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- 1 - A Qualidade da Água dos Pequenos Regadios Individuais do Alentejo Oliveira, I 1 ; Varela, M 2 1 Centro Operativo e de. Tecnologias de Regadio. Quinta da Saúde, Apartado 354–7801- 904 Beja. [email protected] 2 Centro Operativo e de Tecnologias de Regadio. Quinta da Saúde, Apartado 354–7801- 904 Beja. [email protected] Resumo As disposições da Directiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 23 de Outubro para que se estabeleça um quadro comunitário de actuação no âmbito da política de águas, a necessidade de implementação do Código de Boas Práticas Agrícolas e o estabelecimento de programas de actuação nas zonas vulneráveis com o objectivo de prevenir ou reduzir o problema, incentiva a conveniência de que se disponha de uma Rede para o Controlo da Qualidade da Água. A qualidade da água de rega é um problema que afecta hoje em dia todos os países do mundo, com especial relevo os que se situam nas zonas áridas a semi-áridas. Numa zona regável que dispõe de um recurso hídrico de duvidosa qualidade é necessário avaliar a aptidão da água para a rega. Quando existem riscos de salinização dos solos é imprescindível analisar o problema, já que é possível regar com águas de certa salinidade em certas condições de uso da terra e de manejo da água. Para evitar um processo de salinização secundária dos solos, os sais aportadas pela água de rega têm que ser lavados, pelo menos da fracção da zona radicular mais activa do ponto de vista de absorção de humidade e nutrientes. Os sais transportadas pela água de percolação podem acumular-se em parte no subsolo e ser descarregadas através do sistema de drenagem natural ou artificial, quando o natural não é suficiente. Os sais transportados pela água de rega podem contribuir para a alimentação das plantas, e assim, diminuir as necessidades de fertilizantes a aplicar. O aparecimento de condições de salinidade está dependente, entre outros factores: da quantidade de sais solúveis presentes no solo e na água de rega, da composição química da água de rega, do tipo de cultura, das condições climáticas, das práticas culturais. A quantidade de sais solúveis no solo é normalmente superior à da água de rega, razão pela qual, e devido ao processo de transpiração das plantas e evaporação directa do solo, os sais tendem a acumular-se no perfil de solo explorado pelas raízes. Este fenómeno tem extrema acuidade nas zonas de clima mais árido, nas quais a evaporação e transpiração das plantas atingem valores bastante elevados, raramente acompanhados pela aplicação de água de boa ou razoável qualidade, em quantidade suficiente. Nestas condições, o controlo da qualidade da água de rega situa-se como um dos principais objectivos da gestão da rega, tendo em vista, por um lado, permitir manter a

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A Qualidade da Água dos Pequenos Regadios Individuais do Alentejo Oliveira, I1; Varela, M2 1Centro Operativo e de. Tecnologias de Regadio. Quinta da Saúde, Apartado 354–7801-904 Beja. [email protected] 2Centro Operativo e de Tecnologias de Regadio. Quinta da Saúde, Apartado 354–7801-904 Beja. [email protected]

Resumo As disposições da Directiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 23 de Outubro para que se estabeleça um quadro comunitário de actuação no âmbito da política de águas, a necessidade de implementação do Código de Boas Práticas Agrícolas e o estabelecimento de programas de actuação nas zonas vulneráveis com o objectivo de prevenir ou reduzir o problema, incentiva a conveniência de que se disponha de uma Rede para o Controlo da Qualidade da Água.

A qualidade da água de rega é um problema que afecta hoje em dia todos os países do mundo, com especial relevo os que se situam nas zonas áridas a semi-áridas.

Numa zona regável que dispõe de um recurso hídrico de duvidosa qualidade é necessário avaliar a aptidão da água para a rega.

Quando existem riscos de salinização dos solos é imprescindível analisar o problema, já que é possível regar com águas de certa salinidade em certas condições de uso da terra e de manejo da água.

Para evitar um processo de salinização secundária dos solos, os sais aportadas pela água de rega têm que ser lavados, pelo menos da fracção da zona radicular mais activa do ponto de vista de absorção de humidade e nutrientes.

Os sais transportadas pela água de percolação podem acumular-se em parte no subsolo e ser descarregadas através do sistema de drenagem natural ou artificial, quando o natural não é suficiente.

Os sais transportados pela água de rega podem contribuir para a alimentação das plantas, e assim, diminuir as necessidades de fertilizantes a aplicar.

O aparecimento de condições de salinidade está dependente, entre outros factores: da quantidade de sais solúveis presentes no solo e na água de rega, da composição química da água de rega, do tipo de cultura, das condições climáticas, das práticas culturais.

A quantidade de sais solúveis no solo é normalmente superior à da água de rega, razão pela qual, e devido ao processo de transpiração das plantas e evaporação directa do solo, os sais tendem a acumular-se no perfil de solo explorado pelas raízes.

Este fenómeno tem extrema acuidade nas zonas de clima mais árido, nas quais a evaporação e transpiração das plantas atingem valores bastante elevados, raramente acompanhados pela aplicação de água de boa ou razoável qualidade, em quantidade suficiente.

Nestas condições, o controlo da qualidade da água de rega situa-se como um dos principais objectivos da gestão da rega, tendo em vista, por um lado, permitir manter a

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água no solo a um potencial que favoreça o desenvolvimento cultural, e como tal, a obtenção de produções elevadas, por outro garantir que a qualidade da água de drenagem proveniente das áreas regadas se mantenha dentro dos limites previstos nas normas, e por outro ainda, em função dessa mesma qualidade, assegurar os meios e as medidas necessárias a garantir a filtração adequada e a protecção dos equipamentos de rega contra a corrosão.

