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Ana Cecília de Oliveira Gândara Boa-Ventura O Impacto da Comissão Europeia nas Dinâmicas de Mudança no Ensino Superior da UE Dissertação de Mestrado em Relações Internacionais, na área de especialização em Estudos Europeus, apresentada à Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra para obtenção do grau de Mestre.

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O Impacto da Comisso Europeia nas Dinmicas de Mudana no Ensino Superior da Unio Europeia

Bibliografia

O Impacto da Comisso Europeia nas Dinmicas de Mudana no Ensino Superior da Unio Europeia

Bibliografia

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Ana Ceclia de Oliveira Gndara Boa-Ventura

O Impacto da Comisso Europeia nas Dinmicas de Mudana no Ensino Superior da UE

Dissertao de Mestrado em Relaes Internacionais, na rea de especializao em Estudos Europeus, apresentada Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra para obteno do grau de Mestre.

Orientador: professor doutor Augusto Rogrio Leito

Coimbra, 2012

O Impacto da Comisso Europeia nas Dinmicas de Mudana no Ensino Superior da Unio Europeia

Abstract

III

Mestrado em Relaes Internacionais

Sumrio

Em 2013 termina o programa PROALV que dar lugar a um novo programa global no mbito do ensino superior: o Erasmus for All. A ser aprovado nos termos em que foi proposto, o programa originar uma profunda mudana na tradicional universidade humboldtiana e provavelmente uma viragem neoliberal definitiva. Esta a altura de repensar o ensino superior europeu e decidir se o caminho passa pela adeso a um certo tipo de universidade, que vive para satisfazer os rankings e vender programas ou, se pelo contrrio, o ensino superior europeu deve primar pela diferena e manter a prtica da universidade como um bem pblico.

A mudana de paradigma que se tem vindo a verificar no ensino superior - da cooperao para a competio - no s resultado do panorama internacional e de uma crescente globalizao que devemos considerar como inevitvel mas tambm promovida internamente na UE.

Esta tese examina o papel da Comisso Europeia (CE) nessa mudana, especificando os instrumentos utilizados para a promover. A anlise foi realizada sob o enquadramento terico do Institucionalismo discursivo e a trs nveis: institucional, poltico e de governao. Sempre que possvel realizou-se a triangulao dos trs nveis para compreender at que ponto a influncia da CE foi importante no desenhar da universidade do sculo XXI.

Para a concretizao do objetivo proposto recorreu-se especialmente a fontes primrias, aprendizagem decorrente da participao em quatro conferncias sobre o tema e a trs entrevistas realizadas: um funcionrio da DG-Educao da CE, a um especialista em liderana no ensino superior e a um membro do Bologna Follow-Up Group (BFUG).

Este estudo sugere o interesse de uma anlise longitudinal da influncia da CE sobre o ensino superior no perodo ps-Lisboa, com nfase nas consequncias das variaes na governao que refletem essa influncia e as flutuaes no equilbrio de poderes subnacional, nacional e supranacional.

Palavras-Chave: Internacionalizao, Globalizao, Paradigma, Mobilidade, Aprendizagem ao Longo da Vida, Governao.

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Sumrio

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Sumrio

III

Mestrado em Relaes Internacionais

Mestrado em Relaes Internacionais

Abstract

In 2013, the Life Long Programme ends and a new global programme of higher education will rise in Europe: Erasmus for All. This programme is being the object of public discussion in the European Parliament at the time this study is taking place. If it is approved in the terms it was proposed, it will change the face of the humboldtian university and will probably lead us to a final neoliberal turn. This is the right moment to rethink higher education and decide if the new path will be represented by a certain type of university that lives for rankings and to sell programmes or if the European system of higher education should strive to be different, and defend the idea of university as public good.

The paradigm shift that has been taking place in higher education-from cooperation to competition- is not only the result of the international environment and of an increasing and inevitable globalization but also of an internal promotion by the EU.

This thesis examines the role of the European Commission in this shift, and specifies the tools used to promote it. The theoretical frame is the discursive Institutionalism and the study was developed in three levels: institutional, political and governance. Whenever possible, a triangulation of the three levels was conducted, in order to understand the influence of the European Commission in the genesis of the XXI century university.

To conduct this study, primary sources were used, and three interviews were conducted: to a staff member of DG-Education in Brussels, an expert in higher education leadership and a member of the Bologna Follow-Up Group (BFUG). The knowledge gathered through the participation in four thematic conferences was also pivotal.

This study suggests the need to conduct a longitudinal analysis on the influence of the European Commission in higher education after the Lisbon treaty, stressing the governance turn and the balance of power between the Council and the Commission at the subnational/national and supranational levels.

Key Words: Internationalization, Globalization, Paradigm, Mobility, Lifelong Learning, Governance.

VI

O Impacto da Comisso Europeia nas Dinmicas de Mudana no Ensino Superior da Unio Europeia

Abstract

O Impacto da Comisso Europeia nas Dinmicas de Mudana no Ensino Superior da Unio Europeia

Abstract

V

Agradecimentos

No final desta minha pesquisa e tendo em conta as limitaes de tempo da minha vida profissional e pessoal, agradeo a todos aqueles de alguma forma contriburam para concluir esta minha caminhada de um ano.

Ao meu orientador professor doutor Augusto Rogrio Leito que me ajudou a questionar; ao professor doutor Jos Manuel Silva, por me ter deixado voar; aos professores doutores Carmen Mendes e Andr Barrinha, por tudo o que me ensinaram; aos meus colegas de curso que sempre me acolheram como um deles apesar da diferena de idade, ao professor doutor Pedro Lourtie, pela inestimvel colaborao; ao professor doutor Maral Grilo pela inspirao; minha colega dra. Rita Gaivoto pela valiosa ajuda na reviso; minha colega dra. Naide Martins, pelo apoio, e por ter assumido diversas vezes uma sobrecarga de trabalho sempre com um sorriso nos lbios, revelando a nobreza de carter que sempre lhe reconheci. Finalmente minha maravilhosa irm que embora vivendo a milhares de quilmetros de distncia nunca deixou de ser a minha referncia e a minha fora.

Em memria de meu pai

O Impacto da Comisso Europeia nas Dinmicas de Mudana no Ensino Superior da Unio Europeia

Agradecimentos

VII

ndice

Introduo17

I. O Contexto25

I.1. Sumrio25

I.2. A evoluo da Universidade Europeia26

I.3. Mudana de Paradigma Cooperao/Competio30

I.4. Internacionalizao versus Globalizao41

I.5. Europeizao49

II. As Instituies53

II.1. Sumrio53

II.2. De Bolonha a Lisboa a mo invisivel da CE55

II.3. Think European for Global Action69

II.4. As IES e os Novos Desafios77

III. As Polticas85

III.1. Sumrio85

III.2. A Sociedade do Conhecimento87

III.3. A Mobilidade no Ensino Superior92

III.4. Aprendizagem ao Longo da Vida108

III.5. Dimenso social120

IV. A Governao131

IV.1. Sumrio131

IV.2. O Excesso de Passado da UE e a Governao131

IV.3. Hard Law e Soft Law137

IV.4. Discurso e Governao147

IV.5. Metagovernao?152

Concluso157

Fontes Primrias159

Bibliografia165

XII

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ndice

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ndice

IX

Lista de Quadros

Quadro 1 Programas mais importantes da UE para o ensino superior97

Quadro 2 Criao e consolidao da ALV de 1993 a 2000115

Quadro 3 Modos de governao na UE153

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Lista de Quadros/Tabelas

XI

Lista de Figuras

Figura 1 Fatores de Internacionalizao44

Figura 2 Comparao Bolonha / Follow-up / Lisboa62

Figura 3 A Declarao de Bolonha versus a Estratgia de Lisboa76

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Lista de Figuras/Mapas

XIII

Lista de Acrnimos

ALV Aprendizagem ao Longo da Vida

BFUG Bologna Follow-Up Group

CE Comisso Europeia

DB Declarao de Bolonha

DGE-CE Direo-Geral de Educao da Comisso Europeia

EEES Espao Europeu de Ensino Superior

EEI Espao Europeu de Investigao

E&F Educao e Formao

EL Estratgia de Lisboa

EUA European University Association

ESU European Students Union

ID Institucionalismo Discursivo

IES Instituies de Ensino Superior (abrangendo Universidades e Politcnicos)

IH Institucionalismo Histrico

IR Institucionalismo Racional

IS Institucionalismo Sociolgico

MAC Mtodo Aberto de Coordenao

PB Processo de Bolonha

PEV Poltica Europeia de Vizinhana

PLA Peer Learning Activities

PROALV Programa de Aprendizagem ao Longo da Vida

TIC Tecnologias da Informao e Comunicao

TL Tratado de Lisboa

UE Unio Europeia

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ndice

O Impacto da Comisso Europeia nas Dinmicas de Mudana no Ensino Superior da Unio Europeia

Lista de Acrnimos

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Introduo

Hier a semblait la fois plus court et plus long, de toute faon on avait pas eu lide de compter, puisque a ntait pas termin. A prsent, cest termin. Ctait un faux avenir. Tout ce quon a vecu depuis vingt ans, on la vecu faux. Nous tions appliqus et srieux, nous essayions de comprendre

(Sartre, J. P (1972) Les Chemins de la Libert. vol.2, Gallimard.Paris: 86.)

O repensar o ensino superior na UE faz parte do processo de mudana que se tem produzido, especialmente nos ltimos trinta anos. No panorama nacional e internacional, alteraes polticas, relaes pblico-privadas, a globalizao econmica, as tecnologias da informao e da comunicao, a relao entre o local, o nacional, a Europa e o resto do mundo e a crise so fatores que interligados determinam a face da universidade no sculo XXI. No momento em que nova mudana se avizinha com a estratgia 2020 e a entrada de um novo programa comunitrio abrangente e transversal ao ensino superior, urge fazer uma anlise do percurso desenvolvido na rea e a influncia de uma instituio em particular, a CE, na definio desse percurso.

A questo que pretendo colocar prende-se com o papel da CE nessa mudana, mais concretamente, com os instrumentos utilizados para a promover junto das instituies de ensino superior (IES). Comearei por contextualizar o panorama universitrio dos ltimos 30 anos a nvel internacional, dividindo-se os trs captulos seguintes no processo de integrao das IES promovido pela CE, a trs nveis: nvel institucional, nvel das polticas e, finalmente, nvel da governao, fazendo, sempre que possvel, a triangulao dos aspetos relevantes sob as trs perspetivas no desenhar das IES no sculo XXI.

