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  • ESPAO DO CURRCULO, v.3, n.2, pp.578-590, Setembro de 2010 a Maro de 2011

    ISSN 1983-1579 http://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/rec

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    OCURRCULOEOSEUPLANEJAMENTO:CONCEPESEPRTICAS

    rikaVirglioRodriguesdaCunha1

    RESUMO:Opresenteensaioobjetivatecerumadiscussosobrecomodiferentesconcepesde currculo configuramas prticas de planejamento curricular naescola.Tratasede umareflexo possibilitadapelo trajeto tericopercorrido emmeuMestrado, concludoem2005juntoaoProgramadePsGraduaoemEducao daUniversidadeFederaldeMatoGrosso.A discusso tecida diante da questo: como as concepes de currculo construdas historicamente podem configurar as prticas de planejamento curricular na escola? Assim,comento brevemente a concepo da teoria crtica curricular a partir de um dilogo,especialmente,comSacristn(1998),McLaren(1997)e LopeseMacedo(2002).Emseguida,trato de justificar meu posicionamento crtico para, pouco depois, passar discusso do planejamento curricular e de suas caractersticas a partir de duas diferentes perspectivas:currculocomoprodutoecomoprocesso.

    PALAVRASCHAVE: Concepes de Currculo, Prtica de Planejamento Curricular, TeoriaCrtica.

    CURRICULUMANDITSPLANNING:CONCEPTIONSANDPRACTICES

    ABSTRACT: The present paper aims at discussing how different conceptions of curriculumguidethecurriculumplanningpracticesatschool.Itisareflectionderivedfromthetheoreticalbody developed onmyMA thesis, concluded in 2005 at the PostGraduation Program inEducationatUniversidadeFederaldeMatoGrosso.Thediscussion isorganizedaround thequestion: how may conceptions of curriculum historically constructed guide practices ofcurriculumplanningatschool?Inthisway,Ibrieflydialoguewiththecriticaltheoryconceptionofcurriculum,basedontheworksofscholarslikeSacristn(1998),McLaren(1997)andLopesandMacedo (2002).Afterwards, Iaddressmy criticalpointof viewandmoveon todiscusscurriculum planning and its characteristics, taking as reference two distinct conceptions:curriculumasproductandasprocess.KEYWORDS:Conceptionsofcurriculum,curriculumplanningpractice,Criticaltheory.

    1 Professora do Departamento de Educao, do Instituto de Cincias Humanas e Sociais, do Campus Universitrio de Rondonpolis da Universidade Federal de Mato Grosso. Endereo eletrnico: [email protected]

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    As discusses sobre currculo constituem, podese afirmar, uma das problemticasmais complexas na rea daeducao.Discutir currculo significadiscutiraprpriaeducaoformal, pois diante de qualquer aspecto que se queira abordar na rea, seja a polticacurricular,aprtica pedaggica,asrepresentaessobrediversoselementos,asquestesdasdiversidades,aorganizaoescolar, dentre outros, noh como negar aeminnciade umcampo de estudos que se dedica a compreender os movimentos de construo daescolarizao e seus significados. Neste ensaio abordo a problemtica da prtica deplanejamento curricular, como um doselementos da educao formal, refletindo sobre asimplicaesdeseproduzirumaposturaorientadapelaconcepoprocessualdecurrculo.

    UMAAPROXIMAOASCONCEPESDECURRCULO

    Falardecurrculo e,especialmente,propordiscutilo, implicainvariavelmenteassumirum posicionamento frente s teorias que se desenvolvem na atualidade entre seusconflitos e crises , anunciando as perspectivas que informam nossa compreenso desociedadeeosvaloresquecomungamosfrentescomplexasepersistentes condiessociaisdemisriaeexcluso emque seencontra, cada vezmais, umamaiorparceladapopulao mundial e seu distanciamento acentuado de uma elite que impe historicamente oconhecimentovlido,a culturae que,comprocessoscada vezmaismassificantes,naturalizaasdiferenascomocausadeummovimento inevitvel.

    Assimsendo,cumpremeanunciarqueestadiscussotemassentonateoriacrticado currculo,emboraseja importante, ainda, colocarmemaisprecisamente comrelaoaoqueme habilita ancorar nesta perspectiva, visto que a crise da modernidade questiona talreferencial comoinsuficiente frente aosdesafiosque aglobalizaoeosnovosprocessosderelaoevaloraosocialtmapresentado.