No momento actual, a este nível, e com este objectivo, não foi realizado, com carácter sistemático, qualquer trabalho no Alentejo, já que todos os trabalhos vão sendo realizados ao nível das grandes bacias.

Com a finalidade de caracterizar a qualidade da água de rega, foi desenvolvido o presente trabalho, o qual, nesta primeira fase, e a partir da Inventariação dos Pequenos Regadios Individuais do Alentejo – PRIA - 1, e da identificação das fontes de água, se pretende apresentar os resultados da caracterização de uma centena de fontes de água individuais (barragens, charcas e furos) localizadas nos distritos de Beja e Évora.

Esta caracterização será feita recorrendo às classificações normalmente usadas, nomeadamente as da FAO e do USSSL dos Estados Unidos da América tendo em vista a optimização potencial das aplicações de fertilizantes, e os potenciais riscos de entupimentos e corrosão dos equipamentos de rega que permitam criar normas de dimensionamento e protecção dos mesmos.

O resultado deste projecto permitirá definir alterações nas estratégias de rega actualmente usadas pelos agricultores, as necessidades de filtração da água de rega, a protecção dos equipamentos contra eventuais risco de corrosão e as prioridades de implementação do Código de Boas Práticas Agrícolas, tendo como finalidade prevenir ou reduzir a poluição das fontes de água superficiais ou subterrâneas e reduzir os riscos potenciais de salinização do solo pela rega

Palavras-chave: Qualidade da água, rega, salinização, filtração e corrosão

1. Introdução As disposições da Directiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 23 de Outubro para que se estabeleça um quadro comunitário de actuação no âmbito da política de águas, a necessidade de implementação do Código de Boas Práticas Agrícolas e o estabelecimento de programas de actuação nas zonas vulneráveis com o objectivo de prevenir ou reduzir o problema, incentiva a conveniência de que se disponha de uma Rede para o Controlo da Qualidade da Água ao nível dos Regadios Individuais.

A qualidade da água de rega é um problema que afecta hoje em dia todos os países do mundo, com especial relevo os que se situam nas zonas áridas a semi-áridas.

Assim sendo, e tendo em atenção que o objectivo de qualquer projecto de rega consiste em proporcionar novos meios de produção que possibilitem aumentar os níveis de produção e o rendimento do empresário agrícola de um modo sustentável torna-se 1 SIGIRA – Sistema de Informação Geográfica sobre o Inventário dos Pequenos Regadios do Alentejo. Comunicação apresentada ao I Congresso Nacional de Rega e Drenagem

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necessário preservar a qualidade da fonte de água, pelo que se torna extremamente importante avaliar a aptidão da água para a rega, já que as suas características, podem condicionar o fim a que se destinam.

A sustentabilidade do regadio é negativamente influenciada pela qualidade da água.

No sentido de ajudar os utilizadores a caracterizar as águas disponíveis, e consequentemente, os limites da sua utilização, têm sido elaboradas várias normas, as quais não são mais do que guias do utilizador.

A qualidade da água de rega, é caracterizada pela quantidade e qualidade dos materiais em suspensão e dissolvidos na água.

Em função deste tipo de características, a água de rega pode ser qualificada em função do tipo e dimensão dos problemas que podem vir a surgir com a sua aplicação, ou que se esperam venham a acontecer ao longo dos tempos, os quais estão relacionados com a salinidade, a toxicidade de determinados elementos, a modificação das condições de infiltração da água no solo, entupimento e corrosão dos equipamentos.

Nestas condições, o controlo da qualidade da água de rega situa-se como um dos principais objectivos da gestão da rega, tendo em vista, por um lado, permitir manter a água no solo a um potencial que favoreça o desenvolvimento cultural, e como tal, a obtenção de produções elevadas, por outro, garantir que a qualidade da água de drenagem proveniente das áreas regadas se mantenha dentro dos limites previstos nas normas, e por outro ainda, em função dessa mesma qualidade, assegurar os meios e as medidas necessárias a garantir a filtração adequada e a protecção dos equipamentos de rega contra a corrosão. No momento actual, a este nível, e com este objectivo, não foi realizado, com carácter sistemático, qualquer trabalho no Alentejo, já que todos os trabalhos existentes vão sendo realizados ao nível das grandes bacias.

Com a finalidade de caracterizar a qualidade da água de rega, foi desenvolvido o presente trabalho, o qual, nesta primeira fase, e a partir da Inventariação dos Pequenos Regadios Individuais do Alentejo – PRIA – (Oliveira et al 2005) e da identificação das fontes de água, se pretende apresentar os resultados da caracterização de diversas fontes de água individuais (barragens, charcas e furos) que abastecem os regadios individuais localizadas nos distritos de Beja e Évora (Fig.1).

Este projecto é financiado através dos Programas PEDIZA e INTERREG IIIA.

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Figura 1 – Localização dos regadios pertencentes ao PRIA caracterizadas nesta 1ª fase

Objectivos Tendo por base a inventariação das fontes de água que abastecem os PRIA dos distritos de Beja e Évora, o objectivo deste trabalho consiste na caracterização da água disponível para a rega deste tipo de regadios, tendo em conta os potenciais perigos da mesma na:

• Salinidade do solo, já que o uso contínuo de águas com elevados teores em sais, pode levar à salinização do solo, inviabilizando-o para uso agrícola. Dependendo do teor de sais, a salinidade da água pode ainda afectar a disponibilidade de água para as culturas, podendo restringir o seu uso.

• Entupimentos dos emissores, já que esta é uma das principais causas do funcionamento deficiente da rega localizada, e está relacionado com a qualidade da água de rega nas suas múltiplas componentes físicas, químicas e biológicas.

