12
intuitio ISSN Porto Alegre Vol.6 Nº.1 Junho p.229-240 1983-4012 2013 A IDÉIA DE CIÊNCIA NA FENOMENOLOGIA DE HUSSERL A PARTIR DA SEXTA INVESTIGAÇÃO LÓGICA The idea of science in Husserl’s phenomenology from sixth Logic Investigation Adelar Conceição* Resumo: O tema do presente texto refere-se à idéia de ciência na fenomenologia de Husserl analisada a partir de uma leitura da sexta investigação lógica. Para tanto, parte-se de uma análise da introdução e da parte inicial das Investigações lógicas, dedicada a fundamentação de uma lógica pura enquanto fundamento de uma teoria do conhecimento, da qual Husserl extrai sua crítica ao psicologismo e funda o terreno propriamente fenomenológico como “ciência de essências”. Em seguida tomaremos a idéia de ciênciaexpressa em A filosofia como ciência de rigor, na qual Husserl apresenta de maneira definitiva seu ideal de ciência dentro do quadro da fenomenologia clássica. Com base na definição ali apresentada de ciência como “intuição de essência”, retornamos a sexta investigação lógica e procuraremos mostrar como Husserl pretende fundar a idéia de ciência e de conhecimento em geral a partir da noção de “intuição categorial”. Palavras-chave: ciência; fenomenologia; Husserl. Abstract: The theme of this text refers to the idea of science in Husserl's phenomenology analyzed from a reading of the sixth logical investigation. To do so, one starts with an analysis of the introduction and the early part of the Logical Investigations, a foundation dedicated to pure logic as the basis for a theory of knowledge, which Husserl draws its critique of psychologism and founds the terrain itself as phenomenological science of essences”. Then we will take the "idea of science" expressed in Philosophy as rigorous science, in which Husserl presents definitively his ideal of science within the framework of classical phenomenology. Based on the definition of science presented here as “intuition of essence”, returned the sixth logical investigation and try to show how Husserl claims to base the idea of science and knowledge in general from the notion of “categorical intuition”. Keywords: science; phenomenology; Husserl. * Doutorando em Filosofia, Programa de Pós-graduação em Filosofia UFRGS. Contato: [email protected]

13635-54132-1-PB.pdf

Embed Size (px)

Citation preview

  • intuitio ISSN Porto Alegre Vol.6 N.1 Junho p.229-240 1983-4012 2013

    A IDIA DE CINCIA NA FENOMENOLOGIA DE HUSSERL

    A PARTIR DA SEXTA INVESTIGAO LGICA

    The idea of science in Husserls phenomenology from sixth Logic Investigation

    Adelar Conceio*

    Resumo: O tema do presente texto refere-se

    idia de cincia na fenomenologia de Husserl

    analisada a partir de uma leitura da sexta

    investigao lgica. Para tanto, parte-se de uma

    anlise da introduo e da parte inicial das

    Investigaes lgicas, dedicada a fundamentao

    de uma lgica pura enquanto fundamento de uma

    teoria do conhecimento, da qual Husserl extrai

    sua crtica ao psicologismo e funda o terreno

    propriamente fenomenolgico como cincia de essncias. Em seguida tomaremos a idia de cincia expressa em A filosofia como cincia de rigor, na qual Husserl apresenta de maneira

    definitiva seu ideal de cincia dentro do quadro

    da fenomenologia clssica. Com base na

    definio ali apresentada de cincia como

    intuio de essncia, retornamos a sexta investigao lgica e procuraremos mostrar

    como Husserl pretende fundar a idia de cincia e

    de conhecimento em geral a partir da noo de

    intuio categorial. Palavras-chave: cincia; fenomenologia;

    Husserl.

    Abstract: The theme of this text refers to the

    idea of science in Husserl's phenomenology

    analyzed from a reading of the sixth logical

    investigation. To do so, one starts with an

    analysis of the introduction and the early part of

    the Logical Investigations, a foundation

    dedicated to pure logic as the basis for a theory of

    knowledge, which Husserl draws its critique of

    psychologism and founds the terrain itself as

    phenomenological science of essences. Then we will take the "idea of science" expressed in

    Philosophy as rigorous science, in which Husserl

    presents definitively his ideal of science within

    the framework of classical phenomenology.

    Based on the definition of science presented here

    as intuition of essence, returned the sixth logical investigation and try to show how Husserl

    claims to base the idea of science and knowledge

    in general from the notion of categorical intuition. Keywords: science; phenomenology; Husserl.

    * Doutorando em Filosofia, Programa de Ps-graduao em Filosofia UFRGS. Contato: [email protected]

  • Adelar Conceio A IDIA DE CINCIA NA FENOMENOLOGIA DE HUSSERL A PARTIR DA SEXTA

    INVESTIGAO LGICA

    intuitio ISSN Porto Alegre Vol.6 N.1 Junho p.229-240 1983-4012 2013

    1. A fenomenologia como mtodo das cincias

    As Investigaes Lgicas (1900/01) de Edmund Husserl est dividida em duas grandes partes,

    a primeira (tomo I) trata dos Prolegomenos a uma lgica pura, enquanto a segunda (tomo II) se refere

    s Investigaes para a fenomenologia e a teoria do conhecimento. Pela diviso da obra e o contedo

    dos subttulos possvel ter uma idia da dimenso do projeto husserliano. Trata-se do que o autor ir

    considerar posteriormente o esboo de uma cincia pura dos fundamentos do conhecimento, no

    apenas da filosofia, mas das cincias em geral.

