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EDUCAÇÃO BÁSICA
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2. FUNDAMENTOS TERICO - METODOLGICOS DA EDUCAO
INFANTIL: A ABORDAGEM HISTRICO - CULTURAL
A concepo de aprendizado1 e desenvolvimento adotada pelo
municpio de Piraquara para fundamentar a presente proposta tem por base a
Abordagem Histrico-Cultural (da Atividade) - enraizada nos princpios do
Marxismo2 - no conceito de atividade principal e no estudo do mtodo
gentico3, em que os fenmenos psicolgicos s podem ser investigados em
sua essncia e em seu processo de origem e desenvolvimento.
No tocante explicao do que a atividade principal, Leontiev (1988,
p. 119-142) argumenta que:
Designamos por esta expresso no apenas a atividade freqentemente encontrada em dado nvel do desenvolvimento da criana. O brinquedo, por exemplo, no ocupa, de modo algum, a maior parte do tempo de uma criana. A criana pr-escolar no brinca mais do que trs ou quatro horas por dia. Assim, a questo no a quantidade de tempo que o processo ocupa. Chamamos de atividade principal aquela em conexo com a qual ocorrem as mais importantes mudanas no desenvolvimento psquico da criana e dentro da qual se desenvolvem processos psquicos que preparam o caminho da transio da criana para um novo e mais elevado nvel de desenvolvimento.
Em relao ao mtodo gentico, este estudo envolve os processos
psquicos propriamente humanos (funes psicolgicas superiores), as
exigncias para a investigao do psiquismo e a relao aprendizado-
desenvolvimento levando-se em conta trs aspectos, so eles (Vigotski, 1998,
p. 81-86):
1) anlise de processos e no de objetos;
2) explicao versus descrio; e
1 A palavra russa "obutchenie" aparece muitas vezes traduzida como aprendizagem, mas tem
como traduo literal o significado de "instruo" ou "ensino" ou aprendizado (FABRI, 2001, p. 61). Assim, a palavra aprendizado cria relao direta com o conceito de instruo ou ensino, enquanto o termo "aprendizagem" possui um significado generalizado, como processo de aquisio de conhecimentos, habilidades e sentimentos, no se destacando o papel importantssimo e fundamental da mediao (FABRI, 2001, p. 64). S h aprendizado se houver mediao. 2 Marxismo o conjunto das ideias filosficas, econmicas, polticas e sociais que Karl
Marx e Friedrich Engels elaboraram. Esta filosofia interpreta a vida social conforme a dinmica da luta de classes e prev a transformao das sociedades de acordo com as leis do desenvolvimento histrico de seu sistema produtivo (PEDROZA, in: BRASIL, 2006, p. 24). 3 O termo gentico definido nesta abordagem como a busca de explicao para a
origem dos fenmenos em estudo.
3) o comportamento fossilizado.
Em relao anlise de processos e no de objetos (1), deve-se estudar
os fenmenos em sua origem e desenvolvimento, no movimento, e em suas
mltiplas relaes com os demais fenmenos. Nesta perspectiva, quando se
pretende estudar o processo de alfabetizao, por exemplo, no se busca
apenas levantar dados sobre quantas crianas chegaram a concluir a aquisio
da lngua escrita ou quantas palavras j sabem escrever corretamente, quantas
dificuldades ortogrficas ainda apresentam, mas fundamentalmente como
estas crianas chegaram a este resultado e como vo avanar para fases
posteriores. Ou seja, importa mais o caminho pelo qual as crianas vo
adquirindo a linguagem escrita na mediao com o professor e com os colegas
do que o resultado final.
O professor no deve apenas transmitir informaes, deve ser o
articulador de todo processo de conhecimento em sala de aula, provocando no
educando a abertura para o aprendizado e disponibilizando meios para que se
efetive o domnio do conhecimento. De acordo com VASCONCELLOS (2002, p.
105), a ao do professor deve: a) provocar - pr os educandos para pensar,
provocar certas necessidades no aluno que deixado a si certamente no
apareceriam; b) dispor - dar condies para que o educando tenha acesso a
elementos novos. Propor aes que favoream a elaborao do conhecimento
de forma crtica, criativa, significativa e duradoura; c) interagir - o professor
um mediador qualificado que pode dialetizar com as representaes dos
educandos. Ensinar o educando a aprender, ajudar o educando a desenvolver
um mtodo de trabalho.
Tambm necessrio buscar a essncia das coisas e no ficar apenas
na sua aparncia (2), pois explicar ir s causas e a descrio das coisas na
sua aparncia estaciona nos seus efeitos externos. Pode-se observar que
processos aparentemente idnticos podem ter origens diferentes e processos
aparentemente distintos podem ter a mesma origem. Vigotski (2001, pp. 194-
195) considera que:
Encontrar o limite que separa o pseudoconceito do verdadeiro conceito sumamente difcil, quase inacessvel anlise fenotpica puramente formal. A julgar pela aparncia, o
pseudoconceito tem tanta semelhana com o verdadeiro conceito quanto a baleia com um peixe. Mas se recorrermos origem das espcies das formas intelectuais e animais, o pseudoconceito deve ser to indiscutivelmente relacionado ao pensamento por complexos quanto a baleia aos mamferos.