Enquanto que as causas potenciais de entupimento de gotejadores provocadas pelas partículas físicas em suspensão podem ser removidas por filtragem, as causas de entupimento provocadas pela precipitação química dos carbonatos e fosfatos já se tornam de mais difícil resolução.

Legenda: Pontos de monitorização da qualidade da água dos PRIA Pequenos regadios individuais inventariados (SIGIRA) Regadios colectivos

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Esta precipitação química está normalmente associada a valores de pH e temperatura elevados, e podem resultar da presença em excesso de carbonatos ou sulfatos de cálcio e/ou magnésio, ou da presença de ferro na forma ferrosa, o qual, em contacto com o oxigénio é oxidado passando à forma de precipitados férricos insolúveis.

• Taxa de infiltração da água no solo, uma vez que a qualidade da água de rega influencia a infiltração da água do solo, já que actuando especificamente nas camadas superficiais deste, está relacionada com a estabilidade estrutural desta camada e com o seu baixo teor de cálcio, relativamente ao sódio. Assim, a aplicação de água com elevado teor em sódio, favorece a dispersão dos agregados de partículas do solo, levando à formação de uma camada praticamente impermeável à superfície que provoca uma redução das taxas de infiltração.

• Toxicidade de alguns iões, uma vez que, devido à acumulação de determinado tipo de iões no interior da planta, nomeadamente nas folhas, que, quando em determinada concentração pode levar à queimadura destas. Os prejuízos causados pelos iões são essencialmente influenciados pela sua concentração, sensibilidade da planta e taxa de utilização de água pela planta, a qual é responsável pelo movimento ascensional destes, no sentido do solo para as folhas.

A toxicidade pode ainda ser causada por absorção directa a partir das folhas, principalmente nos casos em que é utilizada rega por aspersão. Nesta situação, os prejuízos podem aparecer para concentrações inferiores àquelas que se manifestam quando a absorção é feita a partir do solo, e tem especial acuidade quando a rega é feita em condições de elevada temperatura e baixa humidade.

• Outros aspectos, nomeadamente os relacionados com a corrosão dos materiais metálicos, fenómeno natural que consiste na deterioração, ou na alteração das propriedades de um material, já que, dado que a maioria dos equipamentos de rega têm componentes metálicas, a corrosão pode ser a causa da deterioração em determinados ambientes.

2. Material e Métodos Para a caracterização das diferentes fontes de água inventariadas nos PRIA, num total de 1773, fontes analisadas nesta 1ª fase aproximadamente 100, localizadas de acordo com a Fig.1.

Na tentativa de caracterizar a qualidade das águas provenientes das diferentes fontes de água e apreciar o seu grau de restrição ao uso na rega, tendo em vista a obtenção da máxima produção potencial, lançou-se mão das diferentes aproximações a este assunto que vão sendo feitas um pouco por toda a parte.

Nestas condições, começou-se por usar uma das primeiras classificações de água para rega, precisamente a que foi apresentada pelo United States Salinity Laboratory – USSL - em 1954 e posteriormente reeditada em 1984, a partir da qual, mais recentemente, a FAO elaborou um guia interpretativo.

A classificação do USSL utiliza uma classificação baseada na concentração total de sais solúveis expressa pela condutividade eléctrica – CE -, taxa de adsorção de sódio - SAR -, concentração de boro e a noção de carbonato de sódio residual -CSR-.

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Segundo esta classificação, em termos de - perigo de salinização - as águas são classificadas em:

C1- Água de baixa salinidade. Boa qualidade para rega (CE = 0-250 µS/cm).

C2 - Água de média salinidade. Pode ser usada sempre que houver um grau moderado de lixiviação (CE = 250-750 µS/cm).

C3 - Água com salinidade alta. Não deve ser usada em solos com drenagem deficiente, nem para culturas pouco tolerantes ao sal (CE = 750-2 250 µS/cm).

C4 - Água de salinidade muito alta. Não apropriada para rega em condições normais, podendo no entanto, ser usada ocasionalmente, em condições muito especiais (CE = 2 250-5 000 µS/cm).

Segundo o perigo de alcalinização ou sodificação, as águas são classificadas em 4 classes:

S1 - Água com baixa concentração de sódio

S2 - Água com média concentração de sódio

S3 - Água com alta concentração de sódio

S4 - Água com muito alta concentração de sódio

Agrupando os dois critérios, a Forma de classificação é construída de seguinte forma: CnSx onde n varia de 1 a 5 e x de 1 a 4 de acordo com as classes de salinização e sodificação.

A relação de adsorção de sódio – SAR - é um parâmetro calculado em função dos teores de cálcio, magnésio e sódio (eq. 1), que representa o perigo de sodificação, ou a proporção relativa de sódio em relação aos outros catiões.

SAR (meq/l) =

2)( 2+

+

+MgCaNa (1)

A concentração elevada de bicarbonatos na água, pode ainda elevar a proporção de sódio no solo, devido à precipitação do cálcio e do magnésio. Assim, classificam-se as águas de rega quanto ao carbonato de sódio residual (CRS) em:

CRS<1,25 - Águas apropriadas para rega

1,25 < CRS < 2,5 - Águas duvidosas

CRS > 2,5 - Águas não recomendáveis

O – CRS – é calculado através da eq.(2)

CRS (meq/l)= ((CO32-+HCO3

-)- (Ca+Mg)2+) (2)

Esta classificação foi comparada com outras, em função do objectivo pretendido, das quais se ressalta a adaptada de Ayers e Westcot 1985 baseada na condutividade eléctrica

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da água de rega – CE – expressa em dS/m, na concentração total de sais dissolvidos – TDS – em mg/l, no que se refere à salinidade; na taxa de absorção de sódio – SAR -, no que se refere à infiltração; na concentração em sódio, expressa em meq/l, na concentração em cloretos, expressa em meq/l e na concentração em boro, expressa em meq/l, no que se refere à toxicidade de alguns iões; e na concentração em azoto nítrico, expressa em mg/l, bicarbonatos, expressa em meq/l, no que se refere a outros efeitos.

