43
5 1. INTRODUÇÃO “Todo Roqueiro é Gente fina” aborda a trajetória da banda paranaense de rock, A Chave. Para resgatar a memória do grupo foram feitas entrevistas com integrantes, pessoas que presenciaram a história e pesquisas em jornais. A proposta principal deste trabalho é resgatar, através de um videodocumentário, a história da primeira banda de rock paranaense a compor músicas próprias. A Chave foi um grupo formado originalmente em Palmeira, interior do estado do Paraná, que em meados dos anos 60 migrou para a capital. No início, projetava-se tocando composições de outras bandas: The Beatles, The Rolling Stones, The Animals, e The Kinks em festas. Após passar por diversas formações de integrantes o grupo passa a criar material próprio a partir de 1969, com influências concretistas 1 vindas do poeta Paulo Leminski, que também participou do processo. Em 1975, A Chave foi a banda de abertura de Bill Haley and His Comets, 2 autor de Rock Around The Clock, um marco para o gênero rock and roll, criado em meados dos anos 50. Infelizmente após dez anos de “estrada” a banda tem seu fim. Com apenas um single gravado, ainda ouvimos alguém falar da Chave, conjunto que durou apenas 10 anos. Será importante elaborar um projeto como este, pois o material da banda foi pouco explorado a nível nacional e pouco tratado em mídias locais. Como é o caso dos jornais Gazeta do Povo e Estado do Paraná, principalmente em 1975, ano em que a banda tocou ao lado de um dos pioneiros do rock and roll: Bill Haley. Naquele ano, os veículos apresentaram apenas pequenas notas ao grupo. A fim de resgatar a história da banda e a sua importância no cenário nacional, pretende-se, através de um videodocumentário de 30 minutos, uma concepção mais concreta da banda no cenário rock and roll da época ao lado de bandas como Made In Brazil, Tutti Frutti, Joelho de Porco, Mutantes, Bixo da Seda e Secos e Molhados. O problema de pesquisa deste trabalho é o porquê do resgate de uma banda que foi um grande expoente na música paranaense fora esquecida por 35 anos. O objetivo principal é produzir um videodocumentário a fim de resgatar a banda que 1 Deriva de poesia concreta, que melhor se define como poesia experimental, vanguardista. 2 Banda americana de Rock and Roll fundada em 1952, em Chester – Pennsylvania.

1. INTRODUÇÃO · PDF filerevista Poeira Zine, o domínio vem da palavra “Hipster”, que significava na época pessoas que se envolviam com a cultura negra. O termo foi generalizado

  • Upload
    volien

  • View
    215

  • Download
    2

Embed Size (px)

Citation preview

5

1. INTRODUÇÃO

“Todo Roqueiro é Gente fina” aborda a trajetória da banda paranaense de rock,

A Chave. Para resgatar a memória do grupo foram feitas entrevistas com integrantes,

pessoas que presenciaram a história e pesquisas em jornais. A proposta principal deste

trabalho é resgatar, através de um videodocumentário, a história da primeira banda de

rock paranaense a compor músicas próprias. A Chave foi um grupo formado

originalmente em Palmeira, interior do estado do Paraná, que em meados dos anos 60

migrou para a capital. No início, projetava-se tocando composições de outras bandas:

The Beatles, The Rolling Stones, The Animals, e The Kinks em festas. Após passar por

diversas formações de integrantes o grupo passa a criar material próprio a partir de

1969, com influências concretistas1 vindas do poeta Paulo Leminski, que também

participou do processo. Em 1975, A Chave foi a banda de abertura de Bill Haley and His

Comets,2 autor de Rock Around The Clock, um marco para o gênero rock and roll,

criado em meados dos anos 50. Infelizmente após dez anos de “estrada” a banda tem

seu fim. Com apenas um single gravado, ainda ouvimos alguém falar da Chave,

conjunto que durou apenas 10 anos.

Será importante elaborar um projeto como este, pois o material da banda foi

pouco explorado a nível nacional e pouco tratado em mídias locais. Como é o caso dos

jornais Gazeta do Povo e Estado do Paraná, principalmente em 1975, ano em que a

banda tocou ao lado de um dos pioneiros do rock and roll: Bill Haley. Naquele ano, os

veículos apresentaram apenas pequenas notas ao grupo. A fim de resgatar a história da

banda e a sua importância no cenário nacional, pretende-se, através de um

videodocumentário de 30 minutos, uma concepção mais concreta da banda no cenário

rock and roll da época ao lado de bandas como Made In Brazil, Tutti Frutti, Joelho de

Porco, Mutantes, Bixo da Seda e Secos e Molhados.

O problema de pesquisa deste trabalho é o porquê do resgate de uma banda

que foi um grande expoente na música paranaense fora esquecida por 35 anos. O

objetivo principal é produzir um videodocumentário a fim de resgatar a banda que

1 Deriva de poesia concreta, que melhor se define como poesia experimental, vanguardista. 2 Banda americana de Rock and Roll fundada em 1952, em Chester – Pennsylvania.

6

obteve representatividade nacional na época em que esteve em atividade: 1969 a 1979.

Os objetivos secundários desta pesquisa são levar até gerações já existentes e as que

virão, o conhecimento sobre essa banda que teve grande expressão no cenário

brasileiro e paranaense no tempo em que perdurou e resgatar a história da banda A

Chave para contribuir com a preservação de sua memória. Nossa hipótese baseia-se

no fato do ano de 1975, quando a banda abriu o único show de Bill Halley and His

Comets aqui em Curitiba. Este, de fato, seria o ano mais importante para a banda,

tendo em vista a repercussão de um artista, que fora considerado os inventores do

termo rock?

O referencial teórico deste trabalho contempla entre os principais autores:

FRIEDLANDER (2006), NICHOLS (2010), PIZA (2004) e VILAS BOAS (2002). No

segundo capítulo deste trabalho apresentamos a delimitação do tema, onde serão

abordados como a história do rock a nível mundial, história do rock na cidade de

Curitiba, Paraná e também a história da banda A Chave.

A seguir, na terceira parte, mostramos quais são os objetivos de pesquisa deste

trabalho, que se dividem entre um objetivo específico e objetivos específicos. O primeiro

tem como objetivo criar um videodocumentário com a intenção de resgatar a história da

banda A Chave. Já os demais objetivos resumem-se a tornar o resgate mais fácil para

pessoas que se interessam por música e arte e cinema. Na quarta parte apresentamos

à justificativa e nossas hipóteses de pesquisa. Como quinto capítulo, são apresentados

os autores que colaboraram para o processo do trabalho: Sergio Villas Boas, Cremilda

de Araújo, Daniel Piza, Bill Nichols, Robert Young, J.S Faro dentre outros.

No capítulo seguinte, o sétimo, será apresentado como o produto, no caso o

videodocumentário é trabalhado. Técnicas e processos de gravação, edição e

produção. O objetivo é mostrar como o produto foi desenvolvido e quais as técnicas

foram utilizadas para obter os resultados desejados neste trabalho.

7

2. DELIMITAÇÃO DO TEMA E PROBLEMATIZAÇÃO

O rock foi uma vertente musical que abriu portas para muitas outras

possibilidades de fazer música. Variações surgiram e continuam a surgir com o

passar do tempo. Notamos que o modelo fiel de um contrabaixo, uma guitarra

elétrica e de uma bateria quebrou barreiras, musicalmente falando, até chegar a nós

aqui no Brasil.

Para A Chave, o movimento Rock foi importante, pois é nele que o grupo

resolve fazer suas criações baseadas em concretismo, poesia concreta e outras

vertentes do universo rock. A banda durou 10 anos e obteve destaque nacional

merecido no tempo em que perdurou, mas depois a história nunca mais fora

retomada, resgatada para gerações posteriores.

Nossa questão-chave, o problema de pesquisa, foi pensar como produzir um

videodocumentário que resgate a trajetória e a história da banda de rock A chave?

2.1 HISTÓRIA DO ROCK NOS ANOS 50, 60 E 70

Primeiramente é importante definir o termo “Rock”. Alguns autores utilizam

essa definição para abordar a música que viria de gêneros subsequentes ao Rock

and Roll. Assim como o autor Paul Friedlander no seu livro “Rock and Roll – uma

história Social”, o videodocumentário aborda o gênero Pop/Rock, que “reflete uma

natureza dupla: raízes musicais e líricas derivadas da era clássica do rock e seu

status como uma mercadoria produzida sob pressão para se ajustar à indústria do

disco (Pop).” (FRIEDLANDER, 2006)

O pontapé inicial do gênero tratado aqui em “Todo Roqueiro é Gente Fina”,

segundo Friedlander, acontece nos Estados Unidos da América, que se recuperava

do período pós-guerra. Como se não houvesse problemas, a geração do consumo

8

estava apenas começando e tudo era novidade. Aquela história de canções

românticas, como orquestrações de Glenn Miller3, já não eram tão bem aceita por

jovens, que buscavam outra vertente musical mais prazerosa e que se conectava ao

contexto social da época. Dessa busca gerada através dessa insatisfação, nasceu o

gênero chamado de Rock and Roll. Por muito tempo fora chamado de ato de

rebeldia, pois a questão não era só a música, mas todo um universo envolvendo

vestuário, automóveis, motocicletas, topetes e a guitarra elétrica.

Podemos dividir o movimento em duas gerações: a primeira, que contava com os músicos Fats Domino, Chuck Berry, Little Richard e Bill Haley. “Eles conquistaram sucesso nas paradas populares entre 1953 e 1955, iniciando a escalada como os pioneiros do rock. Sua música, uma síntese dos estilos branco e negro e dominada por um forte acompanhamento de bateria, exibia letras que celebravam as experiências de vida dos adolescentes do pós-guerra, como amor, dança, alusões ao sexo e ao próprio rock and roll.” (FRIEDLANDER, 2006, p.20).

Segundo FRIEDLANDER (2006), essa segunda geração do gênero garantiu

a sucessão do trono da música popular com um estilo que, embora um pouco menos

estridente que os roqueiros do começo e geralmente tratando mais do amor entre

jovens do que suas angústias. Ele fora adotado pela juventude da época. Após essa

ascensão do estilo, ele foi perdendo espaço com o passar do tempo para uma outra

vertente. A “surf sound” ou mais conhecida como Surf music, que contava com

vocais femininos, jovens de cabelos cortados e um revival do folk tornou-se popular.