Um outro dado importante na busca de explicaes, entender as leis
que envolvem o aprendizado e o desenvolvimento psquico das crianas
durante seus anos escolares; as causas que influenciam na formao das
funes psicolgicas superiores; e os valores que implicam na formao da
identidade social das crianas, pois o papel essencial da educao implica na
formao de pessoas preparadas para o trabalho e para intervirem ativamente
na vida social. Aqueles todos que trabalham no processo educativo devem e
querem saber como se produz essa transformao da criana, pequena e
indefesa, em um jovem evoludo, instrudo e inteligente, desejoso de exercer
uma atividade criadora e preparado para a vida.
Para Leontiev (1978, 265), esse processo de transformao humana se
d primeiramente pelas necessidades e posteriormente ganha em qualidade
pela atividade educacional, ou seja:
Eles [os seres humanos] modificam-na [a natureza] em funo do desenvolvimento das suas necessidades. Criam os objetos que devem satisfazer as suas necessidades e igualmente os meios de produo desses objetos, dos instrumentos s mquinas mais complexas. Constroem habitaes, produzem as suas roupas e outros bens materiais. Os progressos realizados na produo de bens materiais so acompanhados pelo desenvolvimento da cultura dos homens; o seu conhecimento do mundo circundante e deles mesmos enriquece-se, desenvolvem-se a cincia e a arte (acrscimos nossos).
O comportamento fossilizado (3) uma atividade ou um processo
psicolgico aparentemente mecnico, uma vez que j se tornou automatizado e
passa despercebido o complexo processo que o gerou. Por exemplo, parece
ser imediato e desvinculado de um processo mais complexo de
desenvolvimento, o ato de dar um lao num cordo de sapato, uma vez que
isto feito praticamente sem nenhuma exigncia maior em termos de reflexo.
No entanto, ao observar-se o desenvolvimento da aquisio deste ato
complexo, pode-se perceber o quo complicada e quo demorada ela para a
criana que aprende a fazer o lao. Vigotski (1981, p. 137) levanta um exemplo
complexo, o do processo de memorizao atravs de um n amarrado no
dedo. Aqui algo que parece imediato na realidade um processo mediado e
que envolve uma forma especificamente humana de memorizao - um fssil
por ser algo to antigo na histria dos grupos humanos, ou to precoce no
desenvolvimento da criana, que se pode esquecer quo dinmica e viva a
gnese deste processo.
Leontiev (1978, p. 273) ressalta o processo histrico que envolve o
comportamento fossilizado em seu vnculo com educao, argumentando que:
Quanto mais progride a humanidade, mais rica a prtica scio-histrica acumulada por ela, mais cresce o papel especfico da educao e mais complexa a sua tarefa. Razo por que toda a etapa nova no desenvolvimento da humanidade, bem como nos diferentes povos, apela forosamente para uma nova etapa no desenvolvimento da educao: o tempo que a sociedade consagra educao das geraes aumenta; criam-se estabelecimentos de ensino, a instruo toma formas especializadas, diferencia-se o trabalho do educador, do professor; os programas de estudo enriquecem-se, os mtodos pedaggicos aperfeioam-se, desenvolve-se a cincia pedaggica. Esta relao entre o progresso histrico e o progresso da educao to estreita que se pode sem risco de errar julgar o nvel geral do desenvolvimento histrico da sociedade pelo nvel de desenvolvimento do seu sistema educativo e inversamente.
Convm destacar que no possvel explicar diferentes etapas de
desenvolvimento mediante uma nica fora de desenvolvimento vinculada a
um nico conjunto de princpios explicativos.
As generalizaes amplas acabam sendo dogmticas, pois no explicam
a fundo o que define a especificidade de cada fenmeno, nem coloca s claras
o que efetivamente h de comum entre eles. Teorias que tentam explicar tudo
por um nico princpio acabam por no explicar coisa alguma.
Cada etapa determinada pela participao de diferentes foras de
desenvolvimento com seus diferentes princpios explicativos, onde uma delas
se faz dominante. No haveria uma forma especfica de explicar todas as
funes psicolgicas superiores em todos os momentos do desenvolvimento do
indivduo, da espcie e da sociedade.
No h na Abordagem Histrico-Cultural (da Atividade) um princpio
nico mudando quantitativamente, mas vrios princpios que geram outros
princpios novos, qualitativamente diferentes e que mudam em cada salto
qualitativo a prpria natureza do desenvolvimento.
Deste modo, o desenvolvimento revolucionrio, pois envolve evoluo
e involuo (avanos e retrocessos). Assim, nenhum fator isolado nem seu
correspondente conjunto de princpios explicativos pode, por si s, proporcionar
uma explicao completa sobre o desenvolvimento das funes psicolgicas
superiores.
Ao contrrio, diferentes foras do desenvolvimento aparecem envolvidas
no processo geral e dinmico de gnese das funes psicolgicas superiores.
Com a incorporao de uma nova fora de desenvolvimento, a prpria natureza
do desenvolvimento se altera atravs de um salto de qualidade.
Ou seja, deste modo os conceitos de desenvolvimento podem ser
postulados da seguinte maneira: o desenvolvimento se d por saltos
revolucionrios (saltos de qualidade); os perodos de desenvolvimento esto
relacionados s formas de mediao, estrutura do uso de mediadores,
dependendo de quais so utilizados e como o so; e a explicao dos
fenmenos psquicos deve apoiar-se em uma anlise das diversas esferas do
desenvolvimento (filognese, ontognese, sociognese e micrognese4).
Assim, a compreenso do processo que envolve o desenvolvimento em
sua relao com o aprendizado deve levar em conta o papel das funes
psicolgicas superiores, que so construdas/aprimoradas ao longo da vida
humana.