De acordo com esta classificação as águas são classificadas em três graus de restrição de uso, respectivamente, nenhum, ligeiro a moderado e severo, conforme as suas potencialidades para criar problemas ao nível dos diferentes parâmetros.

Segundo esta classificação, a toxicidade dos iões sódio e cloreto, dependendo da concentração na água de rega, podem afectar a sensibilidade das culturas. Assim, de acordo com a concentração dos iões, estes podem não afectar a qualidade da água de rega ([ião] <3 meq/l), ou podem restringir o uso da água de rega num nível ligeiro a moderado, se [ião] > 3 meq/l.

As fontes mais usuais de azoto são o azoto natural do solo, os fertilizantes e o azoto presente nas águas. Estas fontes, em excesso, podem causar problemas que afectam a susceptibilidade das culturas (crescimento, maturação e qualidade).

O azoto na forma nítrica é o que ocorre mais frequentemente nas águas de rega, constituindo um potencial causador de poluição e contaminação das águas e dos solos.

Ayers e Westcot, 1985, classificam vários graus de restrição no uso das águas de rega segundo o teor de nitratos em:

• Severo >30 mg/l NO3-N

• Ligeiro a Moderado 5-30 mg/l NO3-N

• Nenhum <5 mg/l NO3-N

No que respeita à potencialidade da água para causar entupimentos de natureza química dos emissores, ela está, como foi dito, associada a valores de pH e temperatura elevados, e podem resultar da presença em excesso de carbonatos ou sulfatos de cálcio e/ou magnésio, ou da presença de ferro na forma ferrosa, o qual, em contacto com o oxigénio é oxidado, passando à forma de precipitados férricos insolúveis.

É difícil prever, de forma fácil e prática, a tendência para a precipitação do cálcio. Existe, no entanto, uma aproximação, que é feita pela utilização do índice de saturação de Langelier (LSI), o qual estabelece que, quando for atingido o ponto de saturação do cálcio, na presença de um bicarbonato, o carbonato precipitará.

O índice de saturação de Langelier (LSI) é dado pela eq.(3):

LSI = pHa – pHc (3)

Onde: pHa – pH da água, obtido a partir das análises de água pHc – pH teórico que a água teria se em equilíbrio com o carbonato

O cálculo de pHc pode ser obtido através da tabela de NAKAYAMA 1982, citado por Oliveira (1993).

De acordo com o autor, os valores do índice correspondem a:

LSI > 0 pHa > pHc → tendência para que o CO3Ca precipite

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LSI < 0 pHa < pHc → tendência para que o CO3Ca se dissolva na água

De acordo com BUCKS et al 1982, citado por Oliveira 1993, a classificação da qualidade da água de rega, em termos de perigo potencial de entupimento de gotejadores, é do tipo:

pH = 7 perigo de entupimento baixo;

7<pH<8 perigo de entupimento moderado;

pH > 8 perigo de entupimento severo.

No que respeita aos perigos potenciais de corrosão dos equipamentos de rega pela água, o impacto da deterioração nos equipamentos de rega pode ter várias origens:

• Má qualidade da água de rega. As águas naturais contêm diversos compostos químicos que se encontram na forma solúvel. O principal elemento é o carbonato de cálcio, onde o seu equilíbrio está sujeito às interacções com o dióxido de carbono, podendo levar à deposição ou dissolução de calcário.

• Falta de práticas de manutenção; defeitos de fabrico; práticas pobres de instalação e as próprias circunstâncias de funcionamento do equipamento.

Os parâmetros de classificação das águas quanto à corrosão são escassos, e não existem normas para tal.

Segundo Oliveira 1993, citando BIEZOK 1972, classifica-se a agressividade da água nas tubagens de betão em nenhum a ligeiro, suave, forte e muito forte, tendo em conta o pH, concentração de amónia e de sulfatos da água de rega.

Existem, no entanto, alguns índices que revelam a tendência corrosiva da água. Neste estudo consideraram-se os seguintes índices:

1. Índice de Saturação de Langelier (LSI) O índice de saturação de Langelier dá a tendência corrosiva da água. (Fonte: BROOKSIDE LABORATORIES, INC.; GLS-Société d’Etudes et de Conseils)

• Se LSI > 0, o carbonato de cálcio precipitará e a água terá tendência incrustante.

• Se LSI < 0, o carbonato de cálcio dissolve-se na água e a água terá tendência corrosiva.

2. Índice de Estabilidade de Ryznar (RSI) O índice de Ryznar é um índice de estabilidade, definido segundo a eq.(4) (Fonte: CORROSION-DOCTORS, 1999):

RSI = 2pHs - pHA (4)

Onde: pHc é o pH de saturação do carbonato de cálcio

pHa é o pH actual da água medido em laboratório

pHc = (9,3+A+B) – (C+D)

A = (log[TDS]-1)/10

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B = -13.2 * log(T+273)+34.55

C = log[Ca2+ como CaCO3)]

D = log[Alcalinidade como CaCO3]

Segundo o índice de Ryznar as águas classificam-se em (Fonte: AMERICAN PUBLIC HEALTH ASSOCIATION, 1992):

• Fortemente incrustantes RSI de 4.0 a 5.0

• Ligeiramente incrustantes RSI de 5.0 a 6.0

• Ligeiramente corrosiva RSI de 6.0 a 7.0

• Significativamente corrosiva, RSI de 7.0 a 7.5

• Fortemente corrosiva RSI de 7.5 a 9.0

• Intoleravelmente corrosiva RSI > 9.0

3. Índice de Larson-Skold (ILR) Este índice descreve a corrosividade da água, principalmente para o aço (Fonte: CORROSION-DOCTORS, 1999).

