A pesquisa etnográfica com homens na fronteira entre o carcere e a rua - Milton Julio

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    Milton Jlio de Carvalho Filho1

    RESUMO: Este artigo descreve o processo de pesquisa etnogrfica sobre homens queviveram a experincia do encarceramento penal no Brasil. Parte da premissa de que oencarceramento deflagra valores, traumas, comportamentos e atitudes presentes na retomada

    da vida desses sujeitos quando das suas sadas das prises, o que exigiu um processo depesquisa que considerou como necessria uma convivncia longa com esse outro. Foiutilizado o referencial terico de Michel Foucault e de Irving Goffman para analisar osaspectos do regime carcerrio e as conseqncias desse passado de priso na reconstruoidentitria dos sujeitos ao sarem dela. Esse passado presente foi analisado a partir dodilogo com Michael Pollak para classificar as narrativas em critrios da memria individual egrupal, analisando suas resignificaes.PALAVRAS CHAVES::::: etnografia, identidade,,,,, memria, mtodo, pesquisa, prises.

    ABSTRACT: This ethnographic study describes the processes of recovering freedom by men

    who have lived the experience of criminal imprisonment in Brazil. It starts from the premisethat imprisonment sets off values, traumas, behaviors and attitudes that are present whenthese subjects resume their lives after being released from prison. To find out whether ornot and to which extent imprisonment has been fixed on these subjects demanded a processof work, whose basic premise was a long life experience with this other. The basis was thenarratives of men, former prisoners who were interviewed and followed. Michel Foucault andIrving Goffmans theoretical references were used to analyze the aspects of the imprisonmentregime present in the ones that were subject to imprisonment and to analyze the consequencesof this past of prison in the reconstruction of the identity of these subjects when they leave

    it. This past that is present in their lives was analyzed, classified according to criteria ofindividual and group memory, analyzing their resignifications based on Michael Pollak.KEYWORDS::::: ethnography, identity, memory, method, prisons, search.

    A pesquisa etnogrfica com homens na fronteira entre oA pesquisa etnogrfica com homens na fronteira entre oA pesquisa etnogrfica com homens na fronteira entre oA pesquisa etnogrfica com homens na fronteira entre oA pesquisa etnogrfica com homens na fronteira entre ocrcere e a rua.crcere e a rua.crcere e a rua.crcere e a rua.crcere e a rua.

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    MILTONJLIODECARVALHOFILHO

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    INTRODUO

    O objetivo geral desse artigo apresentar o processo metodolgico de

    uma pesquisa etnogrfica, intitulada Do Crcere Rua, sobre possibilidadesemancipatrias dos homens que saram das prises, aps cumprimento da penajudicial. O processo de pesquisa foi realizado entre 2002 e 2006, inicialmente emSo Paulo, a capital brasileira com maior quantidade de homens presos. Em SoPaulo a pesquisa foi desenvolvida no Programa de Estudos Ps-Graduados emCincias Sociais da Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo, para obtenode ttulo de doutor em antropologia. Posteriormente, entre 2006 e 2010 ainvestigao foi ampliada, na Universidade Federal da Bahia, para avaliar a mesma

    realidade em Salvador, Bahia, a terceira capital do pas e a maior do Nordeste,visando comparar com os resultados obtidos no Sudeste.Especificamente, esse o artigo objetiva discutir o trabalho de campo na

    pesquisa antropolgica, os desafios do pesquisador frente s singularidades deuma pesquisa na rea de antropologia urbana com sujeitos presos ou oriundos dosistema prisional brasileiro. Visa agregar reflexes sobre o processo metodolgicoda pesquisa antropolgica para novos e atuantes pesquisadores da violncia urbana,da criminalidade e das prises e seus sujeitos, quanto s especificidades dessetipo de processo de pesquisa. Justifica a inteno desse artigo a necessidade de

    maior dilogo entre pesquisadores sobre os seus processos de pesquisa, alm danecessidade de registrar e divulgar a memria desses processos, til as novasiniciativas de pesquisa na rea de antropologia e mais especificamente aquelesque tratam ou pretendem tratar de sujeitos presos ou egressos do sistemapenitencirio brasileiro.

    O recorte da pesquisa em termos de grupo de informantes foi o seguinte:homens2, acima dos dezoito anos de idade, julgados criminalmente no Estado deSo Paulo ou no Estado da Bahia por prticas entendidas como delituosas luz dodireito penal, em qualquer tipologia criminal, e em gozo de liberdade no momentoda realizao da pesquisa, dado o cumprimento parcial ou total das penas a queforam submetidos, encarcerados em penitencirias. Excluram-se deste estudo:presos em delegacias, presos em regime semi-aberto, homens acusados, mas aindano sentenciados, menores de idade e mulheres em quaisquer das situaesanteriormente mencionadas. Foram entrevistados setenta e dois ex-presos, sendo24 deles acompanhados regularmente durante todo o perodo da pesquisa. Visandoa um acompanhamento mais criterioso, foram consultados seus processos criminaisnas respectivas Varas de Execuo Penal, com o intuito de ter acesso aos laudos de

    sada emitidos por psiclogos e por assistentes sociais das instituies prisionais.

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    INFORMAES PRELIMINARES PARA O PROCESSO DE PESQUISA

    Atualmente, h uma difuso de informaes quanto s precrias condies

    do sistema penitencirio no Brasil. Os meios de comunicao de massa regularmenteinformam sobre as rebelies e as condies de vida no sistema penitencirio. Commenor divulgao, mas com maior sofisticao interpretativa, as produescientficas sobre a priso tambm tm contribudo para uma melhor reflexo sobreo sistema prisional. Outro vis de informao sobre priso explodiu nos anosnoventa: a surpreendente produo editorial de livros autobiogrficos, que relatamas experincias de homens que estiveram presos. Ainda so fontes de informaosobre a priso e seus sujeitos, os livros escritos por ex-diretores de penitencirias,

    ou por ex-voluntrios que atuaram no sistema e a produo cinematogrfica brasileirasobre o crcere: documentrios como Carandiru.doc e Prisioneiros da Gradede Ferro, ou o longa-metragem Carandiru.