    Fazse necessria, portanto, uma passagem pelas concepes de currculo queperfilam em distintos tempos no campo2 de estudo do currculo, como uma forma decaracterizar as nuances epistemolgicas que suplantam tais concepes. Como Lopes eMacedo (2002)ponderam o campodo currculo se constitui como um campo intelectual:espaoemquediferentesatoressociais,detentoresdedeterminadoscapitaissocialeculturalnarea, legitimamdeterminadasconcepessobreateoriadecurrculoedisputamentresiopoderdedefinirquemtemaautoridadenarea.(p.1718)

    Destaforma,osprocessoscurricularesemsuaamplitude,nasmaisvariadasdimensesde realizao, sofrem as influncias e determinaes deste campo enquanto espaolegitimadordosdiscursosedasprticasqueseestabelecememtornodocurrculo.prudenteaorientaodeMoreira (2003,p.30)dequeemperodos de crise, a preocupao com aprtica precisa intensificarse, j que ela se torna, segundo Lather (1991), o motor dainovao.Emoutraspalavras,tratasededefenderacentralidadedaprticanosestudosquepretendemcontribuirparaasuperaodacrisedateoriacrticadecurrculo.

    Talorientao,buscandoresponderqueixadapsmodernidadequantoausnciade solues e orientaes aos educadores na superao dos problemas da modernidade,acena paraum necessrioeurgente dilogo ou,maisque isso, para umaproduotericatecidanaprtica,pelaatividade socialquesupereosdiscursoseasdemonstraesdesligadas destaprtica.

    2 Segundo Pacheco (2003, p. 55), para Cloy Hobson (1943, p. 15) Franklin Bobbitt corretamente consideradoopaidomodernomomentode construodocurrculo.Elepublicouem1918,nosEstados Unidos,TheCurriculum.

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    Ateoriacrticadocurrculonascenadcadade1970,comosestudossociolgicosquequestionam o carter prescritivo, a suposta neutralidade do currculo e sua anlisedesvinculadadocontextosocialmaisamplo.Sustentadapelacrenadeumaescolaquetenhaseu papel ressignificado na construo de uma sociedade mais democrtica e mais justa(MOREIRA, 2002), a teoria crtica, cuja construo passa por fases que subentendem operodode1970a1990,concebeocurrculocomoumapolticacultural.

    Para McLaren (1977, p.216), o currculo representa a introduo a uma formaparticulardevida;eleserve,emparte,paraprepararosestudantesparaposiesdominantes ousubordinadasnasociedadeexistente(grifosdoautor).Nestaperspectiva,acreditasequeo currculo favorece certas formas de conhecimento sobre outras e afirma os sonhos,desejos e valores de grupos seletos de estudantes sobre outros grupos, com freqncia,discriminandocertosgruposraciais,classesougnero.

    No mais possvel, portanto, conceber o currculo dissociado de sua naturezasocial, pois como adverte Silva (apudGOODSON,2002,p.8)em sua construo convivem edisputam fatores lgicos, epistemolgicos, intelectuais, determinantes sociais menosnobres e menos formais, tais como interesses, rituais, conflitos simblicos e culturais,necessidades de legitimao e de controle, propsitos de dominao dirigidos por fatoresligados classe, raa, ao gnero.Assim o currculono constitudode conhecimentosconsideradosvlidos,masdeconhecimentosconsideradossocialmentevlidos.

    Silva (1999), ao prefaciar a obra de Pacheco (2002), pontua que no currculo secondensamrelaesdepoderquesocruciaisparaoprocessodeformaodesubjetividades sociais. Em suma, poder e identidades sociais esto mutuamente implicados. O currculo corporificarelaessociais.(p.102103)

    Comestesreferenciaisostericoscrticossededicamaosimperativosemancipatriosdeconferirpoderaoindivduoedetransformaosocial,comocolocaMcLaren (1997) (grifosdo autor).A partirdesta acepoos professores tmum papeltotalmente ressignificado esua formaoeprticaso compreendidasnadimenso dotrabalhointelectual,denaturezaessencialmentepoltica.

    Nesta direo, o currculo uma construo cultural que se faz na interface dasrelaes polticas mais amplas com a prtica e, neste sentido, a teoria crtica respalda o compromisso com uma prtica transformadora3, comprometida coma justia social, a lutacontraasdesigualdades,opressesemarginalizaes.Osprofessores,porsuavez,

    devem desenvolver no s uma compreenso das circunstncias em que ocorre o ensino,masque, juntamente comosalunos,devemdesenvolvertambmasbasesparaacrticaeatransformao das prticas sociais que se constituem ao redor da escola. (GIROUX, 1990,p.382)

    Aqui, portanto, situamos nossa defesa por um posicionamento crtico que no desconsidereum dilogo, como sugereMoreira4(2003,p.28), tambm crtico comapsmodernidade.Assentaseumacompreensodocurrculo comoprocessocomplexo,dadoporrelaes depodere de significao de conhecimentos, coisas, relaese valores, ou como

    3Discutindoaquestodaautonomiaprofissionalnestemomentodecrisedateoriacrtica,Contreras(2002,p.187188)argumentaquenodevemos renunciar idiadeemancipaoeperspectivado intelectualcrtico, jquesequestionaafaltadeumprojetoqueaponteuma definiomaisclaraparaaautonomia dos professores, tratandose como necessrio, portanto, criar e desenvolver uma sensibilidademoral a tudooquepossasuporsofrimentohumano,comoqueriaMarcuse.4Moreira (2003, p. 28)apiase na idia deBoaventura Santos (1996) cuja defesa subentende que um projetoeducativoemancipatriovisa recuperara capacidadedeespantoe indignaoe orientlaparaa formaodesubjetividadesinconformistaserebeldes.

