145
1 Renata Emy Koyama A Mobilidade de Pacientes Obesos no Pós-Cirúrgico Bariátrico Dissertação de Mestrado em Psicologia Clínica Pontifícia Universidade Católica São Paulo

A Mobilidade de Pacientes Obesos no Pós-Cirúrgico Bariátrico Koyama.… · radical, tendo um resultado de emagrecimento em curto espaço de tempo, modificando rapidamente a estrutura

  • Upload
    others

  • View
    1

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

1

Renata Emy Koyama

A Mobilidade de Pacientes Obesos no

Pós-Cirúrgico Bariátrico

Dissertação de Mestrado em Psicologia Clínica

Pontifícia Universidade CatólicaSão Paulo

2

2007

A Mobilidade de Pacientes Obesos no

Pós-Cirúrgico Bariátrico

Renata Emy Koyama

Banca Examinadora

_________________________

_________________________

_________________________

Dissertação defendida e aprovada em: ____ / ____ / 2007.

Pontifícia Universidade CatólicaSão Paulo

3

2007

Renata Emy Koyama

A Mobilidade de Pacientes Obesos no

Pós-Cirúrgico Bariátrico

Dissertação apresentada àbanca Examinadora da PontifíciaUniversidade Católica de SãoPaulo, como exigência parcialpara obtenção do título deMESTRE em Psicologia Clínica,do Núcleo de Psicossomática ePsicologia Hospitalar, sob aorientação da Profª DoutoraMathilde Neder.

4

Pontifícia Universidade CatólicaSão Paulo

2007

À minha família, em

especial minha mãe, Marina

Tsuyaco Ascava Koyama, que

acreditou, dedicou, confiou,

5

acolheu e deu amor em todos

os dias da minha vida.

AGRADECIMENTOS

À minha orientadora, Profª Drª Mathilde Neder, que me acolheu,

compreendeu e ensinou, com muito amor, amizade, dedicação, eficiência e

capacidade; principalmente nos momentos difíceis.

À Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, que ajudou me com sua

infra-estrutura a adquirir um maior conhecimento.

Ao Conjunto Hospitalar de Sorocaba, à equipe de Cirurgia Bariátrica, Drª

Débora, Drª Maria Tereza, Dr. Celso e Drª Ana Célia; em especial a secretária

Jovelina que me ajudou nas questões administrativas de agendamento dos

pacientes e local.

Aos professores da Pós-Graduação em Psicologia Clínica, do Núcleo de

Psicossomática e Psicologia Hospitalar, em especial a Profª Drª Marlise Aparecida

Bassani, pelo muito que me ensinou.

Ao Drº Mitsunori Matsuda que esteve sempre presente e disposto nos

momentos que precisei de sua ajuda.

Aos meus queridos colegas da Pós-Graduação em Psicologia Clínica, do

Núcleo de Psicossomática e Psicologia Hospitalar, Rosa, Enéas, Mariângela,

Rodrigo, André, Ana, Cristina, Sueli, em especial, a Maria Luiza e ao George

Barbosa que sempre estiveram dispostos a me ajudar em todos os momentos.

6

Aos meus grandes amigos, Valdir Figueiredo e Márcia de Godoy Andrade,

que me ajudaram e me acolheram em sua casa nos momentos que estive na cidade

de São Paulo.

À minha amiga Marina, à Simone, em especial à Gertrudes e à Drª Ana Laura

Shliemann, que me ajudaram e me acolheram em sua casa nos momentos que

estive em Sorocaba.

Aos sujeitos da pesquisa que colaboraram para que se concretizasse esse

estudo.

À minha família que esteve sempre presente, ajudando-me, durante todo o

momento de minha vida, principalmente meus pais e minha avó, Elza Takako

Ascava.

E a todos, de modo geral, que, direta ou indiretamente, contribuíram para a

realização desse trabalho.

7

Resumo

A pessoa portadora de obesidade mórbida possui sérios problemas de saúde,

pois dela decorrem doenças orgânicas e psicossociais adversos que em grande

parte advém de sua mobilidade pessoal prejudicada.

O dia-a-dia da pessoa obesa mórbida é muito difícil, pois entre as dificuldades

de sua mobilidade estão o tomar banho, vestir-se, amarrar os sapatos, deslocar-se

de um lugar ao outro devido a falta de ar, entrar num veículo, subir escadas, sentar-

se nas cadeiras de ambientes sociais que são pequenas e frágeis, entre outros.

Dessa forma, a cirurgia bariátrica surge como um tratamento invasivo e

radical, tendo um resultado de emagrecimento em curto espaço de tempo,

modificando rapidamente a estrutura física que conseqüentemente acarreta

mudanças psicológicas e sociais na pessoa; e a mobilidade da pessoa após alguns

meses da cirurgia exige reorganização radical.

O presente trabalho sob o enfoque fenomenológico, procura identificar o

significado da mobilidade para pacientes obesos, após a cirurgia bariátrica, face a

rápida mudança corporal; sendo importante no tratamento pós cirúrgico o

acompanhamento psicológico e a relação da mobilidade neste contexto, para que

venha contribuir com mais informações sobre as dificuldades por que passam esses

pacientes.

Os resultados encontrados sobre o significado da mobilidade nos três meses

pós-cirúrgico bariátrico foram: alegria, felicidade, vitória, ser outra pessoa, bem

melhor que antes, a coisa mais importante na vida e tudo.

8

Abstract

The person with morbid obesity has serious health problems , due to it may

occur organic diseases, adverses psychosocial mainly caused by the affected

personal mobility.

The day-by-day of a morbid obese person is very difficult, due to the lack of

mobility, activities like to take shower, to get dressed, to tie the shoes, to walk from a

place to another ( because it´s breathtaking ), to enter in a vehicle, to go upstairs and

to sit in unapropriated chairs, become hard.

This way, the bariatric surgery arises as an invasive and extreme treatment,

resulting in loss of weigth in a short period of time, modifying quickly the physical

structure causing psychological and social changes to the person; and the mobility of

the person after some months of the surgery can be modified.

The objective of this work in a phenomenonlogic focus is to identify the

meaning of mobility for obeses patients after the bariatric surgery, faced with the fast

corporal change; being important the psychological treatment after the surgery and

the relation of mobility in this context, to contribute with more information about the

difficulties the patients go through.

The results that were found about the meaning of mobility three months after

bariatric surgery are: joy, happiness, victory, they felt like another person and better

than before, the most important thing in life and all.

9

SUMÁRIO

I.INTRODUÇÃO __________________________________________________ p.11

II.OBJETIVO ____________________________________________________ p.17

III. PSICOSOMÁTICA NA OBESIDADE ___________________ ____________ p.18

1) Epidemiologia e visão clínica na obesidade _____ ________________ p.18

2) Visão sóciocultural da obesidade - Tratamentos _ ________________ p.22

3) Mobilidade e obesidade _________________________ ____________ p.25

4) Mobilidade do paciente obeso mórbido ___________ _____________ p.27

5) Cirurgia bariátrica e mobilidade________________ _______________ p.30

6) Dimensão psicossomática ________________________ ___________ p.32

IV. MÉTODO ____________________________________________________ p.35

1) Sujeitos _______________________________________ ___________ p.35

2) Local __________________________________________ ___________ p.37

10

3) Instrumentos ___________________________________ ___________ p.37

4) Cuidados éticos ________________________________ ____________ p.39

5) Coleta de dados_________________________________ ___________ p.40

V. RESULTADOS E ANÁLISES DOS DADOS ________________ __________ p.43

1) Procedimento da análise ________________________ ____________ p.43

2) Dados sobre os sujeitos ________________________ _____________ p.43

3) Entrevistas ____________________________________ ____________ p.44

VI. DISCUSSÃO _________________________________________________ p.71

VII. CONSIDERAÇÕES FINAIS _____________________________________ p.74

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ________________________ __________ p.76

ANEXO

A: Termo de Consentimento do Sujeito ______________ __________ p. 79

B: Termo de Consentimento do Pesquisador __________ __________ p.82

C: Entrevista Estruturada _________________________ ___________ p.83

D: Entrevista Semi-Estruturada ____________________ ___________ p.84

11

E: Entrevistas dos Sujeitos _______________________ ___________ p.85

I - INTRODUÇÃO

O presente estudo decorreu da minha experiência em campo de trabalho

numa cooperativa médica, cuja diretoria solicitou a implantação de grupos

terapêuticos com pessoas obesas.

O objetivo do trabalho terapêutico era diminuir o número de consultas a

endocrinologistas no ano de 2002, por motivos econômicos, uma vez que o

tratamento da pessoa obesa é oneroso. A pessoa obesa é portadora de patologias

como: transtornos respiratórios e cardíacos, diabetes, hipertensão arterial,

osteoartrite e fatores psicossociais adversos, entre outros. Tratava-se, portanto, de

um investimento preventivo a médio e longo prazo.

12

O trabalho era conduzido por uma equipe multiprofissional, envolvendo áreas

de Enfermagem, Nutrição e Psicologia. Os pacientes recebiam atendimento

semanal.

No mês de março do ano de 2004, fui convidada a trabalhar na equipe da

cirurgia bariátrica do Conjunto Hospitalar de Sorocaba, como psicóloga voluntária do

grupo pós-cirúrgico, onde atuei até o mês de julho do ano de 2005.

No Conjunto Hospitalar de Sorocaba, a referida cirurgia (bariátrica) foi

credenciada pelo governo do Estado de São Paulo no ano de 2003. A equipe

responsável por esse procedimento cirúrgico é multidisciplinar, composta por

assistente social, nutricionista, equipe médica (endocrinologista, cirurgião e

anestesista) e psicólogos.

Através da experiência prática, de muita leitura e estudos, percebi que grande

parte da população obesa consegue perder peso no tratamento, mas, após alguns

meses ou anos, recuperam o peso perdido ou até mais. O emagrecimento, nesse

caso, é algo muito complexo e requer mudança de comportamento, de estilo de vida

e reeducação alimentar, o que, sob o aspecto psicológico, pode ser extremamente

difícil.

A vivência com pacientes obesos mórbidos submetidos à cirurgia bariátrica

despertou meu interesse sobre a mobilidade desses pacientes após a cirurgia, ou

seja, a sua relação com o movimento de se deslocar de um lugar para outro.

O dia-a-dia da pessoa obesa mórbida é muito difícil. Destacam-se, entre as

dificuldades de sua mobilidade, os efeitos sobre uma de suas atividades de vida

diária, como tomar banho. Necessitando de um espaço maior no banheiro para

movimentar-se, muitas vezes não alcançam lugares em seu corpo para se lavarem,

como suas partes íntimas, pernas e pés, necessitando da ajuda de seu (sua)

companheiro (a), ou de alguém mais próximo.

Após o banho, ao se vestirem, muitas vezes não conseguem colocar as meias

e, depois, precisam de ajuda para calçar-se, principalmente com sapatos de

cadarço. As mulheres relatam que evitam comprar sandálias, pois sempre precisam

de ajuda para colocá-las e, para não incomodar alguém, acabam optando por

13

tamancos, chinelos de dedos, quando gostariam de usar sandálias para se sentirem

mais femininas.

O auxílio de que precisam no dia-a-dia, apesar de simples, causa grande

constrangimento e sentimento de dependência, pois há ocasiões em que as pessoas

não estão dispostas ou precisam parar alguma atividade para auxiliá-las, nem

sempre havendo, portanto, boa vontade dos demais.

Outra dificuldade é sair de casa, pois o deslocamento é muito difícil. Devido à

obesidade, sua resistência respiratória é prejudicada, não conseguindo caminhar

com o desempenho de uma pessoa normal. Sentem muita falta de ar e dores nas

pernas e joelhos.

Caso a pessoa obesa mórbida opte por utilizar uma condução, por exemplo

um ônibus, como a grande maioria da população, a dificuldade tem início ao entrar

no veículo, pois as escadas são muito altas, o que exige sacrifício e causa dores ao

subir. Em seguida, encontram a catraca, onde costumam ficar "entaladas", o que

provoca olhares críticos ou zombarias dos demais passageiros.

Quando solicitam a abertura da porta traseira do ônibus, alguns motoristas

resistem, ordenando que utilizem a porta da frente como todos os passageiros, e,

quando conseguem descer pela porta traseira, os passageiros olham-nas como se

fossem "coitadinhas", ou lançam um olhar preconceituoso (“gordo preguiçoso").

Sentem-se o centro da atenção discriminatória.

Na tentativa de evitar essa humilhação, pedem carona para as pessoas que

possuem automóveis, mas muitos negam, alegando que, devido ao seu peso, ocorre

um desgaste maior do motor do carro, solicitando que encontrem outro modo de

condução.

Ao conseguir se deslocar para lugar desejado, encontram outro obstáculo.

Muitos lugares não estão preparados para receber pessoas obesas. A maioria dos

bares possui somente cadeiras de plástico, que não suportam muito peso. Na

tentativa de acreditarem que nada acontecerá, muitos obesos que nelas se sentam

vão parar no chão, já que as pernas da cadeira se abrem, sendo mais um motivo

para gargalhadas e humilhações.

14

Enfim, todas as vezes que procuram sair, evitam lugares a que muitas vezes

gostariam de ir e, para não sofrerem constrangimentos acabam escolhendo sempre

o mesmo lugar que nem sempre as agrada, mas que garante a sua segurança.

Em ambientes sociais, como cinemas ou teatros, sentem-se desprezados,

pois as cadeiras são estreitas demais para o seu tamanho, impedindo o seu acesso.

Devido a essa situação, dentre outros fatores, a cirurgia bariátrica trouxe uma

nova esperança para muitas pessoas com obesidade mórbida, dando-lhes

esperança de novas perspectivas e melhor qualidade de vida, uma vez que essas

pessoas são privadas de uma vida social, afetiva e profissional.

Nos três meses após a cirurgia, período em que os pacientes passam por

uma alimentação de dieta líquida e pastosa, e estão em uma nova etapa de ingestão

de alimento sólido, ocorre uma perda considerável de peso corpóreo, mais rápido,

do que o modo convencional ou natural (através de regimes ou dietas), ou seja, 17%

a 26% de peso corpóreo medido por IMC de acordo com pesquisas recentes

(CASALNUOVO, EGUILEOR, BRITES E BRAGINSKY, 2001; GARRIDO, 2000).

Desta maneira, os pacientes geralmente percebem que o seu peso diminui

rapidamente e sua aparência física muda substancialmente. Retomam um ritmo de

vida normal, buscando adaptar-se à sua nova forma de se alimentar, pois voltam a

ingerir alimentos sólidos como antes da cirurgia sabendo, no entanto, o que podem e

o que não podem comer.

As pessoas do seu relacionamento percebem seu emagrecimento. Passam a

receber muitos elogios, começam a cuidar melhor de sua aparência física, suas

roupas ficam largas, e melhora sua resistência física que antes era um fator

agravante para a sua locomoção.

Entre as mudanças de mobilidade, a maioria dos pacientes relatam, com

muito entusiasmo, que as atividades de vida diária se modificaram substancialmente,

como tomar banho e conseguir lavar-se por inteiro, colocar as meias, amarrar os

sapatos, vestir-se sozinhas, caminhar por um percurso maior, sem sentir falta de ar e

dores intensas nas pernas como antes, e até mesmo a simples possibilidade de

cruzar as pernas.

15

Experimentam maior independência, adquirida em um curto espaço de tempo.

A cada dia descobrem que conseguem fazer cada vez mais coisas do que

conseguiam antes da cirurgia.

Não obstante, percebi que, durante os atendimentos psicoterápicos pós-

cirurgia, a mobilidade modifica-se consideravelmente para a maioria dos pacientes,

não sendo, entretanto, totalmente explorada em alguns pacientes, talvez devido às

dificuldades corporais que apresentam como seqüelas da obesidade, tais como as

dores nas costas, nos joelhos e pernas.

Ressalte-se que a mobilidade em relação aos diferentes ambientes, desde a

sua casa, clube, parques e comunidade, que antes era limitada, depois da cirurgia

pode não melhorar concomitantemente com a sua mudança corporal. Isso pode

trazer sérios prejuízos, pois a pessoa, emagrecendo, embora possa se deslocar

mais facilmente, pode negar ou não se dar conta dessa mudança corporal e, assim,

não desfrutará da possibilidade de ter um melhor acesso a ambientes sociais,

espaços de lazer, antes evitados pelo constrangimento, não incorporando a sua

nova independência pessoal.

Nesse caso, essa negação, ou não percepção do aumento da mobilidade

social decorrente de sua acentuada mudança corporal, deixa de ser um reforço

positivo a aumentar a motivação dos pacientes para desgastante processo de

tratamento no pós-cirúrgico. Nessa fase, o intenso trabalho em busca da

modificação dos hábitos alimentares em particular e no estilo de vida como um todo,

impõe aos pacientes um esforço que, para ser mantido, depende fundamentalmente

dessa percepção dos ganhos obtidos.

Sem perceber os benefícios conquistados é maior a possibilidade de não

adesão ao tratamento, com a conseqüente recuperação ou aumento de peso,

propondo riscos inclusive à sua vida.

Assim, o paciente necessita perceber o quanto seu corpo se modificou e as

possibilidades de desfrutar essa mudança, que atinge concomitantemente às suas

dimensões psíquica, social e espiritual. Uma vez que o paciente deixará de ser uma

pessoa tão dependente, tornando-se mais autônoma em seus movimentos, como

uma pessoa normal, esse ganho na mobilidade, produzido pela mudança corporal,

16

constituir-se-á num fator essencial para seu desenvolvimento e bem-estar. E o

psicólogo pode assumir um papel fundamental nesse processo.

Para tanto, se faz necessário um maior conhecimento e uma maior

compreensão do significado que esse aspecto em particular – mobilidade – tem para

os pacientes obesos mórbidos, submetidos à cirurgia bariátrica, após os três

primeiros meses desse evento.

Dessa forma, proponho, como estudo, identificar qual o significado que a

pessoa obesa pós-cirúrgica atribui à sua mobilidade, face à rápida mudança

corporal.

Este conhecimento será um passo importante no tratamento pós-cirúrgico

bariátrico da pessoa obesa, além de ressaltar a importância do acompanhamento

psicológico e a relação da mobilidade nesse contexto.

Na revisão bibliográfica não encontrei nenhuma pesquisa que associasse

mobilidade, obesidade e cirurgia bariátrica. Constatei um número reduzido de

pesquisas envolvendo o tema mobilidade, e, mesmo assim, relacionados à

deficiência visual e de trânsito; com o tema cirurgia bariátrica, a maioria das

pesquisas encontradas são médicas e poucos são os estudos que encontrei na área

da psicologia.

O estudo sobre a obesidade mórbida e cirurgia bariátrica, sob o ponto de vista

psicológico, tem-se a dissertação de Benedetti (2001), Obesidade e emagrecimento

– Um estudo com obesos mórbidos submetidos a gastroplastia, que investigou o

sentido que o paciente obeso mórbido, submetido a gastroplastia, como forma de

conseguir o emagrecimento, atribui à sua experiência com a obesidade, a cirurgia e

o emagrecimento. Os resultados mostraram que a obesidade mórbida era uma

experiência difícil, interferindo no desempenho escolar e profissional, na auto-

imagem e no auto-conceito.

O trabalho de Santos (2003), em sua dissertação: “Identidade Pessoal de

obesos mórbidos submetidos à cirurgia bariátrica: uma metamorfose emancipatória”,

buscou compreender como as transformações radicais no corpo relacionam-se com

a corporeidade e a constituição da saúde/doença do indivíduo e interferem na

17

construção da identidade dessa pessoa, ao se transformar profundamente o corpo

da mesma, como numa cirurgia bariátrica que se faz necessária.

Assim, acreditamos que o presente estudo se justifica por contribuir com mais

informações sobre as dificuldades por que passam as pessoas obesas, mesmo

depois de submetidas à cirurgia bariátrica, podendo auxiliar na “quebra” do

preconceito social existente com relação a ela, contribuindo, enfim, para um olhar

mais respeitoso e que contemplem seus direitos e deveres.

18

II - OBJETIVO

Identificar o significado da mobilidade para pacientes obesos, após a cirurgia

bariátrica.

19

III - PSICOSSOMÁTICA E OBESIDADE

1 - Epidemiologia e visão clínica na obesidade

A obesidade consiste em sério problema de saúde pública, apresentando

proporções epidêmicas. Se constata que, segundo estatísticas da National Health

and Nutrition Examination Surveys - NHES, citado por Ades e Kerbauy (2002),

existem mais de noventa e sete milhões de americanos obesos ou acima do peso,

ou seja, aproximadamente 50% daquela população, e a tendência é aumentar esse

número. A NHES aponta que nos Estados Unidos é séria, pois a alimentação

desregrada e a vida sedentária contribuem para aproximadamente 300.000 mortes

por ano.

Conforme Thirlby e Randall (2002), a cada ano, nos EUA, 300.000 mortes

ocorrem em conseqüência do excesso de peso. É a segunda causa de morte, pois a

pessoa com excesso de peso possui um risco aumentado de morte prematura, de

50% a 100%, em relação às pessoas com Índice de Massa Corpórea (IMC) entre 20

e 25.

Salientam Donato at all (2003) que, em 1995, foi estimada, pela Organização

Mundial de Saúde (OMS), uma população mundial de 200 milhões de obesos

adultos e 18 milhões de crianças abaixo de cinco anos. No ano de 2000, essa

estimativa seria de 300 milhões de pessoas obesas.

Os índices de obesidade estão aumentando nos EUA e no Brasil a cada ano

e medidas preventivas, além das curativas, necessitam ser implantadas com

urgência.

20

Com relação à obesidade mórbida, que é definida como a daquela pessoa

que possui um índice de massa corpórea igual ou maior que 40 (IMC>40), estima-

se, de acordo com Fernandes, Pucca e Matos (2001), que 3% a 5% da população

nas nações desenvolvidas apresentam obesidade mórbida.

Nos EUA, existem cerca de 1,5 milhões de pessoas com obesidade mórbida

e 4 milhões com obesidade grave (sobrepeso Grau II b de acordo com a

classificação da OMS, já mencionada) (CSENDES et al., 2002). Por se tratar de uma

patologia de grande relevância, devido às comorbidades adquiridas pelo excesso de

peso, os problemas de sustentação de peso, dificuldades de locomoção, problemas

emocionais e sociais, repercute gravemente sobre a sociedade.

Cabe ressaltar que estudos constatam que a taxa de mortalidade das

pessoas com obesidade mórbida é 12 vezes maior para as pessoas com idade entre

25 e 40 anos do que para as pessoas com peso normal. (SANTOS, 2003;

COUTINHO e BENCHIMOL in GARRIDO, 2002)

O excesso de peso ameaça a vida, pois o risco da mortalidade, de 15% nas

pessoas que têm 20% a mais de peso para a idade, sobe para 250% em indivíduos

que sofrem de obesidade de grandes proporções (BENEDETTI, 2001). Além disso, à

medida que ocorre um aumento do IMC da pessoa, aumenta também o risco de

comorbidez.

Santos (2003) define que a obesidade é como um excesso de tecido adiposo

no organismo, devido a uma ingestão calórica que sobrepassa o gasto calórico.

Ainda não existe um consenso dos autores sobre o assunto, uma vez que a

obesidade é uma síndrome do ponto de vista conceitual. Entendendo-se por

síndrome um estado mórbido caracterizado por um conjunto de sinais e sintomas

atribuíveis a mais de uma causa.

Atualmente, porém, não mais se considera a obesidade uma síndrome e, sim,

uma doença, segundo a OMS (1997), devido a outras enfermidades que dela

decorrem como doenças cardiovasculares, hipertensão, problemas respiratórios,

diabetes mellitus, osteartrites, distúrbios reprodutivos em mulheres, certos tipos de

21

câncer, bem como fatores psicossociais adversos, como sofrimento, depressão e

comportamentos de esquiva social.

Loli (2000) ressalta que a obesidade é uma patologia multideterminada, pois

uma causa não descarta outra e não se necessita de todas as causas para ocorrer o

seu desenvolvimento.

Dessa forma, pode-se dizer que a obesidade está relacionada a fatores

genéticos, metabólicos, neuroendócrinos, dietéticos, socioculturais (como renda

familiar e nível de escolaridade, e estado civil), ambientais e comportamentais (como

tabagismo, etilismo, atividade física e sedentarismo), demográficos (como idade,

sexo, raça) e psicológicos. É, dessa forma, multifatorial.

Assim, o diagnóstico da obesidade pode ser realizado quantitativa ou

qualitativamente. No que se refere ao diagnóstico quantitativo, este pode ser

realizado através da somatória das medidas de pregas cutâneas ou do índice de

massa corpórea (IMC ou BMI –body mass index) da pessoa, sendo a mais utilizada

por apresentar um custo menos elevado, através da fórmula abaixo:

Peso (Kg)

IMC =

Altura² (m²)

A limitação do IMC encontra-se no fato de que esse tipo de índice não

distingue a origem do peso, a massa magra ou gordura, nem a distribuição da

gordura, andróide ou ginóide, podendo superestimar o grau de obesidade em

indivíduos musculosos. A sua aplicabilidade clínica, porém, é alta, tanto em estudos

epidemiológicos quanto na prática diária.

Entretanto, existem outras formas de se diagnosticar a obesidade, como a

impedância bioelétrica de freqüência única, espectroscopia bioelétrica de freqüência

múltipla (Tobec), condutibilidade elétrica corpórea de raios X (DXA), absorpciometria

dual de raios X (DXA), tomografia computadorizada e ressonância nuclear

magnética, potássio corpóreo total (40K) e água duplamente marcada. Esses

métodos são de uso limitado na prática clínica devido a seu custo elevado.

22

A impedância bioelétrica de freqüência única é altamente precisa e de fácil

utilização. Ela, aos poucos, está ganhando uma boa aceitação na prática clínica por

avaliar com precisão a massa adiposa e a massa de tecidos magros, substituindo o

método somatório da medida da espessura das pregas cutâneas. (MANCINI in

Garrido, 2002)

No quadro que se segue é apresentada a classificação da OMS (WHO,1997)

para sobrepeso:

IMC Classificação

OMS

Descrição Usual Risco Risco

corrigido*

<18,5Kg/m² Baixo Peso Magro Aumentado Aumentado

18,5-24,9Kg/m²Faixa Normal Peso Saudável,

Normal

Baixo Aumentado

25-29,9Kg/m² Sobrepeso Grau I Sobrepeso Aumentado Moderado

30-34,9Kg/m² Sobrepeso Grau

IIa

Obesidade Moderado Grave

35-39Kg/m² Sobrepeso Grau

IIb

Obesidade Grave Muito Grave

>40,0Kg/m² Sobrepeso Grau

III

Obesidade Mórbida Muito Grave Muito Grave

* Risco corrigido = risco quando o peso está associado a outros fatores de risco. (OMS

(WHO),1997)

23

Um diagnóstico qualitativo também pode definir o tipo de obesidade, mas é de

uso limitado na prática clínica. Alguns exemplos: medida do maior perímetro

abdominal entre a última costela e a crista ilíaca, relação cintura-quadril,

absorpciometria dual de raios X (DXA), ultra-sonografia, tomografia computadorizada

e ressonância nuclear magnética.

Donato et al. in Busse (2004) classificam uma variabilidade fenotípica entre os

indivíduos obesos, como:

“- Obesidade Universal , massa corpórea ou porcentagem de

gordura em excesso, distribuída por todo o corpo;

- Obesidade tronco-abdominal subcutânea em excesso , ou

padrão andróide ou em forma de maçã, mais comum no sexo

masculino, mas, também, presente no sexo feminino, com

deposição de gordura ao redor da cintura e do abdômen superior;

- Obesidade visceral , é a de maior risco cardiovascular e

metabólico;

- Gordura gluteofemoral em forma de pêra com excesso ou

padrão ginóide ou em forma depósito de gordura ao redor das coxas

e nádegas, cuja função seria a de reserva de energia para manter a

gravidez e a lactação”. (p340)

Apesar de haver uma variabilidade fenotípica, a obesidade é uma alteração

da saúde por implicar em alterações físicas, trazendo inúmeras doenças associadas

e complicações, como já mencionado.

Algumas doenças neuroendócrinas podem estar associadas ao

desenvolvimento da obesidade, mas tais formas de obesidade, genética ou de causa

orgânica, representam uma parcela mínima em relação ao total de obesos.

2 - Visão sociocultural da obesidade - Tratamentos

24

Atualmente, a vida sedentária diminui o gasto energético. A ingestão de

alimentos hipercalóricos, como frituras e massas gordurosas, o estilo de vida

estressante, competitivo, acrescentados aos fatores ambientais, como os aparelhos

eletrônicos, que poupam energia no trabalho e no ambiente doméstico, são também

fatores responsáveis pela tendência do aumento de peso da população.

Moraes (2004) relata que, em nossa cultura, como ser social, o homem

adquire hábitos relacionados ao meio em que vive; alimentar-se está relacionado a

uma série de fatores externos, como muitas situações agradáveis (aniversário,

casamento, festas, diversões) em que o alimento está presente, e dessa forma, o

padrão alimentar pode passar a ser controlado mais por fatores externos do que

propriamente a fome.

De acordo com Zilberstein, Galvão Neto e Ramos (2002), nos Estados

Unidos, calcula-se que “são gastos anualmente com programas de emagrecimento,

drogas para tratamento da obesidade e programas de condicionamento físico cerca

de 33 milhões de dólares” (p258). Desse contexto, infere-se que o custo para o

tratamento da obesidade é caro e traz inúmeras implicações para a sociedade.

Para tanto, nas pessoas obesas mórbidas pode ocorrer um fenômeno

chamado “binge eating” ou “transtorno da compulsão alimentar periódica” (TCAP).

De acordo com Coutinho e Benchimol (2002), trata-se da ingestão de uma grande

quantidade de alimentos num curto período de tempo, aliada a uma sensação de

perda de controle. Essas pessoas passam a incorporar em suas vidas uma

necessidade de ingerir grandes quantidades de qualquer alimento, podendo ocorrer

em indivíduos com transtorno do comer compulsivo, bulímicos e anoréticos tipos

bulímicos.

Nesse contexto é importante considerar válido o uso conjunto de

medicamentos, para facilitar a dieta. Na maioria dos casos, essas pessoas já

tentaram todo tipo de tratamento para emagrecer: medicamentoso, spas, tentativas

de regimes, exercícios físicos e mentais, rezas e simpatias.

Deixo claro que não irei abordar sobre as inúmeras técnicas de tratamento

para emagrecer como as citadas anteriormente; o foco ficará especialmente no o

tratamento da cirurgia bariátrica.

25

O tratamento cirúrgico para a obesidade foi realizado, pela primeira vez, na

Suécia, em 1952, com o objetivo de impedir a absorção de gordura no trato intestinal

e provocar diarréias. Mas os benefícios não superaram os efeitos colaterais de longo

prazo.

No Brasil, a cirurgia Fobi-Capella foi introduzida por Arthur B. Garrido Jr. Em

1999, o Ministério da Saúde, após acertos com a Sociedade Brasileira de Cirurgia

Bariátrica, reconhece a necessidade de tratamento cirúrgico aos obesos mórbidos e

inclui a cirurgia bariátrica entre os procedimentos cobertos pelo Sistema Único de

Saúde (SUS), conforme portaria nº 628/GM de 26 de abril de 2001. Com essa

abertura, houve a ocorrência de um grande número de pacientes candidatos à

cirurgia bariátrica, a ponto de provocar longas filas de espera, sendo que, desses,

2,4% falecem enquanto aguardam a cirurgia nos hospitais públicos. (SANTOS,

2003)

Os pacientes que são submetidos à cirurgia bariátrica perdem sua massa

corpórea de forma acelerada durante o primeiro ano de cirurgia, esperando-se que

eles reduzam 40% de seu peso comparado ao inicial.

Dados disponíveis da literatura mostram que, após a cirurgia, alguns

pacientes conseguem mudar o estilo de vida, com um controle dietético rigoroso e

ajustado à nova situação. Outros não têm a mesma facilidade, ou não conseguem a

perda de peso necessária ou desejada, ou voltam a ganhar o peso perdido. Em

outros casos, ainda, apesar do emagrecimento, a qualidade de vida não é boa, por

inadaptação à nova condição.

A cirurgia bariátrica tem sido atualmente um recurso eficiente para a obtenção

do emagrecimento por parte das pessoas com obesidade mórbida e para a

manutenção do peso baixo ao longo do tempo, comprovando a eficácia do

tratamento e seus benefícios clínicos e psicológicos associados à perda de peso.

(WAIDERGORN, EVANGELISTA, 1999; CASALNUOVO EGUILEOR, BRITES E

BRAGINSKY, 2001; GUZMÁN & BOZA,2001; FERNANDEZ, PUCCA e MATOS,

2001; CSENDES,BURDILES, MALUENDA, BURGOS, RECIO, FERNANDEZ,2002;

SABBIONI et al.,2002; TRONCOSO, NUNEZ, GUZMAN, 2002; ZILBERSTEIN,

GALVÃO NETO e RAMOS, 2002)

26

Casalnuovo et al. (2001) constatam, em sua pesquisa com cem sujeitos

submetidos à cirurgia bariátrica, uma perda de peso pós-operatório medido por IMC

de 13% no primeiro mês e 26% no terceiro mês. Garrido Junior (2000) refere em seu

trabalho que, no primeiro mês pós-cirúrgico bariátrico, ocorreu uma perda de peso

medido por IMC de 9,1%, sendo que, no terceiro mês, a perda foi de 17,1% e, aos

doze meses, atingiu 42,3%.

Sabe-se, contudo, que é preciso ocorrer modificações internas, querer

modificar o estilo de vida, e assim, ocorrer mudanças externas, para que possa

haver um melhor aproveitamento do processo da cirurgia. Somente a cirurgia não

garante uma melhoria na qualidade de vida da pessoa obesa mórbida, deixando

claro que essa não é apenas uma questão médica, mas, também, psicológica.

Para emagrecer, e ficar magro, é necessário reorganizar a vida e se preparar

para a cirurgia e as dificuldades que virão, pois a nova imagem corporal adquirida

através do tratamento poderá ser duradoura se a pessoa tiver competência para

mudar seu estilo de vida e comportamento.

3 - Mobilidade e obesidade

A palavra mobilidade é conceituada por FERREIRA (2006) como: 1.

“qualidade ou propriedade do que é móvel ou obedece às leis do movimento”; 2.

“facilidade de mover-se ou de ser movido...”

O termo mobilidade é antigo e muitas vezes confundido com motricidade no

seu significado mais lato. É utilizado atualmente em muitos estudos sobre a

deficiência visual o termo mobilidade e orientação, cuja designação se refere à

deslocação, a pé, da pessoa portadora de deficiência visual.

Nas atuais sociedades, a mobilidade é um dos traços mais marcantes, pois

inclui múltiplos componentes, envolvendo pessoas, bens, serviços, capitais,

informações e imagens. Pressupondo a circulação de bens materiais e imateriais,

tecnologias, infra-estruturas, valores sociais, formas de regulação política e jurídica

que a condicionam, podem estimular a pessoa ou dificultar a sua mobilidade.

27

A mobilidade geográfica é um poderoso fator de diferenciação e organização

territorial. Áreas atrativas ou repulsivas, lugares acessíveis ou de localização

marginal, redes densas ou de fraca interação com as pessoas, são situações

contrastantes, no que se refere às condições de mobilidade de quem vive e/ou

trabalha nestes locais.

Num mundo de crescente interação, onde o potencial de cada região ou lugar

depende cada vez mais da capacidade de participar, de forma ativa, em diferentes

redes de circulação de pessoas, bens e conhecimento, a mobilidade surge como um

fator básico para o desenvolvimento das pessoas.