    Atravs desses meios, o Brasil tem conhecido mais sobre as suas prpriasprises. Ainda assim, sabe-se de uma parte substancialmente pequena da realidadedo sistema penitencirio. Considerando-se que os problemas das prises brasileirasso relativamente conhecidos da sociedade, resta ento perguntar: o que faltasaber?

    preciso saber em que condies os sujeitos que viveram a privao da

    liberdade penal, voltam s ruas e ao convvio social, agora como produtos dessesistema prisional complexo e ineficiente. O que esperar desses homens que saemdas prises brasileiras todos os dias?

    A DEFINIO DO PROBLEMA DA PESQUISA

    Foi definida a problemtica de pesquisa partindo da seguinte indagao:quando o ex-preso deixar de ser ex-preso? Essa questo nasceu a partir dasconsideraes de FOUCAULT (1989) segundo as quais o fracasso do sistemapenitencirio na reduo da criminalidade foi substitudo pelo sucesso da produoda delinqncia e da idia de identidade como metamorfose desenvolvida porCIAMPA (1996). Para FOUCAULT (1989 e 1990), a margem pela qual a prisoexcede a deteno preenchida, de fato, por tcnicas do tipo disciplinar.

    Mas isso implica em que o aparelho penitencirio, com todo o programatecnolgico de que acompanhado, efetue na curiosa substituio: das mosda justia ele recebe um condenado; mas aquilo sobre que ele deve seraplicado, no a infrao, claro, nem mesmo exatamente o infrator, mas oobjeto um pouco diferente, e definido por variveis que pelo menos no iniciono foram levadas em conta na sentena, pois s eram pertinentes para umatecnologia corretiva. Esse outro personagem que o aparelho penitencirio

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    coloca no lugar do infrator condenado o delinqente. (FOUCAULT, 1989,p.223)

    A assimilao pelos encarcerados de diversos aspectos do universosimblico e cultural do regime penitencirio foi inicialmente pressuposta eposteriormente constatada, tambm, a partir da considerao de que as tcnicasdisciplinares do isolamento, da vigilncia e do controle, alm do cdigo deconvivncia entre os presos, molda essa realidade prisional nos sujeitos. Essaplasticidade na assimilao dos cdigos prisionais pelos presos e,consequentemente, pelos ex-presos no pode ser explicada apenas pelamaleabilidade natural dos sujeitos, mas tambm em razo de um saber estruturadoe incorporado no sujeito pelo poder disciplinar. Temos que considerar que apermanncia desses sujeitos na priso depende fundamentalmente do grau detolerncia e do pertencimento quela sociedade. Portanto, a liberdade prisionalno se resume a abertura dos portes das prises a partir da expedio de alvarsde solturas pela justia, uma questo de maior complexidade.

    A CONSTRUO DOS PRESSUPOSTOS DA PESQUISA

    A pesquisa em foco part iu do pressuposto da complexidade do

    desencarceramento, como um processo que estabelece nos sujeitos ex-presoscomportamentos que oscilam entre conviver com as marcas deixadas pela experinciaprisional ou procurar super-las. Essa oscilao, por sua vez, cria uma fronteiraentre o que se foi e o que se pretende ser e acarreta vrias possibilidades quepodem se concretizar, a depender da fora exercida no sujeito por um lado ou poroutro dessa fronteira. O desencarceramento foi entendido como um processo,desenvolvido em etapas no propriamente previsveis, mas dependentes dasressignificaes, dos vnculos e das condies objetivas de vida que os sujeitosmantm aps o crcere, capazes de auxili-los ou na superao, ou no reforo, ou

    na fixao da experincia carcerria.A hiptese principal validada pela pesquisa que a vivncia da oscilao

    entre o passado e o presente, mediado pela experincia prisional, constitu oepisdio mais drstico por que passavam os sujeitos na sada da priso. Outrahiptese testada e positivada que h possibilidades de emancipao aps asuperao das seqelas do crcere, a partir da ressignificao da experincia vivida.Importante salientar que tais hipteses emergiram no apenas dos referenciaistericos, mas tambm da comunicao do pesquisador, por carta, com vrios presos,

    alguns em fase de sada do encarceramento, ocasio em que expunham seus planose seus projetos.As cartas usadas como recurso metodolgico inicial, permitiram perceber

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    que esses homens projetavam futuros fora da vida no crime, mas expunham seusreceios, manifestavam certa descrena em aes que os levassem emancipaoda condio de criminoso, prevendo o estigma sobre a sua futura condio de ex-

    presidirio. Os planos e os projetos emancipatrios so dependentes diretos dacapacidade de reconstrurem vnculos e de se readaptarem ao meio social externo priso.

    O desencarceramento, como processo que estabelece uma zona de fronteiraentre o crcere e o mundo externo priso, pode tambm culminar em possibilidadesemancipatrias. Portanto, um processo de reconstruo identitria que surge dadialtica entre o indivduo e a sociedade um processo contnuo de interiorizao eexteriorizao que caracteriza o indivduo com o seu entorno (SALEM, 1981, p.

