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AÇÕES CONSTITUCIONAIS (1)

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Elaine Harzheim Macedo

Roberto de Almeida Borges Gomes

Wellington Pacheco Barros

Ações Constitucionais

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Elaine Harzheim Macedo

Roberto de Almeida Borges Gomes

Wellington Pacheco Barros

4.ª edição / 2010

Ações Constitucionais

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Doutora em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisi-nos). Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grandedo Sul (PUCRS). Professora do curso de Pós-Graduação da Universidade Lute-

rana do Brasil (Ulbra). Colaboradora dos cursos da Universidade Federal do RioGrande do Sul (UFRGS) de Especialização em Processo Civil, do Instituto deDesenvolvimento Cultural (IDC-RS), da Associação dos Juízes do Rio Grandedo Sul (AJURIS), da Escola Superior do Ministério Público do Rio Grande doSul (ESMP-RS) e do Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul (IARGS).Desembargadora do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.

Elaine Harzheim Macedo

Mestrando em Direitos Difusos e Coletivos pela Universidade Metropoli-tana de Santos (Unimes). Especialista em Direitos Difusos e Coletivos pela Pon-tifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Professor dos cursos de Gra-duação da Faculdade Ruy Barbosa (FRB), dos cursos de Pós-Graduação do CentroUniversitário Jorge Amado e da Universidade Salvador (Unifacs-BA). Professor da

Fundação Escola Superior do Ministério Público (Fesmip), da Faculdade Social daBahia (FSBA), da Academia de Polícia Civil da Bahia (ACADEPOL), do Centro Pre-paratório para Carreira Jurídica (JusPODIVM) e do Centro de Estudos Jurídicos deSalvador (CEJUS). Membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM)e da Associação Nacional do Ministério Público do Consumidor (MPCON). Mem-bro-Diretor da Associação Brasileira de Professores de Ciências Penais (ABPCP--Diretoria Bahia). Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado da Bahia.

Roberto de Almeida Borges Gomes

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Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande doSul (PUCRS). Professor do curso de Pós-Graduação do Centro Universitário Ritterdos Reis (UniRitter) e da Escola Superior da Magistratura da Associação dos Juízes

do Rio Grande do Sul (AJURIS). Desembargador aposentado do Tribunal de Jus-tiça do Estado do Rio Grande do Sul. Advogado.

Wellington Pacheco Barros

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Sumário

Princípios de hermenêuticadas ações constitucionais ......................................................11

Princípios constitucionais............................ ......................... .......................... ........................ 11Princípio da supremacia da Constituição ....................... .......................... ........................ 12

Princípio da presunção de constitucionalidadedas leis e dos atos do Poder Público ........................ ......................... .......................... ....... 13Princípio da interpretação conforme à Constituição ....................... ......................... ... 13Princípio da unidade da Constituição .......................... .......................... ......................... ... 15Princípio da razoabilidade ou proporcionalidade ........................ .......................... ....... 16Princípio da efetividade ...................... .......................... ......................... .......................... ....... 17

Mandado de segurança individual I ..................................21

Considerações gerais ....................... .......................... ......................... .......................... ........... 21Garantia constitucional ....................... .......................... ......................... .......................... ....... 21Situações de não cabimento de MS ......................... ......................... .......................... ....... 22Quem pode praticar a ilegalidade ou o abuso de poder? ....................... ................... 25MS como forma de controle da Administração Pública ...................... ........................ 27MS preventivo........................ .......................... ......................... .......................... ........................ 29Conclusão ........................ ......................... .......................... ......................... .......................... ....... 30

Mandado de segurança individual II .................................33

Considerações gerais ....................... .......................... ......................... .......................... ........... 33Regulamentação legal ........................ .......................... ......................... .......................... ....... 33Quem é o autor do MS? ......................... .......................... .......................... ......................... ... 33Quem pode ser a autoridade pública coatora? ......................... .......................... ........... 35Conceito de direito líquido e certo ....................... ......................... .......................... ........... 36Ponto forte da inicial do MS ....................... ......................... .......................... ........................ 36Decisão judicial liminar ....................... .......................... ......................... .......................... ....... 38Recursos da decisão judicial liminar ......................... ......................... .......................... ....... 41Resposta da autoridade coatora e do ente público .......................... ......................... ... 42Previdências cartorárias ...................... .......................... ......................... .......................... ....... 42

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Presença obrigatória do MP ....................... ......................... .......................... ........................ 42Sentença ........................ .......................... .......................... ......................... .......................... ....... 43Recursos cabíveis da sentença ...................... .......................... ......................... .................... 45Conclusão ....................... .......................... .......................... ......................... .......................... ....... 47

Mandado de injunção............................................................. 49

Breve histórico ....................... ......................... .......................... .......................... ........................ 49Cabimento .......................... ......................... .......................... ......................... .......................... ... 50Intervenção do Ministério Público (MP) ...................... .......................... ......................... ... 51Legitimação ativa .......................... ......................... .......................... .......................... ............... 51Competência versus legitimação passiva ............................... .......................... ............... 52Sentença no mandado de injunção ......................... .......................... ......................... ....... 54Posição do STF ....................... .......................... ......................... .......................... ........................ 57Mandado de injunção e ação de inconstitucionalidade por omissão ................... 57Texto do Projeto de Lei 6.839/2006 ...................... .......................... ......................... ........... 59Justificação ......................... .......................... ......................... .......................... ......................... ... 60

Habeas data ................................................................................ 65

Origem histórica ....................... .......................... ......................... .......................... .................... 65Cabimento ......................... ......................... .......................... ......................... .......................... ... 67Objeto do habeas data ........................ .......................... ......................... .......................... ....... 69Intervenção do Ministério Público (MP) ...................... .......................... ......................... ... 71Legitimação ativa .......................... ......................... .......................... .......................... ............... 71Legitimação passiva ......................... .......................... .......................... ......................... ........... 72Procedimento ........................ .......................... .......................... ......................... ........................ 73Sentença .......................... .......................... ......................... .......................... ......................... ....... 75Recurso......................... ......................... .......................... .......................... ......................... ........... 75(Des)cabimento de liminar ......................... .......................... .......................... ....................... 76Opção pela via ordinária ...................... .......................... ......................... .......................... ...... 76

Direitos coletivos ...................................................................... 85

Princípios protetivos dos bens difusos e coletivos ...................... .......................... ....... 85Categorias de interesse ....................... .......................... ......................... .......................... ....... 89Direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos ........................ ........................ 91

Distinções necessárias .......................... ......................... .......................... ......................... ....... 94A tutela coletiva dos interesses transindividuais ....................... ......................... ........... 95

Ação popular ............................................................................101

Conceito......................................................................................................................................101Objeto ..........................................................................................................................................102Requisitos ...................................................................................................................................103

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Finalidade ...................................................................................................................................104Partes ...........................................................................................................................................104Competência .............................................................................................................................106Processo ......................................................................................................................................107

Ação civil pública ....................................................................121

Conceito......................................................................................................................................121Ação civil pública e ação popular ......................................................................................121Responsabilidade por danos ...............................................................................................122Bens tutelados ..........................................................................................................................122Hipótese de descabimento da ACP ..................................................................................126Foro competente .....................................................................................................................127Objeto da ACP ..........................................................................................................................128Tutela preventiva .....................................................................................................................129Legitimidade ativa ..................................................................................................................132Execução da sentença ...........................................................................................................138Coisa julgada .............................................................................................................................139Litigância de má-fé .................................................................................................................141Ônus da sucumbência ...........................................................................................................141

Inquérito civil ...........................................................................149

Histórico ......................................................................................................................................149Conceito e natureza jurídica................................................................................................150Princípios norteadores do inquérito civil .......................................................................151Procedimento ...........................................................................................................................155Termo de ajustamento de conduta ..................................................................................160Arquivamento ...........................................................................................................................162Conflito de atribuição entre membros do MP ..............................................................163Do valor probatório do inquérito civil .............................................................................165Inquérito civil e seus reflexos na ação penal .................................................................166

Mandado de segurança coletivo I ....................................171

Considerações gerais .............................................................................................................171Garantia constitucional .........................................................................................................172

Situações de não cabimento de MS coletivo ................................................................173Quem pode praticar a ilegalidade ou o abuso de poder? ........................................177MS coletivo como forma de controle da Administração Pública .......................... .179MS preventivo...........................................................................................................................181Conclusão ...................................................................................................................................182

Mandado de segurança coletivo II ...................................185

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Considerações gerais .............................................................................................................185Regulamentação legal ...........................................................................................................185Quem pode ser o autor no MS coletivo? ........................................................................185Quem pode ser a autoridade pública coatora? ............................................................186Conceito de direito líquido e certo ...................................................................................187Ponto forte da inicial do MS coletivo ...............................................................................188

Decisão judicial liminar .........................................................................................................190Recursos da decisão judicial liminar .................................................................................193Providências cartorárias ........................................................................................................194Resposta da autoridade coatora e do ente público ....................................................194Presença obrigatória do Ministério Público (MP) ........................................................194Sentença .....................................................................................................................................196Recursos cabíveis de sentença ...........................................................................................198Conclusão ...................................................................................................................................199

Ação de improbidade administrativa .............................201

Princípios constitucionais da Administração Pública.................................................201Estudo da Lei 8.429/92 ..........................................................................................................201

Ação direta de inconstitucionalidade .............................223

Considerações gerais .............................................................................................................223Em que consiste a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo? .....................224Base constitucional .................................................................................................................224Incidente de inconstitucionalidade: CF, artigo 97 ......................................................225Regulamentação legal ...........................................................................................................226Quem pode propor a ação ...................................................................................................226Conteúdo da petição inicial .................................................................................................227Indeferimento liminar da inicial pelo relator ................................................................228Andamento da ação ...............................................................................................................229Ação cautelar em ação direta de inconstitucionalidade ...........................................229Julgamento da ADIn pelo Órgão Pleno do STF ............................................................230Questões importantes da ADIn ..........................................................................................231Conclusão ...................................................................................................................................232

Ação declaratória de constitucionalidade.....................235

Considerações gerais .............................................................................................................235Quem pode propor a ação? .................................................................................................237Conteúdo da petição inicial.................................................................................................238Indeferimento liminar da inicial pelo relator .......................... .......................... .............239Andamento da ação ...............................................................................................................239Ação cautelar em ação declaratória de constitucionalidade ..................................240Julgamento da ADC pelo Órgão Pleno do STF .............................................................241Questões importantes da ADC ...........................................................................................241Conclusão ...................................................................................................................................242

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Arguição de descumprimentode preceito fundamental .....................................................245

Considerações gerais .............................................................................................................245Preceito fundamental ............................................................................................................245

Base constitucional e legal ...................................................................................................246Legitimados ...............................................................................................................................248Requisitos da inicial ................................................................................................................249Liminar ........................................................................................................................................250Andamento da ação ...............................................................................................................251Julgamento ................................................................................................................................252Conclusão ...................................................................................................................................253

Referências ................................................................................255

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Roberto de Almeida Borges Gomes

Princípios constitucionaisÀ guisa de introdução, cumpre relembrar a noção conceitual de princípio

constitucional. É sabido que a Constituição é formada por um conjunto de

regras e princípios, sendo estes as normas escolhidas pelo legislador consti-

tuinte como fundamentos primordiais da ordem jurídica que cria.

Ivo Dantas (apud  MAGALHÃES, 1997) entende que os

[...] princípios são categoria lógica e, tanto quanto possível, universal, muito embora nãopossamos esquecer que, antes de tudo, quando incorporados a um sistema jurídico-cons-titucional-positivo, refletem a própria estrutura ideológica do Estado, como tal, represen-tativa dos valores consagrados por uma determinada sociedade.

Manoel Gonçalves Ferreira Filho (apud  MAGALHÃES, 1997) percebe que o

vocábulo “princípio” não é unívoco, possuindo três principais sentidos:

Num primeiro, seriam “supernormas”, ou seja, normas (gerais ou generalíssimas) que expri-mem valores e que por isso, são ponto de referência, modelo, para regras que as desdo-bram. No segundo, seriam standards, que se imporiam para o estabelecimento de normasespecíficas – ou seja, as disposições que preordenem o conteúdo da regra legal. No último,seriam generalizações, obtidas por indução a partir das normas vigentes sobre determi-nada ou determinadas matérias. Nos dois primeiros sentidos, pois, o termo tem uma cono-tação prescritiva; no derradeiro, a conotação é descritiva: trata-se de uma “abstração porindução”.

Atualmente, aceita-se sem maior estupefação a ideia, há muito procla-

mada, de que os princípios, em especial os princípios constitucionais, nãosão meras indicações valorativas, sem poder normativo, mas sim, elementos

normativos dotados de eficácia e de aplicabilidade geral em todo o ordena-

mento jurídico.

Sob esse aspecto, encara-se os princípios como condicionantes da inter-

pretação constitucional. Alguns princípios são apontados na doutrina como

Princípios de hermenêuticadas ações constitucionais

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Princípios de hermenêutica das ações constitucionais

vocacionados à interpretação das normas constitucionais; embora não previstos

expressamente na Constituição, representam “premissas conceituais, metodoló-

gicas ou finalísticas que devem anteceder, no processo intelectual do intérprete,

a solução concreta da questão posta” (BARROSO, 2003).

Cuidando do conceito de interpretação, Celso Ribeiro Bastos (1998) aduz:

Trata-se de um processo no qual entra a vontade humana, onde o intérprete procura deter-minar o conteúdo exato de palavras e imputar um significado à norma. Nesse sentido, a inter-pretação é uma escolha entre múltiplas opções, fazendo-se sempre necessária por mais bemformuladas que sejam as prescrições legais. A atividade interpretativa busca sobretudo recons-truir o conteúdo normativo, explicitando a norma em concreto em face de determinado caso.

Acerca da interpretação jurídica, José Afonso da Silva (2003, p. 157) constata

que ela “resulta numa compreensão valorativa, num juízo de valor que não se

extrai do nada, mas, ao contrário, decorre da intuição das tendências sociocultu-rais da comunidade, e fundamenta-se nos ‘cânones axiológicos que pertencem à

ordem jurídica vigente’ ”.

Princípio da supremaciada Constituição

A ideia de que a Constituição é norma primeira, suprema e influenciadorade todo o sistema jurídico é pressuposto da interpretação constitucional. Deve

estar assente na consciência do intérprete a superioridade jurídica da Constitui-

ção sobre as demais normas, decorrente da sua posição hierárquica superior ocu-

pando o topo da pirâmide da ordem jurídica.

Como bem pontua Luís Roberto Barroso (2003, p. 313), este “princípio não tem

um conteúdo próprio: ele apenas impõe a prevalência da norma constitucional,

qualquer que seja ela”.

Visando garantir a supremacia da Constituição é que são criados os mecanis-

mos de controle de constitucionalidade, seja pela via incidental, seja pela via da

ação direta. A atuação do Poder Judiciário na defesa da supremacia constitucional

dá-se através do mecanismo de contenção do poder, no sistema de freios e con-

trapesos.

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Princípios de hermenêutica das ações constitucionais

13

Princípio da presunçãode constitucionalidade das leise dos atos do Poder Público

Embora o Poder Judiciário seja o principal intérprete das leis, a interpretação

constitucional é tarefa realizada pelos três Poderes, no âmbito de suas atribui-

ções. Deste modo, apesar de ser o Judiciário o guardião primaz da interpretação

constitucional, os Poderes Legislativo e Executivo também realizam a tarefa de

interpretar as normas constitucionais, nos limites de sua atuação.

A presunção de constitucionalidade dos atos emanados das atividades admi-

nistrativa e legislativa decorre do fato de que elas subordinam-se à Constituição,

e têm o objetivo de efetivá-la. Por essa razão, considerando a necessidade de har-monia entre os três Poderes, o Judiciário deve, dentro do possível, preservar a

interpretação levada a efeito pelo Legislativo e Executivo. A declaração judicial

de inconstitucionalidade de lei ou ato do poder público deve ser encarada como

medida de caráter excepcional, ultima ratio. Nesse sentido,

[...] o princípio da presunção de constitucionalidade [...] funciona como um fator de autodeli-mitação da atuação judicial: um ato normativo somente deverá ser declarado inconstitucionalquando a invalidade for patente e não for possível decidir a lide com base em outro fundamento(BARROSO, 2003, p. 313).

Princípio da interpretaçãoconforme à Constituição

O princípio da interpretação conforme à Constituição leva em conta as possi-

bilidades interpretativas que podem ser extraídas do texto legal. Como ressalta

Amandino Teixeira Nunes Júnior (2002):

A aplicação do princípio da interpretação conforme à Constituição só é possível quando, em facede normas infraconstitucionais polissêmicas ou plurissignificativas, existem diferentes alternati-vas de interpretação, umas em desconformidade e outras de acordo com a Constituição, sendoque estas devem ser preferidas àquelas. Entretanto, na hipótese de se chegar a uma interpre-tação manifestamente contrária à Constituição, impõe-se que a norma seja declarada inconsti-tucional.

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Princípios de hermenêutica das ações constitucionais

Segundo Luís Roberto Barroso (2003, p. 313), a interpretação conforme à Cons-

tituição pode ser entendida sob duas faces: como princípio de interpretação e

como técnica de controle de constitucionalidade.

Sobre esse princípio interpretativo, Celso Ribeiro Bastos (1998) leciona:

A interpretação conforme à Constituição é mais do que uma técnica de salvamento da lei ou doato normativo, pois ela consiste em uma técnica de decisão. Ela não é necessariamente unívoca,pois permite várias interpretações conformes à Constituição, que podem até mesmo contradi-zerem-se entre elas. O princípio da interpretação conforme à Constituição, cumpre dizer, temsido interpretado no sentido de favor legis, no plano do direito interno, e de favor conventionis,no plano do direito internacional. Ele tem como seus objetivos precípuos excluir as demais inter-pretações existentes e suprir possível lacuna da lei.

Como princípio de hermenêutica, a interpretação conforme à Constituição

decorre dos princípios da supremacia da Constituição e da presunção de cons-

titucionalidade, impondo que o aplicador da norma infraconstitucional busque,dentre as interpretações possíveis, aquela que mais se compatibilize com a Cons-

tituição.

Alexandre de Moraes (2004, p. 48-49) apresenta três hipóteses de aplicação do

princípio da interpretação conforme à Constituição:

interpretação conforme com redução do texto:

[...] ocorrerá quando for possível, em virtude da redação do texto impugnado, declarar ainconstitucionalidade de determinada expressão, possibilitando, a partir dessa exclusão de

texto, uma interpretação compatível com a Constituição Federal.

interpretação conforme sem redução do texto, conferindo à norma impug-

nada uma determinada interpretação que lhe preserve a constitucionali-

dade:

[...] quando, pela redação do texto no qual se inclui a parte da norma que é atacada comoinconstitucional, não é possível suprimir dele qualquer expressão para alcançar essa parte,impõe-se a utilização da técnica de concessão da liminar [pelo Supremo Tribunal Federal]  para a suspensão da eficácia parcial do texto impugnado sem a redução de sua expressãoliteral .

interpretação conforme sem redução do texto, excluindo da norma impug-

nada uma interpretação que lhe acarretaria a inconstitucionalidade:

[...] o Supremo Tribunal Federal excluirá da norma impugnada determinada interpretaçãoincompatível com a Constituição Federal, ou seja, será reduzido o alcance valorativo danorma impugnada, adequando-o à Carta Magna.

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Princípios de hermenêutica das ações constitucionais

15

Enquanto técnica de controle de constitucionalidade, a interpretação con-

forme à Constituição determina a exclusão de certa interpretação de uma norma

que a torne inconstitucional, funcionando como declaração de inconstitucionali-

dade parcial sem redução de texto.

José Levi Mello do Amaral Júnior (1998), colhendo lição do ministro GilmarMendes, ensina que a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução

de texto

[...] refere-se, normalmente, a casos não mencionados no texto, que, por estar formulado deforma ampla ou geral, contém, em verdade, um complexo de normas [...] – é dita “parcial” poisfulminará apenas uma – ou algumas – hipóteses de incidência do ato normativo. Tal modalidaderedunda na procedência da arguição de inconstitucionalidade.

A importância crucial do princípio da interpretação conforme à Constituição,

bem como das demais técnicas atuais de hermenêutica constitucional, é captada

por Celso Ribeiro Bastos (1998), que assim aduz:

O que se pode depreender acerca da aplicação das modernas formas de interpretação constitu-cional e precipuamente do princípio da interpretação conforme à Constituição é a comprovaçãode que a interpretação da norma constitucional é indispensável para a boa compreensão dasdemais normas que compõem o nosso ordenamento jurídico. Tendo em vista que a Constitui-ção Federal deve informar todo o conjunto do ordenamento jurídico, verifica-se que a utilizaçãodessas modernas formas de interpretação constitucional tem como objetivo evitar a criação delacunas no ordenamento jurídico decorrente da declaração de inconstitucionalidade da lei. Elasvisam sobretudo a manutenção do direito, do interesse social e o combate aos perigos da inse-gurança jurídica gerados pela exclusão da norma inconstitucional do nosso sistema jurídico.

Princípio da unidade da ConstituiçãoEm razão da noção sistêmica da ordem jurídica esta tem como pressupostos

a unidade e o equilíbrio. Todavia, é irremediável a existência de conflitos entre

algumas normas do sistema. Visando solucionar os casos de colisão de normas

infraconstitucionais, aplicam-se os clássicos critérios de hierarquia, norma poste-

rior e norma especial.Contudo, cuidando-se de hipótese de confronto de normas constitucionais

(princípios X princípios, princípios X regras, regras X regras), os critérios tradicio-

nais não são suficientes para garantir uma solução harmônica, razão pela qual se

utiliza a técnica da ponderação.

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Princípios de hermenêutica das ações constitucionais

Amandino Teixeira Nunes Júnior (2002) afirma que, segundo o princípio da

unidade da Constituição, “[...] as normas constitucionais devem ser consideradas

não como normas isoladas e dispersas, mas sim integradas num sistema interno

unitário de princípios e regras”.

Como acentua J. J. Gomes Canotilho: “O princípio da unidade da Constituiçãoobriga o intérprete a considerar a Constituição na sua globalidade e a procurar

harmonizar os espaços de tensão existentes entre as normas constitucionais a

concretizar”.

Tendo em mente que a Constituição é uma unidade, como o princípio em

comento propaga, não há hierarquia entre suas normas, devendo ser aplicada a

ponderação (harmonização de dispositivos contrapostos) e a concordância prá-

tica, como formas de preservação do princípio citado.1

Princípio da razoabilidadeou proporcionalidade

Trata-se de princípio constitucional implícito, relacionado à ideia de devido

processo legal substantivo e ao ideal de justiça. O princípio da razoabilidade visa

propiciar o controle da discricionariedade dos atos do Poder Público, atuando

como a forma pela qual uma norma deve ser interpretada para atingir o fim cons-titucional por ela visado.2

Amandino Teixeira Nunes Júnior (2002), sobre esse princípio, percebe tratar-se

de “norma essencial para a proteção dos direitos fundamentais, porque estabe-

lece critérios para a delimitação desses direitos”.

Conforme lição de Luís Roberto Barroso (2003, p. 315), por esse princípio o

Judiciário pode invalidar os atos legislativos ou administrativos, quando:

falte

adequação entre o fim visado e o instrumento empregado;

1 Nesse ponto, leitura obrigatória de Daniel Sarmento, A Ponderação de Interesses na Constituição Federal , editora Lumen Juris.

2 Leitura obrigatória sobre o tema: Celso Antonio Bandeira de Mello, Discricionariedade e Controle Jurisdicional , editora Malhei-ros.

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Princípios de hermenêutica das ações constitucionais

17

não haja necessidade para a medida empregada, havendo meio menos gra-

voso para obtenção do resultado;

não haja proporcionalidade em sentido estrito (perde-se mais do que se

ganha com a medida).

Ainda esclarecendo esses fundamentos do princípio da proporcionalidade, é

oportuna a lição de Amandino Teixeira Nunes Júnior (2002):

A adequação significa que o intérprete deve identificar o meio adequado para a consecuçãodos objetivos pretendidos. A necessidade (ou exigibilidade) significa que o meio escolhido nãodeve exceder os limites indispensáveis à conservação dos fins desejados. A  proporcionalidadeem sentido estrito significa que o meio escolhido, no caso específico, deve se mostrar como omais vantajoso para a promoção do conjunto de valores em jogo.

Aplicando-se o princípio da proporcionalidade para se obter a mitigação da

norma, o julgador não permite que esta produza um resultado não desejado pelosistema, realizando, assim, a justiça no caso concreto.

Princípio da efetividadeAlém dos planos de existência, validade, e eficácia, analisados para as normas

infraconstitucionais, as normas constitucionais podem ser estudadas num quarto

plano: o da efetividade.

Efetividade significa a realização, a atuação prática da norma, ou, como escla-

rece Luís Roberto Barroso (2003, p. 316), a “aproximação, tão íntima quanto possí-

vel, entre o dever ser  da norma e o ser  da realidade social”.

A aplicação do princípio da efetividade na interpretação constitucional impõe

que o intérprete busque, entre as possíveis interpretações, a que possibilite a

concretização da vontade constitucional, desviando-se daquelas que implicam

na não autoaplicabilidade da norma ou na ocorrência de omissão do legislador(BARROSO, 2003, p. 316).

“O princípio da máxima efetividade significa o abandono da hermenêutica tra-

dicional, ao reconhecer a normatividade dos princípios e valores constitucionais,

principalmente em sede de direitos fundamentais”, consoante observa Amandino

Teixeira Nunes Júnior (2002).

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Princípios de hermenêutica das ações constitucionais

Ampliando seus conhecimentos

 Jurisprudências

EMENTA: COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO, FISCALE TELEFÔNICO. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DE FATOS CONCRETOS. FUNDAMENTAÇÃO GENÉ-RICA. INADMISSIBILIDADE. CONTROLE JURISDICIONAL. POSSIBILIDADE. CONSEQUENTEINVALIDAÇÃO DO ATO DE “DISCLOSURE”. INOCORRÊNCIA, EM TAL HIPÓTESE, DE TRANS-GRESSÃO AO POSTULADO DA SEPARAÇÃO DE PODERES. MANDADO DE SEGURANÇADEFERIDO. A QUEBRA DE SIGILO QUE SE APOIA EM FUNDAMENTOS GENÉRICOS E QUE NÃOINDICA FATOS CONCRETOS E PRECISOS REFERENTES À PESSOA SOB INVESTIGAÇÃO CONS-TITUI ATO EIVADO DE NULIDADE. A quebra do sigilo inerente aos registros bancários, fis-cais e telefônicos, por traduzir medida de caráter excepcional, revela-se incompatível como ordenamento constitucional, quando fundada em deliberações emanadas de CPI cujosuporte decisório apoia-se em formulações genéricas, destituídas da necessária e especí-fica indicação de causa provável, que se qualifica como pressuposto legitimador da rup-tura, por parte do Estado, da esfera de intimidade a todos garantida pela Constituição daRepública. Precedentes. Doutrina. O CONTROLE JURISDICIONAL DE ABUSOS PRATICADOSPOR COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUÉRITO NÃO OFENDE O PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃODE PODERES. O Supremo Tribunal Federal, quando intervém para assegurar as franquiasconstitucionais e para garantir a integridade e a supremacia da Constituição, neutralizando,desse modo, abusos cometidos por Comissão Parlamentar de Inquérito, desempenha, demaneira plenamente legítima, as atribuições que lhe conferiu a própria Carta da República.O regular exercício da função jurisdicional, nesse contexto, porque vocacionado a fazerprevalecer a autoridade da Constituição, não transgride o princípio da separação de pode-

res. Doutrina. Precedentes. (STF, MS 25.668/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, j.26/03/2006).

EMENTA: I. Ação direta de inconstitucionalidade: L. 959, do Estado do Amapá, publicada noDOE de 30/12/2006, que dispõe sobre custas judiciais e emolumentos de serviços notariaise de registros públicos, cujo art. 47 – impugnado – determina que a “lei entrará em vigor nodia 1.º de janeiro de 2006”: procedência, em parte, para dar interpretação conforme à Cons-tituição aos dispositivos questionados e declarar que, apesar de estar em vigor a partir de1.º de janeiro de 2006, a eficácia dessa norma, em relação aos dispositivos que aumentamou instituem novas custas e emolumentos, se iniciará somente após 90 dias da sua publi-cação. II. Custas e emolumentos: serventias judiciais e extrajudiciais: natureza jurídica. É da

 jurisprudência do Tribunal que as custas e os emolumentos judiciais ou extrajudiciais têmcaráter tributário de taxa. III. Lei tributária: prazo nonagesimal. Uma vez que o caso trata detaxas, devem observar-se as limitações constitucionais ao poder de tributar, dentre estas,a prevista no art. 150, III, “c”, com a redação dada pela EC 42/03 – prazo nonagesimal paraque a lei tributária se torne eficaz. (STF, ADI 3.694/AP, Tribunal Pleno, Rel. Min. SepúlvedaPertence, j. 20/09/2006).

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Princípios de hermenêutica das ações constitucionais

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EMENTA: Habeas corpus. 1. Crime previsto no art. 331, §1.º, do Código Penal (adulteraçãode sinal identificador de veículo automotor). 2. Alegações: a) atipicidade da conduta; b) queo paciente não seria o destinatário da norma penal; e c) violação do  princípio da propor-cionalidade ou da razoabilidade. 3. Na espécie, afigura-se de todo evidente que a condutaimputada ao paciente – substituição de placas particulares de veículo automotor por placasreservadas obtidas junto ao Detran –, não se mostra apta a satisfazer o tipo do art. 311 doCódigo Penal. 4. Não há qualquer dúvida de que o órgão de controle – Detran – sabia epoderia saber sempre que se cuidava de placas reservadas fornecidas à Polícia Federal. 5.Ordem concedida para que seja trancada a ação penal contra o paciente, por não resta-rem configurados, nem em longínqua apreciação, os elementos do tipo em tese. (STF HC86.424/SP, 2.ª Turma, Rel. p/ acórdão Min. Gilmar Mendes, j. 11/10/2005).

EMENTA:  AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 187 DA LEI COMPLEMENTAR75/93. EXIGÊNCIA DE UM BIÊNIO NA CONDIÇÃO DE BACHAREL EM DIREITO COMO REQUI-SITO PARA INSCRIÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO PARA INGRESSO NAS CARREIRAS DO MINIS-TÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO. ALEGADA OFENSA AOS ARTS. 5.º, I, XIII E 37, I, DA CF. 1. A exi-

gência temporal de dois anos de bacharelado em Direito como requisito para inscrição emconcurso público para ingresso nas carreiras do Ministério Público da União, prevista noart. 187 da Lei Complementar 75/93, não representa ofensa ao princípio da razoabilidade,pois, ao contrário de se afastar dos parâmetros da maturidade pessoal e profissional a queobjetivam a norma, adota critério objetivo que a ambos atende. 2. Ação direta de inconsti-tucionalidade que se julga improcedente. (STF, ADI 1.040/DF, Tribunal Pleno, Rel. p/ acórdãoMin. Ellen Gracie, j. 11/11/2004).

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Wellington Pacheco Barros

Considerações geraisO mandado de segurança (MS) individual é uma das maiores garantias

criadas pelo Direito para proteger o cidadão da prepotência do Estado e, por

consequência, uma forma de ação de controle dos atos administrativos abu-

sivos. Por sua tamanha importância, é estudado em vários ramos do Direito,

como o Constitucional, Administrativo e Processual Civil, cada qual realçandoseus aspectos típicos.

Apesar disso, e de sua institucionalização no direito brasileiro há mais de

50 anos, o MS, em muitos aspectos, continua um instituto jurídico muito pro-

palado e pouco aprofundado.

A intenção deste texto é dimensioná-lo no seu aspecto material, especial-

mente pelas profundas modificações introduzidas pela Lei 12.016, de 7 de

agosto de 2009.

Garantia constitucionalO artigo 5.º, LXIX, da Constituição Federal (CF) reza o seguinte:

Art. 5.º [...]

LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, nãoamparado por “habeas-corpus” ou “habeas-data”, quando o responsável pela ilegalidade

ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício deatribuições do Poder Público;

Tem-se, portanto, que o MS é um remédio constitucional criado pelo legis-

lador para sanar ou evitar ato abusivo ou ilegal de uma autoridade.

Por outro lado, o controle por meio dessa ação visa sanear a Administração

de um defeito praticado por seu agente. Em consequência, não pode se cons-

tituir em determinação para obrigar que o agente público se manifeste sobre

determinada situação administrativa, porquanto, a manifestação é sempre

Mandado de segurança individual I

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Mandado de segurança individual I

da pessoa pública. Como a própria nomenclatura deixa antever, agente é aquele

que age, que se manifesta em nome da Administração Pública, já que esta, em

todos os seus segmentos de Administração direta ou indireta, é abstração jurídica

exteriorizando vontades através de pessoas físicas.

O MS surgiu como decorrência do desenvolvimento da doutrina brasileirado habeas corpus. Quando a Emenda 1.926 restringiu o uso do habeas corpus às

hipóteses de ofensa ao direito de locomoção, os doutrinadores passaram a pro-

curar outro instituto para proteger os demais direitos. Sob a inspiração do writ

norte-americano e do  juicio de amparo do direito mexicano, instituiu-se o MS (DI

PIETRO, 1996, p. 508).

O mandamus, como também é conhecido, não é a única forma de controle

da Administração. Outras formas de controle jurisdicional do ato administrativo

também podem ser utilizadas, como o habeas corpus, as cautelares, a ação popu-lar, a ação civil pública, a ADIn, o mandado de injunção etc.

Sempre que alguém sofrer ou estiver na iminência de sofrer violação em seu

direito líquido e certo por ato de autoridade é parte legitimada para impetrar MS,

seja pessoa física ou jurídica, pública ou privada. O cerne da legitimação, por-

tanto, é quanto ao direito e não quanto à pessoa de quem o detém.

Situações de não cabimento de MSA provocação ou a ação mais tradicional de controle do ato administrativo é

o MS, individual ou coletivo. Esta tem sido a via mais usada, embora em muitas

situações não seja a mais eficiente.

Existem situações nas quais não é possível impetrar-se MS:

Como substituto das ações de cobrança

  Fixemos o seguinte exemplo: um servidor público é surpreendido por atoadministrativo suspendendo o pagamento sob a alegação de recebimento

indevido de alguma vantagem e automaticamente determinando o res-

pectivo desconto em folha de pagamento. Nessa situação, o MS é o remé-

dio plenamente aplicável, ou seja, por meio dele pode se fazer cessar o des-

conto em folha e determinar a devolução das parcelas já descontadas? A

resposta é não. O MS é cabível quanto à primeira situação, mas descabido

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Mandado de segurança individual I

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quanto à segunda porquanto esta ação excepcional não se equipara à ação

de cobrança, como entendimento sufragado pelo Supremo Tribunal Fede-

ral (STF), por meio da Súmula 269 que reza:

N. 269. O mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança.

Como substitutivo de ação popular

  A ação popular, como o próprio nome sugere, é a ação típica do exercício

da cidadania em que alguém do povo busca anulação de ato administrativo

lesivo ao patrimônio público. Embora seja um instrumento forte de con-

trole da Administração Pública, sua utilização não é de muita frequência.

  A Lei 4.717/65, ao regular essa forma de controle da Administração Pública,

no seu artigo 1.º, procurou proteger além do simples limite daqueles bens

pertencentes às pessoas públicas diretas ou indiretas, para atingir tambémo patrimônio, verbis:

Art. 1.º [...] de sociedades de economia mista (Constituição, art. 141, §38), de sociedadesmútuas de seguro nas quais a União represente os segurados ausentes, de empresas públi-cas, de serviços sócios autônomos, de instituições ou fundações para cuja criação ou custeioo tesouro público haja concorrido ou concorra com mais de cinquenta por cento do patri-mônio ou da receita ânua, de empresas incorporadas ao patrimônio da União, do DistritoFederal, dos Estados e dos Municípios, e de quaisquer pessoas jurídicas ou entidades sub-vencionadas pelos cofres públicos.

  A ideia clara do legislador foi a de alcançar com o controle exercido pelaação popular o patrimônio público, fosse ele de valor econômico, artístico,

estético, histórico ou turístico.

  Diferentemente do MS, a ação popular pode ser proposta diretamente

contra os entes públicos ou assemelhados acima enunciados, contra os

agentes públicos propriamente ditos ou extensão legal ou contra uns e

outros. Caso a opção eleita seja a ação popular contra agentes públicos pro-

priamente ditos ou por extensão legal, as pessoas jurídicas públicas ou pri-

vadas que eles integram, como litisconsortes necessários que são, poderãoabster-se de contestar o pedido ou atuar ao lado do autor, por puro juízo de

conveniência e oportunidade do representante legal.

  No entanto, em que pese haja algumas similitudes com o MS, a ação popu-

lar não o substitui, consoante a Súmula 101 do STF:

N. 101. O mandado de segurança não substitui a ação popular.

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Mandado de segurança individual I

Como substitutivo de ação civil pública

  O MS não substitui a ação civil pública, de legitimidade do Ministério Público

(MP), como já decidiu o Superior Tribunal de Justiça (STJ):

MANDADO DE SEGURANÇA. AÇÃO POPULAR. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. O MS PROTEGE DIREITO

INDIVIDUAL. NÃO SUBSTITUI A AÇÃO POPULAR OU A AÇÃO CIVIL PÚBLICA. NAQUELEREALÇA O INTERESSE PARTICULAR. NESTAS, O INTERESSE PÚBLICO; O POSTULANTE SÓREFLEXAMENTE SE BENEFICIARÁ DO QUE REQUER. (MS 267, 1.º Seção, Rel. Min. Vicente Cer-nichiaro, j. 12/12/1989).

Contra lei em tese

  Após reiteradas precedentes decisões1, o STF estabeleceu a Súmula 266

que diz:

N. 266. Não cabe mandado de segurança contra lei em tese.

O ato legislativo legítimo só pode ser atacado por MS quando concreta-mente ferir direitos individuais, uma vez que é dotado de abstração e gene-

ralidade.

  A única forma de se anular uma lei pelo Poder Judiciário é por meio de

ADIn, porquanto o MS é via inidônea para tal.

Contra ato judicial recorrível

  O artigo 5.º, II, da Lei 12.016/2009 veda a possibilidade de impetração de

segurança contra decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspen-sivo. Por interpretação dedutiva, se o recurso interposto não tiver efeito

suspensivo, é cabível MS. Aliás, a nova lei consolidou entendimento do STF

manifestado através da Súmula 267 (manter transcrição)2.

  A modificação imposta pelo novo regramento do MS modificou o enten-

dimento de que não se poderia interpor a segurança contra ato judicial.

Observa-se que o legislador criou uma salvaguarda cujo maior beneficiário

é a Administração Pública, circunstância que é repetida em vários momen-

tos, como se verá mais adiante.

1 Precedentes: MS 9.077, DJ de 23/08/1962; RMS 9.973, DJ de 06/09/1962; MS 10.287, DJ de 27/06/1963; RE 351, DJ de29/08/1963.

2 RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. NÃO CABIMENTO DE MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA DECISÃOMONOCRÁTICA PASSÍVEL DE RECURSO. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO IMPROVIDO. Não merece prosperar o pedido dereforma de acórdão, prolatado em agravo regimental pelo Superior Tribunal de Justiça, mantenedor da decisão agravada, a qualnegara seguimento ao MS impetrado contra decisão monocrática de ministro, passível de recurso próprio. Súmula 267 destaCorte. Recurso improvido. (STF, RMS 27.071, 2.ª Turma, Rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 04/12/2004).

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Mandado de segurança individual I

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Contra ato que caiba recurso administrativo com efeito suspensivo

  O artigo 5.º, I, da Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009, introduziu uma novi-

dade quanto às situações de não cabimento de MS. Trata-se da situação em

que há previsão legal de cabimento de recurso administrativo com efeito

suspensivo, independentemente da exigência de caução.

A vedação vem realçar o artigo 5.º, LV, da CF que outorga ao processo admi-

nistrativo força de garantia fundamental.

Contra decisão judicial transitada em julgado

  O artigo 5.º, III, da Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009 inovou quando esta-

beleceu ser impossível a concessão de MS contra decisão judicial transi-

tada em julgado. A questão é apenas aparentemente óbvia. Isso porque,

embora minoritária, o certo é que há jurisprudência entendendo que, se adecisão judicial transitou em julgado, mas o fundamento em que se baseou

era ilegal, por aplicação da doutrina de que a ilegalidade gera a nulidade

absoluta de efeito ex tunc, caberia MS.

Contra ato de gestão comercial

  O artigo 1.º, parágrafo 2.º, da Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009, pondo fim

a uma discussão doutrinária e jurisprudencial intensa, especificou que não

cabe MS contra atos de gestão comercial praticados pelos administradores

de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessioná-ria de serviço público.

  Ocorre que as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as

concessionárias de serviços públicos só integram o conceito de adminis-

tração pública quando praticarem atribuições típicas de poder público. No

mais, são pessoas jurídicas de direito privado, portanto, os atos que prati-

cam são atos de gestão comercial.

Quem pode praticar a ilegalidadeou o abuso de poder?

Vários agentes públicos podem ser autoridade coatora na ação de MS. Entre

eles, podem ser nominados como:

agentes políticos – Presidente da República, ministros de Estado, sena-

dores, deputados, ministros de tribunais superiores, governadores, depu-

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Mandado de segurança individual I

tados estaduais, desembargadores, secretários de Estado, prefeitos muni-

cipais, vereadores, magistrados e secretários municipais, sempre que

representando a Administração Pública. O parágrafo 1.º, do artigo 1º, da Lei

12.016/2009 legitimou na categoria de agente político os representantes

ou órgãos dos partidos políticos e os administradores de entidades autár-

quicas.

agentes administrativos  – servidor público e empregado público no exer-

cício de suas atribuições;

particulares no exercício de atribuições delegadas pelo Poder Público  

– concessionários, permissionários e autorizatários de serviços públicos.

Além destes, são considerados autoridades para efeito de mandado de

segurança os dirigentes de pessoas jurídicas ou de pessoas naturais no

exercício de atribuições do poder público, somente no que disser respeito

a essas atribuições, consoante dicção do artigo 1.º, parágrafo 1.º, da Lei12.016/2009.

O controle judicial dos atos administrativos não se limita aos atos de pessoas

públicas. Seus agentes também estão sujeitos a esse controle, não na mesma ple-

nitude, porém por meio de forma especial de tutela, como é ação mandamental.

Para melhor compreensão, deve-se tecer algumas considerações do que venha a

ser órgão público, agente público e serviço público delegado.

O órgão é aquela parcela de poder da pessoa jurídica pública, resultante de sua

divisão por força de lei. Tem como objetivo fazer com que a Administração alcance

uma maior operacionalidade. É o fracionamento administrativo a que é subme-

tido todo ente jurídico público para atingir com maior eficiência o bem comum.

Embora durante muito tempo a doutrina e a jurisprudência tenha se entendido

que o órgão não tinha legitimidade passiva no MS, o artigo 1.º, parágrafo 1.º, da

Lei 12.016/2009 criou a exceção a esse entendimento ao estabelecer que órgãos

de partidos políticos poderiam ser equiparados a autoridades coatoras.

O agente,  por sua vez, na estrutura tipicamente administrativa, é a pessoa

física que age e movimenta a Administração. A ação nunca é pessoal, porquantoquem em verdade se manifesta é a pessoa jurídica pública por meio de seu órgão.

O agente público é a autoridade coatora para fins de MS. Por isso, dirigir a peça

mandamental contra pessoa jurídica de Direito Público é vício insanável, enseja-

dor de indeferimento da peça inicial.

Os atos decorrentes de órgãos colegiados, como Mesa Diretora da Câmara e

do Senado, das Assembleias Legislativas e das Câmaras Municipais ou análogos,

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Mandado de segurança individual I

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não são enquadráveis como atos de autoridade coatora para fins de MS. Como

os atos emitidos são complexos, ou seja, não se executam por si mesmos, depen-

dem de vontade de outro agente público para que tomem vida jurídica. Só violam

direito líquido e certo se manifestados pela pessoa daquele que executa ou pre-

side o órgão coletivo.

Questão delicada diz respeito aos serviços públicos delegados, uma manifes-

tação de conveniência e necessidade do repasse ao particular a execução de ser-

viços públicos.

A delegação tanto pode recair em uma pessoa física quanto jurídica. Em ambas,

o serviço continua sendo estatal, ou seja, a relação entre o prestador do serviço

e o administrado não configura uma relação civil, sendo tutelado pelo Direito

Administrativo. O executor privado do serviço público delegado é o legitimado

passivo na ação mandamental, pois pratica atos públicos, passíveis de controlepelo Judiciário. A matéria inclusive já fora sumulada pelo STF:

N. 510. Praticado o ato por autoridade, no exercício de competência delegada, contra ela cabemandado de segurança ou a medida judicial.

Situações novas foram criadas pela Lei 12.016/2009 dimensionando de forma

mais abrangente o conceito de autoridade coatora para fins de MS.

A primeira dessas novidades é estratificada no artigo 2.º quando salienta que

se deverá considerar como federal a autoridade coatora se as consequências de

ordem patrimonial do ato contra o qual se requer o mandado houverem de ser

suportadas pela União ou entidade por ela controlada.

A segunda novidade é a do artigo 3.º que estabelece que o titular de direito

líquido e certo decorrente de direito, em condições idênticas, de terceiro poderá

impetrar MS a favor do direito originário, se o seu titular não o fizer, no prazo de

30 (trinta) dias, quando notificado judicialmente. O parágrafo único deste mesmo

artigo afirma que o exercício do direito previsto no caput  do artigo submete-se ao

prazo fixado no artigo 23 da Lei, contado da notificação.

MS como formade controle da Administração Pública

Como já mencionado, há formas de controle para que sejam fiscalizados os

atos da Administração Pública, e o MS é uma delas.

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Mandado de segurança individual I

Não se discute na doutrina se o Poder Judiciário pode ou não exercer o controle

sobre os atos praticados pela Administração Pública. A questão que se impõe é

em relação à extensão desse controle, uma vez que a conduta do administrador

tem que se pautar, às vezes, com pouca ou nenhuma eficácia; no mais das vezes

pela relação política dos agentes administrativos que integram esses organismos

de controle interno como os agentes que dão voz aos atos públicos.

O certo é que o Poder Judiciário, por seu poder coativo, é o verdadeiro subter-

fúgio do questionamento das ações do administrador.

Entretanto, o poder de controle dos atos administrativos pela via judicial

encontra limites. Como se sabe, ao Judiciário é vedado analisar o mérito admi-

nistrativo, seja na conveniência ou na oportunidade, sob pena de ingerência no

poder alheio, o que violaria o princípio da independência dos poderes.

O  princípio da eficiência, de outro lado, ajuda a mitigar tal premissa, pelo sub-

 jetivismo que o traz relacionado. Assim, como dizer-se que essa ou aquela mani-

festação de Administração Pública é válida e foi ditada de forma suficiente, se

não analisado seu mérito? Nessa situação, o Judiciário deve enfrentar a questão

em todos os seus contornos subjetivos. Somente a prova que reveste a estrutura

material do ato que esclarecerá.

Há necessidade de fixar-se a extensão do ato coator.

O ato da autoridade é ato jurídico especial conhecido como ato administrativo.É a manifestação de vontade da Administração. Por ele, o Poder Público extingue,

cria ou modifica direitos, consoante os princípios esculpidos no artigo 37 da CF.

O ato atentador de tais cânones constitucionais acaba por não integrar o universo

da Administração Pública. Por sua vez, o writ  é o antídoto para curar esse mal jurí-

dico no nascedouro.

É possível concluir que o ato de autoridade para efeito de MS, além daquela

manifestação específica da autoridade pública direta ou indireta, ou ainda o par-

ticular revestido nessa função, contra alguém, pode ser também caracterizadono ato do superior hierárquico, e não de seu subordinado, quando este apenas

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cumpre ordens; na lei, no regulamento, nos regimentos, nas portarias, nas circula-

res, nas instruções, nos editais, desde que produzam efeito material concreto res-

tringindo direito de qualquer pessoa. Até o ato jurisdicional quando inexistente

previsão recursal, desde que calcado em ilicitude, de forma excepcional, pode

caracterizar ato de autoridade passível de controle por MS.

MS preventivoAlém da possibilidade da autoridade dita coatora praticar ato lesivo ou

abusar de poder, caberá a impetração de mandando de segurança. Tais hipóte-

ses são comissivas, pois exigem um agir da administração. Entretanto, a lei prevê

uma hipótese em que o ato ainda não fora praticado pelo Poder Público – uma

expectativa de ato – quando houver justo receio do sofrimento de uma ilegali-

dade. É nesse caso que há permissão da impetração de MS preventivo.

Mas não deve haver um risco singelo de lesão ao direito líquido e certo do

impetrante. Deve haver uma real e efetiva ameaça comprovada ou, ao menos,

indícios da iminência da ilegalidade.

Evidente que se ainda não há coação, o MS preventivo não pode ser atingido

pelo instituto da decadência, consoante reiteradas decisões do STJ.3

E não é por ser de caráter preventivo que a lei dispensa o impetrante de provar

a efetiva ameaça de seu direito líquido e certo bem como de demonstrar a pre-sença dos requisitos do fumus boni iuris e do  periculum in mora, sob pena de seu

indeferimento.

Como no MS comum, o mandado mandamus  preventivo deve vir acompa-

nhado de prova pré-constituída porquanto a natureza do rito – sumário – não

permite instrução elástica.

Nesse sentido, reiteradas as decisões do STJ:

ADMINISTRATIVO. CERTIFICADO DE ENTIDADE DE FINS FILANTRÓPICOS. CANCELAMENTO.RECURSO ADMINISTRATIVO. REVISÃO DE ATO ADMINISTRATIVO EIVADO DE NULIDADE. ART. 53DA LEI 9.784/99. MS. DENEGAÇÃO DA ORDEM.

[...]

3 PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. CABIMENTO. FIM SOCIAL. COMPENSAÇÃO. DIREITO DECORRENTE DA INCONSTI-TUCIONAL MAJORAÇÃO DE ALÍQUOTA. DECADÊNCIA.1. O mandado de segurança, segundo jurisprudência desta Corte (Primeira Seção), é usado com efeito declaratório tão somente.Tese jurídica, sobre a qual guardo reservas.2. Em se tratando de writ  preventivo, não há que se falar em decadência. Precedentes da Corte. 3. Recurso especial provido. (STJ,REsp 707.490, 2.ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, j. 14/03/2006).

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Mandado de segurança individual I

3. Ademais, se o recurso administrativo não é cabível – como se alega – não se pode presumirque a autoridade impetrada vá recebê-lo, ou acolhê-lo. Não se pode presumir que autoridadepública vá praticar uma ilegalidade. Não cabe mandado de segurança preventivo, base-ado na presunção – sem qualquer fundamento de ordem objetiva a indicar isso – que aautoridade impetrada irá tomar uma decisão contra a lei. Em casos tais, presente o prin-cípio da legitimidade dos atos da administração, não se pode considerar presente uma

ameaça a direito da impetrante. 4. Segurança denegada. (MS 9.406, 1.ª Seção, Rel. Min. TeoriZavascki, j. 13/04/2005). (grifo nosso)

CONSTITUCIONAL. COMPOSIÇÃO DE TRIBUNAL. PREENCHIMENTO DE VAGAS DE DESEMBAR-GADOR. LISTA DE ANTIGUIDADE. ATUALIZAÇÃO. PUBLICAÇÃO. DIREITO LÍQUIDO E CERTO.AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA. MANDADO DE SEGURANÇA.

1. O caráter preventivo da impetração não afasta a necessidade de que sejam efetiva-mente demonstradas a certeza e a liquidez do direito em tese ameaçado.

2. O direito invocado, para ser amparado, há que vir expresso em norma legal, e trazer emsi todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante.

3. Ao apreciar a ADIn 189-2/RJ, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade daResolução 03/89 – TJ/RJ. Ilegalidade que não se reconhece.

4. Recurso em MS conhecido, mas não provido. (RMS 12.445, 5.ª Turma, Rel. Min. Edson Vidigal, j. 21/06/2001). (grifo nosso)

Esses são os principais aspectos materiais do MS.

ConclusãoMS é ação constitucional de controle do ato administrativo abusivo.

Ampliando seus conhecimentosIndicamos a leitura da obra abaixo:

Código de Processo Civil Comentado: legislação processual civil e extravagante,de Nelson Nery Junior, editora Revista dos Tribunais.

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Wellington Pacheco Barros

Considerações geraisO mandado de segurança (MS) é ação constitucional de garantia que

busca controlar os atos abusivos da Administração Pública.

Originária do direito comparado, entre nós, sua evolução histórica teve

início com o habeas corpus, consolidada em 1951 como estrutura típica.O MS, apesar de usualmente ser impetrado como remédio para todos os

males administrativos, no entanto, tem limitações, já que não pode ser subs-

titutivo de ação de cobrança, de ação popular, de ação civil pública ou de

recurso judicial, entre outros.

A proposta deste texto é estudar o MS na sua forma processual.

Regulamentação legalA base legal do MS é a Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009, que revogou

expressamente a Lei 1.533/51.

Quem é o autor do MS?O autor do MS é sempre aquele que sofrer ou estiver na iminência de sofrer

violação em seu direito líquido e certo por ato de autoridade, seja pessoa

física ou jurídica, pública ou privada.

Por estar dotado de uma relação entre o Estado e o indivíduo, objetivando

uma tutela jurisdicional para neutralizar o ato – e não uma relação de Direito

Privado para resolver uma questão entre particulares – o MS não se afasta da

grande esfera do Processo Civil, embora seja uma ação constitucional.

Sendo assim, a capacidade ativa para impetração do MS está imbricada

aos requisitos subjetivos do Código de Processo Civil (CPC), ressalvadas as

peculiaridades da ação.

Mandado de segurança individual II

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Mandado de segurança individual II

Assim, os absolutamente capazes e os relativamente incapazes podem valer-se

desse remédio constitucional, desde que representados e assistidos, respectiva-

mente.

As pessoas jurídicas serão representadas pelos administradores ou por aque-

les a quem os estatutos conferirem poderes de representação, lembrando-se que

há existência da controvérsia envolvendo a necessidade de haver a AssembleiaGeral ou não para o ajuizamento da medida. Frise-se que os direitos dos filiados

dos órgãos associativos nunca podem ser confundidos com interesses eventual-

mente escusos da direção das entidades.

Se a violação a direito líquido e certo atingir diretamente a entidade, seus

representantes legais podem votar a garantia judicial, mas não o podem a título

da defesa de alguns, se só sobre eles recair o malgrado. Até porque o direito de

impetração do mandado é indelegável.

O Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu que o brasileiro domiciliado noexterior tem legitimidade para impetrar o MS.

Da mesma forma, a pessoa jurídica de Direito Público detém capacidade de ser

parte ativa na ação mandamental.

O locatário possui legitimidade ativa para impetrar MS contra o Fisco, em caso

de inércia do locador.

Da mesma forma, o agente do Ministério Público (MP) pode ajuizar demanda

mandamental quando houver interesse na defesa de interesses difusos oucoletivos.1-2O terceiro interessado também pode ajuizar MS em processo em que

não é parte, desde que tenha direito seu ameaçado.3

1 ADMINISTRATIVO. ENSINO INFANTIL. CRECHE PARA MENORES. MANDADO DE SEGURANÇA. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO.1. Tem o Ministério Público legitimidade para, via ação mandamental, requerer o cumprimento de políticas sociais.2. Hipótese em que a pretensão mandamental não pode ser seguida pela específica determinação.3. Recurso especial improvido. (STJ, REsp 503.028, 2.ª T., Rel. Min. Eliana Calmon, j. 20/04/2004)2 MANDADO DE SEGURANÇA. PROMOTOR DE JUSTIÇA. LEGITIMIDADE PARA PROPOR MS CONTRA ATO DO JUIZ DE DIREITO.RECURSO PROVIDO. (STJ, RMS 8.026, 4.ª T., Rel. Min. Bueno de Souza, j. 06/04/1999).3 PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. IMPETRAÇÃO POR TERCEIRO PREJUDICADO. CABIMENTO. SÚMULA 202/STJ.IMPETRAÇÃO POR EMPRESA PÚBLICA FEDERAL CONTRA ATO PRATICADO POR JUIZ ESTADUAL, EM PROCESSO DE INVENTÁRIO.COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL.

1. As decisões proferidas em inventário – como em qualquer processo, de jurisdição voluntária ou contenciosa – só vinculam as pes-soas que dele participam. Não ficam a elas submetidas os terceiros eventualmente prejudicados (CPC, art. 472 e 584, parágrafo único).2. Na condição de gestora do FGTS (Lei 8.036/90, art. 4.º), a Caixa Econômica Federal não está necessariamente vinculada adecisões, proferidas em processo de inventário, quando prejudiciais aos interesses do referido Fundo. Situa-se, quando issoocorre, na condição de terceiro prejudicado e, como tal, tem a faculdade de se opor àquelas decisões, utilizando-se, entre outrosinstrumentos, do mandado de segurança. O recurso do terceiro prejudicado (CPC, art. 499) não é via única para esse fim, nem évia obrigatória (Súmula 202/STJ) [...] (STJ, RMS 18.172, 1.ª T., Rel. Min. Teori Zavascki, j. 21/09/2004).

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Mandado de segurança individual II

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De forma inovadora na legislação, embora amplamente aceita na doutrina e

na jurisprudência, o artigo. 1.º, parágrafo 3.º, da Lei 12.016/2009 estabeleceu que,

se o direito ameaçado ou violado couber a várias pessoas, qualquer delas poderá

ser autor de MS.

No entanto, o artigo 10, parágrafo 2.º, estabeleceu que litisconsorte ativo nãoserá admitido após o despacho da petição inicial.

Quem pode ser a autoridade pública coatora?Os legitimados passivos na ação de MS são todos os agentes públicos que

podem praticar a ilegalidade ou o abuso de poder no exercício de seu ofício.

Considera-se autoridade coatora a pessoa que ordena ou omite a prática do

ato impugnado e não o superior que o recomenda ou baixa normas para a suaexecução. Coator  é a autoridade superior que pratica ou ordena concreta e espe-

cificamente a execução ou inexecução do ato impugnado, e responde pelas suas

consequências administrativas (MEIRELLES, 1989, p. 34).

São eles:

agentes políticos  – Presidente da República, ministros de Estado, senadores,

deputados, ministros de tribunais superiores, governadores, deputados esta-

duais, desembargadores, secretários de Estado, prefeitos municipais, vere-

adores, magistrados e secretários municipais, sempre que representando a

Administração Pública. O parágrafo 1.º do artigo 1.º da Lei 12.016/2009 legi-

timou na categoria de agente político os representantes ou órgãos dos parti-

dos políticos e os administradores de entidades autárquicas;

agentes administrativos  – servidor público e empregado público no exer-

cício de suas atribuições;

particulares no exercício de atribuições delegadas pelo Poder Público

–  além dos concessionários, permissionários e autorizatários de serviços

públicos, são considerados autoridades para efeito de mandado de segu-rança os dirigentes de pessoas jurídicas ou de pessoas naturais no exercício

de atribuições do poder público, somente no que disser respeito a essas atri-

buições, consoante dicção do artigo 1.º, parágrafo 1.º, da Lei 12.016/2009.

E para não deixar dúvida, o parágrafo 3.º do artigo 6.º da Lei 12.016/2009 diz

que considera-se autoridade coatora aquela que tenha praticado o ato impug-

nado ou da qual emane a ordem para a sua prática.

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Mandado de segurança individual II

Conceito de direito líquido e certoO controle jurisdicional dos atos administrativos por meio da ação de MS pres-

supõe, como requisitos objetivos, a demonstração pelo impetrante de seu direito

líquido e certo e, como requisitos subjetivos, a existência de fundamento rele-

vante e de perigo ao direito do impetrante que a demora pode causar.

Direito líquido é o que se apresenta demonstrado, provado; não necessita ser

aclarado em dilação probatória; é o direito pronto. Certo  é o direito bom, que

não desperta dúvida; que está isento de obscuridade. Antes chamavam-se esses

elementos de direito certo e incontestável. Di Pietro (1996, p. 510) denomina de

“direito comprovado de plano”.

