16

Click here to load reader

A Guerra Do Paraguai

Embed Size (px)

DESCRIPTION

A Guerra Do Paraguai

Citation preview

  • 1

    UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

    IFCH - INSTITUTO DE FILOSOFIA E CINCIAS HUMANAS

    DEPARTAMENTO DE HISTRIA

    HH483 - Histria do Brasil II

    Professor Robert Slenes

    A GUERRA DO PARAGUAI: formao de um exrcito nacional e questes sobre

    o recrutamento.

    Felipe da Costa Mello 104879

    Higor Codarin Nascimento 102620

    Ncolas Rocca Bragaia 103661

    Paula Mazzaro Pavan 105513

    A Guerra do Paraguai, conhecida tambm como a Guerra Grande ou a Guerra

    da Trplice Aliana foi o maior confronto militar ocorrido no continente Sul

    Americano, responsvel pela morte de milhares de pessoas em um perodo de quase seis

    anos (1864-1870). Com base nos diversos aspectos estudados sobre esse grande

    conflito, o ensaio a seguir pretende fazer uma anlise sobre a consequncia da Guerra

    para o desenvolvimento do exrcito nacional brasileiro e a formao de um ncleo

    profissional dentro dele, a questo do recrutamento das tropas que serviriam ao Brasil,

    bem como a participao dos escravos no conflito, e o discurso patritico produzido

    pelos militares, a partir de vises de diferentes autores, que fizeram sua anlise sobre

    tais pontos.

    A quantidade de estudos histricos sobre a rea militar pequena e, no caso da

    Guerra do Paraguai, ainda menor. Vitor Izecksohn nos coloca os problemas em

    relao a esses estudos: primeiro, o veto por parte da academia em tratar dessa rea;

    segundo, a falta de dados e a prpria falta de pesquisas empricas sobre o tema1. Apesar

    disso, h uma grande importncia em se estudar, por exemplo, a forma como a Grande

    Guerra contribuiu para uma transformao na organizao do exrcito brasileiro, porque

    essa transformao teve impacto na prpria poltica monrquica e na sociedade, e a

    1 IZECKSOHN, Vitor; O Cerne da discrdia: A guerra do Paraguai e o ncleo profissional do exrcito

    brasileiro. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exrcito, 1997.

  • 2

    anlise dela ajuda no entendimento histrico sobre esse fato. A prpria guerra foi

    considerada o mais importante conflito entre os pases do Rio da Prata, o que a torna um

    necessrio objeto de estudo.

    Para pensar a mudana ocorrida no exrcito brasileiro, preciso analisar as

    condies pr-guerra das instituies de segurana e defesa do Estado. Para Izecksohn,

    no havia uma fora armada de dimenso nacional nesse perodo. Primeiro, porque o

    processo de independncia do pas no foi produtor de rupturas com o antigo sistema

    colonial, sendo assim desnecessria uma mobilizao de armas para tal. Segundo,

    porque no havia possibilidades financeiras para a formao de um exrcito nacional.

    Terceiro, porque o modelo escravista e aristocrtico da sociedade brasileira tendia a

    uma descentralizao do uso da violncia para as elites regionais, reduzidas a um carter

    miliciano2.

    A Guarda Nacional, criada em 1831, era responsvel por representar o poder do

    Imperador em relao s milcias regionais brasileiras. O que isso significa? Que ela

    seria um esforo moderador perante a descentralizao das foras armadas, um rgo

    que legitimava as aes das elites agrrias. O fator que determinava a filiao era a

    renda, o que contribuiu para que no houvesse uma preocupao com as carreiras dentro

    da instituio, os homens no faziam esforos para subir de cargo3.

    A Guerra do Paraguai trs a necessidade de centralizao dessas foras e

    demandas de profissionalizao do exrcito. Isso no significa que no houvesse oficiais

    profissionais nas foras armadas brasileiras antes da guerra, mas que o conflito

    direcionou o uso de uma tecnologia sofisticada para o momento e exigiu uma

    reorganizao entre os comandantes do exrcito4. A guerra mostrou as deficincias da

    estrutura militar existente5.

    Alm da utilizao de uma tecnologia sofisticada, de suprimentos e armas, o

    Imprio brasileiro precisou de fora humana nas batalhas, ou seja, houve a necessidade

    de intensificao do recrutamento de homens para o exrcito6. Isso causou um

    descontentamento entre os latifundirios, j que perderiam parte de sua mo-de-obra e

    2 Idem, pp.58-63. 3 Idem, pp.71. 4 Idem, pp.38,69. 5 Idem, pp.165. 6 Idem, pp.88.

  • 3

    teriam maiores gastos com o aumento de impostos para sanar despesas da prpria

    guerra7.

    Os homens preferencialmente recrutados eram homens livres e pobres, porm, a

    partir de determinado momento, essa fora no foi suficiente para derrotar o Paraguai,

    sendo necessrio o recrutamento de escravos. Era preciso trein-los e arm-los8. Mas,

    visto que os prprios senhores no estavam abertos a liberar seus escravos para a guerra

    e os pobres no viam nenhum benefcio no alistamento, o que os militares poderiam

    fazer para traz-los ao servio militar sem que a hierarquia dessa sociedade sofresse

    grande mudana?

