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1 ADRIANO PONDÉ HOMENAGEM DOS SEUS EX-ALUNOS NO CENTENÁRIO DO SEU NASCIMENTO

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ADRIANO PONDÉ

HOMENAGEM DOS SEUS EX-ALUNOS NO CENTENÁRIO DO SEUNASCIMENTO

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COMISSÃO ORGANIZADORADra. Anita Guiomar Franco TeixeiraDra. Angelina Maria Pelosi MatosDr. George Barreto Oliveira

REVISÃODra. Anita Guiomar Franco Teixeira

CAPAErnesto Oliveira

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Cabe em nossa memória a recordação daquelesalunos e colaboradores que não estão mais entre nós

Alberto de Azevedo PondéAldrovando VasconcelosArlinda Luzia VerasBoris Lecht FittermanCarlos Edmundo ChenaudDenakê Rodrigues PhilocreonEuvaldo de Araújo Cardoso de MeloHelcio BessaHerval BittencourtHorácio AlbanJayme Nunes da SilvaJosé Moreira FerreiraSilvio Raimundo MonsãoSimão Lecht FittermanWalter AmorimWoquiton Teixeira

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AGRADECIMENTOS

Dr. Paulo GaudenziSecretário da Cultura e Turismo do Estado da Bahia

Dr. Gilson Soares FeitosaPresidente da Sociedade Brasileira de Cardiologia

Dr. Mário Sérgio BacellarPresidente da Soc. Bras. de Cardiologia - secção Bahia

Profa. Consuelo Pondé de SenaPresidente do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia

Enfa. Maria Ivete Ribeiro de OliveiraEx-Diretora da Escola de Enfermagem da UFBa

Professor Emérito da UFBaNeuza Castro

Nutricionista. Presidente da Fundação Cidade Mãee a todas as Pessoas que, direta e indiretamente, colaboraramconosco tornando realidade as homenagens que prestamos à

memória do nosso querido Prof. Dr. ADRIANO DE AZEVEDOPONDÉ, Príncipe dos Cardiologistas Brasileiros,

no Centenário de seu Nascimento

26 de Junho de 2001

A Comissão Organizadora

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Alguns dados Biográficosdo Mestre Adriano Pondé

Como seus alunos e Assistentes, enaltecemos a figura impardo Prof. Pondé, prestando-lhe esta merecida homenagem ereferindo aqui, alguns dos seus dados biográficos:

Completou seus estudos pre-vestibulares no Colégio AntonioVieira, e foi aluno laureado.

Em 1923, teve sua colação de grau pela Faculdade deMedicina e, novamente, como aluno laureado, recebendo aMedalha de Ouro Alfredo Brito.

1926 - Apresentou e defendeu tese de doutoramento sobre“Contribuição para o estudo das Aguas minero – medicinais doItapicuru.

1928 – Tese de Livre Docência, sobre “Em torno da ArtériaPulmonar”, para a Cadeira de Clínica Propedêutica Médica.

1939 - Tese para Professor Catedrático da ClínicaPropedêutica Médica sobre “Infarto do Miocárdio” tese esta que olançou como o Grande Cadiologista.

1945 - Submeteu-se a Concurso de Títulos para transferênciapara a 1ª Cadeira de Clínica Médica.

1948 - Transferência da 1ª Clínica Médica para o recéminaugurado Hospital das Clínicas.

Participou da criação da Escola de Enfermagem.Fundou a Escola de Nutrição da UFBa, elevando-a como a 1ª

Escola de Nutrição de nível universitário.1971 – O Mestre que orientou e ensinou a gerações de

médicos, enfermeiras e nutricionistas, que serviu à Universidadecomo Reitor substituto e, por duas vezes Vice-Reitor, foiaposentado pela compulsória em 26 de junho. Foi alvo de muitashomenagens por serviços prestados da mais alta qualidade e damais grata admiração.

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APRESENTAÇÃO

Este livro é uma coletânea de memórias afetivas dos alunos ecolaboradores de um grande homem que, além de

Professor, foi Mestre de muitas gerações.De temperamento alegre, bondoso, compassivo e, ao mesmo

tempo, irriquieto e sedento de muito saber, ele era entusiasta pelavida, pela Medicina e, principalmente, pelo quanto poderia fazer ao

descortinar novos exames e novas técnicas no tratamento dedoenças crônicas.

Sua garra era ainda maior quando se aproximava de algo novo,desconhecido, das chamadas

“doenças até então por nós ignoradas”.Estamos dedicando este livro à memória de que seus Alunos,

Colaboradores, Familiares, Amigos e Funcionários do

Prof. Dr. Adriano de Azevedo Pondé,

guardam com muito carinho.

Salvador, 26 de junho de 2001

Angelina Maria Pelosi MatosAnita Guiomar Franco Teixeira

George Barreto de OliveiraRubem Tabacof

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Mensagem da Sociedade Brasileira de Cardiologia

Até o meado do século passado predominavam as doençasinfecciosas, parasitárias e carenciais, como principal causa de óbitono Brasil.

Dificilmente ocorreria ao observador comum a idéia damudança do quadro nosológico nos anos vindouros.

Mas, o incremento do tabagismo, uso abusivo de comidaindustrializada, rica por isso em conservantes salgados e emgordura, o sedentarismo e o advento e massificaçõ de uso doveículo automotor, haveriam de mudar essa perspectiva, trazendo-nos a epidemia das doenças cardiovasculares degenerativas dosúltimos anos.

O Professor Adriano Pondé estava entre os visionários queantevinham a necessidade de um enfrentamento organizado doproblema e participou da criação da Sociedade Brasileira deCardiologia dotando, destarte, a comunidade médica, de um fórumque permitisse o desenvolvimento adequado do conhecimentodessa Ciência, e trazendo par a coletividade os benefícios que hojepodemos constatar.

O Professor Adriano Pondé terá sempre um lugar relevante naHistória da Cardiologia Nacional, por essa e outras atitudes.

No seu centenário a SBC alia-se com júbilo às comemoraçõesque muito justamente reverenciam a memória do grande mestre.

Junho 2001

Gilson Soares FeitosaPresidente da SBC

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Mensagem da Sociedade Brasileira de CardiologiaSecção Bahia

A Sociedade Brasileira de Cardiologia - Secção-Ba. sente-sehonrada em participar das homenagens do centenário de tão ilustrebaiano. Ao fundar a nossa sociedade e ser o primeiro presidentedurante alguns anos, criou uma entidade hoje de grande relevânciano meio cardiológico da Bahia e do Brasil,imprimindo-lhe umaforça que sentimos presente em nossas atividades até hoje. Seuespírito inovador e criativo tem mantido elevado o nome destaentidade,legando a seus sucessores uma grande responsabilidadeperante a comunidade médica do Estado e do País. Pôr ondepassou, na Faculdade de Medicina nas cadeiras de Propedêutica eClínica Médica, no ambulatório de cardiologia do Hospital SantaIzabel, na criação da Escola de Nutrição, como vice-reitor daUFBA, construiu parte importante da nossa história intensamentevivida pelo seu espírito de pessoa genial. A sua presença se fazsentir diariamente no quadro de ex-presidentes da nossa sede,mostrando-nos que a vida dignifica as entidades pelo quanto dedoação se lhes pode oferecer. Assim procuramos a cada dia seguir-lhes os passos em respeito à sua memória.

Junho 2001

Mário Sérgio BacellarPresidente

SBC-BA

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ÍNDICE

Adriana Maria Baptista Pondé - sobrinha ........................................................15Aída Maria Ramos Costa de Castro – nutricionista 1a turma* ........................36Almeidina Maciel de Almeida – nutricionista .................................................16Angelina Maria Pelosi Matos – médica assistente ...........................................17Anibal Muniz Silvany Filho - médico ..............................................................19Anita Guiomar Franco Teixeira – interna, médica e assistente........................21Antonio Carlos Nogueira Britto - médico.........................................................29Antonio Carlos Peçanha Martins - médico .......................................................33Assis Fernandes - médico .................................................................................35Beatriz de Paulo Alfredo – nutricionista 1a turma* .........................................36Cléa Almeida – nutricionista 1a turma* ...........................................................36Consuelo Pondé de Sena – prima e afilhada ....................................................38Cremilda Costa de Figueiredo - médica ...........................................................51Edith Tolentino Vieira – nutricionista 1a turma* .............................................36Ernane N. A. Gusmão - médico ........................................................................55Ernesto Simões Neto – médico .........................................................................58Estácio de Lima – (im memoram).....................................................................59Fernando Costa D’Almeida - médico ...............................................................66George Alakija - médico...................................................................................68George Barreto de Oliveira – Prof. Adj. do Dep. de Medicina da UFBa. ........71Geraldo Milton da Silveira - médico ................................................................73Hugo S. Maia - médico .....................................................................................75Ildefonso do Espírito Santo – médico assistente ..............................................78Irmã Joana Calmon Villas – Boas – 1a enfermeira da 1a Clínica Médica........80Jacy Rêgo Vieira – interna, médica e assistente ..............................................82José Antonio de Almeida Souza – médico .......................................................83Joselina Martins Santos - nutricionista ............................................................86Lia Regina Valente Vassilatos – nutricionista 1a turma*.................................36Lúcia Maciel – nutricionista 1a turma*............................................................36

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Luiz Antônio Costa -- médico ..........................................................................88Luiz Muylaert de Azevedo - - médico familiar ................................................89Luiz Ramos de Queiroz – médico e um dos 1o assistentes ...............................90Margot Lobo Valente - médica.........................................................................92Maria de Jesus Valente Monteiro - nutricionista .............................................95Maria Lúcia Pires Santana – nutricionista 1a turma*.......................................36Maria de Lourdes Rocha Santos Burgos - médica............................................97Maria Duarte Sepúlveda - enfermeira ..............................................................98Maria Ivete Ribeiro de Oliveira – enfermeira ..................................................99Maria José de Oliveira – enfermeira ..............................................................102Mário Augusto Jorge de Castro Lima - médico ..............................................106Myriam Fraga - poeta .....................................................................................109Nícia Maria Biscaia – nutricionista 1a turma* .................................................36Osvaldo Devay de Souza – (in memóriam) ....................................................113Penildon Silva - médico..................................................................................115Roberto Figueira Santos - médico ..................................................................119Rodolfo Teixeira - médico..............................................................................134Rubem Tabacof - médico ...............................................................................137Ruy Machado da Silva - médico.....................................................................143Sergio Santana Filho - médico........................................................................144Silvio de Alcântara Vieira – médico e assistente............................................147Sylvio Santos Faria - amigo ...........................................................................148Yolanda Pondé de Senna – nutricionista 1a turma* .........................................36

* Apresentação Grupal

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HOMENAGEM AO “DINDO”,MEU TIO ADRIANO

Lembro quando criança nas festas em sua casa à Rua Oito deDezembro quando íamos todos os sobrinhos, pois todos eram seusafilhados e o chamávamos “Dindo”.

A noite, quando ele chegava, nos colocávamos à frente do seuvelho carro “ OPEL VERDE ” de Placa nº 49 e cantávamos “ALATA VELHA” “A LATA VELHA”.

Faziam parte da turma Nininha, Adriana, Gilda, Myriam,Joãozito, Lafayetinho, Jorge e Fernando, Lula e Marita Novis que ochamavam carinhosamente Vô Ano (Vovô Adriano) e MaritaFrank.

Ele dirigindo com seu sorriso paternal cuidadosamente evagarosamente para não tocar em nenhum de nós.

Dindo: - esta é a lembrança carinhosa, homenagem de suasobrinha e afilhada

Adriana Maria Baptista Pondé

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O Idealista

O ideal do grande mestre Adriano Pondé era o de criar aEscola de Nutrição na Universidade Federal da Bahia. Com a suabrilhante inteligência, já naquela época, tinha a certeza daimportância da Nutrição na prevenção e na cura das doenças.

Assim, em 1956 com o apoio do Magnifico Reitor Prof. Dr.Edgar Santos e por instância do Prof. Pondé foram dados osprimeiros passos para a realização desse sonho. Fui contratada ejuntamente com Sônia Moreira Alves de Souza iniciamos, noHospital das Clinicas, a organização do Serviço de Nutrição eDietética que serviria de base para a implantação da Escola: osonho do renomado mestre foi concretizado e para gáudio daUniversidade ele a dirigiu por 15 anos.

O Prof. Adriano Pondé era um visionário e distinguia-se peloseu humanismo, ideal de servir, cavalheirismo, trabalho esimplicidade no trato. Acreditava nas pessoas e lutava de formadevotada pela saúde dos menos favorecidos.

A 1a Clinica Médica foi a sua trincheira de onde defendeu elutou pelos princípios da boa medicina.

Maio 2001

Almeidina Maciel de AlmeidaNutricionista

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Professor ADRIANO AZEVEDO PONDÉ

Fazer um comentário sobre o Professor ADRIANO PONDÉcom quem mantive um convívio de mais de 30 anos de profissão ésempre muito grato à condição de sua aluna, e sua assistente noserviço de 1ª Clínica Médica da UFBA.

Reporto-me ao ano de l948, no início do 2º ano médico,quando dois colegas de anos mais avançados estimularam o meudesejo de participar de um serviço no Hospital das Clínicas, ondepodíamos encontrar um ensinamento disciplinar muito apurado, porparte do professor, de seus assistentes e dos seus internosdoutorandos, tanto que a equipe de alunos de todos as seriesalcançavam um número superior a 20 estudantes.

Daí então o meu convívio diário e permanente com o Prof.Pondé, nas suas aulas, às visitas às enfermarias, onde eramdiscutidos os prontuários dos pacientes com toda aquela equipe, deestudantes e professores, e com seu grande empenho em estimulara leitura de revistas estrangeiras, de livros didáticos para quesempre permanecêssemos atualizados nos assuntos da Clinicamédica e principalmente nos assuntos condizentes com aCardiologia, sua grande meta. Desse tempo os trabalhos sobredoenças de Chagas, a febre reumática com repercussão nasválvuloplastias, as cardiopatias congênitas e a hipertensão arterial edoença arterial coronariana em seus estudos sobre ateroesclerose.

De sua tese sobre infarto do miocardio, o aspecto da prevençãoda ateroesclerose das coronariopatias, os estudos sobre os lipídios eas dietas apropriadas. Nesse afã de progredir veio a necessidade deintroduzir o estudo da nutrição e com muita garra se empenhou emfundar a Escola de Nutrição, onde vislumbrara o grande avanço quetraria à medicina em todos os seus aspectos, incluindo também seugrande papel social e político aos povos de todo o mundo.

Assim seguia a trajetória do Prof. Pondé até que instalada aReforma, Universitária e o limite de idade o fizeram afastar-se da

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FAMED e de sua 1ª Clinica Médica porem não arrefeceram oanimo de servi-la como também à Universidade que sempre tinhacontado com seu trabalho, desde a sua participação no ConselhoUniversitário até ocupar o lugar de Vice Reitor e depois o de Reitorpelo espaço de dois anos, tempo conturbado no cenário políticobrasileiro e no qual se empenhou com coragem para manter aautonomia do ensino universitário.

Fora do convívio universitário, veio a amizade duradoura denossas famílias, a admiração pelo seu lar onde a presença de donaMARIA DO CARMO trazia harmonia e tranqüilidade ao seuespirito de HOMEM DA MEDICINA E DA CULTURA.

Dessa época seus estudos sobre os médicos de NapoleãoBonaparte, o aprofundamento da obra de Proust, com a qual sedeliciava. Consultar sua vasta biblioteca, reler o que mais gostava,escrever na sua maquina, ter aulas de inglês ininterruptamente paranão esquecer a pratica, já que ele que havia estudado nos livros delíngua francesa e alemã, e pudesse acompanhar a evolução damedicina agora sob o domínio da América do Norte, suasanotações em fichário dos artigos que mais lhe interessavam, eramna realidade a ocupação preferida depois do seu consultório.

Essa é a pequena trajetória que posso escrever a respeito doProf. ADRIANO PONDÉ que com a sua privilegiada inteligência,o amor ao estudo, nos deixou como legado o exemplo do seutrabalho desprendido pela medicina e por seu semelhante.

Angelina Maria Pelosi Matos

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VIVÊNCIAS ACADÊMICASProf. Adriano Pondé

A década de 1940 foi perturbada pelo conflito da chamada 2ªGrande Guerra. Iniciei meu curso de formação médica na vigênciadas hostilidades. E quase no meado do curso as vi terminar. Foiuma fase de muita turbulência e expectativas, mas que me ajudou aamadurecer. Desde o primeiro ano, apliquei o tempo acadêmicodisponível em tarefas voluntárias, de minha própria iniciativa,tentando aprender já ao tempo, um pouco da arte médica.Freqüentei com assiduidade o Laboratório de Histologia,exercitando-me na técnica, confeccionando os preparados para osestudos microscópicos e, depois, parti para as análises laboratoriaisclínicas, no velho Hospital Santa Isabel, na época o hospital –escola da Faculdade de Medicina.

No final do 2º ano passei a trabalhar, com racional destinaçãode tempo, na enfermaria S.Vicente e no necrotério, onde inicieimeu preparo como patologista. Com Roberto, Cícero Adolfo e atutela do Prof. José Olimpio investia no aprendizado dapropedêutica e nos difíceis meandros da Clínica Médica. Namesma enfermaria, à moda da época, alinhavam-se muitos leitosonde pacientes desbonados procuram tratamento. Nesta enfermariaconheci Adriano Pondé. Muito bem apessoado, com óculosbrilhantes de lentes espessas, atraia pela simplicidade e serenidade.Todos o tinham em alto conceito, não só pelas atitudes corretas,mas pela competência. Foi, talvez o primeiro especialista.Dedicou-se especialmente a Cardiologia, valorizando o empregodo ECG, largamente. Para os antigos clínicos, formados à modafrancesa apegados ao estestoscópio, sinais e “tino clínico”,representava uma revolução. Antecipava-se o mestre ao advento danova medicina, mais instrumentalizada e factual, que viria assomarno após guerra.

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Adriano Pondé lia e escrevia inglês e procurava constanteatualização. Era, sem dúvida, um comportamento novo naFaculdade, cujos professores, na sua maioria, tinham formação àfrancesa. Por este fato era considerado por muitos de seus pares,como um inovador. Sempre o apreciei pela modéstia e convicçãode seus propósitos acadêmicos. Era um predestinado. Pude oassistir argüindo teses, quando analisava cientificamente o trabalhodos candidatos à vida acadêmica, sempre com muita proficiência eincontestáveis segurança e modernidade.

Jamais fui um aproximado do professor. O destino, creio, nãonos ensejou, senão, em ocasiões excepcionais, quando manteve amesma serenidade, correção e lhaneza de trato, que meencantavam. Assisti o seu decaimento físico, o mesmo que meassalta agora.

Por certo mereceu justas homenagens, mas, esta, por ocasiãodo centenário de seu nascimento, parece-me a mais convincente deseu valor, pois partida de seus alunos passados assistentes,delineia, com linhas fortes, o mérito que um Mestre mais deseja-oapreço daqueles a quem ajudou a tornarem-se também Mestres.

Anibal Muniz Silvany FilhoProf. Livre de Anatomia Patológica

de Histologia e Embriologia da FAMED da UFBA.

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Em homenagem aoProf. Adriano de Azevedo Pondé,

cabe-me contar uma história que começou em8 de Maio de 1945

Pela primeira vez, fui ao Hospital Santa Izabel, acompanhadapelo acadêmico de Medicina Luiz M. Azevedo, meu futurocunhado e primo do Prof. Pondé. Ao me ver, pergunta-me quemsou e o que queria: ‘Falar ao Senhor e solicitar sua permissãopara...’

-“Minha filha, hoje não é dia de trabalho. Você não ouviu orádio? Paris foi libertada pelas Forças Aliadas. HOJE é um dia defesta: terminou a 2ª Guerra Mundial !”

E, imediatamente, começou a cantar a Marselheza: Allonsenfant de la Patrie...

Com a chegada de seus assistentes, Lydia Paraguassú, JoséMoreira Ferreira, Walter Amorim, nos tornamos um grupo decantores pouco afinado e improvisado. Enfim, aquele dia que setornou feriado para toda a Humanidade foi, para mim, aconcretização do que esperava do Prof. Pondé - além de ser OProf. de Cardiologia, era um homem-coração, com um amor tãogrande que, como nos falou o Anibal Silvany, “Só quem ama écapaz de ouvir estrelas”.

Isto aconteceu em 1945, ano importante na vida do MestreAdriano e na minha própria vida; estava cursando a 2ª sériemédica, mas já tinha um aprendizado adquirido no Pronto Socorrodo Canela , cuja diretora era irmã prima-freira, que convidou-me aacompanha-la no serviço de orientação a um grupo de auxiliares deenfermagem. Aprendi rápido e sempre que podia ia visitá-la eajuda-la. Tantas vezes isso aconteceu que fui um dia convidada ainstrumentar numa urgência. Após o vestibular, frequentei

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oficialmente o serviço da Pupileira onde encantei-me com queaprendi em laboratório com Dr. Estácio Gonzaga. O Prof. Pondé aosaber de ‘tantos conhecimentos’ disse-me: “Ainda falta muitopara chegar aonde você quer”. Recomendou-me ao Prof.Leocádio como pessoa a ser aceita como estagiária, apesar de serapenas um segundo anista de Medicina.

A re-descoberta da Doença de Chagas, se deu neste ano.Regressando de um Congresso, ele trouxe uns insetosPanstrongilus Megista (barbeiro) e explicou algo ao Prof.Leocádio. Não prestei atenção; eles se revezavam em olhar omicroscópio e depois deram por terminada a pesquisa. Falaram queesperavam encontrar o tripanosoma cruzi, mas as lâminas nadamostraram. Dirigiram-se à outra sala e ficaram falando de quedevia ter sido encontrado o tripanosoma, pois aquele barbeiroestava infectado.

Ouvindo isso, peguei a lâmina e coloquei-a sob o microscópio:e o que vi, me fez falar alto: Professor, venha ver se é isso que estáno campo? Vieram apressados e logo confirmaram o achado.Enquanto o Prof. Leocádio percorria outros campos, ele meperguntou: “Em que ano você está?” e, antes de minha resposta,falou: “A partir de agora, você é a minha interna”. E confirmouesta afirmação, dando-me este título no livro que escreveu eindicando meu nome para ser a Interna da 1ª Cl. Médica, de 1947 a1949.

A pesquisa da doença de Chagas em Salvador e em cidadesonde ele sabia que havia um profissional seu amigo, explodiu emtrabalhos organizados. Casos suspeitos chegavam e eramexaminados pelos seus assistentes acima mencionados além deRubem Tabacof e Luis R.de Queiroz.

De início, começamos indo em caravana, aos sábados, adiversos bairros de Salvador, como caronas dele e do Prof.Leocádio. Além deles, a Lydia Paraguassú, Walter Amorim, JoséMoreira Ferreira e eu. Estacionávamos próximos a casebres e acasas de barro. Após nos apresentarmos como médicos, eexplicado o motivo, em geral recebiam-nos de boa vontade e

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franqueavam nossa entrada para esmiuçar as ‘locas’ onde, de dia,se escondiam os barbeiros. Em algumas casas encontramos sob ocolchão barbeiros e, em outras, o percevejo ‘doméstico’... Quantatristeza sentimos percebendo tanta miséria e sujeira, e doençasdecorrentes.

Colhíamos os exemplares colocando-os em frasco tipoNescafé que, após vedados, rotulados com nome e endereço,levávamos ao hospital e o examinávamos sob a orientaçãosupervisão do Prof. Leocádio.

Um outro trabalho referente à re-descoberta da doença deChagas, foi o xenodiagnóstico, exame que usava barbeiros criadosno laboratório, chamados de ‘virgens’, isto é, por terem sidocriados desde o ovo e considerados não infectados e nãoinfectantes.

Esses barbeiros sugavam pacientes cardiopatas, com coraçãobovino, ou com bloqueio de ramo ao eletrocardiograma, ou porviverem sob o mesmo teto onde, alguém, já havia sidodiagnosticado como portador ou doente de Chagas. Neste trabalho,contamos com a ajuda das funcionárias Helena e Creusa, quecriavam galinhas para alimentar barbeiros, enquanto não apareciampacientes- candidatos ao xenodiagnóstico.

A fixação de complemento foi inicialmente um trabalho deparceria com o Instituto Manguinhos no Rio de Janeiro. Colhíamoso sangue do paciente, retirávamos o soro, colocávamos emampolas estéreis, fechávamos a maçarico, acomodávamos em caixae levávamos pessoalmente à agencia da Varig que levava a seudestino, como cortesia.

A apresentação do trabalho de toda a equipe foi destaque noCongresso de Cardiologia. E dele saíram premissas que foramencaminhadas ao Governo Federal e a muitas autoridades em todosos Estados pelos representantes das Sociedades presentes.

O perigo do sangue contaminado ser mais uma possibilidadediagnóstica da doença de Chagas, começou a ser motivo de nossasconversas. A internação de uma paciente que veio do ProntoSocorro, onde recebera sangue de mais de 8 doadores e apresentara

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Insuficiência Renal Aguda. Após sua recuperação, surgiu-lhefebre que perdurou por mais de 42 dias e, re-internada pelo Prof.Pondé com forte suspeita, foi confirmado tratar-se de um casoagudo de doença de Chagas, pós transfusional. Levado àapresentação em duas Sessões Clinicas, divulgada entre oscientistas brasileiros, a paciente continúa gozando boa saúde em2001, sem apresentar sinais de descompensação.

Este fato levou o colega Silvio Monsão a pesquisar quantotempo vivia o tripanozoma em sangue infectado e em geladeira:mais de 21 dias.

O resultado desta pesquisa causou grande impacto no serviçode transfusão de sangue: primeiro, tornou-se uma exigênciapesquisar em cada doador tanto quanto à presença de tripanosoma,como realização da fixação de complemento. O sangue positivoestocado era desprezado imediatamente; e o doador era convidadoa comparecer ao Serv. Social onde era informado e conscientizadoa submeter-se a exames indicados. Acreditamos que foi um grandepasso para reduzir a transmissão sanguínea da d. de Chagas;entretanto, quantos doadores ‘aparentemente saudáveis’ foramexaminados, diagnósticados apenas...? e sairam sem receberqualquer orientação sobre a continuidade das visitas ao serviço,afim de que qualquer novo conhecimento lhe fosse oferecido.Infelizmente continuamos sem uma política social em saúde,ignorando os sofridos e sofredores. Em alguns poucos pacientes foiusada a Penicilina em alta dose e medicamentos em experiência(Roche AT-2?), cujo uso também não revelou qualquer benefício.

Outros estudos feitos em Ribeirão Preto pelo médico bahianoPedreira de Freitas, que verificou que a adição de solução de azulde metileno ao sangue colhido, como inibidor e destruidor dotripanosoma cruzi. As trocas de informação eram sempre em mãodupla.

Com todos estes conhecimentos que tiveram origem dacuriosidade, da tenacidade e da ousadia do Prof. Adriano Pondé,tivemos nós seus alunos e auxiliares a oportunidade de sermoscapazes de pensar alto e de sonhar com a resolução de certos

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problemas de saúde que nos deixam ainda atados como parte doterceiro mundo.

É preciso garra e entusiasmo pela vida, afim de irmos além doque nos parece ser o necessário. Entusiasta pela vida, o Prof. Pondéia além do esperado. Ensinou a todos nós a ordem, a organização, osentido de equipe, a compaixão, a responsabilidade e, muito mais..Um verdadeiro ‘gentleman’, foi admirado e muito querido portodos nós.

Acrescento a seus maiores feitos alguns outros dos quais fuium dos participantes:

O primeiro caso de paciente em coma por diabetes mellitus foiinternado às 14 horas e todos nós fomos chamados a colaborar.Nada sabíamos sobre tratar um caso como aquele; comunicamosnosso receio em dar cobertura a tal situação. Porém o resultado nosvaleu uma grandiosidade de aprendizado. Nós, assistentes einternos, nos revezamos durante 72 horas, enquanto o Prof.Adriano e Prof. Leocádio, nos assessoravam com uma freqüênciadesejada, em tempo suficiente para irmos creditando a favor deEremita, a paciente, e de nós, a confiança do conhecimento e darecuperação. Com a necessidade de termos o resultado de examescom a urgência necessária, ele solicitou do chefe de laboratório apermanência de técnicos ‘em torno do relógio’. E o Serv. deEletrocardiografia nos fornecia o resultado da onda T - ‘expressãoimpressa, apesar de grosseira, dos níveis de potássio sérico’.