    54); uma construo, tanto um fenmeno objetivo, como subjetivo,(...), umprocesso psicolgico e social ( MUNN, 1998, p. 91). Na zona de fronteira, entrea sada da priso e a total adaptao ao meio social externo, o ex-presidirio viveum processo de negociao identitria (...) um processo comunicativo complexo,irredutvel a uma rotulagem autoritria das identidades predefinidas com basenas trajetrias individuais. Implica em fazer da qualidade das relaes com ooutro, um critrio e um elemento importante da dinmica das identidades. (DUBAR,2005, p. 141) Eram esses sujeitos, vivendo um processo de identitrio em francametamorfose, na fronteira entre o crcere e a rua que interessava acessar.

    PESQUISAR SUJEITOS NA FRONTEIRA

    O primeiro exerccio do pesquisador nesse tipo de pesquisa conseguirobter os relatos sem estigmatizar os sujeitos por sua condio de ex-presidirio.Entretanto, preciso partir dessa condio para compreender suas vidas aps ocrcere. Outro exerccio o de buscar compreender o que, no sujeito, conseqnciado encarceramento. Nesse sentido, de grande valia a compreenso do crcere edas anlises sobre a memria individual a partir de um norte terico e metodolgico,nesse caso respectivamente FOUCAULT (1989) e POLLAK (1992). O conhecimentoanterior, exploratrio, do pesquisador com a questo pesquisada valioso, e muitasvezes obtido pela leitura prvia de relatos de experincia carcerria, obtidos apartir de livros autobiogrficos de homens que viveram tal experincia. Nessapesquisa, caso o pesquisador no conhecesse profundamente os aspectos queperpassam o universo carcerrio, dificilmente o reconheceria to prontamente nossujeitos. Ainda assim, inicialmente, h um certo temor do campo. Mas que campo temido? No necessariamente temido o encontro com homens temidos pelo

    senso comum. Os temores podem advir da constatao de que as relaes sociaisprprias do exerccio do viver se do no espao determinado pela cultura, localsimblico onde nasce e se estabelece a diversidade humana. Dessa forma, a relao

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    com o outro se estabelece com e na diversidade, o que faz assumir, em muitosaspectos, um sentido ameaador pelo que pode representar. A citao seguinteressalta a questo relativa a tenso moral no encontro entre pesquisador e o outro

    da pesquisa:

    Reconhecer a tenso moral e a ambigidade tica implcitas no encontroantroplogo/informante, e ainda assim ser capaz de dissip-la atravs dasprprias aes e atitudes, o que tal encontro exige de ambas as partes paraser autntico e efetivamente ocorrer. (GEERTZ, 2001, p.43)

    A concordncia com GEERTZ (2001) tambm se d quando o autor dizque mesmo a antropologia uma atividade acadmica inquietante e inquietadora.

    A inquietao, prpria da atividade antropolgica, coerente com o entendimentode que o comportamento de um grupo na sociedade, ou de sujeitos dentro de umgrupo, so apreendidos e dependentes da tica de quem os observa, portanto no contnuo e freqente, como quer a estatstica, porque incorpora a subjetividade.A tenso na pesquisa antropolgica, entretanto, tambm impe um dilema, vividono campo de pesquisa pelo pesquisador. O que se busca? A busca de leis? A buscade macro teorias a partir do observado? Ainda que este seja um debate dentro daantropologia ou fora dela, serve de ponto de partida a aceitar a concluso de

    GEERTZ (2001) de que a finalidade da pesquisa antropolgica alongar acomunicao e diante de tal princpio o que se viu ou sentiu no campo de pesquisatorna-se fundamental.

    ENGAJAMENTO VERSUS IMPLICAO

    Outro aspecto da pesquisa antropolgica se impe nos estudos com gruposde presos ou de ex-presidirios: a diferena entre engajamento e implicao com acausa pesquisada. Em certo momento, durante um churrasco em um conjunto

    habitacional, do qual participavam tanto os ex-traficantes da rea, ex-encarcerados,como tambm os novos e jovens traficantes, at ento nunca presos, o pesquisadorse deu conta de um grande cansao proveniente do exerccio de se manter ali comopesquisador, sem, contudo, se transformar num estranho. A fragilidade dos limitesrelacionais pode ser pontuada, inclusive, pelos sujeitos implicados na causapesquisada, o que ilustra o exemplo a seguir: aps conhecer as bocas de venda dedrogas, as armas usadas, o pessoal envolvido direta e indiretamente com o trfico,o pesquisador se deixou fotografar no grupo, o que gerou em um dos entrevistadoscerta estranheza diante do procedimento, denominado por ele de um mergulho decabea, numa aluso aos riscos e as conseqncias. Essa pontuao serve comoindicativo para mostrar que pesquisador e pesquisado esto na difcil tarefa de

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    medir os limites em que transitam durante o processo de pesquisa etnogrfica, oque os diferencia entre engajados e implicados na questo.

    Na pesquisa etnogrfica, a aproximao dos sujeitos pesquisados uma

    tarefa complexa e ao mesmo tempo instigante. A dificuldade reside menos noacesso aos sujeitos do que na permisso dada ao pesquisador para o alcance sobrea totalidade da sua realidade. O tempo de campo torna-se ento um aspectofundamental para se observar o ciclo e os costumes do grupo, tendo em vista umaconstruo de experincia nica, capaz de ser comunicada a outros.

    preciso, tambm, demarcar o espao da pesquisa, quando se tem acessoa determinadas informaes, algumas que fogem diretamente ao escopo do trabalho,mas que so acessadas a partir das relaes mantidas no campo e que podem

    implicar em risco para o informante e para o informado, esse ltimo o pesquisador.Durante a pesquisa Do Crcere a Rua h um evento ilustrativo dessa questo: opesquisador em entrevista a um ex-encarcerado j atuante no mercado de trabalhoformal e sem prtica no crime desde a sua sada, na casa da sua sogra, observa queessa terminava a costura de coletes semelhantes aos usados por seguranas privados,enquanto trs homens aguardavam para lev-los e escolhiam o timbre institucionala ser impresso, possivelmente para um assalto. Fatos como esses permiteminferncias, como no caso, de que alguns ex-encarcerados mantm vnculos muitoprximos com o crime, mesmo quando no mais o praticam. Entretanto, so acessos

    s possveis com o tempo de campo e com a aproximao confivel, com os sujeitospesquisados.

