356 - Laicado Dominicano Março/Abril 2012

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  • 8/2/2019 356 - Laicado Dominicano Maro/Abril 2012

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    Maro/Abril 2012Ano XLII - n 356

    Directora: Isabel de Castro e LemosISSN: 1645-443X - Depsito Legal: 86929/95Praa D. Afonso V, n 86, 4150-024 Porto - PORTUGAL

    Fax: 226165769 - E-mail: [email protected]

    LAI

    CADOD

    OMINI

    CANO

    Directora: Cristina BustoISSN: 1645-443X - Depsito Legal: 86929/95

    Praa D. Afonso V, n 86, 4150-024 Porto - PORTUGAL

    A RVORE E O CRCULO:As Palavras Vivas de Sta. Catarina de Sena (1347-1380)

    Senhor, Tu passaste a uma nova vidae agora convidas-nos a passar tambm para ela.Nestes ltimos dias, padecemos com o Teu sofri-mento e chormos a tua morte.Entregmo-nos ao arrependimento e orao, abstinncia e circunspeco.

    Agora, na Pscoa, dizes-nos que morremos para opecado.No entanto, se isso verdade,como poderemos permanecer na Terra?Como podemos passar para a tua vida de Ressusci-tado ainda neste mundo?No continuaremos to intrometidos,preguiosos e egostas como antes?No continuaremos a ter mau feitio e a sermos tei-mosos, imersos em todos os vcios do passado?Oramos para que, ao caminharmos Contigo,os nossos rostos nunca se voltem para trs.Em vez disso, permite que, como Tu,

    faamos o paraso na Terra.Bernardo de Claraval

    RESSURREIO

    No calendrio litrgico catlico, 29 de Abril dedicado memria de Santa Catarina de Sena

    (1347-80), leiga da Ordem dos Pregadores. Catari-na influenciou de modo decisivo a histria da Igre-ja, na procura da paz e da unio quando o Papadoesteve em Avinho e durante a crise que sucedeu eleio do Papa Urbano VI. Exemplo maior domisticismo cristo, ela marcou tambm profunda-mente a teologia catlica, sendo por isso considera-da Doutora da Igreja.

    Desde logo atravs da Eucaristia, a memriana vivncia crist no uma mera recordao, umreavivar do passado, mas a constatao de uma pre-

    sena viva no presente. Todos os domingos nosreunimos tambm para escutar as Palavras de Deuse da Salvao, porque elas atravessam os corpos eas almas, transformando as pessoas que somos.Habitam as imaginaes, os discursos, os coraes e portanto os actos. Se acolhemos e vivemos estas

    palavras desta forma porque elas no nos soestranhas. Pem-nos em contacto com uma verda-

    de que se estende para alm de ns ao mesmo tem-po que intimamente nossa.

    Lemos num dos poemas litrgicos de FreiJos-Augusto Mouro: No pode o mundo arran-car-me raiz. Ao p de Deus hei-de sempre viver;com Deus cheguei e com Ele vou partir. sobreesta verdade enraizada que Catarina fala alegorica-mente no segundo tratado de O Dilogo, examinan-do a ligao entre trs virtudes: amor, humildade, ediscernimento. A primeira a maior virtude infundi-da por Deus (1Cor 13,13) que sustenta as outras

    duas, a f e a esperana. A segunda a mais impor-tante das virtudes que se contrapem a pecadosparticulares porque diz respeito nossa relaocom Deus e com o prximo, opondo-se soberba.

    (Continua na ltima pgina)

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    Palavra do PromotorNeste ano gostava de apresentar algu-mas figuras de mulheres que marcamainda hoje a nossa vida dominicanaem Portugal.Comeo hoje por falar de Madre

    Asceno Nicol fundadora da IrmsMissionrias do Rosrio. Madre

    Asceno nasceu em Navarra, numalocalidade chamada Tafalla, em 14 de Maro de 1868.Deram-lhe o nome de Florentina. Perde a me pouco em1872, tendo o seu pai casado em segundas npcias.

    Como era costume no tempo, o pai pensou em dar-lhe a melhor educao, o que naquela poca se fazia, nor-malmente, num colgio de religiosas com regime de inter-nato. Duas das suas irms tinham tido o mesmo percursoe abraaram a vida religiosa num convento de carmelitas.

