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A capa da edição de maio, do Informativo Jurídico, trata de um assunto que está cada
vez mais dentro das discussões atuais sobre clima e energia: a Geração Distribuída.
Os advogados especialistas na área de energia, Tiago Lobão e Valéria Rosa comentam
sobre as metas de descarbonização e mitigação do clima que foram estabelecidos no
Acordo de Paris, além disso, eles explicam qual o papel da geração de energia por
fontes que são renováveis para que seja possível alcançar a redução da emissão de
gases de efeito estufa.
Este e outros temas como: uma análise sobre a responsabilidade civil do Estado em
relação aos danos causados por enchentes e, a recente decisão do STJ em reconhecer
o direito a não incidência de IPI em mercadorias roubadas, estão nesta edição.
Esperamos que gostem.
Até a próxima edição.
Por: Leite, Tosto e Barros Advogados
Passados três
anos do início
da vigência do
Novo CPC, os
operadores do
direito vêm
e n f re n t a n d o rotineiramente
os reflexos trazidos pelas suas
inovações.
Cumpre a este informativo
elucidar pontualmente alguns
dos novos temas trazidos,
especialmente os que não
ganharam suficiente atenção
da doutrina ou da mídia
especializada, mas que, na
prática, são de essencial
importância para a conclusão
satisfatória de um processo.
Imaginemos, então, que, numa
Ação de Execução, o diligente
credor consiga localizar um
dos melhores imóveis de
propriedade do devedor para
fins de penhora: bem situado,
não possui ônus, não é bem de
família, é indivisível, e que, num
futuro próximo, cumpridas as
formalidades legais, possa se
submeter ao procedimento de
expropriação, conferindo-se ao
credor o produto financeiro da
alienação.
Mas há um senão: a matrícula
indica que o devedor é
proprietário de 50% do bem,
sendo que o coproprietário não
se submete à execução. Deve-se
também elucidar que, na posição
do coproprietário, poderia
também estar o cônjuge meeiro,
igualmente não submetido à
execução.
Pois bem, lembrando-se de que
o bem é indivisível, como essa
situação é enfrentada no Novo
CPC, se o credor efetivamente
quiser penhorar o bem e
expropriá-lo? Primeiramente,
voltemo-nos ao CPC revogado
e à jurisprudência sobre ele
firmada para destacarmos que (i)
em relação ao coproprietário, o c.
STJ pacificou o tema no sentido
de que a fração não penhorada
não poderia ser expropriada,
remanescendo, portanto, sua
posição de coproprietário,
independentemente da alienação
da fração penhorada pertencente
ao devedor1, (ii) em relação ao
cônjuge, o artigo 655-B do
CPC revogado estabelecia que
“tratando-se de penhora de bem
indivisível, a meação do cônjuge
alheio à execução recairá sobre
o produto da alienação do bem.”
Em resumo, a fração do
coproprietário não era atingida
pela penhora da fração do
devedor e pela alienação dessa
fração; a meação do cônjuge o
era, e integralmente.
Salienta-se que, para ambos os
casos, e ainda sob as égides do
CPC revogado, coproprietário
e meeiro precisariam se valer
de Embargos de Terceiro para
resguardar a proteção de suas
quota-partes.
Pois bem, a primeira novidade
sensível trazida no novo
Código é a de que, tanto para
CARLOS D'AVILA
CIVIL
O Coproprietário e o Cônjuge Meeiro na Expropriação
de Bens Imóveis Indivisíveis
05 • Informativo Jurídico
1- Nesse sentido, o REsp 1.196.284/RS: “O Superior Tribunal de Justiça entende que, em execução, a
fração ideal de bem indivisível pertencente a terceiro não pode ser levada a hasta pública, de modo que
se submetem à constrição judicial apenas as frações ideais de propriedade dos respectivos executados.”
o coproprietário quanto para
o cônjuge não alcançados pela
execução, em se tratando de
bem indivisível, deverá ele ser
integralmente submetido à
expropriação, não havendo mais
limitações.
Ambos, contudo, terão direito
ao produto da alienação do bem
no limite de sua quota-parte/
meação.
A segunda é a de que os Embargos
de Terceiro não se fazem mais
necessários, já que a proteção à
indenização, e não mais ao bem,
devida ao coproprietário e ao
cônjuge passou a ser expressa.
A terceira é a de que
coproprietário e cônjuge terão
preferência na arrematação do
bem, quando submetido ao leilão.
Todas essas inovações foram
trazidas objetivamente no artigo
843, §1º, do Novo CPC:
Informativo Jurídico • 06
Art. 843. Tratando-se de
penhora de bem indivisível,
o equivalente à quota-parte
do coproprietário ou do
cônjuge alheio à execução
recairá sobre o produto da
alienação do bem.
§1o É reservada ao
coproprietário ou ao cônjuge
não executado a preferência
na arrematação do bem em
igualdade de condições.
E qual valor que coproprietário/
cônjuge meeiro terão direito
a receber? Aí enfrentamos a
quarta novidade.
Conforme parágrafo 2º do artigo
843:
“Não será levada a efeito
expropriação por preço inferior
ao da avaliação na qual o
valor auferido seja incapaz de
garantir, ao coproprietário ou
ao cônjuge alheio à execução,
o correspondente à sua quota-
parte calculado sobre o valor da
avaliação.”
Está garantido, portanto, que o
coproprietário/cônjuge meeiro
não receba menos do que a sua
quota-parte/meação, tomando-se
como base o valor da avaliação, e
não mais o valor pelo qual o bem
foi leiloado, como se verificava
na legislação revogada.
Não objetivamos aqui ponderar
se a inovação foi justa ou não,
07 • Informativo Jurídico
embora não nos pareça existir
dúvidas quanto a isso, mas, sim,
o reflexo trazido ao credor da
execução.
Isso porque se o imóvel do nosso
exemplo for avaliado em R$
500.000,00, e alienado por R$
300.000,00, ao coproprietário/
cônjuge estarão assegurados R$
250.000,00 correspondentes
à sua quota-parte/meação de
50% sobre o valor da avaliação,
e ao credor os R$ 50.000,00
remanescentes.
Em outro exemplo, Helder
Moroni Câmara2 esclarece que:
" O parágrafo 2º veda
a possibilidade de
expropriação por preço
inferior ao da avaliação,
se o valor obtido for
incapaz de assegurar ao
cônjuge ou coproprietário
o correspondente à sua
quota-parte, calculada
sobre o valor da avaliação.