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    Grundy (1987 apud SACRISTN,1998, p. 14) o define nose podereferir simplesmente aum conceito abstrato que tenha algum tipo deexistncia fora epreviamente experinciahumana.O currculo , antes, ummododeorganizarumasriedeprticaseducativas.

    Para Sacristn (1998), o currculo e sua natureza processual traduzemse em umconjuntodeprticasdiversas,aomesmotempoemqueconstrudoporsubsistemasquevodesdeosrgosmaiselevadosdapolticaeducativaaoscontornosda formaodossujeitosno contexto escolar. A prtica pedaggica uma destas prticas, da qual se servem osprojetos institucionais de formao ao longo da histria da escolarizao formal. Prticapedaggicaecurrculo,aoconstituremsecomoprxis,perfazemoestatutodeprocesso.

    Mas a noo de processo, de formamais aprofundada, est vinculada noo denatureza da realidade, sobre como a realidade se compe. Assim, desde o pensamento clssico e at mesmo anterior a ele, duas noes embasam a compreenso acerca darealidade: a estaticidade ou permanncia do universo e das coisas ou o seu fluxo, seuprocesso. A primeira noo se consolida com Plato5 (426348 a.C) e Aristteles (384322 a.C.) constituindosenumparadigma quevai sustentaropensamentoocidentalpormaisdedoismilnios,oferecendoasbasesparaaconstruodo pensamentomoderno.

    A noo de permanncia em Aristteles sucumbe explicao do ser em suaexistncia.Andery(2001,p.82)ressaltaqueparaAristtelesaessnciadoserpermaneceriasempre a mesma, sem alterarse, apesar de um ser comportar diferentes modos de ser.Assim (...),tudooqueexisteenglobariaoqueeoquepoderiaviraser.Todasascoisas,osobjetos, os fenmenos, eram seres em ato, mas continham em si, ao mesmo tempo,determinadaspossibilidades:potncias.

    Herclito (540470 a.C) , em contrapartida, quem oferece o contraponto ao pensamentoaristotlico depermanncia6,afirmandoqueavida umfluxocontnuo.Todavia,Doll (1997), cujo pensamento se situa na psmodernidade, argumenta que a partir dahermenutica contempornea,especialmentecom as contribuies deMartinHeidegger aolidar com as questes da natureza do ser, que so consolidadas as bases para umpensamento curricular de processo. Nas palavras de Doll (1997, p. 151), paraHeideggercomo seresnomundo jamais poderemos escapar das situaes culturais;estamospresosno crculohermenutico de serdefinidospornossa culturae sua linguagem,podendoseexpandilo, mas nunca sair fora dele.Neste sentido, para o autor pedagogicamente, umaestrutura hermenutica foca nossa ateno curricular nas interaes ou, tomando emprestadaumaexpressodeJohnDewey,nastransaesentreotextoensmesmos(p. 152).

    Partindoda perspectiva de processode Deweyna quala noo de mudana se faz 5 Segundo Doll (1997) as noes de permanncia ou mudana representam alternativas metafsicascontrastantes (...). Plato, valendose da cosmologia de Scrates, combinou ambas as vises, vendo a realidade em um nvel como existindo na permanncia das formas abstratas, e num outro nvel como existindo no fluxo da vida contempornea. Entretanto, ele atribuiu um valor maior s formas permanentes,boase virtuosasemsuaexistnciadoqueaosobjetosconcretosdaexperincia vivida no cotidiano, que ele via apenas como cpias das formas (Repblica, Livro VI). Assim, a permanncia adquiriu uma posio privilegiada no pensamento ocidental; as filosofias e a Teologia aristotlica,ptolomaica e crist reforaram esta viso. A Cincia e a Teologia, na era prmoderna, tambm sereforaram mutuamente, com Deus considerado estvel, permanente e o centro de um universo bem ordenado.Amenteeraconsiderada o olhodaalma,enquantoaMatemtica, com seu prpriosensode permanncia, espalhavaacalmarealidadeaserencontradaemDeusounasformas.(p.150)6Doll (1997, p. 150)ainda relata que Descartes levou ainda mais longe esta viso da realidadecomo permanncia,aoatribuirmentereflexiva opoderdaautoexistncia: Cogitoergosum. Valendosedo pensamento cartesiano, newtoniano e iluminista, o modernismo ainda considera a permanncia como superioraofluxo,proporcionandoumlarparaarealidade.