    Flori como ficou a ser conhecida enviada para Hues-ca, para o Colgio de Santa Rosa, escola que tinha cresci-do sombra do convento de Santa Maria Madalena e deSanta Rosa, da Ordem Terceira Regular, convento funda-do no sculo XVIII. Na jovem adolescente nada fazia pre-

    ver a deciso de que iria tomar hbito e comear o novi-ciado em 1885, tomando o nome de Asceno do Sagra-do Corao.

    Os seus primeiros anos foram passados com professo-ra de lavoures, sobretudo de bordados s alunas da esco-la, mais tarde dar aulas de cultura geral e ser ainda

    directora da escola. Sempre foi de carcter suave, prxi-ma das pessoas e bem cedo comeou a definir um idealde vida que se vai traduzir neste pensamento: aspiro atornar felizes todos os que ho-de cruzar a minha vida, asuavizar as suas horas de tristeza, a ser lenitivo no seupesar. Meu desejo ver felizes todos aqueles que amo,pois a sua alegria a minha alegria e regozijo e ainda queocultasse as minhas lgrimas e os meus suspiros, aindaassim seria feliz de lhes dar todo o mrito dos meuspequenos sacrifcios. Busco este ideal para a minha vida,talvez penseis que demasiado simples mas espero que oenobrea e premeie a caridade de Cristo.

    Em 31 de Julho de 1912 aparece um decreto queextingue a escola anexa ao convento, obrigando as religio-sas a po-la nas mos das autoridades. Era o ganha-po dacomunidade de quase 50 religiosas. As irms sentem-seimpelidas a para as misses e a oferecer os seus servios.

    Em 1913 chega a Huesca um religioso dominicano degrande envergadura espiritual (e mesmo fsica, pois eramuito alto) chamava Ramn Zubieta. Apresentava-lhesum projecto de trabalho na zona onde missionava: a Pre-feitura Apostlica (de que ele ser Bispo) de SantoDomingo de Urubamba e Madre de Dios, situado no

    Per na fronteira entre o Brasil e a Bolvia em plena selvaamaznica. A, alm da situao de atraso e isolamento,da explorao dos indgenas, havia uma outra dimenso a

    que Madre Asceno foi sensvel: a situao da mulher.Para os rapazes j os frades tinham aberto uma escola,mas as raparigas no tinham nada e a sua condio demulheres era muito desvantajosa.

    Madre Ascenso disse: no senti grandes entusias-

    mos, s uma fora irresistvel me levou a oferecer-me epartiu. J tinha 45 anos. Para preparar a viagem acolhe-se,com as outras 5 religiosas, que com ela partiram ao con-

    vento de Nossa Senhora do Patrocnio de Lima, ondeser eleita superiora.

    Enfim partem para a misso. O caminho perigosssi-mo, tm de atravessar toda a cordilheira dos Andes, tmde ir montadas em animais num caminho onde um passoem falso podia ter consequncias fatais. Passem calorestrridos e frios glaciares mas nada as impede de cami-nhar. A vida na selva dura mas a possibilidade da proxi-

    midade a gente era mais do que suficiente para esquecersacrifcios e privaes., por isso no hesitou em escre-ver:nunca me senti to prxima de Deus como nestesseis meses na montanha.

    Em 5 de Outubro de 1918, por conselho do MestreGeral da Ordem na sua vista ao Per d-se incio con-gregao das Irms Missionrias Dominicanas do Sants-simo Rosrio.

    Mas o que mais admiro nesta grande mulher a suarelao de trabalho apostlico com Mons. Zubieta. Hentre eles um sentido de complementaridade para essa

    misso nessas terras longnquas. Mons. Zubieta escreveu: se tu faltasses parece-me que a obra acabaria: creio ques tu s capaz de continuar caso eu falte.

    De facto Mons.Zubieta no durou muito mais anos,morreu em19 de Novembro de 1921. E a obra continuoue acrescentou-se. Madre Asceno ter ainda muito traba-lho pela frente. Em 1932 partem irms para a China eem 1933 as irms chegam a Portugal. Como SuperioraGeral atravessou 17 vezes o oceano, no deixando mesmode ir China. Morreu em 24 de Fevereiro de 1940 e foibeatificada em 19 de Maio de 2005 tendo o CardealSaraiva Martins presidido a celebrao.