Note-se que o dispositivo
não veda a expropriação
por preço inferior
ao da avaliação, mas
apenas na hipótese de
o valor da expropriação
ser insuficiente para
cobrir a quota-parte do
proprietário. Assim, se o
bem foi avaliado em 10,
cabendo ao coproprietário
5, o bem não poderá ser
expropriado por menos de
5, se for por 6, por exemplo,
5 serão destinados ao
coproprietário e 1 ao
exequente."
Por isso, pelas novas regras ora
analisadas, há de se concluir
que a penhora de frações de
bens indivisíveis e a futura
expropriação integral do bem
resultam ao credor, em regra, o
benefício de obter um volume
maior de interessados no leilão e
aquisição do bem, já que poderão
adquiri-lo integralmente, sem as
penúrias muitas vezes trazidas
pela copropriedade.
Lado outro, o direito
indenizatório assegurado ao
coproprietário/cônjuge sobre o
valor da avaliação, e não mais
sobre o valor do leilão, reduzirá
naturalmente o montante a ser
conferido ao credor.
Sem prejuízo da análise de
cada caso, cabe ao credor em
situações como essa envidar
esforços para que a avaliação
do imóvel seja corretamente
realizada, e para que o preço
mínimo de sua alienação, a ser
estipulado pelo juízo nos termos
do artigo 891 do CPC, seja o
maior possível, desde que não
inviabilize o oferecimento de
lances pelos interessados.
Nesse contexto, fundamental
que o credor também esteja
assessorado por profissional que
apure o potencial mercadológico
do imóvel, de modo a se
obter, comprovadamente, um
valor passível de alienação,
elementos esses que poderão
ser submetidos ao perito judicial
por força da avaliação do bem,
e ao próprio juízo para a fixação
do preço mínimo de alienação.
Enfim, mais do que nunca, quanto
maior o valor da alienação,
maior o produto a ser dividido
entre credor e coproprietários/
cônjuges meeiros. ■
2- Código de processo civil comentado. São Paulo:
Almedina, 2016, p. 1018. 14/03/2016.
Em recente decisão, o Superior
Tribunal de Justiça (STJ) decidiu
pela não incidência do Imposto
sobre Produtos Industrializados
(IPI) quando não há a entrega
efetiva da mercadoria devido
ao roubo/furto após a saída do
estabelecimento produtor.1
Os Embargos de Divergência
em Recurso Especial, opostos
pela empresa Philip Morris
Brasil, discutem se a saída física
do produto da fábrica seria
suficiente para concretizar o
negócio jurídico e o fato gerador
do IPI, sendo irrelevante se há a
efetiva entrega ou não. A ação
decorre de uma carga de cigarros
que foi roubada logo após
sua saída do estabelecimento
industrial.
O Ministro Relator Napoleão
Nunes Maia Filho destacou em seu
voto que a operação mercantil
só vai se concretizar com a
entrega efetiva da mercadoria
e, se houver roubo/furto após
a saída do estabelecimento
do fabricante, não existirá
o proveito econômico. Por
consequência, destaca-se que
não haverá forma de incidir o
tributo, pois não se configura o
evento ensejador do IPI.
A jurisprudência já caminhava
nesse sentido: em acórdão
proferido em 30 de agosto de
20122, o próprio STJ votou por
afastar a incidência de IPI, pois
entendeu que não haveria a
concretização do negócio jurídico
e do fato gerador do imposto.
Com o provimento dos Embargos
de Divergência, a Seção também
julgou procedentes os embargos
à execução opostos pela mesma
empresa para desconstituir o
crédito tributário devido de IPI
da operação.
A decisão é positiva para os
contribuintes, pois, além de
confirmar o direito de não
recolher o IPI sobre produtos
roubados, também abriu a
possibilidade para a discussão
de outros tributos na mesma
situação, como no caso do
Imposto sobre Circulação de
Mercadorias e Serviços, o ICMS. ■
Informativo Jurídico • 08
1- Embargos de Divergência em Recurso Especial nº 734.403 – RS – Superior Tribunal de Justiça,
Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho.2- Recurso Especial nº 1.203.236 - RJ, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 30.8.2012.
CARLOS CROSARA
PEDRO A. MUSSOLINI
TRIBUTÁRIO
STJ reconhece o direto a não incidência de IPI
em mercadorias roubadas
09 • Informativo Jurídico
No último dia 19 de abril, foi
publicado o Acórdão da Ação
Direta de Inconstitucionalidade
(ADI nº 2.332/DF), na qual se
discutia a constitucionalidade do
art. 15-A e seus parágrafos, bem
como do art. 27, §1º do Decreto-
Lei nº 3.365/41, com a redação
dada pela Medida Provisória nº
2.183-56/2001.
Em síntese, a ADI foi proposta
pelo Conselho Federal da Ordem
dos Advogados do Brasil para
discutir a inconstitucionalidade
da base de cálculo e do percentual
dos juros compensatórios nos
casos de imissão prévia na posse
do imóvel, por suposta violação
à cláusula da justa indenização
(art. 15-A do Dec.-Lei 3.365/41).
Discutia-se, também, a
FILLIPE G. LAMBALOT
THAINA CERVI
PÚBLICO
Julgamento pelo Supremo da ADI 2.332/DF – Adequação
do percentual e da incidência dos juros compensatórios nas ações
de Desapropriação/Servidão Administrativa
necessidade de comprovação da
existência de renda ou do grau de
utilização da terra superior a zero
para fundamentar a incidência
dos juros compensatórios (§§
1º e 2º do art. 15-A). Levou-
se ainda à apreciação do STF a
limitação imposta a condenação
honorária nos casos regidos pela
Lei de Desapropriação (art. 27,
§1º do Dec.-Lei nº 3.365/41).
Após o ajuizamento da ação,
foi proferida Decisão, publicada
em 13 de setembro de 2001,
que suspendeu liminarmente
a eficácia da expressão “de até
seis por cento ao ano” prevista
no caput do art. 15-A, bem como
a aplicabilidade dos §§ 1º e 2º
do referido dispositivo, que
restringiam a aplicação dos juros
compensatórios em algumas
situações.
Com isso, os Tribunais acabaram
por gerar jurisprudência,
consolidada por meio do
enunciado da Súmula 618
STF, que dispõe que nas
desapropriações a taxa de juros
compensatórios seria de 12%
ao ano. Permaneceu também
o entendimento de que seriam
devidos juros compensatórios
independentemente da
demonstração de perda de renda,
produtividade ou potencial de
produtividade do imóvel.
Levada a ADI a apreciação,
os Ministros do Supremo
entenderam por alterar ambos os
posicionamentos, considerando
constitucional o percentual
de 6% ao ano, bem como a
necessidade de demonstração
da produtividade ou o potencial
para tanto para que se fizessem
cabíveis os compensatórios.