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    anloga, Doll (1997)analisa que os objetivosefins,aqueles faris que orientamtantasdenossas aes curriculares, no s parecem como so decises pessoais tomadas por seresculturaisemmomentoshistricos(p.152).ParaDewey,oconceitodeobjetivoscompreendefazerescolhasinteligentesdentrodeumaestruturacultural,jqueasatividadeshumanassocontnuas. Dewey constri argumentos em torno de uma prtica progressista em que oconhecimentoperspectivadocomoumconstructooriginadode relaes intencionais, ondea curiosidade deve ser instigada a uma atitude de investigao alerta. Assim, Deweyconsideraqueopensamentoemsiumprocesso...eleestemcontnuamudanaenquanto apessoapensa(DEWEYapudDOLL,1997,p.153).

    Neste sentido,oque rompe com aestaticidadeouahierarquiadeum currculoqueseconfigurecomoumconhecimentoapriorieparaoqualhumarealidadecapturvel,dcilemoldvel, aargumentao dequeopensamento processo,equeamudana que sequalifica enquanto eptome do processo acena invariavelmente para o movimento datransformao.

    nestesentidoqueSacristn(1998,p.21),alertaparaacomplexidadequeenvolveosprocessos curriculares e pontua que a nica teoria possvel que possa dar conta dessesprocessos tenha de ser do tipo crtico, pondo em evidncia as realidades que ocondicionam.

    No entanto, como o currculo diz respeito a uma ampla totalidade de prticas,tambm coadunamos com este estudioso do currculo quando afirma que, dentre outrosfatores a maior conscientizao do professorado sobre o seu papel ativo e histrico,colocamapujanadeumaperspectivatericaquesecentramaisnarelaocomaao,quesubentende,comojexpressei,aidiadecurrculo comoconfiguradordaprtica.

    De tal modo, buscando construir uma base de anlise mais coerente entre o quedispeateoriasobreocurrculoenquantoprocesso,consideroimportanteaargumentaodeSacristn (1998,p.48)quandoadvertequeparaqueo currculocontribua para o interesseemancipatrio, deve serentendido comouma prxisopoque, segundoGrundy (1987,p. 114ess),seapianosseguintesprincpios:

    a) Deve ser uma prtica sustentada pela reflexo enquanto prxis, mais do que serentendida comoumplanoque precisocumprir, poisse constri atravsdeumainteraoentreorefletireoatuar, dentrode umprocessocircularquecompreendeoplanejamento,aaoeaavaliao,tudointegradoporumaespiraldepesquisaao.

    b)Umavezqueaprxistemlugarnummundorealenoemoutro,hipottico,oprocessodeconstruo do currculo no deveria se separar do processo de realizao nas condiesconcretasdentrodasquaisadesenvolve.

    c)Aprxisopera nummundode interaes,que omundosocial e cultural,significando,comisso,quenopodesereferirdeformaexclusivaaproblemasdeaprendizagem,jquesetrata de um ato social, o que leva a ver o ambiente de aprendizagem como algo social,entendendoainteraoentreoensinoeaaprendizagemdentrodedeterminadascondies.

    d)Omundodaprxisummundo construdo,nonatural.Assim,o contedodo currculo uma construo social.Atravsdaaprendizagemdo currculo,osalunosse convertememativos participantesdaelaboraodeseuprpriosaber,oquedeveobriglosarefletirsobreoconhecimento,inclusiveodoprofessor.

    e)Doprincpio anterior sededuzque aprxisassumeo processode criaodesignificado como construo social, no carente de conflitos, pois se descobre que esse significado acabasendoimpostopeloquesetemmaispoderparacontrolarocurrculo.

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    Estas caractersticasda prticapermitemmeperspectivar na realidade educativadaescolaossignificadosdatessituradeconstruodeumcurrculoemancipatrio,numprocessoque transforma os atores da cena educativa em articuladores crticos entre asproposiescurriculares mais amplas, suas condies contextuais e percepes formativas prprias,enquantodesenhama trajetria coletivadeproduodo conhecimentoescolar, a partir dareflexo coletiva, cujos significados so construdos na relao como entorno socialmaisamploearealidade imediatada comunidade.Proponho, comesta discusso, apresentar asdiferentesconcepesemtornodasprticasdeplanejamento curricularquehistoricamentevm compondoocampoe,paraisso,apresentoasconsideraesdeSacristn(2000,p.205)que possibilitamuma visomaisaprofundada, ponderandoque planejar implica emrealizaroperaescomplexasemsituaessempreadversas,ou:

    a)Pensarourefletirsobreaprticaantesderealizla.

    b)Considerarqueelementosintervmnaconfiguraodaexperinciaqueosalunos/astero,deacordocomapeculiaridadedocontedocurricularenvolvido.

    c) Ter em mente as alternativas disponveis: lanar mo de experincias prvias, casos,modelosmetodolgicos,exemplosrealizadosporoutros.

    d)Prever,namedidadopossvel,ocursodaaoquesedevetomar.

    e)Anteciparas conseqnciaspossveisdaopoencolhidanocontexto concreto emqueseatua.

    f)Ordenarospassosaseremdados,sabendoquehavermaisdeumapossibilidade.

    g)Delimitar o contexto, considerando as limitaes com que contar outenhadesuperar,analisando as circunstncias reais em que se atuar: tempo, espao, organizao deprofessores/as,alunos/as,materiais,meiosocial,etc.

    h)Determinarouproverosrecursosnecessrios.