A anlise ter como base maioritariamente fontes primrias o stio da CE, da DG-Educao e Cultura, assim como em entrevistas que irei realizar, a um funcionrio da DG-Educao-Bruxelas que pretende manter o anonimato, ao professor doutor Jos Manuel Silva, especialista em liderana no ensino superior, ao professor doutor Pedro Lourtie, especialista no processo de Bolonha e membro do Bologna Follow-Up Group (BFUG), relatrios da European University Association (EUA), de especialistas na educao, em quatro conferncias em que participei e na minha atividade profissional de 18 anos de programas comunitrios. Optei por realizar a reviso da bibliografia no incio de cada captulo e, dada a diversificao de autores, baseei-me na pesquisa bibliogrfica pelos mais emblemticos em cada rea temtica consultada, mais controversos e mais recentes.

O presente histrico corresponder aos ltimos 30 anos, que coincidem com a mudana de paradigma no ensino superior da cooperao para a competio, e os programas abordados sero aqueles relacionados com a construo do Espao Europeu de Ensino Superior (EEES) e no com o Espao Europeu de Investigao (EEI); os dois sempre se moveram em universos paralelos sem se cruzarem e foram impulsionados por polticas e programas diferentes- porque o primeiro tem vindo a ser explorado de forma mais consistente e durante um perodo de tempo maior, ser essa a rea que ser objeto do meu estudo.

Os conceitos mais importantes a definir so os de paradigma e mudana de paradigma, globalizao, internacionalizao, europeizao, governao e aprendizagem ao longo da vida (ALV).

Para Thomas Kuhn[footnoteRef:1], o termo paradigma significa um modelo de pensamento tradicional e a mudana de paradigma define-se com a mudana desse pensamento tradicional que pode ser progressiva, ou revolucionria. Como se ver mais adiante a progresso em determinados reas foi quase revolucionria. [1: Kuhn, S. Thomas.(1970) The Structure of Scientific Revolutions. Chicago: University of Chicago Press.]

A globalizao, pelo seu lado est sujeita a maior variedade e controvrsia nas definies, assim, optei por uma definio muito abrangente, se bem que no primeiro captulo sero abordadas outras perspetivas, representativas do leque variado de interpretaes que dado ao fenmeno. O autor da definio consensual que apresento Van der Wende, um estudioso do processo de globalizao e internacionalizao. Segundo o autor, a globalizao um processo geo-espacial de interdependncia e convergncia crescente a nvel mundial. A europeizao tambm est sujeita a diferentes interpretaes, a adotada nesta tese, refere-se forma com as instituies nacionais e subnacionais acolheram o discurso europeu. Radaelli[footnoteRef:2] usa o termo no mbito do Institucionalismo discursivo (ID) que ser a teoria que irei utilizar. [2: Radaelli M (2004) European Integration online Papers EIoP. Vol 8 N1[http://eiop.or.at/eiop/texte/2004-016a.htm[acesso 21/03/2012]. ]

Europeanization consists of processes of a)construction, b) diffusion and c) institutionalization of formal and informal rules, procedures, policy paradigms, styles, 'ways of doing things' and shared beliefs and norms which are first defined and consolidated in the EU policy process and then incorporated in the logic of domestic (national and sub-national) discourse, political structures and public policies.

(Radaelli, 2003:31)

A europeizao refere-se ao processo atravs do qual as normas so apreendidas no espao da UE, tanto formal como informalmente, e dentro da lgica de comportamento dos atores nacionais e subnacionais.

O enquadramento terico que me pareceu mais adequado estrutura desta tese a do ID de Radaelli e Schmidt, ou seja a viso da institucionalizao como um discurso. A UE construda pela linguagem e discurso, podendo este ltimo tomar diversas formas alterando as preferncias dos autores, reformulando problemas, criando um estilo mais cooperativo ou mais competitivo, aumentando ou reduzindo recursos, tudo isto atravs de um processo ideacional interativo. A vertente interativa cobre no s as relaes dos decisores de opinio na formulao poltica como tambm a forma como as polticas so comunicadas ao pblico. O discurso no seu ambiente institucional, encarado como um poder de gerar mudana na poltica da UE mas que s entendvel quando estudado na sua vertente institucional (Schmidt, 2002) e (Schmidt e Radaelli, 2004).

A vertente ideacional pode por sua vez ser dividida em duas atividades, uma cognitiva e outra normativa sendo comum s duas a mudana. Nesta tese ser analisada a mudana ocorrida por interveno de uma instituio controversa e fascinante, a CE, quer esta surja atravs de comunicados, tratados, livros brancos, estudos, relatrios, processos de socializao ou alteraes na governao. Afinal pretende-se averiguar a forma como a CE contribuiu para alterar a agenda europeia das IES atravs de diversos mecanismos de europeizao que sero analisados.

Finalmente, h que referir dois conceitos de grande importncia para a presente tese, governao e metagovernao. Para a governao, irei utilizar a definio que consta do livro branco sobre governao europeia[footnoteRef:3] Governao designa o conjunto de regras, processos e prticas que dizem respeito qualidade do exerccio do poder a nvel europeu, essencialmente no que se refere responsabilidade, transparncia, coerncia, eficincia e eficcia (CE, 2000. 1547/7). Por outro lado, metagovernao a coordenao de diferentes formas de governao, assegurando um mnimo de coerncia entre elas (Jessop, 1997: 7). [3: CE (2000) White Paper on European Governance. Enhancing Democracy in the European Union, Work Programme, documento de trabalho da Comisso Europeia, SEC (2000) 1547/7 Bruxelas: CEC.]

No primeiro captulo ser realizada uma breve anlise histrica contextualizando o ambiente em que as IES se movem a nvel internacional, a influncia maior o menor da globalizao e da mudana de paradigma.

O segundo captulo incidir sobre os principais atores no processo de transformao: as instituies de ensino superior (IES), os Estados Membros (EM) atravs da Declarao de Bolonha (DB) e a Unio Europeia (UE), atravs da Estratgia de Lisboa (EL).

O terceiro captulo abordar as grandes polticas da CE na rea do ensino superior, designadamente a sociedade do conhecimento, a mobilidade, a aprendizagem ao longo da vida (ALV) e a dimenso social. A sociedade de conhecimento um termo utilizado pela CE, mas nunca verdadeiramente definido, e caracterizado como a sociedade atual, para a qual necessrio os cidados europeus munirem-se de diferentes ferramentas: na produo de novo conhecimento, a sua transmisso pela educao e formao, a sua disseminao pelas tecnologias da educao e formao e o seu uso nos servios e indstria.

O conceito de mobilidade que ser abordado o da mobilidade no ensino superior, por perodos curtos de tempo e no mbito dos programas da CE, ou seja, mobilidade transversal. A ALV caraterizada como a educao e formao constante ao longo da vida, cradle to grave, como alguns autores ironizam. A dimenso social, trata-se de novo de um conceito vago e passvel de muitas interpretaes, mas que usado pela CE para manter o modelo social europeu e que no deixa de ser um bom exemplo do seu discurso com vista europeizao.

Finalmente, o quarto captulo abordar a governao europeia, a hard law e a soft law, o mtodo aberto de coordenao (MAC) e a forma como na governao o discurso poltico continua a ser influenciado pela CE.

A vertente terica que acabou por surgir naturalmente ao longo da tese o quarto institucionalismo, aqui denominado ID mas que conhecido tambm por outros nomes como Institucionalismo ideacional e Construtivismo institucionalista. A governao na UE ser analisada em trs tipos de governao: uma que se continua a desenvolver no mbito da governao multinvel (GMN), outra que se centra no MAC e que a governao em rede (GR) e, finalmente, a metagovernao A governao das governaes.

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O Impacto da Comisso Europeia nas Dinmicas de Mudana no Ensino Superior da Unio Europeia

Introduo

O Impacto da Comisso Europeia nas Dinmicas de Mudana no Ensino Superior da Unio Europeia

Introduo

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I. O Contexto

I.1. Sumrio

Os autores escolhidos para a contextualizao da tese foram em primeiro lugar o Boaventura Sousa Santos, pela anlise da universidade ao longo dos tempos e os desafios que se lhe colocam no sculo XXI. Quanto globalizao e internacionalizao, a escolha recaiu sobre os autores da Escola de Twente, como Van der Wende, de Wit ou Teichler e ainda autores como Knight, Altbach, Marginson e Scott, que foram dos primeiros a explorar a internacionalizao e globalizao, e a sua influncia no ensino superior. Schmidt, Hall, Olsen e Powell, Radaelli e Sabatier foram determinantes na construo do quadro terico que comea a ser esboado neste captulo, assim como Ricardo Novoa na abordagem europeizao.

Depois de uma breve viagem pela universidade ao longo dos tempos, sero analisados os fatores concretos que causaram uma mudana de paradigma nos ltimos 30 anos, numa universidade, pouco dada a mudanas e cujas alteraes ao longo dos tempos foram ocasionais e pouco frequentes. Esta anlise ser exgena, no sentido de entender as alteraes na dimenso internacional que provocaram a mudana de paradigma nas IES europeias da cooperao para a competio, particularmente no modelo humboldtiano[footnoteRef:4]. [4: Wilhelm Von Humboldt, o criador da universidade moderna, introduziu no panorama do ensino alemo uma nova ideia adotada por toda a Europa,: as escolas superiores no deveriam apenas ensinar, como tambm pesquisar.]

Acompanhando as alteraes no passado recente e que conduziram ao atual modelo das IES, h que reter uma mudana na internacionalizao, de fator secundrio e reativo para um dos seus mais pr-ativos objetivos. Para melhor entender a viragem fundamental, alguns dos fatores determinantes da mudana sero sucessivamente referidos, o papel da globalizao e a crescente comercializao do ensino a nvel mundial, o papel da UE na definio de novos conceitos e valores, a resposta dos EM mudana e a forma como esta se instalou, a importncia da internacionalizao e da globalizao, os desafios que so colocados s IES e os novos valores difundidos pela UE na construo de uma identidade europeia.

I.2. A evoluo da Universidade Europeia

Numa anlise holstica, torna-se importante uma breve viagem pela universidade ao longo dos tempos e da tirar ilaes para a maior ou menor dificuldade na mudana de paradigma atual. Existem fronteiras temporais que servem para demarcar diferentes perodos na evoluo da universidade, sendo importante verificar que a internacionalizao e a mobilidade no so conceitos novos o que se tem vindo a modificar a forma como estas realidades so encaradas.

Recuando Idade Mdia, recordemos a Universidade de Bolonha, a mais velha da Europa: nasceu h 900 anos num contexto eclesistico, logo seguida pelas universidades de Oxford e Paris que remontam ao sculo XII e Coimbra e Salamanca ao sculo XIII. A mobilidade, nestas universidades medievais, era inter-regional, habitual, mas altamente elitista pela escassez do binmio oferta-procura, o programa de estudos era comum studium generale e a lngua tambm era comum- o latim. Curiosamente, alguns dos maiores entraves mobilidade dos nossos dias, o programa de estudo e a lngua, no pareciam constituir obstculo burocrtico e acadmico na velha universidade medieval. Em contrapartida o peso institucional desta universidade refletia-se internamente, vivia divorciada da sociedade, e quando tal separao existe, a instituio peca por falta de relevncia e projeo.