    GEERTZ (2001) discute a funo do engajamento do pesquisador e defendeque o mesmo pode garantir a legitimidade moral dos dados obtidos e impor certarespeitabilidade pesquisa. A aproximao com os sujeitos entrevistados rompe atenso inicial existente entre estranhos, da mesma forma que se d entre osdesconhecidos: fotgrafo e fotografado. Essa metfora da fotografia pode serencontrada no trabalho do Pierre Verger ao fotografar o terreiro da Casa Branca,em Salvador, na Bahia, no como um estranho, mas como um integrante do terreiro.A partir do momento que j era considerado da casa, o clicda sua mquina j nopromovia poses, mas captava uma parte do que se considerava real. Para muitos,ele sequer estava fotografando. Esse tipo de vnculo deve ser perseguido comoideal metodolgico da pesquisa com presos e ex-presos.

    Os vnculos entre pesquisador e pesquisados tambm se fortalecem pelademonstrao prvia e sumria para o pesquisado do significado da pesquisa parao pesquisador, do ponto de vista poltico e ideolgico, o que promove uma percepode engajamento poltico com a causa, diferente de uma mera curiosidade. Na

    pesquisa Do Crcere a Rua o esclarecimento do engajamento poltico e ideolgicodo pesquisador com a questo pesquisada, a emancipao de homens que viverama experincia carcerria, permitiu o estabelecimento de um nvel de confiana com

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    os sujeitos capaz de ampliar qualitativa e quantitativamente a rede de contatospara a pesquisa: ex-presos atuantes em crimes de alta monta, ex-presos do PCC3,ainda atuantes no crime por conta da filiao ao partido, os ex-presos condenados

    por estupro e outras tipologias criminais.Outro aspecto importante para pesquisas dessa natureza diz respeito a

    existncia de uma pessoa auxiliar para inserir e referenciar o pesquisador no campo.Nessa pesquisa o elo entre os sujeitos e o pesquisador estabeleceu-se com apresena do Carlos, 48 anos, recm-sado da priso, onde passou doze anos emregime fechado, com grande experincia no sistema prisional. Esse auxiliar depesquisa deve ter como funo primordial a primeira interlocuo sobre os relatosobtidos. Essa interlocuo substancial para a interpretao posterior das

    informaes, alm do dirio de campo. O interlocutor assistente, implicado naquesto, auxiliava nas dvidas quanto as aparentes contradies dos relatos, oumesmo para melhor caracterizar as condies de vida nas prises, mencionadaspelos entrevistados, durante o trabalho de campo.

    O CAMPO DA PESQUISA

    Mas o que significa mesmo ir a campo? De imediato, talvez se pense noconceito fsico de campo, portanto ir a algum lugar fsico, concreto. Todavia, o

    entendimento de campo excede o conceito fsico, bem maior que ele. Ir a campona pesquisa etnogrfica significa estruturar uma relao eficiente com odesconhecido a ponto de perceber suas ambigidades. Entretanto no reside apenasa a singularidade do campo etnogrfico, mas tambm o envolvimento dopesquisador com a temtica pesquisada, condio bsica para que se estabeleauma relao entre pesquisador e pesquisado, como j foi mencionado. essarelao, embasada no compromisso tico e poltico, que faz o pesquisador ir almda narrao de uma histria, levando-o a estruturar um quadro referencial quepermita concluses e conhecimento geral sobre o tema pesquisado. D relevnciaao relacional, importa para esclarecer como o pesquisador posicionou-se em frenteao contexto e diante do processo de produo da pesquisa para que se possaentender como as pessoas pesquisadas foram olhadas, j que pesquisador epesquisado fazem parte do mesmo mundo social. Para isso utilizada a tcnica dodirio de campo.

    Com o tema da pesquisa, o referencial terico e metodolgico pr-determinados, resta ao pesquisador dirigir seus esforos no estabelecimento darede de contatos para acessar grupos no facilmente encontrados em determinados

    espaos da cidade ou identificados a partir de um comportamento nico. Uma dassadas pode ser o estabelecimento de algum nvel, controlvel, de implicao indiretacom a causa. Na pesquisa Do Crcere a Rua o pesquisador intensificou sua rede

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    de contatos quando ingressou como voluntrio na Pastoral Carcerria de So Paulo,colocando-se a disposio da instituio para estruturar ali um servio deatendimento a ex-presos do sistema penitencirio, at ento inexistente na Pastoral

    paulista. Algum me disse que a tem um rapaz que atende quem sai da priso. que vou sair e preciso arrumar um trabalho. Como eu posso falar com ele?Escreveum preso para a Pastoral Carcerria. Soubera do atendimento a ex-presos da PastoralCarcerria atravs de outro que j tinha sido atendido na Pastoral. A informaochega muito rpido priso. Nos atendimentos as solicitaes eram diversas, masa necessidade de escuta atenta era a maior delas.

    A ESCUTA DE SUJEITOS ACOSTUMADOS AO SILNCIO

    Importa ao pesquisador refletir sobre que tipo de escuta o entrevistadorequer: nesse caso, a escuta selvagem, sem apuro tcnico ou psicolgico, dissociadada escuta da clnica psicolgica. De modo geral, os ex-presos tm averso apsiclogos, justificando que foram por eles avaliados nos laudos psicolgicosprisionais e muitas vezes tiveram benefcios negados em funo de avaliaesnegativas desses laudos, criticados quanto ao contedo e forma como se aplicam.