Entretanto, na infncia que este processo ocorre de forma mais
acelerada, devido a grande plasticidade5 que o crebro possui neste perodo
da vida. Vale ressaltar que esta plasticidade de nada adianta se no houver um
ambiente estimulante para a criana, pois o desenvolvimento progride de modo
mais lento e atrs do processo de aprendizado.
4 Filognese: histria da espcie humana. Ontognese: histria do indivduo da espcie,
do nascimento morte. Sociognese: histria de cada grupo cultural. Micrognese: histria, de curto prazo, da formao de processos psicolgicos particulares e especficos, que tambm referem-se configuraes nicas das experincias vividas por cada indivduo em sua prpria histria singular. 5 Plasticidade uma facilidade maior de estabelecer conexes entre as clulas
nervosas comparativamente idade adulta (LIMA, 2001, p. 6). De acordo com LIMA (2005, p. 11), em perodos de maior plasticidade as aprendizagens ocorrem mais facilmente, isto no significa que pessoas com maior idade no tenham plasticidade e, consequentemente, no aprendam. Ela no desaparece, mantm-se no sujeito adulto, embora seja menor do que na criana ou no jovem.
De acordo com VIGOTSKI (1998, p. 118):
(...) aprendizado no desenvolvimento; entretanto, o aprendizado adequadamente organizado resulta em desenvolvimento mental e pe em movimento vrios processos de desenvolvimento que, de outra forma, seriam impossveis de acontecer. Assim, o aprendizado um aspecto necessrio e universal do processo de desenvolvimento das funes psicolgicas culturalmente organizadas e especificamente humanas. (...) o aspecto mais essencial de nossa hiptese a noo de que os processos de desenvolvimento no coincidem com os processos de aprendizado. Ou melhor, o processo de desenvolvimento progride de forma mais lenta e atrs do processo de aprendizado; desta sequenciao resultam, ento, as zonas de desenvolvimento proximal.
A fim de melhor compreender como ocorre o aprendizado, Vigotski
desenvolveu alguns conceitos fundamentais que devem ser apropriados pelos
professores, pois possibilitaro entender melhor a importncia do seu papel
nesse processo. Vigotski explica que as aes/atividades que o sujeito realiza
sozinho, com autonomia, encontram-se no nvel de desenvolvimento real; as
aes/atividades que o sujeito precisa de auxlio para realizar referem-se ao
nvel de desenvolvimento potencial e a distncia entre aquilo que o sujeito
realiza com autonomia e aquilo que precisa de auxlio est na zona de
desenvolvimento proximal, que segundo FABRI (2001, p. 64), a rea de
desenvolvimento das funes psicolgicas superiores complexas (aquelas
propriamente humanas, mediadas, voluntrias, que se estabelecem no crebro
atravs de sistemas funcionais) que esta comeando a se dar, e que s se
consolidar a partir da relao social.
na zona de desenvolvimento proximal que devem ocorrer as
mediaes6, que visam transformar o que nvel de desenvolvimento potencial
em desenvolvimento real. Desta forma aquilo que zona de desenvolvimento
proximal hoje ser o nvel de desenvolvimento real amanh ou seja, aquilo
que uma criana pode fazer com assistncia hoje, ela ser capaz de fazer
sozinha amanh (VIGOTSKI, 1998, p. 113).
A brincadeira fundamental no processo que envolve a zona de
desenvolvimento proximal, como considera Arce (2004, pp. 20-21):
6 A mediao envolve o uso de mediadores (recursos externos ao organismo humano)
para ampliar suas possibilidades de atingir um fim ou uma meta, suprindo determinadas necessidades, em um circuito de relaes sociais. Os mediadores estendem o poder das mos e do intelecto. O uso dos mediadores transformam o psiquismo e lhe d nova estrutura.
A brincadeira, segundo Vigotski (1984, p. 117), a atividade principal porque cria uma zona de desenvolvimento proximal da criana, ou seja, no brinquedo a criana realiza aes que esto alm do que sua idade lhe permite realizar, agindo no mundo que a rodeia tentando apreend-lo. Neste ponto o papel da imaginao aparece como emancipatrio: a criana utiliza-se da imaginao na brincadeira como uma forma de realizar operaes que lhe so impossveis em razo de sua idade. A criana reproduz ao brincar uma situao real do mundo em que vive, extrapolando suas condies materiais reais com a ajuda do aspecto imaginativo. Para que a criana possa tornar real uma operao impossvel de ser realizada na sua idade, ela utiliza-se de aes que possuem um carter imaginrio, o faz-de-conta entra em cena, gerando uma discrepncia, segundo Leontiev (1988), entre a operao que deve ser realizada (por exemplo andar a cavalo) e as aes que formam essa operao (por exemplo selar o cavalo, montar no cavalo etc.). Como a criana no pode usar um cavalo real, ela utiliza-se de um cabo de vassoura, por exemplo, como se este fosse seu cavalo. Isso ocorre porque a criana tem como alvo o processo e no a ao.
Assim, as mediaes que o adulto constri com a criana permitem que
esta se aproprie dos conceitos e movimentos que ainda no era capaz de
desenvolver sozinha, internalizando o que foi primeiramente construdo nas
relaes sociais. O que se estabelecia como uma potencialidade torna-se
habilidade de atuao do sujeito e, exponencialmente, ampliam-se os
horizontes da zona de desenvolvimento potencial.
preciso saber que este processo se inicia muito antes da criana
ingressar na escola7, logo aps o seu nascimento; entretanto, a escola
constitui-se num local privilegiado para efetivao do ensino-aprendizado dos
conhecimentos socialmente construdos e acumulados, j que este
organizado de forma sistemtica, intencional, planejada e desenvolvido por
profissionais formados exclusivamente para este fim o professor; h ainda,
neste processo, a contribuio dos colegas, os quais trocam experincias,
conhecimentos variados, portanto, tambm atuam como mediadores.