    Parto do pressuposto de que a relao do professor real, na escola real, com o currculoexpressa osentidoquese d prtica e aoplanejamento. Comoa prticaalgomuito complexo que no se aprisiona pela rigorosidade de modelos lgicos e formais, oplanejamentopoderepresentaroespaoeomomentoestratgicodeconstruodamudanadaprtica,configuradapelodesenvolvimentodocurrculobaseadonaescola.

    OCurrculocomoProduto

    Aconcepodecurrculocomoumplano,algoaseraplicado,cujabaseseencontranaracionalidade tcnica, subjacente poltica curricular que confere prtica uma margemprestabelecidadaaodocente.Como aordenaodo currculo fazparteda intervenodoEstadonaorganizaodavidasocial,comoressaltaSacristn (1998,p.108),a prescriocurricular uma forma de controlar um sistema que grandemente complexo, tendoporfinalidadepromoveramanutenodaeducaocomosistemaideolgico.Esteprocessosedpelatecnificaodocurrculopelaadministrao.

    Comomencioneiapouco,agnesedocampo curricularseassentanaracionalidadeinstrumentale na defesa pela eficincia a partir de Bobbitt, no incio dosculoXX e, em

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    seguida com Tyler, em meados do mesmo sculo, que consolida o modelo de gestocientfica (PACHECO, 2003, p. 49) concebido como um esquema parao planejamento daprticadocurrculo apartirdadefinio deobjetivos.

    Assim, esteesquemapode ser percebido como uma tecnologia aplicvela todasassituaesdeensino.SegundoPacheco(2003),orationaleTylerrepresenta:

    Aconceitualizaodeumateoriacurricular interligadaauma teorialinear,normativaeprescritivade instruoequeapresentaquatro caractersticasprincipaisparaJeromeBruner(1966):deveespecificarexperincias; deveespecificaromodo pelo qualo conhecimentoreestruturado; deve especificar as seqncias efetivas deapresentaodosmateriaisaseremapreendidos;deveespecificaranatureza dos passos de recompensa e punio do processo deensinoeaprendizagem(p.50).

    Pacheco ressalta que o mtodoem questo subentende um esquema para o seudesenvolvimento,quebemexpressaascaractersticasaqueBrunnerserefere.Constriseapartirdestasdisposiesdo quedeve sero currculo quesoapresentadas em formadequestionamentos um modelo para sua organizao que se assenta na linearidade e naprescrio, concebendoo currculode formaesttica parauma realidade tambmesttica. Neste sentido, Pacheco (2003, p. 50) relata que Ralfh Tyler, em colaborao com VergilHerrick, identificouoselementos indispensveis paraaexistnciadeum currculoem ao,independentedequalquerteorizaocurricular.

    Mas neste caso, o princpio lgico tyleriano para o desenvolvimento do currculo colocasesobrebasesbastanteadversasdeumaproposio crtica,vistoqueaproduodosobjetivosparao currculogiraem torno da lacunaexistenteentre o queeo quedeveserosujeito paraasociedadee,destaforma,estaconstruosecolocaanterioraoprocessoeducativo vivenciado, mais como um fim a ser alcanado do que como um processo emconstruo. como se a realidade do que o sujeito j estivesse definida e a educaoapenasatuassesobresuasincapacidades.

    Nesta perspectiva, a administrao central prescreve o currculo aos professorescontedosmnimos, saberes de alto nvel, disciplinas dispondo para estes os objetivos esaberesqueoprogramadeescolarizaoprevquesejamcumpridos/alcanados.

    Comono casodo currculo disciplinar, uma formadeorganizaodo tempo escolardifundida a partir da racionalidade cientfica, aespecializao do conhecimento emanadadeinteressessociais,polticoseeconmicos,porquedeacordo comForquin(1992,p.39)huma reduodos saberes escolares a construes sociais, partilhadas intersubjetivamente. Forquin ainda analisa a relao entre a veiculao de saberes e a estratificao dasestruturassociais,vistoqueestessoprodutosdeumacentuadoprocessodeseleoculturaledeelaboraodidtica,vistoqueossaberescomosquaisaescolatrabalhaso constitudos porfenmenosdehierarquizaoouestratificaodoconhecimentoe,sendoassim

    Asestratgiasdesenvolvidaspordiferentescategoriasdeatoresno interiordocampoescolarmostramperfeitamentequeosdiferentestiposdesaberesensinadosnasescolasnoso considerados como suscetveis de fornecer a seus detentores benefcios sociais ousimblicosequivalente.(p.41)