A invasão britânica dos anos 60 estava prestes a entrar em cena:

“Em 1964 os Estados Unidos despertaram para o som dos Beatles, com sua variedade de rock clássico combinado com toques de pop e rockabilly. Esta invasão inglesa, a qual incluía a música dos Rolling Stones, Dave Clark Five e The Who, entre outros, reacendeu o impulso do rock and roll na América. Seu sucesso faria com que jovens cantores de folk americano, como Bob Dylan e outros, “se eletrificassem”, somando o poder do rock and roll às letras “sérias” e aos acordes de violões acústicos. Alguns se mudariam para Los Angeles e para o cenário do folk-rock dos Byrds, Buffalo Sprinfield e muitos outros acabariam em San Francisco como parte de uma nascente comunidade de contracultura musical.” (BENTO ARAÚJO, 2010, p.31)

Vários festivais de arte envolvendo a música foram produzidos. Monterey 3 Músico, compositor e lider de grandes orquestras – as big bands.

9

Pop Festival aconteceu em 1967 e contou com a participação de bandas da invasão

inglesa, como o autor colocou e da nova onda americana, o revival folk de bandas

de San Francisco. Músicos como James Marshall Hendrix, ou Jimi Hendrix, foram

revelados à América nesse festival, que fora produzido por músicos da banda

“ianque” The Mamas and The Papas. O Woodstock é também outro festival

conhecido pelo slogan criado em 1969 (ano do festival): Três dias de paz amor e

música. É na década de 1960, que a identidade do “Hippie” é criada. Segundo a

revista Poeira Zine, o domínio vem da palavra “Hipster”, que significava na época

pessoas que se envolviam com a cultura negra. O termo foi generalizado com o

passar do tempo. Para os contemporâneos, a morte desse movimento se deu

quando no festival gratuito de Altamont um estudante morreu devido à violência

desenfreada no próprio festival, que tinha como atração principal os Rolling Stones.

Esta década é lacrada com a morte Jimi Hendrix, Janis Joplin e Jim Morrison. A

década a seguir trazia na bagagem um rock mais pesado e com guitarras

distorcidas.

Por volta dos anos 70, o público de rock tinha chegado a uma certa idade, e uma nova geração de ouvintes buscou sons diferentes daqueles procurados pelos seus contemporâneos mais velhos, que ainda se apegavam aos seus favoritos dos anos 60. Novos artistas apareceram como os cantores/compositores Elton John, Paul Simon e Neil Young, Eagles, Chicago, os ingleses do Fleetwood Mac e Doobie Brothers. À medida que a década passava e a tecnologia de gravação se tornava altamente sofisticada, a música popular se dirigia a um perfeccionismo estético voltado para o estúdio (Representado pelo Boston e pelo Steely Dan). Se você não gravasse num estúdio de última geração e não trabalhasse nota por nota até ficaram perfeitas na Gravação, você não estava “in” - ou seria colocado em uma programação de rádio cada vez mais restrita. (FRIEDLANDER, 2006. P.110).

Surgia aí o movimento progressivo, onde a virtuosidade era pré-requisito

para uma banda de “rock-progressivo”4. Yes, King Crimson e Gentle Giant eram

bandas percussoras desde movimento. Não demorou muito para que a rebeldia

voltasse à tona assim como em meados dos anos 50. Um movimento criado por

jovens que detestavam a ideia de solos de guitarra com mais de 30 minutos, ou até

uma única música ultrapassando um dos lados dos Long Plays. Com o lema “Do it

Yourself” a cena Punk apareceu.

4 Gênero musical criado na Alemanhã

10

Comemoração esta pop dominada pela tecnologia, a música punk rompeu os portões da garagem, da escola, da arte e do pub e se lançou no cenário britânico em meados dos anos 70. Vestindo camisetas rasgadas e detonando uma música frenética e crua, os punks tentaram ofender a todos. Seu sucesso foi além de seus sonhos mais loucos e, no processo, ajudaram a revitalizar o combalido mercado do rock. Os pioneiros do Sex Pistols se autodestruíram, mas outros, como o Clash, encontraram uma maneira de sobreviver e crescer na cena comercial.” (FRIEDLANDER, 2006, p.26).

Essa maneira de crescer na cena comercial do Clash ajudou muitas bandas

de punk rock de décadas sucessoras, inclusive no Brasil.

2.1.1 HISTÓRIA DO ROCK EM CURITIBA

Segundo DAPIEVE (1996) em seu livro BRock: o Rock Brasileiro dos Anos

80, a primeira gravação da vertente na época no Brasil é datada de outubro de 1955.

O pontapé inicial veio de uma cantora de samba-canção (gênero que surgiu em

1920, durante o período de modernização do samba no Rio de Janeiro), Nora Ney,

quando reproduziu uma versão de “Rock Around The Clock”, de Bill Haley and His

Comets. A versão de Nora era para o filme “Sementes da Violência”. Logo após

esse acontecimento, outras versões de músicas estrangeiras foram surgindo e o

Rock foi sendo traduzido para o português. Mas foi no ano de 1957 foi gravado o

primeiro rock legítimo brasileiro: “Rock’n’roll em Copacabana, interpretado por

Cauby Peixoto.

Na capital paranaense, o Rock chegou disfarçado com o cantor norte-

americano Neil Sedaka. Segundo CANDAL (2014) em 1959, Sedaka trouxe a sua

country-music para o Teatro Guaíra e apesar de não difundir o gênero Rock,

carregava consigo algo que seria novo para Curitiba. Programas de rádio também

contribuíram para o crescimento do estilo. O radialista Mario Celso apresentava o

programa “Cabeludos pela Marumbi” direcionando para juventude, a jovem-guarda

que estava em alta na época. Roberto Carlos e Erasmo Carlos eram os expoentes

do estilo, que estava em alta no Paraná. Bandas curitibanas como Os Falcons,

Aquarius Band e Os Metralhas foram aos poucos agregando fãs em território

nacional.

11

No final da década de 60, com influência do movimento de contra-cultura

vindo de outros continentes, especialmente dos Estados Unidos da América e

Inglaterra, outras bandas foram surgindo e assim outras vertentes musicais. Um

exemplo de banda que conseguiu sintetizar essas novas vertentes foram Os

Mutantes. Segundo CALADO (1999) esses paulistas do bairro Pompéia, tinham

influência de Beatles, que naquela altura acabara de lançar o divisor de águas da

música Pop: Sgt. Peppers Hearts Club Band5. No início da década seguinte, 1970,

outras bandas apareceram: Novos Baianos, Gilberto Gil agora tinha uma banda de

rock, o Expresso 2222, o Made In Brazil, Secos e Molhados. Em Curitiba, ainda no

início da década de 70 o já respeitado poeta e pensador local, Paulo Leminski,

passa a se interessar por música e fazer contribuições literárias ao gênero. É com a

banda A Chave, que Leminski uniu a música à poesia concreta – sua paixão.

2.2 HISTÓRIA DA BANDA A CHAVE

A banda composta por Ivo Rodrigues, Carlos Gaertner, Paulo Teixeira e

Orlando Azevedo anteriormente era chamada de Os Jetsons e era da cidade de

Palmeira, interior do estado do Paraná. A união destes quatro músicos se deu

quando em um festival na televisão, Ivo ganhara o prêmio de melhor vocalista,

enquanto Os Jetsons ganhariam o de melhor conjunto. Seu primeiro trabalho foi uma

releitura para a canção “When i'm Sixty Four” dos Beatles, a maior influência da

banda até então, que causou impacto por muitas vezes ser confundida com a

original.

Participou de festivais como o Camburock em 1975 e em Curitiba realizou o

projeto “Sangue nas Máquinas”, onde o grupo improvisava com o som das caldeiras

e das máquinas industriais, que funcionavam a todo vapor. No grande Teatro

Guaíra, em 1975, A Chave abriu o show de um ícone dos anos 50: Bill Haley and His

Comets. Também foram responsáveis pela música nos parques, uma vez que com

frequencia se apresentavam no palco flutuante do Passeio Público.

5 Oitavo disco de studio da banda The Beatles

12

Segundo a revista “Antigas novidades do Rock” a única revista a resgatar a

banda na primeira década dos anos 2000, o legado da Chave foi deixado em grande

parte com os paranaenses, que de grande maioria beiram a faixa dos 60 anos de

idade. Graças aos pesquisadores de décadas passadas, as novas gerações tem

acesso a uma gravação de um ensaio realizado no estúdio da banda chamado na

época de "A Casa Branca" localizada na rua Padre Anchieta no bairro Mercês.

Donos de uma loja de discos no centro de Curitiba, Marco e Jardel, como são

conhecidos, costumavam ir às feiras de LPs em São Paulo todo semestre. Numa

dessas viagens, a dupla encontrou uma fita cassete de um comerciante, que

apresentava um dos ensaios da banda, que supõe ser do início de 1970. Ao voltar

para a capital paranaense, a dupla, que na época era dona da loja Vinyl Club,

resolveu passar a fita para formato CD-R e montar uma capa com recortes de fotos

da época denominando o material de "De Ponta Cabeça", título da canção que abre

o disco encontrado.

Por volta de um mês depois da descoberta o material foi comercializado, e

com muito sucesso entre fãs e novos conhecedores, (que por influência da dupla

Jardel e Marco começou a descobrir um pouco mais da história do Paraná através

da música da Chave) as cópias saíram do estoque e nunca mais foram reeditadas.

Algum tempo depois esse material foi disponibilizado em blogs na internet.

Juntamente com essa passagem do físico para a web, foi descoberto outro material

da banda. A Chave ao Vivo em Londrina em 1975 passou a ser item muito buscado

na própria loja de discos de onde a lenda ressurgiu. Marco, com a ajuda da

Marcinha Teixeira, (esposa do guitarrista Paulo Teixeira) começou a fazer cópias do

mesmo modo que fez o "De Ponta Cabeça".

Maravilhados com a surpresa do material, os integrantes Carlos Gaertner,

Orlando Azevedo, Ivo Rodrigues e Paulo Teixeira, resolvem em 2007 reativar a

banda, que desde 1979 estava parada. A volta foi documentada em áudio, mas não

comercializada, assim como vários rolos gravados que com o tempo se perderam.

No ano de 2012 o baterista e fotógrafo Orlando Azevedo documentou o trabalho da

banda através de um livro O Diário, que deve sair no fim do ano.

13

2.2.1 PAULO LEMINSKI E A CHAVE

Em meados da década de 70, mais precisamente em 1971, Paulo Leminski

viria a conhecer a famosa casa branca da Chave. Em um encontro inesperado entre

a banda e o poeta, surgiu uma parceria que perdurou anos.