Sob o ponto de vista de uma pessoa obesa, a mobilidade é comprometida,

principalmente se esta pessoa for portadora de uma obesidade mórbida. A sua

limitação inicia-se nas atividades diárias de vida, como fazer sua higiene íntima, não

conseguindo alcançar várias partes do corpo para se lavar, dificuldade em colocar

sua roupa, sutiã, meias no pé, alcançar os pés para amarrar um sapato ou uma

sandália.

A pessoa obesa, referindo-se a sua locomoção, definido-se ao seu

movimento, deslocamento de um lugar para outro; muitas vezes não consegue

alcançar lugares distantes a pé por problemas respiratórios, referindo sentir falta de

ar, bem como subir escadas, apresentando dores nos joelhos e/ou nos pés.

Na procura de utilizar um meio de transporte, como um micro-ônibus ou carro,

muitos motoristas queixam-se pelo peso da pessoa, alegando que tal peso exige um

maior esforço do motor para percorrer caminhos de subida; assim, muitas pessoas

deixam de dar carona para ela.

Na utilização de um ônibus, mais um momento de dificuldade para a pessoa

obesa, pois ela apresenta dificuldade para entrar no veículo, devido ao fato de os

degraus serem altos; em seguida, temos a catraca impedindo sua passagem.

Quando precisa enfrentar uma viagem de longa distância e utiliza o ônibus, os seus

assentos são inadequados ao seu tamanho, ocupando dois bancos, acentuando

suas dores nas costas, e, algumas vezes, são cobradas dela duas passagens.

Quando o ônibus está lotado e não há como ocupar duas poltronas, enfrenta um

olhar discriminatório da pessoa ao lado, pois sobra pouco espaço para outra pessoa

sentar.

No dia 24 de janeiro de 2007, foi aprovada a lei nº 5360/05, que obriga a

reserva de assentos para obesos nos transportes interestaduais de passageiros,

28

onde dois assentos devem ser contíguos, situados na primeira fila, e ter apoio de

braço rebatível ou retirável. Caso seja cumprida esta lei, contribuirá para uma melhor

vida social do obeso.

Em sua vida social, situações como ir ao teatro, cinema, bares, podem

transformar-se em um problema, até mesmo em pesadelo. Muitos desses lugares

não possuem estrutura física, as pessoas obesas não cabem nas cadeiras, ou estas

são fracas para seu peso e elas acabam indo parar no chão, sendo motivos de

risadas e piadas.

Outros fatores são lugares estreitos de passagens, locais tumultuados,

sempre evitados, pois vivenciaram situações negativas, não conseguindo se

deslocar, ou encontrando muita dificuldade, como casas noturnas ou bares repletos

de pessoas, onde, para se locomover, acabavam empurrando muitas pessoas ou

esbarrando nos móveis, sujando e rasgando suas roupas.

Dessa forma, a área de circulação e locomoção da pessoa obesa é restrita,

desestimulando sua vida social. Essa mobilidade comprometida implica não somente

na perda de locomoção, mas em sua autoconfiança, auto-estima, valores, auto-

imagem e independência, fatores relevantes na sua integração social. Complementa

Curtin (1962) que a mobilidade é um movimento psicológico implicando nas atitudes,

idéias, aspirações e ambições. Com isso, causando tensões físicas e psicológicas

na pessoa portadora de obesidade.

4 - Mobilidade do paciente obeso mórbido

O estilo de vida da cultura ocidental no século XXI implica num leque de

facilidades que tornam a vida excessivamente cômoda e sedentária, comodidade

essa que se configura como agravante para o emagrecimento no caso dos obesos,

principalmente no obeso mórbido.

A alimentação tornou-se mais calórica, o gasto energético foi diminuído com a

praticidade de se realizar tarefas, o lazer foi modificado pela comodidade,

passividade e rapidez. Como exemplo, para se assistir a um filme não é mais

necessário ir ao cinema, aluga-se uma fita cassete ou DVD. Estando com fome,

telefona-se para um serviço “delivery”. A vida tornou-se sedentária, em

contraposição à correria do dia a dia, acarretando uma diminuição de sua qualidade

e facilitando o desenvolvimento da obesidade nas sociedades.

29

Dessa forma, a mudança do estilo de vida, com o passar do tempo, provocou,

concomitantemente, uma mudança na mobilidade pessoal, principalmente para a

pessoa é portadora de obesidade.

E como será para a pessoa com obesidade mórbida lidar com sua mobilidade

sem um espaço ambiental adequado? Será que ela possui a percepção clara de seu

estado corporal?

A obesidade mórbida implica numa série de situações e constrangimentos

diante da sua mobilidade limitada. A limitação ambiental inicia-se em seu lar, pois as

dimensões de sua cama, poltrona, portas da casa, banheiro precisam ser

adequados ao seu tamanho e resistência, além dos acessórios básicos como

roupas, sapatos e outros.

Para a pessoa com obesidade mórbida, realizar tarefas, como dançar,

caminhar, nadar (vestir um maiô), praticar um esporte, requer esforço enorme,

deixando de ser um prazer. Na maioria das vezes, sua mobilidade é comprometida

pelo excesso de massa corpórea, o que pode ir, aos poucos, anulando sua vida

social.

O contato social da pessoa obesa mórbida, a partir de freqüentar festas,

sentar-se num restaurante para jantar ou mesmo num bar para beber um chope, ir

ao cinema, teatro, passa a ser abolido. Muitas vezes nesses locais não há cadeiras

ou poltronas adequadas à sua dimensão e peso corpóreo, além do constrangimento

causado pelas pessoas ao verem-na como uma pessoa diferente.

Assim, para a pessoa com obesidade mórbida, deslocar-se em qualquer

ambiente, caracteriza grande transtorno. Com o seu peso corpóreo não consegue

andar por longas distâncias. Na locomoção em ônibus, não consegue muitas vezes

entrar no ônibus, onde os degraus são altos demais, pois muitos motoristas

estacionam longe da calçada, e estes encontram muita dificuldade de subir; em

seguida vem a catraca onde o espaço é pequeno, sem levar em conta o tamanho

das poltronas. Assim, passa sempre a evitar locais estreitos de passagem,

tumultuados por pessoas, que, na sua maioria, podem freqüentar espaços sociais

prazerosos.

30

Existe uma associação, nos EUA, de direitos dos obesos, que reivindica mais

espaço nos bancos dos ônibus e aviões. Como afirmado anteriormente, aqui no

Brasil, dia 24 de janeiro de 2007 foi aprovada a lei nº5360/05, mas na prática ainda

não ocorre.

A pessoa com obesidade mórbida, além de ter que lidar com suas limitações

e dificuldades enfrenta também a discriminação social. Zilberstein, Galvão Neto e

Ramos (2002) evidenciam que existe falta de respeito generalizada pelos obesos

mórbidos, a ponto de existirem estudos em que os pacientes relatam terem sido

tratados de forma desrespeitosa por profissionais da área de saúde.

No entanto, deveriam ser esses profissionais da área de saúde as primeiras

pessoas a ajudarem o obeso mórbido a lidar com suas dificuldades diante da sua

condição.

Essas pessoas perderão cerca de 20 a 30 kg logo após serem submetidas ao

procedimento da cirurgia bariátrica. Assim, quais características do espaço físico

serão priorizadas na percepção delas? Ocorrerão modificações?

Godoy (2002) relata que,

“... há uma alteração na percepção proprioceptiva do esquemacorporal. Tive uma paciente adolescente que perdeu 15Kg e nãopercebia a mudança quando se olhava no espelho. Ela se via aindacom aqueles 15Kg a mais. Dizia: ‘Eu estava horrorosa e continuohorrorosa. Não percebo a mudança. Sei racionalmente queemagreci, mas, emocionalmente, não acredito”. (p. 32)

Assim, se não ocorrer uma alteração na percepção do esquema corporal

modificado, não haverá a percepção de sua mobilidade no espaço ambiental,

necessitando, por isso, de um trabalho de auto-imagem aliado à auto-estima.

Godoy (2002) complementa que,

“O contato com seu si mesmo ajuda a harmonizar osrelacionamentos. Uma pessoa que engorda, emagrece, engorda,emagrece vai perdendo seu próprio referencial e tendo dificuldadeem lidar com o si mesmo, prejudicando a sua tele (do grego,distância, agindo à distância), definida como a ligação elementarentre as pessoas e os objetos”. (p.34)

31

E a cirurgia bariátrica, ao provocar o emagrecimento brusco na pessoa com

obesidade mórbida, que se tornou em uma pessoa mais magra, em um processo

rápido, comparado com os métodos preconizados de emagrecimento, poderá trazer

também dificuldades a essa mesma pessoa, no lidar consigo, com outras pessoas e

com o ambiente, caso ela não esteja consciente e preparada para sua nova imagem

corporal.

Gunther (2003) ressalta que, à medida que as pessoas se deslocam de um

lugar para o outro, as dimensões físicas e psicológicas de espaço (pessoal,

territorialidade, apinhamento e privacidade) se modificam. O movimento no espaço

afeta tanto a densidade do recinto que está sendo deixado quanto aquele em que

se está entrando. O movimento, que pode implicar em mais ou menos privacidade,

presença ou ausência em um território, pode também implicar mais ou menos

controle sobre si mesmo. A mobilidade como recurso de exploração é essencial para

o desenvolvimento e bem estar humanos.

Fica claro que a mobilidade é imprescindível, inclusive para o obeso mórbido,

porque ela desvela os caminhos e conhecimentos a que a pessoa pode chegar.

5 - Cirurgia Bariátrica e Mobilidade

Face a esse panorama, a cirurgia bariátrica surge como uma das alternativas

para emagrecer, minimizando ou eliminando suas conseqüências físicas, que podem

levar a pessoa à morte.

É preciso esclarecer a pessoa que irá realizar o procedimento cirúrgico sobre

a necessidade do acompanhamento psicológico, pois a cirurgia irá trazer muitos

benefícios para o paciente, mas também uma série de repercussões relativas à sua

realidade psíquica, não resolvendo problemas psicológicos pré-existentes.

Inúmeras pessoas diagnosticadas como portadoras de obesidade mórbida

são submetidas à cirurgia bariátrica diariamente; ela é vista, por muitos pacientes

como uma nova esperança de vida, após insucessos de tratamentos para

32

emagrecer. Apesar dela ser extremamente invasiva, dolorosa, precisa-se ter

consciência sobre a mudança de estilo de vida, muitas vezes radical, que a pessoa

terá que enfrentar.

Inicialmente o tratamento ocorre meses antes da operação, com uma

mudança no hábito alimentar e inserção de atividade física; após ter perdido cerca

de 10% de seu peso, e estar opta a enfrentar a cirurgia, ela é realizada.

Ao acordar, após o procedimento cirúrgico, continua com o mesmo peso, pois

o ato cirúrgico não emagrece, mas, psiquicamente, se sente aliviada por saber que

sobreviveu à cirurgia e, com isso, possui um grande estímulo para iniciar uma

mudança em sua vida.

Nas primeiras semanas ingerem somente líquidos; depois a comida pastosa

e, após dois meses, inicia a alimentação sólida. Com essa mudança radical de

alimentação, conseqüentemente a pessoa perde seu peso, o corpo começa a se

modificar rapidamente e muitos pacientes já percebem uma melhora na mobilidade,

tentando e conseguindo realizar atos que antes não conseguiam, como tomar banho

por inteiro, amarrar os sapatos, e ficam maravilhados a cada dia.

Aos três meses, é possível constatar uma mudança corporal, perda de peso,

experimentar que socialmente as pessoas que convivem ao redor reforçam

positivamente tal modificação e, verificar que, finalmente, estão conseguindo o que

sempre desejaram: emagrecer, e de uma forma rápida.

Com o ato cirúrgico espera-se que o paciente perca cerca de 40% de seu

peso antes da cirurgia e, com isso, ocorrem muitas mudanças. Essas mudanças

acarretam uma modificação brusca em sua vida, desde pessoal, atingindo a sua

auto-imagem, autopercepção, auto-estima, mobilidade pessoal, independência das

atividades de vida diária, tentando ter uma vida normal.

Inicia ao acordar, após ter dormido uma noite de sono agradável, pois muitos

possuíam apnéia do sono e acordavam várias vezes à noite. Em seguida,

conseguem realizar sua higiene física sozinhas, como tomar banho por inteiro,

depois vestir-se, amarrar as sandálias ou cordões dos sapatos, cortar as unhas dos

pés, poder ir (a) à padaria, à casa da amiga caminhando por uma distância maior

33

que antes, sem sentir falta de ar. A cada dia é uma descoberta, aprende ou

reaprende a realizar movimentos até então não alcançados, mas que possuem um

grande significado em sua vida.

Contudo, toda essa mudança não é tão fácil como parece; para que isso

permaneça, é necessário inserir essa mudança de estilo de viver no decorrer de sua

vida.

Benedetti (2001) ressalta que a realização da cirurgia traz à tona três

questões.

A primeira consiste em que esse procedimento não implica emagrecimento

imediato e duradouro, sendo que o fator determinante para o sucesso do tratamento

é a forma como o paciente vai lidar com esse recurso, a cirurgia. É necessário que

haja, por parte dos pacientes operados, o compromisso de assumir um

comportamento alimentar vigilante pelo resto da vida, tanto no que se refere à

quantidade como à qualidade dos alimentos. Caso contrário, sem uma mudança

radical no comportamento alimentar, a cirurgia perde o poder emagrecedor e frustra

certo número de pacientes que não conseguem perder o peso necessário ou o

fazem com muito sofrimento.

A segunda questão revela que a perda de peso, quando grande e acelerada,

provoca uma mudança brusca na estrutura corporal, que não é assimilada com a

mesma rapidez. A adequação ao novo estilo alimentar e a adaptação funcional às

transformações corporais necessitam de tempo para a mobilização de recursos de

enfrentamento.

Por fim, se impõe uma idéia equivocada de que emagrecer implica

diretamente uma melhoria na qualidade de vida. Muitos pacientes desejam se

submeter ao tratamento, com expectativas que vão além do emagrecimento.

Mostram a associação direta entre emagrecimento e realização pessoal, como se

esta última não dependesse de seu esforço próprio.

6 - Dimensão psicossomática

34

O termo psicossomático foi utilizado, pela primeira vez, em 1818, por J. C.

Heinroth, psiquiatra alemão, ao fazer referência à insônia e à influência das paixões

na tuberculose.

A medicina psicossomática surge nesse período com uma proposta holística

na maneira de olhar a doença. Sami-Ali (1992, p. 159), conceitua a medicina

psicossomática como sendo “uma maneira de introduzir variáveis psicológicas num

domínio que se define como orgânico, adicionando variáveis psíquicas às variáveis

orgânicas”.

Na década de 30, surge o interesse pela psicossomática na América, com

Alexander e Dunbar da Escola de Chicago, Cannon e Selye. Esses autores são

fundamentais para a consolidação do movimento psicossomático, e o surgimento de

uma medicina integral e humanista.

Alexander, a partir de 1944, estrutura seu modelo psicossomático em quatro

premissas: todas as funções humanas são psicossomáticas; as emoções estão

sempre associadas aos concomitantes fisiológicos; as emoções ou conflitos

específicos levam a concomitantes fisiológicos específicos e as emoções, cuja

expressão direta é recalcada por razões ligadas ao conflito intrapsíquico, provocam,

secundariamente, estados de tensão psicológicos pelo aumento, em intensidade e

duração, dos seus concomitantes fisiológicos. (DIAS, 1981)

Na França, no final dos anos 50, de acordo com Albino e Cerchiari (2000), é

iniciada uma investigação em psicossomática por P. Marty, M de M´Uzan, M. Fain e

C. David. Para esses autores, o termo psicossomático refere-se à designação de

uma abordagem de pacientes, de uma técnica psicoterápica e de uma teoria, cujo

interesse é a compreensão de que ocorre na mente dos sujeitos que respondem aos

conflitos e aos acontecimentos somatizando, ou seja, a mente e o corpo estão

interligados.

Albino e Cerchiari (2000) referem que a história da psicossomática pode ser

dividida em duas grandes correntes: as correntes inspiradas nas teorias

psicanalíticas, com base no conceito de doença psicossomática, e as de inspiração

biológica, alicerçadas no conceito de estresse.

35

Para Mello Filho (1992), a evolução da psicossomática ocorreu em três fases:

inicial ou psicanalítica, teve seu interesse voltado para os estudos da origem

inconsciente das doenças, das teorias de regressão e dos benefícios secundários do

adoecer; segunda fase, intermediária ou behaviorista, valorizou as pesquisas, tanto

em homens quanto em animais, e deu um grande estímulo aos estudos sobre

estresse; terceira fase, atual ou multidisciplinar, valorizou o social, interação e

interconexão entre profissionais de saúde.

Alexander (1989) afirma que, teoricamente,

“cada doença é psicossomática, uma vez que fatores emocionaisinfluenciam todos os processos do corpo, através das vias nervosashumorais e que os fenômenos somáticos e psicológicos ocorrem nomesmo organismo e são apenas dois aspectos do mesmoprocesso”. (p. 42)

Complementa Cardoso (1995) que não faz sentido algum separar doença

orgânica e doença mental, uma vez que as somatizações, nas duas, correspondem

a uma somatização cerebral, pois se ocorrer uma doença orgânica esta terá

ressonância no psíquico e vice versa.

Dessa forma, deve-se abordar a obesidade e a obesidade mórbida sob o

ponto de vista psicossomático.

Mello Filho (1992) relata que as obesidades mórbidas, ou grandes obesos,

indicam a impossibilidade de remoção ou impõem limites bem estreitos de redução

ponderal, ao contrário das obesidades do tipo reacionais, ou seja, aquelas que se

instalam a partir de crises existenciais ou acidentais recentes como: gravidez, luto,

perda, separação.

Ao se falar de obesidade, é necessário ressaltar o aspecto da ingestão

alimentar que envolvem as pessoas obesas, pois há uma diferença entre o comer

por fome e o comer por desejo.

A fome física ou fome biológica é a nossa necessidade de reabastecimento.

Ela é desagradável, desprazerosa, mas sustenta a vida.

36

Já a fome emocional, ou apetite, procura o prazer. Ela não tem ligação com a

sustentação da vida, implica em qualidade e não obedece a reservas calóricas. A

comida é procurada como um tranqüilizante, que nos faz comer sem parar, apesar

de já estarmos satisfeitos, ou até mesmo passando mal, fazendo-nos,

conseqüentemente, engordar.

Um dos papéis da gordura indica ser uma proteção, um isolamento, e a idéia

de retirá-la traz ansiedade, caos, pânico. Para muitos, a perda do peso é vivida

como ser roubado, espoliado. Assim sendo, tirar peso pode significar implicitamente

vir à luz algo mais profundo, temido e indesejado.

Mello-Filho ressalta que o excesso de peso constitui-se num aleijão, em

muleta que se tem que carregar para o resto da vida. Serve o excesso de peso no

corpo à função de localizar toda a angústia e toda sorte de dificuldades existenciais.

A localização (somatização), no entanto, para muitos, traz tranqüilidade e paz. O

indivíduo, ao viver e aceitar (internamente) a obesidade e tê-la como fonte de todas

as desgraças de sua vida, já possui condições de exercer um controle. Ele já não

precisa mais pensar em dificuldades emocionais e, sim, em controlar o peso,

modificando o seu foco de sofrimento. (MELLO-FILHO, 1992)

Vemos, pois, que a obesidade mórbida é uma doença que traz prejuízos

físicos, emocionais, sociais e ambientais. Sob o ponto de vista da Psicossomática,

merece uma terapêutica multidisciplinar para se ter bons resultados.

IV - MÉTODO

Este trabalho consiste em uma pesquisa de cunho qualitativo. A pesquisa

qualitativa baseia-se em uma descrição, com uma abordagem interpretativa dos

fenômenos, em termos das significações que as pessoas trazem para o

pesquisador.

Complementa Neder (1992) que, na pesquisa qualitativa, a análise se

processa pela descrição e, sempre que se tratar de fenômenos que ocorrem com

seres humanos, os cuidados na análise se multidimensionam, consideradas as

37

variações individuais no modo de ser de cada Ser Humano. Essa descrição e essa

análise descritiva deverão conduzir à compreensão do fenômeno, de modo a levar a

conhecer ou reconhecer o objeto da pesquisa, o objeto que se descreve, o

fenômeno em estudo, levando à diferenciação e à compreensão do fenômeno

diferenciado.

A análise dos dados será realizada seguindo a fenomenologia; conforme

FORGHIERI (2004), uma pesquisa qualitativa, em uma abordagem fenomenológica,

consiste em retornar ao mundo da vida, à experiência vivida, e sobre ela fazer uma

profunda reflexão, que permite chegar à essência do conhecimento.

Assim, é um estudo descritivo do fenômeno, como ele se revela à nossa

experiência, tudo que se observa, percebe, imagina, alcançando as essências das

coisas que ocorrem na consciência, conhecendo o próprio objeto.

Dessa forma, é um estudo descritivo do fenômeno (mobilidade), como ele se

revela à pessoa obesa no pós-cirúrgico bariátrico.

1 - Sujeitos

Participaram desta investigação seis pacientes que apresentavam obesidade

mórbida ao serem submetidos à cirurgia bariátrica, e que estavam no período de três

a quatro meses de tratamento pós-cirúrgico. É um número pequeno de sujeitos,

devido aos poucos pacientes que foram operados na instituição em que

pesquisamos.

Os sujeitos foram adultos, com idade variando entre 28 a 44 anos, sendo

quatro mulheres e dois homens, alfabetizados, participantes do grupo de psicologia

pós-operatório, encontrando-se no período de três meses a quatro meses após a

cirurgia, e que passaram pelo procedimento regulamentar de atendimento, que está

descrito a seguir.

A faixa etária selecionada abrangeu pessoas que possuem um menor risco

relevante para enfrentar a cirurgia e, assim, ter uma probabilidade de maior sucesso

nesse tipo de tratamento. (FERNANDES, PUCCA e MATOS, 2001)

38

1.1 Critérios de Inclusão dos Sujeitos

Foram incluídos como sujeitos da pesquisa os pacientes que participaram do

procedimento regulamentar no processo cirúrgico, que ocorre da seguinte forma:

1.1.1 - Os pacientes com obesidade mórbida chegam ao hospital diretamente

ou através dos encaminhamentos realizados pelas Unidades Básicas de Saúde

(UBS) dos bairros e de outras cidades da região.

1.1.2 - No Serviço Social, os pacientes recebem uma senha que possibilita o

agendamento da consulta inicial com a médica endocrinologista, e esta os

encaminha para a nutricionista e para as psicólogas da equipe que irão realizar o

atendimento grupal.

1.1.3 - O trabalho do serviço psicológico se desenvolve em três fases, que

vão constituir-se em grupos diferentes. Na primeira fase, os pacientes participam do

grupo de obesidade, com duração de cerca de quatro semanas, com o objetivo de

perder aproximadamente 10% de seu peso atual, necessitando apresentar

condições psíquicas favoráveis, para poderem participar do próximo grupo. Na

segunda fase, o grupo da cirurgia, os participantes permanecem por trinta dias,

recebendo orientações e, ao final, procede-se a uma avaliação psicológica para se

apurar se vão ou não para a cirurgia. Os pacientes que não forem liberados para a

cirurgia serão excluídos do processo cirúrgico e os que necessitarem de ajuda serão

orientados para recorrer a um tratamento psicoterapêutico. Na terceira fase, no

grupo pós-cirúrgico, os pacientes recebem um atendimento de doze meses, após a

cirurgia, tendo como objetivo principal auxiliá-los na adesão ao tratamento; aqui os

pacientes recebem um apoio para enfrentar as dificuldades que poderão surgir como

ansiedades elevadas, frustrações, desejos, medos, problemas conjugais, familiares

e outros. E, após os doze meses, os pacientes que apresentarem condições

psíquicas favoráveis nesse processo de adesão ao tratamento recebem altas.

39

1.2 - Critérios de exclusão dos sujeitos

Foram excluídos da pesquisa os sujeitos que, por algum motivo, não

participaram do procedimento regulamentar no processo cirúrgico, aqueles que não

aceitaram participar da pesquisa ou não assinaram o termo de consentimento livre e

esclarecido.

2 - Local

A coleta de dados foi realizada no Conjunto Hospitalar de Sorocaba, um

Hospital-Escola, localizado na cidade de Sorocaba, no Estado de São Paulo. Esse

hospital atende pelo Sistema Único de Saúde (SUS), a uma população de,

aproximadamente, cinqüenta cidades da região.

No ano de 2003, o Hospital-Escola mencionado foi credenciado pelo Governo

do Estado de São Paulo, entre seis hospitais, para realizar os procedimentos de

cirurgia bariátrica.

A equipe para essa cirurgia é multidisciplinar, com profissionais de diversas

áreas como serviço social, nutrição, equipe médica (endocrinologista, cirurgião e

anestesista) e psicologia.

A equipe de cirurgia realiza, mensalmente, uma palestra, aberta para o

público, sobre o tema cirurgia bariátrica, revezando o assunto a cada mês, nas

seguintes áreas: médica, nutrição e psicologia.

3 - Instrumentos

Para a coleta de dados, foram utilizados:

• Entrevista;

• Prontuário;

• Reunião com os profissionais da equipe multidisciplinar;

40

• Observações da pesquisadora sobre os sujeitos.

3.1 - Entrevistas

3.1.1 - Entrevista Estruturada

Foi realizada uma entrevista estruturada com cada sujeito, individualmente,

para obter dados referentes às características dos sujeitos, como: nome, idade,

estado civil, número de filhos, escolaridade, religião, tipo de trabalho, renda familiar,

maior peso atingido, peso no dia da cirurgia e peso atual no dia da entrevista.

(Anexo C);

A entrevista foi realizada logo após a explicação e a autorização do sujeito

para fazer a pesquisa.

3.1.2 - Entrevista Semi-estruturada

A entrevista semi-estruturada, com questões abertas, foi realizada com cada

sujeito para levantar aspectos relevantes, com o objetivo de estabelecer e

compreender o momento existencial do sujeito, verificar a sua mobilidade após a

cirurgia e sua significação (Anexo D).

A entrevista semi-estruturada foi feita logo após a realização da entrevista

estruturada, e um gravador SONY M-527 foi utilizado para gravar cada entrevista e,

posteriormente, todas as fitas foram transcritas.

3.2 - Prontuário

Após a realização da entrevista semi-estruturada, foi feita a coleta de dados

dos prontuários do hospital onde constam dados diversificados dos diferentes

41

profissionais, dos diferentes setores como endocrinologia, cirurgia, nutrição e

psicologia.

3.3 - Reunião com os profissionais da equipe multi disciplinar

Em seguida, com os dados obtidos, foi realizado um encontro com cada

profissional da equipe sobre o parecer dos profissionais face ao tratamento do

sujeito.

3.4 - Observações da pesquisadora sobre o sujeito

Foram feitas, após a realização das entrevistas com cada sujeito, anotações

transcritas pela pesquisadora sobre a observação do sujeito no encontro da coleta

de dados dos sujeitos envolvendo o local e a sua disposição frente à entrevista.

4 - Cuidados Éticos

Os devidos cuidados éticos foram assim discriminados:

4.1 - Na execução deste trabalho buscou-se atender às normas da Resolução nº

196/196 do Conselho Nacional de Saúde sobre pesquisa, Envolvendo Seres

Humanos.

4.2 - Salientamos o compromisso com o princípio fundamental do Código de Ética

Profissional do Psicólogo, de acordo com as resoluções do CFP (no.) nº 10/97 e

11/97 que dispõem, respectivamente, sobre critérios para divulgação, publicidade e

exercício profissional do psicólogo, associados a práticas que não estejam de acordo

com os critérios científicos estabelecidos no campo da Psicologia e sobre a

realização de pesquisas com métodos e técnicas não reconhecidas pela Psicologia.

4.3 - O projeto – “A mobilidade de pacientes obesos no pós-cirúrgico bariátrico”, foi

submetido à aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade

42

Católica de São Paulo. Após o parecer positivo, a pesquisadora deu continuidade à

pesquisa;

4.4 - O Termo de Compromisso - A pesquisadora assinou o Termo de Compromisso

do pesquisador, comprometendo-se a: atender os deveres institucionais básicos da

honestidade, sinceridade, competência e da discrição; pesquisar adequada e

independentemente, além de buscar, aprimorar e promover o respeito à sua

profissão; não fazer pesquisa que possa causar riscos não justificados às pessoas

envolvidas; não violar as normas do consentimento informado; comunicar ao

possível sujeito todas as informações necessárias para um adequado consentimento

informado; propiciar ao sujeito plena oportunidade e encorajamento para fazer

perguntas; excluir a possibilidade de engano injustificado, influência indevida e

intimidação e obter de cada possível sujeito um documento assinado como evidência

do consentimento informado;

4.5 - Foi utilizado o termo de Consentimento Livre e Esclarecido para informar aos

sujeitos da pesquisa a respeito das garantias de acesso, a qualquer tempo, às

informações sobre procedimentos, riscos e benefícios relacionados à pesquisa,

inclusive para dirimir eventuais dúvidas.

4.6 - O sujeito teve acesso à pesquisadora a qualquer momento via telefone e/ou e-

mail, impressos no Consentimento Livre e Esclarecido, cuja cópia ficou em seu

poder.

4.7 - O sujeito teve acesso, a qualquer tempo, às informações sobre procedimentos

e benefícios relacionados à pesquisa, inclusive para esclarecer eventuais dúvidas.

4.8 - O sujeito teve liberdade de retirar seu consentimento a qualquer momento e de

deixar de participar do estudo, sem que isso trouxesse prejuízo à continuidade da

assistência.

4.9 - O sujeito teve a salvaguarda da confidencialidade, sigilo e privacidade.

4.10 - Foi de conhecimento do sujeito, através do Termo de Consentimento, que os

resultados da Pesquisa seriam utilizados como parte dos requisitos para que a

pesquisadora obtenha o título de mestre em psicologia e para futura publicação. Não

há, no entanto, a identificação dos sujeitos, sendo apenas mencionados os dados e

local onde a pesquisa foi realizada.

43

4.11 - A pesquisadora poderia sugerir ao sujeito que não continuasse o processo,

caso percebesse que o mesmo não se sentia à vontade ou constrangido.

4.12 - Os sujeitos foram informados de que, após a conclusão da pesquisa, seriam

contatados para devolutiva em grupo, caso desejassem.

5 – Coleta de dados

Primeiramente foram realizados convites verbais aos pacientes no grupo pós-

operatório da psicologia que se encontravam no período entre três meses a quatro

meses no pós-cirúrgico e que se enquadraram no critério de inclusão da pesquisa.

Foram realizados vários convites, sendo um a cada mês, até ocorrer a

obtenção de seis sujeitos na pesquisa, com a duração aproximada de quatro meses

para obter a coleta de dados desses seis sujeitos.

Os pacientes que aceitaram participar da pesquisa foram agendados pela

pesquisadora para um encontro individual, sendo avisados, pela mesma, uma

semana antes e no dia anterior por telefone.

Dessa forma, foram marcados dez encontros com os sujeitos, sendo que

quatro deles não compareceram no dia marcado pela pesquisadora para realizar as

entrevistas, sendo que três dos sujeitos mencionaram problemas pessoais no dia e

um sujeito alegou esquecimento.

No dia do convite para participar como sujeito da pesquisa, aos pacientes que

concordaram em participar desta, foram explicados, individualmente, o objetivo da

pesquisa, a necessidade do termo de consentimento e foi, ainda, agendado um dia

conveniente ao sujeito e à pesquisadora para a realização das entrevistas.

Na explicação sobre o objetivo da pesquisa todos os sujeitos tiveram dúvidas

no conceito da mobilidade, foi explicado de maneira coloquial, com exemplos e ficou-

se o termo locomoção de si e de um lugar para outro, para melhor entendimento

destes.

44

O segundo encontro foi realizado individualmente, e nele foi explicado,

novamente, o objetivo da pesquisa e estando o sujeito ciente e concordando em

participar desta, foi convidado a assinar o termo de consentimento livre e

esclarecido.

Em seguida, foi aplicada a entrevista estruturada com duração de

aproximadamente cinco a quinze minutos com cada sujeito.

Após o término da entrevista estruturada, foi orientado ao sujeito que a

entrevista semi-estruturada seguinte, seria gravada, para que a pesquisadora

pudesse coletar os dados fidedignamente, como ele falasse. Observou-se que, no

início, alguns sujeitos ficaram constrangidos, olhavam para o gravador, mas, com o

passar dos minutos, foram ficando descontraídos.

A duração da segunda entrevista variou aproximadamente de quarenta a 100

minutos.

Após o termino de cada entrevista, a pesquisadora realizou anotações sobre

o comportamento do sujeito, observado no período de encontro.

A coleta de dados dos prontuários foi realizada em três encontros, devido à

dificuldade de se ter acesso a eles naquele momento, uma vez que se encontravam

com o profissional da instituição que teria atendimento com o paciente nesse dia ou

estava na comissão de prontuário da instituição.

A reunião com os profissionais da equipe foi realizada de forma individual com

os profissionais da instituição da pesquisa, onde se obteve o parecer dos

profissionais da endocrinologia, psicologia e nutrição.

45

V - RESULTADOS E ANÁLISE DOS DADOS

1 - Procedimento da análise

As entrevistas foram analisadas a partir das questões levantadas da própria

entrevista. Será apresentada, a seguir, a legenda que identifica quais questões

foram trabalhadas:

Questão 1 – Fale sobre a sua vida após a cirurgia.

Questão 1.1 – Como é hoje a sua locomoção?

Questão 1.2 – Sobre a sua casa, qual o lugar de que mais gosta? Por

quê?

Questão 1.3 – A que lugar gosta de ir, ao sair de casa? Por quê?

Questão 2 – Qual o significado que tem para você a sua locomoção?

Questão 2.1 - Como você percebe seu corpo após a cirurgia?

Questão 2.2 – Como você se sente hoje?

46

Os dados foram apresentados por questão, seguindo cada sujeito, sendo que

os sujeitos foram designados por pseudônimos.