Quanto ao percentual dos
juros, a alteração se deu sob
os argumentos de que (i) os
juros compensatórios foram
inicialmente estabelecidos no
Informativo Jurídico • 10
PÚBLICO
percentual de 12% (doze por
cento) a fim de compensar a
enorme perda inflacionária
sofrida pelos proprietários dos
imóveis expropriados que vinha
ocorrendo na época da edição
da Sumula 618 do STF; (ii) a taxa
de juros de 6% é absolutamente
compatível com as taxas de
juros praticadas atualmente no
mercado financeiro; (iii) a fixação
dos juros compensatórios em
12% ao ano vinha elevando
sobremaneira o valor das
indenizações, o que vinha
onerando o Poder Público e
gerando o enriquecimento
sem causa dos expropriados,
vez que por diversas vezes o
valor dos juros compensatórios
vinha superando o valor da
indenização propriamente dita.
Entendeu-se, porém, que o
vocábulo “até”, previsto no
caput do art. 15-A em análise,
seria inconstitucional, vez que
poderia gerar a fixação de
juros compensatórios em valor
abaixo do percentual de 6% (seis
por cento) ao ano, o que não
atenderia à justa indenização.
Quanto aos parágrafos §§ 1º
e 2º do art. 15-A do Dec.-Lei
nº 3.365/41, de acordo com os
quais os juros compensatórios
só seriam devidos se (i) o
proprietário comprovasse
efetiva perda de renda com a
imissão provisória na posse (§1º);
(ii) se o imóvel tiver “graus de
utilização da terra e de eficiência
na expropriação superiores
a zero”, ou seja, se o imóvel
possuir potencial produtivo
(§2º), a maioria do colegiado
julgou ser constitucional a
necessidade de comprovação
ao menos do potencial de
exploração econômica do
bem para a incidência dos
juros compensatórios, vez
que a destinação destes seria
justamente recompor as perdas
decorrentes da impossibilidade
de exploração do bem e não,
simplesmente, recompor a perda
da posse do bem.
Ainda quanto ao caput do art.
15-A do Dec.-Lei 3.365/41,
inserido pela Medida Provisória
nº 2.183-56/2001, entendeu-se
que a fixação da base de cálculo
dos juros compensatórios sobre
a diferença entre o total do valor
ofertado e o valor da indenização
é inconstitucional, mantendo-se
o posicionamento jurisprudencial
dominante de que tal aplicação
se dá quanto à diferença entre
80% do valor da oferta e o valor
final da indenização determinada
pelo juiz, vez que 20% ficam
indisponíveis para levantamento
pelo expropriado.
Com isso, temos que o julgamento
da ADI trouxe duas relevantes
alterações na composição do
cálculo das indenizações nas
ações de servidão administrativa
e desapropriação, primeiro em
razão da redução do percentual
dos juros compensatórios
de 12% para 6% ao ano e,
segundo, em razão da alteração
do entendimento até então
adotado de que a aplicação dos
compensatórios seria automática
independentemente de qualquer
potencial ou utilização do bem,
devendo agora ser considerado
o potencial de utilização do bem
superior a zero para fazer jus
aos compensatórios.
Esses novos parâmetros tendem
a trazer equilíbrio quanto às
indenizações das ações de
desapropriação e servidão
administrativa, desonerando
razoavelmente o custo dos
concessionários de serviços
públicos nessas ações, vez
que, em regra, em razão da
grande demora no trâmite
judicial e o altíssimo índice
de juros compensatórios até
então aplicado, este era um
dos principais fatores
de encarecimento
das indenizações. ■
terá validade até 30/04/2019,
prazo até o qual deverá ser
aprovada ou rejeitada pelo
Congresso Nacional.
Embora o MTb tenha sido
transformado em Ministério
da Economia, as pastas antes
de sua responsabilidade foram
redistribuídas também aos
Ministérios da Justiça e Segurança
Pública (que ficará responsável
pela política de imigração laboral
e dividirá, com o Ministério da
Economia, a responsabilidade
pelo registro sindical) e da
Cidadania (responsável pelo
cooperativismo e associativismo
urbano).
As demais atribuições
– as principais – ficaram a cargo
do Ministério da Economia, quais
sejam: política e diretrizes para
a geração de emprego e renda e
de apoio ao trabalhador; política
11 • Informativo Jurídico
Uma das primeiras e mais
polêmicas decisões do atual
Governo foi a então chamada
de extinção do Ministério do
Trabalho (MTb), mediante a
edição da Medida Provisória
n.º (MP 870/2019), que trouxe
incertezas, especialmente, no
futuro das fiscalizações
trabalhistas.
A primeira novidade é que,
tecnicamente, o MTb não foi
extinto, mas transformado em
Ministério da Economia (Ministro
Paulo Guedes), nos dizeres do
artigo 57, da MP 870/2019.
Vale lembrar que a MP 870, diante
de sua natureza, quando editada
pelo Presidente da República,
possui força de lei e tem
validade de 60 (sessenta) dias,
prorrogáveis por igual período,
de modo que essa medida
AMANDA [email protected]
VITOR [email protected]
FERNANDO RISKALLA
TRABALHISTA EMPRESARIAL
A extinção (?) do Ministério do Trabalho
e o futuro das fiscalizações trabalhistas
e diretrizes para a modernização
das relações do trabalho;
fiscalização do trabalho,
inclusive do trabalho portuário,
e aplicação das sanções previstas
em normas legais ou coletivas;
política salarial; formação e
desenvolvimento profissional;
segurança e saúde no trabalho e
regulação profissional.
Conforme a nova estrutura, as
atribuições serão exercidas
pela Secretaria Especial
de Previdência e Trabalho
(Secretário Rogério Marinho)
e pela Secretaria do Trabalho
(ainda sem secretário nomeado).
Assim, não só a fiscalização
trabalhista continua sendo
um poder-dever do Poder
Público, que encontra proteção
constitucional (artigo 7º, inciso
XXIV, artigo 21, inciso XXIV,
artigo 114, inciso VII), como
também a Lei n.º 10.593/02, que
prevê que a competência acerca
da inspeção do trabalho é dos
Auditores-Fiscais do Trabalho, e
o Decreto 4.552/02, que regula a
inspeção do trabalho, não foram
alterados pela MP 870/2019.
E por que a nova estrutura
importa aos empregadores?
