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05/12/11 Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
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Acórdãos TRP Acórdão do Tribunal da Relação do PortoProcesso: 0633334
Nº Convencional: JTRP00039786
Relator: JOSÉ FERRAZ
Descritores: DIREITOS DE AUTOR
USO
AUTORIZAÇÃO
INDEMNIZAÇÃO
Nº do Documento: RP200611230633334Data do Acordão: 23-11-2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA.
Indicações Eventuais: LIVRO 694 - FLS. 79.
Área Temática: .
Sumário: I- O objecto do direito de autor é a obra, pelo que à criaçãoimporta a sua exteriorização mediante (qualquer) forma que
seja possível apreender pelos sentidos.
II- O registo não tem carácter constitutivo desse direito.III- O direito é reconhecido e tutelado com a criação da obra.
IV- O autor tem o direito exclusivo de fruir e utilizar a obra e de
autorizar a sua fruição e exploração económica por terceiro.
V- A autorização da utilização da obra, com exclusividade ou
não, não implica a transmissão do direito sobre ela, que
permanece na esfera jurídica do seu titular.VI- Para a autorização, a forma escrita constitui formalidade ad
probationem (e não de modo absoluto), constitui uma exigênciaprobatória, daí que a sua falta não determine a nulidade da
autorização, mas transfira para o usuário o ónus probandi daautorização(10) bem como do seu âmbito e da forma de
utilização da obra.
VII- A inobservância da forma escrita não determina a nulidade
do contrato que permite a autorização da exploração
económica da obra por quem não é o seu criador.
VIII- A violação ilícita do direito de autor e direitos conexos faz
incorrer o agente no dever de indemnizar.
IX- È ilícita a utilização de uma obra protegida pelo direito de
autor não autorizada pelo titular do direito.Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação do Porto
I – B……….., residente na ………., ……., entrada …., ….º direito,
Gondomar e C………, Limitada, com sede na Rua ……, nº ….
Gondomar vieram propor contra D………, Limitada, com sede
na R. ……., ….. Porto, acção declarativa ordinária, alegando que
a primeira Autora criou uma nova peça de mobiliário a que
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atribuiu a referência de cadeira E……… e autorizou a segundaAutora, de que aquela é sócia e gerente, a fabricar e
comercializar essa nova peça de mobiliário.
No exercício da sua actividade, a segunda Autora fabricou e
vendeu à Ré, de Janeiro a Julho de 2002, 14 cadeirões E………,
não tendo a partir dessa data, esta última efectuado qualquer
outra encomenda à mesma Autora.
Que a primeira Autora teve conhecimento de que a Ré, não
obstante não ter adquirido mais nenhum cadeirão E……..,
continuava a dar orçamentos e a vender o aludido cadeirão,
não consultando para o efeito a segunda Autora.
A conduta da Ré viola os direitos de autor da 1 ª Autora e deexploração para fins comerciais da 2 ª Autora, incorrendo na
obrigação de indemnização, incluindo quanto aquela, por
danos não patrimoniais.
Terminam a pedir a condenação da Ré a :a) reconhecer o direito de autor e do exclusivo decomercialização dos cadeirões em causa com a referência
“E……….” e quaisquer outros produtos constantes do“Catálogo C1……….”;
b) retirar do mercado os referidos cadeirões, mesmo que jácolocados em distribuidores ou revendedores e
c) indemnizar as AA pelos danos causados, pelo valor de 5.000€ à 1ª Autora a titulo de danos não patrimoniais e pelo valor de
15.000 € à 2ª Autora pelos lucros cessantes, acrescidos dejuros de mora que se vencerem desde a citação.
Em contestação, a Ré impugna a factualidade alegada pelas
AA.Mais diz que o pedido de registo do cadeirão “E………..” é de12/12/2002, o que foi deferido e, 05/03/2004, e as relações
comerciais entre AA e Ré reportam-se a período anterior.A acção tem subjacente a si o facto de, na sequência de
reclamação da Ré por defeito de mobília comprada à segunda,na sequência do que a Ré cortou relações comerciais com as
AA por estas terem obstado á substituição desse mobiliário poroutro, e que os cadeirões de ripas por si comercializados não
eram os cadeirões E………. concebidos e comercializadospelas AA, antes Cadeirões de ripas tendo como referência ocatálogo C2………….
Nem utilizou cadeirões E…….. para fins publicitários como daautoria das AA.
Existem muitos cadeirões iguais ou idênticos aos das AA àvenda no mercado, os quais são comercializados por outras
empresas contra quem as AA não reagiram e que os cadeirõescomercializados pela Ré foram comprados noutra empresa e
não foram fabricados a feitio, a pedido da ré.Só quando a ré abriu um aloja em Matosinhos, próximo de uma
loja da 2ª autora, é que as AA decidiram perseguir a Ré pela via
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judicial, por não conseguirem concorrer comercialmente comaesta.
Pede a improcedência da acção e, em reconvenção, pede acondenação solidária das AA no pagamento à Ré da quantia de
6.000 €, a título de danos não patrimoniais, devidos pela máimagem comercial produzida pelo incidente alegado relativo à
reclamação de defeitos e pela presente acção, nomeadamentedo procedimento cautelar que é já do conhecimento de alguns
os fornecedores e empresas do sector, bem como já doconhecimento de vendedores de mobiliário.
Na réplica as AA. mantiveram a posição afirmada na petição epedem a improcedência da reconvenção.
Proferido despacho saneador, julgando a instância regular, foi
seleccionada a matéria de facto, com a organização da baseinstrutória, que não foi objecto de reclamação.
Realizada a audiência de julgamento, e decidida a matéria defacto provada e não provada, foi proferida sentença que,
julgando parcialmente procedente a acção e improcedente areconvenção:
a) condenou a Ré a reconhecer o direito de autor e doexclusivo de comercialização dos cadeirões em causa com areferência “E………” e quaisquer outros produtos constantes
do “Catálogo C1…………”;b) condenou a Ré a retirar do mercado os referidos cadeirões
de ripas, mesmo que já colocados em distribuidores ourevendedores;
c) condenou a Ré a pagar à 2ª Autora, pelos danos causados atitulo de frustração dos ganhos, a quantia de € 2.475,00,acrescidos de juros de mora que se vencerem após a citação e
até integral pagamento;
d) absolveu a Ré dos demais pedidos das AA e
e) absolveu as AA do pedido reconvencional.
II - Discordado do sentenciado recorre a ré.
