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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa Universidade Federal da Paraíba 15 a 18 de agosto de 2017 ISSN 2236-1855 2785 A MATERIALIDADE EDUCACIONAL EM ANÍSIO TEIXEIRA: A RENOVAÇÃO ESCOLAR BRASILEIRA Ana Zélia Maria Moreira 1 Marlúcia Menezes de Paiva 2 Introdução Em carta escrita a Monteiro Lobato, em janeiro de 1947, Anísio Teixeira, afirma que [...] os sonhos não se realizam sem que primeiro se armem os andaimes. E uma construção em andaimes pede imaginação e amor para ser compreendida. (In: NUNES, 1991). Aproximando essa citação atribuímos a construção das ideias pedagógicas de Anísio Spínola Teixeira (1900-1971) à montagem dos andaimes e o sonho à renovação da escola brasileira, considerando a atuação desse intelectual, educador, politico e gestor publico, em defesa de uma educação para todos os brasileiros, por mais de quatro décadas no século XX. O percurso de Anísio Teixeira foi marcante, sintetiza Marcos Freitas “[...] um “homem de Estado”, um articulador da vida pública e das esferas governamentais” (2010, p.50). Cronologicamente, Anísio marca entrada na educação brasileira quando assumiu, em 1924, o cargo de Inspetor da Instrução Pública da cidade de Salvador e no ano seguinte a direção da Educação e Saúde da Bahia, a convite do governo Francisco Marques de Góes Calmon (1924- 1928). Em 1931, como Diretor Geral da Instrução Pública, no Rio de Janeiro, à época, Distrito Federal, governo Pedro Ernesto (1931-1935) e novamente na Bahia, mais um desafio educacional como Secretário de Educação e Saúde da Bahia, governo Otávio Mangabeira (1947-1951) e diretor do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos INEP, Órgão do Ministério da Educação e Cultura, governos de Getúlio Dorneles Vargas (1951 a 1954), João Café Filho (1954 a 1955) e Juscelino Kubitschek de Oliveira (1956 a 1961). Face à impossibilidade de abarcar a totalidade da produção historiográfica pertinente a essas gestões educacionais, incorporamos os estudos de Azevedo (2010), Nunes (1991) e Saviani (2008), dentre outros estudiosos da educação brasileira, os quais evidenciam Anísio 1 Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Educação PPGEd-UFRN. E-Mail: <[email protected]>. 2 Professora Doutora do Programa de Pós Graduação em Educação PPGEd-UFRN. Orientadora do trabalho. E- Mail: <[email protected]>.

A MATERIALIDADE EDUCACIONAL EM ANÍSIO TEIXEIRA: A ... · Aproximando essa citação atribuímos a construção das ideias pedagógicas de Anísio Spínola Teixeira (1900-1971) à

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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa – Universidade Federal da Paraíba – 15 a 18 de agosto de 2017

ISSN 2236-1855 2785

A MATERIALIDADE EDUCACIONAL EM ANÍSIO TEIXEIRA: A RENOVAÇÃO ESCOLAR BRASILEIRA

Ana Zélia Maria Moreira1

Marlúcia Menezes de Paiva2

Introdução

Em carta escrita a Monteiro Lobato, em janeiro de 1947, Anísio Teixeira, afirma que

[...] os sonhos não se realizam sem que primeiro se armem os andaimes. E uma construção

em andaimes pede imaginação e amor para ser compreendida. (In: NUNES, 1991).

Aproximando essa citação atribuímos a construção das ideias pedagógicas de Anísio Spínola

Teixeira (1900-1971) à montagem dos andaimes e o sonho à renovação da escola brasileira,

considerando a atuação desse intelectual, educador, politico e gestor publico, em defesa de

uma educação para todos os brasileiros, por mais de quatro décadas no século XX.

O percurso de Anísio Teixeira foi marcante, sintetiza Marcos Freitas “[...] um “homem

de Estado”, um articulador da vida pública e das esferas governamentais” (2010, p.50).

Cronologicamente, Anísio marca entrada na educação brasileira quando assumiu, em 1924, o

cargo de Inspetor da Instrução Pública da cidade de Salvador e no ano seguinte a direção da

Educação e Saúde da Bahia, a convite do governo Francisco Marques de Góes Calmon (1924-

1928). Em 1931, como Diretor Geral da Instrução Pública, no Rio de Janeiro, à época, Distrito

Federal, governo Pedro Ernesto (1931-1935) e novamente na Bahia, mais um desafio

educacional como Secretário de Educação e Saúde da Bahia, governo Otávio Mangabeira

(1947-1951) e diretor do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos – INEP, Órgão do

Ministério da Educação e Cultura, governos de Getúlio Dorneles Vargas (1951 a 1954), João

Café Filho (1954 a 1955) e Juscelino Kubitschek de Oliveira (1956 a 1961).