2 - Dados sobre os Sujeitos

Amadeu Bia Caio Dirce Elen FernandaIdade 43 37 44 28 41 49Sexo masculino Feminino masculino feminino feminino femininoEstado Civil solteiro Solteiro casado solteiro casado casadoNúmero deFilhos

2 0 1 0 3 8

Escolaridade 2º graucompleto

2º graucompleto

2º graucompleto

Superiorcompleto

1º grauincompleto

1 ºgrauincompleto

Religião evangélico Católico evangélico católico evangélico evangélicoOcupação motorista Cozinheiro auxiliar de

enfermagemauxiliar deenfermagem

Doméstica Do lar

RendaFamiliar (R$)

3.500 2.000 2.500 5.000 600 560

Maior PesoAtingido

190 152 132 138 130 152

Peso no diada Cirurgia

133 116 107 121 108,7 127

Peso Atual 107 98 83 102 91 105

3. Entrevistas

Questão 1 – Fale sobre a sua vida após a cirurgia.

a) Entrevista - Amadeu

“Bom, a minha vida após a cirurgia ela me trouxe assim muitas felicidades,

né... Porque a cirurgia ela foi assim, para mim é como se fosse uma luz no fim do

túnel. Uma coisa que eu desejava mas que estava muito distante...A cirurgia me deu

uma nova vida, hoje eu sou uma pessoa com a auto-estima lá em cima, sabe.”

b) Entrevista – Bia

“Eu me sinto tão feliz hoje, que acho que contaria a minha história em rede

nacional... uma sensação diferente. Porque, acho que naquele dia eu senti que a

47

minha vida tava mudando...depois da cirurgia a gente vê muda tudo isso. Que você

não sente mais fome, aquela necessidade de estar sempre comendo, sempre

comendo... Não sei onde vai parar tudo isso, só sei que isso some. Pelo menos o

meu sumiu... Fico assim tranqüila, não sinto vontade de comer nada.”

c) Entrevista - Caio

“... após a cirurgia você passa a se vê, e até mesmo a se respeitar mais. A

dar valor a outros valores da vida, né. E, mudou, mudou muito, mudou muito. A auto-

estima principalmente foi parar lá em cima, a auto-estima, né. Porque a partir do

momento que você não se olha mais, e passa a se vê, você vê o seu eu. Você vê,

não as suas limitações, você coloca, são outros valores, é vida nova, né... Eu me

vejo no espelho e, e, me vejo né. Porque antes né, você comprava uma roupa e tal,

você ia para uma festa você via aquela roupa naquela hora. E depois você achava

um abuso, um absurdo a hora que você via na cama, aquela roupa pendurada

porque era enorme. Agora hoje não, é completamente diferente... Por inteiro, por

dentro e por fora, né. Cada minuto é outra coisa, disposição, pra tudo, pra saí,

paciência. Porque, o gordinho como se diz por aí, o gordinho ele é engraçado, é

simpático, mas ele é muito estressado. Ele é estressado. Embora não pareça, é

aquela coisa assim né, você olha por fora você não sabe o que tem dentro. Agora,

não. A partir do momento que você faz essa cirurgia que é invasiva, muitos falam, ah

não, é uma coisa rápida, ela é invasiva, ela é agressiva, mas pra mim foi um mal

necessário. Porque nesse momento da minha vida eu precisava mudar algumas

coisas. Mas é uma mudança que eu impus a mim, e que eu estou me adequando.

Não que a vida, a circunstância, não. Eu que impus a mim e estou tocando pra

frente.”

d) Entrevista – Dirce

“A cirurgia, a minha cirurgia foi ótima, não tive dor, não tive enjôo, não tive nada. Até

hoje não tive nenhum dia que eu comi e passei mal. Porque eu me preparei bem

psicologicamente antes. Então, eu masco bastante, como. É sagrado pra mim a hora

da comida, né. É mudou bastante.”

48

e) Entrevista - Elen

“Nos primeiros quinze a dezesseis dias, eu entalei. Você tem que ir no

hospital fazer endoscopia. Por causa que a minha menina estava comendo assim,

goiaba, e eu peguei e pedi uma mordidinha da goiaba dela. Eu não sei se eu não

mastiguei direito e eu engoli... Tenho medo de sofrer. Que, depois dos trinta dias,

tava com uns quarenta dias, começou a me dar muita cólica, eu não tinha cólica.

... Até os trinta dias. Depois dos trinta dias, acho que depois comecei a me

alimentar, começou a me dar muita fome. Nossa, mas uma fome que eu não

agüentava. Eu terminava de tomar o café da manhã, um pouquinho de café com

leite, com adoçante, duas bolachas de água e sal, nossa, quando era nove, dez

horas, eu não estava agüentando de fome. Daí eu comia um pedacinho de uma

fruta, né. Daí ficava tomando água, líquido, até chegar meio dia pra mim almoçar

novamente. Nossa, mas é uma fome nesse intervalo que eu não estava agüentando,

sabe. Daí, eu peguei e falei assim, meu deus, eu vou ter que parar com isso. Porque

se eu ficar também, eu corro atrás da fome, querer tampar a fome, né. Eu não vou

emagrecer, né. Até a nutricionista falou assim, que eu emagreci muito pouco.

Nesses dois meses, continuo, fez três meses, tem seis quilos que eu emagreci. É,

ela falou assim, que é muito pouco, que eu não perdi peso. Que era pra mim ter de

um lado, é dez por cento do peso em dois meses, e deu somente seis por cento do

peso. Ela falou assim, que o meu organismo que é mais difícil pra emagrecer... Não

é fome, é que você acostumou, ficou aquele ar que tem que ficar catando as coisas

para comer, né. Daí eu fico me segurando, daí quando é a hora do almoço, eu pego

uma colher de arroz, uma de feijão ou então caldinho de feijão, e, uma fatia de

tomate, porque mais que isso você não consegue, e um pedacinho de mistura, ou

um peito de frango ou um bifinho. E aí vou mastigando, mastigando, mastigando a

comidinha é trinta, quase quarenta minutos para conseguir comer aquilo. E não é

todo dia sabe, tem dia que não consegue. Tem dia que, que nem eu falei para você.

É, daí eu peguei e cortei. Agora, nossa, já acostumei. Mas nos primeiros dias foi

difícil. Domingo passado eu comecei a cortar, foi difícil. Porque é, dava intervalo de

três horas, três horas e pouco...E eu queria comer, comer, que eu tava acostumada,

né. Foi difícil. Mas agora já tô acostumando bem. Ontem foi já bem melhor, hoje tá

bem melhor, né.”

49

f) Entrevista – Fernanda

“É bem melhor que antes, né. Tinha muita canseira toda, pra andar, tudo que

eu fazia era difícil, né. Pra caminhar, agora é melhor. Pra dormir também, deus me

livre, tinha falta de ar.”

Síntese da Questão 1

A vida, após a cirurgia bariátrica, trouxe felicidade para Amadeu e Bia. Para

Amadeu, a cirurgia representou uma luz no final do túnel, como se conseguir

emagrecer estivesse muito distante; hoje é uma pessoa com uma elevada auto-

estima. Para Bia, o sentimento é de que sua vida mudou, está mais tranqüila, por

não ter mais vontade de comer. Caio relata que aprendeu a se respeitar mais, dar

valor a outros valores da vida, não ver as suas limitações, “se ver por inteiro, por

dentro e por fora”, sendo uma vida nova, com uma elevada auto-estima. Dirce refere

que a vida mudou bastante e o momento da refeição se tornou sagrado. Já, Elen,

enfrentou um momento traumático após a cirurgia, pois teve que ser submetida a um

procedimento de endoscopia; sentia fome até os dois meses e hoje relata estar se

acostumando a comer menos. Fernanda diz que sua vida está bem melhor que

antes, porque tudo que realizava antes da cirurgia era mais difícil, agora é melhor,

como andar e dormir.

Questão 1.1 – Como é hoje a sua locomoção?

a) Entrevista – Amadeu

“A minha locomoção está ótima. Hoje, inclusive, aconteceu uma coisa com a

minha perna da semana passada, né, que eu não subia escada, tipo assim, uma

escada subir no telhado, né. Eu não subia. Eu hoje, da semana passada, eu subi

numa escada entendeu. O sapato, antes para amarrar o sapato eu tinha que colocar

o pé em cima de uma cadeira, pra poder curvar um pouco o corpo e com alguma

dificuldade amarrar o sapato. Hoje eu abaixo, amarro o sapato, entendeu. Se

precisar pintar o roda pé de uma parede eu passo o tempo todo abaixado pintando o

50

roda pé da parede e não me sinto mal, me sinto bem, entendeu. Até, inclusive eu

conversei com a doutora, a psicóloga na entrevista retrasada, né. Que eu estava me

sentindo com muita energia, eu estava me sentindo muito ativo, e as atividades que

eu estava fazendo estava sendo poucas, pelo tanto de energia que eu tinha, sabe. O

meu trabalho, a minha caminhada, tudo que eu estava fazendo, estava sendo muito

pouca. Inclusive, eu era uma pessoa muito sedentária devido a minha obesidade, eu

ficava a maior parte do tempo deitado, assistindo televisão, né. E então a vida era

muito parada. Antes a gente dormia durante o dia, hoje não. Hoje eu não sei nem o

que é saber dormir de dia mais. De dia para mim é, quem dorme é só criança, eu

não durmo mais. E também não fico deitado. Ás vezes eu chegava do trabalho, né e

já chegava cansado, Por quê? Devido a obesidade. A obesidade já cansava mais do

que o próprio trabalho. Mas hoje não, hoje eu chego do trabalho já troco de roupa,

vou fazer caminhada, vou pedalar na bicicleta ergométrica, você entendeu, estou

sempre me mexendo. Quando não, vou dar uma limpada no quarto, varrer o chão e

passar um pano, sabe, então, eu não paro. Você entendeu. Eu tomava um banho,

chegava do serviço quatro horas, quatro e meia eu tomava banho, né. Cinco horas

eu deitava na cama e só saía da cama outro dia, de manhã para trabalhar. Hoje eu

durmo antes da meia noite entendeu. Sempre fazendo uma coisa e outra, aumentei

não só a minha atividade física como também a minha atividade cultural, né. Que eu

gosto de ler um livro, ficar escutando uma música também. Então, a minha vida ela

mudou bastante.”

b) Entrevista – Bia

“... não tem nem comparação a antes. Porque, eu sempre fui molona, sabe,

eu fui obesa desde criança, já nasci e cresci obesa, né. Então eu ficava muito dentro

de casa, não saía muito, porque ah, era muita dificuldade, né. Pra saí era mais de

carro. Então, hoje não, hoje eu ando, faço caminhada, se é pra saí eu sou a

primeira, vamos caminhando, então não tem nem comparação, hoje é muito melhor

que antes...Até às vezes eu me estranho, porque eu não paro mais dentro de casa.

Então, até falam assim, nossa, você precisa ficar em casa, porque eu não estou

ficando em casa, mas eu ando muito. Acordo cedo, já levanto, vou fazer a minha

caminhada, nossa, e é muito bom... Então, primeiro faço a minha caminhada né,

então, porque como o sol ta muito quente eu vou bem cedinho. Mas depois que

51

volto, aí eu vou cuidar do serviço da casa, porque eu estou desempregada né. Então

cuido do serviço da casa, faço comida, lavo roupa, tudo o que eu não fazia antes eu

agora faço na maior felicidade.”

c) Entrevista – Caio

“Ah, uma maravilha. Uma maravilha assim, em todos os sentidos, né. Porque

a pessoa obesa ela, ela não se vê, ela se olha... Ah, voltei a estudar, o trabalho você

tem mais disposição. Você vê o brilho das flores mais bonito. Oh, até engraçado, o

brilho das flores, você fala o brilho do sono, mas as flores também brilham, depende

da forma que você observa. Então quer dizer que você passa a prestar atenção, a

dar evasão a muita coisa que passava desapercebido a você. “

d) Entrevista – Dirce

“...esses dias eu até dei risada, porque uma coisa que pra mim todo mundo é

normal, eu consegui levantar e fazer a minha unha do pé. E quanto tempo sem

cortar a unha do pé, né... É, pra andar não tenho mais canseira, consigo andar a pé.

Tanto é que vinha só de carro trabalhar, agora estou vindo de ônibus. Eu consigo vir

tranqüilo, pegar um ônibus. Pra você, você quer colocar uma roupa não tem aquele

estresses, toda roupa que você põe não serve, você fica chorando toda hora, agora

qualquer roupa serve. Muito pelo contrário, não serve porque cai, né. E tudo, assim,

comer. Antes comia um bocado, e ficava ai que vontade de comer mais um pedaço.

Agora não, experimento. Como de tudo que eu tenho vontade, não deixo de comer o

que tenho vontade, mas como um bocadinho e já estou satisfeita. Não deixo de

fazer, porque eu não posso comer. Se eu quero fazer, aí penso em alguma coisa se

tenho espaço pra eles para que eu posso comer, mas um bocadinho e estou

satisfeita. Tudo, e é diferente, você muda, você se gosta mais, você tem mais

vontade de se arrumar, se olha no espelho, tudo é diferente... Ah, pra mim ir na casa

da vizinha ali embaixo era muito, não ia a pé. Se a minha mãe precisava buscar uma

farinha, alguma coisa pra ela, eu catava o carro e ia. Não ia a pé, não conseguia.

Hoje em dia se ela precisa buscar alguma coisa procuro ir a pé... Porque assim sei

que eu preciso quanto mais caminhar vai ser melhor pra mim, eu consigo ir, eu tenho

disposição pra ir. Porque lá eu chegava cansando tinha que sentar na casa dela.

52

Então, agora não, eu vou e volto tranquilo. Não tem problema... Ah, antes assim, a

gente tinha hora assim que, assim tinha vez que você sentia que estava

incomodando, que você ia passar por um lugar, tava apertada. Que nem circular a

sala, ia circular a sala, quase morria para não esbarrar nos cirurgiões. Hoje em dia

não, eu consigo passar por ali, boa, você tinha aquele medo de esbarrar, de você

passar por ali e incomodar, você sabe que está estorvando alguém, porque você é

enorme. Incomoda bastante.”

e) Entrevista – Elen

“Ah, tá muito bem. Nossa, tô muito feliz, eu não conseguia agachar para catar

uma caneta no chão, eu não conseguia agachar quando caía o sabonete, eu não

conseguia agachar para catar. Tinha que pegar outro no alto, um que tivesse ali

perto. Porque aquele que caiu no chão não conseguia catar. Nossa, era bem difícil.

Pra catar lixo no chão tinha que ter uma pazinha, aquelas de cabo grande, porque

aquelas baixinhas não conseguia abaixar, ficava muito difícil. Hoje em dia, nossa, eu

to me sinto outra pessoa, dá uma impressão que eu renasci novamente. É, eu

agacho, limpo o canto, eu ando, faço caminhada todos os dias, uma hora e quinze

minutos... Eu saio da minha casa e vou trabalhar, eu trabalho três vezes na semana,

segunda, quarta e sexta. Eu saiu da minha casa, sete horas, dez pra sete. E ando

quarenta e quarenta e cinco minutos pra depois pegar o ônibus. Não porque não tem

ônibus, tem ônibus na porta, mas é que eu, pra fazer a caminhada, os quarenta

minutos, quarenta e quarenta e cinco. Tento fazer sempre. E o dia que estou em

casa, terça e quinta, eu ando uma hora e quinze minutos. Saiu pra andar, ando,

quando dá, é, chego em casa por volta de casa dá uma hora e quinze minutos, uma

hora e dez minutos. Todos os dias. Pra dormir, tô dormindo muito bem. Eu roncava

muito meu marido falava, ele dizia que eu tô com sono assim, tão gostoso. Que eu

fico assim parecendo um neném quando tà dormindo. Sabe, aquele sono bem

suave, sabe. E antes eu roncava muito, ele falava. A gente não vê, a pessoa que

está do lado que vê assim. Nossa, essa cirurgia, vale a pena, sabe.Nossa, mudou

completamente. Tô muito feliz...Eu trabalhava, mesma coisa, só que era assim, eu

trabalhava, me esforçava sem poder mesmo, com aquela gordura, eu trabalhava, eu

chegava em casa, nossa, eu chegava exausta, não tinha coragem nem de fazer

janta. Mesmo assim tinha que fazer, né, na marra, né. Porque não tinha quem

53

fizesse, né. Mas era difícil, era muito sofrido. Eu sofria demais... Nossa, hoje eu não

sinto nada. Trabalho dia inteiro, às vezes saio do serviço, passo na cidade, pago

conta, é, compro mistura, coisas que tá precisando pra casa, vou embora, chego em

casa, já tá sujando, tá lavando louça da janta. É aquele ânimo, nossa, mudou

completamente. Antes eu tinha que fazer isso, entendeu, mas assim, parece que era

forçado, porque eu não agüentava, sentia muita canseira. Hoje em dia, nossa, esses

quilos que perdi.”

f) Entrevista – Fernanda

“Bem melhor. De primeiro pra subir a escada era um sacrifício, pra andar

subir a subidinha até lá na rua de casa, sofria. Pra ir no posto, né, tem que, acho que

dá mais, mais ou menos um quilômetro, né, de casa. Nossa como eu sofria... Eu vou

a pé e volto, né. E às vezes tinha que ir de ônibus, tinha muita dor no joelho, e agora

já não tenho dor mais. A dor já melhorou... Ah, eu ando e não sinto mais. Pra mim é

um prazer de andar. Porque não sinto dor mais nas pernas, no joelho, nada...

Dificuldade, tinha que apoiar né, na minha menina. Na filha que ia junto comigo.

Porque com ela, conforme ia andando parecia que a minha perna adormecia. Aí era

perigoso cair... Não saía sozinha de jeito nenhum... Hoje já dá para sair sozinha, só

que eles nem deixam, né, já tem aquele cuidado, já, costumado comigo, né. Mas eu

já tava pensando, que já tenho vontade de sair sozinha já, nem tontura nem tenho.

Antes tinha muita tontura.”

Síntese da questão 1.1

Amadeu relata que, hoje, a sua locomoção (mobilidade) está ótima, consegue

amarrar os sapatos, subir no telhado, ficar trabalhando abaixado. Sente que está

com muita energia para realizar atividades. Aumentou sua atividade física e cultural,

como ler um livro e escutar música. Bia diz que antes era “molona”, ficava dentro de

casa; hoje acorda cedo, faz caminhada, não pára em casa. Realiza os serviços de

casa, como fazer comida, lavar roupa, algo que não conseguia fazer antes. Caio

refere que a sua locomoção está uma maravilha em todos os sentidos, voltou a

estudar e a trabalhar com mais disposição. Dirce relata que sua mobilidade se

modificou: consegue cortar e fazer as unhas dos pés; andar de ônibus; colocar as

54

roupas; se deslocar para a casa do vizinho; ir buscar algo para sua mãe, sem

precisar ir de carro; caminhar, sem sentir falta de ar; sente-se mais disposta. Nos

lugares estreitos em que circulava, tinha medo de estorvar, como na sala cirúrgica;

hoje consegue passar por estes lugares sem medo. Elen relata que, hoje, consegue

se agachar para pegar as coisas no chão, limpa o canto, caminha, sente-se com

ânimo para realizar as atividades de casa e do serviço, não fica mais tão exausta,

como ficava, ao sair do emprego; chega em casa e está disposta a arrumá-la, caso

seja necessário. Fernanda diz que sua locomoção está bem melhor. Hoje consegue

subir escada, caminhar na subida, a dor no joelho diminuiu, tinha muita tontura e

somente saía de casa acompanhada. Agora acha que não precisa mais de seus

filhos para ajudá-la, tem vontade de sair sozinha.

1.2 - Sobre a sua casa, qual o lugar de que mais g osta? Por quê?

a) Entrevista - Amadeu

“Olha, eu gosto mais é do meu quarto, né. Porque é o lugar que é o seguinte.

Eu fiz um cantinho né, que eu me identificasse com ele. Que eu me sentisse bem,

que eu pudesse fazer as minhas auto críticas diárias que a gente passa o dia,

sempre deitado com a cabeça no travesseiro, e vê o que a gente produziu de

melhor. E ver se a gente fez algumas falhas para a gente corrigir e não repetir no dia

seguinte, né. E também para a gente sabe, poder relaxar, entendeu. Fazer planos

para o futuro, sabe. Eu tenho três quadros no meu quarto que eu fico olhando pra

ele e fico imaginando, imaginando.”

b) Entrevista - Bia

“...eu não paro mais dentro de casa. Então, até falam assim, nossa, você

precisa ficar em casa, porque eu não estou ficando em casa, mas eu ando muito.”

c) Entrevista - Caio

55

“Na minha casa, eu gosto da minha casa... Da minha casa, é, a minha casa,

eu costumo falar que a casa do homem é um castelo. Então a minha casa é um

castelo. Não tem essa, eu não quero isso, não, é a minha casa. Eu gosto das

minhas plantas, eu gosto do meu cachorro, eu gosto, porque eu moro numa

chácara, né. Eu gosto dos meus passarinhos. O sol se pondo, o sol nascendo. O

barulho da chuva molhando a terra, gosto do meu quarto, gosto de ouvir meus

discos, ler meus livros, enfim, eu gosto da minha casa. Não tem isso, ai, aquele

fetiche, eu gosto do meu quarto porque ali estou com minha esposa eu curto meus

momentos de amor, não, momentos de amor é a vida toda. Quando a gente

encontra a pessoa que te completa é a vida toda.”

d) Entrevista - Dirce

“Ah, eu gosto muito da sala... Ah, porque na sala, todo mundo, é o lugar que a

gente reúne a família, conversa bastante, faz bagunça. É o lugar que eu gosto... É

grande.”

e) Entrevista - Elen

“Ah, eu, eu gosto assim, mais de ficar na sala, né, porque têm o sofá, chego

lá eu deito, na hora que não tem nada pra fazer, assim, né... Ah, porque não sei, é

mais gostoso, é mais fresquinho,né, mais ventilação melhor.”

f) Entrevista - Fernanda

“Eu gosto mais da cozinha...Não sei. Acho que é o lugar onde a gente fica

mexendo, nas coisas da cozinha, então, da cozinha eu gosto mais.”

Síntese da questão 1.2

Sobre o lugar de que mais gosta da casa, Amadeu referiu ser o quarto, pois é

um cantinho que se identifica com ele, se sente bem, onde reflete sobre o dia e

relaxa. Bia não está ficando mais em sua casa, passa o dia passeando. Caio gosta

da casa como um todo, para ele é seu castelo. Ele mora em uma chácara, gosta das

56

plantas, do cachorro, dos passarinhos, de ver o sol se pondo, sol nascendo, do

barulho da chuva molhando a terra, de ouvir seus discos, de ler livros. Dirce gosta

mais da sala porque é o lugar onde a família se reúne, conversa, faz bagunça e é

grande. Elen também gosta da sala, porque tem um sofá onde deita, é gostoso,

fresquinho, tem uma ventilação melhor. Fernanda gosta mais da cozinha, porque é o

lugar onde fica mexendo para fazer a comida.

1.3 - A que lugar gosta de ir, ao sair de casa? Po r quê?

a) Entrevista - Amadeu

“No meu dia a dia, olha eu gosto do, aqui tem um projeto semear, que é um

lugar de viveiro de plantas, que cultiva plantas, como se fosse uma maternidade de

plantas né. Então, eu gosto de ir ali. Por quê? Porque é um lugar que é, dá uma paz

muito grande, e eu gosto de plantas e tal , e ali é muito gostoso, um lugar muito bom,

né. E, gosto também de ir na escola de música, a música ela é muito bom para a

alma da gente né. E, vou a igreja também.”

b) Entrevista - Bia

“... eu pela minha religião, o que eu mais gosto é participar dos grupos de

jovens assim, é onde eu vou. Meus passeios são mais mesmo na igreja, meus

movimentos, então, é uma coisa que eu gosto de fazer, que eu me identifico, que eu

já fazia antes e continuo fazendo agora... agora bem mais, bem mais.”

c) Entrevista - Caio

“Gosto muito de andar, eu gosto muito de conversar, eu gosto de ir a lugares

onde eu vejo as pessoas. Independente de eu ir a praia, de eu ir a um restaurante,

de eu ir a um cinema, ir a um teatro. Eu gosto de estar em lugares onde eu possa

conversar. Porque eu sou bastante comunicativo, tal. Então eu tenho que falar. Não

que eu tenho que expor minhas idéias, meu deus não, não. Gosto de conversar.

Gosto de ir a igreja, gosto de estar sempre orientando as pessoas naquilo que eu

57

posso. Então, não tem assim, ah eu gosto de ir a praia porque eu observo o mar,

acho bonito a imensidão do mar, eu vejo o tamanho do meu deus que é maior que o

mar. Não, nada disso, eu gosto de ir a lugares onde estejam as pessoas... A única

coisa que eu posso dizer pra você que mudou um pouco foi meu senso crítico né,

que falei a pouco, né. Comecei a dar mais valor, mudou meu senso crítico, que eu

era muito minucioso, na minhas análises, né. Então era muito detalhista. Então, por

eu dar mais valor a detalhes, não aproveito o bom e não serviu, acabou e tal. A

minha esposa diz, diz ela que eu estou mais maleável. (risos) Estou mais maleável.

Parece que você não é mais você. Você não que, que esteja mais, mas tem tanta

coisa mais importante que você, que as situações pra você mesmo, e você pode

deixar passar, que não vai mudar nada. Brigar pelo pingo da torneira, da torneira.

Nosso planeta é cheio de água, uma gotinha da torneira não vai fazer diferença.”

d) Entrevista - Dirce

“Assim, os lugares, eu sou uma pessoa que eu gosto, eu sou, eu gosto muito,

eu sou caseira. Eu gosto, eu vou bastante pra Igreja, nos encontros da Igreja, nos

grupos de jovens, eu trabalho com a Pastoral da Saúde, então estes é meus

ambientes que eu gosto. Assim, nunca fui de gostar de balada, sair essas coisas.

Então, mas eu tenho mais disposição pra trabalhar nas coisas que eu gosto.”

e) Entrevista - Elen

“Ah, eu gosto de ir sempre assim, sabe, é, antes eu não tinha coragem de sair

nem até assim na padaria, na esquina, não tinha coragem, porque, acho que a

gordura me impedia, né. Aquele desânimo, aquele mal estar. Hoje não, eu tenho

vontade de ir no supermercado fazer compra, é, passear, ir na casa dos amigos, das

colega, conhecer gente nova, às vezes eu encontro gente assim, no ônibus, né. Ah,

é você que é a Elen? Foi você que fez a cirurgia? Eu falo assim, ah, eu sou. Ah, vai

em casa pra gente conversar, eu pego o endereço. Aí eu vou conhecer a casa da

pessoa, sabe. Nossa, eu to muito feliz, gosto muito de passear, no final do ano vou

pro Paraná, a gente fica dez, onze dias lá., tudo. Agora, imagina agora que eu estou

mais magra imagina a delícia que vai se, né.

58

Já gostava, né... Muito mais, porque eu não tinha coragem. Tinha dia, eu

acho, não sei, eu não sei o que é, o que vem a ser depressão... Mas eu acho que

tava entrando em depressão. Porque tinha dia que eu não tinha nem coragem de

sair nem até o portão da minha casa. Era só dentro de casa. Era assim, terminava

de almoçar, já, só lavar a louça e ia se deitar. Era desse jeito. Agora hoje em dia,

não tenho nem vontade de ficar deitar não. Tenho vontade de ficar assim,

trabalhando, limpando as minhas coisas, os dias que fico em casa, lavando a roupa,

arrumando tudo, os quartos, as coisas de lugar, limpando a casa, deixando tudo em

ordem, sabe. Nossa, eu mudei completamente, eu virei outra pessoa.”

f) Entrevista - Fernanda

“Eu gosto de ir na Igreja, que mais... Agora faz dias que não vou, né. Mas tem

que começar ir agora, já posso caminhar. Ir andando, também, um quilômetro, acho

que um quilômetro e meio... Tinha que ir de ônibus... Mas eu gosto mais é de ir de a

pé... Só com a minha mãe, dos meus filhos né, que moram lá na vila perto lá, é os

lugares que eu vou.”

Síntese da questão 1.3

Os lugares a que gosta de ir ao sair de casa, para Amadeu, é o projeto

semear, um viveiro de plantas, por ser um lugar gostoso e que lhe dá paz. Também

gosta de ir à escola de música e à igreja. Bia, por ser religiosa, participa dos grupos

de jovens da igreja. Amadeu e Bia relataram que aumentou a periodicidade desses

lugares, hoje freqüentam mais, por ter mais disposição. Caio diz que freqüenta

lugares onde há pessoas, pois é comunicativo, gosta muito de andar e conversar,

seja num restaurante, cinema, teatro, igreja. Mudou muito seu senso crítico, ser

minucioso, detalhista, acredita que está mais maleável. Dirce diz ser uma pessoa

caseira. Ela vai para a Igreja, ao grupo de jovens, trabalha na Pastoral da saúde,

relata que tem mais disposição para trabalhar. Elen hoje tem vontade de ir ao

supermercado, conhecer gente nova, como no ônibus, viajar para o Paraná, onde

está sua família. Fernanda freqüenta a Igreja, casa dos filhos e de sua mãe; agora,

que está conseguindo andar, está caminhando um quilômetro.

59

2. Qual o significado que tem hoje para você a sua locomoção?

a) Entrevista - Amadeu

“... significado é só de alegria. É, significa o que? Que eu estou fazendo

coisas que eu sempre quis fazer. Sabe, ser uma pessoa normal, ter disposição, uma

coisa que eu não tinha antes, disposição, sabe. Um amigo me chama, ah, vamos

para tal lugar. Ah não, não estou com vontade. Ah, vamos. Ah, não estou com

vontade. Hoje não, qualquer lugar que me chama para ir, tô dentro, vamos... É

disposição. Ás vezes a vontade tem , você entendeu. Mas você imagina assim que

tem que andar daqui lá e tal, então eu pagava para não andar, sabe. Apesar que eu

tinha que andar. Porque, eu absorvia muita energia e não gastava.”

b) Entrevista - Bia

“... acho que é felicidade, viu. Porque hoje eu me sinto tão feliz de me ver o

quanto eu posso fazer assim, sem me cansar, sem me depender de ninguém.

Porque eu não dirigia, não dirijo, então se eu fosse sair quisesse ir de carro tinha

que ta pedindo pra alguém me levar. Agora não, eu vou, se precisar pegar o ônibus,

eu pego o ônibus, e vou. Então eu me sinto muito feliz. Não alcancei o peso que eu

quero, mas já me sinto realizada... Acho que tem um significado de vitória mesmo,

que eu corri atrás dos meus sonhos e consegui chegar lá. Que como eu te falei, vim

lá do Paraná para chegar até aqui. Deixei a minha família, deixei tudo que eu fazia e

acho que valeu a pena foi assim uma vitória mesmo.”

c) Entrevista - Caio

“Ah, tudo. Tudo, tudo. Não que eu esteja mudando o caráter, a personalidade,

porque isso já vem. Mas é vida, significa mais vida. Como eu disse a pouco é melhor

condição de vida. Melhor condição de vida é em todo sentido, não dá para mim

priorizar, são todos os sentidos. Se têm quatro lados a minha vida eu quero os

quatro. Então vou buscar cada coisinha né, que a minha vida me proporciona. Não

que eu vá mudar a dos outros, não mudança na minha vida. Tanto é que esse

60

espaço agora que eu ocupo Renata, sou eu. Tanto é que quem está respondendo

agora sou eu, não é a menina da esquina, ou a menina do lado, sou eu. Então esse

espaço é muito importante para mim, e hoje esse espaço é menor, é só duas

cadeiras.”

d) Entrevista - Dirce

“Ah, é bem melhor que antes. Eu tô vivendo, eu vou e volto, mais agora do

que antes... De que vou correr, eu já pensava, ah, vou correr e não vou agüentar,

não gosto de correr, não gosto de andar, então você já, ficava pensando, vou

começar a correr com alguém e já, vou chegar até ali e só pra ficar tirando o sarro.

Então, hoje não, será que você consegue. Eu tô tentando, tô melhorando a cada dia,

então.”

e) Entrevista - Elen

“Significa que, né, como eu tô falando, né, me sinto outra pessoa. Tá muito

bom pra mim, nossa, tô muito feliz. Se eu imaginasse que fazer essa cirurgia fosse

desse jeito, eu tivesse conseguido mais antes, eu teria feito mais antes. Porque vale

a pena, e é muito bom...Era assim, amarga, né. Um passado amargo, muito amargo.

Hoje em dia é doce, suave, gostoso.“

f) Entrevista - Fernanda

“Não sei dizer. É a coisa mais importante da minha vida. Falam que tem tanto

problema no mundo e, que nem lavar roupa mesmo, quando eu fazia serviço, eu

colocar a roupa no varal, nossa, tinha tontura. Era um sacrifício, caía. Quantos

tombos não cai no quintal da casa...Ficava virando né. Agora pra mim é bem mais

fácil. Não tenho mais problema... É mais fácil. Pra mim andar também, tinha tontura,

se eu fosse andar rápido não conseguia, né, andava de um lado para outro, parecia

bêbada. É bem melhor agora... Me sinto mais leve, né. Fazer tudo que, pra

caminhar, pra fazer o serviço... Parece um milagre, né. (risos) Um milagre que

aconteceu na minha vida.”

Síntese da questão 2

61

Amadeu relata que o significado que tem para ele a sua locomoção

(mobilidade) é de alegria. Hoje, ele está conseguindo fazer coisas que sempre quis

fazer, ser uma pessoa normal, ter disposição. Para Bia, é felicidade e vitória.

Felicidade, por ver o quanto pode fazer as coisas sem se cansar, depender de

ninguém, se precisar ir a um lugar, pode pegar um ônibus e ir. Vitória, porque correu

atrás de seu sonho e conseguiu. Ela deixou sua família no Paraná, largou tudo que

fazia para ser submetida à cirurgia bariátrica. Caio diz que significa tudo, mais vida,

é a melhor condição de vida em todos os sentidos. Para Dirce, significa ser bem

melhor que antes, que está vivendo, vai e volta, está tentando fazer coisas de que

antes desistia, como ir até a algum lugar; achava que não conseguia e nem tentava;

hoje tenta e está melhor a cada dia. Elen refere significar ser outra pessoa, está

mais feliz, pois seus dias antes eram amargos, hoje, viver é doce, suave, gostoso.

Fernanda diz significar ser a coisa mais importante em sua vida. Sente-se mais leve,

consegue colocar a roupa no varal, andar, parece um milagre que aconteceu em sua

vida.

2.1 - Como você percebe seu corpo após a cirurgia?

a) Entrevista - Amadeu

“... a gente já começa a perceber pela roupa que a gente vestia, né... Ela

começa a cair, ela já começa a ficar larga, você entendeu. Algumas que dá para

você ajustar você ajusta. Senão você faz, tem que comprar a roupa que você chega,

você usa um número 66 igual no caso que eu usava e aí hoje já cai para 58, você

entendeu, 56. E a roupa do gordo você coloca, você jamais vai viver assim de

elegância, tem assim uns gordinhos que são elegantes mas tem uns gordinhos

exagerados que não tem elegância nenhuma. Você já, você já vê assim, um

tamanho de roupa melhor, né. Inclusive hoje, que a minha roupa eu mesmo que

lavo, né. Pôxa, você vai lavar uma calça uma camisa do gordo é enorme...Parece

um lençol, se vai passar se passa o ferro pra lá e pra cá e não acaba. Hoje não, a

roupa até pra lava é mais leve...Diminuiu, sabe. Então as coisas, você vai ver, e

outra coisa também, às vezes o gordo ele foge do espelho né. Ele só se olha no

espelho assim do pescoço pra cima né, hoje não, hoje você tem assim uma

62

necessidade, uma curiosidade, de tá se olhando. Começa falar, ah, você ta bonito, e

tal. Então você sabe, aí você começa a se olhar...”

b) Entrevista - Bia

“... dá pra ver que eu já mudei bastante, né. Apesar que agora a gente olha e

vê assim umas peles que não tinha antes, né. Mas acho que tudo isso é

conseqüência né. Então, eu procuro não olhar para isso, eu olho e só vejo o quanto

que ele diminuiu, o resto eu não vejo. Mas assim, dá pra ver o quanto mudou o meu

corpo, para melhor... Mudou bastante, dá para perceber.”

c) Entrevista - Caio

“Ah, maravilhoso. Maravilhoso! É, eu ainda não me desfiz de roupa. É, como

é que eu digo. Olhando para aquelas coisas, aquilo é antigo, aquilo é do morto,

aquilo já foi. Então tá lá separado, tem algumas coisas que não servem ainda, tem

coisas eu comprei há anos que não me serviu, então é uma surpresa, cada dia você

descobre, é assim, como uma criança ou um adolescente que está descobrindo seu

corpo. Ah eu não fazia isso, tipo, eu não agachava com essa freqüência, eu não

dobrava o joelho e dobrei o joelho, ah eu não conseguia é fazer flexão, tanta flexão

abdominal hoje eu consigo. Então é uma descoberta a todo instante. Ah, eu consigo

subir, andar e não sinto falta de ar. Hoje eu corro. Então é uma descoberta

maravilhosa. Como eu sinto meu corpo, funcionando! Eu sinto meu corpo

funcionando!”

d) Entrevista - Dirce

“Cada dia menor... É. Cada dia melhor, que nem eu falo assim, quando você

olha no espelho, você fica assim, não tô nem aí, mas sem trauma. Só sei que ele tá

diminuindo, depois a gente dá um jeito, né. Depois faz exercício, cirurgia, mas o que

importa é conseguir eliminar o indesejável, calorias, né.

e) Entrevista - Elen

63

“Eu percebo que tô mais esperta, mais saudável, prá tudo, prá se virar, prá

agachar, tá. Nossa. Só o que eu tô notando é que tá descendo uns poucos a mais,

sabe, assim, tá ficando flácida a pele, né. Mas isso aí não importa, não esquento a

cabeça com isso não. A minha vontade é de emagrecer. Tô muito feliz, a minha

vontade é emagrecer. Sobre as peles que vai sobrando, isso aí fica escondidinho

debaixo da roupa, né. Isso aí pra mim tá ótimo.”

e) Entrevista - Fernanda

“Ah, bem melhor, né... O problema é que fica a sobra, sobraiada pra todo

lado, né. Tem que caminhar bastante, né. Pra, não ficar, as pelancas cair.”