Encerra as suas alegações a concluir:
1ª O presente recurso vem interposto da douta sentença de fls.
153 a 168 na parte em que condenou a ora Recorrente nospedidos constantes das alíneas a) e c);
2ª Tal condenação prevista na alínea a), quanto ao
reconhecimento do direito de autor, terá de se reportar á data a
partir da qual o mesmo se encontra legalmente reconhecido,pois pedido de averbamento da obra em causa, cadeirão
“E………”, aconteceu em 12/12/2002, vide certidão de fls.
116/117;3ª Não se apurou a data em que foi deferido esse pedido de
averbamento não se não se apurou uma data precisa como
data constitutiva quanto a esse direito de autor reconhecidos
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às Recorridas;
4ª Não se provou, nem consta dos autos, qualquer interpelação
das Autoras dirigida à Ré a comunicar, após o termo dasrelações comerciais em Julho de 2002, que essa peça de
mobiliário constante do “Catálogo de C1………..” se encontrava
registada a seu favor, com consequente impedimento legal dasua comercialização sem autorização destas;
5ª A situação da Ré é bem diferente de doutras empresas
também visadas pelas Autoras, pois essas empresas foram
interpeladas por escrito que a peça de mobiliário designada porcadeirão “E………..” se encontra protegida por lei;
6ª A Recorrente considera que a sentença em crise deveria ter
considerado uma data a partir da qual a Ré é condenada a
reconhecer o direito de autor e de exclusividade das Autorasquanto à comercialização do cadeirão com a referência
“E………..”, data essa nunca anterior a 12/12/2002;
7ª Pois só com o registo da obra há protecção legal da mesma;8ª Da autorização dada pela 1ª Autora à 2ª Autora deve constar
obrigatória e especificamente a forma autorizada da
divulgação, publicação e utilização, bem como as respectivas
condições de tempo, lugar e preço, requisitos que não constamda referida autorização escrita, pelo que tal autorização viola
norma expressa e como tal não pode produzir efeitos perante
terceiros, caso da recorrente;
9ª Da autorização constante dos autos não constaobrigatoriamente esses elementos indicados na conclusão
anterior previstos no artigo 41º do CDA., assim sendo ineficaz a
referida autorização perante a recorrente;10ª Caso se considere, perante a mesma prova documental,
que se trata antes de uma transmissão de um direito de
conteúdo patrimonial da 1ª para a 2ª autora, a mesma
transmissão é nula, por omissão de uma formalidade, ou seja oreconhecimento presencial das assinaturas, nos termos do
artigo 43º do CDA., nulidade que se invoca;
11ª A Recorrente não se conforma por isso na sua condenação
no montante a indemnização prevista na alínea c), ou sejarejeita que da sua conduta que da sua conduta tenham
resultado quaisquer danos para a 2ª Autora, com consequente
condenação no pagamento da quantia de € 2.475,00, acrescidade juros de mora;
12ª Não se provou que:
a)A 1ª Autora após ter conhecimento de uma notícia publicada
num jornal trimestral, se deslocou à loja da Ré, tendo avisadouma gerente desta de que não podiam mandar fazer nem
comercializar os cadeirões E………..;
b) A Recorrente mande fabricar os cadeirões em outro local que
não à Autora;c) Não obstante a providência cautelar se encontre na loja da
Recorrente o cadeirão em causa, em madeira clara;
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d) A Recorrente tenha decorado a montra da referida loja comos ditos cadeirões;
e) A Recorrente tenha provocado uma frustração de ganhos à
2ª Autora, mas apenas que após o corte de relações comerciais
vendeu nove cadeirões semelhantes aos das Autoras;13ª A Recorrente considera que não praticou qualquer facto
ilícito que consubstancie a lesão de qualquer direito de
natureza patrimonial da 2ª Autora, reconhecido pelo Código do
Direito de Autor;14ª A Recorrente não sabia, por não lhes ter sido comunicado
pelas Autoras, que o cadeirão designado por cadeirão
“E………” estava protegido por lei e que se encontravaregistado em nome destas, vide depoimento das testemunhas
acima indicadas e aqui dados por integrados e reproduzidos;
15ª A Recorrente limitou-se a comercializar cadeirões
existentes no mercado fabricados por outras empresassemelhantes aos cadeirões das Autoras;
16ª Só com a notificação da decisão da providência cautelar é
que a Recorrente ficou a saber que se trata de obra legalmente
protegida;17ª A Recorrente desconhecida a existência do direito de autor
a favor das Autoras quanto ao cadeirão “E………” enquanto
mantiveram relações comerciais até Julho de 2002 e depoisdessa data nunca as Autoras a aviaram de que essa obra se
encontrava registada a seu favor e que estava proibida de a
comercializar sem a sua autorização;
18ª Factos que impunham decisão diversa da condenação daalínea a) da sentença:
a)A certidão junta a fls. 116/117 e documentos juntos com a
providência cautelar sob o doc. 6, fls. 1 e 3 (pedido deaverbamento à obra com o registo nº 1361, título “Catálogo de
C1………”) e docº 7 e doº 8;
b) Depoimentos do legal representante da Ré F……….. e das
testemunhas G……….., H………. e I……….;19ª Dos documentos acima indicados e dos depoimentos das
testemunhas da recorrente e do depoimento da sua legal
Representante, impunha-se, no modesto entendimento da
Recorrente, uma decisão diferente, ou seja impunha-se aabsolvição total quanto ao pedido de indemnização formulado
pela 2ª Autora;
20ª A conduta da Recorrente não é ilícita, nem é culposa, peloque não estão preenchidos os pressupostos da
responsabilidade civil extra contratual;
21ª E não havendo culpa por parte da Recorrente não há lugar
à condenação no pagamento de qualquer indemnização a favors 2ª Autora;
22ª A sentença recorrida não violou, entre outros, os artigos
41º, 43º, 44º e 214, todos do Código de Direito de Autor e artigo
487º do Código Civil.