Não demonstrados com a inicial tais elementos, esta deve ser indeferida, caso

em que, se ainda não houver transcorrido o prazo decadencial de 120 dias, podeser repetido o pedido.

Por óbvio que o preenchimento das condições objetivas para a propositura da

ação não vincula a decisão do julgador, pela discricionariedade que lhe é atribu-

ída pela Constituição, desde que motive o seu sentir.

Mas não só, deve ele reconhecer que o ato impugnado, se não suspenso, pode

resultar na ineficácia da própria ação de MS.

É possível a autoridade apontada como coatora impetrar outro MS contra limi-nar concedida em MS? Não, por dois motivos: a ação é dirigida contra ato ilegal de

agente público e este não tem legitimidade postulatória.

Ponto forte da inicial do MSO ponto forte da peça de abertura do MS é, sem dúvida, a parte da narrativa do

fato ilegal ou praticado com abuso de poder. É indispensável que se esclareçamos fatos para que não pairem dúvidas a respeito da delimitação do que se está

discutindo no processo.

Embora se aplique a máxima narra mihi factum dabo tibi ius, é recomendável

que o impetrante exponha suas razões de direito de forma a convencer o magis-

trado de sua insurgência.

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Mandado de segurança individual II

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Vale ressaltar que é extremamente indispensável que a narrativa do fato ilegal

ou praticado com abuso de poder venha acompanhada dos documentos neces-

sários a corroborar suas afirmativas. É o que se chama de prova pré-constituída

ou inequívoca, porquanto a via mandamental não admite espaço para qualquer

atividade probatória. Se eventualmente for necessária a sua produção, o juiz inde-

fere inicial e manda que o impetrante procure as vias ordinárias para buscar o seu

direito.

Há de se distinguir a complexidade dos fatos e do tema de direito daquelas

situações que não prescindem da abertura da fase de instrução. Se o caso está

compreendido no campo da referida dificuldade, nem por isso o MS exsurge

como via imprópria, impondo-se o julgamento do mérito. Somente em defron-

tando-se o órgão julgador com quadro a exigir elucidação de fatos cabe dizer da

impertinência da medida, sinalizando no sentido do ingresso em juízo medianteação ordinária (NERY JUNIOR, 2003, p. 1.599).

É necessário provar se houver matéria controvertida de direito, o que não

pode haver é a controvérsia da matéria fática. Exceção: requisição a pedido da

parte ou de ofício pelo juiz de documentos essencias para o julgamento que se

encontram em poder da autoridade coatora, aos quais o impetrante não teve

acesso, como se fora um pedido incidental de exibição de documentos (Lei 1.533,

art. 6.º, parágrafo único).

A petição inicial, no que couber, também deverá preencher os requisitos

essenciais elencados pelo CPC, especialmente se observando se quem praticou

o ato possui prerrogativa de foro, sob pena de extinção da peça de plano. Outros-

sim, diferente do habeas corpus, em que o próprio paciente pode impetrá-lo em

nome próprio, o MS exige a representação de advogado regularmente inscrito

na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Melhor especificando o que já dizia a lei anterior, a Lei 12.016/2009, no seu

artigo 4.º, caput , estabeleceu que em caso de urgência, será permitido, desde

que observados os requisitos legais, se impetrar mandado de segurança por

telegrama, radiograma, fax ou outro meio eletrônico de autenticidade com-

provada. Nesta última situação deverá ser observado o que dispõe o ICP-Brasil

(Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira), conforme prescrição do parágrafo

3.º do mencionado artigo.

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Mandado de segurança individual II

A excepcionalidade admitida para a interposição do MS, por essa forma, con-

diciona que o texto original da petição seja apresentado nos 5 (cinco) dias úteis

seguintes, conforme determinação expressa do parágrafo 2.º da Lei citada.

Novidade imposta pelo artigo 6.º da Lei 12.016/2009 é a de que a petição

inicial do MS, além de preencher os requisitos estabelecidos pela Lei processual,como já referido, será apresentada em 2 (duas) vias com os documentos que

instruírem a primeira reproduzidos na segunda e indicará, além da autoridade

coatora, a pessoa jurídica que esta integra, à qual se acha vinculada ou da qual

exerce atribuições. Essa é uma das grandes novidades que será analisada em

tópico próprio.

Ademais, segundo parágrafo 1.º do mesmo artigo 6.º, no caso em que o docu-

mento necessário à prova do alegado se ache em repartição ou estabelecimento

público ou em poder de autoridade que se recuse a fornecê-lo por certidão ou deterceiro, o juiz ordenará, preliminarmente, por ofício, a exibição desse documento

em original ou em cópia autêntica e marcará, para o cumprimento da ordem, o

prazo de 10 (dez) dias. Atendida a determinação judicial, o escrivão extrairá cópias

do documento para juntá-las à segunda via da petição.

Por fim, ainda realçando a inicial do MS, diz o também artigo 6.º, parágrafo 2.º

que se a autoridade que tiver procedido dessa maneira for a própria coatora, a

ordem far-se-á no próprio instrumento da notificação.

Decisão judicial liminarAo despachar a inicial, o magistrado tomará dois tipos de decisões.

Na primeira delas, a decisão será meramente ordenatória e determinará: (I) –

que se notifique o coator do conteúdo da petição inicial, enviando-lhe a segunda

via apresentada com as cópias dos documentos, a fim de que, no prazo de 10

(dez) dias, preste as informações; (II) que se dê ciência do feito ao órgão de repre-

sentação judicial da pessoa jurídica interessada, enviando-lhe cópia da inicial

sem documentos, para que, querendo, ingresse no feito, consoante disposição

expressa do artigo 7.º, I e II, da Lei 12.016/2009.

Mas é na segunda que o juiz analisará o pedido de liminar do autor. Assim ele

pode:

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Mandado de segurança individual II

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Conceder a liminar

Tal hipótese ocorre quando provado o direito líquido e certo pelo impetrante,

mas não só isso, deve haver uma necessidade desse direito ser protegido imedia-

tamente, de modo que a espera pelo seu deferimento final possa ocasionar dano

irreparável ou de difícil reparação ao impetrante.

Há mandados de segurança em que a própria medida liminar sem a ouvida

da parte contrária é o objeto da ação, ou seja, se for protelado seu exame para

quando da análise do mérito, a ação perde seu objeto.4

A grande novidade introduzida pelo artigo 7.º, III, da Lei 12.016/2009 é a de

que ficou facultado ao juiz exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com o

objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica. Embora este dispositivo

seja mais um daqueles que a nova lei criou para nitidamente proteger a Adminis-tração Pública, tenho que, ficando caracterizada a existência de direito líquido e

certo do impetrante, tal exigência será não razoável.

Tornando expressa uma situação que já era admitida na doutrina e na jurispru-

dência por aplicação do princípio da preclusão, o parágrafo 3.º, do artigo 7.º da Lei

12.016/2009 estabeleceu que os efeitos da medida liminar, salvo se revogada ou

cassada, persistirão até a prolação da sentença.

E, como forma de preocupação com a Administração Pública, o parágrafo 4.º

do mesmo dispositivo citado afirmou que, se deferida a medida liminar, o pro-cesso terá prioridade para julgamento.

Mas, segundo o artigo 8.º da Lei em referência, será decretada a perempção

ou caducidade da medida liminar ex officio ou a requerimento do MP quando,

concedida a medida, o impetrante criar obstáculo ao normal andamento do pro-

cesso ou deixar de promover, por mais de 3 (três) dias úteis, os atos e as diligências

que lhe cumprirem.

4 RECURSO EM MS. REALIZAÇÃO DE CURSO DE APERFEIÇOAMENTO. CONSUMAÇÃO. PERDA DO OBJETO.I - Impetrado o mandamus visando à participação em curso de aperfeiçoamento, a superveniência de conclusão do respectivocurso, em relação ao qual o recorrente participou sob o pálio de liminar anteriormente concedida, conduz a extinção do writ  por falta de interesse processual superveniente, em face do fato consumado.II - Ausente a utilidade do writ , requisito que, juntamente com a necessidade da tutela compõe o interesse de agir, impõe-se aextinção do processo sem análise de mérito.III - Recurso ordinário desprovido. (STJ, RMS 17.460, 2.ª T., Rel. Min. Félix Fischer, j. 07/03/2006).

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Mandado de segurança individual II

E por fim, ainda como consequência do deferimento liminar do MS, consoante

o artigo 9.º da Lei 12.016/2009, as autoridades administrativas, no prazo de 48

(quarenta e oito) horas da notificação da medida liminar, remeterão ao Ministé-

rio ou órgão a que se acham subordinadas e ao Advogado-Geral da União ou

a quem tiver a representação judicial da União, do Estado, do Município ou da

entidade apontada como coatora, cópia autenticada do mandado notificatório,

assim como indicações e elementos outros necessários às providências a serem

tomadas para a eventual suspensão da medida e defesa do ato apontado como

ilegal ou abusivo de poder.

Negar a liminar

O juiz poderá entender que não há urgência no deferimento da medida e

assim denegará a liminar.No entanto, mesmo que seja caso de cabimento de liminar esta não poderá

ser concedida por força de proibição expressa do parágrafo 2.º do artigo 7.º da

Lei 12.016/2009 quando tenha por objeto a compensação de créditos tributá-

rios, a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação

ou equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão

de vantagens ou pagamento de qualquer natureza. Aliás, aproveitando indevida-

mente o veículo processual específico, o legislador ampliou essa proibição para

as outras ações de controles quando determinou, no parágrafo 5.º do artigo 7.º da

referida Lei, que as vedações relacionadas com a concessão de liminares previstas

no artigo se estenderiam à tutela antecipada a que se referem os artigos 273 e

461 do CPC.

Extinguir o processo

A inicial será desde logo indeferida e o processo extinto, por decisão motivada,

quando não for o caso de MS ou lhe faltar algum dos requisitos legais ou quando

decorrido o prazo legal para a impetração.

Além desses casos específicos de extinção do MS sem julgamento do mérito

também ele será denegado nos casos previstos pelo artigo 267 do CPC.

Em qualquer dessas situações novo pedido de MS poderá ser renovado dentro

do prazo decadencial, consoante previsão expressa do parágrafo 6.º, do artigo 6.º

da Lei 12.016/2009.

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Mandado de segurança individual II

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Recursos da decisão judicial liminarSuprindo uma lacuna legislativa e espancando uma dúvida tormentosa na

doutrina e na jurisprudência, o parágrafo 1.º do artigo 7.º da Lei 12.016/2009 deforma incisiva disse que da decisão do juiz de primeiro grau que conceder ou

denegar a liminar caberá agravo de instrumento, observado o disposto na Lei5.869, de 11 de janeiro de 1973, do CPC. O entendimento anterior era de que nãocabia esse tipo de recurso.

E a lei, excepcionando o princípio da unicidade recursal, ainda estabeleceu

no seu artigo 15, que, a requerimento de pessoa jurídica de direito público inte-ressada ou do MP e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e àeconomia públicas, o presidente do tribunal ao qual couber o conhecimento do

respectivo recurso poderá suspender, em decisão fundamentada, a execução da

liminar e da sentença, cabendo dessa decisão agravo, sem efeito suspensivo, noprazo de 5 (cinco) dias, que será levado a julgamento na sessão seguinte à sua

interposição.

E, se indeferido o pedido de suspensão ou provido o agravo a que se refere ocaput  deste artigo, caberá novo pedido de suspensão ao presidente do tribunal

competente para conhecer de eventual recurso especial ou extraordinário.

De forma pragmática e quebrando o equilíbrio de partes no processo, o legis-lador ainda determinou no parágrafo 2.º do referido artigo 7.º da Lei 12.016/2009

que será cabível também o pedido de suspensão quando negado provimento aoagravo de instrumento interposto contra a liminar.

E para não deixar dúvida, o parágrafo 3.º do mesmo artigo ainda afirmou que a

interposição de agravo de instrumento contra liminar concedida nas ações movi-das contra o poder público e seus agentes não prejudica nem condiciona o julga-mento do pedido de suspensão.

Ainda de forma inovadora, o parágrafo 4.º do artigo em comento, o presidente

do tribunal poderá conferir ao pedido efeito suspensivo liminar se constatar, em juízo prévio, a plausibilidade do direito invocado e a urgência na concessão da

medida.

E, por fim, utilizando-se do princípio da repercussão geral, o parágrafo 5.º doreferido artigo afirmou que as liminares cujo objeto seja idêntico, poderão ser

suspensas em uma única decisão, podendo o presidente do tribunal estender osefeitos da suspensão a liminares supervenientes, mediante simples aditamentodo pedido original.

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Mandado de segurança individual II

Resposta da autoridade coatora e do ente públicoComo já se pode observar, ao despachar a inicial o juiz determinará que a auto-

ridade coatora seja notificada para que em 10 (dez) dias preste informações.

Relevante e pertinente é que agora, por força da Lei 12.016/2009, a pessoa jurídica, a que a autoridade coatora integra e se encontra vinculada ou a qual

exerce atribuições, também deverá ser cientificada. Portanto, diferentemente do

prazo para a manifestação da autoridade coatora, o ente público terá apenas 72

(setenta e duas) horas. Aqui não se aplica o prazo excepcional do artigo 188 do

Código de Processo Penal.

Providências cartoráriasEmbora as providências cartórias tenham previsão no CPC, o artigo 11 da

Lei 12.016/2009 tratou de regrar de forma específica quando disse que, feitas as

notificações, o serventuário em cujo cartório corra o feito juntará aos autos cópia

autenticada dos ofícios endereçados ao coator e ao órgão de representação judi-

cial da pessoa jurídica interessada, bem como a prova da entrega a estes ou da

sua recusa em aceitá-los ou dar recibo e, no caso do artigo 4º da Lei (impetração

de MS por telegrama, radiograma, fax ou outro meio eletrônico), a comprovação

da remessa.

A lei também impôs determinação ao serventuário responsável quando afir-

mou que, não havendo manifestação do MP no prazo de 10 (dez) dias, diligências

deverão ser praticadas para que os autos do processo sejam conclusos ao juiz,

para a decisão, a qual deverá ser necessariamente proferida em 30 (trinta) dias,

conforme se observa no parágrafo único do artigo 12 da referida Lei.

Presença obrigatória do MP

A presença do MP na ação de segurança, como fiscal da lei, assim como emcertas ações, é indispensável e imprescindível, mormente quando o interesse

público é relevante, sob pena de nulidade do processo.

Cumpre registrar que não basta a simples intimação do agente ministerial

para que seja suprida a formalidade. É imperioso que haja sua manifestação,

abordando a questão de fundo, em que pese a existência de posicionamento

contrário.

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Mandado de segurança individual II

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A questão da obrigatoriedade de sua presença nessa via é pacífica no STJ:

MANDADO DE SEGURANÇA. MANIFESTAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. OBRIGATORIEDADE.OBSERVÂNCIA DO PRAZO DO ART. 10, DA LEI 1.533/51. DISPENSABILIDADE. PRECEDENTESDA CORTE ESPECIAL DESTE STJ. Havendo evidente interesse público, a intervenção do órgãodo Ministério Público Federal, oficiando como fiscal da lei, é necessária e obrigatória, não se o

podendo submeter ao prazo do art. 10, da Lei 1.533/51, sob pena de nulidade do processo. –Recurso conhecido e provido. (STJ, REsp 8.8471, 2.ª T., Rel. Min. Peçanha Martins, j. 06/04/1999).

PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. INDICAÇÃO ERRÔNEA DO IMPETRADO. INFOR-MAÇÕES PRESTADAS PELA AUTORIDADE COATORA. SUPRIMENTO DA ILEGITIMIDADE. MANI-FESTAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. OBRIGATORIEDADE. PARECER DO PARQUET  DISPENSANDOA NECESSIDADE DE PRONUNCIAMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE COAGIR O ÓRGÃO A MANIFES-TAR-SE. AUSÊNCIA DE NULIDADE.

1. Em sede de mandado de segurança, deve haver o efetivo pronunciamento do MinistérioPúblico não sendo suficiente a sua intimação, sob pena de nulidade. (EREsp 26.715/AM; Rel.Min. Paulo Costa Leite, Corte Especial, DJ 12/02/2001; EREsp 24.234/AM; Rel. Min. HumbertoGomes de Barros, Corte Especial, DJ de 11/03/1996; EREsp 9.271/AM, Rel. Min. Antônio de PáduaRibeiro, Corte Especial, DJ de 05/02/1996).

2. Considera-se efetivo o pronunciamento se o Ministério Público, abordando a questão defundo, entende que, por força da substância do mesmo, não deve atuar como custos legis.

3. In casu, o douto representante do Parquet  devidamente intimado da sentença afirmou serdesnecessária a sua manifestação. Consectariamente, ausente a nulidade processual haja vistaque o Ministério Público teve a oportunidade de se manifestar e não o fez, à luz da exegese doart. 10, da Lei 1.533/51.

4. A imposição de atuação do membro do Parquet , quanto à matéria versada nos autos, infringi-ria os Princípios da Independência e Autonomia do órgão ministerial.

5. Deveras, a suposta nulidade somente pode ser decretada se comprovado o prejuízo para osfins de justiça do processo, em razão do Princípio de que “não há nulidade sem prejuízo” (“ pas

des nullitè sans grief ”).6. A indicação errônea da autoridade coatora resta suprida em tendo esta, espontaneamente,prestado as informações confirmando a sua legitimidade passiva.

7. Recurso especial desprovido. (STJ, REsp 541.199/MG, T1 - 1.ª Turma, Luiz Fux, 08/06/2004)

Pode ocorrer que, junto à sua condição de fiscal, o MP exercite a sua condição

de representante da pessoa jurídica de Direito Público interessada no ato impug-

nado, podendo da decisão recorrer.

O prazo de manifestação do MP será de 10 (dez) dias, conforme dicção do

artigo 12 da Lei 12.016/2009.

SentençaAo prolatar a sentença mandamental, o juiz pode:

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Mandado de segurança individual II

Conceder a segurança

Nessa hipótese, ele deve declarar a ilegalidade do ato ou abuso de poder,

comunicando o inteiro teor da sentença à autoridade coatora. A decisão é desde

 já executável, até porque eventual recurso de apelação não terá efeito suspen-

sivo. A ilegalidade ou abuso de poder deve cessar tão logo seja cientificada aautoridade coatora da sentença. Dessa decisão, caberá apelação sem efeito sus-

pensivo.

Concedida a segurança, o juiz transmitirá em ofício, por intermédio do oficial

do juízo, ou pelo correio, mediante correspondência com aviso de recebimento, o

inteiro teor da sentença à autoridade coatora e à pessoa jurídica interessada (Lei

12.016/2009 art. 13, caput , ).

Mas, em caso de urgência, a comunicação da decisão poderá ser feita por tele-grama, radiograma, fax ou outro meio eletrônico de autenticidade garantida, nos

termos do artigo 4.º da Lei.

A sentença que conceder o mandado de segurança pode ser executada pro-

visoriamente, salvo nos casos em que for vedada a concessão da medida liminar

– parágrafo 3.º do artigo 14 da Lei em referência.

E quando a decisão disser respeito a pagamento de vencimentos e vantagens

pecuniárias a servidor público da administração direta ou autárquica federal,

estadual e municipal somente será efetuado relativamente às prestações que

se vencerem a contar da data do ajuizamento da inicial, segundo determinação

expressa do parágrafo 4.º da mesma Lei.

Apesar desses efeitos imediatos da sentença, ela fica sujeita obrigatoriamente

ao duplo grau de jurisdição (Lei 12.016/2009, art. 14, §1.°) e ainda poderá sofrer

apelação pela autoridade coatora (art. 14, §2.°).

Negar a segurançaNessa ocasião, deve ele declarar a legalidade do ato atacado. Caso haja liminar

concessiva inicial, deve ser revogada nesse ato. O recurso de apelação interposto

dessa decisão deve ser recebido em ambos os efeitos.

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Mandado de segurança individual II

45

Não condenar ao pagamento de honorários

Sempre foi uma manifestação acesa na doutrina o cabimento ou não de

honorários em MS, embora a jurisprudência tenha se pacificado a respeito de

seu não cabimento através da Súmula 512 do STF e 105 do Superior Tribunal

do Justiça.

Com a Lei 12.016/2009 a matéria ficou superada porquanto o seu artigo 25

expressamente afastou a fixação de tal sucumbência, embora tivesse ressalvado

a possibilidade de aplicação de sanções no caso de litigância de má-fé.

Condenar ao pagamentodas custas do processo

Na ação mandamental, cabe condenação ao pagamento das custas proces-

suais, suspensas, caso a parte litigue sob o pálio da gratuidade judiciária.

Recursos cabíveis da sentençaProferida a sentença, denegando ou concedendo a segurança cabe apelação,

nos termos do artigo 14 da Lei 12.016/2009.

Todavia, se concedida a segurança, a sentença estará sujeita obrigatoriamente

ao duplo grau de jurisdição.

Como já foi dito, de forma inovadora, foi estendida à autoridade coatora o

direito de recorrer, como expressamente autoriza o parágrafo 2.º, do artigo 14

da nova Lei.

Ocorre que, embora a sentença esteja submetida ao apelo em qualquer caso

e ao duplo grau de jurisdição, no caso de concessão da segurança, poderá ainda,

nesta última situação, vir a sofrer o recurso excepcional ao presidente do tribunalnos mesmos moldes da concessão da liminar, conforme expressa determinação

do artigo 15 e seus parágrafos da Lei 12.016/2009.

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Mandado de segurança individual II

A Lei 12.016/2009 ainda estabeleceu regramentos específicos da seguinte forma:

Nos casos de competência originária dos tribunais, caberá ao relator a ins-

trução do processo, sendo assegurada a defesa oral na sessão do julga-

mento – artigo 16.

Da decisão do relator que conceder ou denegar a medida liminar caberá

agravo ao órgão competente do tribunal que integre – parágrafo único do

artigo 16.

Nas decisões proferidas em MS e nos respectivos recursos, quando não

publicado, no prazo de 30 (trinta) dias, contado da data do julgamento, o

acórdão será substituído pelas respectivas notas taquigráficas, indepen-

dentemente de revisão – artigo 17.

Das decisões em MS proferidas em única instância pelos tribunais cabe

recurso especial e extraordinário, nos casos legalmente previstos, e recurso

ordinário, quando a ordem for denegada – artigo 18.

A sentença ou o acórdão que denegar MS, sem decidir o mérito, não impe-

dirá que o requerente, por ação própria, pleiteie os seus direitos e os res-

pectivos efeitos patrimoniais – artigo 19.

Os processos de MS e os respectivos recursos terão prioridade sobre todos

os atos judiciais, salvo habeas corpus – artigo 20.

Na instância superior, deverão ser levados a julgamento na primeira sessão

que se seguir à data em que forem conclusos ao relator – parágrafo 1.º, do

artigo 20.

O prazo para a conclusão dos autos não poderá exceder 5 (cinco) dias –

parágrafo 2.º do artigo 20.

Aplicam-se ao MS coletivo toda a matéria disposta no CPC sobre litisconsór-

cio e assistência – artigo 24.

Não cabe, no processo de MS, a interposição de embargos infringentes –

artigo 25.

Constitui crime de desobediência, nos termos do artigo - 330 do Decreto-

Lei 2.848, de 7 de dezembro de 1940, o não cumprimento das decisões pro-

feridas em MS, sem prejuízo das sanções administrativas e da aplicação da

Lei 1.079, de 10 de abril de 1950, quando cabíveis – artigo 26.

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Mandado de segurança individual II

47

ConclusãoA ação de MS tem estruturas processuais específicas adaptadas à sua própria

celeridade.

Ampliando seus conhecimentosSugerimos a leitura das obras a seguir:

Código de Processo Civil Comentado: legislação processual civil e extravagante,

de Nelson Nery Junior, editora Revista dos Tribunais.

Considerações sobre o controle jurisdicional de urgência na ação de mandado

de segurança, de Wellington Pacheco Barros, Revista da Ajuris, v. 26 n. 76, edi-

tora Ajuris.

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Elaine Harzheim Macedo

O mandado de injunção, previsto no artigo 5.º, LXXI, da Constituição

Federal (CF), representa medida inovadora no sentido de concretização dos

direitos e liberdades consagrados pelo texto constitucional, bem como na

preservação das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania, à cida-

dania. Trata-se, outrossim, de ação constitucional a ser provocada pelo pró-prio cidadão – titular maior da soberania nacional – como fiscal e tutor da

própria Carta Magna, na medida em que visa sanar a mora regulamentadora,

seja ela de competência do Legislativo, seja do Executivo. Daí a importância

de seu estudo, sendo de lamentar que até o presente, o Congresso Nacional

persista na mora em regulamentar tão importante garantia constitucional,

estando ainda em tramitação, na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei

6.839/2006.

Breve histórico

Inspiração nas constituiçõesda (então) Iugoslávia e de Portugal

O mandado de injunção brasileiro encontrou sua inspiração nas consti-

tuições da então Iugoslávia e na de Portugal de 1976. Em ambas as cartas

políticas, dá-se à Corte Constitucional o poder, no caso concreto, de provocaro órgão legislativo ao efeito de ser editada a norma suprindo omissão res-

ponsável por lesão aos preceitos constitucionais. Nesse sentido, dispunha o

artigo 377 da Carta da Iugoslávia:

Se o Tribunal de Garantias Constitucionais inferir que algum órgão competente deixou deeditar a norma regulamentadora a que se obrigou, para a devida aplicação dos preceitosdesta Constituição, das leis ou de outras prescrições gerais federais, informará dessa omis-são a Assembleia da República.

Mandado de injunção

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Mandado de injunção

Anteprojeto da Assembleia Constituinte

No curso da Assembleia Constituinte brotou a semente que se transformou no

atual mandado de injunção. O primeiro texto, mais objetivo que o atual, tinha a

pretensão de ser a garantia das garantias, na medida em que, de um lado, estatuía

que as normas definidoras dos direitos, liberdades e prerrogativas têm eficáciaimediata; de outro, outorgava poderes ao juiz ou tribunal competente, para, em

sede de julgamento, suprir o vazio normativo.

Esse texto não vingou, sobrevindo outro, que praticamente repete o texto

atual, apenas introduzindo regra de natureza processual, pois determinava que

se aplicasse o rito processual do mandado de segurança (MS) ao mandado de

injunção.

Constituição Federal

O texto final que restou consagrado pela Carta de 1988 é o que consta do

artigo 5.º, LXXI:

Art. 5.º [...]

LXXI - Conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadoratorne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentesà nacionalidade, à soberania e à cidadania;

Cabimento

Mora legislativa ou regulamentadora

O primeiro pressuposto constitucional para o seu cabimento é a mora legis-

lativa ou regulamentadora. Não basta, portanto, que a lei existente seja omissaou lacunosa em determinados pontos, pois sua interpretação e aplicação ao caso

concreto é função do Judiciário. O que se pretende com a mora legislativa é a ine-

 xistência de lei a regulamentar os direitos e liberdades e as prerrogativas inerentes

à nacionalidade, à cidadania e à soberania.

Exemplo que pode ser citado, nesse sentido, é o disposto no artigo 14 da CF,

que se refere ao exercício do sufrágio universal e do voto direto e secreto, com

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Mandado de injunção

51

igual valor para todos, e, nos termos da lei , mediante plebiscito, referendo e ini-

ciativa popular. Assim, determinando a lei que uma questão de interesse popular

seja objeto de plebiscito e este não saia porque não há lei que o regulamente, o

mandado de injunção seria o caminho para qualquer cidadão que se sentir lesado

por essa omissão.

Lesão ao exercício dos direitos e liberdadesconstitucionais ou lesão às prerrogativas inerentesà nacionalidade, à soberania e à cidadania

Tem-se discutido que, a rigor, o texto constitucional poderia ter se limitado a

referir “exercício dos direitos fundamentais”, porque é disso que trata os direitos

e liberdades constitucionais e bem assim as prerrogativas inerentes à nacionali-

dade, à soberania e à cidadania.

Em última análise, o que se quer com o mandado de injunção é que se cumpra

a Constituição em todos os seus termos, tendo-se presente que o seu destinatário

maior é o cidadão brasileiro.

Intervenção do Ministério Público (MP)Cuidando-se de ação em que o interesse público está presente, a intervenção

do MP é indispensável, funcionando o órgão como custos legis. A instituição do

MP não pode ficar à deriva em qualquer ação constitucional, considerando sua

função de defesa à ordem jurídica, o que se mostra inquestionável quando esti-

vermos frente a uma ação que cuida exatamente da mora legislativa.

Legitimação ativa

Ente individual

Está legitimado para impetrar o mandado de injunção qualquer cidadão, pois

são os seus direitos constitucionais, os seus direitos fundamentais que essa tão

especial ação pretende tutelar. Mas não apenas a pessoa física, como também

a pessoa jurídica, que também é destinatária dos direitos constitucionais, pode

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Mandado de injunção

promover mandado de injunção. Aliás, ainda que prevaleça a distinção entre as

pessoas dos sócios ou associados e a pessoa jurídica que estes integram, não se

pode olvidar que, ao fim e ao cabo, são os seres humanos que se beneficiam dessa

ficção jurídica e é em seu favor que ela existe.

Ente coletivo

Já há precedentes no Supremo Tribunal Federal (STF) admitindo a impetração

de mandado de injunção por ente coletivo, que atuará como substituto proces-

sual. Nesse sentido:

MANDADO DE INJUNÇÃO COLETIVO. Admissibilidade, por aplicação analógica do art. 5.º, LXX,da Constituição; legitimidade, no caso, da entidade sindical de pequenas e médias empresas,as quais, notoriamente dependentes do crédito bancário, têm interesse comum na eficácia do

art. 192, §3.º, da Constituição, que fixou limites aos juros reais. [...]. (MI 283, Rel. Min. SepúlvedaPertence, RTJ 135/882, J. 1994).

Competência versus legitimação passivaRigorosamente, não há como dissociar o estudo da legitimação passiva da

competência, não se exaurindo, portanto, a análise daquela, a exemplo do enfren-

tamento da legitimação ativa, no trato do artigo 5.º, LXXI, da Carta, remetendo-se

o tema para os dispositivos que estabelecem a competência dos tribunais supe-

riores.

Competência funcional

Segundo a disposição constitucional, a competência para o julgamento do

mandado de injunção é funcional e, portanto, classifica-se como competência

absoluta. Nesse sentido, dispõem os artigos 102, I, “q”, e 105, I, “h”, ambos da CF:

Art. 102. [...]

I - processar e julgar, originariamente:

[...]

q) o mandado de injunção, quando a elaboração da norma regulamentadora for atribuição doPresidente da República, do Congresso Nacional, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal,das Mesas de uma dessas Casas Legislativas, do Tribunal de Contas da União, de um dos Tribu-nais Superiores, ou do próprio Supremo Tribunal Federal;

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Mandado de injunção

53

Art. 105. [...]

I - processar e julgar, originariamente:

[...]

h) o mandado de injunção, quando a elaboração da norma regulamentadora for atribuição de

órgão, entidade ou autoridade federal, da administração direta ou indireta, excetuados os casosde competência do Supremo Tribunal Federal e dos órgãos da Justiça Militar, da Justiça Eleitoral,da Justiça do Trabalho e da Justiça Federal;

Forçoso concluir que esse tema (competência funcional e legitimidade pas-

siva) também está intimamente ligado à questão da sentença na medida em

que, em se tratando de um mandado, ou seja, uma ordem, um comando, não há

como dissociar da carga eficacial da sentença, ou, quiçá, das cargas eficaciais que

a sentença de procedência do mandado de injunção poderá carregar, o que será

objeto de enfrentamento a seguir.

De qualquer sorte, importante registrar que tanto da leitura do dispositivo

que contempla, no rol do artigo 5.º, o mandado de injunção, como nos disposi-

tivos que estabelecem a competência para o seu julgamento, fica um questio-

namento em aberto: a legitimidade passiva é tão somente do órgão legislativo

ou do órgão regulamentador omisso? E quanto ao ente responsável (público ou

privado) pela execução da norma inexistente? Pelas disposições que regulam a

competência funcional, antes mencionadas, pode-se, num primeiro momento,

concluir que o mandado de injunção sempre terá no polo passivo o órgão res-

ponsável pela regulamentação do Direito Constitucional cujo exercício está

inviabilizado, a indicar, como réus da relação processual instaurada, o Congresso

Nacional ou outros responsáveis pela regulamentação, ou, ainda, as Assembleias

Legislativas e as Câmaras de Vereadores nas hipóteses em que a competência

legislativa for de suas respectivas alçadas.

Regra nesse sentido vem no Projeto de Lei que tramita no Congresso Nacional

(PL 6.839/2006, art. 7.º):

Art. 7.º O responsável pela regulamentação da norma será intimado para, no prazo de dezdias, prestar as informações necessárias.

Contudo, essa conclusão só tem sentido se compreendermos o mandado de

injunção como mero comando de recomendação ao Poder Legislativo ou Regu-

lamentador, afastando-se diametralmente do verdadeiro sentido que o mandado

de injunção carrega em suas entranhas, o que será objeto de aprofundamento no

item que se segue.

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Mandado de injunção

Sentença no mandado de injunçãoO mandado de injunção, como ação individual, está contemplado não só em

favor do sujeito de direito, mas especialmente quando esse sujeito se qualificar

como cidadão detentor da soberania popular, sempre que tais direitos e tais prer-

rogativas não puderem ser exercitadas por omissão do legislador, que atua e deve

atuar tão somente na condição de mero representante do povo e não como titu-

lar dessa virtude. Assim, no primeiro bloco de bem da vida protegido, a tutela tem

como destinatário o titular de direito individual, somando-se essa via alternativa

a todas as demais que o ordenamento já contempla (ação de conhecimento, MS,

habeas corpus, habeas data, ação popular etc.). No segundo, quando se tutelam

especificamente as prerrogativas da nacionalidade, soberania e cidadania, o sis-

tema não tem em mira apenas o sujeito de direito frustrado no seu exercício, mas

se volta em seu próprio favor, como autopreservação, na medida em que infrin-gência por omissão do legislador (mero representante do povo) ao exercício de

tais prerrogativas significa descumprimento da própria soberania popular, ani-

quilando não uma situação particular, mas toda a Constituição, porque violada

regra fundamental do pacto, a refletir-se sobre a própria manutenção do Estado

Democrático de Direito. Em outras palavras, a CF além de ser preservada precisa

se autopreservar e, fundamentada como está na soberania popular, não pode per-

mitir que seu único titular fique preso e aniquilado em verdadeira teia de aranha,

porque seu mandatário legislador não legisla e porque não tem acesso ao man-

datário julgador para fazer valer suas prerrogativas de nacionalidade, soberaniae cidadania.

Alinhavam-se tais traços apenas para abrir o debate e provocar reflexões,

porque certamente o tema merece tratamento exclusivo, o que este texto não

permite aprofundar em toda a extensão de sua dignidade.

De qualquer sorte, indo ao ponto, a eficácia da decisão proferida em sede de

mandado de injunção tem sido tema polêmico na doutrina e na jurisprudência.

O ponto de partida é o pressuposto do cabimento do mandado de injun-

ção que o direito insatisfeito o seja por lacuna regulamentadora. Trata-se, por-

tanto, de aplicação jurisdicional da equidade, com previsão constitucional. Cabe

ao Judiciário buscar a norma jurídica nas mesmas fontes materiais em que se

abeberaria o legislador para formular a lei, suprindo o vazio legislativo, mas tão

somente regulamentando o caso em espécie, submetido a julgamento. Não se

trata, porém, da equidade do caso concreto, mas sim da equidade social, ainda

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Mandado de injunção

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que limitada sua incidência ao autor da ação. Como já ensinava Aristóteles,

enquanto aquela é sempre um modo de determinar o que é justo em cada caso,

complementando a lei que é abstrata e genérica, a última atua na lacuna da lei,

devendo o juiz supri-la, formulando ele próprio a norma aplicável. É o caso do

mandado de injunção, segundo defendemos.

Não se olvida que há fortes correntes doutrinárias e jurisprudenciais que

não reconhecem ao juiz, pena de arrostar o dogma da distinção de poderes, o

poder de legislar no caso concreto.1 Nesse espaço, incluem-se tanto aqueles que

defendem que o mandado de injunção se limita a gerar sentença de declaração,

ao efeito de declarar a omissão, quanto os que lhe atribuem uma natureza de

ordem ou mandamento, cujo destinatário é o legislador omisso.

Ao primeiro grupo, fica a indagação a qual, à evidência, não responde: o

constituinte, avançando no tempo e no espaço, cria uma nova ação – mandadode injunção – sem paralelo no mundo ocidental, que tem como interesse de

agir à omissão do legislador em regular determinado direito contemplado pela

Constituição (tanto é assim que se o julgador concluir que o direito subjetivo

alegado encontra regulamentação em determinado diploma legal, o mandado

de injunção será extinto com fundamento no art. 267, VI, do CPC) ao efeito tão

somente de ser declarada judicialmente a mora legislativa? Sim, porque tal

ação, em caso de efetiva omissão legislativa, produziria, na hipótese de proce-

dência segundo essa corrente, apenas uma declaração: “o legislador, frente a tal

Direito Constitucional, encontra-se omisso!” Para não alardear outras insuficiên-

cias, ficaríamos apenas com essa: à eventual extinção do feito, sem exame de

mérito, por ausência de interesse de agir, porque existente ordenamento legal,

contrapõe-se não a superação das condições da ação, mas sentença de proce-

dência declaratória, porque ausente texto regulamentador.

No segundo grupo, no qual se inclui a posição que vem sendo adotada pelo

STF, a procedência do mandado de injunção levaria a uma notificação, con-

tendo uma ordem de natureza moral  ao efeito de lembrar o legislador que ele

deve cumprir sua função, isto é, legislar sobre determinado Direito Constitucio-nal, carente de regulamentação. Ordem de natureza moral, apenas lembrando

1 O conteúdo legislativo da decisão judicial, em sede de processos subjetivos, a exemplo do mandado de injunção, mas nãoapenas nele, como uma terceira categoria de direito, ao lado do direito objetivo e do direito subjetivo, é assunto de vital impor-tância para o reconhecimento de um novo paradigma na jurisdição deste terceiro milênio, cuja abordagem se faz em outra obra,ainda no prelo.

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Mandado de injunção

ou recomendando a produção legislativa, porque nenhum império, nenhuma

cogência, nenhuma coação a alimenta. Exemplo disso, os mandados de injunção

 julgados procedentes, em número de três ao que se tem conhecimento, ao longo

da década de 1990, promovidos perante o STF relativamente à mora do legis-

lador federal na regulamentação dos juros praticados pelo mercado e sua limi-

tação a 12% ao ano, conforme artigo 192, parágrafo 3.º, da CF. Dessas decisões,

foi o Congresso Nacional cientificado, que delas tomou conhecimento, permane-

cendo, porém, em mora, até que em 2003, por meio da Emenda Constitucional

(EC) 40, foi o parágrafo revogado. Ou seja, à mora do legislador, reconhecida e

objeto de recomendação do STF, correspondeu uma reforma constitucional que

simplesmente fez desaparecer o dispositivo não regulamentado. Já que não se

pode curar a doença, mate-se o paciente.

A vingar tais posições, estaremos chancelando a absoluta negativa de tutela

em sede de mandado de injunção, decretando a sua morte por antecipação.

Nesse sentido, posicionamo-nos, pelo menos em termos, em acordo com a

primeira corrente, que vê no mandado de injunção uma útil e eficaz forma de

composição de determinada situação concreta, ocupando o Judiciário o espaço

negligenciado pelo legislador e construindo a regra da qual o sistema é devedor

por omissão. Sentença assim qualificada não fica no plano meramente normativo,

ao efeito de tão somente dizer quem tem razão, mas, ao contrário, fazendo-se por

si só suficiente na execução do direito tutelado pela ordem constitucional.

De qualquer sorte, é preciso reconhecer nessa sentença uma carga de consti-

tutividade, no sentido de construir uma nova situação jurídica, editando a norma

do caso concreto, que valerá exclusivamente para aqueles sujeitos envolvidos

naquela relação de direito material e tão somente até o momento em que o

órgão legislativo ou regulamentador cumprir com o seu mister, portanto, com

eficácia temporal limitada. A sentença, outrossim, não terá qualquer efeito erga

omnes, ficando, dessa sorte, preservada a distinção dos poderes, conforme esta-

belecido no artigo 2.º da Carta Magna. Se o Judiciário foi provocado a agir, o foi

nos termos primeiro da Constituição, que assim autorizou por força do artigo 5.º,LXXI; segundo, porque o órgão responsável pela edição da norma mostrou-se

negligente e omisso.

Essa posição, contudo, altera o próprio polo passivo, pois não só o órgão res-

ponsável pela edição da norma passa a integrá-lo, mas também aquele que se

torna responsável pela execução da norma não editada, formando um verdadeiro

litisconsórcio necessário.

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Mandado de injunção

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Enquanto o órgão legislador ou regulamentador receberá a ordem para cum-

prir com o seu mister e editar a norma, o órgão executor será destinatário da norma

construída para o caso concreto, devendo desde logo cumpri-la por inteiro.

Posição do STFLamentavelmente, o STF tem se posicionado no sentido oposto, adotando

o mandado de injunção como mera comunicação, notificação ao órgão regula-

mentador, dando-lhe notícia de sua mora, como se disso ele não tivesse conhe-

cimento.

Nesse diapasão, a ementa que segue:

MANDADO DE INJUNÇÃO. DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS. ARTIGO 37, VII, DA

CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Configurada a mora do Congresso Nacional na regulamentação doDireito sob enfoque, impõe-se o parcial deferimento do writ  para que tal situação seja comuni-cada ao referido órgão. (MI 585/TOCANTINS, Rel. Min. Ilmar Galvão, J. 15/05/2002).

Peculiar, também, o comentário do então senador, Fernando Henrique Car-

doso, publicado na Folha de São Paulo, em 1990, situação que, registre-se, não

mudou até o presente: 

Tanto o Congresso Nacional como o Supremo Tribunal Federal têm preferido ficar aquém doslimites no exercício de seus poderes constitucionais [...]. Os constituintes criaram a figura domandado de injunção justamente para que o Supremo Tribunal Federal suprisse automatica-

mente a não aplicação da nova Carta.

Mandado de injunção e açãode inconstitucionalidade por omissão

Mandado de injunção e ação de inconstitucionalidade por omissão não se

confundem, ainda que encontrem alguns pontos em comum. Enquanto o man-

dado de injunção é ação individual ou coletiva, reclamando fato, sujeitos interes-sados e conflito de interesses, compondo o chamado processo subjetivo, a ação

de inconstitucionalidade por omissão integra o rol das ações que compõem o

processo objetivo, destinadas ao controle abstrato da constitucionalidade das leis

e atos normativos.

Mas, mesmo reconhecida a identidade da ação de inconstitucionalidade por

omissão e com o seu enquadramento no mesmo grupo de ações destinadas à

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Mandado de injunção

fiscalização abstrata da constitucionalidade, também indispensável que se lhe

reconheça uma carga eficacial distinta daquelas que atendem a declaração da

constitucionalidade ou inconstitucionalidade, porquanto tais situações jurídicas

encontram suficiente efetividade ou na eficácia declaratória (a lei ou ato norma-

tivo é constitucional), nada mais restando a fazer, ou nas eficácias declaratório-

-constitutivas (a lei ou ato normativo é inconstitucional, modificando-se com essa

declaração o mundo jurídico ao efeito de não mais subsistir o ato defeituoso), o

mesmo não se podendo dizer no caso da omissão inconstitucional.

Não há dúvida de que o reconhecimento do defeito é de cunho declaratório,

mas não basta reconhecer, é preciso mais, porque a omissão persiste a produ-

zir os seus efeitos deixando o cidadão à deriva de direitos que a própria ordem

constitucional consagra e tutela, o que representa um ponto em comum com o

mandado de injunção. Daí, inevitável, a admissão da carga mandamental que a

decisão contém e que o próprio texto constitucional indica, ao referir: “será dadaciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias”. (CF, art.

103, §2.º)

Rigorosamente, não é o ato judicial que, por si, “manda”, mas a própria CF que

vincula o órgão Legislativo – e o próprio Judiciário, fazendo com que a decisão

 judicial assim se qualifique. O Judiciário, no particular, apenas se presta para afas-

tar a possível dúvida sobre se a omissão era ou não perniciosa, inconstitucional,

decorrendo desse reconhecimento o império condutor para que seja desenca-

deado o processo normativo, isso porque a partir dessa decisão e de sua ciência,o parlamento passa a estar em mora reconhecida, declarada, a autorizar outros

mecanismos de cobrança da prática pública, inclusive de ordem política para o

devido cumprimento. A diferença de tratamento constitucional entre o Poder

Legislativo e órgãos da administração, estes sim destinatários de determinação

específica para executar a medida no prazo de 30 dias, diz tão somente com a

natureza diferente dos atos legislativos e administrativos, nada mais. Em outras

palavras, ambos os destinatários estão submetidos a um comando de ordem

para cumprir com as respectivas funções, tomando as providências necessárias

ao efeito de tornar efetiva norma constitucional. Um, no prazo de trinta dias;outro, sem prazo predeterminado, o que não significa que não esteja atrelado a

procedimentos formais, tais como o próprio regimento interno do parlamento,

que estabelece o rito e os prazos a serem obedecidos na elaboração do processo

legislativo. De sorte que, considerando as diferenças procedimentais entre a regu-

lamentação administrativa e o processo legislativo, o comando judicial oriundo

do STF pode perfeitamente ser alimentado, quando tendo por destinatário o

Congresso Nacional, pelo estabelecimento de prazo não para a edição da lei, mas

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Mandado de injunção

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para que seja deflagrado o correspondente processo legislativo visando à regu-

lamentação dos direitos constitucionais até então inexistente e por isso mesmo

danosa à concretização da Constituição, no que se harmonizariam as competên-

cias de cada poder. Normatização, outrossim, própria de Regimento Interno das

Casas Legislativas poderia prever a forma como se daria a iniciativa legislativa, em

cumprimento da ordem proferida em sede de ação de inconstitucionalidade poromissão.

Ademais, a celeuma instaurada não está tão atrelada ao ato jurisdicional em si,

mas na perspectiva de descumprimento do Poder Legislativo em relação a suas

funções.2 Trata-se, portanto, de patologia a ser resolvida em seara própria e não

no âmbito do processo jurisdicional, a exigir a adequação de suas respectivas ins-

tituições ao cumprimento da Constituição.

De outra banda, sempre remanesce ao Judiciário, provocado por processosubjetivo enquanto omisso o legislador advertido pelo Supremo, compor o con-

flito concreto à luz dos princípios gerais de direito, da analogia, dos costumes.

E tal decisão não poderia sofrer a pecha de inconstitucionalidade, porque incons-

titucional é a omissão legislativa, assim já declarada pela Corte Suprema.

Texto do Projeto de Lei 6.839/2006O Congresso Nacional decreta:

Art. 1.º Esta lei regulamenta o procedimento do mandado de injunção nos termos do artigo 5.º,inciso LXXI da Constituição Federal.

Art. 2.º Conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadoratorne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentesà nacionalidade, à soberania e à cidadania.

Art. 3.º Para propor a ação, o autor deve ter interesse jurídico ou econômico e legitimidade.

Art. 4.º É gratuita a ação do mandado de injunção, mas responderá o autor pelos ônus se liti-gante de má-fé.

Art. 5.º A petição conterá, além dos requisitos estatuídos na Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973– Código de Processo Civil, a indicação do direito, liberdade, ou prerrogativa que não são exerci-dos por falta de norma regulamentadora.

Art. 6.º No Tribunal, poderá o Relator indeferir liminarmente quando houver, mesmo que parcial-mente, norma aplicável ao caso.

2 Os Poderes da União são harmônicos e independentes e estão igualmente sujeitos e vinculados a cumprir a Constituição, nãose olvidando que o Poder Legislativo, na condição de mandatário do povo, tem sua legitimidade submetida ao sufrágio popularperiodicamente.

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Mandado de injunção

Parágrafo único. Da decisão caberá agravo à Turma recursal, no prazo de dez dias.

Art. 7.º O responsável pela regulamentação da norma será intimado para, no prazo de dez dias,prestar as informações necessárias.

Art. 8.º Após a prestação das informações, o Ministério Público terá vista dos autos pelo prazo dedez dias para emissão de parecer.

Art. 9.º Ao julgar a ação, o juízo suprirá a lacuna observando os princípios fundamentais daConstituição Federal, das Declarações Internacionais de Direitos, de que o País seja signatário, edos princípios gerais do direito, observando os fins sociais e as exigências do bem comum.

Art. 10. Deferido o mandado, o Presidente do Tribunal intimará da decisão o órgão ao qual com-pete a regulamentação da norma constitucional.

Art. 11. A decisão do mandado de injunção não impedirá que o requerente, por ação própria,pleiteie os seus direitos e os respectivos efeitos patrimoniais.

Art. 12. Se não apreciado o mérito, o pedido do mandado de injunção poderá ser renovado.

Art. 13. Caberá apelação da sentença, no efeito devolutivo.

Art. 14. Aplicam-se ao processo do mandado de injunção os artigos do Código de Processo Civilque regulam o litisconsórcio.

Art. 15. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

 JustificaçãoAté o presente momento, ainda não houve regulamentação do mandado de

injunção.

O Poder Judiciário tem encontrado certa dificuldade para aplicar ao caso con-

creto os princípios norteadores de decidir.

Essa ação civil, de índole constitucional, concedida ao titular de direito injusta-

mente ofendido por omissão do órgão regulamentador da norma constitucional,

se destina a obter uma ordem concreta de satisfação da pretensão jurídica que

envolve os direitos do cidadão.

A inércia, que se configura na omissão, do órgão regulamentador, fere todos

os princípios que norteiam a República.

Se o Poder emana do povo e em seu nome é exercido, não pode o Estado, por

não cumprir bem o seu mister, prejudicar o particular.

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Mandado de injunção

61

O acesso a essa proteção jurídico-constitucional deve submeter-se, como

típica ação judicial de natureza civil que é, aos requisitos de procedibilidade fixa-

dos na lei geral que é o Código de Processo Civil (CPC) – e que se traduzem nas

condições da ação.

Os requisitos de admissibilidade do  jus actionis devem ser observados para omandado de injunção, como qualquer outra ação de natureza civil.

O interesse de agir como a necessidade da parte de ingressar em juízo, em face

de obstáculo ilegítimo que lhe tenha sido oposto por outrem, deve ser observado

como uma das condições da ação.

É necessário observar o que estabelece o artigo 3.º do CPC que dispõe:

Art. 3.º Para propor ou contestar ação é necessário ter interesse e legitimidade.

É o que no-lo diz José Frederico Marques (1990) advertindo:Para que a ação, no entanto, se apresente viável, possibilitando ao autor praticar atos processu-ais até obter a tutela jurisdicional, previstas estão, no Código de Processo Civil, três condiçõesfundamentais: a) o interesse de agir; b) a legitimação ad causam; e c) a possibilidade jurídica dopedido (art. 267, VI).

Os regramentos que norteiam o MS e o Processo Civil devem ser observados

para o mandado de injunção, por já estarem solidificados em nosso ordenamento

 jurídico.

Cremos que a colaboração que essa proposta oferece, para suprir a lacunalegal, pode contar com o apoio dos ilustres pares para a sua aprovação.

Ampliando seus conhecimentos

Decisão 1.ª

MI n. 584/SP

STF/Tribunal Pleno

Julgado: 29/11/2001

MANDADO DE INJUNÇÃO. JUROS REAIS. PARÁGRAFO 3.º DO ARTIGO 192 DA CONSTITUI-ÇÃO FEDERAL. Esta Corte, ao julgar a ADIn 4, entendeu, por maioria de votos, que o dis-

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Mandado de injunção

posto no §3.º do artigo 192 da Constituição Federal não era autoaplicável, razão por quenecessita de regulamentação. – Passados mais de doze anos da promulgação da Constitui-ção, sem que o Congresso Nacional haja regulamentado o referido disposto constitucional,e sendo certo que a simples tramitação de projetos nesse sentido não é capaz de elidir amora legislativa, não há dúvida de que esta, no caso, ocorre. Mandado de injunção deferidoem partes, para que se comunique ao Poder Legislativo a mora em que se encontra, a fimde que adote as providencias necessárias para suprir a omissão, deixando-se de fixar prazopara o suprimento dessa omissão constitucional em face da orientação firmada por estaCorte (MI 361).

Decisão 2.ª

MI n. 562/RS

STF/Tribunal Pleno

Julgado: 20/06/2003

MANDADO DE INJUNÇÃO. ARTIGO 8.º, §3.º DO ADCT. DIREITO À REPARAÇÃO ECONÔMICAAOS CIDADÃOS ALCANÇADOS PELAS PORTARIAS RESERVADAS DO MINISTÉRIO DA AERO-NÁUTICA. MORA LEGISLATIVA DO CONGRESSO NACIONAL.

1 - Na marcha do delineamento pretoriano do instituto do mandado de injunção, assentoueste Supremo Tribunal que “a mera superação dos prazos constitucionalmente assinaladosé bastante para qualificar, como omissão juridicamente relevante, a inércia estatal, aptaa ensejar, como ordinário efeito consequencial, o reconhecimento, hic et nunc , de umasituação de inatividade inconstitucional.” (MI 543, voto do Ministro Celso de Mello, in: DJ

24/05/2002). Logo, desnecessária a renovação de notificação ao órgão legislativo que, nocaso, não apenas incidiu objetivamente na omissão do dever de legislar, passados quasequatorze anos da promulgação da regra que lhe criava tal obrigação, mas que, também, jáfoi anteriormente cientificado por esta Corte, como resultado da decisão de outros manda-dos de injunção.

2 - Neste mesmo precedente, acolheu esta Corte proposição do eminente Ministro NelsonJobim, e assegurou “aos impetrantes o imediato exercício do direito a esta indenização,nos termos do direito comum e assegurado pelo §3.º do art. 8.º do ADCT, mediante açãode liquidação, independentemente de sentença de condenação, para a fixação do valor daindenização.

3 - Reconhecimento da mora legislativa do Congresso Nacional em editar a norma pre-vista no parágrafo 3.º do art. 8.º do ADCT, assegurando-se, aos impetrantes, o exercício da

ação de reparação patrimonial, nos termos do direito comum ou ordinário, sem prejuízo deque se venham, no futuro, a beneficiar de tudo quanto, na lei a ser editada, lhes possa sermais favorável que o disposto na decisão judicial. O pleito deverá ser veiculado diretamentemediante ação de liquidação, dando-se como certos os fatos constitutivos do direito, limi-tada, portanto, a atividade judicial à fixação do “quantum” devido.

4 - Mandado de injunção deferido em parte.

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Elaine Harzheim Macedo

O habeas data é a ação constitucional que representa um novo instituto

de Direito Constitucional-Processual em favor da concretização dos direitos e

garantias individuais que ao cidadão brasileiro foram assegurados pela Carta

de 1988. Trata-se de novo processo que cumpre ao operador do direito ana-

lisar e investigar, visando à sua aplicação, o mais adequadamente possível,

as hipóteses fáticas pertinentes, sob pena, inclusive, de se estar negando

vigência à Constituição Federal (CF), no que ela tem de mais sagrado: o artigo

5.º, que traduz exatamente os direitos e as garantias, individuais e coletivas

do cidadão brasileiro. Seu espaço de atuação, como adiante se verá, acon-

tece também numa esfera nova das relações deste mundo sem fronteiras:

as informações subjetivas que não só são objetos de bancos de dados ou

registros cadastrais, como circulam, com a maior facilidade e celeridade ima-

ginável, em todo o planeta, em favor de qualquer beneficiário que para tanto

tenha-se legitimado.

Nesse sentido, revela destacar a importância dessa ação constitucional,

considerando o poder da informação e, mais que isso, do controle da infor-

mação no confronto com os direitos individuais na perspectiva da pós-mo-

dernidade.

Origem histórica

Experiência portuguesa e espanholaSem desprezar experiências outras, na perspectiva de tutelar o direito à

informação subjetiva, importante papel desempenharam os modelos portu-

guês e espanhol na construção do habeas data brasileiro.

Assim, a Constituição de Portugal, de 1976, de significativa influência no

constitucionalismo pátrio desenvolvido ao longo da redemocratização do

país, em seu artigo 35, contemplava a garantia de que todo o cidadão gozava

Habeas data

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Habeas data

de acesso à informação, sobre sua pessoa, de quaisquer registros, em bancos de

dados informatizados e do fim a que se destinavam, assegurando, também, o

trancamento dessas informações a terceiras pessoas. O direito à informação, assim

tutelado, tem por amparo outras garantias constitucionais, expressamente con-

templadas na Constituição portuguesa, diretamente ligadas à cidadania, à digni-

dade pessoal, à intimidade e à vida privada.

A Constituição espanhola, de 1978, também contempla o acesso à informação,

conforme artigo 105, alínea “b”, quando se assegura ao cidadão a obtenção de

informações quanto a arquivos e registros administrativos, rompendo com um

dos dogmas de governos ditatoriais: o monopólio da informação.

Não se pode olvidar que esses dois países, além da aproximação da língua e da

cultura latina, passaram, em períodos não tão divorciados entre si, por experiên-

cias de governos ditatoriais, nas quais, certamente, a informação sobre o cidadãoganha peso na distribuição do poder: quanto mais informação, maior o poder.

Importante análise vem da doutrina especializada. Allan Westin (1976), assim

expressa:

Un aspecto esencial de la vida privada es que los indivíduos y organizaciones pueden determi-nar por su propria cuenta las informaciones que desean mantener como confidenciales y las queaceptan revelar o que ello deben revelar necesariamente.

Dizendo de outra forma, aquele que detém a informação, sobre ela, decide:mantém em sigilo, comunica a terceiros, modifica, retifica ou a conserva na sua

forma original.

Em breves palavras, se no mundo antigo o poder estava concentrado naque-

les que detinham, em suas mãos, o domínio de terras, a justificar os grandes

impérios e suas conquistas territoriais; o mundo moderno se caracterizou pelo

poder do capital e dos meios de produção, colocando nas mãos dos banqueiros e

dos grandes industriais o poder de decisão política dos povos; já no mundo con-

temporâneo, o mais relevante, como poder determinante, é deter a informação eas vias de comunicação dessas informações: é o poder da mídia, das telecomuni-

cações, dos grandes bancos de dados, da internet.

Está, pois, mais que justificada a necessidade de se estudar e analisar o ins-

trumento processual que a própria CF nos oferece para que o cidadão acesse ou

retifique essas informações, sobre as quais não detém o poder.

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Habeas data

67

Constituição de 1988

A Constituição de 1988 não ficou silente e omissa perante essa realidade, até

em certo ponto nova, no que diz respeito aos bancos de dados de natureza nego-

cial, mas nem tão nova em relação aos bancos de dados estatais, de que muito se

serviram os governos militares que a antecederam.

É o que dispõe o artigo 5.º, LXXII, da CF:

Art. 5.º [...]

LXXII - conceder-se-á “habeas data:”

a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantesde registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público;

b) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou

administrativo;

Lei 9.507/97

Não sem demora do Congresso Nacional, em 1997 sobreveio a Lei que regula-

mentou essa ação constitucional e que será objeto de estudo exegético no texto

em desenvolvimento.

CabimentoO habeas data, como ação constitucional, só encontra espaço na garantia de

acesso à informação do próprio impetrante, isto é, da informação subjetiva, que

diz respeito ao impetrante, afastando de seu bojo a informação objetiva.

Daí afirmar-se que ohabeas data

tem como finalidade tutelar a informaçãosubjetiva, isto é, aquela informação que diz respeito ao sujeito de direito que

comparece no polo ativo da relação processual ou, ainda, que provoca adminis-

trativamente os bancos de dados. Quaisquer outras informações, de natureza

objetiva, ainda que de domínio público, podem até receber tutela jurisdicional

diferenciada, inclusive via mandado de segurança (MS), como acontece com o

disposto no artigo 5.º, XIV, da CF:

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Habeas data

Art. 5.º [...]

XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando neces-sário ao sigilo profissional;

Assim, se qualquer cidadão quiser obter informações sobre a produtividade de

um parlamentar ou de um juiz, e essa informação lhe for negada, poderá buscar oJudiciário, mas a ação não será a de habeas data, mas, se for o caso, presentes os

respectivos requisitos, poderá se valer até do MS.

Quanto às espécies de bancos de dados, o dispositivo constitucional nos ofe-

rece duas classes distintas:

bancos de dados privados  (que divulgam as informações cadastradas) –

dos dois destinatários que o artigo da Constituição contempla, um deles diz

respeito aos bancos de dados privados ou particulares. O caráter da publici-dade exigido não diz respeito à autoria ou responsabilidade dos cadastros

ou registros, mas sim à finalidade dada a eles, isto é, se a informação ali

constante é circular perante uma coletividade, ganha o suficiente caráter

público a gerar o interesse de agir daquele sujeito de direito que estiver

sendo objeto de informação. É o exemplo típico dos bancos de dados de

cadastros de inadimplentes, como o Serviço de Proteção ao Crédito (SPC)

e o Serasa.

bancos de dados públicos  (governamentais) – o segundo destinatário docomando judicial diz respeito aos bancos de dados governamentais. Aqui,

não é importante se a informação sobre o cidadão é compartilhada com

outros interessados. Basta que o Poder Público dela se utilize. A natureza

pública das informações, nesse caso, refere-se à autoria ou à responsabi-

lidade do banco de dados. Exemplo histórico desse banco de dados, em

especial considerando os seus fins espúrios, é o SNI do governo da ditadura

militar.

Aliás, o Poder Público, por exigência de suas funções, é detentor de inúmeros

bancos de dados, tais como os que dizem com a Receita Federal, os registros cri-

minais da Polícia Civil e da Polícia Militar, do Judiciário etc.

É evidente que a simples existência do banco de dados não lhe atribui ilici-

tude ou ilegitimidade. E isso vale tanto para os bancos de dados governamentais

como os privados. Numa sociedade de massa, na qual a individualidade perde

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Habeas data

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espaço nas transações que diariamente são firmadas, cada vez mais virtuais, os

bancos de dados aparecem como soluções úteis e necessárias, até porque certas

práticas mercantis e até sociais são irreversíveis.

O que se está pretendendo não é a simples extirpação de tais mecanismos

de controle, que ganham, principalmente na liberação do crédito, relevância sig-nificativa, mas sim o abuso de poder daquele que detém a informação, seja no

âmbito governamental, face ao poder político, seja no âmbito privado, face ao

poder econômico, ambos espaços latentes para que tal ocorra.

Objeto do  habeas data

O objeto da ação de habeas data pode variar e aqui se faz necessário também

o estudo da lei que o regulamentou.

Obtenção da informação

O mais importante objeto, o primeiro a dar origem a esse novel instituto, é exa-

tamente a obtenção da informação. Se o cidadão, titular do direito subjetivo de

ter acesso à informação, é também o objeto da informação, não se pode negar-lhe

a mais ampla ciência de qual informação e em que termos está ela cadastrada.

O direito à obtenção da informação veio expressamente assegurado no texto

Constitucional da Carta de 1988, limitando-se a Lei 9.507/97 (arts. 2.º e 7.º, I) a

repeti-lo. Mas o abuso à obtenção dessas informações, mesmo após a promul-

gação da Constituição, é de domínio público, pois os órgãos cadastrais sistema-

ticamente se negavam a prestar informações, dificultando em muito o acesso ao

crédito ou a quaisquer outras negociações em que o cidadão pudesse estar inte-

ressado.

Com o advento da lei, além de algumas medidas judiciais que se fizeram profi-láticas, a conduta daqueles que detêm a informação passou a mudar, tornando-se

mais democrática.

Assim, por exemplo, basta qualquer cidadão comparecer às agências do SPC,

e desde logo obterá, gratuitamente como determina a CF, a informação de qual-

quer registro negativo que lá estiver consignado em seu nome.

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Habeas data

Também se logrou, na última década, após decisões judiciais estabelecendo

essa obrigatoriedade, por parte do banco de dados, a adoção da prática de pri-

meiro dar ciência à parte que será objeto de inscrição no cadastro negativo de

inadimplentes, mediante correspondência admonitória, de modo a que possa ela

tomar providências evitando o constrangimento do registro.

Esse é o lado positivo da regulamentação, pois é um fator a mais na formação

da cultura social e do comportamento dos diversos agentes.

Retificação da informação

Não basta, porém, obter a informação. É sempre possível que ela esteja equi-

vocada. Para tanto também o habeas data se presta, cumprindo ao interessado na

retificação do registro o ônus da prova. Mais uma vez, o texto legislativo limitou-se

a repetir o que a CF estabeleceu, em nada inovando.

Anotação na informação

O outro objeto do habeas data é a anotação. Na verdade, a construção dessa

pretensão é de cunho legislativo, porque a CF dela não cuidou. Nesse sentido, o

legislador pátrio deu interpretação extensiva ao conteúdo de retificação, enten-dendo que no seu âmbito também se inclui a hipótese daquele que, embora

tenha o seu nome lançado no registro cadastral, esteja, em ação ordinária, dis-

cutindo a origem da informação, e que poderá, durante o tempo desse processo,

obter a anotação de que o registro se encontra subjudice. É a situação típica (mas

não exclusiva) dos mutuários que, estando discutindo a dívida em ações revisio-

nais em curso perante o Poder Judiciário, passam a ter o direito de obter, nos

registros cadastrais, uma anotação de que a sentença referente ao débito lançado

ainda não transitou em julgado, podendo, este, inclusive, vir a ser desconstituído

ou reduzido.

É o que se depreende do artigo 4.º, parágrafo 2.º, da Lei 9.507/97:

Art. 4.º [...]

§2.º Ainda que não se constate a inexatidão do dado, se o interessado apresentar explicação oucontestação sobre o mesmo, justificando possível pendência sobre o fato objeto do dado, talexplicação será anotada no cadastro do interessado.

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Habeas data

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Na prática, não é o que se tem visto ocorrer. As ações revisionais de crédito

se avolumam nas prateleiras judiciárias, e os pedidos cumulativos para que os

respectivos nomes dos mutuários litigantes não sejam lançados em cadastros de

inadimplentes ou, se já foram, venham a ser excluídos, também se multiplicam.

É importante registrar que as decisões judiciais, de primeira e de segunda ins-tância, não se apresentam uniformes, ora concedendo, ora negando a liberação

dos registros.

Posição mais atual do Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem sido no sentido de

só liberar o registro do mutuário que discute o débito em circunstâncias especiais,

como, por exemplo, se satisfeito o valor incontroverso. Trata-se de posição atre-

lada ao princípio da boa-fé objetiva.

Intervenção do Ministério Público (MP)A ação de habeas data é ação especial que contempla a tutela de direito fun-

damental. O interesse público advém porque, ao fim e ao cabo, há nessa ação

verdadeiro instrumento de freios e contrapesos na distribuição do controle de

poder, ora envolvendo entes públicos, ora entes privados. Daí porque, em seu

procedimento, irrelevante se o banco de dados for governamental ou privado,

faz-se indispensável a intervenção do MP, que atua como custos legis. 

Não é por outra razão que o artigo 12 da Lei 9.507/97 dispõe:

Art. 12. Findo o prazo que se refere o art. 9.º, e ouvido o representante do Ministério Públicodentro de 5 (cinco) dias, os autos serão conclusos ao juiz para decisão a ser proferida em 5(cinco) dias.

A regra, nitidamente, foi colacionada da ação do MS, da Lei 1.533/51.

Legitimação ativa

Ente individual

Não há dúvida que o legitimado para impetrar o habeas data é o sujeito ao

qual a informação diz respeito. Vale dizer: o titular do direito à informação, con-

funde-se com o próprio objeto da informação.

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Habeas data

Pode-se tratar tanto de pessoa física ou natural, quanto pessoa jurídica, pois

também as pessoas jurídicas podem ser objetos de informações cadastrais. Não

se descarta, outrossim, a possibilidade de pessoas formais, como, por exemplo,

condomínios, figurarem em cadastros públicos ou publicizados, de modo que

também as pessoas formais podem figurar no polo ativo do habeas data.

Inexistindo qualquer regra em sentido oposto, há de se exigir do autor a plena

capacidade para ser parte, estar em juízo e em postulatória. As regras, aqui, são

aquelas que regulam as relações processuais em geral, inocorrendo qualquer dis-

posição especial (CPC, arts. 7.º, 8.º e 12).

Ente coletivo

Ainda incipiente a doutrina sobre o habeas data. De qualquer forma, algumas

vozes já se levantam contra a possibilidade do habeas data ser promovido por

ente substituto, dando azo, assim, ao habeas data coletivo. Em princípio, até não

nos opomos a essa posição, inclusive por se tratar de um direito personalíssimo.

Não podemos, porém, afastar a ideia de que bancos de dados cadastrais em sede

de relações creditícias passam a adquirir uma feição de relações de massa, típicas,

por exemplo, da sociedade de consumo. E, sob esse aspecto, não é de se afastar

a possibilidade de habeas data coletivo, talvez nem tanto quanto ao objeto de

obter a informação, mas quanto à eventual retificação ou anotação. É tema queainda se está engatinhando, reclamando a participação de todos os operadores

do direito.

Legitimação passiva

Banco de dados governamentalTratando-se de habeas data voltado a obter, retificar ou anotar informações em

bancos de dados de natureza governamental, há de se aplicar, analogicamente, o

que se tem discutido em sede de MS ao polo passivo da relação processual instau-

rada. Defendemos, aqui, a posição que também no MS adotamos: é parte passiva

legítima a pessoa jurídica a qual o banco de dados está atrelado, mas comparece,

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Habeas data

73

no primeiro grau de conhecimento da relação processual, o responsável (diretor,

agente etc.) pelo banco de dados, prestando as informações que lhe foram requi-

sitadas pelo juiz da causa, por meio de ofício por essa autoridade firmado.

Trata-se de especial tratamento procedimental, com o qual dispensada a

capacidade de estar em juízo e a capacidade postulatória, o que vale, todavia, tãosomente para o primeiro grau de conhecimento, pois em eventual fase recursal, a

pessoa jurídica há de se fazer presente por meio do respectivo procurador.

Banco de dados privado: pessoa jurídica de Direito Privado

Cuidando-se de bancos de dados privados, legitimada é a pessoa jurídica cor-

respondente, aplicando-se, no que diz com a capacidade de parte, o disposto no

artigo 12, VI, do Código de Processo Civil (CPC).

ProcedimentoO procedimento do habeas data é ditado pela Lei 9.507/97, guardando simili-

tude com o procedimento do MS, no qual o legislador buscou inspiração, mere-

cendo algumas considerações.

Petição inicial

A petição inicial, como qualquer petição inicial, deve se fazer implementar dos

requisitos essenciais do artigo 282 do CPC.

Deve, também, fazer-se acompanhar da prova da recusa, pelo banco de

dados, de prestar informações, caso o habeas data se destine a obter informação; 

recusa de proceder à retificação pretendida ou de efetivar a anotação, caso sejam

essas as pretensões deduzidas. Estão as disposições associadas ao procedimentoadministrativo que vem regulado nos artigos 2.º, 3.º e 4.º da Lei 9.507/97, e que

sustentam a sumariedade documental da ação de habeas data. Essa preocupa-

ção do legislador ficou evidenciada quando, nos primeiros artigos, cuidou do

procedimento preliminar, de natureza administrativa, exatamente ao efeito de,

ou o impetrante obtém desde logo a pretensão deduzida, dispensando qualquer

intervenção judicial, ou faz a prova pré-constituída, passando a poder dela se

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Habeas data

valer, já com a petição inicial, afastando a desconfortável situação de o banco de

dados, uma vez notificado judicialmente (citação no processo), informar que não

se negara a prestar a informar ou fazer a retificação ou proceder à anotação.

Pela mesma razão, antes do advento da Lei 9.507/97, o STJ já sumulara, pelo

verbete 2, a questão nos seguintes termos, exigindo, portanto, prova documentalde que houve negativa em prestar a informação:

N. 2. Não cabe o habeas data (CF, art. 5.º, LXXII, “a”) se não houver recusa de informações porparte da autoridade administrativa.

Muito se discutiu se essa súmula ou mesmo a disposição legal exigindo a

prova pré-constituída implicaria inconstitucionalidade, na medida em que estaria

limitando o acesso à Justiça, a exigir o prévio exaurimento da via administrativa.

Contudo, não se pode olvidar que o próprio texto constitucional oportuniza à

parte que pode se valer das vias ordinárias – isto é, o procedimento comum ordi-nário do CPC – renunciando ao habeas data, de modo que não logramos antever

qualquer inconstitucionalidade na restrição da prova documental. Ou eu provo

documentalmente que houve a recusa e manejo a ação constitucional sumária

documental, ou não disponho de prova prévia e me faço valer do centenário para

não dizer milenar procedimento ordinário, com o qual posso produzir todos os

meios de prova (CPC, art. 332), no curso da ação, pois ambas as vias me são dispo-

nibilizadas. O que não cabe, sob pena de se trocar seis por meia dúzia, é ordinari-

zar o habeas data.

Requisição de informações

A requisição de informações vem no mesmo estilo do MS: trata-se de comu-

nicação a ser realizada por meio de ofício, em que o responsável pelo banco de

dados não pode omitir-se, devendo esclarecer o que lhe compete, também por

ofício, no prazo de 10 (dez) dias. É o que dispõe o artigo 9.º da Lei do Habeas

Data.

Resposta do impetrado

Não há propriamente contestação. Há informações. Cabe ao banco de dados,

seja ele governamental ou privado, informar ao juízo competente e provocado, o

que lhe compete, recebendo, para tanto, cópia não só da petição inicial, mas dos

documentos que a acompanham e que dizem com os procedimentos administra-

tivos prévios, regulados pelos artigos 2.º, 3.º e 4.º, da Lei de Regência.

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Habeas data

75

Manifestação do MP

O MP, como já foi visto, atua como custos legis, falando depois das partes.

Manifesta-se, pois, no prazo de 5 (cinco) dias, após as informações prestadas pelo

banco de dados, quando os autos irão conclusos para sentença.

SentençaA sentença proferida no habeas data, se for de improcedência, como qualquer

outra sentença de improcedência, será meramente declaratória, levando à extin-

ção do feito e arquivamento dos autos. Não há, em sede de ação de habeas data,

sucumbência, nos termos do que dispõe o artigo 21 da lei, em consonância com

a regra do artigo 5.º, LXXVII, da CF.

A sentença de procedência, porém, qualifica-se por sua eficácia mandamen-

tal, o que significa dizer que se trata de sentença de força, de império para se

autossatisfazer, se autoexecutar. Nesse sentido, merece destaque o artigo 13 da

Lei 9.507/97:

Art. 13. Na decisão, se julgar procedente o pedido, o juiz marcará data e horário para que ocoator:

I - apresente ao impetrante as informações a seu respeito, constantes de registros ou bancos dedados; ou

II - apresente em juízo a prova da retificação ou da anotação feita nos assentamentos do impe-trante.

O descumprimento a essa ordem judicial implicará, sem prejuízo de outras

providências, inclusive de natureza criminal, a adoção das medidas do artigo 14,

parágrafo único, do CPC, por litigância de má-fé, sujeitando-se o descumpridor ao

pagamento de multa.

RecursoO recurso das sentenças proferidas em sede de habeas data é, como não po-

deria deixar de ser, o de apelação, por força do artigo 15 e seu parágrafo único,

Lei 9.507/97:

Art. 15. Da sentença que conceder ou negar o habeas data cabe apelação.

Parágrafo único. Quando a sentença conceder o habeas data, o recurso terá efeito meramentedevolutivo.

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Habeas data

Embora a lei seja omissa, havendo, por parte do impetrante êxito na ação pro-

posta, é de ser reconhecida a sucumbência por parte do banco de dados. Sabe-se

que não é esse o entendimento que grassa nas Instâncias Superiores quanto ao

MS, no qual está sumulado que a ação de MS não gera honorários advocatícios.

Contudo, a discussão merece ser reaberta e, talvez, o habeas data seja o espaço

 jurídico próprio para isso. Mesmo que o autor não tenha dispensado valores em

razão de custas processuais, o processo teve o seu custo, devendo este ser arcado

pelo banco de dados que, descumprindo o seu mister, teve que ser acionado pela

parte interessada, com intervenção do Poder Judiciário ao efeito de prestar ou

corrigir as informações que estão sob sua tutela. Nada mais justo que também

arque com as verbas sucumbenciais, no caso de procedência da ação.

Justifica-se, outrossim, a regra constitucional dispensando o autor das despe-

sas processuais, em nome do mais amplo acesso à Justiça, em especial quandose está em sede de informações que dizem respeito ao seu nome, à sua pessoa,

à sua personalidade, valores inalienáveis em uma sociedade que se prestigie a

democracia social e solidária.

(Des)cabimento de liminarA ação de habeas data não previu na hipótese de obtenção da informação – e

nisto se houve bem o legislador ordinário – antecipação de tutela, por uma razãomuito óbvia: uma vez concedida a informação, esgotaria-se a medida liminar, dis-

pensando a sentença final.

O mesmo, porém, não pode ser dito quando a pretensão for de retificação ou

anotação nos registros, uma e outra admitindo provimento antecipatório, matéria

que certamente a doutrina e a jurisprudência ainda devem elaborar melhor.

Opção pela via ordináriaA opção pela via ordinária é colocada à disposição da parte interessada pelo

próprio texto constitucional. Aliás, é o que vem acontecendo, no mais das vezes,

quando se trata de correções ou liberações de registros junto a banco de dados

cadastrais de inadimplentes, em que o pleito vem reunido às ações ordinárias de

revisão de contrato.

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Habeas data

77

De qualquer sorte, a ação de habeas data, como ação especial, tutelando o

direito à informação subjetiva, divorciando-se da via ordinária, é ação sumária,

documental e mandamental, a exemplo do que ocorre com o MS, não sendo por

outra razão que o legislador ordinário louvou-se naquela ação para compor o pro-

cedimento do habeas data. Nesse sentido, com a necessidade de se documentar,

previamente, o interesse de agir do postulante veio regulamentado pelos artigos

2.º, 3.º e 4.º da Lei 9.507/95, e, antes de sua edição, pela Súmula 2 do STJ. Não há,

em tais exigências, como tivemos oportunidade de defender, qualquer afronta ao

princípio constitucional de acesso à Justiça, porque a parte que não pretenda, pri-

meiro, provocar administrativamente o banco de dados, sempre terá a seu dispor

a via ordinária, o que o próprio texto constitucional reserva no artigo 5.º, LXXII.

Assim, o que o ordenamento jurídico, constitucional e infraconstitucional fez

foi outorgar àquele que, lesado em seu direito à informação subjetiva, buscasse

ou pela via mandamental e sumária do habeas data, provando documental-

mente a recusa, ou, não dispondo de qualquer prova, se valesse das vias ordi-

nárias, mas quer em uma, quer em outra, encontrando a devida prestação juris-

dicional. O excesso de recursos não pode, em nenhum momento, representar

inconstitucionalidade ou vedação ao princípio de acesso à Justiça, muito antes

ao contrário.

Ampliando seus conhecimentos

Decisão 1.ª

AI 70.023.291.008

17.ª CC-TJRS

Julgado em 24/01/2006

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO REVISIONAL. PRETENSÃO DE HABEAS DATA.LIBERAÇÃO DE REGISTRO NEGATIVO EM BANCO DE DADOS.

O devedor que se encontra discutindo o débito que deu ou poderá dar origem aregistros em bancos de dados de informações creditícias tem direito à anotaçãoe não à eliminação ou sustação do referido registro. Exegese dos artigos 4.º, §2.º,e 7.º, inciso III, da Lei 9.507/97.

AGRAVO DESPROVIDO.

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Habeas data

[...]

Os bancos de dados e cadastros de consumidores constituem serviços de

informações legitimados, principalmente pela nova sociedade de consumo,

entre cujas características básicas se encontram o anonimato de seus partici-

pantes e a velocidade de suas transações. Na medida em que a confiança que

unia tradicionalmente o fornecedor e consumidor, baseada esta no conheci-

mento que um tinha do outro, passou a ser substituída pelo anonimato princi-

palmente do consumidor, assim como se fez necessário protegê-lo das diver-

sas práticas utilizadas seja no fornecimento de mercadorias seja de serviços,

também se supriu o fornecedor, superando-se o anonimato do devedor, nas

relações que implicam crédito ou financiamento, com a instituição de arqui-

vos de consumo, instrumentalizando a concessão de crédito de forma rápida

e eficaz.

Nesse particular, os artigos 43 e 44 do CODECON estabelecem princípios

básicos a assegurar, de um lado, o acesso e o controle desses registros pelos

próprios consumidores, e de outro, o seu funcionamento como instrumento

de proteção ao crédito, considerados os mesmos de caráter público, conforme

parágrafo 4.º do predito artigo 43.

Foi, porém, a Lei 9.507/97 que veio, efetivamente, regulamentar o acesso

e, via de consequência, a retificação dos registros. E, nesse diapasão, o legis-

lador pátrio distinguiu o tratamento a ser dispensado ao registro equivo-

cado e àquele cujo débito se encontre em discussão, vênia de entendimento

diverso.

É que o artigo 4.º, §2.º do novel estatuto estabelece que, embora não

constatada a inexatidão do dado, se o interessado apresentar explicação ou

contestação sobre o mesmo, justificando possível pendência sobre o fato

objeto do dado, tal explicação será anotada no cadastro do interessado – e

não simplesmente subtraída, ainda em sede administrativa. E mais, no artigo

7.º, que trata exatamente do cabimento do habeas data, seu inciso III prevê

a ação jurisdicional, elevada à garantia constitucional pelo artigo 5.º, inciso

LXXII, da Carta Magna, exatamente para a hipótese de anotação nos assenta-

mentos do interessado, de contestação ou explicação sobre dado verdadeiro

mas justificável e que esteja sob a pendência judicial ou mesmo amigável,

quando obstaculizada a providência administrativa.

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Habeas data

79

Trata-se, na verdade, da busca de equilíbrio pelo legislador nacional entre

o direito do consumidor ou usuário de crédito de preservar o seu bom nome

no mercado e a indispensável proteção ao crédito, irrenunciável nas socieda-

des modernas e que não sobreviveria se estimulada a inadimplência.

É exatamente o caso dos autos. O agravante está discutindo débito oriundo

de contrato ou contratos, mais precisamente sobre o valor da dívida a partir

das cláusulas de encargos, e postula a abstenção de eventuais registros de seu

nome no Serasa ou quaisquer outros bancos de dados, quando, na verdade, a

tutela prevista no ordenamento jurídico não é de liberação, mas sim de ano-

tação, caso algum lançamento venha a se concretizar. Esta sim, se vedada,

comporta intervenção judicial, seja através da ação sumária e mandamental

do habeas data, caso a resistência seja oposta pelo próprio banco de dados,

seja pelas vias ordinárias, se a fonte da controvérsia for em face do credor.

O que se tem, em suma, é que a simples discussão de cláusulas do contrato

não leva à vedação do acesso do credor ao cadastramento.

[...]

Pelos expostos fundamentos, com base no art. 557, caput , do CPC, com

redação dada pela Lei 9.756/98, nego seguimento, de plano, a presente agravo

de instrumento.

Intime-se a parte agravante.

Decisão 2.ª

AI 70.013.930.888

20.ª CC-TJRS

Julgado em 15/02/2006

HABEAS DATA. EXTINÇÃO DO FEITO. PEDIDO EXTRAJUDICIAL REALIZADOPELO IMPETRANTE DESATENDIDO. REQUISITOS PREVISTOS NO ART. 8.º, DA LEI9.507/97 PERFECTIBILIZADOS. SITUAÇÃO DOS AUTOS QUE VAI AO ENCONTRODAS DISPOSIÇÕES DO ART. 7.º DO REFERIDO DIPLOMA LEGAL. SENTENÇA DES-CONSTITUÍDA. APELO PROVIDO.

[...]

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Habeas data

Cuida-se de habeas data, cujo processamento está regulado através da Lei

9.507/97, a qual impõe como condição da ação, prévio requerimento adminis-

trativo junto ao órgão responsável pelo dado buscado, exigências estas conti-

das nos arts. 2.º e 8.º, parágrafo único, I, verbis:

Art. 2.º O requerimento será apresentado ao órgão ou entidade depositária do registro oubanco de dados e será deferido ou indeferido no prazo de quarenta e oito horas.

[...]

Art. 8.º A petição inicial, que deverá preencher os requisitos dos arts. 282 a 285 do Códigode Processo Civil, será apresentada em duas vias, e os documentos que instruírem a pri-meira serão reproduzidos por cópia na segunda.

Parágrafo único. A petição inicial deverá ser instruída com prova:

I - da recusa ao acesso às informações ou do decurso de mais de dez dias sem decisão;

Consoante se verifica dos autos, o apelante, anteriormente ao ingresso da

presente ação, enviou missiva para o apelado, visando ao fornecimento da

certidão prevista no artigo 7.º, I, da Lei 9.507/97, fl. 06, cujo recebimento pela

ré está datado de 21 de setembro de 2005, inocorrendo qualquer resposta

no prazo de 48 horas (art. 2.º). Donde o prazo passou a ser aquele previsto no

inciso I do artigo 8.º, ou seja, dez dias.

No entanto, quando do ajuizamento da ação, 28 de setembro de 2005,

ainda não havia transcorrido o prazo de dez dias a que alude o inciso I do

artigo 8.º da Lei 9.507/97, posto que a apelada recebeu pedido extrajudicial

em 21 de setembro de 2005. Evidente que a documentação anexada à inicial

deverá ser suficiente para comprovar o direito do impetrante porque o pro-

cedimento não comporta dilação probatória. Vale dizer: é necessária prova de

que a entidade depositária do registro ou banco de dados se recusou a prestar

as informações ou deixou de decidir sobre a matéria em dez dias. Nesse con-

texto, a jurisprudência tem entendido que a prematuridade do ajuizamento

antes do decêndio legal não pode constituir óbice ao processamento doremédio constitucional, mormente diante da inércia da impetrada ao forneci-

mento da certidão postulada, circunstância que ainda persiste.

A ratio essendi  do habeas data é assegurar, em favor da pessoa interessada,

o exercício de pretensão jurídica que se distingue nos seguintes aspectos:

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Habeas data

81

a) direito ao acesso de registro; b) direito de retificação de registro e c) direito

de complementação de registros. (HD 107 / DF; HABEAS DATA 2004/0123006-8;

Ministro JOSÉ DELGADO; DJ 18/04/2005, p. 202)

Demais disso, o habeas data é o meio constitucional posto à disposição de pessoa física ou jurídica para lhe assegurar o conhecimento de registros concernen-

tes ao postulante e constantes de repartições públicas ou particulares acessíveis ao

 público, para retificação de seus dados pessoais (CF, art. 5.º, LXXII, “a” e “b”).”  

Considerando, portanto, a natureza do remédio e comprovada a ausência

de decisão pela impetrada acerca do pedido, tenho que resta caracterizado

o interesse de agir, inaplicando-se o disposto na Súmula do STJ. (Não cabe o

habeas data (CF, art. 5.º, LXXII, letra a) se não houve recusa de informações por

 parte da autoridade administrativa. Súmula 02/STJ ).

Nesse sentido, oportuno transcrever ementa de acórdão do Tribunal Pleno

do STF, Relator o Ministro CELSO DE MELLO (STF, Tribunal Pleno, RHD 22/DF,

Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 1.º/09/1995, p. 27.378), verbis:

“HABEAS DATA. NATUREZA JURÍDICA. REGIME DO PODER VISÍVEL COMO PRESSUPOSTODA ORDEM DEMOCRÁTICA. A JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL DAS LIBERDADES. SERVIÇONACIONAL DE INFORMAÇÕES (SNI). ACESSO NÃO RECUSADO AOS REGISTROS ESTATAIS.AUSÊNCIA DO INTERESSE DE AGIR. RECURSO IMPROVIDO. – A Carta Federal, ao proclamaros direitos e deveres individuais e coletivos, enunciou preceitos básicos, cuja compreen-são é essencial à caracterização da ordem democrática como um regime do poder visível.– O modelo político-jurídico, plasmado na nova ordem constitucional, rejeita o poder queoculta e o poder que se oculta. Com essa vedação, pretendeu o constituinte tornar efeti-vamente legítima, em face dos destinatários do poder, a prática das instituições do Estado.– O habeas data configura remédio jurídico-processual, de natureza constitucional, que sedestina a garantir, em favor da pessoa interessada, o exercício de pretensão jurídica discer-nível em seu tríplice aspecto: (a) direito de acesso aos registros; (b) direito de retificaçãodos registros e (c) direito de complementação dos registros. – Trata-se de relevante instru-mento de ativação da jurisdição constitucional das liberdades, a qual representa, no planoinstitucional, a mais expressiva reação jurídica do Estado às situações que lesem, efetiva oupotencialmente, os direitos fundamentais da pessoa, quaisquer que sejam as dimensões

em que estes se projetem. – O acesso ao habeas data pressupõe, dentre outras condiçõesde admissibilidade, a existência do interesse de agir. Ausente o interesse legitimador daação, torna-se inviável o exercício desse remédio constitucional. – A prova do anterior inde-ferimento do pedido de informação de dados pessoais, ou da omissão em atendê-lo, cons-titui requisito indispensável para que se concretize o interesse de agir no habeas data. Semque se configure situação prévia de pretensão resistida, há carência da ação constitucionaldo habeas data.”

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Habeas data

De resto, ressalto que constitui direito do impetrante o uso do remédio

constitucional para verificar eventuais dados insertos no cadastro da ré, cujo

conteúdo somente poderá ser aferido após o fornecimento de certidão pelo

impetrado. Cuida-se, em realidade, da busca de equação equilibrada entre o

direito do consumidor de preservar o seu bom nome no mercado e a indis-pensável proteção ao crédito. Assim, precipitada a extinção do feito que, em

última análise obsta o exercício da faculdade prevista no artigo 4.º, §2.º do

referido Diploma Legal.

Do exposto, dou provimento ao apelo e desconstituo a sentença, determi-

nando o prosseguimento do feito, com a adoção das providências a que alude

o artigo 9.º, da Lei 9.507/97.

É o voto.

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Roberto de Almeida Borges Gomes

Princípios protetivos dos bens difusos e coletivosÉ elementar, para iniciar-se o presente estudo, a determinação dos ali-

cerces principiológicos que norteiam o objeto do tema discutido. Os bens

difusos e coletivos são constitucionalmente tutelados, submetendo-se a uma

principiologia própria, que segue aqui pincelada.

Dignidade da pessoa humana

A dignidade da pessoa humana é o princípio eleito como vetor mestre

pelo legislador constituinte de 1988. A importância desse princípio é tão

grande que o constituinte o insere no artigo 1.º, III, no rol dos fundamentos

da República Federativa do Brasil. Não satisfeito com o referido comando,

reforça-o em outras passagens.1

É oportuno transcrever a conceituação proposta por Alexandre de Moraes

(2004, p. 52):

A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singular-mente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigoa pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invul-nerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcional-mente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempresem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto sereshumanos.

O elenco de normas constitucionais que consagra o princípio em comento,

v.g., os artigos 5.º, 6.º, 170, 225, dentre outros, demonstra a vocação do consti-

tuinte de 1988 em valorizar o “mínimo existencial”2 que deve ser assegurado

1 Artigo 5.º, XLII, XLIII, XLVIII, XLIX, L; artigo 34, VII, “b”; artigo 226, parágrafo 7.º; artigos 227 e 230.

2 Expressão do professor Cristiano Chaves de Farias utilizada em sua obra Direito Civil : teoria geral. 2. ed. Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2005.

Direitos coletivos

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Direitos coletivos

ao indivíduo quando da sua existência, para a consecução de uma vida digna.

Cristiano Chaves de Farias (2005, p. 343) relaciona essa garantia a um mínimo

patrimonial à dignidade da pessoa humana:

Percebe-se o objetivo almejado pela Constituição da República no sentido de garantir a erradi-cação da pobreza e a redução das desigualdades sociais, funcionalizando o patrimônio comoum verdadeiro instrumento de cidadania e justificando a separação de uma parcela essencial,básica, do patrimônio para atender às necessidades elementares da pessoa humana.

É o chamado mínimo existencial, revelando um dos aspectos concretos, práticos, da afirmaçãoda dignidade da pessoa humana.

Indisponibilidade, titularidade difusa e vulnerabilidade

Um traço característico da tutela coletiva é que ela se refere a bens indisponí-

veis e de titularidade difusa, não sendo possível a identificação dos titulares dodireito. Esse é um dos elementos que ensejam a vulnerabilidade dos bens em

questão.

A natureza diferenciada dos bens citados impõe também uma titularidade

diferenciada, posto que não se compatibilizam com a apropriação por um único

indivíduo. Os bens ambientais, a defesa do consumidor, a proteção à vida e à

saúde, são de tamanha relevância constitucional e para a existência humana, que

não podem cair na vala comum dos bens que podem ser objeto de negociatas,

sendo, portanto, indisponíveis, e requerendo a criação de um sistema protetivo,inclusive com alteração da consagrada legitimação para defesa em juízo, expressa

no artigo 6.º do Código de Processo Civil (CPC), segundo o qual:

Art. 6.º Ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado porlei.

Essa regra foi abrandada por uma espécie de legitimação autônoma determi-

nada na Constituição Federal (CF), no artigo 129, III, que conferiu legitimação ao

Ministério Público (MP) “para a proteção do patrimônio público e social, do meio

ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”, para que defendesse emnome próprio direito alheio, e assim o fez em claro respeito à peculiaridade da

natureza jurídica dos bens em questão, bem como para garantir uma proteção

efetiva e, particularmente, reconhecendo a vulnerabilidade desses bens jurídicos.

A vulnerabilidade é um traço característico dos bens difusos, quer seja por sua

natureza, já que, por vezes, quando violados, são de difícil ou impossível recupe-

ração, quer por sua própria titularidade, que é dispersa, e por isso mesmo dificulta

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Direitos coletivos

87

a sua proteção. A vulnerabilidade fica bem caracterizada por Aurisvaldo Melo

Sampaio (apud  FARIAS, 2005, p. 151), que, de forma lapidar, ensina:

Sob o ponto de vista humano – não jurídico, obviamente – as lesões à saúde e à segurançado consumidor são frequentemente irreparáveis. São marcadas pela irreversibilidade. Comorecompor o dano consequente da morte de um consumidor vitimado por acidente de con-

sumo? Decorre disto a primazia dada pelo Código ao aspecto preventivo.

A prevalência que deu o Código à proteção da saúde e da segurança do consumidor tem ine-quívoca sede constitucional, como decorrência não apenas dos novos valores adotados pelaConstituição Federal, mas, particularmente, do fato de cuidar-se aqui da própria tutela do direitoà vida.

A essencialidade dos bens metaindividuais é o elemento permissivo para esse

tratamento diferenciado dado pelo legislador constituinte e infraconstitucional

aos bens difusos.

Precaução e prevenção

Tais princípios são basilares para a efetivação de uma sadia qualidade de vida,

englobando, portanto, a proteção ambiental, saúde, vida, dentre outros bens de

grande importância para a pessoa humana.

O  princípio da precaução  evidencia-se quando se está diante de incertezas

científicas sobre a potencialidade de lesão ao bem ambiental, e então se deve

atuar para coibir a prática lesiva ao meio ambiente, quando não se sabe se hápossibilidade de lesão, bem como o grau da possível lesão.

Por seu turno, o princípio da prevenção determina que, sabendo-se a potencia-

lidade de lesão e/ou o grau dessa possível lesão, deve-se tomar todas as medidas

para proteção do bem ambiental, para impedir ou minorar os efeitos e resultados

da prática lesiva ao meio ambiente. Tudo isso se coaduna com o ensinamento de

Aurisvaldo Melo Sampaio (apud  FARIAS, 2005, p. 155):

A inquietação surge, em verdade, sob o prisma preventivo, seja relativamente ao dever de infor-

mação, de não colocação do produto ou serviço no mercado de consumo, de retirá-lo, ou daadoção de medidas sanatórias ou acautelatórias, quando há incerteza científica quanto à suasegurança.

Defesa do consumidor

A opção constitucional pelo modelo capitalista faz-se clara nos artigos 1.º, IV,

e 170, caput , II e IV, dentre outros, que demonstram a inequívoca opção político-

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Direitos coletivos

-legislativa nacional. Ocorre que a própria Carta Magna, que inaugura um Estado

social, não poderia criar um paradoxo sem solução, e ela, a “Constituição Cidadã”3,

que com todos os seus problemas, decorrentes de uma costura legislativa compli-

cadíssima4, foi o que de melhor podíamos produzir na época.

Hoje, após inúmeras modificações, a Carta de 1988 ainda representa a opçãoconstitucional brasileira, que adotou o modelo capitalista; todavia, criou um sis-

tema de limites para que esse modelo econômico encontrasse freios, para não

perder de vista a condição de cumprimento dos comandos constitucionais, que

apontam de forma clara para a proteção da dignidade humana como uma condi-

ção essencial para se fazer garantir a vontade da Constituição.

Verificou-se que a situação da igualdade contratual, tão estudada e difundida

no direito das obrigações e na teoria geral dos contratos, pautada numa teoria

pós-revolucionária francesa, denominada de “autonomia da vontade” e aqui no

nosso sistema amplamente defendida, não mais era condizente com os valores

consagrados na CF.

Felizmente, a doutrina consumerista cresceu e o próprio Direito Civil viu brotar

no seu seio teorias revisionistas do contrato, que chegaram a fazer florescer, no

Código Civil (CC) de 2002, a função social do contrato, afastando-se daquela leitura

draconiana do contrato como algo imutável, ainda que trouxesse às partes uma

obrigação desproporcional. O legislador percebeu que as relações e contratos nasociedade de massa mudaram, que o poder econômico criou uma desigualdade

de forças, e que os indivíduos precisavam de assistência peculiar, e reconheceu a

necessidade de constitucionalizar a defesa do consumidor, como forma de garan-

tia da defesa do indivíduo contra os ataques do mercado.

Era necessária essa constitucionalização, pois o microssistema consumerista

serviria para impor limites a um modelo econômico que é traçado constitucio-

nalmente e, portanto, precisa de uma norma de igual hierarquia para limitá-lo e

demonstrar a importância dessas regras limitadoras.

3 Tomo por empréstimo a expressão do presidente da Câmara e Congresso Nacional, quando da promulgação da CF, que deforma emocionada apelidou a recém-promulgada CF, o então deputado Ulisses Guimarães.

4 Controvérsias intra-partidárias, confrontos entre movimentos progressistas e o “Centrão” etc.

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Direitos coletivos

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Sociedade justa e fraterna

Propositadamente encerramos este breve enfoque principiológico, com dois

conceitos expressos no preâmbulo da Constituição, que de forma vestibular abre

as portas da Carta Magna informando qual será sua orientação.

A fraternidade e o modelo libertário individualista se opõem, vez que o

segundo pressupõe uma valorização exacerbada das ideias individualistas, nas

quais os conceitos que primam pelo interesse social e coletivo ficam em segundo

plano. O interesse privado é o norte principiológico, e, portanto, devem ser sacri-

ficados os outros interesses em prol da proteção do exclusivamente individual.

Está evidente no preâmbulo a opção constitucional do Estado brasileiro, que

preza pelo valor justiça como forma de atuação nas relações jurídicas travadas no

Brasil.

Há que se ressaltar que o preâmbulo tem grande importância como fixador

dos elementos de interpretação da CF, e demonstra o verdadeiro espírito consti-

tucional brasileiro, servindo de balizador para leitura e interpretação das normas

constitucionais.

Categorias de interessePodem ser identificadas no Direito diversas categorias de interesse. Aqui, nos

reportaremos apenas às de maior relevância para a compreensão do tema.

Interesse público

O interesse público é aquele relacionado à figura do Estado, no sentido de que

seu conteúdo é por ele determinado. Ademais, a expressão interesse público

abrange também aqueles interesses eleitos pelo Estado como os valores mais

relevantes na sociedade.

Interesse social ou geral

Não se confunde o interesse público com o interesse social  (referente à maio-

ria da sociedade, o chamado “bem comum”) ou geral  (oposto ao individual, pode

ser empregado como sinônimo de interesse social), embora alguns autores

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Direitos coletivos

apontem que o interesse público primário pode ser entendido como interesse da

coletividade (e, nesse sentido, sinônimo de interesse social ou geral), enquanto

o interesse público secundário seria inerente à Administração Pública (LEONEL,

2002, p. 93)

Interesse privado e individual

Interesse privado é o relativo ao relacionamento mantido entre indivíduos, que

verse sobre matéria essencialmente disponível.

Rodolfo de Camargo Mancuso (2004, p. 50-51) entende, por sua vez, que “é

individual o interesse cuja fruição se esgota no círculo de atuação do seu destina-

tário. [...] o interesse individual se exerce pelo e para o indivíduo [...].”

Interesse transindividual

Os interesses transindividuais ou metaindividuais constituem uma categoria

intermediária de interesses, que transcendem o interesse dos indivíduos isolada-

mente considerados, mas não chegam a constituir interesse do Estado.

Sobre eles, leciona Ricardo de Barros Leonel (2002, p. 95):

Os interesses supra ou metaindividuais podem ser identificados como uma terceira categoria,situada propriamente entre os interesses privados e os públicos, mas com maior proximidadedestes últimos, ou, sob outro enfoque, e considerando os públicos uma categoria mais abran-gente, como uma modalidade diferenciada destes interesses.

José Marcelo Vigliar (2005, p. 18) denomina essa classe de interesses como

interesses indivisíveis, explicando que:

Há interesses que apenas podem ser aproveitados, fruídos ou utilizados de forma coletiva.

A abordagem desses interesses se dá de forma diversa daqueles que são defensáveis pelosistema processual do Código: ou todos aproveitam igualmente desses interesses, ou essesinteresses não podem ser considerados, porque perdem sua característica essencial (que é aindivisibilidade).

Por fim, os interesses metaindividuais classificam-se em difusos, coletivos e

individuais homogêneos.

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Direitos coletivos

91

Direitos difusos, coletivose individuais homogêneos

As expressões direitos difusos  e direitos  coletivos  muitas vezes são utilizadascomo sinônimos na doutrina. Todavia, após o advento do Código de Defesa do

Consumidor (CDC), que sistematizou a matéria, apresentando o conceito de cada

categoria de interesse supraindividual, não persiste razão para a confusão doutri-

nária.

Veja-se a disciplina dada à matéria pela Lei 8.078/90, artigo 81:

Art. 81. [...]

Parágrafo único. [. ..]

I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais,de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstân-cias de fato;

II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os transindividu-ais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entresi ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;

III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origemcomum.

Direitos difusos

Direitos difusos são aqueles de natureza indivisível, congregando um grupo,

classe ou categoria de indivíduos indetermináveis, que compartilham a mesma

situação de fato. No dizer de Hugo Nigro Mazzilli (2005, p. 50), “são como um feixe

ou conjunto de interesses individuais, de objeto indivisível, compartilhados por

pessoas indetermináveis, que se encontram unidas por circunstâncias de fato

conexas”.

Segundo lição de Luiz Manoel Gomes Júnior (2005, p. 8), citando Carlos Alberto

Bittar,

O que caracteriza os direitos difusos é, justamente, a impossibilidade de se determinar, “comprecisão”, quem seja o seu titular ou beneficiado, já que se trata de um direito que “[...] trans-cende a um indivíduo, podendo ser exercido em conjunto em razão de elementos comuns (cir-cunstâncias de fato)”.

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Direitos coletivos

Analisando os interesses difusos, Rodolfo de Camargo Mancuso (2004, p. 93)

apresenta as seguintes características básicas desses direitos: indeterminação

dos sujeitos; indivisibilidade do objeto; intensa conflituosidade; duração efêmera,

contingencialidade.

Tais características emanam da conceituação ofertada pelo legislador, noinciso I, artigo 81, parágrafo único, do CDC: “interesses ou direitos difusos, assim

entendidos, para efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível,

de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato” 

(grifo nosso).

José Marcelo Vigliar (2005, p. 23) ainda aponta, sobre os direitos difusos:

A expressão que adjetiva essa modalidade de interesses dá a ideia de dispersão, a ideia dedifusão. [...]

A dispersão dos interessados é uma consequência da dispersão do interesse. [...] o que deter-mina a dispersão dos interessados é justamente a indivisibilidade, característica essencial dosinteresses difusos. A indivisibilidade determina que a fruição e defesa do interesse se dê apenase tão somente de forma coletiva [...].

Acerca da difusão própria dessa categoria de interesses Rodolfo de Camargo

Mancuso (2004, p. 148-149) observa que ela decorre

[...] da circunstância de que eles não estão coalizados por um liame jurídico, mas sim, por ocor-rências de fato  [...]. Aliás, é essa circunstância de estarem num plano pré-jurídico, isto é, des-vinculados dos limites demarcados numa norma, o que enseja essa fluidez apresentada pelosinteresses difusos.

Os direitos difusos, desse modo, em razão de sua natureza indivisível, não são

passíveis de fruição individual, nem é viável a promoção de sua defesa pela siste-

mática individualista do CPC (VIGLIAR, 2005, p. 23).

Direitos coletivosDireitos coletivos são os transindividuais, de natureza indivisível de que seja

titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com a parte con-

trária por uma relação jurídica base. Ricardo de Barros Leonel (2002, p. 107) apontaas notas identificadoras dos interesses coletivos:

Mínimo de organização, a fim de que tenham a coesão e a identificação necessárias; a afetaçãodestes interesses a grupos determinados ou determináveis, que são os seus portadores (enteesponenziali ); vínculo jurídico básico, comum a todos os integrantes do grupo, que lhes confereuma situação jurídica diferenciada.

No mesmo sentido caminha Rodolfo de Camargo Mancuso (2004, p. 59), para

quem

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Direitos coletivos

93

[...] os interesses coletivos valem-se dos grupos como veículos para sua exteriorização; um grupopressupõe um mínimo de coesão, de organização, de estrutura. Os interesses, para serem “coleti-vos”, necessitam, pois, estar aglutinados, coalizados.

José Marcelo Vigliar (2005, p. 28-29) esclarece a amplitude da indivisibilidade

que caracteriza o interesse coletivo:

Há determinados interesses que apenas afetam – indivisivelmente – uma categoria, um grupo,ou uma determinada classe de pessoas (afetam apenas os médicos, os professores da rede deensino público, os advogados, os juízes etc.), não sendo extensiva a todos os seres humanos. [...]

Há uma indiscutível indivisibilidade. Pertencer àquela classe, categoria ou grupo implica na frui-ção de determinados interesses que – indivisivelmente – a todos eles pertence.

Direitos individuais homogêneos

Colhendo ensinamento de Hugo Nigro Mazzilli (2005, p. 53), diz-se que osdireitos individuais homogêneos

[...] são aqueles de grupo, categoria ou classe de pessoas determinadas ou determináveis, quecompartilhem prejuízos divisíveis, de origem comum, normalmente oriundos das mesmas cir-cunstâncias de fato.

Convém esclarecer que os direitos individuais homogêneos, nas palavras de

Luiz Manoel Gomes Júnior (2005, p. 10), são apenas “acidentalmente coletivos”,

devido ao fato de serem “individuais em sua essência”, mas recebendo tratamento

coletivo em razão de sua origem comum. A homogeneidade de tais interessesrepousa, justamente, na origem comum, o evento que liga as pessoas lesadas.

Esse também é o ensino de José Marcelo Vigliar (2005, p. 31):

[...] os interesses individuais homogêneos têm exatamente a natureza jurídica indicada no nome:são interesses individuais, contudo, presentes certas circunstâncias, poderão merecer um trata-mento processual coletivo, como se fosse da mesma natureza dos difusos ou dos coletivos.

A justificativa para esse tratamento coletivo é exposta pelo Superior Tribunal

de Justiça (STJ):

[...] em decorrência de [...] sua dimensão social [...] estará presente [...] o chamado impacto demassa, por ser grande o número de interessados e das graves repercussões na comunidade quepossam ser provocadas pela potencialidade lesiva de um produto, núcleo comum das preten-sões de todos. Tem-se, assim, na fase de conhecimento, um trato processual coletivista a direitose interesses individuais5.

5 STJ, REsp 140.097/SP, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, j. em 04/05/2000, citado por Luiz Manoel Gomes Júnior, (2005, p. 11-12).

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Direitos coletivos

Distinções necessáriasCumpre, ainda, ressaltar as diferenças e semelhanças existentes entre as ca-

tegorias de interesse metaindividual ora estudadas, a fim de melhor compreen-

dê-las.

Proferindo voto no julgamento do RE 163.231-3, o ministro do Supremo Tri-

bunal Federal (STF), Maurício Corrêa, expôs, com clareza, a distinção entre direito

difuso e coletivo:

[...] difuso o interesse que abrange número indeterminado de pessoas unidas pelo mesmo fato,enquanto interesses coletivos seriam aqueles pertencentes a grupos ou categorias de pessoasdetermináveis, possuindo uma base jurídica. Portanto, a “indeterminidade” seria a característicafundamental dos interesses difusos, e a “determinidade” daqueles interesses que envolvem oscoletivos.

Hugo Nigro Mazzilli (2005, p. 53) também captou que “tanto os interesses difu-

sos como os coletivos são indivisíveis, mas se distinguem não só  pela origem da

lesão como também  pela abrangência do grupo”. Essa diferença decorre do fato

de que “os interesses difusos supõem titulares indetermináveis, ligados por circuns-

tâncias de fato, enquanto os coletivos dizem respeito a grupo, categoria ou classe

de  pessoas determinadas ou determináveis, ligadas pela mesma relação jurídica

básica”.

Destacando, ainda, as diferenças entre interesse difuso e interesse coletivo,

Rodolfo de Camargo Mancuso (2004, p. 85) ensina que

[...] o interesse difuso concerne a um universo maior   do que o interesse coletivo, visto que,enquanto aquele pode mesmo concernir até a toda humanidade, este apresenta menor ampli-tude, já pelo fato de estar adstrito a uma “relação-base”.

Por seu turno, os direitos individuais homogêneos são distintos dos difusos

pois não são indivisíveis – ao contrário, o dano ou interesse é divisível, e os preju-

dicados são identificáveis.

Diferem os interesses coletivos dos individuais homogêneos no tocante àdivisibilidade do interesse, vez que só estes últimos são divisíveis, supondo a

origem comum da lesão. Todavia, essas categorias de interesse aproximam-se, ao

passo em que ambos referem-se a um grupo ou classe de pessoas determináveis

(MAZZILLI, 2005, p. 53).

Segue transcrito um quadro sinótico, elaborado por Hugo Nigro Mazzilli (2005,

p. 55) para facilitar a sistematização do tema:

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Direitos coletivos

95

Interesses Grupo Objeto Origem

Difusos indeterminável indivisível situação de fato

Coletivos determinável indivisível relação jurídica

Individuais homogêneos determinável divisível origem comum

A tutela coletivados interesses transindividuais

Tendo em mente as especificidades que caracterizam os interesses difusos e

coletivos, tais como a indivisibilidade, a titularidade difusa e a vulnerabilidade,

convém refletir sobre a efetividade da sua tutela judicial.

A tutela individual, prescrita no CPC, é insuficiente para a proteção dessa gama

de direitos, como bem observa José Marcelo Vigliar (2005, p. 20):

Imagine o problema de se defender um bem indivisível e, ainda, demonstrar, na petição inicial,que se detém legitimidade para a defesa da parcela (que inexiste) que também pertence a todosos demais. [...] Qual seria a natural consequência, diante das regras do Código de Processo Civil?Resposta: a impossibilidade de se defender esse interesse em juízo.

Diante da constatação de que a natureza transindividual desses bens invia-

biliza sua defesa em juízo segundo as regras individualistas do CPC, a doutrinacompreende que a solução é submeter a demanda às regras próprias da tutela

coletiva.

Nesse passo, Hugo Nigro Mazzilli (2005, p. 48) propõe que

[...] o acesso individual dos lesados à Justiça seja substituído por um processo coletivo, que nãoapenas deve ser apto a evitar decisões contraditórias como ainda deve conduzir a uma soluçãomais eficiente da lide, porque o processo coletivo é exercido de uma só vez, em proveito de todoo grupo lesado.

Colhendo ensinamento de Mazzilli (2005, p. 49), pode-se extrair as principaiscaracterísticas da tutela coletiva dos interesses transindividuais:

a controvérsia objeto da lide refere-se a interesses de grupos, classes ou

categorias de pessoas, e não a interesses individuais;

existência de conflitos entre os grupos envolvidos, e não simplesmente

entre autor e réu, como na tutela individual;

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Direitos coletivos

a legitimação é, em regra, extraordinária;

o valor da indenização é destinado a fundos especiais, e não ao indivíduo

lesado;

a coisa julgada que se forma é, geralmente, erga omnes, com eficácia ultra

 partes, diversamente do processo individual, limitado às partes que inte-

graram a lide;

preponderância do  princípio da economia processual  (num só processo dis-

cute-se o interesse de todo um grupo de pessoas, não sendo empregada

uma ação para cada indivíduo, como ocorre na tutela individual).

Ampliando seus conhecimentos

 Jurisprudências

EMENTA: CONSTITUCIONAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPOSTOS: IPTU. MINISTÉRIO PÚBLICO:LEGITIMIDADE. Lei 7.347/85, art. 1.º, II, e art. 21, com a redação do art. 117 da Lei 8.078, de1990 (Código do Consumidor); Lei 8.625, de 1993, art. 25. CF, artigos 127 e 129, III.

I - A ação civil pública presta-se à defesa de direitos individuais homogêneos, legitimado

o Ministério Público para aforá-la, quando os titulares daqueles interesses ou direitos esti-verem na situação ou na condição de consumidores, ou quando houver uma relação deconsumo. Lei 7.347/85, art. 1.º, II, e art. 21, com a redação do art. 117 da Lei 8.078/90 (Códigodo Consumidor); Lei 8.625, de 1993, art. 25.

II - Certos direitos individuais homogêneos podem ser classificados como interesses oudireitos coletivos, ou identificar-se com interesses sociais e individuais indisponíveis. Nessescasos, a ação civil pública presta-se à defesa dos mesmos, legitimado o Ministério Públicopara a causa. CF, art. 127, caput , e art. 129, III.

III - O Ministério Público não tem legitimidade para aforar ação civil pública para o fim de

impugnar a cobrança e pleitear a restituição de imposto – no caso o IPTU – pago indevi-damente, nem essa ação seria cabível, dado que, tratando-se de tributos, não há, entre osujeito ativo (poder público) e o sujeito passivo (contribuinte) uma relação de consumo (Lei7.347/85, art. 1.º, II, art. 21, redação do art. 117 da Lei 8.078/90 (Código do Consumidor); Lei8.625/93, art. 25, IV; CF, art. 129, III), nem seria possível identificar o direito do contribuintecom “interesses sociais e individuais indisponíveis.” (CF, art. 127, caput ).

IV - RE não conhecido. (STF, RE 195.056/PR, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, j.09/12/1999).

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Direitos coletivos

97

EMENTA: PROCESSO CIVIL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. DEMANDAS COLETIVAS E INDIVI-DUAIS PROMOVIDAS CONTRA A XXXXXX E EMPRESAS CONCESSIONÁRIAS DE SERVIÇO DETELEFONIA. CONTROVÉRSIA A RESPEITO DA LEGITIMIDADE DA COBRANÇA DE TARIFA DEASSINATURA BÁSICA NOS SERVIÇOS DE TELEFONIA FIXA.

[...]

Considera-se existente, porém, conflito positivo de competência ante a possibilidade dedecisões antagônicas nos casos em que há processos correndo em separado, envolvendo asmesmas partes e tratando da mesma causa. É o que ocorre, frequentemente, com a propo-situra de ações populares e ações civis públicas relacionadas a idênticos direitos transindi-viduais (= indivisíveis e sem titular determinado), fenômeno que é resolvido pela aplicaçãodo art. 5.º, §3.º, da Lei da Ação Popular (Lei 4.717/65) e do art. 2.º, parágrafo único, da Lei daAção Civil Pública (Lei 7.347/85), na redação dada pela Medida Provisória 2.180-35/2001.

6. No caso dos autos, porém, o objeto das demandas são direitos individuais homogêneos(= direitos divisíveis, individualizáveis, pertencentes a diferentes titulares). Ao contrário

do que ocorre com os direitos transindividuais – invariavelmente tutelados por regime desubstituição processual (em ação civil pública ou ação popular) –, os direitos individuaishomogêneos podem ser tutelados tanto por ação coletiva (proposta por substituto proces-sual), quanto por ação individual (proposta pelo próprio titular do direito, a quem é facul-tado vincular-se ou não à ação coletiva). Do sistema da tutela coletiva, disciplinado na Lei8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor – CDC, nomeadamente em seus arts. 103, III,combinado com os §§ 2.º e 3.º, e 104), resulta (a) que a ação individual pode ter curso inde-pendente da ação coletiva; (b) que a ação individual só se suspende por iniciativa do seuautor; e (c) que, não havendo pedido de suspensão, a ação individual não sofre efeito algumdo resultado da ação coletiva, ainda que julgada procedente. Se a própria lei admite a con-vivência autônoma e harmônica das duas formas de tutela, fica afastada a possibilidade de

decisões antagônicas e, portanto, o conflito.

7. Por outro lado, também a existência de várias ações coletivas a respeito da mesmaquestão jurídica não representa, por si só, a possibilidade de ocorrer decisões antagônicasenvolvendo as mesmas pessoas. É que os substituídos processuais (= titulares do direitoindividual em benefício de quem se pede tutela coletiva) não são, necessariamente, osmesmos em todas as ações. Pelo contrário: o normal é que sejam pessoas diferentes, e, paraisso, concorrem pelo menos três fatores: (a) a limitação da representatividade do órgão ouentidade autor da demanda coletiva (= substituto processual), (b) o âmbito do pedido for-mulado na demanda e (c) a eficácia subjetiva da sentença imposta por lei, que “abrangeráapenas os substituídos que tenham, na data da propositura da ação, domicílio no âmbito decompetência territorial do órgão prolator” (Lei 9.494/97, art. 2.º-A, introduzido pela MedidaProvisória 2.180-35/2001).

8. No que se refere às ações coletivas indicadas pelo Suscitante, umas foram propostas porórgãos municipais de defesa do consumidor, a significar que os substituídos processuais(= beneficiados) são apenas os consumidores do respectivo município; quanto às demais– nomeadamente as propostas pelo Ministério Público –, a eficácia subjetiva da sentençaestá limitada, pelo próprio pedido ou por força de lei, aos titulares domiciliados no âmbitoterritorial do órgão prolator. Não se evidencia, portanto, na grande maioria dos casos, a

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Direitos coletivos

superposição de ações envolvendo os mesmos substituídos. Cumpre anotar, de qualquermodo, que eventual conflito dessa natureza – de improvável ocorrência –, estabelecido emface da existência de mais de uma demanda sobre a mesma base territorial, deverá serdirimido não pelo STJ, mas pelo Tribunal a que estejam vinculados os juízes porventuraconflitantes.

[...]

14. O pedido de suspensão das ações individuais até o julgamento das ações coletivas, alémde estranho aos limites do conflito de competência, não pode ser acolhido, não apenas pelaautonomia de cada uma dessas demandas, mas também pela circunstância de que as açõesindividuais, na maioria dos casos, foram propostas por quem não figura como substituídoprocessual em qualquer das ações coletivas.

15. Conflito conhecido em parte, apenas com relação às ações coletivas propostas perantea 2.ª Vara Especializada da Justiça Estadual de Salvador, BA, e a 1.ª Vara Federal de Salvador,BA, para declarar a competência da Justiça Federal. (STJ, CC 48.106/DF, 1.ª Seção, Rel. para

acórdão Min. Teori Albino Zavascki, j. 14/09/2005).

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Ação popular

A doutrina aponta como espécies de ação popular a ação popular  penal , vol-

tada à aplicação da pena decorrente do cometimento de um delito; e as ações

populares não penais, espécies de direito político de participação (ALMEIDA, 2003,

p. 391). Todavia, há que se ressalvar que no direito brasileiro, com o advento da CF

de 1988, não mais persiste a ação popular dita penal, por ser a titularidade para a

ação penal pública exclusiva do Ministério Público – MP – (CF, art. 129, I).