    1.1. A lgica como teoria do conhecimento

    A introduo das Investigaes exemplifica de maneira clara os problemas com os quais

    Husserl se defronta desde a Filosofia da Aritmtica (1891), convergindo para o problema do

    fundamento da cincia, sua verdade e unidade. Contudo, diferente da posio adotada na obra anterior,

    onde se pretende uma reduo do conceito de nmero ao resultado de operaes subjetivas de ordem

    psquica explicveis pela psicologia, trata-se aqui justamente da crtica desta forma de psicologismo:

    De fato, ns esperamos poder explicar claramente, na investigao que se segue, que a lgica anterior, e sobretudo a lgica atual, fundada sobre a psicologia,

    sucumbe quase sem exceo aos perigos que ns havermos de indicar, e que o

    progresso no conhecimento da lgica est fundamentalmente paralisado por esta

    interpretao errnea dos princpios tericos e pela confuso de domnios que da

    resulta 1.

    Para Husserl trata-se primeiro de uma limpeza do terreno da lgica para em seguida passar aos

    seus fundamentos tericos, pois disto depender a possibilidade da teoria do conhecimento e

    conseqentemente da prpria objetividade do conhecimento. Assim logo de incio Husserl nos deixa

    confrontados com duas possibilidades: ou a lgica uma disciplina terica, independente da

    psicologia e ao mesmo tempo formal e demonstrativa, ou uma tecnologia dependente da psicologia

    2. Estas duas alternativas convertem-se por um lado na contraposio entre uma disciplina apriorstica

    e demonstrativa e uma disciplina emprica e indutiva.

    Assim, o esforo de Husserl no incio das Investigaes mostrar a imperfeio terica das

    cincias particulares, seu carter fundado e, portanto, sua incapacidade de perguntar pelos seus

    prprios princpios. Diz-nos o autor que precisamente o matemtico, o fsico, o astrnomo, no

    necessitam recorrer aos fundamentos ltimos de sua atividade para levar a bom termo seus trabalhos

    cientficos, contudo, ficam assim impossibilitados de provar estes mesmos pressupostos sobre os quais

    repousa a validade de suas concluses.

    1 Husserl, Edmund. Recherches Logiques. Tome premier: Prolgomnes la logique pure. Trad. de Hubert Elie,

    Arion L. Kelkel e Ren Scherer. Paris: Presses Universitaires de France,1969. p, 5. 2 Husserl, Edmund. Recherches Logiques. Tome premier: Prolgomnes la logique pure. Trad. de Hubert Elie,

    Arion L. Kelkel e Ren Scherer. Paris: Presses Universitaires de France,1969. p, 6.

  • Adelar Conceio A IDIA DE CINCIA NA FENOMENOLOGIA DE HUSSERL A PARTIR DA SEXTA

    INVESTIGAO LGICA

    intuitio ISSN Porto Alegre Vol.6 N.1 Junho p.229-240 1983-4012 2013

    Os pressupostos de ordem metafsica no crticos, tomados como fundamento das cincias, so

    o pressuposto de que h um mundo exterior compreendido no espao e no tempo, que todo devir est

    submetido lei da causalidade, etc.; contudo, estes fundamentos, que levam erroneamente o nome de

    teoria do conhecimento, no so suficientes para restituir a perfeio terica subtrada das cincias

    particulares, eles concernem somente as cincias que so afetadas pela realidade natural, este no o

    caso de todas as cincias, e certamente no das cincias puramente matemticas, que tem por objeto os

    nomes, as multiplicidades e outras coisas do gnero, que ns pensamos como simples supostos de

    determinaes puramente ideais, independentemente de toda existncia ou no-existncia real. 3. Dito

    de outra forma, para Husserl, a verdade de uma proposio nada tem a ver com pressupostos de ordem

    emprica que se fundam na prerrogativa da existncia de objetos e de leis compreendidas num mundo

    exterior, como no caso das cincias da natureza. Mas neste caso julgar conforme a verdade de um

    juzo algo radicalmente diferente de afirmar que quer que seja sobre a existncia desta coisa.

    Conforme Husserl coloca:

    Ora, no saber ns possumos a verdade. no saber atual, ao qual em ltima anlise ns nos remetemos, que ns a possumos como sendo o objeto de um julgamento

    exato. Mas isso s no suficiente; pois todo julgamento exato, toda posio ou toda

    rejeio, conforme a verdade, de um estado de coisas, no ser um saber da

    existncia ou da no-existncia deste estado de coisas. Isto que o caracteriza antes se ele fala de um saber no sentido mais estreito e mais estrito a evidncia4, a certeza luminosa que esta que, ns reconhecemos ou que no esta que ns

    rejeitamos, certeza que ns devemos, como bem conhecido, distinguir da

    convico cega, de opinio vaga ou de qualquer opinio fixa que seja, se ns no

    quisermos, pelo menos, encalhar sobre os recifes do extremo ceticismo 5.