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Nestes termos e dos melhores de direito, doutamente supridospor V. Exas., deve o presente recurso merecer provimento e em
consequência deve a sentença recorrida ser revogada quanto:
a) À alínea a) por forma a fixar-se a data a partir da qual aRecorrente deve ser condenada a reconhecer o direito de autor
e do exclusivo de comercialização dos cadeirões em causa
com a referência “E………..” e quaisquer outros constantes do
“Catálogo de C1……….”;b) À alínea c), declarar-se a autorização da 1ª Autora a favor da
2ª Autora ineficaz, por violação do disposto no artigo 41º, ecomo tal não pode ser oponível à Recorrente para efeitos de
condenação na indemnização a que foi condenada quanto à
invocada violação de um direito de natureza patrimonial, ou,
para o caso de se considerar, que a mesma autorização
configura uma transmissão de um direito de natureza
patrimonial e comercial que a mesma autorização seja
declarada nula e de nenhum efeito, por omissão de formalidadeessencial, com a consequente absolvição da recorrente no
pagamento de indemnização a favor da 2ª Recorrida na quantia
de € 2.474, acrescida dos juros de mora que se venceram após
a citação e até integral pagamento” (sic).
Após convite a esclarecer os pontos de facto que entendeincorrectamente julgados, se assim o entendia, veio a
recorrente prestar os esclarecimentos de fls. 210/212.
Não foram apresentadas contra-alegações.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
III - Na sentença recorrida vêm julgados provados os seguintes
factos:
1) A 1ª autora é designer de mobiliário diverso e artigos de
decoração.
2) O móvel – Cadeirão E………. –, logo com o seu lançamento,
passou a fazer parte do Catálogo da C1………, aqui 2ª autora, o
qual refere expressamente, na sua primeira folha, que se trata
de um modelo exclusivo e de uma obra protegida.3) A Ré é cliente da 2ª autora desde o ano de 2001, tendo
adquirido a esta, entre Janeiro e Julho de 2002, 14 cadeirões
E………...
4) Desde Julho de 2002 e até ao momento, a ré nunca mais
efectuou nenhuma encomenda à 2ª autora.
5) Intentaram as autoras a providência cautelar apensa, contra
a ré, a fim de que esta fosse imediatamente impedida decontinuar a comercializar a obra em causa, ou seja, o Cadeirão
com a referência E………..
6) A autora B……… não autorizou em momento algum, que a ré
explorasse e comercializasse a sua obra, sendo de referir que o
catálogo fornecido à ré, logo aquando da apresentação dos
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produtos da autora “C………..”, refere na folha da frente, de
forma expressa, que se trata de um modelo exclusivo e
protegido por direitos de autor.
7) A ré abriu recentemente uma loja em …….., sita na Rua …….,
nº ….., mesmo ao lado da loja pertencente ao grupo da
“C………”, aqui 2ª autora, que comercializa os produtos por
esta fabricados e desenhados pela 1ª autora, B………… .8) O registo de direito de autor, relativo a obras criadas pela
Autora B…………, foi requerido em Maio de 2000, e diz respeito
a vinte e oito modelos de móveis, tendo o registo o nº
……/DRCAC/IGAC, e estando registado com o titulo “Catálogo
de C1…………..”.
9) Com o referido registo, a 1ª Autora, assinou uma declaração,
na qual autorizou que o dito registo fosse efectuado a favor da
ora 2ª Autora, “C………….., Lda.”, para fins comerciais, da qualé a 1ª Autora sócia-gerente.
10) A Autora procedeu ao seu registo mediante o pedido do seu
averbamento à obra com o registo inicial nº
………../DRCAC/IGAC e com o título “Catálogo de C1………….”.
(1)11) De cada obra artística da sua autoria, (cada peça ou
móvel que idealiza e desenha), efectua a autora o registo do
seu direito de autor, junto da Inspecção-Geral das ActividadesCulturais, o qual é elaborado com uma folha discriminativa do
móvel, ou móveis, em questão.
12) O processo de registo é composto com um catálogo a
cores, que segue em duplicado e com fotografias dos móveis a
registar, indicando as respectivas referências.
13) Mediante tal autorização, a referida “C…………, Lda.”, aqui
2ª autora, no pleno exercício da sua actividade, fabrica ecomercializa as peças desenhadas pela 1ª Autora, B…………...
14) Sempre que a 1ª autora cria novos móveis ou novas peças,
procede à emissão de um novo catálogo, e é efectuado o
respectivo registo, mediante um pedido de averbamento ao
catálogo inicial, datado de 2000.
15) Acontece que, no ano de 2001, a Autora B…………., criou
uma nova peça, a que atribuiu a referência de “Cadeirão
E………….”, tendo efectuado o seu lançamento junto declientes e potenciais clientes da 2ª autora.
16) Em Abril de 2003, a autora B…………… tomou
conhecimento de que a ré dava orçamentos para a venda de
um cadeirão de ripas semelhante ao cadeirão “E.......................”
criado pela Autora a quem tivesse interessado em o adquirir.
17) Para a elaboração do dito orçamento a ré não consultou a
Autora “C……….”.18) Igualmente em Abril de 2003 a 1ª autora teve conhecimento
através do Jornal Bimestral “Mobiliário em Notícias” que a ré
vendia cadeirões de ripas semelhantes ao cadeirão
“E.......................” criado pela autora.
19) Em 2004, as AA tiveram conhecimento, através da revista
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Casa Cláudia, de Março último, que a ré continuava a
comercializar os cadeirões de ripas semelhantes aos criadospela autora.
20) A 2ª autora suporta os encargos inerentes com o registo do
direito de autor e com a publicitação de tal facto junto dos seus
clientes.
21) Sendo de salientar que é um elemento determinante na
venda dos seus produtos, designadamente dos cadeirões em
causa, o facto de se tratarem de modelos exclusivos.
22) A ré adquiriu à autora “C……………”, no 1º semestre de2002, 14 (catorze) cadeirões “E.......................” à razão de 275,00 €
cada um, que, a partir de Julho de 2002, a ré não mais adquiriu
cadeirões “E.......................” à autora e que, a partir dessa data,
vendeu, pelo menos, 9 (nove) cadeirões de ripas semelhantes
aos criados pela 1ª autora.
23) O pedido de averbamento ao registo do cadeirão
“E.......................” ocorreu em 12.12.02. (18)24) As relações comerciais terminaram em data que não pode
precisar, mas que coincidiu com um telefonema que a gerente
da ré efectuou para a gerente da 2ª autora a comunicar a
existência de defeitos numa mobília de sala que lhe havia
comprado e que se encontrava em exposição e que, por força
desses defeitos, pretendia que essa mobília fosse substituída
por outra.25) Na nota de encomenda junta como doc. 12, não é referido
que esse cadeirão foi escolhido do catálogo das autoras, que é
conhecido sob o nome de “Catálogo de C1…………….”.
