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História: Questões & Debates, Curitiba, n. 54, p. 103-124, jan./jun. 2011. Editora UFPR A COMIDA COMO LUGAR DE HISTÓRIA: AS DIMENSÕES DO GOSTO * Food as History: The Dimensions of Taste Carlos Roberto Antunes dos Santos ** RESUMO Sendo a cozinha um microcosmo da sociedade e uma fonte inesgotável de saberes históricos, é importante que algumas das suas produções sejam consideradas como patrimônio gustativo da sociedade. Por tudo que venham a representar do ponto de vista do original e de criativo, que permitem destacar as identidades locais e regionais, certos pratos podem ser considerados como bens culturais, como lugares de memória, como patrimônio imaterial. Uma síntese sobre as cozinhas brasileiras busca explicar influências de culturas alimentares a partir de duas realidades: a autêntica cultura alimentar local e regional, e a cultura alimentar oriunda da civilização externa, influenciadora. Tais contatos e simbioses revelam relações e trocas complexas de diferenças, afirmadas e reafir- madas em fecunda assimilação, que redunda numa certa mestiçagem da comida brasileira. O roteiro de uma viagem pela memória gustativa busca explicar o significado da culinária brasileira, que não se resume aos produtos típicos nacionais. Não custa reafirmar que este universo gastronômico trata de uma culinária complexa e dinâmica, marcada pela adoção de alimentos, técnicas e padrões de consumo que têm como ponto de chegada a expressão dos marcos da diversidade dos hábitos alimentares típicos do Brasil. Palavras-chave: saber culinário; memória gustativa; identidade ali- mentar. * O presente texto compõe partes iniciais do livro que está sendo produzido, intitulado Os sabores da sociedade, que busca explicar os vestígios dos saberes de uma identidade gastronômica brasileira. ** Professor Titular em História do Brasil e Coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas em História e Cultura da Alimentação - UFPR.

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historia da confeitaria e gastronomia brasileira

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  • SANTOS, C. R. A. dos. A comida como lugar de histria: as dimenses do gosto 103

    Histria: Questes & Debates, Curitiba, n. 54, p. 103-124, jan./jun. 2011. Editora UFPR

    A COMIDA COMO LUGAR DE HISTRIA: AS DIMENSES DO GOSTO*

    Food as History: The Dimensions of Taste

    Carlos Roberto Antunes dos Santos**

    RESUMO

    Sendo a cozinha um microcosmo da sociedade e uma fonte inesgotvel de saberes histricos, importante que algumas das suas produes sejam consideradas como patrimnio gustativo da sociedade. Por tudo que venham a representar do ponto de vista do original e de criativo, que permitem destacar as identidades locais e regionais, certos pratos podem ser considerados como bens culturais, como lugares de memria, como patrimnio imaterial. Uma sntese sobre as cozinhas brasileiras busca explicar influncias de culturas alimentares a partir de duas realidades: a autntica cultura alimentar local e regional, e a cultura alimentar oriunda da civilizao externa, influenciadora. Tais contatos e simbioses revelam relaes e trocas complexas de diferenas, afirmadas e reafir-madas em fecunda assimilao, que redunda numa certa mestiagem da comida brasileira. O roteiro de uma viagem pela memria gustativa busca explicar o significado da culinria brasileira, que no se resume aos produtos tpicos nacionais. No custa reafirmar que este universo gastronmico trata de uma culinria complexa e dinmica, marcada pela adoo de alimentos, tcnicas e padres de consumo que tm como ponto de chegada a expresso dos marcos da diversidade dos hbitos alimentares tpicos do Brasil.

    Palavras-chave: saber culinrio; memria gustativa; identidade ali-mentar.

    * O presente texto compe partes iniciais do livro que est sendo produzido, intitulado Os sabores da sociedade, que busca explicar os vestgios dos saberes de uma identidade gastronmica brasileira.

    ** Professor Titular em Histria do Brasil e Coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Histria e Cultura da Alimentao - UFPR.

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    ABSTRACT

    Being the cuisine a microcosm of society and an inexhaustible source of historical knowledge, it is important that some of their productions are regarded as gustatory heritage of society. Certain dishes can be re-garded as cultural assets, as intangible heritage, for all that they should represent, from the point of view of the originality and creativity, which highlight the local and regional identities. A summary of the Brazilian cuisine seeks to explain the influence of food cultures from two different realities: the authentic local and regional food culture, and the food culture that originated from external and influential civilization. Such contacts and symbioses reveal complex relationships and exchanges of differences, affirmed and reaffirmed in fruitful assimilation, which results in a certain hybridization of Brazilian food. The itinerary of a trip down the gustatory memory seeks to explain the meaning of the Brazilian cuisine, which is not limited to typical national products. It is important to restate that this gastronomic universe is a complex and dynamic cuisine, marked by the adoption of foods, techniques and patterns of consumption which has as its starting point the expression of the advents of the diversity of typical Brazilian food habits.

    Key-words: culinary knowledge; gustatory memory; food identity.

    Histria, saber gastronmico e sentido do gosto

    Era uma pura magia o sabor da sua comida. Um perfume com aro-ma se espalhava pela casa, e tinha o sentido da comida da alma. O objeto da minha paixo: carne assada na panela de ferro com molho ferrugem. Esta preciosidade mgica era produzida por uma senhora que trabalhava em minha casa havia um ms. E sempre na hora do almoo esta sabedoria culinria era posta mesa, diversificando os pratos, mas produzindo todos com a maior maestria. At que um belo dia resolvi sugerir-lhe um novo prato contido num livro de receitas, portanto fora da comida trivial. O pra-to no veio e ao indagar-lhe recebi uma resposta nua e crua: Seu Carlos, eu no sei cozinhar pela letra. Na verdade, no pouco tempo de convvio desconhecia que aquela senhora era analfabeta. Entretanto, o seu talento na arte de cozinhar era extraordinrio, com um saber no convencional, mas com um refinamento prprio do qual emitia perfume e aroma inebriante.