    A B. Asceno Nicol foi uma grande missionria,mulher de f e capaz de grandes sacrifcios, mas o teste-munho da complementaridade no servio da evangeliza-o tecido na confiana e no amor pela mesma causa queela soube viver com Mons. Ramn Zubieta.

    Quais os traos que encontra mais marcantes na vidade Asceno Nicol.

    O que significa para cada um de ns complementari-dade na pregao.

    D exemplos dessa complementaridade hoje.

    Como podemos fazer crescer a complementaridade napregao na Famlia Dominicana.

    Fr. Rui Carlos de Almeida Lopes, o.p.

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    QUANDO SE PERDE UM AMIGO

    O dia de hoje no foi fcil. Comecei s 8.30h e, antes

    de me deitar, quase meia noite venho aqui escrever a pro-

    funda tristeza da morte de um amigo e irmo, fr. Carlos

    Furtado. Um acidente de carro, sem sabermos ainda por-

    menores, tirou-lhe a vida, a caminho de casa dos pais.

    Conheci o fr. Carlos h vinte e um anos. Tinha eu, na

    altura, 16 anos e ele 30. Conhecemo-nos na escola ondeeu iria ser aluno e ele professor. Foi meu professor de

    Expresso corporal, dramtica e musical. No uma disci-

    plina de currculo liceal; eu ia fazer o secundrio numa

    escola profissional, de animador social/assistente familiar.

    Mas foi mais que um professor. Talvez um irmo mais

    velho. Com ele aprendi a ser mais crescido, quando me

    chamava responsabilidade (era o mais novo do curso!),

    com ele aprendi a tocar guitarra, com ele ri e chorei -

    porque todos temos momentos destes que no

    se partilham com toda a gente -, com ele fiz o meu primei-ro retiro de silncio e, atravs dele, entrei nos Dominica-

    nos.

    Depois do curso, cada um seguiu a sua vida. Sempre

    em contato, em caminhos mais ou menos parecidos mas

    sempre ligados. Eu entrava no Seminrio de Almada e ele

    saa da escola para entrar nos Dominicanos.

    E foi em 1997, quando ele regressa de Sevilha, do Novi-

    ciado, que nos voltamos a encontrar. Convida-me para a

    sua profisso simples, qual no pude assistir por proibi-

    o do Seminrio. No me iria fazer bem, foi a resposta aomeu pedido. Mas no ficou sem resposta. Convidou-me

    para passar pelo convento para conversarmos e conhecer a

    comunidade. L menti eu ao Seminrio e, dizendo que ia

    a casa visitar a minha famlia. Do Seminrio fui direito ao

    Alto dos Moinhos, ao Convento, encontrar-me com o fr.

    Carlos.Contei-lhe a minha tristeza de vida e que no me sen-

    tia bem no Seminrio. Passei a tarde com ele, mostrou-me

    o convento, apresentou-me a outros frades, conversmos

    sobre a vida dominicana.

    Na despedida, quando ele me perguntou o que que

    tinha achado do Convento, respondi-lhe: isto que eu

    quero. Abraou-me. Ento, juntamente com ele e com

    mais dois frades, ganhei foras para sair do Seminrio e

    decidir-me pelos Dominicanos. feliz dia! O que mudou

    desde esse sbado!

    Em Maro de 1998 passamos a viver juntos neste

    Convento. Eu como postulante e ele como estudante de

    votos simples. Depois de vir de Sevilha, em 1999, volta-

    mos a encontrar-nos no s na vida conventual dominica-

    na mas tambm nos estudos: ramos colegas de carteira. E

    que bons momentos! Muito nos rimos, estudmos, troc-

    mos apontamentos! Tempos verdadeiramente felizes.

    Voltmos a separar-nos quando ele foi assignado ao Con-

    vento de Ftima, onde viveu at hoje. Falvamos de vezem quando, se nos encontrvamos numa reunio, ou em

    Ftima. Felicitei-o e muito me alegrei com a sua recente

    eleio para Prior do Convento de Ftima.

    No Domingo passado, apesar de o achar cansado, l

    estava ele, contente, a fazer festa (raramente estava triste e

    no gostava de tristezas).

    Morre na vspera do "Domingo da Alegria". Morre a

    caminho de uma festa (no sei se os anos da sobrinha

    hoje e/ou do pai, amanh).