Passava das três horas da madrugada quando alguém bateu na janela frontal da Casa Branca, gritando: “ô, de casa!” Era o fotógrafo Haraton Maravalhas trazendo Leminski para promover as apresentações formais. Quem estava dormindo acordou e quem estava “viajando” apenas continuou. Apertaram-se alguns baseados, alguém apareceu com copos e garrafas e a noite continuou rolando. (VAZ, 2001, p.137).

De imediato o poeta viria com um projeto para apresentar à banda: Em Prol

de um Português Elétrico, onde propunha uma pesquisa aprofundada para adequar

o idioma (no caso, o português) ao Rock and roll. O compromisso com a banda foi

tão forte, que Paulo e sua esposa/namorada, a também poeta, Alice Ruiz, foram

morar na famosa casa da banda. Na época Leminski escrevia alguns artigos para o

jornal O Estado do Paraná e às vezes inseria uma nota ou outra sobre a “sua”

banda.

A meta é atingir uma estética através de uma tecnologia. Assim, o projeto visa a: libertar a música pop da imagem do inglês, reputando como veículo ideal para esse som. Contribuir para a criação de uma música BRASILEIRA (ao contrário dos reacionários folclóricos e saudosistas que tentam em vão incompatibilizar a cultura brasileira com a nova realidade industrial e eletrônica, que veio pra ficar) ELÉTRICA E INDUSTRIAL.” (LEMINSKI, 1987).

O envolvimento com o projeto resultou em composições do poeta junto à

banda. “Blues Satanás”, “Povo Desenvolvido é Povo Limpeza”, “Vai à Luta”, ”Mulher

Interessante”, “Luva de Pelica”, “Me Provoque Pra Ver” e “Buraco no Coração”, a

primeira a ser gravada no compacto de 1977. Essa parceria foi ainda mais forte com

Ivo Rodrigues, que foi apontado por Leminski como o melhor vocalista de Rock do

Brasil.

2.3 A CHAVE E A IMPRENSA

14

Pode-se considerar a banda paranaense mais importante do cenário musical

brasileiro voltado para o Rock e, juntamente com a poesia de grande influência do

poeta Paulo Leminski, criou um estilo único no gênero que nasceu por volta dos

anos 50 nos Estados Unidos. A banda possui um único material que foi

comercializado: um compacto (lado A "Buraco no Coração"/lado B "Me Provoque

Pra ver") lançado em 1977 pela GTA - Gravações Tupi Associadas. O conjunto não

teve a "ajuda" da internet (Web 2.0 – Troca de arquivos entre pessoas via internet) e

mesmo assim, com duas canções comercializadas, atingiu o cenário Rio-São Paulo,

que durante as décadas de 70 possuíam uma grande repercussão no Brasil: Os

Mutantes, Made in Brazil, Joelho de Porco, Bixo da Seda, Rita Lee e Tutti Frutti.

Segundo o jornalista DUARTE (2003) foi ao fim da década de 1980 que

começou uma movimentação da mídia em torno da música local. “Apesar de não ser

o objetivo principal da cena, alguns grupos tiveram boas chances de alcançar uma

projeção maior. A cena começou a ter uma divulgação maior no cenário musical

nacional”. (DUARTE apud SOUZA NETI, 2003, p.394). Desde o momento em que a

Chave começou a ter espaços em clubes como o Sírio Libanês, a mídia local tais

como O Estado do Paraná, Diário do Paraná, Folha de Londrina, Tribuna do Paraná,

chegaram a dar notas sobre a banda em vésperas de shows e eventos que ela

promovia. A chave chegou a ter um programa de TV, mas na luta contra os direitos

da rede televisiva, até hoje ninguém conseguiu rever o programa que ia ao ar

semanalmente na década de 70.

Em pesquisa em jornais da época na Biblioteca Pública do Paraná, o

assunto foi encontrado três vezes sobre shows na capital. Com o objetivo de

procurar algo relacionado a shows ao ar livre, em teatros (exemplo, Teatro Guaíra) e

em clubes (Sírio-libanês), bem pouco foi achado. Apenas uma pequena nota no

periódico Gazeta do Povo, escolhido por ser o jornal de maior influência na época,

sobre o show realizado em 1975, onde a banda abriu o show de Bill Haley and the

His Comets (Pioneiro do gênero Rock'n'roll).

Nota-se que os tipos de matérias encontradas nos periódicos Tribuna do

Paraná, Gazeta do Povo, O Estado do Paraná, Jornal Panorama, de Londrina, Diário

15

do Paraná e Jornal do Paraná os textos voltados à banda são altamente explicativos

e detalhados. É possível encontrar a importância de sua história em mais de um

parágrafo no mesmo texto. A projeção aplicada no grupo, não sendo “apelativa”, é

algo constante nos sete veículos analisados. Um exemplo disso foi encontrado em

um texto datado de 23/11/1970, na Tribuna do Paraná. “Com uma média de apenas

20 anos de idade, o conjunto realiza em Curitiba um trabalho todo especial,

mostrando um som muito pessoal e dando novas dimensões para a música pop que

se faz no Brasil. Depois de Dublar, perfeitamente, os Beatles na televisão, A Chave,

desligou-se das influências e conseguiu uma síntese que dá ao grupo uma

qualidade de som totalmente original e específica”. A Chave sempre foi colocada à

frente do seu tempo: vanguardista. Para o autor Paulo Reis, em sua obra “Arte de

Vanguarda no Brasil: os anos 60”, Vanguarda é um fenômeno inscrito no mundo do

capital da industrialização e da sociedade de classes. Originalmente ligado a uma

estratégia militar (as “guardas de frente”) e depois presente num ideário político-

revolucionário, o termo ganhou status de discussão cultural no século XX, quando

algumas movimentações artísticas propuseram seus programas estéticos. Esses

programas fundamentavam-se na autonomia da arte e do objeto artístico. Para o

autor, aquilo que é de vanguarda, é aquilo tenta fugir na realidade imediata. Já em

outro veículo analisado, singularidade do grupo é declarada. “O conjunto A Chave já

fez muitas experiências: participou de peça teatral (“A Semana” de Denise Stoklos),

apresentou-se ao ar livre (no palco flutuante do Passeio Público numa manhã de

domingo) e faz experiências de som em seu estúdio próprio (naquele casarão da rua

Pe. Anchieta, onde o grupo mora e trabalha. Agora, mais uma experiência será feita

pelo quinteto: um show numa fábrica. As máquinas acompanharão com o seu som a

música D’a Chave. Relatava que o concerto acontecerá amanhã, às 14 horas, nas

dependências Mueller, na Vila Fany. “Sangue das Máquinas” é o título dessa

experiência.

2.4 INDÚSTRIA FONOGRÁFICA

Uma banda vive, praticamente, de duas coisas: shows e discos gravados.

Uma produção sonora é o cartão de visita de qualquer músico. Mas o processo de

16

gravação de um material muitas vezes pode não parecer muito fácil. Veja como

exemplo a banda em estudo. A Chave, em 10 anos de existência gravou apenas um

compacto simples contendo lado A e Lado B.

O ponta pé inicial desse processo aconteceu especificamente em 1877,

quando Thomas Edson inventou o fonógrafo, primeiro aparelho destinada a músicas

que eram gravadas. Aliás, o termo “indústria fonográfica” surgiu a partir de um dos

setores da indústria cultural, conceito criado por Adorno e Horkheimer.

Segundo CANDAL (2014) durante o século XX a indústria fonográfica se

desenvolveu de uma forma que tornou-se um catalizador financeiro. Ainda mais

quando surgiram as radiolas (onde poderiam ser escutados os discos), discos de

vinil. O mercado de meio fonográfico foi um importante disseminador cultural. O rock

e o Pop, por exemplo, foram um grande chamariz, que contribuiu para a

consolidação dessa indústria. Bandas como The Beatles, Pink Floyd foram grandes

expoentes na indústria fonográfica tanto por questões financeiras e questão o de

técnicas de gravação. Beatles, como o seu divisor de águas o Sgt. Peppers Lonely

Hearts Club Band, de 1967 e o “Floyd” com o seu “Dark Side Of The Moon”, de

1973). Ambos os discos de ambas as bandas tiveram vendas elevadíssimas (Sgt.

Peppers: 5 milhões e Dark Side: 50 milhões).As técnicas de gravação aparentes nas

duas obras foram muito revolucionárias cada um em sua época.

Foi no final da década de 90, que a indústria fonográfica teve o seu auge,

quando cinco empresas – Universal, Warner, Sony, EMI e BMG – obtinham 85,28%

das vendas do mercado mundial (Herschmann e Kischinhevsky), que totalizou 2,2

bilhões de discos vendidos em 1997. Mas, curiosamente, logo após o ápice de

vendas dessa indústria, um processo de declínio nesse processo começa a

aparecer. Com a o aparecimento da pirataria e de outros softwares voltados para

compartilhamento de arquivos e músicas, como o Kazaa, grandes empresas

começaram a quebrar. Alguns músicos foram contra essa troca de arquivo via

internet a custo zero. Lars Ulrich, membro da banda de heavy metal Metallica

processou o criador do Napster por compartilhamento sem autorização de material

de sua banda.

17

3. OBJETIVOS

3.1 OBJETIVO GERAL

− Produzir um videodocumentário sobre a banda paranaense A Chave,

destacando sua história e atuação entre os anos de 1969 e 1979.

3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

− Levar até gerações já existentes, e as que virão, o conhecimento sobre essa

banda que teve grande expressão no cenário brasileiro e paranaense no tempo em

que perdurou .

− Resgatar a história da banda A Chave para contribuir com a preservação de

sua memória.

− Contribuir com o acervo cultural do Paraná.

− Descobrir a história da banda A Chave durante os dez anos de atuação na

cena musical curitibana criando um videodocumentário.

− Levantar quais são as características principais dessa banda que a

diferenciam cena do rock curitibano.

18

4. HIPÓTESE

Partimos da hipótese de pesquisa que ajuda na estruturação teórica e na

produção do nosso produto, o videodocumentário, capaz de responder a esta

prerrogativa inicial apresentada abaixo:

1) A banda A Chave teve grande importância para o rock curitibano e nacional

com maior visibilidade em 1975, ano em que a banda se apresentou no

Teatro Guaira.