Conforme observa Ricardo de Barros Leonel (2002, p. 115), a ação popular foi

prevista no ordenamento jurídico brasileiro como “primeiro instrumento sistemá-

tico, com regulamentação autônoma e praticamente completa, voltada à tutela

de alguns interesses metaindividuais em juízo”; daí sua grande importância para

a sistematização da defesa dos direitos transindividuais.

ObjetoAntes da CF de 1988, o objeto da ação popular era o ato ilegal e lesivo ao patri-

mônio público, entendido este como os bens e direitos de valor econômico, artís-

tico, estético, histórico ou turístico (ALMEIDA, 2003, p. 398).

Com a promulgação da CF de 1988, houve significativa ampliação do âmbito

de atuação da ação popular, abrangendo a defesa do meio ambiente e da morali-

dade administrativa, além do patrimônio público nos aspectos acima referidos.

Considerando o regramento constitucional vigente, pode-se definir como

objeto da ação popular a “anulação de atos lesivos ao patrimônio público, à mora-

lidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural”

(BARROSO, 2003, p. 208).

Rodolfo de Camargo Mancuso (1998, p. 77) sustenta a possibilidade de se

manejar a ação popular também para a desconstituir ato lesivo aos consumido-

res, considerando o conceito de interesse difuso trazido no artigo 81, I, do Código

de Defesa do Consumidor (CDC).

Gregório Assagra de Almeida (2003, p. 400), que compartilha desse entendi-

mento de Mancuso, salienta que

[...] na hipótese de utilização da ação popular para a tutela de relação de consumo, somenteseria possível o pedido de pretensão decorrente de direito difuso (CDC, art. 81, parágrafo único,I), como é da própria essência da ação popular como garantia processual constitucional do cida-dão.

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Ação popular

103

A Lei de Ação Popular (LAP) também está vocacionada a postular a nulidade de

atos que tenham vício de incompetência, vício de forma, ilegalidade do objeto, ine-

 xistência dos motivos ou desvio de finalidade. A própria LAP conceitua esses vícios,

no parágrafo único do artigo 2.º. Cumpre ressaltar, entretanto, que esse rol não é

taxativo – outros vícios podem ensejar a anulação do ato, segundo as prescrições

legais e a sua natureza, como bem frisa o artigo 3.º da LAP. O artigo 4.º, dessa lei,

traz hipóteses de atos em que a ilegitimidade e lesividade são presumidas.

Ainda no tocante ao objeto, deve-se observar que não cabe ação popular

contra lei em tese e ato jurisdicional – mas para lei de efeitos concretos, é cabível

a ação popular (MEIRELLES, 2003, p. 135). Outrossim, “não se pode ignorar que

também a conduta omissiva traz a possibilidade de se produzir um ato danoso”,

de modo que se entende viável a ação popular em face de omissões das autorida-

des (BARROSO, 2003, p. 211).

RequisitosA doutrina costuma apontar como requisito subjetivo da ação popular a exi-

gência de que seu autor seja cidadão brasileiro, assim entendida a pessoa humana

no gozo de seus direitos civis e políticos, que seja eleitor. A comprovação desse

requisito dá-se através do título de eleitor, conforme preceitua o artigo 1.º, pará-

grafo 3.º, da LAP.

Art. 1.º [...]

§3.º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou com docu-mento que a ele corresponda.

Exige-se, ainda, que o ato que se pretende invalidar seja eivado dos vícios de

ilegalidade ou ilegitimidade. A ilegalidade se configura sempre que o ato é con-

trário ao direito, violando normas ou princípios. A ilegitimidade, por sua vez,

refere-se a vício formal ou substancial, inclusive desvio de finalidade (MEIRELLES,

2003, p. 135).

Finalmente, a LAP requer, para o manejo da ação popular, a presença do requi-

sito lesividade do ato ao patrimônio público, à moralidade administrativa, ao meio

ambiente e ao patrimônio histórico e cultural.

Consoante se observa da redação do inciso LXXIII, do artigo 5.º, da CF, citado

anteriormente, reforçado pelo artigo 1.º, parágrafo 1.º, da LAP, a lesividade não

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Ação popular

se refere apenas ao aspecto patrimonial, estendendo-se tal conceito para valores

não econômicos, como a moralidade administrativa, o meio ambiente e o patri-

mônio histórico e cultural.

LAP

Art. 1.º [...]

§1.º Consideram-se patrimônio público para os fins referidos neste artigo, os bens e direitos devalor econômico, artístico, estético, histórico ou turístico.

O entendimento anterior à CF de 1988 era no sentido de que os requisitos

ilegalidade e lesividade eram, obrigatoriamente, cumulativos. Todavia, conforme

observa Luís Roberto Barroso (2003, p. 209), “a tendência dos últimos anos [...] tem

sido a de admitir que cada um desses vícios, individualmente, legitima a proposi-

tura da ação”.

FinalidadeA ação popular tem por finalidade, nos termos do artigo 5.º, LXXIII, a anulação 

dos atos lesivos aos bens jurídicos elencados na referida norma. A Lei 4.717/65,

ao reger a matéria, estabeleceu hipóteses de nulidade e de anulabilidade de tais

atos.

São reputados nulos, segundo expressa disposição da LAP (art. 2.º), os atos quepossuem vício de incompetência, vício de forma, ilegalidade do objeto, inexistên-

cia dos motivos e desvio de finalidade. O artigo 4.º traz um rol casuístico de atos e

contratos considerados nulos.

Os atos considerados anuláveis são aqueles que, lesivos ao patrimônio das

pessoas de Direito Público ou Privado, possuem vícios que não se enquadram nas

hipóteses de nulidade descritas no artigo 2.º da LAP, mas são compatíveis com a

natureza deles (LAP, art. 3.º).

Partes

Sujeito ativo

O cidadão brasileiro, o eleitor pessoa física no gozo de seus direitos políticos,

ocupa o polo ativo da ação popular, por determinação constitucional. Qualquer

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Ação popular

105

cidadão pode, ainda, habilitar-se como litisconsorte ou assistente do autor popu-

lar (LAP, art. 6.º, §5.º).

Luís Roberto Barroso (2003, p. 212) ensina que

[...] a legitimação do cidadão é ampla, tendo o direito de ajuizar a ação popular mesmo que o

litígio se verifique em comarca onde ele não possua domicílio eleitoral. Dessa maneira, é irrele-vante que o cidadão pertença, ou não, à comunidade a que diga respeito o ato lesivo, pois essepressuposto não está na lei e nem se assenta em razoáveis fundamentos.

Sujeito passivo

O polo passivo da ação popular, por sua vez, comporta diversos réus. Dispõe o

artigo 6.º da Lei 4.717/65 que a ação será proposta contra a pessoa jurídica, pública

ou privada, em nome da qual foi praticado o ato que se pretende anular, bem

como em face das autoridades, funcionários, administradores que houverem auto-rizado, aprovado, ratificado ou praticado pessoalmente o ato ou firmado o con-

trato lesivo, ou que, por omissão, tenham causado a lesão.

Ademais, devem também ser réus os beneficiários diretos do ato ou contrato

impugnado (LAP, art. 6.º, §1.º) e o avaliador , quando se tratar de lesão decorrente

de avaliação inexata (art. 6.º, §2.º).

O artigo 6.º, parágrafo 3.º, da Lei 4.717/65 permite que a pessoa jurídica citada

na ação popular abstenha-se de contestar o pedido ou mesmo atue ao lado do

autor, quando isso se mostrar útil ao interesse público. Sobre esse dispositivo Hely

Lopes Meirelles (2003, p. 137) aduz: “a inovação processual é das mais relevantes,

pois permite que o réu confesse tacitamente a ação, pela revelia, ou a confesse

expressamente, passando a atuar em prol do pedido na inicial, em defesa do

patrimônio público”.

A doutrina afirma ser obrigatória a formação de litisconsórcio passivo. Isto seria

cabível, por exemplo, na hipótese em que o servidor que possa ser responsabili-

zado regressivamente pelo dano no caso de julgamento procedente do pedido se

habilite como litisconsorte (MEIRELLES, 2003, p. 137).

Ministério Público

Para José Afonso da Silva (apud MEIRELLES, 2003, p. 138) o MP ocupa, na ação

popular, “posição multifária”, pois atua como fiscal da lei, ativador das provas,

substituto e sucessor do autor e titular.

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Ação popular

Por determinação expressa da LAP (art. 6.º, §4.º), o MP deve acompanhar a

ação, podendo apressar a produção probatória, além de promover a responsa-

bilidade civil ou criminal dos agentes públicos. Por razões óbvias, haja vista ser

o Parquet o guardião do interesse público, é-lhe vedado, em qualquer hipótese,

promover a defesa do ato impugnado ou dos seus autores.

Ao órgão ministerial compete, ainda, dar prosseguimento à ação popular, no

caso de abandono ou desistência da ação pelo autor originário (LAP, art. 9.º). Mas,

nessa hipótese, cabe ao membro do MP decidir se há, de fato, interesse público

no julgamento da ação, pois pode ocorrer “que o autor popular desista expressa-

mente da ação e com isso concorde o Ministério Público [...] se ambos se conven-

cerem da inexistência de fundamento para seu prosseguimento e houver concor-

dância dos réus” (MEIRELLES, 2003, p. 138-139).

Embora a Lei 4.717/65 não conceda legitimidade ativa na ação popular ao MP,enquanto órgão, nada impede que seus membros, na condição de cidadãos, ajuí-

zem tal ação.

CompetênciaA competência para o processamento da ação popular é determinada pela

origem do ato a ser anulado (LAP, art. 5.º):

ato praticado em órgão, entidade autárquica, paraestatal da União ou

entidade por ela subvencionada – competência do juiz federal da Seção

Judiciária onde o ato se consumou.

ato produzido por órgão do Estado ou entidade por ele subvencionada  

– competência da Justiça Estadual, conforme Lei de Organização Judiciária

local.

ato praticado por órgão do Município ou entidade com subvenção

municipal – competência do juiz da comarca a que o município pertencer,

de acordo com a Lei de Organização Judiciária.

Havendo interesse simultâneo da União e de qualquer outra entidade, a com-

petência será da Justiça Federal, da Seção Judiciária respectiva. Se existir interesse

concorrente do Estado e do Município, a competência será do juiz da causa do

Estado (Vara da Fazenda Estadual, se houver) – artigo 5.º, parágrafo 2.º, da LAP.

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Ação popular

107

ProcessoConsoante estatui a Lei 4.717/65 no artigo 7.º, a ação popular tramitará sob o

rito ordinário, todavia, com as especificidades trazidas na referida norma.

No despacho inicial o magistrado determinará a citação dos responsáveis peloato impugnado e a intimação do MP, bem como a requisição de documentos

necessários, com prazo de 15 a 30 dias para atendimento, prorrogável (LAP, art.

7.º, §2.º, I). A citação dos beneficiários pode dar-se por edital, quando assim prefe-

rir o autor popular (LAP, art. 7.º, II).

A LAP prevê que a contestação deve ser oferecida no prazo de 20 dias, comum

a todos os réus, prorrogável a pedido dos interessados, se difícil a prova docu-

mental (LAP, art. 7.º, IV).

Após o prazo para defesa o juiz proferirá despacho saneador. Se não houver

requerimento de provas pelas partes, segue-se para a fase de alegações (prazo de

10 dias), retornando conclusos para sentença. Caso haja requerimento de provas

pelas partes, seguir-se-á o rito ordinário (LAP, art. 7.º, V).

Liminar

A previsão expressa da possibilidade de concessão de medida liminar na LAPfoi introduzida pelo artigo 34 da Lei 6.513/77, que deu a seguinte redação ao

parágrafo 4.º do artigo 5.º da Lei 4.717/65:

Art. 5.º [...]

§4.º Na defesa do patrimônio público caberá a suspensão liminar do ato lesivo impugnado.

Em que pese ser importante a previsão desse provimento de urgência na ação

popular, Hely Lopes Meirelles (2003, p. 144) entende que

não podemos aplaudir o enxerto do parágrafo em exame, porque feito sem exigência de requi-sitos mínimos para a concessão da liminar, nem fixação do prazo para sua vigência, nem indi-cação do recurso cabível desse despacho. Sem esses condicionamentos, a liminar, ao invés deapresentar-se como um instrumento de proteção ao patrimônio público, erige-se numa pereneameaça à Administração.

A jurisprudência entende que a liminar, na ação popular, pode ser comba-

tida via agravo de instrumento, mandado de segurança ou correição parcial, não

cabendo o pedido de suspensão diretamente ao Presidente do Tribunal, previsto

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Ação popular

na Lei 8.437/92 (art. 4.º). Nesse último aspecto, registre-se o posicionamento

diverso de Hely Lopes Meirelles (2003, p. 152), para quem a decisão concessiva da

liminar é passível de pedido de cassação ao Presidente do Tribunal.

Sentença

O inciso VI do artigo 7.º da LAP estabelece que a sentença na ação popular

deve ser prolatada dentro de 15 dias, a contar do recebimento dos autos pelo juiz,

se este não a proferir em audiência.

A lei ainda prevê que a inércia do julgador em proferir sentença poderá pri-

vá-lo de inclusão na lista de promoção por merecimento e fazê-lo perder os dias

do retardamento para efeito de promoção por antiguidade (LAP art. 7.°, parágrafoúnico).

No tocante à natureza da sentença prolatada na ação popular, Luís Roberto

Barroso (2003, p. 214) leciona: “a sentença que julga procedente o pedido formu-

lado na ação popular pode ter natureza declaratória (na hipótese de ato nulo) ou

constitutiva (quando o ato for anulável), mas também condenatória”.

Quando a sentença julgar a ação procedente, deverá contemplar duas situa-

ções: a decretação de invalidade do ato impugnado e a condenação em perdas edanos dos responsáveis e beneficiários do ato, conforme expressamente dispõe o

artigo 11 da LAP. Ressalva-se, ademais, a possibilidade de ação regressiva contra

os funcionários causadores do dano, na hipótese de incorrerem em culpa.

A condenação na ação popular, além das perdas e danos, deve abranger as

indenizações devidas, as custas e demais despesas, judiciais e extrajudiciais, bem

como honorários advocatícios (LAP, art. 12).

No caso de julgamento improcedente do pedido, haverá isenção do autor dopagamento das custas e ônus da sucumbência, salvo comprovada má-fé, em obe-

diência ao comando inserido no artigo 5.º, LXXIII, da CF. Se provada a má-fé, será

o autor popular condenado ao décuplo das custas (LAP, art. 13).

Se restar provado, no curso do processo, o valor da lesão, a sentença já o indi-

cará; caso contrário, será ele apurado na execução. Na situação em que a lesão

for relacionada à falta ou isenção de pagamento, o valor deste será incluído na

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Ação popular

109

condenação, com juros e multa; se resultar de execução fraudulenta de contrato,

a condenará a reposição do valor, com juros; se o réu perceber valores do Poder

Público, será feito o desconto em folha; se a condenação for de restituir bens ou

valores, a parte estará sujeita a penhora (LAP, art. 14).

Vale frisar que, devido à alteração operada no processo de execução civil paraas obrigações de dar e fazer (exceto de dar dinheiro – pagar), a sentença passa

a expressar quase uma ordem mandamental, devendo ser cumprida, sob pena

de incidirem as imposições dos artigos 461 e 461-A do Código de Processo Civil

(CPC)1.

Com as alterações promovidas pelas Leis 8.952/94, 10.444/2002, 11.232/2005

e 11.382/2006, houve alteração substancial no processo de execução no Brasil,

modificando todas as hipóteses de comandos de fazer, não fazer e de dar (coisa

diferente de dinheiro), inclusive no processo coletivo, de modo que a reforma

mencionada também atinge a ação popular.

Nos casos em que a ação popular tiver por objeto obrigação de fazer ou não

fazer, seu procedimento executório deve se submeter ao artigo específico da LAP

(art. 14) e ao novo comando do CPC que, inclusive, é mais benéfico para execução.

A exigência de instauração de novo processo para executar já morreu.

1 Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela especí-fica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao doadimplemento.

§1.º A obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obten-ção do resultado prático correspondente.

§2.º A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa (art. 287).

§3.º Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juizconceder a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia, citado o réu. A medida liminar poderá ser revogada ou modifi-cada, a qualquer tempo, em decisão fundamentada.

§4.º O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedidodo autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.

§5.º Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requeri-mento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção depessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.§6.º O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou exces-siva.

Art. 461-A. Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cum-primento da obrigação.

§1.º Tratando-se de entrega de coisa determinada pelo gênero e quantidade, o credor a individualizará na petição inicial, se lhecouber a escolha; cabendo ao devedor escolher, este a entregará individualizada, no prazo fixado pelo juiz.

§2.º Não cumprida a obrigação no prazo estabelecido, expedir-se-á em favor do credor mandado de busca e apreensão ou deimissão na posse, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel.

§3.º Aplica-se à ação prevista neste artigo o disposto nos §§ 1.º a 6.º do art. 461.

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Ação popular

A Lei 4.717/65 (art. 15) determina, ainda, que, em se provando no curso do

processo a infringência da lei penal ou o cometimento de falta disciplinar, deve ser

remetida cópia dos autos às autoridades competentes para aplicação da sanção

correspondente.

Caso o autor popular ou terceiro não promova a execução da sentença prola-

tada na ação popular dentro do prazo de 60 dias contados da publicação do jul-

gado, esta pode ser feita pelo MP ou pelas próprias entidades chamadas na ação

(LAP, arts. 16 e 17).

A sentença proferida no curso da ação popular fará coisa julgada erga omnes,

exceto quando houver improcedência do pedido por falta de provas, conforme

estatui o artigo 18 da LAP. Nessa última hipótese, a ação poderá ser novamente

ajuizada, sob os mesmos fundamentos, mas com novas provas.

Luís Roberto Barroso (2003, p. 215) ressalva que, “se o pedido for rejeitado

por inexistência de fundamento para anular o ato ou declará-lo nulo, a sentença

também se revestirá de autoridade de coisa julgada oponível contra todos”.

Há previsão de reexame necessário na hipótese em que a sentença concluir

pela carência ou improcedência da ação (LAP, art. 19). No mesmo comando esta-

belece-se que caberá apelação, com efeito suspensivo, da decisão que julgar pro-

cedente a ação popular. Já para as decisões interlocutórias, o recurso cabível é oagravo de instrumento (LAP, art. 19, §1.º). A legitimidade para recorrer das deci-

sões contrárias ao autor da ação popular é atribuída a qualquer cidadão e ao MP

(, art. 19, §2.º).

O prazo prescricional para o ingresso da ação popular, nos termos do artigo 21

da LAP, é de cinco anos.

Por fim, a Lei 4.717/65, em seu artigo 22, determina a aplicação subsidiária do

CPC à ação popular, naquilo em que não contrariar os seus dispositivos nem anatureza específica desta ação.

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Ação popular

111

Ampliando seus conhecimentos

 Jurisprudências

EMENTA: AÇÃO POPULAR. ABERTURA DE CONTA EM NOME DE PARTICULAR PARA MOVI-MENTAR RECURSOS PÚBLICOS. PATRIMÔNIO MATERIAL DO PODER PÚBLICO. MORALIDADEADMINISTRATIVA. ART. 5.º, INC. LXXIII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. O entendimento sufra-gado pelo acórdão recorrido no sentido de que, para o cabimento da ação popular, basta ailegalidade do ato administrativo a invalidar, por contrariar normas específicas que regem asua prática ou por se desviar dos princípios que norteiam a Administração Pública, dispen-sável a demonstração de prejuízo material aos cofres públicos, não é ofensivo ao inc. LXXIIIdo artigo 5.º da Constituição Federal, norma esta que abarca não só o patrimônio materialdo Poder Público, como também o patrimônio moral, o cultural e o histórico. As premissasfáticas assentadas pelo acórdão recorrido não cabem ser apreciadas nesta instância extra-ordinária à vista dos limites do apelo, que não admite o exame de fatos e provas e nem,

tampouco, o de legislação infraconstitucional. Recurso não conhecido. (STF, RE 170.768/SP,1.ª Turma, Rel. Min. Ilmar Galvão, j. 26/03/1999).

EMENTA: AÇÃO POPULAR. PROCEDÊNCIA. PRESSUPOSTOS. Na maioria das vezes, a lesivi-dade ao erário público decorre da própria ilegalidade do ato praticado. Assim o é quandodá-se a contratação, por município, de serviços que poderiam ser prestados por servidores,sem a feitura de licitação e sem que o ato administrativo tenha sido precedido da necessá-ria justificativa. (STF, RE 160.381/SP, 2.ª Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 29/03/1994).

EMENTA: Competência: Justiça Comum: ação popular contra o XXXX: L. 4.717/65 (LAP),artigo 20, f; CF, artigo 109, IV; Súmula 516. 1.O XXXX não corresponde à noção constitu-cional de autarquia, que, para começar, há de ser criada por lei específica (CF, art. 37, XIX) enão na forma de sociedade civil, com personalidade de direito privado, como é o caso dorecorrido. Por isso, o disposto no artigo 20, -f-, da L. 4717/65 (LAP), para não se chocar coma Constituição, há de ter o seu alcance reduzido: não transforma em autarquia as entidadesde direito privado que recebam e apliquem contribuições parafiscais, mas, simplesmente,as inclui no rol daquelas – como todas as enumeradas no artigo 1.º da LAP – à proteçãode cujo patrimônio se predispõe a ação popular. 2. Dada a patente similitude da natureza

 jurídica do XXXX e congêneres à do XXXX, seja no tocante à arrecadação e aplicação decontribuições parafiscais, seja, em consequência, quanto à sujeição à fiscalização do Tribu-nal de Contas, aplica-se ao caso a fundamentação subjacente à Súmula 516/STF: “O ServiçoSocial da Indústria – SESI– está sujeito à jurisdição da Justiça estadual”. (STF, RE 366.168/SC,

1.ª Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 03/02/2004).

EMENTA: ADMINISTRATIVO. AÇÃO POPULAR. INÉPCIA DA INICIAL. 1. O cidadão, autor daação popular, há de fundamentar o seu pedido em causa jurídica expressa determinante denulidade ou de anulabilidade do ato administrativo.

2. É inepta, consequentemente, a petição inicial que não apresenta razão alguma determi-nante da pretensa nulidade e anulabilidade, nem formula pedido nesse sentido.

3. Parecer do Ministério Público em primeiro grau que opina, em razões bem fundamenta-das, pelo reconhecimento da inépcia.

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Ação popular

4. Acórdão que entende ter implicitamente sido formulado pedido de nulidade. Obrigato-riedade de pedido explícito.

5. Recurso provido para, restabelecendo a sentença de primeiro grau, julgar extinto o pro-cesso sem julgamento de mérito. (STJ, REsp 740.803/DF, 1.ª Turma, Rel. Min. José Delgado,

 j. 21/09/2006).

Lei 4.717, de 29 de Junho de 1965

Regula a ação popular.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu san-ciono a seguinte Lei:

Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração denulidade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Muni-cípios, de entidades autárquicas, de sociedades de economia mista (Constituição, art. 141,

§38), de sociedades mútuas de seguro nas quais a União represente os segurados ausentes,de empresas públicas, de serviços sociais autônomos, de instituições ou fundações paracuja criação ou custeio o tesouro público haja concorrido ou concorra com mais de cin-quenta por cento do patrimônio ou da receita ânua, de empresas incorporadas ao patri-mônio da União, do Distrito Federal, dos Estados e dos Municípios, e de quaisquer pessoas

 jurídicas ou entidades subvencionadas pelos cofres públicos.

§1.º Consideram-se patrimônio público para os fins referidos neste artigo, os bens e direitosde valor econômico, artístico, estético, histórico ou turístico. (Redação dada pela Lei 6.513,de 1977)

§2.º Em se tratando de instituições ou fundações, para cuja criação ou custeio o tesouro

público concorra com menos de cinquenta por cento do patrimônio ou da receita ânua,bem como de pessoas jurídicas ou entidades subvencionadas, as consequências patrimo-niais da invalidez dos atos lesivos terão por limite a repercussão deles sobre a contribuiçãodos cofres públicos.

§3.º A prova da cidadania, para ingresso em juízo, será feita com o título eleitoral, ou comdocumento que a ele corresponda.

§4.º Para instruir a inicial, o cidadão poderá requerer às entidades, a que se refere este artigo,as certidões e informações que julgar necessárias, bastando para isso indicar a finalidadedas mesmas.

§5.º As certidões e informações, a que se refere o parágrafo anterior, deverão ser forneci-das dentro de 15 (quinze) dias da entrega, sob recibo, dos respectivos requerimentos, e sópoderão ser utilizadas para a instrução de ação popular.

§6.º Somente nos casos em que o interesse público, devidamente justificado, impuser sigilo,poderá ser negada certidão ou informação.

§7.º Ocorrendo a hipótese do parágrafo anterior, a ação poderá ser proposta desacompa-nhada das certidões ou informações negadas, cabendo ao juiz, após apreciar os motivosdo indeferimento, e salvo em se tratando de razão de segurança nacional, requisitar umas

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Ação popular

113

e outras; feita a requisição, o processo correrá em segredo de justiça, que cessará com otrânsito em julgado de sentença condenatória.

Art. 2.º São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo ante-rior, nos casos de:

a) incompetência;b) vício de forma;

c) ilegalidade do objeto;

d) inexistência dos motivos;

e) desvio de finalidade.

Parágrafo único. Para a conceituação dos casos de nulidade observar-se-ão as seguintesnormas:

a) a incompetência fica caracterizada quando o ato não se incluir nas atribuições legais doagente que o praticou;

b) o vício de forma consiste na omissão ou na observância incompleta ou irregular de for-malidades indispensáveis à existência ou seriedade do ato;

c) a ilegalidade do objeto ocorre quando o resultado do ato importa em violação de lei,regulamento ou outro ato normativo;

d) a inexistência dos motivos se verifica quando a matéria de fato ou de direito, em que sefundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente inadequada ao resultadoobtido;

e) o desvio de finalidade se verifica quando o agente pratica o ato visando a fim diversodaquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência.

Art. 3.º Os atos lesivos ao patrimônio das pessoas de direito público ou privado, ou dasentidades mencionadas no art. 1.º, cujos vícios não se compreendam nas especificações do

artigo anterior, serão anuláveis, segundo as prescrições legais, enquanto compatíveis coma natureza deles.

Art. 4.º São também nulos os seguintes atos ou contratos, praticados ou celebrados porquaisquer das pessoas ou entidades referidas no art. 1.º.

I - A admissão ao serviço público remunerado, com desobediência, quanto às condições dehabilitação, das normas legais, regulamentares ou constantes de instruções gerais.

II - A operação bancária ou de crédito real, quando:

a) for realizada com desobediência a normas legais, regulamentares, estatutárias, regimen-tais ou internas;

b) o valor real do bem dado em hipoteca ou penhor for inferior ao constante de escritura,contrato ou avaliação.

III - A empreitada, a tarefa e a concessão do serviço público, quando:

a) o respectivo contrato houver sido celebrado sem prévia concorrência pública ou admi-nistrativa, sem que essa condição seja estabelecida em lei, regulamento ou norma geral;

b) no edital de concorrência forem incluídas cláusulas ou condições, que comprometam oseu caráter competitivo;

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Ação popular

c) a concorrência administrativa for processada em condições que impliquem na limitaçãodas possibilidades normais de competição.

IV - As modificações ou vantagens, inclusive prorrogações que forem admitidas, em favordo adjudicatário, durante a execução dos contratos de empreitada, tarefa e concessão deserviço público, sem que estejam previstas em lei ou nos respectivos instrumentos.

V - A compra e venda de bens móveis ou imóveis, nos casos em que não cabível concorrên-cia pública ou administrativa, quando:

a) for realizada com desobediência a normas legais, regulamentares, ou constantes de ins-truções gerais;

b) o preço de compra dos bens for superior ao corrente no mercado, na época da opera-ção;

c) o preço de venda dos bens for inferior ao corrente no mercado, na época da operação.

VI - A concessão de licença de exportação ou importação, qualquer que seja a sua modali-dade, quando:

a) houver sido praticada com violação das normas legais e regulamentares ou de instru-ções e ordens de serviço;

b) resultar em exceção ou privilégio, em favor de exportador ou importador.

VII - A operação de redesconto quando sob qualquer aspecto, inclusive o limite de valor,desobedecer a normas legais, regulamentares ou constantes de instruções gerais.

VIII - O empréstimo concedido pelo Banco Central da República, quando:

a) concedido com desobediência de quaisquer normas legais, regulamentares, regimentaisou constantes de instruções gerais:

b) o valor dos bens dados em garantia, na época da operação, for inferior ao da avaliação.

IX - A emissão, quando efetuada sem observância das normas constitucionais, legais e regu-lamentadoras que regem a espécie.

DA COMPETÊNCIA

Art. 5.º Conforme a origem do ato impugnado, é competente para conhecer da ação, pro-cessá-la e julgá-la o juiz que, de acordo com a organização judiciária de cada Estado, o forpara as causas que interessem à União, ao Distrito Federal, ao Estado ou ao Município.

§1.º Para fins de competência, equiparam-se atos da União, do Distrito Federal, do Estado

ou dos Municípios os atos das pessoas criadas ou mantidas por essas pessoas jurídicas dedireito público, bem como os atos das sociedades de que elas sejam acionistas e os daspessoas ou entidades por elas subvencionadas ou em relação às quais tenham interessepatrimonial.

§2.º Quando o pleito interessar simultaneamente à União e a quaisquer outras pessoas ouentidade, será competente o juiz das causas da União, se houver; quando interessar simul-taneamente ao Estado e ao Município, será competente o juiz das causas do Estado, sehouver.

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Ação popular

115

§3.º A propositura da ação prevenirá a jurisdição do juízo para todas as ações, que foremposteriormente intentadas contra as mesmas partes e sob os mesmos fundamentos.

§4.º Na defesa do patrimônio público caberá a suspensão liminar do ato lesivo impugnado.(Incluído pela Lei 6.513, de 1977)

DOS SUJEITOS PASSIVOS DA AÇÃO E DOS ASSISTENTES

Art. 6.º A ação será proposta contra as pessoas públicas ou privadas e as entidades referi-das no art. 1.º, contra as autoridades, funcionários ou administradores que houverem auto-rizado, aprovado, ratificado ou praticado o ato impugnado, ou que, por omissas, tiveremdado oportunidade à lesão, e contra os beneficiários diretos do mesmo.

§1.º Se não houver benefício direto do ato lesivo, ou se for ele indeterminado ou desconhe-cido, a ação será proposta somente contra as outras pessoas indicadas neste artigo.

§2.º No caso de que trata o inciso II, item “b”, do art. 4.º, quando o valor real do bem forinferior ao da avaliação, citar-se-ão como réus, além das pessoas públicas ou privadas eentidades referidas no artigo 1.º, apenas os responsáveis pela avaliação inexata e os bene-ficiários da mesma.

§3.º A pessoa jurídica de direito público ou de direito privado, cujo ato seja objeto deimpugnação, poderá abster-se de contestar o pedido, ou poderá atuar ao lado do autor,desde que isso se afigure útil ao interesse público, a juízo do respectivo representante legalou dirigente.

§4.º O Ministério Público acompanhará a ação, cabendo-lhe apressar a produção da provae promover a responsabilidade, civil ou criminal, dos que nela incidirem, sendo-lhe vedado,

em qualquer hipótese, assumir a defesa do ato impugnado ou dos seus autores.

§5.º É facultado a qualquer cidadão habilitar-se como litisconsorte ou assistente do autorda ação popular.

DO PROCESSO

Art. 7.º A ação obedecerá ao procedimento ordinário, previsto no Código de Processo Civil,observadas as seguintes normas modificativas:

I - Ao despachar a inicial, o juiz ordenará:

a) além da citação dos réus, a intimação do representante do Ministério Público;

b) a requisição, às entidades indicadas na petição inicial, dos documentos que tiverem sidoreferidos pelo autor (art. 1.º, §6.º), bem como a de outros que se lhe afigurem necessáriosao esclarecimento dos fatos, ficando prazos de 15 (quinze) a 30 (trinta) dias para o atendi-mento.

§1.º O representante do Ministério Público providenciará para que as requisições, a que serefere o inciso anterior, sejam atendidas dentro dos prazos fixados pelo juiz.

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Ação popular

§2.º Se os documentos e informações não puderem ser oferecidos nos prazos assinalados,o juiz poderá autorizar prorrogação dos mesmos, por prazo razoável.

II - Quando o autor o preferir, a citação dos beneficiários far-se-á por edital com o prazo de30 (trinta) dias, afixado na sede do juízo e publicado três vezes no jornal oficial do DistritoFederal, ou da Capital do Estado ou Território em que seja ajuizada a ação. A publicação serágratuita e deverá iniciar-se no máximo 3 (três) dias após a entrega, na repartição compe-tente, sob protocolo, de uma via autenticada do mandado.

III - Qualquer pessoa, beneficiada ou responsável pelo ato impugnado, cuja existência ouidentidade se torne conhecida no curso do processo e antes de proferida a sentença finalde primeira instância, deverá ser citada para a integração do contraditório, sendo-lhe res-tituído o prazo para contestação e produção de provas, salvo, quanto a beneficiário, se acitação se houver feito na forma do inciso anterior.

IV - O prazo de contestação é de 20 (vinte) dias, prorrogáveis por mais 20 (vinte), a reque-rimento do interessado, se particularmente difícil a produção de prova documental, e serácomum a todos os interessados, correndo da entrega em cartório do mandado cumprido,ou, quando for o caso, do decurso do prazo assinado em edital.

V - Caso não requerida, até o despacho saneador, a produção de prova testemunhal oupericial, o juiz ordenará vista às partes por 10 (dez) dias, para alegações, sendo-lhe os autosconclusos, para sentença, 48 (quarenta e oito) horas após a expiração desse prazo; havendorequerimento de prova, o processo tomará o rito ordinário.

VI - A sentença, quando não prolatada em audiência de instrução e julgamento, deverá serproferida dentro de 15 (quinze) dias do recebimento dos autos pelo juiz.

Parágrafo único. O proferimento da sentença além do prazo estabelecido privará o juizda inclusão em lista de merecimento para promoção, durante 2 (dois) anos, e acarretaráa perda, para efeito de promoção por antiguidade, de tantos dias quantos forem os doretardamento, salvo motivo justo, declinado nos autos e comprovado perante o órgão dis-

ciplinar competente.

Art. 8.º Ficará sujeita à pena de desobediência, salvo motivo justo devidamente compro-vado, a autoridade, o administrador ou o dirigente, que deixar de fornecer, no prazo fixadono artigo 1.º, §5.º, ou naquele que tiver sido estipulado pelo juiz (art. 7.º, n. I, letra “b”), infor-mações e certidão ou fotocópia de documentos necessários à instrução da causa.

Parágrafo único. O prazo contar-se-á do dia em que entregue, sob recibo, o requerimentodo interessado ou o ofício de requisição (art. 1.º, §5.º, e art. 7.º, n. I, letra “b”).

Art. 9.º Se o autor desistir da ação ou der motivo à absolvição da instância, serão publicadoseditais nos prazos e condições previstos no art. 7.º, inciso II, ficando assegurado a qual-

quer cidadão, bem como ao representante do Ministério Público, dentro do prazo de 90(noventa) dias da última publicação feita, promover o prosseguimento da ação.

Art. 10. As partes só pagarão custas e preparo a final.

Art. 11. A sentença que, julgando procedente a ação popular, decretar a invalidade do atoimpugnado, condenará ao pagamento de perdas e danos os responsáveis pela sua práticae os beneficiários dele, ressalvada a ação regressiva contra os funcionários causadores dedano, quando incorrerem em culpa.

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Ação popular

117

Art. 12. A sentença incluirá sempre, na condenação dos réus, o pagamento, ao autor, dascustas e demais despesas, judiciais e extrajudiciais, diretamente relacionadas com a ação ecomprovadas, bem como o dos honorários de advogado.

Art. 13. A sentença que, apreciando o fundamento de direito do pedido, julgar a lide mani-festamente temerária, condenará o autor ao pagamento do décuplo das custas.

Art. 14. Se o valor da lesão ficar provado no curso da causa, será indicado na sentença; sedepender de avaliação ou perícia, será apurado na execução.

§1.º Quando a lesão resultar da falta ou isenção de qualquer pagamento, a condenaçãoimporá o pagamento devido, com acréscimo de juros de mora e multa legal ou contratual,se houver.

§2.º Quando a lesão resultar da execução fraudulenta, simulada ou irreal de contratos, acondenação versará sobre a reposição do débito, com juros de mora.

§3.º Quando o réu condenado perceber dos cofres públicos, a execução far-se-á por des-

conto em folha até o integral ressarcimento do dano causado, se assim mais convier aointeresse público.

§4.º A parte condenada a restituir bens ou valores ficará sujeita a sequestro e penhora,desde a prolação da sentença condenatória.

Art. 15. Se, no curso da ação, ficar provada a infringência da lei penal ou a prática de faltadisciplinar a que a lei comine a pena de demissão ou a de rescisão de contrato de traba-lho, o juiz, “ex-officio”, determinará a remessa de cópia autenticada das peças necessárias àsautoridades ou aos administradores a quem competir aplicar a sanção.

Art. 16. Caso decorridos 60 (sessenta) dias da publicação da sentença condenatória desegunda instância, sem que o autor ou terceiro promova a respectiva execução, o repre-

sentante do Ministério Público a promoverá nos 30 (trinta) dias seguintes, sob pena de faltagrave.

Art. 17. É sempre permitida às pessoas ou entidades referidas no artigo 1.º, ainda que hajamcontestado a ação, promover, em qualquer tempo, e no que as beneficiar a execução dasentença contra os demais réus.

Art. 18. A sentença terá eficácia de coisa julgada oponível “erga omnes”, exceto no caso dehaver sido a ação julgada improcedente por deficiência de prova; neste caso, qualquer cida-dão poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova.

Art. 19. A sentença que concluir pela carência ou pela improcedência da ação está sujeita ao

duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal;da que julgar a ação procedente caberá apelação, com efeito suspensivo. (Redação dadapela Lei 6.014, de 1973)

§1.º Das decisões interlocutórias cabe agravo de instrumento. (Redação dada pela Lei 6.014,de 1973)

§2.º Das sentenças e decisões proferidas contra o autor da ação e suscetíveis de recurso,poderá recorrer qualquer cidadão e também o Ministério Público. (Redação dada pela Lei6.014, de 1973)

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Ação popular

DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 20. Para os fins desta lei, consideram-se entidades autárquicas:

a) o serviço estatal descentralizado com personalidade jurídica, custeado mediante orça-mento próprio, independente do orçamento geral;

b) as pessoas jurídicas especialmente instituídas por lei, para a execução de serviços deinteresse público ou social, custeados por tributos de qualquer natureza ou por outrosrecursos oriundos do Tesouro Público;

c) as entidades de direito público ou privado a que a lei tiver atribuído competência parareceber e aplicar contribuições parafiscais.

Art. 21. A ação prevista nesta lei prescreve em 5 (cinco) anos.

Art. 22. Aplicam-se à ação popular as regras do Código de Processo Civil, naquilo em quenão contrariem os dispositivos desta lei, nem a natureza específica da ação.

Brasília, 29 de junho de 1965;144.º da Independência e 77.º da República.

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Roberto de Almeida Borges Gomes

ConceitoA noção conceitual de ação civil pública (ACP) não é uniforme na dou-

trina. O primeiro sentido conferido à expressão ação civil pública foi o de ação

diversa da ação penal pública. É nesse diapasão que Hugo Nigro Mazzilli

(2005, p. 69) a entende como “a ação de ordem não penal proposta pelo

Ministério Público”.

Após o advento da Lei 7.347/85, a ACP pode ser definida como

[...] um novo mecanismo processual que pode ser acionado pelas pessoas e entes expres-samente elencados pela Lei 7.347, de 24 de julho de 1985, visando à proteção de interessesgrupais (ou seja, difusos, coletivos e individuais homogêneos), seja porque a tutela juris-dicional individual seria (quase) impossível, seja porque ela seria antieconômica e menoseficaz (DINAMARCO, 2001, p. 16).

Nas palavras de Hely Lopes Meirelles (2003, p. 161), a ACP é o

[...] instrumento processual adequado para reprimir ou impedir danos ao meio ambiente,ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagísticoe por infrações da ordem econômica, protegendo, assim, interesses difusos da sociedade.

Sobre a relevância da Lei 7.347/85, que instituiu a ACP, Roberto Barroso

(2003, p. 216-217) aduz:

[...] a Lei da Ação Civil pública trouxe importantes inovações, que incluíram a extensão dalegitimação ativa a vários órgãos, pessoas, entidades ou associações (art. 5.º); a tutela cau-telar (art. 4.º) e a possibilidade de mandado liminar (art. 12); o inquérito civil, destinado àsinvestigações preliminares à propositura da ação (arts. 8.º e 9.º); a instituição de um Fundopara o qual reverteriam, em alguns casos, as indenizações, com vistas à reconstituição dosbens lesados (arts. 13 e 20).

Ação civil pública e ação popularO artigo 1.º da Lei de ação civil pública (LACP) determina: “Regem-se pelas

disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular   [...]”. Esta ressalva busca

Ação civil pública

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Ação civil pública

tornar expressa a possibilidade de concomitância da ACP e da ação popular,

observados os requisitos específicos de cada uma.

Há que se ressaltar que as finalidades das ações em tela não se confundem: a

ação popular é predominantemente desconstitutiva e subsidiariamente conde-

natória; a ACP, por seu turno, é preponderantemente condenatória (MEIRELLES,2003, p. 165). Como bem observa Hely Lopes Meirelles (2003, p. 166), “a natureza

distinta das sentenças proferidas nesses dois tipos de ações, aliada às diferenças

na legitimidade para as causas, numa e noutra hipótese, nos leva à conclusão de

que não cabe ação civil pública com pedido típico de ação popular, e vice-versa”.

Responsabilidade por danos

Consoante disposição expressa do artigo 1.º da LACP, a ACP é ação de responsa-bilidade por danos morais e patrimoniais. Antes da Lei 8.884/94, o dispositivo refe-

rido apenas mencionava responsabilidade “por danos”. Somente com o advento

da Lei 8.884/94, que deu nova redação ao artigo 1.º da LACP, foram introduzidos

os qualificativos “morais e patrimoniais”.

O objetivo da alteração legislativa foi deixar expresso que a simples ocorrência

tão somente de dano moral é suficiente para desencadear a responsabilização

do agente.

A responsabilidade apurada na ação civil pública será, em regra, subjetiva, e

excepcionalmente, objetiva, segundo as prescrições legais específicas (exemplo:

o Código de Defesa do Consumidor (CDC) prevê responsabilidade objetiva por

fato do produto ou do serviço).

Bens tutelados

Consoante disposição do artigo 1.º da LACP, a ACP é instrumento de defesado meio ambiente, do consumidor, da ordem urbanística, dos bens e direitos de

valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, bem como de qualquer

outro interesse difuso ou coletivo, da ordem econômica e da economia popular.

Também a Constituição de 1988 (CF), no artigo 129, III, prevê a ACP destinada à

proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses

difusos e coletivos.

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Ação civil pública

123

Além desses interesses expressamente tuteláveis através da ACP, Luís Roberto

Barroso (2003, p. 219) defende que

[...] embora não tivessem merecido referência expressa no texto constitucional, também os inte-resses individuais homogêneos, por força do Código de Defesa do Consumidor, foram considera-dos dignos de proteção pela via da ação civil pública ou coletiva.

A Lei 8.625/93 – Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (LONMP) –, em

seu artigo 25, IV, “b”, ainda prevê a ACP como instrumento vocacionado à defesa

da moralidade administrativa.

Observa Hugo Nigro Mazzilli (2005, p. 121), a respeito da amplitude do objeto

da ação civil, que

[...] a legitimação para a defesa de interesses transidividuais é residual, e a legislação infra-constitucional já confere, não só ao Ministério Público como aos demais legitimados ativos àação civil pública, a possibilidade de defenderem quaisquer interesses difusos, coletivos ou

individuais homogêneos, entre os quais, mas não taxativamente, o meio ambiente, o consu-midor, o patrimônio cultural, as pessoas portadoras de deficiência [.. .] (grifos nossos).

A par dessas informações, segue-se à singela análise dos objetos expressa-

mente arrolados na LACP.

Meio ambiente

A CF reconheceu a importância desse bem jurídico, dedicando-lhe, inclusive,

um capítulo (VI, dentro do Título VIII – Da Ordem Social).

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comumdo povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade odever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Além de consagrar a proteção ao meio ambiente, a CF determinou a respon-

sabilização penal e administrativa das pessoas físicas ou jurídicas que ofenderem

este bem jurídico, sem prejuízo da responsabilidade civil (art. 225, §3.º).

Consumidor

Consumidor, na definição da Lei 8.078/90, é toda pessoa física ou jurídica que

adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final (CDC, art. 2.º).

A CF estabeleceu o dever do Estado de promover a defesa do consumidor,

reconhecendo a necessidade de proteção dessa categoria como um direito fun-

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Ação civil pública

damental (CF, art. 5.º, XXXII). A proteção ao consumidor é também um princípio

da ordem econômica (art. 170, V).

Na esfera de proteção da LACP, somente se promove a defesa coletiva dos

direitos dos consumidores (direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos),

excetuados os interesses individuais.

Bens e direitos de valor artístico,estético, histórico, turístico e paisagístico

A CF, ao cuidar desta categoria de direitos, empregou expressão mais abran-

gente: patrimônio público e social .

José dos Santos Carvalho Filho (2001) nos apresenta, em singelas linhas, o sig-nificado desses interesses:

patrimônio público   – conjunto de bens e direitos que integram direta-

mente o acervo do Estado;

patrimônio social  – conjunto de bens e direitos, de qualquer natureza, que

constituam objeto de interesse por parte da coletividade;

valor artístico  – o que merece a específica valoração da arte;

valor estético  – pertinente à estética, como ramo do conhecimento quetrata do belo, na natureza e na arte;

valor histórico  – se relaciona com fatos de grande relevância, principal-

mente ocorridos no passado;

valor turístico  – bens que servem como pontos de atração a pessoas de

local diverso;

valor paisagístico  – ressalta o aspecto da paisagem em si mesma, como

elemento natural de formação geológica.

Outros interesses coletivos ou difusos

Esta cláusula aberta, que havia sido vetada na redação original da LACP, foi

consagrada pela CF e incluída pela Lei 8.078/90.

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Ação civil pública

125

Interesses coletivos, na definição do CDC, são os transindividuais, de natureza

indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre

si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base (Lei 8.078/90, art. 81,

parágrafo único, II).

Interesses difusos, por seu turno, são os transindividuais, de natureza indivisí-vel de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de

fato (Lei 8.078/90, art. 81, parágrafo único, I).

Paira controvérsia acerca da possibilidade de manejo da ACP para defesa de

direitos individuais homogêneos, vez que a LACP somente menciona “interesses

difusos e coletivos”.

Interesses individuais homogêneos, na linguagem do CDC, são os decorren-

tes de origem comum. Em tais interesses, “sem dúvida, há uma relação jurídica

comum subjacente entre os consumidores, mas o que os liga no prejuízo sofrido

não é a relação jurídica em si (como ocorre quando se trata de interesse coletivos),

mas antes [...] a ‘origem comum’” (BARROSO, 2003, p. 223).

Sobre a possibilidade de utilização da ação civil para a defesa de interesses

individuais homogêneos, Hugo Nigro Mazzilli (2005, p. 116-117) aduz:

[...] em interpretação menos avisada, têm alguns procurado sustentar que a defesa de interesses

individuais homogêneos por meio de ação civil pública só poderia ser feita em favor de gruposde consumidores, pois que o CDC, sim, alude à defesa coletiva de consumidores. Esse entendi-mento superficial é de todo equivocado, pois que, como a LACP e o CDC se integram no tocanteà defesa coletiva de interesses transindividuais, também os interesses individuais homogêneosestão alcançados pela proteção da ação civil pública da Lei 7.347/85, estejam ou não relaciona-dos com a defesa de grupos de consumidores.

O CDC prevê a possibilidade de ação coletiva para a defesa de interesses indi-

viduais homogêneos (Lei 8.078/90, art. 91), persistindo o debate sobre se essa

expressão é usada como sinônima de ação civil pública ou se quer apontar a exis-

tência de outra espécie de ação para defesa de direitos metaindividuais.

Atualmente, o entendimento majoritário é de que realmente se trata de pre-

visão legal a possibilidade de ACP para a defesa de interesses individuais homo-

gêneos.

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Ação civil pública

Infração da ordem econômicae da economia popular

O inciso V do artigo 1.º da LACP, que trata da infração à ordem econômica como

objeto da ACP, foi incluído pela Lei 8.884/94. A Medida Provisória (MP) 2.180-35,de 24 de agosto de 2001, deu nova redação ao inciso VI para incluir, além da infra-

ção à ordem econômica, aquela praticada contra a economia popular.

Embora tais conceitos se aproximem, pode-se afirmar que a ordem econômica

se relaciona com o sistema econômico global, enquanto a economia popular se

refere aos prejuízos que podem ser causados aos indivíduos em virtude de alguma

situação de natureza econômica (CARVALHO FILHO, 2001, p. 34-35).

Hipótese de descabimento da ACPA MP 2.185-35, de 24 de agosto de 2001, acrescentou um parágrafo único ao

artigo 1.º da LACP, excluindo do seu âmbito de atuação pretensões que envolvam

tributos, contribuições previdenciárias, Fundo de Garantia do Tempo de Serviço

(FGTS) ou outros fundos cujos beneficiários possam ser individualmente determi-

nados.

Art. 1.º [...]

Parágrafo único. Não será cabível ação civil pública para veicular pretensões que envolvam tri-butos, contribuições previdenciárias, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS ou outrosfundos de natureza institucional cujos beneficiários podem ser individualmente determinados.

Referindo-se às medidas provisórias que regularam o objeto da ação civil,

Hugo Nigro Mazzilli (2005, p. 120) critica:

Verdade é que algumas medidas provisórias posteriores tentaram vedar o acesso coletivo à jurisdição em matérias que não interessavam ao governo; contudo, como é garantia funda-mental o acesso à jurisdição sob forma individual como sob forma coletiva, a ordem infra-

constitucional não pode impunemente obstá-lo (grifo nosso).

A regra supracitada visa afastar a utilização da ACP para tutela de alguns

direitos individuais, possivelmente titularizados por diversos indivíduos, cujo

ponto comum seria o ato do Poder Público que institui o tributo ou contribuição.

O emprego da ACP, nesses casos, geraria sempre a discussão sobre a constitucio-

nalidade do ato. Tais pretensões individuais, assim, devem ser discutidas através

do procedimento ordinário ou de mandado de segurança.

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Ação civil pública

127

Foro competenteQuando o artigo 2.º da Lei 7.347/85 menciona as “ações” previstas nesta lei,

está se referindo à ACP, à ação cautelar (art. 4.º) e à ação de execução (art. 15)

estatuídas na LACP.

O foro competente para processar a ACP e a ação cautelar (a ação de execução

é proposta, em regra, no juízo que julgou a causa em 1.º grau) é o do local onde

ocorrer o dano, conforme disposição do referido artigo 2.º, que firma, à primeira

vista, hipótese de competência territorial.

Essa opção legislativa leva em conta que o juiz do local do dano terá maior

facilidade para colher as provas necessárias ao julgamento da causa.

Embora a competência de foro seja territorial, a LACP prevê regra especial,

determinando que ela será de natureza funcional, tornando-a absoluta e impror-

rogável.

Ademais, a Lei 8.078/90 prevê exceção à regra do local do dano, quando o

dano for nacional ou regional que abranja mais de um Estado.

Art. 93. Ressalvada a competência da Justiça Federal, é competente para a causa a justiça local:

[...]

II - no foro da Capital do Estado ou no do Distrito Federal, para os danos de âmbito nacional ou

regional, aplicando-se as regras do Código de Processo Civil aos casos de competência concor-rente.

Quando a União, Autarquia ou Empresa Pública Federal for parte na ação, a

competência será da Justiça Federal, nos termos do artigo 109 da CF. O entendi-

mento jurisprudencial dominante antes do cancelamento da Súmula 183 do STJ

era no sentido de que, na ACP, a competência seria da Justiça Estadual, quando na

comarca inexistir Vara Federal – prevalência da regra de competência do foro do

local do dano (CF, art. 109, §3.º).

N. 183. Compete ao Juiz Estadual, nas comarcas que não sejam sede de vara da Justiça Fede-ral, processar e julgar ação civil pública, ainda que a União figure no processo. (Cancelada em08/11/2000, DOU 27/11/2000).

O artigo 2.º, parágrafo único, da LACP determina que “a propositura da ação

prevenirá a jurisdição do juízo para todas as ações posteriormente intentadas que

possuam a mesma causa de pedir ou o mesmo objeto”. Essa regra, contudo, deve

ser interpretada restritivamente, ocorrendo a prevenção somente no âmbito de

cada Estado, e não entre Estados distintos.

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Ação civil pública

Objeto da ACPSobre o objeto da ACP, o artigo 3.º da LACP dispõe:

Art. 3.º A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obri-

gação de fazer ou não fazer.

Segundo posição doutrinária1 e jurisprudencial, a ACP intentada pelo Ministé-

rio Público (MP) não deve ser utilizada somente para o ressarcimento de danos ao

erário, pois isso não se amolda às suas finalidades sociais.

Luís Roberto Barroso (2003, p. 223) acentua que “a alternatividade que o dispo-

sitivo enseja não impede a cumulação, numa mesma ação, dos pedidos de prestar

ou não algum fato e de indenizar em certa quantia de dinheiro”.

Condenação em dinheiro

O pedido de condenação em dinheiro será cabível quando o dano já estiver

consumado. Essa indenização pelo dano causado, em regra, não está ligada a

interesse material do autor da ação, por isso é revertida em favor de um fundo

especial, previsto no artigo 13 da LACP. Nesse passo, são pertinentes as pondera-

ções de Pedro da Silva Dinamarco (2001, p. 290):

Um problema bastante agudo da condenação pecuniária, na ação civil pública, consiste naquantificação do dano. É muito difícil calcular o valor econômico de um bem que não está nocomércio, ou seja, que não pode ser objeto de negociação. Assim o são, de modo geral, os inte-resses difusos e coletivos (além de indivisíveis, são muitas vezes infungíveis).

Situação um pouco diversa daquela de que trata o mencionado artigo 13 da Lei

7.347/85 refere-se à tutela de interesse individual homogêneo e, em certa medida,

interesse coletivo. Em tais hipóteses será possível o pedido indenizatório visando

ao ressarcimento em favor do grupo lesado ou dos indivíduos lesados individual-

mente em razão do fato comum. Nas ações que busquem a defesa concomitantede interesse difuso e individual homogêneo, portanto, ter-se-ão pedidos diversos,

um destinado ao fundo do artigo 13 da LACP e outro para os indivíduos atingidos

diretamente pelo dano.

1 Nesse sentido, veja-se José dos Santos Carvalho Filho (2001) e Hely Lopes Meirelles, (2003).

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Ação civil pública

mentos, a doutrina admite também a possibilidade de concessão de tutela ante-

cipada, pois, esta integra o sistema processual brasileiro, e a LACP determina a

aplicação subsidiária do CPC ao seu procedimento.

Pedro da Silva Dinamarco (2001, p. 314) capta com precisão a utilidade dos

provimentos de urgência no âmbito da tutela coletiva:[...] esses são mecanismos destinados a garantir a plena efetividade do processo. E a tutela cole-tiva, mais do que em outros casos, deve dar-se, sempre que possível e desde que satisfeitos osrequisitos legais, previamente (mediante concessão de medidas de urgência), especialmentequando se tratar de obrigação de fazer ou não fazer, por ser o meio mais efetivo de proteção.Apenas subsidiariamente ela pode ser reparatória, quando realmente não mais for possívelevitar o dano.

Ação cautelar

O artigo 4.º da LACP estatui a possibilidade de ajuizamento de ação cautelar

preparatória ou incidental à ação civil. Tal disposição torna-se, contudo, desne-

cessária, diante da previsão de aplicação subsidiária do Código de Processo Civil

(CPC) à ação civil pública (Lei 7.347/85, art. 19). O procedimento da ação cautelar

relativa à ACP será o previsto no CPC, incidindo as regras pertinentes aos proces-

sos cautelares inespecíficos (CPC, arts. 796 a 812).

Embora o artigo 4.º não tenha a redação conforme o artigo 1.º, possuindo um

rol menor de direitos tutelados cautelarmente, deve-se realizar uma interpreta-ção sistemática da LACP, no sentido de ser possível a providência cautelar para

tutelar todos os bens jurídicos mencionados nos incisos do artigo 1.º, sem exclu-

são daqueles não referidos no artigo 4.º.

Os pressupostos da tutela preventiva são os mesmos estabelecidos no CPC:

plausibilidade do direito material ( fumus boni iuris);

risco de perecimento do direito em razão da demora em sua proteção (  peri-

culum in mora).

Medida liminar

Nos termos do artigo 12 da Lei 7.347/85, o juiz poderá conceder mandado

liminar, com ou sem justificação prévia, no âmbito da ACP, em decisão sujeita a

agravo.

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Ação civil pública

131

Quando o autor não detiver todos os elementos para propor a ação princi-

pal, poderá ajuizar ação cautelar, requerendo a concessão de medida liminar. Por

outro lado, quando o requerente já possuir elementos para intentar a ação princi-

pal, não haverá necessidade de cautelar preparatória, pois poderá ser formulado

pedido de concessão de mandado liminar na ação principal, nos termos do citado

artigo 12. É nesse sentido o ensino de Luís Roberto Barroso (2003, p. 237-238):

Conjugando-se os artigos 4.º e 12 da Lei 7.347/85, tem-se que essa tutela de urgência poderáser obtida através de um provimento liminar, que tanto pode ser pleiteado na ação cautelar(preparatória ou incidental) como na própria ação civil pública. Muitas vezes, esta última alter-nativa será a mais prática, já que se obtém a segurança exigida pela situação emergencial sem anecessidade de se ajuizar uma ação cautelar propriamente dita.

Na decisão que conceder a liminar, o juiz poderá fixar multa para o caso de

não atendimento, mas esta só será exigível após o trânsito em julgado da decisão

favorável ao autor, embora devida desde o dia em que se configurar o descumpri-mento (LACP, art. 12, §2.º).

A Lei 7.347/85 ainda contempla o incidente de suspensão da liminar, a requeri-

mento de pessoa jurídica de Direito Público interessada, e para evitar grave lesão

à ordem, à saúde, à segurança e à economia pública (LACP, art. 12, §1.º). Presentes

tais requisitos, poderá o presidente do tribunal a que competir o conhecimento

do respectivo recurso suspender a execução da liminar, sustando-lhe os efeitos.

Hely Lopes Meirelles (2003, p. 178-179) entende que

[...] a razão daquele pedido [de suspensão da liminar] está em que, muitas vezes, a medida limi-nar, tolhendo obras, serviços ou atividades essenciais à comunidade, afeta o interesse público e

 justifica sua cassação até o julgamento final da causa.

O artigo 14 da Lei 7.347/85 ainda faculta ao juiz a concessão de efeito suspen-

sivo aos recursos, com a finalidade de evitar dano irreparável à parte.

Antecipação da tutela

Existe divergência doutrinária a respeito da possibilidade de antecipação da

tutela na ACP. Parte dos doutrinadores entende que, por haver tratamento espe-

cífico da liminar na LACP, não se aplica à ACP a antecipação da tutela (MEIRELLES,

2003, p. 179). Outra corrente, por seu turno, aceita a tutela antecipada especifica-

mente nas ações que tenham por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou

não fazer (BARROSO, 2003, p. 238).

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Ação civil pública

Admitindo-se a possibilidade de deferimento da tutela antecipada, os requisi-

tos serão aqueles exigidos no CPC: prova inequívoca; verossimilhança da alega-

ção; fundado receio de dano irreparável ou abuso de direito de defesa ou mani-

festo propósito protelatório do réu.