    O primeiro passo foi o recrutamento obrigatrio; e junto dele foi se

    disseminando no discurso militar ideias de identidade nacional. Izecksohn afirma que a

    Guerra do Paraguai fez com que a defesa da integridade de um territrio permitisse a

    difuso de uma ideia de patriotismo a partir do fato desse territrio ser nacional e

    precisar ter suas fronteiras delimitadas. Smbolos nacionais, como o hino e a bandeira,

    passaram a ser utilizados para dispersar o ideal patritico 9. O grande problema foi

    conseguir fazer com que homens que mal possuam direitos cvicos comprassem o

    discurso da nao.

    O exrcito passou a ser constitudo ento por homens sem formao militar, que

    eram chamados de tarimbeiros e por homens que haviam se socializado na Escola

    Militar, por isso possuam conhecimento tcnico. Esses ltimos formariam o ncleo

    profissional do exrcito10

    . Por um tempo, a educao militar no foi to valorizada

    quanto passou a ser com o fim da Grande Guerra. Caxias, por exemplo, oficial imperial

    do exrcito achava que a prtica atravs da coragem e compromisso era suficiente para a

    formao dos homens11

    . Entretanto, a chamada qualificao cientifica e intelectual

    passou a ser essencial na carreira do exrcito.

    A Guerra do Paraguai provocou uma mudana conflituosa significativa na

    organizao militar, hierarquicamente, como veremos mais adiante e no ganho de

    autonomia do exrcito em relao ao campo poltico. Apesar de grandes oficiais serem

    homens da monarquia, como o caso de Caxias, e lutarem por ela; ideias republicanas

    se difundiram entre os oficiais e soldados, que perceberam que a monarquia impedia a

    7 Idem, pp.91. 8 Idem, pp.90-91. 9 Idem, pp.167. 10 Idem, pp.135. 11 Idem, pp.156

  • 4

    profissionalizao do exrcito12

    . Alm dessas, houve uma mudana precisa que

    configura as foras armadas at hoje, que a prpria tentativa de centralizao das

    milcias regionais em uma instituio nacional, com o mnimo de disciplina13

    .

    O autor que discutiremos a seguir Ricardo Salles, que em sua obra Guerra do

    Paraguai: Escravido e Cidadania na Formao do Exrcito aborda o aspecto social da

    mobilizao e recrutamento para a guerra, no que tange relao entre os escravos,

    setores livres populares e camadas mdias no exrcito, e as contradies sociais que no

    puderam ser abafadas na corporao militar, agravando as tenses delas decorrentes14

    .

    O autor faz uma contextualizao do perodo anterior guerra, tanto sobre a

    poltica externa imperial, principalmente na Bacia do Prata, onde se deu o conflito,

    como sobre a situao interna no Brasil. Segundo o autor, as dcadas de 50 e 60 do

    sculo XIX marcam o pice do desenvolvimento da sociedade escravista com a

    plantao de caf no Vale do Paraba15

    , bem como a existncia de um Estado Imperial

    consolidado, j que a ltima rebelio, a Praieira, havia sido derrotada e o retorno da

    figura do Imperador ao poder, que amenizaria os impactos causados pelos conflitos

    entre faces polticas do perodo Regencial16

    .

    Para Salles, a Guerra do Paraguai foi um elemento de peso no processo

    histrico que marcou a transio do escravismo para o capitalismo, pois esta seria

    acompanhada da decadncia da produo escravista, expanso do trabalho livre no

    Oeste Paulista, da infraestrutura de servios, manufaturas, pequenas fbricas,

    urbanizao, imigrao europeia, fortalecimento de uma classe mdia e o surgimento do

    movimento abolicionista17

    .

    Com base nos aspectos desse contexto, o autor comea a falar sobre a

    organizao militar do Exrcito Brasileiro no perodo estudado, levando em conta que a

    guerra permitiu a formao de um exrcito nacional regular pela primeira vez no pas, j

    que as foras locais existentes, as guardas nacionais e os tropeiros, no poderiam dar

    conta de um exrcito paraguaio bem organizado18

    .

    Assim como Izecksohn, Salles procura refletir sobre como o exrcito nacional

    poderia ser formado e o que levaria a populao a se alistar nele. Para ele, inicialmente,

    12 Idem, pp.165-166. 13 Idem, pp.138-139. 14 SALLES, Ricardo; Guerra do Paraguai: Escravido e Cidadania na Formao do Exrcito. Rio de

    Janeiro: Paz e Terra, 1990, pp.4-5. 15 Idem, pp.39. 16 Idem, pp.41. 17 Idem, p.55. 18 Idem, p.56.

  • 5

    se deu um recrutamento forado de camadas populares livres, um dado que no

    exclusivo do Brasil, nem dessa poca, na Europa e posteriormente, a coero ainda seria

    muito utilizada para organizar exrcitos. Para demonstrar esse carter coercivo do

    recrutamento, o autor cita Chiavenatto, que destaca a no adeso, a indiferena e a

    resistncia ao esforo de guerra por parte das camadas populares19

    . Algum tempo

    depois, o prprio governo faria uma propaganda para facilitar o recrutamento, a dos

    Voluntrios da Ptria, em que, aquele que se alistasse como voluntrio receberia uma

    gratificao, ou no caso de ser escravo, ganharia a alforria20

    .