Na área da Angiologia, o uso de ‘coquitel’ com novocaina,acetilcolina e antibióticos injetados lentamente por 2 horas, naartéria femural de pacientes com doença vascular obliterante demembros inferiores. Os casos tratados obtiveram alta, semprecisarem da cirurgia. Entretanto o custo x duração do tratamentoe benefício, avaliado pelo Prof. Pondé, foi considerado de custoinaccessível.

A diálise peritonial, utilizada tanto em pacientes renais, quantoem hepáticos que, muitas vezes apresentavam a insuficiênciacardíaca como consequência.

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A punção – biopsia hepática e renal, e até a punção domiocárdio em época em que apenas o Raio X era um dos grandesavanços na Medicina.

Estimulou os hematologistas a realizarem a punção da medulaesternal.

Como verdadeiro Medico de familiar, ensinava a pacientescardíacos, como ‘retirar’ o sal da ricota, fazendo verdadeira diálisedo alimento. Enfim, tudo que o Prof. Pondé aprendia, procuravaensinar a um maior número de pessoas. Assim pensava ele.

Sabia falar com seus pacientes e familiares. Tinha paciência emuito jeito sugerindo e valorizando o ambiente harmônico comopeça fundamental na cura. Falava da compaixão que devemos tercom quem está sofrendo, da ajuda que cada um pode dar semsuperproteger o paciente, da confiança que cada assistente deveriatransmitir.

A Escola de Enfermagem teve nele um grande estimulador. Asprimeiras turmas receberam a informação diretamente do Prof.Pondé; e nós, seus assistentes, o substituimos, quando dedicouparte de seu tempo e trabalho como vice Reitor.

1958: A história da fundação Escola de Nutrição é expressãode um de seus sonhos tornado realidade. Acredito que foi o seumais arrojado empreendimento, reflexo inconsciente do quevisualizara Hipócrates (400 anos a C), quando vaticinou:

“Que o alimento seja o teu remédio, e que o remédio seja oteu alimento”.

Em 1965, estavam ele e d. Carmem em férias, em Paris, edepois Estados Unidos, quando soubemos que o ensino deNutrição em todo o Brasil seria considerado de nível médio.Comunicamos a ele este ‘movimento’; logo de imediato decidiuregressar e defendeu veementemente seu interesse em beneficiar aUniversidade, considerando o desenvolvimento do estudo dealimentos como Programa de Saúde de valor inestimável.

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Assim, era ele: “Quem não luta pelos seus direitos não édigno de merece-los”.

E o finalmente, como parte desta história:O Prof. Pondé cursou no Colégio Antonio Vieira e foi aluno

que recebeu muitos prêmios e, quando se graduou, recebeu amedalha de mérito.

Estudou Medicina na nossa ancestral Faculdade de Medicinano Terreiro de Jesus, onde defendeu suas teses de doutoramento e afamosa tese sobre enfarte do miocárdio.

Foi nomeado assistente do Prof. Prado Valadares, seu mestre aquem devotava especial carinho. Ocupou a Cadeira dePropedêutica Médica – excelente propedeuta – e depois transferiu-se para a 1ª Cadeira de Clínica Médica onde permaneceu até acompulsória.

Recém formado, conheceu a jovem carioca Maria do Carmodo Amaral Lebre, que visitava Salvador juntamente com a primaAdelina, (sobrinhas do Almirante Francisco das Neves, Capitão dePortos em Salvador e casado com uma prima da família Pondé).

O romance entre eles, Prof. Adriano e d. Carmem, foi seladocom breve namoro e casamento no Rio de Janeiro. Quase todos osirmãos e seus Pais estiveram presentes e sempre mantiveram umespecial carinho por d. Carmem, a Tatá de Nininha, Yolanda,sobrinhos e afilhados. Para o Prof., D. Carmem, a Madame e,muitas vezes, a Yayá.

Viveu e existiu sempre a seu lado como esposa, assessora,secretária, datilógrafa e bibliotecária. As revistas estrangeiras(francesas, alemãs e inglêsas) tinham seus resumos datilografadose ordenados por assunto. Em sua casa e depois em seu apartamento-ambos na Graça-, o enorme quarto de estudo tinha as paredes‘forradas’ até o teto com estantes cheias de livros e revistas. Asprincipais novidades eram revistas por d. Carmem e os resumosantigos, somados ao mais recente, eram apresentados ao Prof. Aordem em guarda-los, impressionava-me quando ia ajuda-la; muitoaprendi com ela.!

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Por muitos anos d. Carmem participou de Obras Sociais emSalvador que muito contribuiram para a sociedade bahiana. Figuradestacada nas rodas sociais, mantinha grandes amizades.

Pura fidalguia, era o viver do casal. Recebiam em sua casaamigos, alunos, colegas brasileiros e estrangeiros, com um estiloprimoroso.

O traço mais importante era o afeto que eles deixavamtransparecer, lindo demais, nascido na mocidade, ele já formadoem Medicina - o seu Yoyô - e ela, a Grande Mulher que existe portrás de todo Grande Homem.

* * *

Por alguns anos, o Prof. Pondé continuou atendendo em seuconsultório, à rua da Ajuda – Ed. Bahia, e em visitas domiciliares,como Médico de Família.

Deixou a todos nós um grande legado: seu senso de humor esua sabedoria, da qual considerava ser ele apenas um canal:distribuía a quem estivesse disponível a aprender, jamais seconsiderava dono do saber.

Um traço marcante de sua auto-estima: admirava suaassinatura como representação de si mesmo.

Acreditava que o sobrenome Pondé fosse de origem francesa.Trazia uma forte inclinação por tudo que lhe significasse a França:amava Paris, admirava Proust e freqüentemente expressava-se emfrancês:

“En Medicine comme en amour, on ne ditni jamais, ni toujours!”

Em 4 de junho de 1987, veio a falecer em Salvador – Bahia.

Junho, 2001

Profª. Drª. Anita Guiomar Franco Teixeira

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ADRIANO PONDÉ — LENTE DE MEDICINAE INTELECTUAL

Na cidade da Bahia, o sol achava-se no zênite, na quadracanicular. Ao introduzir-me na loja de alfarrábios, regado porcamarinhas de suor, fui guiado por um chupista, que evolava, dosbeiços, o fumo em espiral do último tabaco ordinário. Encaminhei-me até a estante onde, em atmosfera asfíxica, miasmando o recinto,falta de luz, com bafio típico de umidade, bolor e fungos, jaziamancianas obras sobre medicina. Tateante, exumei precioso livro deantanho. Impado de satisfação, olhos ardentes de santificadaconjuntivite causada pela poeira em suspensão perlustrei ofrontispício do trabalho científico:

EXPOSÉ ANALYTIQUEDES

PRINCIPAUX TRAVAUXD'ANATOMIE, DE PHYSIOLOGIE

D'HYGIÈNE, DE CHIRURGIE, DE MÉDECINE PRATIQUEET

DE LITTÉRATURE PHILOSOPHIQUEDE

P. A. PIORRYP. A. PIORRYP. A. PIORRYP. A. PIORRYCHEVALIER DE LA LÉGION D'HONNEUR

A L'APPUI DE SA CANDIDATURE A L'ACADÉMIE DES SCIENCES(Section de Médecine et de Chirurgie).

A ParisCHEZ J. -B. BAILLIÈRE

LIBRAIRE DE L'ACADEMIE IMPÉRIALE DE MÉDECINERue Hautefeuille, 19

—1856

E emocionei-me com a dedicatória lavrada: "Ao caro collegaAdriano Pondé como lembrança do seu brilhante concurso —ilegível — Rio, 1939".

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Adquirido, o livro foi "entronizado" no "altar" da minhamodesta biblioteca, ladeando "A Oração do Paraninfo" - Prof.Adriano de Azevedo Pondé - Discurso proferido na solenidade dacolação de grau dos doutorandos em Medicina (125.ª turma), a 19de dezembro de 1945; "Discursos na Academia" - Adriano Pondé eZitelmann de Oliva; Revista da Academia de Letras da Bahia -Volume XXIII - 1973/1974, onde estão lavrados os magníficostrabalhos do mestre Adriano Pondé em derredor de Marcel Proust:"A doença e os últimos dias de Marcel Proust" e "Marcel Proust:Asma e Estilo"; "Discurso de saudação proferido pelo Acadêmico,Professor Plínio Garcez de Sena, em 20 de setembro de 1977",durante a posse do professor Adriano de Azevedo Pondé naAcademia de Medicina da Bahia; Dr. João Pondé Filho -"Syndrome Iliaca Direita - These Inaugural - Approvada comdistincção - Cadeira de Clinica Cirurgica - 1925". Miro com muitocarinho, postados ao lado das sobreditas obras: Sóror Mariana -"Cartas de Amor ao Cavaleiro de Chamilly" - D. Francisco Manuelde Mélo - "Carta de Guia de Casados" - "Pela Terra Alheia" (2volumes) e "Ultimas Farpas", de Ramalho Ortigão. Os ditos livrosde lusos autores são extremamente valorizados e enriquecidos pelofato de conterem o autógrafo do inesquecível Adriano Pondé, comsua característica de caligrafia cursiva, de belo efeito estético,traçada de modo corrente.

No Hospital das Clínicas, na bela e organizada enfermaria da1ª Cadeira de Clínica Médica, sob a égide do ilustre e ilustradomestre Pondé, encontrava-me a examinar, um tanto acanhado, oprecórdio de um sertanejo que enfermara de moléstia do coração.No claustral sossego do acolhedor e asseado cômodo amplo,destinado ao tratamento dos padecentes, imaginando-meinteiramente só, cismativo, buscava decifrar, solilóquio, osenigmáticos enunciados de autoria do professor Prado Valladares,tais como: “Cronognose de um sopro cardiaco: criterio dacoincidencia esfigmica, critério da análise do tom livre”. – “Soproscardiacos: nova tentativa taxonômica”. – “Sopro circular de MiguelCouto” e “Sopro cormico de Garcez Fróes: analise destas especiessemiotecnicas à luz das leis de propagação” – “Eletividade cardio-sinistra das lesões adquiridas: uma conjectura patogenica". -"Galope auricular e galope ventricular: definição destas especiespela traqueo-broncofonese de Eteocles Gomes”.

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Subitâneo, tive o pressentimento que alguém se encontravaatrás de mim, observando-me e atentando para as minhasconjeturas, vagas e confusas, ante o desconfiado olhar do pacienteinteriorano. Voltei-me, e lá estava o notável professor, de olharplácido por detrás de óculos de grossa armação e hastes, refulgindode seu arcangélico semblante um terno sorriso. Blandíloquo, à luzda moderna ciência da cardiologia ensinou-me os conceitos atuaiscotejados com os preceitos do grande Prado Valladares, ele, quecom suas mãos iniciou o magnífico Adriano Pondé no magistériomédico, conforme é reconhecido no seu discurso, no ensejo daposse na Academia de Letras da Bahia.

Ao lado de Adriano Pondé, seus assistentes davam alma eenergia, além de singular encantamento aos estudantes quefreqüentavam a Clínica Médica - 1ª Cadeira. Os estudantestestemunhavam a virtude da exemplar atuação didática einexcedível proficiência dos jovens professores Anita G. FrancoTeixeira, Angelina Pelosi, Antonio Ferreira Lima, Alberto Pondé eElias Cheade.

Na minha timidez, própria de um tabaréu, sentei-me na últimafila do Salão Nobre da imortal Faculdade de Medicina da Bahia,para haurir prazerosamente o discurso que seria recitado peloprofessor Adriano Pondé na sua oração de posse em a noite de 5 demaio de 1970. Emocionou-me, deveras, a sua assertiva, bastanteatual: "A MEDICINA NÃO SE DESUMANIZARÁ" — evalendo-me do seu discurso escrito, relembro-me, lendo-o: "Osprogressos da Ciência transformaram profundamente a Medicinaem seus métodos de exame e de pesquisa, porém não lhemodificaram as nobres inspirações que a animam e divinizam"..."A natureza espiritual confere dignidade à pessoa humana, quedeverá ser respeitada e preservada na defesa de seus direitosessenciais e imperecíveis."... "A Medicina não se desumanizará.Porque o homem continuará a ser, em qualquer tempo, o metro detodas as coisas. Uma vida poderá nada valer — nem sequer valer apena de viver — mas, nada haverá no mundo que valha umavida."... "A tecnologia nos transporta a surpresas fascinantes nosdomínios da Medicina! Desde a corrida para o transplante dosórgãos, até o prodígio de máquinas eletrônicas que apresentarão odiagnóstico em tempo mínimo e com toda a exatidão... Ah! asmaravilhas da informática nos domínios da clínica!"... "A técnica,todavia, não é uma finalidade: é o resultado humano. Falta-lhe a

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alma... Falta-lhe a primazia do sentimento... o "pathos", — quetanto domina a razão, como a vontade."...

O Jornal do Cremeb em agosto e setembro - Nº 82 e outubro -Nº 83, publicou trabalhos inéditos, de minha autoria, frutos defontes primárias, com o título "Banhos nas agoas thermaes da Maid'Agoa do Sipó" - (1831 a 1874). Antes da pesquisa ir para aprensa, mestre Jesuino Netto, suspensa a sessão do InstitutoBahiano de História da Medicina, recomendou-me a leitura da teseinaugural de Adriano Pondé, defendida em 1923, versando sobre aságuas do Itapicurú. Estudei-a, de imediato, atento. Magnífico eatual trabalho do doutorando Adriano Pondé, intitulado"Contribuição para o estudo das águas minero-medicinaes doItapicurú".

No lutuoso 4 de junho de 1987, a morte de Adriano Pondé fezum vácuo na medicina nacional. É impossível avaliar a catadupa delágrimas que a saudade o velou, o pranto com que oreconhecimento o consagrou, o crepe do sentido luto com que asociedade baiana e a classe médica o envolveram nasmanifestações eloqüentíssimas da gratidão da Bahia, pois Adrianode Azevedo Pondé, que tão nobremente serviu a Medicina, ilustroua Bahia lacrimosa, que ainda hoje chora por ele, vertendo lágrimasda mais acrisolada saudade, que é graça que suaviza, desafogo queliberta e ternura que balsamiza.

O professor Adriano de Azevedo Pondé, dignificou a minhaturma de médicos de 1960, graduados pela Faculdade de Medicinada Universidade da Bahia, ocupando no tradicional álbum e nocoração de cada um dos formados a merecida homenagem deHonra ao Mérito.

Antonio Carlos Nogueira Britto*

* Vice-Presidente do Instituto Bahiano de História da Medicina.

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Professor Adriano Pondé:uma lembrança

No ano em que se comemora o centenário de nascimento dosaudoso Professor Adriano Pondé, achei oportuno prestar essedepoimento no que tange a sua imágem de professor, sem detalharo seu extenso currículo, que certamente será melhor abordado porseus colaboradores, mas enfocando as suas qualidades de médicoobstinado e de mestre. Na Faculdade, mantivemos contato, quandoera estudante do quarto ano médico, passando pela 1ª cadeira declínica médica, e depois como docente. Lembro-me muito bemdaquele professor de fala mansa, distinto, sempre sorridente, eassíduo na sua enfermaria. Nesta, estavam sempre em suacompanhia, as suas fiéis assistentes, as Dras Angelina Pelosi eAnita Teixeira, que juntamente com o seu sobrinho Dr João deSouza Pondé Neto, tocavam o serviço. No ambulatório, lá estavamos Drs Renato Senna e Jorge Leocádio, todos com atividades nocurso de graduação, que lamentavelmente, hoje está sendo cadavez mais esquecido. Era um professor atuante, cumpridor dos seusdeveres, sempre solícito, muito embora não fosse homem decobranças exigentes.Delegava-as assim, às Dras Anita eAngelina.Entretanto, o que mais me marcou na sua vida, era o seugrande amor e obcessão pelo exercício profissional.Possuidor deuma clínica particular invejável na época, era de uma dedicaçãoextrema aos seus clientes, com horário de entrada, mas sem hora desaida.Atendia a todos com o mesmo humor, sempre com umapalavra de conforto, e jamais se negando aos atendimentosdomiciliares,muito comuns naquela época. Viveu assimintensamente a sua profissão, enquanto teve forças. Dou o meutestemunho desse desempenho, diante do seu comportamento naenfermidade da minha mãe, quando presenciei as suas lágrimas deemoção no seu falecimento precoce.Naquela ocasião, eu era um

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adolescente de quinze anos que nunca tinha visto um médicochorar. A partir daí, passei a amar a minha profissão. Após esseepisódio, continuou médico de meu pai, seu fraternal amigo ecolega, ainda por muitos anos. Por tudo isso, nào poderia deixar deprestar-lhe essa homenágem por um preito de gratidão a um grandemestre, introdutor da cardiologia na Bahia, médico por excelênciae admirável figura humana.

Antonio Carlos Peçanha Martins

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ProfessorDr. ADRIANO DE AZEVEDO PONDÉ

Freqüentei a 1ª Clínica Médica do Hospital Escola (Hospitalda Clínicas) do 2º ao 6º ano de medicina, onde tive a honra deconhecer e conviver com o ilustre e saudoso Professor AdrianoPondé.

Fidalgo no trato com seus assistentes, seus discípulos e demodo muito especial com seus pacientes.

Inteligência, cultura, dedicação e modestia.Além de médico e professor, foi também líder da classe

médica. Um dos fundadores da ABM – Associação Bahiana deMedicina., em outubro de 1942, fazendo parte da Diretoria nacondição de Vice-Presidente, tornando-se seu Presidente nomandato imediato.

Já na década de 70, quando fui Presidente da ABM, havendocumprido dois mandatos, tive a honra de contar com a visita, quasemensal, aos sábados pela manhã, do ilustre Professor com quemtrocávamos ideias sobre as ocorrências Medico-Sociais da época.

O nome do PROFESSOR ADRIANO DE AZEVEDOPONDÉ honra e dignifica a Medicina e a Bahia.

Assis FernandesMédico

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Quem foi Dr. ADRIANO PONDÉpara a Escola de Nutrição

da Universidade Federal da Bahia?

Como professor Catedrático de Clínica Médica no Hospitaldas Clínicas, sentiu a necessidade de ampliar os recursos médicos,para exercício imediato na área de Dietoterapia, como já existentesno Sul do País e para tanto não poupou esforços para a criação danossa Escola de Nutrição.

A dedicação e o entusiasmo desse reconhecido estudiosomédico humanista, também especialista em Cardiologia, colocaramtodo o seu coração a serviço do objetivo a que se propôs.

A responsabilidade de formar profissionais habilitados levou-oa escolher, nas diversas Unidades Universitárias, entre osprofessores, o melhor dos melhores e que partilhavam com ele omesmo ideal.

Fundador, Diretor e Coordenador, com seu dinamismo trouxeà Escola, nutricionistas de comprovada habilitação paradesenvolverem a parte prática.

No contato diário na Escola passou seu entusiasmo a umpequeno grupo integrante da 1ª Turma, que no decorrer dos anosde estudo atuou em Hospitais e clínicas de Cidade, bem como emcomunidades carentes nos arredores, despertando para asdesigualdades sociais.

O pioneirismo do mestre em perceber a importância danutrição no tratamento das doenças geneticamente correlacionadas,tais como obesidade, diabetes e doenças cardíacas foi o maismarcante e significativo aspecto ao criar a Escola de Nutrição deUniversidade da Bahia.

Hoje, esta homenagem de seus diletos discípulos em diversasáreas da medicina, à qual nos associamos, na passagem de seucentenário de nascimento, mantém vivos em nossa memória, os

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anos que enriquecemos com o seu convívio e registramos a suafigura entusiasta, tranqüila e fidalga, que nos deixou como mestre,marcante exemplo de espírito universitário.

Disse Bertold Brecht:

“Há homens que lutam um dia e são bons. Há outros que lutam um ano e são melhores. Há aqueles que lutam muitos anos e são muito bons. Mas há os que lutam a vida toda. Esses são imprescindíveis.”

Nós alunas de 1ª Turma da Escola de Nutrição da UniversidadeFederal da Bahia vemos o emérito Professor ADRIANO DE AZEVEDOPONDÉ no patamar dos imprescindíveis.

Beatriz de Paulo AlfredoLia Regina Valente Vassilatos

Edith Tolentino VieiraCléa AlmeidaLúcia Maciel

Maria Lúcia Pires SantanaNícia Maria Biscaia

Aída Maria Ramos Costa de CastroYolanda Pondé Senna

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Homenagem a Adriano Pondé,meu padrinho

Tem-se constituído em curiosidade para mim verificar que osjovens de hoje quase nada sabem a respeito de sua ascendência.Quando muito recuam às informações sobre os avós,desconhecendo as raízes mais antigas de sua progênie.

Quanto a mim, sempre tive o interesse em conhecer os meusancestrais, além de cultivar o convívio com os parentes de ontem ede hoje, gosto este que herdei, certamente, de meu pai, EdístioPondé.

Foi, pois, com satisfação, que recebi o honroso convite paraparticipar deste livro de memória em homenagem ao saudosoMestre da Cardiologia Baiana, Prof. Adriano Pondé.

É que a Adriano Pondé estou ligada por estreitos laços deparentesco e amizade, razão pela qual não posso furtar-me a esseindeclinável dever. Isto porque, era ele primo carnal de meu pai e,consequentemente, meu primo em segundo grau. Além disso, porele e por sua esposa, Maria do Carmo Lèbre Pondé, fui levada à piabatismal, na Igreja de São Pedro, poucos anos após o meunascimento, em data que não sei precisar. Ambos substituíram ocasal – Adriana – João de Souza Pondé, ele conceituado clíniconesta capital, falecido a 14 de setembro de 1934, os quais haviammeus pais escolhidos como patronos do meu ingresso na IgrejaCatólica Apostólica Romana.

A morte, entretanto, não permitiu a consubstanciação desseconvite, tendo tia Adriana, após a morte do marido, sugerido que ocompadrio fosse transferido para o filho mais velho e sua mulher.

Até quanto foi possível ao genealogista Everaldo PedreiraRocha

localizar, em suas pesquisas, a família Souza Pondé, teveorigem no Capitão Antonio José de Souza Mendonça que, no início

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do século XIX, residia na freguesia de Nossa Senhora daConceição do Aporá, município de Inhambupe. Casado com Mariado Nascimento Dórea, faleceram ambos antes de 1853. Desseconsórcio nasceram onze filhos: 1) Inácio Mendes de SouzaPeriquito. 2)Maria Rita de São Félix. 3) Cap. Pedro Nolasco deSouza. 4)Joana Bernardina de Souza. 5) José Joaquim de Santana.6) Carlos Antonio de Souza. 7) Cap. Antonio José de Souza. 8)Cap. Francisco Xavier de Souza Pondé. 9) Maria Procópia Teles deMenezes. 10) Carlota Joaquina do Amor Divino. 11) Ana Porcinade Menezes.

Do oitavo filho do casal, portanto, o único que teria Pondé noseu sobrenome, Francisco Xavier Souza Pondé, procedemdiretamente todos os Pondés.

DESCENDÊNCIA DE FRANCISCO XAVIER DE SOUZA PONDÉ

Nasceu Francisco Xavier de Souza Pondé em Itapicuru, falecendona mesma localidade em 1878. Tendo sido proprietário de uma fazendaem Santa Cruz do Gangu, em Itapicuru, e senhor de engenho no Conde,casou-se, na matriz de Nossa Senhora da Conceição do Aporá, a 6 defevereiro de 1825, com sua prima em 4o grau, Ana Joaquina de SouzaPondé, filha do Capitão Gonçalo de Souza Ormundo e de Angela Patríciade Menezes. Dessa união nasceram 12 filhos: João Joaquim de SouzaPondé, Pedro Faustino de Souza Pondé, Carolina Pondé Mendes daSilva, Minervina Francisca Pondé de Oliveira, Maria Ernestina Pondé deMendonça, Gonçalo Aprigio de Souza Pondé, Joaquim Maturino deSouza Pondé, Manoel Dultra de Souza Pondé, José Raimundo de SouzaPondé, Antonia Laudelina Pondé de Melo, João Maria de Souza Pondé eAntonio de Souza Pondé.

O segundo filho do casal, Pedro Faustino de Souza Pondé, que secasou com sua prima em 3o grau, Oliva Baptista Pondé, deu origem aoramo ao qual pertenço, sendo seus filhos: Ezequiel de Souza Pondé,Pedro Faustino de Souza Pondé, João de Souza Pondé, José de SouzaPondé, Francisco de Souza Pondé e Maria de Souza Pondé, esta últimafalecida em abril de 1884, com apenas sete dias de nascida.

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Sobre Pedro Faustino de Souza Pondé, conhecido como Donzinho, esua mulher, assim escreveu o líder político Severino Vieira, nas páginasdo Diário da Bahia: “Conheci os pais do Dr. Pondé. Dois santos. Ossertanejos vizinhos, quando passavam em frente da casa da fazenda,descobriram-se como diante de um templo. Os filhos todos oscontinuaram. A árvore sarada floresceu e se perpetuou em frutos deperfeição. Ele fez da ciência um apostolado de altruísmo (referia-se aJoão Pondé). E quanto aos seus irmãos foram, como ele, uma geraçãoinsigne de magistrados e médicos: “Ezequiel, o mais velho, membroegrégio dos superiores tribunais do Estado, destacando-se pelo saber epela sisudez ao lado de Felinto Bastos, de Chico Alexandre, de PedroRibeiro e outros vultos. Pedro Faustino, herdeiro do nome e do espíritopaternos, consagrado por toda a Bahia, através uma benemérita carreira,como o “bom juíz”, José, o procurado oftalmologista, Francisco, clínicoe docente livre da Faculdade de Medicina do Pará, do mesmo modoespecializado em estudos no Velho Continente”.

Dado o grande interesse que Adriano nutria pelas origens da suafamília, em sua homenagem, valho-me de algumas informações extraídasdo trabalho inédito do genealogista Everaldo Rocha sobre a famíliaSouza Pondé, a ser proximamente editado, e de outras publicaçõesrelacionadas na bibliografia consultada.

Por ordem cronológica, cabe-me fazer referência inicial a Ezequielde Souza Pondé, a quem os familiares tratavam de tio Pondé, nascidoem Itapicuru (Ba) a 8 de agosto de 1866 e falecido em Salvador a 10 dedezembro de 1942. Tendo-se diplomado em Ciências Jurídicas e Sociaispela Faculdade de Direito do Recife, em 1887, iniciou sua vidaprofissional como promotor público de Monte Santo. Em seguida, foiJuiz Municipal de Tucano, de onde foi removido para Inhambupe, tendosido nomeado juiz de direito daquela Comarca em 1892. Transferiu-sedepois para Alagoinhas, onde funcionou em 1898, tendo sido removidopara a capital, onde passou a atuar na Vara de Comércio. Alcançou oápice da carreira ao ser nomeado desembargador do Tribunal deApelação e Revista. Ocupou a vice presidência do Tribunal de Justiça e aPresidência do Tribunal Regional Eleitoral, de onde foi o primeiro titular.Casou-se com sua prima em 2o grau Maria de Oliveira Pondé, “tiaPequena”, filha do major Faustino de Paula Oliveira e MinervinaFrancisca de Souza. Em seu livro Caminhos de um Magistrado, AdalícioCoelho Nogueira assim o definiu: “Ezequiel Pondé foi uma organização

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inteiriça de magistrado. Sobravam-lhe integridade e consciênciaescrupulosa”. Do mesmo parente, Adalício Nogueira são ainda, asseguintes palavras sobre o velho Ezequiel: “A ascendência que eleexercia no círculo familiar tinha um cunho verdadeiramente patriarcal.Os parentes ouviram-no, e respeitavam-no. As suas opiniões eramdogmas. O escrúpulo que impregnavam as suas atitudes era um modelodigno de imitar-se. A compostura que lhe exornava o comportamentoimpunha-se a todos, como o reflexo de sua inteireza moral”.

Lembro-me de ter freqüentado a sua casa, situada na Ladeira daIndependência no 7, avivando-me a lembrança de sua figura imponente,do seu trajar impecável, suas polainas que tanto me causavam estranheza.Em casa, sempre ouvira meu pai dizer que tio Pondé era um magistradoincorruptível, dono de uma inteligência luminosa, uma personalidademarcante a qual todos reverenciavam. Para nós, descendentes de PedroPondé, o Bom Juiz, seu irmão amado, era tio Pondé o oráculo e o guia, aquem meu avô no leito de morte confiara a família.