19

5. JUSTIFICATIVA

Este trabalho tem como produto final um videodocumentário biográfico sobre

a banda de rock setentista A Chave. A escolha da banda foi baseada na criatividade

das composições, tanto quanto a união de poesia e o rock and roll, aspecto original

na época em que surgiu.

A história do rock em Curitiba começou na Casa Branca do conjunto A Chave na Rua Pe.Anchieta. Estúdio e casa comunitária, a Casa Branca da Chave foi durante muito a única prova de que estávamos na segunda metade do século XX. Sono de Beatles e Stones, The Who e Led Zeppelin, o rock da Chave foi durante muito tempo o nosso rock, o nosso sonho de rock-and-roll. Fonograficamente, a Chave deixou um compacto. Mas seus shows na segunda metade dos anos 70 eram sempre o evento máximo do show na cidade. Houve banda de repetidores como os Metralhas. A primeira banda curitibana de criação rock foi A Chave. (LEMINSKI, Correrio de Notícias).

Com base nessa citação do Poeta Paulo Leminski e na visão de

documentário do autor Bill Nichols, de que “no documentário, o estilo deriva

parcialmente da tentativa do diretor de traduzir seu ponto de vista sobre o mundo

histórico em termos visuais, e também de seu envolvimento direto no tema do filme.

Ou seja, o estilo ou a voz do documentário revelam uma forma distinta de

envolvimento no mundo histórico”. (NICHOLS, 2010). A ideia de voz ao

documentário representa um “algo a mais”. Um complemento. Da uma visão literal

do que a história quer contar.

Trata-se de um trabalho único a tratar da banda A Chave. O tema “rock em

Curitiba” já foi tratado em dois outros trabalhos acadêmicos: “Sou Legal, Eu Sei” e

“Voz Disfarçada de Gente”. Ambos trataram da vida do cantor e compositor Ivo

Rodrigues da banda Blindagem. No formato biográfico, os documentários apenas

citaram o trabalho da Chave, uma vez que Rodrigues também tenha sido o vocalista

principal da banda até 1979, ano em que o conjunto acabou.

Em outros formatos, tais como jornais, programas de TV e revistas o

20

assunto é muito raso, ou seja, o assunto é muito pouco explorado, ou nem é

abordado. O Documentário “Todo Roqueiro é Gente Fina” tem como objetivo contar

a história da banda de forma profunda, para que as próximas gerações do estado do

Paraná tenham ciência de quem foi uma das bandas de rock mais importante do

cenário musical de Curitiba até hoje.

Preservar a memória da cultura musical é importante para a cultura de

qualquer estado. A Chave contribuiu muito para bandas que viriam depois dela. O

modo com que articulavam uma canção. Como articulavam a poesia e melodia. É

importante trazer a gerações póstumas a história da banda que “fabricou” mais de

150 músicas.

21

6. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Resgate de memória requer uma pesquisa intensa. Seja em livros, revistas

ou documentários. No caso do grupo de rock A Chave, o processo foi basicamente

ao contrário. Pesquisas foram importantes, mas não em livros, revistas ou

documentários como já citados. Os dados mostrados abaixo foram retirados, em

grande parte, de entrevistas com pessoas que conviveram com a banda e com

integrantes da Chave. Foram entrevistados Carlos Gaertner, Orlando Azevedo,

Paulo Teixeira, Judith Magalhães, Sandra Carraro, Luiz H. Groff, Lucas Nieri, Jardel

Simões, Marco Antônio, Luiz Maurício Carraro e Luiz Carlini.. A partir de recortes de

jornais e fotos foi construída uma linha de pesquisa orientada por Sergio Villas Boas,

Cremilda de Araújo, Daniel Piza, Bill Nichols, Robert Young e J.S Faro.

6.1 BIOGRAFIA NO JORNALISMO

Segundo o autor Sergio Vilas Boas a biografia representa a reprodução de

uma vida, ou de várias, que chegam a ser copilados em um material final – o

produto.

A biografia é uma compilação de uma ou de várias vidas. Pode ser impressa em papel, mas em outros meios, como o cinema, a televisão e o teatro podem acolhe-la bastante bem. Por enquanto, não há características epistemológicos para o fazer biográfico. Para os propósitos deste trabalho, o que interessa é a escrita e o autor, a criação e a publicação, o personagem e a sua interpretação. (VILAS BOAS, 2002, p.56)

Vilas Boas (2002) diz que a vida de celebridades e pessoas famosas

despertam a atenção de grupos variados e que o material a ser consumido, ou seja,

o documentário da banda A Chave, trata-se também de um produto social, um

22

documento de resgate do passado de alguém. Hoje no Brasil o mercado é

“bombardeado” com biografias heróis, ídolos das gerações que passaram, ou até as

que hoje se apresentam ativas. Em sua maioria, músicos biografados que já

morreram ou que construíram uma história digna de ser lembrada pelo pesquisador

que tem total liberdade de escolher quem biografar. “Tanto a lista de pessoas

biografáveis no mundo quanto às opções dos biógrafos são finitas e não se

restringem a este ou àquele campo. Até porque o (a) biógrafo(a) pode escolher

quem irá biografar. (VILAS BOAS, 2002).

Young (2002 apud VILAS BOAS, 2002, p. 19) diz que a biografia é uma

espécie de disciplina que contém uma linguagem única, sua própria reflexão. A

biografia traz acontecimentos, dados históricos. Ela acaba se tornando um roteiro de

memórias que, somado a acontecimentos relacionados com o biógrafo, resultam em

um novo produto a partir do conhecimento e da vontade em resgatar o passado. Ele

também diz que sem passado não há biografia.

Para Vilas Boas (2002), a biografia apresenta dois princípios básicos tendo o

jornalismo como aliado: o que conta a história mais próxima da realidade, e o que

garante proximidade do receptor com o conteúdo apresentado, partindo do princípio

de pesquisas jornalísticas, que resgatam a memória do biografado. O jornalismo,

segundo o autor, desenvolveu um conjunto de técnicas, conceitos e princípios, que

dão rumo ao biógrafo na hora de descrever, ou escrever sobre o acontecimento.

Para o autor, as técnicas utilizadas pelo jornalista pra contar eventos periódicos, tais

como política, esportes, cultura, muitas vezes não são entendidos por leigos, quando

transcreverem isso para uma biografia, que não é munida de técnicas estritamente

jornalísticas, exceto parte da pesquisa. Ou seja, não é necessário apenas aplicar o

jornalismo aos meios comuns do cotidiano – Televisão, rádio, jornal impresso – para

a biografia também é possível.

O autor Vilas Boas (2002) chama os biógrafos, que na maioria dos casos

são jornalistas, de repórteres especiais. Alguns se denominam repórteres

investigativos e renegam a tradição do biógrafo como catedrático. Stephen B.,

também citado por Vilas Boas, diz que para contar a história de um sujeito escolhido

23

para ser biografado, o biógrafo tende a se apoiar na linguagem, nas imagens,

diálogos, citações, personalidade, detalhes. Ele utiliza-se de símbolos que

caracterizam a “personagem” a uma biografia.

6.2 JORNALISMO CULTURAL

Nos dias de hoje apresenta-se uma dificuldade em definir o termo

“Jornalismo Cultural” presente em periódicos do dia-a-dia ou em revistas. Uma vez

que um conceito seja formado e esclarecido para um leitor, para o outro o mesmo

pode não ocorrer. Tomando como exemplo a “Ilustrada”, caderno de cultura do jornal

Folha de S. Paulo, percebe-se que os temas ali encontrados permeiam assuntos

ligados à arte no geral. Para alguns indivíduos, essa segregação de editorias pode

não fazer sentido uma vez que a existência de um jornal diário que aborde pautas do

cotidiano da sociedade local já caracteriza um produto sociocultural.

O jornalismo cultural encontrado em cadernos como Caderno 2, do Estado

de S. Paulo e o Caderno G, da Gazeta do Povo abordam temas relacionados a

música, cinema e literatura. Com base nisso, Teixeira Coelho (1997, p. 103) diz em

sua obra “Dicionário Crítico de Política Cultural” que a cultura pensada num modo

amplo, como a “ideia de uma forma que caracteriza o modo de vida de uma

comunidade em seu aspecto global”, seguindo a definição, o conceito emerge em

todas as editorias de um veículo de imprensa, já que não é possível desvincular

práticas políticas, econômicas ou esportivas, por exemplo, da cultura em que elas se

manifestam.

Segundo Piza (2004), o jornalismo cultural é inteiramente dedicado a

avaliações de ideias, valores e artes, é um produto de uma era que se inicia depois

do renascimento. “O jornalismo cultural pode sofrer crises de identidade frequentes,

e é bom que sofra – até porque, como na arte, a condição moderna é “crítica”, isto é,

envolve sinais de crise, é instável, cíclica, plural - , mas as dicotomias fáceis só lhe

tem efeito mal”. (PIZA, 2004). Nesse caso, é necessário entendermos o papel do

jornalismo cultural dentro de uma cultura de massa, onde produtos culturais estão

inseridos e prontos para serem consumidos, dentre eles, videodocumentários

24

retratando biografias de conjuntos de rock.

O autor (2004) diz ainda que algumas características do jornalismo cultural

obtiveram mudanças ao longo do tempo. Muitas delas, por crises financeiras que

jornais impressos enfrentaram. Quando o auge do jornalismo cultural teve

decadência total, os editoriais de cultura cederam lugar a “assuntos que não faziam

parte das chamadas “sete artes” (literatura, teatro, pintura, escultura, música,

arquitetura e cinema), como moda e design.” (PIZA, 2004).

O autor (2004) relata também que no jornalismo cultural, o papel do

jornalista inserido na área, é de mostrar a influência da arte na sociedade em que

vive. Assim, como uma análise, permitiria que a vertente jornalística voltasse a ser

feita como antes. O resultado desse feito seria o retorno da imparcialidade dele para

com os produtos a serem expostos ao público geral, que os consome a partir do

papel do jornalista cultural. Seria aplicado como uma espécie de mediador entre o

produto artístico que será consumido e o consumidor.

Já para Faro (2008), a análise dessas restrições ao jornalismo cultural é

pouco complicada, uma vez que ele coloca que “todo jornalista é intelectual”. Para

ele o jornalismo cultural é formado a partir dessa verdade. “Um exemplo são as

afirmações segundo a qual “todo jornalismo é cultural”, uma espécie de verdade

absoluta, ao qual se segue quase sempre uma tautologia: “todo jornalismo é

intelectual””.