Um dos principais requisitos previstos para a concessão de tutela antecipada [...] é a reversibili-dade dos efeitos da providência. Não se pode realizar atos irreversíveis com base numa decisãoeminentemente provisória, justamente porque não haveria como, depois, dar efetividade ao

 julgado posterior que venha a eventualmente julgar a demanda improcedente (DINAMARCO,2001, p. 315).

Na ACP com pedido condenatório, devido à necessidade de se demonstrar a

prova inequívoca, que nesse caso dependerá de contraditório, não se deve conce-

der a tutela antecipatória, que poderá causar dano irreversível ao réu.

Já na ação civil com pedido constitutivo, por possibilitar que o juiz perceba, de

plano, se presentes todos os requisitos para a tutela antecipada (exemplo: no casode anulação de cláusula abusiva), é viável sua concessão.

Cumpre repisar, ainda, a possibilidade de aplicação da antecipação dos efeitos

da tutela na ACP com base no artigo 273 do CPC, tendo em vista o seu caráter

subsidiário em relação à ação civil. Ademais, a liminar é exteriorização de um pro-

vimento que tanto pode ser acautelatório como antecipatório, de modo que não

é verdadeira a afirmação de que, em razão de a LACP falar apenas em “liminar”,

estaria fazendo referência exclusiva à liminar acautelatória. O tipo de provimento

liminar dependerá, pois, do tipo de tutela buscado no processo, especialmenteapós a inclusão do parágrafo 7.º ao artigo 273 do CPC2, que atribuiu caráter de

fungibilidade ao instituto.

Legitimidade ativaO rol dos legitimados para o ajuizamento da ACP está inserido no artigo 5.º da

Lei 7.347/85, recentemente modificado pela Lei 11.448, de 15 de janeiro de 2007:

Art. 5.º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar:

I - o Ministério Público;

II - a Defensoria Pública;

2 Art. 273.[...]§7.º Se o autor, a título de antecipação de tutela, requerer providência de natureza cautelar, poderá o juiz, quando presentes osrespectivos pressupostos, deferir a medida cautelar em caráter incidental do processo ajuizado.

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Ação civil pública

133

III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista;

V - a associação que, concomitantemente:

a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil;

b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumidor, à

ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico epaisagístico.

A alteração promovida pela lei aludida foi a inclusão da Defensoria Pública e

do Distrito Federal entre os legitimados a promover a ACP.

Ministério Público

A participação do MP na ação civil tem início antes mesmo da fase judicial

ou da instauração do inquérito civil. Consoante determina o artigo 6.º da LACP,qualquer pessoa poderá e o servidor público deverá provocar a iniciativa do MP,

ministrando-lhe informações sobre fatos que constituam objeto da ação civil e

indicando-lhe os elementos de convicção.

O dispositivo em análise faculta ao particular o direito de representar ao MP,

mas cria para o servidor público o dever funcional de, em tomando ciência de

fatos que sejam objeto de ACP, informar ao MP. Descumprindo tal dever, sujeita-se

o servidor a sanções administrativas.

Esse direito de representar ao MP é uma garantia relacionada ao direito de

petição, previsto na CF (art. 5.º, XXXIV, “a”). A lei não exige forma específica para a

representação, bastando que ela seja escrita e assinada.

O objeto da representação deve ser informações sobre fatos que representem

ofensa a direitos difusos ou coletivos; e indicação de elementos de convicção.

Além da representação feita pelo particular ou por funcionário público, o

artigo 7.º da LACP estatui que, os juízes e tribunais, quando no exercício de suas

funções tiverem conhecimento de fatos que possam ensejar a propositura daação civil, remeterão peças ao MP para as providências cabíveis.

A LACP traz um dever, dirigido aos órgãos do Poder Judiciário, de remeter

peças ao MP quando, no exercício de suas funções, tomarem ciência de fatos

que possam ensejar ACP. O MP, ao receber tais peças de informação, não deverá

permanecer inerte, porém não estará vinculado à conclusão do órgão judicial,

podendo agir segundo sua livre convicção e independência funcional.

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Ação civil pública

A doutrina tradicional entende que a atuação do MP na ACP é hipótese de

legitimação extraordinária, pois esse órgão atua em nome próprio, defendendo

direito alheio (DINAMARCO, 2001, p. 204-205). Esse posicionamento é correto em

relação à defesa de interesses coletivos e individuais homogêneos, mas insufi-

ciente quando se trata de direitos difusos.

Em relação aos interesses difusos, Nelson Nery Junior (2002, p. 113-114)

defende tratar-se de legitimação autônoma do MP e pondera:

Parcela da doutrina ainda insiste em explicar o fenômeno da tutela jurisdicional dos interesses edireitos difusos pelos esquemas ortodoxos do processo civil. Tenta-se justificar a legitimação doMinistério Público, por exemplo, como extraordinária, identificando-a com o fenômeno da subs-tituição processual. Na verdade, o problema não deve ser entendido segundo as regras de legi-timação para a causa, com as inconvenientes vinculações com a titularidade do direito materialinvocado em juízo, mas sim à luz do que na Alemanha se denomina de legitimação autônomapara a condução do processo (selbständige Prozeβführungsbefugnis), instituto destinado a fazer

valer em juízo direitos difusos, sem que se tenha de recorrer aos mecanismos de direito materialpara explicar referida legitimação.

As especificidades dos interesses difusos impõem que o legislador rompa com

a tradição individualista da legitimação ativa para estar em juízo, de forma a ava-

lizar a defesa eficaz dos bens difusos, reconhecendo que, em razão da natureza

peculiar de sua titularidade, é necessário criar um sistema diferenciado de legiti-

mação – legitimação autônoma –, tal como propõe Nelson Nery Junior, com base

no direito alemão.

É função institucional do MP a promoção da ACP, conforme a CF (art. 129, III).

A LONMP, em seu artigo 25, IV, também previu essa função.

Os interesses tuteláveis pelo MP, nos termos do artigo 127 da CF, são aque-

les interesses sociais e individuais indisponíveis, quais sejam, os interesses difusos

e coletivos.

Acerca da possibilidade de tutela dos interesses individuais homogêneos pelo

MP, existe controvérsia doutrinária e jurisprudencial, sintetizada nas três posições

ora explanadas:

1.ª posição  – o MP pode tutelar direito individual homogêneo, sem impor-

tar se este é disponível ou não;

2.ª posição  – o MP não pode tutelar qualquer direito individual homogê-

neo, mas somente aqueles individuais homogêneos indisponíveis;

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Ação civil pública

135

3.ª posição   – o MP pode tutelar interesse individual homogêneo desde

que configurado “interesse social relevante” – posição do Superior Tribunal

de Justiça (STJ).

Hodiernamente, prevalece a corrente esposada pelo STJ, que exige como

requisito para a defesa de direito individual homogêneo pelo MP a presença derelevante interesse social.

Além de poder ser autor da ACP, a LACP determina que o MP, se não intervier

no processo como parte, atuará obrigatoriamente como fiscal da lei (Lei 7.347/85,

art. 5.º, §1.º).

Também nos casos de desistência ou abandono da ação pela parte, caberá ao

MP continuar com a ação (Lei 7.347/85, art. 5.º, §3.º), desde que presentes alguns

requisitos: que a parte autora seja associação; que a desistência seja infundada;que a parte responsável pelo abandono seja a associação legitimada.

Desistência é a manifestação do autor no sentido de não dar prosseguimento

ao processo. Abandono é a demonstração de desinteresse da parte no sentido de

ver resolvida a pretensão levada a juízo.

Discute-se se o dispositivo que proclama que o MP “assumirá” a causa no

caso de desistência ou abandono cria hipótese de obrigatoriedade ou faculta-

tividade de atuação do órgão ministerial. Prevalece o entendimento de que éfacultativa a assunção da titularidade pois, se o MP não está obrigado a propor

a ação, não poderia ser obrigado a assumir o polo ativo de ação já em curso – a

recusa, porém, deve ser fundamentada.

A redação do parágrafo 3.º do artigo 5.º da LACP, dada pela Lei 8.078/90, faculta

agora também aos outros legitimados a assunção da titularidade da ação em caso

de abandono ou desistência.

O artigo 5.º, parágrafo 5.º, da Lei 7.347/85 admite o litisconsórcio facultativoentre os Ministérios Públicos da União, do Distrito Federal e dos Estados na defesa

dos interesses e direitos de que cuida essa lei.

Ocorrerá o litisconsórcio facultativo quando houver interesses compartilhados

por ramos diversos do MP (MP Estadual e MP Federal) ou o dano seja de âmbito

regional ou nacional. Em tais situações, o foro competente para julgar a causa será

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Ação civil pública

fixado segundo os critérios gerais: quando houver interesse da União e existir vara

federal no local do dano, será o juízo federal o competente para processar e julgar

a causa; se não houver vara federal, a competência será da Justiça Estadual.

Defensoria Pública

A inclusão da Defensoria Pública no rol dos legitimados à propositura da ACP

é medida que atende aos reclamos da doutrina e jurisprudência pátrias, que

 já admitiam, inclusive, essa possibilidade, a despeito da ausência de previsão

expressa nesse sentido.

A CF, em seu artigo 134, dispõe que a Defensoria Pública constitui instituição

permanente, essencial ao exercício da tutela jurisdicional, incumbindo-lhe a pres-

tação do serviço de plena orientação jurídica judicial e extrajudicialmente, com aconsequente defesa dos necessitados, de forma a garantir a assistência jurídica

gratuita e integral àqueles que comprovarem insuficiência de recursos financei-

ros, na forma do artigo 5.º, LXXIV, da CF.

Aliás, deve-se mencionar que a propositura de ações civis e a defesa dos interesses do consumi-dor são incumbências que se encontram literalmente dispostas dentre as funções institucionaisdesta entidade pública, consoante se vislumbra do artigo 4.º da Lei Complementar 80/94 – quedispõe sobre a organização da Defensoria Pública da União, do Distrito Federal e dos Territóriose prescreve normas gerais para a sua organização nos Estados (QUEIROZ, 2005).

União, Estados, Municípios, autarquia,empresa pública, fundação, sociedade de economia mista

Também estão autorizados a ingressar com ACP os entes da Administração

direta, indireta e fundacional. Entretanto, eles têm sua legitimidade limitada ao

interesse na tutela de direitos coletivos e difusos da coletividade que represen-

tam.

A redação anterior à Lei 11.448/2007 não fazia menção expressa ao Distrito

Federal, mas, efetuando interpretação sistemática, a doutrina já entendia que

esse ente também estava legitimado a propor ACP. Em todo caso, dissiparam-se

as dúvidas com a expressa inclusão do Distrito Federal no inciso III, artigo 5.º, da

LACP.

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Ação civil pública

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Podem as entidades da Administração agir em defesa de interesse próprio –

caso de legitimação ordinária – ou tutelando em seu nome direito difuso ou cole-

tivo – hipótese de legitimação extraordinária.

AssociaçõesA legitimação das associações na ACP é extraordinária (atuam em nome pró-

prio na defesa de direito alheio) e condicionada, porque submetida aos seguintes

requisitos (Lei 7.347/85, art. 5.º, V, “a” e “b”):

requisito formal  – a associação deve estar constituída nos termos da lei

civil;

requisito temporal  – a associação deve estar constituída há pelo menos

um ano;

requisito institucional  – deve o objeto da ACP figurar como finalidade ins-

titucional da associação.

Nos moldes do artigo 5.º, parágrafo 4.º, o requisito da pré-constituição poderá

ser dispensado pelo juiz, quando haja manifesto interesse social evidenciado pela

dimensão ou característica do dano, ou pela relevância do bem jurídico a ser pro-

tegido.

A LACP, em seu artigo 5.º, parágrafo 2.º, traz a possibilidade de o Poder Públicoe outras associações legitimadas formarem litisconsórcio (ativo e facultativo) com

qualquer das partes. É válido frisar que somente se justifica a formação de litis-

consórcio no polo ativo, como um mecanismo de fortalecimento da defesa dos

interesses difusos e coletivos.

Legitimação passiva

A LACP não trata da legitimidade passiva para a ACP, pois não há restrição

nesse sentido. Podem ocupar o polo passivo na ACP entidades da Administração

Pública direta e indireta, bem como particulares, ou seja, quaisquer pessoas, físi-

cas ou jurídicas, que ofendam os bens jurídicos tutelados pela LACP.

Ocorrerá litisconsórcio passivo – a despeito do silêncio da lei – quando duas

ou mais pessoas ou entidades forem responsáveis pelo dano ao interesse difuso ou

coletivo.

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Ação civil pública

Execução da sentençaA execução definitiva da sentença deve ser providenciada pela parte interes-

sada. No caso de associação, não promovendo esta a execução em sessenta dias,

o MP ou os demais legitimados poderão fazê-lo (Lei 7.347/85, art. 15) – o MP tem

o dever, os demais legitimados, uma faculdade.

Insta salientar que, em razão da alteração promovida no processo de execução

civil para as obrigações de dar e fazer (exceto de dar dinheiro – pagar), a sentença

passa a expressar quase uma ordem mandamental, devendo ser cumprida, sob

pena de incidirem as imposições dos artigos 461 e 461-A do CPC.3

As modificações substanciais ocorridas no processo de execução brasileiro,

perpetradas pelas Leis 8.952/94 e 10.444/2002, que modificaram todas as hipóte-

ses de comandos de fazer, não fazer e de dar (coisa diferente de dinheiro), reper-cutem no processo coletivo, de modo que a reforma mencionada também atinge

a ação civil pública.

Nas hipóteses de ação civil com obrigação de fazer ou não fazer, o procedi-

mento executório deve se submeter ao artigo específico da LACP (Lei 7.347/85,

3 Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela especí-fica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao doadimplemento.

§1.º A obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obten-ção do resultado prático correspondente.

§2.º A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa (art. 287).

§3.º Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juizconceder a tutela liminarmente ou mediante justificação prévia, citado o réu. A medida liminar poderá ser revogada ou modifi-cada, a qualquer tempo, em decisão fundamentada.

§4.º O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedidodo autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.

§5.º Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requeri-mento, determinar as medidas necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção depessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.

§6.º O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou exces-siva.

Art. 461-A. Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cum-primento da obrigação.

§1.º Tratando-se de entrega de coisa determinada pelo gênero e quantidade, o credor a individualizará na petição inicial, se lhecouber a escolha; cabendo ao devedor escolher, este a entregará individualizada, no prazo fixado pelo juiz.

§2.º Não cumprida a obrigação no prazo estabelecido, expedir-se-á em favor do credor mandado de busca e apreensão ou deimissão na posse, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel.

§3.º Aplica-se à ação prevista neste artigo o disposto nos §§ 1.º a 6.º do art. 461.

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Ação civil pública

139

art. 15) e ao novo comando do CPC que, inclusive, é mais benéfico para execução.

A exigência de instauração de novo processo para executar já morreu.

Ainda reflete no processo coletivo as alterações promovidas pela Lei 11.232/

2005, que entrou em vigor em 2006, com inovações nos capítulos IX - “Da liquida-

ção da sentença” – e X - “Do cumprimento da sentença” – do CPC e, além disso, aLei 11.382/2006 também trouxe inovações.

Coisa julgadaDispõe o artigo 16 da LACP, com a redação dada pela Lei 9.494/97:

Art. 16. A sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da competência territorialdo órgão prolator, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas,hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fundamento,valendo-se de nova prova.

Essa norma é objeto de densas críticas doutrinárias, pois adveio da conversão

em lei da MP 1.570/97, desatendendo o pressuposto constitucional da urgên-

cia, em matéria que deveria ser submetida ao processo legislativo ordinário 4, de

modo que é possível afirmar padecer ela do vício insanável da inconstitucionali-

dade, ao menos formal.

Ainda acerca da referida alteração legislativa, Hugo Nigro Mazzilli (2005, p.

485) assinala que

[...] o legislador confundiu limites da coisa julgada (a imutabilidade erga omnes da sentença –limites subjetivos, atinentes às pessoas atingidas pela imutabilidade) com competência territo-rial  (que nada tem a ver com a imutabilidade da sentença, dentro ou fora da competência do juizprolator, até porque, na ação civil pública, a competência sequer é territorial, e sim funcional).

Devido ao caráter especial da ACP e aos interesses metaindividuais nela dis-

cutidos, adota-se, em regra, o princípio da coisa julgada erga omnes, ou seja, asentença não produz efeitos apenas às partes do processo, mas à coletividade

abrangida no território do órgão prolator da decisão.

4 Veja, nesse sentido, Hugo Nigro Mazzilli (2005, p. 485).

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Ação civil pública

Outra razão pela qual a doutrina entende inócua a regra do artigo 16 da LACP

é porque o sistema do CDC permaneceu inalterado, mesmo após o advento da

Lei 9.494/97, sendo de aplicação subsidiária à ação civil. O artigo 103 do CDC, ao

disciplinar a coisa julgada nas ações coletivas, assim dispõe:

Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará coisa julgada:

I - erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipóteseem que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento valendo-sede nova prova, na hipótese do inciso I do parágrafo único do art. 81;

II - ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe, salvo improcedência por insu-ficiência de provas, nos termos do inciso anterior, quando se tratar da hipótese prevista no incisoII do parágrafo único do art. 81;

III - erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas eseus sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81.

Vê-se, pois, que ocorrerá exceção à regra da coisa julgada erga omnes quando

a decisão for pela improcedência, em razão de insuficiência de provas. Nessa

hipótese, qualquer legitimado poderá intentar nova ação com idêntico funda-

mento – inclusive o autor da ação julgada improcedente – desde que apresente

nova prova.

A decisão favorável na ACP alcançará e beneficiará os litigantes em ações indi-

viduais; mas a decisão de improcedência não terá nenhuma repercussão nos lití-

gios individuais.

Pedro da Silva Dinamarco (2001, p. 102) entende que, quando se cuidar deação civil para defesa de interesses coletivos, a coisa julgada será ultra partes,

restrita ao grupo, categoria ou classe, ou seja, àqueles possíveis beneficiários da

procedência da ação. Todavia, quando se tratar de direito individual homogêneo,

a coisa julgada formada será erga omnes, mas somente na hipótese de pedido

procedente, que, então, beneficiará todas as vítimas e seus sucessores.

No tocante aos direitos difusos, segundo o ensino de Hugo Nigro Mazzilli (2005,

p. 487), a coisa julgada formada será erga omnes, exceto se houver improcedência

decorrente de falta de provas, hipótese em que poderá ser promovida nova ação,com nova prova; a sentença de procedência beneficiará os lesados individuais,

ligados por interesse individual homogêneo, relativamente ao reconhecimento

da lesão coletiva e desde que tenha havido pedido nesse sentido na inicial.

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Ação civil pública

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Litigância de má-féAnalisando o texto da Lei 7.347/85 verifica-se que o caput do artigo 17 foi

suprimido, transformando-se o parágrafo único no caput. Todavia, houve erro na

publicação.

A redação do antigo parágrafo único era:

Em caso de litigância de má-fé, a associação autora e os diretores responsáveis pela propositurada ação serão solidariamente condenados em honorários advocatícios e ao décuplo das custas,sem prejuízo da responsabilidade por perdas e danos.

O citado dispositivo estatui duas sanções por litigância de má-fé: condenação

ao décuplo das custas e eventual responsabilidade por perdas e danos. A LACP só

prevê a responsabilização para as associações e seus diretores, pois os integrantes

do Poder Público possuem presunção de legitimidade.

Ônus da sucumbênciaA LACP prevê que nas ações nela tratadas, não haverá adiantamento de des-

pesas processuais (Lei 7.347/85, art. 18), não existindo, portanto, necessidade de

reembolso.

De regra, na ACP não incide o ônus da sucumbência para a associação autora,

salvo nos termos do artigo 17, se esta atuou com comprovada má-fé.

Para os entes do Poder Público não há regra especial, por isso sujeitam-se aos

ônus da sucumbência em relação aos honorários advocatícios, mas não em rela-

ção às despesas processuais.

No caso do MP, não são cabíveis os ônus da sucumbência; a condenação em

honorários, neste caso, deve ser dirigida ao Estado ou União.

O réu vencido na demanda deverá arcar com os ônus da sucumbência, caben-

do-lhe pagar apenas os honorários (já que não haverá adiantamento de despesas

pela parte autora).

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Ampliando seus conhecimentos

 Jurisprudências

EMENTA: RECLAMAÇÃO. 2. Ação civil pública contra instituição bancária, objetivando acondenação da ré ao pagamento da “diferença entre a inflação do mês de março de 1990,apurada pelo IBGE, e o índice aplicado para crédito nas cadernetas de poupança, com ven-cimento entre 14 a 30 de abril de 1990, mais juros de 0,5% ao mês, correção sobre o saldo,devendo o valor a ser pago a cada um fixar-se em liquidação de sentença”. 3. Ação julgadaprocedente em ambas as instâncias, havendo sido interpostos recursos especial e extraor-dinário. 4. Reclamação em que se sustenta que o acórdão da Corte reclamada, ao manter asentença, estabeleceu “uma inconstitucionalidade no plano nacional, em relação a algunsaspectos da Lei 8.024/90, que somente ao Supremo Tribunal Federal caberia decretar”. 5.Não se trata de hipótese suscetível de confronto com o precedente da Corte na Reclama-

ção 434-1 - SP, onde se fazia inequívoco que o objetivo da ação civil pública era declarar ainconstitucionalidade da Lei 7.844/92, do Estado de São Paulo. 6. No caso concreto, dife-rentemente, a ação objetiva relação jurídica decorrente de contrato expressamente identi-ficado, a qual estaria sendo alcançada por norma legal subsequente, cuja aplicação levariaa ferir direito subjetivo dos substituídos. 7. Na ação civil pública, ora em julgamento, dá-secontrole de constitucionalidade da Lei 8.024/90, por via difusa. Mesmo admitindo que adecisão em exame afasta a incidência de Lei que seria aplicável à hipótese concreta, porferir direito adquirido e ato jurídico perfeito, certo está que o acórdão respectivo não ficaimune ao controle do Supremo Tribunal Federal, desde logo, à vista do art. 102, III, letra b, daLei Maior, eis que decisão definitiva de Corte local terá reconhecido a inconstitucionalidadede Lei Federal, ao dirimir determinado conflito de interesses. Manifesta-se, dessa maneira, a

convivência dos dois sistemas de controle de constitucionalidade: a mesma Lei Federal ouestadual poderá ter declarada sua invalidade, quer, em abstrato, na via concentrada, origi-nariamente, pelo STF (CF, art. 102, I, a), quer na via difusa, incidenter tantum, ao ensejo dodesate de controvérsia, na defesa de direitos subjetivos de partes interessadas, afastando-sesua incidência no caso concreto em julgamento. 8. Nas ações coletivas, não se nega, à evi-dência, também, a possibilidade da declaração de inconstitucionalidade, incidenter tantum,de lei ou ato normativo federal ou local. 9. A eficácia erga omnes da decisão, na ação civilpública, ut art. 16, da Lei 7.347/97, não subtrai o julgado do controle das instâncias superio-res, inclusive do STF. No caso concreto, por exemplo, já se interpôs recurso extraordinário,relativamente ao qual, em situações graves, é viável emprestar-se, ademais, efeito suspen-sivo. 10. Em reclamação, onde sustentada a usurpação, pela Corte local, de competênciado Supremo Tribunal Federal, não cabe, em tese, discutir em torno da eficácia da sentença

na ação civil pública (Lei 7.347/85, art. 16), o que poderá, entretanto, constituir, eventual-mente, tema do recurso extraordinário. 11. Reclamação julgada improcedente, cassando-sea liminar. (STF, Rcl 600/SP, Tribunal Pleno, Rel. Min. Néri da Silveira, j. 03/09/1997).

EMENTA: PROCESSO CIVIL. DIREITO AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA TUTELA DOMEIO AMBIENTE. OBRIGAÇÕES DE FAZER, DE NÃO FAZER E DE PAGAR QUANTIA. POSSIBI-LIDADE DE CUMULAÇÃO DE PEDIDOS ART. 3.º DA LEI 7.347/85. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁ-TICA. ART. 225, parágrafo 3.º, DA CF/88, ARTS. 2.º E 4.º DA LEI 6.938/81, ART. 25, IV, DA LEI

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Ação civil pública

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8.625/93 E ART. 83 DO CDC. PRINCÍPIOS DA PREVENÇÃO, DO POLUIDOR-PAGADOR E DAREPARAÇÃO INTEGRAL. 1. A Lei 7.347/85, em seu art. 5.º, autoriza a propositura de açõescivis públicas por associações que incluam entre suas finalidades institucionais, a proteçãoao meio ambiente, ao consumidor, ao patrimônio artístico, estético, histórico, turístico epaisagístico, ou a qualquer outro interesse difuso ou coletivo. 2. O sistema jurídico de pro-

teção ao meio ambiente, disciplinado em normas constitucionais (CF, art. 225, parágrafo 3.º)e infraconstitucionais (Lei 6.938/81, arts. 2.º e 4.º), está fundado, entre outros, nos princípiosda prevenção, do poluidor-pagador e da reparação integral. 3. Deveras, decorrem para osdestinatários (Estado e comunidade), deveres e obrigações de variada natureza, compor-tando prestações pessoais, positivas e negativas (fazer e não fazer), bem como de pagarquantia (indenização dos danos insuscetíveis de recomposição in natura), prestações estasque não se excluem, mas, pelo contrário, se cumulam, se for o caso. 4. A ação civil pública éo instrumento processual destinado a propiciar a tutela ao meio ambiente (CF, art. 129, III)e submete-se ao princípio da adequação, a significar que deve ter aptidão suficiente paraoperacionalizar, no plano jurisdicional, a devida e integral proteção do direito material, afim de ser instrumento adequado e útil. 5. A exegese do art. 3.º da Lei 7.347/85 (“A ação civilpoderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer

ou não fazer”), a conjunção “ou” deve ser considerada com o sentido de adição (permitindo,com a cumulação dos pedidos, a tutela integral do meio ambiente) e não o de alterna-tiva excludente (o que tornaria a ação civil pública instrumento inadequado a seus fins).6. Interpretação sistemática do art. 21 da mesma lei, combinado com o art. 83 do Códigode Defesa do Consumidor (“Art. 83. Para a defesa dos direitos e interesses protegidos poreste código são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar sua adequadae efetiva tutela.”) bem como o art. 25 da Lei 8.625/93, segundo o qual incumbe ao Minis-tério Público “IV - promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei: a) para aproteção, prevenção e reparação dos danos causados ao meio ambiente [...]”. 7. A exigênciapara cada espécie de prestação, da propositura de uma ação civil pública autônoma, alémde atentar contra os princípios da instrumentalidade e da economia processual, ensejaria

a possibilidade de sentenças contraditórias para demandas semelhantes, entre as mesmaspartes, com a mesma causa de pedir e com finalidade comum (medidas de tutela ambien-tal), cuja única variante seriam os pedidos mediatos, consistentes em prestações de natu-reza diversa. 8. Ademais, a proibição de cumular pedidos dessa natureza não encontra sus-tentáculo nas regras do procedimento comum, restando ilógico negar à ação civil pública,criada especialmente como alternativa para melhor viabilizar a tutela dos direitos difusos, oque se permite, pela via ordinária, para a tutela de todo e qualquer outro direito. 9. Recursoespecial desprovido. (STJ, REsp 625.249/PR, 1.ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, j. 15/08/2006).

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SOCIEDADE CIVIL. ESTATUTOSOCIAL. ILEGITIMIDADE ATIVA. PRELIMINAR ACOLHIDA. EXTINÇÃO DO FEITO. Sociedade civil

que tem por objetivo defender nas relações de consumo e fiscais, extrajudicialmente, osdireitos e interesses dos seus associados, consumidores e contribuintes em geral, nos termosda legislação em vigor, ainda que a Lei 8.078/90 tenha ampliado o texto da Lei 7.347/85,fazendo incluir no inciso II do seu artigo 5.º as entidades que tenham por finalidade a defesade interesse difuso ou coletivo como partes legítimas para figurarem no polo ativo da ação,tal situação é indiferente na hipótese, pois, se o próprio estatuto delimita a área de atuaçãoda associação, esta não poderá ir além do que lhe é permitido - atuar extrajudicialmente -sob pena de violar seu próprio regimento. (TJ/BA, Proc. 97-6/2004, Ac. 80685).

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Ação civil pública

AGRAVO DE INSTRUMENTO. ILEGITIMIDADE. MINISTÉRIO PÚBLICO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. CRIANÇA. RAZOABILIDADE.Legitimidade. O Ministério Público é parte legítima ativa para propor ação civil pública emprol de criança e adolescente. Jurisprudência majoritária, com base na Constituição daRepública e no Estatuto da Criança e do Adolescente. Antecipação de tutela. A antecipaçãode tutela que impõe multa diária ao Poder Público para que forneça de medicamento àcriança e/ou ao adolescente encontra respaldo na Constituição da República e no Estatutoda Criança e do Adolescente. Não fere a razoabilidade a imposição de multa ou de bloqueiode valores ao Poder Público para que forneça medicamentos, pois a criança e o adolescentetêm prioridade de atendimento em ações de saúde. Ademais, a própria sociedade é obri-gada, pela Constituição da República e pelo ECA, a realizar e assegurar o cumprimento deações voltadas à criança e ao adolescente, quanto mais quando está em jogo o direito àvida. NEGADO PROVIMENTO. EM MONOCRÁTICA. (TJ/RS, Ag. Inst. 70.013.170.055, 8.ª Câm.Cív., Rel. Rui Portanova, j. 18/10/2005).

Lei 7.347, de 24 de julho de 1985

Disciplina a ação civil pública de responsabilidade por danos causados ao meio ambiente,ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico(vetado) e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA  faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu san-ciono a seguinte Lei:

Art. 1.º Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações deresponsabilidade por danos morais e patrimoniais causados:

I - ao meio ambiente;

II - ao consumidor;

III - à ordem urbanística;IV - a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico;

V - por infração da ordem econômica e da economia popular;

VI - à ordem urbanística.

Parágrafo único. Não será cabível ação civil pública para veicular pretensões que envolvamtributos, contribuições previdenciárias, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTSou outros fundos de natureza institucional cujos beneficiários podem ser individualmentedeterminados.

Art. 2.º As ações previstas nesta Lei serão propostas no foro do local onde ocorrer o dano,cujo juízo terá competência funcional para processar e julgar a causa.

Parágrafo único. A propositura da ação prevenirá a jurisdição do juízo para todas as açõesposteriormente intentadas que possuam a mesma causa de pedir ou o mesmo objeto.

Art. 3.º A ação civil poderá ter por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento deobrigação de fazer ou não fazer.

Art. 4.º Poderá ser ajuizada ação cautelar para os fins desta Lei, objetivando, inclusive, evitaro dano ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem urbanística ou aos bens e direitos devalor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico (VETADO).

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Ação civil pública

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Art. 5.º Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar:

I - o Ministério Público;

II - a Defensoria Pública;

III - a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios;

IV - a autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista;V - a associação que, concomitantemente:

a) esteja constituída há pelo menos 1 (um) ano nos termos da lei civil;

b) inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteção ao meio ambiente, ao consumi-dor, à ordem econômica, à livre concorrência ou ao patrimônio artístico, estético, histórico,turístico e paisagístico.

§1.º O Ministério Público, se não intervier no processo como parte, atuará obrigatoriamentecomo fiscal da lei.

§2.º Fica facultado ao Poder Público e a outras associações legitimadas nos termos deste

artigo habilitar-se como litisconsortes de qualquer das partes.§3.º Em caso de desistência infundada ou abandono da ação por associação legitimada, oMinistério Público ou outro legitimado assumirá a titularidade ativa.

§4.º O requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz, quando haja mani-festo interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou pela relevân-cia do bem jurídico a ser protegido.

§5.º Admitir-se-á o litisconsórcio facultativo entre os Ministérios Públicos da União, do Dis-trito Federal e dos Estados na defesa dos interesses e direitos de que cuida esta lei.

§6.º Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajus-

tamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia detítulo executivo extrajudicial.

Art. 6.º Qualquer pessoa poderá e o servidor público deverá provocar a iniciativa do Minis-tério Público, ministrando-lhe informações sobre fatos que constituam objeto da ação civile indicando-lhe os elementos de convicção.

Art. 7.º Se, no exercício de suas funções, os juízes e tribunais tiverem conhecimento de fatosque possam ensejar a propositura da ação civil, remeterão peças ao Ministério Público paraas providências cabíveis.

Art. 8.º Para instruir a inicial, o interessado poderá requerer às autoridades competentes as

certidões e informações que julgar necessárias, a serem fornecidas no prazo de 15 (quinze)dias.

§1.º O Ministério Público poderá instaurar, sob sua presidência, inquérito civil, ou requisitar,de qualquer organismo público ou particular, certidões, informações, exames ou perícias,no prazo que assinalar, o qual não poderá ser inferior a 10 (dez) dias úteis.

§2.º Somente nos casos em que a lei impuser sigilo, poderá ser negada certidão ou informa-ção, hipótese em que a ação poderá ser proposta desacompanhada daqueles documentos,cabendo ao juiz requisitá-los.

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Ação civil pública

Art. 9.º Se o órgão do Ministério Público, esgotadas todas as diligências, se convencer dainexistência de fundamento para a propositura da ação civil, promoverá o arquivamentodos autos do inquérito civil ou das peças informativas, fazendo-o fundamentadamente.

§1.º Os autos do inquérito civil ou das peças de informação arquivadas serão remetidos,sob pena de se incorrer em falta grave, no prazo de 3 (três) dias, ao Conselho Superior do

Ministério Público.

§2.º Até que, em sessão do Conselho Superior do Ministério Público, seja homologada ourejeitada a promoção de arquivamento, poderão as associações legitimadas apresentarrazões escritas ou documentos, que serão juntados aos autos do inquérito ou anexados àspeças de informação.

§3.º A promoção de arquivamento será submetida a exame e deliberação do ConselhoSuperior do Ministério Público, conforme dispuser o seu Regimento.

§4.º Deixando o Conselho Superior de homologar a promoção de arquivamento, designará,desde logo, outro órgão do Ministério Público para o ajuizamento da ação.

Art. 10. Constitui crime, punido com pena de reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos, mais multade 10 (dez) a 1.000 (mil) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional – ORTN, a recusa, oretardamento ou a omissão de dados técnicos indispensáveis à propositura da ação civil,quando requisitados pelo Ministério Público.

Art. 11. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer,o juiz determinará o cumprimento da prestação da atividade devida ou a cessação da ativi-dade nociva, sob pena de execução específica, ou de cominação de multa diária, se esta forsuficiente ou compatível, independentemente de requerimento do autor.

Art. 12. Poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em deci-são sujeita a agravo.

§1.º A requerimento de pessoa jurídica de direito público interessada, e para evitar gravelesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia pública, poderá o Presidente do Tribunala que competir o conhecimento do respectivo recurso suspender a execução da liminar, emdecisão fundamentada, da qual caberá agravo para uma das turmas julgadoras, no prazode 5 (cinco) dias a partir da publicação do ato.

§2.º A multa cominada liminarmente só será exigível do réu após o trânsito em julgado dadecisão favorável ao autor, mas será devida desde o dia em que se houver configurado odescumprimento.

Art. 13. Havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano causado reverterá a

um fundo gerido por um Conselho Federal ou por Conselhos Estaduais de que participarãonecessariamente o Ministério Público e representantes da comunidade, sendo seus recur-sos destinados à reconstituição dos bens lesados.

Parágrafo único. Enquanto o fundo não for regulamentado, o dinheiro ficará depositado emestabelecimento oficial de crédito, em conta com correção monetária.

Art. 14. O juiz poderá conferir efeito suspensivo aos recursos, para evitar dano irreparávelà parte.

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Ação civil pública

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Art. 15. Decorridos sessenta dias do trânsito em julgado da sentença condenatória, sem quea associação autora lhe promova a execução, deverá fazê-lo o Ministério Público, facultadaigual iniciativa aos demais legitimados.

Art. 16. A sentença civil fará coisa julgada erga omnes, nos limites da competência territo-rial do órgão prolator, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de

provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fun-damento, valendo-se de nova prova.

Art. 17. Em caso de litigância de má-fé, a associação autora e os diretores responsáveis pelapropositura da ação serão solidariamente condenados em honorários advocatícios e aodécuplo das custas, sem prejuízo da responsabilidade por perdas e danos.

Art. 18. Nas ações de que trata esta lei, não haverá adiantamento de custas, emolumentos,honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da associação autora,salvo comprovada má-fé, em honorários de advogado, custas e despesas processuais.

Art. 19. Aplica-se à ação civil pública, prevista nesta Lei, o Código de Processo Civil, aprovado

pela Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973, naquilo em que não contrarie suas disposições.

Art. 20. O fundo de que trata o art. 13 desta Lei será regulamentado pelo Poder Executivono prazo de 90 (noventa) dias.

Art. 21. Aplicam-se à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais, no quefor cabível, os dispositivos do Título III da lei que instituiu o Código de Defesa do Consumi-dor.

Art. 22. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 23. Revogam-se as disposições em contrário.

Brasília, em 24 de julho de 1985;164.º da Independência e 97.º da República.

JOSÉ SARNEY

Fernando Lyra

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Roberto de Almeida Borges Gomes

HistóricoO legislador brasileiro, historicamente, disciplinou no Processo Civil e nos

procedimentos administrativos correlatos, institutos destinados à tutela indi-

vidual. A mudança de paradigma na tutela civil de bens difusos e coletivos

fez nascer a necessidade de institutos específicos para proteção dos bens em

questão, em razão da sua especificidade.

Nesse diapasão, surge o inquérito civil1, que, assim como o inquérito poli-

cial, é um procedimento administrativo destinado à reunião de elementos

que possibilitem ao Ministério Público (MP) elucidar o fato noticiado como

ofensivo a interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos, e, ao seu

final, realizar um juízo de valor sobre a eventual inauguração da defesa do

bem em juízo.

O inquérito civil foi inserido no ordenamento jurídico brasileiro por meioda Lei 7.347/85 (Lei de ação civil pública – LACP) como “um instrumento de

apuração de dados tendo por fim o eventual ajuizamento da ação que nesse

momento vinha à tona” (CARVALHO FILHO, 2004, p. 242).

Atualmente, o inquérito civil possui abrigo constitucional, sendo consa-

grado no artigo 129 da Constituição Federal de 1988 (CF):

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

[...]

III - promover o inquérito civil  e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio públicoe social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos; (grifo nosso)

1 A expressão inquérito civil  é consagrada, legal e doutrinariamente, como um procedimento de investigação. Todavia, emrazão da nomenclatura de uma das espécies de ação coletiva, qual seja, ação civil pública, por vezes, de forma errônea,vem-se empregando a expressão inquérito civil público. Nesse sentido, Hugo Nigro Mazzilli (1995, p. 311) e José CarlosBarbosa Moreira (1995, p. 345-349).

Inquérito civil

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Inquérito civil

Observa o Professor Manoel Gonçalves Ferreira Filho (apud  MORAES, 1999, p.

453):

[...] o texto constitucional alargou o alcance desses instrumentos. Por um lado, estendeu-os àproteção do patrimônio público em geral, dando, pois, à ação civil pública âmbito análogo aoda ação popular. Por outro lado, tornou meramente exemplificativa uma enumeração que era

taxativa. Note-se que a regra constitucional se refere a outros interesses difusos e coletivos.

Em seguida, o inquérito civil foi também referido na Lei 7.853/89 (art. 6.º), no

Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) (Lei 8.069/90, art. 201, V), no Código

de Defesa do Consumidor (CDC) (Lei 8.078/90, art. 90) e, mais recentemente, no

Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003, arts. 74, I, e 92).

Ainda tendo em vista que o inquérito civil é meio investigatório colocado, por

força da Carta Magna, a cargo do MP, a Lei Orgânica Nacional desse órgão (LONMP

– Lei 8.625/93, arts. 25, IV, e 26, I), bem como a Lei Orgânica do MP da União (LC

75/93, arts. 6.º, VII, 7.º, I, e 38, I), preveem o inquérito civil como um dos instrumen-

tos de atuação do MP para proteção dos direitos difusos e coletivos, a exemplo

do patrimônio público e social, do meio ambiente etc. Ademais, ao MP dos Esta-

dos também é facultado legislar sobre o inquérito civil, como de fato ocorreu na

maioria dos Estados brasileiros (por exemplo, LC 11/96 – Lei Orgânica do MP do

Estado da Bahia).

Conceito e natureza jurídicaO inquérito civil é um procedimento administrativo presidido por órgão do

MP, que se destina à reunião de elementos que subsidiem o persecutor no juízo

de valor sobre o ato lesivo a bens difusos, coletivos ou individuais homogêneos.

Nas palavras de Hugo Nigro Mazzilli (2005, p. 390):

O inquérito civil é uma investigação administrativa a cargo do Ministério Público, destinada,basicamente, a colher elementos de convicção para eventual propositura de ação civil pública;subsidiariamente, serve, ainda, para que o Ministério Público: a) prepare a tomada de compro-missos de ajustamento de conduta ou realize audiências públicas e expeça recomendações

dentro de suas atribuições; b) colha elementos necessários para o exercício de qualquer açãopública, ou para se aparelhar para o exercício de qualquer outra forma de atuação a seu cargo.

O inquérito civil, a bem da verdade, é o veículo para que seja verificado se o

fato realmente aconteceu, se houve dano (material ou moral) aos bens em ques-

tão, e quais são os responsáveis pelo dano. Dessa forma, as soluções possíveis não

determinam o inquérito civil, e sim a busca sobre a verdade fática, que é o seu

traço caracterizador. Forçosa a constatação, então, de que o inquérito civil pode

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Inquérito civil

151

concluir pela inexistência do fato, do dano, ou de responsáveis, e daí não caber

ações ou ajuste de conduta para proteção de qualquer bem.

É de se observar que o inquérito civil é um procedimento administrativo desti-

nado à elucidação de um fato para subsidiar um juízo de valor ao membro do MP.

O inquérito civil tem como um de seus objetivos excluir a possibilidade de açõestemerárias, e para tal é preciso ser lido como um instrumento destinado à recons-

trução fática viável, de forma a aproximá-lo, o máximo possível, da verdade2.

O artigo 129, III, da CF coloca no elenco de funções do MP o inquérito civil, e,

submetendo o instituto em questão a uma leitura constitucional e legal, cons-

tata-se que este, diferentemente da ACP, é exercido com exclusividade pelo

 parquet .3

Princípios norteadores do inquérito civil

Inquisitoriedade

O inquérito civil é um procedimento administrativo destinado à investigação

e, portanto, ainda não revestido do manto do contraditório. É, pois, regido pelo

 princípio inquisitivo, como preceitua Luiz Roberto Proença (2001, p. 35):

Como instrumento preparatório que é, não tem o inquérito civil, por escopo, a aplicação dequalquer sanção ao investigado; em outras palavras, é procedimento administrativo não puni-tivo, não havendo razão para a ele serem aplicados aqueles princípios constitucionais. Não trazacusado, tratando-se de mera investigação. Nesta, não há, outrossim, “litigantes”, tendo em vistaque a situação não é de litígio, pois a convicção do Ministério Público sobre a real e efetiva res-ponsabilidade do infrator só pode se dar ao final da instrução do inquérito civil.

Cumpre esclarecer que aqui não há qualquer ofensa ao artigo 5.º, LV, da CF,

posto que o referido artigo, ao reconhecer o direito ao contraditório e à ampla

defesa em processo judicial ou administrativo, destina-os aos “litigantes”, e, tanto

no inquérito civil quanto no inquérito policial, não há que se falar em litigantes.

2 Utilizamos a expressão verdade possível  vez que, a verdade real, tão proclamada no Processo Penal, é, no Processo Coletivo, umamera pretensão da construção lógica do operador do Direito, pois sabemos que a reconstrução probatória, no máximo, nos aproximada verdade, uma vez que o retorno ao momento do fato é impossível. Na verdade, o que fazemos é buscar a reconstrução dos fatos,todavia, submetida às nossas impressões subjetivas. Daí surge o distanciamento entre o que aconteceu e a nossa leitura sobre o fato,razão pela qual preferimos usar a expressão aludida.

3 Ressalta-se que o inquérito civil é de titularidade exclusiva do MP, todavia, a ACP não o é. A LACP, no artigo 5.º, prevê um rol deco-legitimados para propositura de ACP. Por exemplo, o CDC (art. 88) e o ECA (art. 210) também determinam um elenco de colegiti-mados para ingressar com ação coletiva na defesa dos bens jurídicos tutelados nessas leis.

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Inquérito civil

Informalidade

Estar-se-á distante de um procedimento destinado à apuração fática, razão

pela qual não se pode aprisioná-lo com formalidades que venham a engessá-lo,

na árdua tarefa de reconstrução da realidade fática ao tempo da prática do

ato. Desse modo, diferente do Processo Civil e do Penal, que se submetem a

regramento fechado, como forma de garantia dos litigantes, regras estas que se

transformam em verdadeiras fórmulas matemáticas para aplicação pelos ope-

radores do direito, tais fórmulas não encontram guarida no procedimento do

inquérito civil.

É válido esclarecer que, em hipótese alguma, está por se defender a falta

de regras no inquérito civil; não se pretende retornar à informalidade do Santo

Ofício, e, sim, está por se definir que, no inquérito civil, não há prisão formal

para a prática de atos investigativos, ou seja, pode-se praticar qualquer ato

investigativo sem que o legislador pretenda um rol taxativo das possibilidades

investigatórias. Em razão da situação exposta, Luiz Roberto Proença (2001, p. 34)

denomina como característica do inquérito civil a formalidade restrita, e assim

leciona:

É instrumento dotado de formalidade restrita. As normas que disciplinam a sua instauração etramitação têm apenas um caráter administrativo, de organização interna da própria instituiçãodo Ministério Público. A forma como se dará a colheita dos documentos e informação não ofe-rece decorrências em relação à validade de ação civil pública ajuizada com base no inquérito,

podendo, se muito, invalidar a força probante do elemento de convicção em si (como ocorreriano caso de obtenção de provas por meios ilícitos).

Facultatividade

O inquérito civil, tratando-se de um procedimento preparatório que se des-

tina a um juízo de valor por parte do MP, não tem o perfil da obrigatoriedade de

sua instauração, para que permita ao órgão ministerial a deflagração da ação civil

vocacionada à tutela coletiva.

A mesma sorte lançada ao inquérito policial é aqui determinada no inquérito

civil, qual seja, a característica da disponibilidade, pois, embora seja uma ferra-

menta de grande valia para que o MP reúna elementos de convicção que per-

mitam ajuizamento de ação coletiva, não é, todavia, obrigatória a realização do

inquérito civil para que o MP venha inaugurar, em juízo, demanda na defesa de

direitos difusos e coletivos.

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Inquérito civil

153

Publicidade versus sigilo

O inquérito civil é um procedimento integrado por uma sequência de atos

administrativos, que se submete ao princípio da publicidade. Para ilustrar tal ideia,

socorremo-nos da lição de Hugo Nigro Mazzilli (2005, p. 391):

O inquérito civil se sujeita ao princípio da publicidade, salvo se: a) o Ministério Público teveacesso a informações sigilosas que passaram a integrar os autos; b) da publicidade puder resul-tar prejuízo à investigação ou ao interesse da sociedade, ou ainda ao interesse do Estado.

É incompatível com o ordenamento jurídico pátrio hipótese de investigação

secreta. A publicidade no inquérito civil é a regra. Todavia, pode sucumbir em

razão de sigilos determinados pelo próprio legislador constituinte ou infraconsti-

tucional, ou em razão do interesse da própria investigação.

Apresentam-se como normas permissivas do sigilo nas apurações as que

determinam proteção de dados destinados ao respeito à intimidade das pessoas

(por exemplo, sigilo bancário ou fiscal). Assim como o artigo 20 do Código Penal

(CP) é uma norma genérica, que pode ser utilizada de forma analógica para emba-

sar o decreto do sigilo na investigação, com a finalidade de proteção dela ou no

interesse da sociedade.

Com essa preocupação, o legislador constitucional e infraconstitucional deter-

minou que algumas questões são sigilosas e, portanto, não submetidas à publi-

cidade prevista no artigo 37 da CF. Dessa forma, no inquérito civil, quando diante

de matéria submetida a sigilo determinado por lei, é vedado ao MP, após receber

as informações referentes aos dados sigilosos, publicizá-las.

De outro modo, há que se analisar que esse sigilo, de forma lógica, é direcio-

nado para os que não estão envolvidos no procedimento administrativo, já que

os investigados, via de regra, devem ter acesso aos elementos coligidos, que se

direcionam à sua vida pessoal.

No que se refere ao advogado constituído para defesa dos interesses do inves-

tigado, deve-se ter em consideração o novo Estatuto da Advocacia, artigo 7.º, XIII,XIV e XV, e parágrafo 1.º, que garantem livre acesso do advogado a procedimen-

tos investigativos.

Ocorre, porém, que até mesmo os investigados e os advogados podem se sub-

meter às regras do sigilo no inquérito civil, posto ser possível que a vista dos autos

aos indicados colidam com os interesses da investigação, a exemplo de possíveis

atos investigatórios que, se conhecidos de um dos dois, torne-os sem eficiência.

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Inquérito civil

Para elucidar, tomemos como exemplo a quebra de sigilo telefônico ou bancário,

embargos administrativos, bloqueios de valores etc.

As considerações acima acabam por determinar o que Luiz Roberto Proença

(2001, p. 39) batiza de “publicidade mitigada”. Sobre o assunto aduz:[...] Assim, sempre, deve ser dada publicidade quanto à sua instauração, ao seu arquivamento, equanto a eventual ajuizamento de ação civil pública e, via de regra, deve se permitir o acesso aoinvestigado e aos colegitimados, aos próprios autos, para que acompanhem as investigações,sendo constitucionalmente assegurado aos interessados direito à obtenção de certidões.

Quanto à vista aos autos, porém, pela própria natureza do inquérito, muitas vezes haverá anecessidade de se determinar sejam eles mantidos sob sigilo, seja parcialmente, seja integral-mente, por haver elementos sobre os quais paire sigilo legal ou por necessidade da própriainvestigação, aplicando-se analogicamente o artigo 20 do CPP.

O decreto de sigilo é exceção à regra da publicidade, razão pela qual deve se

submeter a uma fundamentação, conforme estabelecido no artigo 93, X, da CF,

 já que se trata de uma decisão administrativa. Cumpre salientar que o decreto de

sigilo de forma oral, sem redução a termo, impossibilita, ou pelo menos dificulta,

a busca de sua correção pela via judicial. No Estado Democrático de Direito não

podem organismos públicos criar mecanismos que dificultem a defesa de direi-

tos em juízo, para que não se veja afrontada a regra estabelecida no artigo 5.º,

XXXV, da CF.

Autoexecutoriedade

Neste tópico cuidar-se-á de uma característica do ato administrativo, a auto-

executoriedade, que Luiz Roberto Proença (2001) indica como também um ele-

mento caracterizador do inquérito civil, e parece residir razão no seu enten-

dimento. O MP, durante a instrução do inquérito civil, é dotado de poderes

investigatórios que permitem ao órgão requisição de certidões, documentos,realização de exames e perícias, uso de força policial, expedição de notificação,

sob pena de condução coercitiva, poder de inspeção etc. Os poderes ora elenca-

dos permitem ao MP intromissão na vida do particular e na estrutura de pessoas

 jurídicas públicas ou privadas, o que não é permitido ao particular, quando na

defesa de seus interesses, salvo por via judicial.

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Inquérito civil

155

O MP não necessita recorrer ao Judiciário para fazer valer seus poderes inves-

tigatórios, podendo usar força policial quando necessário, bem como o descum-

primento às suas requisições determina o enquadramento em figura típica penal,

estabelecida no artigo 10 da LACP.4

Evidencia-se, portanto, que o inquérito civil tem o traço marcante da autoexe-cutoriedade, que é, na verdade, o elemento fundante dos poderes instrutórios do

MP no inquérito civil.

Procedimento

Objeto

O inquérito civil não tem fim em si mesmo, e, portanto, o estudo de seu objeto

é de grande importância para que se compreenda o instituto. Nesse diapasão,

José Emmanuel Burle Filho (1995, p. 321):

A Constituição Federal de 1988, ao definir as funções institucionais do Ministério Público, nelasincluiu o inquérito civil, nos seguintes termos: “promover o inquérito civil e a ação civil pública,para proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente, e de outros interesses difusose coletivos” (art. 129, III). [...] a Constituição Federal deixa claro que o inquérito civil é o instru-mento para aquele fim, mesmo porque quem quer os fins quer, explicita ou implicitamente, osmeios. Então, claro está que a Carta Federal confere ao Ministério Público um poder investigató-

rio voltado para a apuração de lesões ou ameaças de lesões àqueles valores.

Verifica-se pela passagem acima que o objeto do inquérito civil é estabelecido

constitucionalmente, não sendo mera deliberação do legislador infraconstitucio-

nal. Frisa-se, nesse ponto, para que possamos criticar, por exemplo, a Medida Pro-

visória 2.180-35/2001, que pretendeu a redução do objeto da ACP ao estabelecer

no parágrafo único do artigo 1.º da LACP a vedação de ACPs que tenham por

objeto tributos, contribuições previdenciárias, o Fundo de Garantia do Tempo de

Serviço (FGTS), ou outros fundos análogos. Em que pese tal norma atingir direta-

mente a ACP, de forma reflexa termina por atingir o inquérito civil, pois o que sevisa com referida norma é impedir o ajuizamento de ações coletivas com o objeto

ali mencionado e, portanto, acaba por, obliquamente, restringir as possibilidades

investigatórias do MP.

4 Art. 10. Constitui crime, punido com pena de reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos, mais multa de 10 (dez) a 1.000 (mil) Obrigaçõesdo Tesouro Nacional – ORTN, a recusa, o retardamento ou a omissão de dados técnicos indispensáveis à propositura da ação civilquando requisitados pelo Ministério Público.

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Inquérito civil

O constituinte, no artigo 129, utilizou uma expressão genérica que não cabe

ao legislador infraconstitucional reduzir sua amplitude, pois textualmente, o que

fez o legislador constituinte foi ampliar o leque de opções para a proteção dos

bens difusos e coletivos, sendo assim flagrantemente inconstitucional qualquer

tentativa legislativa infraconstitucional de reduzir o alcance da norma constitu-

cional.

Dessa forma, o que caracteriza o objeto do inquérito civil é o estabelecido na

CF, que cria um rol exemplificativo e, após, insere um conceito genérico para per-

mitir que se identifique o conteúdo do inquérito civil e da ACP pela natureza do

bem, que de forma exemplificativa pode ser consumidor, meio ambiente, cidada-

nia, defesa dos idosos e pessoas portadoras de necessidades especiais etc.

InstauraçãoO inquérito civil pode ser instaurado de ofício ou por provocação. Doutrinaria-

mente, é pacífico que o inquérito civil pode ser instaurado por meio de portaria,

por despacho do órgão ministerial proferido em representações que lhe sejam

direcionadas.

A portaria parece ser o veículo formalizador mais apto a preencher o mínimo

necessário de formalidade para se inaugurar o inquérito civil. Essa peça define o

elemento ensejador da instauração do procedimento, o objeto do procedimento,identifica a autoridade que o presidirá, o servidor que secretariará os atos a serem

praticados e até elenca, por vezes, as primeiras providências a serem adotadas,

além de determinar o mínimo de formalidades a ser seguido, tal como autuação,

registro, publicação.

É evidente que se o “despacho” preencher os requisitos acima expostos, subs-

tituirá a portaria. Todavia, não é essa a praxe ministerial quando do lançamento

de despachos em representações recebidas. Na verdade, a portaria serve como

ato garantidor da formalidade mínima exigida para um procedimento tão impor-tante, que desencadeia efeitos de grande relevância no mundo jurídico após

seu nascimento, tal como obstar a decadência do direito que tem o consumidor

de reclamar dos vícios aparentes de serviço ou produto (CDC, art. 26, §2.º, III)

(MAZZILLI, 2005, p. 313).

Convém salientar que, na hipótese de deflagração do procedimento investi-

gatório com base em representação, esta deve apontar um mínimo de elementos

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Inquérito civil

157

que justifiquem o início da investigação, tal como um objeto definido, indicação,

se possível, do suposto autor do fato, para que não se dê início a uma varredura

indiscriminada sobre a vida de indivíduos ou na Administração Pública.5

Controle de legalidadeOs atos praticados no inquérito civil se submetem ao controle de legalidade,

e o mesmo ocorre desde o nascimento desse procedimento administrativo, vez

que as leis estaduais que disciplinam o MP estabelecem um recurso administra-

tivo ao Conselho Superior do indeferimento da representação destinada ao órgão

ministerial, bem como do ato que instaura o inquérito civil.

É possível também controlar a legalidade no inquérito civil pela via judicial,

por meio de mandado de segurança que, por exemplo, pode ter como pedido otrancamento do inquérito civil por desvio de finalidade, ausência de pertinência

entre a investigação e o objeto do inquérito civil etc.

Ao final do inquérito civil, todo o procedimento será submetido a um con-

trole de legalidade, quer seja no Judiciário, quando embasar ACP (já que os atos

nele praticados podem ser atacados na ação, como forma de desconstituir o seu

poder probatório, que será tratado em capítulo apropriado), quer seja quando do

seu arquivamento, pois se submete ao controle do Conselho Superior do Minis-

tério Público (CSMP), conforme disciplina o artigo 9.º, caput  e parágrafos da LACP.Evidencia-se, portanto, que o inquérito civil, durante todo seu encaminhamento,

submete-se à correção de atos ilegais porventura praticados.

Instrução e valor probatório do inquérito civil

Os poderes instrutórios do MP e, mais precisamente, no âmbito do inquérito

civil, decorrem diretamente de comando constitucional, conforme se infere do

artigo 129, II, III e VI, da CF. Ademais, a legislação infraconstitucional é farta em

conferir poderes ao MP para instrumentalizá-lo no campo da investigação. Para

tal, vejam-se os artigos 8.º, caput  e parágrafos, e 10 da Lei 7.347/85, o artigo 223

da Lei 8.069/90, o artigo 26, I, “a”, “b” e “c”, da Lei 8.625/93 e o artigo 73, I, “a”, “b” e

“c”, da LC Estadual 11/96.

5 No Estado da Bahia, disciplina a matéria o artigo 78 da Lei Complementar (LC) 11/96.

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Inquérito civil

Os diplomas legais aludidos conferem poder de requisição, notificação, inspe-

ção, condução coercitiva, requisição de força policial, dentre outros, ao MP, quando

exercendo o papel investigatório. No seio da apuração a requisição ministerial

pode se dirigir a particular e à Administração Pública, em todos os seus Poderes e

em qualquer das suas esferas – municipal, estadual ou federal.

O termo requisição orienta o entendimento de que não se pode ir contra esses

expedientes ministeriais, salvo se respaldado em sigilos a que não possa o MP

diretamente ter acesso. Frise-se, aqui, que, doutrinariamente, discute-se que o

MP pode, diretamente, conhecer qualquer informação, independentemente de

sigilo, em razão da permissão legal estabelecida no artigo 26 da LONMP.

Esse, porém, não é o posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF) e

também de parte da doutrina, os quais entendem que, no tocante ao sigilo fiscal

e bancário, o MP somente pode ter acesso por via judicial, excetuando-se a hipó-tese de se tratar de pessoa jurídica ou física que receba verba pública.

O fundamento da doutrina e do STF cai por terra ao se permitir que a Receita

Federal tenha acesso a dados bancários das pessoas físicas ou jurídicas que

tenham movimentação financeira em determinado patamar, independente de

pedido judicial, numa suposição de indício de ilegalidade pelo valor da movi-

mentação. Contudo, nega a possibilidade, a um órgão respaldado constitucional-

mente para investigações, de coleta direta de dados bancários e fiscais no inqué-

rito civil.

Ora, se a legislação infraconstitucional pode instituir tal poder para a Receita

Federal, não se pode negar tal poder ao MP, já que o mesmo decorre de legislação

de igual hierarquia (LONMP).