    O alistamento para o exrcito era visto como algo degradante, pois apenas os

    desocupados, vagabundos e malandros eram recrutados. Essa ideologia do esprito

    voluntrio foi uma tentativa de afastar essa viso negativa, j que garantiria o

    reconhecimento moral daqueles que possussem esse ttulo. Porm, nesse momento

    que as contradies comeam, porque as classes excludas do sistema escravista, que

    emergiriam com esse reconhecimento, em uma sociedade fechada como a brasileira

    imperial, permaneceriam sem ter participao poltica e qualquer peso na tomada das

    decises locais ou nacionais21

    .

    Salles inicia ento um debate com Chiavenatto, visto que, o segundo autor

    afirma que os escravos no s participaram da guerra, como eram a maioria das foras

    combatentes brasileiras, graas ao fornecimento de alforria, e a indenizao do senhor22

    .

    J Salles, afirma que os escravos de fato combateram, mas representavam no mximo

    10% do contingente, primeiramente pelo medo de que houvesse uma revolta no interior

    do exrcito com o alistamento de tantos escravos23

    , alm de se duvidar que os senhores

    abrissem mo de bom grado de seus escravos por uma indenizao que poderia no ser

    compensatria24

    . E, ao contrrio do que pensa Chiavenatto, Salles afirma que o declnio

    acentuado da populao escrava se deu, antes de tudo, extino do trfico, e que nos

    anos 50 do sculo XIX j havia uma diminuio progressiva do nmero de cativos25

    .

    No entanto, o autor no nega que o Escravo-Soldado foi uma realidade, e que

    teve um significado muito importante nas contradies da prpria sociedade escravista

    19 Idem, p.61. 20 Idem, p.62. 21 Idem, p.63. 22 Idem, p.64. 23 Idem, p.67. 24 Idem, p.69. 25 Idem, p.68.

  • 6

    no ps guerra26

    . O que nos leva a outra questo, j que os escravos no eram a maioria

    do contingente nas linhas do exrcito, diferentemente do que afirma Chiavenatto, quais

    outras camadas comporiam as fileiras do exrcito?

    Salles responde isso fazendo um apanhado geral sobre as diferentes camadas

    populares, e mesmo a classe mdia. Havia um grande contingente populacional livre

    que poderia ser alistado. A maioria dessas pessoas era negra ou mestia, mas no era

    escrava27

    . Integrantes das Guardas Nacionais tambm eram transferidos para o exrcito,

    inclusive muitos oficiais provinham delas28

    . Sob esse aspecto, a participao da classe

    mdia no exrcito foi capaz de formar um discurso poltico, entretanto, as outras

    camadas tambm formariam um discurso caracterstico, s que o da classe mdia,

    posteriormente seria visto como o discurso da nao 29

    .

    Como vemos, os Voluntrios da Ptria tinham origens diversas e muitos se

    engajaram para conseguir as vantagens, as gratificaes. Depois que o territrio

    argentino se viu livre do invasor paraguaio, todo o esforo de guerra recaiu sobre o

    Brasil, o que exigiu uma remodelao na organizao do exrcito capitaneada pelo

    Duque de Caxias30

    .

    Como j mencionado, havia uma grande contradio no interior do exrcito,

    devido principalmente, s diferentes origens sociais que o compunham. Havia, tambm,

    uma modernizao na organizao militar e nos recursos empregados, junto com a

    permanncia de valores cercados em uma ordem social hierrquica e nobiliria31

    . Outra

    contradio provm do fato de aparecer, em uma sociedade estratificada, uma nova

    profisso que no dependia das origens sociais de cada indivduo. claro que deve-se

    lembrar que ex-escravos e integrantes de camadas populares permaneciam sem muitas

    possibilidades de chegar ao oficialato32

    , e havia os dilemas de como incorporar setores

    emergentes ao exrcito sem abrir mo dos privilgios. O exrcito continha grande

    nmero de homens que a sociedade repudiava, e o tempo todo se pensava em uma

    forma de organiz-los nos moldes europeus, como, por exemplo, dar promoo por

    competncia33

    .

    26 Idem, p.73. 27 Idem, p.77. 28 Idem, p.106. 29 Idem, p.110. 30 Idem, p.127. 31 Idem, p.134. 32 Idem, p.137. 33 Idem, p.143.

  • 7

    O prprio Caxias afirmava que a coeso de um exrcito to heterogneo s se

    poderia dar a partir da reintroduo de seus corpos em hierarquias, conceito que

    provavelmente no diferia da hierarquia social34

    , principalmente depois de inmeros

    relatos de ataques a oficiais por seus subordinados35

    .