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    Outros exemplos de histria de vida, ainda que resumidos, podem ser citados. Eclea Bosi1, em seu trabalho sobre o significado da memria em lembranas de velhos, transcreve o relato de D. Risoleta, escrava anal-fabeta, que foi criada no servio domstico, se considerava cozinheira de forno e fogo e dominava os afazeres culinrios, observando e aprendendo aquilo que era feito. Em sua dissertao, Dbora Santos de Souza Oliveira2 relata as proezas da paraibana Silvina Celina Pereira, no incio do sc. XX, uma mulher pobre, onde so revelados os fragmentos de um modo de vida cuja relao com um habilidoso trabalho culinrio, bastante reconhecido, permitiu que sustentasse toda a sua famlia.

    Nas narrativas de tais histrias de vida, identifica-se um trao co-mum: o trabalho no formal na produo de comida de sabor e qualidade, onde um saber no convencional expressou conhecimentos acumulados com a arte culinria, at porque, segundo J. P. Ferro, os livros de culinrias con-tam sempre o que se podia comer, mas no o que efetivamente se comia3.

    Cumpre destacar que, de maneira geral, no mbito da sociedade brasileira, h algumas dcadas atrs, o trabalho na cozinha era desvalori-zado e mal visto e o ofcio de cozinheira no era reconhecido. Da emerge uma questo: por que, nos dias atuais, os trabalhos de cozinha e da mesa passam a ser atividades de fino trato, proliferando cada vez mais cursos de gastronomia no pas? Esta e outras questes da emergentes tm sido agora estudadas no mbito da Histria e da Cultura da Alimentao.

    Os estudos que tm como objeto temas relacionados com a ali-mentao em perspectiva histrica buscam entender e explicar uma fase da negao ao novo, qual seja, do pouco interesse e mesmo de depreciao da temtica da cozinha, at a compreenso atual da sua magnitude e o lugar que ocupa hoje no mbito da Histria, das Cincias Humanas e dos mais diversos ramos do conhecimento, tendo como expresso os marcos da interdisciplinaridade. Nesse sentido, o Grupo de Estudos e Pesquisas em Histria e Cultura da Alimentao, vinculado ao DEHIS/UFPR, alm de manter h cinco anos o site www.historiadaalimentacao.ufpr.br, de repercus-

    1 BOSI, Eclea. Memria e sociedade: lembranas de velhos. So Paulo: Cia das Letras, 2007, p. 390.

    2 OLIVEIRA, D. S. de S. A transmisso do conhecimento culinrio do Brasil urbano do sculo XX. Dissertao (Mestrado em Histria) - Universidade de So Paulo, p. 16. So Paulo, 2010.

    3 FERRO, Joo P. Arqueologia dos hbitos alimentares. Lisboa: Publicaes Dom Quixote, 1996, p. 11.

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    so nacional e internacional, vem albergando diversas teses, dissertaes, monografias e trabalhos de concluso de curso (TCCs), alguns j defen-didos e aprovados, outros em fases de concluso e em desenvolvimento, revelando um importante patrimnio acadmico. O Inventrio composto de: uma tese de concurso para Professor Titular, vinte e duas monografias e TCCs, treze dissertaes, dez teses, todos j defendidos e aprovados, e duas coorientaes de Ps-Graduao (Frana e Israel). Cumpre destacar que alguns ttulos j se transformaram em livros. Ainda em desenvolvimento temos dois Mestrados, quatro Doutorados, quatro Monografias e dois TCCs.

    A temtica desenvolvida trata de diversos objetos da Histria e Cultura da Alimentao, como: Alimentar o Paran Provncia; Hbitos alimentares e cadernos de receitas; A memria da cidade atravs dos bares e restaurantes de Curitiba; a Padaria Amrica e o po das geraes curiti-banas; A arte de receber: distino e poder boa mesa; Do cru ao assado: a festa do boi no rolete de Marechal Cndido Rondon; Do gosto e do afeto: comida de imigrantes em Curitiba; Do privado ao pblico: o universo do Restaurante Bolonha; O Brasil mesa: histria, literatura e sensibilidade gastronmica; Alimentao e sade em Curitiba: o desequilbrio diettico e a obesidade infantil; A alimentao infantil e o marketing da indstria de alimentos; Das casas de pasto aos restaurantes: os sabores da velha Curitiba; Diga-me o que comes que te direi quem s: alemes, comida e identidade; Da cozinha clssica nouvelle cuisine; Cozinhando a tradio: o Barreado e a festa gastronmica; Bar Palcio: gastronomia, intelectualidade e boemia em Curitiba; O sentido histrico e tcnico dos rtulos das embalagens de erva-mate no Paran; A culinria judaica e a memria de um povo: a pscoa judaica em Curitiba; A polenta como expresso popular da cultura italiana; Comida e arte: a formao do chef de cozinha em Curitiba; A criminalizao da carne; O Armazm Santa Ana: um patrimnio curitibano; O desenvol-vimento tecnolgico e as mudanas das prticas alimentares; Tudo pronto: o comer fora e o prazer reinventado; As aventuras do gosto: O restaurante Al Manzul como expresso da comida rabe; Histria de vida, comida e cultura: a caa e a pesca numa famlia de descendentes italianos; Comida de So Joo: a culinria junina curitibana; Os cadernos de D. Benta: uma padronizao da culinria brasileira; A culinria japonesa: um sculo de preservao; O lado doce da vida: o pioneirismo da Confeitaria das Famlias; A comida de santo na cozinha dos homens; Cada comida no seu tacho: a