Além disso, a LC 75/93, que regula a atuação do MP da União, servindo como

norma suplementar para os demais MPs, estabelece, em seu artigo 8.º, incisos e

parágrafo 2.º, o poder requisitório do MP, não trazendo qualquer restrição a dados

sigilosos, mas, ao contrário, a leitura do citado parágrafo 2.º veda a alegação desigilo para o MP, prevendo, inclusive, no parágrafo 1.º, a responsabilização penal e

civil do membro do MP pelo uso indevido das informações a que tiver acesso.

Outra argumentação do STF e da doutrina é que o permissivo legal para requi-

sições ministeriais tem sede infraconstitucional, enquanto os sigilos fiscal e ban-

cário têm respaldo constitucional. Não se pode partilhar de tal ideia, já que, a bem

da verdade, o poder requisitório ministerial decorre diretamente da Carta Magna,

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Inquérito civil

159

conforme leitura do artigo 129, VI, estando esse órgão vocacionado a garantir

a tutela dos direitos difusos e coletivos, a tutela social, a ordem democrática, e

dentre tais bens está o patrimônio público.

Tanto deve ser entendido que é possível a requisição direta pelo MP de infor-

mações sigilosas que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA – Lei 8.069/90),no parágrafo 4.º do artigo 201, a Lei 8.625/93 (LONMP, art. 26, §2.º) e a LC 75/93 (art.

8.º, §2.º) dispõem que o representante do MP será responsável pelo uso indevido

das informações e documentos que requisitar, nas hipóteses legais de sigilo.

Desse modo, conclui o Professor José dos Santos Carvalho Filho (2004, p. 262):

“ora, admitindo a responsabilidade do membro do MP inclusive nas hipóteses

legais de sigilo, está a lei, implicitamente, contemplando a possibilidade legal de

requisição mesmo nessas hipóteses”.

Pelo exposto, ousamos discordar da Corte Constitucional, para afirmar que,

salvo o sigilo telefônico, os demais são incompatíveis em face das requisições

ministeriais.

Referente aos elementos periciais, igual poder requisitório tem o MP, que pode

direcioná-los a quaisquer órgãos da Administração direta ou indireta, que têm

o dever de respaldar tecnicamente o MP para elucidação de um fato objeto de

investigação por meio de inquérito civil.

Há que se ressaltar, como já exposto acima, que a recusa ou o retardamento

na prestação de informações, dados e documentos (por pessoa física ou jurídica,

pública ou privada), ou perícias técnicas (pessoas jurídicas públicas) ensejam a

hipótese do artigo 10 da Lei 7.347/85. De igual modo, pode o agente público res-

ponder na forma do artigo 11, II, da Lei 8.429/92.

A instrução do inquérito civil pode necessitar da oitiva de pessoas e, para tal,

o MP tem a faculdade de lançar mão do instituto da notificação para compareci-

mento obrigatório do indivíduo conhecedor dos fatos com finalidade de prestardeclarações. O não comparecimento pode ensejar a determinação de condução

coercitiva, podendo o MP, inclusive, requisitar força policial.

Essa requisição de força policial pode, ainda, ser usada para garantia de acesso

do MP, com o fito de efetuar fiscalizações, inspeções etc., em locais submetidos ao

seu controle.

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Inquérito civil

161

Nesse passo, cabe lembrar que algumas leis estaduais que disciplinam os MPs

condicionam a eficácia do ajuste de conduta à homologação pelo CSMP.6 Clara é

a invasão do legislador estadual em competência reservada à União, conforme

disciplina o artigo 22, I, da Carta Constitucional, ao estabelecer competência pri-

vativa da União para legislar sobre Direito Processual.

Convém analisar a natureza do termo de ajustamento de conduta, já que se

informou que a transação pura e simples não é adequada nas lides transindividu-

ais. Para tratar sobre a natureza jurídica do TAC, não há que se negar a finalidade

preventiva do inquérito civil, e para tal, veja-se a lição de Rodolfo Camargo Man-

cuso (2001, p. 128-129):

[...] O inquérito civil da Lei 7.437/85 cumpre um papel preventivo ou intimidativo sobre o poten-cial infrator de uma norma tuteladora de um interesse difuso: sabendo que o Ministério Público

está investigando uma denúncia sobre desmatamento não autorizado pelo Ibama, ou denúnciaacerca da tramitação de projeto de edificação em área de preservação ambiental, por certo osimplicados nessas irregularidades abandonarão seus projetos iniciais ou tratarão de acomodá--los às normas de regência. Nesse sentido, Édis Milaré, atestando que este inquérito é “eficazmeio na prevenção de futuros danos ecológicos, em razão não só de seu caráter intimidativo,mas também porque o resultado das diligências nele encetadas pode dissuadir o agente quantoà consecução de atos potencialmente lesivos ao meio ambiente”.

Ora, estabelecida a importância preventiva do inquérito civil, e sabendo-se

que o ajustamento de conduta pode ocorrer com ele, resta claro entender que

durante a investigação, verificada a lesão ao bem jurídico e identificados os res-ponsáveis, podem estes não terem interesse em suportar as dificuldades de uma

demanda judicial, ou até mesmo se conscientizarem do erro e da necessidade

da sustação do ato ofensivo, da reparação do bem lesado, ou até mesmo da via

ressarcitória.

Após essa análise, só se pode conceber o termo de ajustamento de con-

duta como verdadeiro reconhecimento pelo agente causador do dano sobre

o fato objeto da investigação e sua responsabilidade, e para tanto, com a

consequência de sua adequação à norma afrontada. Funciona o ajuste de

conduta como um cumprimento antecipado da pretensão que seria ajui-

zada, com a possibilidade de acordo no que se refere à forma e prazo de

cumprimento da obrigação.

6 A Lei Complementar 11/96, que regula o MP do Estado da Bahia, no artigo 83, parágrafo único, condiciona a eficácia do com-promisso à homologação pelo CSMP.

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Inquérito civil

A celebração do ajuste de conduta, se coincide com o objeto de futura ACP,

pode ensejar o arquivamento do inquérito civil, e na hipótese de já haver ação em

curso, pode propiciar a suspensão do processo ou sua extinção com resolução de

mérito.7

ArquivamentoApós a instrução do inquérito civil, este pode findar de duas formas, quais

sejam, servir de base para propositura de ação coletiva, ou ser arquivado por falta

de elementos para propositura de uma ação.

Finda a apuração no inquérito civil, é desnecessária a ACP porque inexistentes

elementos para sua propositura. Deverá o membro do MP, na forma do artigo 9.º,

caput  e parágrafos da LACP, arquivar o inquérito civil ou as peças informativas.Igual tratamento determinou o legislador do ECA e de outras leis.

O arquivamento deve ser feito de forma fundamentada, conforme disciplina-

do na LACP, devendo o membro do MP expor as razões pelas quais não proporá

a medida judicial, que sempre apontarão para a carência de elementos para a

sua propositura, que aqui se exemplifica pelo cumprimento de recomendação,

de ajustamento de conduta, de ausência de comprovação do fato, ou outra si-

tuação.

Diverso do procedimento no inquérito policial, no qual o controle de legalidade

do arquivamento é externo à instituição ministerial, sendo, pois, exercido pelo

magistrado, aqui, no inquérito civil, o arquivamento é promovido pelo membro

do MP de primeira instância e submetido à apreciação do CSMP, conforme disci-

plinado pela LACP. Vê-se, nesse caso, que o controle de legalidade sobre o arqui-

vamento é exercido no próprio âmbito do MP.

Importa salientar que, em razão do princípio da publicidade, deve o MP notifi-

car o indivíduo formulador da representação sobre o arquivamento, até para que

possa ser cumprida a regra estabelecida no artigo 9.º, parágrafo 2.º, da LACP,

que permite às associações legitimadas apresentar razões escritas ou documen-

tos para que o CSMP leve em consideração quando da apreciação da promoção

de arquivamento.

7 Sobre o tema, veja-se Geisa de Assis Rodrigues, ob. cit., e Fernando Reverendo Vidal Akaoui (2003, p. 96-99).

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Inquérito civil

163

O CSMP, ao apreciar a promoção do órgão de primeira instância, pode com

ele concordar (e, nesse caso, estará arquivado o inquérito); pode não se conven-

cer dos argumentos ou da situação fática, todavia, sem apreciar o arquivamento,

determinar diligências para posterior deliberação sobre ele; ou pode discordar

do arquivamento e designar, desde logo, outro órgão do MP para ajuizamento

da ação pertinente, conforme determinado no parágrafo 4.º do artigo 9.º da Lei

7.347/85.

Quando o Conselho Superior discorda do arquivamento e remete o procedi-

mento para outro membro do MP, a decisão se compatibiliza com o  princípio da

independência funcional . Todavia, quando devolve os autos para novas diligên-

cias, têm-se duas hipóteses:

a decisão para diligências objetivas, tal como juntada de documentos,

requisição de certidões etc., em momento algum viola o princípio da inde-pendência funcional, pois não afronta a consciência do membro do MP;

a decisão para diligências que tenham um determinado conteúdo sub-

 jetivo viola o princípio da independência funcional e, portanto, deve ser

determinada a outro membro do MP.

Conflito de atribuição entre membros do MPAbre-se, nesse tópico, um momento para se discutir o conflito de atribuição

entre membros do MP, em que pese não se tratar de caso de arquivamento, por

entender se tratar de um dos casos de controle de legalidade, e como não se tra-

tará do tema de forma aprofundada, resolveu-se por, de forma rápida, falar aqui.

É possível que ocorra conflito de atribuições entre membros do MP na fase do

inquérito civil, e o legislador solucionou o problema quando se refere a membros

do MP de mesma instituição, seja federal ou estadual, conforme se verifica no

artigo 10, IX, da Lei 8.625/93, e artigo 62, VII, da LC 75/93 que, respectivamente,determinam atribuição ao Procurador-Geral de Justiça para solução de tais confli-

tos na área estadual, e às Câmaras de Coordenação e Revisão, idêntica atribuição

na esfera federal. A questão aqui é pacífica e não traz grandes dificuldades em

face da solução encontrada pelo legislador.

Todavia, o mesmo já não ocorre quando nos defrontamos com conflito de atri-

buições de membros do MP de Estados diversos ou entre membros do MP Esta-

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Inquérito civil

dual e Federal. O legislador, nessa questão, não fez qualquer referência, restando

à doutrina e à jurisprudência solucionar a questão. Três são as correntes seguidas

para buscar a harmonia do sistema.8

Eugênio Pacelli de Oliveira (2005, p. 39-42), ao tratar do tema, indica três cor-

rentes doutrinárias e jurisprudenciais. A primeira é a possibilidade de solução doconflito utilizando-se da remessa dos autos ao Procurador-Geral da República,

quando diante do conflito de atribuição entre membro do MP Estadual e membro

do MP Federal. Embora possamos aplaudir tal entendimento, porque a solução

dar-se-ia no âmbito do MP, na sistemática atual se incompatibiliza com estrutura

ministerial, como assevera o autor citado, pois não existe qualquer hierarquia

entre o Procuradoria- Geral da República e as Procuradorias Gerais de Justiça dos

estados, não havendo submissão administrativa, funcional ou operacional entre

MP Federal e MP Estadual.

Outra solução encontrada é referida por Paulo César Pinheiro Carneiro (1999,

p. 190-216), quando busca a aplicação do artigo 102, “f”, da CF, o qual atribui ao

STF competência para solução de conflitos entre a União e os Estados, a União e

o Distrito Federal, ou entre uns e outros. Novamente, não se apresenta como a

melhor solução, pois aqui não se cuida de conflito entre unidades federativas, e,

na verdade vai de encontro ao espírito do legislador constituinte de 1988 que, ao

traçar o perfil do MP, colocou-o ao largo dos interesses estatais, identificando-o

com os interesses da coletividade.

Resta, então, o posicionamento de Pacelli de Oliveira (2005, p. 39-42) pela com-petência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) para resolver a questão, quando se

socorre fundamentado no artigo 105, I, “d”, da CF, que estabelece a competência

do tribunal superior em questão para decidir conflito de competência entre tri-

bunais e entre tribunal e juízes a ele não vinculados e entre juízes vinculados a

tribunais diversos. Ainda não é a solução ótima, mas é a que mais harmoniza o

sistema e se aproxima de uma resolução capaz de preservar a compatibilização

da atuação funcional de membros do MP.

A opção pelo STJ se deve ao fato de que uma das possibilidades do inquéritocivil é a ação coletiva, e como esse tribunal é o competente para a solução do con-

flito de competência que pode se desenhar na referida ação, poderia, portanto,

ser o órgão com atribuição para solução do conflito de atribuição no caso do MP,

ante a falta de órgão específico na organização ministerial para tal.

8 Ver sobre o tema Paulo César Pinheiro Carneiro (1999, p. 190-216).

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Inquérito civil

165

Essa solução é um paliativo, porque se sabe que nem todo inquérito civil

redunda em ACP, e, então, a melhor solução é o legislador corrigir o sistema,

determinando a algum órgão ministerial a resolução da questão. De lege ferenda 

o recém criado Conselho Externo de Controle do MP, ou até o Conselho de Pro-

curadores-Gerais de Justiça, ou ainda expressamente definir a competência de

algum órgão judiciário para dirimir a controvérsia.

Convém salientar que o STF, em suas últimas decisões, optou pela corrente

que confere ao STJ a competência para pôr fim à questão.

Do valor probatório do inquérito civil

Na opinião dos professores Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery,(1999, p. 1.332) “prova recolhida no inquérito civil, se para sua realização não tiver

havido participação dos interessados, precisa ser refeita ou contrastada em juízo,

em obediência ao princípio constitucional do contraditório”.

Esse posicionamento, assente na maior doutrina, não se coaduna com o espí-

rito da LACP, nem considera o valor do bem jurídico (meio ambiente, moralidade

administrativa etc.) protegido na espécie. Caso o MP tenha que repetir em juízo

todas as provas arrecadadas durante o inquérito civil, inclusive as provas periciais,

isso implicará em grande perda não apenas para o órgão ministerial, mas para o

Estado e, em última instância, para a sociedade.

Refletindo sobre tal situação, Hamilton Alonso Júnior (apud  MILARÉ, 2002, p.

294) aduz que

[...] pareceres feitos por professores de universidades renomadas, relatórios técnicos elaboradospor especialistas do setor público, enfim, provas periciais de valor indiscutível, considerando oórgão donde promanam e a capacidade dos subscritores, de nada têm valido quando se iniciaa fase processual.

Desse modo, é forçoso conferir a tais atos, seguindo o regramento genérico

dos atos administrativos, presunção  juris tantum  de validade, cabendo à parte

adversa impugnar essa prova com a apresentação de dados plausíveis.

Acolhendo essa ideia, a própria Lei 9.605/98 saiu na frente, estatuindo em seu

artigo 19, parágrafo único, que “a perícia produzida no inquérito civil ou no juízo

cível poderá ser aproveitada no processo penal, instaurando-se o contraditório”.

8/11/2019 AÇÕES CONSTITUCIONAIS (1)

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Inquérito civil

Sintetizando o pensamento exposto, o professor Hamilton Alonso Júnior (apud  

MILARÉ, 2002, p. 299) afirma ser “possível conciliar o interesse público motivador

da instauração do inquérito civil, o próprio como elemento de prova e os postula-

dos processuais da ampla defesa e do contraditório”.

Em consonância com esse entendimento, tais provas, levadas a juízo via ACP,devem ser devidamente apreciadas pelo requerido (que deve impugná-las no

prazo de defesa, sob pena de serem consideradas fatos incontroversos), bem

como pelo juiz, ao proferir a sentença.

Socorre-se no caso em tela da teoria da ponderação de interesses, tão festejada

na doutrina e pelos tribunais brasileiros, para que se possa buscar uma conforma-

ção do princípio do contraditório, que é uma garantia constitucional determinada

como garantia fundamental e a proteção do meio ambiente, do consumidor, da

saúde, da cidadania, dos idosos, das pessoas portadoras de necessidades espe-

ciais, da criança e do adolescente, também microssistemas reconhecidos consti-

tucionalmente, que também são garantias fundamentais, e embora não elenca-

das no artigo 5.º têm igual força constitucional.

Inquérito civil

e seus reflexos na ação penalDurante a investigação para verificação de ofensa à legislação civil que tutela

os bens difusos e coletivos, pode o presidente do procedimento se deparar com

um ilícito penal. Um ilícito pode ter vertente civil, administrativa e penal (exemplo

clássico, ato de improbidade ou ato contra o meio ambiente).

Em razão da verificação do conhecimento do fato delituoso, não resta outra

alternativa, ao membro do MP, senão utilizar a peça de informação como um ins-

trumento para a propositura da ação penal cabível, conforme permitem os arti-gos 39 e 40 do Código do Processo Penal (CPP).

Aqui não se cuida de instauração de inquérito civil para apuração de fato deli-

tuoso, e sim de procedimento destinado à apuração de ofensa a bem difuso ou

coletivo, em que acabou por se verificar ofensa à legislação civil e também cri-

minal.

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Inquérito civil

167

É bom esclarecer que a investigação presidida pelo MP, ou a sua participação

em apuração de fato delituoso não acarreta impedimento para a deflagração de

ação penal pelo mesmo órgão que produziu a investigação, conforme disciplina

a Súmula 234 do STJ:

N. 234. A participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal nãoacarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia.

Outra questão de grande relevância é sobre a possibilidade de o MP instaurar

inquérito civil com objeto determinado de investigação criminal. Certamente não

foi esse o sentido da norma impressa no artigo 129, III, da CF, pois ao se fazer a

leitura do referido artigo, bem como de toda legislação infraconstitucional que

regulamenta o inquérito civil, resta claro que ele é instrumento direcionado à

apuração de fatos civis e não tem como objeto específico fatos delituosos.

Embora não seja esse o foco do presente trabalho, entendemos que o MP podeinvestigar diretamente sim, mas não com base no artigo 129, III, da Carta Magna,

mas sim, como bem lembrado pelo ministro Carlos Aires Brito, em brilhante voto

proferido em ação pendente de julgamento no STF, com fundamento no artigo

127 c/c artigo 129, VI, VII e VIII, da CF.

Ampliando seus conhecimentos

 Jurisprudências

PROCESSO CIVIL. AÇÃO CIVIL DE REPARAÇÃO DE DANOS. INQUÉRITO CIVIL PÚBLICO. NATU-REZA INQUISITIVA. VALOR PROBATÓRIO.

1. O inquérito civil público é procedimento informativo, destinado a formar a opinio actio do Ministério Público. Constitui meio destinado a colher provas e outros elementos de con-vicção, tendo natureza inquisitiva.

2. “As provas colhidas no inquérito têm valor probatório relativo, porque colhidas sem aobservância do contraditório, mas só devem ser afastadas quando há contraprova de hie-rarquia superior, ou seja, produzida sob a vigilância do contraditório” (Recurso especial476.660-MG, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 04/08/2003).

3. As provas colhidas no inquérito civil, uma vez que instruem a peça vestibular, incorpo-ram-se ao processo, devendo ser analisadas e devidamente valoradas pelo julgador.

4. Recurso especial conhecido e provido. (STJ, REsp. 644.994/MG, 2.ª T., Rel. Min. João Otáviode Noronha, j. 17/02/2005).

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Inquérito civil

ADMINISTRATIVO. MINISTÉRIO PÚBLICO. PROVIDÊNCIAS INVESTIGATÓRIAS PARA PROPO-SIÇÃO DE INQUÉRITO CIVIL E AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REQUISIÇÃO DE DOCUMENTOS NÃOCONFIGURADOS LEGALMENTE COMO SIGILOSOS. PREVALÊNCIA DA LEI 8.625/93.

I - A Lei 8.625/93 confere ao Ministério Público autorização para a requisição de informa-ções a entidades públicas ou privadas visando à instauração de procedimentos judiciais ou

administrativos.II - O Parquet   ao requisitar os documentos inerentes à transferência do controle acio-nário da empresa de telefonia celular XXXX, com assunção de dívidas na ordem deR$4.760.000.000,00 (quatro bilhões, setecentos e sessenta milhões de reais) por apenasR$1,00 (um real), está na sua função de investigar a legalidade de operação de tal vulto.

III - O artigo 155, §1.º, da Lei das Sociedades Anônimas, ao apontar como sigilosas as infor-mações que ainda não tenham sido divulgadas para o mercado, não dirigiu esse sigilo aoMinistério Público, não havendo superposição da norma em relação à Lei 8.625/93.

IV - Não existindo lei que imponha sigilo em relação aos dados em tela, prevalece a determi-nação legal que autoriza o Ministério Público a requisitar tais informações.

V - Recurso especial provido. (STJ, REsp 657.037/RJ, 1.ª T., Rel. Min. Francisco Falcão, j.02/12/2004).

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Wellington Pacheco Barros

Considerações geraisO mandado de segurança (MS) coletivo, na esteira do MS individual, é

uma das maiores garantias criadas pelo Direito para proteger um grupo de

cidadãos da prepotência do Estado e, por consequência, uma forma de ação

de controle dos atos administrativos abusivos. Tamanha sua importânciaque é estudado em vários ramos do Direito como o Constitucional, o Admi-

nistrativo e o Processual Civil, cada qual realçando seus aspectos típicos.

Apesar disso, e de sua institucionalização no direito brasileiro ser recente,

seu espectro é de grande importância para a celeridade do Poder Judiciário,

 já que, pelo leque de abrangência de seus legitimados, pode-se evitar uma

quantidade enorme de MS individuais.

Apesar de tudo isso, o MS, em muitos aspectos, continua um instituto jurí-

dico muito propalado e pouco aprofundado.

A intenção deste capítulo é dimensioná-lo no seu aspecto material, pelas

profundas modificações introduzidas pela Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009,

mais especificamente no artigo 21, parágrafo único, quando conceituou que

os direitos protegidos pelo MS coletivo poderiam ser: (I) – coletivos, assim

entendidos os transindividuais, de natureza indivisível, de que seja titular,

grupo ou categoria de pessoas ligadas entre si ou com a parte contrária por

uma relação jurídica básica; e (II) – individuais homogêneos, assim entendi-dos os decorrentes de origem comum e da atividade ou situação específica

da totalidade ou de parte dos associados ou membros do impetrante.

Mandado de segurança coletivo I

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Mandado de segurança coletivo I

Garantia constitucionalO artigo 5.º, LXX, da Constituição Federal (CF) traz a possibilidade da impetra-

ção do MS coletivo, rezando o seguinte:

Art. 5.º [...]

LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:

a) partido político com representação no Congresso Nacional;

b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funciona-mento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados;

O MS coletivo não discrepa em muito do MS individual, espécies de um

mesmo gênero: mandado de segurança. A ameaça de violação a direito líquido e

certo, ou iminência de sofrimento, continua como requisito nesse outro remédio

constitucional.

O MS coletivo, como seu antecessor, é um remédio constitucional criado pelo

legislador para sanar ou evitar ato abusivo ou ilegal de uma autoridade.

Por outro lado, o controle por meio dessa ação visa sanear a Administração de

um defeito praticado por seu agente. Em consequência, não pode se constituir

em determinação para obrigar que o agente público se manifeste sobre deter-

minada situação administrativa, porquanto a manifestação é sempre da pessoa

pública. Como a própria nomenclatura deixa antever, agente é aquele que age,que se manifesta em nome da Administração Pública, já que esta, em todos os

seus segmentos de Administração direta ou indireta, é abstração jurídica exterio-

rizando vontades por meio de pessoas físicas.

O MS surgiu como decorrência do desenvolvimento da doutrina brasileira

do habeas corpus. Quando a Emenda de 1926 restringiu o uso dessa medida às

hipóteses de ofensa ao direito de locomoção, os doutrinadores passaram a pro-

curar outro instituto para proteger os demais direitos. Sob a inspiração do writ  

norte-americano e do  juicio de amparo do direito mexicano, instituiu-se o MS (DIPIETRO, 1996, p. 508).

O mandamus, como também é conhecido, não é a única forma de controle

da Administração. Outras formas de controle jurisdicional do ato administrativo

também podem ser utilizadas, como o habeas corpus, as cautelares, a ação popu-

lar, a ação civil pública, a ADIn, o mandado de injunção etc.

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Mandado de segurança coletivo I

173

A diferença relevante entre o MS individual e o coletivo é quanto aos aspectos

da legitimação ativa para a causa, tema que diz respeito aos seus aspectos pro-

cessuais.

No balizado de Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery (2003, p. 135):

O MSC nada mais é do que a possibilidade de impetrar-se um MS tradicional por meio de tutela jurisdicional coletiva. O adjetivo “coletivo” se refere à forma de exercer-se a pretensão manda-mental, e não a pretensão deduzida em si mesma. O MSC se presta à tutela de direito difuso,coletivo ou individual. O que é coletivo não é o mérito, o objeto, o direito pleiteado por meio deMSC, mas sim a ação. Trata-se de instituto processual que confere legitimidade para agir às enti-dades mencionadas no texto constitucional (Barbosa Moreira, RP 61/196; Grinover, RP 57/96;Nery, CDC Coment., 664 Nery, RP 57/96).

Situações de não cabimento de MS coletivoA provocação ou a ação mais tradicional de controle do ato administrativo é o

MS, seja individual ou coletivo. Essa tem sido a via mais usada pelos operadores

do Direito, embora em muitas situações não seja a mais eficiente. Entretanto, em

que pese o seu amplo espectro de abrangência, há algumas situações em que

não é possível impetrar MS. E tais hipóteses são iguais às do MS individual, como

veremos a seguir.

Como substituto das ações de cobrança

Não pode um sindicato, por exemplo, buscar algo que entenda ter sido pago

indevidamente por essa via. O MS é cabível para ver cessada uma ilegalidade, e

não serve para repetir o indevido. Essa ação excepcional não se equipara à ação

de cobrança, como entendimento sufragado pelo Supremo Tribunal Federal (STF),

com a Súmula 269 que reza:

N. 269. O mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança.

Aliás, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já se manifestou:

TRIBUTÁRIO. COMPENSAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. SÚMULA 269/STF.

1. “O mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança” (Súmula 269/STF).

2. Agravo provido para não conhecer do recurso especial. (AgRg no REsp 796.305, 2.ª Turma, Rel.Min. Castro Meira, j. 18/04/2006).

RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO. AUMENTO DE CONTRIBUIÇÃOPREVIDENCIÁRIA. LEI ESTADUAL GOIANA. ATO CONSUMADO. IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA.

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Mandado de segurança coletivo I

1. O mandado de segurança não pode ser utilizado como substitutivo de ação de cobrança emuito menos produz efeitos patrimoniais em relação a período pretérito. Entendimentos sumu-lados do Pretório Excelso.

2. Recurso ordinário improvido. (RMS 11.574, 2.ª Turma, Rel. Francisco Peçanha Martins, j.19/02/2002).

Como substitutivo de ação popular

A ação popular, como o próprio nome sugere, é a ação típica do exercício da

cidadania em que alguém do povo busca anulação de ato administrativo lesivo

ao patrimônio público. Embora seja um instrumento de forte controle da Admi-

nistração Pública, sua utilização não ocorre de forma frequente.

A Lei 4.717/65, ao regular essa forma de controle da Administração Pública, no

seu artigo 1.º, procurou proteger além do simples limite daqueles bens perten-centes às pessoas públicas diretas ou indiretas, para atingir também o patrimônio,

verbis:

Art. 1.º Qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação ou a declaração de nuli-dade de atos lesivos ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios,de entidades autárquicas, de sociedades de economia mista (CF, art. 141, §38), de sociedadesmútuas de seguro nas quais a União represente os segurados ausentes, de empresas públicas,de serviços sociais autônomos, de instituições ou fundações para cuja criação ou custeio otesouro público haja concorrido ou concorra com mais de cinquenta por cento do patrimônioou da receita ânua, de empresas incorporadas ao patrimônio da União, do Distrito Federal, dos

Estados e dos Municípios, e de quaisquer pessoas jurídicas ou entidades subvencionadas peloscofres públicos.

A ideia clara do legislador foi a de alcançar, com o controle exercido pela ação

popular, o patrimônio público, fosse ele de valor econômico, artístico, estético,

histórico ou turístico.

Diferentemente do gênero MS, a ação popular pode ser proposta diretamente

contra os entes públicos ou assemelhados acima enunciados, contra os agentes

públicos propriamente ditos ou, por extensão legal, contra uns e outros. Caso a opção

eleita seja a ação popular contra agentes públicos propriamente ditos ou por exten-são legal, as pessoas jurídicas públicas ou privadas que eles integram, como litiscon-

sortes necessárias que são, poderão abster-se de contestar o pedido ou atuar ao lado

do autor, por puro juízo de conveniência e oportunidade do representante legal.

No entanto, em que pese existam algumas similitudes com o MS, a ação popu-

lar não o substitui, consoante a Súmula 101 do STF:

N. 101. O mandado de segurança não substitui a ação popular.

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Mandado de segurança coletivo I

175

O STJ, seguindo o verbete supremo, também já consignou:

MANDADO DE SEGURANÇA E AÇÃO POPULAR. SÚMULA 101/STF. DIRETORES DE EMPRESAPÚBLICA. EXONERAÇÃO. MANDATO FIXO. REVOGAÇÃO DA LEI. ALEGAÇÃO DE DIREITO ADQUI-RIDO. INOCORRÊNCIA.

1. “O mandado de segurança não substitui a ação popular” (Súmula 101/STF).

2. Alegação de inconstitucionalidade da Lei 2.783/2003 não conhecida (ADIn 2.8442-1-AM, Rela-tor Ministro Maurício Correia).

3. Embora a Emenda Constitucional 40 houvesse introduzido o §2.º ao art. 105 para determinarque os ocupantes de órgãos estatais fossem “eleitos ou designados com mandato com prazocerto, na forma da lei, após a aprovação dos respectivos nomes pela Assembleia Legislativa doEstado”, nesse ponto tal emenda, publicada no DOE de 12/12/2002, veio a ser expressamenterevogada pela Emenda Constitucional 42, de 20/03/2003, publicada no DOE de 24/03/2003.

4. Recurso ordinário improvido. (RMS 19.177, 2.ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, j. 16/03/2006).

Como substitutivo de ação civil pública

O MS não substitui a ação civil pública, de legitimidade do Ministério Público

(MP), como já decidiu o STJ:

MANDADO DE SEGURANÇA. AÇÃO POPULAR. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. O MANDADO DE SEGU-RANÇA PROTEGE DIREITO INDIVIDUAL. NÃO SUBSTITUI A AÇÃO POPULAR OU A AÇÃO CIVILPÚBLICA. NAQUELE REALÇA O INTERESSE PARTICULAR. NESTAS, O INTERESSE PÚBLICO; O POS-TULANTE SÓ REFLEXAMENTE SE BENEFICIARÁ DO QUE REQUER. (MS 267, 1.º Seção, Rel. Min.Vicente Cernichiaro, j. 12/12/1989).

Contra lei em teseApós reiterados precedentes1, o STF estabeleceu a Súmula 266 que diz:

N. 266. Não cabe mandado de segurança contra lei em tese.

O ato legislativo legítimo só pode ser atacado por MS quando concretamente

ferir direitos individuais, uma vez que é dotado de abstração e generalidade. O

STJ, de igual forma, seguiu a orientação:

CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. SERVIDORES PÚBLICOS FEDERAISCIVIS DO PODER EXECUTIVO. SINDICATO. MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO. PORTARIA INTER-MINISTERIAL 26/95. LEI EM TESE. APLICAÇÃO DO ENUNCIADO 266 DA SUMULA DO STF. PRECEDEN-TES. CONCESSÃO DO REAJUSTE DE 25,94%, E DO PAGAMENTO DA DIFERENÇA DE 3,07%, EMPROL DA ISONOMIA SALARIAL ENTRE OS SERVIDORES PÚBLICOS FEDERAIS: IMPOSSIBILIDADE.

1 Precedentes: MS 9.077, DJ de 23/08/1962; RMS 9.973, DJ de 06/09/1962; MS 10.287, DJ de 27/06/1963; RE 351, DJ de29/08/1963.

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Mandado de segurança coletivo I

APLICAÇÃO DO ENUNCIADO 339 DA SUMULA DO STF. PROCESSO EXTINTO SEM JULGAMENTODO MERITO.

I - Não merece prosperar o mandado de segurança coletivo impetrado por sindicato em faceda portaria interministerial 26/95, pois esta, por estabelecer normas genéricas, está contida naexpressão “lei em tese”, dando ensejo à aplicação do enunciado n. 266 da Súmula do STF. Prece-dentes do STJ : MS 110/DF, MS 613/DF E MS 1370/DF.

II - Não é possível, tendo em vista a orientação consubstanciada no enunciado 339 da Súmulado STF, conceder o reajuste de 25,94%, bem como determinar o pagamento da diferença de3,07%, pleiteados em prol da isonomia salarial entre os servidores públicos federais civis (dostrês poderes) e militares.

III - Processo extinto sem julgamento do mérito. (MS 4.075, 3.ª Seção, Rel. Min. Adhemar Maciel, j. 27/03/1996).

A única forma de se anular uma lei pelo Poder Judiciário é por meio de ADIn,

porquanto o MS é via inidônea para tal.

Contra ato judicial recorrível

O artigo 5.º, II, da Lei 12.016/2009 veda a possibilidade de impetração de

segurança contra decisão judicial da qual caiba recurso com efeito suspensivo.

Por interpretação dedutiva, se o recurso interposto não tiver efeito suspensivo, é

cabível MS. Aliás, a nova lei consolidou entendimento do STF manifestado através

da Súmula 267 (manter transcrição).

A modificação imposta pelo novo regramento do MS modificou o entendi-

mento de que não se poderia interpor a segurança contra ato judicial. Observa-seque o legislador criou uma salvaguarda cujo maior beneficiário é a Administração

Pública, circunstância que é repetida em vários momentos, como se verá mais

adiante.

Contra ato que caiba recurso administrativo com efeito suspensivo

O artigo 5.º, I, da Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009, introduziu uma novi-

dade quanto às situações de não cabimento de MS. Trata-se da situação em quehá previsão legal de cabimento de recurso administrativo com efeito suspensivo,

independentemente da exigência de caução.

A vedação vem realçar o artigo 5.º, LV, da CF, que outorga ao processo adminis-

trativo força de garantia fundamental.

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Mandado de segurança coletivo I

177

Contra decisão judicial transitada em julgado

O artigo 5.º, III, da Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009 inovou quando estabe-

leceu ser impossível a concessão de MS contra decisão judicial transitada em jul-

gado. A questão é apenas aparentemente óbvia. Isso porque, embora minoritária,

certo é que há jurisprudência entendendo que, se a decisão judicial transitou em julgado, mas o fundamento em que se baseou era ilegal, por aplicação da dou-

trina de que a ilegalidade gera a nulidade absoluta de efeito ex tunc , caberia MS.

Contra ato de gestão comercial

O artigo 1.º, parágrafo 2.º, da Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009, pondo fim

a uma discussão doutrinária e jurisprudencial intensa, especificou que não cabe

MS contra atos de gestão comercial praticados pelos administradores de empre-sas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionária de serviço

público.

Ocorre que as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as con-

cessionárias de serviços públicos só integram o conceito de administração pública

quando praticarem atribuições típicas de poder público. No mais, são pessoas

 jurídicas de direito privado, portanto, os atos que praticam são atos de gestão

comercial.

Quem pode praticara ilegalidade ou o abuso de poder?

Os legitimados passivos do MS coletivo são os mesmos do MS individual:

agentes políticos  – Presidente da República, ministros de Estado, senado-

res, deputados, ministros de tribunais superiores, governadores, deputados

estaduais, desembargadores, secretários de Estado, prefeitos municipais,

vereadores, magistrados e secretários municipais, sempre que repre-

sentando a Administração Pública. O parágrafo 1.º, do artigo 1.º, da Lei

12.016/2009 legitimou na categoria de agente político os representantes

ou órgãos dos partidos políticos e os administradores de entidades autár-

quicas;

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Mandado de segurança coletivo I

agentes administrativos  – servidor público e empregado público no exer-

cício de suas atribuições;

particulares no exercício de atribuições delegadas pelo Poder Público  

– além dos concessionários, permissionários e autorizatários de serviços

públicos, são considerados autoridades para efeito de MS os dirigentesde pessoas jurídicas ou de pessoas naturais no exercício de atribuições do

poder público, somente no que disser respeito a essas atribuições, conso-

ante dicção do artigo 1.º, parágrafo 1.º, da Lei 12.016/2009.

O controle judicial dos atos administrativos não se limita aos atos de pessoas

públicas. Seus agentes também estão sujeitos a esse controle, não na mesma ple-

nitude, porém por meio de forma especial de tutela, como é ação mandamental.

Para melhor compreensão, deve-se tecer algumas considerações do que vem a

ser órgão público, agente público e serviço público delegado.

O órgão é aquela parcela de poder da pessoa jurídica pública, resultante de sua

divisão por força de lei. Tem como objetivo fazer com que a Administração alcance

uma maior operacionalidade. É o fracionamento administrativo a que é subme-

tido todo ente jurídico público para atingir com maior eficiência o bem comum.

Embora durante muito tempo na doutrina e na jurisprudência tenha se entendido

que o órgão não tinha legitimidade passiva no MS, o artigo 1.º, parágrafo 1.º, da Lei

12.016/2009 criou a exceção a esse entendimento ao estabelecer que órgãos de

partidos políticos poderiam ser equiparados a autoridades coatoras.

O agente, por sua vez, na estrutura tipicamente administrativa, é a pessoa

física que age e movimenta a Administração. A ação nunca é pessoal, porquanto

quem em verdade se manifesta é a pessoa jurídica pública por meio do seu órgão.

O agente público é a autoridade coatora para fins de MS. Por isso, dirigir a peça

mandamental contra pessoa jurídica de direito público é vício insanável, enseja-

dor de indeferimento da peça inicial.

Os atos decorrentes de órgãos colegiados, como Mesa Diretora da Câmara e doSenado, das Assembleias Legislativas e das Câmaras Municipais ou análogos, não

são enquadráveis como ato de autoridade coatora para fins de MS. Como os atos

emitidos são complexos, ou seja, não se executam por si mesmos, dependem da

vontade de outro agente público para que tomem vida jurídica. Só violam direito

líquido e certo se manifestados pela pessoa daquele que executa ou preside o

órgão coletivo.

8/11/2019 AÇÕES CONSTITUCIONAIS (1)

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Mandado de segurança coletivo I

179

Questão delicada diz respeito aos serviços públicos delegados, uma manifes-

tação de conveniência e necessidade do repasse ao particular a execução de ser-

viços públicos.

A delegação tanto pode recair numa pessoa física quanto jurídica. Em ambas, o

serviço continua sendo estatal, ou seja, a relação entre o prestador do serviço e oadministrado não configura uma relação civil, sendo tutelado pelo Direito Admi-

nistrativo. O executor privado do serviço público delegado é que é o legitimado

passivo na ação mandamental, pois pratica atos públicos, passíveis de controle

pelo Judiciário. A matéria inclusive já fora sumulada pelo STF (Súmula 510):

N. 510. Praticado o ato por autoridade, no exercício de competência delegada, contra ela cabemandado de segurança ou a medida judicial.

Quem recebe autorização do Poder Público também pode praticar ilegalidade

ou abuso de poder.

Situações novas foram criadas pela Lei 12.016/2009 dimensionando de forma

mais abrangente o conceito de autoridade coatora para fins de MS.

A primeira dessas novidades é estratificada no artigo 2.º quando salienta que

se deverá considerar como federal a autoridade coatora se as consequências de

ordem patrimonial do ato, contra o qual se requer o mandado, houverem de ser

suportadas pela União ou entidade por ela controlada.

A segunda novidade é a do artigo 3.º que estabelece que o titular de direitolíquido e certo decorrente de direito, em condições idênticas, de terceiro poderá

impetrar MS a favor do direito originário, se o seu titular não o fizer, no prazo de

30 (trinta) dias, quando notificado judicialmente. O parágrafo único desse mesmo

artigo afirma que o exercício do direito previsto no caput  do artigo submete-se ao

prazo fixado no artigo 23 da Lei, contado da notificação.

MS coletivo como formade controle da Administração PúblicaComo já frisado, há formas de controle dos atos da Administração Pública e o

MS coletivo é uma delas, assim como o individual.

Não se discute na doutrina se o Poder Judiciário pode ou não exercer o controle

sobre os atos praticados pela Administração Pública. A questão que se impõe é

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Mandado de segurança coletivo I

em relação à extensão desse controle, uma vez que a conduta do administrador

tem se pautado, por ocasiões, com pouca ou nenhuma eficácia, no mais das vezes

pela relação política dos agentes administrativos que integram esses organismos

de controle interno como os agentes que dão voz aos atos públicos.

O certo é que o Poder Judiciário, por seu poder coativo, é o verdadeiro subter-fúgio do questionamento das ações do administrador.

Entretanto, o poder de controle dos atos administrativos pela via judicial

encontra limites. Como se sabe, ao Judiciário é vedado analisar o mérito admi-

nistrativo, seja na conveniência ou na oportunidade, sob pena de ingerência no

Poder alheio, o que violaria o  princípio da independência dos Poderes. O princípio

da eficiência, de outro lado, ajuda a mitigar tal premissa, pelo subjetivismo que o

traz relacionado. Assim, como se dizer que essa ou aquela manifestação da Admi-

nistração Pública é válida e foi ditada de forma suficiente, se não for analisado seumérito? Nessa situação, o Judiciário deve enfrentar a questão em todos os seus

contornos subjetivos. Somente a prova que reveste a estrutura material do ato

esclarecerá.

Por outro lado, há necessidade de se fixar a extensão do ato coator.

O ato da autoridade é ato jurídico especial, conhecido como ato adminis-

trativo. É a manifestação de vontade da Administração. Por ele, o Poder Público

extingue, cria ou modifica direitos, consoante os princípios esculpidos no artigo37 da CF. O ato atentador de tais cânones constitucionais acaba por não integrar

o universo da Administração Pública. Por sua vez, o writ  é o antídoto para curar

esse mal jurídico no nascedouro.

É possível concluir que o ato de autoridade para efeito de MS, além daquela

manifestação específica da autoridade pública direta ou indireta, ou ainda o par-

ticular revestido nessa função, contra alguém, pode ser também caracterizado

no ato do superior hierárquico, e não de seu subordinado, quando este apenas

cumpre ordens; na lei, no regulamento, nos regimentos, nas portarias, nas circula-res, nas instruções, nos editais, desde que produzam efeito material concreto res-

tringindo direito de qualquer pessoa. Até o ato jurisdicional quando inexistente

previsão recursal, desde que calcado em ilicitude, de forma excepcional, pode

caracterizar ato de autoridade passível de controle por MS.

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Mandado de segurança coletivo I

181

MS preventivoAssim como no MS de cunho individual, é possível a impetração de MS cole-

tivo preventivo.

Se a autoridade dita coatora praticar ato lesivo ou abusar de poder caberá aimpetração de MS preventivo, individual ou coletivo. Tais hipóteses são comissi-

vas, pois exigem um agir da Administração. Entretanto, a lei prevê uma hipótese

em que o ato ainda não foi praticado pelo Poder Público – uma expectativa de

ato – quando houver justo receio do sofrimento de uma ilegalidade. É nesse caso

que há permissão da impetração de MS preventivo.

Contudo, não deve haver um risco singelo de lesão ao direito líquido e certo

do impetrante. Deve haver uma real e efetiva ameaça comprovada ou, ao menos,

indícios da iminência da ilegalidade. E, no caso dessa modalidade, resta evidente

que a ameaça deve ser em relação à coletividade atingida, e não ao interesse

individual de cada um de seus membros, caso em que é cabível a impetração do

remédio singular.

Evidente que se ainda não há coação, o MS preventivo não pode ser atingido

pelo instituto da decadência, consoante reiteradas decisões do STJ.2

E não é por ser de caráter preventivo que a lei dispensa a coletividade de

provar a efetiva ameaça de seu direito líquido e certo, bem como de demonstrara presença dos requisitos do fumus boni iuris e do  periculum in mora, sob pena de

seu indeferimento.3

2 COMPENSAÇÃO. DIREITO DECORRENTE DA INCONSTITUCIONAL MAJORAÇÃO DE ALÍQUOTA. DECADÊNCIA.

1. O mandado de segurança, segundo jurisprudência desta Corte (Primeira Seção), é usado com efeito declaratório tão somente.Tese jurídica, sobre a qual guardo reservas.

2. Em se tratando de writ  preventivo, não há que se falar em decadência. Precedentes da Corte. 3. Recurso especial provido. (REsp707.490, 2.ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, j. 14/03/2006).

3 MANDADO DE SEGURANÇA. COLETIVO E PREVENTIVO. TERMINAIS PRIVATIVOS E UTILIZAÇÃO DA ESTRUTURA PORTUÁRIA DA

UNIÃO. ATO ADMINISTRATIVO. EFEITOS NAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS. DIREITO LÍQUIDO E CERTO SEM DEMONSTRAÇÃO INE-QUÍVOCA. DEPENDÊNCIA DE PROVA. CARÊNCIA DE AÇÃO. EXTINÇÃO DO PROCESSO. CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ARTIGO 5.º, LXIXE LXX, B – LEI 8.630/93.

1. Funcionário sujeito à determinação de hierarquia superior, sem carga própria de autoridade para decidir, não podendo modi-ficar ou revogar o ato editado e demonstrado que é mero executor, está o órgão de legitimação para figurar no polo passivo darelação processual.

2. Ato de autoridade competente e explicitando a finalidade, apropriado à atividade de interesse público na organização eadministração dos fatos, não está maculado por ilegalidade formal. Efeitos lesivos ou ofensivos à garantia individual, somentedimensionáveis caso por caso e dependentes de comprovação específica, inviabilizam processualmente o mandamus, cuja açãotem como condição fundamental o direito líquido e certo.

3. Extinção do processo. (STJ, MS 6.803, 1.ª Seção, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, j. 12/09/2001).

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Mandado de segurança coletivo I

Como no MS coletivo, assim como no comum, deve vir acompanhado de

prova pré-constituída, porquanto a natureza do rito – sumário – não permite ins-

trução elástica.

Nesse sentido, reiteradas as decisões do STJ:

ADMINISTRATIVO. CERTIFICADO DE ENTIDADE DE FINS FILANTRÓPICOS. CANCELAMENTO.RECURSO ADMINISTRATIVO. REVISÃO DE ATO ADMINISTRATIVO EIVADO DE NULIDADE. ART. 53DA LEI 9.784/99. MANDADO DE SEGURANÇA. DENEGAÇÃO DA ORDEM.

[...]

3. Ademais, se o recurso administrativo não é cabível – como se alega – não se pode presumirque a autoridade impetrada vá recebê-lo, ou acolhê-lo. Não se pode presumir que autoridade pública vá praticar uma ilegalidade. Não cabe mandado de segurança preventivo, baseado na pre-sunção – sem qualquer fundamento de ordem objetiva a indicar isso – que a autoridade impetradairá tomar uma decisão contra a lei. Em casos tais, presente o princípio da legitimidade dos atos daadministração, não se pode considerar presente uma ameaça a direito da impetrante. (grifo nosso)

4. Segurança denegada. (MS 9.406, 1.ª Seção, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 13/04/2005).

CONSTITUCIONAL. COMPOSIÇÃO DE TRIBUNAL. PREENCHIMENTO DE VAGAS DE DESEMBARGA-DOR. LISTA DE ANTIGUIDADE. ATUALIZAÇÃO. PUBLICAÇÃO. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. AUSÊNCIADE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA. MANDADO DE SEGURANÇA. 

1. O caráter preventivo da impetração não afasta a necessidade de que sejam efetivamente demons-tradas a certeza e a liquidez do direito em tese ameaçado.

2. O direito invocado, para ser amparado, há que vir expresso em norma legal, e trazer em si todos osrequisitos e condições de sua aplicação ao impetrante.

3. Ao apreciar a ADIn 189-2/RJ, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade daResolução 03/89 – TJ/RJ. Ilegalidade que não se reconhece.

4. Recurso em mandado de segurança conhecido, mas não provido. (RMS 12.445, 5.ª Turma, Rel.Min. Edson Vidigal, j. 21/06/2001). (grifo nosso)

Esses são os principais aspectos gerais e materiais do MS coletivo.

ConclusãoO MS coletivo é ação constitucional de proteção coletiva, que busca controlar

os atos abusivos da Administração Pública.

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Mandado de segurança coletivo I

183

Ampliando seus conhecimentosSugerimos a leitura das obras abaixo:

Código de Processo Civil Comentado: legislação processual civil e extravagante,

de Nelson Nery Junior, editora Revista dos Tribunais.

Considerações sobre o controle jurisdicional de urgência na ação de mandado de

segurança, de Wellington Pacheco Barros, Revista da Ajuris, v. 26, n. 76, editora

Ajuris.

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Wellington Pacheco Barros

Considerações geraisO mandado de segurança (MS) coletivo, tal qual o MS individual, é ação

constitucional coletiva de garantia, que busca controlar os atos abusivos da

Administração Pública.

O MS coletivo, apesar de usualmente ser impetrado como remédio paratodos os males administrativos de repercussão coletiva, tem limitações, já

que não pode ser substitutivo de ação de cobrança, de ação popular, de ação

civil pública ou de recurso judicial, entre outros.

A proposta deste texto é estudar o MS coletivo na sua forma processual.

Regulamentação legalA base legal do MS é a Lei 12.016, de 7 de agosto de 2009, que revogou

expressamente a Lei 1.533/51.

Quem pode ser o autor no MS coletivo?Pode ser autor de MS coletivo, conforme preceito constitucional:

partido político,  com representação no Congresso Nacional;

organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente

constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa de

interesses de seus membros ou associados.

Como a estrutura de legitimidade para a propositura do MS coletivo não é

ampla, e a condição de prova a ser demonstrada deve acompanhar a inicial,

esta matéria será analisada logo a seguir, quando se tratar da inicial.

Mandado de segurança coletivo II

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Mandado de segurança coletivo II

Quem pode sera autoridade pública coatora?

Os legitimados passivos na ação de MS coletivo são os mesmos com relação

ao MS individual. São todos aqueles que, representando a Administração Pública,podem vir a praticar ilegalidade ou abuso de poder no exercício de seu ofício.

Considera-se autoridade coatora a pessoa que ordena ou omite a prática do

ato impugnado, e não o superior que o recomenda ou baixa normas para a sua

execução. Coatora é a autoridade superior que pratica ou ordena concreta e espe-

cificamente a execução ou inexecução do ato impugnado, e responde pelas suas

consequências administrativas (MEIRELLES, 1989, p. 34).

São eles:

agentes políticos  – Presidente da República, ministros de Estado, senado-

res, deputados, ministros de tribunais superiores, governadores, deputados

estaduais, desembargadores, secretários de Estado, prefeitos municipais,

vereadores, magistrados e secretários municipais, sempre que repre-

sentando a Administração Pública. O parágrafo 1.º, do artigo 1.º, da Lei

12.016/2009 legitimou na categoria de agente político os representantes

ou órgãos dos partidos políticos e os administradores de entidades autár-

quicas;

agentes administrativos  – servidor público e empregado público no exer-

cício de suas atribuições;

particulares no exercício de atribuições delegadas pelo Poder Público  

– além dos concessionários, permissionários e autorizatários de serviços

públicos, são considerados autoridades para efeito de MS os dirigentes

de pessoas jurídicas ou de pessoas naturais no exercício de atribuições do

poder público, somente no que disser respeito a essas atribuições, conso-

ante dicção do artigo 1.º, parágrafo 1.º, da Lei 12.016/2009.

E para não deixar dúvida, o parágrafo 3.º, do artigo 6.º da Lei 12.016/2009 diz

que considera-se autoridade coatora aquela que tenha praticado o ato impug-

nado ou da qual emane a ordem para a sua prática.

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Mandado de segurança coletivo II

187

Conceito de direito líquido e certoO controle jurisdicional dos atos administrativos por meio da ação de MS

coletivo, de forma idêntica ao individual, pressupõe, como requisito objetivo, a

demonstração pelo impetrante de seu direito líquido e certo, e, como requisitos

subjetivos, a existência de fundamento relevante e de perigo ao direito do impe-

trante, que a demora pode causar.

Direito líquido é o que se apresenta demonstrado, provado; não necessita ser

aclarado em dilação probatória; é o direito pronto. Certo é o direito bom, que não

desperta dúvida, que está isento de obscuridade. Antes, chamavam esses ele-

mentos de “direito certo e incontestável”. Di Pietro (1996, p. 510) denomina de

“direito comprovado de plano”.

Não demonstrados, com a inicial, tais elementos, a peça deve ser indeferida,caso em que, se ainda não houver transcorrido o prazo decadencial de 120 dias,

pode ser repetido o pedido.

Por óbvio que o preenchimento das condições objetivas para a propositura

da ação não vincula a decisão do julgador, pela discricionariedade que lhe é atri-

buída pela Constituição, desde que motive o seu pensar. Mas não só, ele deve

reconhecer que o ato impugnado, se não suspenso, pode resultar na ineficácia da

própria ação de MS.

É possível a autoridade apontada como coatora impetrar outro MS contra limi-

nar concedida em MS? Não, por dois motivos: a ação é dirigida contra ato ilegal de

agente público e este não tem legitimidade postulatória.

Por estar dotado de uma relação entre o Estado e o indivíduo, objetivando a

tutela jurisdicional para neutralizar o ato – e não uma relação de Direito Privado

para resolver uma questão entre particulares –, o MS coletivo não se afasta da

grande esfera do Processo Civil, embora seja uma ação constitucional.

Sendo assim, a capacidade ativa para impetração do MS coletivo está imbri-cada aos requisitos subjetivos do Código do Processo Civil (CPC), além das pecu-

liaridades da ação.

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Mandado de segurança coletivo II

Ponto forte da inicial do MS coletivoUm dos pontos fortes da peça de abertura do MS coletivo é, sem dúvida, a

parte da narrativa do fato ilegal ou praticado com abuso de poder . É indispensável

que se esclareçam os fatos para que não pairem dúvidas a respeito da delimitação

do que se está discutindo no processo.

Embora se aplique a máxima narra mihi factum dabo tibi ius, é recomendável

que o impetrante exponha suas razões de direito, de forma a convencer o magis-

trado de sua insurgência.

Vale ressaltar que é indispensável que a narrativa do fato ilegal ou praticado

com abuso de poder venha acompanhada dos documentos necessários a corro-

borar suas afirmativas. É o que se chama de prova pré-constituída ou inequívoca,

porquanto a via mandamental não admite espaço para qualquer atividade pro-batória. Se eventualmente for necessária a sua produção, o juiz indefere a inicial e

manda que o impetrante procure as vias ordinárias para buscar o seu direito.

Há de se distinguir a complexidade dos fatos e do tema de direito daquelas

situações que não prescindem da abertura da fase de instrução. Se o caso está

compreendido no campo da referida dificuldade, nem por isso o MS exsurge

como via imprópria, impondo-se o julgamento do mérito. Somente em se defron-

tando o órgão julgador com quadro a exigir elucidação de fatos, cabe dizer da

impertinência da medida, sinalizando no sentido do ingresso em juízo medianteação ordinária (NERY JUNIOR; NERY, 2003, p. 1.599).

É necessário provar que pode haver matéria controvertida de direito; o que

não pode haver é a controvérsia da matéria fática, exceção: requisição a pedido

da parte ou de ofício pelo juiz de documentos essenciais ao julgamento que se

encontram em poder da autoridade coatora, aos quais o impetrante não teve

acesso, como se fora um pedido incidental de exibição de documentos (Lei

12.016/2009, art. 6.º, § 1.º).

A petição inicial, no que couber, também deverá preencher os requisitos

essenciais elencados pelo CPC, especialmente observando se quem praticou o

ato possui prerrogativa de foro, sob pena de extinção da peça de plano. Outros-

sim, diferente do habeas corpus, em que o próprio paciente pode impetrá-lo em

nome próprio, o MS, tanto o individual como o coletivo, exige a representação de

advogado regularmente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

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Mandado de segurança coletivo II

189

Entretanto, além da narrativa do fato ilegal ou praticado com abuso de poder,

o MS coletivo, dependendo de quem seja o seu autor, deve preencher os requisi-

tos fixados no artigo 21, da Lei 12.016/2009.

Assim, se o impetrante for partido político deverá ter representação no Con-

gresso Nacional e sua legitimidade estará vinculada à defesa de seus interesseslegítimos relativos a seus integrantes ou à finalidade partidária.

Mas se o impetrante for organização sindical, entidade de classe ou associação

legalmente constituída e em funcionamento há, pelo menos, 1 (um) ano, a legi-

timidade se vinculará à defesa de direitos líquidos e certos da totalidade, ou de

parte, dos seus membros ou associados, na forma dos seus estatutos e desde que

pertinentes às suas finalidades, dispensada, para tanto, autorização especial.

Veja-se que num primeiro momento, o legislador postou os partidos políticose, noutro, a organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente

constituída e em funcionamento há mais de um ano. Quanto a estas, só podem

agir desde que em defesa de seus membros ou associados. Quanto àqueles, Di

Pietro (1996, p. 521-522) bem os definiu, consoante artigo 1.º da Lei 9.096/95:

Art. 1.º O partido político, pessoa jurídica de direito privado, destina-se a assegurar, no interessedo regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e a defender os direitos fun-damentais definidos na Constituição Federal.

Com base nesse dispositivo, que define os objetivos dos partidos políticos,Lúcia Valle Figueiredo concluiu, com razão, que “tudo que atina aos direitos huma-

nos fundamentais, autenticidade do sistema representativo pode ser objeto de

MS coletivo”. E cita vários exemplos extraídos da Constituição Federal: o desres-

peito ao artigo 5.º, XLIX, que assegura ao preso o respeito à integridade física e

moral; o descumprimento do artigo 58, parágrafo 4.º, que exige, durante o recesso

parlamentar, a presença de comissão representativa no Congresso Nacional com

composição proporcional, tanto quanto possível; discriminações entre brasilei-

ros natos e naturalizados em hipóteses não previstas na Constituição; prática do

racismo.

A diferença entre ambas as entidades é que os sindicatos têm interesse mais

restrito, pela própria natureza de sua existência.

A Lei 12.016/2009, no seu artigo 4.º, caput  estabeleceu que em caso de urgên-

cia, será permitido, desde que observados os requisitos legais, se impetrar MS

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Mandado de segurança coletivo II

coletivo por telegrama, radiograma, fax ou outro meio eletrônico de autentici-

dade comprovada. Nesta última situação deverá ser observado o que dispõe o

ICP-Brasil (Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira), conforme prescrição do

parágrafo 3.º do mencionado artigo.

A excepcionalidade admitida para a interposição do MS coletivo, por essa forma,condiciona que o texto original da petição seja apresentado nos 5 (cinco) dias úteis

seguintes, conforme determinação expressa do parágrafo 2.º da Lei citada.

Novidade imposta pelo artigo 6.º da Lei 12.016/2009 é a de que a petição ini-

cial do MS coletivo, além de preencher os requisitos estabelecidos pela Lei pro-

cessual, como já referido, será apresentada em 2 (duas) vias com os documentos

que instruírem a primeira reproduzidos na segunda e indicará, além da autori-

dade coatora, a pessoa jurídica que esta integra, à qual se acha vinculada ou da

qual exerce atribuições. Essa é uma das grandes novidades que será analisada emtópico próprio.

Ademais, segundo parágrafo 1.º do mesmo artigo 6.º, no caso em que o docu-

mento necessário à prova do alegado se ache em repartição ou estabelecimento

público ou em poder de autoridade que se recuse a fornecê-lo por certidão ou de

terceiro, o juiz ordenará, preliminarmente, por ofício, a exibição desse documento

em original ou em cópia autêntica e marcará, para o cumprimento da ordem, o

prazo de 10 (dez) dias. Atendida a determinação judicial, o escrivão extrairá cópias

do documento para juntá-las à segunda via da petição.

Por fim, ainda realçando a inicial do MS coletivo, diz o também artigo 6.º, pará-

grafo 2.º que, se a autoridade que tiver procedido dessa maneira for a própria

coatora, a ordem far-se-á no próprio instrumento da notificação.