    Em relao s contradies que se formariam na sociedade escravista brasileira

    no ps-guerra, segundo Salles, no era possvel distinguir os diferentes tipos de

    voluntrios36

    , mas as fronteiras hierrquicas que ficaram ofuscadas pela ideologia dos

    voluntrios rapidamente se reconstituiriam no interior do exrcito37

    . Salles afirma que

    nesse duplo movimento, havia o reconhecimento de uma contradio, de um conflito

    de interesses, sobre a qual se fundava todo projeto de sociedade imperial, que tinha na

    instituio militar um desfecho oposto quele que caracterizava a situao da massa da

    populao escrava no conjunto da sociedade 38

    .

    O escravo que era liberto para lutar na guerra e, depois, condecorado como

    voluntrio, ao retornar sua cidade, encontraria sua famlia permanecendo na condio

    de escrava, teria dificuldades em constituir uma vida de liberto, e ainda no teria poder

    de deciso na poltica brasileira. Nesses aspectos, negros livres comearam a reivindicar

    seus direitos, afinal, eles tinham defendido um pas que restringia suas aes. As

    camadas populares no teriam uma situao to distinta, inclusive, era melhor que os

    integrantes dessas camadas permanecessem no exrcito, pois fora dele seria muito

    difcil constituir uma nova vida em uma sociedade to exclusivista.

    Para o autor, a presena de escravos, j ento libertos, no exrcito contribuiu

    para o peso poltico decisivo dessa instituio no ps-guerra, com consequncias

    profundas sobre o processo de crise e derrubada do imprio39

    .

    Com o decorrer da guerra, o Ardor Patritico foi diminuindo cada vez mais.

    Houve necessidade de retomar a coero para o recrutamento40

    , j que ainda havia o

    alistamento para perseguir adversrios polticos, herana da maneira de agir da Guarda

    Nacional, em que, no perodo regencial, membros do partido vigente em alguma

    provncia ou municpio alistavam integrantes do partido oposto para se livrar da

    34 Idem, p.145. 35 Idem, p.147. 36 Idem, p.74. 37 Idem, p.148. 38 Idem, p.75. 39 Idem, p.77. 40 Idem, p.102.

  • 8

    oposio poltica41

    . Os corpos dos Voluntrios no conseguiam mais motivar um

    ardor espontneo nas classes desprezadas, o que chegou a levar as elites produzir um

    esforo nacional, pois, aos poucos, as fileiras do exrcito estavam se retraindo42

    . As

    camadas populares percebiam que, depois dos conflitos, o lugar social e poltico desses

    setores na sociedade imperial permaneceria o mesmo43

    .

    Para Salles, a Guerra do Paraguai acelerou e ampliou as necessidades da criao

    de um exrcito nacional. O Estado imperial foi obrigado a recorrer e a fazer uso de

    recursos humanos e materiais muito alm de sua capacidade de aglutinao moral e

    material. No mesmo tempo em que o exrcito nacional era o ndice de estabilidade,

    riqueza e poderio da civilizao escravista imperial, tambm indicava seus limites e

    produzia espaos contraditrios em seu tecido social e econmico. Ao invs de aparecer

    como o ltimo bastio da defesa da ordem escravista e imperial, o exrcito faria com

    que dele surgissem os instrumentos imediatos de sua destruio44

    .

    A relevncia da obra de Salles nesse estudo, diz respeito, primeiramente

    questo do recrutamento - quais camadas eram convocadas para a guerra -; e s

    contradies que, uma vez dentro da organizao militar, a convivncia dessas camadas

    e sua situao posterior guerra, em muitos aspectos, idnticas anterior, iriam ser

    provocadas assim que esses setores se vissem na condio de defender uma nao que

    os marginalizou e no melhorou sua situao com o fim do conflito. Embora escravos

    no fossem a maioria nas fileiras do exrcito, diferentemente do que props

    Chiavenatto, o peso de sua participao seria fundamental para desencadear a crise que

    acabaria com esse sistema poltico exclusivista e com a ordem imperial.

    Aps analisarmos as questes relativas ao recrutamento de acordo com a

    legislao que se formou e o modo como se efetivou, devemos passar a explorar mais

    profundamente o papel do escravo, alforriado para servir ao exrcito, tendo em vista a

    guerra e o contexto social e poltico do Brasil imperial na segunda metade do sculo

    XIX.

    Para isso, analisaremos mais profundamente o livro Escravido ou morte: Os

    escravos brasileiros na Guerra do Paraguai do historiador Jorge Prata de Sousa. A

    tentativa do autor de tentar compreender qual o impacto da participao de escravos

    41 Idem, pp.103. 42 Idem, pp.105. 43 Idem, pp.106. 44 Idem, pp.149.

  • 9

    na estrutura do trabalho do imprio, e na problematizao do conceito que se construiu

    para o exrcito a partir do recrutamento, com os chamados voluntrios da ptria.45

    Primeiramente, antes de adentrar as questes, o autor demonstra um panorama

    do debate historiogrfico, citando obras de historiadores do sculo XIX, como Francisco