    Meu caro Carlos, apesar no gostares de tristezas hojeno estou alegre. Parece mentira que tenhas morrido. Sei

    que o gro de trigo para dar fruto tem de morrer, sei que

    a nossa vida como a erva que de manh est fresca mas

    tarde murcha, sei que tu, no cu, nos sers mais til para

    alm do muito til que tu foste estes anos connosco e

    muito especialmente comigo. Alis, s estas palavras nos

    podem consolar. Mas fazes-nos falta, e sabes disso.

    Hoje perdi um amigo, um irmo e estou triste.

    Frei Filipe, o.p.

    (Texto retirado do blogue retalhos da vida de um padre)

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    Como ponto departida para estareflexo vou propor-

    vos a contemplao

    de dois cones quetodos conhecemosmuito bem: o BomSamaritano (Lc 10,30-37) e o Lava-ps(Jo 13, 1-17).Tanto num casoc o m o n o u t r oencontramos a dis-ponibilidade parasair de si e ir aoencontro do outro,no para fazer um

    discurso, mas numa atitude de servio que procura verqual a necessidade do outro. E, se no Bom Samaritanoestamos diante de uma parbola e por esse motivo pode-mos dizer que este personagem pode encarnar a expressode muitas situaes e das consequentes atitudes que des-pertam; no Lava-ps no temos a atitude do personagemde uma qualquer histria, mas um gesto concreto do pr-prio Jesus que se ajoelha junto dos discpulos para lheslavar os ps. E se tivermos presente que Joo quem nar-ra este episdio, percebemos, claramente, que neste gesto

    de Jesus no pode existir qualquer sinal de servilismo.Tudo no evangelho de Joo quer demonstrar a glria

    do Filho do Homem, e isso v-se at no momento docaminho para o calvrio, ningum lhe coloca a cruz sobreos ombros Ele que a toma, que a agarra, quase comoum dom recebido. Esta atitude no tem nada a ver commasoquismo ou desejo de sofrer, mas com amor e entre-ga, com disponibilidade para caminhar com todos osque sofrem, com todos os que esperam um gesto deredeno na sua vida, uma chama de esperana, uma luzde sentido em suma, esta disponibilidade e entrega,

    esta doao e solidariedade, esta capacidade de servir, semservilismo mercenrio que encontramos na simbologia docone do Lava-ps.

    Servir o Reino:Poderamos, ento, perguntar se estamos dispostos a

    servir? Mas, o que servir? A quem somos chamados aservir? E que servio esse que nos pedido? Poderemospensar que todas estas perguntas so apenas questesretricas. Pois para ns, cristos, est muito claro que oservio o do reino. No entanto, podemos perguntar denovo qual reino? Quem o senhor desse reino? Jesus

    Cristo? ou ns?Todos ns afirmamos, com muita convico e muitobem, que a autoridade um servio. Isto seja numa comu-

    nidade religiosa, numa fraternidade leiga, numa associa-o cultural, num local de servio pblico. Portanto querse trate da Igreja, quer se trate do mundo civil, temos estanoo muito clara. Talvez no esteja to claro saber a

    quem prestado esse servio. Ns sabemos que podemosconfundir tudo, e que em nome do servio da autorida-de pode ser o nosso despotismo, o desejo de domnio epoder a manifestar-se. Todos ns sabemos que em nomedo servio e do bem comum se podem arruinar vidas,destruir fraternidades, acabar com projetos e obras pro-motoras de encontro, partilha e dilogo.

    Quando o poder se constitui autoridade e no aautoridade a conferir poderes, acaba-se com a ousadiainventiva do amor criativo. Ento, todo aquele que nopensar igual um perigo e um inimigo a abater, que preciso silenciar para no causar problemas. A histriaest cheia de situaes destas. Seria um erro pensar que,por termos a tradio da discusso democrtica e da prti-ca comunitria do debate, estamos imunes a estas situa-es. No temos qualquer tipo de imunidade e pens-loseria o maior perigo para nos deixarmos envolver por elas.

    Perante isto, parece que o melhor no assumir car-gos de liderana, porque de facto as fronteiras esto mui-to esbatidas e corremos o risco de cometer erros de deixarque em certos momentos seja o nosso ego a impor-se.Nesta lgica, h muito boa gente que nunca assume nada,porque assim tem sempre as mos limpas e pode criticar

    a ao dos outros vontade. Aqui a pergunta que seimpe saber se tm legitimidade para o fazer.