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    Assim,o currculoprescreveos resultadosque a educao deve ter.Neste sentido,Sacristn (1998) comenta que Johnson (1967), cuja orientao se assemelha a de Tyler,definiria o currculo como um conjunto de objetivos estruturados que a educao queralcanar (p. 46). Sacristn (1998) avalia ainda que o currculo passa a ser um objeto manipulado tecnicamente, evitandoelucidar aspectos controvertidos, sem discutiro valor esignificadodeseus contedos.Umacolocaoque temacompanhado todaumatradiodepensamentoepesquisapsicolgicaepedaggicaaculturaleacrtica.(p.47)

    O desenvolvimento do currculo como uma atividade essencialmente prtica, ou seja,desprovida de trabalho intelectual e alienada das questes polticas, sociais, impe afragmentaodo trabalhodoprofessor, que se v subtrado de sua atividade de planejarocurrculo.O currculoseconfigura comoumguiadaprtica, construdomargemdestaporquem domina a especializao do conhecimento, quemgerenciao trabalho e no quemosimplesmente executa. A tecnificao do currculo transforma o em produto e osprofessoressoseusprimeirosconsumidores(SACRISTN,1998).

    OCurrculocomoProcesso

    Como afirmei anteriormente neste ensaio, partilhando da definio de Sacristn(1988), o currculo uma prtica que se produz numa complexa cadeia de relaes esignificaes. uma prtica cultural, mediada por processos histricos e culturais queemtempos e sociedades distintas, ocorre de forma particular, impregnada pelas condies ecompreensesepocaisquedosignificadoaosprocessoseducativosdaescolarizao.

    Como processo, desenhase uma condio no esttica, pronta, acabada ousimplesmente prdefinida. Muito mais que um programa educativo, que uma listagemdecontedosouumaorientaometodolgicaqueseiniciaeseesgotanumplanorgidopara aao,comodefendeSacristn(1988),ocurrculopodeserdefinidocomo

    o projeto seletivo de cultura, cultural, social, poltica eadministrativamentecondicionado,quepreencheaatividadeescolarequesetornarealidadedentrodascondiesdaescolatalcomoseachaconfigurada.(grifosdoautor)(p.34)

    Humaimbricaodeprticas,deinstnciasquedoformaesignificadoaocurrculo,cujos mbitos se entrecortam, permeiamse, constituindose em uma rede intricada deprticas de produo, que tem implicaes diretas para a construodo sentidoda prticapedaggica.Assimo autoravalia as prticas curricularese,dentreelas a de planejamento,devemseranalisadasnocomoumobjetoesttico,mascomoaexpressodeumequilbrio entre mltiplos compromissos. E mais uma vez esta condio crucial tanto paracompreenderaprticaescolarvigente comopara tratardemudla.(p.102)

    Nestesentido,oplanejamentoapenasumaentreascomplexasediversasinstncias deproduo do currculoque, implicandoqueno complexo processodesuatessitura,sofreas interfernciasdiretasou indiretasnasuasignificao.Aqui,planejaro currculoconsistir,segundoSacristn(2002,p.202),oplanejamento desituaesambientaiscomplexasou,no mnimo,navigilnciadosmltiplosefeitosquesederivamdessesambientes.

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    Diante destes apontamentos, reflito sobre os desafios colocados escola nestetemposdeanunciadaseexigidasmudanas,poisconceboqueoplanejamentocurricularpodeconfigurarsecomoespaoetempoprivilegiadodereflexo,detrabalhodepesquisa sobre aprtica que se quer realizar e a prtica que se realiza, de partilha de saberes docentes,dentretantasoutraspossibilidadesparaagestodasrelaeseducativas.Questiono,ento,quecaractersticassefazempresentesnasprticasdeplanejamentocurricularorientadasporumaperspectivadeprocesso?

    Longe de pretender determinar modelos idealizados para o planejador, o queafirmariaaperspectivadeprodutoparasuaao,oesforodestareflexoencerraodesejodepartilhar alguns caminhos vislumbrados em minha pesquisa de mestrado, quando diversosaspectos forampercebidoserelacionadosaosmovimentosqueosprofessores impetramembuscadeprticasmaissignificativas.

    Assim, Schon (1983 e 1987 apud SACRISTN, 1998, p. 198) oferecenos uma claradefinio sobre o professor como planejador. Na sua concepo, a atividade de planejardemanda conhecimento sobre a realidade coma qual se trabalhaeexigeamobilizao deconhecimentosdiversos.Naanlise destasrealidadessurgemosplanosouprodutossempresingulares. Shon conceituao planejador como algumque dialoga com a situao emqueatua, que experimenta com uma idia guiado por princpios, que configura um problema,distingue seus elementos, elabora estratgias de ao ou configura modelos sobre osfenmenos,tendoumarepresentaoimplcitadecomoestessedesenvolvem.