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    mineiridade e o paranismo mesa; O ser vegetariano no universo da carne; O projeto da Escola Municipal So Luiz: deliciosas lembranas das avs e seus cadernos de receitas; Comida, beleza e sade na histria: as mudanas nos hbitos alimentares no Brasil (1950/2000); Estmago, o filme: uma anlise projetando a comida como prato principal para o cinema; A histria da sobremesa na Frana; As dietas e o universo do no comer; Os prazeres da gula: cadernos de receitas como fontes histricas; A geopoltica do paladar brasileiro em Cmara Cascudo; A formao do corpo: representaes sociais sobre corpo e alimentao no Brasil (1960/70); Hospitalidade em Curitiba: a mesa ainda est posta? Champagne e histria: as borbulhas da civilizao; A indstria do gosto e os novos hbitos alimentares no Brasil (1970- 2000); Acar: histria, civilizao e cultura; As feirinhas noturnas em Curitiba como espaos de sociabilidade e de retomada da memria gustativa; O pastel de Rodoviria: comida e identidade; Feijo e arroz: os sabores da integrao latino-americana; Aromas e paladares da Curitiba rural; O bolo de Santo Antnio: tradio e festa; Histria e nutrio: o po da Famlia Farinha e a inovao; A polenta como forma de expresso da cultura popular italiana em Curitiba (1940/2006); Memria, educao e histria: o cotidiano alimentar de alunos das escolas pblicas de Ponta Grossa (1900/1950); A indstria do gosto e os novos hbitos alimentares no Brasil (1960-2000); Pinho indgena: a culinria do Paran; Os dois lados do balco: a Sociedade das Bodegas em Irati/PR no incio do sc. XX; Uma releitura de Guaraqueaba mar e mato luz da Histria e Cultura da Alimentao.

    As cozinhas esto em permanentes transformaes. As culturas alimentares, sejam quais forem os tempos e espaos, esto postas em si-tuaes de confrontos que podem levar a certas rupturas, diante da imple-mentao de novas tcnicas, de novas formas de consumo, da introduo de novos produtos e do encontro e fuso dos mesmos, a partir da inovao e da criatividade. Estas novas transformaes da cozinha acabam sendo absorvidas ou digeridas pela tradio, que em patamares seguintes cria novos modelos, adaptados aos modelos convencionais precedentes. Nesse sentido, a ruptura ao provocar certa revoluo culinria traz em seu bojo os traos de novo modelo de transio, ainda que marcados pelo convencional e pelo tradicional.

    As cozinhas locais, regionais, nacionais e internacionais so pro-dutos da miscigenao cultural, fazendo com que as culinrias revelem

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    vestgios das trocas culturais. Hoje, os estudos sobre a comida e a alimen-tao invadem as cincias humanas, a partir da premissa que a formao do gosto alimentar no se d, exclusivamente, pelo seu aspecto nutricional, biolgico. O alimento constitui uma categoria histrica, pois os padres de permanncia e mudanas dos hbitos e prticas alimentares tm refern-cias na prpria dinmica social. Os alimentos no so somente alimentos. Alimentar-se um ato nutricional, comer um ato social, pois se constitui de atitudes, ligadas aos usos, costumes, protocolos, condutas e situaes. Nenhum alimento que entra em nossas bocas neutro. A historicidade da sensibilidade gastronmica explica e explicada pelas manifestaes cultu-rais e sociais, como espelho de uma poca e que marcaram uma poca. Desta forma, uma comunidade pode manifestar na comida emoes, sistemas de pertinncias, significados, relaes sociais e sua identidade coletiva. Se a comida uma forma de comunicao, assim como a fala, ela pode contar histrias e pode se constituir como narrativa da memria social de uma comunidade. Nesse sentido, o que se come to importante quanto quando se come, onde se come, como se come e com quem se come. Enfim, este lugar da alimentao na Histria.

    Foi com Braudel4, herdeiro de Febvre e Bloch, por meio dos con-ceitos de cultura material, que a Histria da Alimentao ganhou fisionomia definitiva no campo da pesquisa histrica. Inspirado nos textos de Lucien Febvre sobre a distribuio regional das gorduras e nos fundos de cozinha, Braudel, como o maior representante da segunda gerao dos Annales, trabalhou em suas obras o conceito de cultura material, abrangendo os aspectos mais imediatos da sobrevivncia humana: a comida, a habitao e o vesturio. Para Fischler, as vestimentas e os cosmticos esto apenas em contato com o nosso corpo; j os alimentos rompem a barreira oral, se introduzem em nossos corpos e se tornam nossas substncias ntimas5.

    No incio dos anos 70, o lanamento de uma coletnea, Faire de lhistoire, traduzida no Brasil como Histria: novos problemas, novas abordagens, novos objetos, trouxe tona novos paradigmas da Histria. Na apresentao desta coletnea, seus organizadores, Jacques Le Goff e

    4 BRAUDEL F. Les structures du quotidien. In: Civilization matrielle, economie et capi-talisme. Paris: ArmandColin, 1979.

    5 FISCHLER, C. LHomnivore. Paris: ditions Odile Jacob, 1993, p. 9.

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    Pierre Nora6, reivindicavam para a Nova Histria a coexistncia de vrios tipos de histria igualmente vlidos, e defendiam o fatiamento da histria, mais tarde denominada de micro-histria, em contraposio a uma histria absoluta do passado. A partir da, historiadores como Jean Paul Aron7, Jean Louis Flandrin8 e Flandrin e Montanari9 deslocaram o foco da histria em migalhas para o comer e para aquele que come. Atravs destes novos pa-radigmas, o ensinamento dos Annales era para que a comida fosse levada a srio pelos historiadores.

    A histria oferece nos domnios da alimentao uma contribuio fundamental das perspectivas sobre o futuro. Os estudos de longa durao entre o meio e a sociedade, tendo o passado como espelho, contribuem de maneira substancial para propor os elementos e as respostas aos problemas contemporneos que envolvem a alimentao. Indispensvel a uma melhor compreenso do presente, a histria mostra em quais termos so propostas ao longo do tempo, no Brasil e pelo mundo todo as questes relacionadas, como aquelas da subsistncia e da sade, da segurana e dos medos, das proibies, dos gostos, das preferncias e das sensibilidades alimentares.

    Desta forma, a Histria e Cultura da Alimentao, liderada por Aron e Flandrin, enveredou pela temtica da vida material e das mentalidades, da interdisciplinaridade e dos estudos transculturais, que tem permitido a reconstruo de quadros contextuais capazes de dar luzes aos movimentos das histrias locais, regionais, nacionais e internacionais da cozinha e do gosto, enfim, tornando-se grandes fontes do saber histrico.

    Sendo a cozinha um microcosmo da sociedade e uma fonte ines-gotvel de histria, importante que algumas das suas produes sejam consideradas como patrimnio gustativo da sociedade.