O índice de Larson define-se pela eq.(5):

ILR =][CO ][HCO

][SO ][Cl-2

3-2

3

-24

-

++ (5)

As concentrações dos parâmetros intervenientes na fórmula são expressas em meq/l.

De acordo com o ILR, as águas, quanto à corrosão, são classificadas em (Fonte: AMERICAN PUBLIC HEALTH ASSOCIATION, 1992):

• Corrosão elevada ILR > 1.2

• Corrosão significativa 0.8 < ILR < 1.2

• Não há corrosão ILR < 0.8

Em termos gerais, a qualidade da água destinada para rega, está, em Portugal, regulamentada pelo Decreto-Lei nº 236/98, o qual apresenta os valores máximos recomendados (VMR) e admitidos (VMA). Este Decreto, embora apresente os valores VMR e VMA, eles não foram construídos com os objectivos apresentados.

Tendo em vista os objectivos traçados, e as diversas classificações com que se trabalhou, as diferentes fontes de água foram caracterizadas através das seguintes análises laboratoriais:

• Condutividade Eléctrica da água a 25 º C,

• pH da água

• Temperatura da água.

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42,11%

4,21%

53,68%

Nenhum (CE<0,7 dS/m)

Lig. a Mod. (CE0,7-3,0 dS/m)

Severo (CE> 3,0 dS/m)

• SALINIDADE: Teor em Sal: Condutividade Eléctrica; Catiões e Aniões: Cálcio, Magnésio, Sódio, Carbonato, Bicarbonato, Cloreto, Sulfato;

• NUTRIENTES: Nitrato-Azoto, Amónia-Azoto, Nitrito-Azoto, Fosfato-Fósforo, Potássio;

• OUTROS: Ferro, Acidez/Basicidade - pH -, Taxa de Adsorção de Sódio - SAR .

realizadas em laboratório certificado, de acordo com as normas apresentadas no Decreto-Lei nº 236/98

As águas foram recolhidas, nas diversas fontes, de acordo com a metodologia descrita por Oliveira (1993), em frascos de plástico de 1 l de capacidade, identificados, transportados, em malas térmicas com temperatura controlada, para laboratório no mesmo dia da recolha. Nos casos em que tal não foi possível, a água foi guardada em frigorífico à temperatura inferior a 5 ºC.

3. Resultados De acordo com os objectivos e a metodologia traçados, avaliou-se a qualidade das águas destinadas a rega segundo os parâmetros anteriormente considerados, ou seja:

1. Salinidade;

2. Influência da qualidade da água de rega na infiltração da água do solo;

3. Riscos de salinização e alcalinização (SAR);

4. Toxicidade de alguns iões específicos e outros efeitos que afectam a susceptibilidade das culturas;

5. Influência da qualidade da água de rega no entupimento de gotejadores (Índice de Saturação de Langelier-LSI);

6. Problemas de incrustação e corrosão em tubagens provocados pela qualidade da água de rega.

Salinidade da Água

Na Fig.2, apresenta-se o Grau de Restrição do Uso da Água de Rega no que se refere à salinidade.

Figura 2 - Grau de Restrição do Uso da Água de Rega dos PRIA – Salinidade

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01000

20003000

40005000

60007000

8000

CE

(uS/

cm)

VMR C.E. (uS/cm)

Da análise do Fig.2 verifica-se que a maioria das fontes de água (subterrâneas ou superficiais) analisadas que abastecem os pequenos regadios individuais do Alentejo, enquadram-se no grau de restrição ligeiro a moderado, ou seja, são águas com uma condutividade eléctrica entre 0,7 e 3,0 dS/m. Dentro deste intervalo, só as plantas sensíveis à salinidade é que podem ter a sua produção relativa afectada, como se pode observar na Fig.3.

Figura 3 - Agrupamento das culturas em função da sua sensibilidade à salinidade (Ayers e

Westcot, 1985) De acordo com o Decreto-Lei nº 236/98, os valores da condutividade eléctrica são, na sua maioria, inferiores ou iguais ao valor máximo recomendado (VMR = 1000 µS/cm), havendo no entanto casos pontuais onde se verificam valores bastante superiores ao VMR, como se pode observar na Fig.4.

Estes valores anormais, correspondem a fontes onde a água provém ou de ETAR, ou de charcas onde o nível de água era muito baixo, e como tal, a água não foi utilizada para rega em 2005.

Figura 4 – Valores de CE vs Valor Máximo Recomendado

Influência da qualidade da água de rega na infiltração da água do solo A infiltração é normalmente favorecida pela aplicação de águas com salinidade elevada, pois quando o cálcio e o magnésio são os catiões predominantes adsorvidos no complexo de troca, o solo tende a ter uma estrutura granular, a qual é facilmente trabalhada e apresenta taxas de infiltração elevadas e permeabilidade elevadas. É, no

ECe = Condutividade Eléctrica do Exctracto de saturação (dS/m) ECw = Condutividade eléctrica da água de rega (dS/m)

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entanto, prejudicada pela redução da salinidade da água e pelo aumento do teor de sódio relativamente aos de cálcio e magnésio, ou seja pelo aumento dos valores do SAR, tal como se pode observar na Fig.5.

Na Fig. 5, extraída de Ayers e Westcot, 1985, apresenta-se a caracterização das águas dos PRIA, no que se refere à relação entre a CE (dS/m) e o SAR (meq/l), bem como a classificação do grau de restrição do uso da água, no que a este parâmetro se refere.