    Compreende-se, portanto, que para Husserl esta certeza luminosa no possa ser aquela

    verdade parcial das disciplinas especficas. Pelo contrrio, nestes termos, [...] a evidncia, ns a

    consideramos como a percepo imediata da verdade ela-mesma 6. Com isto Husserl delimita a

    distncia que separa esta certeza fundante da certeza fundada, da crena ingnua das cincias na

    existncia de estados de coisas exteriores. Da poder se afirmar que:

    Em ltima anlise, todo conhecimento verdadeiro, e, especialmente todo conhecimento cientfico, repousa portanto sobre a evidncia e, tambm a distncia

    que se estende a evidncia, se estende tambm o conceito de saber.

    3 Husserl, Edmund. Recherches Logiques. Tome premier: Prolgomnes la logique pure. Trad. de Hubert Elie,

    Arion L. Kelkel e Ren Scherer. Paris: Presses Universitaires de France,1969. pp., 11-12. 4 Grifo nosso.

    5 Husserl, Edmund. Recherches Logiques. Tome premier: Prolgomnes la logique pure. Trad. de Hubert Elie,

    Arion L. Kelkel e Ren Scherer. Paris: Presses Universitaires de France,1969.. p, 13. 6 Husserl, Edmund. Recherches Logiques. Tome premier: Prolgomnes la logique pure. Trad. de Hubert Elie,

    Arion L. Kelkel e Ren Scherer. Paris: Presses Universitaires de France,1969.. p, 14.

  • Adelar Conceio A IDIA DE CINCIA NA FENOMENOLOGIA DE HUSSERL A PARTIR DA SEXTA

    INVESTIGAO LGICA

    intuitio ISSN Porto Alegre Vol.6 N.1 Junho p.229-240 1983-4012 2013

    No subsiste menos uma dualidade no conceito de saber (ou, o que para ns tem o

    mesmo sentido: do conhecimento). Saber no sentido mais estrito da palavra, a

    evidncia que um certo estado de coisas existe ou no existe [...] 7.

    Assim fica claro a pretenso de Husserl na anlise da lgica como teoria da cincia, trata-se,

    com efeito, de estabelecer esta como disciplina normativa, porquanto compreende as cincias

    enquanto unidades sistemticas de tal ou tal gnero.

    Em ligao com este tema Husserl nos oferece de passagem uma primeira indicao da sua

    idia de cincia:

    O que prprio das cincias verdadeiras, as cincias vlidas como tal, dito de outro modo o que constitui a idia de cincia, aquilo que a lgica tem por propsito

    investigar, a fim de que ns possamos assim medir, de acordo com este critrio, se

    as cincias empricas existentes so conforme a esta idia, ou em que medida elas se

    aproximam e em que elas so em oposio com ela 8.

    Para isto necessrio mostrar em que medida a fenomenologia, ao se contrapor ao tipo de

    conhecimento produzido pelas cincias especficas, capaz de oferecer um conhecimento necessrio

    e, no entanto, diverso daquele produzido pelo mtodo das cincias da natureza.

    1.2. A intuio das essncias

    Partindo da idia da lgica pura como teoria do conhecimento, Husserl elabora sua crtica das

    limitaes do mtodo das cincias naturais e da tendncia psicologista na lgica, delineando com isto

    os contornos do campo da fenomenologia. Com efeito, no se tratam mais de fenmenos no sentido

    das cincias empricas, da posio de um objeto existente no mundo exterior, mas dos fenmenos tal

    como se do para a conscincia. Contudo, se o objeto j no mais uma natureza em si, mas o

    correlato desta natureza objetiva, que se pode captar e determinar com validade objetiva? Husserl

    responde da seguinte forma:

    [...] se os fenmenos no so natureza, tem sem embargo uma essncia captvel, e adequadamente captvel, na contemplao imediata todos os enunciados que

    descrevem os fenmenos por meio de conceitos direitos, o fazem, quando so

    vlidos, mediante conceitos de essncias, ou seja, por meio de significados

    conceituais de palavras que podem se fazer efetivas na intuio de essncia. 9.

    Ainda que se tenha abstrado do fenmeno sua existncia objetiva ele conserva para a

    conscincia a sua essncia e, portanto, possvel de ser captvel numa conscincia intuitiva a que

    Husserl chama intuio de essncia. No se trata aqui de uma experincia de percepo ou

    7 Husserl, Edmund. Recherches Logiques. Tome premier: Prolgomnes la logique pure. Trad. de Hubert Elie,

    Arion L. Kelkel e Ren Scherer. Paris: Presses Universitaires de France,1969.. p, 14. 8 Husserl, Edmund. Recherches Logiques. Tome premier: Prolgomnes la logique pure. Trad. de Hubert Elie,

    Arion L. Kelkel e Ren Scherer. Paris: Presses Universitaires de France,1969.. p, 28. 9 Husserl, Edmund. La filosofa como ciencia estricta. Trad. Elsa Taberning. Buenos Aires: Editorial Almagesto,

    1992. p, 47.