    Os temas das cozinhas e das mesas local, regional e nacional re-velam os tempos da memria gustativa, e tm suas origens numa riqueza tnica e cultural que inventou uma mesa ampla, com pratos produzidos pelos povos locais ou trazidos por diversos migrantes e imigrantes, num

    6 LE GOFF, J.; NORA, P. Histria, novos objetos. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1974. LE GOFF, J.; NORA, P. Histria, novos problemas. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1974. LE GOFF, J.; NORA, P. Histria, novas abordagens. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1974.

    7 ARON, J. P. Le mangeur du XIXe. sicle. Paris: Denol/Gonthier, Roberto Lafont, 1973.8 FLANDRIN, J. L. Chronique de platine: pour une gastronomie historique. Paris: ditions

    Odile Jacob, 1992. 9 FLANDRIN, J. L.; MONTANARI, M. Histria da alimentao. So Paulo: Estao

    Liberdade, 1998.

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    processo permanente de adaptao e readaptao dentro das dinmicas dos processos histricos. Cumpre destacar e considerar que, num processo de adaptao e readaptao de um grupo social imigrante, a culinria a ltima a se desnacionalizar, num evidente processo de resistncia. Nesse sentido, as construes destas cozinhas, a partir da fundamentao de que o alimen-to constitui uma categoria histrica, so marcadas pelas novas condies materiais, novos utenslios, novas tecnologias, novos ingredientes, novos alimentos, novos caminhos, novas rotas de abastecimento, novos mercados, novos hbitos alimentares, novos imaginrios, e muita inveno e criativi-dade, adaptados s circunstncias do gosto e das prticas alimentares, onde histria, comida e identidade criam e mantm uma articulao permanente.

    Os estudos de Histria e Cultura da Alimentao tratam da dinmica de uma Santa Aliana composta pela trade memria, tradio e identidade, fazendo com que a comida seja constitutiva da identidade de um grupo, que se mantm viva nas tradies e na memria. Nesse sentido, a alimentao considerada como patrimnio histrico gustativo de uma cultura.

    Na cozinha, prevalece a arte de elaborar os alimentos e de lhes dar sabor e sentido. Na obra A distino, Bourdieu analisa aquilo que denominamos de gosto com relao a vrias expresses culturais como a arte, a msica, o vesturio e a comida e considera que todas so modeladas socialmente10. H na cozinha a intimidade familiar, os investimentos afe-tivos, simblicos, estticos, sociais e econmicos. A cozinha se reafirma, portanto, como um espelho da sociedade, um microcosmo da sociedade, uma imagem da sociedade. Em vez de falar em cozinha, melhor falar em cozinhas, em suas pluralidades, porque elas mudam e se transformam face s influncias e aos intercmbios entre as populaes, aos novos produtos e alimentos, graas s condies sociais, s circulaes de mercadorias e aos novos hbitos e prticas alimentares.

    Do exposto, verifica-se que, no cruzamento do biolgico com o histrico e cultural, do social e do poltico, da economia e das tecnologias, a questo da alimentao se situa no corao das nossas preocupaes, como um gnero de fronteira, como uma integrao federativa de carter transdis-ciplinar, de onde emergem os marcos que permitem fazer por intermdio da comida uma reflexo sobre o prprio significado e evoluo da sociedade.

    10 BOURDIEU, P. A distino: crtica social do julgamento. So Paulo: EDUSP, 2008.

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    A anatomia dos cadernos de receitas

    As mltiplas condies postas pelas relaes da Histria com diversas outras reas do conhecimento condicionam as naturezas das mil comidas que impem o modo de vida material e cultural de um povo. A partir desta premissa, captada na antologia gastronmica expressa e trans-mitida pelos cadernos e livros de receitas, traamos uma fascinante viagem por infinitos ingredientes, temperos, aromas, cores e sabores, festas e alegrias em tempos de abundncia e escassez, mitos e tabus, iguarias como obras de arte, todas assentadas na diversidade material e cultural de uma determinada sociedade. De profundo significado histrico, antropolgico e sociolgico, os cadernos de receitas revelam no somente o nvel da civilizao material e imaterial, bem como a arquitetura expressa nas hierarquias sociais atravs dos hbitos alimentares, sua evoluo e requinte.

    Sendo a cozinha um microcosmo da sociedade e uma fonte ines-gotvel de histria, importante que algumas das suas produes sejam consideradas como patrimnio gustativo da sociedade. Por tudo que os cadernos de receitas venham a representar do ponto de vista do original e de criativo, que permitem destacar as identidades locais e regionais, podem ser considerados como bens culturais. Tais preceitos esto presentes nas receitas, revelando conotaes simblicas, sociais, polticas e culturais que se integram num elaborado sistema de representao. Estas fontes, segun-do Laurioux, so testemunhos de uma sociedade ou de um determinado segmento social, numa poca especfica11.

    Os significados histricos, antropolgicos e sociolgicos da comi-da presentes nos cadernos de receitas permitem abordar um universo sob mltiplos olhares, podendo trazer luzes sobre a produo de alimentos, a evoluo dos preos, as polticas de importao e exportao de ingredien-tes, as mudanas no gosto, bem como as relaes de classes e de gnero envolvidas na criao ou consumo de determinados pratos.

    A captao dos traos da dinmica composta pela trade memria, tradio e identidade, permite fazer com que a alimentao seja constitutiva

    11 LAURIOUX, B. Cozinhas medievais, sculos XIV e XV. In: FLANDRIN, J. L.; MON-TANARI, M. Histria da alimentao, 3. ed. So Paulo: Estao Liberdade, 1998, p. 447-465.

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    da identidade de um grupo, que se mantm viva nas tradies e na memria. Nesse sentido, a conexo dos ingredientes presentes nas receitas expressa a alimentao como patrimnio histrico gustativo de uma cultura, assen-tada numa narrativa fortemente comunicativa, sem requintes, e como arte, descompromissada de normas.