Figura 5 - Influência da relação entre a salinidade da água de rega e a taxa de adsorção de sódio na taxa de infiltração da água no solo (Ayers e Westcot, 1985)

Da análise da Fig. 5, constata-se que a maioria das águas de rega analisadas, não têm características para potencialmente modificarem as condições de infiltração do solo. Salienta-se, no entanto, que estes valores se encontram muito próximos da fronteira entre redução nula e redução ligeira a moderada na taxa de infiltração.

As águas de rega que se encontram classificadas como potenciais para provocar uma redução ligeira a moderada na taxa de infiltração, são águas provenientes de albufeiras de barragens praticamente vazias (ano de 2005).

Riscos de salinização e Sodificação do Solo A Fig. 6 resume a classificação das águas de rega analisadas de acordo com os parâmetros de salinização e sodificação.

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- 13 -

0,00%20,00%40,00%60,00%80,00%

100,00%

Am

ostr

as

Ana

lisad

as (%

)

<1,25 1,25-2,5 <2,5

CSR

Figura 6 – Classificação da qualidade da água de rega segundo o United States Salinity Laboratory (USSL)

De acordo com a Fig. 6, verifica-se que a qualidade da água dos PRIA não supera a classificação C3S1, estando a maioria dos casos entre a classificação C2S1 e C3S1, o que significa que o uso continuado destas águas representa um perigo de salinização do solo médio a alto, principalmente em solos com má drenagem. Mesmo quando se dispuser de uma drenagem regular, torna-se indispensável o uso de práticas especiais para controlo da salinidade.

Quanto ao perigo de sodificação do solo, as águas classificam-se no nível S1, o que significa que podem ser usadas em quase todos os solos, apresentando baixo risco de alcalização.

No que respeita ao teor em carbonato de sódio residual apresenta-se, na Fig.7, a classificação das águas e o seu grau de restrição de uso. Da análise da figura constata-se que cerca de 90% das águas dos PRIA são águas apropriadas para a rega segundo esta classificação, ou seja, a concentração de bicarbonatos na água não irá elevar a proporção de sódio no solo.

Figura 7 – Carbonato de Sódio Residual das amostras de água analisadas

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0

5

10

15

20

25

30

SAR

(meq

/l)

VMR SAR

Na Fig.8 apresenta-se a relação entre os valores das análises e o valor máximo recomendado para o SAR, de acordo com o Decreto-Lei nº 236/98.

Figura 8– Valores do SAR das análises vs Valor Máximo Recomendado

Tal como seria esperado, de acordo com a classificação U.S.S.L., os valores do SAR das águas dos PRIA são inferiores ao VMR.

Salienta-se aqui um caso onde o valor do SAR é bastante elevado e que corresponde de novo à charca onde o nível de água era muito baixo.

Toxicidade de alguns iões específicos e outros efeitos que afectam a susceptibilidade das culturas Neste sub-capítulo apresentam-se os dados analíticos analisados referentes à toxicidade específica do catião sódio (Na+) e do anião cloreto (Cl-), por serem os iões que causam maior quantidade de problemas e por serem aqueles que mais aparecem nas águas naturais. Avaliaram-se também outros problemas variados, tais como: concentração de bicarbonatos e nitratos na água e acidez ou basicidade da água (pH).

Toxicidade específica dos iões Sódio e Cloreto Na Fig.9 pode-se observar a percentagem de amostras de água analisadas que correspondem a cada grau de restrição no uso da água de rega (quanto à toxicidade de iões específicos).

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74%

49%

26%

51%

Sódio (Na+)

Cloreto (Cl-)

Ligeiro a Moderado(>3meq/)Nenhum (< 3 meq/l)

0

100

200

300

400

500

600

Cl (

mg/

l)

VMR Cl (mg/l)

Figura 9 – Percentagem de amostras analisadas que correspondem a cada grau de restrição no

uso da água de rega, quanto à toxicidade de iões específicos.

No que respeita à concentração de sódio nas águas dos PRIA (Fig.9), verifica-se que 74% das águas analisadas não afectam a sensibilidade das culturas e cerca de 26% das águas afectam a sensibilidade das culturas num grau ligeiro a moderado.

Relativamente ao teor de cloretos nas águas, constata-se, através da mesma figura, que existe uma percentagem considerável de águas (51%) que afectam a sensibilidade das culturas num nível ligeiro a moderado.

Na Fig.10 pode-se observar o comportamento das águas analisadas, no que aos cloretos diz respeito, face aos valores máximos recomendados (segundo o Decreto-Lei nº 236/98).

Figura 10 - Enquadramento das análises de água no Valor Máximo Recomendado

De acordo com a Fig.10, a maioria das amostras situa-se acima do VMR, havendo no entanto muitos valores próximos do VMR. Estes resultados vêm confirmar a tendência para o teor em cloretos nas águas ser relativamente elevado, tal como foi verificado no ponto anterior (Fig. 9).

No que ao sódio diz respeito não existe informação no Decreto-Lei nº236/98 sobre os valores máximos recomendados e admitidos para este catião.

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Azoto (Nitratos) Na Fig.11, apresenta-se a percentagem de amostras de água analisadas que correspondem a cada grau de restrição.

Nenhum 80,00%

Ligeiro a Moderado

20,00%

Severo 0,00%

Figura 11 - Grau de restrição do uso das águas referentes ao seu teor em Nitratos

Da análise dos dados da Fig.11 verifica-se que a maioria das águas não apresentam nenhum grau de restrição no uso. Existe, no entanto, uma pequena percentagem de amostras de água que podem restringir o seu uso num grau ligeiro a moderado (20%).