    H dias celebrmos a festa do nosso querido Marti-nho de Lima que quis ser apenas Irmo converso, istoporque no quis viver sombra de privilgios que seriamfceis de obter pelo nome e posio do pai. Penso que foium gesto proftico que ainda hoje nos pode interpelar.

    Bom, chegados aqui, parece que estamos num com-plicado impasse e o melhor ser mesmo no arriscar, parano cometer erros, nem magoar ningum e ficarmostodos em paz. Mas essa no ser uma paz podre de cons-

    cincias adormecidas e de espritos entorpecidos e indife-rentes? Onde estaria o grito proftico que ressoa desde ostempos do xodo: Eu vi a misria do meu povo. Vai libert-lo. Eu estarei contigo?

    Voltando ao cone do Samaritano percebemos que aatitude a tomar ser capaz de ver com os olhos do cora-o, o mundo, as pessoas, os acontecimentos, os cargos,os desafios, e descer da montada do poder e das certezasabsolutas, para ir ao encontro do outro, da sua necessida-de, interpelando outros para se envolverem na mesmacausa. , olhando para o Lava-ps, ajoelhar junto dos

    irmos e escutar mesmo as suas recusas. Tu nunca me lava-rs os ps!...

    (Continua na pgina seguinte)

    AO SERVIO DO REINO

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    (Continuao da pgina anterior)

    De facto, a atitude daquele que chamado a desem-penhar um servio de coordenao, de liderana, maisque mandar, deve amar. Li h j algum tempo um livrointitulado o monge e o executivo, onde, entre outras coi-sas, h um retiro para pessoas que ocupam cargos de lide-

    rana e que so das provenincias mais dspares: Umaenfermeira, um pastor anglicano, um executivo, etc. oanimador um monge beneditino que tinha sido donoduma empresa muito prspera e que em dado momentodecidiu largar tudo e abraar a vida monstica. Diantedaquele grupo de gente desmotivada e cansada ele afirmasem tranquilamente que o segredo para uma liderana desucesso o amor. Perante a atitude cptica e irnica dosseus ouvintes o monge reafirma que no sero as ordensditadas do pedestal que envolvero os colaboradores dequalquer obra ou empresa. Mas ser a forma como aque-

    le que assume a liderana capaz de escutar e valorizar oscontributos dos seus colaboradores que os envolver namesma causa comum.

    Frei Timothy Radcliffe, diz mais ou menos a mesmacoisa: O governo na vida dominicana muito democrti-co. No a democracia dos partidos polticos que assentamna competio pelo poder, mas no debate dos irmos noCaptulo na busca do bem comum. Baseia-se na busca doconsenso, ainda que nem sempre se consiga. Portanto osegredo de um bom governo criar condies que permi-tam expressarmo-nos mutuamente uns perante os outrose juntos procurarmos uma soluo e tomarmos decises

    capazes de servir o bem comum. Isto implica a mtuacompreenso e estarmos atentos ao que mais importa acada irmo(1). Isto implica debate continua ele, logo queno fundo todos tememos com demasiada frequncia.Pois, isso implica tomar a srio as objees do irmo,usando a nossa inteligncia para juntos encontrarmosuma unidade que ir mais alm do nosso desacordo, uma

    verdade mais ampla onde todos possam ser um(2)

    . E o ex-Mestre Geral continua afirmando que aquilo que sentiacomo primeira obrigao era escutar e compreender osirmos. A tenso existente entre a unidade e a diversida-de faziam parte da vida da Ordem desde o princpio e eleno a via como uma dificuldade, mas como desafio e ale-gria.

    Penso que esse desafio que hoje colocado aqui eagora, neste momento importante da vida das nossas Fra-ternidades portuguesas. Dispostos a deixarmo-nos inter-pelar por aquilo que nos mostra o nosso olhar, ilumina-

    do por um corao que ama o mundo, a Igreja, a vida, aOrdem, cada irmo; dispostos a largar a segurana damontada para fazermos caminho com o outro escutandoos seus anseios e esperanas, as suas dores e desiluses,prontos a sermos servidores em traje de servio, capazesde se ajoelharem ao lado dos irmos tambm para osinterpelar. Disponveis, para sermos caminheiros de espe-rana e construtores de sentido, porque foi isso que nosensinou o Mestre.