Segundo ele (2008), no jornalismo cultural ocorrem alguns trâmites em torno

da avaliação e da análise da produção desse tipo de jornalismo representada pelos

eventos artísticos do mundo social, razão pela qual diversos veículos com as

características já apontadas se prestaram à condição de interpretadores.

6.3 VIDEODOCUMENTÁRIO

25

O autor Nichols (2010) coloca que cada documentário tem uma voz distinta,

assim como cada pessoa possui a sua própria impressão digital. É como uma voz

que fala, a voz fílmica tem um estilo ou uma “natureza” própria. “Ela atesta a

individualidade do cineasta ou diretor, ou, às vezes, o poder de decisão de um

patrocinador ou organização diretora” (NICHOLS, 2010). Para ele (2010), no cinema

as vozes individuais estão a mercê do autor/diretor, ou seja, não possuem

características de sua natureza, uma vez que o que foi dado pelo responsável pela

obra criou algo a ser interpretado por um personagem. “No vídeo e no filme

documentário, podemos identificar seis modos de representação que funcionam

como subgêneros do gênero documentário propriamente dito: poético, expositivo,

participativo, observativo, reflexivo e performático.” (NICHOLS, 2010, p.135).

Essas seis características apresentadas por NICHOLS (2010) determinam

aquilo que o espectador espera. Estabelecem convenções que um determinado

filme pode adotar e propiciam expectativas específicas já aguardadas pelo

espectador, que por sua vez espera ficar satisfeito.

Cada modo compreende exemplos que podemos identificar como protótipos ou modelos: eles parecem expressar de maneira exemplar as características mais peculiares de cada modo. Não podem ser copiados, mas podem ser emulados quando outros cineastas, com outras vozes tentam representar aspectos do mundo histórico de seus próprios pontos de vista distintos. (NICHOLS, 2010, p.138).

O desejo do documentarista em criar um novo tipo de documentário é

aparentemente normal, uma vez que como um conjunto mutável de circunstâncias, o

desejo de propor maneiras diferentes de representar o mundo também contribui para

a formação de cada modo.

Modos novos surgem, em parte, como a resposta às deficiências percebidas nos anteriores, mas a percepção da deficiência surge, em parte, da ideia do que é necessário para representar o mundo histórico de uma perspectiva singular num determinado momento. A aparente neutralidade e o atributo “entenda como quiser” do cinema observativo surgiram no fim dos calmos anos 50 e durante o auge das formas descritivas da sociologia, baseadas na observação. Eles floresceram, em parte, como concretização de um suposto “fim de ideologia” e de um fascínio pelo corriqueiro, mas não

26

necessariamente da afinidade com a situação social difícil ou o ódio político daqueles que estão às margens da sociedade. (NICHOLS, 2010, p.136).

Devemos aceitar que um novo modo de filmagem e de roteiro faz com que a

arte cinematográfica progrida. Assim, dessa forma é capaz de captar aspectos que

jamais foi possível. Sem esquecer-se de processos já realizados, que não excluem

os anteriores nem os sucessores. Assim como um meio de comunicação não é

capaz de excluir um mais antigo.

Um modo novo não é melhor, ele é diferente, embora a ideia de “aperfeiçoamento” seja frequentemente alardeada, especialmente entre os defensores e praticantes de um modo novo. Um modo novo tem um conjunto diferente de ênfases e consequências e, por sua vez, acabará se mostrando vulnerável à crítica pelas limitações que um outro modo de representação prometa ultrapassar. (NICHOLS, 2010, p.140).

Colocando um documentário como uma nova forma pode tornar-se uma

nova ideologia para explicar a nossa relação com a realidade e um novo conjunto de

questões e desejos para inquietar o público. Segundo Nichols (2010) existem sete

tipos de documentários: Ficção Hollywoodiana, Documentário Poético,

Documentários Expositivos, Documentários Observativo, Documentário Participativo,

Documentário Reflexivo e o Documentário Performático. Para produzir o

Videodocumentário “Todo Roqueiro é Gente Fina: A História da Banda A Chave”,

resolvemos se basear no Documentário Participativo, Documentário Reflexivo e

adotar algumas características do Documentário Poético.

6.3.1 DOCUMENTÁRIO PARTICIPATIVO

O Documentário participativo tem como característica a entrevista e a

interação com eles. Usa imagens de arquivo para recuperar a história. Possui fé

excessiva em testemunhas e é evasivo demais. Segundo Nichols (2010) quando

assistimos a documentários participativos, esperamos testemunhar o mundo

histórico de maneira pela qual ele é representado por alguém que nele se engaja

ativamente, e não por alguém que observa discretamente, reconfigura poeticamente

27

ou monta de forma argumentativa esse mundo. Metaforicamente, o autor coloca

uma mosca, que está em quadro, mas em segundo plano, e que acaba se tornando

importante para o documentário. “O cineasta despe o manto do documentário com

voz-over, afasta-se da meditação poética, desce do lugar onde pousou a mosquinha

da parede e torna-se um ator social (quase) como outro qualquer. (Quase como

outro qualquer porque o cineasta guarda pra si a câmera e, com ela, um certo nível

de poder e controle potenciais sobre o acontecimentos)”. (NICHOLS, 2010, p. 154).

6.3.1 DOCUMENTÁRIO REFLEXIVO

Apresenta o caráter dos anos 80, questiona a forma do documentário e tira a

familiaridade dos outros modos. É abstrato demais e perde de vista as questões

concretas. Esse estilo de documentário, segundo Nichols (2010), aborda um caráter

mais consciente de si mesmo. Nas entrelinhas ele é o que mais se questiona.

O acesso realista ao mundo, a capacidade de proporcionar indícios convincentes, a possibilidade de prova incontestável, o vínculo indexador e o que ela representa – toas essas ideias passam a ser suspeitas. O fato de que essas ideias podem forçar uma crença fetichista inspira o documentário reflexivo a examinar a natureza de tal crença em vez de atestar a validade daquilo em que se crê. (NICHOLS, 2010, p.160).

Em suma, o autor diz que o documentário reflexivo estimula o espectador

uma forma mais elevada de consciência a respeito de sua relação com o

documentário e aquilo que ele representa.

6.3.3 DOCUMENTÁRIO POÉTICO

É característico dos anos 1920 reunir fragmentos do mundo de modo

poético. Tem como deficiência a falta de especificidade e por ser de caráter poético,

tende a ser abstrato demais. “O modo poético sacrifica as convenções da montagem

em continuidade, e a ideia de localização muito específica no tempo e no espaço

28

derivada dela, para explorar associações e padrões que envolvem ritmos temporais

e justaposições espaciais”. (NICHOLS, 2010, p.138). Nichols coloca o modelo

poético de uma forma mais qualitativa em relação às demais vertentes do

documentário oriundos do século XX. Essa característica é observada, uma vez que

é colocada a vertente poética como a única a possibilitar formas alternativas de

conhecimento para transferir informações diretamente, dar prosseguimento a um

argumento ou ponto de vista específico ou apresentar preposições sobre problemas

que necessitam solução.

O modo poético começou ainda alinhado ao modernismo, como uma forma de representar a realidade em uma série de fragmentos, impressões subjetivas, atos incoerentes e associações vagas. Essas características foram muitas vezes atribuídas às transformações da industrialização, em geral, e aos efeitos da primeira guerra mundial, em particular. A divisão do tempo e do espaço em múltiplas perspectivas, a negação de coerência a personalidades sujeitas a manifestações do inconsciente e a recusa de soluções para problemas insuperáveis cercam-se de uma sensação de sinceridade, mesmo quando criavam obras de arte confusas ou ambíguas em seus efeitos. (NICHOLS, 2010. p.160).

Embora alguns filmes explorem concepções mais clássicas do poético como

fonte de ordem, integridade e unidade, essa ênfase na fragmentação e na

ambiguidade continua sendo um traço importante em muitos documentários

poéticos.

29

7. METODOLOGIA

As metodologias usadas para este trabalho foram estudo de caso da banda

A Chave, pesquisa exploratória e experimental, com revisão bibliográfica, análise

documental e entrevistas com personagens que estivessem relacionados com a

banda, e a produção de um videodocumentário. O videodocumentário amparado

pelas entrevistas e análise documental vai ajudar a responder nossos objetivos geral

e secundários e no auxílio de afirmar que nossa hipótese de pesquisa estava

correta, parcialmente correta ou incorreta.

O foco da discussão A Chave e imprensa surge a partir de imagens atuais e

imagens nunca mostradas da banda com um olhar mais poético e menos didático,

relatos de integrantes, história da banda, rota dos bares que frequentavam, eventos

que a banda participou, em sua maioria sustentados por livros que envolveram a

época. Dentre eles, "Bandido Que Sabia Latim", biografia do poeta Paulo Leminski

produzida pelo autor Toninho Vaz. A soma desses materiais culminará em um

videodocumentário sobre A Chave.

A partir de técnicas citadas por Bill Nichols em “Introdução ao

Documentário”, dicas de entrevista com a autora Cremilda de Araújo em “Entrevista:

diálogo possível” e noções de como se contar uma história, ou fazer um perfil, com

Sérgio Vilas Boas o videodocumentário “Todo Roqueiro é Gente Fina” mostrará o

trabalho da banda que mesclou poesia com acordes de guitarra e como cano de

escape obtém distorções de amplificadores valvulados.

Para a produção deste projeto de videodocumentário foram utilizados

materiais impressos obtidos de jornais da época em que a banda esteve em

atividade – 1969 a 1979. Os tipos de mídias consultadas: documentários que

abordassem o tema, sites, livros e fanzines6. Os jornais usados para ilustrar a

6 Publicação não official e não profissional, que geralmente é produzida por fãs ou pessoas que tem interesse no assunto abordado

30

relação da banda com a imprensa foram Tribuna do Paraná, Gazeta do Povo, O

Estado do Paraná, Jornal Panorama, de Londrina, Diário do Paraná e Jornal do

Paraná. Pesquisando exemplares do ano de 1975, apenas cinco notas foram

encontradas. Este ano foi importante para a banda, uma vez que tocariam ao lado

do ícone do rock and roll: Bill Haley and his Comets no palco do Teatro Guaíra.