26) A nota de encomenda em causa não respeita ao cadeirão
“E.......................“ comercializado pela 2ª Autora, mas respeita a
um cadeirão de ripas, tendo como referência o catálogo
C2…………...
27) Existem cadeirões iguais ou semelhantes aos das Autoras àvenda no mercado, os quais são comercializados por outras
empresas.
28) Os cadeirões a que se reporta a revista Casa Cláudia são
dois cadeirões de ripas semelhantes aos criados e
comercializados pelas AA.
29) Esses dois cadeirões expostos na fotografia foram
comprados noutra empresa e não foram fabricados a feitio.30) A Ré desde Julho de 2002 deixou de comprar os cadeirões
“E.......................” das AA e já não tem stock dos mesmos, mas
sim de outro tipo de cadeirões de ripas semelhantes aos das
AA. comercializado por outra empresa.
31) Logo que teve conhecimento da reclamação a autora
“C………….” ordenou ao funcionário que transportou a mobília
que desmontasse a mesma sem colocar outra no mesmo sitio.32) A gerente da ré opôs-se ao levantamento da mobília e
perante esse facto a gerência da autora “C………….” concedeu
que a mobília fosse levantada nos dias seguintes.
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33) A Ré teve que se defender perante o presente pleito judicial,
o que lhe acarreta despesas com advogado, pagamento de
taxas de justiça e demais encargos.
34) A 2ª autora procedeu ao levantamento da mobília objecto da
reclamação por parte da ré, uma vez que a reclamação da Réveio a ser por si aceite.
IV - Face às conclusões das alegações de recurso, que
delimitam o seu objecto (arts. 684º/3 e 690º/1 do CPC), não
havendo que conhecer de questões não suscitadas pelosrecorrentes, salvo se do conhecimento oficioso, importa
decidir:
a) - se a sentença devia fixar a data (e ser essa a de 12/12/2002)
a partir da qual a ré é condenada a reconhecer o direito de
autor e da exclusividade de comercialização dos cadeirões
com a referência E....................... pelas autoras;
b) – ineficácia, em relação à recorrente, da autorização decomercialização da 1ª à 2ª AA por falta dos requisitos
(menções) previstas no artigo 41º do Código do Direito de
Autor (forma de divulgação, publicação, utilização, condições
de tempo, lugar e preço da autorização) e eventual nulidade por
vício de forma, a ocorrer transmissão do direito patrimonial do
direito da 1ª autora a favor da 2ª autora;
c) – inexistência de facto ilícito e culposo da apelante que a faça
incorrer em responsabilidade civil perante as apeladas.
V - A recorrente apenas discorda da douta sentença recorrida,
quanto ao nesta decidido nas alíneas a) e c) – ou seja, quando
condena a ré reconhecer o direito de autor e do exclusivo de
comercialização dos cadeirões com a referência“E.......................” (a) e condena a Ré a pagar à 2ª Autora, pelos
danos causados a titulo de frustração dos ganhos, a quantia de
€ 2.475,00, acrescidos de juros de mora que se vencerem após
a citação e até integral pagamento (c). Mas acolá, apenas por
não ter sido limitada a condenação a partir de 12/12/2002.
Nos demais aspectos decididos, a sentença transitou em
julgado.
1) Perante as alegações de recurso (fls. 196/198) e as
conclusões (v. conclusões 18ª e 19ª) poderia depreender-se
que a recorrente impugna a decisão sobre a matéria de facto.
Daí ter sido convidada a esclarecer esse aspecto e, bem assim,
no caso de ser essa a sua intenção, dar cumprimento aodisposto no artigo 690º-A/1. als. a) e b), e 2, do CPC (cfr.
despacho de fls. 208) – isto é, especificar nas conclusões os
pontos da matéria de facto impugnada (por referência à base
instrutória), os meios concretos de prova fundamento de
decisão diversa e, estando gravados os depoimentos, a sua
indicação por referência ao assinalado na acta.
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Pelos esclarecimentos que a recorrente vem prestar, a fls.
210/212, tem de concluir-se que não impugna a decisão sobre a
matéria de facto. Do que discorda, apesar da falta de clareza da
sua exposição, é da subsunção jurídica, ou seja, entende que
os factos provados, na sua posição, não justificam a decisão,
nos aspectos impugnados.
Interpretando-se esses “esclarecimentos”, a recorrente nãopretende que se modifiquem as respostas dadas aos
“quesitos” (16, 17, 18, 24 e 28) – sendo certo que nem sequer
indica o sentido de uma eventual alteração da decisão – mas
que desses factos (conforme decidido na primeira instância)
não pode decorrer a decisão tomada ou, como aquela diz,
“estes pontos de facto foram incorrectamente julgados e
apreciados na sentença”.Ora, na decisão jurídica apenas se atende aos factos provados
e não às provas que permitiram a decisão pela realidade
desses factos. As testemunhas e os documentos são meios de
prova dos factos. Nãos são factos a enquadrar juridicamente.
Não é às provas que se aplicar o direito, mas aos factos
provados.
Não sendo intenção da recorrente impugnar a decisão damatéria de facto, inútil se torna aduzir os meios probatórios
acerca dos factos que serviram de base à decisão da matéria
de facto e, assinale-se, os factos atrás referidos (respostas aos
quesitos 16, 17, 18, 24 e 28) em nada desfavorecem a ré, na
posição por si afirmada, se bem que dela se discorde. Na sua
tese, poderiam favorecê-la com a conclusão pela inexistência
de responsabilidade.
Feitas estas considerações, conclui-se que não foi impugnadaa decisão sobre a matéria de facto. Mas, se fosse intenção da
recorrente impugná-la, nessa vertente, do recurso não devia
conhecer-se por a apelante não mencionar sequer o sentido de
uma boa decisão (diversa da adoptada pelo tribunal recorrido)
e que devia mencionar. Após esta observação, passemos ao
conhecimento das questões suscitadas.
2) Quanto à questão da data a partir da qual se impõe à
apelante o reconhecimento do direito de autor – quer esta que
o reconhecimento do direito de autor à primeira autora e,
consequentemente, a imposição de o respeitar, decorre do
registo e este só terá sido efectuado em 12/12/2001, como se
verifica das conclusões (6) “A Recorrente considera que asentença em crise deveria ter considerado uma data a partir da
qual a Ré é condenada a reconhecer o direito de autor e de
exclusividade das Autoras quanto à comercialização do
cadeirão com a referência “E.......................”, data essa nunca
anterior a 12/12/2002” e (7) “pois só com o registo da obra há
protecção legal da mesma”.