Passado o perodo medieval, as universidades europeias continuaram a crescer, viradas para dentro, ignorando do alto da sua Ivory Tower o Renascimento e a revoluo industrial. A maior parte das universidades produto dos Estados-Nao do sculo XIX e XX, a sua funo tradicional, a formao profissional de elites, o ensino e a pesquisa, perduraram ao longo dos ltimos dois sculos.

A Napoleo Bonaparte se devem os primeiros passos na definio do ensino tcnico, estabelecendo as Grandes coles destinadas ao desenvolvimento das tecnologias para criar melhores e mais preparados servidores do Estado que no sculo XX iriam dar origem ao ensino politcnico. A universidade moderna, no entanto, cuja identidade ficou para sempre ligada a Wilhelm Von Humboldt, consequncia da secularizao, do estado moderno e do poder crescente da burguesia. Nesta universidade, o ensino e a pesquisa estavam interligados, no s se ensinava mas tambm se contribua de forma positiva para a pesquisa e para o avano do conhecimento que assentava na investigao cientfica e no no desenvolvimento tecnolgico. A universidade era um instrumento do estado, elitista e fechada sobre si prpria. O investigador padecia do que Boaventura Sousa Santos apelidou de irresponsabilidade social[footnoteRef:5]. Os professores eram livres nas suas pesquisas e sujeitos apenas a avaliao dos seus pares, se bem que o Estado, superiormente, pudesse intervir na sua organizao e funcionamento. O conhecimento foi subdividido em disciplinas especializadas reconhecidas internacionalmente, standards comuns e aceites pela comunidade acadmica. Humboldt atribuiu especial importncia ao facto dos assuntos acadmicos ficarem na esfera acadmica sem presses da sociedade. [5: Santos, Boaventura Sousa, A Universidade do Sculo XXI- Para uma Universidade Nova, Coimbra.Outubro 2008.]

Apesar do sculo XIX ter assistido ao capitalismo e poltica do laissez-faire, a universidade no era um negcio. Esta universidade, que foi aquela que permaneceu at aos nossos dias, desenvolveu um conhecimento sobretudo disciplinar e viveu de forma descontextualizada em relao ao quotidiano das sociedades (Santos, Boaventura de Sousa, 2008:17). A universidade servia para produzir conhecimento que poderia ou no ser aplicado posteriori pela sociedade.

Aps a Segunda Guerra Mundial, com a gerao do baby boom, a democratizao, e um certo otimismo econmico, o acesso s universidades generalizou-se. A maioria das IES surgiu j no sculo XX sobretudo devido procura generalizada aps a Segunda Guerra Mundial, que abalou a universidade elitista. Houve necessidade de fazer as primeiras adaptaes procura generalizada, se bem que os anos 70 tenham trazido a primeira crise econmica do ps-guerra. viso filosfica humanista de Humboldt e a ideia de unidade e homogeneidade do modelo alemo opunha-se o funcionalismo e diversidade das instituies de ensino superior anglo-saxnicas (Parsons e Platt, 1973). A expanso do ensino superior em todo o globo foi de tal forma marcante que bastar fazer uma comparao entre os valores de 2000: 100 milhes de estudantes no ensino superior, enquanto no incio do sculo XX o nmero rondava os 500 mil estudantes (Schofer e Meyer, 2005).

A volatilidade do mercado exigia competncias que os programas rgidos das universidades europeias no acompanhavam. Contriburam para aprofundar a crise institucional as medidas levadas a cabo por John Major, primeiro - ministro ingls, que passou indiscriminadamente os politcnicos a universidades[footnoteRef:6]. [6: Grilo, Maral (2011) European Conference on Higher Education in the Framework of the 2020 Europe Unions Strategy- Centro de Excelncia Jean Monnet Lisboa 10/11novembro]

Numa perspetiva histrica, as alteraes que afetaram a dimenso internacional do ensino superior europeu tiveram a sua origem na emergncia do Estado-Nao no sculo XIX; no papel da Europa no mundo, particularmente como potncia colonizadora nos processos de colonizao e descolonizao; no impacto de pases como o Reino Unido, a Alemanha e a Frana no ensino superior do resto do mundo; nas polticas de integrao europeia; na queda da URSS e do muro de Berlim; na recesso financeira e a massificao do ensino superior.

I.3. Mudana de Paradigma Cooperao/Competio

Recuando no tempo vamos encontrar inicialmente a expresso Paradigm Shift na obra de Thomas Kuhn.[footnoteRef:7] Os agentes e as estruturas so afetados por relaes de cooperao e competio que, por sua vez, originam uma complexa rede de relaes em contnua transformao com regras especficas, mudanas de discurso e intercmbios que lembram outras noes mais recentes, mas no menos importantes que podero originar a mudana de paradigma refiro-me aos campos de poder de Bordieu[footnoteRef:8]. Este considerava que o lugar ocupado pelos agentes e instituies em cada campo estava sujeito a um nvel mnimo de acordo nos princpios base - estes campos so caraterizados no como consenso total mas sim por um constante conflito. A manifestao das estratgias definida como posio adquirida (Bordieu, 1993: 35), O poder simblico como poder de constituir o dado pela enunciao, de confirmar ou de transformar a viso do mundo e, deste modo, a ao sobre o mundo, permite o equivalente daquilo que obtido pela fora (fsica ou econmica), graas ao efeito especfico de mobilizao (Bordieu, 1993: 14) Perpetuar ou subverter as regras do jogo, atravs das estratgias dos agentes, uma tendncia. Habitus uma noo primordial na sociologia de Bourdieu, que diz respeito aos sistemas de perceo, de apreciao, ou como princpios de classificao incorporados pelos agentes a partir das estruturas sociais presentes em um momento dado, em um lugar dado, que vo orient-los nas suas aes. [7: Kuhn, Thomas (1970) op. cit.] [8: Bourdieu, Pierre (1993) The Field of Cultural Production. Cambridge: Polity.]

As caractersticas do "novo saber", virtual, interdependente e novo, obrigam a mudanas na aprendizagem e a uma interdisciplinaridade. O ensino superior situa-se no cruzamento da pesquisa, educao e inovao e como tal um elemento crucial no desenvolvimento da sociedade do conhecimento e elemento chave para a competitividade da UE. As IES encontram-se envolvidas em dinmicas de mudana que j esto a alterar a sua identidade institucional, h que avaliar at que ponto os fatores externos obrigam mudana, se existe apenas um tipo de presso ou muitas apontadas em direes diferentes e que geram obrigaes ou necessidades de adaptao.

preocupante a Europa aspirar a ser a economia e sociedade do conhecimento mais competitiva e dinmica do mundo[footnoteRef:9] e as questes estruturais estarem por definir em diversas reas. Observa-se uma ntida dificuldade de adaptao e inovao que se reflete na competitividade. As dinmicas de mudana exteriores foram to rpidas no ltimo meio sculo que as IES no conseguiram acompanhar o clima de constante mudana. Para conseguir sobreviver mudana de paradigma necessrio aprender a competir no mercado global, conseguir dar rpida resposta s alteraes estruturais e finalmente, mas no menos importante, conseguir mudar a sua realidade institucional para um pensamento competitivo. [9: Estratgia 2020 http://europa.eu/abc/12lessons/lesson_8/index_pt.htm [acesso em 11/04/2012] ]

Sem dvida que as IES tm sido influenciadas por fatores externos mas o tempo institucional mais lento na mudana do que o tempo do mercado globalizado. Historicamente, as universidades tm sobrevivido e conseguido tornear as crises e as mudanas e aproveit-las a seu favor mas no h garantias que o consigam fazer desta vez se no apressarem o seu relgio institucional. A competitividade obriga as IES a ter uma maior preocupao em oferecer curricula de alta qualidade em reas inovadoras, atrair maior nmero de pessoas para as cincias e tecnologia, promover a mudana profunda da estrutura da educao para a indstria (apud Cameron, 1992 em Gumport e Sporn, 1999). A mudana tem caractersticas revolutionary, rather than evolutionary (apud Kerr, 1987 em Gumport e Sporn, 1999). As exigncias do capitalismo global impedem as IES de cumprir livremente a sua misso cultural em detrimento de habilitar os estudantes com as necessrias competncias para enfrentar uma sociedade em constante transformao e prepar-los para um mercado de trabalho sempre diverso, mais exigente e mais global.

A adaptao faz parte de um processo de transformao e inovao, envolvendo abertura e responsabilidade perante as exigncias do mercado. A internacionalizao, uma das grandes bandeiras da CE, requer adaptao institucional, com a mudana de paradigma, o desafio do ensino superior o de no permanecer preso ao passado da forma tradicional. A cooperao e a transferncia aberta do conhecimento no so suficientes nesta nova sociedade em constante mutao; a competio vista como soluo para trazer fontes de rendimento superiores s instituies, aumentar a reputao das IES e potenciar a excelncia - resta, no entanto, determinar de que forma as polticas supranacionais, nacionais e institucionais se adaptam mudana de paradigma (cooperao/competio).

A globalizao aparece muitas vezes como justificao para determinadas medidas estratgicas com vista competio mas a cooperao mantem igualmente um lugar de destaque e chegam a conviver lado a lado em diversos documentos tanto produzidos pelos EM, como produzidos pela CE. A Declarao de Bolonha (DB) refere a necessidade da Europa se tornar mais competitiva a nvel global mas por outro refere diversas vezes a cooperao como seu objetivo; a diversidade cultural focada como elementos fundamental e choca, por sua vez, com a convergncia mencionada. A estratgia de apoiar o EEES e a cooperao entre as IES europeias entra em conflito com a comercializao do ensino superior atravs da importao de estudantes de fora da Europa vendendo programas a nvel internacional fator que desmotiva as IES para a cooperao intraeuropeia. A dimenso social e a promoo das IES como um bem pblico para todos entra em choque com os cortes nos financiamentos. A globalizao acaba por ser justificao para medidas contraditrias se bem que existem muitas formas de a definir e mesmo em documentos da CE ela aparece umas vezes como ameaa, outras como um desafio a que temos de corresponder, outras como uma realidade instalada (Relatrio Wim Kok, 2004)[footnoteRef:10]. [10: Kok, W. (2004) A Estratgia de Lisboa para o crescimento e o emprego, Relatrio do Grupo de Alto Nvel presidido por Wim Kok, Bruxelas, novembro. ]

O estado-nao est em crise assim como os modelos sociais apoiados no bem-estar social. O facto da universidade humboldtiana estar to dependente dos dois conceitos, implica j de si uma reestruturao das IES.