    Desta forma, to importante quanto conhecer as formas de trans-misso de um saber culinrio buscar compreender como se origina este tipo de conhecimento, que posteriormente ser resguardado e repassado para as geraes futuras. O momento da criao culinria parece assumir um carter de criao artstica, mesmo que o cozinheiro no se d conta. Da talvez a coerncia da expresso arte culinria, funo esta que pode ser desempenhada por qualquer pessoa que detenha mnimos conhecimentos sobre as tcnicas culinrias, com a assertiva de que todos podem cozinhar.

    No Brasil, historicamente, cultivou-se a diversidade alimentar, numa sntese entre as culturas primitivas com a superposio de etnias das diferentes culturas, que, numa simbiose, formaram nossos hbitos alimentares e constituram uma rica culinria. Num momento em que a gastronomia dita moda, a sociedade busca, cada vez mais, resgatar e valo-rizar os cadernos de receitas, em nome da qualidade das cozinhas locais e regionais, carregadas de culturas. Face s diversas particularidades nacio-nais, as sociedades transnacionais de alimentao buscam estratgias para adaptar-se aos gostos locais, eivados de pratos rsticos e naturais. Desta forma, o local e o regional precedem o nacional e o internacional, fazendo com que a gastronomia, mesmo diante da globalizao do gosto alimentar, revele a resistncia de identidades especficas.

    Na cozinha revelada e descortinada pelos cadernos e livros de recei-tas, prevalece a arte de elaborar a comida e de lhes dar sabor e sentido. Tais fontes desvendam uma dimenso do tempo no exclusivamente cronolgico da produo de um prato, mas o tempo lento ou rpido do gesto para misturar ingredientes, que constitui algo prprio e pessoal, de intimidade familiar, de investimentos afetivos, simblicos e estticos. Na cozinha, despontam as relaes de gnero, de gerao, a distribuio das atividades que traduzem uma relao de mundo, um espao rico em relaes sociais, fazendo com que a mesa se constitua, efetivamente, num ritual de comensalidade.

    Os cadernos de receitas ou de culinria, revelam interaes sociais com base na oralidade e na escrita, pois sabemos que foi a partir da trans-

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    crio de diferentes sistemas e tradies culinrias que muitas sociedades desenvolveram uma escrita e uma literatura, e at mesmo um gosto pela leitura12. Enquanto variedade de literatura oral, as tcnicas de preparao da comida esto sujeitas aos mesmos fenmenos inerentes a esta literatura: esquecimento, mal-entendidos, improvisao, impreciso, simplificao, mistura de elementos pertencentes a diversas receitas. A partir desta com-plexidade que se constri um saber culinrio e que, muitas vezes, acaba por consolidar um certo padro alimentar.

    A leitura que as narrativas postas nos cadernos concede, permite identificar a comida como festa, comemorao, encontros, prazer, alegria e, principalmente, como patrimnio imaterial. No Brasil, os alimentos da terra se destacam nestas vocaes nostlgicas, que parecem louv-los como deuses das experincias gustativas. A perfilam as festas nacionais e regionais, os sabores do carnaval, as tradies da Semana Santa com suas abstinncias alimentares, a comida com sentido de fraternidade do Natal e de prosperidade futura do rveillon, a comida dos ancestrais, as comidas dos orixs, o sincretismo religioso e o ritual com toda a sua nobreza, como um patrimnio gastronmico.

    Ao se folhear e utilizar as receitas, numa verdadeira viagem pela boca, pela mestiagem dos pratos, com olhares para os estados do cru, assado, cozido, podre, do salgado e doce, do quente e frio, das medidas, das abundncias e carncias, do tempo de cozimento e da diversificao dos utenslios, no h demarcaes de fronteiras e territrios. Na verdade, se h limites neste panorama eles esto postos numa verdadeira fantasia antropofgica do prazer de produzir e comer uma obra de arte, numa gula indiscriminada e ecltica. Assim, as receitas culinrias permitem o conhe-cimento do cotidiano atravs de prticas culturais, que, de acordo com Certeau, revelam as maneiras de fazer o cotidiano13.

    A anlise das receitas permite ingressar no universo criativo da culinria, bem como sentir o gosto e o sentimento que da emanam. Nesse sentido, o conjunto de informaes aportadas por esta fonte revelam a seleo, o preparo, o consumo de determinados alimentos, e a criao e estrutura de certos pratos, que so produtos das escolhas e preferncias.

    12 ABRAHO, F. A. et al. (Org.). Delcias das sinhs: histria e receitas culinrias da segunda metade do sc. XIX e incio do sculo XX. Campinas: CMU-UNICAMP, Arte Escrita, 2007, p. 17.

    13 CERTEAU, M. A inveno do cotidiano. Petrpolis: Vozes, 2001.

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    Das receitas testadas e aprovadas, muitas vezes, tem-se o registro apenas dos ingredientes, sem a forma de preparo. Tal constatao leva percepo que quanto mais antiga a receita, menos detalhado o modo de sua execuo, indicando a preocupao do autor com a posse da mesma, da manuteno da sua originalidade, o que acaba diminuindo a chance de que outros possam chegar ao resultado final desejado. E, para tanto, diversos fatores podem influenciar: a qualidade do produtos, a quantidade de ingre-dientes, os pesos, as medidas, o tempo de cozimento, o grau da temperatura, as misturas e inclusive o imediato servir do prato mesa, para que seu gosto no seja alterado. Desta forma, os pratos doces e salgados no seguem os mesmos imperativos, os mesmos passos, pois, no que se refere aos doces, parece ser fundamental que sejam seguidos os passos exatos para o seu preparo, sob pena de estragar a receita, exigindo um detalhamento de pe-sos e medidas para seu sucesso14. J para os salgados, o detalhamento da preciso no seguido a rigor, pois a quantificao dos pesos e medidas mais camuflada. Deste rico universo da preciso, a impreciso uma pr-tica, como nos pesos e medidas: uma pitada, uma beirada, um prato fundo acima da beirada, um prato raso, uma colher de ch, uma conchinha, uma colher de sopa rasa, um pires, uma xcara mal cheia, um bocado, um copo, sal a gosto, e tantos outros, fazem das receitas um universo da criao, da liberdade da improvisao, do preparo e do gosto.