Face à impossibilidade de abarcar a totalidade da produção historiográfica pertinente a

essas gestões educacionais, incorporamos os estudos de Azevedo (2010), Nunes (1991) e

Saviani (2008), dentre outros estudiosos da educação brasileira, os quais evidenciam Anísio

1 Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Educação – PPGEd-UFRN. E-Mail: <[email protected]>.

2 Professora Doutora do Programa de Pós Graduação em Educação – PPGEd-UFRN. Orientadora do trabalho. E-Mail: <[email protected]>.

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Teixeira e demais intelectuais, dentre eles: Sampaio Dória, Carneiro Leão, Lourenço Filho,

José Augusto de Medeiros, Lysímaco da Costa, Mário Casassanta, Francisco Campos,

Fernando de Azevedo, como educadores, denominados de reformadores da Instrução pública

brasileira, por atuarem na difusão dos princípios da Escola Nova, defendendo a crença da

escola ser transformadora da sociedade.

Também esses estudos historiográficos apontam a adoção de medidas estratégias por

Anísio nessas administrações, tais como diálogo com intelectuais em distintos espaços e

níveis diferenciados de articulação; interlocução com parlamentares no trâmite de discursão

dos instrumentos legais das reformas de ensino público nos estados; aprofundamento teórico

na área educacional e aproximação com distintas realidades da educação, elaboração de sua

produção literária, dentre outras estratégias.

Em conferência de abertura do XXIII Reunião Anual da ANPEd, referencia Clarice

Nunes,

Anísio não nasceu educador. Tornou-se educador num processo laboriosamente construído, lapidado no diálogo com os diversos educadores que dentro dele transitaram, na intensa experiência dos exercícios espirituais realizados na juventude, nas reflexões suscitadas pelas viagens internacionais, nas fiéis amizades, como a que manteve com Monteiro Lobato e Fernando de Azevedo, na experiência da gestão pública da educação. (NUNES, 2000, p. 5)

Diante disso, compreender a trajetória de Anísio Teixeira, pressupõe situá-lo no

conceito de rede de sociabilidade, apontado por Sirinelli (2003, p.246) como o sentimento

comum a envolver todo grupo de intelectuais que se organiza a partir de uma sensibilidade

ideológica ou cultural comum e de afinidades, que alimentam o desejo e o gosto de conviver.

Este estudo utiliza os Relatórios Administrativos das gestões administrativas, exceto a

atuação no INEP (1952-1964) e Livros, do próprio Anísio Teixeira como fonte de pesquisa e

como categoria de análise – estratégia no entendimento de Certeau (2013), que é considerada

por esse autor como :

“o cálculo (ou manipulação) das relações de forças que se torna possível a partir do momento em que um sujeito de querer e poder (uma empresa, um exercito, uma cidade, uma instituição cientifica) pode ser isolado” (CERTEAU, 2013,p. 93).

Nestes termos, estruturamos este trabalho objetivando compreender a materialidade

das ideias pedagógicas do intelectual e gestor público Anísio Teixeira, como parte de uma das

etapas de nossa investigação de doutorado em andamento, no contexto do processo de

renovação da escola brasileira; explorando os desafios educacionais nessas administrações

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públicas, a constituição de suas ideias pedagógicas, enquanto planejamento do espaço escolar

e, a implementação da escola renovada brasileira nos anos 20 e 40. Contudo, aliada a uma

concepção pedagógica vinculada a visão de mundo, homem e sociedade.

Anísio Teixeira e os Desafios Educacionais

Anísio Teixeira demostrava inquietação quando assumiu a inspeção educacional na

Bahia, diante da extensão do analfabetismo brasileiro, nos anos de 1920 e 1930, uma média

em torno de 79,91% entre homens e mulheres3, situação semelhante aos demais estados do

país, apesar da garantia constitucional4. Em termos regionais, os índices mais significativos

de alfabetização encontravam nos estados do sul e sudeste: Distrito Federal (61,30%); Rio

Grande do Sul (38,80%); São Paulo (29,80%); Santa Catarina(29,5%); Minas Gerais

(20,70%) e nos estados do Nordeste: Bahia (18,40%); Alagoas (14,80%); Piauí (12,00%),

conforme recenciamento geral de 1920.

Apesar de dados oficiais apontarem atendimento escolar na Bahia, os melhores índices

do país nesses anos, Anísio classificava uma realidade educacional de escassez generalizada,

pela pobreza de recursos materiais e humanos, identificada na dispersão e desarticulação dos

serviços educativos, despreparo do professor, imoralidade, corrupção e acomodação dos

serviços públicos, alimentado pela ineficiência da máquina estatal (TEIXEIRA, 1928b).