Impressionava pela retidão de caráter e sobretudo, para nós, ospequenos, por suportar estoicamente o temperamento ácido de suamulher, tia Pequena. O casal não deixou descendência.

O segundo filho do casal, meu avô, era Pedro Faustino de SouzaPondé, nascido em Itapicuru (Ba), a 12 de fevereiro 1870, viveu apenas54 anos, tendo falecido nesta capital, a 25 de abril de 1925.Bacharelando-se em direito pela Faculdade do Recife, em 1890, foipromotor público de Juazeiro (1891), juiz preparador do termo deParipiranga, ex-Patrocínio do Coité (1853) e de Irará (1897), Juiz dedireito das comarcas de Cícero Dantas e ex-Bom Conselho (1898), deInhambupe (1900), de Amargosa (1914), de Cachoeira, de Alagoinhas(1923) e da Vara de Órfãos e Ausentes, na capital baiana (1926).

Casou-se em Aporá (Inhambupe) com sua prima em 2o grau,Vitalina Mendes Pondé, no dia 28 de junho de 1892. Era ela filha docapitão Antonio Mendes da Silva, senhor do engenho Cipó emInhambupe e de Carolina de Oliveira Pondé. Desse casamento nasceram17 filhos: Maria do Patrocínio Pondé (Cotinha), Ezequiel PondéSobrinho, Antonio Mendes Pondé, Edgard Pondé, Palmira MendesPondé, Edístio Pondé, Mário Pondé, José Pondé Sobrinho, Maria doCarmo Mendes Pondé, Nelson Pondé, Francisco Pondé Sobrinho, JaimePondé, João Pondé Sobrinho, Maria Dolores Pondé Peixoto e ClóvisPondé.

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Sobre meu avô, acerca de quem tenho escrito muitas vezes,confessei certa feita não saber defini-lo – se um juiz ou um santo.Cognominado “O Bom Juiz”, era um temperamento sóbrio e sereno, deuma suavidade incomum, que inspirava confiança e respeito. A seurespeito, entre outras palavras, escreveu Adalício Nogueira: “Eu o vi, porvezes, na austera presidência dos atos judiciais. A minha retina infantilfixou o quadro daquela imponência que não pecava pela excessivarigidez da severidade. A inflexibilidade do seu temperamento de juiz nãotinha a dureza agressiva das almas frias, porque se impregnava dosinfluxos de um coração bem formado. Era justo e bom. Era um misto deenergia e mansidão”.

Ventre bendito o da bisavó Oliva, que gerou cinco figuras estelaresda Bahia, abençoado seio cuja seiva vital alimentou bocas sequiosas dejustiça e de bem. Braços sertanejos e carinhosos que embalaram o sonodaqueles que honrariam a sua terra e a sua gente, tornando-se paradigmasdas virtudes humanas em nosso meio.

O terceiro filho do casal de sertanejos era, precisamente, João deSouza Pondé, que nasceu em Itapicuru (Ba) a 2 de julho de 1874, tendofalecido em Salvador em 14 de setembro de 1934. Ingressou noSeminário de Salvador, mas abandonou a carreira religiosa para a qualnão se sentia vocacionado. Matriculou-se na Faculdade de Medicina daBahia, diplomando-se em 14 de dezembro de 1897. Inicialmente, exerceua profissão em Cruz das Palmeiras (SP) e Madalena (RJ).

Regressando à Bahia, residiu por pouco tempo em Lençóis(Ba),médico do serviço de Profilaxia da Peste Bubônica, médico do Hospitalde Isolamento, médico e diretor do Laboratório Municipal de AnálisesQuímica e Bromatológica (1914), professor livre de higiene daFaculdade de Medicina (1912). Como estudante do 6o ano de Medicina,trabalhara nos hospitais de sangue da Campanha de Canudos, tendo,inclusive, ido ao teatro da guerra, onde lhe foi destinada a missão dereconhecer o corpo do beato Antonio Conselheiro, a quem, segundoconsta, havia conhecido quando criança em Itapicuru.

João de Souza Pondé casou-se a 8 de setembro de 1900 comAdriana Maria Daltro de Azevedo, nascida em 8 de setembro de 1876e falecida, em Salvador, a 9 de julho de 1962. Adriana Maria era filha deAntonio Martins de Azevedo Júnior e de Maria Amélia Daltro deAzevedo, neta paterna de Antonio Martins de Azevedo e de LeopoldinaAzevedo, e materna de José Cerqueira Daltro e de Joana Augusta

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Guimarães Daltro. Desse consórcio nasceram os seguintes filhos:Adriano de Azevedo Pondé, João de Azevedo Pondé, Bernadete deAzevedo Pondé, Francisca de Paula de Azevedo Pondé, Lafayette deAzevedo Pondé, Jaime de Azevedo Pondé, Beatriz Pondé de CastroLima, Regina Pondé Falcão e Alberto de Azevedo Pondé.

Adriano de Azevedo Pondé nasceu em Salvador a 26 de junho de1901, tendo falecido na mesma cidade a 4 de junho de 1987. Diplomadoem medicina pela Faculdade da Bahia, em 1923, foi assistente de clínicapropedêutica de 1925 a 1938, assistente do Instituto Osvaldo Cruz (1925-1938), Chefe do Serviço de Radiologia do Hospital Português (1933-1938), docente livre de clínica propedêutica médica (1928), catedráticode clínica propedêutica (1939-1971), vice-reitor da UFBA, professoremérito da Faculdade de Medicina, membro da Academia de Letras daBahia e presidente da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Era sócioefetivo de IGHB, que hoje presido. Casou-se em 30 de setembro de 1921com Maria do Carmo do Amaral Lebre e Azevedo Pondé, nascida no Riode Janeiro e falecida em Salvador a 7 de março de 1990, de cuja uniãonão houve descendentes.

João de Souza Pondé Filho nasceu em Salvador, a 5 de novembrode 1902, diplomou-se em medicina em 1925, tendo-se casado comDagmar Vaz Baptista filha de Elizeu de Assis Baptista e Anisia Vaz deAssis Baptista, desse consórcio nasceu a única filha Adriana MariaBaptista Pondé.

Maria Bernadete Pondé de Senna nascida em Salvador a 17 demarço de 1904 e falecida em 11 de dezembro de 1982. Casou-se em1924 com o Engenheiro Civil José Soares Senna, que lecionou naFaculdade de Ciências Econômicas, foi diretor de Construções eMáquinas da Prefeitura de Salvador e faleceu em 1939, deixando duasfilhas: Yolanda Pondé de Senna, nascida em Salvador, licenciada emGeografia e História e em Nutrição pela UFBA e Maria do Carmo Pondéde Senna Adeodato de Souza, Nininha, como é tratada na intimidade,nascida em Salvador, no dia 4 de março de 1939 nutricionista pelaUFBA. Casou-se em Salvador, na igreja de São Francisco em 10 deagosto de 1963, com José Adeodato de Souza Neto, químico industrial,filho de José Adeodato de Souza Filho e Dionea Carneiro Adeodato deSouza, com os seguintes filhos: Cláudia Pondé de Senna Adeodato deSouza, nascida em 17 de outubro de 1964 e Adriano José Pondé deSenna Adeodato de Souza.

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Francisco de Paula de Azevedo Pondé (Chiquito), nasceu emSalvador no dia 6 de agosto de 1905. Fez os cursos primário e secundárioem Salvador, ingressando na Escola Militar de Realengo a 12 de marçode 1923, foi declarado aspirante a oficial da Arma de Artilharia em 30 dedezembro de 1935. Tornou-se engenheiro militar, após curso no TME,em 1939, fazendo brilhante carreira no Exército Brasileiro, ondealcançou o generalato, como general-de-brigada a 25 de março de 1956 egeneral de divisão em 1959. Casou-se com Dulce do Amaral LebrePondé, sendo seus filhos Leda Maria Pondé de Serra, arquiteta, que secasou com Teodomiro Serra Filho, também militar, em 25 de agosto de1957, tendo o casal os seguintes filhos: Paulo Nei Pondé Serra, LuizCarlos Pondé Serra, Sérgio Luiz Pondé Serra e Dulce Adriana PondéSerra. Francisco Nei Lebre Pondé, nascido no Rio de Janeiro, engenheirocivil, casou-se com Neide Cerqueira Pondé, sendo pais de Carlos NeiPondé e Tânia Lúcia Pondé.

Lafayette de Azevedo Pondé, nascido a 12 de março de 1907,bacharel em direito pela Faculdade da Bahia (1929). Promotor públicodas comarcas de Remanso, Santo Amaro, Maragogipe e Alagoinhas. Foiprocurador geral do Estado (1935-1938), secretário do Interior e Justiçano governo Landulfo Alves (1938-1942), conselheiro do Tribunal deContas (1940-1957), professor de direito público internacional daFaculdade de Ciências Econômica, professor de Política da Faculdade deFilosoofia, professor de direito administrativo da Faculdade de Direito,diretor da Escola de Administração, reitor da Universidade Federal daBahia, presidente do Conselho Federal de Educação, sócio fundador doInstituto de Economia e Finanças da Bahia, conselheiro da Ordem dosAdvogados, Presidente da Academia de Letras Jurídicas da Bahia,membro da Academia Bahiana de Educação. Casou-se com LourdesMargarida Vaz Porto e Azevedo Pondé, sendo pais de João de SouzaPondé Neto, Gilda Maria Pondé Bastianetti e Lafayette de AzevedoPondé Filho.

Jaime de Azevedo Pondé, nasceu em Salvador a 12 de outubro de1912. Após os cursos primário e secundário feitos na Bahia, ingressou naMarinha, alcançando o Almirantado. Foi comandante do Distrito Navalde Belém do Pará. Casou-se com Helena Fialho, sendo pais de RobertoFialho Pondé, Lígia Maria Pondé Vassalo e Glória Maria Fialho Pondé.

Beatriz Pondé de Castro Lima, nasceu em Salvador, em 10 denovembro de 1910, casou-se com Orlando de Castro Lima, também

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nascido em Salvador, em 20 de agosto de 1907, médico, diretor daEscola Baiana de Medicina e Saúde Pública, nascido em Salvador. efalecido a 28 de março de 1988. Era filho de César de Castro Lima e deLeonor Damásio de Castro Lima, sendo pais de Myriam Castro LimaFraga.

Myriam Fraga é a diretora executiva da Fundação Casa de JorgeAmado. Escritora, pertence à Academia de Letras da Bahia. Casou-secom Carlos Fraga, filho de Albérico Pereira Fraga e Odete Basto Fraga.

Regina Pondé Falcão nascida em Salvador, em 16 de agosto de1912, casou-se com Pedro de Cerqueira Falcão, que se diplomou emmedicina pela Faculdade da Bahia, em 1929. Pedro Falcão especializou-se em oftalmologia e transferiu-se para São Paulo, onde se fixou eexerceu a profissão tendo feito parte da Academia de Medicina local.Nascido em Salvador e falecido em São Paulo a 22 de junho de 1994, erafilho do conselheiro Teófilo Borges Falcão e de Maria das Dores Falcão.O casal não teve descendência. O último filho do casal João de SouzaPondé e Adriana de Azevedo Pondé era Alberto de Azevedo Pondé,nascido a 8 de setembro de 1915 e falecido a 24 de junho de 1978.Diplomou-se em Medicina. Foi professor assistente da Faculdade deMedicina da UFBA e radiologista do Hospital Português. Casou-se comAntonietta Ballalai Alves Pondé, nascida em Salvador, filha de FernandoBallalai Alves e Alzira de Carvalho Alves, tendo o casal um filho, JorgeAlves Pondé. Este, por sua vez, tem também um único filho, MarcosMesquita Pondé, filho do seu primeiro casamento com Lucila Mesquita.

A mesma devoção que possuía meu pai, e seus irmãos, pela figurapaterna repete-se no enlevo com que hoje escuto emocionada LafayettePondé referir-se a seu pai, João de Souza Pondé. Uma saudade que otempo não apaga, uma admiração que cresce com o passar do tempo,uma presença firme e forte quase 67 anos após o seu desaparecimento.Milagre que só a bondade, a retidão, o afeto, a solidariedade constróem eperenificam.

Meu pai, seu sobrinho, tinha por João Pondé uma afeição imensa,afeição que se misturava com a enorme admiração, com a gratidão quelhe devotava sinceramente. Por isso, não se cansava de recordar dadedicada assistência prestada por tio João a minha mãe, assistindo-lhe nasua ausência, nos dias que antecederam ao nascimento de Lúcia. Ouvi,incontáveis vezes, o relato desse momento difícil de meus pais, em que otio atento e prestimoso deu-lhes o apoio de que necessitavam,

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amanhecendo o dia sentado numa poltrona, na casa da Ladeira deSantana, enquanto o sobrinho, no interior, preparava-se para voltar acapital. Esse gesto de solidariedade sempre foi mencionado em nossacasa com especial ternura

Resta fazer referência aos dois últimos filhos do casal Oliva eDãozinho, José e Francisco.

José de Souza Pondé o penúltimo da irmandade, nasceu emItapicuru(BA) a 8 de agosto de 1878. Fez o curso de humanidades nacapital baiana, freqüentando o colégio Spencer, sob a direção do Prof.Alexandre Borges dos Reis, tendo em seguida ingressado na Faculdadede Medicina da Bahia, onde se doutorou em 16 de dezembro de 1900.Diplomado, exerceu inicialmente a clínica em Estância (SE), ondeconheceu aquela que seria a companheira de sua vida, senhoritaprendada, modelo de educação e fineza de trato, Maria do Carmo Dórea(Zulica), filha do sr. Joseph Dórea, empresário naquela localidade. Emseguida, clinicou em Aracajú, onde também, foi inspetor de Saúde dosportos em Sergipe (1903-1907). Neste último ano, seguiu com a jovemesposa para Europa, fixando-se em Paris. Ali permaneceu 2 anos emestudos da especialidade, durante os quais freqüentou no HospitalLariboisière o curso do ilustre oftalmologista Prof. Vitor Mourax.Retornando ao Brasil, passou a clinicar em Salvador, candidatando-se em1914 à livre docência de Clínica Oftalmológica da Faculdade deMedicina e, depois, professor substituto dessa mesma cadeira. Tevecomo competidor o Dr. João Cesário de Andrade. Ambos obtiveram dacongregação igual números de pontos, mas um “empurrão” políticopromoveu a nomeação do seu concorrente. Mais tarde, submeteu-se anovo concurso de oftalmologia, sagrando-se vitorioso. Em 1924, adoeceugravemente, vindo a falecer no Rio de Janeiro aos 46 anos de idade, semdeixar descendência. Seu retrato a óleo, encontra-se na sala dacongregação da Faculdade de Medicina do Terreiro de Jesus.

Francisco de Souza Pondé nasceu em Itapicuru (Ba), a 17 defevereiro de 1880, estudou na sua terra natal, transferindo-se mais tardepara Salvador, onde cursou os preparativos no conceituado ColégioSpencer. Ingressou no Seminário, onde aprendeu francês, italiano e latim,que lhe serviram para o resto da vida. Com apenas 18 anos, matriculou-se na Faculdade de Medicina da Bahia, concluindo o curso médico em1902, após defender a tese Assistência Pública aos Loucos Delinqüentesno Brasil. Em seguida, viajou para Belém(Pa) a fim de tentar a vida no

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norte do país. Em 1911 seguiu para a Europa para ampliar seusconhecimentos médicos, com ênfase na Pediatria. Casou-se, em Paris, naIgreja de Sainte Madeleine, no dia 15 de maio de 1912, com ClorindaTeixeira Pena, senhorita pertencente à mais fina e elegante sociedadeparaense que, na Cidade da Luz, ultimava a sua educação. Tia Zita, comoera tratada na intimidade, foi criada por sua irmã Leonila Pena deOliveira, esposa do Desembargador Napoleão de Oliveira, ambos denobres famílias paraenses.

Ao retornar a Belém, Francisco de Souza Pondé, construiu eleganteresidência na Travessa Ruy Barbosa no 1454, na qual residiu durante otempo em que viveu, vindo a falecer em 24 de fevereiro de 1934, umasemana após ter completado 54 anos. Francisco de Souza Pondé foiprofessor das Faculdades de Direito e de Medicina, no Pará, fundador doInstituto Histórico local e figura de proa no meio intelectual do Estadonortista. O casal teve três filhos: Rui Pena Pondé, (falecido) nascido emBelém (Pa), médico do Ministério da Fazenda, pediatra como o seu pai,casado com Alcinda Tocantins Pondé, sem descendência. Climene PenaPondé, solteira, que desde 1939, com tia Zita e irmãos passou a viver noRio de Janeiro. Clorinda Pena Pondé, (falecida), que foi casada comCláudio Camargo Osório e teve dois filhos: Eliana e Cláudio, este últimotambém desaparecido.

Francisco de Souza Pondé deixou um nome respeitável nos meiosmédicos e social do Pará, sendo patrono da cadeira no 33 da Academia deMedicina local.

Dos cinco Pondés, descendentes de Oliva e Pedro Faustino de SouzaPondé, apenas dois, Ezequiel e José não deixaram descendência.

ADRIANO PONDÉ, O PARENTE MÉDICO

Ao comentar o papel desempenhado pelo parente Adriano Pondé, noseio da família, compete-me ressaltar o seu devotamento e a suasolicitude. Consagrava-se a todos, fossem parentes mais próximos oumais afastados, aos quais dispensando-lhes atendimento carinhoso esolícito. Herdara do velho pai, além da acuidade clínica, a atenção aopaciente e a dedicação sem limite. Tendo João de Souza Pondé,admirável figura de médico, sido justamente considerado um dos

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melhores clínicos de sua época, seguiu-se-lhe o filho mais velho ospassos como autêntico herdeiro de uma legítima vocação.

Aliás, sobre essa afinidade intelectual e profissional com o modelopaterno, teve Adriano a oportunidade de manifestar-se em discursopronunciado no salão nobre da antiga Faculdade de Medicina do Terreirode Jesus, ao ensejo da celebração do centenário de João Pondé: “Sinto-lhe a presença efetiva e orientadora nesse milagre da memóriainvoluntária, em muitas horas de estudo e meditação – conferindo-meenergias e serenidade nos momentos difíceis em que tenho que afirmarminha presença no mundo”.

Em discurso de saudação a Adriano Pondé, proferido peloAcadêmico Plínio Garcez de Sena, em 20 de setembro de 1977, naAcademia de Medicina da Bahia, disse o orador: “Tivestes, pois, afelicidade de ser filho de João Pondé, como igualmente fostes ditoso porter merecido ser filho de D. Adriana de Azevedo Pondé, a quemdefinistes como possuidor daquele espírito da mulher forte da Bíblia,louvada nos Provérbios, criatura dotada de sensibilidade, inteligência e,de acordo com vossas próprias palavras: “Foi a trave e a candeia de nossacasa”.

Adriano de Azevedo Pondé revelou-se desde cedo, tendo sido alunoexemplar dos jesuítas, em cujo colégio do Portão da Piedade logrounumerosas distinções, conforme depõe seu irmão, Professor LafayettePondé. Distinguia-se também pela educação, lhaneza no trato ecordialidade. Fez o curso médico com igual brilhantismo, diplomando-semuito jovem, em 1923. Nessa mesma Faculdade de Medicina realizoumemorável concurso público de títulos e provas, defendendo a teseintitulada: Enfarte do Miocárdio, trabalho pioneiro no país e que, atéhoje, é referência bibliográfica, com o qual obteve a cadeira dePropedêutica Médica. Em 1945, contudo, após concurso de títulos,transferiu-se para a Primeira Cadeira de Clínica Médica, em cujaregência permaneceu até que oficialmente foi afastado das atividadesuniversitárias. Professor Emérito da UFBA, mesmo aposentadocostumava comparecer às reuniões da congregação da Faculdade deMedicina como prova do grande afeto e interesse que dedicava àinstituição.

Idealista, realizador, foi criador da Escola de Nutrição da UFBA, deonde foi diretor durante 15 anos. Dessa unidade de ensino recebeu a 28de maio de 1976, data do vigésimo aniversário de sua fundação,

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expressiva e carinhosa homenagem de reconhecimento pelosinestimáveis serviços a ela prestados. Adriano de Azevedo Pondé foiainda Vice-Reitor da UFBA, conduzindo-se nessa função, e nas vezes emque ocupou interinamente a Reitoria, com competência, descortino eprobidade.

Dotado de cultura sólida e diversificada, lastreada no estudosistemático e no culto às belas letras, alcançou a Academia de Letras daBahia, onde ocupou a cadeira no 8, cujo patrono é o médico e liberalrevolucionário Cipriano José Barata de Almeida.

Adriano de Azevedo Pondé era profundamente afeiçoado à suafamília, estendendo-se em atenções com os parentes, fossem os jovens ouos mais idosos, tanto do ramo materno quanto do paterno. Não tendo tidofilhos ele e Maria do Carmo assumiram, inteiramente, a criação e aeducação da sobrinha, Maria do Carmo Pondé de Senna (Nininha), aquem dedicavam atenção, cuidado e carinho como se fossem seusverdadeiros pais.

Lembro-me muito bem do carinho que dispensava aos Mendes,também Pondés pelo lado materno, a exemplo de Ana Mendes Ribeiro(tia Morena), minha avó, Vitalina Mendes Pondé, sua prima e cunhada,ao Des. João Mendes da Silva, ao Des. Políbio Mendes da Silva, a D.Basílio Mendes Ribeiro O.S.B., aos quais atendia com zelo e solicitude.

Com efeito, não sei de um parente que lhe houvesse solicitado oscuidados médicos e ele houvesse se furtado a atende-lo. Adriano era bome solidário, ungido de paciência e solicitude, enfim um médico admirávelque exerceu a profissão com competência, desprendimento e carinho.

Somos, os filhos de Edístio Pondé, particularmente gratos à atençãoe à solidariedade que dispensou ao primo, especialmente na fase final desua vida. Não só providenciou o tratamento quimioterápico que lheacrescentaria os dias de vida, como esteve ao seu lado, no SanatórioEspanhol, durante um intervenção a que teve que se submeter aquele queo antecederia na trajetória derradeira da existência e no portal daeternidade.

São essas, pois, as palavras que com carinho e saudade, dedico à suamemória, à memória do meu padrinho muito querido, Adriano deAzevedo Pondé.

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Bibliografia consultada

1. E.C. Estância e estancianos, Sergipe e sergipanos e outros.(Crônicas da passagem do século). [s.l.: s.n.] 1965. 6 p.

2. IN MEMORIAM. Discursos pronunciados em comemoração aocentenário de nascimento do Des. Ezequiel de Souza Pondé. Bahia,[s.n.], 1996. 30 p.

3. JUDEX PERFECTUS. Coletânea de artigos, discursos, notas deimprensa e homenagens outras, referentes ao falecimento do Dr.Pedro Faustino de Souza Pondé. Bahia: Imprensa Oficial, 1945, 160p.

4. PANDOLFO, Sérgio Martins. Francisco de Souza Pondé: pioneiro noensino da medicina legal no Pará. An. Acad. Med. Pará, Belém, v.6,p.5-15, 1995.

5. ROCHA, Everaldo Pedreira. Família Souza Pondé. Salvador: EmpresaGráfica da Bahia, 2000. Não paginado (No prelo).

6. SENA, Consuelo Pondé de. Introdução ao estudo de uma comunidadedo agreste baiano; Itapicuru, 1830/1892. Salvador: Fundação Culturaldo Estado da Bahia, 1979. 242 p. (Coleção Cabrália, 8).

Consuelo Pondé de Sena

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Professor ADRIANO PONDÉ- 100 ANOS -

Ao ingressar na Faculdade de Medicina tinha como metaespecializar-me em cardiologia. No afã de inteirar-me dos segredosda profissão, no início do 2º ano consegui estágio na entãodenominada 1ª Clínica Médica, dedicada à Cardiologia e chefiadapelo Professor Catedrático Adriano Pondé, colega e amigo do meupai.

Fui carinhosamente recebia pelo Professor e seus assistentes,ali permanecendo até o 4º ano quando mudei de rumo, cedendo aosencantos da Obstetrícia.

Nunca me desliguei totalmente da 1ª Clínica, onde comecei aaprender tratar os pacientes com amor e integral dedicação, alémde haver recebido a base clínica que me tem sido tão importante navida profissional.

No Professor Adriano encontrei um mestre exemplar,dedicado, amigo, sempre pronto a uma palavra de incentivo, e umexcepcional ser humano. Lembro aqui, com uma doce saudadedaqueles tempos e carinho pela figura do Mestre, uma sua fraquezaque divertia a todos que trabalhávamos na clínica: seu medo nãoconfessado de injeção. Sob a desculpa de que, para aplicação demedicações injetáveis, não confiava em qualquer pessoa, dizia sóaceitar a aplicação por Angelina Pelosi, cuja paciência por todosconhecida era posta à prova nesses momentos.

Lembro-me especialmente de uma ocasião em que, acometidode um processo infeccioso, foi-lhe prescrito Benzetacil (à épocausado para diversas infecções). Nos dias da aplicação ficávamosapreciando Angelina percorrer toda a enfermaria com a seringa na

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mão, atrás do Professor, que, fugindo, dizia ter um paciente aexaminar, uma anotação a ser feita, ou qualquer outro pretexto atéque, esgotadas as desculpas para o adiantamento, rendia-se à suatenaz perseguidora, aceitando o inevitável. Nossa diversão eraobservar as idas e vindas dos dois, sabendo que Angelina, nuncaperdendo a paciência, conseguiria, mais cedo ou mais tarde, acapitulação do paciente recalcitrante.

27/03/01

Cremilda Costa de FigueiredoMédica

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Sempre amigos,Adriano Pondé e Edgard Santos

Ao Dr. Adriano de Azevedo Pondé, devo muito, a partir dequando comecei minha vida profissional, na Bahia, em 1951, comoProfessora de Enfermagem da Universidade Federal da Bahia(UFBA) e como Enfermeira-chefe do Hospital das Clínicas daBahia, ele chefiando a primeira clínica médica.

Ainda jovem, distinguia-se pela sua cordialidade, e pelo seutemperamento, atencioso para quem dele se aproximasse, sendocomum vê-lo sendo sempre cercado pelos seus diligentesassistentes, Dr. Renato Senna, Anita Franco, Angelina Pelosi,Denakê Philocreon e Silvio Monsão.

O Hospital das Clinicas se nos afigurava parte do nosso lar,sem que sentíssemos "desigualdades" mas todos se respeitando.

Em 1956, colegas e sempre amigos, Adriano Pondé e EdgardSantos, Magnífico Reitor da Universidade Federal da Bahia(UFBA), idealizaram e realizaram a nossa Escola de Nutrição, parao que contaram com a experimentada colaboração, vinda do Rio deJaneiro, das Nutricionistas Sônia Moreira Alves de Souza eAlmeidina Maciel de Almeida.

Honroso e prazeroso, foi, para mim, estar sempre a trabalharcom ele, substituindo-o algumas vezes e finalmente, quando da suaaposentadoria.

Alem de Diretor, foi nosso professor de Dietoterapia,distinguindo-se também como amigo solidário de professores,estudantes, funcionários e colegas. Seu gabinete estava sempreaberto e acessível a todos, a qualquer hora.

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A Escola de Nutrição da UFBA foi das primeiras a funcionarno Brasil assim como das mais atuantes, o que afirmo, modéstia àparte, mas por dever histórico, ser a primeira a ser dirigida porNutricionista. Por esta razão, a Associação Nacional deNutricionistas concedeu-me, na condição de sua então Diretora otitulo de Nutricionista do ano, cuja honraria desejo compartilharcom "Dr. Adriano" devido a sua grande influência na minhaindicação para referido cargo, conforme me foi confidenciado peloentão Reitor Dr. Roberto Santos

Ao Dr. Adriano Pondé, resta-me desejar, a sua recompensadivina pela sua grande contribuição à sociedade e o bem que atodos nos fez, como liderados e como amigos.