Os colegas de sala de aula tambm se constituem em importantes
mediadores, pois, muitas vezes, um colega consegue explicar melhor a outro
do que o professor em funo da proximidade de suas experincias e de sua
linguagem.
Dessa maneira, de acordo com BOCK, FURTADO e TEIXEIRA (2001, p.
126):
7 Entende-se como escola todas as instituies escolares incluindo as instituies de
educao infantil.
A escola torna-se um novo lugar um espao que deve privilegiar o contato social entre seus membros e torn-los mediadores da cultura. Alunos e professores devem ser considerados parceiros nesta tarefa social. O aluno jamais poder ser visto como algum que no aprende, possuidor de algo interno que lhe dificulta a aprendizagem. O desafio est colocado. Todos so responsveis no processo. No h aprendizagem que no gere desenvolvimento; no h desenvolvimento que prescinda da aprendizagem. Aprender estar com o outro, que mediador da cultura. Qualquer dificuldade neste processo dever ser analisada como uma responsabilidade de todos os envolvidos. O professor torna-se figura fundamental; o colega de classe, um parceiro importante; o planejamento das atividades torna-se tarefa essencial e a escola, o lugar de construo humana.
Assim, o professor desempenha o papel de expert, de sujeito
responsvel pela mediao entre os educandos e o conhecimento, pela
organizao dos tempos e espaos necessrios para que as relaes sociais
construdas no interior da escola possibilitem o acesso ao conhecimento.
preciso recordar sempre que o aprendizado se estabelece pela internalizao,
pela reconstruo intrapsquica de relaes interpsquicas, ou seja, para que o
aprendizado ocorra preciso que o conhecimento esteja explcito nas relaes
entre os sujeitos que participam desse processo. O professor visto como
aquele que mais experiente, que propicia meios, orienta, auxilia o menos
experiente que tambm participa ativamente para chegar no s a resoluo
do problema, mas a compreenso sobre como se pode chegar a tal resultado.
importante destacar que o trabalho educativo um trabalho com a
aquisio e a reorganizao de conceitos socialmente significativos. Palavras
como "matemtica", "sociedade", "geografia", entre tantas outras, so conceitos
produzidos socialmente, vinculados a aspectos especficos da realidade e do
conhecimento humano sobre a realidade. no trabalho escolar que cada uma
destas palavras deixar de ser um som estranho e passar a traduzir uma srie
de significados (significados compartilhados com todos em uma determinada
sociedade), que possibilitam novas formas de entendimento, ampliando as
possibilidades de compreenso da realidade e de atuao sobre ela.
Ao aprender um conceito geogrfico, o educando realiza um ato mental
que propicia o entendimento do processo no qual as palavras que formam o
conceito esto envolvidas, o modo que elas devem ser usadas, o que
significam em determinado contexto.
A escola tem por fim a apropriao por parte do educando de conceitos
que sejam significativos em seu ambiente social, na compreenso das relaes
internas constituintes da realidade e na instrumentalizao para sua
transformao. O educando precisa dar conta de um trabalho conceitual que se
apia numa construo cientfica de toda a humanidade.
Entretanto os conceitos tm um desenvolvimento na mente da criana
que se expressa e avana na sua interao com os mais velhos, com o
professor, com os outros que lhe possibilitam um acesso a significados
elaborados no trabalho realizado pelas geraes passadas e contemporneas.
O fato de haver um desenvolvimento interno dos conceitos na interao
que o sujeito concreto estabelece com os demais, aponta para a questo de
que quando a criana repete pela primeira vez uma palavra j utiliza um
sistema de signos partilhado socialmente, o desenvolvimento desta palavra no
terminou, ao contrrio est s comeando.
O significado de uma palavra utilizado pela criana no incio no o
mesmo que utiliza o adulto, haver todo um processo de desenvolvimento dos
conceitos, no decorrer do processo geral de desenvolvimento das funes
psicolgicas desta criana.
Enfim: o significado social de um conceito cientfico reconstrudo
ativamente pela criana na interao com o professor que domina este
conceito, e que organiza conscientemente o meio educativo de forma a
possibilitar criana os recursos sociais indispensveis conquista do
conhecimento (dentre estes: a prpria interveno direta do professor).
Neste processo esto envolvidas as funes psicolgicas superiores
necessrias para a realizao da atividade (como ateno voluntria, memria
mediada, raciocnio lgico, abstrao, entre outras), as quais tm um
desenvolvimento interno (cerebral) a partir da relao da criana com o mundo
mediada pela fala e ao de outro, e por instrumentos cuja forma e modo de
utilizao so determinados scio-culturalmente (FABRI, 2001, 67).
Sendo assim, a interao com e no meio social promove e determina o
aprendizado e, consequentemente, o desenvolvimento. Sendo o aprendizado
entendido como um processo permanente, contnuo, cumulativo e gradativo da
apropriao dos elementos culturais, o qual promove o desenvolvimento. O
desenvolvimento um processo descontnuo, desordenado e acontece em
saltos. Isto significa que o indivduo no est programado desde sua
concepo para ser de uma determinada maneira (PEDROZA, in BRASIL,
2006, p. 34).