    O tipo de escuta requerida pelos sujeitos repercute a experincia vivida,em muitos casos. Para os ex-presos relevante ser escutado de forma no

    explicitamente avaliativa aps um aprisionamento que teve como uma das suascaractersticas a negao da fala dos sujeitos, causada pela desconfiana, pelaincredibilidade e pela subjugao. Nesses casos as narrativas devem ser livres,quase monlogos, sem interrupes do fluxo da fala por parte do pesquisador,deixando as suas dvidas para serem sanadas no final. Esse tambm o entendimentode THOMPSON (1992) para quem se voc interrompe uma histria, estarinterrompendo no apenas essa, mas toda uma srie de ofertas posteriores deinformaes.

    Um aspecto relevante na pesquisa como o sujeito pesquisado avalia oprocesso de pesquisa. O sujeito se coloca no processo a medida da sua compreensodeste e essa compreenso varivel dependente do capital intelectual dos sujeitos.Entre os ex-presos a sntese compreensiva mais recorrente era de que elesparticipavam da escrita de um livro. Esse entendimento causa e causado, tambm,pelo desejo de muitos de contarem suas histrias de vida de forma literria, quandotm a chance de ressignificar a prpria vida, atribuindo a ela valor, interesse esingularidade. Os mais jovens, ligados falsa idia de que podiam ter umapossibilidade emancipatria, tangenciada pelo reconhecimento da sua experincia

    na priso o heri bandido, se iludiam com a possibilidade de que a pesquisafosse divulgada na televiso eu em jornais, demonstrando assim certa necessidadede visibilidade, de espetacularizao das suas experincias na priso. Entretanto,

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    a notoriedade a partir da experincia do crcere no comum a todos.O desejo por notoriedade e por reconhecimento social por parte dos

    sujeitos estudados cria um problema metodolgico: a produo de um discurso,

    em que o autor assume a posio de heri, perigoso, viril ou de vtima. Emconseqncia, as narrativas podem se tornar inverossmeis, o que o pesquisadorpode identificar pela falta de encadeamento lgico dos eventos narrados outrabalhando com mais de uma fonte de informao. O Robson conta: fui presoporque matava ds os dezesseis anos. Matei um, alis matei quatro, agora merecuperei e vou te contar como Nos seus processos na justia no h nenhumameno a homicdios e sim a roubos praticados em saidinhas de banco, umamodalidade considerada banal entre os presos. Aos poucos, a depender do

    estreitamento qualitativo da relao pesquisador e pesquisado, essas narrativastendem a ser corrigidas naturalmente. Aps algum tempo de convvio Robson diz:graas a Deus nunca sujei as minhas mos de sangue referindo-se ao fato de noter matado ningum em sua vida. Ao perceber que as narrativas se tornam irregulares,cabe ao pesquisador retomar, reestruturar as narrativas a partir da contradioverificada, como se de fato o desentendimento fosse seu. Os estudos da memriaindicam que:

    O que mais nos deve interessar, numa entrevista so as partes mais slidas

    e as menos slidas. Eu diria que no mais slido e no menos slido se encontrao que mais fcil de identificar como sendo verdadeiro, bem como aquiloque levanta problema de interpretao. (POLLAK, 1992, p.9)

    Os documentos obtidos no campo so tambm elementos de reforo dasentrevistas. O acesso a eles tambm funo da relao mantida entre pesquisadoe pesquisador. Alguns ex-presos mantm dirios de priso, cartas, fotos e outrosdocumentos, do tempo de encarceramento. As famlias tinham o mpeto de destruiresses documentos. Por conta disso, vrios ex-presos cederam os seus acervos de

    vida prisional ao pesquisador, por considerarem que estariam guardados eprincipalmente valorizados, longe da possibilidade de destruio por parte dassuas famlias. Essas doaes de acervos da vida prisional eram obtidas pelopesquisador quando das muitas visitas as famlias.

    O CONTEXTO E OS VNCULOS DOS SUJEITOS DE PESQUISA

    As visitas s casas e a observao dos sujeitos no seu ncleo familiar outro momento rico deste tipo de trabalho de pesquisa e favorece inmerosapontamentos nos dirios de campo. Esses apontamentos podem dizer respeito,tambm, a necessidade de rever conceitos, como por exemplo o de desestruturao

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    ou disfuno familiar. Nos momentos em que a relao se estabelece com mais deuma pessoa ao mesmo tempo, a capacidade de observao fundamental. Nascasas dos ex-presos e entre as suas famlias o pesquisador pode constatar a fora

    das mulheres, mes ou companheiras, no sutil controle do comportamento dossujeitos sados da priso. Esse controle foi observado desde os primeiros contatostelefnicos quando os ex-presos nunca atendiam o telefone e nunca falavam semantes a ligao passar pelo crivo da esposa, da sogra ou da me.

    O pesquisador deve ficar atento aos grupos que controlam ou contm asnarrativas dos entrevistados e como o fazem, principalmente nas entrevistas emncleos familiares. Na pesquisa com ex-presos durante as visitas, as mulheres,como grupo de controle da narrativa, assumiam no primeiro momento uma posio

    de coadjuvantes, serviam caladas, atentas conversa, mas disciplinadas no silncio,no davam opinies sem que fossem solicitadas pelo marido, entretanto no saiamdo ambiente. Quando a pergunta era dirigida a elas, muitas vezes respondiam comeu no sei no, senhor, pergunte a ele. Isso era recorrente entre as esposas epouco entre as mes ou tias que participavam mais efetivamente das conversas eat contradiziam os sujeitos em alguns aspectos, principalmente os mais jovens.As esposas, assim como os demais familiares, passavam a participar mais quandoa conversa chegava ao crcere, priso. Nesse momento passavam a valorizar osofrimento que tiveram por eles e nesse momento eles ouviam mais calados at

    retomarem os relatos das suas prprias experincias. a famlia vitimada pelocrcere que cobra essa vitimizao ao sujeito.