O que na realidade enfrentamos uma desobrigao do estado como facilitador de atividades que impliquem fundos pblicos. As IES no podem ser vistas isoladamente mas sim como mais uma categoria de instituies, entre muitas outras, vtimas das mudanas polticas, econmicas, culturais e civilizacionais. A forma como as IES esto a enfrentar os desafios que se lhes colocam ir sacrificar algumas mas ir definir as que realmente esto preparadas para a mudana e principalmente as que esto preparado para transformar a mudana em novas oportunidades[footnoteRef:11] (Lourtie, 2011). [11: Lourtie, Pedro (2011). Reunio Novas Formaes. Escola Superior de Sade. Instituto Politcnico de Leiria. 5 de dezembro]

As IES so foradas a responder s presses vindas do exterior e que as colocam frente s mudanas na sociedade, aos valores divulgados pela UE a nvel supranacional, s presses nacionais e objetivos definidos para o pas, presso do mercado, e cultura normativa do meio acadmico. Estamos perante diferentes instituies que tm ritmos de adaptao diferentes e que nos permitem inferir da complexidade de relaes existentes entre as diversas instituies.

Para compreender o processo de mudana, h que compreender o contedo da mudana e a forma como implementada. A universidade dos nossos dias j no se encontra divorciada da sociedade e opera num mundo cada vez mais globalizado, tem que filtrar as presses exteriores, culturais, normativas, polticas e adaptar-se para sobreviver. So indicadas 5 variveis que por sua vez so importantes para a maior ou menor flexibilidade perante a mudana: liderana, contexto institucional, cultura interna, legitimidade, financiamento. Todos estes fatores parecem ser determinantes na maior ou menor rapidez da mudana (Levine, 1980: 19).

Um dilema fundamental do Institucionalismo o facto de quando se quer provocar uma mudana de paradigma, colocar o enfoque na cultura e esperar que as estruturas se adaptem ou, antes pelo contrrio, coloc-lo nas estruturas para provocar a mudana cultural (Wilber, 1998). Se refletirmos em cada uma das hipteses separadamente, o tempo institucional de uma mudana nas estruturas ou uma mudana nos agentes significativamente diferente- uma mudana nas estruturas pode ser realizada a curto prazo, enquanto uma mudana nos agentes apenas poder ocorrer a longo prazo- para tempos institucionais diferentes nos agentes e nas estruturas no temos uma mudana de paradigma conseguida. Assim, operar de forma exgena, a curto prazo, mediante uma interveno calculada, prpria do Institucionalismo racionalista (IR), no soluo, como tambm no soluo atuar de forma endgena a longo prazo, mediante uma oportunidade temporal e potencialmente expansiva mas que ocorrer muito para alm do processo rpido de mudana que exigido ao ensino superior atual. As interaes entre os agentes so na verdade afetadas por regras formais e informais que foram criadas ao longo dos tempos mas o Institucionalismo histrico (IH) move-se numa path dependency mais evolutiva do que revolucionria.

O Institucionalismo sociolgico (IS) lida com a mudana de paradigma de forma mais coerente ao considerar que as opes estratgicas so determinadas por interao entre os agentes e estruturas. Os atores so endgenos, a viso holstica e construtivista e constituda por processos de barganha mas em dois aspetos fundamentais no acompanha a mudana de paradigma- essencialmente evolutiva e as alteraes so tambm produzidas a longo prazo.

Faltou a estes trs institucionalismos um elemento fundamental que pode influenciar uma rpida mudana de paradigma e com possveis caractersticas revolucionrias o elemento discursivo o (ID) ou Institucionalismo ps-estruturalista ou ainda Institucionalismo construtivista. As instituies so veculos para o exerccio do poder, atravs dos polticos, media e redes de presso. Os autores que defendem esta teoria, referem que na sua perspetiva o racional homo economicus e o seguidor das normas sociais homo sociologicus no explicam o comportamento humano, as praticas sociais e mudanas societais. Assim, eles consideram que o homo interpreter o homem que procura o conhecimento e a razo, o homem que se rege pelas ideias, interpretaes e significados (Reckwitz, 2002: 243).

As redes de presso influenciam as instituies e conseguem apressar mudanas de paradigma que de outra forma demorariam muito mais tempo a ser internalizadas. Com o tempo a lealdade institucional desviada para o nvel supranacional. Tanto a elite poltica como os grupos de interesses transnacionais incitam mudana e as instituies a nvel subnacional quer por isomorfismo quer por mera sobrevivncia, tendem a copiar e replicar o nacional e o supranacional. As instituies so definidas de forma dinmica contrastando com as trs vertentes do institucionalismo abordadas mais estticas, dependentes do enquadramento cultural, estruturas de incentivos, longos prazos ou path dependency.

Diversos autores sublinham a importncia da cultura e valores institucionais no processo de mudana de paradigma (Simsek e Lewis, 1994:678). As ligaes estabelecidas atravs dos decisores de opinio, mitos, metforas e representaes simblicas, so importantes na mudana das instituies de ensino superior do velho paradigma, que representa a cultura dominante, incorporando a nova viso sem choque e sem um processo revolucionrio de mudana. As alteraes top-down no sero eficazes se no tiverem em conta as alteraes transversais e as subculturas existentes nas IES.

O mais novo dos novos institucionalismos permite analisar as dinmicas de mudanas institucional, explicando as preferncias, estratgias e orientaes normativas dos agentes assim como os interesses, incertezas e pontos de clivagem. Comparativamente o IR, o IH e o IS tm mais dificuldade em explicar as dinmicas de mudana que a continuidade, o ID permite uma melhor perceo das mudanas de ideias e processos interativos atravs dos quais as mudanas ocorrem.

O ID falha no no modo como explica como a mudana difundida mas no motivo que leva mudana e porque umas ideias falham e outras so adotadas, aqui o IS no deixa de se relevante. O middle ground[footnoteRef:12] de Checkel entre estes dois ltimos institucionalismos servir para explicar no s a forma como a mudana se d mas tambm porque que a mudana ocorre. [12: Checkel ficou sobretudo conhecido por aliar o Institucionalismo ao Construtivismo. Neste caso, o middle ground seria considerado como a aliana do IS ao ID.]

Nem sempre a mudana de paradigma repentina, pode ser formada ao longo do tempo atravs do discurso (Kjaer e Pedersen 2001: 219) e (Howarth, Norval, e Stavrakakis 2000.) Essas mudanas podem ocorrer em perodos de aparente estabilidade apenas pela mudana do discurso mas as condies em que uma rpida mudana tem lugar so pouco usuais. Tanto as presses externas como a dinmica interna so importantes na mudana institucional. (Greenwood e Hinings, 1996: 1022).

A mudana de paradigma promove a mudana institucional, atravs de uma dinmica que compreende 5 fatores dominantes: 1) normalidade, 2) confronto com anomalias, 3) crise, 4) seleo 5) normalidade renovada (Simsek e Louis, 1994).

Os autores consideram que este tipo de modelo se adapta s mudanas no ensino superior, porque reconhece a existncia de uma cultura dominante enquanto incorpora o novo paradigma sem mudanas de carcter revolucionrio. Outros adotam duas fases na mudana institucional no ensino superior: mudana radical, em que o novo paradigma substitui o anterior ou sedimentao em que o novo paradigma coexiste com o anterior (Becher e Kogan, 1992). Esta perspetiva parece ser demasiado simplista quanto s fases da mudana, ao mesmo tempo que o convvio do velho com o novo paradigma poderia originar novas subculturas que fugiriam ao novo paradigma.

A viragem para o Neoinstitucionalismo, na sua vertente alargada, permite explicar como as ideias aqui explanadas e como as ideias polticas ajudam a entender a mudana de paradigma. A importncia das ideias tem que ver com o facto de interagirem atravs dos atores polticos nas instituies (Scott, 2003).

As alteraes paradigmticas ou pontuais ocorrem devido a perturbaes externas que vm quebrar a estabilidade institucional endgena, se as alteraes forem paradigmticas podem causar uma alterao profunda nas prticas institucionais e nos atores (Sabatier e Jenkins-Smith, 1993: 129) Segundo o modelo de Hall (apud Hall, 1968 em DiMaggio e Powel, 1983), a mudana pode ser pontual e ter carcter incremental, normalmente resultante de atividade endgenas, ou por outro lado pode ser paradigmtica quando existe um desfasamento entre os resultados esperados e aqueles obtidos pelas organizaes. Os fatores que despoletam esta mudana paradigmtica, so exgenos, especialmente societrios e polticos - Hall considera que sem este choque exgeno as prticas institucionais se manteriam as mesmas num perptuo equilbrio, com alteraes incrementais pontuais, certo, mas sem alteraes dos objetivos finais.

O debate apaixonado dos institucionalistas acerca da melhor forma de descrever a mudana institucional continua. Alguns autores consideram que a mudana resulta de um modelo evolutivo, caracterizado pela acumulao gradual de pequenas alteraes pontuais, mudanas incrementais atravs de longos perodos de tempo. Outros acreditam que caracterizada por padres de evoluo pontual com perodos de equilbrio e estabilidade, que so interrompidos por fatores exgenos que provocam uma alterao institucional profunda aqui o padro mais revolucionrio do que evolutivo. Outros ainda, no renegando esta ltima interpretao mas aprofundando-a, justificam a fase revolucionria atravs de uma viragem cultural, reconhecendo que as ideias, quer elas sejam paradigmas intelectuais, prticas polticas, vises globais, provocam alteraes institucionais (Campbel, 2002).

Se for tido em conta o relativamente curto espao de tempo em que a mudana de viso acerca do ensino superior ocorreu e especialmente porque coincidiu com uma notria viragem neoliberal na Europa, o ID parece ser a corrente terica que melhor explicam a evoluo dos acontecimentos. O prprio neoliberalismo no campo da poltica econmica um debate ideolgico e intelectual que se alarga sobre um paradigma poltico do nosso tempo.

A tenso fundamental entre a economia e a sociedade, entre a competitividade e a cooperao, contnua latente atravs dos vrios documentos comunitrios, dos quais saram as principais polticas que afetaram as IES no seu desenvolvimento, da EL estratgia 2020. Por detrs desta dinmica encontram-se as opes polticas por solues de curto prazo e de gesto da crise e vises a longo prazo numa vertente mais holstica.

I.4. Internacionalizao versus Globalizao

Globalisation sometimes seems a catch-all phrase or a non concept, a catalogue of more or less everything that seems different since the 1970s: advances in information technology, greater capital flow across borders, international mobility of labour or of students, new public management and the weakening power of nation states, credit transfer in higher education and international recognition of degrees.

(Guilln, 2001:8).