Diante disso, interessante expressar a importncia do afeto durante a
mediao e em todos os perodos do desenvolvimento, como explica Vigotski
(1996a, p. 299):
Os impulsos afetivos so os acompanhantes permanentes de cada etapa nova do desenvolvimento da criana, desde a inferior at a mais superior. Cabe dizer que o afeto inicia o processo de desenvolvimento psquico da criana, a formao de sua personalidade
8 e fecha esse processo, culminando assim todo o
desenvolvimento da personalidade.
Para Leontiev e Elkonin, cada perodo de desenvolvimento humano
caracterizado por uma atividade principal (ou atividade dominante), a partir da
qual se estruturam as relaes do indivduo com a realidade social.
A atividade da criana conhecer a realidade social, nesse sentido
importante destacar que as relaes estabelecidas no convvio afetivo- social
(pai, me, irmos, etc.) interferem e fortalecem as atividades realizadas pelas
crianas futuramente. O lugar ocupado pela criana, segundo Leontiev (1988,
p. 63), nas suas relaes sociais impulsiona o desenvolvimento de sua psique:
Todavia, esse lugar em si mesmo, no determina o desenvolvimento: ele simplesmente caracteriza o estgio existente j alcanado. O que determina diretamente o desenvolvimento da psique de uma criana, a sua prpria vida e o desenvolvimento dos processos reais desta vida, em outras palavras: o desenvolvimento da atividade da criana, quer a atividade aparente, quer a atividade interna. Mas o seu desenvolvimento, por sua vez depende de suas condies reais de vida.
Para melhor esclarecer o conceito de atividade principal nos utilizaremos
de Leontiev (p. 64 e p. 65, 1988), o qual a caracteriza em trs atributos, sendo
eles:
1- Ela a atividade em cuja forma surgem outros tipos de atividade e dentro da qual eles so diferenciados. Por exemplo, a instruo no sentido mais estreito do termo, que se desenvolve em primeiro lugar j na infncia pr-escolar, surge inicialmente no brinquedo, isto , precisamente na
8 O que se denomina personalidade no outra coisa que a autoconscincia do
homem que se forma justamente ento: o novo comportamento do homem se transforma em comportamento para si, o homem toma conscincia de si mesmo como de uma determinada unidade. Este o resultado final e o ponto central de toda a idade de transio (Vigotski, 1996b, p. 231).
atividade principal deste estgio do desenvolvimento. A criana comea a aprender de brincadeira.
2- A atividade principal aquela na qual processos psquicos particulares tomam forma ou so reorganizados. Os processos infantis da imaginao ativa, por exemplo, so inicialmente moldados no brinquedo e os processos de pensamento abstrato, nos estudos. Da no se segue, porm, que a modelagem ou a reestruturao de todos os processos psquicos s ocorram durante a atividade principal. Certos processos psquicos no so diretamente modelados e reorganizados durante a prpria atividade principal, mas em outras formas de atividade geneticamente ligadas a ela. Os processos de observao e generalizao das cores, por exemplo, no so moldados, durante a infncia pr-escolar, no prprio brinquedo, mas no desenho, nos trabalhos de aplicao de cores, etc.; Isto , em formas de atividades que s esto associadas a atividade ldica em suas origens.
3- A atividade principal a atividade da qual dependem de forma intima, as principais mudanas psicolgicas na personalidade infantil, observadas em um certo perodo de desenvolvimento. precisamente no brinquedo que a criana no perodo pr-escolar, por exemplo, assimila as funes sociais das pessoas e os padres apropriados de comportamento (O que um soldado do exrcito vermelho? O que fazem em uma fbrica o diretor, o engenheiro e o operrio?), e este um momento muito importante de modelagem de sua personalidade.
Parafraseando Leontiev (p. 65, 1988), em certo estgio do seu
desenvolvimento, a atividade principal direciona as transformaes dos
processos psquicos e os traos psicolgicos da personalidade da criana. Faz-
se necessrio destacar que as condies histricas e culturais interferem neste
processo, seja no momento atual, seja posteriormente.
Quando a atividade principal d lugar a novas atividades ainda no
internalizadas, surge uma nova atividade principal, e comea um novo estgio
de desenvolvimento psicolgico da criana. Os estgios de desenvolvimento
defendidos nesta proposta, no so definidos pela idade cronolgica das
crianas, mas pelas suas condies histricas e sociais.
A criana por meio das atividades principais relaciona-se com o mundo,
a medida que supera as atividades de cada estgio forma-se nela
necessidades especficas em termos psquicos passando para o estgio
superior. De acordo com Leontiev (1978, p. 292):
Podemos dizer igualmente que cada estgio do desenvolvimento psquico caracterizado por certo tipo de relao da criana com a realidade, dominantes numa dada etapa e determinados pelo tipo de atividade que ento dominante para ela.
Elkonin e Leontiev afirmam que cada estgio de desenvolvimento da
criana caracterizado por uma relao determinada, por uma atividade
principal que desempenha a funo de principal forma de relacionamento da
criana com a realidade.
Para esses autores, os estgios de desenvolvimento, possuem certa
seqncia de tempo, mas no so imutveis. Eles dependem das condies
concretas nas quais ocorre o desenvolvimento. As condies histrico-sociais
concretas exercem influncia tanto sobre o contedo concreto de um estgio
individual do desenvolvimento como sobre o curso total do processo de
desenvolvimento psquico como um todo.