    Esses homens saem das prises devedores da solidariedade de suas mese companheiras. Essa dvida, em muitos casos, era fator preponderante naspossibilidades emancipatrias dos sujeitos. Pagar a dvida significava no voltar aerrar. Em outros casos, a dvida se transformava em cobranas e as mulherespassavam a ser vistas como algozes e perigosas diante do que eles consideravamque teriam aprendido com a experincia prisional indireta. A ida s casas dasfamlias tambm permitia a observao sobre a insero dos sujeitos nos seuslocais de moradia.

    SEGREDOS, ESTIGMA E VALIDAES

    A chegada do pesquisador no meio social de vida dos entrevistados delicada. Deve-se partir da considerao que nesses locais j esto estabelecidosdiversos tipos de vnculos e na falta de informao sobre estes, o pesquisadordeve partir da discrio. O pesquisador tambm um agente da manuteno dos

    segredos do entrevistado no seu meio. Em muitos casos o pesquisador era advertidoanteriormente pelo ex-preso a ser visitado de que fosse discreto e, se abordadopela vizinhana, que nada dissesse sobre sua situao. No entanto, em alguns

    A pesquisa etnogrfica com homens na fronteira entre o crcere e a rua.

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    casos, a prpria vizinhana, quando perguntada sobre uma referncia de endereo,j respondia, na casa de.... que saiu da cadeia? O segredo vazado aparecia comoum aspecto a ser analisado, assim como as estigmatizaes sofridas no seu meio

    social mais prximo. Tanto o segredo descoberto quanto estigmatizao levavammuitos a certo recolhimento.

    Aps as entrevistas e os acompanhamentos individuais o pesquisadorpode ter a necessidade de validao de alguns dados ou mesmo de ampliar asfontes de pesquisas. Nesse sentido a pesquisa Do Crcere a Rua usou tambmcomo fontes os processos criminais de cada entrevistado, obtidos nas Varas deExecuo Penal. As narrativas foram cruzadas com dados do processo, visandocorrigir distores, considerando que:

    (...) o problema da subjetividade e das fontes (...) at as mais subjetivas dasfontes, tais como uma histria de vida individual, podem sofrer uma crtica,por cruzamentos de informaes obtidas a partir de fontes diferentes.(POLLAK, 1992, p. 9).

    O que interessava nos processos era comparar alguns dados obtidos nasentrevistas e adicionar outros como os laudos de avaliao social e psicolgicoque embasaram a sada. Nesse sentido mais um auxiliar de pesquisa, Francisco,

    tambm recm-sado do sistema penitencirio e estudante de Direito, levantou eclassificou os processos por tempo de recluso. As fontes documentais precisamser reconhecidas antes do uso e identificadas as partes a serem utilizadas. Ocruzamento entre entrevistas e os processos, indicou um aspecto recorrente: asdescries sobre os crimes praticados eram muito semelhantes ao relatado nasentrevistas, com exceo quando o crime praticado acarretava a morte de algum.A morte de terceiros no era mencionada nas entrevistas. Uma questo relevantedo ponto de vista do estudo da memria a memria silenciada, o no dito. Outroaspecto silenciado era o sofrimento de algum suplcio fsico. Um dos aspectos do

    regime disciplinar das prises brasileiras est no s diretamente articulado aoato de punir a mente, como tambm de atribuir arbitrariamente ao corpo umapunio atravs das torturas4. Ao longo dos relatos observei que esse aspecto noera mencionado. Para muitos, a submisso parecia ser pior do que o suplciofsico. Essa submisso era retratada com o fato de terem que tratar com respeito ospoliciais e os agentes penitencirios, ao terem que olhar para baixo diante defuncionrios e at de outros presos mais poderosos, ao no poderem tomar decisese expressar opinies.

    Aps o acompanhamento sistemtico desses homens por dois perodos, oprimeiro de trs anos, entre 2002 e 2005 em So Paulo e mais dois anos, entre2007 a 2009, em Salvador, foram necessrios dois relativos perodos de afastamento

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    para o tratamento e para a anlise das informaes obtidas, um deles durante oano de 2006 para tratar dos dados de So Paulo e outro no ano de 2010 para tratarda realidade baiana e da comparao com a paulista. Esse afastamento, entretanto,

    no se caracterizava como ruptura com o campo, mas um distanciamento necessrioao trabalho de anlise.

    DEPOIS DA COLETA, A ANLISE.

    No texto Uma nova luz sobre a antropologia, GEERTZ (2001) discutedois momentos do trabalho de pesquisa: o momento do campo propriamente ditoe o momento do retorno do campo de pesquisa. Para a pesquisa antropolgica o

    mtodo, os instrumentos que organizam o campo, assim como o tempo vivido nocampo singularizam a pesquisa. Portanto, no modo como o pesquisador trabalhaque reside a especificidade antropolgica. Aps o campo, a solido do pesquisadorsitua-se sobre a interpretao do que ele viu, sentiu, observou, enfim sobre o quetraz do campo como realidade. A angstia reside no fato de que a realidade vista,talvez j no seja a mesma, ou o que foi visto pode ser apenas aquilo que foipermitido ver.