Primeiro – esclarecendo a dúvida
de muitos –, é que não se deve
confundir a até então chamada
extinção do MTb com a extinção
das suas atribuições: na prática,
as fiscalizações continuam a ser
exercidas da mesma forma. Mas,
o que é mais importante salientar,
é que a lavratura de autos de
infração poderá trazer diversos
prejuízos aos empregadores –
não só de ordem econômica,
diante da aplicação de multas –
mas outros, como:
• Utilização de eventuais
autos de infração para subsidiar
investigações realizadas pelo
Ministério Público do Trabalho
(MPT). As investigações pelo MPT
podem ocasionar propositura de
Ação Civil Pública, culminando,
inclusive, em condenações de
altíssimas indenizações por
danos morais coletivos.
• Impossibilidade de
obtenção de Certidão Negativa
de autuações trabalhistas, o
que poderá ocasionar eventuais
prejuízos em negociações
empresariais (por exemplo,
fusões, incorporações) ou, ainda,
em participações em licitações
públicas.
• Utilização dos autos de
infração para incluir a empresa
na lista de empregadores que
tomam trabalho análogo a de
escravo, tendo em vista que a
Informativo Jurídico • 12
TRABALHISTA EMPRESARIAL
Portaria n.º 1.293/2017, do MTb,
que dispõe acerca das condições
que caracterizam o trabalho
análogo a de escravo é, a nosso
ver, genérica, incluindo, como
hipótese desse tipo de trabalho,
a prática de jornada exaustiva,
sem, no entanto, definir
(objetivamente) o que, de fato,
seria uma jornada exaustiva.
Diante desses prejuízos, que
podem ser gravíssimos para
reputação da empresa – o
que, nos dias atuais é muito
valorizada –, é de extrema
importância a adoção de medidas
preventivas e criteriosa cautela
nos procedimentos trabalhistas
que são adotados.
Nesse sentido, inserem-se
como medidas preventivas
a reavaliação periódica das
jornadas de trabalho dos
trabalhadores, realização de
auditorias internas, assegurar
o cumprimento das normas
de saúde e segurança do
trabalho, ministrar cursos/
palestras aos empregados,
avaliar periodicamente o
atual cumprimento da cota de
aprendizes e portadores de
deficiência, entre outras medidas.
Vale ressaltar, sob o aspecto
do alinhamento das práticas
trabalhistas com a lei, que as
fiscalizações caminham para
ocorrer cada vez mais por meios
virtuais, como a utilização de
sistemas como o do FGTS para
verificação de documentos
e, agora em voga, o e-Social.
Essa forma de fiscalização,
denominada como indireta,
facilitará as fiscalizações pelos
auditores e, consequentemente,
implicará autuações às
empresas que eventualmente
descumprirem a legislação.
Mesmo com toda atuação
preventiva e cuidadosa das
empresas, sabe-se que ocorrem
equívocos pelos auditores, ou
até mesmo abusos, motivo
pelo qual também se ressalta
a relevância da utilização dos
meios de defesa nos processos
administrativos (mediante
apresentação de defesa e
recurso), além da possibilidade de
levar as autuações ao Judiciário,
postulando sua nulidade por
meio de Ação Anulatória.
A conclusão é que a até então
chamada extinção do MTb
não importou no fim das
fiscalizações, sendo que as
autuações, em verdade, podem
até mesmo aumentar, diante
do uso de sistemas para acesso
de informações pela Secretaria
do Trabalho, facilitando as
autuações para empresas. ■
13 • Informativo Jurídico
GERAÇÃO DISTRIBUÍDA COMO AGENTE DA TRANSIÇÃO ENERGÉTICA - UMA BREVE ANÁLISE REGULATÓRIA ACERCA DA REVISÃO DAS REGRAS APLICÁVEIS À MICRO E MINIGERAÇÃO DISTRIBUÍDA (GD)
ENERGIA
VALERIA ROSA
TIAGO LOBÃO
14 • Informativo Jurídico
ENERGIA
Para cumprir a as metas
de descarbonização
e mitigação do clima
estabelecidas no Acordo de
Paris, a energia renovável
precisaria, segundo o Global
Energy Transformation, ser
ampliada pelo menos seis vezes
mais rápido em todo o mundo.
Vale lembrar que o histórico
Acordo Climático de 2015 teve
como uma das suas diretrizes
limitar, no mínimo, a elevação
da temperatura global média a
abaixo de 2°C no século atual,
em comparação com os níveis
pré-industriais.
Embora tenhamos diversos
caminhos diferentes que
possibilitam a mitigação
destas mudanças climáticas,
acreditamos que a geração de
energia por fontes renováveis e
a busca por eficiência energética
fornecem o caminho ideal para
a redução da emissão de gases
de efeito estufa na velocidade
necessária.
Sem dúvidas, a chamada
“Transição Energética”, além de
impreterível, é um dos principais
caminhos para a transformação
do setor energético nacional
e global. Exemplo da citada
Transição é a fabricação de
automóveis de passeios 100%
elétricos, além de máquinas e
caminhões com essa mesma
característica, o que mostra que
toda uma cadeia de consumo
precisa e já busca se reinventar
a fim de adequar-se a esta nova
realidade.
Para caminharmos neste
sentido, a nosso ver, a Geração
Distribuída (GD) é de suma
importância vez que diversifica
a matriz energética, ajuda
a minimizar os impactos
ambientais provindos de fontes
não sustentáveis, contribuindo,
de forma bastante relevante,
na tão sonhada mitigação das
alarmantes questões climáticas.
No entanto, para que a GD
alcance seu propósito e continue
crescendo e se difundindo
no Brasil, imprescindível a
promoção da segurança jurídico-
regulatória, primando-se pela
previsibilidade do ponto de
15 • Informativo Jurídico
Informativo Jurídico • 16
vista de quem deseja investir.
Esse binômio, previsibilidade-
segurança, é primordial para
a atração de investidores que
façam esta vantajosa modalidade
de geração de energia se
consolidar no país.
Neste sentido, buscando oferecer
previsibilidade ao mercado e, por
consequência, maior segurança
jurídico-regulatória, é que a
Agência Nacional de Energia
Elétrica - ANEEL instaurou a
Audiência Pública nº 001/2019,
a qual, nesta primeira fase, visa
obter subsídios para a Análise
de Impacto Regulatório – AIR
acerca das possíveis alterações
da Resolução Normativa nº
482/2012, previstas para
ocorrer em 2020.
O foco da Agência Reguladora
neste momento é, principalmente,
o “Sistema de Compensação
de Energia Elétrica” e a forma
de valoração da energia que é
injetada na rede. Justamente
este aspecto coloca de um
lado as Concessionárias de
Distribuição e, do outro, os
investidores e consumidores
interessados em GD.