Síntese da questão 2.1

A percepção de seu corpo, após a cirurgia, para Amadeu, é constatada pela

roupa que antes vestia e hoje está larga ou começa a cair; antes da cirurgia usava

número 66 e hoje está usando 56. Diz que fugia do espelho, só olhava do pescoço

pra cima, e hoje tem uma necessidade, curiosidade em olhar. Para Bia, percebe que

seu corpo se modificou bastante, pois vê “umas peles que não tinha antes”, relata

evitar o olhar para a pele e perceber o quanto seu corpo diminuiu e está melhor.

Caio relata que percebe seu corpo, após a cirurgia, como maravilhoso, porque é

uma descoberta maravilhosa a todo instante; hoje ele se abaixa com freqüência, faz

flexão abdominal, sobe, anda, corre, é como uma criança ou adolescente que está

descobrindo seu corpo. Sente seu corpo funcionando. Dirce percebe seu corpo cada

dia menor e melhor. Olha no espelho sem trauma e sabe que está diminuindo, faz

exercício e o que importa é eliminar as calorias. Para Elen, a percepção é de que

está mais esperta, saudável, se agacha, consegue se virar. Percebe que está

ficando flácida a pele, mas não se importa: as peles ficam escondidinhas debaixo da

roupa, a vontade é de emagrecer. Fernanda percebe seu corpo bem melhor, o

problema, para ela, são as peles que sobram e diz que precisa caminhar.

2.2 - Como você se sente hoje?

64

a) Entrevista – Amadeu

“Olha, felicidade, sabe. É, as pessoas parecem que elas se achegaram mais,

né. Tem a curiosidade de saber o processo da cirurgia, até pessoas que não vão

fazer, tem uns que são obesos e pensam em fazer esses daí estão sempre

chegando, às vezes, eles se tornam até repetitivo com as perguntas, pra, sabe, acho

que talvez pra adquirir uma confiança para fazer a cirurgia. Mas a gente também foi

paciente um dia e continua sendo e fizemos várias perguntas. Você entendeu. Às

vezes, até, pelo que passou e tem pacientes que vão passar, às vezes a gente

também acaba fazendo até um trabalho psicológico, né, com aquele paciente.

Orientando olha, assim, sabe. Então eu estou muito feliz, e as pessoas também

chegam em mim e falam assim, eu admiro você, eu me orgulho de você, às vezes

tem pessoas que falam, eu queria ser igual a você. Assim, pela perseverança, pela

vitória que eu tive. É, eu sou vitorioso. Hoje eu tenho, é, 83 kilos a menos o que eu

tinha, sabe. 83 kilos a menos, uma vez eu fiz um eletrocardiograma. E eu peguei e

falei assim, aí doutor, como é que está meu coração. Ele falou assim, imagine um

motor de um fusquinha puxando uma carreta carregada, sabe. Aí eu falei assim,

então esse motor não vai durar muito tempo. Uma hora ele vai fundir o motor,

porque é muito peso para pouco motor. Então hoje eu to com mais motor e com

menos peso. Você está com motor de caminhão com um fusquinha... É felicidade. É

poder estar vivendo a cada dia, um diferente do outro. Porque a cada grama que eu

emagreço é uma atividade amanhã, ou hoje mesmo a mais que eu posso fazer.”

b) Entrevista – Bia

“...eu me sinto meio boba ainda. Acho que ainda não caiu muito bem a minha

ficha. Eu estou sonhando. Sabe por que, sei lá, é uma coisa que esperei muito

tempo para acontecer e então, nesse pouco tempo que aconteceu, eu estou em

estado de graça assim. Eu estou viajando. Mas é muito bom... Primeiro porque me

sinto bem, me sinto melhor. Depois porque saio na rua e os amigos te olham e

falam, nossa como você está diferente, está mais bonita. Então é uma sensação boa

que te trás felicidade, né. E isso é gostoso... me sinto mais leve, me sinto feliz. Então

é uma sensação boa, mas primeiro para mim. Porque é comigo que está

acontecendo...”

65

c) Entrevista - Caio

“Olha se eu for avaliar o que eu como eu me sinto hoje, se eu falar bem, eu

vou estar é, sendo negligente comigo mesmo. Hoje eu me sinto muito bem. Muito

bem, e vai melhorar, porque eu estou naquele processo comigo mesmo. Hoje eu já

tenho a relação da alimentação o que eu posso e não posso, quanto ta, as medidas

já conheço. Tem aquele fantasma do dumping que sei muito bem trabalhar ele. Hoje

eu já vou as reuniões, festinhas numa boa. Já não é mais aquele puxa anti-social,

chegou aquele comilão. (risos) Não que ele é anti-social. Eu sei. Mesmo com a

cirurgia tem pessoas que se tornam anti-sociais, posso isso, não posso isso. Não se

não posso eu não posso, não precisa falar. Não precisa ser desagradável. Eu não,

sou bom divã, sociável, extrovertido, brinco. Eu sou é bonagente.”

d) Entrevista – Dirce

“Me sinto melhor. Melhor, mais feliz. É gostoso, né. Você vê, aonde você vai,

nossa, como você está magra, ai, como você está mais bonita. É, tudo isso é

gostoso. Porque antes, às vezes você chegava em alguém, nossa, como você está

gorda. É só isso que vem falar pra você. Você não é conhecida pelo seu nome, ah, é

a gordinha do C.O., a gordinha ali. Ah, Dirce, que Dirce, a gorda, então muda.”

e) Entrevista - Elen

“Nossa, eu fico muito feliz. Eu olho no espelho e fico, olha como eu estou

emagrecendo, roupa que não estava servindo mais, agora já serve. Nossa, a cintura

tá afinando mais, nossa, eu tô muito feliz... Eu olhava mais eu tinha até medo.

Chorava, falava meu deus, que corpo horrível. Eu cheguei até a mandar uma carta lá

pro Ratinho, pra ver se eu conseguia uma cirurgia, um regime, alguma coisa. Porque

eu não suportava mais aquela gordura. Cento e trinta quilos... Eu me olho. Eu me

olho e eu tô muito feliz, é muito diferente. Nossa, diferente, muito...Eu tô outra Elen

hoje. Muitos disseram pra mim que aquela Elen anterior não existe. Eu tô

começando a viver depois da cirurgia outra fase. Eu me sinto assim, sabe.Que eu

estou começando a dar mais felicidade na minha vida. Eu tentava ser feliz mas não

66

era feliz. Sabe quando você tenta uma coisa e você não consegue? Eu fazia isto,

todo mundo via eu com sorriso. Pra alegrar mais as pessoas, só que por dentro eu

não era feliz. Eu me fazia de feliz, mas eu não era feliz...agora ela é feliz mesmo de

verdade...Eu sou assim agora direto, direto. Se a caso eu fico nervosa por alguma

coisa assim, de repente já passa, eu falo, ah, deixa isso pra lá, porque fazer isso,

isso faz mal pra gente. Deixa eu ficar com a minha felicidade, com minha alegria.

Nossa, eu me sinto muito feliz... Questão das pessoas me olharem, né. Ás vezes até

as criancinhas, né. Você vai passando na rua, na frente da criança, porque a criança

não tem maldade né... Às vezes nem tá. Mas você se sente assim, entendeu. Agora

hoje em dia, nossa, aquilo, eu saio na rua assim, as pessoas falam assim. Nossa,

Elen, como que você está emagrecendo, como que você está mais magra, você está

ficando bonita. Nossa, aquilo me enche de alegria. Nossa, eu fico muito feliz... Sinto

que as pessoas estão me olhando, imaginando. Quem fala de mim, eu sinto que as

pessoas estão imaginando que a Elen está emagrecendo. Acho que ela deve estar

fazendo alguma coisa para emagrecer, imaginando isso, sabe...Hoje eu me sinto

como uma pessoa normal. Antes eu sentia como uma pessoa doente. Deus me

perdoe de eu falar, porque é muito triste essa palavra, porque a gente tem muito dó

de as pessoas que são assim, mas eu me sentia uma pessoa deficiente. Eu me

sentia assim, não era, tinha perna, braço, eu andava. Mas por causa da obesidade

era muito grande, né. Os cento e trinta quilos, cento e vinte e cinco quilos, eu me

sentia uma pessoa desse jeito. Uma pessoa deficiente que não tinha coragem pra

nada. Não tinha felicidade pra nada. Se fazia que estava feliz, mas não estava feliz.

Agora hoje em dia me sinto uma pessoa normal. Uma pessoa igual todo mundo,

normal. Uma pessoa feliz, pode trabalhar tranqüila, andar, passear, se divertir, né. E

antes eu não tinha essa felicidade.”

f) Entrevista – Fernanda

“Eu me sinto bem feliz, né. Mais do que antes. Porque era uma dificuldade

muito grande para emagrecer, só com cirurgia mesmo, né.”

Síntese da questão 2.2

67

Amadeu sente se hoje feliz e vitorioso, parece que as pessoas se

aproximaram mais dele. Bia sente-se meio boba, parece estar sonhando, viajando,

se sente melhor, uma sensação boa. Caio se sente muito bem e vai melhorar,

porque está num processo de mudança. Dirce sente-se melhor, mais feliz, as

pessoas falam que está mais magra e mais bonita. Elen se sente muito feliz, olha no

espelho e percebe o quanto está emagrecendo, a cintura está afinando, está

começando a dar mais felicidade em sua vida porque pode andar, trabalhar,

passear, se divertir. Fernanda se sente bem feliz, porque está conseguindo

emagrecer.

Em resumo, encontramos:

Na questão 1, (englobando 1.1, 1.2 e 1.3)

A vida, após a cirurgia, para Amadeu trouxe felicidade, apresentando uma

elevada auto-estima. A sua mobilidade melhorou visivelmente, pois consegue

amarrar os sapatos, subir no telhado, ficar trabalhado abaixado, apresentando muita

energia para realizar as atividades físicas e culturais, como ler um livro e escutar

música. O lugar de que mais gosta da casa é o quarto, porque se identifica com ele,

se sente bem, é onde reflete sobre o dia e relaxa. Ele gosta de ir ao projeto semear,

um viveiro de plantas, à escola de música e à Igreja; refere que os lugares de

passeio não mudaram, mas a freqüência a esses lugares aumentou.

Bia relata que a vida, após a cirurgia, mudou, é felicidade. Ela está mais

tranqüila por não ter mais vontade de comer, diz que antes não saía de casa, hoje

acorda cedo, caminha e os serviços de casa, que antes não conseguia realizar, hoje

consegue, como fazer a comida, lavar roupa, encontrando-se mais disposta. Não

possui um lugar de que mais gosta de casa, pois nem fica mais em sua casa. Por

ser religiosa, participa dos grupos de jovens da igreja.

Caio, após a cirurgia, aprendeu a se respeitar mais, a dar valor a outros

valores da vida, sendo uma vida nova; tornou-se mais maleável e com uma elevada

auto-estima. Ele refere que sua locomoção está uma maravilha em todos os

sentidos: voltou a estudar e a trabalhar com mais disposição. Sua casa, gosta dela

como um todo, é o seu castelo. Seus lugares sociais são aqueles onde há pessoas

para conversar, como um restaurante, cinema, teatro, igreja.

68

Dirce relata que sua vida, após a cirurgia, mudou bastante. O momento da

refeição se tornou sagrado, sua mobilidade se modificou, conseguindo cortar e fazer

as unhas dos pés, andar de ônibus, colocar as roupas, se deslocar para a casa do

vizinho, caminhar sem sentir falta de ar, circular em lugares estreitos sem medo e

percebe uma maior disposição. Sobre a sua casa, gosta mais da sala, porque é

onde a família se reúne, conversa e é grande. Sua vida social, por ser caseira,

freqüenta o grupo de jovens e trabalha na pastoral da Saúde.

Elen, após a cirurgia, enfrentou um momento traumático, pois teve que ser

submetida a uma endoscopia por ter se entalado com um pedaço de goiaba. O seu

apetite, até os dois meses, não havia se modificado, sentia muita fome, mas,

atualmente, está se acostumando a comer menos. Sobre sua mobilidade, agora

consegue se abaixar para pegar as coisas no chão, limpar o canto, faz caminhada,

sente ter mais ânimo para realizar as atividades de casa e do serviço. Sobre sua

casa gosta mais da sala, porque tem um sofá onde deita e é fresquinho. Hoje, gosta

de ir ao supermercado, conhecer pessoas novas, viajar de ônibus para rever sua

família.

Fernanda diz que sua vida está bem melhor, porque hoje as coisas estão

mais fáceis para fazer, como andar e dormir. Ela consegue subir escada, caminhar

na subida, a dor no joelho diminuiu, tinha muita tontura e precisava sempre de

companhia para sair de casa, hoje já não tem mais tontura e não precisa mais de

seus filhos para ajudá-la, tem vontade de sair sozinha. Sobre sua casa, gosta mais

da cozinha, pois é onde fica mexendo para fazer a comida. Sobre sua vida social,

freqüenta a igreja, a casa de sua mãe e dos filhos, pois agora está conseguindo

caminhar até um quilômetro.

Na questão 2 (englobando 2.1e 2.2)

O significado da mobilidade para Amadeu é alegria, está conseguindo fazer

coisas que sempre quis fazer, ser uma pessoa normal. Percebe que seu corpo se

modificou, o que constata na roupa que está larga ou começa a cair, e tem uma

necessidade e curiosidade de olhar-se no espelho. Sente-se hoje feliz e vitorioso e

as pessoas estão se aproximando mais dele.

69

Bia diz que significa felicidade e vitória. Felicidade por ver o quanto pode fazer

as coisas sem se cansar, não depender de alguém, poder pegar um ônibus para ir a

um lugar. Vitória porque conseguiu realizar seu sonho. Ela percebe que seu corpo

se modificou porque vê umas peles que não tinha antes, mas seu corpo diminuiu e

está melhor. Sente-se hoje meio boba, como se estivesse sonhando, sente-se

melhor, uma sensação boa.

Caio relata que significa tudo, mais vida, é a melhor condição de vida em

todos os sentidos. Percebe seu corpo maravilhoso, uma descoberta a todo instante,

sente ele funcionando, consegue se agachar, faz flexão abdominal, sobe, corre.

Hoje se sente muito bem e que vai melhorar, pois está num processo de mudança.

Dirce refere que sua mobilidade, hoje, significa ser bem melhor que antes,

que está vivendo, vai e volta. Percebe seu corpo cada dia melhor e menor, olha no

espelho e sabe que está diminuindo. Hoje se sente melhor, mais feliz.

Elen diz que significa ser outra pessoa, está mais feliz, seus dias são doces,

suaves e gostosos. Percebe que está mais esperta, saudável consegue se virar.

Sabe que está flácida a pele, mas a vontade é de emagrecer, olha no espelho e

percebe o quanto está emagrecendo, a cintura está afinando e está dando mais

felicidade a sua vida. Sente-se muito feliz.

Fernanda relata significar ser a coisa mais importante em sua vida. Percebe

seu corpo bem melhor, leve; o problema é as peles que sobram. Sente-se bem feliz

porque está conseguindo emagrecer.

Em resumo, temos que os pacientes expressaram que a vida, após a cirurgia,

é felicidade, mudança, modificação de valores, maior respeito por si mesmo,

sensação de estar melhor e um momento traumático.

A mudança da mobilidade em todos os sujeitos foi constatada como

caminhar, sem sentir falta de ar; vestir-se sozinhos; amarrar os sapatos; cortar as

unhas do pé; se abaixar; subir escada; executar serviços diários da casa e do

serviço, com maior disposição; ir a lugares caminhando, sem precisar de ajuda ou de

veículo para percorrer pequenas distâncias, como ir á padaria, supermercado, à

casa de amigos, pais, filhos e ao trabalho.

70

Sobre a sua casa, os lugares citados foram o quarto, a sala, a cozinha, a casa

como um todo, e que não há um lugar de preferência por não ficar mais em casa.

Foram escolhidos esses lugares por se sentirem bem, reunião familiar, arejado, onde

fica o tempo mexendo (cozinhando), simboliza o seu castelo.

Sobre sua vida social, foram escolhidos; o projeto semear, escola de música,

igreja, restaurante, cinema, teatro, casa da mãe, dos filhos. Os lugares não se

modificaram, mas a freqüência a esses lugares aumentou consideravelmente.

Sobre a sua locomoção, os significados foram de alegria, felicidade, vitória,

ser bem melhor que antes, ser outra pessoa, coisa mais importante na vida, tudo.

A modificação da percepção do corpo, após a cirurgia, foi constatada em

todos os sujeitos, pela roupa que está larga, no espelho, as peles que sobram, sente

que está diminuindo, a cintura afinando, está emagrecendo, percebe que o corpo

está funcionando.

Os sujeitos sentem-se hoje: feliz, vitorioso, que está sonhando, está melhor e

que irá melhorar.

4 - Dados Observados e/ou vivenciados pela pesquisa dora

Amadeu foi o único sujeito onde a coleta de dados da pesquisa ocorreu em

outro local, devido a questões jurídicas, por ser um local familiar do sujeito, este

estava mais à vontade e disposto, pois não precisou se locomover até o hospital. Ele

demonstrou ser uma pessoa comunicativa, percebi que havia se preparado para a

entrevista, tinha uma organização das idéias passo a passo. A entrevista dele foi a

de maior duração e rica em detalhes. Ele passou-me a sensação de estar seguindo

as orientações à risca, a medicação, a alimentação, a mudança do estilo de vida, à

vontade de mudar, um entusiasmo pelo momento vivenciado.

Bia encontrava-se disposta e calma durante a entrevista. Relata que era uma

pessoa caseira, introvertida, mas, depois que começou a emagrecer, socializa-se

facilmente, conhece as pessoas na rua, pega o endereço e vai até sua casa, assim

não fica mais o dia em casa. Observa-se que, com a cirurgia, a mudança de seu

71

corpo e a facilidade que sua mobilidade, ocorreu um desenvolvimento social e

modificou seu humor, tornando-se extrovertida.

Caio é uma pessoa comunicativa, estava disposto na entrevista, percebe-se

ser uma pessoa reflexiva atualmente; enquanto os outros sujeitos encontram-se

maravilhados pela modificação corporal que acontece diariamente e tentam

descobrir o que conseguem fazer a mais a cada dia, ele teve uma modificação de

valores, de humor. Relatou ser rígido com a vida antes da cirurgia e, hoje, ser uma

pessoa mais flexível, dificilmente perde o controle, como ocorria antes. Ele valoriza

não somente sua mobilidade, ir e vir, mas a natureza, como o amanhecer, o

entardecer, o cheiro das flores, o barulho da chuva, parece ter ocorrido uma

transcendência em sua vida.

Transcender, refere-se ao desenvolvimento de uma pessoa que após ter uma

experiência de vivência sofrida, consegue ter um outro olhar sobre a vida, valorizar

cada momento de sua vida e os fatos ao redor.

Dirce demonstrou ser uma pessoa retraída, a coleta de dados ocorreu no

vestuário da sala cirúrgica, devido ao seu trabalho e a indisponibilidade de horário.

Devido o local, pessoas passavam e a entrevista foi interrompida uma vez, pois teve

que prestar um atendimento. Estava disposta para a entrevista, mas com pressa.

Demonstrou perceber a mudança corporal que está ocorrendo em sua vida, mas, no

nível social, houve um leve aumento, continuando ser uma pessoa caseira.

Elen foi à única a passar um trauma após a cirurgia. O procedimento da

endoscopia a fez ficar com medo de que ocorra novamente, pois sofreu muito.

Percebemos ter compulsão alimentar, pois necessita o tempo inteiro estar com algo

em sua boca ou ingerindo algo, diz sentir muita fome. Parece ser uma pessoa

ansiosa; com 17 quilos a menos, após a cirurgia, apesar de ser menor a sua perda

de peso comparada com os demais sujeitos; a sua mobilidade se modificou,

conseguindo se abaixar, deslocar-se mais facilmente, viajar de ônibus para rever sua

família, pois ela veio do estado do Paraná para passar pelo procedimento cirúrgico

em Sorocaba, deixou sua família e emprego para conseguir uma mudança em sua

vida.

72

Fernanda possui sérios problemas nos joelhos, possuindo dores fortes e

dificultando seu deslocamento. Após a cirurgia, com seu emagrecimento percebeu

que a dor, ao caminhar, tenha diminuído; hoje sobe escada, uma rua na subida,

coisas que antes não conseguia, além da diminuição dos desmaios freqüentes.

Parece querer sua independência de ir e vir, não precisar mais de alguém ao seu

lado para ajudá-la, caso necessite. Estava cansada e introvertida no dia da

entrevista, mas disposta a colaborar.

5. Dados dos Profissionais da Equipe e Prontuário

Amadeu ficou internado durante nove dias no hospital; a cirurgia foi tranqüila,

apresentou deiscência de um dos pontos cirúrgicos, com saída de grande

quantidade de secreção, mas teve uma boa recuperação. Após três meses da

cirurgia, obteve uma boa evolução, com uma redução de 20% do peso.

Bia ficou internada seis dias no hospital, sua cirurgia foi tranqüila. Após três

meses da cirurgia, obteve uma redução de 15% do peso. Não é compulsiva, sente

muita sede devido à medicação e faz caminhada.

Caio ficou internado seis dias no hospital e foi um sucesso a cirurgia. Após

três meses de cirurgia, teve uma redução de 23% do peso, faz caminhada.

Dirce ficou internada seis dias no hospital, sua cirurgia foi tranqüila. Após três

meses de cirurgia, perdeu 15% do peso.

Elen ficou seis dias internada no hospital, sua cirurgia foi tranqüila. Em uma

das consultas com a endocrinologista teve uma crise dissociativa antes e durante a

consulta, na sala de espera; foi ao psiquiatra. Após três meses de cirurgia, perdeu

15% do peso. Está apresentando dificuldade a aderir ao tratamento dietético,

sentindo fome.

Fernanda ficou sete dias internada no hospital. Paciente faz há um ano e

meio acompanhamento com a endocrinologista do CHS; quando descobriu ter

hipotireoidismo foi medicada com PUSAN; nesse período perdeu 25 quilos, faz

acompanhamento com a psicóloga e nutricionista.

Foi internada em janeiro de 2006 para ser submetida à cirurgia bariátrica, mas

devido às más condições do centro cirúrgico, pela falta de leito na UTI, a cirurgia foi

cancelada e remarcada. Perdeu, após três meses de cirurgia, 17% do peso, não faz

atividade física devido ao problema no joelho.

73

VI. DISCUSSÃO

Com o objetivo de fazer uma leitura fenomenológica da pessoa obesa nos

três meses pós-cirúrgico bariátrico, irei identificar o significado que os sujeitos

entrevistados dão a sua mobilidade no atual momento.

Desta forma, SER-NO-MUNDO é o essencial para o ser humano existir.

Complementa Forghieri (1984), “Existir é estar em constante processo, indo sempre

adiante, caminhando para um futuro que se abre diante de nós, com possibilidades

imprevisíveis e incontroláveis.”(p.19)

Assim, no desenvolvimento da personalidade da pessoa o corpo ocupa um

lugar de extrema importância, e quando este sofre desadaptações, o corpo,

74

enquanto organismo reage nos aspectos emocionais, originando fenômenos

psicossomáticos.

Na primeira questão, sobre a vida após os três meses de cirurgia que os

sujeitos encontravam-se, observamos que houve uma mudança corporal

significativa, concomitantemente um aumento de sua mobilidade social refletindo em

seu estado emocional, onde os sujeitos relatavam sentir felicidade.

Ao ser submetido a uma cirurgia bariátrica o corpo modifica-se rapidamente,

sendo importante considerar que a consciência do espaço está relacionada à

consciência corporal, pois todo corpo ocupa um espaço e não há espaço sem corpo,

e este possui uma mobilidade, e através da mobilidade e da comunicação à pessoa

se coloca no mundo, para sua sobrevivência e com-vivência. O deslocamento do

corpo no espaço desenvolve a noção de imagem corporal segura, e através dessa

segurança sobre si que facilita as suas relações corporais. Complementa May;

Angel; Ellemberg (1977), “meu corpo deve significar sempre e ao mesmo tempo meu

eu” (p.280).

A mudança corporal resultante da cirurgia bariátrica, faz com que a auto-

imagem da pessoa obesa modifique, mas nem sempre pode corresponder à

verdadeira imagem que a pessoa manifesta em suas relações sociais. Porque pode

ocorrer um distanciamento entre o EU e a pessoa como um todo, originando a

existência de um conflito, minimizando este conflito em uma escolha dentro das

inúmeras escolhas que possui.

A representação que se faz do corpo, uma parte tem-se em comum com a

descrição feita pela anatomia, mas o resultado se faz através da experiência vivida,

da comunicação do meio que o circunda.

Como exemplo, os sujeitos referem que as pessoas dizem que estão mais

magras, mais bonitas, que parecem serem outras pessoas.

Merleau-Ponty (1971) refere que a imagem corporal é construída a partir da

familiaridade pré-reflexiva com o próprio corpo e das possibilidades de ação do

próprio corpo; ou seja, é a partir da percepção da experiência vivida que possibilita

sua identificação, através de sua mobilidade exploratória.

Assim, o esquema corporal ocorre com o conhecimento do próprio corpo

através da experiência subjetiva, e a percepção corporal através das relações com o

mundo exterior, sua mobilidade.

75

Todo contato social é favorável ao desenvolvimento humano, dependendo do

tipo de relação, as inúmeras pessoas terão funções de diferentes significações, e

que cada uma dará ao seu mundo de experiência pessoal.

Na segunda questão, é trabalhada o significado que os sujeitos dão a sua

mobilidade: alegria, felicidade, vitória, ser bem melhor que antes, ser outra pessoa,

coisa mais importante na vida, tudo.

Na pessoa que era um obeso mórbido e atualmente vivencia uma mobilidade

menos comprometida, esse movimento, deslocamento apresentado a cada dia lhe

dá um sentido e o torna significativo em sua vida, modificando até mesmo seu

estado de humor.

Os sujeitos que antes possuíam uma passividade e limitação dos movimentos

corporais, ao vivenciar e desfrutar de sua mobilidade a cada dia modifica seus

horizontes, estimulando sua criatividade e aumentando a significação das vivencias.

O movimento corporal que se modifica a cada dia com a perda de peso, faz

com que cada olhar, cada passo que se dê, significa a eleição de um ponto do

espaço, acolhedor ou não, mas com uma mudança de significação diariamente. Por

exemplo, os sujeitos referem que após a cirurgia o caminhar ganhou um outro

significado em sua vida, andam melhor, mais leve, com maior disposição; Caio

consegue correr atualmente, que para ele representa um significado talvez melhor

que caminhar.

Através das significações que o paciente pós-cirúrgico refere a cada

mobilidade conquistada, constata-se a evolução de sua capacidade exploratória

vivencial, percebendo a modificação que está ocorrendo em sua vida, não somente

corporal, mas de mobilidade social, relações inter e intrapessoais, valores e sentido

que dá a sua vida atualmente, podendo minimizar ou prevenir o surgimento de

patologias.

76

VII. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo sobre o significado da mobilidade dos pacientes obesos nos três

meses pós-cirúrgico é um conhecimento para a compreensão sobre sua mobilidade

ressaltando a importância do acompanhamento psicológico.

A cirurgia bariátrica é um tratamento invasivo que possui um resultado

emagrecedor imediato ocorrendo mudanças corporais diariamente, e a

autopercepção da pessoa muitas vezes não acompanha essa transformação

corporal.

A não percepção de sua mudança corporal pode trazer sérios prejuízos na

adesão ao tratamento uma vez que o processo pós-cirúrgico é sofrido, apresentando

dor corporal, alimentação modificada, medicação durante toda a sua vida, podendo

77

o paciente frustrar-se de sua decisão tomada, uma vez que precisa ocorrer uma

modificação no estilo de vida como um todo.

Ressalta-se que a mobilidade em relação a si e aos locais vivenciados

melhoram significativamente, quando ocorre a mudança de percepção corporal

apresentando uma maior disposição para realizar atividades que eram executadas

de maneira sofrida passam a serem realizadas com menor esforço, tornando-se até

mesmo prazerosa.

Caso esta mudança de mobilidade não seja desfrutada, o paciente não

perceberá os benefícios conquistados, dificilmente modificará seu estilo de vida,

podendo não aderir ao tratamento e propondo riscos a sua vida.

A pessoa portadora de obesidade mórbida muitas vezes torna-se uma pessoa

passiva, antissocial devido todo contexto vivido. Quando é submetida à cirurgia

bariátrica, ocorre à perda de peso, sua saúde melhora como um todo, mas a não

consciência de sua percepção e não aceitação dessa mudança, onde alguns

pacientes acreditam que não modificaram e não podem desfrutar de sua mobilidade,

percebendo uma obteção de um ganho secundário como a ajuda financeira do

governo que agora é perdida, o olhar do outro que não a vê mais como uma pessoa

limitada, ela em conflitos existenciais.

Sugere-se ao psicólogo fazer um trabalho de acompanhamento pré e pós-

cirúrgico bariátrico, para que os pacientes estejam conscientes de sua real

modificação, não somente corporal, mas de sua mobilidade, alimentação e estilo de

vida. Para isso, necessitamos de mais estudos a respeito sobre a mobilidade social

e as conseqüências emocionais envolvidas no paciente pós-cirúrgico bariátrico.

A sociedade brasileira, como todas as outras, necessita reinserir a pessoa

obesa e obesa mórbida no contexto social, pois, hoje, não se pode mais ver a

pessoa “gorda” como a diferente e, sim, como cidadã, que nunca deixou de ser. A

mobilidade tem, como um dos objetivos, a busca da cidadania, o direito de ir e vir,

participando do gozo dos direitos civis, sociais e políticos.

78

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ADES, L.; KERBAUY, R. R. Obesidade: realidades e indagações. Psicol. São Paulo:USP, .13(1), 2002.

ALBINO, E; CERCHIARI, N. Psicossomática: um estudo histórico e epistemológico.Rev.Psicologia Ciência e Profissão,20 (4),2000: 64-79.

ALEXANDER, F. Medicina Psicossomática. Artes Médicas. Porto Alegre, 1989.

BENEDETTI, C. Obesidade e Emagrecimento: um estudo com obesos mórbidossubmetidos a gastroplastia. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo- SP.2001,147p (Dissertação de Mestrado).

BINSWANGER, L. El caso de Ilse. In:MAY, R.; ANGEL, E.; ELLEMBERG, H.Existencia. Madrid. CapVIII, 1977.

79

BUSSE, S.de R. (org.). Anorexia, bulimia e obesidade. Barueri, SP: Manole, 2004.

CARDOSO, N. M. P. Doença Oncológica e Alexitimia. Contributo Pessoal.Dissertação de Mestrado Universidade de Coimbra, 1995.

CASALNUOVO, C. A; EGUILEOR, E. O. de; BRITES, G.; BRAGUINSKY, J. CirurgíaBariátrica con Banda Gástrica Ajustable. Rev. Argent. Cirug; 80 (3-4),2001: 86-99.

COUTINHO, W.F.; BENCHIMOL, A .K. Obesidade Mórbida e Afecções Associadas.In: GARRIDO JUNIOR, A . (org). Cirurgia da Obesidade. São Paulo: Atheneu,2002:.13-17.

CURTIN, G.T. Mobility-social and psychological implications. The New Outlook,56(2), 1962: 5-9.

CSENDES, A . J.; BURDILES, P.; DÍAZ, J. C.; MALUENDA, F.; BURGOS, A .M.;RECIO, M.; HERNANDEZ, J. A. Resultados del tratamiento quirúrgico de la obesidadmórbida.Análisis de 180 pacientes. Rev. Chilena de Cirurgia, 54 (1), febrero, 2002: 3-9.

DIAS C.A .(1981) Psicossomática e Reumatologia. Separata do “Jornal do Médico”.Fev, 1981:215-221.

DONATO, A; OSORIO, M.G.F; PASCHOAL, P.V.;MARUM,R.H. Obesidade.InBUSSE, Salvador de Rosis (org.). Anorexia, bulimia e obesidade. Barueri, SP:Manole, 2004.

FERNANDES, L. C; PUCCA, L; MATOS, D. Tratamento cirúrgico da obesidade. J.Bras. Méd 80(3), mar, 2001: 44-9.

FERREIRA, Aurélio B. de H. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. Rio de

Janeiro: Nova Fronteira , 2006.

FORGHIERI, Y.C. Psicologia Fenomenológica: fundamentos, método e pesquisas.São Paulo: Pioneira, 2004.

GARRIDO JUNIOR, H. Cirurgia em Obesos Mórbidos: Experiência Pessoal.Arq.Bras.Endoc.Metab., 44(1), fev. 2000.

____________________ . Cirurgia da Obesidade. São Paulo: Atheneu, 2002.

GODOY, Antonio Carlos Marsiglio de. Emagreça pela cabeça.3ªed.-São Paulo; MGEditores, 2002.

GUNTHER, H. Mobilidade e affordance como cerne dos estudos pessoa-ambiente.Estudos de Psicologia. 8(2), 2003: 273-280.

GUZMÁN, S.B.; BOZA, C.W. Reflexiones sobre la cirugía de la obesidad mórbida.Rev. Chil. De Cirugía,.53(2), abril, 2001:129-134.

80

LOLI, Maria Salete Arenales. Obesidade como sintoma: uma leitura psicanalítica.São Paulo: Vetor, 2000.

MANCINI, A. In: GARRIDO JUNIOR, H. Cirurgia da Obesidade. São Paulo: Atheneu,2002.

MELLO FILHO, Júlio de. Psicossomática Hoje. Artes Médicas. Porto Alegre, 1992.

MERLEAU-PONTY, M. Fenomenologia da Percepção. São Paulo: Fretas Bastos,1971.

NEDER, M. O psicólogo e a pesquisa na instituição hospitalar. Rev. de PsicologiaHospitalar, FMUSP. São Paulo: 3(2): 2-4, jul/dez, 1993.