    Irm Assuno (IDSCS)(1)RADCLIFFE, T, San Esteban, Barcelona, 2001, p. 42

    (2)RADCLIFFE, T, Os llamo amigos, p. 61

    O HOMEM MAIS RICO DO MUNDOVou accionar a revista Fortune porque me tornou vti-

    ma de uma omisso inexplicvel. Publicou a lista doshomens mais ricos do mundo, e nessa lista eu no apare-o!

    Aparece o sulto do Burnei, a rainha Isabel de Ingla-terra, Stavros Niarkos, e os mexicanos Carlos Slim e Emi-lio Azcrraga.

    Sem dvida, a revista no me menciona. E eu sou um

    homem rico, imensamente rico.Vejam bem:Tenho vida que recebi, no sei porqu, e sade que

    conservo no sei como.Tenho uma famlia: uma esposa adorvel, que ao

    entregar-me a sua vida, ofereceu-me o melhor da minha,filhos maravilhosos de quem apenas recebi felicidade enetos com os quais exero uma nova e gozosa paternida-de.

    Tenho irmos que so como meus amigos, e amigosque so como meus irmos.

    Tenho gente que me ama com sinceridade apesar dosmeus defeitos, e a quem eu amo sinceramente apesar dosmeus defeitos.

    Tenho quatro leitores a quem agradeo todos os dias,

    porque lem bem o que eu escrevo mal.Tenho uma casa e nela muitos livros, embora a minha

    esposa diria que eu tenho muitos livros com uma casa.Possuo um pedacito do mundo na forma de uma hor-

    ta que cada ano me d mas que teriam reduzido aindamais o tempo de presena de Ado e Eva no Paraso.

    Tenho um co que no vai dormir antes de eu chegar,e que me recebe como se eu fosse o dono dos cus e da

    terra.Tenho olhos que vem e ouvidos que ouvem, ps quecaminham e mos que acariciam, um crebro que pensacoisas que aos outros j poderiam ter ocorrido, mas que amim ainda no tinham ocorrido.

    Sou dono da comum herana dos homens, alegriaspara desfrutar, e penas para irmanar-se aos que sofrem.

    E tenho f em Deus que guarda para mim um infinitoamor.

    Pode haver riquezas maiores do que as minhas? Porquento a revista Fortune no me ps na lista dos homensmais ricos do planeta?

    H gente pobre, to pobre que o nica coisa que tm dinheiro.

    Armando Fuentes Aguirre

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    NOTCIAS DAS FRATERNIDADESFRATERNIDADE DE ELVAS

    No passado dia 28 deJaneiro de 2012, a

    Fraternidade Leiga deSo Domingos deElvas celebrou a Festade So Toms de

    Aquino com missaSolene na Igreja deSo Domingos pre-sidida pelo seu Procoe Capelo o P.

    Avelino Lopes OCD,

    esteve presente umbom grupo de irmose fiis da cidade.

    A Eucaristia, alm de ser aplicada por todos os Irmosda Ordem Dominicana, vivos e defuntos, foi tambm apli-cada pela melhoras da nossa Presidente, a irm MariaBelm Rijo, que no dia 24 de Janeiro fez uma intervenocirrgica ao joelho esquerdo.

    Toz Brito, O.P.

    VISITA A PORTUGAL DO PROMOTOR MUNDIALDO LAICADO DOMINICANO

    No prximo ms de Maio, o Frei David Michael

    Kammler, PromotorMundial do Laicado,

    vir a Portugal numav i s i t a s F r a -ternidades e organiza-es de leigos em Por-tugal.

    O frei Davidchegar a Lisboa nodia 2 de Maio e re-

    gressar a Roma nodia 10 de Maio.Do programa da

    sua visita constaroencontros com as fraternidades em Lisboa, Elvas, Ftima ePorto. Haver tambm ocasio para um encontro para oConselho Provincial Leigo.

    Cristina Busto, O.P.

    Mais uma vez, e graas generosidade dos nossos leitores, foi possvelencerrar as contas de 2011 do Laicado Dominicano com umamargem positiva de 238,42 , o que nos permite continuar o nossotrabalho, elo de ligao entre Fraternidades , no seio da FamliaDominicana.

    A todos os que, generosamente, e apesar dos tempos difceis queatravessamos, apoiam o Laicado, o nosso bem-haja!