Salvador, maio 2001

Edith Tolentino VieiraNutricionista

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Adriano Pondé – Exemplo e Palavra

Disse o filósofo espanhol Miguel de Unamuno, “...nossa maiorempreitada deve ser nos tornarmos insubstituíveis”. Isto significaque, ao deixarmos um dia uma lacuna entre os que conoscoconviveram, todas a sintam não apenas como a falta de alguém quese foi, mas como algo que não deveria ter acontecido. Tornar-seinsubstituível, é mais do que um exercício espiritual, é estético. Oque resta depois que alguém insubstituível desaparecesomaticamente do nosso circulo de convivência formal, é a suaimagem, o caráter que ele imprimiu a seu ambiente e a seu tempo,indelével, duradouro, na memória e na reverência dos que oconheceram e, mais ainda, dos que tiveram o privilégio de privarda sua proximidade e dos seus ensinamentos.

Assim foi, e assim é, com a figura inesquecível, e com aimagem e o caráter presentes do Professor Adriano Pondé. Eu fuium desses privilegiados que beberam na fonte do seu infinito saber– não apenas o saber da ciência, da Medicina Interna, daCardiologia, como sextanista-interno da 1ª Clínica Médica doHospital Universitário Professor Edgard Santos. Mas o sabertranscendente, das verdades simples e puras, despidas de vaidadescatedráticas, que perfazia a individualidade do seu estiloinconfundível. Adriano Pondé foi um desses que ensinou pelapalavra e pelo exemplo, muito mais pelo exemplo que pela palavra.

Em seu serviço universitário do magistério, encontrei também,o zelo quase maternal das suas então assistentes – Anita FrancoTeixeira e Angelina Pelosi – sob cuja eficiente orientação, emEnfermaria e Ambulatório, completaria o meu curso de ClínicaMédica, iniciado e desenvolvido sob a clarividência de JesséAciolly, César de Araújo, Augusto Mascarenhas, Roberto Santos,Cícero Adolpho da Silva, Gerson Pinto e Heonir Rocha.

Adriano não era um professor de gabinete; transitava entre osdoentes, assistentes, estagiários, residentes, internos e alunos com

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o despojamento que todos nele admiravam. Sua simplicidadecontrastava benfazejamente com seu valor; não exibia a pompa decertos catedráticos da sua época, gente que se sentia iluminando oscorredores do hospital quando por eles passavam. Existia nele umsentimento intuitivo, daqueles intimamente cultivados, queimpedem os seres humanos de ultrapassarem as fronteiras da suaverdadeira autenticidade. Sabia-se bom, mas não alardeava a suabondade, tampouco a sua competência. Usava-a, porém, comnaturalidade precisa, para ensinar e conduzir os seus pupilos.

Certa feita eu estava auscultando o tórax de um pacienteinternado, quando o mestre, discretamente, aproximou-se de mime, quase balbuciando, para não parecer grandiloqüente, orientou omeu estetoscópio para os espaços interescapulovertebrais, depoispara os subescapulares e basais, por fim as laterais infra-axilares,onde pude realmente encontrar os murmúrios que procurava.Minutos após, no corredor, ele me disse – “Gusmão, ali, sobre oprocesso espinhoso da escápula não se ouve nada, ou quase nada”.De outra feita, convocou todos os internos e residentes daEnfermaria à ausculta cuidadosa de estertores basais crepitantes,em um caso típico de pneumonia lobar. Lembro-me bem de suaspalavras, sete lustros passados – “Ouçam bem; tornem a ouvir; essecrepitar nos alvéolos é típico da exsudação pneumônica; parece ofino estalido de brasas em uma fogueira, é inconfundível”. E sorriasatisfeito, feliz com o aprendizado dos discípulos, consciente deque jamais esqueceríamos aqueles crépitos patognomônicos. Eassim foi.

Em uma outra oportunidade, já médico pós-graduado emNefrologia, no exercício privado da clínica hospitalar, estava euassistindo a um grave paciente cirúrgico de outro expoente daMedicina baiana, o Professor Venceslau Pires da Veiga, quando apresença do Professor Adriano, na qualidade de Cardiologistaemérito, se fez necessária. O paciente, em choque circulatório, nãorespondia às manobras terapêuticas ensaiadas por mim, quando omestre, com muita singeleza, sugeriu dobrar ou triplicar a dose daamina dopaminérgica que fluía através a soroterapia. Atendi-o de

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pronto, para assistir, quase de imediato, a situação se reverter. Aocontemplarmos juntos a rápida transformação, do leito cianóticodas unhas e do roxeado das polpas digitais, em róseo tomalvissareiro, enquanto os níveis de pressão sangüínea se elevavam,e a lívida frieza das extremidades se aquecia, sorrimosdiscretamente um para o outro e ele disse – “É fantástico, ésimplesmente fantástico”. Extasiava-se o velho professor com asrecentes maravilhas da terapêutica vascular. Pareceu-me umacriança embriagada com a magia do seu brinquedo.

Era assim, na minha visão, o Professor Adriano Pondé. Umhomem simples, afável, acessível, rico de pendores. Daqueles queenvelhecem como os vinhos, cada vez melhores. E por isto fazfalta, muita falta, numa época, trinta anos apenas passados, em queos valores éticos titubeiam numa Medicina massificada, ondemuitos médicos se arrogam a continência do saber, descuidososdos mais comezinhos deveres para com a solidariedadeprofissional e a consciência do servir.

Há realmente pessoas insubstituíveis. Não apenas pelo queforam ou fizeram. Mas, principalmente, pela imagem que o caráterimpôs, com naturalidade, aos que lhe são pósteros. Esta imagem étão sólida, tão densa, que não permite a outrem a ocupação do seulugar. Para mais além dos aspectos éticos e morais, há uma leifísica instransponível, segundo a qual dois corpos não podemocupar, ao mesmo tempo, o mesmo lugar no espaço. E o ProfessorAdriano, com sua imagem, e seu caráter, permanece vivo entrenós.

Ernane N. A. GusmãoMédico Clínico e Nefrologista - Ex-aluno do Professor Adriano Pondé

Professor Adjunto da FAMED/UFBAPresidente da Comissão Cultural da Associação Bahiana de Medicina

Diretor Cultural da Associação de Antigos Alunos da Faculdade de Medicina da Bahia

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Professor Dr. Adriano de Azevedo Pondé

Entre os Médicos e Professores de Medicina que tive, oprofessor Adriano Pondé foi um dos expoentes; digo isto pois oconheci exercendo o magistério e atendendo a pacientes, muitasvezes, portadores de doenças graves, podendo assim apreciar asduas faces do Grande Mestre.

Sempre alegre, gentil e solícito com seus alunos ministravaaulas agradáveis, sempre atualizadas, principalmente no que sereferia a doenças cardíacas e vasculares, nas demais especialidadesmédicas mantinha o mesmo nível de atualização pois sempre sereciclava através da leitura de revistas nacionais e estrangeiras.Esta afirmação é fruto de minha observação, pois tive o privilégiode ser vizinho do Mestre durante alguns anos.

A outra face do Professor Adriano era a de médico nacabeceira do paciente. Nos tempos em que não havia estapropedêutica sofisticada que hoje dispomos, diagnosticava comsegurança, como se tivesse um sentido alem dos comuns.

Acompanhei-o algumas vezes no tratamento de pessoas domeu conhecimento, numa época em que não havia clínicas deemergência, quando muitas vezes passava toda noite como médicoe enfermeiro, instalando soluções endovenosas e ele mesmoaplicando os medicamentos necessários. Aos familiares sempreuma palavra de consolo e clareza diante do quadro clínico dospacientes.

Cansaço era algo que não existia para ele, pois estava sempredisponível para os seus diversos pacientes, independente dequalquer compromisso social que porventura existisse. E mesmoatendendo a qualquer hora da noite com dedicação seus pacientes,cedo ele estava no Hospital das Clínicas, ministrando aulas ediscutindo casos clínicos com seus assistentes, como se não tivessepassado a noite toda anterior acordado e trabalhando.

Por tudo isto acho que o Professor Adriano Pondé honrou oMagistério e a Medicina Assistencial, tornando-se um exemplo aser seguido pelas gerações dos Médicos atualmente em exercício eas que estão por vir.

Ernesto Simões Neto

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DISCURSOPronunciado na Sessão Solene de Instalação da IV

Reunião Anual da Sociedade Brasileira deCardiologia pelo Prof. Estácio de Lima

(In memóriam)

Adriano de Azevedo Pondé é Professor de vocação. A cátedralhe é um refúgio a que sempre se abrigou nos momentos felizes oudolorosos, nela encontrando consolações dulcíssimas, além domilagre, o formoso milagre do perene rejuvenescimento dasenergias do espírito, outros tantos Faustos, mais ou menosparecidos, que, afinal, somos todos.

É neste notável Professor de Cardiologia que tão bem sabe eextraordinariamente faz aplicar a digital e tatear, dia a dia,ansiosamente, a pulsação do seu paciente à procura da bradicardiatão esperada, preocupado com o surgimento do dicrotismo quepoderá surgir!...

Os fatores da formação científica conferiram a Adriano acondição de homem suave, esquivo, comedido, reto, sereno, crente,minucioso, simples, sempre comunicativo, porém impávido nocumprimento dos deveres. Habituado a leitura dos poetas eprosadores da Inglaterra, da França e da Itália em seus respectivosidiomas.

Adriano Pondé, com a esquisitice dos sábios que vivem para otrabalho e para o estudo, embora, aos quandos, raramente, é ver-dade, para os devaneios e os sonhos, sem os quais a existênciaseria mais triste e mais árida do que aquela Filosofia de AlexandreHerculano, Adriano Pondé houve por bem acometer-me oagradável encargo de saudar-vos. preeminentes confrades, emnome da Bahia, e no instante desta solenidade.

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Quase paradoxal que o fizesse eu. Porque não tive a honraexcelsa de encontrar, no regaço maternal da terra gentil e morena,o berço de nascimento.

Venho do nordeste, lá de um rincão, debruado de palmeiras ede águas represadas á beira do oceano, - mas áspero e seco nossertões batidos, meses a fio, pela cruel monotonia de um solinclemente, que tosta, estiola e combure a vegetação mirrada,criando o trágico pesadelo das secas episódicas...

A gente, por lá, adquire na alma doçuras e amenidadesinerentes à paisagem dos coqueirais intérminos e da meiga LagoaManguaba, onde os jaçanãs em bandos infindos, alçam vôos denuvens policrômicas... Mas, igualmente. na alma fica a indeléveltatuagem das plagas desoladas, marcando-nos, para sempre, com oressaibo do sofrimento e das agonias...

Foi assim que aportei à Bahia, criança ainda, já trazendo,porém, no coração e no pensamento, ilusões e descrenças, emconstante agitação...

Cedo, porém, experimentei os encantos e as seduções sem pardesta natureza excepcional e bela. Amei, e para sempre amei, aiBahia feiticeira de graças infinitas. Heróica e sublime nas pelejasde 2 de Julho. Ingênua, terna e boa nos descantes das serenatas,acompanhadas a violão primorosamente dedilhado, pelas ruasestreitas, iluminadas por discreta claridade de um luar de prata,calçadas de pedras coloniais, pisadas outrora por vice-reis, cheiasde velhos sobrados, e de cujas varandas austeras ainda escuta, asempre sedutora Yayá, recatada, mimosa, e comovida, as notasrepassadas de afeto e de saudade... Tradicional, grave, respeitável,magnífica, nos seus templos de ouro e de azulejos, perfumados deincenso, embalados pelos campanários seculares, capazes decomover às lágrimas, os espíritos empedernidos, que se deixarammaravilhar - e como deixar de maravilhar-se? - pelos revérberos domaterialismo científico.

Admirável, generosa e fecunda, nos seus estadistas do impérioe da república, inclusive esse batalhador da democracia, OTÁVIOMANGABEIRA, que nos estendeu a dextra amiga, amparando este

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conclave de cardiologistas, dificilmente levado a bom termo, sem aajuda inestimável do grande Governador e do nosso Prefeito,ilustre e digníssimo.

A Bahia, de quem sou filho adotivo, leal e ardoroso, pelos seusartistas, os seus sábios, os seus mártires, as suas instituições, daanciana Faculdade de Medicina, templo de estudo e de civismo, atéá jovem e promissora Universidade, toda ela cheia de brasilidade,pelo que foi e pelo que é, recebe, com especial carinho, aos nobrescaravaneiros da cardiologia nacional.

O século dezenove, sem dúvida, foi marcante. Na Inglaterra,os estadistas consolidaram a grandeza de um império antevisto, nopretérito, pela singular Elizabeth. Na América do Norte, um povojovem, depois de acerba guerra contra a negra opressão, crioumaravilhas de técnica, e deu á pátria da flâmula das estrelas, umagrandeza soberana e impar.

Na Alemanha, o pensamento filosófico atingiu a culminânciasexcepcionais, que poderiam tê-la conduzido ao fastígio maisadmirável, porém, desgraçadamente, gerou fatais idéias dedominação, responsáveis pelas sucessivas tragédias quemergulharam o mundo num oceano de mortes, de incêndios edesolações. Na França o século dezenove assistiu ás cintilações dosgênios soberanos de Pasteur e de Cláudio Bernard que, tantovalendo, não valem muito mais do que a esquisita elegânciaintelectual de Renan e a fina tessitura do espírito sutilíssimo docriador de Silvestre Bonard.

Foi, justamente, em meio daquela época ilustre, lá pelos diasmemoráveis de 1856, que dois insignes pesquisadores, Köllicker eMüller, tomando entre as mãos ágeis de fisiologistas eméritos, ocoração palpitante, dentro do peito aberto de um cão, viram eregistaram que esse coração era capaz, em todas as sístoles, deexcitar o nervo motor da rã, determinando o abalo muscular, quesempre se interrompia às diástoles subsequentes, como si houvesseali misterioso e invisível manipulador de Morse...

Foram, certamente, os dois, ás custas da experiência formosa esingela - e pode, acaso, haver formosura sem a singeleza? - terão

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sido eles ambos, indubitavelmente, fazendo o que fizeram, osprecursores da electrocardiologia, demonstrando, comodemonstraram, e de modo insofismável, "a existência de potênciaselétricas engendradas pela cardio-dinâmica".

A Clinica teve, igualmente, naqueles anos pretéritos eluminosos, os seus representantes mais destacados. Laenec, vindode mais ancianos dias, floresceu e dominou no século dezenove.Trousseau nasceu e morreu dentro dele, tendo sido o mestre dosdiagnósticos incomparáveis e das incomparáveis previsõesprognósticas, não errando sequer no cálculo fatal de seus finaisinstantes. E até no Brasil, esse extraordinário Francisco de Castro,baiano e carioca a um tempo só, criou monumento da suaPropedêutica, obra que se envelheceu pelas conquistassurpreendentes de hoje, imortal ficará como relicário melhor daciência de então, exposta na linguagem lapidar de um clássico,bem servido pelas riquezas e louçanias de um estilo raro.

A despeito, entretanto, de todas essas forças propulsoras dopensamento científico, não vem daquelas eras o decisivo progressoda Cardiologia. Nos últimos quarenta anos do século vinte, creiobem terá ele avançado mais, e mais se enriquecido, que nos quatromil derradeiros de toda a história da Medicina.

Vós outros, eminentes confrades de mais ou menos longínquasterras brasileiras, e porque não vocês, também, companheirosprezados de aqui mesmo, todos vós, indubitavelmente, sois, com osdemais desse mundo que bem quiséramos fosse o mundo só que osonhou Wilckie, procurando combater essas fronteiras eriçadas debaionetas e essas terríveis cortinas de aço que escondem o medo, adesconfiança e a agressividade, todos vós sois, por sem dúvida, osdenodados construtores do edifício majestoso da Cardiologiamoderna.

Não nos falta, aqui, a figura prestigiosa e brilhante dePazzanese, que tomando a si, primeiro de todos, as rédeas daSociedade Brasileira de Cardiologia, soube alçá-la ás culminânciasde organismo precioso e fecundo.

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E porque São Paulo, a terra encantadora e miraculosa, tãoprofícua ao desabrochar da sementeira das grandes realizaçõesmateriais e dos anseios do mais puro idealismo, ora nos surgediante dos olhos deslumbrados, outra personalidade de relevo seimpõe à consideração nossa - um filho seu distintíssimo: JairoRamos.

Descendo um dia da serra altaneira, onde os cravos multicoresperfumam e alegram a paisagem e as hortênsias lindas, masnostálgicas, amenizando o ambiente, nos convidam à meditação eao sonho, descendo um dia das culminâncias petropolitanas,Magalhães Gomes fixou-se na Cidade Maravilhosa, paraconquistá-la pelo talento e pelo saber. Também ele aqui seencontra, e naquela presidência condigna, merecendo, junto a todosos que vieram nos honrar com as suas presenças de homens decultura e de fé, os saudares da Bahia intelectual.

Muito se tem feito, principalmente nestes quatro decêniosúltimos, em favor da importantíssima especialidade.

Agora, quer-se perquirir melhor a questão tormentosa doreumatismo nefasto e bárbaro. Volta-se a um tenra nacionalpalpitante, investigando-se até onde vai, definitivamente, esseprotozoário, caprichoso e malsinado, responsável pela ingratamoléstia de Chagas. Insiste-se no trágico problema dashipertensões, desafiando a argúcia dos clínicos, sobrepondo-se ásinvestigações da técnica hodierna, resistindo ás terapêuticas maiscuidadas e melhor conduzidas.

Vê-se, indubitavelmente, que um largo terreno foi percorrido,no setor da patologia cardíaca, e os resultados têm sido excelentes.Muito há, entretanto, por fazer ainda.

O prático, no exercício profissional, encontra a maior soma desurpresas, de ciladas desconcertantes, de singulares manifestações,justamente no âmbito da cardiologia.

O conceito da Medicina psicossomática impõe a todos osclínicos um conhecimento particular de psicologia, para lhe serpossível devassar a pobre alma do enfermo. Nenhumaespecialidade, porém, exige tão particular sutileza espiritual, mais

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finura da inteligência, maiores doses de psicologia, do que esta deque então cuidamos.

Às vezes, a sífile chega e se assesta, firmemente. numaválvula, no miocárdio, nas coronárias... Outras, é o reumatismo quemorde, brutalmente, este ou aquele departamento cardíaco. Opaciente, porém, resiste admiravelmente, em ambos os casos, e poranos a fio. Certas criaturas, ao revés disso, em que a escuta muitopouco denuncia, o eletrocardiograma é plenamente satisfatório, aradiologia nada revela de causar apreensões, e outros examescomplementares são silenciosos, de repente, em dado momento,caem mortas pelo coração...

As ações hiper-emotivas, as condições temperamentais, osviolentos choques morais sucessivos devem causar tantos receiosquanto, digamos, uma onda Q profunda em D III. Não há digitalcapaz de compensar um coração cheio de angústias e de torturasíntimas.

E quando for possível, um dia, aplicarmos, seguramente, omendelismo em biologia humana, haveremos de enxergar a valiaconsiderável dos fatores genotipos em cardiologia.

São, destarte, múltiplas as razões que justificam a existênciade uma Sociedade Brasileira de Cardiologia, ramificada nos várioscentros de cultura do país, e impondo o mais carinhoso trato e asgrandes e repetidas reuniões como esta que assistimos na Bahia.

Cumpre-nos desvendar, por diante, embora tanto já tenhamosfeito, sérias questões etio-patogênicas, para clarearmos as sendasda medicina curativa e preventiva em cardiologia, além darecuperação, para o trabalho compatível, daqueles havidos porincuráveis, e que às vezes se quedam, indefinidamente, nadesoladora tristeza das enfermarias, ou em casa, nos tugúrios oupalácios, apreensivos, mão constantemente espalmada sobre oprecórdio, no pavor ininterrupto da morte súbita...

Vós sois, preclaríssimos confrades, os caravaneiros dessacruzada magnifica. O caminho é difícil e a meta inatingível para anossa geração. É preciso, entretanto, lutar e progredir. As vitóriasmais dignas são aquelas que se alcançam pelo trabalho diuturno e

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pelo sofrimento constante. Ensinava o meu grande clássico, no seufamoso livro, "Os Apólogos Dialogais".

"Aquilo que se alcança dificilmente, guarda-se com maiorestimação e cautela". Pouco importa não sejamos testemunhas doêxito glorioso. Devemos ir adiante. Os nobres objetivos justificamos sacrifícios da batalha cruenta.

Sede bem-vindos, colegas e amigos digníssimos.Conheceis, realmente, muitos dos segredos do coração

humano, e agora ireis conhecer e sentir um coração amorável eboníssimo, e onde mora inextinguível afeto: o coração da Bahia!

Sede bem-vindos, cavalheiros ilustres, exímios soldados dasanta cruzada dos corações sofredores!

Salvador – 1947

Cortesia deMaria Theresa Pacheco

Médica

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Professor Adriano de Azevedo Pondé

Foi, sem dúvida, um dos grandes mestres da Faculdade deMedicina e da UFBa.

Como integrante da turma de 1944, da qual fiz parte, tive aoportunidade de tê-lo como mestre da Cadeira de PropedêuticaMédica. Depois dos primeiros anos de estudo das cadeiras básicas,passamos a freqüentar o Hospital Santa Isabel e assistir as aulas doProfessor Adriano Pondé.

Colocou o estetoscópio no nosso pescoço e nos ensinou comoutilizá-los, interpretar os ruídos que captava e como examinar umdoente após a anamnese. Logo percebemos que estávamos diantede um professor que, embora jovem, não só acumulava sólidoconhecimento da Medicina, como tinha satisfação de transmiti-losa seus alunos, que por sua vez passaram a ter grande admiraçãopelo Mestre que conseguiu renovar o entusiasmo pela profissãoque tínhamos decidido praticar.

Anos mais tarde, quando construído o Hospital das Clínicaspor iniciativa do sempre saudoso Prof. Edgard Santos, foi pelomesmo designado para progressivamente transferir todas asclínicas que funcionavam no velho Hospital Santa Isabel para onovo e bem equipado Hospital, e o fez com tal eficiência que foiem seguida indicado para instalar as recém criadas Escolas deEnfermagem e de Nutrição. O Prof. Adriano Pondé prestou assimincalculável serviço ao desenvolvimento de ensino médico eaperfeiçoamento da prática médica no Estado da Bahia sendodistinguido pelo Conselho Universitário como Prof. Emérito danossa Universidade.

Poucos sabem que, com o Prof. José Silveira atuou comoassistente do renomado Prof. Prado Valadares e trabalharam noGabinete de Radiologia que montara.

O Prof. José Silveira dedicou-se então ao estudo daPneumologia e particularmente d Tisiologia enquanto que o Prof.

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Adriano Pondé especializou-se em Cardiologia e particularmentena Eletrocardiologia, desenvolvendo importe pesquisa nainterpretação do Eletrocardiograma.

Voltei a encontrar o Prof. Adriano Pondé já depois de formadoe trabalhando no Hospital que sverio a ser denominado de EdgardSantos, quando tive a honra de ser convidado a integrar a suaequipe, ministrando aulas de Radiologia do sistema cardio-vascular, durante anos seguidos.

Agora, quando se comemora o seu centenário, é justo fazerressurgir para as novas gerações o g rande vulto da medicinabaiana, que tanto contribuiu para o ensino médico e que, pelosserviços prestados à nossa Faculdade de Medicina, não pode seresquecido.

Fernando Costa D’AlmeidaEx Chefe do Serviço de Radiologia

do Hospital das Clínicas,hoje, Hospital Universitário Prof. Edgard Santos.

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GRATIDÃO

Sou o psiquiatra mais antigo da Bahia. Em 1942 cursava osegundo ano médico, alimentando bonitos sonhos, hoje, quasetodos realizados. A despeito de estar aposentado, continuo empleno exercício da profissão, numa fuga consciente e benéfica daociosidade. Mesmo assim, sobra-me tempo para relaxar e viajar notempo, atividade deliciosa para aqueles da minha faixa etária,saboreando avidamente os bons momentos de uma vida bemvivida.

Aquele foi um dos anos mais importantes de minha vida, poisocorreram três acontecimentos inesquecíveis: conheci a minhaesposa, tomei a decisão de ser psiquiatra e conheci o professorAdriano de Azevedo Pondé.

Toda a minha turma já o conhecia embora ainda não fossenosso professor. Sua simpatia irradiante, sua jovialidade, suacapacidade de comunicação confirmavam o adágio popular: “avida começa aos quarenta”. Curioso observar que o seurelacionamento com os alunos, a despeito de tão familiar, nãoquebrava a postura de professor que conseguia de todos nós, semimposição, admiração e respeito.

Aproximei-me dele, através de minha irmã Cleonice, suaamiga, também médica, assistente do professor Eduardo Morais.Foi assim que ele tomou conhecimento de que eu filho denigeriano, além de estudar medicina também mantinha cursosparticulares de Inglês.

Um certo dia encontramo-nos no Hospital Santa Isabel e elesorrindo perguntou: Alakija, você poderia me dar aulas de Inglês?

Aquela consulta foi um impacto. Senti um aperto no plexosolar seguido de evidente taquicardia emotiva. Eu dar aula ao

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professor Adriano? Controlei-me o quanto foi possível eaparentando tranqüilidade respondi: estou às suas ordens professor.

Ficou estabelecido que eu iria ao seu consultório duas vezespor semana onde as aulas seriam ministradas. Uma coisa foidecisiva: antes que eu dissesse que não cobraria (antigamente haviaessas gentilezas) ele foi categórico: você vai cobrar as suas aulassenão nada feito.

O meu convívio com Dr. Adriano durante alguns meses foimaravilhoso. Infelizmente por motivos imprevistos nãocontinuamos. Pude sentir de perto a pessoa que ele era. Chamou-me de início a atenção a sua modéstia: já conhecia muito a línguainglesa e insistia em dizer que queria aprender. Em realidade o quedesejava era praticar conversação e ter uma ajuda relativa naleitura de obras de cardiologia em inglês.

Se tivesse feito testes de inteligência teria se revelado umsuperdotado. A capacidade didática em transmitir coisas difíceis demodo fácil seria uma prova disso. Seu senso de humor eraadmirável; tinha facilidade em encontrar nas coisas mais sériasuma brecha onde inseria com suavidade um toque humorístico. Eraum homem bondoso, fui testemunha várias vezes disso,observando a sua postura discreta ao beneficiar alguém. Memóriaexcelente, guardando com facilidade os vocábulos que aprendia.

Como disse anteriormente, ao iniciarmos as nossas aulas jápossuía razoável conhecimento de inglês. Nas traduções decapítulos de livros de cardiologia naquele idioma esbarrávamos emvocábulos técnicos que ele, como especialista, traduzia melhor doque eu. Havia uma palavra presente com freqüência no livros deeletrocardiologia que era “Fluttering”. Os trabalhos escritos emportuguês não encontravam tradução e preferiam manter o termooriginal. Ele decidiu: temos que encontrar uma tradução para isso.Lembrei-lhe que o bater de asas do beija-flor era um “fluttering”.Ele então concluiu: adejamento. Cito este fato para registrar que a

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palavra adejamento traduzindo “Fluttering” foi utilizada emprimeira vez pelo professor Adriano Pondé.

Posteriormente, já médico, o encontrava com freqüência emdiferentes acontecimentos sociais. Aproximava-se de mimsorridente e dizia: How are you?

Lembro sempre daquela figura ímpar, com imenso sentimentode gratidão: minha cunhada, diabética, foi hospitalizada esolicitaram uma avaliação cardiológica. Fui à noite à residência doprofessor pedir uma orientação, juntamente com o clínico, Dr.Leopoldo Valverde. Com surpresa disse-me ele que se fossemosbuscá-lo na manhã seguinte iria pessoalmente ao hospital. Não foipreciso, a paciente faleceu à noite.

Felizes aqueles que são lembrados pelo que de positivofizeram na vida. Imagino, quanta coisa edificante ele teria feito ede que não tivemos conhecimento. Acredito que tornando públicoo meu sentimento de gratidão estou modestamente contribuindopara perpetuar a sua memória.

George AlakijaMédico

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Ao Mestre Adriano Azevedo Ponde

Nos anos Dourados, fim da década de 50 e início dos anos 60,estudava no Colégio 2 de Julho e era Presidente do Grêmio ErasmoBraga, porquanto mantinha relacionamento salutar não tãosomente, com os meus colegas, outrossim, com outros quereuníamos na Praça do Campo Grande, dentre eles, o aluno doColégio Maristas, Jorge Alves Ponde, sobrinho do ProfessorADRIANO AZEVEDO PONDÉ, nascendo daí um laço deprofíncua amizade, estendendo-a aos genitores de Jorge; AlbertoPonde e Maria Antonieta Ponde, ambos tínhamos a mesma faixaetária, anseios pares, objetivos e sonhos convergentes demonstradacom o logro de Jorge no vestibular para engenharia, e o meu para oCurso de Medicina no mesmo ano.