    O exposto acima em termos da liberdade no detalhamento de um prato de doce ou salgado, leva ao encontro de novos sabores e gostos, de novas invenes. Esta desobedincia essncia da receita original, provoca a atribuio de ttulos diferentes a pratos sem grandes alteraes no modo de preparar. Desta forma, tais receitas que resistem ao longo das geraes, so consagradas pelas tradies enquanto outras, simplesmente desaparecem, numa demonstrao de que a cozinha no apenas espao das criaes e repeties, mas tambm de perdas e destruies.

    No Brasil, os cadernos de culinrias, ao longo da segunda metade do sculo XIX at os anos 70 do sculo XX, foram dirigidos especialmente para as mulheres, consideradas as rainhas do lar. Durante este perodo, era comum a passagem dos cadernos de mes para filhas, numa espcie de

    14 GOMES, L. G.; BARBOSA, L. Culinria de papel. Estudos Histricos: Alimentao. Rio de Janeiro: CEPEDOC de Histria Contempornea do Brasil, FGV, n. 33, p. 6, jan.-jun. 2004.

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    maonaria das mulheres, segundo Gilberto Freyre. Esta forma de passagem das receitas revela a ideia de pertencimento a um grupo de iguais para o repasse de um conhecimento que a princpio no estaria acessvel maioria. Esta arquitetura das receitas implica em considerar a casa como um espao de produo e criao dos pratos e at mesmo das matrias-primas, como o macarro, o po e tantos outros alimentos que eram produzidos no mbito domstico.

    Cumpre ainda destacar que, a partir da segunda metade do sculo XX, o espao da cozinha foi incorporando aos poucos os alimentos industria-lizados, praticamente prontos, as inovaes tecnolgicas que a mecanizao provocou, tanto em termos de utenslios, como os novos foges, geladeiras, freezers, panelas de presso, fornos micro-ondas e eletrodomsticos, tudo na busca de mais conforto, da racionalidade e praticidade. Desta forma, o ritmo ditado por uma nova sociedade do trabalho e que afetou a estrutura familiar, pois em nome da sobrevivncia subsistncia fez com que as mu-lheres pudessem tambm ir luta, permitiu a criao de novos ambientes no mbito da cozinha e da mesa, acalentando outros sonhos de consumo, o que implicou em mudanas nos hbitos alimentares. Portanto, embalada pelo boom da gastronomia e como testemunhas dos processos de mudanas, a elaborao das receitas comprova tais inovaes, numa demonstrao daqui-lo que permanece e daquilo que muda, a partir dos limites da resistncia de uma cozinha convencional e de tradio impregnada da memria gustativa, passando pela nouvelle cuisine e pela cozinha fuso, at o seu mais recente estgio expresso na cozinha molecular, uma concepo do espanhol Ferran Adri, considerado o melhor cozinheiro do mundo. Neste ltimo estgio, numa nova anatomia da cozinha, desaparecem as fronteiras entre o quente e o frio, o salgado, o doce e o amargo, o cru, o cozido, o assado e o podre, sempre na busca de novas segmentaes gastronmicas, onde em nome do prazer, da volpia e dos pecados da gula a busca do bom gosto revela que o cu o limite.

    Do exposto, cabe aos historiadores tomar conscincia de que ali-mentao um fenmeno social total, e que vai alm de certos aspectos que permeiam as abstratas relaes econmicas, sociais e polticas. Ao introduzir novas perspectivas de anlise, a alimentao traz no seu bojo o carter interdisciplinar levando em considerao as mltiplas e comunicantes perspectivas que a configuram. Nesse sentido atuam os cadernos e livros

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    de receitas, cujo acervo transmitido atravs de geraes revela dados sobre a prtica e hbitos alimentares de determinado grupo e da forma como se efetivam as relaes sociais.

    Uma grande parte do saber gastronmico ocidental, que se consti-tuiu como patrimnio do sentido do gosto, foi revelado em diversos cadernos e livros de receitas, sendo que, dentre tantos, podemos destacar alguns: De re coquinaria (da cozinha), considerado o principal livro de receitas da cozinha romana, obra escrita por Apicius, conselheiro do Imperador Nero; Le Viandier, obra escrita no final da Idade Mdia pelo chef de cozinha Guillaume Trel, cognominado de Taillevent; O manual dos anfitries, de autoria de Grimod de La Reynire, publicado em 1808, considerado o pai da crtica gastronmica, fazendo da Gastronomia uma nova disciplina; A fisiologia do gosto, obra de referncia para o estudo da Histria e Cultura da Alimentao, de autoria de Brillat-Savarin e produzida em 1825, mais do que um livro de receitas, um livro de Gastronomia; Le Ptissier Royal, obra de Marc Antoine Carme escrita em 1815, que criou o prestgio da cozinha francesa; Um simples livro de culinria para as classes trabalha-doras, obra de Charles Elm Francatelli, publicada em 1852, em plena era vitoriana e escrita para uma determinada classe social, a dos pobres ingleses; O cozinheiro imperial: a presente obra constituiu o primeiro livro conhecido de culinria do Brasil, editado em 1840, sendo que o autor se apresenta apenas pelas iniciais do nome: R.C.M.; O cozinheiro nacional, obra editada em 1875 no Brasil, com um tom nacionalista e republicano, mesmo em pleno perodo de reinado de D. Pedro II; A arte de comer bem, de autoria de Rosa Maria, obra esta editada em 1933 e que simboliza a vida domstica e a rotina culinria no Brasil; Comer bem: 1001 receitas de bons pratos, de Dona Benta. Obra em conjunto editada em 1948, ainda que seus primeiros livros datem de 1940, de autoria de Monteiro Lobato; Comer fez o homem: receitas afrodisacas, trabalho editado pelo chef Allan Vila Espejo, editado em So Paulo pela Editora Melhoramentos, em 2006; Escoffianas brasileiras, obra de autoria do chef e cozinheiro Alex Atala e que constitui o encontro de dois grandes artesos: Heitor Villa-Lobos com suas Bachianas Brasileiras em juno com a critividade do chef francs Auguste Escoffier; El Bulli, as receitas do chef catalo Ferran Adri, constituem o que existe de mais recente na Gastronomia, com a concepo da cozinha molecular.