Foram feitas entrevistas informais com pessoas que conheceram o trabalho

da banda A Chave e que ainda vivem na capital paranaense. Algumas entrevistas

foram feitas via e-mail e outras em encontros, uma vez que a fonte não fora avisada

sobre entrevista alguma. As fontes mais usadas foram Carlos Augusto Gaertner,

Orlando Azevedo e Jardel Simões. O baixista, Carlos Caertner e o baterista, Orlando

Azevedo da banda em pesquisa, obtém grande quantidade de material a ser usado

no videodocumentário. Simões, além de responsável pela volta da banda em 2004 e

grande fã da banda, reuniu fotos e recortes de jornais possibilitando a pesquisa mais

a fundo. O fotógrafo Orlando Azevedo, baterista da Chave, também possui um vasto

repertório sobre o assunto. Na época Azevedo já era fotógrafo e com isso registrou

momentos muito importantes para não só a carreira da banda, mas para o futuro da

música na capital paranaense. Com a ajuda dele, autores como Manoel J. Souza

Neto, autor curitibano, descreveu a cena cultural musical de Curitiba em

“[des]Construção da Música na Cultura Paranaense”.

Os tipos de documentários analisados para esse projeto, como “Ervilha da

Fantasia, de Werner Schumann, torna-se próprio, no caráter de originalidade, em

relação aos documentários musicais colocados no mercado. Documentários como o

da banda Foo Fighters 7 , são considerados comuns por apresentar uma linha

cronológica a seguir. Segundo Bill Nichols esse estilo de documentário é chamado

de “Documentário expositivo”. Este é excessivamente didático. Já no modo

escolhido para o videodocumentário “Todo Roqueiro é Gente Fina” foram escolhidos

três vertentes dos documentários citados em “Introdução ao Documentário”, de

Nichols.

Documentário participativo, que possui uma característica mais participativa

7 Banda norte-americana fundada em 1994.

31

com o entrevistado e com a história, documentário no estilo reflexivo, que questiona

a forma do documentário, tirando a familiaridade dos outros modos, e por fim, um

pouco do caráter do documentário poético, que possui fragmentos de mundos

imaginários, tal como ausência da realidade.

Para produzir o videodocumentário foi preciso um olhar mais poético,

misturando realidade com ficção, que também será encontrado no projeto. O projeto

será de caráter mais solto e interpretativo, de modo que faça o receptor tirar

conclusões, mesmo que o caráter didático seja traçado de forma clara e

compreensiva.

Segundo Antônio Carlos Gil, pesquisas exploratórias compreendem uma

forma divergente de outras pesquisas sociais. Ela possui um caráter mais

investigativo, aquele que esclarece ideias sobre o assunto pesquisado. Nesse caso,

a trajetória da banda A Chave, um levantamento bibliográfico de documental,

entrevistas não padronizadas e estudos de caso. “Procedimentos de amostragem e

técnicas quantitativas de coleta de dados não são costumeiramente aplicados

nestas pesquisas”. (GIL, 1999).

Para o autor (1999), o tipo de pesquisa utilizada nesse projeto é realizada

especialmente quando o tema é pouco explorado e torna-se difícil sobre ele formular

hipóteses precisas. O produto final deste processo passa a ser um problema mais

esclarecido, passível de investigação mediante procedimentos mais sistematizados.

A pesquisa documental também é usada para explorar o projeto do

videodocumentário. Esse tipo de pesquisa consiste em explorar as fontes

documentais, que são em grande número.

Existem, de um lado, os documentos de primeira mão, que não receberam qualquer tratamento analítico, tais como: documentos oficiais, reportagens de jornal, cartas, contratos, diários, filmes, fotografias, gravações, etc. De outro lado, excitemos documentos de segunda mão, que de alguma forma já foram analisados, tais como: relatórios de pesquisa, relatórios de empresas, tabelas estatísticas, etc. (GIL, 1999, p.99 ).

Aqui, não necessita um tratamento mais analítico, ou seja, que já não

32

receberam um tratamento “especial”, e que ainda podem ser reelaborados de acordo

com os objetivos da pesquisa.

8. DELINEAMENTO DO PRODUTO

Um videodocumentário, assim como qualquer outra forma de biografia,

exemplifica quase por inteiro a história daquilo que quer será resgatado. Nesse

formato são apresentadas fotos, músicas, entrevistas, passagens, que simbolizam

ou que recriam aquilo que vai ser resgatado. Para “Todo Roqueiro é Gente Fina”

todos esses recursos foram utilizados, dando a condição de resgate do período

proposto: 10 anos da primeira banda de Rock, aqui no Paraná, a produzir músicas

próprias.

8.1 SINOPSE

“Todo Roqueiro é Gente Fina” deve traçar a história da extinta banda

paranaense A Chave. A união dos músicos em 1969, sua passagem pelo cenário

musical nacional durante a década seguinte, 1970, o envolvimento com o poeta

Paulo Leminski Filho, a gravação do único compacto e o fim em 1979 da formação

original. Entrevistas com membros da banda, fãs e colecionadores estarão ilustrando

ao máximo o que foi o legado D’A Chave.

8.2 ARGUMENTO

A banda A Chave foi à pioneira em solo paranaense, a compor canções de

rock. Juntaram-se a poesia concreta de Paulo Leminski e “decolaram” no cenário

33

musical brasileiro. Bandas como Rita Lee & Tutti Frutti, Made in Brazil, Mutantes,

Som nosso de Cada Dia (o tecladista/ saxofonista Manito era muito amigo do

quarteto. Chegou a gravar as duas músicas do único compacto da banda, O Peso.

Elas também foram bandas que passaram pela capital paranaense, a fim de visitar

os amigos que até então moravam em uma casa, denominada “A Casa Branca”,

onde a arte (em todas as formas) era divulgada para o Brasil. O videodocumentário

biográfico tem como objetivo resgatar a memória de uma das bandas mais

importantes do estado do Paraná. Tem como objetivo difundir uma área tão pouco

explorada por críticos, fãs e até pelos integrantes da banda.

8.3 PROPOSTA

O videodocumentário tem como objetivo resgatar a história da banda que foi

pouco explorada em solo paranaense e do Brasil. “Todo Roqueiro é Gente Fina”

pretende trazer à tona a memória cultural da música paranaense, focada em quatro

figuras muito importantes para o avanço da arte no estado do Paraná e o

entendimento desse processo todo: Ivo Rodrigues, Paulo Teixeira, Orlando Azevedo

e Carlos Augusto Gaertner. Alguns documentários e obras biográficas (ou não)

analisados e colocados como próximos ao projeto em questão: “Ervilha da Fantasia”,

“Polaco Louco Paca”, “Para Limpar Lágrimas”, o filme “Ex-Isto” e o romance-ideia 8"Catatau".

8.4 DESCRIÇÃO DO OBJETO

Este projeto de videodocumentário é baseado na história da banda

paranaense A Chave e da vida dos quatro integrantes: Ivo Rodrigues, Paulo

Teixeira, Orlando Azevedo e Carlos Augusto Gaertner. A essência do registro

surgirá do envolvimento com os entrevistados em frente a uma câmera, somado a

abordagem abstrata de outros videodocumentários que serviram de influência para o 8 Pode ser chamado também de romance filosófico ou aenas romance. O termo foi criado pelo poeta Paulo Leminski.

34

projeto. A forma com que será abordado o documento é de característica universal,

mas moldada a características não usuais em demais àqueles videodocumentários,

que resgatam histórias. Tomadas, ângulos tentam acompanhar a história, do mesmo

jeito que o conjunto tentou projetar-se no cenário musical: de forma criativa, mas

sem perder a essência de um documentário.

Duração: 30 minutos

8.5 ABORDAGEM

Documentários do estilo Participativo, Reflexivo e Poético serão explorados

em sua totalidade. Serão realizadas entrevistas em forma de depoimento, mas sem

cair no modo didático, muito utilizado no cinema dos anos 20. O modelo preto e

branco do videodocumentário foi escolhido para uso uma vez que se tem como

objetivo acompanhar traços característicos da banda.

8.6 ESTRUTURA

A partir de entrevistas e ficção, o videodocumentário tomará forma, uma vez

que assuntos interligados a banda podem surgir, de forma que não se distanciem do

assunto proposto: documentar a história da banda A Chave. Um exemplo disso

seriam as poesias que serviam de base para criação de melodias e composições.

Trechos de músicas serão utilizados para ilustrar composições que jamais foram

gravadas.

A estrutura do videodocumentário:

1) Começa com uma representação de uma pessoa colocando um compacto em

um toca-discos, dando início a história d’A Chave

2) Primeiro entrevistado, Paulo Teixeira. Ele é quem vai dar o pontapé inicial da

história do grupo.

35

3) Logo em seguida, temos Orlando Azevedo, dialogando com Teixeira sobre a

história da banda. Algumas imagens em forma de fotografia da época foram

utilizadas para ilustrar o assunto que é tratado pelos dois.

4) Carlos Augusto Gaertner, baixista do grupo, entra após 4 minutos,

simbolizando a sua entrada tardia na formação da banda.

5) A partir daí, os três dialogam com complementos de mais três entrevistados:

Luiz Groff, Lucas Nieri e Luiz Carraro.

6) Entre os diálogos algumas faixas musicais compostas pela Chave aparecem

de fundo, a fim de complementar o assunto discutido.

7) Ao final do documentário temos Paulo Teixeira tocando a faixa que dá nome

ao videodocumentário.

8) Os créditos são apresentados junto à sonorização deita por Teixeira.

8.7 PÚBLICO-ALVO

Esse videodocumentário visa atingir admiradores de três vertentes da arte:

cinema, música e poesia, uma vez que o projeto tende ser abordado pelo formato

abstrato. Abrange também o público que acompanhou na época os caminhos da

banda A Chave, e tem a curiosidade de relembrar os dez anos de estrada da

primeira banda paranaense a compor uma canção de rock. Também agrega o

público jovem que é atraído por cultura no geral. Tem como um dos objetivos ser

exibido na Biblioteca Pública do Paraná, cinemateca e em mostras de cinema que

acontecerem na capital, ou até mesmo em cidades do interior.

8.8 PROCESSO DE GRAVAÇÃO

Para a gravação de “Todo Roqueiro é Gente Fina” foram usadas duas

36

câmeras do modelo Canon Rebel, com diferentes lentes. Foi escolhida a “olho de

peixe” para alguns entrevistados, a fim de criar um caráter mais poético e menos

usual nos demais vídeo, já apontado por Nichols. Outra característica marcante

nesse tipo de lente é a retratação do modo de filmagem presente nos anos 60 ou até

em filmagens Super 8.