Contudo, antes de explicitarmos
as seis alternativas para o modelo
do Sistema de Compensação
propostas pela ANEEL e que
constam do Relatório de AIR
supracitado, nos cumpre
consignar algumas premissas
conceituais acerca da Resolução
Normativa nº 482/2012 e o
contexto de sua edição em 2012,
bem como as alterações na
norma implementadas em 2015.
Esta Resolução Normativa, que
estabelece as condições gerais
para o acesso da Microgeração
e Minigeração Distribuída aos
sistemas de distribuição de
energia de elétrica e instituiu
o Sistema de Compensação
supracitado, foi editada com
o objetivo de democratizar
e reduzir as barreiras para
conexão à rede, além de criar
um ambiente em que este tipo
de geração de pequeno porte
pudesse se viabilizar.
O Sistema de Compensação de
Energia, por sua vez, foi criado
visando permitir que a energia
excedente gerada por uma
unidade consumidora com Micro
e Minigeração seja injetada na
rede da distribuidora local para
posteriormente ser utilizada para
abater do seu consumo mensal.
ENERGIA
17 • Informativo Jurídico
Nos casos em que a energia
injetada é superior à energia
consumida em um ciclo de
faturamento, ao final do ciclo,
o consumidor recebe um
crédito em energia (kWh) a ser
utilizado para abater o consumo
nos meses subsequentes, não
sendo permitido, entretanto, a
comercialização do excedente.
O Sistema de Compensação
foi concebido nestes moldes
considerando os custos
elevados para a implantação
de GD objetivando viabilizá-
la. O modelo atual estabelece
que a energia injetada
seja utilizada para abater
integralmente a energia
consumida, contemplando todas
as componentes tarifárias, o que
faz com que a energia injetada
na rede pelo gerador seja
valorada pela tarifa de energia
elétrica estabelecida para os
consumidores.
Em 2015, por meio da Resolução
Normativa nº 687, as regras
atinentes à Micro e Minigeração
Distribuída foram aperfeiçoadas
através da elevação do limite de
potência para estas modalidades
de geração de energia e
da criação dos modelos de
empreendimentos com múltiplas
unidades consumidoras,
instituindo, ainda, a geração
compartilhada e a possibilidade
de autoconsumo remoto.
Não se discute que em razão
de tais mudanças regulatórias
houve um aumento significativo
de interessados na implantação
de GD, entretanto, o mercado
ainda tem muito a evoluir para
afirmarmos que está de fato
consolidado no Brasil.
Também não se pretende negar
aqui a necessidade de equilíbrio
dos interesses entre os diversos
usuários da rede, nem tampouco
a importância da busca por um
modelo que evite a transferência
de custos entre os usuários que
optam por GD aos usuários que
não se utilizam de tal modalidade
para a geração de energia e seu
consumo, entretanto, o tema
deve ser analisado com cautela.
Passemos, pois, às alternativas
de alteração regulatória
colocadas em pauta pela ANEEL.
Como mencionado, o principal
foco das alternativas para a
mudança da regulação vigente é
o “Sistema de Compensação de
Energia Elétrica”, ou seja, a forma
como ocorre a compensação dos
créditos de energia elétrica.
Neste diapasão, o que se discute
é quantos dos seis componentes
tarifários cada kWh produzido
a partir do sistema de Micro
e Minigeração Distribuída, e
injetado na rede elétrica, serão
compensados do consumo.
Para cada uma das Alternativas
foram estimados custos e
benefícios que a GD aportaria
tanto para a compensação local
quanto para a compensação
remota. Não obstante, importa
consignar de plano que, a nosso
ver, tais estimativas não foram
tão precisas quanto deveriam
para a tomada de uma decisão
extremamente relevante quanto
à iminente.
Veja-se no quadro ao lado, de
forma resumida, as Alternativas
submetidas à Audiência Pública:
Informativo Jurídico • 1818 • Informativo Jurídico
19 • Informativo Jurídico
ENERGIAPara a geração junto à carga
(compensação local), a opção mais
cotada pela Agência Reguladora
inicialmente é a “Alternativa 1”.
Diferentemente, para a geração
remota, propõe-se a transição
para a “Alternativa 1” passando-
se, depois, à “Alternativa 3”.
Importa esclarecer que a ANEEL
pretende que tais alterações
aconteçam de forma gradual
e previsível na medida em
que sejam atingidos “gatilhos”
específicos, quantificados pela
potência acumulada (GW).
Para a geração junto à carga, o
gatilho seria o alcance de 3,36
GW, e, para a geração remota,
foram sugeridos dois gatilhos
diferentes: o primeiro para a
“Alternativa 1” quando atingidos
1,25 GW, e o segundo, quando se
chegasse a 2,13 GW, haveria a
mudança da “Alternativa 1” para
a “Alternativa 3”.
É de se ressaltar, outrossim,
que a Agência também
estipulou regras de transição
para tais alterações. Conforme
depreende-se do Relatório de
AIR nº 004/2018-SRD/SCG/SMA/
ANEEL, os consumidores que
instalarem GD até o fim de 2019
continuariam com as regras
atualmente vigentes aplicáveis a
seus empreendimentos durante
um período de 25 anos contados
a partir da conexão, sujeitando-
se, posteriormente, às novas
regras.
Consumidores que instalarem
GD entre 2020, após a entrada
em vigor das novas regras, e
o acionamento dos primeiros
gatilhos, compensariam seus
créditos de acordo com o modelo
atual (“Alternativa 0”) durante os
10 primeiros anos de conexão.
Para os agentes que compõem o
mercado de Micro e Minigeração
Distribuída, as sugestões da
Agência Reguladora prejudicam
o desenvolvimento da GD,
uma vez que implicariam uma
mudança muito radical no atual
Informativo Jurídico • 20
ENERGIAmodelo econômico do negócio,
sugerindo a sua manutenção
(“Alternativa 0”).
Já algumas Distribuidoras de
Energia entendem que há um
incentivo excessivo que acaba
por onerá-las, assim como os
demais consumidores. Opinam,
portanto, que seja adotada
ao menos a “Alternativa 4” e
propõem que a transição para os
consumidores que já instalaram
GD seja baseada no tempo
para o retorno do investimento
(payback) e não no tempo de
vida útil dos equipamentos.
Sem querer invalidar os
estudos e propostas da Agência
Reguladora, observa-se,
contudo, que o grande mote para
a alteração regulatória que está
sendo proposta é a preocupação
com a redução do mercado das
Distribuidoras, o que poderia
ensejar um efeito redistributivo
nos valores das tarifas.
Segundo o aduzido pela ANEEL,
tal efeito não ocorreria caso
houvesse uma redução dos
custos das Distribuidoras na
mesma proporção da redução do
seu mercado, ocasionada pela
redução do consumo da unidade
que instalou GD.