Os aspectos psicolgicos ligados atividade principal da criana em
cada perodo so abordados por Elkonin (1987) quando se reporta relevncia
de seu ingresso na escola. Em suas pesquisas sobre o desenvolvimento
psquico, Elkonin elaborou uma periodizao, dividindo o desenvolvimento em
trs etapas: a primeira infncia, a infncia e a adolescncia. Cada etapa se
constitui em dois perodos interligados entre si, e cada perodo do
desenvolvimento psquico singular, pois cada um deles predomina uma forma
especfica de atividade que assume o papel de principal.
Segundo Elkonin (1987), os principais estgios de desenvolvimento
pelos quais os sujeitos passam, e as quais norteiam o trabalho da educao
infantil envolvem duas etapas:
- Primeira infncia caracterizada pela comunicao
emocional direta (predomnio de objetivos, motivos e normas), que
uma esfera motivacional e de necessidades [1 grupo]; e pela atividade
objetal manipulatria (predomnio de procedimentos elaborados de
ao com objetos), que uma esfera de possibilidades tcnicas e
operacionais [2 grupo];
- Infncia caracterizada pelo jogo de papis [1 grupo]9 e
pelas atividades de estudo [2 grupo]10.
9 Para Elkonin (1987, p. 121), a comunicao emocional direta e o jogo de papis (1
grupo) se diferenciam substancialmente por seu contedo concreto, pela profundidade com que o sujeito penetra na esfera dos fins e motivos da atividade dos adultos, penetrao que representa uma peculiar escala na assimilao consecutiva que o indivduo faz desta esfera. Em comum nessas atividades, continua Elkonin (1987, p. 121), tem lugar o desenvolvimento preponderante, nas crianas, da esfera motivacional e das necessidades. 10
Em relao atividade objetal manipulatria e s atividades de estudo (2 grupo),
embora sejam diferentes pelo aspecto externo [manipulao de um objeto como um copo difere do estudo de uma rea do conhecimento como a Geografia], Elkonin (1987, p. 122) postula que o geral e essencial entre elas e que todas aparecem como elementos da cultura humana. Tem uma origem e um lugar comum na vida da sociedade, sendo o resultado da histria precedente. Sobre a base da assimilao dos procedimentos socialmente elaborados de ao com estes objetos se produz a orientao cada vez mais profunda da criana no mundo objetal e a formao de suas forcas intelectuais, a formao da criana como componente das forcas
A comunicao emocional direta , neste momento o comportamento
do beb depende das relaes sociais estabelecidas entre a criana e o adulto,
toda a relao da criana com o mundo mediada pelo adulto. A atividade
principal desse perodo de desenvolvimento psicolgico a base para a
formao de aes sensrio-motoras de manipulao e o desenvolvimento das
primeiras palavras. Elkonin (1969, p. 504) argumenta que:
A criana, ao nascer, o mais indefeso de todos os seres vivos. No poderia viver sem os cuidados dos adultos. Somente o cuidado dos adultos, substitui a insuficincia dos mecanismos de adaptao que h no momento de nascer.
O aparecimento de novas palavras, o aprendizado do andar e a
atividade com os objetos mudam a situao social11 (atividade principal) do
desenvolvimento da criana, aparecendo novas formaes no
desenvolvimento, que no correspondem condio social antiga da criana.
Segundo Vigotski (1996c, p. 356), essa:
Nova formao deve sua origem s relaes da criana com os adultos, da colaborao com eles. So eles que impulsionam a criana a uma nova via de generalizao, de domnio da linguagem, etc. E o domnio da linguagem leva a uma configurao nova de toda a estrutura da conscincia.
Nessa idade a criana se comunica atravs do olhar, movimento
corporal, porm, inicialmente essa comunicao se d de forma emocional,
atravs do choro e sorriso do beb. A criana comea a fazer uso dos objetos
pelo uso social que deles fazem os adultos. Elkonin (1969, p. 507) caracteriza
que:
produtivas da sociedade. As atividades de estudo no sero discutidas neste documento pois referem-se ao perodo dos sete aos dez anos de idade, nas palavras de Elkonin (1987, p. 119): o estudo, isto , aquela atividade em cujo processo transcorre a assimilao de novos conhecimentos e cuja direo constitui o objetivo fundamental do ensino a atividade dominante neste perodo. Durante este tem lugar uma intensa formao das foras intelectuais e cognitivas da criana. A importncia primordial da atividade de estudo esta determinada, ademais, porque por meio dela se mediatiza todo o sistema de relaes da criana com os adultos que a circundam, incluindo a comunicao pessoal na famlia. 11
A situao social envolve a relao estabelecida entre a criana e o meio, sendo que
ela no se repete, peculiar e especfica em cada perodo de desenvolvimento. A situao social constitui-se como o ponto de partida para todas as mudanas que ocorrem e que permitem criana adquirir novas propriedades de sua personalidade.
Neste perodo, todas as aquisies da criana aparecem sob a influncia direta dos adultos, que no somente satisfazem todas as suas necessidades, como organizam tambm seu contato variado com a realidade, sua orientao nela e as aes com os objetos. O adulto traz a criana distintas coisas para que as contemple, toca junto com ela o jogo sonoro, coloca em sua mo os primeiros objetos para que os manipule, a criana aprende a sentar-se com a ajuda dos adultos, o adulto o apoia em seus primeiros intentos de pr-se de p e andar, etc. (grifos no original).
medida que surgem novos motivos e necessidades na relao entre a
criana com os adultos, sobressai uma nova atividade principal, envolvendo a
manipulao de objetos, cuja caracterstica implica na apropriao de modos
elaborados de ao junto aos objetos.