Cursando o 30 ano de Medicina, o Professor Alberto Ponde,indicou-me para o Hospital das Clínicas, atualmente denominadoHospital Universitário Prof. Edgard Santos, no Serviço deEletrocardiografia, sob a orientação do Prof. Yulo Cesare VianaPereira. Era o ano de 1964, momento histórico indelével, quandoconheci o Prof. ADRIANO PONDÉ, começando daí a freqüentar oambulatório da 1a Cadeira de Clínica Médica com Dr. RenatoSena, Dra. Angelina Pelosi e Dr. João Ponde Neto, fluindotenazmente sentimento de admiração, respeito a uma equipe decoesão impar, mormente, altruísta, sensível as necessidades dosmais humildes “indigentes”.

Neste ano o marido da secretária da minha mãe, foi acometidapor insuficiência cardíaca por miocardiopatia chagásica e teve aeficaz assistência médica desta equipe. Estreitava-se os laçosprofissionais e a admiração com a equipe médica, conquanto eucomeçava a participar da mesma, embuido da curiosidade deestudante e jamais senti dificuldades em expressar opiniões apesardo meu parco conhecimento, vez que em fase de formação.

Sucedera o 5o ano médico, época em que fui convidado peloProf. Alberto Ponde, para participar do Congresso Brasileiro deCardiologia em Recife-Pernambuco, minha terra natal e comanuência do meu pai, que subsidiou efusivamente a viagem.

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Memoro que em 1966, durante o congresso, a cidade de Recifesofreu uma grande inundação, todavia não obstaculou o sucesso doevento, haja vista que obtive um grande aprendizado, conhecendooutros profissionais e ante a minha maior proximidade com o Prof.ADRIANO PONDÉ, apresentou-me ao Prof. Luís Decourt e oProf. João Tranchesi, oportunidade que solicitei um estágio em seuserviço, a fim de cursar o período de interno.

O Professor ADRIANO ratificou o pedido, entretanto ocoordenador do Internato à época recusou argumentando quetratava-se de uma especialização precoce.

Não obstante, este mesmo Coordenador no ano seguinte, em1968, liberou uma interna para Colômbia, com o escopo deespecializar-se em Prontuário Médico.

Diplomado, incorporei a equipe do Prof. Adriano Ponde, e fuio seu último Prof. Assistente.

A convivência com a Família Ponde, arraigou-se a minha vida,eternizando uma amizade impostergável, marcada pela gratidão eamor, inspirando-me a escolher o Prof. Cícero Adolpho da Silva eD. Maria Antonieta Alves Ponde para padrinhos da minha filhacaçula, Andréa Marciel de Oliveira Rossini, atualmente, MédicaEspecialista na área de Infectologia Pediátrica.

Perdurou o convívio com o Prof. Adriano Pondé mesmodepois de aposentado, absorvendo gradativamente muito das suasfacetas como ser humano, mestre e principalmente da suahumildade. Sofremos juntos com a perda de Prof. Alberto, ele nãose conformava!

Hoje como coordenador da Disciplina de Cardiologia doDepartamento de Medicina da Universidade Federal da Bahia, nãome facultaria furtar-se juntamente com a Prf. Angelina Pelosi deMatos e a Prof. Anita Guiomar Franco Teixeira de externar a esteEminente e Benemérito Mestre da Universidade Federal da Bahiana passagem do Centenário de seu nascimento a Homenagem dereconhecimento dos seus ex-alunos e colaboradores.

George Barreto de OliveiraProf. Adj. do Departamento de Medicina da UFBa

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Prof. ADRIANO AZEVEDO PONDÉ

Conheci o Prof. Adriano Pondé mais de perto, em 1949,quando era o interno oficial da Primeira Clínica Cirúrgica, quetinha como Catedrático o Prof. Eduardo de Sá Oliveira. Nesse ano,três ou quatro “cadeiras” haviam-se transferido do Hospital SantaIzabel para o então Hospital das Clínicas, inclusive as PrimeirasClínicas Médica e Cirúrgica, razão pela qual, com certa freqüência,ia examinar doentes e participar de discussões de casos comindicação cirúrgica. Nessas ocasiões, pude constatar a soma deconhecimentos médicos, o espírito humanitário, o cuidado, atépaternal, que o Prof. Adriano Pondé dispensava aos acadêmicosparticipantes e, até, aos seus assistentes mais novos e menosexperientes.

Em fase posterior, quando foram criados os famigeradosdepartamentos clínico-cirúrgicos, como o de Gastroenterologia, fuipor este eleito para ministrar o curso de Fisiopatologia da Nutrição,na Escola de Nutrição, recentemente fundada pelo MagníficoReitor Edgard Santos, sob influência do prof. Adriano Pondé. Porser, além de muito jovem e cirurgião, de um lado, e do outro, porensinar em uma escola em fase de estruturação, de quando em vezprocurava o Prof. Pondé para orientar-me e, também, a Prof.ª EditeVieira, sua Diretora. Nessa fase, pude ratificar constatação anteriorsobre seus conhecimentos médicos e o cuidado temeroso quedeixava claramente transparecer, e até aconselhava ser mantido, norelacionamento interpessoal.

Essa aproximação foi preservada, e mesmo ampliada, atravésdos anos, porquanto Anita Guiomar Franco, hoje Teixeira, colegade turma e amiga queridíssima, assim como Angelina Pelosi, nãomenos considerada, eram suas assistentes.

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Quando, em 1979, ingressei na Academia de Medicina daBahia, aceitando honroso convite do então Presidente, Prof. JoséSilveira, honra e glória científica da Bahia, o meu trabalho, queversou sobre o Tratamento cirúrgico das manifestações digestivasda doença de Chagas, foi analisado pelos professores ManoelPereira, cirurgião, Zilton Andrade, patologista, e Adriano Pondé,clínico estudioso da doença de Chagas, com diversos trabalhospublicados sobre a cardiopatia que a doença determina, aprovando-o com encômios.

Guardo na memória uma das mais elogiáveis recordações docientista simples e afável, do clínico ético, capaz, de fácilabordagem e alegre; do administrador sempre preocupado com obem-estar de seus comandados e com o progresso da ciênciamédica e das entidades que fundou.

Geraldo Milton da SilveiraMédico

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Sob a regência doMestre Pondé

Meu primeiro contato com o professor ADRIANO PONDÉ,foi em março 1945 cursava então o 2o ano de medicina quando, porpedido do prof. MARIO LEAL (catedrático de psiquiatria) passei afrequentar o ambulatório e enfermaria da cadeira de propedêuticamédica da Faculdade de Medicina da Bahia no Hospital SantaIsabel, sob a regência do mestre Pondé. O meu convívio foi o maisproveitoso possivel, calouro ainda, vestir uma capa médica, passara ter contato com pacientes foi a primeira e grande emoção do meucurso médico.

Duas vezes por semana frequentava o ambulatório decardiologia “Prado Valadares” e no final das manhãs visitava aenfermaria. Ao correr deste ano participei de um fato importante,chegava à Bahia o primeiro eletrocardiógrafo Cambridge quepassou a funcionar no ambulatório onde frequentava e vi serrealizado pela primeira vez um eletrocardiograma.

Embora tendo frequentado por apenas um ano a cadeira depropedêutica médica foi de extraordinário valor este pequenoestágio, porque convivi numa disciplina onde se estudava os meiosde diagnóstico clínico.

Como não era meu destino ser clínico, a partir do 3o anomédico passei a trabalhar como “mata cachorro” no ambulatório depequena cirurgia do hospital santa isabel sob a chefia do Dr . ElziroMacêdo. Lembro ainda que o Prof. Pondé possuia em 1945 umcarro opel movido a gazogênio, pois nesta época ainda haviaracionamento de gasolina e na mala do carro havia torpedo deoxigênio e uma mala com toda a medicação de urgência . do 3o anomédico em diante o meu contato com o Prof Pondé era muito brevenos corredores das enfermarias do Hospital Santa Isabel até o anode 1949, quando cursava o 6o ano médico. A indicação do seu

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nome como um dos homenageados foi a oportunidade paravoltarmos a uma nova convivência.

Em 1949 conquistei por concurso o internato de ginecologia eposteriormente logo após a formatura fui em 1950 indicado para“técnico especializado” junto à clínica ginecológica. A partir dejaneiro de 1950 as cadeiras de clínica e cirurgia foramgradativamente transferidas para o recém inaugurado hospital dasclínicas. Aí já no novo hospital o meu convívio com o Prof. Pondéfoi mais assíduo pois, recém formado, participava das reuniões dacadeira de clínica médica (houve transferência do Prof. Pondé dacadeira de propedêutica médica para clínica médica) toda vez queum paciente em estudo necessitava a opinião de um ginecologista.

Em 1953 iniciei o meu atendimento em clínica privada e comfrequência recebia do Prof. Pondé clientes para consultaginecológica.

Para mim no entanto, o fato mais marcante do meu convíviocom o Prof. Pondé foi em 1956, quando a seu pedido participei deuma conferência médica sôbre uma paciente sua que apresentavaum quadro de abdome agudo e urgia um esclarecimentodiagnóstico imediato. Tratava-se de uma senhora da mais altasociedade e, nesta conferência participavam também um cirurgiãogeral e mais dois clínicos além do Prof. Pondé.

Não tenho palavras para exprimir a grande emoção quando daminha chegada.

Quando compreendi a grande confiança em mim depositadapelo eminente mestre, diante de uma paciente em que pesava agrande responsabilidade de uma ação imediata devido ascircunstâncias do caso em apreço.

Após um exaustivo relato da história clínica e análise dosexames laboratoriais cada participante manifestou a sua opiniãoquando então pedi permissão para examinar a paciente.

Procurando me concentrar ao máximo e dominando a tensãoemocional presente naquele momento iniciei um pequenointerrogatório seguindo-se o exame ginecológico. Senti como seestivesse sozinho e a minha mente trabalhava aceleradamente.

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Terminado o exame emiti a minha opinião levantando a suspeita detratar-se de um cisto de ovário que havia sofrido torção dopedículo. sugeri que a paciente fôsse transferida para SanatórioEspanhol onde seria feito sob anestesia local uma pequena incisãono abdome inferior e exploração direta da cavidade peritonial.

Confirmado o diagnóstico e com uma complementaçãoanestésica o conteúdo do cisto seria aspirado por punção seguindo-se a retirada da cápsula tumoral.

Exposto o meu ponto de vista retirei-me do recinto, e horasapós o Prof. Pondé telefonou-me perguntando se estaria disposto aassumir com ele a total responsabilidade do caso o que respondiafirmativamente.

Este foi o momento mais emocionante porque compreendi oquanto de responsabilidade assumiria embora estivesse escutadopor uma das mais importante figura médica da Bahia.

A paciente foi internada no sanatório espanhol, convocado oDr. Menandro de Faria para complementar a anestesia e tudo maisgraças a deus seguiu como programado. Vinte quatro horas após acirurgia na minha 1a visita do pós operatório encontrei-a sentada noleito hospitalar alimentando-se normalmente e com um sorriso quejamais esquecerei.

Este foi um dos casos mais brilhantes da minha vidaprofissional graças a confiança que o Prof. Pondé depositou naminha competência profissional.

Hugo S. MaiaMédico

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Texto SobreDr. Adriano Pondé

Vocação de pesquisador e de mestre, Dr. Adriano Pondé foi,por excelência, um clínico, um médico. Isso porque o médico, naessência de sua missão, engloba a figura de um pesquisadorquando busca nos relatos do paciente e dos familiares,complementos com os dados oferecidos pelo exame físico,estruturar as bases do diagnostico. E de mestre quando ensina,quando orienta, quando prescreve com maestria os cuidados eprocedimentos capazes de determinar acura do paciente.

Dr. Adriano, como era chamado, detinha em plenitude essasqualidades. A partir daí diante de um caso clínico com sabedoriacuidava do esquema do tratamento e da estratégia de ação, semesquecer as recomendações ao paciente e aos responsáveis pelaexecução das medidas terapêuticas prescritas. Era como seestivesse diante de uma batalha em que todos juntos – paciente,familiares, médicos e auxiliares – tivessem de sair vitorioso,como um dever, uma obrigação.

Frente a um doente alguma coisa haveria de ser feita. Era odever do médico. Por isso era importante colher informaçõesreunidas. Eles, aliados ao saber científico conduziram o candidatocapaz de superar as dificuldades, melhorando o paciente e dandosatisfação aos familiares.

Como professor, estava particularmente atento à necessidadede o aluno aprender a pensar. Pensar para agir com oportunidadede modo a obter resultados que significassem a recuperação dopaciente.

Tais, como se fossem princípios, valeram-lhe a condição degrande clínico, que lhe era com justiça atribuída.

No momento atual, quando se comemora seu 1º centenário,as condições da prática médica são outras, bastante diferentes do

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seu tempo, contudo, sentimento que ele desenvolveu e transmitiu,de uma medicina humanizada, solidária com o sofrimentodaquele que adoece ainda tem muito sentido. Razão porque esta éuma hora de reflexão para todos aqueles que, como um, tiveram ahonra de ser aluno e colaborador nos núcleos de aprendizagem etratamento que ele desenvolveu na 1ª Clínica Médica da FAMEDe na Escola de Nutrição da Bahia, ambos integrantes daUniversidade Federal da Bahia, cuja Reitoria por ele exercidaalgumas vezes, em substituição.

Assim, quando lhe são tributadas as homenagens doreconhecimento, pelo mérito que o fez contribuir para oengrandecimento da medicina bahiana e brasileira, modestamentequero expressar a minha mais profunda gratidão por tudo querecebi de sua magnanimidade, rogando a Deus que o ampare nacontinuidade de sua trajetória imortal.

Salvador, 23 de Março de 2001

Ildefonso do Espírito SantoMédico

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Homenagem aoProf. ADRIANO PONDÉ

É uma alegria poder partilhar desta homenagem, prestada porseus amigos pelos cem anos do prof. Adriano Pondé. Dois laçosnos unem profundamente.

Durante dez anos de luta com doença de minha família, Prof.Pondé foi nosso médico, amigo e conselheiro. Infatigável na suadedicação, quase diariamente ia à nossa casa, acompanhando meupai e minha mãe no seu sofrimento. Para nós, os filhos, ele soubecriar laços de amizade, que nos acompanharam por toda a vida,mesmo depois do falecimento dos dois, cuja assistência ecompetência até a última hora de cada um deles, soube demonstrar.

Neste longo tempo, foi para nós o médicos competente, fiel,que apesar de suas múltiplas ocupações encontrava tempo de ir aténossa casa, dar uma palavra de conforto e de carinho. Contávamoscom sua presença amiga e nela confiávamos. Por tudo o querecebemos dele, nasceu em nós uma profunda gratidão.

Terminado o nosso curso de Enfermagem em 1950, poispertencemos à primeira turma desta Faculdade recém-criada, fuinomeada enfermeira chefe da 1ª Clínica Médica no Hospital dasClínicas, também recém-inaugurado, cujo Professor era, AdrianoPondé. Com ele trabalhavam jovens recém formados e estudantesde Medicina, incansáveis na sua dedicação. Dentre eles ainda estãoentre nós Anita Franco e Angelina Pelosi, que exercem a Medicinacom a mesma dedicação que o seu querido Mestre. Animados peloProfessor, organizamos a Clínica, e em pouco foi reconhecidacomo um centro sério de estudos médicos e de pesquisa.

Prof. A. Pondé foi o primeiro professor de Clínica Médica,para a Escola de Enfermagem ré- inaugurada. Foi de tal mododedicado, também para este novo grupo, que foi escolhido comoparaninfo na formatura de 1950. A formatura foi realizada no salão

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nobre da Faculdade de Medicina no Terreiro de Jesus, por não tersido ainda inaugurada a Reitoria do Canela.

A Escola de Enfermagem contou, desde a sua fundação com oapoio irrestrito do Prof. A. Pondé. Tenho em minha mão datado de30 de dezembro de 1950 um bilhete escrito por Prof. A. Pondé quediz o seguinte: “Na história da Enfermagem bahiana, este ano 1950assinala duas grandes efemérides de alta significação para oprestígio da profissão: 1) Formatura da primeira turma de alunas,2) Assento no Conselho Universitário da Diretora da Escola deEnfermagem. Prof. Pondé, fazia parte do conselho.

Na formatura Prof. Adriano Pondé foi com a diretora daEscola buscar as formandas, entrando formalmente no Salão Nobreda Faculdade. Depois do discurso da aluna escolhida para oradorapela classe, Prof. Pondé leu com muito entusiasmo o seu discursode paraninfo. Houve uma Missa pela manhã, no Mosteiro de S.Bento onde depois de abençoados os distintivos da Escola deEnfermagem, as neoformadas os receberam individualmente doProf. Pondé e da Diretora da Escola.

Com pena não o pude acompanhar nos últimos anos de vida.Passei muitos anos no Mosteiro de Na. Sra. das Graças em BeloHorizonte. Não mais tive oportunidade de encontra-lo. Indo visitarno Hospital Cardio pulmonar, pude conversar com sua esposa, D.Carmem Pondé, muito doente mas bem consciente, que mereconheceu e falou-me do nosso caro amigo que já havia falecido.Que Deus já o tenha recompensado no Céu, por toda a sua vida deamor ao próximo.

Irmã Joana Calmon Villas – BoasMaria Julieta Calmon Villas – Boas

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TEMPO, LEMBRANÇAS, AFEIÇÃO*

Em sua inexorável passagem o tempo faz esmaecer, apagar edestruir todas as coisas materiais ou não que tenhamos conhecido.Isso é um aforisma que temos ouvido e proferido pela vida aforaaceitando-o em sua aparente integrabilidade.

Existem coisas, no entanto, tão arraigadas a nossos própriossentimentos que nem mesmo essa característica do tempo as podesequer esmaecer.

Refiro-me aqui, com muita saudade, respeito e admiração àslembranças que guardo grata e carinhosamente do inesquecívelProf. Adriano Pondé, da primeira Cadeira de Clínica Médica daUniversidade Federal da Bahia onde, como Interna e apósAssistente Honorária, privei de sua magnífica companhia, seusensinamentos, sua ciência e bondade, juntamente com os tãoqueridos companheiros Jorge Leocádio, Renato Sena, AnitaFranco, Denakê Philocreon, Veríssimo, Angelina Pelosi, EuvaldoMelo, Sílvio Monsão, José Augusto e a exemplar EnfermeiraJulieta Calmon.

São reminiscências maravilhosas guardadas em minha menteque o tempo – com certeza – jamais apagará.

Hoje, nesta merecida homenagem que estamos prestando pelapassagem do centenário de seu nascimento, sei que, onde quer queele esteja, estará feliz por ter tão fortemente contribuído naformação moral e profissional de tão ilustres colegas aqui presentese dos que, como ele, já se foram.

*DEPOIMENTO FEITO POR JACY RÊGO VIEIRA, POR OCASIÃO DAHOMENAGEM FEITA AO PROF. ADRIANO PONDÉ, PELA PASSAGEM DOCENTENÁRIO DE SEU NASCIMENTO.

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ADRIANO PONDÉParadigma de Professor do Século XXI

Um homem elegante, gentil. Um Professor Pesquisadorincansável. Um eterno coração de Estudante aplicado, metódico eobstinado.

Professor Adriano Pondé aliava a sua imensa capacidade detrabalho à extrema meticulosidade, qualidades que o caracterizamdesde a sua Tese de Graduação, arquivada na Biblioteca doMemorial da Medicina Brasileira, do Terreiro de Jesus, naFaculdade de Medicina.

Essa Tese foi apresentada em 30 de outubro de 1923, paraobter o Grau de Doutor em Medicina, e o registra como Adrianode Azevedo Pondé, ex-Interno de 2ª Clínica Cirúrgica e da 4ªClínica Médica, natural da Bahia, filho de Dr. João de SouzaPondé e D. Adriana Maria de Azevedo Ponde.

O trabalho foi intitulado como:“Contribuição para o Estudo das Águas Minero-Medicinais

do Itapicuru”.

Começava com a definição de águas minerais segundo osconceitos da época e, daí em diante, descortinava-se dentro domesmo raciocínio e numa disciplina muito grande (outra suacaracterística).

Discorria sobre as origens, a mineralização e o diagnóstico.Neste último explicava: “os elementos principais de diagnósticosda água são a situação topográfica, a termalidade e aconstituição...”.

No Capítulo Segundo, em continuação, relatava, de maneiraprofunda, sobre as propriedades físicas das águas, considerandocoloração, limpidez, fluorescência, índice de refração, cheiro e

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sabor. Sobre esta última, comentava: “De todas as águas mineraissão as sulfurosas que têm odor característico. O cheiro particularde ovos podres, obtido no desprendimento de ácido sulfídrico, émais acentuado nas águas sulfurosas cálcicas do que nas sódicas.Estas mesmas águas sulfurosas têm sabor desagradável, hepático enauseoso.”, concluiu.

Um outro item interessante e que mostra o acirrado grau deobservação, foi sobre a temperatura da água: “Com a água de Cipóapresentou-se-nos ensejo de observar que, transportada da fontepara usos domésticos, conservava-se quente durante 10 horas”.Deste fato, a busca da explicação pelo retardamento da evaporação,em virtude das cargas elétricas de que são portadoras...

Analisou, ainda, as águas do Itapicuru sobre o prisma daiontização crioscópia, pressão osmótica, resistências elétricas ecolóides.

Um dos aspectos que chama mais atenção é a atualidade doAutor (outro traço considerável).

Estudava diuturnamente, sempre procurando estar à frente dainformação.

Para exemplificar, na ocasião em que realizou a Tese,começava-se a falar em Radioatividade. Pois, em um dosCapítulos, discorreu sobre a radioatividade das águas minerais,citandos vários Autores Franceses da época em que se iniciava adiscussão sobre o assunto. Há, inclusive, uma fotografia mostrandouma placa com evidências da radiação de uma das fontesestudadas.

No Capítulo Quinto desenvolveu o seu Estudo na composiçãoe concluiu com a classificação das águas de acordo com apredominância de determinados Elementos, tais como: sulfurosos,cloretados, bicarbonatados, sulfatados, indeterminados eferruginosos.

Feitas essas considerações, o Graduado Pondé entrou no relatohistórico do Itapicuru, abrangendo Caldas de Cipó, Mosquete,Muriçoca e Fervente.

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Dosou todos os Componentes Químicos de forma qualitativa equantitativa. A seguir, fez análise bacteriológica, ilustrando suaTese com microfotografias dos bacilos encontrados. Contudo, oponto alto da Tese estava na tentativa de provar, farmaco-dinamicamente, porque as águas citadas faziam bem aos SeresHumanos.

As observações e os gráficos da pressão arterial, antes e após obanho, continuam, na atualidade, interessantes. A ação sobre adiurese, também. A análise profunda da urina e de elementosnitrogenados do sangue já demonstrava o grande Investigador queali aparecia. Fez considerações sobre o efeito no aparelho digestivoe relatos de casos de desenssibilização anafilática após o uso daságuas de Caldas de Cipó.

As suas observações sobre os efeitos da água no aparelhodigestivo contra asma, reumatismo, lotíase urinária, hipertensão earteriosclerose, moléstias do coração e outras, são verdadeirosmodelos de sua boa pesquisa e senso crítico.

Nas suas conclusões acentuava sobre o valor efetivo das fontesem determinadas afecções gerais do corpo humano.

Descrevia o cenário: “O pior é que não se cuidam das fontes.Tudo está ao abandono e ficará ao abandono sem a proteçãodecidida do Governo”.

Impressiona esta Tese pela sua abrangência, pela suainterdisciplinaridade, envolvendo História, Geologia, Química,Física, Medicina, Geografia, Política, realizada não por um simplesFormando, mas, por um Pesquisador, Médico, Educador nato,dentro do paradigma do século XXI.

Obrigado Professor Adriano pelo seu exemplo!

José Antonio de Almeida SouzaMédico

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Relembrando a presença doDr. Adriano Pondé na Escola de Nutrição

Ao falar em Dr. Adriano de Azevedo Pondé, o vejo comomestre e amigo, dotado de grande paciência frente aos arroubosdos jovens.

Por vários momentos durante a minha vida acadêmica, quercomo aluna ou membro do Diretório acadêmico em dias tãonefastos para a Nação, pude testemunhar a atitude deste homemque abandonava a sua postura de mestre e adotava a de um Pai,preocupado com sua prole, com o nosso bem estar, receio que aotomarmos alguma atitude podéssemos ser vitimas de contratempos.Em sua quietude, deixava transparecer sua grande preocupação.

Lembro-me das várias vezes que me argüiu para saber dosestudantes de Nutrição, se estavam em algum movimento, ou seliderando greve. Relato uma das ações mais importante queocorreu quando houve um movimento para reduzir o Curso deNutrição de 4 para 3 anos; após abrir para discussão e análise pelosmembros da Congregação esta proposta de mudança, aguardandoque todos dessem seu parecer, solicitou a palavra da representantedos “mais interessados” como citou; todos aguardaram, a aluna(eu), se pronunciou, e ele acatando a fala da aluna, colocou oassunto em votação, ficando mantido o curso com 4 anos. E assimfora em outros episódios, sempre valorizando o forma de pensar dojovem em formação profissional, animando para as novasinvestidas, cônscio do alto valor da Nutrição como ciência, namissão maior de mestre, dentro da ótica de Paulo Freire: “cabe aomestre desenvolver a consciência crítica do aluno”, assim, DrAdriano Pondé, cumpriu com maestria a nobre função do

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professor/educador – mesmo nos momentos mais difíceis do País -e hoje se faz mais presente que antes, neste templo onde soubeerguer a científica fornalha do saber ciência em Nutrição eAlimentação. Como professora desta Escola, que ele fundou numaépoca em que falar de Nutrição e Alimentação não causava eco,reconheço que sua coragem e ação foi de um visionário no projetopara o futuro além do futuro, rendo as minhas homenagens, eagradeço a Deus por ter permitido a sua existência.

Joselina Martins SantosProf. Adjunto da Escola de Nutrição – UFBA

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Declaração afetiva

Eu, Luiz Antônio Costa, tendo colado grau em medicina em15 de dezembro de 1956 pela nossa querida Faculdade deMedicina da UFBA, não poderia deixar de participar desta justa eoportunissima homenagem comemorativa do centenário donascimento do nosso inesquecível mestre Professor Dr. AdrianoPondé; não poderia e não deveria estar ausente nesta grandeefeméride pois fui um dos seus alunos, e como tal, aprendi acimade tudo ser um verdadeiro médico. O Professor Adriano Pondéalém de ser o nosso querido, amado e respeitado mestre, foi opioneiro da cardiologia do nosso país, dando uma dimensãoinigualável ao nascer da cardiologia brasileira. Sendo assim, todosnós médicos que abraçamos tão nobre e dignificante especialidadecardiológica, devemos muito aos seus ensinamentos e acima detudo à sua dedicação e amor a medicina em geral efundamentalmente à cardiologia. Ele, o mestre Adriano Pondé, nãoé somente o Príncipe dos cardiologistas, ele foi e será sempre onosso grande mestre, o nosso guia, o paladino da cardiologiabrasileira.

Nota: Lembro-me que numa manhã em aula, na primeiraclínica médica no ano de 1955, quis contesta-lo sobre ainsuficiência mitral, ele na sua característica do verdadeiro mestreresPondéu-me da seguinte maneira:

___ Meu colega, você terá muito a aprender como eu tambémterei muito a aprender com meus alunos.

Essas palavras como muitas outras, foram de importânciafundamental para a minha carreira médica, onde humildade,dedicação e competência são fundamentais.

"OBRIGADO MESTRE"

Luiz Antônio CostaCRM 1.170

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Prof. Dr. ADRIANO DE AZEVEDO PONDÉ

Solicitado a relatar algumas palavras sobre o ilustre Prof.Adriano Pondé, meu primo carnal e com quem tive a honra deconviver nos mais íntimos acompanhamentos da sua vidaprofissional. Não só a admiração e o respeito, mas tambem o graude parentesco nos aproximava muito. Fui seu colaborador duranteanos e, algumas vezes, discordávamos de algum diagnóstico o quenos levava a profundos estudos e analises até chegarmos a umaconclusão. Sentia nele o olhar de acerto e sua vibração quando oresultado era correto.