A apelante não questiona o reconhecimento do direito de autor
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e do exclusivo da comercialização pelas autoras nem na sua
condenação a reconhecer esses direitos nem se insurgiucontra a imposição de retirar do mercado os referidos
cadeirões (concebidos pela 1ª autora e comercializados pela
2ª), mesmo que já colocados em distribuidores ou
revendedores.
Foi pedida a condenação da Ré, e esta foi condenada, a (a)
reconhecer o direito de autor e do exclusivo de
comercialização dos cadeirões em causa com a referência
“E.......................” e quaisquer outros produtos constantes do
“Catálogo de C1………..”.
Provado está que a 1ª autora é designer de mobiliário diverso e
artigos de decoração e que as obras por si concebidas sãoregistadas junto da Inspecção-Geral das Actividades Culturais,
registo esse com o título “Catálogo de C1…………”, com o nº
1361/DRCAC/IGAC, efectuado em 22/05/2000, a que é averbada
cada nova peça por si criada (como a que deu origem à
controvérsia).
A 1ª autora criou uma peça de mobiliário, em 2001, a que
atribuiu a referência “Cadeirão E.......................” que foi averbadaao registo inicial nº 1361/DRCAC/IGAC, com o referido título
“Catálogo de C1………….”.O pedido de averbamento foi feito em 12/12/2002.
O direito de autor tutela a criação intelectual, enquanto obra(por qualquer forma) exteriorizada (e não enquanto mera ideia
incubada apenas no espírito humano, por mais trabalhada ebrilhante que seja, se bem que o mérito não releva para efeitos
de tutela do direito de autor) – artigo 1º, nºs 1 e 2, do CDA(2).Estão fora do âmbito de protecção do direito de autor as ideias,processos, sistemas, conceitos ou princípios ou as
descobertas, enquanto não associados a uma obraindividualizada e que represente uma criação intelectual
original (nº 2).É essencial à obra, objecto de protecção do direito de autor a
originalidade, que incorpore um mínimo de criação pessoal,que lhe dê uma individualização própria, a marca pessoal doseu autor. Embora a ideia seja produto do espírito humano, não
é a ideia pura que constituiu objecto do direito de autor ou queé protegido por esse direito. A protecção recai antes sobre a
forma que exterioriza a ideia, a criação do espírito exteriorizadana obra(3).
Nos termos do artigo 2º/1, são tuteladas pelo direito de autor ascriações intelectuais do domínio literário, científico e artístico
que compreendam, entre outras, as “obras de artes aplicadas,desenhos ou modelos industriais e obras de design queconstituam criação artística, independentemente da protecção
relativa à propriedade industrial”.
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No âmbito desta norma se enquadram as obras criadas pela 1ª
autora, as suas criações de “peças de mobiliário e artigos dedecoração” (e registadas junto da Inspecção-Geral das
Actividades Culturais).E apesar da protecção relativa à propriedade industrial que
poderia dar cobertura á pretensão das autoras (cfr. arts. 1º, 2º,3º, 257º e 260º do CPI e 212º do CDA), não é nessa base quealicerçam a pretensão. Não apelam à proibição da concorrência
desleal para obterem protecção acrescida dos direitos autorais.A causa de pedir situa-se apenas na violação do direito de
autor. Limitam-se a afirmar a protecção que, na sua alegação,lhes dispensa o direito de autor e que a apelante não respeitou,
utilizando a obra criada sem autorização.
O objecto do direito de autor é a obra, pelo que à criação
importa a sua exteriorização mediante (qualquer) forma queseja possível apreender pelos sentidos. “O facto constitutivo
dos direitos de autor é apenas a criação da obra”(4). “O facto constitutivo do direito de autor é sempre e só a criação
da obra, mesmo nos casos em que o direito é originariamenteatribuído a quem não é o criador intelectual”(5). Temos assimque, como regra, a atribuição do direito de autor é apenas
resultado da criação, e o seu reconhecimento não depende dequalquer formalidade. O criador da obra é o titular do direito de
autor.O registo não tem carácter constitutivo desse direito(6).
Não é por este que o criador da obra adquire esse direito, nemno registo assenta a pretensão das autoras.Direito que pertence ao criador intelectual da obra e, conforme
artigo 12º, “é reconhecido independentemente do registo,depósito ou qualquer outra formalidade”. Por outro lado,
estatui o artigo 213º desse Código que “o direito de autor e osdireitos deste derivados adquirem-se independentemente de
registo” sem prejuízo do disposto no artigo 214º, sendo certoque, na espécie em análise, a criação da 1ª autora não sesubsume a qualquer dos casos previstos neste último
normativo.Em matéria de publicidade do direito de autor domina o
princípio de que esse direito é reconhecido independentementedo registo ou depósito (arts. 12º e 213º do CDA). A atribuição e
a tutela desse direito não depende desses actos de merapublicidade, salvo as situações de registo necessário, em quese não integra a hipótese destes autos.
Estando em causa um cadeirão (E.......................), modelo criadopela 1ª autora, que constitui obra protegida pelo direito de
autor, nenhuma razão tem a apelante de, perante si, tal direitodever ser reconhecido apenas a partir de 12/12/2002.
O direito é reconhecido e tutelado com a criação da obra.Nem é legítimo o alegado desconhecimento (pela apelante) do
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autor da obra e sua protecção.Se, por um lado, a ré já era cliente da autora “C……….” desde oano de 2001, tendo adquirido a esta, entre Janeiro e Julho de
2002, 14 cadeirões “E.......................” (o objecto visível dacontrovérsia), não desconhecia quem detinha os direitos de
autor e o direito de comercialização sobre essa peça demobiliário.
Por outro lado, do “Catálogo de C1…………”, fornecido à répela segunda autora, logo aquando da apresentação dos seus
produtos (que, seguramente, ocorreu antes de Dezembro de2002), constava, de forma expressa e na sua primeira folha, queo modelo de mobiliário em causa é modelo exclusivo e obra
protegida por direitos de autor (als. 2 e 6 da matéria de facto) –conforme doc. de fls. 47 do procedimento cautelar. Injustificada
é a reserva da apelante quanto ao momento a partir do qual étutelado o direito de autor, para pretender situá-lo em
12/12/2002. A atribuição acontece com a criação da obra e esta teve lugarem 2001.