Decisão judicial liminar

Ao despachar a inicial do MS coletivo, o magistrado determinará: (I) que se noti-fique o coator do conteúdo da petição inicial, enviando-lhe a segunda via apre-

sentada com as cópias dos documentos, a fim de que, no prazo de 10 (dez) dias,

preste as informações; (II) que se dê ciência do feito ao órgão de representação

 judicial da pessoa jurídica interessada, enviando-lhe cópia da inicial sem docu-

mentos, para que, querendo, ingresse no feito, consoante disposição expressa do

artigo 7.º, I e II, da Lei 12.016/2009.

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Mandado de segurança coletivo II

191

Diferentemente do que ocorre com o MS individual, o magistrado não ana-

lisará o pedido de liminar do autor nesta oportunidade. Isso porque, conforme

o parágrafo 2.º, do artigo 22, da Lei referida, a liminar só poderá se analisada e

concedida após a audiência do representante judicial da pessoa jurídica de direito

público, que deverá se pronunciar no prazo de 72 (setenta e duas) horas.

Conceder a liminar

Tal hipótese ocorre quando provado o direito líquido e certo pelo impetrante.

Mas não só isso, deve haver uma necessidade desse direito ser protegido imedia-

tamente, de modo que a espera pelo seu deferimento final possa ocasionar dano

irreparável ou de difícil reparação ao impetrante.

A grande novidade introduzida pelo artigo 7.º, III, da Lei 12.016/2009 é a deque ficou facultado ao juiz exigir do impetrante caução, fiança ou depósito, com o

objetivo de assegurar o ressarcimento à pessoa jurídica. Embora esse dispositivo

seja mais um daqueles que a nova lei criou para nitidamente proteger a Adminis-

tração Pública, tenho que, ficando caracterizada a existência de direito líquido e

certo do impetrante, tal exigência será não razoável.

Tornando expressa uma situação que já era admitida na doutrina e na jurispru-

dência por aplicação do princípio da preclusão o parágrafo 3.º do artigo 7.º da Lei

12.016/2009 estabeleceu que os efeitos da medida liminar, salvo se revogada oucassada, persistirão até a prolação da sentença.

E, como forma de preocupação com a Administração Pública, o parágrafo 4.º

do mesmo dispositivo citado afirmou que, se deferida a medida liminar, o pro-

cesso terá prioridade para julgamento.

Mas, segundo o artigo 8.º da Lei em referência, será decretada a perempção ou

caducidade da medida liminar ex officio ou a requerimento do Ministério Público

(MP) quando, concedida a medida, o impetrante criar obstáculo ao normal anda-

mento do processo ou deixar de promover, por mais de 3 (três) dias úteis, os atose as diligências que lhe cumprirem.

E, por fim, ainda como consequência do deferimento liminar do MS coletivo,

consoante o artigo 9.º da Lei 12.016/2009, as autoridades administrativas, no

prazo de 48 (quarenta e oito) horas da notificação da medida liminar, remeterão

ao Ministério ou órgão a que se acham subordinadas e ao Advogado-Geral da

União ou a quem tiver a representação judicial da União, do Estado, do Município

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Mandado de segurança coletivo II

ou da entidade apontada como coatora, cópia autenticada do mandado notifi-

catório, assim como indicações e elementos outros necessários às providências a

serem tomadas para a eventual suspensão da medida e defesa do ato apontado

como ilegal ou abusivo de poder.

Negar a liminar

O juiz poderá entender que não há urgência no deferimento da medida e

assim denegará a liminar.

No entanto, mesmo que seja caso de cabimento de liminar esta não poderá

ser concedida por força de proibição expressa do parágrafo 2.º, do artigo 7.º da

Lei 12.016/2009 quando tenha por objeto a compensação de créditos tributários,

a entrega de mercadorias e bens provenientes do exterior, a reclassificação ou

equiparação de servidores públicos e a concessão de aumento ou a extensão de

vantagens ou pagamento de qualquer natureza. Aliás, aproveitando indevida-

mente o veículo processual específico, o legislador ampliou essa proibição para

as outras ações de controles quando determinou, no parágrafo 5.º, do artigo 7.º,

da referida Lei, que as vedações relacionadas com a concessão de liminares pre-

vistas no artigo se estenderiam à tutela antecipada a que se referem os artigos

273 e 461 do CPC.

Extinguir o processoA inicial será desde logo indeferida e o processo extinto, por decisão moti-

vada, quando não for o caso de MS coletivo ou lhe faltar algum dos requisitos

legais ou quando decorrido o prazo legal para a impetração.

Além desses casos específicos de extinção do MS coletivo sem julgamento do

mérito também ele será denegado nos casos previstos pelo artigo 267 do CPC.

Em qualquer dessas situações, novo pedido de MS coletivo poderá ser reno-

vado dentro do prazo decadencial, consoante previsão expressa do parágrafo 6.º

do artigo 6.º da Lei 12.016/2009.

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Mandado de segurança coletivo II

193

Recursos da decisão judicial liminarSuprindo uma lacuna legislativa e espancando uma dúvida tormentosa na

doutrina e na jurisprudência, o parágrafo 1.º, do artigo 7.º da Lei 12.016/2009,

de forma incisiva disse que da decisão do juiz de primeiro grau que conceder

ou denegar a liminar caberá agravo de instrumento, observado o disposto na Lei

5.869, de 11 de janeiro de 1973, CPC. O entendimento anterior era de que não

cabia esse tipo de recurso.

E a lei, excepcionando o princípio da unicidade recursal, ainda estabeleceu

no seu artigo 15, que, a requerimento de pessoa jurídica de direito público inte-

ressada ou do MP e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à

economia públicas, o presidente do tribunal ao qual couber o conhecimento do

respectivo recurso poderá suspender, em decisão fundamentada, a execução da

liminar e da sentença, cabendo dessa decisão agravo, sem efeito suspensivo, noprazo de 5 (cinco) dias, que será levado a julgamento na sessão seguinte à sua

interposição.

E, se indeferido o pedido de suspensão ou provido o agravo a que se refere o

caput  deste artigo, caberá novo pedido de suspensão ao presidente do tribunal

competente para conhecer de eventual recurso especial ou extraordinário.

De forma pragmática e quebrando o equilíbrio de partes no processo, o legis-

lador ainda determinou no parágrafo 2.º do referido artigo 7.º da Lei 12.016/2009

que será cabível também o pedido de suspensão quando negado provimento ao

agravo de instrumento interposto contra a liminar.

E, para não deixar dúvida, o parágrafo 3.º do mesmo artigo ainda afirmou que

a interposição de agravo de instrumento contra liminar concedida nas ações

movidas contra o poder público e seus agentes não prejudica nem condiciona o

 julgamento do pedido de suspensão.

Ainda de forma inovadora, segundo o parágrafo 4.º do artigo em comento,

o presidente do tribunal poderá conferir ao pedido efeito suspensivo liminar seconstatar, em juízo prévio, a plausibilidade do direito invocado e a urgência na

concessão da medida.

E, por fim, utilizando-se do princípio da repercussão geral, o parágrafo 5.º do

referido artigo afirmou que as liminares, cujo objeto seja idêntico, poderão ser

suspensas em uma única decisão, podendo o presidente do tribunal estender os

efeitos da suspensão a liminares supervenientes, mediante simples aditamento

do pedido original.

8/11/2019 AÇÕES CONSTITUCIONAIS (1)

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Mandado de segurança coletivo II

Providências cartoráriasEmbora as providências cartorárias tenham previsão no CPC, o artigo 11 da

Lei 12.016/2009 tratou de regrar de forma específica quando disse que, feitas as

notificações, o serventuário, em cujo cartório corra o feito, juntará aos autos cópia

autêntica dos ofícios endereçados ao coator e ao órgão de representação judicial

da pessoa jurídica interessada, bem como a prova da entrega a estes ou da sua

recusa em aceitá-los ou dar recibo e, no caso do artigo 4.º da Lei (impetração de

MS por telegrama, radiograma, fax ou outro meio eletrônico), a comprovação da

remessa.

A Lei também impôs determinação ao serventuário responsável quando afir-

mou que, não havendo manifestação do MP no prazo de 10 (dez) dias, diligências

deverão ser praticadas para que os autos do processo sejam conclusos ao juiz,

para a decisão, a qual deverá ser necessariamente proferida em 30 (trinta) dias,

conforme se observa no parágrafo único do artigo 12 da referida Lei.

Resposta da autoridade coatora e do ente públicoComo já se pode observar, ao despachar a inicial, o juiz determinará que a

autoridade coatora deverá ser notificada para que em 10 (dez) dias preste infor-

mações.

Relevante e pertinente é que agora, por força da Lei 12.016/2009, a pessoa

 jurídica a que a autoridade coatora integra e se encontra vinculada ou a qual

exerce atribuições, também deverá ser cientificada. Portanto, diferentemente do

prazo para a manifestação da autoridade coatora, o ente público terá apenas 72

(setenta e duas) horas. Aqui não se aplica o prazo excepcional do artigo 188 do

Código de Processo Penal.

Presença obrigatóriado Ministério Público

A presença do MP na ação de segurança coletiva, como fiscal da lei, assim

como em certas ações, é indispensável e imprescindível, mormente quando o

interesse público é relevante, sob pena de nulidade do processo.

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Mandado de segurança coletivo II

195

Cumpre registrar que não basta a simples intimação do agente ministerial para

que seja suprida a formalidade. É imperioso que haja sua manifestação, abordando

a questão de fundo, em que pese a existência de posicionamento contrário.

A questão da obrigatoriedade de sua presença nessa via é pacífica no STJ:

MANDADO DE SEGURANÇA. MANIFESTAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. OBRIGATORIEDADE.OBSERVÂNCIA DO PRAZO DO ART. 10, DA LEI 1.533/51. DISPENSABILIDADE. PRECEDENTES DACORTE ESPECIAL DESTE STJ.

– Havendo evidente interesse público, a intervenção do órgão do Ministério Público Federal,oficiando como fiscal da lei, é necessária e obrigatória, não se o podendo submeter ao prazo doart. 10, da Lei 1.533/51, sob pena de nulidade do processo.

– Recurso conhecido e provido. (STJ, REsp. 88.471, 2.ª Turma, Rel. Min. Peçanha Martins, j.06/04/1999).

PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. INDICAÇÃO ERRÔNEA DO IMPETRADO. INFOR-MAÇÕES PRESTADAS PELA AUTORIDADE COATORA. SUPRIMENTO DA ILEGITIMIDADE. MANI-FESTAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. OBRIGATORIEDADE. PARECER DO PARQUET  DISPENSANDOA NECESSIDADE DE PRONUNCIAMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE COAGIR O ÓRGÃO A MANIFES-TAR-SE. AUSÊNCIA DE NULIDADE.

1. Em sede de mandado de segurança, deve haver o efetivo pronunciamento do MinistérioPúblico não sendo suficiente a sua intimação, sob pena de nulidade. (ERESP 2.6715 / AM ; Rel.Min. Paulo Costa Leite, Corte Especial, DJ 12/02/2001; ERESP 24.234 / AM; Rel. Min. HumbertoGomes de Barros, Corte Especial, DJ 11/03/1996; ERESP 9.271 / AM, Rel. Min. Antônio de PáduaRibeiro, Corte Especial, DJ de 05/02/1996).

2. Considera-se efetivo o pronunciamento se o Ministério Público, abordando a questão defundo, entende que, por força da substância do mesmo, não deve atuar como custos legis.

3. In casu, o douto representante do Parquet  devidamente intimado da sentença afirmou serdesnecessária a sua manifestação. Consectariamente, ausente a nulidade processual haja vista

que o Ministério Público teve a oportunidade de se manifestar e não o fez, à luz da exegese doart. 10, da Lei 1.533/51.

4. A imposição de atuação do membro do Parquet , quanto a matéria versada nos autos, infringi-ria os princípios da independência e autonomia do órgão ministerial.

5. Deveras, a suposta nulidade somente pode ser decretada se comprovado o prejuízo para osfins de justiça do processo, em razão do princípio de que “não há nulidade sem prejuízo” ( “pasde nullité sans grief ”).

6. A indicação errônea da autoridade coatora resta suprida em tendo esta, espontaneamente,prestado as informações confirmando a sua legitimidade passiva.

7. Recurso especial desprovido. (STJ, REsp. 541.199/MG, Rel. Ministro Luiz Fux, 1.ª Turma, julgadoem 08/06/2004, DJ 28/06/2004).

Pode ocorrer que, junto à sua condição de fiscal, o MP exercite a sua condição

de representante da pessoa jurídica de Direito Público interessada no ato impug-

nado, podendo recorrer da decisão.

O prazo de manifestação do MP será de 10 (dez) dias, conforme dicção do

artigo 12 da Lei 12.016/2009.

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Mandado de segurança coletivo II

197

De grande importância quando se trata de MS coletivo, é que a sentença fará

coisa julgada limitadamente aos membros do grupo ou categoria substituídos

pelo impetrante, consoante disposição expressa do artigo 22 da Lei 12.016/2009.

E por fim, como comando especial, o parágrafo 1.º do mesmo artigo citado

afirma que o MS coletivo não induz litispendência para as ações individuais, masos efeitos da coisa julgada não beneficiarão o impetrante a título individual se não

requerer a desistência de seu MS no prazo de 30 (trinta) dias a contar da ciência

comprovada da impetração da segurança coletiva.

Negar a segurança

Nessa ocasião, deve ele declarar a legalidade do ato atacado. Caso haja liminar

concessiva inicial, deve ser revogada nesse ato. O recurso de apelação interpostodessa decisão deve ser recebido em ambos os efeitos.

Não condenarao pagamento de honorários

Sempre foi uma manifestação acesa na doutrina o cabimento ou não de hono-

rários em MS, embora a jurisprudência tenha se pacificado a respeito de seu não

cabimento através da Súmula 512 do Supremo Tribunal Federal e 105 do SuperiorTribunal de Justiça.

Com a Lei 12.016/2009 a matéria ficou superada, porquanto o seu artigo 25

expressamente afastou a fixação de tal sucumbência, embora tivesse ressalvado a

possibilidade de aplicação de sanções no caso de litigância de má-fé.

Condenar ao pagamento

das custas do processo

Na ação mandamental, cabe condenação ao pagamento das custas processu-

ais, suspensas, caso a parte litigue sob o manto da gratuidade judiciária.

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Mandado de segurança coletivo II

Recursos cabíveis da sentençaProferida a sentença, denegando ou concedendo a segurança, cabe apelação,

nos termos do artigo 14 da Lei 12.016/2009.

Todavia, se concedida a segurança, a sentença estará sujeita obrigatoriamente

ao duplo grau de jurisdição.

Como já foi dito, de forma inovadora, foi estendida à autoridade coatora o

direito de recorrer, como expressamente autoriza o parágrafo 2.º do artigo 14 da

nova Lei.

Ocorre que, embora a sentença esteja submetida ao apelo em qualquer caso

e ao duplo grau de jurisdição, no caso de concessão da segurança, poderá ainda,

nesta última situação, vir a sofrer o recurso excepcional ao presidente do tribunalnos mesmos moldes da concessão da liminar, conforme expressa determinação

do artigo 15 e seus parágrafos da Lei 12.016/2009.

Mas não cabem embargos infringentes, consoante disposição expressa do

artigo 25 da referida Lei.

A Lei 12.016/2009 ainda estabeleceu regramentos específicos da seguinte

forma:

Nos casos de competência originária dos tribunais, caberá ao relator a ins-

trução do processo, sendo assegurada a defesa oral na sessão do julga-

mento – artigo 16.

Da decisão do relator que conceder ou denegar a medida liminar caberá

agravo ao órgão competente do tribunal que integre – parágrafo único do

artigo 16.

Nas decisões proferidas em MS e nos respectivos recursos, quando não

publicado, no prazo de 30 (trinta) dias, contado da data do julgamento, oacórdão será substituído pelas respectivas notas taquigráficas, indepen-

dentemente de revisão – artigo 17.

Das decisões em MS proferidas em única instância pelos tribunais cabe

recurso especial e extraordinário, nos casos legalmente previstos, e recurso

ordinário, quando a ordem for denegada – artigo 18.

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Mandado de segurança coletivo II

199

A sentença ou o acórdão que denegar MS, sem decidir o mérito, não impe-

dirá que o requerente, por ação própria, pleiteie os seus direitos e os res-

pectivos efeitos patrimoniais – artigo 19.

Os processos de MS e os respectivos recursos terão prioridade sobre todos

os atos judiciais, salvo habeas corpus – artigo 20.

Na instância superior, deverão ser levados a julgamento na primeira sessão

que se seguir à data em que forem conclusos ao relator – parágrafo 1.º do

artigo 20.

O prazo para a conclusão dos autos não poderá exceder 5 (cinco) dias –

parágrafo 2.º do artigo 20.

Aplicam-se ao MS coletivo toda a matéria disposta no CPC sobre litisconsór-

cio e assistência – artigo 24.Constitui crime de desobediência, nos termos do artigo 330 do Decreto-Lei

2.848, de 7 de dezembro de 1940, o não cumprimento das decisões proferi-

das em MS, sem prejuízo das sanções administrativas e da aplicação da Lei

1.079, de 10 de abril de 1950, quando cabíveis – artigo. 26.

ConclusãoA ação de MS coletivo tem estruturas processuais específicas adaptadas à sua

própria celeridade.

Ampliando seus conhecimentos

Código de Processo Civil Comentado: legislação processual civil e extravagante,de Nelson Nery Junior, editora Revista dos Tribunais.

Considerações sobre o controle jurisdicional de urgência na ação de mandado de

segurança, de Wellington Pacheco Barros, v. 26, n. 76, editora Ajuris.

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Roberto de Almeida Borges Gomes

Princípios constitucionaisda Administração Pública

Para introduzirmos o estudo da improbidade administrativa, é conve-

niente lembrarmos que a defesa da moralidade administrativa possui status

constitucional, sendo elevada a princípio da Administração Pública (CF, art.37):

Art. 37. A Administração Pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dosEstados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade,impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência [...].

Ademais, o próprio texto constitucional prevê expressamente que os atos

atentatórios à moralidade administrativa deverão ser punidos na forma da

lei, estabelecendo, inclusive, as espécies de sanções cabíveis:

Art. 37. [...]

§4.º Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos,a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, naforma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.

Estudo da Lei 8.429/92

Sujeito passivoA doutrina classifica o sujeito passivo do ato ímprobo em próprio e impró-

prio.

São sujeitos passivos próprios  da improbidade administrativa as pessoas

 jurídicas que sofrem as consequências do ato ímprobo, elencadas no artigo

1.º da Lei de Improbidade Administrativa (LIA), quais sejam: a Administração

Ação de improbidade administrativa

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Ação de improbidade administrativa

203

abertas, descrevendo no caput  dos artigos um “gênero” de ato de improbidade, e

elencando nos incisos um rol não exaustivo de espécies de condutas ímprobas.

O artigo 9.º da LIA traz os atos de improbidade que importam enriquecimento ilí-

cito, estatuindo que o ato que vise auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial

indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividadenas entidades arroladas em seu artigo 1.º, constitui-se ato de improbidade. Os

incisos que seguem o caput  trazem uma enumeração não taxativa de práticas que

caracterizam improbidade administrativa. Essa modalidade é a mais grave vio-

lação à moralidade administrativa, tanto que o legislador a pune de forma mais

gravosa (LIA, art. 12, I).

Nesse passo, é oportuna a lição de Waldo Fazzio Júnior (2001, p. 68):

Receber vantagem patrimonial indevida é auferir qualquer modalidade de prestação, positiva

ou negativa, comissiva ou omissiva, direta ou indireta, não respaldada em lei. É ganhar patrimô-nio sem causa justa, ou, em outras palavras, distrair valores para infringir lei ou para facilitar queoutrem o faça.

É importante frisar que essa vantagem patrimonial deve estar relacionada ao

exercício de cargo ou função pública.

Para a configuração da improbidade administrativa por enriquecimento ilícito

não se exige a lesividade, o dano efetivo ao patrimônio público, pois a vantagem

indevida pode vir de fonte particular, não lesando o erário, tanto que o artigo 21

prevê, expressamente, que a aplicação das sanções trazidas na LIA independemda efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público.

O que é imprescindível para a caracterização dessa espécie de improbidade é:

a efetiva vantagem patrimonial do agente;

que essa vantagem tenha origem ilegal/ilícita;

que o ato ilegal/ilícito tenha sido praticado em virtude de cargo ou função

pública.

A hipótese do artigo 9.º só é possível na modalidade de conduta dolosa, comis-

siva ou omissiva. Resta claro, pela leitura do artigo em tela, a vedação à hipótese

culposa nos atos ofensivos a princípios. Não há que se falar que a ausência de

previsão normativa referente à culpa poderia ensejar uma “integração” pelo apli-

cador do direito, de modo a ampliar a conduta para a modalidade culposa, pois

estamos na seara de direito sancionatório, razão pela qual se subordina à legali-

dade estrita.

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Ação de improbidade administrativa

Estão previstos no artigo 10 da Lei 8.429/92 os atos de improbidade que

causam prejuízo ao erário, sendo assim considerada qualquer ação ou omissão,

dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbarata-

mento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas em seu artigo

1.º. Novamente, o caput  é complementado por 15 incisos que trazem exemplos

de atos dessa natureza.

Para a caracterização do ato de improbidade que gera prejuízo ao erário, enten-

dido como a modalidade de gravidade intermediária, admite-se a conduta dolosa

ou culposa, comissiva ou omissiva. Como lembra Carlos Frederico Brito dos Santos

(2002, p. 2), “esta é a única modalidade de ato de improbidade administrativa que

prevê a conduta culposa como nexo subjetivo necessário à sua caracterização”.

Essa hipótese exige, para sua configuração, a ocorrência de efetiva perda pa-

trimonial ao erário. A doutrina critica a utilização dessa expressão, entendendoque melhor seria o emprego de dano ou lesão ao  patrimônio público, vocábu-

los que possibilitariam a responsabilização do agente no caso de dano moral. À

falta de expressão unívoca, a doutrina diverge, entendendo alguns autores que

não há previsão de dano moral na LIA, enquanto outros pensam ser possível

falar-se em dano moral no âmbito dessa lei.

A interpretação que se compatibiliza com a ideia do dano moral na LIA decorre

da conjugação do artigo 5.º com o artigo 21 da referida lei.

Wallace Paiva Martins Júnior (2002, p. 313), ao tratar sobre o tema, leciona: “o

ressarcimento do dano deverá ser integral, ou seja, abrangerá tudo aquilo que

representa a expressão do dano (o prejuízo efetivo e as perdas e danos decorren-

tes da conduta), prendendo-se à noção de restitutio in integrum”.1

Nos termos do artigo 11 da LIA, constitui ato de improbidade administrativa

que atenta contra os princípios da Administração Pública qualquer ação ou omis-

são que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às

instituições. O artigo possui sete incisos, exemplificando condutas que caracteri-

zam improbidade por violação aos princípios da Administração Pública. A ofensa

pode ser a princípio explícita ou implícita, ainda que não mencionado no caput  

do artigo (p. ex., princípio da eficiência).

1 No mesmo sentido, Marcelo Figueiredo (2005); Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves (2004); Frederico Silveira e Silva(2005).

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Ação de improbidade administrativa

205

Cabem aqui as mesmas considerações tecidas a respeito da previsão exclusiva

de que a conduta seja dolosa, tal como nos posicionamos ao tratar do artigo 9.º.

O dispositivo em comento é reforçado pelo artigo 4.º da LIA, ao estabelecer

o dever dos agentes públicos de velar pela estrita observância dos princípios da

legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos quelhes são afetos.

Sanções

As sanções atribuídas aos atos de improbidade administrativa estão discipli-

nadas no artigo 12 da LIA, sendo aplicáveis independentemente das demais san-

ções penais, civis e administrativas, previstas na legislação específica.

Discute-se, doutrinariamente, se as espécies de sanções previstas nos três inci-sos do artigo em análise devem ser obrigatoriamente cumuladas, ou se podem

ser aplicadas isoladamente, de forma mitigada.

A solução para a controvérsia, a nosso ver, fundamenta-se no  princípio da pro-

 porcionalidade, que impõe, no caso, a aplicação da(s) sanção(ões) cabível(is), a

partir da análise razoável feita pelo julgador no caso concreto, com fundamento,

inclusive, no parágrafo único do artigo 12, que estatui que o juiz levará em conta

a extensão do dano causado e o proveito patrimonial obtido pelo agente.

As sanções previstas nos incisos I, II e III do artigo 12 são aplicadas, respecti-vamente, às modalidades dispostas nos artigos 9.º, 10 e 11 da LIA, ressaltando-se

que o legislador preocupou-se em determinar o quanto disposto no artigo 37,

parágrafo 4.º, da Constituição Federal (CF), estabelecendo as sanções de suspen-

são dos direitos políticos, perda da função pública, indisponibilidade dos bens, e

acresceu a multa e a proibição de contratar com o Poder Público ou receber bene-

fícios ou incentivos fiscais ou creditícios. Nas sanções de suspensão dos direitos

políticos e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou

incentivos fiscais ou creditícios, o legislador fixou períodos distintos, levando em

consideração a gravidade de cada conduta, conforme se depreende dos incisos

do artigo 12.

Salienta-se que, embora o artigo 37, parágrafo 4.º, da CF determine como

uma das respostas à improbidade administrativa o ressarcimento ao erário, e

figurando o mesmo nas hipóteses dos incisos do artigo 12, excluímos ele da con-

dição de sanção administrativo-civil, para indicá-lo como hipótese meramente

reparatória e não sancionatória.

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Ação de improbidade administrativa

Aspectos processuais

Fase pré-processual

A Lei 8.429/92 prevê uma fase pré-processual, consistente na possibilidade deinstauração de um procedimento administrativo, instaurado via representação

feita por qualquer pessoa do povo à autoridade administrativa competente para

apuração do ato (LIA, art. 14).

O artigo referido estabelece requisitos formais para a representação, quais

sejam, a forma escrita ou redução a termo, com a exigência de assinatura, qualifi-

cação do representante, informações sobre o fato e suposta autoria, com a indica-

ção de elementos probatórios para a apuração do fato.

A ausência desses requisitos pode ensejar o indeferimento da representação,ressaltando-se que a rejeição não impede o endereçamento de idêntica peça ao

Ministério Público (MP).

A representação, estando devidamente formalizada, será processada no rito

procedimental estabelecido pelas legislações estaduais que tratam do pro-

cesso administrativo, e, na esfera federal, na forma dos artigos 148 a 182 da Lei

8.112/90. Salienta-se que, em se tratando de servidor militar, será adotado o pro-

cedimento dos regulamentos disciplinares pertinentes.

A Lei 8.429/92, no artigo 15, prevê a informação ao MP e ao Tribunal de Contas

do procedimento instaurado, com a finalidade de que o órgão, querendo, designe

representante para acompanhar o procedimento. Cumpre ressaltar que o repre-

sentante terá uma atuação ativa na investigação, podendo participar de atos, fazer

requerimentos, não sendo mero figurante para o cumprimento de formalidade.

É importante lembrar que, tratando-se de investigação realizada pelo MP para

apuração de ato de improbidade administrativa, esta será feita por meio de inqué-

rito civil, procedimento administrativo presidido por membro do MP, prerrogativa

exclusiva do órgão em questão, definida no artigo 129, III, da CF. O inquérito civil énormatizado na Lei 7.347/85, bem como na Lei 8.625/93 e Lei Complementar (LC)

75/93, sendo plenamente aplicável à fase pré-processual da LIA.

Para apurar as condutas previstas na Lei 8.429/92, o MP, de ofício, a requeri-

mento de autoridade administrativa ou mediante representação, poderá requi-

sitar a instauração de inquérito policial ou procedimento administrativo (LIA,

art. 22).

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Ação de improbidade administrativa

207

Processo cautelar

Na fase judicial, é possível um provimento de natureza acautelatória: o seques-

tro dos bens do investigado, processado de acordo com os artigos 822 e 825 doCódigo de Processo Civil (CPC), podendo-se incluir nesse pedido a investigação, o

exame e o bloqueio de bens, contas bancárias e aplicações financeiras mantidaspelo indiciado no exterior, nos termos da lei e dos tratados internacionais (LIA,art. 16, §§ 1.º e 2.º).

Cabe salientar que a cautelar de sequestro de bens, embora procedimento

 judicial, pode ser requerida na fase pré-processual, pelo MP ou pela procurado-ria do órgão investigante, conforme dispõe o artigo 16. O artigo 7.º, ao tratar daindisponibilidade de bens, determina que a autoridade administrativa represente

o MP para a adoção dessa medida.

A medida cautelar de sequestro pode recair sobre os bens do agente público,bem como de terceiro que tenha enriquecido ilicitamente ou causado dano aopatrimônio público.

A LIA prevê, ainda, a possibilidade de afastamento acautelatório do agente

ímprobo na fase judicial ou pré-processual, tendo competência para determi-nar tal medida tanto a autoridade judicial (na fase judicial) quanto a autoridadeadministrativa (durante a fase administrativa), nos termos do artigo 20, parágrafo

único.

Questão relevante é a incidência de tal artigo para o caso de detentores decargos eletivos, havendo divergência quanto a esse fato. Os que entendem a pos-sibilidade de emprego de tal artigo para todos os que exercem qualquer ativi-

dade administrativa fazem a leitura de que a lei não traça qualquer distinção. Deoutro modo, pensando de forma diversa, há os que defendem a inaplicabilidadedo artigo aos que detêm cargo eletivo, fundamentando sua argumentação no

parágrafo único do artigo 20, que apontaria uma restrição do legislador no elencode sujeitos submetidos ao afastamento cautelar, reduzindo-os aos que ocupamcargo, emprego ou função. Estes fazem uma leitura do termo “função” de forma

extremamente restrita.

Podemos ainda relacionar como possibilidade acautelatória a estabelecida noartigo 7.º da LIA, que disciplina a indisponibilidade de bens do indiciado apósrequerimento do MP ao Judiciário, em decorrência de atuação de ofício ou por

representação da autoridade administrativa responsável pela investigação.

Resta claro, no artigo em questão, que a legitimidade para o pedido referidoé exclusiva do MP. Note-se, ainda, com base no parágrafo único do artigo 7.º,

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Ação de improbidade administrativa

que a indisponibilidade pode recair sobre a quantidade necessária do bem para

assegurar o ressarcimento integral do dano.

É imperioso salientar que as cautelares tipificadas na LIA não excluem outras

possibilidades acautelatórias decorrentes do sistema processual brasileiro.

A ação de improbidade

A ação de improbidade é concebida doutrinariamente como espécie de ação

civil pública (ACP), embora a LIA a identifique como se submetendo ao rito ordi-

nário (art. 17), observadas as alterações introduzidas pela Medida Provisória (MP)

2225-45, de 4 de setembro de 2001. Existem posições doutrinárias que identi-

ficam o rito como sendo especial após as alterações estabelecidas pela MP em

questão.

Estabelece o artigo 17 da LIA que a legitimidade para a ação principal é do MP

ou da pessoa jurídica interessada, que deverá propô-la 30 dias após a efetivação

da medida acautelatória. Se o MP não intervier como parte, deverá atuar como

custos legis, sob pena de nulidade (LIA, art. 17, §4.º).

O artigo 17, parágrafo 6.º, determina que a inicial seja instruída com docu-

mentos ou justificação que contenham indícios suficientes da existência do ato

de improbidade. Esse dispositivo é despiciendo, pois o artigo 283 do CPC já esta-

belece requisito idêntico. Parece-nos que a intenção legislativa era de inibir oslegitimados na deflagração das ações de improbidade, tentando estabelecer,

com a norma em questão, um óbice ao início da ação. Todavia, restou claro que o

intento não foi alcançado, já que tal requisito é da natureza do sistema processual

brasileiro.

A MP 2.225-45/2001 introduziu alteração na LIA, estabelecendo um juízo de

admissibilidade da ação de improbidade, exercido pelo magistrado. Este, verifi-

cando que a inicial está em devida forma, determinará a notificação do reque-

rido para se manifestar por escrito sobre ela, no prazo de 15 dias, podendo esteapresentar documentos e justificações (LIA, art. 17, §7.º). Idêntico procedimento

no Direito Processual brasileiro pode ser encontrado na esfera penal, a exemplo

do artigo 514 do Código de Processo Penal (CPP), o qual estabelece o rito para os

crimes praticados por servidores públicos.

Após a manifestação do requerido, o juiz decidirá, no prazo de 30 dias, se rejeita 

(caso convencido da inexistência do ato de improbidade, da improcedência da

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Ação de improbidade administrativa

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ação ou da inadequação da via eleita) ou recebe a inicial. Na hipótese de recebi-

mento, o julgador determinará a citação do réu para contestar a ação (LIA, art. 17,

§8.º). Da decisão que receber a petição inicial caberá agravo de instrumento (art.

17, §10).

Embora a LIA silencie quanto ao recurso cabível contra a decisão que nãorecebe a inicial, é forçoso reconhecer que dela cabe apelação, socorrendo-nos

do CPC, legislação suplementar da Lei 8.429/92.

A lei determina que a partir da contestação o procedimento se ordinariza.

O parágrafo 11 do artigo 17 parece-nos despiciendo, posto que é a permissão

para o magistrado extinguir o feito sem julgamento do mérito (hoje, seguindo-se

a alteração legislativa feita ao artigo 267 do CPC, substitui-se a expressão por “sem

resolução do mérito”), quando reconhecer a inadequação da ação de improbi-

dade. Esse poder, na realidade, decorre da própria atuação jurisdicional do magis-

trado, estando já estabelecido no sistema processual brasileiro a faculdade de

o juiz indeferir a inicial ou extinguir o processo sem resolução do mérito, pela

inadequação da via processual eleita. Essa é mais uma das medidas do pacote da

MP 2.225-45/2001, destinada a abrandar a LIA.

A Lei 8.429/92 veda a possibilidade de transação, acordo ou conciliação na

fase judicial (LIA, art. 17, §1.º). É evidente a necessidade de estender tal disposi-

tivo à fase pré-processual, pois a razão dele decorre da indisponibilidade do bem

em questão. Convém assinalar a forte tendência doutrinária em compreender a

possibilidade de ajuste de conduta quando diante de improbidade administrativa,

com a finalidade de previsão no instrumento transacional para ressarcimento ao

erário. Os defensores de tal tese não ousaram permitir o termo de ajustamento de

conduta para aplicação de sanções ou com finalidade de dispensa destas.

A LIA, em seu artigo 18, determina que a reparação do dano ou os bens per-

didos serão revertidos em favor da pessoa jurídica lesada, lembrando-se que

essa é uma das diferenças em relação à ACP, que dispõe o recolhimento da multa

imposta a fundo de direitos difusos e coletivos. A regra em tela da Lei 8.429/92parece-nos acertada, pois serve de proteção ao lesado e não se incompatibiliza

com a figura da Lei de ação civil pública (LACP), já que o fundo se destina também

ao lesado, que é a coletividade.

Estabelece o artigo 19 da LIA uma figura típica que pode ser chamada de

“denunciação caluniosa de ato de improbidade administrativa”. Ela prevê a

seguinte conduta delitiva:

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Ação de improbidade administrativa

Art. 19. Constitui crime a representação por ato de improbidade contra agente público ou ter-ceiro beneficiário quando o autor da denúncia o sabe inocente.

Pena: detenção de seis a dez meses e multa.

Parágrafo único. Além da sanção penal, o denunciante está sujeito a indenizar o denunciadopelos danos materiais, morais ou à imagem que houver provocado.

Da prescrição

O artigo 23 da Lei 8.429/92 traz os prazos prescricionais para as ações de

improbidade administrativa, prevendo períodos distintos para os agentes públi-

cos detentores de mandato, cargo em comissão ou função de confiança (cinco

anos após o término do exercício de mandato, cargo em comissão ou função de

confiança) e para os detentores de cargo efetivo ou emprego (prazo previsto na

legislação específica para faltas disciplinares puníveis com demissão a bem doserviço público).

É importante observar que a ação de ressarcimento contra agente, servidor

ou não, que cause prejuízo ao erário é imprescritível , conforme estatui o artigo 37,

parágrafo 5.º, da CF.

Ampliando seus conhecimentos

Lei 8.429, de 2 de junho de 1992

CAPÍTULO I

Dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilí-cito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na Administração Pública direta,indireta ou fundacional e dá outras providências.

Das Disposições Gerais

Art. 1.º Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não,contra a Administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União,dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada aopatrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorridoou concorra com mais de cinquenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serãopunidos na forma desta lei.

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Ação de improbidade administrativa

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Parágrafo único. Estão também sujeitos às penalidades desta lei os atos de improbidadepraticados contra o patrimônio de entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo,fiscal ou creditício, de órgão público bem como daquelas para cuja criação ou custeio oerário haja concorrido ou concorra com menos de cinquenta por cento do patrimônio ouda receita anual, limitando-se, nestes casos, a sanção patrimonial à repercussão do ilícitosobre a contribuição dos cofres públicos.

Art. 2.º Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, aindaque transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contra-tação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego oufunção nas entidades mencionadas no artigo anterior.

Art. 3.º As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo nãosendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele sebeneficie sob qualquer forma direta ou indireta.

Art. 4.º Os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a velar pelaestrita observância dos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade

no trato dos assuntos que lhe são afetos.Art. 5.º Ocorrendo lesão ao patrimônio público por ação ou omissão, dolosa ou culposa, doagente ou de terceiro, dar-se-á o integral ressarcimento do dano.

Art. 6.º No caso de enriquecimento ilícito, perderá o agente público ou terceiro beneficiárioos bens ou valores acrescidos ao seu patrimônio.

Art. 7.º Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enri-quecimento ilícito, caberá à autoridade administrativa responsável pelo inquérito repre-sentar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos bens do indiciado.

Parágrafo único. A indisponibilidade a que se refere o caput  deste artigo recairá sobre bens

que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resul-tante do enriquecimento ilícito.

Art. 8.º O sucessor daquele que causar lesão ao patrimônio público ou se enriquecer ilicita-mente está sujeito às cominações desta lei até o limite do valor da herança.

CAPÍTULO II

Dos Atos de Improbidade Administrativa

Seção I

Dos Atos de Improbidade Administrativa que Importam Enriquecimento Ilícito

Art. 9.º Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícitoauferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo,mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1.º desta lei, enotadamente:

I - receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer outra van-tagem econômica, direta ou indireta, a título de comissão, percentagem, gratificação oupresente de quem tenha interesse, direto ou indireto, que possa ser atingido ou amparadopor ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público;

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Ação de improbidade administrativa

II - perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a aquisição, permuta oulocação de bem móvel ou imóvel, ou a contratação de serviços pelas entidades referidas noart. 1.º por preço superior ao valor de mercado;

III - perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a alienação, permuta oulocação de bem público ou o fornecimento de serviço por ente estatal por preço inferior ao

valor de mercado;IV - utilizar, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas, equipamentos ou materialde qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de qualquer das entidades mencio-nadas no art. 1.º desta lei, bem como o trabalho de servidores públicos, empregados outerceiros contratados por essas entidades;

V - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para tolerar aexploração ou a prática de jogos de azar, de lenocínio, de narcotráfico, de contrabando, deusura ou de qualquer outra atividade ilícita, ou aceitar promessa de tal vantagem;

VI - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para fazer decla-ração falsa sobre medição ou avaliação em obras públicas ou qualquer outro serviço, ousobre quantidade, peso, medida, qualidade ou característica de mercadorias ou bens for-necidos a qualquer das entidades mencionadas no art. 1.º desta lei;

VII - adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, cargo, emprego ou funçãopública, bens de qualquer natureza cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimô-nio ou à renda do agente público;

VIII - aceitar emprego, comissão ou exercer atividade de consultoria ou assessoramentopara pessoa física ou jurídica que tenha interesse suscetível de ser atingido ou amparadopor ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público, durante a atividade;

IX - perceber vantagem econômica para intermediar a liberação ou aplicação de verbapública de qualquer natureza;

X - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indiretamente, para omitirato de ofício, providência ou declaração a que esteja obrigado;

XI - incorporar, por qualquer forma, ao seu patrimônio bens, rendas, verbas ou valores inte-

grantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1.º desta lei;XII - usar, em proveito próprio, bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patri-monial das entidades mencionadas no art. 1.º desta lei.

Seção II

Dos Atos de Improbidade Administrativa que Causam Prejuízo ao Erário

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualqueração ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação,malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1.º

desta lei, e notadamente:

I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular,de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patri-monial das entidades mencionadas no art. 1.º desta lei;

II - permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada utilize bens, rendas,verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1ºdesta lei, sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espé-cie;

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Ação de improbidade administrativa

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III - doar à pessoa física ou jurídica bem como ao ente despersonalizado, ainda que de finseducativos ou assistências, bens, rendas, verbas ou valores do patrimônio de qualquer dasentidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem observância das formalidades legais eregulamentares aplicáveis à espécie;

IV - permitir ou facilitar a alienação, permuta ou locação de bem integrante do patrimônio

de qualquer das entidades referidas no art. 1.º desta lei, ou ainda a prestação de serviço porparte delas, por preço inferior ao de mercado;

V - permitir ou facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem ou serviço por preço supe-rior ao de mercado;

VI - realizar operação financeira sem observância das normas legais e regulamentares ouaceitar garantia insuficiente ou inidônea;

VII - conceder benefício administrativo ou fiscal sem a observância das formalidades legaisou regulamentares aplicáveis à espécie;

VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente;

IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento;

X - agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz res-

peito à conservação do patrimônio público;XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir dequalquer forma para a sua aplicação irregular;

XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente;

XIII - permitir que se utilize, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas, equipamen-tos ou material de qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de qualquer das enti-dades mencionadas no art. 1.º desta lei, bem como o trabalho de servidor público, empre-gados ou terceiros contratados por essas entidades;

XIV - celebrar contrato ou outro instrumento que tenha por objeto a prestação de serviçospúblicos por meio da gestão associada sem observar as formalidades previstas na lei; (Inclu-ído pela Lei 11.107, de 2005)

XV - celebrar contrato de rateio de consórcio público sem suficiente e prévia dotação orça-mentária, ou sem observar as formalidades previstas na lei. (Incluído pela Lei 11.107, de2005)

Seção III

Dos Atos de Improbidade Administrativa que Atentam Contra os Princípios da Administra-ção Pública

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios daAdministração Pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade,imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:

I - praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, naregra de competência;

II - retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;

III - revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que devapermanecer em segredo;

IV - negar publicidade aos atos oficiais;

V - frustrar a licitude de concurso público;

VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo;

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Ação de improbidade administrativa

VII - revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes da respectiva divul-gação oficial, teor de medida política ou econômica capaz de afetar o preço de mercadoria,bem ou serviço.

CAPÍTULO III

Das Penas

Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas, previstas na legis-lação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes comina-ções:

I - na hipótese do art. 9.º, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio,ressarcimento integral do dano, quando houver, perda da função pública, suspensão dosdireitos políticos de oito a dez anos, pagamento de multa civil de até três vezes o valor doacréscimo patrimonial e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefíciosou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de

pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos;II - na hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acres-cidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função pública,suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até duasvezes o valor do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefíciosou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio depessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;

III - na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da funçãopública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civilde até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratarcom o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ouindiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário,

pelo prazo de três anos.

Parágrafo único. Na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará em conta a extensãodo dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente.

CAPÍTULO IV

Da Declaração de Bens

Art. 13. A posse e o exercício de agente público ficam condicionados à apresentação dedeclaração dos bens e valores que compõem o seu patrimônio privado, a fim de ser arqui-vada no serviço de pessoal competente. (Regulamento)

§1.º A declaração compreenderá imóveis, móveis, semoventes, dinheiro, títulos, ações,e qualquer outra espécie de bens e valores patrimoniais, localizado no País ou no exterior, e,quando for o caso, abrangerá os bens e valores patrimoniais do cônjuge ou companheiro,dos filhos e de outras pessoas que vivam sob a dependência econômica do declarante,excluídos apenas os objetos e utensílios de uso doméstico.

§2.º A declaração de bens será anualmente atualizada e na data em que o agente públicodeixar o exercício do mandato, cargo, emprego ou função.

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Ação de improbidade administrativa

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§3.º Será punido com a pena de demissão, a bem do serviço público, sem prejuízo de outrassanções cabíveis, o agente público que se recusar a prestar declaração dos bens, dentro doprazo determinado, ou que a prestar falsa.

§4.º O declarante, a seu critério, poderá entregar cópia da declaração anual de bens apre-sentada à Delegacia da Receita Federal na conformidade da legislação do Imposto sobrea Renda e proventos de qualquer natureza, com as necessárias atualizações, para suprir aexigência contida no caput  e no §2.º deste artigo.

CAPÍTULO V

Do Procedimento Administrativo e do Processo Judicial

Art. 14. Qualquer pessoa poderá representar à autoridade administrativa competente paraque seja instaurada investigação destinada a apurar a prática de ato de improbidade.

§1.º A representação, que será escrita ou reduzida a termo e assinada, conterá a qualificação

do representante, as informações sobre o fato e sua autoria e a indicação das provas de quetenha conhecimento.

§2.º A autoridade administrativa rejeitará a representação, em despacho fundamentado, seesta não contiver as formalidades estabelecidas no §1.º deste artigo. A rejeição não impedea representação ao Ministério Público, nos termos do art. 22 desta lei.

§3.º Atendidos os requisitos da representação, a autoridade determinará a imediata apura-ção dos fatos que, em se tratando de servidores federais, será processada na forma previstanos arts. 148 a 182 da Lei 8.112, de 11 de dezembro de 1990 e, em se tratando de servidormilitar, de acordo com os respectivos regulamentos disciplinares.

Art. 15. A comissão processante dará conhecimento ao Ministério Público e ao Tribunal ouConselho de Contas da existência de procedimento administrativo para apurar a prática deato de improbidade.

Parágrafo único. O Ministério Público ou Tribunal ou Conselho de Contas poderá, a requeri-mento, designar representante para acompanhar o procedimento administrativo.

Art. 16. Havendo fundados indícios de responsabilidade, a comissão representará ao Minis-tério Público ou à procuradoria do órgão para que requeira ao juízo competente a decre-tação do sequestro dos bens do agente ou terceiro que tenha enriquecido ilicitamente oucausado dano ao patrimônio público.

§1.º O pedido de sequestro será processado de acordo com o disposto nos arts. 822 e 825do Código de Processo Civil.

§2.º Quando for o caso, o pedido incluirá a investigação, o exame e o bloqueio de bens,contas bancárias e aplicações financeiras mantidas pelo indiciado no exterior, nos termosda lei e dos tratados internacionais.

Art. 17. A ação principal, que terá o rito ordinário, será proposta pelo Ministério Público oupela pessoa jurídica interessada, dentro de trinta dias da efetivação da medida cautelar.

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Ação de improbidade administrativa

§1.º É vedada a transação, acordo ou conciliação nas ações de que trata o caput .

§2.º A Fazenda Pública, quando for o caso, promoverá as ações necessárias à complementa-ção do ressarcimento do patrimônio público.

§3.º No caso de a ação principal ter sido proposta pelo Ministério Público, aplica-se, no que

couber, o disposto no §3.º do art. 6.º da Lei 4.717, de 29 de junho de 1965. (Redação dadapela Lei 9.366, de 1996).

§4.º O Ministério Público, se não intervir no processo como parte, atuará obrigatoriamente,como fiscal da lei, sob pena de nulidade.

§5.º A propositura da ação prevenirá a jurisdição do juízo para todas as ações posterior-mente intentadas que possuam a mesma causa de pedir ou o mesmo objeto.

§6.º A ação será instruída com documentos ou justificação que contenham indícios sufi-cientes da existência do ato de improbidade ou com razões fundamentadas da impossibili-dade de apresentação de qualquer dessas provas, observada a legislação vigente, inclusiveas disposições inscritas nos arts. 16 a 18 do Código de Processo Civil.

§7.º Estando a inicial em devida forma, o juiz mandará autuá-la e ordenará a notificação dorequerido, para oferecer manifestação por escrito, que poderá ser instruída com documen-tos e justificações, dentro do prazo de quinze dias.

§8.º Recebida a manifestação, o juiz, no prazo de trinta dias, em decisão fundamentada,rejeitará a ação, se convencido da inexistência do ato de improbidade, da improcedênciada ação ou da inadequação da via eleita.

§9.º Recebida a petição inicial, será o réu citado para apresentar contestação.

§10. Da decisão que receber a petição inicial, caberá agravo de instrumento.

§11. Em qualquer fase do processo, reconhecida a inadequação da ação de improbidade, o juiz extinguirá o processo sem julgamento do mérito.

§12. Aplica-se aos depoimentos ou inquirições realizadas nos processos regidos por esta Leio disposto no art. 221, caput  e §1.º, do Código de Processo Penal.

Art. 18. A sentença que julgar procedente ação civil de reparação de dano ou decretar aperda dos bens havidos ilicitamente determinará o pagamento ou a reversão dos bens,conforme o caso, em favor da pessoa jurídica prejudicada pelo ilícito.

CAPÍTULO VI

Das Disposições Penais

Art. 19. Constitui crime a representação por ato de improbidade contra agente público outerceiro beneficiário, quando o autor da denúncia o sabe inocente.

Pena: detenção de seis a dez meses e multa.

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Ação de improbidade administrativa

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Parágrafo único. Além da sanção penal, o denunciante está sujeito a indenizar o denun-ciado pelos danos materiais, morais ou à imagem que houver provocado.

Art. 20. A perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos só se efetivam com otrânsito em julgado da sentença condenatória.

Parágrafo único. A autoridade judicial ou administrativa competente poderá determinar oafastamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo daremuneração, quando a medida se fizer necessária à instrução processual.

Art. 21. A aplicação das sanções previstas nesta lei independe:

I - da efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público;

II - da aprovação ou rejeição das contas pelo órgão de controle interno ou pelo Tribunal ouConselho de Contas.

Art. 22. Para apurar qualquer ilícito previsto nesta lei, o Ministério Público, de ofício, a reque-rimento de autoridade administrativa ou mediante representação formulada de acordo

com o disposto no art. 14, poderá requisitar a instauração de inquérito policial ou procedi-mento administrativo.

CAPÍTULO VII

Da Prescrição

Art. 23. As ações destinadas a levar a efeitos as sanções previstas nesta lei podem ser pro-postas:

I - até cinco anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de

função de confiança;II - dentro do prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puní-veis com demissão a bem do serviço público, nos casos de exercício de cargo efetivo ouemprego.

CAPÍTULO VIII

Das Disposições Finais

Art. 24. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 25. Ficam revogadas as Leis 3.164, de 1.º de junho de 1957, e 3.502, de 21 de dezembrode 1958 e demais disposições em contrário.

Rio de Janeiro, 2 de junho de 1992;171.º da Independência e 104.º da República.

FERNANDO COLLOR

Célio Borja

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Ação de improbidade administrativa

 Jurisprudências selecionadasAÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/92. VIOLAÇÃO DOS DEVERES DEMORALIDADE E IMPESSOALIDADE. SERVIDORES CONTRATADOS SEM CONCURSO PÚBLICOPELO EX-PREFEITO. LESÃO À MORALIDADE ADMINISTRATIVA QUE PRESCINDE DA EFETIVA

LESÃO AO ERÁRIO. PENA DE RESSARCIMENTO. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. APLICAÇÃO.DANO EFETIVO. INOCORRÊNCIA.

1. Ação civil pública intentada pelo Ministério Público Estadual em face de ex-prefeito deRiolândia-SP e de ex-servidores públicos municipais, por ato de improbidade administra-tiva, causador de lesão ao erário público e atentatório dos princípios da AdministraçãoPública, consistente na contratação irregular dos servidores corréus, sem a realização deconcurso público.

2. A Lei 8.429/92, da Ação de Improbidade Administrativa, explicitou o cânone inserto noartigo 37, §4.º, da Constituição Federal de 1988, tendo por escopo impor sanções aos agen-tes públicos incursos em atos de improbidade nos casos em que: a) importem em enrique-

cimento ilícito (artigo 9.º); b) causem prejuízo ao erário público (artigo 10); e c) atentemcontra os princípios da Administração Pública (artigo 11), aqui também compreendida alesão à moralidade administrativa.

3. Acórdão recorrido calcado na assertiva de que, “apesar das contratações inconstitucio-nais e ilegais, não houve prejuízo ao patrimônio público, na medida em que os servidoresCelso Luiz Santana e José Inácio Borges efetivamente prestaram seus serviços, fazendo jusao recebimento da respectiva paga, não se justificando a condenação de Antônio Gonçal-ves da Silva a restituir aos cofres da Municipalidade os valores a eles pagos”.

4. In casu, o ato de improbidade se amolda à conduta prevista no artigo 11, revelandoautêntica lesão aos princípios da impessoalidade e da moralidade administrativa, tendo emvista a contratação de parente e de amigo do ex-prefeito para exercerem cargos públicossem a realização de concurso público.

5. Deveras, a aplicação das sanções, nos termos do artigo 21, da Lei de Improbidade, inde-pendem da efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público, o que autoriza a aplicação danorma sancionadora prevista nas hipóteses de lesão à moralidade administrativa.

6. À luz dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, impõe-se a mitigação dopreceito que preconiza a prescindibilidade da ocorrência do dano efetivo ao erário para seinfligir a sanção de ressarcimento: “a hipótese prevista no inciso I do artigo 21, que dispensaa ocorrência de dano para aplicação das sanções da lei, merece meditação mais cautelosa.

Seria inconcebível punir-se uma pessoa se de seu ato não resultasse qualquer tipo de dano.Tem-se que entender que o dispositivo, ao dispensar o “dano ao patrimônio público” uti-lizou a expressão patrimônio público em seu sentido restrito de patrimônio econômico.Note-se que a lei de ação popular (Lei 4.717/65) define patrimônio público como “os bense direitos de valor econômico, artístico, estético, histórico ou turístico” (art. 1.º, §1.º), paradeixar claro que, por meio dessa ação, é possível proteger o patrimônio público nesse sen-tido mais amplo. O mesmo ocorre, evidentemente, com a ação de improbidade administra-tiva, que protege o patrimônio público nesse mesmo sentido amplo. (Maria Sylvia Zanelladi Pietro in: Direito Administrativo, 13.ª edição, pág. 674, in fine).

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Ação de improbidade administrativa

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7. Precedentes do STJ: REsp 291.747/SP, Relator Ministro Humberto Gomes de Barros, PrimeiraTurma, DJ de 18/03/2002; REsp 213.994/MG, Relator Ministro Garcia Vieira, Primeira Turma,DJ de 27/09/1999; REsp 261.691/MG, Relatora Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJde 05/08/2002; e REsp 439.280/RS, desta relatoria, Primeira Turma, DJ de 16/06/2003.

8. Assentado o aresto recorrido que não houve dano e que impor o ressarcimento por forçade improbidade imaterial conduziria à reparação de dano hipotético, resta insindicável otema pelo STJ (Súmula 7), mercê de afastar-se a improbidade por violação da moralidadeadministrativa por via oblíqua, ao exigir-se, sempre, prejuízo material ressarcível.

9. Condutas que recomendaram o afastamento do ex-prefeito no trato da coisa pública,objetivo aferível pela manutenção da suspensão dos direitos políticos e da inabilitação paracontratar com a Administração Pública.

10. Recurso especial do Ministério Público Estadual desprovido. (STJ, 1.ª T., REsp 711.732/SP,Rel. Min. Luiz Fux, j. 28/03/2006).

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE ADMINISTRA-TIVA. LESÃO A PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS. AUSÊNCIA DE DANO AO ERÁRIO.

1. A lesão a princípios administrativos contida no artigo 11 da Lei 8.429/92 não exige doloou culpa na conduta do agente, nem prova da lesão ao erário público. Basta a simples ili-citude ou imoralidade administrativa para restar configurado o ato de improbidade. Casoreste demonstrada a lesão, e somente neste caso, o inciso III, do artigo 12 da Lei 8.429/92autoriza seja o agente público condenado a ressarcir o erário.

2. Se não houver lesão, ou se esta não restar demonstrada, o agente poderá ser condenadoàs demais sanções previstas no dispositivo como a perda da função pública, a suspensãodos direitos políticos, a impossibilidade de contratar com a administração pública pordeterminado período de tempo, dentre outras.

3. In casu, face à inexistência de lesividade ao erário público, ainda que procedente a açãocivil pública e, consequentemente, revisto o acórdão de segundo grau, deve ser afastada aaplicação de multa civil determinada na sentença de primeiro grau.

4. Recurso especial provido em parte. (STJ, 2.ª T., REsp 650.674/MG, Rel. Min. Castro Meira, j. 06/06/2006).

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ADMISSIBILIDADE. SÚMULA 13/STJ. ADMINISTRA-

TIVO. LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. DISCRI-CIONARIEDADE DO JULGADOR NA APLICAÇÃO DAS PENALIDADES.

1. “A divergência entre julgados do mesmo Tribunal não enseja recurso especial” (Súmula13/STJ)

2. In casu, a controvérsia a ser dirimida cinge-se em definir se as penas acessórias do artigo12, da Lei 8.429/92, inflingidas aos ex-vereadores, foram aplicadas de forma razoável e pro-porcional ao ato ímprobo praticado.

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Ação de improbidade administrativa

3. As sanções do artigo 12, da Lei 8.429/92, não são necessariamente cumulativas, cabendoao magistrado a sua dosimetria; aliás, como resta claro do parágrafo único do mesmo dis-positivo.

4. No campo sancionatório, a interpretação deve conduzir à dosimetria relacionada à exem-plariedade e à correlação da sanção, critérios que compõem a razoabilidade da punição,sempre prestigiada pela jurisprudência do E. STJ. (Precedentes: REsp. 291.747, Rel. Min.Humberto Gomes de Barros, DJ de 18/03/2002 e REsp 213.994/MG, Rel. Min. Garcia Vieira,DJ de 27/09/1999).

5. Revela-se necessária a observância da lesividade e reprovabilidade da conduta do agente,do elemento volitivo da conduta e da consecução do interesse público, para efetivar a dosi-metria da sanção por ato de improbidade, adequando-a à finalidade da norma.

6. Hipótese em que foi ajuizada ação de improbidade tendo em vista que o Presidente daCâmara Municipal, e os vereadores no Município de Guairá (PR), no período de 1993/1996,perceberam indevidamente no mês de janeiro de 1995, respectivamente, à época da pro-

positura da demanda, R$378,73 (trezentos de setenta e oito reais e setenta e três centavos),e R$252,49 (duzentos e cinquenta e dois reais e quarenta e nove centavos) sendo certoque foram condenados ao ressarcimento integral do dano ao erário, bem como à perda dafunção pública, à suspensão dos direitos políticos por cinco anos, ao pagamento de multacivil, correspondente à metade do valor que deve ser ressarcido e à proibição de contrata-ção com o Poder Público ou de recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou credití-cios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejamsócios majoritários, pelo prazo de cinco anos.