    Nesteprisma,aatividadedeplanejarumaatividadedeproduodeconhecimento acercadaprtica,norteadapelareflexoquedeveserealizarcomoprticacoletivaconformeadvertem Liston e Zeichner (1981 apud CONTRERAS, 2002, p. 139). Tratandose de umaperspectiva que toma comoprerrogativa a construo,a prtica ressignificada para umacondiomais ativa, imersa empossibilidades e em tramas relacionais, decises de cunho poltico,ou como Sacristn (2002) argumenta,exige um tipo de interveno ativadiscutidaexplicitamentenumprocessodedeliberaoabertoporpartedosagentesparticipantesdosquaisesta cargo:professores,alunos,pais, forassociais,gruposdecriadores,intelectuais,para que no seja uma mera reproduo de decises e modelaes implcitas. Nem ocurrculo comoalgo tangvel, nem os subsistemas que os determinam so realidades fixas,mashistricas.(1998,102)

    Aprticade planejamentoganhaumadimensocontextualmaisamplaqueasaladeaula, visto que o currculo constituise no projeto educativo da escola. A considerao dosatoresdoprocessocomosujeitosdo currculo imprimelhesumanecessria deliberao queimplica em escolhas, negociaes e perdas. Pacheco (2003) ressalta que ospressupostosideolgicosdaconstruodocurrculotornamoprofessorcomo umdecisorpoltico,exigindo dele uma atitude permanente de parceria, que lhe advm querda sua profissionalidade,quer dos espaos de autonomia curricular, que no so conquistados, mas politicamentedecretados.(p.121)Planejarocurrculoumtrabalhodeliberativoquesefaznacoletividade. Sacristn (1998, p.196) pondera que o planejamento ou a programao do currculo emequipe uma exigncia da necessidade de oferecer aos alunos um projeto pedaggico coerente.Assim,otrabalhocoletivosurgecomoumacaractersticadaprticaqueexpressa asustentao em torno de uma negociaosobre a mudana e de um efetivoenvolvimento nestadireo. Sacristn (1998,p.196) pontuaque asestruturasde funcionamento coletivo dosprofessores,decididas aonveldaescola,sofatoresmediadoresimportantesdocurrculo edevemsermaisumprojetodemudanaqualitativo.

    O professor,no entanto, noonico decisordocurrculo.Aparticipaodealunos epais,almdeoutrosatorescitadosporSacristn(1998)configurasecomoumainversodelgicasna relao como conhecimento escolar, cuja funoemancipadorabusca desvelar a

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    alienaoquemantmosprocessosdedominao ede intensificaodeinjustias.Pacheco(2003) ressalta queocorreuma inverso dosquestionamentosque ancoram as discusso econstruo do currculo.Aquesto Que conhecimentomaisvalioso?substitudapor Que interesses sociais, econmicos, polticos e ideolgicos esto na base do conhecimento escolar?.Neste sentido, aparticipaodospais,alunose professores dependeem grandeparte dos limites impostos pelo currculo nacional (PACHECO, 2003, p. 128), dada suaestruturadeobjetivosecompetnciasprestabelecidas.

    Osalunosnosomerosreceptorescocurrculo,jquearealidadeeoconhecimento soproblematizadoscomeles.Aconstruodo currculo subentendeumprocessoformativocrtico e,portanto,participativo.

    A lgicado currculo comoprocessoalude tambm paraumaorganizao curriculardiferenciada da que supe a lgica disciplinar, direcionada a construo de situaescurriculares pouco estruturadas que permitem aos alunos refletirem sobre as suasexperinciasdevidaesentirem aeducao como umprocessodemocrticonoqual lhespermitidonegociarasuaprpriaagendadeaprendizagem.

    Tratase da construo de novas relaes com o conhecimento que subentendemuma perspectiva de compreenso da realidade pela produo de conhecimentos. A defesapelaintegraocurricularcomoabordagemdoconhecimento sustentada pelapossibilidadede promover um conhecimento da realidade social, j que a diviso disciplinar do conhecimento incapaz de dar contada problemtica social (MACEDOe LOPES, 2001, p. 81).Colocando a integrao curricular comoum parmetro crucialdaspolticascurriculares,Pacheco (2003) avalia que a integrao o que permite fazer a interligao do currculo formal do qual resultam as decises mais prescritivas com o currculo informal, e omesmo se pode dizer em relao s decises resultantes das interaes e relaes no previstas oficialmente, ouclandestinas e ocultas, que se inscrevem tambmemuma lgicadossentimentos.

    A integraocurricular,paraMacedoeLopes (2002,p.81),podesedarviatemticaou por campos de saberes interdisciplinares, sendo esta ltima uma realidade maispertinente construo de currculos universitrios. Assim, as autoras consideram aintegraopor temtica comouma articulao horizontalde contedos, afirmandoqueapropostadaintegraodesconstriaidentidadeentredisciplinacientficaedisciplinaescolar,namedidaem que propeumaorganizao da disciplinaescolar segundo critriosdiversosdaquelesaceitospelocampocientfico.