  • Adelar Conceio A IDIA DE CINCIA NA FENOMENOLOGIA DE HUSSERL A PARTIR DA SEXTA

    INVESTIGAO LGICA

    intuitio ISSN Porto Alegre Vol.6 N.1 Junho p.229-240 1983-4012 2013

    recordao, nem de uma generalizao emprica que postula a existncia de um objeto por meio de

    dados da experincia, o conhecimento de essncia, diz Husserl, no um conhecimento de matter of

    fact, nada diz sobre a existncia individual do objeto. Neste caso, como se fosse necessrio se valer

    de um ver fenomenolgico:

    Porm tudo isso depende de que compreendamos que assim como ouvimos imediatamente um som tambm vemos uma essncia, a essncia som, a essncia fenmeno da coisa, a essncia coisa visvel, a essncia representao imagem, a essncia juzo, vontade, e que contemplando-la podemos abrir juzo sobre a essncia 10.

    Portanto, ao se abstrai da posio existencial da natureza, [...] a fenomenologia pura

    considerada como cincia no pode ser mais que uma investigao de essncia e de nenhum modo

    uma investigao de existncia 11. Com efeito, veremos que o seu ideal de cincia pretende ser bem

    mais abrangente que as cincias especficas em geral.

    2. A filosofia como cincia de rigor12

    Neste texto, Husserl retoma e aprofunda alguns aspectos da concepo de fenomenologia e a

    crtica ao psicologismo e agora tambm do historicismo como formas de relativismo. Contudo, outro

    aspecto relevante, e de importncia fundamental para a temtica deste trabalho, refere-se a pretenso

    de Husserl, expressa j no ttulo A filosofia como cincia de rigor (1907), em fazer da fenomenologia

    uma filosofia primeira e da filosofia uma cincia rigorosa. Assim, passando por alto as partes em que

    Husserl retoma temas j tratados nas Investigaes, iremos nos concentrar no que se refere a idia de

    cincia expressa no texto.

    Husserl faz aluso a vocao cientfica da filosofia, ou seja, desde sua origem o conhecimento

    filosfico pretende ser uma cincia rigorosa, mas no s, quer alm disso satisfazer as necessidades

    tericas mais profundas desde as quais se possa erigir uma vida regida por normas puramente

    racionais. Precisamente neste ponto o seu ideal de cincia diferente tanto do conceito moderno de

    cincia experimental. O conceito de cincia de Plato, de Descartes e do racionalismo do sculo XVII

    em geral13. Com efeito, faz-se notar que junto com este instrumento rigoroso herdado da tradio,

    Husserl incorpora tambm o seu ideal de cincia como verdade absoluta orientada segundo um fim.

    Mas, com efeito, a filosofia no pretende ser uma cincia ao lado das demais, seno que o seu

    papel de sanar a imperfeio das cincias particulares em organizar numa unidade o carter

    10

    Husserl, Edmund. La filosofa como ciencia estricta. Trad. Elsa Taberning. Buenos Aires: Editorial

    Almagesto, 1992. p, 53. 11

    Husserl, Edmund. La filosofa como ciencia estricta. Trad. Elsa Taberning. Buenos Aires: Editorial

    Almagesto, 1992. p, 53-54. 12

    A verso espanhola aqui utilizada opta pela expresso ciencia estricta, contudo utilizaremos a traduo cincia de rigor como ocorre na maior parte dos trabalhos em lngua portuguesa. 13

    Kuypers, D. K. La concepcin de la filosofia como ciencia rigurosa y los fundamentos de las ciencias en Husserl. In: Husserl. Tercer coloquio filosfico de Royaumont. Buenos Aires: Paidos, 1968, pp. 68-87. p, 69.

  • Adelar Conceio A IDIA DE CINCIA NA FENOMENOLOGIA DE HUSSERL A PARTIR DA SEXTA

    INVESTIGAO LGICA

    intuitio ISSN Porto Alegre Vol.6 N.1 Junho p.229-240 1983-4012 2013

    fragmentrio do conhecimento. Husserl constata que ao longo da histria da filosofia persiste este

    ideal de fundamentao cientfica, contudo, a cada vez que se retoma novamente o problema ele

    reformulado sob novas bases e novos mtodos. A dificuldade da filosofia em constituir-se em cincia

    , portanto, de um outro grau: Porm a imperfeio da filosofia muito distinta de todas as cincias

    de acordo com o que se acaba de descrever. No que se disponha de um sistema de doutrina

    imperfeito, incompleto nos detalhes, seno que no dispe de nenhum 14.

    Cabe a fenomenologia a tarefa de sanar esta imperfeio da filosofia sob o seu elemento

    caracterstico: a intuio de essncias. Trata-se de tudo aquilo que j foi dito nas Investigaes, ou

    seja, os fenmenos no so em si natureza, no implicam a posio de um objeto existente, mas so

    um correlato desta natureza que apresentam uma essncia captvel na intuio de essncia. Assim, at

    onde alcana o ter conscincia intuitiva, at ali alcana a possibilidade desta ideao

    correspondente. Husserl refora sempre que este campo de experincia original aberto pela

    fenomenologia no s nada tem a ver com a experincia emprica, como tambm no pode ser

    derivada da experincia interna:

    Se v portanto que se cometeria o pior dos erros se se espera-se poder escrutar a essncia da recordao, do juzo, da vontade, etc., por meio de experimentaes

    psicofsicas e por percepes ou, vivncias interiores no intencionais, para chegar a

    conceitos rigorosos que so os nicos que podem dar valor cientifico a denominao

    do psquico nos enunciados psicofsicos e a estes mesmos 15.