Pondera-se, todavia, que, na
hipótese de esta redução de
consumo ser atribuída como
custo, é razoável que, por
outro lado, se considerem como
benefício as vantagens advindas
da postergação de investimentos
em redes de distribuição e de
transmissão em virtude da GD,
o que ainda não foi considerado
completamente na AIR.
Além deste ponto, apesar dos
muitos cálculos realizados
pela ANEEL e evidenciados no
Relatório multicitado, nota-
se que nem todos os custos
e benefícios afetos à GD, e
que implicarão na alteração
regulatória em comento, foram
mensurados e quantificados,
motivo pelo qual entendemos
que a discussão acerca de todas
as variáveis em torno da questão
carece de amadurecimento antes
de alterar-se o atual modelo.
Observa-se, ainda, que os
estudos realizados até o
momento correlacionam-se
intrinsecamente apenas com
21 • Informativo Jurídico
a geração fotovoltaica, sem
contemplar as peculiaridades
atinentes às demais fontes
renováveis para GD. Deste
modo, vale frisar que cada uma
das fontes possui características
específicas, necessitando de
estudos diferenciados para
a definição de modelagens,
construção de cenários e análise
de sensibilidades às alterações
propostas, a fim de evitar
suposições imprecisas.
Em nossa opinião, a diferenciação
por fonte é vital para o aumento da
segurança energética do Sistema
na medida em que contribuiria
para uma maior sinergia entre as
fontes geradoras, possibilitando
a criação de uma rede com
alto fator de simultaneidade.
Esta distinção é também
necessária haja vista que seus
projetos apresentam tempo de
implantação e investimentos
diversos, o que implica na
conveniência de definir-se
incentivos baseados em prazos e
não por potência, que é a forma
de “gatilho” considerada pela
ANEEL no Relatório de AIR.
Os agentes do mercado de GD
afirmam, ainda, que antes de
qualquer alteração regulatória
há que se fazer cumprir as
regras atualmente vigentes. Isto
porque diversos investidores e
consumidores optantes pela GD
reclamam do descumprimento
de prazos e da falta de
transparência por parte das
Concessionárias de Distribuição
na condução dos processos de
aprovação dos projetos, além de
relatarem erros nos sistemas de
compensação de energia.
Tendo em vista os estudos
até agora realizados, que, a
nosso ver, não contemplam
totalmente a complexidade do
tema, haja vista não abordarem,
por exemplo, temas como o
armazenamento de energia; a
venda de excedentes; a abertura
do mercado; a valoração
de atributos das fontes; a
valorização dos benefícios
socioambientais; dentre outros,
constata-se que uma imediata
alteração regulatória poderá
ocasionar distorções e até
retrocessos.
Se veremos grandes
modificações na RN 482/2012,
ainda não sabemos, mas é certo
que a ANEEL terá, ao final do
período de contribuições, um
árduo trabalho de compilação e
análise dos dados apresentados
na Audiência Pública. E, como é
de praxe na Agência, esta deve
buscar o caminho mais lógico
e correto visando não ceifar
o caminho tão promissor da
Geração Distribuída. Assim, a
GD seguirá contribuindo para
o cumprimento das metas de
descarbonização e mitigação do
clima estabelecidas no Acordo
de Paris. ■
Fontes: AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA – ANEEL. Resolução
Normativa Nº 482, De 17 De Abril De 2012.Estabelece as condições
gerais para o acesso de microgeração e minigeração distribuída aos
sistemas de distribuição de energia elétrica, o sistema de compensação
de energia elétrica, e dá outras providências.
Disponível em: <http://www2.aneel.gov.br/>.
Acesso em: 28 abr. 2019.
IRENA (2018). Global Energy Transformation: A roadmap to 2050.
International Renewable Energy Agency, Abu Dhabi. “Global Energy
Transformation.
Disponível em: <https://www.irena.org/>.
Acesso em: 28 abr. 2019.
AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA – ANEEL. Relatório de
Análise de Impacto Regulatório nº 004/2018-SRD/SCG/SMA/ANEEL.
Disponível em : <http://www.aneel.gov.br/>.
Acesso em: 28 abr. 2019.
AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA – ANEEL. Apresentações
realizadas nas Reuniões Presenciais da 1ª Fase da Audiência Pública nº
001/2019. Disponível em : <(http://www.aneel.gov.br/>.
Acesso em: 28 abr. 2019.
Informativo Jurídico • 22
A necessidade de diálogo entre
todos os atores processuais
trouxe ao legislador pátrio a
preocupação com um modelo
processual cooperativo1, a fim
de regulamentar a atividade
jurisdicional com mais precisão,
sobretudo para evitar situações
em que a decisão monocrática
do Juiz cria um ambiente em
que a violação aos direitos
fundamentais das partes
atropela a marcha processual,
trazendo empecilhos à prestação
jurisdicional2.
Em vigor há poucos anos, o
novo Código de Processo Civil
sobressai por trazer institutos
com grande influência do
princípio da cooperação. Entre
os mais destacados, está a
proibição das chamadas decisões
ALEXANDRA DEL AMORE
RENATA ARAUJO
TRABALHISTA
A análise da proibição das decisões por emboscada
em precedentes da justiça do trabalho
por emboscada ou decisões
surpresa. Diz a letra de lei:
De uma interpretação literal,
vê-se que qualquer decisão a
ser promovida pelo magistrado
deve vir antecedida da análise
e manifestação das partes,
ainda que a matéria posta em
discussão trate de questões de
ordem pública.
O que se pode observar do caput
é a clara preocupação do
legislador em se evitar o
estabelecimento do processo de
exceção, que coloque uma ou
Art. 10. O juiz não pode
decidir, em grau algum de
jurisdição, com base em
fundamento a respeito do
qual não se tenha dado às
partes oportunidade de se
manifestar, ainda que se
trate de matéria sobre a
qual deva decidir de ofício.
(Grifo nosso).
ambas as partes em situação
de total submissão à decisão
unilateral do Estado-Juiz sobre
aspectos processuais e materiais
que deveriam ser postos à
discussão por todos os atores
processuais.
O Processo do Trabalho não
poderia ser diferente. Mesmo em
vista da aplicação subsidiária do
Diploma Processual Civil, temos
que a visão trazida pelo princípio
da cooperação projeta também
para o Processo do Trabalho a
necessidade de concretização de
um modelo mais dialógico.