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    A culinria brasileira: um patrimnio imaterial

    No Brasil Colonial, o livro da Profa. Paula Pinto e Silva, Farinha, feijo e carne-seca: um trip culinrio no Brasil Colonial15 demonstra, a partir do seu prprio ttulo e de suas pesquisas, a importncia destes que constituram os alimentos essenciais, as bases da alimentao da maioria da populao. Durante a ocupao holandesa, as plantas brasileiras eram reconhecidas como o bem mais precioso da Colnia, como fontes de boa sade fsica e at mesmo de longevidade de vida. Portanto, a poca colonial brasileira pode ser includa entre as sociedades que no fazem clara distino entre alimento e remdio, como o lcool, acar, ch, caf, coca, mate e chocolate. Podemos incluir a as drogas, que tm importncia tanto quanto as plantas alimentcias, como tratado na obra organizada por Henrique Carneiro e Renato Pinto Venncio16 sobre lcool e drogas na Histria do Brasil. No mbito da Histria do Brasil importante citar, dentre outras, as obras de grande densidade interpretativa como as de Cmara Cascudo, Histria da alimentao no Brasil17, de Gilberto Freyre, Acar18, e de Srgio Buarque de Holanda, Caminhos e fronteiras19, que evidenciaram, alm das riquezas, tradies e inovaes da culinria brasileira, tambm as dificuldades de acesso aos alimentos como forma de superar as carncias nutricionais do pas.

    No Brasil, uma parte da historiografia produz e publica pesquisas desenvolvidas a respeito da Histria da Alimentao de forma bastante pon-tual ou inseridas num contexto mais amplo de abordagem. Gilberto Freyre foi o primeiro autor a mostrar maior preocupao com o tema, inovando o uso de fontes e na interpretao dessas, buscando dar uma identidade na-cional a partir da civilizao do acar no Brasil, a sacarocracia, que muito influenciou nos hbitos alimentares brasileiros. Partindo de entrevistas e da anlise de livros de receitas, Gilberto Freyre resgatou a cozinha tradicional

    15 SILVA, P. P. Farinha, feijo e carne-seca: um trip culinrio no Brasil Colonial. So Paulo: Ed. SENAC, 2005.

    16 VENNCIO, R. P.; CARNEIRO, H. lcool e drogas na Histria do Brasil. So Paulo: Alameda; Belo Horizonte: Editora PUC Minas, 2005.

    17 CASCUDO, L. C. Histria da alimentao no Brasil. Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1983.

    18 FREYRE, G. Acar. So Paulo: Companhia das Letras, 1997.19 HOLANDA, S. B. Caminhos e fronteiras. So Paulo: Companhia das Letras, 1994.

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    dos engenhos e apresentou a sacarocracia como elemento de identidade na-cional, a qual, segundo o autor, marcou decisivamente as prticas e hbitos alimentares no Brasil. A influncia da Antropologia, assim como a prpria experincia e sensibilidade s tradies do autor, possibilitaram a incluso de elementos cotidianos em sua anlise generalista. Desta forma, Gilberto Freyre o primeiro autor das Cincias Humanas no Brasil a dar nfase a questes alimentares, principalmente gastronmicas, que teria como tema de sua predileo, antecipando-se escola francesa dos Annales, na histria do cotidiano.

    O historiador Srgio Buarque de Holanda tambm enfocou perspec-tivas dos hbitos alimentares com a insero destes no espao geogrfico, social, econmico e cultural do Brasil. A abordagem de Srgio Buarque de Holanda, difere da de Gilberto Freyre em diversos aspectos, principalmente no objetivo relacionado temtica alimentar, pois possui uma viso mais antropolgica e sociolgica que Freyre. Em sua obra, Srgio Buarque pro-duz um captulo especfico para o tratamento da civilizao do milho. O interesse pelo tema deve ser creditado aos propsitos de Srgio Buarque de Holanda de estudar as especificidades da formao da sociedade brasileira, valorizando os pormenores e o fragmentrio e reconhecendo sua diversidade, apresentando, desta forma, um enfoque que remete ao relativismo cultural.

    As contribuies de Srgio Buarque de Holanda e Gilberto Freyre so relevantes na medida em que representaram inovaes na historiografia brasileira, a qual passa a valorizar a prpria cultura brasileira em sentidos mltiplos.

    Em 1967, Cmara Cascudo publica a primeira Histria da Alimen-tao no e do Brasil. No prefcio da Histria da Alimentao no Brasil, Cmara Cascudo revela o interesse antigo em escrever tal obra afirmando: Em todas as pesquisas nunca esqueci de investigar sobre a alimentao popular em sua normalidade20. Ao longo de seus estudos a respeito da cultura popular brasileira, Cmara Cascudo reuniu material para analisar os hbitos alimentares cotidianos brasileiros, num contexto, acusado por ele, de extrema mudana no cotidiano dos indivduos, trazida com as inovaes da crescente urbanizao e o desenvolvimento da indstria alimentcia.

    20 CASCUDO, L. C. Histria da alimentao no Brasil. Belo Horizonte: Editora Itatiaia, 1983, p.15.

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    Em sua obra, busca estudar a alimentao com base histrico-etnogrfica, considerada a partir da determinao das trs raas formadoras: portugus, negro e ndio. Nesta direo, o autor traa determinadas influncias de cada uma das raas nos hbitos alimentares brasileiros. Atravs deste estudo, Cascudo pretende demonstrar a antiguidade de certas predilees que o tempo tornou hbito, e que acabaram por se inserir no cotidiano do paladar familiar da nossa populao. Ao dialogar com diversas outras reas do co-nhecimento, tanto das Cincias Humanas como da Nutrio, o autor rompe com o isolacionismo terico-metodolgico e torna-se pioneiro no resgate da Histria da Alimentao no Brasil, construda nos hbitos cotidianos e nas particularidades locais.