MORAES, J.C.C.de. A mulher obesa enfrentando a própria obesidade: um estudoclínico psicológico. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo-SP. 2004, 337f.(Tese de Doutorado)

SABBIONI, M.E.E; DICKSON, M. H.; EYCHMÜLLER, S.; FRANKE, D.; GOETZ, S.;HÜRNY, C.; NAEF, M.; BALSIGER, B.; MARCO, D.; BÜRGI, U; BÜCHLER, M. W.Intermediate results of health related quality of life after vertical banded gastroplasty.Int. J. Obes. Relat. Metab. Disord: 26(2), 2002: 277-80.

SAMI-ALI. Pensar o Somático. Imaginário e Patologia. Guide-Artes Gráficas Ltda,1992.

SANTOS, Francisco Carlos Gomes dos. Identidade pessoal de obesos mórbidossubmetidos á cirurgia bariátrica: uma metamorfose emancipatória?.PontifíciaUniversidade Católica de São Paulo- SP.2003, (Dissertação de Mestrado).

THIRLBY, R. C., RANDALL, J. A Genetic; “Obesity Risk Index” for Patients withMorbid Obesity. Obes. Surg.12, 2002: 25-29.

TRONCOSO, P. G.; NÚÑEZ, I. V.; GUZMÁN, S. B. Protocolo de atención kinésica enpacientes portadores de obesidad mórbid sometidos a bypass gástrico. Rev. Chilenade Cirugía. 54(4), ago 2002: 437-443.

ZILBERSTEIN,B; GALVÃO NETO, M.; RAMOS, A. C..O papel da cirurgia notratamento da obesidade. RBM-Rev.Bras.Med., 59 (4),abril , 2002.

WAIDERGORN, L.; LOPES, C.; EVANGELISTA, R. The psychologycal attendance tothe morbid obese. Psyke – R. Cur. Psic. Cent. Univ. FMU: 1999. .4(2), jul-dez,1999:73-82

WHO. Obesity: obesity epidemic puts millions at risk from relates diseases. Report ofa WHO Consultation on Obesity. World health Organization, Geneva, 1997.

81

ANEXOS

ANEXO A

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Clí nica

Núcleo de Psicossomática e Psicologia Hospitalar

COMITÊ ÉTICA EM PESQUISA – CEP

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

82

I- DADOS DE IDENTIFICAÇÃO DO PARTICIPANTE DA PESQUI SA

Nome do(a) participante: _________________________ _______________

Documento de identidade n° :____________________

Data de Nascimento :___/___/______

Endereço: ________________________________________________n.____

Complemento: ________________ Bairro: __________________________

Cidade: ________________________________ CEP: __________________

Telefone: ( ) _________________________________________________

II – DADOS SOBRE A PESQUISA CIENTÍFICA

Título do protocolo de pesquisa: A mobilidade de pacientes obesos no pós-

cirúrgico bariátrico.

Pesquisador: Renata Emy Koyama

Profissão: Psicóloga

Inscrição do Conselho Regional n°: CRP 06/62443-0

Avaliação de Risco da Pesquisa: Risco Baixo

III – REGISTRO DAS EXPLICAÇÕES DA PESQUISADORA AOPARTICIPANTE DA PESQUISA

Você está sendo convidado a participar de uma pesquisa que tem como titulo:

A mobilidade de pacientes obesos no pós-cirúrgico bariátrico. Esta pesquisa tem

com objetivo principal descobrir o significado da mobilidade social para os pacientes

obesos após três meses de tratamento através da cirurgia bariátrica. Para a coleta

de dados serão utilizados 5 instrumentos, a saber:

1.Questionário Sócio-demográfico, para levantamento das características dos

sujeitos.

2.Entrevista Semi-estruturada, para descobrir o significado da mobilidade

social do s sujeitos atualmente.

3.Dados do prontuário diversificado dos diferentes profissionais,

endocrinologia, cirurgia, nutrição e psicologia.

83

4.Dados da reunião de equipe multidisciplinar.

5.Dados da pesquisadora, coletados após a entrevista.

Os resultados da pesquisa serão utilizados na elaboração de um relatório

como parte das necessidades para que o pesquisador obtenha o Titulo de Mestre

em Psicologia Clinica e, para futura publicação cientifica conforme sigilo

estabelecido pelo comitê de ética em pesquisa. Seu nome e de qualquer outro

participante jamais será divulgado.

IV – ESCLARECIMENTOS DADOS PELO PESQUISADOR SOBRE

GARANTIAS DO PARTICIPANTE DA PESQUISA:

1. Acesso a qualquer tempo, às informações sobre procedimentos, riscos e

benefícios relacionados a pesquisa, inclusive para diminuir eventuais duvidas.

2. Liberdade de retirar seu consentimento a qualquer momento e de deixar de

participar do estudo.

3. Salvaguarda confidencial de idade, sigilo e privacidade.

V- INFORMAÇÕES PARA CONTATO DO RESPONSAVEL PELA

PESQUISA

Pesquisadora: Renata Emy Koyama

Endereço: Rua Dez de maio, 111 ap301, Zona7, Maringá, PR

Telefones: (14) 32032939/ (14) 91110320/ (44) 99630008

E-mail: [email protected]

VI – INFORMAÇÕES COMPLEMENTARES

Os resultados da pesquisa estarão disponíveis aos participantes a qualquer

momento, bastando para tanto, contatar a pesquisadora e agendar data e horário.

84

VII - CONSENTIMENTO

Recebi, li e entendi a Folha de Informação do Paciente para a pesquisa

acima, também recebi uma explicação adequada sobre este estudo, seus

propósitos, riscos e sobre meus direitos como paciente. Eu tive a oportunidade de

fazer perguntas antes de tomar qualquer decisão. Sei que a decisão de tomar parte

desta pesquisa é só minha e tenho direito de mudar de idéia durante qualquer

momento do estudo. Estou certo de que não serei identificado e que tudo será

realizado com o máximo de confidencialidade. Com base nisso, autorizo a

participação nesta pesquisa.

Declaro que, após convenientemente esclarecido pela pesquisadora e ter

entendido o que me foi explicado, consinto em participar da presente pesquisa.

Sorocaba, _____ de _____________________ de 20______

___________________________________________

Assinatura do Participante da Pesquisa

___________________________________________

Assinatura da Pesquisadora

ANEXO B

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

COMITÊ DE ÉTICA DE PESQUISA

TERMO DE COMPROMISSO DO PESQUISADOR RESPONSÁVEL

Eu, Renata Emy Koyama, RG 21287373, pesquisadora responsável pelo

projeto de pesquisa intitulada: "A mobilidade de pacientes obesos mórbidos no pós-

cirúgico bariátrico"

85

Protocolo:

Declaro conhecer a Resolução MS/CNS - nº 196/96 e complementares do

Conselho Nacional de Saúde sobre Pesquisa Envolvendo Seres Humanos e

comprometo-me a seguir as normas e orientações, assim como a dar conhecimento

delas e exigir a co-responsabilidade de todos os outros participantes do estudo, no

seu cumprimento.

São Paulo, 30 de novembro de 2005.

Assinatura

ANEXO C

Entrevista Estruturada

Nome:

Data de nascimento:

Estado civil:

Número de filhos:

Escolaridade:

86

Religião:

Ocupação (trabalho):

Renda familiar:

Data da cirurgia:

Maior peso atingido:

Peso atual:

Data da entrevista:

Anexo D

Entrevista Semi-Estruturada Individual

87

1. Fale sobre a sua vida após a cirurgia.

1.1 Como é hoje a sua locomoção?

1.2 Sobre a sua casa, qual o lugar de que mais gosta? Por quê?

1.3 A que lugares gosta de ir, ao sair de casa? Por quê?

2. Qual o significado que tem hoje para você a sua locomoção?

2.1 Como você percebe seu corpo após a cirurgia?

2.2 Como você se sente hoje?

88

ANEXO E – ENTREVISTAS

P: pesquisadora

S: sujeito

SUJEITO- AMADEU

P:Amadeu fale um pouquinho para mim sobre a sua vida após a cirurgia.

S: Bom, a minha vida após a cirurgia ela me trouxe assim muitas felicidades, né.

P: Uhum.

S: Porque a cirurgia ela foi assim, para mim é como se fosse uma luz no fim do

túnel. Uma coisa que eu desejava mas que estava muito distante. Quando eu soube

que ia começar a fazer aqui no hospital regional a cirurgia, para mim foi uma alegria

muito grande, né. Porque devido às condições que eu me encontro, para mim as

coisas seriam muito mais difícil. Mas graça a Deus, as pessoas que estão aqui ao

meu redor, me ajudaram muito, né. E, eu consegui é, assistir as palestras, eu

consegui é, fui chamado para passar pela primeira consulta e tal. E é uma coisa que

eu sempre quis. Porque, uma pessoa obesa é uma pessoa limitada , né. A gente,

muita coisa que a gente tem vontade de fazer, e não pode fazer devido à limitação

de peso. Sem contar, que eu passei um momento muito difícil de enfermidade, né.

Eu num período de dois anos seguido eu tive duas internações devido a minha

obesidade, a minha circulação é ruim, né, e eu tive uma trombose na perna

esquerda né, fiquei doze dias internado né. E por pouco não perdi a perna, e no ano

seguinte né, eu já tive uma outra trombose na perna direita e fiquei mais nove dias

internados. Sem contar né, a dificuldade para tudo, ás vezes muita coisa que a

gente precisa pegar um objeto no alto fica dependendo de um amigo para estar

pegando, uma pessoa para tá, tá pegando. A cirurgia me deu uma nova vida, hoje

eu sou uma pessoa com a auto-estima lá em cima, sabe. Nem até, até tem muitos

pacientes que ele, querem fazer a cirurgia e se preocupam a com a pele que vai

sobrar, eu prefiro ter várias peles sobrando mas ser magro. Por que? Porque isso eu

estou conhecendo coisas, fazendo coisas que até então eu nunca fiz depois de

adulto. Porque quando a gente é criança a gente, eu sempre fui uma pessoa obesa,

né.

P: Uhum.

89

S:Desde quando eu nasci a minha mãe dizia que eu mamava nela e mamava duas

mamadeiras e meia, então eu sempre fui uma pessoa de muito apetite só que, até,

até mesmo eu penso, que eu não quero jogar a culpa do meu resultado nos meus

pais, mas eu acho que tem pais que às vezes eles agem errado. Porque veja bem.

Eu sou, eu sou uma criança no caso quando eu era criança, cada vez que a balança

aumentava um quilo né, a pessoa falava trinta quilo, olha, como ele está gordinho,

tal, a bochechinha dele, então, eu gostava de ser paparicado. Então acho que é por

isso, que eu sempre tive engordando cada vez mais. Mas se eu tivesse informação

que isso no futuro ia me prejudicar, jamais eu ia estar sabe, é, comendo e outra

coisa, eu não sabia me alimentar. Eu fui saber me alimentar depois de quarenta

anos, que foi quando eu comecei o processo para fazer a cirurgia,foi quando eu fui

frequentar a faculdade, é, frequentei as palestras né, na faculdade, foi quando eu

tive orientação, prá tá sabendo como se alimentar, né, prá estar assimilando também

o exercício físico, né. E hoje, nossa, eu não tenho nem palavras para dizer a alegria

que eu sinto né, depois de ter feito essa cirurgia.

P: No dia da cirurgia, você tinha alguma dúvida em fazer ela, passou por algum

momento

S: Olha eu, no dia da minha cirurgia a minha internação foi marcada para internar no

domingo às sete horas da manhã, né. Aí eu saí daqui tal, cheguei no hospital

internado, passei domingo o dia todo bem tranqüilo, aí na segunda feira também,

tranqüilo tal. Quando chegou à noitinha aí a enfermeira chegou no quarto né, e falou

assim, olha, amanhã seis e meia você vai para o centro cirúrgico.

P: Uhm.

S: Aí deu um frio na barriga, né, pois eu nunca tinha feito cirurgia nenhuma, mas eu

falei não, é o que eu sempre quis, e se tiver alguma dificuldade eu estou disposto a

passar né. Sem problema. E naquela noite procurei dormir bem tranqüilo,

sossegado, tal, dormi. De manhã a enfermeira já veio, me acordou, eu fui pro outro

quarto, depois coloquei a roupa para ir no centro cirúrgico, e do quarto a maca já

encosta assim na porta do quarto e vai deitado, né.

P: Uhum.

S: E engraçado que aí deitado assim, conforme a enfermeira vai empurrando a maca

aí vai passando assim as carga de luz no teto

P: Uhum.

90

S: E aquilo alí, sabe, não sei, e aquilo ali me deixou um pouco tenso, sabe. Aí subiu

o elevador tal, até o quinto andar. Quando eu cheguei lá na, na, eu não fui direto

para a sala de cirurgia, eu fui para uma salinha antes né, onde é medido a pressão

tal, se tá tudo bem, bati um papo, pergunta como está dá uma olhada nos exames, e

quando eu cheguei lá já tinha uma senhora que ia operar de apêndice, né.

P: Uhum.

S: E a gente ficou ali uns quinze minutos conversando, e aquele papo que a gente

bateu ali, foi o que a gente precisava para, eu acalmar ela e ela me acalmar. Mesmo

porque não é assim, assim nervoso, é um pouquinho de ansiedade, isso é natural. A

minha pressão ela geralmente é doze por oito, quando a médica mediu a minha

pressão ela estava doze por oito, mas quando ela mediu eu já tinha conversado com

a, com a amiga lá que ia operar também, mas se ela tivesse medido assim que eu

tivesse chegado lá a pressão estaria quinze, dezesseis. Aí, em seguida ela já saiu,

né. Foi para o centro cirúrgico, e os estagiários também eles participam, assistem a

cirurgia e tal, eles foram lá bater um papo com a gente, foi interessante também

ajudou bastante. Sabe, porque o médico ele chega ali, ele já te cumprimenta, ele

chega sorrindo, ele já deixa você mais relaxado, né. Aí quando eu fui para o centro

cirúrgico, aí eu falei bom, aí chegou à hora, a coisa que eu sempre quis vai

acontecer agora. Entrei no centro cirúrgico,tal.

P: Uhum.

S: Graça a deus. Me trataram muito bem, né. Aí colocaram o oxigênio, já foram

colocando o soro né.

P: Uhum.

S: Aí quando colocou a máscara de oxigênio acho que, já quando me aplicaram a

rack né.

P: Uhum.

S: Quando eu deitei aí já não via mais nada, né. Já tinha apagado. Agora à volta da

anestesia, após a cirurgia né, da anestesia geral,foi muito mais difícil, por quê?

Porque conforme a orientação médica, quando a gente é entubado

P: Uhum.

S: A gente respira através de aparelho, quando a gente volta da anestesia que a

gente acorda, a gente tem que fazer o pulmão da gente funcionar, né. Pela, pela

gente mesmo, normal né.

P: Uhum.

91

S: E, eu sempre tive dificuldade de respirar. Eu acordei, estava com os olhos

fechados e escutava a voz da enfermeira, respira, respira, eu sou meio preguiçoso,

respirava um pouquinho, parava sabe. Aí, depois umas três vezes aí eu firmei a

respiração. Aí, a dificuldade que eu tive onde que foi, eu tive muito vômito, após a

volta da cirurgia. Só que eu não sentia que eu tinha sido operado porque quando eu

acordei eu não sentia nada, né. Aí eu falei assim, pôxa mas será que eu já operei?

Aí eu falei assim, ah acho que já, porque tem soro, tem tudo aqui, eu fui para a sala

de cirurgia, eles não iam tirar eu de lá sem operar, aí eu peguei a mão aqui, pus a

mão e falei, ah, eu estava com a cinta né, ah, eu fui operado. Graça a deus, aí foi só

alegria, confirmou. Mas foi vômito o resto do dia, né, eu desci do centro cirúrgico, era

quatro horas da tarde, e quando, toda a noite inteira, o outro dia também. Aí quando

o médico passou,eu falei assim doutor, eu graça a deus eu estou muito bem, estou

sentindo um pouco fraco, né, um pouco debilitado, mas eu estou vomitando muito. Aí

ele falou assim, é o medicamento que tem, o dramal, dramal é para dor e ele

provoca vômito. Só que vamos fazer o seguinte, eu vou trocar ele por dipirona né, e

se o dipirona tirar a dor aí você fica com ela. Eu falei, excelente. Aí ele passou, eu

acabei passando dipirona, só que após a cirurgia os médicos eles orientam muito a

gente a andar. Por quê? Por causa da circulação, né. A circulação da gente e não

dar uma trombose. Como eu era reincidente de duas tromboses uma em cada perna

eu tinha que andar de todo jeito. Só que pôxa, eu tinha uma sonda aqui na uretra né,

tinha duas sondas aqui, e não foi fácil, porque eu fiquei praticamente umas quase

trinta horas de jejum, né, então pra mim estava muito fraco. E ainda estava na minha

ficha lá, todo plantão que trocava no hospital era pra mim andar. Só que depois que

acordei e vomitei, fui andar três dias depois, né. Mas dor não senti nada. Não senti

nada. Só o que me incomodou foi o vômito mesmo, né. E se precisasse fazer de

novo eu faria. Sabe, faria porque a alegria de ser a pessoa que sou hoje não tem

preço, não tem dor que pague.

P: E como é que foram os dias depois da cirurgia.

S: Olha, o dia depois foi o seguinte, a gente começa com uma dieta né, dieta líquida

e tal, que é o chá, né. E água não pode, água só pode depois de quatro a cinco dias,

né. E é só o chazinho e o caldinho, né. Só que o caldo, ele ainda desse bem, agora

o chá, não tem açúcar, não tem nada, é meio aguado ele é horrível. Mas a gente

discute, né. E então eu fui fazendo a dieta líquida, fui fazendo tudo, porque desde o

início, as coisas correram bem para mim, porque eu sempre pedi orientação médica,

92

segui orientação das psicólogas, endocrinologistas, todas, terapeutas, tudo correram

muito bem, graça a deus.Após cinco dias.

P: Uhum.

S: Eu já ia, eu vim para minha casa, né. E já ia ficar por minha conta,né. A dieta, a

água de coco, né.

P: Uhum.

S: Gatorade, caldinho, né. Então, eu praticamente fiz tudo. Eu tive um pós-operatório

muito bom, muito bom, eu já saí do hospital andando, né. Quando eu cheguei em

casa, eu mesmo já, eu mesmo que fazia a minha sopinha, né. Tomava banho

sozinho, tudo tranqüilo. Sabe, não tive dificuldade nenhuma. Acho que a vantagem

de estar em pena, de estar passando aquele momento, e o momento mais crítico é o

pós-operatório, né. Por quê? Porque, porque precisa ter muito cuidado para não

formar fístula, não é. Pra cuidar dos pontos que também estão muito molhados, a

gente tem que tá, sabe, não pode pegar peso, não pode subir escada, tem que

andar mas um pouquinho, sabe, somente o necessário para evitar uma doença é,

mais grave no caso da trombose, pra circulação.

P: E aí veio a primeira refeição. Depois de trinta dias.

S: É, eu, não. Eu com trinta dias, eu passei, não com vinte e cinco dias eu passei

pela nutricionista, né. Então, como ela viu que eu estava muito bem, ela falou assim,

olha, hoje fazem vinte e cinco dias, daqui mais quatro dias você completa os trinta

dias de cirurgia, então aí eu já vou estar liberando para você o arroz, mas o arroz

não assim, ele é uma papinha, sabe. Um arroz bem molhadinho, né. Você pode

estar se alimentando dele, né. E a carne bem desfiadinha, bem pequenininha, né.

Você pode também estar se alimentando porque a carne é o essencial, né, então eu

fiquei nessa dieta, também a maça cozida, a pêra cozida comendo raspando na

colherinha, e também hidratando bastante com gatrorade, com água de coco, né.

Com suco ela também liberou, suco Del Vale, né, então estar tomando suco, nada

de açúcar, né, doce só com quatro meses, refrigerante também.

P: E como que você lidou com a questão da quantidade, que foi bem menos do que

você comia.

S: Isso. Olha para mim não foi difícil. Sabe por quê? Veja bem, a partir do momento

que passei pela endocrinologista, pela nutricionista, ela passou uma dieta para mim,

então essa dieta, ela já foi trabalhando com o meu organismo, o meu hábito

93

alimentar, né, já diminuindo a proporção de comida, por quê? Porque se eu já

estivesse comendo vamos supor é 500g a cada refeição, né.

P:Uhum.

S:Quando eu operasse eu ia ter uma mudança de um dia para outro muito radical,

porque eu ia deixar de comer 500g a cada refeição e ia ter que comer, tomar 20ml

de líquido, né. Um copinho de café, né, mais é líquido não tem nada sólido, né, é só

líquido. Então, ia ter uma diferença muito grande e o meu organismo poderia sentir,

então ela já passou uma dieta, né. Não era uma dieta líquida, era uma dieta sólida

mas uma dieta bem balanceada. Não muito difícil. Pra quê? Para eu ir me

habituando para quando eu fizesse a cirurgia o meu organismo não tivesse um

impacto muito grande. E outra coisa, a própria cirurgia a gente não sente fome.

Quando tem fome, né. Muitas vezes, tem paciente que varia de paciente, tem alguns

que tem enjôo outros não, né. No meu caso não tive enjôo até hoje eu com 4 meses

de cirurgia só vomitei devido a medicação. Mas com a alimentação eu não vomitei,

só que, bom, aí é já é um processo lá na frente e tal, eu só queria falar que tem

alimentos que eu comia antes que hoje eu não consigo comer. Acho que dentro

desse paladar já não me dá prazer em comer, sabe. Mas isso já é um processo lá na

frente, né. Ainda estamos nos meus trinta dias de cirurgia. E, é.

P: Então com trinta dias você começou esse alimento sólido.

S: Mais trinta dias.

P: E você não sente fome.

S: Não sentia fome.

P: Desejo de comer alguma coisa que não pode.

S:Também não, não tinha. Depois pós trinta dias não. Mas depois dos sessenta dias

eu já tinha vontade de comer o que não como. Não tinha fome, mas tinha vontade

de comer, porque é um processo muito longo, né. Sem estar se alimentando, sem ta,

assim, comendo uma coisa que você está vendo ali, e você sabe o sabor daquilo ali,

sabe, você está impedido de comer, então você sente vontade de estar sentindo

aquele paladar daquele alimento, né. Mas não por fome, mas sim por sabe, quando

você está comendo chocolate, ele é, além de ele ser energia alimentar ele também é

prazeiroso, ele é gostoso, ele é saboroso, você entendeu. Mas não assim, uma coisa

assim, é também por comer e estravazar. Porque é vontade de, porque devido à

gente não poder comer nada doce, estar se alimentando mais por coisa salgado,

parece que o organismo ele sente falta, de açúcar, algo doce, inclusive eu antes da

94

cirurgia, eu nunca fui de falar de doce, nunca fui falar de chocolate, era muito

comilão mesmo, sabe. Agora hoje não, hoje eu sinto uma necessidade de comer

algo doce. Mas também nada que seja abusivo, sabe. Tudo tem limite.

P: Tem aquele desejo mas antes disso tem limite, você toma cuidado.

S: Isso, isso. É inclusive agora no final do ano né, nós fizemos festas do ano novo e

tal, então a gente tem vários pratos variados de alimento, disso, daquilo, só que a

gente que tem estômago reduzido à gente fala assim, bom,

tem churrasco, tem maionese, tem lasanha, tem frango, tem peru, tem pernil, só que

eu não posso comer tudo aquilo, eu vou escolher o que eu quero comer.

P: Hum.

S: Comi aquilo ali acabou, sabe, antes poderia comer um prato e variar, pra mim

não, isso aí hoje pra mim é uma coisa impossível querer comer tudo isso de uma vez

só. Eu escolho uma coisa e como, né.

P: Uhum.

S: Daqui umas duas, três horas eu vou e como outro alimento, né. Mas eu não

importo porque sabe, porque eu jamais vou me arrepender por ter feito a cirurgia.

Entendeu, pra mim é a coisa mais importante que aconteceu na minha vida. Porque,

eu vivi, sabe. Eu estou me conhecendo, eu tô buscando eu, porque antes não era

eu, sabe. Porque eu não era feliz, como é que poderia ser eu, sabe, não era normal,

sabe. Eu tinha uma coisa que impedia eu de poder lidar com a minha vida, até nisso.

Quando eu estava na palestra, né, com a psicóloga e tal, eu não tive oportunidade

de falar isso mas na próxima palestra eu vou falar, né. Sabe doutora, a cirurgia me

fez um bem muito grande, só que no meu trabalho eu tinha uma limitação para

trabalhar, por quê, porque eu era obeso, então a minha produtividade era menor.

Hoje com o peso que eu me encontro eu aumentei a minha capacidade de produzir,

eu estou trabalhando dobrado, né, por quê, porque eu estou mais ágil, mais rápido,

tem serviço que eu não poderia fazer, sabe. E hoje eu faço, então o que aconteceu,

aumentou o serviço, dobrou o serviço mas não dobrou o salário. Tem um detalhe,

recompensando o tempo que era obeso, pois quando eu era obeso ninguém

também questionava, quem fazia o meu pagamento, porque eu produzia menos,

então hoje eu também não posso questionar o meu trabalho porque eu estou

produzindo mais.

P: É.

S: Foi a vez do patrão e agora é a minha vez, né.

95

P:É uma troca.

S:É uma troca.

P: E hoje assim, passado esses três meses você sente assim essa diferença porque

mudou, mas hoje está normal e pode comer de tudo.

S: Eu posso comer de tudo, né. Ainda tem outras coisas que estão restrita, né.

Porque ainda tem agora mais uma passagem pela nutricionista e tem algumas

coisas que não está liberado, entendeu. Refrigerante mesmo, é liberado com 4

meses, até agora nas festas ela falou, você vai estar completando quatro meses

agora depois da festa, eu vou liberar um pouquinho de refrigerante para você, mas

você não vai colocar o refrigerante e beber, você coloca o refrigerante no copo,

espera ele evaporar um pouco de gás e aí você bebe. Então tem certas coisas que

ela não liberou, agora a alimentação eu posso comer de tudo, até que o meu

organismo não rejeite. Igual hoje eu vou comer salsicha, não desce, é, carne seca

que é jabá também não desce, lingüiça também não desce. Na verdade, muita coisa

que principal que é necessário comer o meu organismo se dá muito bem, que é

carne, então o que como mais é bife e filé de frango, carne de frango. São as duas

carnes que como, mas é o que eu preciso devido às proteínas, as vitaminas

também, né. Mas eu estou muito feliz, eu estou, às vezes eu via as pessoas se

alimentar, a pessoa pegava o prato, né, aí ia fazer seu prato assim, aí colocava uma

colherzinha de arroz, uma colherzinha de feijão, uma salada e comia, e muitas vezes

nem comia tudo, e se satisfazia. E eu fazia o prato que sabe, parecia um pão de

açúcar, e depois fazia um mini pão de açúcar sabe. E às vezes eu não me sentia

bem fazendo aquilo, sabia que aquilo me fazia mal, mas o que é, o que aquela

necessidade de estar comendo, porque se eu pudesse comer só um pouquinho e

não morrer de fome eu comeria. Então hoje, eu ponho bem pouquinho no prato e é o

que sempre quis, comer pouco, sabe. É igual aquele velho ditado, né, a gente come

para viver e não vive para comer. Antes eu vivia para comer, hoje eu como para

viver, né. Eu gasto uma porcentagem de energia, e reponho uma porcentagem de

energia de acordo com o que eu necessito, né.

P: Conta um pouquinho pra mim como está hoje a sua locomoção.

S: A minha locomoção está ótima. Hoje, inclusive aconteceu uma coisa com a minha

perna da semana passada, né, que eu não subia escada, tipo assim, uma escada

subir no telhado, né. Eu não subia. Eu hoje, da semana passada, eu subi numa

escada entendeu. O sapato, antes para amarrar o sapato eu tinha que colocar o pé

96

em cima de uma cadeira, pra poder curvar um pouco o corpo e com alguma

dificuldade amarrar o sapato. Hoje eu abaixo, amarro o sapato, entendeu. Se

precisar pintar o roda pé de uma parede eu passo o tempo todo abaixado pintando o

roda pé da parede e não me sinto mal, me sinto bem, entendeu. Até, inclusive eu

conversei com a doutora, a psicóloga na entrevista retrasada, né.

P: Hum.

S: Que eu estava me sentindo com muita energia, eu estava me sentindo muito

ativo, e as atividades que eu estava fazendo estava sendo poucas, pelo tanto de

energia que eu tinha, sabe. O meu trabalho, a minha caminhada, tudo que eu estava

fazendo, estava sendo muito pouca. Inclusive, eu era uma pessoa muito sedentária

devido a minha obesidade, eu ficava a maior parte do tempo deitado, assistindo

televisão, né. E então a vida era muito parada. Antes a gente dormia durante o dia,

hoje não. Hoje eu não sei nem o que é saber dormir de dia mais. De dia para mim é,

quem dorme é só criança, eu não durmo mais. E também não fico deitado. Ás vezes

eu chegava do trabalho, né e já chegava cansado, Por quê? Devido a obesidade. A

obesidade já cansava mais do que o próprio trabalho. Mas hoje não, hoje eu chego

do trabalho já troco de roupa, vou fazer caminhada, vou pedalar na bicicleta

ergométrica, você entendeu, estou sempre me mexendo. Quando não, vou dar uma

limpada no quarto, varrer o chão e passar um pano, sabe, então, eu não paro. Você

entendeu. Eu tomava um banho, chegava do serviço quatro horas, quatro e meia eu

tomava banho, né. Cinco horas eu deitava na cama e só saía da cama outro dia, de

manhã para trabalhar. Hoje eu durmo antes da meia noite entendeu. Sempre

fazendo uma coisa e outra, aumentei não só a minha atividade física como também

a minha atividade cultural, né. Que eu gosto de ler um livro, ficar escutando uma

música também. Então, a minha vida ela mudou bastante. E eu agradeço isso

primeiramente a deus, né. E toda equipe médica que está fazendo um trabalho

maravilhoso, muito bonito, trazendo a felicidade e a vida para as pessoas obesas.

P: Ótimo. E assim, sobre a sua casa, o lugar que você fica. Que lugar que você mais

gosta? E por que você gosta desse lugar.

S: Olha, eu gosto mais é do meu quarto, né. Porque é o lugar que é o seguinte. Eu

fiz um cantinho né, que eu me identificasse com ele.

P: Uhum.

S: Que eu me sentisse bem, que eu pudesse fazer as minhas auto críticas diárias

que a gente passa o dia, sempre deitado com a cabeça no travesseiro, e vê o que a

97

gente produziu de melhor. E ver se a gente fez algumas falhas para a gente corrigir

e não repetir no dia seguinte, né. E também para a gente sabe, poder relaxar,

entendeu. Fazer planos para o futuro, sabe. Eu tenho três quadros no meu quarto

que eu fico olhando pra ele e fico imaginando, imaginando.

LADO B

P: Que tamanho que é mesmo esse seu quarto?

S: É três por dois.

P: Ah, é pequeno.

S: É pequeno, é pequeno. Não é muito grande não.

P: E é só seu?

S: Esse aí é só meu.

P: A tá.

S: É só meu. Ah, é um cantinho que eu me sinto bem ali.

P: É seu cantinho particular.

S: Meu cantinho particular.

P: Que lugar você mais gosta de ir. Quando você, no seu dia a dia assim.

S: No meu dia a dia, olha eu gosto do, aqui tem um projeto semear, que é um lugar

de viveiro de plantas, que cultiva plantas, como se fosse uma maternidade de

plantas né. Então, eu gosto de ir ali. Por quê? Porque é um lugar que é, dá uma paz

muito grande, e eu gosto de plantas e tal , e ali é muito gostoso, um lugar muito bom,

né. E, gosto também de ir na escola de música, a música ela é muito bom para a

alma da gente né. E, vou a igreja também.

P: A tá.

S: Na verdade, eu gosto de ir , a gente também, às vezes está com algum problema

a gente entra e quando sai, já sai.

P: Mais leve.

S: Mais leve, tal, deixa toda aquela carga, né.

P: E assim, depois da cirurgia, teve alguma modificação de lugares, assim, que você

freqüentava antes, e hoje você freqüenta, ou você deixou de ir.

98

S: Não, eu é, a parte de lugares continua do mesmo jeito. Não mudou nada, né. Eu

só assim, eu só, eu fiquei mais elétrico, né. Eu, sabe, estou sempre andando não

consigo é ficar parado.

P: Está mais disposto.

S: É, mais disposto. Parece que eu criei rodinhas no pé e, estou sempre andando. A

única mudança que teve, é que assim, vamos supor se eu fosse lá no semear, e

ficasse uma hora lá. Hoje não consigo ficar uma hora lá. Eu fico quinze minutos, só

que tem um detalhe, eu ás vezes vou lá duas a três vezes ao dia, sendo que antes

eu ia uma vez só. Então, eu diminuí o meu tempo de permanência lá, mas também

aumentei o meu tempo de freqüência. Por quê eu ia uma vez lá e não voltava mais?

Pela dificuldade de estar me locomovendo, de estar andando. E hoje, com a minha

necessidade que tenho de, estar gastando energia, de estar sempre andando, às

vezes eu vou lá umas duas, três vezes, você entendeu. Então

P:Lá é o quê?

S: Lá é um, é um, o projeto semear, é um lugar que a gente cultiva plantas, sabe.

P: A tá.

S: É um viveiro, sabe. Eles tem vários tipos de plantas e eles, eles como é que diz,

eles vendem, e tal, sabe.

P: Comercializam.

S: É, comercializam, isso.

P: Ah, tá. E assim, qual o significado que tem para você hoje essa sua locomoção,

seu ir e vir.

S: Ah, pra mim esse significado é só de alegria. É, significa o que? Que eu estou

fazendo coisas que eu sempre quis fazer. Sabe, ser uma pessoa normal, ter

disposição, uma coisa que eu não tinha antes, disposição, sabe. Um amigo me

chama, ah, vamos para tal lugar. Ah não, não estou com vontade. Ah, vamos. Ah,

não estou com vontade. Hoje não, qualquer lugar que me chama para ir, tô dentro,

vamos.

P:Eu não estou com vontade é porque você não queria ir, ou você não estava

disposto, o que era isso.

S:É disposição. Ás vezes a vontade tem , você entendeu. Mas você imagina assim

que tem que andar daqui lá e tal, então eu pagava para não andar, sabe. Apesar

que eu tinha que andar. Porque, eu absorvia muita energia e não gastava. Então eu

tinha que andar, só que o peso, eu tinha muitas dores na perna, além da minha

99

trombose, ela não veio de um dia para outro, eu tive febrite, sabe, eu tive úlcera

varicosa, eu tive muitos problemas na perna. Passei maus momentos de

enfermidade nas minhas pernas, às minhas pernas doía muito. Doía muito. E hoje,

após a cirurgia, o tratamento que eu fiz antes de operar, porque eu comecei o

tratamento pra emagrecer, isso foi dando resultado nas minhas pernas, após a

cirurgia emagreci ainda mais. Para você ter uma idéia, antes da cirurgia eu tomava

dois é, comprimidos diários para a circulação, pra dor você entendeu. Depois da

cirurgia, nunca mais eu tomei esses remédios, já tem quatro meses que eu não tomo

mais remédios pra perna. A minha perna não dói, não sinto nada, sou uma pessoa

normal, entendeu. Porque o meu objetivo maior, pra fazer a cirurgia não é, por

estética, estética. Questão de enfermidade, sabe. Questão de saúde. A médica

mesmo falou pra mim, se eu continuasse com o peso que eu estava, as tromboses

elas iam estar freqüentando a minha vida e provavelmente no futuro próximo eu

poderia perder uma das minhas pernas, sem contar que, a minha probabilidade de

vida seria menos de dois anos. Devido à obesidade, ter ataque cardíaco, qualquer

coisa ou outra. E com a cirurgia, eu posso até, hoje eu tenho uma realidade de vida

de sobrevida de mais de quarenta anos. Pra você vê, antes da cirurgia menos de

dez, depois da cirurgia quarenta anos, pode ver, que aumentou aí mais de trinta e

dois anos para gente poder desfrutar a vida, você entendeu. Então, por isso que no

início eu falei para você, eu que posso tá assim, um monte de pele caindo que eu

não estou preocupado, eu não quero é estar obeso, você entendeu. Porque se eu

um dia, eu tiver, eu ter alguém na minha vida para dividir a minha vida comigo, ela

vai ter que aceitar do jeito que sou, você entendeu. Não, não adianta nada eu ser

gordo, e ter a pele toda esticadinha, e, mas não ter saúde, não viver, sabe. Porque

o gordo é assim, ele começa, sabe, passando mais tempo em casa, sabe, ainda

quando tá trabalhando vai trabalhar, depois com o tempo devido à obesidade já não

trabalha mais, começa a depender dos outros até para tomar banho, vai chegar o

momento que da cama já não sai mais. Você entendeu. E essa vida eu não quero

para mim. Eu quero viver, eu quero respirar, sabe, eu quero participar, você

entendeu. Eu estou com, hoje eu vou fazer, completar 42 anos mas eu estou me

sentindo com energia de 25 anos, sou um garoto, sabe. Hoje em dia se, se alguém

falar assim, ah, eu apesar de eu estar um pouco pesadinho.

