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BIOÉTICA E ESPIRITUALIDADE
Eliana Rezende Adami1
Waldir Souza2
RESUMO
As ciências, principalmente, as biomédicas aliaram-se à tecnologia na sociedade pós-
moderna, permitindo manipular o ser humano em todas as fronteiras da vida. Com isso surgiu
consequências éticas graves que vão de encontro aos valores espirituais. Esse fato é motivado
pela força econômica que a ciência e a tecnologia adquiriram na cultura do mundo
globalizado. A proposta desse ensaio é discutir as alternativas éticas, por meio da bioética, nos
cursos da área de saúde, no exercício da profissão, voltadas para a formação de cidadãos
comprometidos com a construção de uma sociedade solidária, justa e, portanto, mais humana
não ferindo a dignidade do ser humano. Abrange ainda o comportamento humano e
autoconhecimento relacionados a espiritualidade, assim como bioética e espiritualidade,
perspectivas da bioética. Na sociedade capitalista globalizada, científica e tecnológica, o
paradigma não é o compromisso de servir, mas o de competir, mesmo que para isso se ignore
as necessidades e os direitos do outro, desaparecendo, portanto, o conteúdo das condutas
humanas. Pretende-se resgatar o elo entre a busca da dimensão interior do ser humano, em sua
essência, que é a espiritualidade, visando o bem-estar do outro em sua alteridade, exercendo a
ética, dentro da bioética no cotidiano, no profissional e nas pesquisas científicas.
Palavras-chave: Bioética. Ética. Espiritualidade. Autoconhecimento. Educação.
INTRODUÇÃO
De acordo com Goldim (2006), foi Fritz Jahr que utilizou pela primeira vez a palavra
bioética em artigo publicado no periódico Kosmos, em 1927. Jahr conceituou a bioética como
sendo o reconhecimento de obrigações Éticas, não apenas com relação ao ser humano, mas
para com todos os seres vivos. Contudo, foi só a partir da década de 1970 que o neologismo
popularizou-se, quando Van Rensselaer Potter, biólogo e oncologista da Universidade de
1 Mestranda em Bioética na PUCPR. Farmacêutica – Bioquímica e Bióloga pela PUCPR. E-mail:
[email protected]. 2 Doutor em Teologia pela PUC-Rio. Professor do PPG em Teologia e em Bioética da PUCPR. Professor de antropologia teológica, bioética e teologia moral no Bacharelado em Teologia da PUCPR. Professor de Temas de
Teologia e Bioética e Questões Fundamentais de Teologia do Mestrado em Teologia da PUCPR. Membro do
Comitê de Ética e Pesquisa no Uso de Animais da PUCPR. E-mail: [email protected].
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Wisconsin, Madison, EUA, publicou o livro Bioethics: a bridge to the future. Para Potter bio
representava o conhecimento biológico, a ciência dos seres viventes, e ética o conhecimento
dos valores humanos. Seu objetivo era prolongar a sobrevivência da espécie humana numa
forma aceitável de sociedade segundo Oliveira, na obra Bioética: uma face da cidadania
(1997).
Em 1998 Potter reiterou suas idéias iniciais propondo uma abrangência maior para que
a bioética englobasse aspectos relacionados ao viver, bem como o pluralismo,
interdisciplinaridade, autonomia, abertura e incorporação crítica de novos conhecimentos.
Em 2001 o Programa Regional de Bioética, vinculado a Organização Pan-Americana
de Saúde (OPAS), definiu bioética como sendo uma disciplina científica que estuda aspectos
éticos da medicina e da biologia em geral, assim como as relações morais do homem com os
outros seres vivos.
Para Barchifontaine e Pessini na obra Princípios da ética biomédica (1998) o campo
de ação da bioética vai muito mais além das questões de biologia, engenharia genética,
biotecnologias e dos dilemas nas áreas médicas, a sua abrangência temática na América
Latina está relacionada com a justiça, a equidade e a alocação de recursos na área da saúde,
diferentemente da abordagem norte-americana e européia, que na maioria das vezes, ignora
questões básicas que milhões de excluídos enfrentam como a fome, miséria, exclusão social, a
falta de saneamento ambiental, de educação e saúde de qualidade, a morte precoce, a
violência, enquanto no primeiro mundo as pessoas morrem depois de ter vivido e desfrutado
da vida com dignidade.