    Adolfo de Varnhagen, at historiadores mais recentes. Essas obras, segundo Sousa,

    constroem historiograficamente o mito dos voluntrios da ptria, possibilitando uma

    mitificao do Exrcito, de modo que esta instituio, que saiu fortalecida da guerra,

    tenha sido composta apenas por voluntrios que defendiam a ptria. No entanto, para o

    autor, este tipo de anlise impede uma viso do recrutamento e da constituio do

    Exrcito, enquanto um momento de conflitos sociais e tnicos, que mascaram a

    opresso em relao a esse fato, importante para a anlise da guerra.46

    Partindo para a apresentao de seu problema, Jorge Prata Sousa, inicia a anlise

    da participao dos escravos promovendo uma contextualizao do momento pelo qual

    o Brasil passava em relao escravido. Primeiramente, devemos compreender que as

    presses britnicas fazem com que o Brasil, em 1831, aprove uma lei que probe o

    trfico de escravos para todos os seus portos. Apesar de obter relativa eficcia nos anos

    seguintes lei, esta acaba caindo em desuso, sendo apelidada de lei para ingls ver.

    No entanto, devido ao aumento das presses inglesas, o Brasil aprova uma lei que

    acabar definitivamente com o trfico de escravos em grande escala em 1850, a lei

    Eusbio de Queirs.47

    Por fim, podemos, a partir deste incio da obra, antever que o argumento central

    ser analisar a participao dos escravos na guerra de uma forma maior, ou seja, no

    mbito da questo da composio da estrutura do trabalho na segunda metade do sculo

    XIX. Tentemos agora expor de forma mais clara a argumentao do autor.

    Aps fazer uma exposio sobre as polticas de recrutamento, fato que j

    expusemos neste trabalho, o autor chega discusso sobre o recrutamento de libertos48

    .

    Este recrutamento obedecia a duas principais demandas: enviar um maior contingente

    guerra, para substituio das grandes baixas que ocorriam no Exrcito, e tambm da

    necessidade de determinados setores da sociedade de se ausentarem na guerra. No

    primeiro momento, esses libertos so absorvidos pela Guarda Nacional, e s em um

    45 SOUSA, Jorge Prata de (autor). Escravido ou morte: os escravos brasileiros na guerra do Paraguai.

    Rio de Janeiro, RJ: Mauad: ADESA, 1996, pp.13. 46 Idem, pp.19-20. 47 Idem pp.37. 48 Idem pp.63.

  • 10

    segundo momento que sero absorvidos no Exrcito e na Marinha. Feito isso, Sousa

    passa parte mais importante de seu trabalho, em que aprofunda e esclarece o imbrglio

    envolvendo o recrutamento de escravos49

    .

    Primeiramente, o autor demonstra que havia diversos casos de revoltas dos

    senhores de escravos em relao s polticas de recrutamento, muitas vezes feitas sem

    permisso; fato que, segundo os senhores, violava o direito propriedade. Alm disso,

    Jorge Prata Sousa demonstra que, aps a guerra, o imbrglio se aprofunda.

    Os escravos formam redes de sociabilidade para se tornarem livres das amarras

    da escravido, com diversos modos, incluindo a fuga. No entanto, Sousa evidencia que

    essas fugas no devem ser entendidas enquanto conscincia da ptria, e sim maneiras de

    escapar da brutalidade e crueldade do regime de escravido.

    Todo esse imbrglio leva legalizao do recrutamento de escravos, prevendo

    indenizao aos senhores e estabelecendo taxas para serem pagas caso o escravo fosse

    realmente voluntrio sem a autorizao de seu senhor. Por fim, aps a guerra, esses

    escravos recrutados sem permisso tm sua liberdade questionada, devido ao incio

    turbulento das polticas envolvendo o recrutamento para a guerra.50

    Logo aps esta explanao, o autor apresenta suas fontes documentais, atestando

    ao mesmo tempo sua importncia e sua deficincia. Para contabilizar os escravos

    participantes da guerra, Jorge Prata Sousa se utiliza principalmente das cartas de

    Alforrias registradas. Para o autor, esta era a nica possibilidade de tentativa de anlise.

    No entanto, salienta que por esse vis documental podemos apenas obter uma realidade

    parcial do recrutamento de escravos.51

    Para concluir e resumir sua anlise, Jorge Prata Sousa expe alguns pontos

    fundamentais: o primeiro justamente no negar a existncia do voluntarismo na

    guerra. No entanto devemos problematiz-lo enfatizando que isso no levou o Brasil

    vitria contra o Paraguai52

    . O segundo gira em torno da questo do Exrcito. Para

    Sousa, o Exrcito deve ser visto como uma das poucas, seno a nica, instituio do

    Estado com ampla representatividade popular, justamente devido ao recrutamento das

    camadas mais baixas da sociedade, de libertos e de escravos.53

    Por fim, a evidncia

    clara do recrutamento forado, desmistificando o conceito de voluntrios da ptria

    49 Idem pp. 68. 50 Idem pp.70. 51 Idem pp.93. 52 Idem pp.111. 53 Idem pp.112.

  • 11

    para evidenciar as contradies sociais que se puseram a partir dali. A mais importante

    delas para o autor: a estrutura do trabalho escravo.54

    Sobre este ponto, o autor argumenta que a poltica de recrutamento de escravos

    facilitou e aprofundou a desestabilizao do trabalho escravo. E por entender que

    grande parte do poder poltico advinha desse suporte, Jorge Prata de Sousa evidencia

    que essa pode ser considerada uma das causas do fim da monarquia e incio do governo

    republicano no Brasil55

    .