A globalizao pode ser considerada um meta-mito que acarreta uma constelao de outros mitos associados (Bradley et al, 2000). Este meta-mito utilizado indiscriminadamente em termos polticos, econmicos e ainda no dia-a-dia para levar a cabo mudanas sociais e justific-las. A internacionalizao est diretamente relacionada com o dilogo e a cooperao com outros pases e envolve muitos caminhos e muitas escolhas, um processo em constante reconstruo (Knight e De Wit 1999) ao contrrio da globalizao menos flexvel e que tende a uniformizar as escolhas possveis. Teichler teve o mrito de primeiro abordar a distino entre os dois conceitos: Afinal que dinamismo existe entre os dois se que existem pontos de convergncia? A internacionalizao seria uma forma de integrar uma dimenso internacional e intercultural no ensino, pesquisa e servios de uma IES. A internacionalizao para um dos especialistas na matria pode ser considerada como any systematic effort aimed at making higher education responsive to the requirements and challenges related to the globalization of societies, economy and labour markets. (Van der Wende, 1997: 18).

A internacionalizao existiu desde sempre mas no com a fora e o impacto que adquiriu nos anos 80. A influncia de uma sociedade cada vez mais globalizada, a presso supranacional e nacional, serviram de grupos de presso para uma mudana que tinha que de ser iniciada a nvel subnacional, nas IES em que o verdadeiro processo de internacionalizao tinha lugar. As implicaes dinmicas entre os agentes em todo o processo implicavam assim influncias bottom-up (institucionais) tais como top-down (nacionais e supranacionais). As formas mais claras de internacionalizao referem-se mobilidade internacional, ainda hoje considerada a maior bandeira da internacionalizao, cooperao entre IES em diferentes pases, programas conjuntos, reforma de curricula, projetos de twinning, qualidade na educao e pesquisa e desenvolvimento estratgico (Klvermark, T. e Van der Wende 1997). A globalizao, pelo seu lado, considerada como um fenmeno com impacto na internacionalizao atravs do fluxo de tecnologia, economia, conhecimento, pessoas e ideias alm-fronteiras (de Wit, 1997: 6).

globalizao muitas vezes dada uma carga negativa, coincidente com a crescente interdependncia, mercantilizao do ensino e com a viragem neoliberal e tecnocracia (Cox 1996: 21), noutros casos, existe alguma controvrsia acerca da definio do conceito como processo social genuno ou como novo elemento no discurso poltico. Por outro lado, Van der Wende (op. cit.) apresenta a internacionalizao como uma resposta ameaa da globalizao. Criticamente pode afirmar-se que no linear que a internacionalizao seja uma resposta globalizao, nem a globalizao pode ser reduzida liberalizao de mercados embora existam diversos autores que confundam os dois conceitos.

Para Scott[footnoteRef:13], a nfase e o que est em causa o conceito de Estado-Nao. A internacionalizao reflete um mundo dominado pelo Estado-Nao enquanto a globalizao ignora-o, transcende-o e hostiliza-o. O debate do conceito de estado-nao versus globalizao tem vindo a originar acesa discusso desde a queda do muro de Berlim. Esta discusso ser retomada mais frente quando abordar o sistema hbrido de governao da UE. A globalizao o facto dominante na desnacionalizao que afeta diversos setores da sociedade, entre os quais ensino superior. [13: Scott, Peter (2000) Globalisation and Higher Education: Challenge for the 21st Century.Journal of Studies in International Education.4: 3-10.]

Enquanto o trabalho de Knight e Van der Wende se centra principalmente nas relaes internacionais no ensino superior, a nfase dada por Scott conceptualizao perante a globalizao e sob o ponto de vista do Estado-Nao. As diferenas fundamentais so de carcter qualitativo, sendo que a importncia dada a cada conceito diverge de autor para autor, assim como a relao entre ambos. A internacionalizao diz respeito a processos de cooperao entre Estados e portanto a atividades que tm lugar entre Estados e num mundo em que os Estados tm um papel central.

O significado da palavra internacionalizao varia segundo a perceo de quem a utiliza, mas, tal facto, no impedimento para constar dos planos estratgicos de todas as IES europeias como um dos eixos mais importantes. A vertente internacional sempre fez parte dos seus objetivos mas a internacionalizao como estratgia acelerou-se com o nascimento do Programa ERASMUS em 1987 e teve, especialmente nos primeiros anos, um enorme impacto. A internacionalizao foi tanto induzida pelas prprias IES como foi induzida pelas alteraes scio - econmicas a nvel global, pelo advento de novas tecnologias e pelos desafios colocados s IES pelo panorama internacional. A cooperao europeia estava ligada a uma dimenso cultural e no apenas econmica e a Europa do conhecimento, era vista como uma forma de consolidar e enriquecer a cidadania europeia e no de se subjugar aos imperativos globais.

H que ter presente que consoante o pas da Europa, o contexto da internacionalizao pode variar. Existem fatores que tero de ser tidos em conta no processo (apud Klvemark, e Van der Wende, 1997 em Teichler, 2004).

Figura 1 Fatores de Internacionalizao

Na busca de afirmao a nvel internacional, as IES enfrentam diversos tipos de dilemas: por um lado a busca de unidade de objetivos e por outro a criao da sua prpria identidade, o desejo de unidade de ao e a proteo da liberdade individual, o desejo de continuidade e a necessidade de mudana. Em resumo: a dependncia e incerteza de caminhar por sua conta e risco. Foreign ministries, universities and cemeteries are notoriously hard to move in part for the same reasons (apud Maurice A. East, 1995 em Underdal 1997: 213) a frase, se bem que imbuda de algum sentido de humor, no deixa de ser pertinente, existem caractersticas fundamentais nas IES europeias que afetam a sua capacidade de mudana - Da que alguns autores considerem que as IES padecem de esclerose institucional (Forrant, 2001).

Para levar a cabo o processo de mudana e no perder a corrida da competitividade, necessrio ter em ateno o contedo da mudana e pesar tambm os elementos que jogam a favor da oposio mudana, elementos instrumentais muito concretos, constrangimentos financeiros, ou, mais intangveis, constrangimentos culturais. A mudana uma questo de sobrevivncia para muitas IES (El-Khawas, 1998). A par da influncia da UE e dos EM, outros fatores obrigam mudana. So os chamados fatores externos: mudanas polticas, econmicas, sociais, tecnolgicas. As IES diferem na resposta para cada um dos elementos mencionados, por vezes com julgamentos contrastantes, o que apenas demonstra a forma diversa como os dilemas e a mudana de paradigma so encarados. As decises podem assim sofrer de miopia estratgica, serem pouco razoveis, desastrosas, inconsistentes com outras realidades institucionais, por falta de uma anlise holstica do plano estratgico. Na mudana existem diversas fases: a mobilizao, a implementao e a institucionalizao. Um dos requisitos fundamentais do processo de mudana o da oportunidade para que os agentes institucionais se integrem no processo que lhes permita entender a mudana. Existem diferenas substanciais na forma como se desenvolveu ao longo dos tempos, a nvel institucional, individual, regional, global, j que sendo um fenmeno evolutivo difcil de enquadrar. Assim se explica porque autores consagrados como de Wit e Brandenburg, Teichler e Hudzik, e muitos outros, levantaram legtimas questes quanto necessidade de revisitar o conceito tradicional da internacionalizao no ensino superior.

A internacionalizao do ensino superior sofreu profundas mudanas nos ltimos tempos devido s grandes disparidades entre os pases da UE com linhas de meta diferente e com adaptaes s situaes nacionais. De tal forma os ritmos de cada pas so dspares, o EEES tem dificuldade em ser implementado e verdadeiramente, desde o TL pouco ou nada se tem feito nesse sentido, convergindo os interesses para o aumento da atratividade individual com a competio e os rankings a superar o sonho de um espao comum de cooperao no ensino superior. Sem a identificao dos pases com objetivos comuns, a promoo dos sistemas nacionais torna-se algo descoordenada e expresses, como ALV, gesto descentralizada, educao de adultos e formao contnua, repetidos em estudos e relatrios da UE, criam novos paradigmas que as IES consideram no poder enfrentar sozinhas.

Na realidade as maiores mudanas ocorreram nos anos 90 de um modelo de cooperao vertical passou-se para um modelo de cooperao horizontal, de aes casusticas no plano internacional para polticas sistemticas, de atividades dispersas de internacionalizao para um sistema integrado. A maior parte das atividades de internacionalizao esto ligadas a programas especficos de pesquisa, dispersos dentro da instituio e nas atividades prosseguidas (por vezes colaboraes de curta durao). Identificar uma poltica coerente de internacionalizao torna-se complicado e grande parte das parcerias so perfeitamente inteis em termos de resultados prticos. As iniciativas partem de departamentos dispersos e os gabinetes de mobilidade e de projetos funcionam de forma independente, vindo ao encontro de um trajeto independente do espao de ensino superior e da pesquisa e investigao.

in Europe, three terms are employed to characterise the internationalisation process: internationalisation, europeanisation and globalisation but each addresses the process of internationalisation with a different emphasis.

(Teichler, 2004)

globalizao podemos aliar como catalisadores a sociedade do conhecimento, as tecnologias da comunicao, a economia de mercado, a liberalizao do comrcio e as alteraes na governao - internacionalizao consequncia da globalizao (Knight, 2007: 290) ou resposta alternativa a esta (Beck, 2000: 47). As definies so variadas j que o termo internacionalizao se aplica interna e externamente, ou seja, tanto a aes externas no domnio do ensino superior como nos instrumentos utilizados para colocar de p tais aes e aqui a CE mostrou ser indispensvel.

Apesar disso, internacionalizao parece ser muito mais consensual do que globalizao que padece de uma carga negativa. No entanto, independentemente da resposta, um fator parece ser comum a todas as opinies: existe uma maior competitividade fruto da liberalizao de mercados e a UE considera a globalizao uma realidade, pois utiliza expressamente a palavra, por diversas vezes, no texto do TL e da Estratgia 2020.

No perdendo de vista a mobilidade como instrumento privilegiado da internacionalizao, poderemos considerar que a internacionalizao est ligada cooperao entre Estados (Inter-nacionalizao) e a competio globalizao. Alguns autores consideram que fenmenos semelhantes j aconteceram ao longo da histria e que a economia no est a globalizar-se mas sim a tonar-se mais internacional (Hirst e Thompson, 1996 1:3, 18-98) e reforam a existncia de um mito assumindo que no nem inevitvel nem irreversvel. Existem ainda uma srie de autores que afirmam que a globalizao atinge apenas segmentos especficos da sociedade, nomeadamente os aspetos econmicos e financeiros e no os polticos ou culturais (Castells, 1996: 102).

O resultado so cooperaes estratgicas que podem potenciar as atividades das IES e o fomento da criao de pequenas redes de parceiros, procurando formas de colaborar e divulgar as suas atividades - As IES tentam aumentar o seu estatuto ao melhorar o seu poder competitivo em reas especficas, se estamos a falar de uma universidade, deve haver trabalho especializado e cooperao interinstitucional para aumentar a competitividade em produtos especficos.