A proposta desse artigo é discutir as alternativas éticas, no comportamento humano e
espiritualidade por meio da bioética, abrangendo as perspectivas dentro da ciência, filosofia e
espiritualidade. Estabelecendo relação entre a busca da dimensão interior do ser humano, em
sua essência, que é a espiritualidade visando o bem-estar do outro em sua alteridade,
exercendo a ética, dentro da bioética no cotidiano, no profissional e nas pesquisas científicas.
ÉTICA E BIOÉTICA
A bioética é um neologismo com características transdisciplinares e combina
conhecimentos biológicos com o conhecimento dos sistemas de valores humanos. O termo
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bioética, em que “bio” representa vida e conhecimentos biológicos, e a “ética” os
conhecimentos dos valores humanos perante as descobertas da biologia molecular, dentro da
sociedade científica e tecnológica.
O compromisso com a preservação da vida dos seres humanos entre si e com o
ecossistema previa os grandes dilemas dos dias atuais no campo da biologia molecular e da
sustentabilidade do meio ambiente.
A década de 1970 foi o período em que os avanços científicos e tecnológicos,
principalmente no meio médico, se intensificaram e ao mesmo tempo passaram a ser
questionados (UTIS, transplantes, diagnóstico de morte, procriação, diagnóstico pré-natal).
O compromisso hipocrático e a experiência de Nuremberg propiciaram a criação de
comitês de ética, que, em sua essência, fundamentam-se nos princípios da bioética, composto
por: beneficência, não maleficência, justiça, autonomia e possuem composição
multidisciplinar (médicos, farmacêuticos, bioquímicos, enfermeiros, teólogos, juristas,
usuários, entre outros).
A bioética é um desdobramento da ética voltado para os questionamentos morais,
suscitados pelos avanços científicos e tecnológicos, no contexto da sociedade em sua
globalidade (pessoa, meio ambiente, cidadania, aspectos terapêuticos e suas aplicações
legais). Assim podemos dizer que a bioética difere da ética, da moral e da deontologia devido
a sua característica problematizadora e evolutiva.
BIOÉTICA E EDUCAÇÃO DO PROFISSIONAL DE SAÚDE
A importância da bioética, na formação acadêmica do estudante de medicina e em
outras áreas da saúde, passa, inevitavelmente, pela cultura humanística. Para isso, é
fundamental que o modelo cartesiano, que privilegia o modelo fragmentado por
especialidades, abra espaço para um ensino voltado para a busca de conhecimento integrado,
considerando a óbvia inseparabilidade entre as partes que constituem o ser humano integral.
Esse modelo flexeriano privilegia a tecnologia e divide a pessoa humana em partes cada vez
menores. É voltado para as especialidades que forma territórios onde os especialistas se
comportam, segundo Morin em Os sete saberes necessários à educação do futuro (2000, p.
99) “como lobos que urinam para marcar seus territórios e mordem os que nele penetram”.
Com isso, a formação acadêmica é atravessada por uma metodologia desconexa de
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disciplinas, prejudicando a visão holística e integral do ser humano na sua complexidade
profissional (SIQUEIRA, 2008).
Desnecessário repetir que a própria universidade, intencionada ou alheia à cultura
técnico-científica da pós-modernidade, foi ficando cativa de um modelo educacional que tem
como parâmetros a eficácia e a rentabilidade econômica, formando profissionais voltados para
a competitividade e prestígio pessoal, alheios aos valores éticos que é o selo de um ambiente
acadêmico.
A bioética, por sua característica interdisciplinar e transdisciplinar, problematiza essa
cultura dominante enfatizando posições éticas que devem ser estabelecidas visando a
transmitir valores, assim como fez Sócrates na Grécia junto aos jovens de Atenas. É crescente
o consenso que a bioética deve figurar nos cursos de formação de profissionais das áreas de
saúde, em todos os anos da formação acadêmica, com intuito de que, no exercício
profissional, o futuro profissional tenha uma formação humanística comprometida com o
exercício pleno da cidadania.