    A esta intuio original e fundadora da possibilidade de compreenso da origem do

    conhecimento Husserl dedica a sexta investigao lgica.

    3. Anlise da sexta investigao lgica

    No captulo sexto da sexta investigao, segunda seo sensibilidade e entendimento, sobre

    intuies sensveis e categoriais, Husserl retorna ao problema deixado em aberto pelas investigaes

    precedentes, a saber, o problema do preenchimento das formas categoriais, ou em larga medida a

    relao entre inteno de significar e intuio sensvel.

    Logo de incio, Husserl faz notar que mesmo nos enunciados mais simples de percepo, no

    apenas so preenchidas as representaes nele contidas, mas tambm a significao do enunciado se

    preenche por meio desta percepo. Deste modo, o problema da decorrente j se apresenta bem

    delineado para Husserl:

    Se o preenchimento das significaes nominais parece a algum suficientemente claro, ns lhe perguntamos como deve ser compreendido o preenchimento dos

    enunciados inteiros, sobretudo no tocante ao que vai alm da sua matria, isto , no

    14

    Husserl, Edmund. La filosofa como ciencia estricta. Trad. Elsa Taberning. Buenos Aires: Editorial

    Almagesto, 1992. p, 10. 15

    Husserl, Edmund. La filosofa como ciencia estricta. Trad. Elsa Taberning. Buenos Aires: Editorial

    Almagesto, 1992. p, 57.

  • Adelar Conceio A IDIA DE CINCIA NA FENOMENOLOGIA DE HUSSERL A PARTIR DA SEXTA

    INVESTIGAO LGICA

    intuitio ISSN Porto Alegre Vol.6 N.1 Junho p.229-240 1983-4012 2013

    caso presente, alm dos termos nominais. Que dever e poder dar preenchimento

    aos momentos de significao que constituem a forma da proposio como tal momentos da forma categorial entre os quais se encontra, por exemplo, a cpula? 16.

    Dito de outra forma, o problema pode ser expresso na pergunta mesma pela possibilidade de

    manter o ideal de preenchimento completamente adequado. Neste caso, a todas as partes e formas da

    significao corresponderiam tambm formas da percepo? Husserl responde dizendo que o

    prottipo de interpretao da relao entre o significar e o intuir seria assim a relao entre a

    significao prpria e as percepes correspondentes 17. Assim, se conheo a cidade de Colnia e,

    portanto, o significado da palavra Colnia, encontro em cada um dos seus significados atuais uma

    correspondncia com a percepo futura que venha a confirm-la.

    Mas, com efeito, o que Husserl quer fazer notar que h nesta operao um excedente na

    significao, uma forma que no encontra na apario algo que pudesse confirm-la. Como no caso de

    quando vejo um papel branco e digo papel branco, digo tambm papel que branco. Nota-se ento

    que:

    S as significaes de caractersticas unificadas no conceito de papel que tem na percepo o seu termo; aqui tambm o objeto inteiro conhecido como papel, aqui

    tambm h uma forma complementar que contm o ser, embora no como forma

    nica. Como bvio, a funo preenchida da simples percepo no pode satisfazer

    tais formas 18.

    Para Husserl, como se sabe, ao falarmos em conhecimento em geral, trata-se de atos de

    pensar intuitivamente fundados. Contudo, na ausncia de intuio, no se pode falar certamente de

    conhecimento, mas to somente de um visar do puro pensamento, aquele que poder vir a ser

    confirmado numa intuio. No caso dos juzos gerais, para que este venha a ser posteriormente

    confirmado necessrio, portanto, que o seja na intuio pelo carter de preenchimento e identificao

    peculiar a todo conhecimento. Mas, justamente, a dificuldade est em como se daria esta identificao,

    a proposio geral buscaria em vo uma confirmao com base nos elementos fornecidos pela intuio

    individual.

    A soluo do problema passa, segundo Husserl, por recorrermos aos atos fundados, ou seja,

    aqueles atos em que sempre que os pensamentos gerais so preenchidos pela intuio, no se trata

    apenas do objeto intudo, ele prprio, mas este funciona antes como exemplo daquela inteno geral

    propriamente dita. Assim, neste caso particular, a inteno significativa dirige-se antes para algo geral,

    a ser confirmado pela intuio, pelo que fica comprovada a possibilidade objetiva deste geral.

    16

    Husserl, Edmund. Investigaes Lgicas Sexta investigao. Selec. e Trad. de Zeljko Loparic e Andra Maria Altino de Campos Loparic. So Paulo: Abril Cultural, 1975. p, 105. 17

    Husserl, Edmund. Investigaes Lgicas Sexta investigao. Selec. e Trad. de Zeljko Loparic e Andra Maria Altino de Campos Loparic. So Paulo: Abril Cultural, 1975. p, 106. 18

    Grifo nosso. Husserl, Edmund. Investigaes Lgicas Sexta investigao. Selec. e Trad. de Zeljko Loparic e Andra Maria Altino de Campos Loparic. So Paulo: Abril Cultural, 1975. p, 107.