Não foi peticionado, nos articulados, que se fixasse a data doreconhecimento do direito em determinado momento, antes
importando que, na/s data/s em que se alegam as utilizaçõesabusivas ou as violações desse direito por parte da apelante,
este fosse reconhecido ao demandante, o que acontece nasituação submetida ao escrutínio do tribunal.O que implica a improcedência da questão.
3) A questão relativa à ineficácia da autorização da primeira à
segunda AA, para exploração comercial da obra, por violaçãodo disposto no artigo 41º e consequente inoponibilidade à ré(ou eventual nulidade do acto de transmissão do direito da 1ª
para a 2ª autoras, se por ela se devesse concluir). Trata-se de questões novas e, como se sabe, os recursos não
visam criar decisões novas sobre matéria nova mas reexaminara questão decidida pelo tribunal recorrido. Atento o disposto no
artigo 489º do CPC, é serôdia a alegação.Não foram questões suscitadas na contestação ou emqualquer outra fase antes das alegações recursivas para este
tribunal.Os recursos visam modificar as decisões impugnadas. Não
criar decisões novas sobre matéria nova, salvo tratando-se dequestões de conhecimento oficioso, ainda não definitivamente
apreciadas no processo(7). Os recursos, no regime dereponderação ou reexame, só podem incidir sobre questões jáexpostas no tribunal recorrido e sobre as quais este tenha
oportunidade de se pronunciar.E, a não suceder a prática de alguma nulidade nos termos do
artigo 668º/1 do CPC), o âmbito do recurso está delimitado peloconteúdo do acto recorrido, pelo que o tribunal de recurso só
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pode apreciar as decisões tomadas pelo tribunal a quo; é quecom os recursos visa-se a alteração dessas decisões e não
obter decisões novas sobre questões novas não suscitadasperante aquele e no momento processual adequado. Assim, o
tribunal de recurso não deve pronunciar-se sobre as questõesnovas, como aquelas que, não sendo do conhecimentooficioso, não foram alegadas pelas partes perante o tribunal
recorrido e, portanto, não foram objecto da sua decisão.
Não sendo as questões mencionadas suscitadas perante otribunal recorrido, não mereciam conhecimento. Massuscitando-se uma eventual nulidade por vício de forma
(oficiosamente cognoscível - artigo 286º do CC), importadeterminar se o negócio que está na base da exploração
comercial da obra criada pela autora B……………… configuratransmissão (parcial) do direito patrimonial de autor.
O direito de autor compreende direitos de natureza pessoal(denominados direitos morais) - como os direitos de reivindicara paternidade da obra, de assegurar a sua genuinidade e
integridade, de divulgar a obra e de a modificar (arts. 9º/1 e 3,56º/1, 58º, 59º/1 e 62º), que são inalienáveis, irrenunciáveis e
imprescritíveis (arts. 42º e 56) – e direitos de carácterpatrimonial que são negociáveis e, no exercício destes, o autor
tem o “direito exclusivo de dispor da obra e de fruí-la, ouautorizar a sua fruição ou utilização por terceiro, total ouparcialmente” (artigo 9º/2). Por outro lado, estatui o artigo 67º
que o autor da obra tem o direito exclusivo de fruir e utilizar aobra, no que se compreendem nomeadamente as faculdades
de a “explorar economicamente por qualquer forma, directa ouindirectamente, nos limites da lei” (nº 1) e que “a garantia das
vantagens patrimoniais resultantes dessa exploração constitui,do ponto de vista económico, o objecto fundamental daprotecção legal” (nº 2).
A exploração e a utilização da obra pode fazer-se por qualquerdos modos conhecidos (artigo 68º/1).
Cabe ao autor da obra a titularidade dos frutos do seu esforçointelectual, daí que o direito de autor deve permanecer na sua
esfera jurídica, que pode proceder à exploração directa ouindirecta e à transmissão ou à oneração do direito patrimonial,no todo ou em parte.
Em causa no processo, está apenas o direito de autor navertente patrimonial, já que, absolvida a ré da pretensão
indemnizatória da criadora da obra por violação dos direitosmorais, não foi a sentença impugnada nessa parte.
O autor tem o direito exclusivo de fruir e utilizar a obra e deautorizar a sua fruição e exploração económica por terceiro. Ao
contrário dos direitos pessoais, o direito patrimonial étransmissível, renunciável e limitado no tempo. Como escreve oProf. Oliveira Ascensão, “o núcleo do direito patrimonial é
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constituído pelo exclusivo da exploração económica daobra”(8); a lei reserva o aproveitamento ou a exploração
económica da obra ao seu autor, como decorre do artigo 67º/2,cabendo-lhe, só a ele, os benefícios económicos que a sua
exploração pode proporcionar.Estabelece o artigo 40º que o titular originário do direito pode
“a) autorizar a utilização da obra por terceiros e b) transmitir ouonerar, no todo ou em parte, o conteúdo patrimonial do direitode autor sobre essa obra”.
A autorização da utilização da obra, com exclusividade ou não,não implica a transmissão do direito sobre ela, que permanece
na esfera jurídica do seu titular.Deve ser concedida por escrito, de que devem constar as
menções referidas no artigo 41º/3, ou seja, a forma de utilizaçãoautorizada, bem como a condições de tempo, lugar e preço. Os contratos que tenham por objecto a transmissão ou
oneração parciais do direito de autor devem constar dedocumento escrito com reconhecimento notarial das
assinaturas, sob pena de nulidade (artigo 43º/2) e se atransmissão for total e definitiva (a alienação) do direito
patrimonial, deve ser feita por escritura pública. Não é alegado, em parte alguma dos articulados, a alienação oua transmissão, ainda que parcial, do direito de autor sobre os
modelos de mobiliário em causa (cadeirão E.......................) –situação em que o direito passaria à esfera do transmissário -
nem os factos provados permitem essa qualificação donegócio celebrado entre a 1ª e a 2ª AA. Por isso que a criadora
da obra não deixa de ter direitos patrimoniais sobre a obra porsi criada. A concessão ou a licença ‘apenas habilita aquele quea obteve a utilizar e explorar a obra dentro dos limites, nas
condições e para os fins determinados pelo autor’(9); nãoadquire o direito (patrimonial) de autor.
A lei não prevê que a omissão da forma ou das mençõesreferidas no artigo 41º tenham como consequência a invalidade
da autorização. Se tal estivesse no espírito do legislador, nãodeixaria de se lhe fazer referência, como sucede nestes doisúltimos preceitos, para o caso de transmissão ou oneração do
direito, em que comina com a nulidade a inobservância daforma escrita.