No intuito de guiar a aplicação,
ao Processo do Trabalho, dos
institutos trazidos pelo novo
CPC, o Tribunal Superior do
Trabalho editou, em 15 de março
de 2016, a Instrução Normativa
nº 39. No que tange à matéria
das decisões por emboscada, a
Instrução destaca que “aplicam-
se ao processo do trabalho as
normas do CPC que regulam o
1- DIDIER, Fredie. Fundamentos do Princípio da Cooperação no Direto Processual Português. Lisboa:
Wolters Kluwer, 2010, p. 47.2- ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Do formalismo no Processo Civil (1997). 2. Ed. São Paulo:
Saraiva, 2003, p. 244 e ss. apud MITIDIERO, Daniel. Colaboração no Processo Civil [livro eletrônico]:
pressupostos sociais, lógicos e éticos. 1. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.
TRABALHISTA
23 • Informativo Jurídico
princípio do contraditório, em
especial os arts. 9º e 10, no
que vedam a decisão surpresa”
(art. 4º). Por sua vez, o conceito
de “decisão surpresa” ou “por
emboscada” é aquele que:
"[...] no julgamento final
do mérito da causa, em
qualquer grau de jurisdição,
aplicar fundamento jurídico
ou embasar-se em fato não
submetido à audiência
prévia de uma ou de ambas
as partes. (art. 4ª, § 1º). "
E a Instrução ainda complementa:
"[...] não se considera
decisão surpresa a que, à luz
do ordenamento jurídico
nacional e dos princípios
que informam o Direito
Processual do Trabalho, as
partes tinham obrigação
de prever, concernente
às condições da ação, aos
pressupostos processuais
de admissibilidade de
recursos e aos pressupostos
processuais, salvo
disposição legal expressa
em contrário. (§ 2º)."É inegável, portanto, a
preocupação em trazer mais
segurança jurídica às relações
processuais trabalhistas, em
especial se considerarmos
que o Processo do Trabalho
preza, especialmente, pela
flexibilização e simplicidade dos
atos processuais, em vista da
proteção à figura do trabalhador.3
Contudo, analisando precedentes
da Justiça do Trabalho, sobretudo
em decisões da primeira
instância, é possível observar
que o modelo cooperativo vem
sendo, em não raras ocasiões,
abandonado pelos Juízes,
colocando as partes (em especial,
as empresas reclamadas) em
situação bastante complicada.
Exemplo disso ocorre nos
casos em que empresas são
incluídas no polo passivo
somente na fase de execução,
sob o fundamento de formação
de grupo econômico (com
responsabilidade solidária pelo
crédito executado), ainda que
a tese não tenha sido ventilada
na fase de conhecimento. Em
muitos precedentes, os Juízes
tomam a decisão com base,
exclusivamente, na alegação
unilateral da parte autora,
sem que se oportunize à parte
contrária prestar esclarecimentos
a respeito da legitimidade (ou
não) para responder pelo crédito
executado.
Aliás, é comum ocorrer a inclusão
de empresa no polo passivo sem
que esta seja sequer citada ou
mesmo notificada previamente
para a efetuar o pagamento,
havendo casos em que se
somente toma conhecimento do
caso após a adoção de medidas
constritivas por parte do Juízo,
como o bloqueio judicial de
valores em contas bancárias, ou
da penhora de bens.
Outra situação típica ocorre
também nos casos em que
empresas em recuperação
judicial estão no polo passivo da
execução. Em que pese o regime
diferenciado estabelecido
pela Lei de Falências (Lei nº
11.101/2005), não é incomum
3- LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito
Processual do Trabalho. 16. ed. São Paulo: LTr, 2018, p. 458.
Informativo Jurídico • 24
que Juízes do Trabalho usurpem
a competência do Juízo da
recuperação judicial e decidam
por prosseguir com a execução
contra a empresa recuperanda,
aplicando-lhe medidas de
constrição patrimonial, ou
mesmo forçando o pagamento
do crédito.
Veja-se que os exemplos citados
expressam total oposição ao
modelo cooperativo preconizado
pelo novo CPC. É certo que,
dada a natureza alimentar do
crédito trabalhista, a adoção de
medidas simplificadas para sua
execução se mostra imperativa,
até mesmo por conta da
hipossuficiência que, em grande
parte das vezes, se assenta na
figura do reclamante. Porém,
isso não significa que o Estado-
Juiz possa se valer de decisões
por emboscada, unicamente
para satisfazer uma execução
que, a princípio, mostrava-se
frustrada. Eis uma das grandes
dificuldades enfrentadas pela
advocacia trabalhista nesta área.
O Processo do Trabalho ainda
caminha por vias incertas quando
TRABALHISTA
a questão é segurança jurídica.
Não por outro motivo, as
mudanças promovidas pela
Lei nº 13.467/2017 (Reforma
Trabalhista) geraram discussões
em todos os segmentos da
sociedade, especialmente por
se mostrar uma reação que, de
fronte, veio do setor empresarial.
A consagração de um processo
trabalhista dialógico depende
da atuação harmônica de todos
os atores processuais. Por outo
lado, um modelo calcado no
protagonismo judicial tende
a criar, inevitavelmente, um
cenário de muitas incertezas. ■
Todos os anos, principalmente
no período de verão, vemos
inúmeras notícias sobre os
estragos deixados pelas
enchentes, com mortes e
prejuízos materiais.
Recentemente, a Grande São
Paulo, nos dia 10 e 11 de
março, bem como a cidade
do Rio de Janeiro, no dia 6
de abril, foram atingidas por
fortes temporais, que causaram
mortes e incalculáveis prejuízos
materiais.
Embora decorrente de fato
da natureza, a ocorrência de
fortes chuvas entre os meses do
verão não se trata mais de caso
fortuito e desconhecido, mas sim
evento absolutamente comum e
previsível.
FILLIPE G. LAMBALOT
THAINA CERVI
PÚBLICO
Da Responsabilidade Civil do Estado por danos
causados por enchentesSendo fato corriqueiro e de
grande impacto à população,
compete ao Estado, como
Administração Pública, adotar
medidas preventivas para
evitar ou ao menos amenizar
a ocorrência dos alagamentos
e enchentes decorrentes das
chuvas e, consequentemente, os
danos causados.
Neste sentido, convém
salientarmos que, nas palavras
de Marçal Justen Filho1, a função
administrativa do Estado é:
"[...] o conjunto de poderes
jurídicos destinados a
promover a satisfação
de interesses essenciais,
relacionados com a
promoção de direitos
fundamentais, cujo
desempenho exige uma
organização estável e
permanente e que se faz
sob o regime jurídico
infralegal e submetido ao
controle jurisdicional."Disso extrai-se que é função do
1- JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 29.
Estado garantir o atendimento
aos direitos básicos da
população, previstos no art. 6º
da Constituição Federal, dentre
os quais o direito à moradia
digna, à saúde e à segurança.