  • Adelar Conceio A IDIA DE CINCIA NA FENOMENOLOGIA DE HUSSERL A PARTIR DA SEXTA

    INVESTIGAO LGICA

    intuitio ISSN Porto Alegre Vol.6 N.1 Junho p.229-240 1983-4012 2013

    No 43 Husserl ir tratar dos correlatos objetivos das formas categoriais como momentos no

    reais. Isto significa que, tal como em Kant, o ser no aqui um predicado real, no sentido em que a

    flexo que d a forma, o ser na funo atributiva e predicativa, no se preenche, dissemos, em

    nenhuma percepo 19. Com efeito, trata-se muito simplesmente do que Husserl chamava acima o

    excedente na significao, aquela forma que no pode ser confirmada por nenhuma apario, isto :

    O ser no nada dentro do objeto, nenhuma de suas partes, nenhum momento e ele inerente, nenhuma qualidade ou intensidade, como tambm nenhuma figura, nem

    absolutamente nenhuma forma interna nenhuma caracterstica constitutiva, como

    quer que seja concebida. Mas o ser tambm no nada de aderente ao objeto, assim

    como no uma caracterstica real externa e por isso no absolutamente nenhuma

    caracterstica, no sentido de uma caracterstica real 20.

    De modo anlogo, Husserl diz que tambm entre as relaes, porquanto se considere os

    objetos num mundo exterior fenomnico, enquanto formas concretas de unidade externa dos objetos,

    no se pode a encontrar nada como o .

    Contudo, por outro lado, a origem do conceito de ser no deve ser procurada tambm no

    domnio da percepo interna. Ocorre que, para Husserl, a intuio no se refere somente aquilo que

    percebido pelos sentidos, mas pelo contrrio, considera necessrio ... estender adequadamente o

    conceito de percepo sensvel, de tal modo que ele viesse a abranger ainda toda percepo interna e

    de tal modo que, sob o ttulo de objeto sensvel fosse includo tambm o crculo correlato dos objetos

    internos e, portanto, o eu e suas vivncias internas 21. Portanto, no apenas o ser, mas tambm

    outras formas categoriais dos enunciados (o um e o o, o e e o ou, e se e o ento, formas da quantidade

    e, determinaes numricas, etc.), no encontram correspondente possvel na intuio sensvel, nem

    nesta maneira mais ampla de considerar a sensibilidade, que no para Husserl seno a esfera dos

    objetos reais de uma possvel percepo sensvel.

    V-se em que medida a fenomenologia se difere de uma doutrina que afirma que categorias

    lgicas como ser, no-ser, unidade, princpio, conseqncia, etc., surgem na reflexo sobre atos

    psquicos e que, portanto, so conceitos sensveis que pertencem ao domnio do sentido interno. Ora,

    assim como o ser no um componente real de um objeto externo, do mesmo modo no de um

    objeto interno. Quer dizer que:

    No juzo enunciado predicativo o figura como um momento da significao [...] O prprio no figura a; na palavra , ele apenas significado, ou seja,

    signitivamente visado, entretanto, ele prprio dado [...] Aparece agora no somente

    aquilo que visado [...]; o juzo e a intuio do juzo se unem aqui para construir a

    19

    Husserl, Edmund. Investigaes Lgicas Sexta investigao. Selec. e Trad. de Zeljko Loparic e Andra Maria Altino de Campos Loparic. So Paulo: Abril Cultural, 1975. p, 111. 20

    Husserl, Edmund. Investigaes Lgicas Sexta investigao. Selec. e Trad. de Zeljko Loparic e Andra Maria Altino de Campos Loparic. So Paulo: Abril Cultural, 1975. p, 111. 21

    Husserl, Edmund. Investigaes Lgicas Sexta investigao. Selec. e Trad. de Zeljko Loparic e Andra Maria Altino de Campos Loparic. So Paulo: Abril Cultural, 1975. p, 112.

  • Adelar Conceio A IDIA DE CINCIA NA FENOMENOLOGIA DE HUSSERL A PARTIR DA SEXTA

    INVESTIGAO LGICA

    intuitio ISSN Porto Alegre Vol.6 N.1 Junho p.229-240 1983-4012 2013

    unidade do juzo evidente e, no caso mais favorvel, do juzo evidente, no sentido do

    limite ideal 22.

    A reflexo sobre juzos no pode ser, assim, a origem dos conceitos de estado de coisa e

    ser, antes a prpria reflexo j os pressupe. Ocorre que na reflexo esta simples vivncia torna-se

    um ser objetal. Ento, se tomarmos o ser primeiramente como o ser predicativo, este ser j deve de

    alguma forma ser dado e isto, segundo Husserl, num ato anlogo a intuio sensvel.

    3.1. Ampliao do conceito de intuio: a intuio categorial

    A partir daqui Husserl tenta responder a questo elaborada pelas anlises precedentes, a saber,

    como podem ser preenchidas as formas categoriais das significaes, a no ser pela percepo ou

    pela intuio naquele sentido mais restrito, ao falarmos da sensibilidade, tentamos indicar

    provisoriamente? 23.