A presença das duas câmeras por integrantes da banda é proposital

justamente para captar de outros ângulos a reação do entrevistado ao resgatar sua

memória dentro de uma banda de rock de grande expressão. Também foi escolhida

a mudança da fotografia dentro do videodocumentário por uma questão de opção.

Preto e branco retratam sentimentos e memória.

8.9 LINGUAGEM

No Resgate d’A Chave foi importante criar um tipo de linguagem, que

seguisse a verve do grupo. Poesia e música concreta fizeram boa parte da história

da Chave. Ruídos estão presentes no videodocumentário de forma proposital, assim

como intervalos de poucos segundos entre a troca de assuntos. Assim como na

música, a imagem em movimento precisa de respiro9.

Em música, podemos chamar o respiro de intervalo. Segundo Med (1996),

intervalo é a diferença de altura entre dois sons, é a relação entre duas alturas e é

também o espaço que separa um som do outro. Altura, divide-se entre absoluta10 e

relativa11. Como esse respiro o telespectador é capaz de processar o que foi lhe

dito, estando assim preparado capítulo a capítulo.

9 Descanso, repouso ou intervalo. 10 Do som é a altura exata, correspondente a um determinado número de vibrações 11 Do som é o resultado da comparação entre sons (no mínimo dois)

37

9. CONCLUSÃO

Concluímos que a banda A Chave, primeira banda de rock autoral no

Paraná, teve uma grande influência para o cenário rock/cultural do estado e

nacionalmente falando. Junto com outras bandas, que foram contemporâneas a ela

e existem até hoje, obtiveram reconhecimento no universo rock.

Vale lembrar, que nas entrevistas, foi expressado isso de forma verbal e

também de forma expressiva para cada entrevistado. Foi concluído também, que o

período de 1975, que no inicio foi colocado como importante em nossa hipótese

estruturadora de pesquisa, por ser a abertura do show do Bil Halley and His Comets,

passou a não a não ser tão significativo para o videodocumentario e até para os

membros d’A Chave. Para eles, a construção e produção de músicas dentro dos 10

anos de existência recebe forma e importância maior.

“Todo Roqueiro é Gente Fina” alcançou o objetivo de contar a história do

grupo e passar a sua importância a nível nacional, junto às demais bandas, que

citadas no videodocumentário formavam a “nata” do rock nacional na década de

1970.

O processo de gravação e inteiração com os entrevistados foi intenso, uma

vez que resgatar a história de uma banda, que relativamente sobreviveu do boca a

boca e não de algo concreto, exceto o compacto lançado no final de sua carreira. Os

dados coletados foram praticamente escassos. Problemas de comunicação também

quase foram uma barreira a ponto de fazer desistir. Questões não resolvidas entre

integrantes, ego, brigas internas quase fez com que esse trabalho não fosse

concluído. Depois de dois anos de tentativa, o conseguimos constatar que

realmente, Todo Roqueiro é Gente fina. O título escolhido foi escolhido a partir de

uma composição, não gravada, que no fim fez sentido. A história foi compartilhada,

foi contada e com certeza outras aparecerão.

38

10. CRONOGRAMA

2º Semestre 2014

Atividades jul ago set out nov

Metodologia e execução X X

Pré-entrevista X X

Pré-produção X X

Elaboração do roteiro X

Produção do DOC X X

Decupagem X X

Edição X X

Redação Final X X

Apresentação Final X

39

11. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ADORNO, T. “A Industria Cultural”. In: Cohn, G (org) Comunicação e Industria Cultural. São Paulo: Nacional, 1975. CALADO, Carlos. A Divina Comédia dos Mutantes. São Paulo: Editora 34, 1995. CANDAL, Rômulo. “Garoa e Solidão: O Rock’n’Roll Curitibano Abordado em Almanaque. Curitiba, 2014. DAPIEVE, Arthur. BRock – O Rock Brasileiro dos Anos 80. São Paulo: Editora 34, 1995. DUARTE, R. Teoria Crítica da Indústria Cultural. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003. EAGLETON, T. The Idea of Culture. Oxford: Blackwell Publishing, 2000. FRIEDLANDER, Paul. Rock and Roll: Uma História Social. São Paulo. Ed. Record, 2006. GIL, Antônio Carlos. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. São Paulo: Ed Atlas, 1999. LEMINSKI, Paulo. Música Com Gosto de Pinhão. Correio de Notícia. Curitiba: 18/01/1987. MED, Bohumil. Teoria da Música. Brasília. Editora Musimed, 1996. MEDINA, Cremilda de Araújo. Entrevista: O Diálogo Possível. São Paulo. Ed Ática, 2002. Nichols, Bill. Introdução ao Documentário. São Paulo: Papirus Editora 5 ed. 2010. PIZA, Daniel. Jornalismo Cultural. São Paulo: Editora Contexto 4 ed. 2011. ROCHA LEITE, E. Leminski: o Poeta da Diferença. EDUSP, 2012. SOUZA NETO, Manoel J. [des] Construção da Música na Cultura Paranaense. Curitiba: Ed Aos quatro ventos, 2004. VAZ, Toninho. O Bandido que Sabia Latim. Ed. Record 1 Edição, 2008.

40

VILAS BOAS, Sergio. Biografia e Biógrafos – Jornalismo Sobre Personagens. São Paulo: 2 ed. 2002. VINIL, Kid. Almanaque do Rock. São Paulo. Ed. Ediouro. Março, 2008. WOLFE, Tom. Radical Chique e o Novo Jornalismo. São Paulo. Companhia das letras. Fevereiro, 2005.

41

12. ANEXOS

Luiz Calanca

- Pode começar

- Você não vai fazer uma pergunta?

- Não, é livre.

- Legal! Eu abri minha loja em 78, e já conhecia a Chave de ouvir falar em casa de

amigos. Eu não tinha o disco, adquiri depois aqui na loja. Eu acho bacana lembrar

dessas bandas do mesmo período da Chave, como O Terço, Casa das Máquinas,

Made in Brazil, Joelho de Porco. Eu vim de uma época em que era difícil conseguir

todos os tipos de disco de bandas. Era complicado achar loja que colocasse de tudo

pra vender. Eu lembro de ter escutado Beatles pela primeira vez e achar que eles

estavam copiando Renato e seus Blues caps. Aliás, quando eu pensei em abri a

minha loja, a Baratos Afins, eu tinha pensado em vender só lps que não pudessem

ser encontrados por aí, ser um lance segmentado mesmo. Temos exemplos de

bandas que tinha um baita potencial, mas que ficava a mercê das lojas ou até das

rádios em tocar o material. Aquela época era difícil mesmo, ms acho que a mídia

focava mais nas coisas daqui do que coisas de fora, bem mais o que hoje.

Atualmente tudo vai pelo ralo, temos mania de valorizar sempre o que vem de fora.

Muitas vezes o referencial era, por exemplo, um músico mais famoso, que

gravou/produziu uma banda que não era do meio. Você chegava a buscar de

alguma forma aquela banda que o artista famoso teve alguma relação, como o caso

do Manito com a Chave. Foi a Chave, né?

- Sim, gravou sax e piano no single.

- Isso mesmo. Naquela época era mais por indicação mesmo, quando não saia em

revistas, jornais, etc. Hoje, graças a Deus, tem a inernet que é capaz de resgatar um

monte de material que nunca foi botado na roda. Esse disco pirata da banda eu só

tenho em mp3, no meu computador. Não tenho uma cópia em cd. Era diferente, por

exemplo, dos anos 80, que muita coisa tocava em rádio ou aparecia em revista. Era

comum, também, ter grandes casas de shows, onde as bandas faziam a via sacra,

passavam por todos os lugares. Até parecia que a música aqui ia decolar mesmo.

As pessoas tinham acesso. Isso meio que morreu. Ah, também é bom lembrar que

não temos mais alguma rádio especializada em rock. Mas a Chave, sem dúvida, era

42

uma banda ao nível das outras que eu já havia citado. Muitas vezes até melhor,

sabe? Com peso, e pegada. Sem falar nas letras. Aliás, acho que a banda tinha um

ponto bem positivo de ter um puta letrista, que era o Paulo Leminski, que escrevia

muitas letras da banda. Um ícone da literatura brasileira. Muito legal a tua iniciativa

com esse trabalho. O Brasil foi e é repleto de bandas, mas o pessoal só fica preso a

Mutantes e os que fizeram sucesso. Muitas bandas foram esquecidas, como Os

Incríveis, Jet Blacks , muita banda instrumental, tipo o Jordans, que foram

praticamente esquecidas. O Jordans estão tocando até hoje. Fizemos o show deles

no Sesc Pompéia agora pouco tempo atrás. O legal também é sacar que os outros

países também estão de olho nas nossas bandas, inclusive devem saber muito mais

do que nós mesmos sobre. Inclusive ontem eu postei um som da Chave e um amigo

meu, que conhecia o material da banda, veio conversar sobre as falcilidades dos

músicos hoje em dia. Parece que a música perdeu um pouco da alma, acho que os

µúsicos ficaram todos vagabundos com essas facilidades. Com todo respeito aos

que usam modernidades, mas acho que a música perdeu muito feeling. Sabe?

Então, acho que é válido sempre procurar o que havia no passado e sacar que

desde a música até a produção artística eram mais impactantes do que os de hoje

em dia.

Luiz Sergio Carlini

- Como você conheceu a Chave? Como foi sua convivência com a banda em

Curitiba, ou até aqui em São Paulo?

- Bem, assim. Quando comecei com Rita Lee e Tutti Frutti, talvez a Chave já

existisse. Logo que começamos, a banda com Lee Marcuci, Lucia Turnbul, nosso

bateristas era o Emilson Colantoni, Rita e eu. E de 1973 pra 74, nós fomos pra

estrada pra apresentar o primeiro disco, o Atrás do Porto de Uma Ciade” , e

consequentemente fomos pra Curitiba tocar no teatro Paiol. Tá lá até hoje. Lembro

de estar um frio insuportável e que ficávamos nos aquecendo num aquecedor antes

de entrar no palco. Lembro também de andar com a Chave pra cima e pra baixo

numa Kombi, que era da banda. Foi assim que conheci o Ivo, o Carlão, Paulo

Leminski, Orlando e o Paulinho Teixeira. Lembro também que tinham o próprio

estúdio de ensaio. O legal era que saímos naquela Kombi, a banda toda, pra

passear. Fizemos isso várias vezes quando estávamos lá. Essse foi meu primeiro

43

contato com a banda. Uma outra grande oportunidade de encontra-los foi num

festival que aconteceu, o Festival Praia de Lest, no Paraná. Em 1975. A Chave

esteve por lá também, eles tinham acabado de conseguir um equipamento super

foda. Tudo do bom e do melhor. Ficamos amigos, inclusive lembro de uma história

da banda onde nos shows, a plateia arremessava chaves no palco. Muito doido!