Nos anos 1930, no Rio de Janeiro, Anísio se depara com um cenário desolador na

capital do país, a educação para uma população escolar mínima – crianças de 6 a 12 anos –

em torno de 196.000, só existiam escolas para 45% das crianças. Além desse reduzido

atendimento escolar os prédios próprios não ofereciam condições adequadas de

funcionamento e, a maioria das escolas era residências particulares disponibilizadas pela

Prefeitura Municipal, constituindo em espaços impróprios ou inadequados (TEIXEIRA,

1935).

Constituíam em mecanismos estratégicos para enfrentamento dessas situações

educacionais nas reformas dos anos de 1920 e 1930, segundo Azevedo (2010, p. 696) estudos

técnicos elaborados por meio de “cadastro” ou de “censo” escolar. Tais estudos demostraram

um cenário mais próximo da realidade na educação baiana nos anos 1920, uma reduzida taxa

3 Da população de 6.155.567habitantes – Fonte: Anuário Estatístico – 2001: IBGE. 4 Com base na Constituição Federal de 1891 e Constituição Estadual da Bahia de 2/07/1891, previsto no artigo

148, do capitulo I, no Titulo X .

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de escolarização, em torno de 8,99% da população de 5 a 19 anos5, associada às carências de

professorado, de material escolar e de escolas inexistentes ou em condições físicas

inadequadas. O próprio Anísio Teixeira confirma em relatório administrativo “[...] não era

somente a cifra reduzida de escolares e de unidades de ensino que era para notar, mas uma

constatação de que frequentava a escola, somente 1,3% da população total e 15% da

população em idade escolar” (TEIXEIRA, 1928b, p. 12).

Havia uma dispersão de atendimento escolar, por um lado, poucos prédios escolares de

ensino primário estadual e municipal, em alguns pontos do Estado da Bahia, um ou outro

prédio municipal; por outro, enquanto a Cidade de Salvador em 1923 não possuía sequer

uma escola primária pública organizada e em condições de eficiência havia um Ginásio oficial

montado com luxuosa liberalidade se o comparassem com as classes elementares, além de

vários colégios secundários particulares, uma Faculdade de Direito, uma Escola Politécnica e

uma Faculdade de Medicina, considerada como uma das mais notáveis do país.

Esse caráter excludente da educação brasileira é citado por Ribeiro, percebido pelo

educador Afrânio Peixoto

[...] o pobre não pode frequentar o Liceu, o ginásio, colégio custam caro. [...] os pobres vão para as fábricas, para as lavouras, para a mão de obra. Os ricos farão exames, depois serão bacharéis, médicos, engenheiros, jornalistas, burocratas, políticos constituirão a elite nacional” (RIBEIRO, 2001, p. 257).

Nesse contexto de exclusão social, Anísio Teixeira fazia alusão “[...] efetivamente,

nesses adiantados princípios do século vinte, o serviço de educação pública ainda estava

jungido à velha orientação colonial de educação para uma classe fina da sociedade”

(TEIXEIRA, 1928b, p. 5).

A educação para aqueles que não se enquadravam nessa classe se restringia à

alfabetização rudimentar prestado por um elevado número de escolas subvencionadas6,

poucas escolas tinham prédio próprio, a maioria das escolas elementares era antigas

residências alugadas que funcionavam em residências de professor e sem condições mínimas

de higiene. Segundo Nunes, Anísio em visitas à escolas presenciou em sala de aula “[...]

alunos escreverem no chão, estirados de bruços sobre os papéis de jornais ou, então, fazerem

seus exercícios de joelhos, ao redor de bancos ou à volta das cadeiras” (NUNES, 2010, p.17).

5 De 12.703.077habitantes a matrícula no ensino primário era de 1.033.421alunos - Fontes: Fundação IBGE, Séries Estatísticas Retrospectivas, 1970; INEP/MEC; Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, n. 101. Nota: (*) Dados estimados.

6 As escolas particulares foram instituídas nas reformas da instrução pública na maioria dos estados brasileiros. Participavam na prestação de serviço de educação elementar e compensadas por subvenção financeira concedida pelo poder público.

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Instrumento técnico semelhante de aproximação da realidade no Rio de Janeiro utiliza

Anísio Teixeira e equipe do Serviço de Prédios e Aparelhamentos Escolares do Departamento

de Educação. Diagnostico situacional proveniente de resultados de inquéritos e

levantamentos dos prédios existentes, além de informações e dados quanto à matrícula,

frequência, promoção, repetência, unidade administrativa, homogeneidade de processos de

ensino, transformado em Relatório apresentado ao executivo estadual, em 1932, refletia o

quadro de carência de atendimento quantitativa e qualitativamente da rede física escolar do

Estado.