    Visto isso, a proposta agora fazer uma anlise mais profunda acerca da

    comparao entre a resistncia ao recrutamento para o exrcito durante a guerra civil

    dos Estados Unidos e a Guerra do Paraguai por parte do Brasil. No cabe aqui um

    paralelo a respeito das organizaes das sociedades, pois h diferenas latentes no

    desenvolvimento institucional de cada pas.

    Para embasamento desta anlise utilizou-se o estudo de Vtor Izeckson, que

    escreveu um artigo sobre o assunto56

    . Para iniciar-se a investigao, necessrio

    evidenciar que, desde a fundao de cada pas, houve distines considerveis nas

    tradies militares, que aumentaram nas independncias. No entanto, ambos os pases

    se consolidaram nas guerras de Secesso (1861- 1865) e na guerra do Paraguai (1864-

    1870) 57

    .

    At a ecloso das guerras, no havia um projeto de grandes organizaes

    militares, j que em ambos os pases a consolidao do poder local era eminente, e o

    estabelecimento destes exrcitos ameaaria a independncia das influncias regionais.

    Porm, devido falta de soldados e a durao da guerra, se fez necessria a ampliao

    dos exrcitos de cada pas. Muitos problemas apareceram na ampliao dos exrcitos,

    um deles foi a ausncia de uma burocracia adequada para o recrutamento, j que ambas

    as naes nunca tinham se envolvido em guerras destas magnitudes. Os recursos para a

    resoluo destes problemas foram similares, segundo os estudos de Izecksson, em

    termos de recrutamento58

    .

    Na mobilizao para a guerra, foi necessria a interveno do Estado e uma

    diminuio dos poderes locais, incomodando as elites e as relaes estabelecidas no

    mbito local. No Brasil, como j foi dito, a independncia se deu sem um exrcito

    54 Ibidem. 55 Idem pp.112. 56 IZECKSOHN, Vitor. Resistncia ao recrutamento para o exrcito durante as guerras Civil e do

    Paraguai in Revista estudos histricos, n27. Rio de Janeiro, 2001, pp.89-101. 57 Idem, pp.90. 58 Idem, pp.91.

  • 12

    nacional, no sendo essencial para o processo de construo do Estado. Tendo em vista

    esta cultura vigente, houve muita resistncia das lideranas locais em admitir um Estado

    com o monoplio da violncia, ou seja, com meios legtimos de coero59

    .

    Nesta discusso de transferncia de foras locais e sua submisso ao poder

    centralizado, observa-se, nos Estados Unidos, a realizao do recrutamento de milcias

    estaduais pelo presidente Lincoln. J no Brasil, a submisso a um exrcito centralizado

    consistiu em transferir os corpos da Guarda Nacional para o front de guerra, essas aes

    tinham por objetivo a organizao das foras militares, mas foram vistas como um

    alargamento excessivo das foras do Estado, concebendo tais aes como um mal

    permanente e alarmando a populao a resistir sobre o controle local do recrutamento60

    .

    Vamos nos atentar primeiramente ao caso da guerra do Paraguai. No incio da

    guerra, a primeira onda de recrutamento foi pequena, j que as foras existentes foram

    suficientes para repelir as foras paraguaias no sul do pas, alm disso, a fora dos

    voluntrios da ptria impressionou as autoridades, j que estava acostumada a lidar

    com populaes resistentes. Essa motivao vinha da idia de ingerncia paraguaia no

    territrio brasileiro, pois estes invadiram o Brasil sem uma declarao oficial de guerra,

    o que gerou muita revolta61

    .

    interessante observar que muitas das regies brasileiras no tiveram contato

    com os problemas da regio do Prata, no entanto, ofereceram muitos voluntrios ao

    front de guerra. Parece, neste momento, que nasce o sentimento de unidade nacional,

    dos brasileiros se reconhecerem como brasileiros. As ajudas vinham de todas as formas,

    desde alistamentos voluntrios, at doaes pecunirias, como aponta Ricardo Salles em

    seus estudos. Segundo ele, as doaes eram realizadas desde os setores mais abastados,

    passando pelos funcionrios pblicos, at pequenos sitiantes e alfaiates62

    .

    A populao acreditava que a guerra no duraria muito tempo e, que mesmo

    sendo precrio, o exrcito brasileiro pulverizaria os inimigos paraguaios. No incio das

    batalhas, as foras locais tinham como verdade absoluta a no necessidade da

    implementao de um exrcito permanente, talvez por isso uma contribuio consistente

    deste setor. Contudo, o governo de D. Pedro II parecia vislumbrar uma longa guerra, e

    comeou a adotar medidas para ampliar o exrcito, como maiores salrios, menores

    59 WEBER, Max. A poltica como vocao in H.H Gerth e C. Wright Mills. So Paulo:Tribuna da

    histria. 1982. 60 IZECKSOHN, Vitor. Resistncia ao recrutamento para o exrcito durante as guerras Civil e do

    Paraguai in Revista estudos histricos, n27. Rio de Janeiro, 2001, pp.93. 61 Idem, pp.94. 62 SALLES, Ricardo. Op. Cit.