Na atividade objetal manipulatria, necessrio a interveno direta
do adulto para que acontea a assimilao. Elkonin (1969, p. 508) considera
que:
Sob a direo dos adultos e em constante contato com eles, a criana aprende a atuar com os objetos, por meio dos quais satisfaz suas variadas necessidades (comer com a colher, beber com a xcara, abotoar os botes, colocar as meias, etc.). No comeo, os adultos executam as aes junto com a criana, e, somente de uma maneira progressiva a deixam com liberdade, vigiando e corrigindo constantemente seus movimentos. Quando a organizao e o mtodo de ensino so bons, a criana aprende com perfeio as maneiras corretas de atuar com os objetos (grifos no original).
preciso que a criana participe das atividades nas quais observe as
suas aes ou nas quais os adultos lhe mostrem formalmente as aes com os
objetos.
A apario do andar independente no somente amplia o crculo dos objetos com os quais a criana se encontra diretamente, mas muda tambm o carter da conduta com muitos outros que antes no lhe eram acessveis. Agora, no somente pode olhar-lhos, mas pode aproximar-se e atuar com eles. Tambm mudam as possibilidades de contato com os adultos: a criana j no tem que esperar que se aproximem, ela mesmo pode aproximar-se e exigir ajuda e ateno por parte deles. Sobre a base de uma convivncia com os adultos em todos os aspectos da vida, tem lugar uma formao rpida da linguagem da criana. Na medida em que domina as aes com os objetos e sobre a base de um desenvolvimento intenso da linguagem, tem lugar a formao de todos os processos psquicos e o desenvolvimento da personalidade da criana (ELKONIN, 1969, p. 508).
A comunicao da criana com o adulto passa a ser mediatizadas pelas
aes objetais, em que se destacam os brinquedos, conforme aponta Elkonin
(1969, p. 508):
Na etapa inicial da aprendizagem das aes com os brinquedos, a criana reproduz as aes indicadas pelos adultos somente com aqueles objetos e naquelas condies em que lhes haviam mostrado. Se o adulto mostrar a criana como dar de beber a boneca com uma caneca, no comeo, ela dar de comer a boneca somente com a caneca e no utiliza outras coisas; se lhe mostram como se d de comer ao gatinho ou ao cachorrinho, ela dar de comer somente a estes animais. No entanto, posteriormente, as aes se generalizam e se executam no somente com aqueles objetos que haviam mostrado, mas tambm com outros parecidos. Agora, a criana lhe d de beber no somente ao cachorrinho e ao urso, mas tambm ao cavalo, boneca e ao cubo de maneira; e no somente com a caneca com que lhe haviam mostrado a ao, mas tambm com a xcara, com a taa, etc. (grifos no original).
Quando a criana j aprendeu os modos de ao com os objetos, ela
passa a querer compreender as relaes, as aes e o comportamento dos
adultos, levando a uma mudana na atividade principal, surgindo o jogo dos
papis.
O jogo de papis (ou jogo protagonizado12) ocorre atravs da
brincadeira, a criana pode realizar aes (como dirigir, um carro, andar de
motocicleta, pilotar um avio) e resolver as contradies entre a necessidade
de agir e a impossibilidade de executar as operaes exigidas pela ao de
outro. Observando as aes humanas e pela imitao dos adultos em suas
relaes sociais, a atividade do faz-de-conta constitui-se na atividade principal
da criana neste momento de seu desenvolvimento psquico (Elkonin, 1987, p.
118).
A brincadeira de papis aparece como a atividade na qual tem lugar a orientao da criana nos sentidos mais gerais, mais fundamentais da atividade humana. Sobre esta base se forma na criana pequena a aspirao para realizar uma atividade socialmente significativa e
12
Jogo de papis ou jogo protagonizado uma atividade peculiar de reproduo de
papis sociais nas brincadeiras das crianas, em que contm regras implcitas, determinadas pela sociedade. O jogo protagonizado caracteriza-se tambm como uma atividade em que seu objetivo se encontra tanto no processo quanto no contedo, por isso uma brincadeira (a palavra russa igra pode significar brincar, brincadeira ou jogo; ela foi traduzida para o portugus como jogo, porm Elkonin refere-se em seu livro Psicologia do Jogo aos processos implcitos da produo infantil e no aos processos explcitos [regras], donde pode-se concluir que a traduo mais adequada para o livro do autor seria Psicologia da Brincadeira, em que a criana reproduz os papis sociais vividos.
socialmente valorada, a aspirao que constitui o principal momento em sua preparao para o aprendizado escolar. Nisso consiste a importncia bsica da brincadeira para o desenvolvimento psquico, nisso consiste sua funo dominante.
Nesta nova etapa, a criana assume a responsabilidade de dar funo
aos objetos, um novo sentido a sua atuao com estes objetos. Nesta ao, a
criana apropria-se do mundo mais amplo dos objetos e das relaes sociais.
Para Elkonin (1987), o principal significado do jogo, permitir que a
criana modele as relaes entre as pessoas. O jogo influenciado pelas
atividades humanas e pelas relaes entre as pessoas, pois a base do jogo
social devido precisamente a que tambm o so sua natureza e sua origem, ou
seja, a que o jogo nasce das condies de vida da criana em sociedade
(Elkonin, 1998, p. 36).
O jogo exerce influncia sobre o desenvolvimento psquico da criana e
sobre a formao de sua personalidade, assim, para Elkonin (1998, p. 421) A
evoluo do jogo prepara para a transio para uma nova fase, superior, do
desenvolvimento psquico, a transio para um novo perodo evolutivo.