    Aps o campo, todo material recolhido deve ser analisado, classificado,categorizado, e interpretado. Entretanto, ainda no campo, o pesquisador precisa

    saber como motivar o incio das narrativas sob pena de atribuir um tom as mesmasque dificilmente conseguir superar no momento da anlise. Os sujeitos iniciavamas narrativas a partir da fala sobre necessidades imediatas aps a sada da priso.O pesquisador percebeu a tempo o quanto seria improdutivo indagar sobre a sadada priso, inicialmente, sob pena de ter uma regularidade de relatos sobrenecessidades bsicas como: emprego, vale-transporte, cesta bsica, retirada dedocumentos, entre outras variveis importantes para o estudo, mas que noesgotavam seu objetivo. Os relatos mais densos sobre a vida do sujeito e sobre asignificao da priso no seu trajeto de vida aps a sada, nasciam da frase: o queaconteceu com a sua vida? Era durante esses relatos em que historiavam umatrajetria, que o pesquisador inclua o roteiro das entrevistas, previamenteelaborado, sobre aspectos relacionados sada da priso, o que enriqueceu oprocesso de anlise posterior.

    Para analisar via os recursos metodolgicos dos estudos da memria necessrio analisar os estilos das narrativas. Nessa pesquisa ou eram factuais, oucronolgicos, ou seja, ou se prendiam a fatos da vida na priso e depois dela, ounuma cronologia, apresentavam sua trajetria desde a priso at ali, o momento da

    narrativa. Poucas vezes os sujeitos narravam suas vidas de maneira temtica, sendoessa classificao feita posteriormente pelo pesquisador. Esses estilos narrativospodem ser considerados em relao com as caractersticas de escolarizao dos

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    narradores. Todo relato mistura trs estilos (...) o predomnio do estilo cronolgicoestava correlacionado com (...) um grau mnimo de escolarizao (...) o temticocorrespondia a um elevadssimo grau de escolarizao (...) o factual (...)

    correspondia a um grau educacional baixssimo. (...) (POLLAK, 1992, p.13).Deve-se considerar, tambm, ao se trabalhar com a memria como recurso

    metodolgico que (...) contar a prpria vida nada tem de natural, se voc estivernuma situao de justificao ou de construo de voc prprio. (...) (POLLAK,1992, p.13). Os ex-presos apresentavam modos de narrar que os singularizavam apartir da maneira como rompiam a aparente simplicidade entre tempo e espao,nas suas memrias. Isso permitiu que o pesquisador os agregasse em grupos, combases em suas vozes: o primeiro caracterizado pela interioridade das narrativas, o

    segundo, marcado por uma linguagem mais referencial, pontuada pelo discursodireto e o terceiro pela juno das duas vozes citadas. Assim tinha-se a vozcaracterizada pela nsia subjetiva da confisso, do depoimento. Outra voz eraembasada em um esforo de objetividade e imparcialidade, ou da fuso das duasanteriores. A segunda era a mais comum e tinha como af a necessidade de serouvido como um sobrevivente, uma testemunha viva do horror vivido na priso.Negociavam as suas narrativas, como sobreviventes e no como bandidos oudelinqentes. A vida se dividia entre o antes e o depois da priso que permaneciano sujeito como marca, independente da data real em que a vivncia se deu.

    Alm dos acontecimentos e dos personagens, POLLAK (1992) cita os lugarescomo o terceiro elemento constitutivo para a anlise amparada nos estudos damemria. Nesse sentido, a priso assume carter preponderante na constituioda memria dos sujeitos entrevistados. a priso, como lugar fsico e simblicoque ocupa espao importante e comum na memria desses sujeitos, criando, apartir dessa referncia, um sentimento de pertencimento a um grupo, por pior queseja a considerao que se faa dele. Os acontecimentos, os personagens e oslugares so narrados a partir de memrias fundadas em fatos concretos, e daprojeo de outros eventos e personagens que tangenciaram a vida dos sujeitos.

    importante, tambm, para a anlise das narrativas, observar o uso depronomes pessoais usados para falar de si: (...) possvel falar de si em termosde eu, em termos de tu ou de voc, em termos de ele ou de ela. Pode-setambm falar de si usando termos coletivos, tais como o ns, vocs, eles,mas, o mais importante nesse caso se impessoal ou a gente. (POLLAK, 1992,p.14) Os entrevistados oscilavam no uso, ora do eu ora do eles. O eu erausado sempre quando se referiam as suas anlises e sentimentos, j o eles quandose referiam ao espao prisional, aos presos, aos agentes etc. O uso do ele acusava

    certa necessidade de estabelecer um distanciamento. A priso era o espao dooutro, o de l, assim era comum ouvir: o preso complicado; eles so terrveis,para falar de um grupo do qual ele prprio fazia parte; os caras ficam amontoados;

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    l um inferno, falas que constituam a priso como o espao distante, emborasimbolicamente presente. Os relatos expressos na primeira pessoa do singular,indicam segurana do eu e da identidade com a experincia do domnio da realidade,

    mas tambm podem expressar um destino incontrolvel: falas como sou um carasangue frio; no porque sou bandido que tenho que ser tratado daquele jeito,agora sou evanglico, sou trabalhador, so alguns exemplos. O predomnio dedeterminados pronomes pessoais no conjunto de um relato de vida representa umamedida ou um indicador do grau de segurana interna da pessoa. (POLLAK, 1992,p.15) Os ex-presos, ao retornarem aos seus vnculos fora da priso, ressaltam oeu ou o agente quando consideram a famlia no seu processo de emancipao,embora relatem a priso e os companheiros de l como eles.

    CONSIDERAES FINAIS

    O campo de pesquisa com homens recm sados da priso revelou oentendimento de que os ex-presos do sistema penitencirio podem ser entendidoscomo um grupo unicomportamental, com um tipo especifico de diversidade. Tambmrevelou que tal diversidade estruturava-se na compreenso do ethos do grupopesquisado, o que conferia ao grupo a sua singularidade e o entendimento sobre asua dimenso simblica e objetiva. Essa compreenso dada pelo campo caracterizou

    a natureza do grupo investigado, distinguindo-o de outros a partir de umasingularizao psicossocial, poltico-histrica da formao do grupo, a partir daconsiderao do aprisionamento penal.