Assim, resta clara a obrigação
do Estado, no cumprimento
de sua função administrativa,
agir preventivamente, a fim de
evitar a ocorrência de enchentes
e alagamentos, seja por meio
da construção de piscinões,
alargamento e desassoreamento
de rios e córregos e outras obras
de contenção das águas, seja
mantendo limpos e adequados
bueiros e galerias pluviais.
Em que pese em regra a
Responsabilidade Civil do
Estado seja objetiva, ou seja,
independente de culpa do
agente, conforme previsto no
art. 37, §6º da Constituição
Federal, no presente caso, por
se tratar de conduta omissiva,
ou seja, proveniente da ausência
de ação esperada do Estado, esta
regra não é aplicável.
Neste sentido, Celso Antonio
Bandeira de Mello2 ensina que:
25 • Informativo Jurídico
PÚBLICO
"Quando o dano foi
possível em decorrência
de uma omissão do Estado
(o serviço não funcionou,
funcionou tardia ou
ineficientemente) é de
aplicar-se a teoria da
responsabilidade subjetiva.
Com efeito, se o Estado não
agiu, não pode logicamente,
ser ele o autor do dano. E,
se não foi o autor, só cabe
responsabilizá-lo caso
esteja obrigado a impedir
o dano. Isto é: só faz
sentido responsabilizá-lo
se descumpriu dever legal
que lhe impunha obstar ao
evento lesivo."
Segue o professor ensinando que3:
"Os acontecimentos
suscetíveis de acarretar
responsabilidade estatal
por omissão ou atuação
insuficiente são os
seguintes:
Fato da natureza a cuja
lesividade o Poder Público
não obstou, embora
devesse fazê-lo. Sirva de
exemplo o alagamento de
casas ou depósitos por
força do empoçamento
de águas pluviais que não
escoaram por omissão do
Poder Público em limpar
bueiros e galerias que lhes
teriam dado vazão [...]. "
Nesta mesma toada, é o
entendimento do Marçal Justen
Filho4:
"Nesse caso, a
responsabilização apenas
surgirá se houver omissão
juridicamente reprovável,
consistente na infração a um
dever de diligência. Assim,
por exemplo, o Estado
pode ser responsabilizado
quanto deixar de limpar
galerias pluviais, daí
derivando inundação das
vias públicas e prejuízos a
terceiros."
Assim, temos que em casos de
enchentes, por ter o Estado o
dever de agir para obstar a sua
ocorrência, seja por meio de
obras públicas ou da simples
Informativo Jurídico • 26
PÚBLICO
limpeza e adequação das
tubulações que escoam as águas
pluviais, ao não as realizar, o
Estado está cometendo ato ilícito
(art. 186 do Código Civil), o que
nos termos do art. 927 do Código
Civil gera o dever de indenizar.
Nesse sentido vem se
posicionando a Jurisprudência
sobre a questão, no sentido de
ser passível a indenização por
danos materiais decorrentes de
inundações e enchentes quando
decorrentes de omissão do
Estado, senão vejamos:
"[...] 4. Em casos de
inundações ou enchentes
a responsabilidade
do Estado consiste na
omissão administrativa na
realização de obras
necessárias à prevenção,
diminuição ou atenuação
dos efeitos decorrentes
das enchentes de águas
públicas, ainda que
verificadas fortes e
contínuas chuvas. 5.
Não se pode cogitar da
existência de força maior
quando, por exemplo,
ocorram inundações na
cidade, previsíveis e
que demandariam obras
de infra-estrutura não
realizadas. 6. Demonstrada
a ocorrência do evento
danoso e do nexo causal
entre o dano e a conduta
omissiva do demandado,
afigura-se inegável a
obrigação de indenizar.
7. A verba compensatória
dos danos morais não se
destina a indenizar o que
não é indenizável, mas a
fornecer meios que possam
contrapesar o sofrimento.
Todavia, assim como não
pode servir como fonte
de enriquecimento ilícito
do ofendido, também
não pode se transformar
em algo inexpressivo
ou insignificante para
o ofensor, a ponto de
compensar a prática de
novas infrações. Sentença
mantida. Agravo retido
não provido. Reexame
necessário, considerado
interposto, não acolhido.
Recurso não provido.
(TJSP; Apelação
Cível 9065166-
84.2004.8.26.0000; Relator
(a): Décio Notarangeli;
Órgão Julgador: 9ª Câmara
de Direito Público; Foro de
Piedade - 1. VARA CIVEL;
Data do Julgamento:
29/06/2011; Data de
Registro: 29/06/2011)"
Assim, conclui-se que serão
indenizáveis os danos
decorrentes de inundações
e enchentes, desde que se
demonstre que o Poder Público
não agiu corretamente para
preveni-las, cabendo aos
prejudicados a demonstração
do efetivo dano em ação a
ser proposta em face do ente
público responsável. ■
2- MELLO, Celso Antonio Bandeira. Curso de Direito Administrativo.
32 Edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2015, p. 1041.
3- Ibidem, p. 1045-1046
4- JUSTEN FILHO, Marçal. Op. cit., 2005, p. 29.
27 • Informativo Jurídico
BIBLIOTECA LTB
• BARCELLONA, Pietro; CAMARDI, Carmelita. Le
istituzioni del diritto privato contemporâneo.
Napoli: Jovene, 2002.
• BRITO, Maria Helena. A representação nos
contratos internacionais. Coimbra: Almedina,
1999.
• LUZZATI, Claudio. Principi e Principi: La
Genericità nel Diritto. Torino: Giappichelli,
2012.
• NOVA, Giogio de. Il sale and Purchase
Agreement: um contratto comentato. 2. ed.
Torino: Giappichelli, 2017.
• OPETIT, Bruno. Droit du commerce
international. Paris: PUF, 1977.
• OSMAN, Filiali. Les principes généraux de la
lex mercatoria. Paris: LGDJ, 1992.
• PIRAINO, Fabrizio. La Buona Fede in Senso
Oggettivo. Torino: Giappichelli, 2015.
• SORIA, Julio González (Coord.). Comentarios a
la nueva ley de arbitraje: ley 60/2003, de 23
de diciembre. 2. ed. Navarra: Aranzadi, 2011.
• TRIMARCHI, Pietro. La Responsabilità Civile:
Atti Illeciti, Rischio, Danno. Milano: Giuffrè,
2017.
• ZWEIGERT, Konrad; KÕTZ, Hein. Introduction
to comparative law. 3rd ed.. Oxford: Clarendon
Press, 1998.
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Informativo Jurídico • 28