COMPORTAMENTO HUMANO E ESPIRITUALIDADE
Desde os primórdios da humanidade, sempre houve uma preocupação e necessidade
de explicar os fenômenos que envolviam a vida e morte do homem. Começou a ser
desenvolvida uma sociedade, na qual se utilizavam instrumentos, realizava trabalhos artísticos
rústicos, domesticação dos animais e surgindo a agricultura. Ocorreu uma intensificação da
vivência em grupos através da linguagem e essas primeiras civilizações alcançam o sentido do
espírito, buscando entendimento e fazendo sentido da vida, se reconhecendo como seres vivos
que possuem inteligência e consciência. Se auto-organizam, tomam consciência de si, através
de uma autoconsciência, auto-explicação e finalmente se tornam seres vivos conscientes,
espíritos humanos livres, capazes de fazer escolhas.
Após o homem tomar consciência que é um ser vivo consciente, tenta entender a si, o
outro, a sociedade, a cultura, o cosmo, o universo e Deus. Ao tentar entender esse todo, ele
participa de uma cosmovisão, resultando na tentativa de entendimento do todo, permitindo
que tenha mais consciência e mais inteligência, resultando em um conhecimento maior.
Esse ser vivo consciente, que é o espírito, busca conhecimento através de um senso
comum, de sobrevivência, tomando consciência de suas limitações, tentando significar e
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resignificar a vida, buscando entendimentos que vem através de questionamentos de sua
origem e sua gênese. Faz reflexão sobre o futuro buscando essa compreensão através do
conhecimento religioso (espiritual) e obtém explicações na cultura, no conhecimento
acumulado e descobre que muitas dessas explicações eram místicas, baseadas em rituais e
dogmas devido a falta de entendimento e conhecimento da época.
E, através da cogência dos conhecimentos religioso, filosófico e científico, o homem
busca um sentido, uma razão e propósito para sua vida fomentado na transdiciplinalidade que
visa a unidade do conhecimento, estimulando uma nova compreensão da realidade,
articulando elementos que passam entre, além e através das disciplinas, numa busca de
compreensão da complexidade.
A espiritualidade requer uma ação que permita o desdobramento singular de cada um,
gerando um sistema de idéias, devendo sempre fazer contextualização, crítica e
aperfeiçoamento do entendimento. Interessante observar que se esta fazendo um segundo
olhar e uma resignificação possíveis de mudança que podem - e devem - ser substituídos
quando necessário.
Esta não é, entretanto, uma visão meramente filosófica. A capacidade de atribuir
significado não pode ser artificialmente reproduzida. Penrose, em Dal big bang all'eternità. I
cicli temporali che danno forma all'universo (2006), provou matematicamente que os
computadores não conseguem simular a única característica que define a mente humana, o
significado. De acordo com Goswami, em O médico quântico (2006), a mente não é física,
assim, não é atribuída ao corpo ou ao cérebro, mas sim, extra-físicamente. Assim, reconhecer
a capacidade de distinguir o homem das demais espécies, diferenciando sua mente de uma
máquina, aceitando-a como algo externo ao próprio corpo, é reconhecer a espiritualidade.
Considera-se espiritualidade, então, o conjunto de todas as emoções e convicções de
natureza não material, com a suposição que há mais no viver do que pode ser percebido ou
plenamente compreendido, remetendo a questões como significadas e sentidas da vida, não se
limitando a qualquer tipo de crença ou prática religiosa segundo Volcan, Relação entre bem-
estar espiritual e transtornos psiquiátricos menores: estudo transversal (2003).
Segundo Frei Betto et al, Ética (1997, p. 15-36) a espiritualidade não é uma questão
simplesmente religiosa, é uma questão de educação, de subjetividade, de interioridade. É uma
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forma de reeducarmos para a comunhão conosco mesmos, para a comunhão com a natureza,
para a comunhão com o próximo e com Deus.
AUTOCONHECIMENTO E ESPIRITUALIDADE
O ser humano possui uma propensão a buscar constantemente significado para a vida
por meio de conceitos que transcendem o palpável e o mensurável, que pode ou não incluir
uma participação religiosa formal. Esta busca e crença em um sentido de conexão com algo
maior que si próprio de acordo com Saad et al. (2001), pode ser chamada de espiritualidade.
A busca de sentido e de significado é uma das necessidades fundamentais do ser
humano, que o distingue das demais espécies. O ser humano é um ser em relação: consigo
mesmo, com seus semelhantes, com a natureza, com a divindade. A espiritualidade sempre
tem a ver com o transcender a si mesmo e para transcender a si mesmo é preciso entrar em
relação segundo Ferrer, Medicina y espiritualidad: redescubriendo una antigua alianza
(2002).
