a imortalidade do heri, e se o heri aceitava morrer jovem, era porque sua vida,assim consagrada e magnificada pela morte, passava imortalidade; a narrativa recuperava estamorte aceita. (...) Esse tema da narrativa ou da escrita feitos para exorcizar a morte, nossa cultura ometamorfoseou: a escrita est atualmente ligada ao sacrifcio, ao prprio sacrifcio da vida (...). Aobra, que tinha o dever de trazer a imortalidade, recebeu agora o direito de matar, de ser assassina doseu autor. Vejam Flaubert, Proust, Kafka.41 Para uma demonstrao mais detalhada e cuidadosa desta posio, cf. meu artigoNota crtica bela morte vernantiana (Assuno, T. R. Nota crtica bela mortevernantiana. Classica. So Paulo, v. VII/ VIII, p. 53-62, 1994-1995).

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    o autor da Ilada e o autor da Odisseia, o que faria com que um dosdois poemas devesse necessariamente permanecer sem autor (no podendoele ser o mesmo Homero autor do outro poema). Que os dois poemaspossam fazer parte de uma mesma tradio (retratando no smomentos distintos da gesta de Troia, mas heris e valores antagnicoscomo Aquiles e Ulisses, sempre segundo um mesmo repertrio mtricoe formular) o que para algum como Nagy no seria nenhum problema algo que, por exemplo, a lei de Monro42 parece bem sugerir enquantouma correlao negativa consciente entre os dois, ou seja: nenhum episdio(o que no coincide com um verso ou grupo de versos) dos dois poemasjamais referido ou mencionado pelo outro, silncio que indica certa eexatamente um reconhecimento recproco de um pelo outro e umadupla estratgia que funda uma tradio narrativa comum. A autoria deHomero representaria, assim, dentro de um mesmo repertriovocabular e esquema de construo mtrica formular (assim como dentrode uma mesma viso de mundo bsica centrada na mortalidade), a tensoproblemtica e a unidade complementar entre dois poemas (que narramdois momentos distintos e sucessivos da estria da guerra de Troia) comprotagonistas, solues narrativas e valores morais opostos ou marcada-mente diferenciados, mas que seriam impensveis um sem o outro.43

    42 Pietro Pucci, na nota 3 da Introduo de Ulysse polutropos. Lectures intertextuelles del Iliade et l Odysse, informa-nos minimamente sobre esta lei: Ver DavidMonro, Homers Odyssey, Books XIII-XXIV, Oxford, 1901, p. 325: A Odisseiajamais repete ou faz referncia a qualquer incidente relatado na Ilada. Estaafirmao, que torna-se rapidamente a lei de Monro, est na origem de pesquisascomo as de Denys Page: ver The Homeric Odyssey, Oxford, 1955, onde ele tentaprovar que a Odisseia no tem conhecimento da existncia da Ilada. Uma posiomais slida expressa por Gregory Nagy, The Best of the Achaeans, Baltimore,1979, p. 21: Se a excluso fosse intencional, isso implicaria que a Odisseia mostraum certo conhecimento da Ilada pelo cuidado que ela tem em se afastar destaltima, a menos que se trate de uma questo de evoluo. Talvez fosse prprio datradio odisseica distanciar-se da tradio ilidica. Como quer que seja, a tradioda Ilada e a da Odisseia constituem uma totalidade pela distribuiocomplementar de suas narrativas (cf. Pucci, P. Introduction. In: ______. Ulyssepolutropos. Lectures intertextuelles de l Iliade et l Odysse. Traduction de JeannineRoutier-Pucci. Lille: Presses Universitaires du Septentrion, 1995, p. 35).43 Ver a posio de conjunto de Pietro Pucci: O ndice mais significativo da ambivalnciaque atravessa a economia da Odisseia seu silncio a respeito da Ilada. Emnumerosas retomadas, a Odisseia indica incontestavelmente sua vontade de ignorara Ilada e a tradio ilidica. Isso depe a meu ver a favor da hiptese segundo a quala Odisseia conhecia a Ilada. (...) claro que o texto da Ilada e o da Odisseia se

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    pressupem um ao outro; eles se avizinham e se limitam mutuamente de tal modoque um, de alguma maneira, escreve o outro. Esta complementaridade no significapor isso que os dois poemas constituem uma unidade lgica e harmoniosa. Pelocontrrio. A Odisseia, fingindo ignorar a Ilada e vice versa , trai uma relaofrancamente polmica com esta ltima. Assim, os dois heris, Aquiles e Ulisses,entretm de uma obra outra um dilogo intertextual em que um pretende sersurdo ao outro, cada um incarnando em seu poema um modo de ser nico,radicalmente oposto ao do outro (cf. Pucci, op. cit., 1995, p. 35-36).

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