Quando retornei do início de minha vida profissional exercidano interior deste Estado, fui convidado a montar um Laboratório dePatologia Clínica com a finalidade de montar técnicas novasvisando mais a pesquisa que a rotina.

Trabalhávamos em conjunto, dia e noite, domingos e feriados,com visitas familiares e hospitalares onde presenciei o professorpassar as noites ao lado dos seus pacientes até a estabilização doquadro. Só usava os exames complementares para tirar algumadúvida ou para controle. Era impressionante vê-lo firmar umpreciso diagnóstico unicamente com o seu tino, poder deobservação e conhecimento profundo da ciência medica, aliada àprática quotidiana que ocupava todos os momentos da suaexistência.

Não tenho a menor dúvida de afirmar ter sido o Prof. AdrianoPondé o maior expoente da medicina na minha geração.

Luiz Muylaert de AzevedoMédico

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DEPOIMENTO

Certamente foi o Prof. Adriano de Azevedo Pondé um dosgrandes clínicos e dos melhores professores que passaram pelanossa Faculdade de Medicina, então sediada no Terreiro de Jesus.

Quando assumiu a 1ª Cadeira de Clínica Médica da Faculdadede Medicina, então única na Bahia, o Prof. Adriano convidou-mepara seu assistente honorário, já que eu nela trabalhava há váriosanos como interno do então catedrático Prof. Armando SampaioTavares, que falecera.

Permaneci como assistente ministrando as aulas práticas ealgumas teóricas, até 1954, quando, por interesses particularessolicitei o meu afastamento para integrar a Diretoria de umestabelecimento bancário, para qual fora convidado.

Nessa ocasião o Prof. Adriano com sua verve habitualPondérou-me: “mas seu Luiz, você trocar minha Cadeira por umBanco?

O Prof. Adriano foi, sem dúvida, quem firmou na prática oexercício da Cardiologia na Bahia, divulgando o exame maismoderno da época, o eletrocardiograma tanto como “sua”terapêutica nas doses adequadas com os medicamentos digitálicos eestrofantínicos.

Nessa época em 1944, quando me diplomei em Medicina,introduzi aqui na Bahia a oxigenioterapia, fundando com mais 2colegas o Serviço de Gases Terapêuticos da Bahia, que tambémaplicava o Carbogênio, uma mistura de Oxigênio (95%) e GásCarbônico (5%), que era empregado em injeções subcutâneas comovaso dilatador das artérias periféricas, nos casos de arterites,

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principalmente diabéticas e posteriormente para fazer cessar osespasmos da coqueluche.

O Prof. Adriano Pondé deu inteiro apoio ao Serviço de GasesTerapêuticos, utilizando a oxigênioterapia através de máscaras,cateteres e tenda de oxigênio nos casos indicados, ele que era oclínico mais conceituado e de maior clientela em Salvador.

Fundamos também com vários outros colegas a SociedadeBahiana de Cardiologia, da qual ele foi o 1º. Presidente e eu 1ºTesoureiro.

Mesmo afastado da sua cátedra, continuamos a boa amizadeaté o seu falecimento.

Salvador, 05 de maio de 2001.

Luiz Ramos de QueirozMédico

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Homenagem ao professor Adriano de AzevedoPondé, em seu centenário de nascimento.

Trecho do livro: “uma mulher de branco”, que contareminiscências do 1. Ano de Residência médica, no Hospital dasClínicas, hoje Hospital Edgar Santos, da Universidade Federal daBahia.

Capitulo XVII

Na 1a médica, encontro o professor Adriano Pondé, comochefe da Clínica, um dos maiores cardiologistas da cidade naépoca, já mais idoso que Dr. Roberto. Possuindo uma clínicainvejável, talvez por isso mesmo, não disponha de tempo comoeste para dedicar ao Hospital.

É alvo, altura mediana, usa óculos, educado, fala mansamente,com um tom levemente irônico. Recebe bem seus residentes edemonstra sempre aquele cavalheirismo e fidalguia das famíliastradicionais baianas.

Entre seus Assistentes, há três mulheres: Dra. Anita,orientadora da Residência, Dra. Angelina, descendente como eu deitalianos e Dra. Denakê.

Dra. Anita é morena, cor de jambo, tem cabelos negros e lisos,sorriso doce, covinhas maravilhosamente colocadas em sua face depele macia. Alta, elegante, inteligente, mostra-se sempre atenta einteressada em seus doentes. É alta, veste-se com muito bom gosto,tem olhos escuros e vivos, boca de lábios grossos e sensuais,dentes alvíssimos, que surgem encantadores quando sorri.

Dra. Angelina é alva, cabelos escuros, veste-se com maissobriedade, sem perder a elegância. Trata a todos com gentileza.Está sempre correndo, de um leito para outro, vendo prontuários,dando ordens, observando.

Dra. Denakê é morena, magra, não muito alta; tem fama de serpessoa difícil no trato e na Residência, existem recordações nãomuito agradáveis de sua atuação. Tem um temperamento instável enão muito acessível, segundo dizem.

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Chego meio temerosa, com orientação para não criarproblemas. Procuro juntar todo mel que encontro em meu coraçãoe, confiando nisso, sigo em frente, pensando:

- Seja o que Deus quiser!Apresento-me ao professor, logo cedo, devidamente

acompanhada pelo meu estetoscópio e belo abençoado caderno,armas do residente. Capa alvíssima, impecável. Sorridente, entroem sua sala. Dr. Adriano levanta-se, com uma mesura e me recebecom um sorriso largo.

- Bom dia, Dra. Giovanina. A casa é sua! Vou mandar chamarDra. Anita para apresentá-la. Já se conhecem, não?

- Sim, naturalmente. Das aulas- Bem, isto dispensa apresentações. E, virando-se para fora:- D. Marisa, quer por favor chamar Dra. Anita?- Não demora e uma vozinha arrastada de nordestina faz-se

ouvir na porta da sala.- Chamou, professor?- Sim, chegou a nova residente. Quer fazer o favor de vir Até

aqui- Pois não, com prazer.Dra. Anita entra na sala, irradiando simpatia. Tem o ar fresco,

um perfume delicado penetra com ela na sala. Sua capa é branca elimpa. Anda com movimentos felinos, sem pressa, com levesmeneios sensuais. Sorri para mm.

Já nos conhecemos, não é, Giovanina?- Sim, doutora Anita, fui sua aluna.- E muito boa aluna, ela comenta, delicada. É um prazer tê-la

conosco, diz, apertando simplesmente minha mão.- Qualquer dúvida, ela é quem está encarregada de orientá-la.

Mas pode vir a mim, quando queira; estou á sua disposição. Esperoque se adapte bem conosco.

- Obrigada, professor, sinto-me em casa.- Vai passar enfermaria agora, professor? Pergunta Dra. Anita.- Sim; vamos apresentar nossa colega aos pacientes, diz o

doutor Adriano levantando-se.Penso emocionada:Vou conhecer um novo mundo...A enfermaria sem Silvio fica vazia.Chega o dia D de Cláudia; subo para instrumentar sua cirurgia.

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Aberto o abdome o Dr. Hugo Maia, o cirurgião, encontra úteroe ovários, solucionando o problema.

Na véspera da cirurgia, acontece um incidente engraçado.Na hora de passar enfermaria, o professor Adriano vê Claudia

chorando. Ele para, conversa com a menina, promete balinha,chocolate e... nada! Ela não para de choramingar.

Passamos as duas enfermarias inteiras e os leitos individuais.Continua o ruído desagradável do choro de Claudia.

O professor resolve voltar e conversar com ela.- O que você tem, Boneca? Vou dar a você uma nova filha.

Esta está um pouco... velha, não é?A menina continua choramingando.- Se não quer uma boneca, quer uma bola? Umas panelas para

brincar de casinha?- A criança olha-o com os olhos cheios d´dágua, mas não

resPondé, amuada.- Faz tempo que está chorando. Quando a gente pergunta diz

que num é nada... Explica a doente do leito vizinho.- Doutorinha, converse com ela, diz o professor sorrindo para

mim e observando.- Claudia, Dr. Adriano vai dar a você outra boneca. Panelas

para você brincar. Nós lhe daremos chocolates. Isto não é bom,querida?

Dei um beijo estalado em sua face molhada de lágrimas. Umabraço apertado e ruidoso. A garota continuou chorando.

- Você não quer os presentes? Responda, querida!O choro continuava. Ela afirmava com a cabecinha que queria,

mas continuava chorando...O professor então olhou-a pensativo. Depois sorriu e

comentou comigo e com Dra. Anita:E vocês ainda têm dúvidas de que ela seja mulher? Ora esta,

chorando à tôa...

Margot Lobo ValenteMédica

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Eu fui “uma das pupilas de Dr. Adriano”

“Entrei para Escola de Nutrição em março de 1957. Foi oprimeiro ano em que foi realizado o ingresso mediante concursovestibular ... Fui aprovada!!! Felicidades!!! A partir daí ,acostumei-me a ouvir sempre que éramos as “pupilas deDr.Adriano”...Até então, não entendia direito a extensão daalcunha...

Quando, n’uma manhã qualquer de 18 de outubro de 1957...Estava esperando a condução em um ponto de Ônibus. Aflita,

haveria uma reunião... Foi tudo muito rápid... Um convite de umaamiga em um Citroen preto... Uma providencial carona!!! Umamanobra intempestiva de um caminhão... A derrapagem...Oacidente... Ferros retorcidos, o Pronto Socorro do Canela... Fuireconhecida por uma colega de enfermagem... A Escola foraavisada!!! Neste instante a providencia divina traçou uma linhadivisória entre uma mocinha qualquer vítima de um acidente, euma “pupila de Dr.Adriano”.

O querido mestre providenciou minha transferência para orenomado Hospital das Clínicas, no andar dirigido por ele, ondetoda sua equipe (em especial Dra.Angelina Pelosi Matos) nãomediu esforços e conhecimentos naqueles sofridos meses deinternamento, entre o coma, o afundamento craniano, a amnésiaprofunda, e enfim,a recuperação.

Por sua influencia, a Escola de Enfermagem foi mobilizada,havendo diuturnamente uma estudante ao meu leito.

Após 2 meses tive alta, e nossa estória não terminou por aí...Após intenso sofrimento físico, o sofrimento moral... Deparei-mecom a incompreensão da Secretaria da Escola, proibindo-me derealizar a 2a.chamada das provas perdidas...

Eu,aquela aluna aplicada, responsável, com o ano perdido?!Não! Mais uma vez o mestre,o amigo, naquele instante o pai,entrou em cena, e com apoio da grande e saudosa amiga,

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Enfa.Nilza Garcia, então Diretora da Escola de Enfermagem,descerraram o véu da incompreensão, e pude realizar as provasfinais, permitindo–me o acesso ao 2o.ano, formando-me em 1959.

A partir daí, pude entender o peso de ser uma “pupila”...Sua atitude despida de qualquer interesse pessoal ou político,

a uma simples aluna desconhecida, norteou a minha vidaprofissional...

Tal qual o Mestre e seus discípulos daquela ClínicaCardiológica do Hospital das Clínicas que testemunhei comopaciente, como nutricionista,em um Hospital Psiquiátrico,procurei abordar cada paciente com respeito, dignidade, eindividualidade, e não simplesmente como fichas dietoterápicaspara doentes mentais.

Hoje ,aposentada das minhas atividades profissionais, masnão da gratidão,agradeço a Deus a oportunidade de o terconhecido, e poder contribuir à sua memória por ocasião do seucentenário de nascimento, entrelaçada à minha própria memória,por tudo acima relatado, e pela honra de possuirmos a mesmadata natalícia...”

Salvador,26 de junho de 2001

Maria de Jesus Valente MonteiroNutricionista/CRN 0007

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“Meu Cliente”,o Prof. Adriano de Azevedo Pondé

Um carinho muito grande guardo em minha memória: o quesignificou para nós - eu e Jair, esta figura impar de Mestre,Professor, Amigo e Paraninfo da Turma de 1945 – “a turma deJair”.

Além de esposa de seu afilhado, fui agraciada com o títulohonorífico de “minha ginecologista”. Cuidei da querida donaMaria do Carmo por muitos anos. Seu acompanhante, o queridoProf. Pondé, tinha razão de assim me chamar; apesar de euexaminar a D. Maria do Carmo, ele procedia como se ele fosse ocliente, aquele para quem prescrevi a receita. Perguntava-me sobretudo, desde qual o meu diagnóstico até a minúcias sobre amedicação prescrita, que substâncias originais continha o remédio,seus efeitos colaterais...

Parecia-me que ele captava até o “não bom” da medicação,deixando apenas o BOM para que sempre surtisse o efeito desejadoem sua “Iaiá”. Quanto amor, quanta dedicação!

Lembro-me de suas visitas à nossa casa em São Thomé deParipe, nos encontros e comemorações da turma de 1945.Balançando-se na rede, como vibrava de alegria, sempreexpressando seu agradecimento pela beleza do lugar, pela nossaacolhida e a companhia de seus afilhados! Dona Maria do Carmoestava sempre rodeada da afilhada Bety Souto Maior e de nós, as“Esposas dos Doutores de 1945”!

Maria de Lourdes Rocha Santos BurgosMédica

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Lembranças

Lembrar do Prof. Adiando Pondé é sempre um prazer. Alembrança daquele professor digno, estudioso e competente,lutando pela sua clínica e seu paciente, fazendo da medicina umideal de vida.

Criou uma escola, prestigiou seus colegas e alunos, dando umalição do exercício da profissão com a maior seriedade e dedicação.

Foi um amigo da Escola de Enfermagem nos seus promórdios,procurando valorizar aquele grupo, desejando fazer da profissãoum parceiro importante na cura e manutenção da saúde.

No seu centenário, devemos nos sentir honrados de termosparticipado de seu convívio.

Maria Duarte SepulvedaEnfermeira da Turma de 1952

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Professor ADRIANO PONDÉ

A sociedade baiana associa-se à Universidade Federal daBahia e, em particular à Faculdade de Medicina, nas homenagensque vêem sendo prestadas ao insigne Mestre da medicina, aoensejo do centenário de seu nascimento em junho do corrente ano.

Professor Catedrático, título conquistado em brilhanteconcurso de títulos e provas, o Professor Adriano, autor denumerosos trabalhos sobre sua especialidade, sempre buscoumanter-se atualizado, o que lhe valeu o reconhecimento nacionalde seus pares, tal as solicitações que lhe eram feitas para examinarconcursos em outras faculdades do país ou pronunciarconferências.

Também a sociedade soube apreciar os méritos do famosoclínico, acorrendo em grande número para o seu consultório. Valia-se para tanto não só de sua grande competência clinica, mas de sualhaneza no trato com pacientes e familiares, aliado a um grandesenso de responsabilidade, dedicação e ética no atendimento aosque buscavam sua atenção profissional.

Integrante da primeira turma do curso de enfermagem daUFBA tive o privilégio de ser uma de suas alunas na disciplina deCínica Médica. Didático, discorria de modo eloqüente mas semafetação, a matéria que dominava, sempre interessado noaprendizado de suas alunas. Essas aulas também despertavamgrande interesse dos estudantes do curso de medicina, a procura deuma novidade a mais.

Quando o Hospital das Clínicas (hoje Hospital ProfessorEdgard Santos) foi inaugurado em novembro de 1948, o Professor

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Adriano foi dos primeiros a transferir da Santa Casa deMisericórdia os serviços ambulatoriais e de enfermaria sob suaresponsabilidade, para as novíssimas instalações do hospitaluniversitário.

Ainda como estudante de enfermagem acompanhei ainstalação do novo ambulatório. O clima cordial e de seriedadepredominava no relacionamento entre o Professor e seusdiscípulos, propiciando o surgimento de laços de amizade nogrupo, que se mantém até os dias de hoje.

Entre as colegas de enfermagem, esse entendimentorespeitoso, aliado a uma grande admiração ao Mestre, foi decisivoem sua escolha como paraninfo da primeira turma de nosso curso.Em brilhante oração “às moças”, o Professor Adriano ressaltou ogrande papel da nova profissão de enfermagem, tanto nosmodernos hospitais – escola, quanto no trabalho visando àprevenção das enfermidades, principalmente aquelas endêmicas emnosso meio.

Mais tarde, já formada e na qualidade de Diretora da Escola deEnfermagem, tive mais uma vez oportunidade de trabalhar muitoproximamente com o Professor Adriano, agora no ConselhoUniversitário onde ele era representante da Congregação daFaculdade de Medicina. Por dois mandatos consecutivos ocupoutambém o cargo de Vice Reitor, sendo o primeiro na gestão doProf. Albérico Fraga e o segundo com o Prof. Miguel Calmon,quando teve oportunidade de assumir o cargo de Reitor em virtudedo falecimento deste. Foi um momento difícil na vida de nossaUniversidade, tolhida pela dor e pela surpresa do inesperadodesaparecimento do Reitor Miguel Calmon. O Reitor Adrianosoube conduzir a Universidade naquela inusitada situação,demonstrando grande equilíbrio e liderança.

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Suas preocupações, além da administração da Universidade,estavam particularmente concentradas na Escola de Nutrição queele próprio havia criado, e desejava que fosse realmente umaunidade modelo, centro de referência para o nordeste brasileiro.

Finalmente, para concluir essas breves palavras, escritas sobemoção ao relembrar a figura de um grande Mestre, lembro daspalavras de J. Maritain: “a grandeza das grandes figuras da Históriareside em que souberam inserir-se nas exigências do seu tempo”. OProfessor Adriano soube aliar a sua sabedoria de grandeprofissional da medicina, ao de eminente professor, além de líderuniversitário.

Salvador, abril de 2001

Maria Ivete Ribeiro de OliveiraProfessor Emérito da UFBA

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Ao Prof. Adriano de Azevedo Pondé,no seu centenário de nascimento

É uma honra poder compartilhar, juntamente com a área desaúde da UFBA, e, de modo especial, com a dedicada equipe daentão – 1ª Clínica Médica – Prof. Dr. Adriano de Azevedo Pondédo HC – nas pessoas dos seus diletos ex- assistentes, responsáveispela realização dessa justa homenagem ao mestre, por ocasião doseu centenário de nascimento.

Conheci o Prof. Pondé em 1945 quando aqui cheguei do meuinterior – Jequié – trazendo a minha mãe, com uma carta derecomendação do nosso médico de família, o Dr. Cely de Freitas,para o seu colega, solicitando examina-la. Logo o procuramos, efomos muito bem atendidas; cujo resultado do exame teve, Graçasa Deus, o diagnóstico satisfatório. Fiquei impressionada com amaneira atenciosa e com a segurança demonstrada por aqueleSenhor simpático e ainda jovem, no atendimento dispensado à suanova cliente, nos deixando à vontade, ouvindo perguntas erespondendo com simplicidade. Procurou saber dos meus estudos,se eu já havia definido a profissão, insinuando-me a optar pelamedicina; disse-lhe que preferia odontologia; ele rindo, disse-melouvar a minha determinação. – Nunca pensei que um dia viria aser sua aluna.

Em 1946, com a fundação da Escola de Enfermagem daUFBA, o meu amigo, Prof. Trípoli Gaudenzzi, me convenceu aingressar na recém-criada escola, dizendo-me ser uma nova epromissora profissão.

Foi quando tive a oportunidade de novamente encontra-mecom o Prof. Pondé, já na condição de sua aluna, assistindo suasaulas de clínica médica. O seu método de ensino, despertava

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atenção porque, ao tempo em que desenvolvia a teoria, intercalavaexemplos vivenciados com os seus próprios doentes, alusivos aoassunto teórico, para uma melhor compreensão; aí, vibrava quandoo diagnóstico e o tratamento levavam à recuperação do paciente;mas, também se mostrava triste quando falhava e, às vezes, levavao seu paciente ao óbito. Emotivo, evidenciava a sua dignidadeprofissional, seu espírito de responsabilidade e amor ao próximo.

Era um dos professores mais ilustre da sua época, marcadopela competência, dedicação ao ensino e aos seus pacientes doentão Hospital das Clínicas, bem como à clientela particular. Eraum verdadeiro “médico de família”, visitando seus pacientes emdomicílio tantas vezes quanto necessitassem de sua assistência,sem se preocupar com o horário.

Hoje, que tanto se fala na oficialização do “médico defamília”, naquela época eram os professores catedráticos da melhorestirpe que iam às residências, sem nenhuma complicação, atenderaos seus pacientes de qualquer condição financeira.

Impossível deixar, nesta oportunidade, de citar fatos referentesao Prof. Pondé vivenciados por mim, os quais ficaram indeléveisna minha memória, a capacidade de compreensão, a sensibilidade eo respeito humano daquele homem de tanta projeção profissional.

Era eu ainda estudante, e fazia estágio na 1ª Clínica MédicaProf. Adriano Pondé, unidade do então HC. Era a enfermeira chefedessa Clínica, D. Radicliff Guanais Dourado (Santos Pereira), quetambém era professora da Escola de Enfermagem (naquela épocase acumulava as duas funções), minha eficiente quanto exigentesupervisora. Havia na clínica um paciente idoso, de temperamentodifícil, que se negava de modo absoluto a beber água; oscomprimidos ele ingeria a seco, derramava o copo d’água,desobedecia a todos. Esse paciente ficou sob meus cuidados e a D.Rad, me encarregou a convence-lo a beber água de qualquer modo.Estava eu nessa “luta” quando o Prof. Pondé entrou na enfermaria

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e tomando conhecimento do problema, me pediu o copo, e, certoda sua vitória, disse ao paciente: “beba logo sua água com ocomprimido amigo”; o homem, num gesto de revolta resPondéu:“doutô, o Senhor sabe muita coisa, mas não sabe tudo não... voulhe dizer o meu segredo pra vocês me deixar em paz; ou vouembora... tem 10 anos que comi coração de cágado pra fechar meucorpo contra doença ruim e por isso não posso beber água nuncamais, para não perder o efeito; e, não é aqui que vou quebrar minhapromessa” e deitando-se cobriu a cabeça. O professor me entregouo copo, bateu no ombro do paciente e disse: “está certo amigo,ninguém mais vai lhe falar em água; fique com aquela do seucoração de cágado”. Rindo, saiu dizendo: “a fé tem poderes alémda medicina... aprendi mais uma lição”. Era assim o Prof. Pondé,cordato e humilde.

Sua maneira como distinguia a Escola de Enfermagem,conferindo-lhe sempre uma posição de alto nível na Universidade,a atenção e amizade dispensada às estudantes, levou-nos,estudantes da 1ª turma dessa Escola, ao término do curso, aconvida-lo para ser o paraninfo da turma em 09/12/50.

Um outro fato que muito me sensibilizou em relação ao Prof.Pondé foi quando – já formada e chefe de enfermagem da ClínicaGinecológica – num fim de tarde, o professor chegou na minhasala visivelmente emocionado me pedindo licença para ficarsozinho, na sala de reunião dos professores, pois precisavadesabafar; e, chorando copiosamente me falou de gravidade doestado de saúde do seu “filho profissional”, o jovem assistenteSilvio Monsão, que se ultimava na sua 1ª Clínica Médica.Atendendo seu pedido ofereci-lhe água e deixei-o sozinho, por umbom tempo. Mais tarde, tentando se fazer de forte, banhou o rosto,agradeceu-me e saiu abatido.

O Prof. Pondé não deixou filhos biológicos, mas,praticamente, “adotou” grande parte de seus alunos de medicina –

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os internos da 1ª Clínica Médica, os quais chamava de “filhosprofissionais”, muitos deles se tornaram seus fiéis assistentes. E,em relação a isto, vou falar de mais um dos seus episódios: já nadécada de 70, retornei ao seu consultório com a minha mãe; ele aexaminou e disse-lhe: “a senhora está ótima e a partir de agora,quando precisar de médico, procure uma jovem médica, minhaassistente, que atualmente sabe mais do que eu”; assim rindo muitodisse que era a Dra. Angelina Pelosi; “não diga isso a ela para quenão fique compenetrada, mas é ela, uma das minhas filhas deprofissão”. E assim o fiz. A Dra. Angelina nunca soube dessarecomendação mas passou a assistir a mamãe com todacompetência e carinho, passando a visitá-la em nossa residênciaquando isto se tornou necessário. Tão grande foi a sua assistência ededicação, que a mamãe a chamava de “professora dos doutores”.E assim foi até os seus últimos dias entre nós (1990).

O Prof. Pondé foi, portanto, um grande mestre não só namedicina, mas na orientação de pessoas em todas as dimensões!

Maria José de OliveiraProfessora Adjunto aposentada da escola de Enfermagem da UFBA

Ex- Diretora da Escola de Enfermagem da UFBAPresidente da Associação dos Enfermeiros Aposentados da Bahia

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ADRIANO PONDÉ – O INOVADOR

Das qualidades magistrais e magisteriais de Adriano Pondé,merece principal destaque a de ter sido ele a fronteira e ao mesmotempo traço de união entre o ensino da medicina clínica, em basespredominantemente teóricas como faziam os grandes professoresque o precederam (José Olímpio da Silva, Fernando São Paulo,Sabino Silva etc.) e o ensino dirigido para Prática Clínica, comopassou a ser por ele e pelos que lhe seguiram o exemplo,aproximando o jovem estudante do doente, mais do que da doença,o que se mantém até agora.

De seus antecessores, o de que mais se aproximou foi onotável Armando Sampaio Tavares, cuja Cátedra veio ocupar empoucos anos.

Outra notável realização foi ter criado uma Escola MédicaCardiológica, sendo especialidade da qual, foi introdutor entre nósembora, não deixasse de ser o grande Clínico Geral, sem subdividira Medicina Interna em muitas sub especialidades (pneumologia,gastroenterologia, endocrinologia etc.) como infelizmente se vemfazendo no Ensino Médico, esquecendo-se que a medicina internaé uma só e que o grande clínico, é o que conhece bem e praticatodas estas sub-especialidades clínicas, até porque não se trataapenas o coração, o fígado, ou a tireóide de alguém trata-se alguémque tem um coração um fígado e uma tireóide. Portanto, AdrianoPondé, sendo um dos maiores cardiologistas do País, nunca sedivorciou da clínica em geral, defendendo como os que lheseguimos a orientação, que a Clínica Médica é uma só, não podeser fracionada artificiosamente para contemplar os interesses e aslimitações dos que se conformam com uma daquelasespecialidades.

Dentre os que se destacaram na Escola de cardiologia queiniciou, estavam Moreira Ferreira, Jorge Leocadio, RubensTabacoff, Anita Franco Teixeira, Angelina Pelosi, Denakê

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Philocreom, Géothon Philocreom, Alberto Pondé, ArmênioGuimarães, mas os que foram seus alunos apenas curriculares,receberam também a marca de sua orientação científica.

Foi fundador de inúmeras associações científicas nacionais,tendo inclusive presidido algumas delas como as de Cardiologia.

Estimulou e conduziu a pesquisa científica, inovou portanto oensino da Medicina Clínica, o que não significa concordamos coma designação injusta, ingrata e pejorativa de “bacharelice médica”pela qual ainda hoje algumas desmemoriados designam o ensinoclínico praticado pelos professores anteriores.

Perfeccionistas, sua lições alcançavam todo assunto proposto,sem esconder a minúcia dos detalhes.

Sua presença nas bancas de concurso, sempre se tornavadominante, além de temível pelos candidatos, porque aprofundidade do seu saber e a elegância da sua dialética tornavamsuas argüições de difíceis respostas pelos candidatos quepretendessem supera-lo até porque se transformavam em vigorosaslições científicas.

Filho de um grande médico João Pondé, Adriano não tevefilhos, mas considerava afilhados não só seus paraninfados, comoos que lhe acompanhavam na Escola Científica. Fui um destes!Não se negava em acompanhar e ajudar médicos mais novos juntoa casos clínicos difíceis mas, ainda assim não esquecia de fazersuas ironias. Lembro-me bem que visitando comigo uma pacienteem que eu fizera o diagnostico de tromboflebite criticou adesignação, substituindo por “venite” dos autores franceses ao querespondi, que aprendera com ele a primeira designação.