    Com base no que j foi exposto, Husserl pode afirmar, com efeito, que num enunciado de

    percepo as formas so tambm efetivamente preenchidas, e no apenas os momentos materiais

    da significao. Contudo, isto s j no basta, se quisermos falar de formas categoriais, ser

    necessrio recorrer a um outro sentido da percepo, caso se queira extrair dos elementos categoriais

    de significao o mesmo oferecido aos elementos materiais pela simples percepo sensvel. Trata-se

    agora de oferecer uma fundamentao descritiva da j apontada diferena relativa as percepes, entre

    intuies sensveis e categoriais.

    A percepo compreende o seu objeto de forma diversa, sensvel ou categorial conforme a

    objetividade a ele ligada, ou seja, conforme a objetividade seja um objeto real ou ideal. Assim

    Husserl nos oferece uma primeira caracterizao dos objetos sensveis ou reais como objetos do grau

    mais baixo de intuio e objetos categoriais ou ideais como objetos de graus superiores.

    Na percepo sensvel o objeto imediatamente dado como presente. Quer dizer, os objetos

    sensveis se do num nico grau de ato, ou dito de outra maneira, no so atos fundados sobre

    outros atos, que viriam a se converter em objetos de um outro grau para a percepo. Cada ato de

    percepo pode desempenhar o papel de ato fundamental sobre o qual se fundam novos atos, que

    geram uma nova conscincia de objetividade que pressupe, contudo, a conscincia original. Surgem,

    portanto, novos atos que constituem novas objetividades, mas que no existiam nem poderiam ser

    dadas nos atos fundantes.

    Com efeito, para Husserl, nestes atos fundados que reside o que h de categorial no intuir e

    no conhecer. O objeto sensvel, apreendido de maneira simples na percepo sensvel, dado de

    22

    Husserl, Edmund. Investigaes Lgicas Sexta investigao. Selec. e Trad. de Zeljko Loparic e Andra Maria Altino de Campos Loparic. So Paulo: Abril Cultural, 1975. p, 113. 23

    Husserl, Edmund. Investigaes Lgicas Sexta investigao. Selec. e Trad. de Zeljko Loparic e Andra Maria Altino de Campos Loparic. So Paulo: Abril Cultural, 1975. p, 114.

  • Adelar Conceio A IDIA DE CINCIA NA FENOMENOLOGIA DE HUSSERL A PARTIR DA SEXTA

    INVESTIGAO LGICA

    intuitio ISSN Porto Alegre Vol.6 N.1 Junho p.229-240 1983-4012 2013

    maneira no desdobrada, embora suas partes constituintes estejam nele, no ato simples elas no se

    tornam objetos explcitos. Finalmente, deixemos que o prprio Husserl exprimir a necessidade dos

    atos categoriais de carter fundado que a tem origem:

    As ligaes sensveis so momentos do objeto real, seus momentos efetivos nele presentes, ainda que s implicitamente dele destacveis por meio de uma percepo

    abstrativa. Pelo contrrio, as formas de ligao categoriais so formas

    correspondentes aos modos dos atos-snteses, ou seja, formas que se constituem

    objetivamente nos atos sintticos, edificados sobre a sensibilidade. [...] No todo

    sensvel as partes A e B so unidas pelo momento de contigidade que as liga de

    maneira sensvel. O destaque dessas partes e momentos, a construo das intuies

    de A, de B e de ser-contguo, ainda no produz a representao A contguo a B.

    Esta exige um ato novo que se apodere dessas representaes, dando-lhes a forma e

    a ligao adequadas 24.

    Concluso: a forma categorial como fundamento do conhecimento e o ideal de cincia de rigor

    Por fim, os atos fundados, analisados por Husserl, so intuies de objetos de uma nova

    espcie, dados numa esfera alargada do conceito de intuio, onde estes tm todas as peculiaridades

    prprias das intuies, sendo que nestas ltimas o preenchimento no se d apenas sobre o fundamento

    do ato simples, mas sobre o fundamento dos atos categoriais.

    Ora, o procedimento essencial da fenomenologia precisamente a intuio das essncias, fato

    que Husserl no se cansa de contrapor as cincias experimentais. O seu paradigma de cincia pura

    justamente a lgica pura e as matemticas puras, pois considera que a estas no importa o estudo de

    realidades, mas de relaes essenciais do ato que estabelece os fundamentos ltimos. A tendncia

    geral da fenomenologia como mtodo descritivo , com efeito, tomar a conscincia e a subjetividade

    como ponto de partida e com isto a ser a contraparte de toda cincia objetiva e emprica, e isto se

    traduz na concepo de Husserl da intuio categorial enquanto ato que torna possvel compreender o

    prprio conhecimento:

    A concepo dos atos categoriais como intuies a nica que torna realmente transparente a relao entre o pensar e o intuir, relao que no recebeu at agora,

    por parte de nenhuma crtica do conhecimento, uma elucidao aceitvel como tambm a nica que torna compreensvel o prprio conhecimento, na sua essncia

    e no seu desempenho 25.