    Maria do Carmo Ramos, o.p.

    Cristina Busto, o.p.

    DESPESAS RECEITAS

    Expedio (6 nmeros) 774.32Impresso (6 nmeros) 953.83Despesas variadas (correio e papelaria) 272.93

    Total de despesas 2001.08

    Saldo positivo 238.42

    Donativos 2239.50

    CONTAS DO JORNAL 2011

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    Sinto-me grato por este tempo da Quaresma que nos dado viver at grande alegria da Pscoa. Vivemos o dia-a-dia num ritmo muito agitado, com a sensao de que otempo passa a correr quase sem darmos por ele, com aideia de que no temos tempo para nada, o amanh e jhoje e o hoje j ontem. Lembro-me que h uns anosatrs tive um aluno na Universidade que era um rapazcalmo e tranquilo, com uma serenidade que no o impe-dia (antes pelo contrrio) de cumprir a tempo e horas osseus deveres, sendo, alis, um bom aluno. Curiosamenteos colegas suportavam-no mal, no tinham pacincia,

    achavam-no simptico mas demasiado calmo e puseram-lhe logo uma alcunha o Xanax! que viver assim podeser interpretado e visto como uma provocao quando, aoque sabemos, somos quotidianamente levados a correratrs do tempo, rodeados de informao, tanta e to velozque muitas vezes no nos serve de nada, mergulhados emruido, frequentemente em busca angustiada do acessrioenquanto o essencial nos passa ao lado sem darmos porele. Se no corremos com quem corre e no nos agitamoscom quem se agita, destoamos do mundo em que vive-mos. Para nos sentirmos socialmente inseridos e estarmos

    na mesma onda dos outros precisamos de viver diaria-mente como que em fuga de ns prprios, fugitivos danossa conscincia, numa situao de alienao consentidamas sem sentido.

    E eis seno quando nos proposto que entremosdurante 40 dias no deserto! Assim, primeira vista, pare-

    ce at uma brincadeira de mau gosto, uma propostainsensata e completamente intil, arriscamo-nos mesmo aque nos chamem Xanax (ouAlprazolam, com a introduodos medicamentos genricos). O deserto faz-nos sentir napele as nossas necessidades mais bsicas, a comear pelasede e pela fome, mas tambm a necessidade da presenados outros na nossa vida (o deserto realmente um localdespovoado) e, mais ainda, entrar no deserto leva-nos confrontao connosco, com o nosso deserto interior,quando nos esvaziamos de tanto peso intil na nossa

    vida. O deserto pode tornar-se, como se diz agora, umaseca. Curiosamente, na regio onde vivo, em Trs-os-Montes e Alto Douro (sobretudo no meio rural), empre-

    ga-se ainda a expresso estou deserto de que significaem bom portugus (com ou sem acordo ortogrfico)estou desejoso de ou estou morto por. O deserto um lugar de provao e de desejo, mas de desejo do essen-cial vida, do que realmente nos faz falta e no do acess-rio.

    Trabalho na rea da Sade Mental h vrios anos e sei,por experincia prpria, que um dos pesos mais inteis edoentios na vida justamente a culpabilidade. A culpabi-lidade diferente da responsabilidade: a responsabilidadeleva-nos a assumir um compromisso connosco e com os

    outros (aqueles por quem somos responsveis), a respon-der por ns e pelos outros; a culpabilidade acusa-nos dasnossas falhas e erros e pede-nos que os reparemos, maspode tornar-se um crculo vicioso e doentio. A responsa-bilidade ergue-nos, conduz-nos ao encontro connoscoprprios e alegria de servir; a culpabilidade verga-nos,afasta-nos de ns mesmos e torna-nos tristes. O remdiopara a culpabilidade o perdo. No o perdo no sentidomais curto e simplicista, mas o perdo como aprendiza-gem para o crescimento pessoal e comunitrio, o perdocomo dever de derrubar muros que se ergueram dentro

    de ns e entre ns e os outros, o perdo como direito avivermos pacificados e a encontrarmos a alegria. E odeserto uma boa oportunidade para nos encontrarmoscom o perdo como um bem essencial vida.

    Jos Carlos Gomes da Costa, O.P.