Assim também, na educação baiana em 1949, manteve postura idêntica às gestões

anteriores, de elaborar estudos técnicos e expor um balanço da situação dos serviços

educacionais do estado. Afirma Anísio:

Resumem-se em um corpo de professores primários aglomerados nas cidades, ou dispersos pelas vilas e povoados, quase todos sem prédios, instalações e assistência técnica, moral ou mesmo administrativa; um corpo de professores secundários distribuídos em três ou quatro pavilhões de um único instituto secundário, e três institutos de formação do magistério primário, somente um com instalações materiais adequadas, mas lamentavelmente transformado numa confusa e congestionada escola secundária. (TEIXEIRA, 1949, p. 52)

Para Dórea (2003) os estudos desenvolvidos evidenciavam esse quadro de criticidade

de ensino público, os quais foram estabelecidos em trocas de experiências entre gestores

educacionais, dentre eles: Anísio Teixeira, Afrânio Peixoto, Antônio Carneiro Leão, Lourenço

Filho, Aluísio de Azevedo e possibilitaram “[...] compreenderem os mecanismos jurídicos e

institucionais envolvidos nos processos das reformas educacionais e a identificarem às

vantagens oferecidas pela realização de pesquisas sistemáticas sobre a situação do ensino e

seus problemas” (DÓREA, 2003, p. 48).

Como referenciado preliminarmente, nesses termos trazemos Sirinelli (2003, p. 246)

que identifica entre esses intelectuais-educadores uma articulação a partir de uma

sensibilidade ideológica ou cultural comum e de afinidades. Sobre esse aspecto, Câmara

referencia o educador Fernando de Azevedo e o projeto da Reforma da Instrução no Rio de

Janeiro (1928), quando diz: “[...] pensar esse projeto reformador significa compreender seu

idealizador nas injunções do seu tempo e nas redes de sociabilidades constituídas de que o

educador em questão participava, comungava e divergia” (CAMARA, 2011, p. 181).

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Nesse sentido, Cavaliere evidencia que antes da viagem de Anísio Teixeira aos EUA em

1927, o projeto de Lei da Reforma da Instrução Pública da Bahia7 se encontrava em

andamento no qual “[...] a influência de ideias renovadoras era perceptível, ainda que

predominasse o sentido republicano democratizador” (CAVALIERE, 2010, p. 250).

Dessa forma, o intelectual e gestor Anísio Teixeira se empenhava na montagem dos

andaimes em busca do sonho - uma escola pública para todos os brasileiros.

A Construção dos Andaimes Mediante Medidas Estratégicas

O intelectual Anísio Teixeira mantinha diálogos em distintos espaços com intelectuais

educadores que integravam os movimentos de renovação da pedagogia e pratica escolar

sintonizados com as novas dinâmicas da sociedade, dos finais do século XIX. Defendiam

novas ideias e técnicas pedagógicas circulantes na Europa e Estados Unidos, tendo a Escola

Nova ou Escola Ativa como novas concepções pedagógicas. Contudo, essas ideias e praticas

circulantes entre os intelectuais se estabeleciam numa rede de sociabilidade (DÓREA, 2003).

Dentre os diferentes espaços sociais no qual participava Anísio Teixeira, a Associação

Brasileira de Educação( ABE) criada em 1924 e instalada no Rio de Janeiro, contribuía para

os diálogos educacionais, sobretudo doutrinas e reformas de ensino. Para Fernando de

Azevedo essa sociedade de educadores se configurou como

[...] centro de coordenação e de debates para o estudo e solução dos problemas educacionais, ventilados por todas as formas, em inquéritos, em comunicação à imprensa, em cursos de férias e nos congressos que promoveu nas capitais dos Estados. (AZEVEDO, 2010, p. 696)

Também, essa instituição foi responsável pela organização de conferências ou

congressos nacionais de educação até 1937, inclusive palco de divulgação da produção

literária de Anísio Teixeira8.

Os permanentes diálogos na ABE resultaram numa das mais significativas

contribuições de intelectuais/educadores brasileiros no século XX - o Manifesto dos

Educadores da Escola Nova9, carta/documento estabelecido as diretrizes de uma politica

7 Decreto n. 1.846 de 14/08/1925 e Decreto n. 4.218 de 30/12/1925 respectivamente. 8 O livro “Educação não é privilégio”, reuniu duas conferencias, em sua primeira edição publicada em 1957. A

primeira que corresponde ao nome do próprio livro, data de 1953, pronunciada na Escola Brasileira de Administração Pública, da Fundação Getúlio Vargas; e segunda conferencia intitulada “A escola pública, universal e gratuita” de 1956, foi pronunciada no I Congresso Estadual de Educação Primária, em Ribeirão Preto, São Paulo.