    Importante salientar que um fator primordial na anlise das possibilidadesemancipatrias desses sujeitos diz respeito forma como esses homens se percebeme percebem as heranas que trazem do crcere. Alguns, mesmo aps o crcere,estabelecem seus vnculos a partir dele, reforando o que trazem de singular daexperincia carcerria: o chamar um ao outro de ladro, por exemplo, como formade tratamento comum, o uso das grias do crcere e de alguns princpios do cdigode tica carcerrio. Vivem na fronteira da coexistncia entre dois papis, o depreso e de homem livre, mas com sua liberdade mediada pelas heranas dos hbitos,dos costumes e dos traumas da experincia prisional ou pelo aspecto negativo eestigmatizante que tal experincia representa para a sociedade em geral. Assumir,a priori, a complexidade da condio dos sujeitos pesquisados fundamental paragarantir ateno a todas as etapas do processo de pesquisa, evitando grandes eincontrolveis surpresas, ainda que o campo da pesquisa etnogrfica seja sempresurpreendente.

    Ainda do ponto de vista metodolgico, as anlises das narrativas permitiramperceber que esses sujeitos narravam as suas vidas partindo da sada da priso,porm falando de toda sua trajetria imbricada com o crcere. Em muitos momentos

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    falavam como se tivesses falando com eles mesmos, refletiam no momento em quenarravam, criando um processo dinmico de interpretao sobre a prpria vida,tangenciada pela priso. Ao narrarem se transformavam em autores das suas prprias

    histrias e por isso suas narrativas se mostravam recheadas das suas prpriascompreenses sobre a experincia vivida. O mais importante em dar voz a essessujeitos nesse estudo foi o fato de se ater s suas reflexes sobre o processo desada da priso, portanto configurar a complexidade da questo. As narrativaspossibilitavam conhecer a praxisdas suas vidas. Assim, tambm nas construesdas narrativas havia como um incio de libertao de muitas questes. Nesse sentidoreflito mais uma vez sobre o engajamento do pesquisador com os sujeitospesquisados e, portanto, com a questo estudada. O pesquisador, durante a audio

    das narrativas, era diretamente envolvido nesse processo de reconstruo detrajetrias, naquele momento estimulada pela pesquisa. Assim, essa pesquisaetnogrfica atendia a duas finalidades: atravs da escuta levantava informaesteis para a pesquisa e para o dilogo terico que essa se propunha realizar e aomesmo tempo cedia uma escuta livre, engajada politicamente com a questo e porisso capaz de auxiliar na promoo de uma forma de emancipao para essessujeitos, atravs do reordenamento das suas trajetrias. Auxiliar esses homensatravs da cesso da escuta a reordenarem suas trajetrias de vida, foi alm donecessrio ao processo de pesquisa. Aliou-se pesquisa uma ao poltica em

    prol da causa dos ex-presos e da sua emancipao.A coerncia estabelecida pelas trajetrias de vida a partir da ressignificao

    do crcere s era percebida quando as narrativas dos sujeitos entrevistados eramorganizadas em uma linha de tempo. Isso era feito durante a prpria entrevista,evitando furos e indeterminaes. Entretanto, os marcadores de tempo para ossujeitos nem sempre eram cronolgicos: a entrada e a sada da priso organizavama narrativa. A linha do tempo era, ento, utilizada para verificar as lacunas dasnarrativas, sem a inteno de linearizar as trajetrias.

    As dificuldades e os aprendizados do percurso dessa pesquisa deram-seprincipalmente por serem esses sujeitos homens que nesse momento de suas vidasviviam na fronteira da coexistncia entre dois papis, o de preso e de homem livre,mas com sua liberdade mediada pelas heranas dos hbitos, dos costumes e dostraumas da experincia prisional ou pelo aspecto negativo e estigmatizante que talexperincia representa para a sociedade em geral. So singularidades de pesquisascom grupos que transitam entre duas reas de sociabilidade, com grupos queviveram a institucionalizao total, com grupos que viveram traumas e queexpressam, a partir da memria, a ressignificao das suas experincias.

    As pesquisas sobre prises brasileiras realizadas nos anos setenta e oitentafixavam-se na instituio, com raras e positivas excees. Nos anos noventa algumaspesquisas j trazem elementos da sada da priso com base em anlises sobre

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    excluso social e preconceito. Ainda so necessrios outros estudos que tratemdos impactos do encarceramento na reconstruo das vidas dos sujeitos que saemdas prises.

    NOTAS

    1professor adjunto do instituto de humaniddades, artes e cincias da universidade federal dabahia.

    titulao do autor::::: doutor em cincias sociais (antropologia) pela pontifcia universidadecatlica de so paulo puc/sp endereo eletrnico::::: [email protected] [email protected]

    2A escolha de homens e no de mulheres deu-se por dois motivos, sendo o primeiro: oshomens compem a maioria do conjunto de presos do sistema penitencirio brasileiro epaulista, chegando a mais de noventa por cento dos presos em penitencirias. O segundomotivo que s mulheres presas, em sua maioria, so levadas ao crcere por motivos diferentesdaqueles que penalizam os homens: participaes indiretas nos delitos, quase sempreassociados execuo de seus companheiros, o que comprovado por uma frase emblemticaem quase todas nas prises femininas: o meu mal foi ter amado o homem errado. Sendoassim, a priso feminina articula-se com a criminalidade de uma forma diferente da impostapelo encarceramento masculino e isso supostamente gera efeitos diferenciados na sada.

    3PCC Primeiro Comando da Capital Faco existente nas prises paulistas.

    4Relatrio da Anistia Internacional, em cinco anos, acusa o Brasil de prticas de tortura nocrcere.

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