    Podemos concluir aqui que a idia de cincia em Husserl tem sua origem e motivao

    justamente nessa tentativa de oferecer um fundamento apodtico ao conhecimento. Assim, tudo aquilo

    a que Husserl se refere desde os Prolegomenos lgica pura nas Investigaes, de uma lgica

    enquanto teoria do conhecimento por oposio a uma cincia naturalista da conscincia, e da idia de

    24

    Husserl, Edmund. Investigaes Lgicas Sexta investigao. Selec. e Trad. de Zeljko Loparic e Andra Maria Altino de Campos Loparic. So Paulo: Abril Cultural, 1975. p, 124. 25

    Husserl, Edmund. Investigaes Lgicas Sexta investigao. Selec. e Trad. de Zeljko Loparic e Andra Maria Altino de Campos Loparic. So Paulo: Abril Cultural, 1975. p, 130.

  • Adelar Conceio A IDIA DE CINCIA NA FENOMENOLOGIA DE HUSSERL A PARTIR DA SEXTA

    INVESTIGAO LGICA

    intuitio ISSN Porto Alegre Vol.6 N.1 Junho p.229-240 1983-4012 2013

    realizar uma filosofia enquanto cincia de rigor (expresso em A filosofia como cincia de rigor) recebe

    aqui, em certo sentido, o seu fundamento.

    A vinculao aqui entre a idia de cincia e sua fundamentao a partir da Sexta

    investigao nos parece pertinente na medida em que, o progresso da concepo de cincia em

    Husserl, parece se confirmar na Filosofia como cincia de rigor como reflexo da necessidade interna

    da fenomenologia em buscar um fundamento apriorstico, que escape a toda forma possvel de

    entendimento desta como uma investigao da ordem de uma psicologia descritiva (conforme

    posteriormente Husserl considera a abordagem presente nas Investigaes). A, conforme procuramos

    mostrar est presente no s a retomada e aprofundamento das crticas ao psicologismo, e a qualquer

    concepo de cincia fundada em pressupostos meramente naturais e acrticos, seno que essa mesma

    crtica e a idia de cincia apresentada tem um acento na necessidade de rigor auto-imposta

    fenomenologia, fato que se ver mais claramente nas obras posteriores de Husserl. Levado por esse

    ideal, Husserl se empenha cada vez mais em fazer da fenomenologia uma investigao transcendental

    em oposio tese natural do mundo das cincias naturais. Prova disso a introduo da epoch a

    partir da Idias para uma Fenomenologia Pura e uma Filosofia Fenomenolgica (1913), como

    operao metdica que tem justamente a funo de por entre parntesis a tese do mundo natural, e a

    apario do Ego transcendental nas Meditaes Cartesianas (1931), como resultado final da epoch e

    princpio de constituio de todo sentido do mundo para a conscincia. Fato que leva o prprio

    Husserl a definir a fenomenologia ento como idealismo transcendental.

    Contudo, para os propsitos desse trabalho, nos limitamos aqui a indicar a relao entre a idia

    de cincia em Husserl e o projeto de fundamentao apriorstica do conhecimento, como uma

    investigao acerca das essncias, fundada por sua vez na forma da intuio categorial. Deixamos

    apenas a ttulo de indicao a importncia que o ideal de cincia de rigor, gestado a partir desses

    trabalhos, ter para a futura fenomenologia transcendental. Aqui o Husserl das Investigaes se

    encontra ainda distante da verso transcendental subjetivista da fenomenologia que apresentar

    posteriormente. A certeza absoluta primeiramente epistemolgica, adquirida metodicamente pelo

    retorno a intuio como fundamento da cincia 26.

    Referncias

    HUSSERL, Edmund. La filosofa como ciencia estricta. Trad. Elsa Taberning. Buenos Aires: Editorial

    Almagesto, 1992.

    _______. Recherches Logiques. Tome premier: Prolgomnes la logique pure. Trad. de Hubert Elie, Arion L.

    Kelkel e Ren Scherer. Paris: Presses Universitaires de France, 1969.

    26

    Husserl, Edmund. Investigaes Lgicas Sexta investigao. Selec. e Trad. de Zeljko Loparic e Andra Maria Altino de Campos Loparic. So Paulo: Abril Cultural, 1975. p, 130.

  • Adelar Conceio A IDIA DE CINCIA NA FENOMENOLOGIA DE HUSSERL A PARTIR DA SEXTA

    INVESTIGAO LGICA

    intuitio ISSN Porto Alegre Vol.6 N.1 Junho p.229-240 1983-4012 2013

    _______. Investigaes Lgicas Sexta investigao. Selec. e Trad. de Zeljko Loparic e Andra Maria Altino de

    Campos Loparic. So Paulo: Abril Cultural, 1975.

    KUYPERS, D. K. La concepcin de la filosofia como ciencia rigurosa y los fundamentos de las ciencias en

    Husserl. In: In: Husserl. Tercer coloquio filosfico de Royaumont. Buenos Aires: Paidos, 1968, pp. 68-87.

    SCHRER, Ren. La fenomenologa de las Investigaciones lgicas de Husserl. Trad. Jess Daz. Madri:

    Editorial Gredos, 1969.