Existe ainda uma outra forma de cooperar atravs de relaes transnacionais, discutida na ltima conferncia da European University Association (EUA, 2009)[footnoteRef:14]. Esta forma de estender a influncia de uma instituio alm-fronteiras, vista inicialmente como uma forma de financiamentos alternativos, tem vindo a difundir-se e a alargar-se substancialmente. Se incluirmos aqui graus conjuntos, centros de pesquisa, projetos de twinning, outras realidades sero afetadas por este spillover de atividades de internacionalizao. Importante que as instituies definam o seu mercado primordial e campo de ao e diversifiquem a oferta de acordo com os seus planos estratgicos. A utilizao das tecnologias de comunicao fundamental, tanto na formao intrainstitucional como na formao exterior em e-learning que diminui consideravelmente os riscos financeiros. [14: A EUA faz parte do Bologna Follow-up Group e tem um extenso trabalho de monitorizao da adaptao dos IES Bolonha.]

I.5. Europeizao

Poder considerar-se a UE como um condomnio de poderes (Smith, 1991: 153), ou poder criar-se um sentimento de pertena Europa? (Shore, 2000: 3) O sentimento de herana cultural comum, dificilmente poder existir, dado o mosaico de culturas subjacentes, a identidade da UE deveria desenvolver-se volta do conceito de valores cvicos que tem que ver com um passado civilizacional comum (Giddens, 2002: 168). O tema identitrio continua no entanto a ser uma bandeira da UE, muito ajudado no processo graas a programas como o ERASMUS ou a polticas como da ALV. No Ensino, a comissria europeia Viviane Reding, reforou esta tendncia declarando:

If we want to build a living Europe, with a soul, a destination and a world role (...) it is there, in the schools, the universities, the training centres, that Europe can grant itself a soul

(Reding, 2000: 2).

Ricardo Novoa indica duas formas de europeizao uma pragmtica e uma identitria. A vertente pragmtica ser abordada nos captulos das polticas e governao e reflete a interveno poltica da UE nas IES atravs de programas e iniciativas polticas. A vertente identitria, que abordamos neste captulo, em que se contextualiza o que ser europeu, o conceito de identidade a nvel do ensino, identidade essa construda custa da maior ou menor influncia da vertente pragmtica.

Poderemos talvez questionar os mecanismos atravs dos quais a identidade e as normas tm impacto. As normas so usadas genuinamente ou instrumentalmente? Ser por puro egosmo e interesse prprio ou por uma verdadeira lgica de apropriao adquirida e desprovida de interesse? Temos conscincia de que muito de demaggico existe no processo de alargamento europeu no que se refere s estratgias e argumentos, normas e apelos identidade democrtica.

A europeizao no ensino superior no foi um tema to abordado com a internacionalizao e a globalizao, talvez porque para alguns, a europeizao seja a vertente regional da internacionalizao e muitas vezes associada mobilidade, cooperao e integrao (Teichler 2003: 180). a europeizao uma forma de promover a competitividade da Europa face ameaa da globalizao (Van der Wende (2004b: 10). Face s diferentes percees de globalizao, assim a Europeizao umas vezes vista como um processo voltado para o exterior e para os desafios da globalizao como um processo interno de resposta ao processo externo de globalizao (Luijten-Lubet et al, 2005: 5).

Na mudana no contexto da integrao europeia, identificam-se 5 dimenses: mudanas nas fronteiras externas da UE atravs de alargamento, desenvolvimento de instituies a nvel da UE, relao e interdependncia entre os sistemas de governao supranacionais, nacionais, exportao de modelos de governao ou modelos polticos para fora do espao europeu e finalmente unificao poltica da UE no sentido de se tornar uma entidade poltica mais forte (Olsen 2002: 921).

O foco na governao traz colao questes relacionadas com o equilbrio entre unidade e diversidade e entre autonomia e coordenao central. Neste processo a mudana na universidade acaba por estar diretamente ligada s mudanas de equilbrio entre o local, nacional e supranacional. A Europa continua a estar unida na diversidade[footnoteRef:15] com diversas reas de integrao poltica, social e econmica. Como tal existem diversos autores que descrevem a integrao como differentiated integration, Kernel Europe, Europe la carte, Enhanced cooperation[footnoteRef:16] A identidade europeia, resultante do processo de europeizao, o reconhecimento de pertena a uma rea social e cultural comum, se bem que essa construo acabe por ser artificialmente construda atravs de instrumentos polticos centrados no discurso. [15: Lemmens, A et al (2007), Consumer confidence in Europe: united in diversity? - International Journal of Research in Marketing. 24:2, 97-184.] [16: Fritz Breuss ( 2006) Can the Relaunch of the Lisbon Agenda Solve the Puzzle of Why Deeper. Integration Did Not lead to More Growth in Europe? Global Jean Monnet Conference. Bruxelas. 23-24 novembro.]

Quadro 1 Internacionalizao na UE

Informao/promoo

Mobilidade

Lngua de ensino

Cooperao acadmica

Capacidade de inovao

Dilogo poltico

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O Impacto da Comisso Europeia nas Dinmicas de Mudana no Ensino Superior da Unio Europeia

I. O Contexto

O Impacto da Comisso Europeia nas Dinmicas de Mudana no Ensino Superior da Unio Europeia

I. O Contexto

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II. As Instituies

II.1. Sumrio

O debate estrutura-se fundamentalmente na forma como os diferentes instrumentos foram utilizados pelas instituies para abrir caminhos s polticas no mbito do ensino superior e podero ser analisados segundo duas vertentes, a da convergncia e da divergncia. A primeira aponta a via da homogeneizao (cultural, poltica e econmica) e baseia-se numa perspetiva linear e top-down. A segunda baseia-se na heterogeneidade dos efeitos da globalizao a nvel das organizaes, de acordo com perspetivas bottom-up de manipulao, interpretao e resistncia.

A predominncia da vertente nacional sobre as IES imperou durante largo tempo sobre as tentativas da CE assumir um papel mais importante. A noo de europeizao da Educao causa preocupaes na maioria dos pases da Europa, por ser considerado como igual homogeneizao dos sistemas de ensino que poderia implicar uma perda de identidade nacional (Beukel 2001: 126). No entanto, como se ver no decurso deste captulo, quanto mais aumenta a integrao europeia e a cooperao menos hipteses tm as IES para arriscarem ser outsiders em todo o processo. Na ausncia da convergncia existe o risco da diviso entre sistemas convergentes e no convergentes com consequncias negativas para os ltimos j que os estudantes naturalmente procuram as instituies que lhes do maior garantia no binmio qualidade/reconhecimento de qualificaes.

Nos ltimos vinte anos, as IES europeias tm vindo a ser alvo de considerveis mudanas. Os intervenientes dessas mudanas so indiscutivelmente a UE, os EM e as prprias IES, no entanto o grau de responsabilidade de cada um dos desses atores na mudana no o mesmo. A interveno na viragem economicista no interessa a todos de igual modo e a melhor forma de verificar quem despoletou todo o processo verificar os resultados concretos da mudana.

Apesar de o Tratado de Maastricht ser muito claro quanto ao papel subsidirio e modesto da CE no ensino superior, a verdade que num curto espao de tempo foi-lhe atribudo um mandato poltico nessa rea. Em termos legislativos no houve alteraes substanciais, mas de forma evolutiva, atravs da participao nas reunies do BFUG e da agenda de Lisboa, acabaram por ser consentidas pelos EM e admitidas pelas IES se bem que neste ltimo caso de forma mais reticente.

Para empreender o percurso at mudana institucional subnacional, a CE precisava de ser aceite no clube, a partir desse momento seria fcil encontrar o caminho para as grandes linhas polticas que sero explanadas mais frente.

Neste captulo ser abordado o papel que tradicionalmente a CE, os EM e IES tinham no ensino superior e a forma como se articularam antes e depois da mudana de paradigma. Os EM cederam s polticas competitivas e assistiu-se a uma tendncia geral para dar maior autonomia s IES sob o argumento de que ficariam mais bem preparadas para enfrentar o mercado global. Estas por sua vez, tiveram que sofrer profundas alteraes nas estratgias se bem que estruturalmente ainda exista muito caminho a percorrer. O envolvimento supranacional, nacional e subnacional fundamental para entender as polticas e o tipo de governao que consolidaram a atuao da CE. O TL constituiu um marco na consolidao da estratgia da UE e como tal ser tambm analisado.

Neste captulo, o recurso a fontes primrias ser mais consistente. Os autores escolhidos para apoiar os dados das fontes primrias foram Maria Joo Rodrigues e Attila gh pela anlise feita do TL estratgia 2020. Para alm disso a entrevista realizada a Pedro Lourtie e a Jos Manuel Silva revelaram-se importantes na sistematizao respetivamente da perspetiva do BFUG e das IES.

II.2. De Bolonha a Lisboa a mo invisivel da CE

although the Bologna process was initiated mainly as an intergovernmental process, there is an evident and growing convergence with EU processes aimed at strengthening European co-operation in higher education

(Zgaga, 2003: 7).

Houve sempre bastante relutncia por parte dos EM em aceitar a harmonizao dos sistemas de ensino superior apesar de desde 1976 se observar algum tipo de cooperao, nomeadamente a criao de uma rede de informao com as polticas nacionais e sistemas nacionais, por parte dos Ministros da Educao ou a criao do programa de ao no campo da educao, implementado ao nvel dos EM (Neave, 2003). Sempre que se discutia algum tipo de convergncias as conversaes acabavam por abortar. A soberania das estruturas nacionais no estava em questo nem o princpio da subsidiariedade que regia a atuao da CE no ensino superior.

A Declarao da Sorbonne de maio de 1998 foi assinada pelos Ministros da Educao de Frana, Alemanha, Itlia e Reino Unido tendo como tema a referida harmonizao da estrutura do ensino superior europeu. A Magna Charta Universitatum reforava a viso humboldtiana da universidade tendo os Ministros da Educao, sublinhado a diversidade dos seus sistemas de educao. A ideia fundamental foi a de contribuir para a integrao europeia e, simultaneamente, preparar o ensino superior europeu para enfrentar os desafios globais, sem que as IES perdessem a sua identidade e independncia. A DB prosseguiu esses objetivos e nos primeiros anos focou a sua atividade na implementao de reformas que promovessem o EEES como um espao de cooperao dentro de um mosaico de IES que pretendia manter a sua identidade. Esse talvez tenha sido, e continue a ser, o grande desafio na implementao do EEES tentar equilibrar a convergncia com a diversidade.