O ser humano na busca constante de conhecimento tenta entender a si, o outro, a
sociedade, a cultura, o cosmo e o universo. Ao tentar compreender esse todo ele alcança a
cosmovisão resultando no entendimento da origem, da gênese, significado que remete a Deus,
Creador3 de tudo. O entendimento e compreensão desse todo, juntamente com o
autoconhecimento, aproxima o homem de Deus.
BIOÉTICA E ESPIRITUALIDADE
Bioética e espiritualidade são áreas do conhecimento que se aproximam na medida em
que questões relativas à bioética lidam com a expressão material da vida e também com a
espiritualidade. Partindo do princípio que o objeto de estudo da bioética são as questões
relacionadas à vida, estudando as dimensões morais das ciências da vida e do cuidado da
saúde, utiliza uma variedade de metodologias éticas num contexto multidisciplinar.
Os princípios que fundamentam a concepção da bioética estão em absoluta
concordância com as leis naturais que regem o universo e que indicam o que o homem deve
fazer para ser feliz. Essa lei divina ou natural, segundo Kardec no Livro dos Espíritos (2009)
3 Creador do Universo. Crear é a manifestação da essência em forma de existência. Criar é a transição de uma
existência para outra existência (ROHDEN, 2007, p. 11).
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está escrita na consciência humana. O instrumento para distinguir o bem e o mal, é o uso da
inteligência, que permite o discernimento, mediada pela vontade de fazer o bem. A máxima
de amor é capaz de estabelecer novos patamares de relação entre os seres humanos impondo
um novo status evolutivo para a humanidade.
A bioética, de acordo com o modelo explicativo da complexidade, tem as seguintes
características: interdisciplinaridade, o pluralismo, a humildade, a responsabilidade, o senso
de humanidade, dentre outras. Segundo Goldim, Bioética e espiritualidade (2007):
No processo de tomada de decisão o sistema de crenças de uma pessoa tem papel
fundamental. Estas crenças, incluindo-se as religiosas, afetam a sua percepção e
leitura do mundo, o conjunto das alternativas disponíveis e a seleção da ação que irá
ser realizada ou não. Os aspectos religiosos ou espirituais devem estar também
incluídos em uma reflexão bioética, sempre preservando o caráter plural da
discussão e não assumindo uma posição sectária.
PERSPECTIVAS DA BIOÉTICA E ESPIRITUALIDADE
As ciências biomédicas, aliadas à tecnologia na sociedade pós-moderna, permitem
manipular o ser humano em todas as fronteiras da vida, surgindo, em consequência, questões
éticas que vão ao encontro dos valores espirituais. Esse fato é motivado pela força econômica
que a ciência e a tecnologia adquiriram na cultura do mundo globalizado. A perspectiva da
bioética é desenvolver no exercício das profissões, voltadas para a área de saúde, a formação
de cidadãos comprometidos com a construção de uma sociedade solidária, justa e, portanto,
mais humana.
A medicina, alicerçada na ciência com seus avanços tecnológicos e científicos,
representa, para os dias atuais um mundo de descobertas e possibilidades nunca antes
imaginadas na área da saúde. Esse fato permite salvar mais vidas, revolucionando a qualidade
da cura e longevidade das pessoas. Todavia, se torna menos acessível para pacientes menos
abastados ou mesmo para o sistema de saúde governamental.
BIOÉTICA E PESQUISA CIENTÍFICA
No campo da pesquisa, cada vez se torna mais indispensável a formação de comitês de
ética e bioética, com o intuito de modernizar e normatizar condutas que eventualmente
venham ferir a dignidade do ser humano. A pesquisa tem o objetivo de encontrar na pessoa
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espiritualizada um sentido moral e ético buscando seu entendimento e compreensão de sua
realidade como ser, gerando um embasamento de comportamento em relação ao próximo.