9 A Reconstrução Educacional no Brasil, documento apresentado ao povo e ao governo e publicado em 1932, no Rio de Janeiro e São Paulo. Azevedo(2010, p. 722).

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escolar nacional, inspirada em novos ideais pedagógicos e sociais e planejada para uma

civilização urbana e industrial.

Os signatários do Manifesto expressava em documento dever do Estado tornar a

educação obrigatória, pública e gratuita para todos os níveis de ensino mediante programa de

âmbito nacional. Dentre os pontos contidos nas diretrizes propostas, destacamos a

organização da educação popular, urbana e rural, concebida por Anísio Teixeira na forma de

sistema escolar e empreendida em suas gestões educacionais.

A articulação de Anísio também se constituiu na busca de conhecer novos processos

educacionais e aspectos materiais em instituições de ensino de países estrangeiros, após

assumir a direção da Instrução da Bahia em sua primeira gestão. Em 1925, numa primeira

experiência de poucos dias viajou à Espanha, Itália, França e Bélgica e, dois anos depois, aos

Estados Unidos.

A montagem dos andaimes de Anísio continuava em construção e a viagem

comissionada aos Estados Unidos constituiu numa oportunidade de realização de curso de

especialização com obtenção de título de Master of Arts correspondente a Mestrado em

Educação na Universidade de Columbia, em Nova York; aproximação da obra de John Dewey

e W. H Kilpatrick, os quais marcaram fortemente sua formação e lhes deram base teórico-

filosófica para a construção de um projeto de educação brasileira, alinhando a experiência

com instituições públicas e privadas, sobretudo os sistemas escolares de atendimento

populacionais diferenciados o que lhe proporcionou uma experiência ímpar. Conciliar teoria

educacional com a prática foi entendida pelo próprio Anísio como “[...] viagem especializada,

onde fui buscar elementos positivos de informação”(TEIXEIRA, 1928a, p. 205).

Para Anísio as contribuições estrangeiras ampliaram para sua formação educacional,

contudo prevaleceram os novos conhecimentos educacionais nos Estados Unidos “[...] os

moldes do meu pensamento nesse assunto, se se moldaram na Europa, se aproximam hoje,

vivamente, dos americanos” (TEIXEIRA, 1928a, p. 206).

No ano de 1927, em vinte dias Anísio visitou diferentes sistemas de ensino,

aproximando-se de métodos de ensino, aparelhamento escolar e organização espacial de

Escolas Rurais, Colégios e Escolas Secundárias Normais, tais como, Escola Secundária

Normal de Flemington, Colégio Normal de Farmville e Escola Secundária Normal da cidade

de Towson e o Instituto de Hampton.

Essa permanência de Anísio Teixeira nos estados americanos fora documentado em

diário de bordo na viagem de retorno ao Brasil, cujos registros se transformaram num

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exaustivo relatório, de certa forma prestação de contas ao governo Calmon, com a

denominação de Anotações de viagem aos Estados Unidos.

Alguns aspectos educacionais são evidenciados por Anísio Teixeira nesses registros,

dentre eles: os sistemas escolares no interior dos estados americanos; a organização escolar,

em Cheveland; as atividades práticas do Colégio Normal de Farmille e o funcionamento das

escolas rurais. Quanto à organização espacial dos estabelecimentos a implantação dos

edifícios entre vastos campos, para Anísio Teixeira as edificações transmitiam “[...] sensação

de beleza e de tranquilidade” (TEIXEIRA, 1928a, p. 143).

Estas impressões somam-se as de instalações prediais “luxuosas”, equipamentos e

aparelhamento escolar apropriados, inclusive a distribuição interna dos edifícios escolares.

Para Anísio, essa visita permitiu estabelecer a diferença com os colégios da Europa,

sobretudo os da França, para esse educador denotavam “[...] de uma certa fixidez, de

estabilidade, de um equilíbrio conseguido e que se quer manter” (idem. p. 99).

Um outro aspecto de destaque foi o sistema platoon como uma nova organização e de

construção escolar fundamentado nos princípios do filósofo Dewey:

É uma escola elementar que funciona simultaneamente em dois grupos, sendo ministrado, em determinado tempo, ensino das matérias fundamentais do curso elementar a um deles, enquanto o outro se ocupa com as matérias especiais (TEIXEIRA, 1928a, p. 179).

Esse sistema americano proposto no Plano de Reconstrução Escolar do Manifesto dos

Educadores Brasileiros de 1932, constituiu proposta de organização escolar adaptada e posta

em pratica por Anísio Teixeira nas administrações no Rio de Janeiro(1935) e Bahia(1947).