Os pases mais pequenos demonstraram alguma preocupao por ficarem de fora da assinatura da Declarao de Sorbonne e recearam que os big elephants (Pechar, 2007:109)[footnoteRef:17] os deixassem de fora. Para moderar a preocupao geral, o Ministro da Educao Italiano, Luigi Berlinguer, convidou os ministros da educao europeus para uma conferncia na cidade de Bolonha, em junho de 1999, no intuito de informar em detalhe os avanos resultantes da Declarao da Sorbonne, dando origem DB. Outro descontente com a situao, a CE, no deixou de se insurgir por ter ficado de fora de todo o processo. Visto distncia confortvel de 13 anos, no restam dvidas de que o facto de a CE no ter sido convocada contribuiu favoravelmente para definir uma srie de polticas, entre elas o EEES, que no teriam sido articuladas se a UE interviesse nesta fase do processo os EM no estavam ainda preparados para aceitar a sua (CE) interveno direta[footnoteRef:18]. Tratou-se de uma negociao intergovernamental, onde os EM tentaram manter o controlo total do processo de decises, adaptando as polticas aos contextos nacionais, numa clara e voluntria manifestao de articulao a nvel intergovernamental, no vinculativa e portanto sem consequncias legais para os pases envolvidos. Os ministros signatrios de Bolonha sublinharam o valor do reconhecimento acadmico no espao europeu, de forma que as qualificaes das IES fossem mais transparentes e compatveis, mantendo a diversidade como fator enriquecedor. [17: H Pechar. H (2007) The Bologna Process A European Response to Global Competition in Higher Education - Canadian Journal of Higher Education.37:3, 107-123.] [18: Entrevista telefnica funcionrio annimo DG-Educao- Bruxelas [9 janeiro de 2012]]

Ao analisar os objetivos de Bolonha fica claro que, com exceo da criao do sistema de dois ciclos no ensino superior, todas as outras medidas vinham a ser propostas e discutidas pela CE nos quinze anos anteriores. A implementao do programa ERASMUS vinha de encontro ao incremento da mobilidade, o European Credit Transfer System (ECTS) tambm j estava em funcionamento, em 1993, no livro branco sobre o Crescimento, Competitividade e Emprego[footnoteRef:19] encontramos j o objetivo de estabelecer um espao comum de ensino superior: [19: CE (1993) livro branco- Growth, Competitiveness, Employment. The Challenges and Ways Forward into the 21st century- COM(93) 700, dezembro 1993.Bruxelas]

establish a genuine European area of [] skills and training by increasing the transparency, and improving the mutual recognition of qualifications and skills; to promote European level mobility among teachers, students and other people

(CE, 1993:122 op.cit.).

A CE fornecia ainda incentivos financeiros para a cooperao no ensino superior e projetos de reforma que vinham ao encontra dos objetivos de Bolonha. O reconhecimento mtuo era visto como resultando da gerao do sistema de crditos (CE, 1993: 55 op. cit.). Por outro lado, a CE procurou adaptar-se aos objetivos de Bolonha e estava sempre um passo mais frente do que os EM, como quando adotou os objetivos da transparncia e da qualidade, atravs da proposta de criao das agncias de acreditao e qualidade, que foi aprovada pelo Parlamento Europeu e Conselho em 2005 (CE 2004-0642). No livro branco Teaching and Learning. Towards the Learning Society (CE 1999, 750 final) a ideia de um mtodo de acreditao europeu tinha tambm j sido aflorada. Promoveu mestrados conjuntos atravs do seu programa Erasmus-Mundus[footnoteRef:20], que vinha ao encontro de outro dos objetivos de Bolonha e a validao dos conhecimentos no formais (Cedefop e CE, 2004). Olhando com mais ateno para a ligao entre o processo de Bolonha e a CE, a ideia que transparece que paulatinamente este apropriado pela CE e anexado aos outros trabalhos paralelos que entretanto surgiam nesse campo, nomeadamente resultantes da EL A sua tentativa de facilitar a acreditao levou-a a influenciar a transdisciplinaridade e a romper os laos com as disciplinas tradicionais. O ensino e a pesquisa deveriam funcionar de forma colaborativa atravs de redes universitrias coordenadas pela CE (redes temticas, projetos conjuntos) que implicariam a colaborao industrial, tudo com o objetivo de aproximar o PB da EL. Apercebemo-nos igualmente que os objetivos de Bolonha vo sendo alargados e acrescentados com novas polticas medida que so incorporados na agenda de Lisboa. [20: Proposta da CE - JO C 331 E de 31.12.2002: 25.]

Os artigos 126. e 127. do Tratado de Maastricht permitiam uma curta margem de manobra ao atribuir CE o fomento da cooperao entre os EM, e o apoio e complemento de aes ao nvel nacional, respeitando a estrutura dos sistemas nacionais e a sua diversidade. A ligeira e pouco definida abertura era suficiente, no entanto para a CE encontrar o caminho para desenvolver uma complexa rede de influncia que transformasse as suas fraquezas em foras a partir da foi simples e natural financiar os promotores nacionais de Bolonha e diversas atividades de informao.[footnoteRef:21]A CE apesar de no estar na assinatura da DB aparece envolvida com os trabalhos desde o incio. Atravs de seminrios, trabalhos de experts, promoo de diversas atividades, no desistiu de um trabalho que, afinal, tinha iniciado vrios anos antes. Formalmente, foi envolvida na reunio de Praga em 2001, muito por presso da presidncia sueca do Conselho Europeu que considerou que havendo necessidade de uma entidade coordenadora, nada como atribuir esse cargo a quem j dominasse a rea. No Conselho Europeu de Barcelona de 2002, a UE comprometeu-se a aumentar as verbas para a pesquisa e desenvolvimento em 3% do PIB at 2010 e na Conferncia de Primavera do Conselho Europeu de 2004 apresentado um programa de trabalho Educao e Aprendizagem 2010 em que se encontrava incorporado o PB na EL. [21: CE (2003) apresentado ao Comit Scrates e Sub-Comit para o Ensino Superior. From Berlin to Bergen,the EU contribution. 2 outubro.]

Obviamente os objetivos primordiais de Bolonha estavam j desvirtuados e o seu carter no vinculativo desaparecia lentamente, ultrapassado pela estratgia do Mtodo Aberto de Coordenao (MAC), por comunicados, livros brancos, reunies de follow-up, indicadores e bencharmarks. Este plano de 10 anos que tinha trs objetivos globais - melhorar a qualidade e eficcia, facilitar o acesso e abertura a novos planos educativos em todo o mundo (CE, 2001) tinha j a influncia da CE quanto s polticas de pesquisa e desenvolvimento que faziam parte da EL assim como o suporte institucional e estrutural do terceiro ciclo com o beneplcito dos EM signatrios de Bolonha. Esta nova rea permitia novas oportunidades CE, nomeadamente conseguir reunir o EEES e o EEI que at ento funcionavam separadamente. Adotando prticas mais voltadas para as grassroots (que tinham resultado muito positivamente com o programa Erasmus), a CE a conseguindo aumentar a sua visibilidade e credibilidade junto das IES.

No retirando importncia aos EM, a CE influenciou, implementou e enquadrou todo o processo de Bolonha participando nas reunies de follow-up que preparam os objetivos prioritrios de 2 em 2 anos. difcil determinar quem influenciou quem nos primeiros passos mas a CE rapidamente tomou as rdeas polticas ao comear numa primeira fase por alinhar as suas atividades com Bolonha para poder lanar as bases do controlo das polticas com a EL.

Apesar da CE aparecer como pivot como organizador e facilitador do debate, conseguiu impor-se institucionalmente ao saber rodear-se de especialistas, apoiar trabalhos polticos nas reas que lhe so caras e desenvolvendo consultas pblicas que lhe do visibilidade[footnoteRef:22]. A agenda prosseguida a nvel nacional mas monitorizada e acompanhada de perto pela CE, atravs de relatrios, comunicados e declaraes polticas que so disponibilizadas por reunies ministeriais bianuais assim como BFUG- Praga 2001, Berlim 2003, Bergen 2005, Londres 2007, Lovaina 2009, Bucareste 2012. [22: Lourtie, Pedro (2012) Entrevista email. Leiria. 28 de junho]

Ser interessante comparar a DB, o BFUG e a EL e verificar os pontos comuns e as diferenas.

Figura 2 Comparao Bolonha / Follow-up / Lisboa

Em Praga, a primeira reunio j com a participao da CE, foram acrescentados trs objetivos aos previamente descritos a ALV, a competitividade perante o resto do mundo e o envolvimento das IES e dos estudantes no processo. O Comunicado de Berlim (2003) deu um passo mais frente no aumento da responsabilidade da CE.

O comunicado O papel das universidades na Europa do conhecimento (COM 2003 58 final.), e Investigadores na rea de investigao europeia, uma profisso, mltiplas carreiras (COM 2003 436 final)) completaram as polticas j iniciadas em 2001 Tornar a aprendizagem ao longo da vida uma realidade (COM 2001 678 final) ao mesmo tempo que abordavam as polticas do PB e do BFUG. A proposta da CE e do Conselho da Educao, em maro de 2004, para a Educao e Aprendizagem 2010 surgiu j sem surpresas para ningum pois refletia o corolrio das polticas da CE na rea.

Os desenvolvimentos mais importantes da cimeira de Berlim (2003) basearam-se na entrada dos estudantes como membros de pleno direito, na declarao do ensino superior como um bem comum e na criao de uma rede informal para garantia da qualidade e acreditao para o 1 e 2 ciclo do ensino superior. Berlim (2003) clarificou que todos os pases que fizessem parte da Conveno Cultural Europeia[footnoteRef:23] poderiam integrar o processo. A Cimeira de Berlim concluiu ainda que o EEES e o EEI so dois pilares da sociedade do conhecimento e como tal, na sequncia do desenvolvimento do EEI preconizaram a criao do 3 ciclo do ensino superior. A Cimeira de Bergen (2005) pretendeu sobretudo criar sinergias entre o EEES e o EEI e considerou mesmo tratar-se de um elemento fundamental nas prioridades de Bolonha. Ao avaliarmos os objetivos iniciais estamos bem longe das atuais prioridades. Atravs de um aproveitamento de parte da PB para a EL, de uma cuidada poltica nas grassroots, da MAC e de financiamento e apoios a atividades de pesquisa e organizao de seminrios, a CE tornou-se um elemento fundamental no ensino superior europeu. Ao aproximar duas reas que sempre caminharam separadas, o EEES e o EEI, a CE apresenta as IES como economicamente rentveis para o indivduo e para a sociedade (COM, 2000 6 final) e extremamente importantes na poltica de aumento da empregabilidade (CE, 2003), da tambm a viragem que visvel no processo para as reas cientificas, engenharias e tecnologias (CE, 2003, , 2005) no sentido de incrementar a pesquisa ao servios do setor privado industrial e empresarial O papel das universidades na Europa do conhecimento (COM 58 final) e comunicado University-based Research (CE 2005). Bergen, em 2005, preocupou-se em desenvolver critrios de garantia de qualidade e a dimenso social. Em 2007, Londres introduziu um registo de agncias de garantia de qualidade, decorrente j da EL, adotou a estratgia do EEES numa vertente global, aproximando as medidas de Bolonha ao resto do mundo. Lovaina, em 2009, realou a necessidade de reforma curricular, ensino mais transdisciplinar, incremento da mobilidade como reflexo do EEES e finalmente Bucareste, em abril de 2012, mantendo os projetos em curso veio incrementar a dimenso social e as peer learning activities (PLAs). [23: http://euromachs.fl.uc.pt/heritage/index.php?page=convencao-cultural-europeia-paris-1954 [acesso a 3 de Abril de 2012]]

Partindo do modelo inicial de Bolonha e percorrendo o BFUG ao longo dos anos, chega-se concluso que do foco na cooperao dos sistemas educativos na Europa se chega ao foco na economia europeia. Esta alterao que foi feita subtil e faseadamente do ensino superior para o indivduo e o social ser abordada no captulo seguinte, basta referir que do micronvel das qualificaes e da preparao dos estudantes para o mercado de trabalho se alarga o processo para a pesquisa e para o macronvel, alargando a diversos parceiros sociais e aumentando a sua influncia no sector tercirio.