Em outra oportunidade, quando lhe ofereci o estetoscópio paraauscultar um paciente, agradeceu perante a família, dizendopreferir praticar a auscultação direta do tórax. Comentei ter ciênciado valor destas últimas, que aliás foi a primeira e maliciosamenteacrescentei, saber que ele a praticava diferentemente em pacientesmasculinos ou femininos, usando orelha direta no primeiro caso e aesquerda no segundo; percebendo a malícia, acrescentou que assimfazia por sugestão das clientes...

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Fui seu médico por algum tempo, num dos seus últimos anosde vida e pude perceber, que a disciplina quanto ao tratamento,inclusive a dieta, que exigia dos seus pacientes, modelarmentepraticava como paciente, até porque ensinou-me: “ou se confiaintegralmente no médico ou se muda de médico”

Meu primeiro contato com Adriano – tinha eu então 10 anos.Fui em casa do meu avô Francisco Eloy Paraíso Jorge, tambémmédico cardíaco, quando por alguns dias Adriano substituiu seupai João Pondé na assistência ao venerano paciente. E ali nasceu aadmiração e a confiança que progressivamente aumentaram nasdécadas seguintes.

A lacuna deixada por Adriano Pondé na nossa Faculdade deMedicina, quando se aposentou, permanece até hoje, apesar deseus doutos sucessores.

Com Adriano Pondé, aprendi que o médico não pode alinearsua autoridade e que deve praticar sua “Arte” com profundoconhecimento e também com sutil elegância. Documentava assim asua presença na Posteridade, que ainda e sempre deve, saudade,respeito e admiração.

Mário Augusto Jorge de Castro LimaProfessor de Medicina

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Adriano Pondé: parentesco e afinidades

Ao procurar fixar alguns traços do perfil de Adriano Pondédeparo-me com uma série de imagens que se justapõemsimultaneamente: a do médico humanitário, a do professordedicado, a do pesquisador escrupuloso, a do acadêmico e outrostantos qualificativos que se conjugam para compor o retrato destebaiano ilustre, aqui justamente homenageado na oportunidade dacelebração do centenário de seu nascimento.

O meu propósito, porém, é revelar apenas um pouco do que foiAdriano Pondé na intimidade, aquele tão perfeito homem defamília com quem tive o prazer da mais estreita convivência, pois,sendo ele o mais velho dos irmãos de minha mãe, nossorelacionamento começa, por atávicos caminhos, antes mesmo demeu próprio nascimento, na estreita relação de parentesco ecompadrio.

Debruçada no espelho turvo do passado busco captar uma dasimagens de Adriano Pondé: a minha imagem de Adriano Pondé.Busco juntar fragmentos dispersos. Às vezes opacos, diluídos nadistância, às vezes brilhantes e vivos como vidros coloridosformando desenhos num calidoscópio.

Na monografia que escreveu sobre Marcel Proust, AdrianoPondé assinala que, para esse autor “a justaposição de estadossucessivos é que faz o nosso Eu”. Convenhamos, neste momento,que a“ busca do tempo perdido” é um difícil e lento trabalho paraquem se disponha a resgatar sua verdade e permanência, no antigosabor dos dias vividos.

Mas o que será realmente a “verdade” de um homem, seu ladomais absoluto? E haverá, porventura, esta totalidade do ser?

Se para Marcel Proust, uma das paixões literárias de nossohomenageado, “a nossa personalidade social é uma criação do

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pensamento alheio” e por isso mesmo se nos afigura múltipla,distorcida, conflitante, o que será então nossa personalidade real?Existe, realmente, ou será também uma permanente mutação, umreflexo de variados estados de alma, das contingências do ser “emsituação”?

Assim, nesta busca de camuflados caminhos, onde se enredamos confusos fundamentos de meu próprio labirinto, vou tateandoaos poucos, como se armasse peças de um quebra-cabeças:intuições, reminiscências, reinventos.

Como através de um painel que se desdobra, vejo a casa da rua8 de dezembro, com sua escada de mármore branco lançandofaiscas ao sol do meio dia. Uma mangueira sombreava o pátio e navaranda, móveis de ferro, no melhor estilo art-decô, apertavam osdedos dos visitantes distraídos em suas lâminas maleáveis. Haviaum almoço, reunião de família, e ele chegava, apressado, numterno de linho branco, óculos de grau, redondos com aros pretos,sorridente, desculpando-se do atraso.

Lembro também, de repente, de uma varanda sobre o mar –havia por acaso luar aquela noite em Praia Grande ou a memóriafantasia a sua parte? Havia lua, sim, a claridade esbranquiçava aareia da praia onde pescávamos papa-fumos. De súbito, uma barataapareceu, voando, do arvoredo da casa ao lado fazendo com queele subisse lépido e apavorado, na amurada da janela. Passado osusto, desatamos todos na gargalhada: pois não é que o Dindotinha medo de baratas?

Há um sabor de chá e madeleine nestes assomos dereminiscência. Todos temos nossos Combrays, nossas tiasLeôncias com seus chás, seu perfume suave acendendolembranças. Assim é que aos poucos, lentamente, vou desfazendoos novelos. O Dindo da minha infância era uma presença boa,amistosa, agradável, sempre pronto a presentear generosamente, aaliviar os sofrimentos de nossas moléstias infantis, mas não era

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ainda a presença duradoura, indispensável, a que buscou econseguiu, na cumplicidade do espírito, apagar as diferenças degeração, de idade e até, porque não dize-lo, de uma diferente visãode mundo.

De repente, não posso bem precisar a época, Adriano passa aocupar na minha vida um lugar privilegiado numa escolha ditadamais por uma afinidade espiritual do que pelas razões deparentesco.

Agora era também o companheiro que ouvia com atenção, quechegava de repente com um livro desejado, que me reconhecia avocação, ainda na insegurança dos primeiros versos. Presente emtodos os momentos importantes de minha vida: alcovitava onamoro, acompanhou o noivado, paraninfou o casamento. Assistiuao parto de todos os meus filhos. Quando editei o primeiro livrinhoe, diante dos volumes, ainda quentes da prensa, me perguntava,meio aflita, o que fazer daqueles pacotes empilhados na sala, elechegou de repente já tinha sabido do livro!

Chegou entusiasmado, desfez os pacotes, ditou dedicatórias,distribuiu orgulhosamente alguns volumes para parentes e amigos,enviando pelo correio, cobrando opiniões, de preferência elogiosas,é claro. Daí para diante não perdia lançamento, sempre fazendoquestão de comprar vários livros Não quis o destino que ele, jáentão muito doente, assistisse à minha posse na Academia deLetras. Ele, que tantas vezes vaticinara esse acontecimento.

Aqui assinalarei duas coincidências: a primeira vez queparticipei de uma cerimônia acadêmica foi por ocasião de suaposse na Academia de Letras da Bahia. Ainda no Terreiro de Jesus,a velha casa que então sediava a Academia seria insuficiente paratantos convidados. Por isso a festa se fez no salão nobre de suaquerida Faculdade de Medicina, também ali, na mesma praça, noTerreiro de Jesus.

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Naquela noite memorável, para minha surpresa, terminou odiscurso de posse citando versos de meu livro Sesmaria. Foi entãoque tomei consciência de que seu interesse pela minha atividadepoética transcendia o círculo familiar. Respeitada em minha tãojovem experiência, me senti feliz de estar sendo publicamentereverenciada.

Mas, se a primeira vez que pisei na Academia foi para assistirà sua posse, a última em que ele lá esteve foi para votar na minhacandidatura. Não teve a alegria de me ver com o colar e eu,cumprindo a liturgia acadêmica, fui escolhida para o dolorosodever de fazer-lhe o elogio, como a um confrade desaparecido, aodeclarar-se a vacância da cadeira que fora, por ele, tãohonrosamente ocupada.

Myriam FragaPoeta

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ORAÇÃO DE DOUTORANDOCOLAÇÃO DE GRAU

FACULDADE DE MEDICINA DA BAHIA1942

O LIVRO UNDÉCIMOOsvaldo Devay de Souza

(in memóriam)

PROFESSORES HOMENAGEADOS

E vô-lo digo com perversão da verdade, porque nós e queestamos homenageados à nossa escolha e na aceitação que lhesdestes.

Nós os destacamos, sem excluir, mas preferenciais, ou porafeto mais comunicado, ou por estímulo mais assíduo, ou porobjeto de esperança maior de ajuda e patrocínio quando das nossasmais ingratas dificuldades.

E assim nos veio:A bondade que se oculta, disfarça, mimetiza em Eduardo

Diniz.A amizade fraterna de João Andréa, em todos os nossos passos

de estudante presente.A acolhida paterna de José Olímpio, simples e dadivoso,

servindo o ouro de lei do seu senso clínico.A formosura de coração e o talento de Estácio de Lima.O cavalheirismo e a simpatia de Adriano Pondé, jovem

mestre amadurecido de saber, a quem devemos os nossos reaisprimeiros encontros com a medicina. (N.R.o grifo é nosso)

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A cordialidade de Lafayete Coutinho, que tão mais se ligaconosco porque integra a família de um de nós.

A capacidade de ser e de ilustrar, de Cesário de Andrade, quenem a distância afastou dos moços seus discípulos.

E o mais que afeto, e mais que justiça, a idolatria por Almir deOliveira.

E ao Professor EDGARD REGO DOS SANTOS, queridopadrinho das nossas boas e belas esperanças.

Cortesia deOgvalda Devay Torres

médica

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Adriano Pondé

As pessoas predestinadas trazem a característica de umapersonalidade polimórfica, refletindo a biodiversidade natural dosseres bem dotados.

Por tal motivo, um perfil de Adriano Pondé tem que focalizaros múltiplos aspectos da brilhante trajetória da sua vida. Ele nosdeixou a lembrança sempre viva do professor, do chefe de escola,do clínico, do administrador, da pessoa humana entusiasmada pelavida.

O professor da Faculdade de Medicina, titular de duasdisciplinas, Propedêutica Médica e Clínica Médica, se distinguiapela singularidade da sua didática. Sem pressa, sem estardalhaço,sem querer impressionar ninguém, o mestre, no seu raciocíniocartesiano, timbrava em ser compreendido.

Com a segurança e tranqüilidade que Deus lhe deu, transmitiaaos alunos a alegria genuína da aprendizagem. O que noutras aulasparecia sobrecarga ou aborrecimento com ele era o “apprendre parplaisir”.

Realista, prático, teorizava quando necessário, mas sempreancorava suas afirmativas em lições concretas.

Sempre a par dos avanços contínuos da medicina, logo traziaas novidades e as aplicava nas aulas de enfermaria. Foi umverdadeiro chefe de escola médica, criando no Hospital SantaIsabel, onde se ministrava a parte clínica do Curso Médico daUFBA, a célula pluripotente da cardiologia baiana. Fundou oprimeiro ambulatório de Cardiologia de Salvador, onde dirigia eincentivava um grupo ebuliente de estudantes e assistentes dacardiologia, especialidade que se tornou a mais prodigiosa damedicina atual.

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Professor Adriano Pondé chegou a contratar um professor deMatemática para explicar a teoria dos vetores, assunto básico paraa interpretação dos mistérios do eletrocardiograma.

Depois, transferiu seu serviço para o Hospital das Clínicas daUFBA, onde continuou a formar gerações de médicos que sebeneficiaram com sua orientação.

Ao lado da criadora atividade acadêmica, exercia também aclínica particular, pois não era possível sobreviver com o ordenadoirrisório de Professor Catedrático. Com a sua competência e seucarisma interpessoal, atraiu uma das maiores clientelas deSalvador.

Quando diante do cliente, dedicava-lhe toda a sua atenção,sem interposição da sua pessoa de médico e sem quaisquerinterrupções. Sabia ouvir porque sentia ele que a doençafreqüentemente diz seus segredos em parênteses casuais. Era umouvinte atento, com especial sensibilidade para as entrelinhas dahistória do paciente.

Além de ser profissional competente era uma pessoa humanaque tratava de seres humanos que necessitavam de ajuda.

Um outro aspecto da personalidade do Prof. Adriano Pondéera representado pela sua insaciável curiosidade intelectual. Era umaprendiz eterno. Não se julgava dono de nenhum conhecimento.Quando previu que a língua inglesa iria torna-se universal e que ahegemonia do francês iria ser destronada, resolveu estudar inglês, elogo começou, com seu entusiasmo juvenil, a falar, sem temer oserros iniciais e normais. Dizia, na época, que quem não conhecia oinglês só utilizava um hemisfério cerebral.

Na sua especialidade, a cardiologia, os avanços científicoseram contínuos e amplos. E ele dizia que estava sempreaprendendo e se atualizando e acompanhando o que ocorria emtodos os outros centros de estudo cardiológico. Sua tese deconcurso versou sobre enfarte do miocárdio. Numa época em quenão havia Bireme nem Internet, conseguiu, num esforço homérico,reunir o que havia sido feito no mundo inteiro sobre o assunto e

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publicou uma tese que se tornou famosa pelo volume deinformações que proporcionou.

Outra qualidade importante possuía o Prof. Adriano Pondé: eraum administrador geneticamente bem estruturado.

Dedicado ao trabalho, onde encontrava a realização se seuímpeto criador, sabia como pouca gente, distribuir o seu tempo efazer tudo que fazia com a concentração total dos seuspensamentos.

Nos mandatos do grande Reitor Prof. Edgard Santos,participou ativamente da Universidade Federal da Bahia. Foi essaépoca que teve a inspiração de criar a Escola de Nutrição daUFBA. Durante muitos anos dedicou o melhor dos seus esforçospara criar, manter e dirigir esta escola que se tornou uma dasmelhores unidades da UFBA.

Nessa época foi também Reitor interino da UFBA e ai entãoexerceu este cargo com muita inteligência, e diria mesmo, commuita alegria. Também se tornou membro da Academia de Letrasda Bahia.

Dominando todos os aspectos dessa vida fecunda, sobressaia afigura de pessoa humana que era o Prof. Adriano Pondé. Possuía oraro dom de saber ser feliz. Tinha a capacidade de transformaracontecimentos hostis e neutralizar as pessoas que monopolizavama maldade. Diante dos seus pacientes, ele corporificava o velhoaxioma de que o médico era o melhor medicamento.

Irradiava sempre o sentimento da alegria para seus familiares,seus alunos, seus amigos, seus pacientes.

Estamos reunidos, nesta homenagem, para honrar a memóriade nosso mestre e amigo. Os mortos deixam de ser mortos quandoos vivos os reanimam. É através dos vivos que os mortos revivem,que observam, que falam, que se tornam presentes.

A lembrança de Adriano Pondé está presente em cada um denós.

Tudo o que amamos nele, tudo o que admiramos subsiste.Nossas idéias, nossos trabalho, nossos sentimentos, nossos atostrazem sua marca decisiva.

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Somos, nessa homenagem, em grande número, os quetestemunhamos essa grande vida. Transmitiremos a lembrança e oexemplo dela às gerações futuras.

A vida do nosso mestre se tronou sua própria lenda. Nós oencontrávamos sempre o mesmo, sempre o que esperávamos demais nobre.

Sempre nos mostrou a elevação dos pensamentos, a beleza doseu trabalho, a coragem das suas decisões.

É natural que a meditação se dirija aos mortos que foramnossos modelos, a fim de lhes pedir conselhos e exemplos.

Professor Adriano Pondé resumia tudo que fazia numapalavra: esperança. Ele pedia que tivéssemos confiança no homem,o que, leva a respeitar suas liberdades; confiança no nosso espíritopara ir, de erro em erro, na direção da verdade e confiança na nossaânsia de encontrar passagens através do universo imenso da nossaalma.

Essa é a sua mensagem que devemos manter viva em nós afim de que o espírito de Adriano Pondé não morra.

Sabemos como ele gostava das comemorações em que osgrandes mortos guiam os vivos e que louvava o gesto piedoso deacrescentar uma pedra à pirâmide erguida sobre o túmulo.

Depende de nós que Adriano Pondé continue a ser.Nesta homenagem do centenário do seu nascimento,

colocamos a pedra fundamental de um monumento do seu espírito.

Penildon SilvaMédico

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No Centenário de ADRIANO PONDÉ

Reúne-se, esta noite, a Academia de Letras da Bahia, parareverenciar a memória de Adriano de Azevedo Pondé, confradenosso cujo nascimento ocorreu, exatamente, há cem anos.

Era Adriano, por natureza, de temperamento irrequieto.Incluía-se entre os que detestam o ócio e buscam a cada instanteuma causa nobre para com ela ocupar-se.

Pelos seus múltiplos interesses e variadas habilidades, deixouAdriano expressivas realizações em campos muito diversos. Ereuniu amplo círculo de amigos e de admiradores, tanto entre osque conviviam com ele, diuturnamente, como entre os que,radicados embora em terras distantes, compartilhavam idênticosinteresses.

Em meio a uma vida assim cheia de afazeres tãodiversificados, identificavam-se preferências e prioridades. Acimade todas, esteve, inquestionavelmente, a dedicação aos seuspacientes. Soube Orlando Gomes, companheiro seu de lidesuniversitárias durante décadas, sintetizar de modo admirável amarca predominante da personalidade de Adriano: “Foiintensamente médico”. Em três palavras, resumiu Orlando o queAdriano trouxe do berço e representou para ele o legado maior doconvívio com o Dr. João de Souza Pondé. Além de pai, o “velhoPondé”, conforme era conhecido entre os amigos mais íntimos dageração seguinte, foi também o exemplo e o modelo por eleescolhidos para toda a sua existência.

Ouçamos as palavras do próprio Adriano, no discurso de possenesta Academia: “Com simplicidade vos declaro que praticar aMedicina foi a minha primeira ambição consciente, estimuladacom o exemplo aliciante de meu pai. Assim, nascia uma vocação,este apelo para uma determinada forma de vida, e que me atraía eme compelia a adotá-la, nos seus anseios, nas suas vicissitudes, nasua luta obstinada contra a morte. Em meu Pai, conheci a completa

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personificação do verdadeiro clínico: pelo saber, nas qualidades docoração, pelos donos do espírito. Através do exemplo, ensinou-mea tolerância e a paciência – a elevação moral – a dignidade daprofissão; com a palavra, inspirou-me na compreensão dos quesofrem e instruiu-me na fidelidade ao ato clínico. – Todo atomédico é, com efeito, um ato de fé – nos progressos ilimitados daciência – no poder da arte de curar!”

No exercício da profissão, graças à verdadeira maestria naprática das relações médico - paciente, sabendo unir o sentimentoda dignidade do ser humano sob os seus cuidados ao conhecimentoatualizado da ciência médica e à intuição nutrida pela experiência,Adriano fez amizade incontáveis, que se estenderam ao longo detoda a vida. Invariavelmente, a amizade assim construída, nãoficava restrita ao próprio paciente. Logo, estendia-se à respectivafamília, o que em muito ampliava o círculo de amigos nascido darelação médico-paciente. Mesmo quando exames especializados semostravam necessários, e colegas que dominavam outras técnicaseram chamados a colaborar, permanecia Adriano, pela vontade dopaciente e da família, coordenando e orientando os trabalhos, comoé próprio do exímio “médico de família” que havia aprendido a sercomo o velho João Pondé.

Coincidiu a época em que Adriano foi atingido a plenitude doexercício da Medicina clínica, com transformações em grandeprofundidade nas bases científicas da prática médica. Não faltouquem chegasse a considerar difícil a dissociação entre medicina eciência. Contudo, a relação médico - paciente é, essencialmente,uma relação entre pessoas humanas, entre indivíduos, compersonalidades próprias. Por sua vez, a produção científica seapresenta sob a forma de generalidades, entre as quais compete aomédico selecionar e identificar as informações que importam àcondição do seu paciente. Enquanto a ciência busca oentendimento de fenômenos da natureza, em si mesmos desprovidode um sentido ético, na medicina, ao contrário, lida-seconstantemente com uma hierarquia de valores cristalizada emantigas tradições. É certo que já se não pode conceber a Medicina

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esvaziada das suas científicas. Porém, o labor científico e oexercício da clínica tem, cada qual, identidade própria, mesmoquando aplicadas conjuntamente em benefício do ser humano cujasaúde se acha perturbada. Como denominador comum e requisitoessencial aos médicos de todas as épocas, esteve sempre anecessidade de uma boa dose de altruísmo, o que nada tem a vercom as bases científicas da medicina. Colocava-se Adriano entreos que encontraram o equilíbrio no domínio das técnicas firmadasem bases científicas, com o sentido humanista da relação com ospacientes.

Na civilização ocidental, ao longo de tantos séculos detentativas e erros visando o aperfeiçoamento dos cuidados com asaúde, a despeito de terem sido postos à prova modelos variados deorganização do exercício profissional, nenhum se mostrou tãoconfiável entre as partes envolvidas quanto a simples e sempreatualizada fórmula do “médico-de-família”. E era esta a liçãomaior que apreendiam os seus alunos, quando exercia Adriano omister de professor de Clínica Médica, ao qual se dedicou porquase toda a vida profissional.

A prática do magistério médico, contudo, envolve muitasresponsabilidades das quais o nosso homenageado soubedesincumbir-se de modo a fazer crescer incessantemente oconceito que desfrutava entre os colegas e discípulos.

Assim, era extremamente zeloso no preparo das aulasexpositivas. Preocupava-o, sobremodo, a constante atualização,pelas melhores fontes, do material que apresentava ás turmassucessivas do último ano do curso médico. Para isso, estevesempre entre os professores que custeavam do próprio bolso oslivros e as muitas assinaturas de periódicos da sua especialidade. Airregularidade (poderia dizer, a irresponsabilidade) na aquisição debibliotecas universitárias. Os professores mais consciente daimportância da formação atualizada – entre os quais Adrianoocupava posição inarredável – sentiam-se obrigados a custear comos seus minguados salários a aquisição de vasto materialbibliográfico. A conservação destes livros e revistas, instrumentos

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essenciais ao nosso labor, se vem tornando cada dia mais onerosana vida moderna, pela exigência de espaço e pelos cuidados naprofilaxia das várias “doenças” a que estão expostos,particularmente quando mantidos em ambiente doméstico e não embibliotecas institucionais devidamente climatizadas e sob a guardade pessoal especializado. Como Adriano precedeu a era do xerox eda Internet, dos editores de texto, das maravilhas projetoras e dassensacionais impressoras ligadas aos computadores, era para ele –e para os seus auxiliares – uma luta incessante obter microfilmes eprovidenciar reproduções ou máquinas de leitura que, por maissofisticadas, sempre deixavam a desejar. Só os mais velhos sabemcomo as novas tecnologias tornaram tudo isso mais fácil para osintelectuais dedicados ao seu trabalho. Os jovens de hoje, porterem encontrado a baixo custo tais regalias, nem sempreimaginam a imensa tenacidade exigida dos os que os precederam,quando queriam manter-se em dia com as publicações científicasou localizar exemplares de material bibliográfico mais antigo.

A preocupação de Adriano com a atualidade das aulas ia miaslonge. O temperamento irrequieto levava-o a buscar o que fossemais avançado no tocante aos métodos audiovisuais, muito antesque estes se tornarem rotineiros. Tanto para as aulas como para aapresentação das suas próprias pesquisas, adquiria equipamento emanuseava material de projeção cuidadosamente escolhidos.Convém lembrar que tudo isto ocorria quando a pobreza dasinstituições locais era muito maior que a de hoje.

A despeito do muito que aprendi da disciplina de ClínicaMédica enquanto discípulo de Adriano, a causa maior da minhaadmiração pelo seu desempenho como professor está no esforçocolossal que devotou às pesquisas clínicas, ainda quando eramextremamente precários os meios ao nosso alcance. O que há demelhor nestes seus trabalhos data de antes do funcionamento doHospital das Clínicas e teve como principal ambiente o velho SantaIsabel das décadas de 1930 e 1940. Pouquíssimos foram os seuscolegas de cátedra que lograram produzir, na mesma época, obra

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de densidade comparável, por exemplo, à dos estudos sobre oinfarto do miocárdio e sobre a doença de Chagas em nossa terra.

Depois da profunda transformação nos equipamentos da áreada saúde ocorrida no Norte- Nordeste do Brasil quando do iníciodo funcionamento do Hospital Universitário Professor EdgardSantos, já Adriano estava sendo freqüentemente convocado paratarefas de liderança, ora na nossa e em outras UniversidadesBrasileiras, ora na comunidade baiana em geral. Restava-lhe,então, pouco tempo para atender às exigências da pesquisa clínica,no estilo das que havia realizado anteriormente, quando ascondições eram de muito maior escassez.

Um dos temas da predileção de Adriano, ao longo de toda asua vida profissional, foi o infarto do miocárdio, sobre o qualescreveu a tese de concurso à cátedra de Clínica PropedêuticaMédica, em 1937. Este trabalho extraordinário impressionasobremodo pela riqueza das observações próprias que o autorconseguiu reunir, dentro das limitações que enfrentava. A tese deAdriano tornou-se conhecida no mundo acadêmico nacional, já emvirtude do aspecto externo, uma vez que ocupava cerca desetecentas páginas de texto, além das sessentas e quatropreenchidas pelas mil cento e trinta e três referênciasbibliográficas. Mas, não foi ente o motivo maior de haver servidopara que o autor firmasse definitivamente a sua reputação entre oscolegas de profissão. Valeu e vale o trabalho, acima de tudo, pelaqualidade do material próprio que ilustra vários dos seus capítulos,e que foi colhido graças a imenso esforço e indizível dedicação.Nisto, se sobressaía quando confrontada com outras teses de épocapretéritas à nossa Faculdade, nas quais as quais do autor ficavamrelegadas a plano muito secundário, enquanto predominava apreocupação com a revisão crítica da leitura.

A parte essencial do trabalho em tela consiste nas observaçõesclínicas, profusamente documentadas, de quatorze pacientesatingidos pelo infarto do miocárdio. Procedendo-as, entretanto,encontra-se clichês de excelente qualidade referentes a materialcolhido pelo mesmo autor para ilustrar a anatomia do sistema

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circulatório coronariano, as alterações radiológicas conseqüente aoinfarto, além de fartíssima documentação eletrocardiográfica deestudos experimentais em cães submetidos a intervençõescirúrgicas sobre os vasos coronarianos.

Sempre atento ao que havia de mais moderno em cada época,logrou Adriano, no devido tempo, dominar a interpretação dasimagens radiológicas, especialmente as do tórax, e dos traçadoseletrocardiográficas. Estas duas técnicas encontravam campos deaplicação particularmente férteis no estudo de outra doença cujosignificado em nosso meio era então ainda desconhecido.

De toda a história da Medicina no Brasil, o capítulo do qualmais nos orgulhamos é, sem sombra de dúvida, o da identificação eda descrição da tripanossomíase americana pelo médico-cientistaCarlos Chagas. Incluem-se esses trabalhos entre os clássicos daleitura biomédica universal. Não obstante, como é sobejamenteconhecido, a importância dessas pesquisas não foi logoreconhecida, e houve até quem as contestasse veementemente. Nãoé de surpreender, pois, que outros estudiosos brasileiros tivessem aatenção voltada para a doença que representava verdadeiro desafioentre os responsáveis pela saúde da nossa população. Na Bahia, apercuciência clínica de Adriano o levou a enfrentar desse desafio,reunindo os protocolos de 36 pacientes exaustivamenteexaminados. Originou-se, desta forma, a famosa monografiaintitulada “A doença de Chagas na Bahia”, publicada nos“Arquivos da Universidade da Bahia” em 1946, e que assim seinicia: “Desde algum tempo, que vinha chamando nossa atenção,nas enfermarias, a ocorrência de casos de miocardite crônica, emindivíduos jovens, cuja etiologia não era possível identificar... .“Do trabalho de Adriano e colaboradores, destaca-se a cuidadosaanálise das arritmias cardíacas, possibilitada pelos conhecimentosprofundos que tinha da eletrocardiografia.

Quero fazer valer, aqui, o meu testemunho pessoal daverdadeira “garra” de Adriano ao dedicar-se a essa pesquisa , sema qual jamais teria sido possível a valiosa contribuição queofereceu ao conhecimento de uma entidade nosológica assim

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complexa e de tão grande significado social, como a moléstia deChagas.

Entre os seus colaboradores, era tudo levado com muito bomhumor. Lembro, por exemplo, as peripécias de mobilização até aoHospital, dos galináceos usados para alimentar os insetos vetoresdo agente causador da doença. Era esta tarefa atribuída,predominantemente, á técnica Helena, nas suas poucas horasvagas, porquanto era ela a encarregada de colher oseletrocardiogramas interpretados pelo professor, tanto no SantaIsabel, quanto no consultório particular. Os exames laboratoriaisdos pacientes objeto da pesquisa eram realizados por nós,estudantes, em apertada sala de um dos anexos do Santa Isabel,num laboratório provido apenas do equipamento mais elementar.Nenhum financiamento existia, a esse tempo, para pesquisasmédicas, nem de fonte pública nem privada. Tudo era na base dadedicação e do sacrifício.