A aproximação de Anísio Teixeira com educação americana resultou seu entendimento

de que esta “[...] propõe não a preparar para a vida, mas a ser a própria vida”. Considerando

preparação para a vida [...]no sentido em que podemos compreender que os nossos dias

passados e os nossos dias presentes nos preparam para os dias que hão de vir”(TEIXEIRA,

1928a, p. 166).

A prática educacional do gestor Anísio Teixeira associada à experiência americana foi

contabilizada em críticas gerando a categorização de americanismo de Anísio Teixeira.

Acreditava o diretor da Instrução baiana na “excelência da escola americana”, em retorno ao

país implementou medidas educacionais, em curso de férias junto ao professorado baiano

disponibilizou para aprofundamento a obra do belga Omer Buyse - Métodos Americanos de

Educação (ROCHA, 2011).

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Contudo, para Carvalho (2000, p.50) Anísio Teixeira no sentido de transplantar para o

solo brasileiro instituições capazes de “catalisar processo de transformação social” o fazia

considerando as devidas adaptações. Também nesse entendimento coaduna Saviani

o educador Anísio Teixeira esteve atento às condições brasileiras e admitia a proposição de organização de serviços centralizados de apoio ao ensino e não transportara, simplesmente o sistema americano de Dewey, no qual estavam presente os princípios desse filósofo em direção à pedagogia da Escola Nova. (SAVIANI, 2008, p. 226)

Neste sentido, o intelectual Anísio Teixeira elabora suas ideias pedagógicas, a própria

montagem dos andaimes no processo de renovação escolar por meio de redes de

sociabilidades e estrategicamente nas administrações educacional públicas buscando

formatar um sistema de ensino, condizente com seu sonho – uma escola pública para todos

os brasileiros.

A Renovação da Escola: o Sonho Sonhado

As iniciativas e realizações educacionais empreendida por Anísio Teixeira na Bahia

(1924-1928) não se restringiu às questões pedagógicas, possibilitou implementar uma

organização administrativa centralizada com ênfase no planejamento educacional, em

especial a relação com a arquitetura escolar. Consistia numa nova concepção de escola e a

efetiva realização de programas de construção escolares com as municipalidades, que para

Anísio Teixeira se estabelecia uma aconselhável praticidade (DÓREA, 2000).

Segundo França Rocha (2011, p. 80) foram acrescidos 3.6% prédios próprios escolares

de ensino primário baiano ao reduzido número existente e aumento da matrícula em torno de

58%. O atendimento no ensino normal ampliado em mais de 56% com a instalação de duas

Escolas no interior e a da capital transformada em modelo para formação do professor

primário em quatro anos. Apesar de previsto, a implantação da Escola Normal Superior para

a capital não foi instalada, entendida por Anísio “[...] como faculdade de educação do estado,

destinada ao aperfeiçoamento pedagógico e literário dos professores” (TEIXEIRA, 1928b,

p.62).

Entretanto, para esse gestor a despeito das dificuldades de implementação da reforma

em sua totalidade, prevaleceu o predomínio do caráter educativo com ampliação de sete anos

de permanência do aluno na escola primária:

[...] dando-lhe um sentido estreitamente condicionado às situações sociais e geográficas de nossa terra, penetrando-o de um largo espírito democrático e universal e fazendo do seu curso a verdadeira pedra angular do sistema de educação estadual (TEIXEIRA 1928b, p. 20).

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Essa proposição de sistema escolar se amplia quando Anísio Teixeira assume a direção

educacional no Rio de Janeiro, em 1931. Sua implantação estava condicionada a um plano

geral de construções, cuja implantação se daria num prazo de 10 anos, em dois períodos de 5

anos.

O plano mínimo de construção, até o ano de 1938, previa construção 1.956 novas salas

de aula; sendo 306 em prédios municipais existentes; 1.431 dos 74 novos prédios do tipo

médio de 25 classes e 219 em 25 prédios que poderiam ser aproveitados. Essa meta baseava-

se na ocupação de 40 alunos por sala de aula e funcionamento das escolas em dois turnos,

para permitir acesso a 156.480 alunos.

No segundo prazo, ano horizonte de 1942, previa 320.000 novas vagas com a

construção de mais 82 novos prédios.

O sistema escolar concebido por Anísio incorporava a concepção de duas naturezas de

escolas: as escolas nucleares ou “escolas classe” e playground ou “escolas parques”. Estas se

alinhavam as experiências vivenciadas aos sistemas de ensino americano, nos anos de 1927, e

sua efetivação se apresentava como solução técnica para as áreas de significativas

concentrações escolares do Rio de Janeiro, em que se mostravam as carências em relação ao

terreno, à localização, à economia e ao programa educacional.