Por outro lado, o BFUG continuou a atribuir um importante mandato poltico CE para outras atividades ligadas ao ensino superior, como por exemplo as agncias de certificao e acreditao, permitindo efeitos spillover sobre outras reas relacionadas.

No se trata de uma conspirao para ultrapassar o papel dos EM nestes pontos, na realidade a maioria das polticas do PB teve origem na CE e se no fosse esta, os objetivos traados sem um plano de atuao e sem qualquer tipo de vinculao, teriam ficado pelas boas intenes. A proximidade temporal tambm ajudou a que Bolonha e Lisboa convergissem objetivos (Van der Wende & Huisman, 2004: 34-35) mas a CE teve um papel preponderante em organizar e estruturar um plano de ao e ao tornar-se indispensvel em todo o processo, comprova-o a aprovao tcita dos EM ao aceitarem a mistura dos novos objetivos com os iniciais e o facto da agenda do PB cada vez estar mais ambiciosa e mais parecida com a EL. A CE teve influncia tambm ao medir as atividades desenvolvidas no mbito de Bolonha. Esta anlise de procedimentos era nova; as constantes referncias a indicadores, publicaes economtricas, benchmarking, para o ensino superior e investigao, transformavam as IES em organizaes de carter empresarial capazes de competir no mercado.

H quem afirme que Bolonha faz parte de uma poltica de desnacionalizao, tal como a globalizao, ou quem considere que Bolonha uma resposta regional globalizao (Huisman, 2004), certo que a DB invariavelmente usado como justificativa para a implementao da EL no ensino superior, e, na realidade, para a implementao de quaisquer estratgias internacionais que os Estados queiram implementar na rea da educao. Justificao para todas as polticas mas mal compreendida e mal implementada em grande parte dos pases. O texto relativamente vago da DB permite aos Estados signatrios uma considervel latitude para implementar polticas de mudana, usando a DB como pretexto.

Um dos grandes mritos do processo foi a forma como os Estados se uniram em torno de um projeto comum, mesmo sendo este projeto desenvolvido no mbito das suas competncias. Quem poderia imaginar que da reunio na Sorbonne viesse a surgir um documento to inovador e ao mesmo tempo com a capacidade de reunir pases dentro e fora da UE no mesmo objetivo? O Processo de Bolonha foi, de forma otimista, direcionado para a realizao do EEES at 2010, embora reconhecendo a diversidade cultural e os obstculos naturais a uma reforma substancial, principalmente, para alm da UE, entre os outros pases signatrios.

A Europa do Conhecimento agora por todos reconhecida como um fator imprescindvel ao crescimento social e humano, um elemento indispensvel consolidao e enriquecimento da cidadania Europeia, capaz de oferecer aos seus cidados as aptides necessrias para enfrentar os desafios do novo milnio, a par com a conscincia de partilha dos valores e de pertena a um espao social e cultural comum.

A importncia do ensino e da cooperao pedaggica no desenvolvimento e fortalecimento de sociedades estveis, pacficas e democrticas universalmente reconhecida como tal tendo em vista a situao que se verifica no Sudeste Europeu

(Declarao de Bolonha, 1999).

Em 2005, o nmero de pases signatrios tinha aumentado para 45, incluindo a Rssia. Todos os pases signatrios deveriam ter implementado at 2010 as medidas conducentes ao EEES, apesar de estas serem voluntrias. A realidade que tal no sucedeu. Algures no caminho, o termo internacionalizao deixou de ser a palavra-chave para ser substitudo por globalizao e pelo interesse em promover internacionalmente os programas de estudo europeus, considerados fator primordial para aumentar a mobilidade no ensino superior e a cooperao internacional. Bolonha revelou ter um programa criativo, otimista, dinamizador da cooperao, ao mesmo tempo que criava as bases para um sistema atrativo para o exterior. O EEES continua, no entanto, por implementar. Onde falhou Bolonha?

Atrever-me-ei a sugerir que no otimismo - no certo que medidas de convergncia estrutural sejam aplicadas de igual forma em pases com graus de desenvolvimento diferentes, diferentes sistemas sociais, uns mais antigos na UE, outros recentes, e outros ainda que nem sequer fazem parte dos EM, uns com democracias slidas e outros com democracias recentes; o problema da lngua revelou-se um obstculo mais difcil de ultrapassar do que inicialmente se pensou; o dfice de programas de doutoramento bem organizados; a adaptao aos sistemas nacionais; a burocracia - o problema no Bolonha a aplicao de Bolonha. No basta o ato inovador e criativo, preciso saber executar[footnoteRef:24]. [24: Grilo, Maral Eduardo (2011) European Conference on Higher Education in the Framework of the 2020 European Unions Strategy Universidade de Lisboa, 10/11 novembro ]

A implementao de Bolonha, embora com alguns resultados apreciveis em muitos pases, cresceu de forma pouco uniforme de acordo com as necessidades de cada pas, caiu na armadilha da burocracia dos sistemas de acreditao, controlo de qualidade, problemas de lngua, legislao nacional, constrangimentos financeiros e, porque no diz-lo, na comitologia. Tempus fugit, mas no atropelando objetivos e subindo a fasquia que vai ser possvel tornar-nos competitivos a nvel internacional.

O pull effect da DB est por avaliar porque na realidade o PB ainda est no princpio. um processo moroso mas sem sombra de dvida necessrio. Definitivamente aumentou a mobilidade de estudantes, docentes e pessoal no docente e facilitou os processos de equiparao acadmica para quem frequentou um perodo de mobilidade. Os ministros dos pases europeus envolvidos indicaram nos Comunicados de 2009 e 2010 que ainda se prev mais uma dcada de implementao dos objetivos, revises dos objetivos iniciais e, nalguns aspetos objetivos bem mais ambiciosos.

Numa perspetiva de resultados o impacto da criao de uma agenda para a educao na Europa foi largamente ultrapassado pela participao de atores subnacionais e pela interveno posterior da poltica da UE, como se ver mais adiante. A natureza algo vaga e no vinculativa noutros pontos, serviu de campo frtil para a mudana de umas polticas e manuteno de outras de acordo com os interesses dos atores envolvidos. Os conceitos chave de Bolonha so a empregabilidade, cooperao, mobilidade, qualidade, excelncia. A empregabilidade considerada um objetivo predominante numa Europa devastada pelo desemprego, dessa forma os programas de estudo so organizados de forma a irem ao encontro das expectativas do mercado laboral. A Mobilidade e a Cooperao como fatores determinantes na promoo da empregabilidade e na promoo do EEES. A qualidade e a excelncia, so fatores considerados determinantes para a promoo do EEES, mas como elementos vagos no sujeitos a controlo direto de nenhuma entidade supranacional, cabe aos Estados interessados divulgar os nmeros.

II.3. Think European for Global Action

Given that the higher education sector is situated at the crossroads of research, education and innovation, it is a central player in the knowledge economy and society and key to the competitiveness of the European Union

(Blackstone , 2008)

A EL que surgiu como um projeto bem alm do TL, representou a viso poltica da UE a nvel global ao mesmo tempo que fazia o enquadramento das polticas principais e da governao europeia. Um superprojeto econmico com o intuito de incentivar o emprego e como uma viragem na governao, ao estabelecer-se metas temporais para desenvolver determinadas polticas ligadas competitividade, desenvolvimento tecnolgico, sociedade do conhecimento, a integrao e coordenao de mercados financeiros e a modernizao do modelo social europeu. A falta de coordenao na rea da governao, especialmente na dcada de 90, e o chumbo da Constituio Europeia, obrigava a alteraes no modus operandi europeu ao mesmo tempo que o TL modificava ainda a estrutura institucional, com vista a maior eficincia e transparncia. Era urgente consolidar-se o discurso da estratgia do emprego e da ALV. Devido a grandes mudanas na Europa de perodos de relativa bonana para profundas crises, foi-se alterando e ajustando s circunstncias de momento dado origem Lisboa I, II e III.

Em 2000 poderemos considerar que o programa estava principalmente virado para as reformas internas tendo sofrido constantes alargamentos no seu mbito em 2007 compreendia j a dimenso externa e preparava-se de forma otimista para se tornar a economia do conhecimento mais dinmica e competitiva do mundo, capaz de desenvolvimento econmico sustentvel com mais e melhores empregos e maior coeso social (Conselho Europeu, 2000:2)[footnoteRef:25]. Para alcanar tal objetivo era necessrio preparar a transio para a economia e sociedade do conhecimento que passavam por tecnologias da informao, pela R&D, pela competitividade e inovao que passavam necessariamente pelo Ensino Superior. A par destas polticas a coeso social e o combate excluso e a poltica de emprego. (Conselho Europeu, 2000:2). [25: Conselho Europeu de 2000 de onde partiu a elaborao do Tratado de Lisboa.]

A questo fulcral da EL foi formulada por Maria Joo Rodrigues da seguinte forma: Ser possvel atualizar o desenvolvimento estratgico Europeu de forma a estarmos altura dos desafios da globalizao? (Rodrigues, 2009: 1).

A estratgia discursiva da CE aproveitou a oportunidade surgida com a agenda de Lisboa e a nfase dada sociedade do conhecimento. A agenda de Lisboa acabou por ser o motor para despoletar a influncia da CE no ensino superior. Muito provavelmente sem Lisboa no teriam sido dados passos to firmes no sentido de incorporar o ensino superior na estratgia de europeizao, a agenda de Lisboa colocou definitivamente o ensino superior associado s estratgias de emprego na agenda modernizao europeia e na estratgia discursiva da CE.

Com o arranque da EL, Lisboa I contava com o efeito domin de uma srie de rpidos spillovers em vrias reas polticas, criando sinergias entre o sector empresarial-educao-emprego-inovao. O otimismo tecnocrtico no contabilizou que um processo desta envergadura levaria tempo e s seria conseguido num perodo avanado de i