Entende-se que, para a autorização, a forma escrita constituiformalidade ad probationem (e não de modo absoluto),
constitui uma exigência probatória, daí que a sua falta nãodetermine a nulidade da autorização, mas transfira para ousuário o ónus probandi da autorização(10) bem como do seu
âmbito e da forma de utilização da obra. A inobservância daforma escrita não determina a nulidade do contrato que permite
a autorização da exploração económica da obra por quem nãoé o seu criador.
Na espécie, não há dúvida quanto á autorização, pois é a
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mesma afirmada pelo autora da obra (cujo interesse, a forma
legal procura, sobremodo, proteger e obrigar a ponderaçãoantes da contratação) e por quem dela obteve a concessãopara a sua exploração comercial. E nenhum conflito existe
entre o autor e o autorizado a explorá-la quanto a essaautorização, seu limites, forma ou modo de utilização.
Por outro lado, não foi antes alegado que as partes não tenhamacordado sobre as questões mencionadas no artigo 41º/3 e
nem está assente tal omissão, se bem que, no processo, nãoconste suporte documental (não decisivo para se afirmar aomissão face à função da exigência formal). Tardiamente é o
assunto trazido à colação. Não se tratando de transmissão de direito de autor, o negócio
que autoriza a 2ª autora a utilizar a obra criada pela 1ª para asua actividade comercial (fabrico e comercialização) não é nulo.
E, não sendo o problema da forma questão antes suscitada, anão ser em recurso, constitui questão nova que não é doconhecimento oficioso. Por isso, e sem prejuízo das
considerações feitas, afastada a pretensa nulidade, do demaisnão cumpre conhecer.
4) Se a recorrente praticou facto ilícito e culposo que lheimponha a obrigação de indemnizar a 2ª autora por danos
causados.No campo dos direitos patrimoniais do direito de autor,
assentemos já que o criador da obra goza do direito exclusivode dispor dela, fruí-la e utilizá-la, ou autorizar a sua fruição ou
utilização, total ou parcialmente, por terceiro (conforme decorredos arts. 9º e 67º), de beneficiar das vantagens económicas quea sua exploração pode proporcionar.
A garantia dessas vantagens beneficia de protecção legal.
Na situação deste processo, a 1ª autora autorizou a 2ª a utilizara obra, por si criada, para fins comerciais, ou seja, podendo
fabricar o cadeirão E....................... e comercializá-lo. É questãoque deve ter-se por assente, na medida que é aceite por autorada obra e entidade que dela recebeu autorização para a utilizar.
É questão sobre que a ré também não manifesta já discórdia.Não é de esquecer a relação existente entre as AA.
A 2ª é uma sociedade de que a 1ª autora é sócia e gerente.E aquela é autorizada por esta a utilizar, na sua actividade
comercial, não só o controverso cadeirão “E.......................”como as demais obras criadas por esta que estão registadascom referência ao “Catálogo de C1……….” (registada na
Inspecção-Geral de Actividades Culturais).A autorização que, como se pode descortinar da matéria de
facto, abrange, ao menos, o fabrico e comercialização da obra(que se enquadram na actividade comercial da 2ª autora).
A licença de utilização da obra (nos termos do arts. 40º e 41º)
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não implica a transmissão e presume-se onerosa e não
exclusiva (artigo 41º/1 e 2). Presunções elidíveis, pelo que nadaobsta que se demonstre a gratuidade e/ou a exclusividade da
licença.Já afirmamos que os factos provados não autorizavam seconcluísse por transmissão do direito de autor e também se
não dispõe de elementos factuais que alicercem a ideia degratuidade.
A relação existente entre as AA inculca uma licença exclusiva.Nesse sentido também vários aspectos da factualidade
apurada. Assim, no acto do registo da obra, a requerimento da 1ª autora,é aquela também registada a favor da 2ªa autora, para fins
comerciais, que, aliás, suporta os encargos inerentes ao registoe com a publicitação de tal facto junto dos seus clientes.
O registo tem por fim dar publicidade aos factos registados.A autora B....................... não autorizou, em momento algum, que
a ré explorasse e comercializasse a sua obra, como tambémnão se extrai do processo que outrem que, não a 2ª autora, sejaautorizada a tal exploração (alínea 6 da matéria de facto).
O móvel (cadeirão “E.......................”) em causa passou a fazerparte do “Catálogo da C…………” (da 2ª autora), e trata-se de
um exclusivo desta como é referido na primeira folha docatálogo (alínea 2 da matéria de facto), aí sendo referido
expressamente, na sua primeira folha, que se trata de ummodelo exclusivo e de uma obra protegida.A titular do direito de autor intervém no processo, aceitando e
afirmando estes factos bem como a defesa dos direitos da 2ªautora ao exclusivo do modelo de mobiliário e à reparação dos
danos que a ré lhe causou.Afigura-se possível afirmar a exclusividade da utilização da
obra pela 2ª autora, no que respeita ao seu fabrico (reprodução)e comercialização.
Por outro lado, o registo da obra está também feito a favor da 2ªautora (alínea 9 da matéria de facto), publicitando, desse modo
o direito de utilização e não desconhecia a ré que o cadeirão“E.......................” era um exclusivo dessa autora.
E dado que a alegada utilização abusiva por parte da apelanteocorreu após o pedido de registo da obra (que o Catálogo deque iria fazer parte há muito estava registado), data a partir da
qual consente a sua condenação a reconhecer o direito deautor, podia informar-se junto desse registo do detentor do
direito de autor e de utilização da obra.Acresce que à ré foi fornecido o catálogo, logo aquando da
apresentação dos produtos da autora “C………..” (2ª autora),do qual consta que o referido cadeirão era um modeloexclusivo e protegido por direitos de autor.
Durante algum tempo, desde 2001 e até Julho de 2002, foi
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cliente da 2ª autora, a quem comprou os mencionados
cadeirões (alínea 3 da matéria de facto), bem conhecendo aobra por ela comercializada (modelo exclusivo e protegida por
direito de autor).Concluindo, a ré não podia desconhecer que o dito cadeirão
era um móvel da exclusiva comercialização da autora(sociedade) e não estava autorizada comercializá-lo deproveniência que não fosse a autora.
De contrário, pratica facto ilícito, quer utilizando, para finseconómicos ou outros, a obra sem autorização do seu autor,
seja porque utiliza, com proveito seu e prejuízo do titular dodireito de autor, obra contrafeita.