No perodo pr-escolar, o que se constata que as necessidades
das crianas so supridas pelos adultos, estas se sentem dependentes nessa
relao com eles. O mundo infantil dividido em duas partes, um formado
pelos seus pais e pessoas que convivem com ela e outro com as demais
pessoas que compe a sociedade (ELKONIN, 1969, p. 512):
Graas independncia e s relaes verbais com os adultos que ampliaram-se, a criana comea a conhecer um amplo crculo de pessoas fora da famlia. Ante ela se abre, em certa medida, a vida de seu bairro, de sua cidade e inclusive a de seu pas. Neste novo mundo que se abre ante ela, interessam-lhe, sobretudo, as pessoas, sua atividade, seu trabalho, os objetos com que atua e as relaes entre as pessoas. Na criana, cresce a tendncia a tomar parte na vida e na atividade dos adultos, e quer aprender na relao que tem com ele o novo mundo dos objetos humanos, ao incorporar a atividade das pessoas e suas relaes mtuas. Porm as crianas pr-escolares ainda no aprenderam a atuar da mesma maneira que os adultos. Por isso, sua tendncia a tomar parte na vida e atividade dos adultos, a manejar realmente os objetos com que atuam, realiza-se em um tipo especial de atividade caracterstica para a idade pr-escolar, na brincadeira, que a atividade fundamental da criana neste perodo de desenvolvimento (grifos no original).
Atravs do jogo, a criana modifica seu comportamento, suas atitudes e
seus valores. Elkonin (1998) ressalta que esta evoluo do jogo prepara a
criana para a transio de uma nova fase do desenvolvimento psquico,
preparando a criana para um novo perodo de desenvolvimento, o da
atividade de estudo.
Esta temtica pe em evidncia o papel do meio social na formao do
psiquismo propriamente humano e tem sido colocada em pauta por educadores
que consideram que a Abordagem Histrico-Cultural (da Atividade) pode e
deve contribuir para o desenvolvimento e a efetivao de uma educao
progressista. Elkonin (1969, p. 326) considera que:
qualquer operao mental comea quando o estudante, que ainda no sabe operar independentemente, segue as explicaes e exemplos do professor, formando-se previamente uma ideia muito incompleta do que tem que aprender. Esta e a etapa de orientao inicial, em que se conhece pela primeira vez a operao que se deve fazer. A etapa seguinte a execuo prtica da operao, utilizando objetos reais ou as imagens que os substituem. Na terceira etapa, a operao se realiza sem atuar praticamente com os objetos, porm, utilizando a linguagem em voz alta. A quarta etapa se realiza mentalmente (utilizando somente a linguagem interna). Finalmente, na quinta etapa, tem lugar o estabelecimento definitivo da operao mental com o desaparecimento de algumas relaes que agora j so desnecessrias (grifos no original).
A Abordagem Histrico-Cultural (da Atividade) considera que o processo
de ensino/aprendizado impulsiona o desenvolvimento das funes psicolgicas
superiores. As crianas, a partir do trabalho com os conceitos cientficos
ampliavam sua capacidade de lidar de forma lgica com os prprios conceitos
cotidianos.
Desta forma, o processo ensino/aprendizado entendido como a
realizao conjunta de uma atividade, em que as pessoas interagem para
chegar a uma determinada meta, encontram-se em nveis diferentes de
compreenso sobre o processo para resolver o problema.
O desenvolvimento interno se d a partir da relao social, que externa
ao indivduo. Porm o significado de externa no o de alheia, apartada,
distanciada, dos sujeitos que realizam tais aes, mas no sentido de extra-
cortical, ou seja, para alm dos limites do crebro, para alm dos limites do
campo interno (envolvendo ao mesmo tempo interno e externo numa relao
dialtica e indissocivel entre sujeito-sujeito, sujeito-objeto).
A gnese das funes psicolgicas a relao. E a relao sempre se
baseia num desenvolvimento j existente (partindo no incio dos reflexos, dos
movimentos bsicos, das expresses emocionais do beb que desde bem
cedo j vo se constituindo como maneiras da criana ativamente direcionar-se
com relao ao meio fsico e social).
Contudo, as novas formas de interagir com o mundo surgiro sempre do
campo da relao, especialmente da relao entre pessoas. Bruner (1985, pp.
24-25) destaca esse processo, ao argumentar que:
Se a criana capaz de avanar da existncia sob a tutela de um adulto ou um par mais competente, ento o tutor ou o par serve ao aprendiz como uma forma indireta de conscincia at o tempo em que o aprendiz seja capaz de controlar sua prpria ao atravs de sua prpria conscincia e controle. Quando a criana alcana aquele controle intencional sobre uma nova funo ou sistema conceitual, ento que ela capaz de us-la como um instrumento. Sobre este ponto, o tutor na realidade desempenha a funo de andaime de tornar a tarefa de aprendizagem possvel para a criana, nas palavras de Vygotsky, internalizar conhecimento externo e convert-lo em um instrumento para controle da conscincia.
Enfim, pode-se afirmar com base na Abordagem Histrico-Cultural (da
Atividade) que desde o incio a criana constitui-se socialmente,
relacionando-se ativamente com outras pessoas (que, diferentemente dos
objetos que compem o mundo com o qual ela se relaciona, intervm
ativamente sobre as atitudes dela, tendo em vista determinadas metas,
determinadas concepes de mundo) e realizando com tais pessoas atividades
conjuntas.
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