Sendo que nesse “sistema” escolar as crianças frequentariam regularmente as duas

escolas e necessariamente deveria funcionar em dois turnos, para cada criança. No primeiro

turno, a criança receberia, em prédio adequado e econômico (escola-classe), o ensino

propriamente dito; no segundo turno, receberia, em um parque escolar aparelhado e

desenvolvido, a sua educação propriamente social, a educação física, a educação musical, a

educação sanitária, a assistência alimentar e o uso da leitura.

Os projetos arquitetônicos das novas escolas foram concebidos pelo arquiteto-chefe

Enéas Silva, da Divisão de Prédios e Aparelhamentos do Departamento de Educação, de

cinco tipos de escolas de acordo com os estudos de expansão escolar:

a) Escola Tipo Mínimo, com 2 salas de aula e uma sala de oficinas, destinava-se a

regiões de reduzida população escolar;

b) Escola Tipo Nuclear ou escola-classe: era constituída de 12 salas de aula,

ambientes para administração, secretaria e biblioteca de professores, e deveria

ser complementada com o parque escolar;

c) Escola Platoon 12 classes (6 salas comuns e 6 salas especiais);

d) Escola Platoon 16 classes (12 salas comuns e 4 salas especiais);

e) Escola Platoon 25 classes (12 salas comuns, 12 salas especiais e o ginásio).

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No final da administração de Anísio em 1935, a execução física do plano regulador de

edificação escolar, 25 prédios escolares foram construídos,10 correspondendo um pouco mais

de 16% das 1.956 salas de aula estimadas para o ano de 1938. Para Dórea (2003) a oferta

prevista no plano mínimo atenderia aproximadamente 80% das crianças em idade escolar.

Nestes termos, estaria acumulado déficit de atendimento escolar desde o ano base de 1932,

tendo em vista que a população em idade escolar correspondia aproximadamente 195.600

crianças. Entretendo, Oliveira faz a observação ,

[...] embora esse número estivesse ainda distante daquele calculado para cumprir a primeira etapa de edificações (74 prédios para atender 156.480 alunos), a realização podia ser considerada excepcional dado o período de sua execução que compreendeu os anos de 1934 e 1935, logo após a definição da política e dos programas em educação. (OLIVEIRA, 1991,p.167.)

Outro aspecto, Dórea faz referência à implantação da escola do tipo "parque escolar"

ou escola-parque, que “[...] não encontrou registro de planta baixa, nem indicação de que

tenha sido construído, embora o Relatório Administrativo de 1935, o tenha referenciado”

(DÓREA, 2003, p.86).

Sobre as escolas nucleares ou escolas-classes (onze Escolas Tipo Nuclear de doze

classes) construídas na proposta concebida por Anísio Teixeira, funcionavam nos antigos

moldes impossibilitando, dessa maneira, a permanência da criança na escola durante os dois

turnos, como havia sido previsto inicialmente. Diante do exposto conforme os estudos de

Dórea, a proposta de educação integral idealizada por Anísio Teixeira para o Rio de Janeiro,

na prática, não se efetivou.

Entretanto, aproximando as observações de Oliveira(1991) para Saviani (2008 p. 219)

Anísio Teixeira coloca em prática suas ideias renovadoras, de modo especial, no âmbito da

formação de professores cria o Instituto de Educação e transforma a Escola Normal em

Escola de Professores, integrando Jardim de Infância, Escola Primária e Escola Secundária,

as quais funcionavam como campo de experimentação para os cursos de formação de

professores. Em 1935, com a criação da Universidade do Rio de Janeiro a Escola de

Professores foi integrada com o nome de Escola de Educação. Neste ano, Anísio Teixeira se

demite do cargo, em função das circunstâncias políticas do país, assume atividades no ramo

empresarial de minério na Bahia e, retorna ao cargo de diretor da educação baiana,

novamente em 1949.

10 02 Escolas Tipo Mínimo de 3 classes, 11 Escolas Tipo Nuclear de 12 classes, 05 Escolas Platoon de 12 classes, 02 Escolas Platoon de 16 classes, 03 Escolas Platoon de 25 classes, 01 Escola Tipo Especial de 6 classes e 01 Acréscimo de 12 classes.

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Nesse estado na perspectiva de contrapor o cenário de criticidade da educação, em

particular às condições precárias e/ou inexistência dos prédios escolares, Anísio Teixeira

elabora conjuntamente com equipe de aparelhamento escolar um plano especifico de

expansão escolar para o interior e capital do estado. Prever uma solução progressiva e

gradual de implantação de edificações, inclusive de centros populares para criança ao

adolescente de 18 anos. Essa proposição estava condicionava aos estudos de planejamento de

rede escolar incluindo estabelecimento de parâmetros técnicos, dentre eles: raio de

abrangência da escola, localização, condições de terreno, também referenciados na proposta

do Rio de Janeiro nos anos de 1930.