Por isso, se a ré utiliza a obra da autora, sem autorização, ouobra contrafeita, igual e sem individualidade própria, antes seconfundindo com aquela, pratica um facto ilícito e incorre no
dever de indemnizar, na hipótese da ocorrência de danos parao titular do direito.
Para se impor a obrigação de indemnizar, os danos terão de serprovados por quem alega a protecção do direito.
A violação ilícita do direito de autor e direitos conexos fazincorrer o agente no dever de indemnizar. È ilícita a utilização
de uma obra protegida pelo direito de autor não autorizada pelotitular do direito
A obrigação de indemnizar importa, além da ilicitude do facto(como ofensa injusta a bens ou direitos alheios tutelados pelodireito), a culpa do agente, na modalidade de dolo ou
negligência (artigo 483º/1 do CC). Não há obrigação deindemnizar, em sede de violação do direito de autor, sem que
sobre o agente possa recair um juízo de censura ou dereprobabilidade por o agente agir do modo como agiu, optando
por uma conduta ilegítima quando podia e devia adoptar ocomportamento devido.
E são reparáveis todos os danos causados ao lesado quedecorram (nexo de causalidade) da lesão, sejam danosemergentes ou lucros cessantes (artigo 564º/1 do CC).
Recai sobre quem invoca um direito o encargo da prova dospressupostos do dever de indemnizar, nomeadamente dos
danos causados (artigo 342º/1 do CC).No recurso estão em causa apenas os danos patrimoniais
causados à 2ª autora, segunda a alegação das AA (a que adouta sentença deu acolhimento parcial – sem estar emquestão o critério nela adoptado para a determinação do
quantum indemnizatório), como titular do direito de utilizaçãoda obra (da sua exploração económica) criada pela 1ª autora.
Não invoca a apelante direito algum concorrente com o da 2ªautora a utilizar a obra (e que a matéria de facto provada não
tolera). Apenas que não violou o direito de autor, porque
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desconhecia que tal obra estava protegida pelo direito de autorporque também as AA não lhe deram conhecimento daprotecção, limitando-se a comercializar móveis à disposição no
mercado.Nesse aspecto, chegamos já a conclusão contrária.
A ré não desconhecia ou não podia desconhecer não lhe serlegítimo utilizar (comercializar) os referidos cadeirões sem a
autorização das AA. Defesa e argumentos improcedentes.A autora (2ª) é titular de um direito de utilização da obra (que ao
contrário do direito de autor ou do direito do transmissáriodaquele, não se trata de um direito absoluto, mas de eficácia
obrigacional), que explora comercialmente, e tanto quanto dosfactos se pode extrair, de forma exclusiva.
O beneficiário da autorização pode defender o seu direito dasua violação por terceiro que lhe cause danos, nos termos doartigo 483º/1 do CC, isto é, da responsabilidade civil
extracontratual(11), sem necessidade da colaboração do titulardo direito de autor (que nem está obrigado a agir em juízo
contra quem viole o direito do autorizado). Colaboração doconcedente que, no caso, até existe.
É ilícita a utilização da obra protegida pelo direito de autor nãoautorizada.
E é criminalmente punível a utilização, como sendo criaçãoprópria, de obra que seja mera reprodução de obra alheia ou de
tal modo semelhante que não tenha individualidade própria,bem como quem vender ou distribuir ao público obracontrafeita (arts. 196º/1 e 199º/1).
Tal como se revela na sentença recorrida – para que se remeteneste aspecto - foi essa a conduta da apelante. Comercializa,
mediante a aquisição a terceiro, obra de tal modo semelhante àcriação (sem traços verdadeiramente distintivos) da 1ª autora
que não tem individualidade própria (que levaria, até, oconsumidor a poder confundi-la com os móveis desenhados
pela 1ª e fabricados e comercializados pela 2ª AA).Bem sabendo da protecção de que beneficiava a obra criadapela 1ª e comercializada pela 2ª AA e que, portanto, lhe estava
interdita essa actuação comercial, de que retirou evidentesproveitos económicos, em detrimento das AA.
A sua conduta é ilícita e culposa. Impõe-se o dever deindemnizar, nos termos e montantes fixados na douta sentença
recorrida.O que motiva a improcedência do recurso.
VI - Pelo exposto, acorda-se nestes tribunal da Relação doPorto em julgar a apelação improcedente e confirmar a
sentença recorrida.Custas pela apelante.
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Porto,
(1) Esta alínea e as seguintes resultam das respostas àsquestões de facto constantes da base instrutória.
(2) Diploma a que pertencem os artigos citados sem outrareferência.
(3) V. J. Oliveira Ascensão, Direito de Autor e Direitos Conexos,69/70, Ac. STJ, de 23/03/2000, na CJ/STJ, Ano VIII, I, 93.
(4)Ac. STJ, de 14/12/95, na CJ/STJ, 1995, III//163. (5) J. Oliveira Ascensão, Ob. cit., 355.(6) J. Oliveira Ascensão, Idem, 397, em que escreve que o
registo é considerado uma formalidade e que esse tem sido oentendimento do artigo 5º/2 da Convenção de Berna (Sobre a
Protecção de Obras Literárias e Artísticas, de 1886) queestabelece “o gozo e o exercício destes direitos não estão
subordinados a qualquer formalidade”. E o registo constituiriamera formalidade.
(7) Acs. do STJ de 3/8/89, 11/11/92 e 10/5/2000, no BMJ 390/408,421/287 e 497/343.(8) Ob. cit., 197.
(9) L. Francisco Rebello, Introdução ao Direito de Autor, Vol. I,pág 135.
(10) Idem, pág.136; António M. Vitorino, A Eficácia dosContratos De Direito de Autor, págs. 28/29, para quem a
exigência da convenção relativa aos direitos de autor sercelebrada por escrito particular visa garantir maior facilidade deprova; que as regras dos arts. 41º/1 e 3, e 43º/2 do CDA têm “um
alcance bem limitado e reduzido, de mera eficácia adprobandum e não ad substantiam”. J. Oliveira Ascensão, ob.
cit., pág. 426 quando escreve “já no que respeita ásautorizações, a lei não comina a nulidade. Poderá perguntar-se
se em relação a estas a forma será ad pobationem”. Acs. STJ,de 15/2/98 e 14/03/06, em ITIJ/net, procs. 98A1138 e 06B231, queafirmam tratar-se de formalidade probatória.
(11) António Vitorino, ob. cit., 213 e seg.