    QUARESMAENTRAR NO DESERTO

    Certa vez, Santo Agostinho descreveu o seu dia-a-dia da seguinte forma:

    Corrigir os indisciplinados, confortar os pusilnimes, amparar os fracos, refutar os opositores, precaver-se

    dos maliciosos, instruir os ignorantes, estimular os negligentes, travar os provocadores, moderar os ambicio-sos, encorajar os desanimados, pacificar os litigiosos, ajudar os necessitados, libertar os oprimidos, demons-trar aprovao aos bons, tolerar os maus e, ai de mim!, amar a todos.

    SANTO AGOSTINHO

  • 8/2/2019 356 - Laicado Dominicano Maro/Abril 2012

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    O s a r t i g o s p u b l i c a d o s e x p r e s s a m a p e n a sa o p i n i o d o s s e u s a u t o r e s .

    Laicado Dominicano Maro/Abril 2012

    (Continuao da pgina 1)

    A terceira, normalmente designada por prudncia, avirtude humana fundamental, dispondo-nos para a justia,a fortaleza, e a temperana.

    O que precede esta passagem do livro de Catarinasublinha como a virtude e o pecado surgem sempre danossa relao com o vizinho, com quem se aproxima, com

    quem nos d a oportunidade de nos aproximarmos. Aparbola do bom samaritano (Lc 10,25-37) aborda a mes-ma relao. Tal como as parbolas de Jesus, tambm a deCatarina convida contribuio de quem a l, ligando aleitura aco. A parbola das trs virtudes prope queimaginemos um crculo traado no cho e no seu centrouma rvore com um rebento que cresce. A rvore encon-tra alimento apenas na terra que est no interior do crcu-lo. Se fosse arrancada, morreria.

    O crculo no qual a raiz da rvore, o amor da alma,cresce a imagem do conhecimento sobre ela prpria.Esse conhecimento no pode ser desligado da sua unio

    com Deus, sem princpio nem fim. A figura circular umabase sem arestas que abraa a alma e ilustra a descoberta eredescoberta, sem fim nem princpio. Podemos supor que

    se a raiz no pode sair do crculo sem perder contacto como que a nutre, ento as ramificaes da raiz acabaro porse sobrepor, formando um crculo coincidente com o tra-ado no cho. A imagem da alma torna-se imagem deDeus. Esta semelhana o cumprimento da semelhanaque est na nossa origem e que no podemos rejeitar semrenunciar a uma parte essencial de ns.

    O auto-conhecimento da alma portanto conheci-mento de Deus e enraza-se na humildade que o solo.Santa Teresa de vila ensina-nos que a humildade consis-te em ver as coisas como elas so. Sermos humildes ser-mos verdadeiros connosco e com o mundo. A coeso daterra abre-se para que passe por ela a gua e os nutrientes.Como lembra Henri Dominique Lacordaire ao reflectirsobre a filosofia do Pe. Lamennais, a humildade une ondeo orgulho divide, abrindo espaos para o florescimento da

    vida atravs do cuidado amoroso.A alma como esta rvore, feita para amar e vivendo

    do amor sem o amor divino, que a caridade verdadei-

    ra e perfeita, a morte o seu fruto em vez da vida, diz-nosCatarina. A rvore do amor nutrida pela humildade eramifica-se em discernimento. de notar que o centrocircular no limita o desenvolvimento da rvore. Outrosrebentos nascero e os ramos resultantes ultrapassaro ocrculo marcado no cho e estender-se-o pelo territrio eem direco ao cu.

    No contexto do encontro mstico com Deus que todoO Dilogo , Catarina acrescenta que a pacincia amedula da rvore (isto , caridade amorosa) e que esta

    virtude um sinal seguro de que Deus est na alma e que

    ela est unida a Deus. Em muitas das suas oraes, a ima-gem da rvore da vida alimentada pela graa divina regres-sa. Numa orao dita a 15 de Fevereiro de 1379 emRoma, Catarina diz: Deus Eter-no, na tua luz vi como modelaste atua criatura prxima de ti. Vi quenos colocaste, por assim dizer, numcrculo, de modo que onde quer quepossamos ir ainda estamos dentrodesse crculo. O ofcio de SoDomingos, e o da ordem que fun-dou, o da Palavra isto , da prega-

    o, como anncio, conhecimento, eiluminao. tambm o desta aps-tola chamada Catarina.

    Srgio Dias Branco