Em função da necessidade de cobrir o déficit de prédios escolares o plano regulador de

escolas previa quatro tipos: escolas provisórias, escola semiprovisória e escola permanente11.

A escola permanente, com construção definitiva comportando diversos tipos de prédios:

a) o mínimo – prédio de pelo menos três salas de aula, além de ambientes para

trabalhos manuais, biblioteca e administração (escola mínima)

b) o nuclear - prédio de pelo menos seis salas, uma biblioteca, um pequeno

auditório, ambientes administrativos, comportando acréscimos (escola nuclear)

c) Escola Compreensiva - prédio de pelo menos 12 salas de aula, uma biblioteca,

salas para cursos de adultos, salas para agencias de informação, para

professores, para administração, além de instalações para educação física e

jogos recreativos. (Grupos escolares) A Escola Compreensiva é desta forma

definida pelo educador:

É chamada compreensiva porque incluirá, além do curso elementar integral com pequenas oficinas de artes industriais, o ensino de extensão aos adultos, e a biblioteca e o auditório de aplicação mista. Nela é que a escola primária se desdobrará em todos os seus aspectos e em que se processará o que está aqui denominado de recuperação da escola primária. (TEIXEIRA, 1948, p. 8)

As propostas de Anísio estimavam para o interior do estado dois sistemas de ensino:

um sistema de educação elementar, incluso zona urbana e rural dos municípios e um sistema

de ensino médio ou secundário, com a previsão de construção de Centros Regionais de

Educação, a serem localizados em 10 regiões administrativas, nos quais deveriam

compreender: jardim de infância, escola elementar modelo, escola normal, escola secundária,

parque escolar, centro social e de cultura e internatos. Para Martha Dick(2000) os centros

urbanos de mais de cinco mil habitantes incorporariam a concepção de Escola Compreensiva,

de certa forma uma primeira ideia dos Centros Educacionais.

11 Segundo (Dórea, 2003) as escolas provisórias seriam implantadas em casos extremos poderia ser, inclusive, ser um simples galpão e a escola semiprovisória com construção precária e econômica, embora mais estável.

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Para a capital, compreendia um sistema de escolas elementares, articulado com um

conjunto de escolas secundárias de cultura geral e técnica e da escola de formação de

professores em nível de ensino superior. A proposta para Salvador a criação de dez centros de

educação popular, dos quais apenas o Centro Educacional Carneiro Ribeiro foi implantado,

cuja obra fora concluída quando Anísio Teixeira, então diretor do INEP/MEC.

O sistema de escolas elementares ou Centros de Educação Popular constituía um

conjunto de escolas-classe e escolas-parque, a concepção experimentada originalmente no

Rio de Janeiro, nos anos 1930. Previstos serem implantados na periferia da cidade, como um

núcleo de articulação do bairro, compreendido como integração da escola ao

desenvolvimento urbano da área.

O Centro Educacional Carneiro Ribeiro, mais conhecido como "Escola Parque",

transformou-se em obra máxima de seu idealizador Anísio Teixeira, notabilizada pela

proposta pedagógica/arquitetônica inovadora e experiência pioneira de escola pública de

educação integral em meados do século XX. Implantado no bairro da Caixa d'Água em área

de 42.292 m2, arborizada e gramada, de arquitetura modernista concebido pelos

profissionais brasileiros Paulo Assis Ribeiro, Diógenes Rebouças e Hélio Duarte.

Estabelecia-se o complexo escolar de quatro escolas-classe de nível primário para mil

alunos cada, com funcionamento em dois turnos; uma escola parque, com sete pavilhões

destinados às práticas educativas, onde os alunos completavam sua educação no turno

alternado ao da classe. Em 1958, o Centro Educacional Carneiro Ribeiro recebe a visita de seu

idealizador – o sonho se transformara em realidade.

Figura 1 – Anísio e sonho sonhado Fonte: Anísio Teixeira – A construção da educação brasileira (2000, p. 16).

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Considerações Finais

Anísio Teixeira em diferentes níveis de atuação, no pais e fora, por meio de redes de

sociabilidades se articulou dialogando com seus pares, teóricos da educação Nova,

vivenciando experiências de diferentes instituições de ensino para seu enriquecimento

intelectual na área educacional e estrategicamente nas gestões públicas buscou implementar

suas ideias pedagogias, sobretudo a concepção de sistemas de ensino que possibilitaria a

renovação da escola para todos os brasileiros.

De certa maneira, a analogia que atribuímos a construção das ideias pedagógicas de

Anísio Teixeira à montagem dos andaimes e o sonho à renovação da escola brasileira se

constituíram em encaixes de peças teorias e praticas educacionais e o olhar a apreciação da

escola sonhada.

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