P: (Sorriu)

100

S: Porque eu estou com 107 Kilos, mas se alguém falar assim, ah, vamos fazer uma

caminhada, vamos subir aquela montanha lá, a pé eu vou, só não vou subir com

uma corda porque não dá para escalar, né.

P:Hoje você topa tudo.

S: Ah, hoje eu topo tudo, você entendeu. Então, pra mim é , é vida né. A vida é

maravilhosa. É qualidade de vida a pessoa ter um peso ideal para sua estatura, né.

É bom para o coração, é bom pra tudo, entendeu. E outra coisa também, o motivo

de, para eu fazer a cirurgia não foi só questão de saúde, foi questão que eu tenho

dois filhos, você entendeu.

P: Hum.

S: E eu quero participar da vida dos meus filhos. Eu não coloquei eles no mundo só

para eles ter o nome do pai, eu quero estar participando, sabe. Eu sempre gostei

também, e ainda, nunca abandonei a questão de estar desfrutando das brincadeiras

de quando eu era criança, o meu primo, ele adora soltar o pipa, e eu quero ir soltar

pipa com o meu filho, que problema tem, você entendeu. A minha filha, ela gosta de

brincar de bola, vamos brincar de bola com ela também. Sabe, eu vou ter a minha

responsabilidade de pai, a minha responsabilidade de adulto, mas também quero

participar da vida dos meus filhos. Ser uma pessoa doente e obesa como é que eu

vou participar. Só vou estender as mãos pra eles para eles tomar benção de mim e

pronto. Não, quero viver com eles, sabe, quero pegar e falar filho como é que está

na escola, ah pai ta meio assim, pega o caderno aí, e vamos ver onde tá a sua

dificuldade, eu quero ajudar você entendeu. Eu quero acompanhar eles até a porta

da escola, eu quero conhecer a professora deles, quero que ela me conheça, quero

é diminuir a distancia entre pai, filho e a professora, por quê? Se ela tiver uma

dificuldade com a criança, ela já tem uma liberdade de estar chegando ao pai e olha

o seu filho está com uma dificuldade assim, vamos ajudar ele, tal. Você entendeu.

Na minha cabeça é participar, participar de tudo, você entendeu.

P: Que ótimo. Assim, mudando um pouco de assunto, como você percebe seu

corpo.

S: Como eu percebo

P: É, após a cirurgia.

S: Ah eu, a gente já começa a perceber pela roupa que a gente vestia, né.

P: Hum.

101

S: Ela começa a cair, ela já começa a ficar larga, você entendeu. Algumas que dá

para você ajustar você ajusta. Senão você faz, tem que comprar a roupa que você

chega, você usa um número 66 igual no caso que eu usava e aí hoje já cai para 58,

você entendeu, 56. E a roupa do gordo você coloca, você jamais vai viver assim de

elegância, tem assim uns gordinhos que são elegantes mas tem uns gordinhos

exagerados que não tem elegância nenhuma. Você já, você já vê assim, um

tamanho de roupa melhor, né. Inclusive hoje, que a minha roupa eu mesmo que

lavo, né. Pôxa, você vai lavar uma calça uma camisa do gordo é enorme

P: Sorrisos.

S: Parece um lençol, se vai passar se passa o ferro pra lá e pra cá e não acaba.

Hoje não, a roupa até pra lava é mais leve,

P: Sorrisos.

S: Diminuiu, sabe. Então as coisas, você vai ver, e outra coisa também, às vezes o

gordo ele foge do espelho né.

P:Aham

S:Ele só se olha no espelho assim do pescoço pra cima né, hoje não, hoje você tem

assim uma necessidade, uma curiosidade, de tá se olhando. No geral.

P:Aham.

S:Você entendeu. Eu mesmo, eu comprei umas roupa menor agora né, de acordo

com o peso que eu tô hoje, e aí as pessoas até que tá ao seu redor acostumada a

ver você com roupa grandona, daqui a pouco se tá com um manequim menor

P:Uhum

S: Começa falar, ah, você ta bonito, e tal. Então você sabe, aí você começa a se

olhar porque veja bem, eu ganhei dois presentes, eu ganhei a cirurgia né..

P:Uhum

S:Devido a minha saúde que era ruim, e hoje graças a Deus tá, a 100%, porque não

to sentido nada tá 100%. E também, tô ganhando na parte de estética. Porque não é

todo lugar que eu tô flácido, em alguns lugares, Você entendeu.

P:Uhum.

S: E, como eu não me importo com isso, então, os lugares que não são flácidos,

então a roupa cai bem, então você vai ficando contente a auto-estima vai

levantando, você entendeu. E, olha, eu só tenho a agradecer, sabe. Só agradecer,

foi muito bom pra mim, sabe. E também agradeço a mim também, porque eu nunca

102

tinha passado por cirurgia nenhuma, e a orientação que os médicos, não escondem

nada da gente né.

P:Uhum.

S:Dos riscos das cirurgias, do pós cirúrgico de tudo, é, o tamanho da cirurgia, o anel

que vai ser colocado, e tal, os grampos. Então pôxa, você nunca passou por cirurgia

nenhuma né, de repente você vai passar por uma cirurgia dessas, se tem que ta

preparado, primeiramente se tem que querer e tem que gostar muito de você, certo,

se tem que querer. Aí você querendo, você tem que ter conhecimento do que você

vai passar, e aí você tem que se perguntar, é isso que eu quero? É isso que eu

quero. E aí você da seqüência, vai a frente , se entendeu, não pode ir com dúvida

nenhuma. Pra você ter uma idéia, os médicos a, a preocupação deles comigo é que

não tinha uma pessoa assim pra tá cuidando de mim após a cirurgia né.

P:Uhum

S: E então eles tinha essa preocupação, porque tem pessoas que após a cirurgia iria

tá tendo pessoas pra tá cuidando deles

P:Sei

S: E mesmo assim eles estavam tendo dificuldades, ligava pro medico e tal, e eu

não, eu antes da cirurgia eu já conscientizei que eu não ia ter ninguém, prá ta

cuidando de mim, então eu já vinha me preparando minha cabeça e ir buscando

força que eu ia ter que fazer tudo só. Foi aonde que eu, cheguei do hospital, e já fui

pro fogão fazer a minha, a minha dieta, você entendeu.

P: E tua mãe não ficou com você no hospital?

S: No hospital ela foi me visitar.

P: Ah é.

S: Ela ficou comigo, foi, eu tive, eu bati o recorde de visita no hospital,

P: Ah é.

S: Você entendeu. Só que no caso aqui, aonde eu tô aqui,

P:Uhum.

S: Pra mim já não tinha como né, eu tenho uns amigos e tal que deu uma força, mas

veja bem, a dieta da gente ela não pode ser colocada gordura, ela não pode, tem

alguma, alguns, aqueles gordos que aqueles não podem

P: Existem muitas restrições.

S: A carne tem que ser uma carne, é, própria, não pode ser carne com gordura,

devido os pontos. Então, não que eu não confiasse ,sabe, não que eu não confiasse.

103

Mas, como aqui eu tenho uma dificuldade para eu estar me locomovendo, vamos

supor que me dá um problema aqui, depois da cirurgia, até que eu pegue um carro e

tal e me leve para o hospital, pôxa, eu já iria estar numa situação pior. Então, o que

eu fiz? Eu busquei força da onde eu tinha e da onde eu não tinha pra quê? Pra

cuidar de mim. Já, pra não ter essa dificuldade de ter algum problema aqui e ter que

sair daqui às pressas, sabe. Então meu pós-operatório foi maravilhoso, foi um

sucesso.

P: Sucesso, o maior responsável dessa recuperação foi você, graças a você.

S: Graça a Deus. Inclusive a nutricionista, eu passei com ela, né. Eu estava com 3

meses de cirurgia. Ela falou assim, olha Antonio, esse índice que você está com ele

hoje, que a gente após a cirurgia a gente tem um índice de 40%, de eliminar 40% do

peso do dia da cirurgia. E nesses três meses, eu já tinha eliminado uma

porcentagem que era para eu eliminar em 6 meses.

P: Hum.

S: Que era para eliminar em 6 meses eu eliminei em 3 meses. Então ela falou assim,

olha, foi agora, se no dia 3 de março você estiver emagrecendo assim acelerado, a

gente vai ter que fazer um trabalho de alimentação prá tá dando uma freiada no seu

emagrecimento. Porque após a cirurgia, a gente tem, a gente emagrece durante

um ano seguido, após um ano já, já fica parado.

P: Hum.

S: A gente emagrece um ano seguido. E eu estou emagrecendo bem rápido, né. Eu

acho que é devido o organismo da gente, né. Nem tudo você guarda. Tem gente, a

gente pergunta lá pro paciente que foi operado, tem gente que com dois meses

emagreceu 30 kilos, outro emagreceu 10, outro 8, outro 20, 25, nem todos são

iguais. Inclusive eu estava conversando com as amigas lá, olha, se você eliminou

pouco peso não se preocupe, não se preocupe que o seu colega emagreceu mais.

Porque às vezes tem semana que a gente não emagrece nada, tem semana que a

gente emagrece 2 kilos, então isso aí é relativo. Não se preocupe. Porque muitas

vezes, a pessoa se ela ficar preocupada porque não está emagrecendo, ela pode

entrar numa depressão. Porque ela acabou de sair de uma cirurgia, sabe. E ela tá

ainda meia, não está no seu normal, sabe, porque a cirurgia ela mexe com o seu

corpo. Não só do organismo como com o dia a dia da gente. Você vê, eu sou uma

pessoa mais ativa, sabe. E ela mexe também com o humor, sabe, têm pessoas que

ficam mais humoradas mais alegres, mais, tem pessoas que já ficam mais troncosa,

104

irritadas com poucas coisas, e tem pessoas que ficam mais ofensiva também, às

vezes uma pessoa fala uma palavra assim um pouco mais áspera para a outra, e a

pessoa fica com grilo, tristonha, meio sabe, meio sentimental, então é uma coisa

que, né, então a pessoa tem que se preocupar de tudo, igual a educação alimentar.

P: Uhum.

S: A gente não tem que dar pelo menos de 35 a 40 mastigada

P: Isso.

S: Por garfada. Então, a gente tem que desligar de tudo, do trabalho, da televisão,

do rádio, do filho de tudo. Tem que se preocupar só de estar mastigando, sabe, se

alimentando bem devagarzinho. Então, após a cirurgia a gente tem que se

despreocupar de tudo, tem que levar tudo numa boa. Pra que? Pra gente não

encher a cabeça da gente com coisas que, sabe, vai deixar, mexer com o humor da

gente, vai mexer com o astral da gente. Porque depois da cirurgia a gente fica meio

assim, sabe, é, tudo é novo, tudo é novidade. Você quer saber o que vai acontecer

com você amanhã, sabe. Você quer saber se amanhã você tá com centímetros a

menos de gordura, sabe. Então você não precisa antecipar problema, sabe. Se tiver

que ter algum problema ele vai estar no seu caminho. Prá que vamos antecipar ele.

Se nosso momento hoje é de alegria, vamos viver o momento de alegria. Se chegar

um momento de tristeza, opa, vamos arrumar uma solução prá acabar com essa

tristeza não é verdade?

P: É dia após dia.

S: É dia após dia, por isso que não pode querer, é igual uma escada, a gente tem

que subir de degrau a degrau, se você for subir 3 a 4 degraus e pular os dois

primeiros você acaba se machucando, não é verdade.

P: Aí você Amadeu, você como se sente hoje?

S: Hoje, ótimo!

P: O que significa ótimo.

S: O que significa ótimo. Olha, felicidade, sabe. É, as pessoas parecem que elas se

achegaram mais, né. Tem a curiosidade de saber o processo da cirurgia, até

pessoas que não vão fazer, tem uns que são obesos e pensam em fazer esses daí

estão sempre chegando, às vezes, eles se tornam até repetitivo com as perguntas,

pra, sabe, acho que talvez pra adquirir uma confiança para fazer a cirurgia. Mas a

gente também foi paciente um dia e continua sendo e fizemos várias perguntas.

Você entendeu. Às vezes, até, pelo que passou e tem pacientes que vão passar, às

105

vezes a gente também acaba fazendo até um trabalho psicológico, né, com aquele

paciente. Orientando olha, assim, sabe. Então eu estou muito feliz, e as pessoas

também chegam em mim e falam assim, eu admiro você, eu me orgulho de você, as

vezes tem pessoas que falam, eu queria ser igual a você. Assim, pela perseverança,

pela vitória que eu tive. É, eu sou vitorioso. Hoje eu tenho, é, 83 kilos a menos o que

eu tinha, sabe. 83 kilos a menos, uma vez eu fiz um eletrocardiograma

P: Uhum.

S: E eu peguei e falei assim, aí doutor, como é que está meu coração. Ele falou

assim, imagine um motor de um fusquinha puxando uma carreta carregada. Sabe.

P: Uhum.

S: Aí eu falei assim, então esse motor não vai durar muito tempo. Uma hora ele vai

fundir o motor, porque é muito peso para pouco motor. Então hoje eu to com mais

motor e com menos peso.

P: Você está com motor de caminhão com um fusquinha.

S: É verdade. Com a carroceria de um fusquinha, né.

P: É.

S: Né. Olha o rosto da gente afina. Tudo pra mim é

P: Isso é felicidade.

S: É felicidade.

P: E como é que você pode descrever essa felicidade, porque a felicidade é um

resultado, uma conseqüência.

S: Como é que eu posso. Olha, é poder estar vivendo a cada dia, um diferente do

outro. Porque a cada grama que eu emagreço é uma atividade amanhã, ou hoje

mesmo a mais que eu posso fazer. É, vamos supor, eu ainda não joguei bola hoje.

P: Uhum.

S: Até hoje eu não joguei bola, vamos supor que amanhã eu esteja 100gramas mais

magro, e me sinta já preparado pra pelo menos dar um chute numa bola, é uma

coisa que não faço a 20 anos. E hoje eu posso fazer.Você entendeu? Eu falei pra

você que, se hoje me convidasse para subir uma montanha a pé eu subiria.

P: Uhm.

S: É que, daqui um mês eu tô mais 5 kilos mais magro né. Eu falei pra você que se

fosse para subir numa corda eu não subiria. Daqui 5, daqui um mês eu tô 5 kilos

mais magro eu conseguiria subir a montanha pela. Então tem muita coisa pra tá

descobrindo, tem muita coisa pra tá fazendo. Às vezes a alegria não é só de ter feito

106

a cirurgia, e já tá fazendo coisas que não fazia, mas de poder fazer coisas no futuro.

Você entendeu, e também, eu não me canso de dizer que eu sou feliz por já ter feito

a cirurgia, sabe. Porque antes da gente fazer a cirurgia a gente tem que passar por

um processo de exames clínicos, a gente tem que fazer a parte da gente, que é

emagrecer, sabe, tem também a parte psicológica, se a pessoa não estiver 100% ela

não vai para a cirurgia. Você entendeu? Então eu me sinto feliz de já ter passado

por esse estágio, entendeu. E hoje ser uma pessoa realizada, sabe. A pessoa, uma

moça que quer casar, primeiramente ela tem que arrumar um noivo.

P: Hum.

S: Aí ela já sente uma felicidade de ter arrumado um namorado, depois a felicidade

de noivar, chega o dia D, o casamento, a cirurgia pra mim foi como um casamento,

sabe. Acho que o dia mais feliz, pro homem é, mas pra mulher ela fica muito mais

feliz, porque a produção da mulher, da noiva é muito maior, você vê até o vestimento

dela é uma coisa que, né.

P: A expectativa.

S: A expectativa é maior. Você entendeu? A cirurgia pra mim é um casamento

eterno, sabe. A felicidade que eu sempre busquei, chegou no dia 6 de setembro,

sabe, eu casei, eu casei comigo, com uma nova vida. E sei que tem muita coisa boa

para mim. Eu, eu moro num, aonde eu moro, tem praia. Eu adoro, eu não sou peixe

mais eu adoro água, sabe. Gosto de mergulhar, gosto de nadar, gosto disso tudo

aqui. Eu sempre tive vontade de pegar uma prancha de surf e dar uma surfada.

Você entendeu. É uma coisa que não é difícil, é uma questão de equilíbrio, mas

como é que eu vou subir numa prancha de surfe com 190 kilos, não tinha como. Só

se eu arranjasse uma prancha de navio para poder surfar. E eu ainda, é uma coisa

que eu tenho vontade de fazer, você entendeu.

P: Algum dia.

S: É.

P: Vai concretizar,nada que impeça.

S: É verdade, você entendeu.

P: E falta quanto tempo para você sair daqui?

S: Olha, esse ano, eu quero estar indo embora. Eu to com benefício aí, se deus

quiser esse ano alguma coisa vai pra mim tá indo embora, se deus quiser.

P: Vida nova, muitas mudanças.

107

S: Muitas mudanças, muitas mudanças. Inclusive eu tive conversando com o diretor

e ele falou assim, olha, vê se você consegue né, que a cirurgia plástica do abdômen

eu já ganhei. Ganhei do médico aqui da unidade tal porque lá ainda não tá está

fazendo, né. Do abdômen eu já ganhei. Ele falou assim, vê se você consegue fazer

a cirurgia plástica antes de você sair daqui. Porque depois que você sair daqui você

ta numa outra vida, você vai ta trabalhando, e tal né. E com emprego novo não tem

como você estar deslocando para você estar fazendo exame, cirurgia aqui. Então

procura fazer tudo aqui pra quando você sair daqui você sai novo, né, e sem precisar

fazer mais nada.

P: É outro Amadeu.

S: É outro Amadeu. Você já sai e já vai trabalhar, e já casa, já faz tudo que você tem

que fazer. Então pra mim tá ótimo. Tem pessoas, que, tem médico que me atende

aqui, né. outro dia ele passou por mim e não me reconheceu. Oh doutor, sou eu. Ele

falou assim, pó rapaz, quando você era obeso, gordo, era difícil de não notar, de

longe a gente já notava. Hoje a gente passa, pensa que é uma pessoa normal,

entendeu. Por isso que às vezes que não conhece, por isso que eu não te conheci.

Porque ele tava de férias, ele tava de licença né, então ele passou 4 meses

afastados e à 4 meses eu estava com 40 kilos a mais, 30 kilos a mais, e hoje né, eu

não via ele bem antes.

Fita 2

Lado A

S: Até o apelido mudou, me chamavam de tonelada. Hoje me chamam de meio

quilo.

P: Riu.

S: Cem gramas, sabe.

P: Ah, que ótimo. Tem alguma coisa que você gostaria de complementar?

S: De complementar.

P: Alguma coisa que não perguntei e que você acha importante.

S: Hum. Deixa eu ver, tem bastante coisa.

P: Não, pode falar.

108

S: É que tem bastante coisa, é que assim, mas na hora, assim que a senhora

perguntou sabe. Olha eu, vou falar uma coisa pra senhora. Eu, olha eu sou uma

pessoa que, eu sou abençoado. Porque tem pessoas que fora daqui, que está em

condições melhores do que eu, e tem dificuldade de estar fazendo a cirurgia, né.

P: Uhum.

S: É, eu, sabe, daqui de dentro acho que era pra mim fazer mesmo. Porque eu corri

atrás, sabe, perturbei a diretora aí do ambulatório, da enfermaria. O diretor do

estabelecimento, sabe. Conversei, pedi, eles me atenderam e graça a deus eu

consegui. Então, eu sou uma pessoa abençoada por isso. E acho que, não sei, não

sei o dia de amanhã, mas no momento as coisas mais importantes que aconteceram

na minha vida até hoje, foi o nascimento dos meus filhos e essa cirurgia. São as

coisas mais importantes que aconteceu na minha vida, sabe. E eu, jamais vou

esquecer das pessoas que participaram como paciente e das pessoas que

participaram como profissionais né, que atenderam, porque, é bom frisar também,

que os profissionais, psicólogos, os médicos, é, nutricionistas, endocrinologista,

terapeutas, todos, todos, eles tratam a gente sabe, num nível mais alto que um

paciente, sabe. Eles buscam assim, uma amizade com a gente, porque a cirurgia ela

é uma coisa muito grande sabe, e o paciente precisa ser conhecido pelos médicos.

E ele não vai ser conhecido pelos médicos se tiver uma barreira entre eles. E a

quebra dessa barreira é a amizade que vem do mesmo lugar, sabe. E o tratamento

é, eu digo pra eles. Que eu fiz a cirurgia pelo SUS, mas foi melhor do que se fosse

particular, sabe. Porque, o carinho que eles tem com a gente, a atenção, a

preocupação, sabe. A gente é muito bem tratado. Entendeu, eu só tenho a

agradecer, desde a pessoa que faz também o agendamento da consulta até a

pessoa que vai lá e varre o chão do quarto. Porque, não é só porque os médicos

tem um grau acima, e eu não vou deixar de agradecer as pessoas que quando eu

estou internado, que vai ali, limpam o quarto. Até conversam com a gente, sabe,

como é que foi, como é que você está. Você entendeu. Então, eles também são

pessoas que tratam a gente muito bem, sabe. Eu só tenho a agradecer e pedir a

deus que ilumine o caminho dessas pessoas pra toda a vida e que eles continuem

trazendo felicidade.

P: Com certeza, e pra você também, que seja muito feliz.

S: Muito obrigado.

P: Com certeza.Obrigada pela entrevista.

109

Sujeito Bia

S: Eu me sinto tão feliz hoje, que acho que contaria a minha história em rede

nacional.

P: Ah, que bom. Então Bia, conta um pouquinho pra mim sobre a sua vida após a

cirurgia.

S: Bem, eu assim, a partir do momento que eu participei da primeira palestra, que eu

decidi que eu queria fazer a cirurgia, em nenhum momento eu tive medo, em

nenhum momento eu pensei em desistir, a pessoa, a doutora Maria Tereza falou que

estava chegando próxima, que eu tava conseguindo alcançar a perda dos 10%, eu

fiquei assim, muito feliz mesmo, aí quando a doutora Débora marcou o dia da

cirurgia, nossa eu não cabia de tanta alegria, né.

P: Uhum.

S: E assim, a minha cirurgia foi normal, no dia 4 de outubro, né. Mas foi normal,

ocorreu tudo bem, eu fiquei no hospital só o tempo previsto mesmo. Eu fui pra casa,

e foi tudo muito bem mesmo. Não senti assim, não senti dor, não senti nada, nada.

Foi tudo tranqüilo.

P: Você internou no dia três.

S: Internei no dia três. Aí fui pra casa no dia acho, oito, nove.

P: Quem ficou com você?

S: A minha mãe, daí ela veio pra ficar comigo.

P: Como é que foi na hora de ir para a cirurgia.

S: Olha, eu até eu me estranhei, porque eu tinha muito medo de ficar em hospital né.

Aí quando eu fiquei sabendo que a gente podia ter um acompanhante eu fiquei mais

aliviada, falei então eu não ia ficar sozinha, né. Mas no dia principal que foi no dia

três e o dia quatro, eu tive que ficar sozinha. E eu achei que eu fosse assim, que eu

tenho pressão alta, minha pressão ia subir porque eu ia ficar nervosa. Mas não, foi

assim, um dia tranqüilo, durmi bem, assim, sem precisar tomar remédio. Aí acordei

de manhãzinha, aí a hora que a enfermeira veio me buscar falou vamos? Eu falei,

vamos, pode ir que eu estou pronta, né. Ainda fiquei um tempão lá no pré-cirúrgico

esperando chegar o anestesista. Mas assim, numa tranqüilidade, numa paz, que

olha, nem parecia eu. Porque eu tava antes apavorada, e depois no dia fiquei muito

calma, muito tranqüila mesmo.

P: Ah tá. Você queria mesmo.

110

S: Queria. Acho que era o sonho da minha vida que tava se realizando não deu

espaço pra mais nada, só pensava naquilo, e foi tudo muito tranqüilo.

P: Não deu nenhum medo, assim, na hora.

S: Não. Nenhum medo, nada, nada. Nenhum pensamento negativo. Assim, foi uma

coisa de deus mesmo, foi assim tão bom, tão em paz assim, que eu fui tranqüila.

P: Que ótimo. E depois da cirurgia que você acordou. Como foi?

S: Ah,sei lá. Era uma sensação diferente. Porque, acho que naquele dia eu senti que

a minha vida tava mudando, né. Mas eu acordei bem sem dor, sem nada, assim, a

minha mãe do meu lado, aí logo o médico chegou, e falou que tinha corrido tudo

bem, aí eu fiquei mais tranqüila ainda né. Mas foi tranqüilo.

P: Ah tá. Assim..., e depois da cirurgia tinha que caminhar, que vem as outras coisas

para estar fazendo você ficou com medo.

S: Eu passei o primeiro dia na cama, né. Porque eu estava com dor nas costas, mas,

acho que era devido ao colchão, e tal, aí eu fiquei com medo de caminhar. Aí o

doutor Celso chegou no meu quarto, me deu uma maior bronca porque eu não tinha

levantado ainda né, e falou que não podia e tal, tal, tal. Aí na hora que ele saiu eu já

levantei e comecei a caminhar, e daí vi que realmente não tinha nada demais, que

eu podia caminhar, que era coisa da minha cabeça. Daí depois disso foi tranqüilo,

daí não deitei mais.

P: Aí veio a alimentação, do primeiro mês, que é líquida.

S: Isso, só líquida, e também foi normal, não engasguei, não rejeitei nada, foi tudo

perfeito, tudo tranqüilo.

P: Enjoou da gelatina.

S: Ah, da gelatina até que não, mas gatorade, água de côco não posso nem ver.

Nossa! É horrível, horrível, não dá para tomar.

P: Certo.Depois veio a pastosa.

S: Aham. Também foi normal, nunca tive problema com a alimentação. Vômito,

essas coisas, nunca tive nada nesses três meses, foi tudo tranqüilo.

P: E fome.

S: Não tenho fome. Assim, às vezes quando eu fico muito tempo sem me alimentar,

eu sinto que eu tenho um vazio assim, que eu estou precisando comer alguma coisa.

Mas dizer que eu tenho fome, aquela fome assim, não.

P: Não. Você tem que comer aquele tanto, aí você come, mas depois não dá mais

fome.

111

S: Não. Como aquela quantia, e já fico satisfeita, aí tranqüilo.

P: E desejo de comer outras coisas, não dá?

S: Não, aquela coisa assim incontrolável, ah, eu preciso de comer. Porque também

agora eu já posso comer de tudo. Porque quando eu tenho vontade de comer

alguma coisa eu como, porque é uma quantidade pequena, mas eu como, mas não

tenho desejo, aquela coisa que a gente tem antes né, eu não tenho mais.

P: E aonde foi parar esse desejo?

S: Eu não sei. Não sei. Sumiu. Porque antes eu achava assim, que ia diminuir o

estômago, mas a fome ia continuar, aquela vontade de comer ia continuar.

P: Uhum.

S: E então eu pensava muito nisso, como é que vai ser. Mas depois da cirurgia a

gente vê muda tudo isso. Que você não sente mais fome, aquela necessidade de

estar sempre comendo, sempre comendo.

P: Uhum.

S: Não sei onde vai parar tudo isso, só sei que isso some. Pelo menos o meu sumiu.

P: Nossa, que bom.

S: Fico assim tranqüila, não sinto vontade de comer nada.

P: E assim, no que se refere a sua locomoção hoje.

S: Acho assim, não tem nem comparação a antes. Porque, eu sempre fui molona,

sabe, eu fui obesa desde criança, já nasci e cresci obesa, né. Então eu ficava muito

dentro de casa, não saía muito, porque ah, era muita dificuldade, né. Pra saí era

mais de carro. Então, hoje não, hoje eu ando, faço caminhada, se é pra saí eu sou a

primeira, vamos caminhando, então não tem nem comparação, hoje é muito melhor

que antes.

P: Você está mais disposta.

S: Com certeza. Até às vezes eu me estranho, porque eu não paro mais dentro de

casa. Então, até falam assim, nossa, você precisa ficar em casa, porque eu não

estou ficando em casa, mas eu ando muito.

P: Está andando bastante, hein.

S: Acordo cedo, já levanto, vou fazer a minha caminhada, nossa, e é muito bom.

P: E na sua casa, você acorda, você faz alguma coisa, você ajuda em casa.

S: Ajudo. Então, primeiro faço a minha caminhada né, então, porque como o sol ta

muito quente eu vou bem cedinho. Mas depois que volto, aí eu vou cuidar do serviço

112

da casa, porque eu estou desempregada né. Então cuido do serviço da casa, faço

comida, lavo roupa, tudo o que eu não fazia antes eu agora faço na maior felicidade.

P: E antes o serviço de casa você fazia também?

S: Fazia. Mas era aquela coisa bem lenta, né. Você vai varrer a casa demora um

tempão, você vai parando, dá uma descansadinha. Lava roupa eu não lavava

porque não gostava. Então, agora eu faço tudo isso só que é rapidinho.

P: Agora está produzindo mais.

S: Tô, com certeza.

P: Ah, tá. Que significado tem para você hoje a sua locomoção?

S: Ah olha, acho que é felicidade, viu. Porque hoje eu me sinto tão feliz de me ver o

quanto eu posso fazer assim, sem me cansar, sem me depender de ninguém.

Porque eu não dirigia, não dirijo, então se eu fosse sair quisesse ir de carro tinha

que ta pedindo pra alguém me levar. Agora não, eu vou, se precisar pegar o ônibus,

eu pego o ônibus, e vou. Então eu me sinto muito feliz. Não alcancei o peso que eu

quero, mas já me sinto realizada.

P: Felicidade é um resultado que a gente tem.

S: Isso.

P: Mas para chegar nessa felicidade qual o significado tem isso, essas coisas que

você está conseguindo fazer.

S: Acho que tem um significado de vitória mesmo, que eu corri atrás dos meus

sonhos e consegui chegar lá. Que como eu te falei, vim lá do Paraná para chegar

até aqui. Deixei a minha família, deixei tudo que eu fazia e acho que valeu a pena foi

assim uma vitória mesmo.

P: E assim, você gosta de sair.

S: Gosto.

P: Que lugar você freqüenta hoje.

S: Olha, eu pela minha religião, o que eu mais gosto é participar dos grupos de

jovens assim, é onde eu vou. Meus passeios são mais mesmo na igreja, meus

movimentos, então, é uma coisa que eu gosto de fazer, que eu me identifico, que eu

já fazia antes e continuo fazendo agora.

P: E é na mesma quantidade, assim.

S: Ah não, agora bem mais, bem mais.

P: Agora você está mais presente.

S: Isso.

113

P: E você percebe... como você percebe seu corpo hoje?

S: Ah, assim, dá pra ver que eu já mudei bastante, né. Apesar que agora a gente

olha e vê assim umas peles que não tinha antes, né. Mas acho que tudo isso é

conseqüência né. Então, eu procuro não olhar para isso, eu olho e só vejo o quanto

que ele diminuiu, o resto eu não vejo. Mas assim, dá pra ver o quanto mudou o meu

corpo, para melhor.

P: Você percebe que seu corpo mudou.

S: Mudou bastante, dá para perceber.

P: Quando você percebeu que ele está mudando mesmo, depois de quanto tempo

após a cirurgia.

S: Depois de uns dois meses e meio, quase agora que eu completei três meses. Foi

quando eu tive que dar uma mudada no meu guarda roupa, né. Porque as roupas

começaram a cair, tudo. Aí eu falei nossa, meu corpo diminuiu bastante, né. E foi

assim, muito bom.

P: Então faz pouco tempo.

S: Faz pouco tempo.

P: E como você se sente hoje?

S: Ah, eu me sinto meio boba ainda. Acho que ainda não caiu muito bem a minha

ficha. Eu estou sonhando. Sabe por que, sei lá, é uma coisa que esperei muito

tempo para acontecer e então, nesse pouco tempo que aconteceu, eu estou em

estado de graça assim. Eu estou viajando. Mas é muito bom.

P: E esse muito bom é como, detalha um pouco mais para mim.

S: Ah, não sei. Primeiro porque me sinto bem, me sinto melhor. Depois porque saio

na rua e os amigos te olham e falam, nossa como você está diferente, está mais

bonita. Então é uma sensação boa que te trás felicidade, né. E isso é gostoso.

P: Mas essa felicidade vem porque os outros estão vendo isso, ou não.

S: Não, Primeiramente porque eu me sinto assim, me sinto mais leve, me sinto feliz.

Então é uma sensação boa, mas primeiro para mim. Porque é comigo que está

acontecendo, né. Então primeiro eu.

P: E você resolveu fazer a cirurgia por quê?

S: Pela minha saúde. Porque eu fiquei, quando eu atingi o peso máximo né, de 152

quilos, aí eu comecei a ter problemas de pressão alta, de diabetes, e o meu

cardiologista que sugeriu que eu deveria fazer essa cirurgia, porque a minha

pressão não estava controlando, né. Então, eu comecei a ir atrás, que eu fui, que ele

114

deu uma carta de recomendação, e eu fui atrás. Aí que eu comecei a fazer,

primeiramente pela saúde.

P: Ah tá. O motivo principal foi por causa da sua saúde.

S: Da saúde.

P: E isto está refletindo na sua estética.

S: Isso, e está sendo muito bom. Porque, eu não pensava, porque assim, apesar da

minha vida pacata, tudo, mas eu era bem conformada, porque era uma coisa que

vinha na minha vida desde pequena. Então assim, não me atrapalhava em nada, eu

ia vivendo do meu jeito, né. Então a estética, eu não pensava muito na estética, né.

Às vezes quando a gente quer comprar uma roupa e não acha, a gente fica

chateada, mas depois passa. Mas quando a minha saúde ficou crítica, aí que eu

comecei a ver que eu tinha que fazer alguma coisa para mudar isso. Foi bom porque

mudou tudo, né. A saúde melhorou e a estética também. (risos e sorrisos)

P: Isto está atingindo as suas expectativas.

S: Com certeza.

P: Que ótimo. E sobre a sua casa, no lugar que você vive hoje, que lugar você mais

gosta.