    Tais preceitos esto tambm presentes em Brasil bom de boca, de Raul Lody21, revelando conotaes simblicas, sociais, polticas e culturais que se integram num elaborado sistema de representao. A visibilidade acima detectada, decorre da dinmica imposta pelo autor sua obra, pois os sete captulos, intitulados Eu como, Lugares de comer, Porque eu como tudo, Festa de comer, Comer com a frica, Comer com f e Comer Patrimnio, permitem uma pedaggica digresso pelas cozinhas locais e regionais, passando por influncias externas como a presena no Brasil das Casas de Pasto, uma verdadeira instituio portuguesa. Nesse sentido, uma terra rica e dadivosa em que se plantando tudo d, revela iguarias com expresses multiculturais e multitnicas, que vo desde as riquezas da cozinha baiana, passando pela cozinha caipira mineira e pau-lista e chegando ao mstico e extico mundo da comida amaznica. Desta forma, estabelece-se um panorama onde o mercado exibe a natureza, os dons da terra e os dons dos homens, estabelecendo dilogo entre o arcaico, a memria e a contemporaneidade. Na verdade, se h limites neste panorama eles esto postos numa verdadeira fantasia antropofgica do comer, onde uma gula indiscriminada e ecltica abre a boca para a aventura, destacando a comida dos ancestrais, as comidas dos orixs, o sincretismo religioso e o ritual e a nobreza da cachaa. Importante, como atesta o autor na ltima parte do seu trabalho, que os poderes do Estado registrem a comida como patrimnio cultural imaterial, destacando o acaraj como smbolo de um patrimnio gastronmico.

    21 LODY, R. Brasil bom de boca: temas da antropologia da alimentao. So Paulo: Editora SENAC So Paulo, 2008.

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    No Brasil, os temas da cozinha e da mesa regional brasileiras reve-lam os tempos da memria gustativa, e tm suas origens nos contornos nas cozinhas indgena, portuguesa e africana, dando verdadeiro salto cultural ao encontrar a cozinha caipira e imigrante. Desta maneira, a gastronomia brasileira reserva um lugar para todos, pois diversa, a partir de uma riqueza tnica e cultural que inventou uma mesa ampla com pratos produzidos pelos povos locais ou trazidos por diversos migrantes e imigrantes, num processo permanente de adaptao e readaptao.

    Os significados histricos e antropolgicos da alimentao permi-tem captar traos da dinmica, fazendo com que a comida seja constitutiva da identidade de um grupo, que se mantm viva nas tradies e na mem-ria. Nesse sentido, a alimentao deve ser considerada como patrimnio histrico gustativo de uma cultura, associada ao cotidiano dos indivduos, das pessoas e dos grupos, e como espao de vida que se destaca como categoria histrica.

    Na verdade, uma sntese sobre as nossas cozinhas busca explicar influncias de culturas alimentares a partir de duas realidades: a autntica cultura alimentar local e regional, e a cultura alimentar oriunda da civilizao externa, influenciadora. Tais contatos e simbioses, revelam relaes e trocas complexas de diferenas, afirmadas e reafirmadas em fecunda assimilao, que redundam numa certa mestiagem da comida brasileira.

    O roteiro desta viagem pela memria gustativa busca explicar o significado da culinria brasileira, que no se resume aos produtos tpicos nacionais. No custa reafirmar que este universo gastronmico trata de uma culinria complexa e dinmica, marcada pela adoo de alimentos, tcnicas e padres de consumo que tm como ponto de chegada a expresso dos marcos da diversidade dos hbitos alimentares tpicos do Brasil. Numa viagem pelas cozinhas brasileiras, nos deparamos com pratos que afirmam e reafirmam a memria gustativa das diversas regies, como: a feijoada, o arroz de carreteiro, a moqueca de peixe, o churrasco, o pato no tucupi, o barreado, o angu, o virado paulista, a rabada com polenta, o vatap, o acaraj, o piro de peixe, a galinha ao molho pardo, o leito pururuca, a carne de panela, o porco no rolete, o tutu mineira, o po de queijo, o bob de camaro, o caruru, a carne seca com jirimum, a manioba, a caldeirada de peixe, e tantas outras iguarias que revelam a riqueza da nossa culinria. Por tudo que venha a representar do ponto de vista do original e de criativo,

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    que permite destacar as identidades locais e regionais, certos alimentos e pratos da gastronomia brasileira, considerados como comida da alma, podem ser considerados como bens culturais, como patrimnio imaterial.

    Consideraes finais

    As mil e uma comidas que definem os sabores da sociedade ex-pressam lugares de memria, de patrimnios sociais, de significncia social. Os cadernos de receitas, livros de culinrias e livros de gastronomia so fontes importantes para se estudar a Histria e a Cultura da Alimentao, considerando os estgios histricos da cozinha e da mesa, permanentemente associados na esfera social. Tais fontes revelam as mudanas e permanncias que a atividade culinria adquiriu perante as sociedades, e que permitiram e tm permitido para alguns uma mesa farta e para muitos outros uma mesa de migalhas. Desta forma, a cozinha guarda a memria gustativa revelada por meio das receitas, com as suas respectivas dimenses local, regional, nacional e internacional. Tais fontes demonstram um enorme campo de possibilidades para estudos histricos que pensem a comida e as relaes sociais ligadas ao ato de alimentar-se como uma forma de reconstruo do passado, bem como a percepo cotidiana das novas cozinhas. Portanto, todo o saber culinrio que era preservado, sistematizado e transmitido de gerao para gerao, traz consigo, dentre outras, categorias de anlises como a identidade, a tradio e a comensalidade. Todo um saber fazer presente na elaborao dos pratos que foram incorporados aos padres de cada poca e que receberam algumas alteraes, em termos de acrscimos, substituies e abstraes. Desta forma possvel perceber as resistncias na Histria de determinadas tradies, seja em termos de escolha de alimentos, seja em relao sua elaborao. Nesse sentido, as receitas que incorporam os paradigmas de continuidade e permanncia, trazem a noo de que as prticas alimentares so ditadas por regras culturais engendradas na histria de uma famlia ou de um grupo social. Muitas vezes, as receitas, ao atraves-sarem geraes, expressam as realidades sociais em termos de adequao aos novos tempos. Afinal de contas, os pecados e os prazeres da gula nos levam questo se somos o que comemos ou comemos o que somos?

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