  • 13

    termos de servio, penses e terras para os veteranos. Alm destas aes, o governo

    adotou medidas polmicas, como a transferncia dos 14.976 soldados da Guarda

    Nacional para o front de batalha externo.

    Tal ao do governo desagradou os lderes locais, que se viram expropriados e

    desrespeitados, j que a autoridade local era sancionada pelo costume e por uma srie de

    leis no escritas, aceitas como tradio. O entusiasmo popular comeou a minguar,

    naquele momento as relaes pessoais tornaram-se mais importantes que os

    compromissos com a guerra63

    . A partir dessa perspectiva, o Estado comeou a utilizar a

    fora no recrutamento, muitos recrutas foram acorrentados at as bases do exrcito, pois

    o nmero de evases era enorme.

    Os presidentes das provncias aproveitaram as conjunturas da guerra para

    empreender uma faxina social, muitos deles foravam o recrutamento da populao

    pobre para extirpar a presena destas pessoas no territrio brasileiro. O foco principal

    destes governantes eram os migrantes, mendigos, vadios e aqueles que no tinham

    nenhuma proteo. O que gerou um grande nmero de deseres64

    .

    No entanto, as formas de resistncia que se deram no foram apenas com

    deseres. Muitos recrutadores foram assassinados, principalmente no nordeste do pas,

    onde o poder local parecia ser mais forte. Houve muitos ataques s escoltas e s cadeias,

    por diversas vezes os ataques partiam dos prprios desertores. Os revoltosos tinham o

    apoio do poder local e da imprensa, minando de forma considervel a autoridade

    imperial.

    Vamos agora tentar compreender o processo de recrutamento na guerra Civil

    americana, aferindo as semelhanas com o processo brasileiro. Desde sua

    independncia, os Estados Unidos rechaavam a ideia de um exrcito permanente e

    centralizado. Preceitos como localismo e liberdade individual eram prezados em

    demasia pelos cidados americanos. Antes da guerra civil, a fora militar era composta

    pelas milcias estaduais, os governadores se utilizavam das relaes pessoais e

    partidrias para constituir o exrcito65

    .

    A partir do incio da guerra civil, a opinio pblica do norte apoiou

    massivamente as aes do exrcito, como no Brasil, houve um grande nmero de

    alistamentos voluntrios, nmero questionado por Salles e Sousa. Lincoln convocou

    63 IZECKSOHN, Vitor. Resistncia ao recrutamento para o exrcito durante as guerras Civil e do

    Paraguai in Revista estudos histricos, n27. Rio de Janeiro, 2001, pp.96. 64 Idem, pp.97. 65 Idem, pp.98.

  • 14

    75.000 soldados para alistarem-se por trs meses de servio. Izecksohn acredita que,

    como acontecera na Guerra do Paraguai, houve muitas demonstraes de patriotismo, a

    populao jovem do norte declarava que no existiam mais democratas e republicanos,

    mas defensores da Constituio. Veremos que essa afirmao no se sustentou66

    .

    Isso se explica pelo fato de todos os governadores do norte serem do partido

    republicano (partido de Lincoln), representando uma coalizo que apoiava Lincoln em

    Washington. Os governadores competiam para oferecer o maior nmero de soldados e

    assim ganhar maior prestgio com o presidente da nao. Eles recorriam aos chefes

    locais para arregimentar o maior nmero de voluntrios. Alm do prestgio, ganhavam o

    ttulo de oficiais no exrcito, fato que aumentava o sistema de parentesco nas relaes

    hierrquicas nas companhias combatentes.

    A alta adeso dos cidados na guerra deveu-se tambm ao medo dos chefes de

    famlia serem vistos como covardes perante sua comunidade, pois era forte o orgulho

    local e tnico, reforando a idia de uma sociedade branca e protestante. Os problemas

    comearam a aparecer quando os soldados se reuniram. O facciosismo poltico, a falta

    de estrutura e a m administrao deterioraram as condies no campo. Uma nova

    concepo de guerra se instaurava naquele momento, armas de maior alcance

    prolongaram a guerra, diminuindo o entusiasmo da populao67

    .

    A imprensa comeou a divulgar ilustraes e gravuras feitas no campo,

    conscientizando as populaes mais distantes do combate. Essa situao paralisou o

    alistamento de soldados, que estavam insatisfeitos com a gerncia da guerra feita por

    Lincoln. Essa insatisfao foi refletida nas eleies de 1862, em que o partido

    Democrata aumentou muito sua representao no congresso e nos legislativos estaduais,

    alm de conseguirem o governo de Nova Iorque e Nova Jersey68

    .

    Tendo essa situao em vista, o governo Lincoln comeou a tomar decises que

    interferiram nas comunidades do pas, estendendo o recrutamento a cidados que no se

    alistariam voluntariamente. Tais aes foram vistas pela populao como um excesso

    governamental que alijava princpios democrticos. Contudo, Lincoln sabia que o

    destino do partido Republicano dependia do desfecho da guerra e tomou a deciso de

    tornar a guerra mais violenta com o intuito de acabar rapidamente com ela69

    .