    Nestesentido,horeconhecimentodequeaamatrizdisciplinarpersiste(idem, p. 72)eque a integrao curricular pode conduziraodesenvolvimentode umaeducaoquegaranta aospropsitos de um currculoemancipatrioantesque auma integrao comumfimemsimesma.

    Pacheco (2003, p. 129) argumenta que a efetivao desta nova situao como superaodapersistenteorganizaodisciplinarspossvelseredesdinmicasdetrabalho lhe servirem como alicerce e permitirem, de acordo com Poch (2000 apud PACHECO)responderscaractersticas:

    a)As situaes so relativamente poucoestruturadas;os problemaseosobjetivosno soapresentados;necessrio,porisso,quesejamdefinidosporumanegociaoentreaspartesenvolvidas.

    b)O conhecimentonecessrio (conhecimento situacional)pode,at certoponto, ser criado em determinadas situaes pelas prprias pessoas, as quais, por meio de sua ao (ouinao)constituempartedessemesmoconhecimento.

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    c)O conhecimento no aplicado instrumentalmente demodo a solucionarosproblemas,masseexpressaholisticamenteemaesqueincluempercepes,valoresesentimentos.

    O que se coloca tem relao mais profunda que a questo das abordagensmetodolgicasparaoensinoeaaprendizagem.Dizrespeitoa caminharparaumaalteraodasrelaes comoconhecimento comoqualaescolatrabalha.Assim,evocaraperspectivado planejamento curricular como processo compreende superar uma viso do professorescomomeros aplicadores de contedos prdeterminados, vitimados em uma condio a histrica e donde a prtica insiste por manterse velada da realidade social, como se osconhecimentosa serem ensinadoseaprendidosexistissem margemda prpria existnciaconcreta, emblemtica e dinmica dos envolvidos diretamente no processo social daeducaoescolar.

    ALGUMASCONSIDERAES

    Neste ensaio propus refletir sobre como diferentes concepes de currculo configuram as prticas de planejamento curricular na escola. Neste sentido a discusso foiarticulada tendoem vista que o campo da prtica complexoe que as concepesqueaorientamnose constituempuraou linearmente.Apolarizaopresentenasdiscusses,aoretratar duas concepes de currculo, so postas num esforo de compreender certosreferenciaisque ao longo dahistria da produoda teoria curricular foramproduzidosdemodofronteirio,tensoemesmodifuso.

    Assim,nestasconsideraesapenasdestacoalgunspoucoselementosquejustificamapertinnciadeumaorientao processualparaasprticasdeplanejamento curricular.Como destaquei inicialmente, de acordo com Sacristn (1998, p. 48), a prxis um mundo construdo,nonatural,queassumeoprocessodeconstruodesignificadocomoconstruo social, cultural; um processo produzido por conflitos, tenses, interaes nem sempretranquilas,consensuais.

    A prtica de planejamento do currculo, no obstante, e como j apontado anteriormente, contextual, histrica. Seu significado se constri na interao entre o refletir e o atuar no apenas de professores e professoras, sujeitos desta reflexo, mastambm de outros atores escolares que constituem tambm, e de forma expressiva, ascenasdeplanejamento curricularnaescola.Aprtica curriculardeprofessoresnodeveserconsideradacomoocondicionanteemdefinitivodo currculo,pois,comonoslembraSacristn(1998), h todo um complexo sistema de produo curricular em que os professoresparticipam de forma a filtrar, validar emediaro currculo e isso os leva a um permanenteestadodeconflito, implicandoquetomemdecises,realizemescolhas,faamopes.

    Estas reflexes, importante dizer, se desenvolvemno reconhecimento de que naprtica aaopedaggica,a aodeplanejamento curricular,dentreoutras,dosesempreem movimentos pendulares, oscilando entre as perspectivas apresentadas, visto que arealidadeprocesso,queopensamentoprocesso.Abuscaporcompreendermaisafundoadinmicadeumcurrculoprocessualrepousana crenadequealgunselementospodemserapresentados como pontos para reflexo acerca de caminhos possveis para um currculo emancipador. Contudo, tambm possvel afirmar que um currculo emancipador oumesmo experincias que tomem este como referncia est sempre em curso, pois aemancipaossetornarealidadenavivnciadeprticasconcretasnointeriordasescolas.

    Sendoassim,planejarocurrculonumadimensoprocessualcompreendeimplicaes

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    positivas prtica dos professores, se se entende que a construo de um currculo emancipador na escola abarca o percurso de construo da autonomia do professor,compreendida como construo de sua emancipao. preciso, no entanto, perceber aprtica deplanejamentodo currculo comooespao eo tempo elementar naproduodepossibilidadesparaumaaomaiscrtica,poisconstitui instnciasignificativano interior dasescolas que ousam promover vivncias de processos mais democrticos, especialmenteporque no se limitam a debruarse a apelosde produo dediferenciaometodolgica,toinsistentesemdiasdeacentuadanfasenanecessidadedemudananaescola.

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