De acordo com a Fig. 12, a concentração de nitratos nas águas está abaixo do VMR, verificando-se apenas dois casos onde a concentração é superior ao VMR.

0

20

40

60

80

100

NO 3 (

mg/

l)

VMR NO3 (mg/l)

Figura 12 – Teor de nitratos vs Valor Máximo Recomendado

Bicarbonatos Normalmente os problemas relacionados com os bicarbonatos na água de rega não são de natureza tóxica.

A presença excessiva de bicarbonatos pode provocar depósitos esbranquiçados sobre folhas e frutos, principalmente quando se usa rega por aspersão. Estes depósitos quando se acumulam nos gotejadores podem obstruí-los.

A Fig.13 mostra que o teor de bicarbonatos na maioria das águas analisadas se encontra num grau de restrição ligeiro a moderado.

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36,84%

1,05%

62,11%

Nenhum(HCO3<1,5

meq/l)

Ligeiro aModerado

(HCO3 1,5-8,5meq/l)

Severo(HCO3>8,5

meq/l)

Figura 13 –- Grau de restrição do uso das água referentes ao seu teor em Bicarbonatos

pH O pH é um indicador da acidez ou da basicidade de uma água, mas é raramente um problema por si só.

A escala normal do pH para a água de rega está entre 6,5 e 8,4. Um valor fora da escala normal pode causar um desequilíbrio nutritivo, ou pode conter um ião tóxico.

Um valor anormal de pH da água de rega pode representar um impacto negativo no equipamento de rega. Tal água pode ser muito corrosiva, e como tal, corroer rapidamente as tubagens e os equipamentos metálicos, bem como facilitar a precipitação de determinados componentes químicos da água, ou ainda o desenvolvimento de microrganismos causadores indirectos de entupimentos dos emissores.

Na Fig.14 pode-se observar a percentagem de amostras correspondentes a cada escala de pH, correspondente a dois graus de restrição do uso da água.

62,11%

37,89%

0,00%

20,00%

40,00%

60,00%

80,00%

100,00%

6,5<pH<8,4 pH>8,4 ou pH<6,5

Figura 14 – Percentagem de amostras correspondentes a cada escala de pH

Da análise da Fig.14 verifica-se que, embora a maioria das amostras apresente um pH normal, existe uma percentagem considerável de amostras (37.89%) que têm um pH fora da escala normal.

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0

2

4

6

8

10

12

pH

VMR VMA pH

LSI > 0; 86,32%

LSI < 0; 13,68%

Tais resultados podem ser confirmados na Fig.15, onde cerca de metade dos casos são iguais ou superiores ao valor máximo recomendado (VMR) do Decreto-Lei nº 236/98.

Figura 15 – Enquadramento dos valores de pH no VMR e no VMA

Influência da qualidade da água de rega no entupimento de gotejadores (Índice de Saturação de Langelier-LSI) Na Fig.16 apresenta-se o índice de saturação de Langelier das amostras de água dos pequenos regadios do Alentejo, de onde se pode concluir que cerca de 86 % das amostras apresentam perigo potencial de entupimento, por precipitação do carbonato de cálcio (LSI>0).

Figura 16 – Índice de saturação de Langelier

Tendo por base a classificação de BUCKS et al 1982, apresenta-se na Fig.17 o perigo potencial de entupimento de gotejadores das águas de rega dos PRIA, de onde se pode concluir que cerca de 56% das águas representam perigo severo no entupimento de gotejadores, tal como seria esperado, tendo em conta o índice de saturação Langelier.

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1,05%

43,16%

55,79%

pH = 7

7 < pH < 8

pH > 8,0

Bai

xoM

oder

ado

Seve

ro

1,05%

0,00%

0,00%

98,95%<200mg/l

200-600mg/l

600-3000mg/l

>3000mg/l

Nen

hum

aLi

geiro

Suav

eFo

rte

Mui

toFo

rte

Figura 17– Influência do pH no perigo potencial de entupimento de gotejadores

Na zona em estudo, o estudo do perigo de entupimento de gotejadores impõe-se, já que cerca de 33% dos sistemas de rega inventariados dizem respeito à rega localizada (gota-a-gota), onde este problema é mais agudo. Problemas de incrustação e corrosão em tubagens provocados pela qualidade da água de rega Nas Fig. 18 a 20, apresenta-se a agressividade da água em tubagens de betão, tendo em conta o pH, a concentração de sulfatos e de amónio, respectivamente.

0,00%

0,00%

0,00%

100,00%pH>6,5

pH6,5-5,5

pH5,5-4,5

pH<4,5

Nen

hum

aLi

geiro

Suav

eFo

rte

Mui

toFo

rte

Figura 18 – Agressividade da água, segundo o pH

Figura 19 – Agressividade da água, segundo a concentração de sulfatos

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0,00%

0,00%

0,00%

100,00%<15mg/l

15-30

mg/l

30-60

mg/l

>60mg/l

Nen

hum

aLi

geiro

Suav

eFo

rte

Mui

toFo

rte

Figura 20 – Agressividade da água, segundo a concentração de amónio

Quanto à agressividade das águas dos PRIA, verifica-se que não existe qualquer perigo de ataque da água às tubagens de betão, ou se existir, o ataque é ligeiro.

Nas Fig. 21 a 23 apresentam-se os índices de saturação de Langelier, de estabilidade de Ryznar e de Larson Skold, respectivamente.