7. É cediço que a ausência de razoabilidade da sanção infirma a sua “legalidade”, à luz doartigo 12, da Lei 8.429/92 e seu parágrafo único. É cediço em sede de cláusula doutrináriaque: com efeito, reza o artigo 5.º, LIV/88 que ninguém será “privado da liberdade ou de

seus bens sem o devido processo legal”. Privação de liberdade há de ser interpretada, aqui,de modo mais amplo possível. Não se trata de pena privativa de liberdade. Uma restriçãoa direitos políticos não é pena privativa de liberdade, mas prova o agente do gozo de umaliberdade política, v.g., candidatar-se a cargos públicos, ou a cargos eletivos, ou de usufruirdo direito-dever de voto. Uma sanção que proíbe alguém de contratar com a Administra-ção Pública, ou dela receber benefícios fiscais ou creditícios, subvenções, por determinadoperíodo, atinge a sua liberdade de contratar e de participar da vida negocial. Ademais, pri-vação dos bens também mercê ampla compreensão. Quando o Estado ajuíza uma açãocivil pública visando à condenação do agente ao pagamento de multa civil, parece-me quehá perspectiva de privação dos bens. Também um processo administrativo que tenha porfinalidade imposição de multa pode atingir os bens dos indivíduos, dada a perspectiva exe-

cutória de uma eventual decisão sancionatória. Essa locução não quer significar, em pobredicção literal e pouco criativa, que somente aqueles que respondem a processos de exe-cução, com patrimônio diretamente submetido ao risco de constrição, teriam o supremodireito ao devido processo legal. Outros, respondendo a ações indenizatórias, ainda na fasecognitiva, milionárias ou não, não teriam direito ao atendimento do artigo 5.º, LIV, da CF/88?Evidentemente que têm mais pessoas esse direito. Consta que o projeto original do artigo37, caput , da Carta de 1988 previa, expressamente, o princípio da razoabilidade, tendo sidobanido do texto final. Nem por isso, todavia, deve ser desconsiderado. Anote-se que há umprincípio da razoabilidade das leis, princípio que tem sido acolhido na jurisprudência do

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Ação de improbidade administrativa

221

Supremo Tribunal Federal, e na boa doutrina, condenando-se a discrepância entre o meioeleito pelo próprio legislador e o fim almejado . “A atribuição ao Judiciário do controle dasleis mediante o juízo de valor da proporcionalidade e da razoabilidade da norma legal nãopretende substituir a vontade do juiz. Antes, a este cabe pesquisar a fidelidade do ato legis-lativo aos efeitos essenciais da ordem jurídica, na busca da estabilidade entre o poder e a

liberdade. Os Magistrados devem obediência ao princípio geral da razoabilidade de suasmedidas e atos. Trata-se de um princípio com reflexos, portanto, processuais. Nenhumamedida judicial pode ser “desarrazoada”, arbitrária, absurda [...]. Ademais, a razoabilidadeé um fundamental critério de apreciação da arbitrariedade legislativa, jurisdicional e admi-nistrativa, porque os tipos de condutas sancionadas devem atender a determinadas exi-gências decorrentes da razoabilidade que se espera dos Poderes Públicos. [...] Uma decisãocondenatória desarrazoada, por qualquer que seja o motivo, será nula de pleno direito,viciada em sua origens, seja fruto de órgãos judiciários, seja produto de deliberações admi-nistrativas ou mesmo legislativas, eis a importância de se compreender a presença do prin-cípio da razoabilidade dentro da cláusula do devido processo legal (Fábio Medina Osório,in: Direito Administrativo Sancionador , Ed. Revista dos Tribunais).

8. Consectariamente, independentemente do reexame de matéria fático-probatória, insin-dicável, em sede de recurso especial, pelo E. STJ, ante a incidência do verbete sumular 07/STJ, revela-se evidente a excessividade das penas aplicadas aos recorrentes, com notóriainfração ao artigo 12, parágrafo único, da Lei 8.429/92.

9. Forçoso concluir que, nos casos em que a lei não fixa critério a ser obedecido na infliçãoda sanção, é defeso ao STJ invadir a discricionariedade judicial prevista em lei. Outrossim,erigido em critério legal e desobedecido o mesmo em face de error   in judicando, vislum-bra-se inequívoca a violação legal que embasa a irresignação recursal.

10. Recurso especial interposto por Heraldo Trento e outro parcialmente conhecido erecurso especial de Paulo Celinski e outros, integralmente conhecidos e ambos providos

para que sejam condenados, tão somente, ao ressarcimento dos valores indevidamenterecebidos, afastando-se as demais penalidades acessórias impostas aos recorrentes. (STJ,1.ª T., REsp 664.856/PR, Rel. Min. Luiz Fux, j. 06/04/2006).

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Wellington Pacheco Barros

Considerações geraisToda lei, depois de sancionada e publicada, tem validade plena, e somente

pode ser retirada do universo jurídico brasileiro por meio de outra lei que a

revogue ou por uma ação direta de inconstitucionalidade.

Portanto, tem-se um verdadeiro controle judicial da lei que venha a ferira Constituição. A ação direta de inconstitucionalidade também é conhecida

como ADIn.

Ante a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), é possível exem-

plificar alguns casos de cabimento, ou não, da ADIn:

a inconstitucionalidade pode ser de lei, de ato normativo federal ou de

ato normativo estadual. Se a lei ou o ato normativo estadual for ante-

rior à Constituição Federal (CF), não cabe a ADIn, pois há a revogação

do ato;

lei ou ato normativo municipal – não cabe;

lei que cria município – cabe;

ato administrativo – cabe, desde que seja lei em sentido material (ato

abstrato e genérico);

resolução administrativa dos órgãos do Poder Judiciário – cabe;

atos estatais de conteúdo meramente declaratório, como as resoluções

administrativas, desde que incidam sobre atos de caráter legislativo –

cabe;

convenções coletivas, resoluções do Tribunal Superior Eleitoral (TSE),

leis que concedem doações de bens, leis orçamentárias e súmulas –

não cabe;

Ação diretade inconstitucionalidade

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Ação direta de inconstitucionalidade

emendas constitucionais e tratados – cabe;

ato que regulamenta uma norma – não cabe.

Em que consiste a inconstitucionalidadede lei ou ato normativo?

Todas as leis, ao passarem por processo legislativo regular, sendo afinal san-

cionadas, possuem presunção de constitucionalidade. Isso significa dizer que a

lei passa a produzir efeitos de acordo com os mandamentos da Constituição. Por

vezes, entretanto, tal lei ou ato normativo não está de acordo com a Lei Maior,

necessitando que seja declarada inconstitucional, total ou parcialmente.

O controle de constitucionalidade tem duas vertentes: o abstrato (ou concen-trado), e o concreto (ou difuso). O primeiro controla a lei em tese, e o segundo, no

caso concreto.

A ADIn, por via de consequência, foi criada para ser supletiva (função suple-

tiva) ao controle concreto. Assim, quando fosse inviável fazer o controle difuso,

far-se-ia o controle por meio da ADIn. Recebeu também uma função corretiva:

foi criada como expressão da segurança jurídica. Hoje, não há dúvida, deve ser

considerado que o controle difuso é supletivo.

Base constitucionalA base constitucional da ADIn está no artigo 102 da CF:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição,cabendo-lhe:

I - processar e julgar originalmente:

a) ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a açãodeclaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal;

É bom frisar que o controle pela ADIn, segundo o comando constitucional,

opera-se de forma abstrata (lei em tese), já o controle concreto da constituciona-

lidade das leis é feito pelo Judiciário, no julgamento de um caso. Assim, quando

há uma decisão que declara uma lei inconstitucional no controle concreto, esta

produz efeito apenas entre as partes.

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Ação direta de inconstitucionalidade

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Incidente de inconstitucionalidade:CF, artigo 97

Ao se analisar a ADIn, não se pode deixar ao largo o incidente de inconstitu-

cionalidade.

O órgão fracionário do tribunal não pode, em regra, declarar a inconstituciona-

lidade de norma. Somente o Órgão Especial  (ou o Pleno) do tribunal pode declarar

a inconstitucionalidade desta ( princípio da reserva de plenário). Se o órgão fracio-

nário entender que a lei declarada inconstitucional pelo juiz singular é realmente

inconstitucional, remeterá o processo ao Pleno (ou órgão especial) do Tribunal:

esse procedimento é denominado incidente de inconstitucionalidade (é suscitado

um incidente de inconstitucionalidade). Após o julgamento da inconstitucionali-

dade da norma, o processo retorna à Câmara para apreciação do mérito (o pedido

formulado).

Se o STF (até mesmo em recurso extraordinário – RExt), ou o Pleno do Tribu-

nal de Justiça, já se manifestou a respeito da constitucionalidade da norma, não

há necessidade de incidente de inconstitucionalidade. Se na volta do processo à

Câmara tiver ocorrido a mudança de entendimento desta, não sendo mais consi-

derada inconstitucional por esse órgão, na norma declarada inconstitucional pelo

Pleno do Tribunal é cabível o recurso especial – REsp. Não pode o juiz se pronun-

ciar no dispositivo da sentença a respeito da declaração de inconstitucionalidade

de norma (isso só pode ocorrer na ADIn, não no controle difuso). Mas ele pode

declarar de ofício a inconstitucionalidade de uma norma.

Questão importante pertinente ao tema diz respeito aos efeitos da declaração

de inconstitucionalidade realizada concretamente pelo Judiciário em cada caso.

Como já dito, o efeito é inter partes. A única forma de existência de efeito erga

omnes é se houver a decisão definitiva do Plenário do STF, e o Senado suspender

a execução da norma (CF, art. 52). O artigo 52, X, da CF, só é aplicável ao controleincidental difuso. O Senado não é obrigado a suspender a execução da norma.

Caso suspenda, terá efeito ex nunc ; porém, a matéria é discutível: Alexandre de

Moraes considera o efeito ex nunc , já Teori Zavascki considera efeito ex tunc .

O controle abstrato de lei e ato normativo contestado em face à CF, repetindo,

é realizado sob a forma de ADIn, que fará coisa julgada com efeito contra todos

(erga omnes).

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Ação direta de inconstitucionalidade

Regulamentação legalA regulamentação legal da ADIn, instrumento que o STF utiliza para o controle

concentrado da constitucionalidade de leis e atos normativos, foi introduzida

pela Lei 9.868/99.

Como ressalva, apenas leis e atos normativos federais ou estaduais podem ser

discutidos em face da Constituição; os municipais não, apenas em caso incidental

ou em ação de arguição de descumprimento de preceito fundamental (somente

se contestada em face da Constituição Estadual e com previsão legal nesta).

Quem pode propor a açãoSão legitimados para propor ADIn, segundo o artigo 2.º da Lei da ADIn:

Art. 2.º [...]

I - o Presidente da República;

II - a Mesa do Senado Federal;

III - a Mesa da Câmara dos Deputados;

IV - a Mesa de Assembleia Legislativa ou a Mesa da Câmara Legislativa do Distrito Federal;

V - o Governador de Estado ou o Governador do Distrito Federal;

VI - o Procurador-Geral da República;

VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;

IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

Há distinção entre os legitimados em razão da pertinência temática: há legiti-

mados universais e especiais:

legitimados universais  – o Presidente da República é legitimado univer-

sal, pois não precisa demonstrar a pertinência temática. Também são legiti-

mados universais: Mesa da Câmara, do Senado, Conselho Federal da OAB e

partido político com representação no Congresso Nacional.

legitimados especiais  – Mesa de Assembleia Legislativa, Governador, Con-

federação etc.

O Governador de um determinado Estado pode ajuizar ADIn pedindo a

declaração da inconstitucionalidade de norma de outro Estado, se esta interferir

no seu.

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Ação direta de inconstitucionalidade

227

Quanto aos partidos políticos, apenas o seu diretório nacional pode ajuizar

ADIn, desde que tenha representação mínima no Congresso Nacional.

No que tange às confederações, somente elas podem ajuizar ADIn, não as

demais entidades sindicais, pois estas são inferiores hierarquicamente.

Quanto às entidades de classe, só podem ajuizar a ação as de âmbito nacional

com membros em nove Estados da Federação – esse requisito provém da lei orgâ-

nica dos partidos políticos.

Conteúdo da petição inicialQuanto ao conteúdo, a petição inicial indicará, segundo o artigo 3.º da Lei

9.868/99:

Art. 3.º [...]

I - o dispositivo da lei ou do ato normativo impugnado e os fundamentos jurídicos do pedido emrelação a cada uma das impugnações;

II - o pedido, com suas especificações.

A inicial deve, como de rotina, obedecer aos requisitos essenciais dispostos no

Código de Processo Civil (CPC), artigos 282 e 283, acompanhada dos documentos

vitais à sua propositura.

Além da indicação do STF como tribunal de endereçamento e qualificação doautor, a peça inicial deve fazer menção à norma ou ao ato normativo que se queira

impugnar, mesmo que parcialmente, transcrevendo-se excerto da expressão da

norma que se quer ver declarada inconstitucional.

Caso os fundamentos do pedido necessitem de comprovação fática, o que não

é normal, devem acompanhá-los os respectivos documentos. Caso contrário (se

não necessitarem de outras provas), bastam os fundamentos acerca da inconsti-

tucionalidade formal (processo legislativo) ou material.

Como lei , pode-se entender como a norma proveniente do Poder Legislativo,em casos restritos como emendas constitucionais, leis complementares e ordiná-

rias, decretos legislativos e resoluções. Como ato normativo, temos as medidas

provisórias, decretos, instruções normativas, regimentos internos do Congresso

Nacional.

Quanto ao pedido e à capacidade postulatória, é pertinente a transcrição do

balizado de Nery Junior (2003, p. 1.379):

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Ação direta de inconstitucionalidade

Pedido. Pode ser deduzido como pedido tudo aquilo que a CF e a LADIn autorizar seja feito naADIn: a) medida cautelar (LADIn 10); b) declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato norma-tivo; c) declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto (LADIn 28 par. ún.); d)declaração de inconstitucionalidade de termo ou expressão constante da lei ou do ato norma-tivo, com supressão do termo ou expressão inconstitucional; e) declaração sobre a eficácia dadecisão no tempo (LADIn 27); f) interpretação conforme a CF (LADIn 28 par. ún.) etc.

Capacidade Postulatória. A petição inicial deve ser subscrita por profissional habilitado a pro-curar em juízo: advogado ou Procurador-Geral da República. Quando subscrita por advogado,a petição inicial deve estar acompanhada do instrumento de procuração. A CF 103 conferelegitimidade (condição da ação) para a propositura da ADIn. Para subscrever a petição inicial,entretanto, há necessidade de capacidade postulatória (pressuposto processual). As figuras sãoinconfundíveis: a legitimação é relativa ao exercício do direito de ação, enquanto que a capa-cidade postulatória é requisito de existência e validade do processo. A lei exige a capacidadepostulatória para poder procurar em juízo (CPC 36).

Indeferimento liminar da inicial pelo relatorO artigo 4.º da Lei da ADIn prevê as hipóteses em que há indeferimento liminar

da inicial pelo relator: quando for inepta, não fundamentada e manifestamente

improcedente.

Mas não só a inépcia é causa de indeferimento; as hipóteses de indeferimento

do artigo 295 do CPC também são aplicadas à espécie, exceto quanto à parte do

inciso III, aos incisos IV (a ação é imprescritível) e V (inadequação do procedimento

escolhido). O magistrado pode, contudo, mandar emendar a inicial.

A falta de fundamentação pode ocorrer quando o autor não explicar as razões

que entende serem motivo de inconstitucionalidade da lei ou ato impugnado.

O STF precisa saber o porquê da insurgência.

A improcedência manifesta dá-se quando o relator vislumbra o insucesso

patente e futuro da ação. Pode ocorrer quando o STF já se manifestou em caso

idêntico, incidentalmente. Há improcedência manifesta também quando a cons-

titucionalidade da norma atacada é flagrante.

Da decisão que indefere a liminar cabe agravo, em cinco dias.

Embora não previsto o prazo na lei, deve-se fazer uma analogia remissiva aos

artigos 545 e 557, parágrafo 1.º, do CPC, a fim de que haja coerência procedimen-

tal. Esse recurso somente é cabível em caso de exame monocrático da inicial. Se

a questão for submetida ao plenário, descabe o recurso porque a ele (colegiado)

competiria julgar o próprio recurso de agravo, o que contraria a teoria geral dos

recursos.

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Ação direta de inconstitucionalidade

229

Andamento da açãoApós o exame da liminar, o relator pedirá informações aos órgãos ou às autori-

dades das quais emanou a lei ou o ato normativo impugnado, no prazo de 30 dias

do recebimento do pedido. É o que diz o artigo 6.º da Lei da ADIn.

Aqui não há uma faculdade do relator, pois a lei é imperativa ao indicar a ofi-

cialidade da medida. Evidente que as informações serão solicitadas a quem fez

emanar a lei ou ato normativo impugnado, devendo ser prestadas de maneira

compulsória pela autoridade competente.

Caso não sobrevenham ao processo as informações na data legal aprazada, o

processo deverá seguir sem elas.

Com o retorno ou não das informações, serão ouvidos, sucessivamente, o

Advogado-Geral da União, que defenderá o ato ou a lei impugnados, e o Procu-rador-Geral da República, como parecerista e fiscal da lei, caso não seja o autor

da ação (sob pena de nulidade), para se manifestarem no prazo de 15 dias, o que

mesmo que desobedecido, não importará em sanção a eles.

Feitos esses rápidos procedimentos, o relator lançará relatório nos autos e

pedirá dia para julgamento. Caso haja necessidade de algum esclarecimento para

melhor elucidação dos fatos e convencimento do magistrado, ele poderá solicitar

informações adicionais ou até mesmo designar audiência; daí então, pautará o

processo para julgamento do colegiado.

Ação cautelar em açãodireta de inconstitucionalidade

A seção II da Lei da ADIn traz o tópico atinente à medida cautelar em ADIn.

Como carro-chefe, o artigo 10 preleciona:

Art. 10. Salvo no período de recesso, a medida cautelar na ação direta será concedida por deci-são da maioria absoluta dos membros do Tribunal, observado o disposto no art. 22, após a audi-ência dos órgãos ou autoridades dos quais emanou a lei ou ato normativo impugnado, quedeverão pronunciar-se no prazo de cinco dias.

§1.º O relator, julgando indispensável, ouvirá o Advogado-Geral da União e o Procurador-Geralda República, no prazo de três dias.

§2.º No julgamento do pedido de medida cautelar, será facultada sustentação oral aos represen-tantes judiciais do requerente e das autoridades ou órgãos responsáveis pela expedição do ato,na forma estabelecida no Regimento do Tribunal.

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Ação direta de inconstitucionalidade

§3.º Em caso de excepcional urgência, o Tribunal poderá deferir a medida cautelar sem a audiên-cia dos órgãos ou das autoridades das quais emanou a lei ou o ato normativo impugnado.

A lei permite a concessão de medida liminar em ADIn, desde que presentes os

requisitos indispensáveis do fumus boni iuris e do  periculum in mora. O primeiro

ocorre quando a inconstitucionalidade, na fase de cognição sumária, é saliente,quando o direito está em evidência; o segundo diz respeito ao aspecto temporal

de urgência da apreciação da medida.

A medida tanto pode ser pleiteada na petição inicial, incidentalmente no pro-

cesso, quanto em antecedência (30 dias) ao processo principal.

Seu julgamento se dará pelo colegiado pleno do STF, com a presença de,

no mínimo, oito ministros que, por maioria absoluta (seis), poderão conceder a

medida. Se em recesso, o presidente do STF apreciará a medida.

Caso indispensável, serão ouvidos o Advogado-Geral da União e o Procurador-

-Geral da República, no prazo de três dias, exceto quando houver urgência urgen-

tíssima, caso em que a medida poderá ser examinada sem a ouvida da autorida-

de-ré.

Concedida a medida cautelar, o STF fará publicar em seção especial do Diário Oficial da União edo Diário da Justiça da União a parte dispositiva da decisão, no prazo de dez dias, devendo soli-citar as informações à autoridade da qual tiver emanado o ato, observando-se, no que couber, oprocedimento estabelecido na Seção I deste Capítulo. (Lei da ADIn, art. 11).

O efeito da medida será, em regra, concedido ex nunc , ou seja, apenas a partirde sua publicação produzirá efeitos, salvo se o tribunal entender que deve ser

concedida com efeitos ex tunc (de forma retroativa).1

Seja qual for o efeito, este deverá ser vinculante em relação aos órgãos do

Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal.

 Julgamento da ADIn pelo Órgão Pleno do STFA decisão da ADIn deverá ser tomada se presentes pelo menos oito ministros

do STF, como já mencionado.

1 CONTROLE ABSTRATO DE CONSTITUCIONALIDADE. ALEGADA OMISSÃO, POSTO NÃO HAVER O ACÓRDÃO ATACADO EXPLICI-TADO OS EFEITOS DA DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 25 DO ADCT PARANAENSE, SE EX TUNC  OU EX  NUNC .A declaração de inconstitucionalidade decorrente da procedência de ação direta tem efeitos ex tunc , regra que somente admiteexceção na forma do art. 27 da Lei 9.868/99, hipótese não configurada no caso em questão. Embargos rejeitados. (STF, TribunalPleno, ADIn 483, Rel. Min. Ilmar Galvão, j. 22/08/2001).

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Ação direta de inconstitucionalidade

231

Efetuado o julgamento, proclamar-se-á a constitucionalidade ou a inconstitu-

cionalidade da disposição ou da norma impugnada, se em um ou em outro sen-

tido tiverem se manifestado pelo menos seis ministros; eis a necessidade de maio-

ria absoluta, sob pena de suspensão do julgamento até que o quorum mínimo

seja estabelecido.

Proclamada a constitucionalidade, julgar-se-á improcedente a ação direta;

proclamada a inconstitucionalidade, julgar-se-á procedente a ação direta.

Questões importantes da ADInA decisão que declara a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade da lei

ou do ato normativo em ação direta é irrecorrível – por ser exarada pelo órgão

maior da Corte Máxima do país – ressalvada a interposição de embargos decla-

ratórios, não podendo, igualmente, ser objeto de ação rescisória (pelo mesmo

motivo destacado na irrecorribilidade).

Ao declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista

razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, poderá o STF, por

maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração

ou decidir que ela só venha a ter eficácia a partir do seu trânsito em julgado ou de

outro momento que venha a ser fixado.

Dez dias após o trânsito em julgado da decisão, o STF fará publicar em seção

especial do Diário da Justiça e do Diário Oficial da União a parte dispositiva do

acórdão.

A decisão terá efeito contra todos (erga omnes). Após sua publicação, produ-

zirá efeitos da coisa julgada, sendo desnecessária a remessa do feito ao Senado

Federal para suspensão da execução, como é feito no controle difuso.

A decisão proferida na ADIn pode ter as seguintes extensões:

interpretação conforme a Constituição  – tendo uma norma diversas pos-

sibilidades interpretativas, e entendendo o STF que apenas uma está de

acordo com a Constituição Federal, conclui-se que a referida norma é cons-

titucional desde que interpretada daquela forma;

declaração de inconstitucionalidade com redução de texto   – ocorre

quando uma determinada norma é riscada do mundo jurídico;

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Ação direta de inconstitucionalidade

declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto  – as normas

permanecem no mundo jurídico. É retirada a incidência da norma sobre

determinado grupo.

ConclusãoToda lei, em princípio, é editada conforme a Constituição. A ADIn é o procedi-

mento jurídico para controle e retirada da lei inconstitucional, realizado pelo STF.

Ampliando seus conhecimentosIndicamos a leitura das obras abaixo:

Código de Processo Civil Comentado, de Nelson Nery Junior, editora Revista dos

Tribunais.

Controle de Constitucionalidade, de Gilmar Ferreira Mendes, editora Saraiva.

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Wellington Pacheco Barros

Considerações geraisNa estrutura do direito brasileiro, toda lei, depois de sancionada e publi-

cada, tem validade plena e somente pode ser retirada do universo jurídico

pátrio por meio de outra lei que a revogue ou pela ação direta de inconstitu-

cionalidade (ADIn). Tem-se, portanto, um verdadeiro controle judicial da leique venha a ferir a Constituição.

Assim, todas as leis ao passarem por processo legislativo regular, sendo

afinal sancionadas, possuem presunção de constitucionalidade. Isso significa

dizer que a lei passa a produzir efeitos de acordo com os mandamentos da

Constituição Federal (CF).

Por vezes, entretanto, surgem dúvidas se tal lei ou ato normativo está de

acordo com a Lei Maior, necessitando que seja declarada constitucional totalou parcialmente. E isto se opera por meio da ação declaratória de constitu-

cionalidade (ADC).

Não custa repetir que o controle de constitucionalidade tem duas verten-

tes: o abstrato e o concreto. O primeiro controla a lei em tese, e o segundo, no

caso concreto.

A ADIn, por via de consequência, foi criada para ser supletiva (função

supletiva) aos controles difuso ou concreto. Assim, quando fosse inviávelfazer o controle difuso, fazer-se-ia o controle por meio da ADIn. Esta rece-

beu, também, uma função corretiva: foi criada como expressão da segurança

 jurídica. Hoje, não há dúvida, deve ser considerado que o controle difuso é

supletivo.

Tema sempre pertinente ao se analisar a ação declaratória de constitucio-

nalidade diz respeito ao incidente de inconstitucionalidade.

Ação declaratóriade constitucionalidade

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Ação declaratória de constitucionalidade

O órgão fracionário do tribunal não pode, em regra, declarar a inconstituciona-

lidade de norma. Somente o Órgão Especial  (ou o Pleno) do tribunal pode declarar

a inconstitucionalidade desta ( princípio da reserva de plenário). Se o órgão fracio-

nário entender que a lei declarada inconstitucional pelo juiz singular é realmente

inconstitucional, remeterá o processo ao Pleno (ou órgão especial) do Tribunal:

esse procedimento é denominado incidente de inconstitucionalidade. Após o jul-

gamento da inconstitucionalidade da norma, o processo retorna à câmara para

apreciação do mérito – o pedido formulado.

Se o Supremo Tribunal Federal (STF) – até mesmo em recurso extraordinário

(RExt) – ou o Pleno do Tribunal de Justiça já se manifestou a respeito da constitu-

cionalidade da norma, não há necessidade de incidente de inconstitucionalidade.

Se na volta do processo à Câmara tiver ocorrido a mudança de entendimento

desta, não sendo mais considerada inconstitucional por esse órgão, à norma

declarada inconstitucional pelo Pleno do Tribunal será cabível o recurso especial

(REsp). Não pode o juiz se pronunciar no dispositivo da sentença a respeito da

declaração de inconstitucionalidade de norma (isso só pode ocorrer na ADIn, não

no controle difuso), mas ele pode declarar de ofício a inconstitucionalidade de

norma.

Questão também importante e pertinente ao tema diz respeito aos efeitos

da declaração de inconstitucionalidade realizado concretamente pelo Judiciário

em cada caso. Como já dito, o efeito é inter partes. A única forma de existência de

efeito erga omnes é se houver a decisão definitiva do plenário do STF, e o Senado

suspender a execução da norma (CF, art. 52, X). O artigo 52, X, da CF só é aplicável

ao controle incidental difuso. O Senado não é obrigado a suspender a execução

da norma. Caso suspenda, terá efeito ex nunc , porém a matéria é discutível: Ale-

xandre de Moraes considera o efeito ex nunc , já Teori Zavascki considera efeito

ex tunc .

O controle abstrato de lei e ato normativo contestado em face da CF, repe-

tindo, é realizado sob a forma de ADIn, que fará coisa julgada com efeito contra

todos (erga omnes).

Base constitucional

A base constitucional da ADC está no artigo 102 da CF:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição,cabendo-lhe:

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Ação declaratória de constitucionalidade

237

I - processar e julgar originalmente:

a) a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal ; (grifo nosso)

A ADC foi inserida na CF (art. 102) pela Emenda Constitucional (EC) 3/93. Ao

ser instituída, a ideia foi a de evitar decisões desfavoráveis ao governo nas ins-tâncias inferiores e tribunais, a respeito de lei que tivesse sua constitucionalidade

discutida.

Não existe ADC de lei estadual. A ADC tem como único âmbito de abrangên-

cia: a declaração de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal.

Regulamentação legal

A lei que disciplinou o processo da ADC é a mesma que estabeleceu as normasprocedimentais relativas à ADIn: a Lei 9.868/99, com algumas modificações.

Trata-se de outra ação genérica de controle da constitucionalidade. O Procura-

dor-Geral da República é o fator de contraponto, e é ouvido nessa ação, devendo,

ao final, emitir parecer por sua procedência ou não. Essa é outra ação que tem

como objetivo a defesa da ordem constitucional.

Não há partes, mas sim requerentes. Só se admite seu ajuizamento se houver

controvérsia sobre a constitucionalidade da lei.

Quem pode propor a ação?Os legitimados a propor a ADC, segundo o artigo 13 da Lei 9.868/99, são os

seguintes:

Art. 13. [...]

I - o Presidente da República;

II - a Mesa da Câmara dos Deputados;

III - a Mesa do Senado Federal;

IV - o Procurador-Geral da República.

Como se vê, a lei fechou e reduziu o rol dos legitimados para propositura da

ADC. Na ADIn, embora restrita, a lista é mais extensa. No cotejo dos legitimados

para as duas ações, observa-se que na ADC ficaram excluída as Mesas de Assem-

bleias Legislativas e a Câmara do Distrito Federal, os governadores, o Conselho

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Ação declaratória de constitucionalidade

Federal da Ordem dos Advogados, os partidos políticos e as confederações sindi-

cais. Consoante o STF, a listagem é numerus clausus:

AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE. LEGITIMAÇÃO. CF, art. 103, §4.º.

I - A ação declaratória de constitucionalidade poderá ser proposta apenas pelo Presidente daRepública, pela Mesa do Senado Federal, pela Mesa da Câmara dos Deputados ou pelo Procura-

dor-Geral da República. CF, art. 103, §4.º, com a redação da EC 3/93.II - Agravo não provido. (Tribunal Pleno, ADC – AgR 2, Rel. Min. Carlos Velloso, j. 07/08/1997).

Conteúdo da petição inicialO artigo 14 da Lei 9.868/99 arrolou os requisitos da petição inicial da ADC:

Art. 14. [...]

I - o dispositivo da lei ou do ato normativo questionado e os fundamentos jurídicos do pedido;

II - o pedido, com suas especificações;III - a existência de controvérsia judicial relevante sobre a aplicação da disposição objeto da açãodeclaratória.

A inicial deve trazer os requisitos essenciais dispostos no Código de Processo

Civil (CPC) (arts. 282 e 283), acompanhada dos documentos indispensáveis à sua

propositura.

Além da obrigatoriedade de apresentar o dispositivo de lei ou ato normativo

questionado, acompanhado dos fundamentos jurídicos e do pedido, a lei ordena

que se traga a existência da controvérsia judicial – que seja relevante – sobre aaplicação da disposição objeto da ação declaratória, porquanto a função do STF

não é consultiva.

A Corte Suprema assim já se manifestou:

AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE. PROCESSO OBJETIVO DE CONTROLE NOR-MATIVO ABSTRATO. A NECESSÁRIA EXISTÊNCIA DE CONTROVÉRSIA JUDICIAL COMO PRESSU-POSTO DE ADMISSIBILIDADE DA AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE. AÇÃOCONHECIDA.

– O ajuizamento da ação declaratória de constitucionalidade, que faz instaurar processo obje-

tivo de controle normativo abstrato, supõe a existência de efetiva controvérsia judicial em tornoda legitimidade constitucional de determinada lei ou ato normativo federal . Sem a observânciadesse pressuposto de admissibilidade, torna-se inviável a instauração do processo de fiscali-zação normativa “in abstracto”, pois a inexistência de pronunciamentos judiciais antagônicosculminaria por converter a ação declaratória de constitucionalidade em um inadmissível instru-mento de consulta sobre a validade constitucional de determinada lei ou ato normativo fede-ral, descaracterizando, por completo, a própria natureza jurisdicional que qualifica a atividadedesenvolvida pelo Supremo Tribunal Federal. – O Supremo Tribunal Federal firmou orientaçãoque exige a comprovação liminar, pelo autor da ação declaratória de constitucionalidade, daocorrência, “em proporções relevantes”, de dissídio judicial, cuja existência – precisamente em

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Ação declaratória de constitucionalidade

239

função do antagonismo interpretativo que dele resulta – faça instaurar, ante a elevada incidên-cia de decisões que consagram teses conflitantes, verdadeiro estado de insegurança jurídica,capaz de gerar um cenário de perplexidade social e de provocar grave incerteza quanto à vali-dade constitucional de determinada lei ou ato normativo federal [...] . (Tribunal Pleno, ADC-MC8, Rel. Min. Celso de Mello, j. 13/10/1999).

Indeferimento liminar da inicial pelo relatorO artigo 15 da Lei da ADC prevê as hipóteses de indeferimento liminar da ini-

cial pelo relator: quando a petição for inepta, não fundamentada ou manifesta-

mente improcedente.

No que couber, é aplicável também as regras do CPC (art. 295), podendo o

magistrado, se for o caso, mandar emendar a inicial.

A ausência de fundamentação jurídica pode ocorrer quando o requerente seabstiver de demonstrar os motivos jurídicos que está questionando no ato que

quer que seja declarado constitucional, porquanto ao STF é vedado o exercício de

adivinhação da tese jurídica proposta.

A improcedência manifesta dá-se quando o relator vislumbra o insucesso

patente e futuro da ação, assim como na ADIn. Pode ocorrer quando o STF já

se manifestou em caso idêntico, incidentalmente. Há improcedência manifesta

também quando a constitucionalidade do ato ou da norma questionada é tão

assente que a instauração da ação ofenderia o princípio da economia processual.

Da decisão que indefere a liminar, cabe agravo em cinco dias. Aqui, deve-se

fazer uma analogia aos artigos 545 e 557, parágrafo 1.º, do CPC. Por coerência,

esse recurso somente é cabível em caso de exame singular da peça inicial, res-

tando, por óbvio, que, se submetida à apreciação do Plenário, descabe o recurso,

porquanto se está diante do último grau recursal existente na ordem jurídica

brasileira.

Andamento da açãoRecebida a inicial, será aberta vista ao Procurador-Geral da República para

que se pronuncie no prazo de 15 dias. A presença do representante do Ministério

Público (MP) como fiscal da lei é essencial, nos casos de propositura da ação pelos

três primeiros legitimados do artigo 13 da Lei 9.868/99. Se porventura ele for o

propositor da ação, evidente que a vista dos autos torna-se desnecessária.

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Ação declaratória de constitucionalidade

O artigo 20 da lei reitera a concessão de poderes instrutórios ao relator

que, de ofício, em caso de necessidade de esclarecimentos acerca da matéria

ou circunstância ou, ainda, se verificar alguma insuficiência de informações,

poderá requisitar dados adicionais, até mesmo por perícia, e oitiva de pes-

soas com experiência e autoridade na matéria, com o objetivo de firmar seu

convencimento.

O relator poderá ainda solicitar aos tribunais em geral como está se verificando

a aplicação da norma questionada no âmbito da respectiva jurisdição.

Realizados esses procedimentos, o relator lançará relatório nos autos e pedirá

dia para julgamento.

Ação cautelar em açãodeclaratória de constitucionalidade

O STF, por decisão da maioria absoluta de seus membros – oito ministros, se

presentes todos (onze), e seis ministros, se presente o quorum mínimo de oito –,

poderá deferir pedido de medida cautelar na ação declaratória de constituciona-

lidade, consistente na determinação de que os juízes e os tribunais suspendam o

 julgamento dos processos que envolvam a aplicação da lei ou do ato normativo

objeto da ação até seu julgamento definitivo. É o que consigna o artigo 21 da Lei

da ADC.

A crítica que pode ser feita a esse artigo é a de que a Constituição atribui efei-

tos contra todos e é vinculante apenas às decisões de mérito e definitivas – com

trânsito em julgado – e não às liminares.

Dessa forma, todo o Judiciário brasileiro restará afetado com essa medida.1

1 AÇÃO DECLARATÓRIA DE CONSTITUCIONALIDADE. OUTORGA DE MEDIDA CAUTELAR COM EFEITO VINCULANTE. POSSIBILI-DADE. – O Supremo Tribunal Federal dispõe de competência para exercer, em sede de ação declaratória de constitucionalidade,o poder geral de cautela de que se acham investidos todos os órgãos judiciários, independentemente de expressa previsãoconstitucional. A prática da jurisdição cautelar, nesse contexto, acha-se essencialmente vocacionada a conferir tutela efetivae garantia plena ao resultado que deverá emanar da decisão final a ser proferida no processo objetivo de controle abstrato.Procedente.

O provimento cautelar deferido, pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de ação declaratória de constitucionalidade, além deproduzir eficácia “erga omnes”, reveste-se de efeito vinculante, relativamente ao Poder Executivo e aos demais órgãos do PoderJudiciário. Procedente.

A eficácia vinculante, que qualifica tal decisão – precisamente por derivar do vínculo subordinante que lhe é inerente –, legitimao uso da reclamação, se e quando a integridade e a autoridade desse julgamento forem desrespeitadas. (STF, Tribunal Pleno,ADC-MC 8, Rel. Min. Celso de Mello, j. 13/10/1999).

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Ação declaratória de constitucionalidade

241

Concedida a medida cautelar, o STF fará publicar em seção especial do Diário

Oficial da União a parte dispositiva da decisão, no prazo de dez dias, devendo o

tribunal proceder ao julgamento da ação no prazo de 180 dias, sob pena de perda

de sua eficácia.

 Julgamento da ADC pelo Órgão Pleno do STFA decisão colegiada da ADC deverá ser tomada se presentes pelo menos oito

ministros do STF.

Efetuado o julgamento, proclamar-se-á a constitucionalidade ou a inconstitu-

cionalidade da disposição ou da norma impugnada, se num ou noutro sentido

tiverem-se manifestado pelo menos seis ministros. É a necessidade de maioria

absoluta, sob pena de suspensão do julgamento até que o quorum mínimo sejaestabelecido.

Proclamada a constitucionalidade, julgar-se-á improcedente a ação direta ou

procedente uma eventual ação declaratória; e, proclamada a inconstitucionali-

dade, julgar-se-á procedente a ação direta ou improcedente uma eventual ação

declaratória. É o que se denomina de teoria dos sinais trocados, adotada pela Lei

9.868/99.

Questão de suma importância envolvendo a ADC diz respeito àquilo que a

doutrina chama de teoria dos sinais trocados, ou seja, a ação direta de inconstitu-cionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade perseguem resultados

diferentes. Porém, as decisões, quando inversas, considerando-se uma e outra

ação, produzem o mesmo resultado, por coerência. Assim, o efeito vinculante

também é aplicável à ADC.

Questões importantes da ADCA decisão que declara a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade da lei

ou do ato normativo em ação declaratória é irrecorrível – por ser exarada pelo

órgão maior da Corte Máxima do país – ressalvada a interposição de embargos

declaratórios, não podendo, igualmente, ser objeto de ação rescisória.

Dez dias após o trânsito em julgado da decisão, o STF fará publicar em seção

especial do Diário da Justiça e do Diário Oficial da União a parte dispositiva do

acórdão.

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Ação declaratória de constitucionalidade

A decisão terá efeito contra todos (órgãos do Poder Judiciário e Administração

Pública federal, estadual e municipal). Após sua publicação, produzirá efeitos de

coisa julgada, sendo desnecessária a remessa do feito ao Senado Federal para

suspensão da execução, como é feito no controle difuso.

Quadro comparativo dos efeitos da ADIn e da ADC

ADIn ADC

erga omnes erga omnes

ex tunc, exceto a previsãodo artigo 27 da Lei 9.868/99.

ex tunc , exceto as restriçõesconstantes no artigo 27 da Lei 9.868/99.

Efeito vinculante: também é aplicávelà ADIn, em razão da teoria dos sinais trocados.

Efeito vinculante (CF, art. 102, §2.º): efeitovinculante em relação ao Poder Executivoe demais órgãos do Poder Judiciário (sehouver desobediência à decisão de declara-ção de constitucionalidade, o recurso cabívelé a reclamação – que originará uma ordemao desobediente para que acate a decisãodo STF. O Poder Legislativo e o STF não ficamvinculados à decisão da ADC.

Liminar/cautelar: artigos 10 e 11 da Lei9.868/99. O STF reconhece efeito vinculanteà decisão concessiva de medida liminar.Pode haver a paralisação dos processosem curso que envolvam a matériaconstante na ADIn.

Liminar/cautelar: artigo 21 da Lei 9.868/99.Tem efeito vinculante a decisão concessivade medida liminar (Lei 9.868/99, art. 21,caput ). Pode haver a paralisação dosprocessos em curso que envolvam questõesreferentes à lei discutida na ADC.

ConclusãoA ação declaratória de constitucionalidade, também conhecida como ação de

resguardo constitucional, visa espancar dúvidas sobre a constitucionalidade

de leis ou de atos normativos federais.

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Ação declaratória de constitucionalidade

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Ampliando seus conhecimentosSugerimos a leitura das obras abaixo:

Código de Processo Civil Comentado: legislação processual civil e extravagante,

de Nelson Nery Junior, editora Revista dos Tribunais.

Moreira Alves e o Controle de Constitucionalidade no Brasil , de Gilmar Ferreira

Mendes, editora Saraiva.

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Wellington Pacheco Barros

Considerações geraisEntre as ações de proteção à Constituição Federal (CF), como a ação direta

de inconstitucionalidade (ADIn) e a ação declaratória de constitucionalidade 

(ADC), a ação de arguição de descumprimento de preceito fundamental  (ADPF)

se destaca por sua modernidade e pelo caráter de subsidiariedade. Nesseaspecto, é de se ressaltar que a ação, embora não possa ser ajuizada existindo

outras formas de controle constitucional, no entanto, será sempre possível,

mesmo que superadas as outras formas de controle jurisdicional.

Para melhor compreensão, situemos o ajuizamento de uma ação popular.

Mesmo que essa ação seja julgada procedente e o ato administrativo lesivo

ao patrimônio público tenha sido declarado e o processo tenha sido extinto,

pode o legitimado ajuizar a ADPF para que o Supremo Tribunal Federal (STF)

 julgue se houve ou não violação a preceito fundamental. Em uma visão tipi-camente processual, é possível concluir-se que a coisa julgada somente assim

pode ser considerada se não atentar contra preceito fundamental esculpido

na CF.

Portanto, é bom ter sempre presente que a ADPF retrata uma demanda

que tem por objeto evitar ou reparar lesão a preceito fundamental resultante

de ato do Poder Público e com isso preservar a integridade constitucional,

que é a base jurídica maior do Estado de Direito Nacional.

Preceito fundamentalMas o que vem a ser um preceito fundamental? São valores jurídicos de

extrema importância na ordem social e que por isso foram incorporados à CF.

Podem-se citar, dentre outros, como preceitos fundamentais, os fundamentos

da República e as cláusulas pétreas.

Arguição de descumprimentode preceito fundamental

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Arguição de descumprimento de preceito fundamental

Quanto aos primeiros, cabe o seguinte elenco:

o Estado Democrático de Direito (CF, art. 1.º, caput);

a soberania nacional (CF, art. 1.º, I);

a cidadania (CF, art. 1.º, II);

a dignidade da pessoa humana (CF, art. 1.º, III);

os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (CF, art. 1.º, IV );

o pluralismo político (CF, art. 1.º, V).

Quanto às cláusulas pétreas:

direitos e garantias fundamentais (CF, art. 5.º);

direitos sociais (CF, art. 6.º a 11);

forma federativa do Estado brasileiro;

separação e independência dos poderes;

voto universal, secreto, direto e periódico.

Base constitucional e legalA base constitucional da ADPF está assentada no artigo 102, parágrafo 1.º, da

CF, no qual se estabelece que a competência para seu julgamento é do STF, na

forma da lei. E essa lei a que se refere o mandamento constitucional é a Lei 9.882,

de 3 de dezembro de 1999. O artigo 1.º dessa norma assim preleciona:

Art. 1.º A arguição prevista no §1.º do art. 102 da Constituição Federal será proposta peranteo Supremo Tribunal Federal, e terá por objeto evitar ou reparar lesão a preceito fundamental,resultante de ato do Poder Público.

Parágrafo único. Caberá também arguição de descumprimento de preceito fundamental:

I - quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativofederal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição;

Como se infere a partir da leitura do citado artigo, o objetivo da ação é prevenir

ou reparar lesão a preceito fundamental, impedindo que o Poder Público pratique

determinado ato ou, caso praticado, anule-o.

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Arguição de descumprimento de preceito fundamental

247

Registre-se que tal ato, inclusive, pode ser uma omissão (“deixar de fazer”) da

Administração, direta ou indireta, e seus respectivos órgãos, ou até mesmo por

um particular no exercício de função pública ou delegada pela Administração

(ex.: serviços notariais). Frise-se que o ato de particular que venha a descumprir

direito fundamental se sujeita ao controle jurisdicional ordinário.

A arguição pode se dar tanto pelo procedimento independente, no caso de

descabimento de ADIn, por exemplo, quanto pela via incidental. Sobre a forma

incidental pertinente o balizado de Nery Junior (2003, p. 1.444):

O incidente criado pela LADPF, artigo 1.º, parágrafo único, funciona como verdadeira prejudi-cial de inconstitucionalidade, porquanto a Corte Constitucional (STF), quando for relevante ofundamento da controvérsia constitucional, poderá ser chamada a pronunciar-se a respeito damatéria (erga omnes) e vinculante aos demais órgãos do Poder Público.

A utilização da arguição pela via incidental faz com que seja antecipada a solução sobre a inter-pretação, pelo STF, de preceito constitucional fundamental quando o feito ainda se encontrasub judice a instância ordinária. Não se trata de “avocatória”, pela qual o STF requisitaria o processo edecidiria a lide, por inteiro, subtraindo do juiz natural o exame da causa. Ao contrário, o incidentefunciona como uma espécie de um juízo prévio acerca da interpretação pelo STF, do preceitoconstitucional fundamental questionado no juízo ordinário. Assemelha-se mais ao incidente deinconstitucionalidade (ou prejudicial de inconstitucionalidade) dos países europeus que têmcorte constitucional. Não fosse assim o incidente seria inconstitucional como inconstitucionalse nos afigura a avocatória.

A arguição de descumprimento de preceito fundamental é meio de controlede constitucionalidade de leis e atos normativos. Isso porque, nas restritas hipóte-

ses de não cabimento de ADIn, caberá ADPF relativamente a Lei Federal, estadual

ou municipal, ainda que anterior à Constituição.

Veja-se que até mesmo lei municipal pode ser contestada no STF por essa via.

No procedimento comum, é vedado ao STF examinar ação direta de inconstitu-

cionalidade de lei ou ato normativo municipal frente à CF. É uma inovação no

controle de constitucionalidade das leis.

A jurisprudência do STF é uníssona em inadmitir controle de constitucionali-

dade, pela via da ADIn, para lei ou ato normativo editado em momento anterior à

promulgação da CF porquanto sequer recepcionadas. Entretanto, caso se queira

discutir a constitucionalidade, o artigo 1.º, I, da Lei da ADPF autoriza essa possi-

bilidade.

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Arguição de descumprimento de preceito fundamental

LegitimadosQuem são os legitimados para propor essa ação? O artigo 2.º da Lei 9.882/93

dirime essa indagação, indicando que são os mesmos para a propositura da ADIn

(CF, art. 103). Aclarando-se essa remissão, tem-se que os agentes políticos, os órgãos

públicos e as pessoas jurídicas legitimadas são as seguintes:

Art. 103. [...]

I - o Presidente da República;

II - a Mesa do Senado Federal;

III - a Mesa da Câmara dos Deputados;

IV - a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal;

V - o Governador de Estado ou do Distrito Federal;

VI - o Procurador-Geral da República;

VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;1

IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

Como a ADPF é de interesse de toda a sociedade porquanto trata de maté-

ria constitucional, comum ao povo, é despicienda a comprovação de pertinência

temática de cada um dos legitimados para propor a ação, embora o STF já tenha

se manifestado em sentido contrário.2

A lei prevê uma hipótese para que um particular solicite a propositura da

ADPF, mediante representação, ao Procurador-Geral da República (exercícioconstitucional do direito de petição), que examinando o caso, à margem de sua

discricionariedade, decidirá ou não pela propositura da medida (Lei 9.882/99, art.

2.º, §1.º). É uma forma indireta do cidadão denunciar a violação de um preceito

fundamental de seu interesse. O STF já entendeu pela ilegitimidade do particular

para ajuizar diretamente a ADPF:

1 No ajuizamento da ação o partido político deve ter, no mínimo, um representante no Congresso Nacional, se perdê-la, mesmoassim, o processo não deve ser extinto;

2 AÇÃO DIRETA. ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO INCISO VI DO ARTIGO 93 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL NA REDA-ÇÃO DADA PELA EMENDA CONSTITUCIONAL 20/98. – Em se tratando de Mesa de Assembleia Legislativa – que não é daquelasentidades cuja legitimação ativa para propor ação direta de inconstitucionalidade lhe é conferida para a defesa da ordem jurídicaem geral –, em nada lhe diz respeito, para sua competência ou para sofrer os seus efeitos, seja constitucional, ou não, o preceitoora impugnado que se adstringe à determinação da aposentadoria compulsória dos membros do Poder Judiciário, inclusiveestadual, aos setenta anos de idade. E a pertinência temática é, segundo a orientação firme desta Corte, requisito de observâncianecessária para o cabimento da ação direta de inconstitucionalidade. – Ademais, não tendo sido atacado o artigo 93, VI, da Consti-tuição em sua redação originária, e que seria também inconstitucional pelos mesmos motivos que o seria na redação da EmendaConstitucional 20/98, não é de conhecer-se, também por esse fundamento, a presente ação, segundo o entendimento já firmadopor esta Corte na ADIn 2.132. Ação direta não conhecida. (ADIn 2.242, Tribunal Pleno, Rel. Min. Moreira Alves, j. 07/02/2001).

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Arguição de descumprimento de preceito fundamental

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AGRAVO REGIMENTAL EM ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL.

2. Ação proposta por particular.

3. Ausência de legitimidade. Somente podem propor ADPF os legitimados para a ação direta deinconstitucionalidade (art. 2.º, I, da Lei 9.882/99).

4. Pedidos de suspensão de bloqueio de bens e de sentença.

5. Subsidiariedade da ação. Os pedidos que podem ser pleiteados com eficácia pelas vias pró-prias.

6. Entendimento do relator do acórdão de que o critério há de se fazer quanto a uma relação desubsidiariedade entre processos de índole objetiva.

7. Agravo desprovido. (ADPF 11/AgR, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sydney Sanches. j. 18/11/2004).

Requisitos da inicialO artigo 3.º da Lei da ADPF elenca alguns requisitos da petição inicial:

Art. 3.º [...]

I - a indicação do preceito fundamental que se considera violado;

II - a indicação do ato questionado;

III - a prova da violação do preceito fundamental;

IV - o pedido, com suas especificações;

V - se for o caso, a comprovação da existência de controvérsia judicial relevante sobre a aplica-ção do preceito fundamental que se considera violado.

Além dos requisitos essenciais dos artigos 282 e 283 do CPC, aplicáveis no

que couber, a lei estabeleceu os elementos indispensáveis à propositura daADPF.

Por óbvio, a peça portal deve mencionar o preceito fundamental que se acha

violado, apresentando o ato questionado com a respectiva prova de que houve

ameaça ou descumprimento do preceito constitucional. O acesso a documentos

que se encontrem no poder da autoridade pública é perfeitamente possível pelo

exercício do direito de petição ou por um requerimento ao relator para que for-

neça os elementos probatórios.

Há três possibilidades de pedido:

que a lei ou ato normativo atacado sejam declarados inconstitucionais;

que se impeça a prática do ato pela iminência da violação a preceito fun-

damental; ou

que anule o ato já praticado.

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Arguição de descumprimento de preceito fundamental

Quando for o caso incidental, o autor deve demonstrar a ação judicial pendente

de julgamento, no qual se discuta o preceito fundamental, em tese, violado.

A petição que relatar um caso de descumprimento de preceito fundamental,

que desobedecer aos requisitos estabelecidos na lei ou for inepta, conforme o

CPC, será indeferida liminarmente pelo relator da ADPF, segundo o artigo 4.º dalei, sendo aconselhável, antes, que seja determinada a emenda à inicial, nos casos

de irregularidade sanável.

De outra banda, o parágrafo 1.º do artigo 4.º remete ao caráter de subsidiarie-

dade3 da ação, uma vez que não se admite ADPF quando houver outro meio de

sanar a lesividade. Exemplo disso ocorre nos casos em que não se pode ajuizar

ADIn ou ADC.

Da decisão de indeferimento liminar da inicial, caberá a interposição de agravo,no prazo de cinco dias (Lei 9.882/99, art. 4.º, §2.º), nos próprios autos, com o obje-

tivo de fazer com que o órgão colegiado – e não o relator de forma monocrática

– se pronuncie a respeito da irregularidade processual detectada.

LiminarAdmitida a inicial, há algumas possibilidades de concessão de medida liminar.

A primeira delas diz respeito à decisão monocrática do relator, ad referendum doTribunal Pleno, em casos de extrema urgência ou perigo de lesão grave, ou, ainda,

em caso de recesso. Esse poder atribuído ao relator, previsto pelo artigo 5.º, pará-

grafo 1.º da lei, somente poderá ser por ele exercido em casos de real excepciona-

3 ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL (CF, ART. 102, §1.º). AÇÃO ESPECIAL DE ÍNDOLE CONSTITU-CIONAL. PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE (LEI 9.882/99, ART. 4.º, §1.º). EXISTÊNCIA DE OUTRO MEIO APTO A NEUTRALIZAR ASITUAÇÃO DE LESIVIDADE QUE EMERGE DOS ATOS IMPUGNADOS. INVIABILIDADE DA PRESENTE ARGUIÇÃO DE DESCUMPRI-MENTO. RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. – O ajuizamento da ação constitucional de arguição de descumprimento de preceitofundamental rege-se pelo princípio da subsidiariedade (Lei 9.882/99, art. 4.º, §1.º), a significar que não será ela admitida, sempreque houver qualquer outro meio juridicamente idôneo apto a sanar, com efetividade real, o estado de lesividade emergentedo ato impugnado. Precedentes: ADPF 3/CE, ADPF 12/DF e ADPF 13/SP. A mera possibilidade de utilização de outros meiosprocessuais, contudo, não basta, só por si, para justificar a invocação do princípio da subsidiariedade, pois, para que esse pos-tulado possa legitimamente incidir – impedindo, desse modo, o acesso imediato à arguição de descumprimento de preceitofundamental – revela-se essencial que os instrumentos disponíveis mostrem-se capazes de neutralizar, de maneira eficaz, asituação de lesividade que se busca obstar com o ajuizamento desse writ  constitucional. – A norma inscrita no art. 4.º, §1.º da Lei9.882/99 – que consagra o postulado da subsidiariedade – estabeleceu, validamente, sem qualquer ofensa ao texto da Consti-tuição, pressuposto negativo de admissibilidade da arguição de descumprimento de preceito fundamental, pois condicionou,legitimamente, o ajuizamento dessa especial ação de índole constitucional, à observância de um inafastável requisito de proce-dibilidade, consistente na ausência de qualquer outro meio processual revestido de aptidão para fazer cessar, prontamente, asituação de lesividade (ou de potencialidade danosa) decorrente do ato impugnado. (STF, ADPF AgR 17, Tribunal Pleno, Rel. Min.Celso de Mello, j. 05/06/2002).

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Arguição de descumprimento de preceito fundamental

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lidade, quando há impossibilidade de aguardar-se disponibilidade de pauta para

 julgamento.

Entretanto, o procedimento ordinário recomenda que a concessão de liminar

se dê por maioria absoluta dos membros do STF, ou seja, seis ministros devem

votar favoravelmente ao seu deferimento.

É facultado ao relator, no prazo de cinco dias, ouvir o órgão responsável pelo

preceito fundamental violado, até mesmo o Advogado-Geral da União ou o Pro-

curador-Geral da República, a fim de elucidar as questões relativas ao ato ou à

lei questionadas. Frise-se que essa é uma faculdade do relator que pode, sem a

ouvida das partes e em caso de urgência, apreciar a medida initio littis.

Em caso de deferimento da medida, poderá ser determinado que os juízes

suspendam o andamento do processo ou os efeitos de decisões judiciais, ou dequalquer outra medida que apresente relação com a matéria objeto da arguição

de descumprimento de preceito fundamental, salvo se decorrentes de coisa jul-

gada. Pode o STF cassar a decisão do ato impugnado ou inibir a prática dele, ou,

até mesmo, suspender o processo no qual se discute a violação do preceito cons-

titucional.

Andamento da açãoApreciada a liminar, o relator solicitará informações às autoridades responsá-

veis pela prática do ato questionado, em dez dias.

Art. 6.º [...]

§1.º Se entender necessário, poderá o relator ouvir as partes nos processos que ensejaram aarguição, requisitar informações adicionais, designar perito ou comissão de peritos para queemita parecer sobre a questão, ou ainda, fixar data para declarações, em audiência pública, depessoas com experiência e autoridade na matéria.

Findo o prazo das informações das autoridades responsáveis pelos atos impug-nados, o relator, após lançar o relatório, pedirá dia para julgamento. O Ministé-

rio Público, como de praxe, deverá ter vista dos autos, manifestando-se sobre a

demanda, por cinco dias, após o decurso do prazo para informações.

Poderão ser autorizadas pelo relator a sustentação oral e a juntada de memoriais.

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Arguição de descumprimento de preceito fundamental

 JulgamentoNo que tange ao julgamento, a ADPF deverá ser apreciada por, no mínimo,

dois terços dos Ministros do STF (oito) presentes à sessão. É o chamado quorum 

qualificado, igualmente exigido no julgamento de ADIn.

O artigo 10 da Lei 9.882/99 estabelece os procedimentos imediatos ao julga-

mento da ação, os quais merecem transcrição:

Art. 10. Julgada a ação, far-se-á comunicação às autoridades ou órgãos responsáveis pela prá-tica dos atos questionados, fixando-se as condições e o modo de interpretação e aplicação dopreceito fundamental.

§1.º O presidente do Tribunal determinará o imediato cumprimento da decisão, lavrando-se oacórdão posteriormente.

§2.º Dentro do prazo de dez dias contado a partir do trânsito em julgado da decisão, sua partedispositiva será publicada em seção especial do Diário da Justiça e do Diário Oficial da União.

§3.º A decisão terá eficácia contra todos e efeito vinculante relativamente aos demais órgãos doPoder Público.

Tão logo seja julgada a ação, imediatamente, o presidente do STF cientificará

as autoridades envolvidas no ato impugnado. Em caso de declaração de que

efetivamente houve violação a preceito fundamental, a comunicação irá acom-

panhada das condições e modo de interpretação da decisão, a fim de que seja

aplicado corretamente o preceito fundamental violado. A decisão produz efeitodesde logo, independente de ser atacada por recurso.

A publicação da decisão deverá ser feita em 10 dias a partir de seu trânsito em

 julgado, com divulgação no Diário Oficial da União e Diário de Justiça da União.

Destaque importante deve ser feito no parágrafo terceiro do artigo acima

transcrito em que é feita a menção relativa aos efeitos erga omnes da decisão.

Nery Junior (2003, p. 1.453-1.454) assim ensina:

A eficácia do acórdão, quer seja na arguição autônoma, quer na incidental; quer na arguiçãode interesse geral, quer na de interesse subjetivo, fará coisa julgada erga omnes quanto à deci-são do descumprimento do preceito constitucional fundamental, isto é, quanto à interpretaçãoe alcance do preceito. Relativamente quanto à questão subjetiva posta em exame pelo STF, acoisa julgada só operará inter partes (CPC, 472). A eficácia da auctoritas rei iudicatae (coisa jul-gada material) atine, igualmente, a autoridade ou órgão do poder público responsável pela prá-tica do ato questionado, bem como todas as demais autoridades e órgãos públicos da União,Estados, DF e Municípios. Em suma, a decisão do STF sobre o preceito constitucional fundamen-tal é vinculante a todos.

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Arguição de descumprimento de preceito fundamental

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O STF pode, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos

da declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em jul-

gado ou de outro momento que venha a ser fixado, desde que o faça por razões

de segurança jurídica ou de excepcional interesse público. O alcance dessa deci-

são pode chegar tanto à matéria abrangida quanto aos limites temporais em que

ela passa a ter eficácia.

De relevo, referir-se que a decisão proferida na ADPF, qualquer que seja seu

fundamento, seja na ação autônoma ou na incidental, é irrecorrível, exceto por

embargos declaratórios, além do que, não cabe ajuizamento de ação rescisória.

A razão essencial dessas vedações é evidente: o julgamento é realizado pelo Tri-

bunal Pleno da corte máxima do país.

Do descumprimento da decisão exarada pelo STF, caberá reclamação (Lei da

ADPF, art. 13) a fim de que o tribunal garanta a autoridade de sua decisão.

ConclusãoA ADPF é uma das ações de controle da CF que somente se legitima quan-

do exauridas todas as demais formas de controle judicial.

Ampliando seus conhecimentosCódigo de Processo Civil Comentado: legislação processual civil e extravagante,

de Nelson Nery Junior, editora Revista dos Tribunais.

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