S: Olha o lugar que eu mais fico mesmo é na cozinha. Porque na minha casa a

televisão fica ali na cozinha, né. Então é aonde fica todo mundo reunido, então a

gente acaba ficando mais na cozinha, mas é onde fica todo mundo reunido, a gente

conversa bastante, a gente brinca bastante. Então eu fico mais na cozinha.

P: Assim, sobre seguir o tratamento certinho, a dieta, tal. Você é desobediente, ou

você faz rigorosamente.

S: Não, eu faço tudo certinho, tudo certinho.

P: Está bem rigoroso.

S: Bem rigoroso.

P: Desde que você começou o tratamento.

S: Isso. Até mesmo antes na perda dos dez porcento. Quando a doutora passou

para mim, eu fiquei acho, uns dois meses na casa da minha mãe e aí eu não fiz, eu

não fiz a dieta. Aí quando eu voltei quando foi a segunda consulta aí ela teve uma

conversa bem séria comigo, me deu uma bronca mesmo. Ela falou pra mim, você

pensa se você quer ou se você não quer. Porque se você realmente quer tem que

levar a sério. Aí a partir daí eu falei que eu quero e aí eu comecei a levar a sério e

até hoje.

115

P: E agora com as festas do Natal, do Ano Novo.

S: Foi tudo assim tranqüilo, né. Porque, a gente mesmo que você quer extrapolar

não dá, você passa mal, né. Então não teve problema. Foi aquele pouquinho, aquela

quantidade, não teve nenhum abuso, porque assim, está recente, a gente tem medo

que pode acontecer alguma coisa, se abusar né, então foi tranqüilo.

P: O que segura mais, é aquele medo de aconteça alguma coisa.

S: Acho que é o medo de acontecer alguma coisa. Porque eu também tava lá no

Paraná né, e os meus médicos são todos daqui. Então a gente fica pensando, se

acontecer alguma coisa aqui ninguém vai me atender aqui, porque né, eu fiz tudo

mundo em São Paulo. Aí fica com aquele medinho né. Aí você faz tudo mais

certinho para não acontecer nada. (risos)

P: Ah, tá. Bom, é isso. Tem alguma coisa que você quer colocar, de importante, que

você percebe.

S: Não, acho que eu falei tudo.

P: Ótimo então. Obrigada Bia.

Sujeito Caio

P: Conta um pouquinho para mim Caio, sobre a sua vida após a cirurgia.

S: O primeiro mês após a cirurgia é difícil, é complicado. Mas quando se quer muito

uma coisa, você luta, né. E a gente tem restrição a muitos alimentos, inclusive nos

primeiros quinze dias. Nos primeiros quinze dias é, líquido.

P: Certo.

S: São sopas líquidas, são sucos. É, gelatina, sempre gelatina. É, e os isotônicos né,

que é o gatorade, que é os suquinhos que a gente toma. Depois de quinze, vinte

dias a gente começa a ingerir alguma coisa mais sólida, né.

P: Certo.

S: E já fazendo o acompanhamento dos médicos, né. O primeiro acompanhamento

veio a, a cirurgiã, né. Foi avaliar a condição da incisão, a retirada dos drenos, né. E,

até mesmo a liberação da dieta, daí depois a gente passa para a endocrinologista

para ver se está tudo bem, e por último, neste período de um mês a nutricionista que

vai nos dar a dieta pra esse mês, pra verificar se a dieta está sendo correta, e já

passar para a dieta do segundo mês. Todo mês a gente tem uma dieta.

P: Certo. E assim, você sentia fome no começo.

116

S: Não, não. Fome não. A princípio é, muito horário, né. Eu que tenho por exemplo,

uma vida sedentária, que eu não tenho horário nenhum, tive que me colocar dentro

dos horários. Porque a cirurgia ela é uma, eu costumo a falar para as pessoas que é

uma vida nova, então vida nova são atos novos. E devagarzinho vou lapiando. De

um lado vai tentando, do outro vou aprendendo.

P: Ah, certo. E assim, como que é hoje a sua locomoção.

S: Ah, uma maravilha. Uma maravilha assim, em todos os sentidos, né. Porque a

pessoa obesa ela, ela não se vê, ela se olha.

P: Certo.

S: Ela não se vê. E após a cirurgia você passa a se vê, e até mesmo a se respeitar

mais. A dar valor a outros valores da vida, né. E, mudou, mudou muito, mudou

muito. A auto-estima principalmente foi parar lá em cima, a auto-estima, né. Porque

a partir do momento que você não se olha mais, e passa a se vê, você vê o seu eu.

Você vê, não as suas limitações, você coloca, são outros valores, é vida nova, né.

P: Valores, como assim. Que tipo de valores?

S: Ah, todos. Todos que segundo, o ser humano. Todos, todos, todos. A plenitude.

Porque o obeso se limita. Uns porque têm trauma da obesidade, outros porque não

tem condições devido a obesidade, e outros pelo comodismo por causa da

obesidade também. Então, a partir do momento que, após os trinta dias da dieta,

você passa por essa intervenção cirúrgica, na qual você obtém o resultado que é

esperado. Você começa, você deixa de ser um obeso mórbido e passa a ser um

obeso. Você vê que a diferença de seu peso caiu, então você começa a se

enxergar, você vai perdendo roupa, você vai perdendo os traumas do gordo. Porque

o gordo por ele, ele não se olha, ele se vê.

P: Ah tá. E esse se vê.

S: Esse se vê, espelho. O gordo não gosta de espelho.

P: E hoje você se olha no espelho?

S: Ah, hoje eu me olho no espelho. (risos)

P: Certo.

S: Eu me vejo no espelho e, e, me vejo né. Porque antes né, você comprava uma

roupa e tal, você ia para uma festa você via aquela roupa naquela hora. E depois

você achava um abuso, um absurdo a hora que você via na cama, aquela roupa

pendurada porque era enorme. Agora hoje não, é completamente diferente.

P: E você hoje se vê por inteiro.

117

S: Por inteiro, por dentro e por fora, né. Cada minuto é outra coisa, disposição, pra

tudo, pra saí, paciência. Porque, o gordinho como se diz por aí, o gordinho ele é

engraçado, é simpático, mas ele é muito estressado. Ele é estressado. Embora não

pareça, é aquela coisa assim né, você olha por fora você não sabe o que tem

dentro. Agora, não. A partir do momento que você faz essa cirurgia que é invasiva,

muitos falam, ah não, é uma coisa rápida, ela é invasiva, ela é agressiva, mas pra

mim foi um mal necessário. Porque nesse momento da minha vida eu precisava

mudar algumas coisas. Mas é uma mudança que eu impus a mim, e que eu estou

me adequando. Não que a vida, a circunstância, não. Eu que impus a mim e estou

tocando pra frente.

P: Que tipo de mudança você teve.

S: Ah, voltei a estudar, o trabalho você tem mais disposição. Você vê o brilho das

flores mais bonito. Oh, até engraçado, o brilho das flores, você fala o brilho do sono,

mas as flores também brilham, depende da forma que você observa. Então quer

dizer que você passa a prestar atenção, a dar evasão a muita coisa que passava

desapercebido a você. Porque essa cirurgia ela é assim, você é desligado,

desconectado, e quando você volta, você fala assim, pôxa vida to vivo. E nesse

estar vivo porque não viver, vou viver. E nesse viver vamos viver mais magrinho,

com condições de vida melhor, né. É saúde melhor. Eu era hipertenso, tinha a

apnéia de sono, cheguei a ter (expitaxe) noturna, que foi tomando. Bem antes da

cirurgia eu fiz tratamento, é lógico que a pessoa que vai para a cirurgia, ela vai com

condições para se fazer à cirurgia. A pessoa para entrar numa mesa, no centro

cirúrgico, numa mesa cirúrgica ela precisa tem que estar com condições, no pré-

operatório para que o pós não venha dar problema nenhum.

P: E assim, sobre a sua casa que lugar que você mais gosta.

S: Na minha casa, eu gosto da minha casa.

P: Da tua casa como assim.

S: Da minha casa, é, a minha casa, eu costumo falar que a casa do homem é um

castelo. Então a minha casa é um castelo. Não tem essa, eu não quero isso, não, é

a minha casa. Eu gosto das minhas plantas, eu gosto do meu cachorro, eu gosto,

porque eu moro numa chácara, né. Eu gosto dos meus passarinhos. O sol se pondo,

o sol nascendo. O barulho da chuva molhando a terra, gosto do meu quarto, gosto

de ouvir meus discos, ler meus livros, enfim, eu gosto da minha casa. Não tem isso,

ai, aquele fetiche, eu gosto do meu quarto porque ali estou com minha esposa eu

118

curto meus momentos de amor, não, momentos de amor é a vida toda. Quando a

gente encontra a pessoa que te completa é a vida toda.

P: Certo. Que lugares que você gosta de ir? Quando sai de casa.

S: Gosto muito de andar, eu gosto muito de conversar, eu gosto de ir a lugares onde

eu vejo as pessoas. Independente de eu ir a praia, de eu ir a um restaurante, de eu

ir a um cinema, ir a um teatro. Eu gosto de estar em lugares onde eu possa

conversar. Porque eu sou bastante comunicativo, tal. Então eu tenho que falar. Não

que eu tenho que expor minhas idéias, meu deus não, não. Gosto de conversar.

Gosto de ir a igreja, gosto de estar sempre orientando as pessoas naquilo que eu

posso. Então, não tem assim, ah eu gosto de ir a praia porque eu observo o mar,

acho bonito a imensidão do mar, eu vejo o tamanho do meu deus que é maior que o

mar. Não, nada disso, eu gosto de ir a lugares onde estejam as pessoas.

P: Certo. E assim, mudou alguma coisa depois da cirurgia os lugares que você

freqüentava antes.

S: A única coisa que eu posso dizer pra você que mudou um pouco foi meu senso

crítico né, que falei a pouco,né. Comecei a dar mais valor, mudou meu senso crítico,

que eu era muito minucioso, na minhas análises, né. Então era muito detalhista.

Então, por eu dar mais valor a detalhes, não aproveito o bom e não serviu, acabou e

tal. A minha esposa diz, diz ela que eu estou mais maleável. (risos) Estou mais

maleável. Parece que você não é mais você. Você não que, que esteja mais, mas

tem tanta coisa mais importante que você, que as situações pra você mesmo, e você

pode deixar passar, que não vai mudar nada. Brigar pelo pingo da torneira, da

torneira. Nosso planeta é cheio de água, uma gotinha da torneira não vai fazer

diferença.

P: E antes você ficava irritado com isso.

S: Não irritado. Eu é, assim, se você não ia fazer eu ia na tua frente. Não, tem eu e

tem você, senão seria só eu. Não que eu me via eu como todo. Mas é,me

incomodava, então normalmente eu fazia. Quer dizer, eu não tinha paciência né.

P: Ah tá.

S: Eu preferia fazer do que falar. Então eu pegava e fazia e pronto acabou, enfim.

Agora não, agora eu posso até ouvir, daí eu penso que tá, ah tá até gostoso acho

que dá para tirar um cochilo, vou viajar com esses pingos, com essa roupa

ressecando varal, essas coisas, essa porta tá pensa, então não esquento a cabeça.

(risos)

119

P: Ah.

S: Ah, vai, vai, vai cair a parede, ah tá. Pêra um pouquinho, deixa eu puxar aqui um

pouco pro lado de cá, porque ela pode cair do lado, pra não voar bagulho nenhum

da poeira, do tijolo. Entra aí.

P: E que significado tem hoje para você a sua locomoção.

S: Olha, antes eu vivia, bastante, agora eu quero mais, né. Se a gente pode ter mais

porque a gente vai é, se acondicionar só aquilo. Não só posso isso, não você pode

mais. Por exemplo, eu sou feliz, mas eu posso ser mais feliz. Ah mais, como uma

senhora disse uma vez, mas meu filho ele pode ser feliz, a criança tinha nascido

com uma má formação e a criança veio a falecer né, depois. Ele nasceu com os

membros inferiores todo juntinho grudado no corpo, e a pediatra foi avisar a mãe

que a criança tinha nascido com esse problema. Ela falou assim, seu filho nasceu

com um problema. Mas ele vai falar doutora? Não, seu filho não vai falar. Ele vai

andar? Não, seu filho também não vai andar. Mas se ele quiser ele pode ser feliz. E

eu gravei esta frase ser feliz. E hoje eu incluí o mais feliz. Porque tem tantas

pessoas que são mais infelizes devido à situação financeira, problema social, é

sentimental, sei lá, é, a saúde. Então, é sempre mais pro lado da desvantagem do

que pro lado bom. E essa mudança, que nem essa mudança após, essa mudança,

para obeso essa mudança é mais pro lado da cirurgia. Eu não pensei em valores, eu

fui buscar coisa nova, fui ver coisa nova, fui avaliar coisa nova. Porque, por

enquanto, a gente tá aqui caminhando nessa terra, é todo dia a gente descobre uma

coisa diferente. Que nem hoje estou conversando com você, você está me

entrevistando. Outro dia eu subi no auditório no quarto andar da PUC, eu fiquei ah é,

apresentação da cirurgia, vamos aguardar. No momento, é aquela coisa, no

momento certo, na hora exata as coisas acontecem. Quer dizer que, não que você

não tenha que calgar sua próprias coisas, a pessoa fala assim vale mais uma pomba

na mão do que duas voando, não, não. Vale uma na mão e vou sair dando uma

cacetada pra pegar aquela segunda, porque eu tenho o direito aquela segunda. Não

estou pegando de ninguém ela é minha, eu vou atrás.

P: E o que significa para você hoje a sua mobilidade? É importante?

S: Ah, tudo. Tudo, tudo. Não que eu esteja mudando o caráter, a personalidade,

porque isso já vem. Mas é vida, significa mais vida. Como eu disse a pouco é melhor

condição de vida. Melhor condição de vida é em todo sentido, não dá para mim

priorizar, são todos os sentidos. Se têm quatro lados a minha vida eu quero os

120

quatro. Então vou buscar cada coisinha né, que a minha vida me proporciona. Não

que eu vá mudar a dos outros, não mudança na minha vida. Tanto é que esse

espaço agora que eu ocupo Renata, sou eu. Tanto é que quem está respondendo

agora sou eu, não é a menina da esquina, ou a menina do lado, sou eu. Então esse

espaço é muito importante para mim, e hoje esse espaço é menor, é só duas

cadeiras. (risos)

P: E como você percebe seu corpo após a cirurgia?

S: Ah, maravilhoso. Maravilhoso! É, eu ainda não me desfiz de roupa. É, como é que

eu digo. Olhando para aquelas coisas, aquilo é antigo, aquilo é do morto, aquilo já

foi. Então tá lá separado, tem algumas coisas que não servem ainda, tem coisas eu

comprei à anos que não me serviu, então é uma surpresa, cada dia você descobre,

é assim, como uma criança ou um adolescente que está descobrindo seu corpo. Ah

eu não fazia isso, tipo, eu não agachava com essa freqüência, eu não dobrava o

joelho e dobrei o joelho, ah eu não conseguia é fazer flexão, tanta flexão abdominal

hoje eu consigo. Então é uma descoberta a todo instante. Ah, eu consigo subir,

andar e não sinto falta de ar. Hoje eu corro. Então é uma descoberta maravilhosa.

Como eu sinto meu corpo, funcionando! Eu sinto meu corpo funcionando!

P: Certo. Como você se sente hoje?

S: Olha se eu for avaliar o que eu como eu me sinto hoje, se eu falar bem, eu vou

estar é, sendo negligente comigo mesmo. Hoje eu me sinto muito bem. Muito bem, e

vai melhorar, porque eu estou naquele processo comigo mesmo. Hoje eu já tenho a

relação da alimentação o que eu posso e não posso, quanto ta, as medidas já

conheço. Tem aquele fantasma do dumping que sei muito bem trabalhar ele. Hoje

eu já vou as reuniões, festinhas numa boa. Já não é mais aquele puxa anti-social,

chegou aquele comilão. (risos) Não que ele é anti-social. Eu sei. Mesmo com a

cirurgia tem pessoas que se tornam anti-sociais, posso isso, não posso isso. Não se

não posso eu não posso, não precisa falar. Não precisa ser desagradável. Eu não,

sou bom divã, sociável, extrovertido, brinco. Eu sou é bonagente.

P: Ah, sei. E antes da cirurgia, como você era antes.

S: Também, também. Era assim, também. Eu creio que melhorou para mim. Hoje eu

sou para mim e eu era para os outros, entendeu. Era para os outros, era uma coisa

assim. É aquela coisa, você está rindo por fora e chorando por dentro. Se você

ocupa um espaço que talvez não seja meu. E, ou comi demais, será que você não

foi intransigente. Será que, era um será gozado de mencionar. Será que não estou

121

sendo inconveniente. Não, não tô não. Se estou aqui eu tenho mais que participar

mesmo, tal, e assim vai.

P: E hoje você não pensa assim.

S: De jeito nenhum.

P: Se estou ocupando sendo inconveniente.

S: Não, de jeito maneira.

P: Será que estou ocupando o lugar do outro.

S: Não, não. De jeito nenhum. Eu sempre gostei de festa, sempre gostei de

madrugada, balada. Hoje não, eu sou evangélico, né. Hoje são outras coisas, hoje

são outras reuniões que a gente participa. São outros trabalhos sociais que a gente

faz, né. Mas mesmo assim, eu sinto que eu posso estar mais feliz, mesmo porque é,

pela minha condição física que é bem melhor, né. Não tem aquela canseira, aquele

inferno, aquela coisa, hoje eu estou bem melhor.

P: Antes te dava muita canseira então.

S: Ah, sim. Por causa da obesidade mesmo, né. E o calor, aquela sudorese intensa.

E hoje isso é coisa que faz parte do passado, né. Hoje nós estamos falando do

presente. E quando eu costumo falar isso, o pessoal costumam a falar isso pra mim:

“o magrelo”, “cadê aquele outro era você mesmo, hein”.

P e S:(risos)

S: “Quanto é que foi que tiraram do seu estômago”. Eu falo: não tiraram nada,

grampearam. E a gente faz uma dieta, acompanhada, assistida, depois passa pelo

psicólogo. É assistida pela equipe toda depois que faz a cirurgia. Eu muito das

vezes, o meu trabalho, eu não tenho aquela freqüência nas consultas. Mas eu vou,

faço meus exames, se possível como a gente trabalha no complexo hospitalar, você

fala com eles, porque a gente tem essa liberdade de chegar e conversar. Então, eu

sou daqui mesmo, ah, tá, então vamos agendar para tal dia, que hora você pode, né.

Não tem aquela disponibilidade de estar vindo, devido ao trabalho, né. Mas.

P: E hoje você faz a sua atividade de vida diária normal.

S: Tudo, tudo. A minha vida, ela deu uma virada de 180 graus. Nossa, de 180

graus? Ah é, 180, porque 360, você volta para o mesmo lugar. Não é. 180? É 180.

P: É o oposto.

S: (risos) Não é. É que nem a menina falou para mim a outra psicóloga. Porque ela

me conheceu na época da balada, eu bebia, fumava, era bem maneiro, bem

madrugada mesmo. Ela falou assim: Ivan, porque você parou de beber? Pra mim.

122

Bem seco. Eu falei pra ela: olha, eu parei de beber porque eu cansei de ser um

encosto, e me amar. Verdade. Se você prestar atenção no que você está fazendo, é

aquilo que é bom pra você, não é bom para o outro. Mas como? Mas é bom pra

você. Então, é bom pra ele, que nesse espaço aqui, quem ocupa aqui sou eu. Não

que seja só eu, eu, eu. Não.Mas quando se vem tocante a mim, primeiro eu, depois

eu, depois eu, depois você.

P: Isso. E assim, você parou de beber a quanto tempo depois da cirurgia?

S: Ah bastante.

P: Bem antes.

S: A uns oito anos atrás, parei de beber, parei de fumar. Uns oito anos atrás.

P: A balada também, foi tudo junto?

S: Cansou. Cansou, porque eu comecei muito cedo. E daí perde a graça, né. Fica

aquela coisa meio repetitiva, meio, todo dia mesma coisa. Todo dia a mesma

figurinha, acontece as mesmas estórias, né. E isso aí cansa, cansa. Aí você começa

a ver outras coisas, você começa a ver outros tipos de reuniões. Você vai na casa

do amigo, o amigo vai a tua casa. Daí você deixa um pouquinho. Você dorme,

porque eu não dormia. Porque as pessoas que gostam de uma balada, hoje numa

sexta feira, essa hora tava saindo e só voltava na segunda. Se voltasse na segunda

pra minha casa, senão voltava na outra semana na minha casa, ficava internado na

casa de alguém ia para o trabalho direto.

P: Ah, tá. E você era obeso desde criança, não?

S: Não, não. Eu me tornei obeso depois dos trinta anos. Trinta, depois dos trinta

anos mesmo. Não, não era obeso, nem grande, nem forte. Tinha estatura mediana,

que era para a minha altura, que é 1,96m menos 30cm, que dava 1,66m, eu pesava

em torno de 72, 68 que é o que eu vou chegar. Hoje eu estou com 83 falei para

você, né. Então estou quase chegando onde tem que ser a meta. Que não é uma

meta, né. Eles priorizaram mais ou menos, né, o cálculo, por aí,até 74 kilos, pode ser

menos, pode ser um pouco mais. Mas eu creio que vai dar 70, 68. Pelo menos pelo

meu biótipo, vai dar uns 70, 73.

P: Certo. Tem alguma coisa que você gostaria de acrescentar.

S: Não. Agradecer a você pela oportunidade de estar aqui conversando, eu gosto de

conversar. Então se você me pegar e disser que eu vou ter que falar para 300

pessoas, 500 mil. Eu vou lá, dou uma olhada no biótipo e depois eu volto. Porque é

gostoso conversar com as pessoas, né.

123

Sujeito Dirce

P: Dirce, conta para mim um pouco sobre a sua vida após a cirurgia.

S: A cirurgia, a minha cirurgia foi ótima, não tive dor, não tive enjôo, não tive nada.

Até hoje não tive nenhum dia que eu comi e passei mal. Porque eu me preparei bem

psicologicamente antes. Então, eu masco bastante, como. É sagrado pra mim a hora

da comida, né. E mudou bastante. Porque, que nem agora, pra antes, esses dias eu

até dei risada, porque uma coisa que pra mim todo mundo é normal, eu consegui

levantar e fazer a minha unha do pé. E quanto tempo sem cortar a unha do pé, né.

P: Uhum.

S: É, pra andar não tenho mais canseira, consigo andar a pé. Tanto é que vinha só

de carro trabalhar, agora estou vindo de ônibus. Eu consigo vir tranqüilo, pegar um

ônibus. Pra você, você quer colocar uma roupa não tem aquele estresses, toda

roupa que você põe não serve, você fica chorando toda hora, agora qualquer roupa

serve. Muito pelo contrário, não serve porque cai, né. E tudo, assim, comer. Antes

comia um bocado, e ficava ai que vontade de comer mais um pedaço. Agora não,

experimento. Como de tudo que eu tenho vontade, não deixo de comer o que tenho

vontade, mas como um bocadinho e já estou satisfeita. Não deixo de fazer, porque

eu não posso comer. Se eu quero fazer, aí penso em alguma coisa se tenho espaço

pra eles para que eu posso comer, mas um bocadinho e estou satisfeita. Tudo, e é

diferente, você muda, você se gosta mais, você tem mais vontade de se arrumar, se

olha no espelho, tudo é diferente.

P: Tem algum lugar que você hoje vai mais, que você não freqüentava e hoje você

freqüenta.

S: Assim, os lugares, eu sou uma pessoa que eu gosto, eu sou, eu gosto muito, eu

sou caseira. Eu gosto, eu vou bastante pra Igreja, nos encontros da Igreja, nos

grupos de jovens, eu trabalho com a Pastoral da Saúde, então estes é meus

ambientes que eu gosto. Assim, nunca fui de gostar de balada, sair essas coisas.

Então, mas eu tenho mais disposição pra trabalhar nas coisas que eu gosto.

P: Ah, certo. Assim, antes você tinha atividade física?

S: Não.

P: Nenhuma.

124

S: Nenhuma.

P: E começou a fazer quando?

S: Depois da cirurgia. Depois que ele liberou pra fazer, que eu tô fazendo a

caminhada. Também, pelo tempo, né. Porque eu terminei a faculdade este ano,

então eu trabalhava doze horas no hospital todo dia. Daí saía, ia direto pra

faculdade, então não tinha tempo mesmo. Agora tô só aqui, terminei a faculdade,

então quando chego em casa a noite dá pra fazer também, né. Mas mesmo assim, é

bem melhor, mais gostoso, dá mais prazer, né.

P: Que tipo de atividade você faz?

S: Eu tenho feito caminhada, por enquanto. Por enquanto, caminhada bastante,

porque eu moro em sítio, então tem bastante lugar para caminhar, junto com a

natureza.

P: Quanto tempo de caminhada?

S: Ah, uma hora, uma hora e pouco. Eu pego e subo no meio do mato lá e vou

embora.

P: E antes você não tentava caminhar?

S: Não. A minha vontade era de dormir, era sagrado.

P: Não tentava de vez em quando, nem esporadicamente.

S: Ah, quando eu tentava já cansava, ai que sofrimento.

P: Ah tá. E durava quanto tempo?

S: Ah, pra mim ir na casa da vizinha ali embaixo era muito, não ia a pé. Se a minha

mãe precisava buscar uma farinha, alguma coisa pra ela, eu catava o carro e ia. Não

ia a pé, não conseguia.

P: E hoje?

S: Hoje em dia se ela precisa buscar alguma coisa procuro ir a pé.

P: Mas daí, você vai a pé por que você está disposta ou por que você sente que

você precisa?

S: Os dois. Porque assim sei que eu preciso quanto mais caminhar vai ser melhor

pra mim, eu consigo ir, eu tenho disposição pra ir. Porque lá eu chegava cansando

tinha que sentar na casa dela. Então, agora não, eu vou e volto tranquilo. Não tem

problema.

P: Ah tá. Na sua casa, que lugar que você mais gosta?

S: Ah, eu gosto muito da sala.

P: Por quê?

125

S: Ah, porque na sala, todo mundo, é o lugar que a gente reúne a família, conversa

bastante, faz bagunça.

P: Ah tá.

S: É o lugar que eu gosto.

P: E a sala é grande?

S: É grande.

P: Que tamanho?

S: A sala de casa, maior que este espaço.

P: Que significado tem pra você, hoje a sua locomoção?

S: Ah, é bem melhor que antes. Eu tô vivendo, eu vou e volto, mais agora do que

antes.

P: Ah tá, mas se pudesse dar uma palavra.

S: Então, não estou sabendo distinguir uma palavra.

P e S: Risos

S: Esse que é o problema.

P: Um significado pra você a sua locomoção de hoje, o que ela significa na sua vida.

S: De que vou correr, eu já pensava, ah, vou correr e não vou agüentar, não gosto

de correr, não gosto de andar, então você já, ficava pensando, vou começar a correr

com alguém e já, vou chegar até ali e só pra ficar tirando o sarro. Então, hoje não,

será que você consegue. Eu tô tentando, tô melhorando a cada dia, então.

P: E no seu trabalho, já sentiu alguma diferença?

S: Sinto.

P: Como que era?

S: Ah, antes assim, a gente tinha hora assim que, assim tinha vez que você sentia

que estava incomodando, que você ia passar por um lugar, tava apertada. Que nem

circular a sala, ia circular a sala, quase morria para não esbarrar nos cirurgiões. Hoje

em dia não, eu consigo passar por ali, boa, você tinha aquele medo de esbarrar, de

você passar por ali e incomodar, você sabe que está estorvando alguém porque

você é enorme. Incomoda bastante.

P: Assim, você percebe que seu corpo, ou melhor, como você percebe seu corpo

após a cirurgia?

S: Cada dia menor.

P: Cada dia menor?

126

S: Risos. É. Cada dia melhor, que nem eu falo assim, quando você olha no espelho,

você fica assim, não tô nem aí, mas sem trauma. Só sei que ele tá diminuindo,

depois a gente dá um jeito, né. Depois faz exercício, cirurgia, mas o que importa é

conseguir eliminar o indesejável, calorias, né.

P: E como você se sente hoje?

S: Me sinto melhor. Melhor, mais feliz. É gostoso, né. Você vê, aonde você vai,

nossa, como você está magra, ai, como você está mais bonita. É, tudo isso é

gostoso. Porque antes, às vezes você chegava em alguém, nossa, como você está

gorda. É só isso que vem falar pra você. Você não é conhecida pelo seu nome, ah, é

a gordinha do C.O., a gordinha ali. Ah, Dirce, que Dirce, a gorda, então muda.

P: E hoje chamam a Dirce como?

S: Uns falam, a magrela, Olívia Palito.

P e S: Risos

S: Exageram, mas tudo bem.

P: Que bom. Obrigada pela entrevista.

S: Nada.

Sujeito Elen

P: Elen, conta para mim um pouco sobre a sua vida após a cirurgia.

S: Ah, a minha cirurgia foi assim, né. É, foi feito no dia 25 de janeiro, né.

P: Uhum.

P: Está com 3 meses e uma semana, e eu senti bastante dor, com a cirurgia, quando

eu estava no hospital, né. Deu uns quatro dias eu fiquei virada, doía bastante. A

hora que apertava a cinta, assim, o médico vinha e apertava a cinta, assim, eu pedia

para as enfermeiras soltar um pouco porque eu não agüentava doía muito.

P: Uhum.

S: Mas depois de uma semana já comecei a mover, andar né, devagarzinho na

casa, só que pra deitar na cama e pra levantar tinha que pedir ajuda pras minhas

meninas porque não agüentava levantar sozinha por causa do corpo pesado, né.

P: Uhum.

S: Mas nossa, foi muito bom à cirurgia pra mim, foi ótimo. É, não sofri tanto, igual

tem muita gente que fala que sofre demais, tem medo de fazer porque sofre demais.

127

Não sofre. Porque eu não acho que sofri, acho que foi uma coisa muito boa pra mim,

sabe. Porque eu estava precisando mesmo, meu peso era de 180 kilos, daí com o

acompanhamento e fazendo regime, em dois anos perdi 25 kilos, e agora após a

cirurgia né, que tá 3 meses e uma semana já perdi 16 kilos e estou me sentindo

super ótima.

P: No primeiro mês como é que foi assim a sua alimentação.

S: Foi só líquido, gatorade,água de côco e água. Só isso.Trinta dias. Quinze dias.

Daí, com mais quinze dias comecei a comer a sopinha liquidificada. Batida no

liquidificar. É, cozinhava tudo junto, chuchu, abobrinha, é, batatinha, caldinho de

feijão e pedacinho de carne. E daí liquidificava no liquidificador e eu daí comia

aquela sopinha. Colocava um pouquinho no pratinho pequenininho, comia um

pouquinho aquela sopinha, que tinha feito, preparado, e era assim,durante uns

quinze. Primeiro uns quinze dias líquido e depois quinze dias a, a sopinha, né.

P: Uhum.

S: E daí depois, quando inteirou os trinta dias, a nutricionista falô que eu podia

começar a comer, assim, mais coisas. Sopinha mesmo era assim, eu tinha que

procurar mastigar, daí não era mais batido no liquidificador. Era pra começar a

comer assim e mastigar, entendeu. Chuchu, abobrinha, tem que colocar caldinho de

feijão e ir mastigando.

P: Uhum.

S: Dar uma amassadinha. E um dia, daí quando deu quarenta dias, eu comecei a

experimentar normal.

P: Uhum.

S: Hoje eu como de tudo. Eu como uma colher de arroz, uma colher de feijão, um

bifinho. É meio difícil, sabe, eu gasto uns trinta a quarenta minutos para comer isso.

P: Uhum.

S: Mas, se sentir que estou meio entalada, aí tem que parar, você não consegue

fazer nada, daí tem que estar tomando água, e você dá aquelas gorfadas, e quando

sai aquilo com tanto esforço, você não consegue comer mais, só que depois você

acaba perdendo o gosto. Porque depois você estava almoçando e aconteceu isto,

então você não quer mais comer, né. Daí começa a tomar água, tomar um suco, até

a hora que tem que tomar o remédio. Mas estou me sentindo muito bem. Graças a

deus.

P: E dá medo, assim porque engasgou.

128

S: Não.

P: Não.

S: É, nos primeiros quinze a dezesseis dias, eu entalei. Você tem que ir no hospital

fazer endoscopia. Por causa que a minha menina estava comendo assim, goiaba, e

eu peguei e pedi uma mordidinha da goiaba dela. Eu não sei se eu não mastiguei

direito e eu engoli. Só que isto foi no domingo.

P: Uhum.

S: E eu só comecei a sentir mal na terça feira à noite. Daí fiquei terça, quarta, quinta,

tudo que eu tomava, a água, suco, voltava, nada descia. Já estava tremendo já.

Porque é, fraqueza, né. Não descia, aquela sede, assim, pra baixo do estômago,

sentia que, tinha muita sede, meus órgãos estava precisando de água, só que não

descia. Voltava tudo. Ficava dando aquelas gorfadas, daí na sexta feira vim aqui,

falei com a doutora Débora, daí ela pegou e mandou fazer a endoscopia. Daí na

endoscopia deu, que era um pedacinho de fruta. E eu tinha comido no domingo, né,

o pedacinho de fruta. Graça a deus, foi feita a endoscopia, foi tirado né, daí quando

fez quinze dias de novo que eu tinha feito a endoscopia, tornei a começar a passar

mal, tudo que eu comia voltava. Água, líquido, sopinha, comida, tudo voltava. Daí,

vim aqui de novo, torna a fazer outra endoscopia de novo. Até a médica deu uma

dura em mim, você aqui de novo?, falei: de novo. Daí ela falou assim: Ai meu deus,

o que eu faço com você? Eu espanco você, o quê que eu faço? Falei: Ai não sei

doutora, faz o que você resolver, porque eu não sei. Só que não tava entalado. A

endoscopia foi feita, não deu nada. Não sei o que aconteceu, que nem ela falou, não

sabe se já tinha descido, ou às vezes, o estômago estava inchado, ou o que né.

P: Uhum.

S: Porque não tinha nem dois meses, né. Trinta dias e pouquinho. Mas depois de

trinta dias para cá, nossa. Graça a deus. Não, agora tô aprendendo a comer, coloco

uma colher de arroz, uma colher de feijão, e um bifinho, só que eu to pondo assim,

comida mais coisinha mais molinhas, sabe.

P: Uhum.

S: Porque pra comer um bifinho, umas cem gramas, assim, dá trabalho. Tem que

mastigar. Cortar bem pequenininho, pra mastigar. Carne cozida, assim, na panela de

pressão aos pedaços, assim, com molho, você consegue comer só o molho, carne

você não consegue. Fica mastigando, mastigando, em pedaço, ele vira uma bucha

na boca, você fica com medo de engolir e entalar novamente, né. Então, eu prefiro

129

comer mais o bife assim, eu frito ele assim, não com muito óleo, né, só passo assim

na frigideira, bem pouquinho em óleo, vou apertando bem ele para que fique bem

sequinho, e daí vou tirando os pedacinhos e vou comendo bem devagarzinho.

Agora a carne cozida não consigo comer, o que deveria ser melhor que bife, agora

não consigo. Porque eu mastigo ela, fica como uma bucha na boca, daí eu só

engulo o caldo e jogo ela fora, porque eu não consigo. Tenho medo de engolir e

entalar novamente.

P: Tem outros alimentos.

S: Todos eu estou comendo.

P: Que bom.