LSI > 0; 86,32%

LSI < 0; 13,68%

Figura 21 – Índice de Saturação de Langelier (LSI)

0,00%

13,68%

21,05%

13,68%

4,21%

47,37%

Fort. Incrustante 4<RSI<5

Lig. Incrustante 5<RSI<6

Equilíbrio 6<RSI<7

Sig. Corrosiva 7<RSI<7,5

Fort. Corrosiva 7,5<RSI<9

Int. Corrossiva RSI>9

Figura 22 – Índice de estabilidade de Ryznar (RSI)

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27,37%

24,21%

48,42%

Não hácorrosão

Corrosãosignificativa

Corrosãoelevada

ILR

<0,8

0,8<

ILR

<1,2

ILR

>1,2

Figura 23 – Índice de Larson-Skold (ILR)

Da observação das Fig. 21 a 23 pode-se constatar que:

• Cerca de 86 % das águas têm tendência incrustante (LSI>0) e, como tal, constituem um perigo potencial de entupimento de gotejadores, tal como se verificou anteriormente.

Segundo este índice, apenas 13.68% (LSI<0) das águas poderão ser corrosivas.

• Segundo o índice de estabilidade de Ryznar a maioria das águas (47.37 %) são quimicamente estáveis e, portanto, não apresentam perigo potencial de corrosão e de incrustação, para a generalidade dos materiais. Salienta-se, no entanto, que cerca 38.95% das águas têm tendência a ser corrosivas, e destas 13.68% são fortemente corrosivas e 21.05% são significativamente corrosivas. O valor de 13.68% coincide com a classificação do índice de Langelier. O facto de o índice de Langelier não indicar os 38.95% das águas com tendência corrosiva, poderá ser devido a diferenças nos critérios de classificação.

• De acordo com o índice de Larson, apenas 27.37% das águas não são corrosivas para o aço. Destaca-se neste índice a percentagem elevada de águas que são potencialmente corrosivas, num nível significativo (24.21%) e num nível elevado (48.42%).

5. Conclusões e Recomendações Embora o número de fontes de água abastecedora dos pequenos regadios individuais do Alentejo – PRIA – analisadas seja ainda reduzido, já que representam apenas cerca de 6 % do número total, as conclusões que se podem tirar podem já apresentar resultados que poderão ser representativos de toda a zona, uma vez que houve o cuidado de escolher fontes de água dispersas pela mesma.

Desta análise pode-se concluir que:

• Em termos de salinidade das águas de rega, verifica-se que a maioria das fontes de água se enquadram no grau de restrição ligeiro a moderado, ou seja, são águas com uma condutividade eléctrica entre 0,7 e 3,0 dS/m

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• Em termos de modificação das características de infiltração do solo, constata-se que a maioria das águas de rega analisadas se encontram muito próximas da fronteira entre redução nula e redução ligeira a moderada na taxa de infiltração.

As águas de rega que se encontram classificadas como potenciais para provocar uma redução ligeira a moderada na taxa de infiltração, são águas provenientes de albufeiras criadas por barragens com muito pouca água (ano de 2005).

• Em termos de potenciais perigos de salinização do solo, verifica-se que a qualidade da água dos PRIA representa um perigo de salinização do solo médio a alto, principalmente em solos com má drenagem, pelo que deve ser dado particular cuidado à drenagem, principalmente dos solos mal drenados.

• Quanto ao perigo de sodificação do solo, pode concluir-se que as águas podem ser usadas em quase todos os solos, apresentando pouco risco de alcalização.

• os valores do SAR das águas dos PRIA são inferiores ao VMR .

• Verifica-se que em 74 % das águas analisadas a concentração de sódio não afecta a sensibilidade das culturas, e que existe uma percentagem considerável de águas (51 %) em que a concentração do anião cloreto pode afectar potencialmente, num nível ligeiro a moderado, a sensibilidade das culturas.

• Em termos de pH, verifica-se que, a maioria das amostras apresentam um pH normal, embora exista uma percentagem considerável de amostras (37.89 %) que têm um pH superior a 8,4 ou inferior a 6,5.

• Em relação ao teor de nitratos, verifica-se que a maioria das amostras (80.0%) não apresenta nenhum grau de restrição no uso da água, mas existe uma pequena percentagem de amostras que podem restringir o uso da água num nível ligeiro a moderado.

Segundo o Decreto-Lei não existem problemas relativamente aos nitratos, já que os valores das análises de água se encontram abaixo do VMR.

• Em termos de perigo potencial de entupimento, verifica-se que, cerca de 86 % das amostras dos pequenos regadios do Alentejo, apresentam perigo potencial de entupimento, por precipitação do carbonato de cálcio.

• Em termos de perigo potencial de corrosão dos equipamentos metálicos, poder-se-á concluir, embora os diversos critérios analisados não sejam coincidentes, sendo mesmo, por vezes, divergentes, que pode existir uma percentagem razoável de fontes de água com água que poderá ser potencialmente corrosiva.

Nestas condições, como prevenção, e como este tratamento é comum à maioria dos factores analisados, poder-se-á dizer que uma medida urgente a tomar será a que aconselha a correcção do pH da água de rega para valores ligeiramente abaixo de pH = 7. Este projecto continuará, pelo que no ano de 2006 se prevê vir a cobrir cerca de 30 % da área total abrangida pelo projecto.

Os resultados já alcançados permitirão já definir alterações nas estratégias de rega actualmente usadas pelos agricultores, indicações sobre as necessidades de filtração da água de rega e correcção do pH da água, de forma a proteger os equipamentos contra eventuais risco de corrosão e as prioridades de implementação do Código de Boas

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Práticas Agrícolas, tendo como finalidade prevenir ou reduzir a poluição das fontes de água superficiais ou subterrâneas e reduzir os riscos potenciais de salinização do solo pela rega. Referências Bibliográficas AyerR, R.S.;Westcot, D.W. 1985 - Water Quality for Agriculture.Irrigation and

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