Quem me contou isso foi o Orlando! A Chave rolava! Era a banda de rock de

Curitiba, que estava atuando nos anos 60 e 70. Na verdade, por afinidade, talvez, eu

e o Carlão nos tornamos muito amigos. Inclusive temos até uma banda juntos, o

Bartenders. Meu contato era ele! Mas da Chave lembro desse festival e de passear

muito com eles pela noite de Curitiba. Legal! Banda que é o alicerce do rock

nacional, assim como os mutantes da época. Era uma banda de extrema

importância. O embrião do Blindagem, né? É isso, cara!

Luiz Maurício “Miau” Carraro

- Então, Miau! Como você conheceu a Chave?

- Então, era o único grupo de rock que tinha em Curitiba, né?! Não me lembro quem

me apresentou o grupo, mas lembro de ir em todos os shows que eles faziam.

Lembro bem que a sociedade hípica tinha uma boatinha e eles tocavam lá direto.

Lembro do Ivo cantando In-a-gadda-da-vida , com aquele cabelão enorme ele

deitava no chão e a galera ia ao delírio. E com o passar do tempo eu fui convivendo

com a banda através do Helinho Pimentel eu fui ficando amigo deles. Fui ficando

amigo, amigo. Nessa época eu me envolvi com música e cheguei a ensaiar com

eles. Ensaiar, não. A gente passava umas músicas que eu tinha e tal. O final de

semana inteiro. Com o Paulo Leminski, o Ivo, o Paulinho, Orlando, Carlão e o

Helinho Pimentel, que era o agregador dessa galera toda. O João Lopes também

apareceu e participou desse movimento de rock. Eu era apenas o caçulinha do

grupo, um piá de bosta, mas já convivia com essa turma.

- E ela chegou a ter uma boa projeção aqui em Curitiba? Não merecida, mas nessa

época A Chave era muito falada?

- Assim, a galera em Curitiba, os “loucos” eram no máximo, 200 loucos. Todo mundo

se conhecia! E o barato era que ninguém ficava estagnado musicalmente, o pessoal

gostava de coisa nova e não ficavam apenas em Roberto Carlos, Erasmo Carlos e

44

Chico Buarque. Essa galera era louca pela Chave, tinha um movimento grande, mas

não envolvia a cidade inteira, né?! Até porque era separada em loucos x caretas. Os

caretas não gostavam da Chave. Os loucos é que gostavam.

- Foi me passado, que na época ou até um pouco antes da Chave, existia Os

Metralhas.

- Os Metralhas, era o seguinte, mais pop. Coisa de rádio! Era um rock bem pop,

junto aos Beatles. A Chave era alternativo, um rock pesado. E sem preocupação.

- Musica autoral, né?!

- Musica autoral, exatamente!

- E você lembra de ter ido em algum show da Chave com alguma banda de fora do

estado?

- Lembro de festivais. Festival de Matinhos, o show da Chave com a Rita Lee e o da

Nina Hagen no estádio do Coxa. Foi muito legal! Eu lembro também de um show da

Chave em Joinville, que estávamos indo pra Barra do Saí, onde a banda estava

hospedada e no meio da estrada a gente parou a Kombi e o Ivo, o João Lopes e o

Belo, um amigo nosso do interior do Paraná saíram correndo atrás de um tatu.

Lógico, o tatu foi mais rápido e eles não tiveram sucesso. Mas enfim, foi uma época

muito legal e produtiva. O Leminski participava muito de processo de criação. Quem

convivia muito com a Chave, eram uma 50 pessoas, que inclusive vivam uma paixão

muito doida. Curtíamos um lance muito bacana.

- Você acha que existe muita diferença entre o processo de criação da Chave e de

bandas do contexto atual?

- Olha, assim, não acompanho muito o processo das bandas de hoje em dia, mas o

pouco que escuto dá pra sacar que um vem com a poesia ou a letra e o outro bem

com arranjo. Trabalham naquilo até ficar numa métrica legal. Naquela época, eu

lembro do Leminski e o Ivo junto e meses depois aquilo virava uma música, sabe?! A

música já vinha junto com a letra. Depois os poemas do Leminski virava, mas no

total era muito instintivo.

Naquela época, Os Metralhas tocavam em rádio, era um lance mais pop, como eu já

te disse. A Chave sempre trazia bandas de fora pra tocar aqui. Era super legal, mas

por outro lado era difícil ver essas bandas levando a Chave pra fora do estado,

sabe?! Não entendia isso. Talvez fosse ciúmes ou medo de que a banda realmente

estourasse. A Chave era foda, cara. O Ivo tinha a melhor voz do Brasil sem dúvida

alguma. Era uma grande potência.

45

Gilberto Nogueira

- Então, Giba! O que você tem a falar sobre A Chave?

- O que mais me impressionava nos shows da Chave era a qualidade dos músicos,

mas de cara, mesmo, o que me fez prestar atenção na Chave, foi a guitarra do

Paulinho! Ele tinha uma pegada diferente, o jeito de construir os solos, muito bem

feito. Isso me impressionou! Ah, claro, o peso do baixo do Carlão! Depois eu

descobri o que ele fazia. Ele simplesmente pegava e botava o grave no 10 e o

agudo, no zero. E Pau! Qualidade Marshall, com a válvula, um baixo Fender de

qualidade só podia dar no que deu. Ficava uma “cama” muito boa pro Paulinho

construir solos e pro Ivo cantar. Claro, o Ivo. Ele tinha aquele vocal, aquele visual

típico dos roqueiros da década de 70. Estilo próprio. Os primeiros cabeludos da

história da música. Ali fechou! Bateria do Orlando sensacional e claro, qualidade das

letras. Letras bem bolas. Enfim, todas as qualidades que uma banda de rock tem e

tem que ter. Pena hoje em dia isso ter acabado um pouco, os conceitos são outros!

Judith Vieira Magalhães

- Então, Juju! Pode começar falando como você conheceu a Chave e como foi sua

trajetória com ela.

- Eu conheci a Chave, como eu já te disse, através de um amigo meu, o Billy. Eu

tinha acabado de chegar em Curitiba e estávamos pouco tempo aqui. Eles estava

me apresentando as coisas aqui da cidade, e foi uma surpresa ver a banda. Ele me

apresentou a banda dizendo que eles eram incríveis, que tocavam Rolling Stones,

Led Zeppelin super bem e que o vocalista cantava muito. Não, minto, ele nem

elogiava muito, mas quando vi pela primeira vez a voz do Ivo, realmente a voz dele

era demais. Ninguém tinha uma voz daquela. Nenhuma banda no Brasil tinha uma

voz daquela. Uma pena não ter estourado! Realmente, a guitarra do Paulinho

também era muito boa. O Orlando, naquela época não tinha entrado na banda. Mas

quando entrou, também tinha uma figura muito boa como baterista. Ficou incrível

depois! Mas calma aí, acho que ele não era baterista, né?

46

- É, ele era o produtor da banda antes. Quem era o batera era o Gianfranco.

- Ah, você já sabe mais ou menos a história, né?

- Mais ou menos, mais ou menos. Pode continuar.

- Eu esqueço. Eu pensei “pô, poderia ter me perguntado isso há uns 10 anos atrás”

eu diria bem melhor. Então, a meninada era adorada, mexia mesmo. Vou dar um

pulo na história aqui, mas lembrei de como eles eram com o lance de comprar os

equipamentos. Aqueles que conseguiram com o CR Almeida e tal. Eles tinham um

caderninho, tipo uma meta, em que tinham que cumprir pra poder pagar toda a

aparelhagem que foi comprada mas acabou que não deu muito certo. Comecei a

preparar bailes pra poder arrecadar grana pra banda. O legal é que foi um sucesso,

fizemos três. Meu irmão fazia os cartazes, ele era um excelente ilustrador, e logo

depois de pronto eu ia até uma gráfica e já espalhava por tudo. Era muito legal! O

sucesso foi tão grande que o meu quartinho ficava lotado de dinheiro, até debaixo do

meu colchão tinha, pois não tinha nem onde guardar. Era difícil fazer vários assim,

pois eles viajavam bastante. Numa dessas viagens o Ivo deu uma palhinha solo e a

galera foi ao delírio. Na verdade, acho que o Ivo já devia ter começado a fazer isso

antes. Na verdade, achei que ele já iria começar a fazer isso antes do que ele já

tinha começado. Ter a Chave e um lado mais country, sozinho. Mais tarde ele se

juntou com o pessoal do Blindagem e tal. Ele, quando entrou no Blindagem, nem

tinha me falado nada. Fui descobri depois. A Chave meio que estava em crise, eles

já não estavam mais se entendo como banda e o Ivo foi procurar outras pessoas,

acho. O nosso relacionamento também já não estava muito bem. Dizem que depois

dos sete anos vem uma crise no relacionamento, né?! Ou você supera ou acaba.

- Como era a convivência na casa branca?

- Era muito boa. Muita gente, Muita loucura. No começo eu ia lá, encontrava o Ivo a

gente namorava e tal. Mais tarde eu o encontrava nos shows Eles tinham os

horários deles e eu tinha os meus, né?! De vez enquanto a gente combinada de sair,

mas por a casa estar lotada, acabávamos por abortar a ideia. Depois de um tempo

os meninos, Carlão e Orlando, punham uma certa ordem, pois estava começando a

ficar difícil com tanta gente rodando por lá. Era uma coisa Organizada, não era uma

loucura e tal. Por exemplo, quando vinha alguém de fora, algum músico de fora eles

mantinham a ordem. Mas fora isso, não. Era uma coisa que funcionava. Eles eram

sérios, tinham uma rotina de banda e de criação.

- Lembra como era o processo de criação?

47

- Lembro de quando a banda foi pra chácara do avô do Carlão ensaiar shows e

trabalhar em novas composições. Eles ficaram três meses lá compondo todas as

músicas que o pessoal conhece. Bem quase todas! Eu ia lá nos finais de semana

junto do meu irmão, o Sam. Levávamos cerveja, galinha, comida. Era bem bacana!

Mas eles era muito sérios no lance da composição. Muito rígidos e centrados naquilo

que queriam.