S: Agora, a única coisa que eu não estou comendo ainda é folha, sabe. Alface,

almeirão, couve. Eu tentei comer estes dias couve, assim, picado bem fininho, na

salada, não consegui também. Eu fui mastigando, mastigando, primeira colherada

que eu coloquei na boca, daí, juntou tudo aquela coisa assim, e parece que deu

aquele bolo assim, fiquei com medo de engolir. Joguei fora e não comi mais.

P: Ah, tá. Mas foi uma tentativa de comer mas aí o medo veio.

S: É.

P: Você desistiu e soltou.

S: Soltei, mais é por causa da, a psicóloga também, já falou pra mim que muitas

coisas, às vezes está acontecendo isso comigo, por causa de já ter acontecido, de

ter entalado, né. Aí eu fico com aquele medo, aquele medo, aquele trauma.

P: Você tem medo de sofrer de novo.

S: Tenho medo de sofrer. Que, depois dos trinta dias, tava com uns quarenta dias,

começou a me dar muita cólica, eu não tinha cólica.

P: Uhum.

S: Até os trinta dias. Depois dos trinta dias, acho que depois comecei a me

alimentar, começou a me dar muita fome. Nossa, mas uma fome que eu não

agüentava. Eu terminava de tomar o café da manhã, um pouquinho de café com

leite, com adoçante, duas bolachas de água e sal, nossa, quando era nove, dez

horas, eu não estava agüentando de fome. Daí eu comia um pedacinho de uma

fruta, né.

P: Uhum.

S: Daí ficava tomando água, líquido, até chegar meio dia pra mim almoçar

novamente. Nossa, mas é uma fome nesse intervalo que eu não estava agüentando,

130

sabe. Daí, eu peguei e falei assim, meu deus, eu vou ter que parar com isso. Porque

se eu ficar também, eu corro atrás da fome, querer tampar a fome, né. Eu não vou

emagrecer, né. Até a nutricionista falou assim, que eu emagreci muito pouco.

Nesses dois meses, continuo, fez três meses, tem seis quilos que eu emagreci. É,

ela falou assim, que é muito pouco, que eu não perdi peso. Que era pra mim ter de

um lado, é dez porcento do peso em dois meses, e deu somente seis porcento do

peso. Ela falou assim, que o meu organismo que é mais difícil pra emagrecer.

P: Uhum.

S: Mas não pode acontecer isso, porque se fosse para acontecer isso, é, não

compensaria nem ter feito a cirurgia. Porque é sofrida né, dolorosa.

P: Uhum.

S: E depois ficar assim. Ela falou assim, que esses seis porcento que eu emagreci a

gente emagreceria com regime. Daí, desse dia pra cá, eu peguei e cortei um monte

de coisa. Porque é aquela história, os trinta dias que foi só líquido.

P: Uhum.

S: E acostumou toda hora ficar de vinte a trinta minutos, tomar água de côco, tomar

gatorade.

P: Ingerindo alguma coisa.

S: É, muita coisa. Então comecei a atacar a geladeira, sabe.

P: Uhum.

S: É toda hora. Assim, sabe. Eu ficava ansiosa.

P: Uhum.

S: Eu fiquei naquele desespero. Eu, eu tomava água, dali a pouco, eu tomava café

com leite. E não demorava acho nem vinte minutos eu comia uma bolacha de água e

sal, dali a pouco eu chupava uma laranja. Acho que é isso que, eu não emagreci o

peso normal, sabe.

P: Porque já tinha criado o hábito de comer de trinta em trinta.

S: Porque ficava toda hora, acho assim que, a minha mente acostumou aquele, ao

hábito de toda hora, toda hora, sabe. Toda hora ficava comendo, toda hora. Daí, por

mim mesmo, eu não passei mais na psicóloga, eu tenho psicóloga agora só em

agosto.

P: Uhum.

S: Daí, por mim mesmo eu comecei a tirar. Quer ver, foi, sexta feira passada.

P: Uhum.

131

S: Eu estava com noventa e três quilos, quase noventa e quatro, noventa e três e

quatrocentos quase noventa e quatro. Daí eu comecei a fazer isso, diminuí. Eu tô

comendo de três em três horas. Mesmo que eu fico com vontade de ir lá e atacar as

coisas, eu não como. Eu vou na água, ou então no suco com adoçante.

P: Uhum.

S: Não como nem bolacha, nem chupo laranja. Nem como fruta igual estava

fazendo. Você vê que cortei, eu mesmo cortei. Olha, quanto, de sexta feira pra cá,

eu to com noventa e um.

P: Em menos de uma semana.

S: Menos de uma semana. Você vê, porque eu diminuí, não de comer, eu tô

comendo normal, almoço, janto, tomo lanche da tarde. Mas assim, no intervalo de

três em três horas. Porque tava, muito acostumado assim, aquele hábito né, de, toda

hora, de vinte e trinta minutos estar tomando um suco, tomando um gatorade, então,

ou comendo uma coisinha, então, eu acho que eu fui acostumando aquilo. Aí, meu

deus. Se eu continuar desse jeito eu não vou emagrecer. Ainda a psicóloga falou

aquilo pra mim né, que eu emagreci muito pouco, eu coloquei aquilo na cabeça.

Falei não, não pode acontecer isso comigo. Porque se eu tive vontade de fazer

cirurgia, pra mim emagrecer, agora porque eu vou ficar, sendo que eu sou operada,

consegui graça a deus, né. Ser operada.

P: Uhum.

S: Porque eu vou ficar me dando comer, comer, comer, aí, que nem uma doidinha aí

e depois só engordando. Não, eu vou parar por aqui. Chegou domingo eu cortei

tudo. De sexta feira passada, domingo eu já cortei tudinho. Eu já comecei no café da

manhã, eu tomei um copinho de café com leite e duas bolachas água e sal, mas do

que duas eu não como. Dá vontade.

P: Uhum.

S: Mas eu não como. E daí, lá pra umas dez, onze horas, dez e meia, onze horas,

eu como uma metade de uma fruta, eu não como a fruta inteira como eu tava

comendo antes, só a metade.

P: Uhum.

S: Ou uma pêra molinha, ou então, um pedacinho de banana. E daí, naquele

intervalo das dez e pouco até chegar o almoço, lá pelas meio dia e meia, uma hora,

eu passo só com água. Dá vontade de comer as coisas. Não é porque você fome,

132

você entendeu, o que é né.

P: Uhum.

S: Não é fome, é que você acostumou, ficou aquele ar que tem que ficar catando as

coisas para comer, né. Daí eu fico me segurando, daí quando é a hora do almoço,

eu pego uma colher de arroz, uma de feijão ou então caldinho de feijão, e, uma fatia

de tomate, porque mais que isso você não consegue, e um pedacinho de mistura, ou

um peito de frango ou um bifinho. E aí vou mastigando, mastigando, mastigando a

comidinha é trinta, quase quarenta minutos para conseguir comer aquilo. E não é

todo dia sabe, tem dia que não consegue. Tem dia que, que nem eu falei para você.

P: Hum.

S: Você começa a comer, tem dia que você come que é uma beleza, café da manhã,

almoço, janta, tudo normalzinho. Mas tem dia que não sei se o anel aperta mais, eu

não sei o que acontece, só sei que tem dia que eu não consigo almoçar, eu começo,

eu não sei é porque eu estou comendo muito depressa, eu começo a comer e

começa a querer me entalar, parece que é assim, fica tampando assim.

P: Uhum.

S: Aí eu pego e já paro. Pego e já paro, vou cuidar das minhas coisas, e daí depois

mais tarde,daí eu não tento comer aquele almoço que eu estava tentando almoçar

não, aquele lá eu jogo fora.

P: Certo.

S: Daí mais tarde eu faço igual como eu fazia, almoço, café e fruta da tarde.

P: Uhum.

S: Eu como uma fruta molinha, ou então, muito o que eu estou comendo também, é

aqueles mamão papaya.

P: Uhum.

S: Bem madurinho, eu pico ele picadinho, bem pequeninho, eu coloco um pouquinho

de leite desnatado assim, numa tigejinha pouquinho né. Uma fatiinha de mamão.

P: Uhum.

S: Pico ela. Às vezes até a metadinha dela, pico a metadinha, coloco um pouquinho

de leite desnatado, às vezes coloco um pouquinho de adoçante e como. Daí, nossa,

fica excelente. E aí é na hora da janta de novo.

P: (sorriso)

S: E olha para você ver como eu perdi peso.

P: Perdeu mesmo.

133

S: Né. Quer dizer, se eu continuasse, não ia dar certo a minha cirurgia. Ia continuar

engordando. E daí eu mesmo parei para pensar e cortei, já logo no começo, né.

P: Que bom.

S: Porque, uma semana eu pesei e tava com noventa e um. Daí, dali duas semanas

eu fui pesar e tava com quase noventa e quatro. Falei, não é pra acontecer isso.

P: Fez a cirurgia.

S: É, daí eu peguei e cortei. Agora nossa, já acostumei. Mas nos primeiros dias foi

difícil. Domingo passado eu comecei a cortar, foi difícil. Porque é, dava intervalo de

três horas, três horas e pouco,

P: Uhum.

S: E eu queria comer, comer, que eu tava acostumada, né. Foi difícil. Mas agora já

tô acostumando bem. Ontem foi já bem melhor, hoje tá bem melhor, né.

P: Está pesando quanto?

S: Hoje está com oito dias que eu tava com quase noventa e cinco, noventa e qutro

e algumas gramas.

P: Então, você teve uma faze que você perdeu peso, de repente você começou a

ganhar de novo, e aí.

S: Ah, fugi. Porque você tem um estômago pequenininho, você não tem tanta fome

assim. Bom, fome você tem, só que o pouquinho que você come você já fica cheia.

P: Aham.

S: Né.

P: Já satisfaz.

S: É, porque o estômago é pequenininho, né. Isso que vale a pena, né.

P: O que dá é vontade de beliscar.

S: Dá, vontade porque, é aquela história. A gente tem o olho mais gordo que a

barriga.

P: Sorriso.

S: Tudo que você vê você quer comer. Nossa, aquela vontade de comer. Sabe por

que isso? Porque, a pessoa que é obesa, ele é obeso não é porque muitas pessoas

falam assim, ah, a obesidade é porque a pessoa é, de família, a obesidade é uma

doença assim. É nada. A obesidade é porque come, viu. A obesidade é porque

come. Igual a gente quer tampar aquela fome que tá ali, o que tava acontecendo

comigo. Você quer tampar aquela fome, e é onde você acaba engordando. A mesma

coisa agora depois da cirurgia. Você imaginou se eu fosse acudir a fome que eu tava

134

sentindo, ficasse só comendo toda hora, toda hora, eu não ia emagrecer. Só que eu

já peguei e cortei.

P: Na verdade não era uma fome.

S: Era um hábito.

P: Era um hábito por causa da ansiedade.

S: É.

P: Ela fazia você colocar a comida na sua boca toda hora.

S: Toda hora precisava comer. Nossa, toda hora atacando a geladeira.

P: Agora você está trabalhando com a sua ansiedade. Você está controlando.

S: Tô controlando. Agora tô começando a comer direitinho, tô aprendendo melhor a

comer, né. Depois dos três meses tá melhor. Me sentindo muito bem. Tô comendo e

me sentindo melhor, né. Não é assim, tudo medidinho. Vou na panela de arroz, pode

tá o arroz mais gostoso que tiver, é duas colher só. A vontade dá de você lotar o

prato, mas mesmo que você lote o prato você não vai conseguir comer. Porque o

estômago tá pequenininho.

P: Você já tentou comer.

S: Não.

P: A mais, alguma coisa.

S: Não. Eu imagino, mas fica na imaginação. Que se for tentar comer, devagarzinho,

devagarzinho, acho que come, viu.

P: Você acha que come?

S: Eu acho que come. Por causa que, você fica meio imaginando assim, sabe.

Porque eu acho que daí é, pode acontecer isso. Você vai comer, e fica na

imaginação de querer comer, comer, comer. De pouquinho, em pouquinho, você vai

comendo, comendo, comendo. O que aconteceu comigo aquela hora, daí acho que

o estômago vai laciando de novo.

P: Isso.

S: Porque o estômago é igual uma bexiga, né. Vai esticando de novo.

P: Isso.

S: Daí eu peguei e parei antes que acontecesse isso comigo, né. Porque senão

como eu ia perder peso depois da cirurgia?

P: Isso. E assim, como está hoje a sua locomoção.

S: Ah, tá muito bem. Nossa, tô muito feliz, eu não conseguia agachar para catar uma

caneta no chão, eu não conseguia agachar quando caía o sabonete, eu não

135

conseguia agachar para catar. Tinha que pegar outro no alto, um que tivesse ali

perto. Porque aquele que caiu no chão não conseguia catar. Nossa, era bem difícil.

Pra catar lixo no chão tinha que ter uma pazinha, aquelas de cabo grande, porque

aquelas baixinhas não conseguia abaixar, ficava muito difícil. Hoje em dia, nossa, eu

to me sinto outra pessoa, dá uma impressão que eu renasci novamente. É, eu

agacho, limpo o canto, eu ando, faço caminhada todos os dias, uma hora e quinze

minutos.

P: Uhum.

S: Eu saiu da minha casa e vou trabalhar, eu trabalho três vezes na semana,

segunda, quarta e sexta. Eu saiu da minha casa, sete horas, dez pra sete.

P: Uhum.

S: E ando quarenta e quarenta e cinco minutos pra depois pegar o ônibus. Não

porque não tem ônibus, tem ônibus na porta, mas é que eu, pra fazer a caminhada,

os quarenta minutos, quarenta e quarenta e cinco. Tento fazer sempre. E o dia que

estou em casa, terça e quinta, eu ando uma hora e quinze minutos. Saiu pra andar,

ando, quando dá, é, chego em casa por volta de casa dá uma hora e quinze

minutos, uma hora e dez minutos. Todos os dias. Pra dormir, tô dormindo muito

bem. Eu roncava muito meu marido falava, ele dizia que eu tô com sono assim, tão

gostoso. Que eu fico assim parecendo um neném quando tà dormindo.

P: Sorrisos.

S: Sabe, aquele sono bem suave, sabe. E antes eu roncava muito, ele falava. A

gente não vê, a pessoa que está do lado que vê assim. Nossa, essa cirurgia, vale a

pena, sabe.

P: A sua locomoção hoje.

S: Nossa, mudou completamente. Tô muito feliz. Eu peço que alguém que tá assim,

com acompanhamento médico da endocrinologia, que queira fazer essa cirurgia,

pode fazer sem medo, porque vale a pena, é muito excelente. Só que a gente

também tem que ajudar. Que acontece tudo isso com a gente, né, que eu falei né.

P: E antes da cirurgia você caminhava assim, esse tanto.

S: Olha, eu tentava caminhar, só que sofria muito. Eu andava uma hora, não todo

dia porque eu não agüentava. Eu peguei uma dor no pé, no calcanhar que eu não

agüentava de dor. Ainda tenho a dor, continua a dor, acho que é esporão que deu

este negócio.

P: Uhum.

136

S: Você, eu tentava andar, assim, porque eu tava fazendo regime, fazia

acompanhamento, pra fazer a cirurgia, tinha que emagrecer dez porcento do peso

né, então eu tinha que me esforçar, sem guentar mesmo não dá. Mas hoje em dia,

nossa, eu quero andar assim, quero andar, passear. Nossa, eu gosto muito de

andar.

P: Isto te dá prazer.

S: Dá. Me dá prazer.

P: Quais são os lugares que você mais gosta de ir, hoje?

S: Ah, eu gosto de ir sempre assim, sabe, é, antes eu não tinha coragem de sair

nem até assim na padaria, na esquina, não tinha coragem, porque, acho que a

gordura me impedia, né. Aquele desânimo, aquele mal estar. Hoje não, eu tenho

vontade de ir no supermercado fazer compra, é, passear, ir na casa dos amigos, das

colega, conhecer gente nova, às vezes eu encontro gente assim, no ônibus, né. Ah,

é você que é Elen? Foi você que fez a cirurgia? Eu falo assim, ah, eu sou. Ah, vai

em casa pra gente conversar, eu pego o endereço. Aí eu vou conhecer a casa da

pessoa, sabe. Nossa, eu to muito feliz, gosto muito de passear, no final do ano vou

pro Paraná, a gente fica dez, onze dias lá., tudo. Agora, imagina agora que eu estou

mais magra imagina a delícia que vai se, né.

P: Risos. Já gostava de passear.

S: Já gostava, né.

P: Agora você está saindo muito mais do que você antes.

S: Muito mais, porque eu não tinha coragem. Tinha dia, eu acho, não sei, eu não sei

o que é, o que vem a ser depressão.

P: Certo.

S: Mas eu acho que tava entrando em depressão. Porque tinha dia que eu não tinha

nem coragem de sair nem até o portão da minha casa. Era só dentro de casa. Era

assim, terminava de almoçar, já, só lavar a louça e ia se deitar. Era desse jeito.

Agora hoje em dia, não tenho nem vontade de ficar deitar não. Tenho vontade de

ficar assim, trabalhando, limpando as minhas coisas, os dias que fico em casa,

lavando a roupa, arrumando tudo, os quartos, as coisas de lugar, limpando a casa,

deixando tudo em ordem, sabe. Nossa, eu mudei completamente, eu virei outra

pessoa.

P: E antes você trabalhava, limpava a casa de alguém também, Trabalhava como

doméstica?

137

S: Eu trabalhava, mesma coisa, só que era assim, eu trabalhava, me esforçava sem

poder mesmo, com aquela gordura, eu trabalhava, eu chegava em casa, nossa, eu

chegava exausta, não tinha coragem nem de fazer janta. Mesmo assim tinha que

fazer, né, na marra, né. Porque não tinha quem fizesse, né. Mas era difícil, era muito

sofrido. Eu sofria demais.

P: E hoje está mais fácil você fazer.

S: Nossa, hoje eu não sinto nada. Trabalho dia inteiro, às vezes saio do serviço,

passo na cidade, pago conta, é, compro mistura, coisas que tá precisando pra casa,

vou embora, chego em casa, já tá sujando, tá lavando louça da janta. É aquele

ânimo, nossa, mudou completamente. Antes eu tinha que fazer isso, entendeu, mas

assim, parece que era forçado, porque eu não agüentava, sentia muita canseira.

Hoje em dia, nossa, esses quilos que perdi.

P: Uhum.

S: É, uns vinte e cinco quilos no regime, esses dezesseis depois da cirurgia, eu tô

me sentindo muito ótima.

P: Uhum. Tá. E que significado tem para você, essa sua locomoção hoje?

S: Significa que, né, como eu tô falando, né, me sinto outra pessoa. Tá muito bom

pra mim, nossa, tô muito feliz. Se eu imaginasse que fazer essa cirurgia fosse desse

jeito, eu tivesse conseguido mais antes, eu teria feito mais antes. Porque vale a

pena, e é muito bom.

P: O que significa a locomoção de hoje para Elen. Porque antes da cirurgia tinha um

significado, não tinha?

S: É assim, vamos supor, é, vamos supor, é, antes a minha vida nessa situação toda

que eu tô contando.

P: Uhum.

S: Era assim, amarga, né. Um passado amargo, muito amargo. Hoje em dia é doce,

suave, gostoso.

P: E assim, sobre a tua casa, mudando de assunto, que lugar você mais gosta?

S: Ah, eu, eu gosto assim, mais de ficar na sala, né, porque têm o sofá, chego lá eu

deito, na hora que não tem nada pra fazer, assim, né.

P: Por que você gosta mais de lá?

S: Ah, porque não sei, é mais gostoso, é mais fresquinho,né, mais ventilação

melhor.

138

P: E a sala é grande?

S: Não, é pequena. É do tamanho desse quarto aqui.

P: Ah, tá. Mas ela é maior que o quarto, que a cozinha?

S: Não, ela é menor que a cozinha. A cozinha é bem maior.

P: Ah, tá.

S: É. Outra coisa também, eu gosto de fazer muitas coisas, sabe. Assim, acho que é

isso que eu engordei muito, as minhas filhas também são gordas. A mais velha têm

vinte anos e pesa 78 quilos, a do meio tem 80, a pequena de treze ta com 45.

Porque nossa, eu adoro cozinhar sabe, fazer massa, coxinha, quibe, todos eles

gostam, sabe.

P: Ah que tentação.

S: É, eu gosto de fazer.

P: Também tem uma ajuda para ganhar uns pezinhos, quilinhos.

S: É.

P: Então, agora está diminuindo.

S: Tá diminuindo porque eu não posso estar comendo, né. E se por acaso eu não

comer, só dar uma beliscadinha, só, né. Porque não pode né, senão. Daqui a pouco.

P: E depois da cirurgia que você não podia comer, que era líquido, mesmo assim

você cozinhava, trabalhava, fazia as massas.

S: Cozinhava, fazia a comida, né. Só que até diminuí as massas, né, daí eu não fiz

massas, porque daí era uma tentação.

P: Risos. Ficaram obrigados a não comer massas. Também foi diminuindo o peso,

porque diminuiu a fartura.

S: É.

P: E como você percebe seu corpo hoje?

S: Ah, eu percebo assim que eu tô mais esperta. Tô mais.

Lado B

S: Eu percebo que tô mais esperta, mais saudável, prá tudo, prá se virar, prá

agachar, tá. Nossa. Só o que eu tô notando é que tá descendo uns poucos a mais,

sabe, assim, tá ficando flácido a pele, né. Mas isso aí não importa, não esquento a

cabeça com isso não. A minha vontade é de emagrecer. Tô muito feliz, a minha

vontade é emagrecer. Sobre as peles que vai sobrando, isso aí fica escondidinho

139

debaixo da roupa, né. Isso aí pra mim tá ótimo.

P: É sinal que está emagrecendo. Está sobrando pele.

S: Nossa, eu fico muito feliz. Eu olho no espelho e fico, olha como eu estou

emagrecendo, roupa que não estava servindo mais, agora já serve. Nossa, a cintura

tá afinando mais, nossa, eu tô muito feliz.

P: Antes você se olhava no espelho?

S: Eu olhava mais eu tinha até medo. Chorava, falava meu deus, que corpo horrível.

Eu cheguei até a mandar uma carta lá pro Ratinho, pra ver se eu conseguia uma

cirurgia, um regime, alguma coisa. Porque eu não suportava mais aquela gordura.

Cento e trinta quilos.

P: Hoje você se olha por inteiro no espelho?

S: Eu me olho. Eu me olho e eu tô muito feliz, é muito diferente. Nossa, diferente,

muito.

P: Como você vê a Clarice hoje. Como que ela está?

S: Eu tô outra Elen hoje. Muitos disseram pra mim que aquela Elen anterior não

existe. Eu tô começando a viver depois da cirurgia outra fase. Eu me sinto assim,

sabe.Que eu estou começando a dar mais felicidade na minha vida. Eu tentava ser

feliz mas não era feliz. Sabe quando você tenta uma coisa e você não consegue? Eu

fazia isto, todo mundo via eu com sorriso. Pra alegrar mais as pessoas, só que por

dentro eu não era feliz. Eu me fazia de feliz, mas eu não era feliz.

P: Hoje a Elen não se faz de feliz.

S: Não, agora ela é feliz mesmo de verdade.

P: Pra você estar feliz você demonstra mesmo que está feliz.

S: É. Eu sou assim agora direto, direto. Se a caso eu fico nervosa por alguma coisa

assim, de repente já passa, eu falo, ah, deixa isso pra lá, porque fazer isso, isso faz

mal pra gente. Deixa eu ficar com a minha felicidade, com minha alegria. Nossa, eu

me sinto muito feliz.

P: Tá, e essa felicidade vem da onde? Por causa dessa perda de peso que vem

essa felicidade.

S: Essa felicidade, porque antes não tinha nem como, né.

P: É por causa da estética, ou porque tem outras coisas também influenciando,

como as pessoas te olharem. Ou é tudo isso.

S: É. Questão das pessoas me olharem, né. Ás vezes até as criancinhas, né. Você

vai passando na rua, na frente da criança, porque a criança não tem maldade né.

140

P: Uhum.

S: A criança vê a fala, nossa, ai que gorda. Aquilo você fica, você vai andando assim

na rua, entrando num ônibus, dá a impressão que está todo mundo te olhando, te

apontando o dedo.

P: Uhum.

S: Às vezes nem tá. Mas você se sente assim, entendeu. Agora hoje em dia, nossa,

aquilo, eu saio na rua assim, as pessoas falam assim. Nossa, Elen, como que você

está emagrecendo, como que você está mais magra, você está ficando bonita.

Nossa, aquilo me enche de alegria. Nossa, eu fico muito feliz.

P: Então agora você sai na rua e não senti que as pessoas estão te olhando.

S: Não, não sinto. Sinto que as pessoas estão me olhando, imaginando. Quem fala

de mim, eu sinto que as pessoas estão imaginando que a Elen está emagrecendo.

Acho que ela deve estar fazendo alguma coisa para emagrecer, imaginando isso,

sabe.

P: Ah, tá. E como você se sente hoje? Elen hoje se sente como?

S: Hoje eu me sinto como uma pessoa normal. Antes eu sentia como uma pessoa

doente. Deus me perdoe de eu falar, porque é muito triste essa palavra, porque a

gente tem muito dó de as pessoas que são assim, mas eu me sentia uma pessoa

deficiente. Eu me sentia assim, não era, tinha perna, braço, eu andava. Mas por

causa da obesidade era muito grande, né. Os cento e trinta quilos, cento e vinte e

cinco quilos, eu me sentia uma pessoa desse jeito. Uma pessoa deficiente que não

tinha coragem pra nada. Não tinha felicidade pra nada. Se fazia que estava feliz,

mas não estava feliz. Agora hoje em dia me sinto uma pessoa normal. Uma pessoa

igual todo mundo, normal. Uma pessoa feliz, pode trabalhar tranqüila, andar,

passear, se divertir, né. E antes eu não tinha essa felicidade.

P: Você tem alguma coisa que quer complementar, gostaria de falar.

S: Acho que no momento, agora não estou lembrando nada.

P: Obrigada Elen.

S: De nada.

Sujeito Fernanda

P: Dona Fernanda, fala um pouquinho pra mim sobre a sua vida após a cirurgia.

141

S: É bem melhor que antes, né. Tinha muita canseira toda, pra andar, tudo que eu

fazia era difícil, né. Pra caminhar, agora é melhor. Pra dormir também, deus me livre,

tinha falta de ar.

P: E hoje você não têm?

S: Hoje não. Tô me sentindo bem melhor.

P: Você fez a cirurgia que dia?

S: Foi dia dezessete de janeiro.

P: Ah, tá. E como é que foi aqui, essa cirurgia?

S: Ah, graça a deus foi tudo bem, né. Eu tava com medo de precisar ir prá UTI, nem

precisou, foi tudo bem. Outro dia, cedo já, foi numa quarta feira, quinta feira de

manhã já levantei, as enfermeiras ajudaram né, a levar, ir no banheiro, depois eu

tomei banho já sozinha, já comecei a caminhar devagarinho, né. Dor, não tinha

muita dor, só quando sentava, levantava tinha dor um pouquinho. Aí tinha que

respirar bem fundo e depois começava a caminhar, porque tinha que caminhar.

P: Uhum.

S: Bem devagarinho. Então, não teve nem ânsia, só teve uma vez, no dia da

cirurgia, só tinha, umas seis horas da tarde que deu ânsia só, depois não tive mais.

P: Aí para ingerir nesses primeiros dias.

S: Daí, a gente fica três dias né, sem tomar nada, fica tomando soro, nem água não

pode tomar. Daí, depois do terceiro dia, no quarto dia em diante aí eu começo a

tomar líquido. Chá de camomila, de erva doce, gatorade, essas coisas, água de

côco.

P: Você teve uma boa aceitação?

S: Só o chá de erva doce que, (risos), as outras coisas tudo bem.

P: Depois você foi para a tua casa, e.

S: E daí continuei com o líquido, o chá, gatorade, danone, na hora da refeição era

caldo de legumes.

P: E você seguiu certinho, nos primeiros dias, de cinco em cinco tem que tomar os

líquidos.

S: É de dez, em cinco em cinco é, cinco minutos.

P: Você foi mais rigorosa assim ou você foi mais tranqüila, dava um tempinho você

tomava.

142

S: Não. Eu tomava de cinco em cinco, é que nem danone, água de côco, essas

coisas, de cinco em cinco minutos. E a refeição assim que era caldo de legumes, era

na hora do almoço.

P: Depois entrou a gelatina.

S: Não, a gelatina já tava, nos primeiros dias já.

P: Uhum.

S: Era de cinco e cinco minutos também. Eu fiz tudo certinho.

P: Depois entrou a comida mais pastosa.

S: É, depois de quinze dias já podia já comer purê. É, passado na peneira né, a

batatinha, legumes também, batia tudo no liquidificador e passava na peneira.

P: Não teve nenhum problema?

S: Não.

P: Depois da cirurgia não teve problema nenhum?

S: Não tive problema nenhum. Nem tive nenhuma fome também. Não tenho fome. A

gente come porque tem, né, que comer.

P: Mas não tinha fome.

S: Não teve. Quando tem fome assim, dá a impressão que vai comer bastante.

P: Uhum.

S: Quando coloca a comida, a quantia certa, já acostumou. É duas colheres de

arroz, uma de feijão, uma de caldo, uma verdura, por aí. A gente tem que mastigar

muito bem, senão a gente se afoga.(risos)

P: E você já se afogou, alguma vez?

S: É, já aconteceu de parar assim.

P: Uhum.

S: Dá uma sensação muito ruim. Parece que vai morrer afogado. Mas aí a gente

volta, o que não consegue descer volta. Não tenho paciência pra nada não.

P: Já aconteceu isso várias vezes?

S: Não muitas vezes, umas três vezes, só.

P: Ah, tá. Hoje demora quanto tempo para você se alimentar?

S: Para me alimentar demora mais, não cheguei a marcar, mas uma meia hora mais

ou menos. Tem que mastigar bem.

P: Nesse período, não teve nenhum problema de rejeitação de nenhuma

alimentação.

S: Não, foi tudo bem.

143

P: Ah, tá. E quando que você começou, ficou, o médico liberou você a fazer

atividade física?

S: É, caminhar assim quando tava antes dos três mês, só lugar de acento, o lugar

onde moro tem muita subida, agora eu já posso caminhar, né, fazer ginástica. Agora

que passei nela, quer ver, dia cinco que eu passei nela, ela liberou para fazer

ginástica, caminhar mais do que estava caminhando. Já posso, só não posso lugar

de subida, mais devagar.

P: Uhum.

S: Ela falou que já posso caminhar uns quarenta minutos, uma hora, mas

devagarinho. No começo não pode. Só tem que ser em acento, caminhar vinte,

trinta, vinte e cinco minutos, e não forçar muito, porque é perigoso, né.

P: E hoje você está caminhando?

S: Eu não caminho muito porque eu faço o serviço da casa, né, não dá tempo.

P: Ah, é você que limpa a casa toda?

S: Eu ajudo a cuidar da casa. Tenho uma menina que ta na escola, ela chega meio

dia, aí eu faço almoço, lavo roupa também.

P: E você trabalha fora?

S: Não.

P: Na casa já te muito serviço.

S: E eu tenho uma neta, e também ajudo a cuidar dela.

P: E como está hoje a sua locomoção?

S: Bem melhor. De primeiro pra subir a escada era um sacrifício, pra andar subir a

subidinha até lá na rua de casa, sofria. Pra ir no posto, né, tem que, acho que dá

mais, mais ou menos um quilômetro, né, de casa. Nossa como eu sofria.(risos)

P: Ia a pé.

S: Eu vou a pé e volto, né. E às vezes tinha que ir de ônibus, tinha muita dor no

joelho, e agora já não tenho dor mais. A dor já melhorou.

P: Melhorou a dor no joelho. Pra você ir no posto você sente hoje?

S: Ah, eu ando e não sinto mais. Pra mim é um prazer de andar. Porque não sinto

dor mais nas pernas, no joelho, nada.

P: E antes você caminhava mas com dificuldade.

S: Dificuldade, tinha que apoiar né, na minha menina. Na filha que ia junto comigo.

Porque com ela, conforme ia andando parecia que a minha perna adormecia. Aí era

144

perigoso cair.

P: Ah. Hoje você pode caminhar então.

S: Não saía sozinha de jeito nenhum.

P: E hoje você sai sozinha?

S: Hoje já dá para sair sozinha, só que eles nem deixam, né, já tem aquele cuidado,

já, costumado comigo, né. Mas eu já tava pensando, que já tenho vontade de sair

sozinha já, nem tontura nem tenho. Antes tinha muita tontura.

P: É por causa da pressão.

S: Da pressão. Tá normal.

P: Sobre a sua casa, que lugar você mais gosta?

S: Eu gosto mais da cozinha. (risos)

P: Por quê da cozinha?

S: Não sei. Acho que é o lugar onde a gente fica mexendo, nas coisas da cozinha,

então, da cozinha eu gosto mais.

P: E as pessoas da casa se reúnem onde? Na cozinha?

S: É, na cozinha.

P: Em que lugares você gosta de ir quando sai de casa?

S: Eu gosto de ir na Igreja, que mais.

P: Você vai toda semana?

S: Agora faz dias que não vou, né. Mas tem que começar ir agora, já posso

caminhar. Ir andando, também, um quilômetro, acho que um quilômetro e meio.

P: E antes você ia como na igreja?

S: Tinha que ir de ônibus.

P: Ah, você ia de ônibus.

S: Mas eu gosto mais é de ir de a pé.

P: Hoje você gosta mais de caminhar.

S: Gosto mais.

P: Mais algum outro lugar que você vai. Com seus familiares.

S: Só com a minha mãe, dos meus filhos né, que moram lá na vila perto lá, é os

lugares que eu vou.

P: A freqüência é a mesma?

S: É.

P: Que significado tem para você hoje a sua locomoção?

S: Não sei dizer. É a coisa mais importante da minha vida. Falam que tem tanto

145

problema no mundo e, que nem lavar roupa mesmo, quando eu fazia serviço, eu

colocar a roupa no varal, nossa, tinha tontura. Era um sacrifício, caía. Quantos

tombos não cai no quintal da casa.

P: É.

S: Ficava virando né. Agora pra mim é bem mais fácil. Não tenho mais problema.

P: É mais fácil fazer o serviço de casa?

S: É mais fácil. Pra mim andar também, tinha tontura, se eu fosse andar rápido não

conseguia, né, andava de um lado para outro, parecia bêbada. É bem melhor agora.

P: Fazer o serviço de casa também?

S: É.

P: Você sente a diferença?

S: Sinto. Me sinto mais leve, né. Fazer tudo que, pra caminhar, pra fazer o serviço.

P: Se for pra colocar em palavra que significado, o que representa o quê pra você a

sua locomoção? Seu ir e vir, poder colocar a roupa no varal, você ir até lá no posto,

né, agora caminhando, porque antes era de ônibus. Coloque em palavras.

S: Parece um milagre, né. (risos) Um milagre que aconteceu na minha vida.

P: E como você percebe seu corpo após a cirurgia?

S: Ah, bem melhor, né. (risos)

P: Bem melhor.

S: O problema é que fica a sobra, sobraiada pra todo lado, né.

P: O problema é que sobra.

S: Tem que caminhar bastante, né. Pra, não ficar, as pelancas cair.

P: Ah tá. É por isso que você quer caminhar?

S: É. (risos)

P: Ok.

S: Pra fazer a cirurgia é difícil, né. Para tirar as sobras.

P: Ok. E como você se sente hoje?

S: Eu me sinto bem feliz, né. Mais do que antes. Porque era uma dificuldade muito

grande para emagrecer, só com cirurgia mesmo, né.

P: Muito Obrigada pela entrevista.

S: Nada.