Em 1993 a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura
(UNESCO) criou o Comitê Internacional de Bioética cujo estatuto foi aprovado em maio de
1998. O Comitê tem a missão de manter-se à frente do progresso em genética, procurando
assegurar o respeito aos valores da liberdade e da dignidade humana em relação aos riscos
potenciais de atitudes irresponsáveis em pesquisa biomédica. O surgimento do órgão teve
como objetivo responder às principais preocupações envolvidas no progresso nas ciências
biológicas, em particular a genética e a biotecnologia. O órgão foi concebido como um foro
privilegiado para o debate, as trocas de ideias e informações, com um caráter multidisciplinar.
Desde seu surgimento, tem realizado reuniões anuais para estudar os aspectos éticos e legais
de temas como aconselhamento genético, genética de populações, acesso a tratamentos
experimentais, alimentos geneticamente modificados, entre outros. No campo científico,
especificamente aquele envolvido em pesquisa com seres humanos, o bem-estar das pessoas
que se submetem as pesquisas deve sempre prevalecer sobre os interesses da ciência e mesmo
da sociedade. Este pressuposto é apresentado em diversos documentos internacionais como as
Declarações de Nuremberg e Helsinque. A Declaração de Nuremberg é a primeira
normatização sobre ética em pesquisa envolvendo seres humanos, resultado do julgamento
dos crimes nazistas cometidos contra a humanidade. Sua revisão pela Assembléia Geral da
Associação Médica Mundial, em 1964, resultou na Declaração de Helsinque, documento de
referência internacional - atualizado cinco vezes - que estabelece diretrizes para as pesquisas
médicas de modo a preservar a integridade física e moral dos voluntários (MARTIN, Bioética
em pesquisa: uma perspectiva brasileira, 2002).
Segundo Oliveira, na obra Bioética: uma face da cidadania (1997), atualmente
bioética é uma disciplina reconhecida praticamente em todos os cursos na área de saúde e na
maioria dos cursos da área de humanas das universidades europeias e norte-americanas. No
Brasil, muitos cursos de graduação dedicam à bioética uma carga horária mínima.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O modelo de desenvolvimento atual é baseado no consumo exacerbado,
proporcionado pela busca desenfreada de prazer e posses. Esse comportamento vem gerando
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um vazio espiritual que obriga o ser humano a recorrer à interioridade de valores que alimenta
e recompõe permitindo a volta para a espiritualidade. Na medida em que a espiritualidade se
traduz em compaixão, fraternidade e solidariedade, é possível exercer a ética em sua
plenitude, pois possibilitará a comunhão de todos e para com o próximo.
A religiosidade, na medida em que orienta para a busca de princípios e virtudes,
subsidia a espiritualidade, como ensinou Jesus Cristo e, modernamente, como sugere a ética
do Dalai-Lama. A espiritualidade indica que a vida é substancialmente o que não se vê, mas o
que se sente.
A bioética, como um neologismo da ética, é uma área de conhecimento interdisciplinar
de base filosófica e antropológica voltada para os dilemas decorrentes do avanço científico e
tecnológico no que concerne à pesquisa envolvendo os seres humanos e o meio ambiente. É
urgente sua conscientização e vivência em uma “Aldeia Global”, exigindo soluções éticas
permanentes para seus problemas. Como resultado, essa atitude ética universalista impele os
diversos grupamentos humanos a vivenciar novos parâmetros para uma sociedade mais justa e
fraterna.
A bioética representa uma proposta de tolerância e esperança para a pluralidade moral
da humanidade nas suas diferenças de crenças e valores em todos os campos relacionados às
ciências da vida. Pelo seu caráter transdisciplinar, se apresenta como um instrumento valioso
e indispensável para o diálogo que envolve questões éticas levantadas pelas decisões clínicas,
pelos avanços científicos e tecnológicos. E o maior exemplo se manifesta na composição
pluralista e interdisciplinar das comissões bioéticas dos hospitais e universidades.
Diante do avanço científico e tecnológico que permeia todos os setores envolvidos
com a saúde, é importante que o estudante das áreas de saúde e os médicos se conscientizem
que a missão mais importante é a de promover a saúde e não de ser um manipulador de
tecnologia. Infelizmente, muitas vezes esse público se observa comprometido com dilemas
éticos, mas devem procurar entender que a medicina mais humana se distingue da medicina
tecnológica pelas características que envolvem o desempenho do profissional como forma de
avaliação e competência e seu desenvolvimento não pode ir contra a valorização do ser
humano e sua felicidade.
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