    66 Idem, pp.99. 67 Idem, pp.103. 68 Idem, pp.105. 69 Idem, pp.107.

  • 15

    O governo republicano buscou leis mais abrangentes que aumentava o controle

    do Estado sobre o recrutamento. Dentre elas, podemos citar a lei que autorizava o

    presidente a organizar regimentos sem a assistncia dos estados, tornando todos os

    homens entre 20 e 35 anos e todos os homens casados entre 35 e 45 anos sujeitos ao

    recrutamento militar, alm de absorver as milcias estaduais s foras nacionais; como

    foi feito pelo Imprio brasileiro na absoro da Guarda Nacional e das milcias

    regionais pelo exrcito nacional70

    .

    As reaes a essas aes foram distintas: nas partes mais ricas, os cidados

    contratavam substitutos e pagavam a comutao de 300 dlares, j nas partes mais

    pobres houve muitas revoltas, assim como no Brasil. As comunidades do Meio-Oeste

    organizaram protestos, argumentando que o recrutamento compulsrio era um

    instrumento para penalizar os democratas, os pobres e os imigrantes. Esse argumento

    nos remete a discusso sobre faxina social citada anteriormente nos pargrafos que

    tratavam sobre a Guerra do Paraguai, contudo, estudos apontam uma relao entre

    resistncia, filiao partidria e religio, fatores que no foram preponderantes no caso

    brasileiro71

    .

    Os distrbios ocorridos nos Estados Unidos foram to violentos quanto os vistos

    no Brasil, todavia, mais interessante que relatar os distrbios, aferir os objetivos de

    tais aes. Na Pensilvnia, os grandes mineradores usaram o recrutamento contra os

    sindicatos e as greves; em Nova Iorque, manifestantes destruram os prdios pblicos e

    propriedades. O objetivo dos protestos era controlar o mercado de trabalho, expulsando

    os negros de Nova Iorque, segundo Iver Bernstein, a turba conseguiu os seus objetivos,

    colocando os negros para trabalhar em outras cidades72

    .

    O governo de Lincoln contemporizava as aes, pois sabia que mais do que a

    guerra civil, existia naquele momento muitas disputas entre ricos, pobres, negros e

    brancos. O que mais interessava ao governo federal era manter a lealdade tcita dos

    estados do norte, por isso, o presidente suprimiu o recrutamento em Nova Iorque,

    temendo mais revoltas. Lincoln ordenou um recrutamento maior em outros estados,

    criando mais distrbios; entretanto, posteriormente, o presidente saiu vitorioso da

    guerra, o que diminuiu a presso sobre o governo.

    70 Idem, pp.108. 71 Idem, pp.109. 72 Idem, pp.111.

  • 16

    Em suma, nas duas guerras existia um estgio pouco avanado de burocracia em

    cada pas, gerando conflitos e tenses nas cidades e nos campos das naes.

    importante ressaltar que no foram grandes as ameaas proferidas pelas populaes

    locais do Brasil e Estados Unidos, mas levaram a novas propostas que organizaram o

    exrcito das naes. Nos Estados Unidos, a interveno do Estado foi crescente, e

    concebeu-se uma nova viso de cidadania populao americana73

    .

    O fim da Guerra do Paraguai provocou uma mudana no jogo poltico brasileiro.

    Nos Estados Unidos, a vitria do norte garantiu a reeleio de Abraham Lincoln e no

    mudou o sistema partidrio, marcado pela disputa entre Democratas e Republicanos.

    A ideologia nacionalista contribuiu para os conflitos existentes dentro da

    sociedade brasileira e tem sido alvo de discusso entre diversos autores, como foi

    demonstrado acima em relao participao popular na guerra. As questes sobre os

    voluntrios da Ptria e sobre o recrutamento compulsrio demonstram uma

    incoerncia presente tanto no momento histrico quanto na historiografia.

    A Grande Guerra demonstrou a exigncia de um exrcito organizado a nvel

    nacional brasileiro, que teve participao ativa na transformao poltica e social do

    pas. Seja a partir da repercusso de ideias republicanas, que levaram ao fim do regime

    monrquico; ou na questo da hierarquia social, pensando nos escravos e pobres que

    agora faziam parte desse exrcito.

    Referncias bibliogrficas:

    IZECKSOHN, Vitor; Resistncia ao recrutamento para o exrcito durante as guerras

    Civil e do Paraguai in Revista Estudos Histricos, n27. Rio de Janeiro, 2001.

    IZECKSOHN, Vitor; O Cerne da discrdia: A guerra do Paraguai e o ncleo

    profissional do exrcito brasileiro. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exrcito, 1997.

    SALLES, Ricardo; Guerra do Paraguai: Escravido e Cidadania na Formao do

    Exrcito. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990.

    SOUSA, Jorge Prata de; Escravido ou morte: os escravos brasileiros na guerra do

    Paraguai. Rio de Janeiro: Mauad ADESA, 1996.

    73 Idem, pp.114.