Tive o privilégio de, juntamente com outros discípulos seus,acompanhá-lo durante as horas da manhã, todos os dias, ao longode vários anos. Na Enfermaria e no Laboratório da 1ª Cadeira deClínica Médica da Faculdade, eram seus colaboradores àquelaépoca: Jorge Leocádio de Oliveira, Renato Sena, Anita Franco,Angelina Pelosi, Denaké Philocreon, Lydia Paraguassú, MoacirVeríssimo e outros que permaneceram conosco menos tempo. E,no Ambulatório de Cardiologia da Santa Casa da Misericórdia,também dirigido por Adriano, integravam a mesma equipe oscolegas José Moreira Ferreira, Alberto Pondé e Rubens Tabacof.Com eles iniciei o meu aprendizado da clínica.

A despeito de todas as dificuldades enfrentadas pelos quededicam, atualmente, ao magistério superior, em nada secomparam as de agora com as que enfrentávamos para resolver osmais elementares problemas, naqueles tempos que já vão distantes.Para exemplificar as carências com que lutávamos, cabe lembrar ainexistência de qualquer arremedo de enfermagem junto aospacientes da Enfermaria do Hospital Santa Isabel a cargo da 1ªCátedra de Clínica Médica. A transferência do ensino da nossa

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Faculdade para o Hospital das Clínicas, entre o final da década de1940 e o começo dos anos 50, modificou radicalmente esse quadro.Não me canso, por esta e outras razões, de afirmar que asinovações implantadas no Hospital Universitário Edgard Santosconstituem o mais importante evento da história da assistência àsaúde na Bahia, ao longo do século que passou.

Durante largo tempo, devotou-se Adriano com o maiorentusiasmo, a conhecer melhor as publicações do Professor FrankWilson, da Universidade de Michigan, que precisamente àquelaépoca, vinham revolucionando a interpretação dos traçadoseletrocardiográficos. A análise crítica das pesquisas de Wilsonenvolvia conceitos matemáticos que Adriano não trazia consigo,porém não o fizeram recuar.Com a sua característica tenacidade,foi aprender o de que necessitava para bem acompanhar a transiçãoda eletrocardiografia clássica, baseada na simples comparação depadrões gráficos com achados clínico-patológicos, para ainterpretação científica dos traçados, calcada em bases,matemáticas.

Vale aqui destacar o enorme avanço ocorrido no Brasil quantoà valorização da pesquisa médica. Houvesse Adriano realizado osseus trabalhos umas poucas décadas mais tarde, disporia ele demeios de financiamento que, embora ainda limitados, temrepresentado enorme diferença em relação ao passado remoto.

Foi este o grande salto verificado no papel das Universidadesbrasileiras – e, em especial, das Universidades públicas – nasdécadas recentes. A pesquisa técnico-científico deixou de seratividade de exceção, a exigir atitudes quase-heróicas dosprofessores e alunos, para atingir patamar muito mais alto devalorização por parte de amplos segmentos da sociedade e dosdirigentes das Universidades.

A reestruturação das Universidades, iniciada na década de1960, abriu caminho para a criação dos cursos de mestrado edoutorado, e ensejou a valorização dos setores básicos doconhecimento, condição necessária ao florescimento de ambientesvoltados para a investigação cientifica. Sobreveio, simulta-

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neamente, o regime de tempo integral e dedicação exclusiva. Aexigência de teses e dissertações para a obtenção dos graus dedoutor e de mestre, e a devida valorização desses títulos nacompetição inerente à carreira universitária, representaramfortíssimos estímulos à maior dedicação às atividades de pesquisa.O fator decisivo para tais transformações, entretanto, foi oreconhecimento, pelas lideranças da nossa sociedade, de que oBrasil precisava recuperar o tempo perdido, durante o qual asUniversidades não atentaram suficientemente para o imenso papela ser obrigatoriamente por elas cumprido na ampliação dasfronteiras do conhecimento por meio da pesquisa técnico-científica. Este indispensável passo à frente no processo dedesenvolvimento, que já se evidencia com tanta clareza em outrasunidades da Federação, merece receber entre nós renovadosestímulos para alcançar vigor maior do que até agora observado.

Dentre os registros que bem exprimem a confiança e oprestigio que Adriano desfrutava no seio dos colegas em nívelnacional, vale referir o número enorme de bancas examinadorasdas quais participou. Afim de julgar concursos de cátedra e dedocência.

Livre na nossa e em outras Faculdades de todo o Pais, além deteses de doutoramento, era ele repetidamente convidado pelos seuspares para julgar o mérito de colegas que se candidatavam aposições de liderança no magistério médico nacional.

Mas, os resultados da capacidade de realização de Adriano nãose limitaram à sua atividade na cátedra de Clinica Médica. No dia-a-dia do trato com os pacientes, percebeu ele como a prevenção e otratamento de numerosas condições mórbidas exigia o emprego dedietas cientificamente orientadas. Faltava, entre nós, o profissionalespecializado que disto se encarregasse. Em outras palavras,ressentia-se a Bahia da inexistência de nutricionistas quecolaborassem com o médico afim de proporcionar junto aospacientes, a alimentação adequada. Idealizou, então, Adriano acriação de um curso superior de Nutrição, para o que contou com oapoio irrestrito do então Reitor, o Professor Edgard Santos.

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Nasceu, assim, a Escola de Nutrição que tantos e tão relevantesserviços tem prestado à população da Bahia e do NordesteBrasileiro.

A partir do momento em que teve essa feliz inspiração,acrescentou Adriano às atividades referentes à Cardiologia, as quedizem respeito à nutrição e à alimentação. Nos sucessivospronunciamentos, nas publicações, na participação em eventoslocais, nacionais e internacionais, no empenho em conseguirrecursos financeiros, o sempre irrequieto Adriano passou a destinarboa parte da sua atenção para o mais recente alvo dos seusinteresses. Bem ao estilo da Bahia da nossa época – estilo queauguramos seja preservado, em muitos dos seus aspectos – afim detornar explicita a convicção que o animava quanto a importânciados profissionais da Nutrição, Adriano orientou a sobrinha maisquerida a inscrever-se no vestibular que deu acesso ao curso.Nininha e varias das suas amigas mais próximas, entre elas MariaAmélia, a minha futura esposa. Foram assim contaminadas peloentusiasmo do Professor Adriano e se fizeram alunas da turma daEscola de Nutrição da UFBA. Passou a ser essa Escola, de certaforma, a extensão da própria família do Professor, para o quecontribuía o carinho com que eram as alunas tratadas pela D.Carmen Lebre Pondé, a digna companheira de Adriano durantecerca de meio século.

Afim de formar o corpo docente da nova entidade, convidouAdriano colegas seus, professores da Faculdade de Medicina.Assim, fui eu encarregado da disciplina de

Patologia da Nutrição. Veio esta grata incumbência a ter amais profunda conseqüência em toda a minha vida. Entre as alunasdessa disciplina encontrava-se Maria Amélia, com quem iniciei onamoro que perdura até hoje, depois de percorrida a trajetória dequase quarenta anos de casamento enriquecido pela geração deseus filhos e por enquanto, de dois netos.

Graças ao elevado conceito de que desfrutava entre os colegas,foi Adriano convocado, repetidas vezes, para o exercício de cargosde direção na nossa Universidade. Havia, já participado do

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Conselho Técnico- Administrativo da Faculdade de Medicinadesde 1940 até à fundação da Universidade, em 1946. Passou,então a integrar o Conselho Universitário, inicialmente comorepresentante da Faculdade de Medicina, e, a partir de 1961 até àaposentadoria, como Diretor da Escola de Nutrição. Exerceu aChefia do setor clínico do Hospital Universitário Professor EdgardSantos. Foi Vice- Reitor com vários mandatos, durante os quaisassumiu a Reitoria vezes incontáveis.

Ao encerrar-se, por implemento de idade, a brilhante carreirade professor, recebeu homenagem especial, a Medalha de Ouro doMérito Universitário, “pelos altos e beneméritos serviços prestadosao ensino e à administração”. Pouco antes, havia passado a integraro Conselho de Curadores da Universidade Federal da Bahia. Em1973, foi feito Professor Emérito pela Faculdade de Medicina epela Escola de Nutrição. Recebeu, ainda, a condecoração da“Ordem do Mérito da Bahia”, em grau de Comendador.

No plano nacional, foi um dos fundadores da SociedadeBrasileira de Cardiologia, entidade da qual foi presidente e quecresceu de modo a tornar-se uma das maiores e mais importantesassociações médicas do País. As reuniões anuais dessa Sociedadecontam com muitos milhares de participantes e mobilizamconvidados de várias partes do mundo. Sobre os temas de suapreferência, foi Adriano convidado a escrever capítulos de livros evolumes especiais de revistas publicados no Brasil e no exterior.

Graças à cultura polimorfa, Adriano estendeu a sua atuação àcategoria dos “escritores- médicos”, havendo sido um dos líderesdas respectivas associações. Ainda em plena juventude, passara elea integrar o círculo de estudantes de Medicina diretamenteinfluenciados pelo talento extraordinário do Professor PradoValadares, amigo do seu Pai, o “velho Pondé”. graças a esseconvívio, não haveria como escapar, então, de expressar-se noestilo conhecido como “valadaresco”. Deste, é exemplo eloqüenteo “Antelóquio” (a expressão é do autor) da teses de docência livrede Clínica Propedêutica Médica da nossa Faculdade, datada de1928: “O fabrico deste trabalho, sem pretensões a cousa de vulto –

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tão fraco é o alvaner que o opõe em esquadria –, é resultado depacientes observações e estudos aturados, por mais de dois anos,no Gabinete Médico de Eletricidade e Luz... Serviram-lhe de sólidaargamassa os ensinamentos e conselhos salutares hauridos noconvívio espiritual de Prado Valadares, cuja escola magníficahouve sempre de ter a mais vincada influência em meu espírito”.

Ocorreu com Adriano, ao longo do tempo, evolução idêntica àobservada nos escritos de Edgard Santos, outro discípulo de PradoValadares que adotou o estilo “valadaresco” nos trabalhos iniciaise passou, mais tarde, a expressar-se mediante frases menoselaboradas.

Além das numerosas publicações deixadas por Adriano nodomínio da Medicina, devo mencionar alguns dos seus trabalhosno campo literário.

Referi-me, acima, ao discurso de posse da Cadeira nº 8 destaAcademia, que tão bem refletiu as qualidades humanas eintelectuais do nosso confrade. Dessa obra primorosa, além datranscrição acima sobre o papel do Dr. João Pondé na formaçãoprofissional do nosso homenageado, quero reproduzir o que elechamou de “declaração de fidelidade ao espírito da Academia”,com a qual encerra emocionado, a sua oração: “... no encantamentodeste sonho de Beleza, trabalhei com todo empenho para, no justoafã de servir a esta Casa, servir à minha terra, com o purosentimento de humanidade que palpita em meu coração e meconsome”.

No volume XXVI da Revista desta Academia, datado deSetembro de 1978, encontra-se traçado o perfil de uma das figurasmais interessantes da história da nossa Faculdade de Medicina. Sobo título: “Gonçalo Moniz – a lição de um sábio que dignificou osvalores da inteligência”, Adriano proferiu conferência da qualextraio os seguintes trecho: “(Gonçalo Moniz) escreveu sobreMedicina, Literatura Portuguesa, questões do nosso vernáculo,problemas religiosos; colaborou não só em revistas médicas, masliterárias, como ainda na imprensa diária. Era um legítimofilosofo... No escritor o que sobressaia era a clareza e a

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simplicidade, num estilo fluente. Evitava o supérfluo na construçãoda frase – límpida e atrativa – refletindo, com a linguagem direta,um espírito sereno e equilibrado ...era a discrição, a delicadeza, anaturalidade... A solicitude pelas grandes idéias, - a pureza desentimentos, o espírito de justiça foram qualidades que fizeram,realmente, deste grande mestre uma das figuras insignes do nossopanorama cultural...”

Merece, igualmente, referência espacial o cuidadoso trabalhobiográfico sobre Marcel Proust, dividido em duas partes eapresentado perante esta Academia sob os títulos: “A doença e osúltimos dias de Marcel Proust” e “Marcel Proust – asma e estilo”.Os próprios títulos dessas conferências revelam a condição demédico, da qual o autor não se consegui desvincular, mesmoquando percorre com grande brilho os caminhos da literaturafrancesa.

Mais um dos seus trabalhos literários devo citar, porigualmente significativo da sua cultura polimorfa, e por ser detodos o que mais me impressionou: em Maio de 1946, achou porbem a direção da Faculdade de Medicina promover uma sessãosolene em homenagem a professores que haviam recentementefalecido. Eram seis dos maiores vultos da história da nossa Escola,cada qual dotado de formação intelectual e de personalidade bemdiversas dos demais. Foram eles: Alfredo Couto Brito, AristidesMaltez, Álvaro de Carvalho, Alfredo Magalhães, Eduardo deMorais e Armando Sampaio Tavares.

A simples menção desses nomes nos desperta, entre os quevivemos intensamente a vida da nossa Faculdade, o mais profundosentimento de respeito e admiração. Em linguagem que torna aleitura extremamente atraente, e graças às pesquisas que realizoucom paciência e obstinação, conseguiu Adriano traçar retratos queaprofundam e aperfeiçoam o que me ficou da lembrança de cadaqual dos biografados. Apesar da grande diferença entre a minhaidade e as deles, conheci-os pessoalmente a todos, na minha casapaterna, onde eram visitas freqüentes, e onde seus nomes eramrepetidamente citados, nas conversas familiares de cada dia.

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Conservo lembrança especial de um deles, o “gentleman”Professor Eduardo de Moraes porquanto foi quem prescreveu pelavez primeira, aos meus 9 anos de idade, os óculos que passaram afazer parte da minha fisionomia até o presente. Ao manusear,recentemente, o discurso a que me refiro, ocorreu-me que bempoderia a Faculdade de hoje reimprimi-lo em órgão decomunicação a que tivessem amplo acesso os atuais professores ealunos da nossa Faculdade, assim como os confrades destaAcademia. Cidadãos presentes como os biografados pelo mestreAdriano foram os artificies bem sucedidos do imenso carinhodedicado pela Bahia à nossa Faculdade. Cabe, então, indagar: porque já não encontra a mesma instituição, nos dias de hoje, igualdesvelo dentro da comunidade baiana? Não estaremos nós, os deagora, à altura dos nossos antecessores, ou ter-se-á alterado tãoprofundamente nas décadas mais recentes, o modo de ser e desentir dos nossos conterrâneos?

Por várias gerações, a família Pondé, originária do sertãobaiano do Itapicuim, tem prestado relevantes serviços à Bahia e aoBrasil. Em publicação recente representante ilustre da Família naatual geração, a Professora Consuelo Pondé de Sena, relatouinteressante pesquisa da sua lavra, que demonstra a extensaramificação dos seus consangüíneos na Bahia e em outros Estados,a exemplo do Pará e do vizinho Sergipe. Tantos são os Pondé quese tem destacado na presente e nas anteriores gerações, que se iriatornar demasia da minha parte pretender enumera-los, correndo orisco, certamente, de faze-lo de maneira incompleta. Três nomes,entretanto, não podem deixar de ser aqui citados: dentre os muitosirmãos e irmãs de Adriano, o do Professor Lafayette, ex-Reitor daUniversidade Federal da Bahia, professor dos mais ilustres daFaculdade de Direito de tão veneráveis tradições, e fundador daEscola de Administração que se tornou uma das mais atuantes eprogressistas unidades da nossa Universidade. E, dentre os muitossobrinhos, sobrinhos netos e primos, o da nossa confreira, poetisaMyriam Fraga, e o do herdeiro do nome do avô, João de SouzaPondé Neto. O Joaozito, como é conhecido entre os íntimos,

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dedicou-se à mesma especialidade médica do tio, e sobre construirpara si ambiente de trabalho no Instituto Cardio-Pulmonar daBahia, que honra a nossa terra. Comparadas as condições queAdriano teve à disposição na prática da especialidade a domicilio eem seu consultório, às instalações a cuja frente se encontra o seusobrinho, logo se observa como evoluiu favoravelmente a Bahia notocante às instituições privadas para o atendimento à saúde.

Encerro estas palavras ainda sob a inspiração do mesmoAdriano, amigo, mestre e confrade, transcrevendo o final dodiscurso datado de 1946, em que retrata seis dos seuscompanheiros de Congregação da Faculdade de Medicina daBahia: “... Esses nunca duvidaram dos nossos destinos ... Etambém sonharam, como nós sonhamos, com um mundo em que ainteligência e a cultura triunfassem, e a Justiça e o Direitoprevalecessem sobre a ferocidade e a violência, sobre o arbítrio e oobscurantismo ... um mundo melhor, enfim, em que a Humanidadepudesse desfrutar uma felicidade tranqüila, sob a proteção dasliberdades democráticas”.

Bahia, l6 de maio de 2001.

Roberto Figueira SantosMédico

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O seu dia foi bom.

Justa e necessária a homenagem que se presta à memória doProf. Adriano de Azevêdo Pondé. Justa, justíssima, pelosincontestados merecimentos do homenageado; necessária pelo seusignificado de reverenciar o passado, com as suas figuras e a suahistória, em verdade, o único e real patrimônio das pessoas, dascomunidades e das instituições.

Adriano de Azevêdo Pondé: o cidadão, o médico e o professorharmonizavam-se eqüânimes em sua personalidade. Para mim, nãoé difícil recompor o seu perfil. Reúno lembranças, reminiscênciasguardadas, relicário do tempo em que desfrutei a ventura de serestudante de Medicina na sempre lembrada Faculdade do Terreirode Jesus; do tempo em que vivi os verdes anos da profissão; edepois, o caminho do médico que amadureceu e que, finalmente,desembocou na situação em que hoje me encontro, com uma visãomais ampla e mais clara do caminho distante já percorrido.

Não pertenci ao escolhido e seleto grupo que cercava oProfessor Pondé. Faltava-me tempo, embora não me faltassevontade. O meu esforço se concentrava, então, em participar,satisfeito, de uma não menos preciosa escola médica, a doProfessor César de Araújo, meu mestre nunca esquecido.

Ah! Como é fácil e bom estimular a memória. De sentir a suapronta resposta, que me proporciona um momento remoçado efeliz. Tantas fisionomias juvenis e amigas emergem do longe dasdistâncias, quantas palavras ainda consigo relembrar e quantosepisódios – aulas, discussões em enfermarias e ambulatórios, noscorredores do Hospital – ainda distingo. Silvio Monção e DenakéRodrigues Philocreon, envoltos na bruma terna da saudade porquejá tombaram; Anita Franco Teixeira, Angelina Pelosi de Matos,Silvio Vieira, José Verissimo e tantos outros; os mais velhos, entreos quais Alberto Pondé, Leocádio Oliveira. Os tempos do Santa

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Isabel e a quadra próspera dos primeiros anos do Hospital dasClínicas.

No centro de tudo, estimulando, selecionando vocações,amparando, procurando sempre novos conhecimentos nas revistasou nas últimas edições dos livros, nos congressos, nas reuniões, afigura de um mestre, a quem se tinha fácil acesso, autêntico eamigo – o Professor Adriano. Considero que a geração de hoje doscompetentes cardiologistas desta terra há de ter algumas de suasraizes plantadas no fértil terreno que foi a 1ª Cadeira de ClínicaMédica da Faculdade de Medicina da Bahia.

Estendeu os seus braços, a sua inteligência, a sua cultura aoutras messes, onde a sua ação foi pródiga e generosa. Criou aFaculdade de Nutrição e amparou os seus primeiros passos. Vice-Reitor da Universidade Federal da Bahia, cargo que exerceu semconcessões a não ser as ditadas pela consciência do seu dever e dadignidade da instituição a que servia.

Se alguém me pedir que defina uma qualidade maior doProfessor Pondé, resPondérei que era a aversão ao imobilismo, e ofaro do progresso. Lembra-me o entusiasmo com que me relatou apassagem de Hideo Nogushi, no início dos anos vinte, na Bahia; asdificuldades, a pequenez de recursos da terra pobre e comoabsorveu do pesquisador japonês o anseio e a fidelidade emdecifrar o desconhecido.

As suas publicações tinham sempre a busca da novidade. Umexemplo é o seu trabalho sobre a doença de Chagas. O trabalho éclínico e epidemiológico e tem incontestável mérito na história dacardiopatia chagásica na Bahia.

Não sei se o seu gosto pelo ensino suplantava a plenasatisfação que alcançava em praticar a Medicina no seu consultórioda rua da Ajuda. Ano após ano ouviu, orientou, tratou, aconselhoua milhares de pessoas. A sua presença nos hospitais da Bahia foiuma constante até o extremo das suas possibilidades físicas. Nuncase excusou a praticar a Medicina em domicílio. Somente quemexerce este tipo de apostolado é que pode aquilatar a validade e aextensão do trabalho de um clínico que executa tal prática. Não

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existem razões válidas que possam separar o doente do seu médico,de tal forma unidos pelos sentimentos e pelas emoções. O primeirorequisito que se deve exigir de um bom clínico é o ser paciente esimples; depois, é saber ouvir, é compreender a condição humana eser compassivo com os que sofrem; é saber que a técnica énecessária mas não é prioritária. A Ética está acima delas e a Éticaé indistinta dos mistérios da vida e das suas manifestaçõesanímicas. Nisto se resume o verdadeiro sentido da arte médica queé assim função da cultura do espírito.

Adriano Pondé se ajustou a tais princípios. Humanista, comomuitos de sua geração. Tinha o gosto inato pelas artes e pelaliteratura, o que, afinal, no seu ocaso profissional, nos anos dooutono, lhe acolheu e amenizou os dias. Membro da Academia deLetras da Bahia, onde se manteve leal às mesmas virtudes que otornaram respeitado e aplaudido no ensino e no ofício da Medicina.

Foi um dos fundadores da Academia de Medicina da Bahia.Ocupou a Cadeira 24, que tem como patrono uma outra figuraestelar: Gonçalo Moniz de Aragão.

Adriano Pondé foi um dos presidentes da Associação Bahianada Medicina, cargo que exerceu com o zêlo e a competênciacostumeiros.

Reflito a vida de Adriano de Azevêdo Pondé e ocorre-meconcluir que “o seu dia foi bom e que quando a noite desceu, anoite com todos os seus sortilégios, encontrou lavrado o campo, acasa limpa, a mesa posta. Com cada coisa em seu lugar.”

Rodolfo TeixeiraMédico

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ADRIANO PONDÉ, O PIONEIRO

Adriano Pondé teve muitos méritos na vida.Foi um brilhante professor de Propedêutica Médica e de

Clínica Médica.Era muito didata, e suas aulas costumavam atrair os alunos,

que evitaram perder suas apresentações lúcidas e de enormefundamentação clínica.

Foi Vice-Reitor e Reitor da Universidade Federal da Bahia,tendo deixado uma imagem de excelente administrador.

Na clínica particular mestre Adriano foi inexcedível.Diariamente, no velho Edifício Bahia, da Rua Padre Vieira, Dr.Adriano passava todas as tardes (e várias horas do princípio dasnoites), em suas disputadas consultas, atendendo com seuconstante bom humor e aquela angelical paciência quecaracterizavam sua grande personalidade. Os pacientes oadoravam, e ele sempre correspondeu à sua expectativa.

Mas foi na área do progresso científico que Dr. Adriano sesuperou, constituindo-se como o grande, o benemérito fundador dacardiologia baiana.

Todos nós, que fomos seus alunos, e depois seuscompanheiros de trabalho, nunca esqueceremos de ressaltar osméritos de Dr. Adriano Pondé, como legítimo pioneiro daespecialidade, à qual devotou, durante muitos anos, sua aguçadainteligência e sua fantástica capacidade de trabalho.

Graças à sua penetrante visão e infatigável noção de equipe,ele e seu grupo conseguiram dar o lance inicial e mobilizar amedicina brasileira em torno de um problema médicoextremamente sério, mas cujos contornos, aquela época, erammuito, muito mal definidos.

Eu me refiro à Doença de Chagas.

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A cardiologia baiana – como especialidade – nasceu em 08 deagosto de 1945, quando Adriano Pondé, à época professor deClínica Médica na Faculdade de Medicina, conseguiu, com seugrande prestigio social e acadêmico, instalar no Hospital SantaIsabel, o que veio a se chamar Ambulatório de Cardiologia “PradoValadares”.

O corpo clínico do serviço foi constituído pelos Drs. AdrianoPondé (chefe), Herval Bittencourt, Rubem Tabacof e José MoreiraFerreira (assistentes).

Atendíamos, durante as manhãs, pacientes indigentesselecionados pelo pessoal da Medicina Interna do hospital, e aafluência, desde o início, foi bastante boa.

Nossas instalações físicas consistiam em 3 modestas salas, notérreo do hospital e tínhamos um pequeno fichário paradocumentação dos atendimentos.

O laboratório do hospital dava apoio às solicitações dosmédicos assistentes.

Naquela ocasião, o curso de medicina de nossa então únicaFaculdade, nas disciplinas que exigiam contato com o paciente,eram ministrado no Hospital Santa Isabel, através de convênio comnossa Faculdade. Porque a Faculdade não tinha hospital.

Por isso mesmo a equipe de trabalho do Ambulatório foiconstituída por docentes da Faculdade.

Ninguém ganhava nada.Mais havia entusiasmo no trabalho. E grande interesse.

Estávamos aprendendo algo novo. Sabíamos pouco. AdrianoPondé sabia muito mais e nos estimulava a observar e a estudar.

Nossos recursos de trabalho eram extremamente pobres. Era oque havia na época: era a Cardiologia de 50 anos atrás.

Após o interrogatório e o exame físico do paciente,dispúnhamos do estetoscópio e o tensiômetro. Havia umeletrocardiógrafo “Cambridge” americano, de fotografia, derevelação. (Fazia-se o registro e no final da manhã o filme eracuidadosamente retirado, com a sala obscurecida, e deixado no

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gabinete de radiologia do hospital. Na manhã seguinte recebíamoso traçado revelado).

Nosso eletrocardiógrafo era grande, pesado, e dificilmenteremovível para o leito do paciente.

Um velho aparelho de radioscopia constituía o grande requintedo serviço.

Ao laboratório solicitávamos exames de urina, fezes,eritrograma, leucograma, hemossedimentação, proteína C reativa ereações sorológicas para lues. As reações sorológicas para lueseram muito importantes, pois tínhamos numerosas casos de aortitesifilítica, insuficiência aórtica sifilítica e aneurismas da croça daaorta e da aorta ascendente.

Hoje, praticamente, deixaram de existir essas afecções.O Ambulatório de Cardiologia do hospital Santa Isabel prestou

assinalados serviços à incipiente especialidade em nossa terra, poisreuniu durante vários, em sua esfera de influência, numerososmédicos e acadêmicos de medicina, entusiasmados e até fascinadoscom a nova especialidade, até então praticamente desconhecida.

E vejam mais o que Dr. Adriano e seu grupo de trabalhoconseguiram:

De 2 a 7 de julho de 1947 realizamos em Salvador, pelaprimeira vez na história médica da Bahia, um Congresso Nacional,que foi planejado, organizado e presidido pelo Dr. Adriano Pondée secretariado pelo Dr. Rubem Tabacof.

As reuniões foram realizadas na velha Faculdade de Medicina,no Terreiro de Jesus, com o comparecimento do então presidentenacional da SBC, Dr. Edgar Magalhães Gomes, além de colegas dePernambuco, Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo, Paraná eRio Grande do Sul.

O Dr. Adriano Pondé apresentou um trabalho sobreCardiopatia Reumática, com minucioso levantamento estatístico depacientes atendidos em sua clínica particular e nos até então doisanos de funcionamento do Ambulatório de Cardiologia do HospitalSanta Isabel.

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Esta foi, foi possivelmente, a 1ª contribuição científica decardiologistas baianos em conclaves se âmbito nacional.

Também nesse mesmo Congresso (até então ainda não seusava a expressão “reunião nacional”), o Dr. Adriano Pondé e seusassistentes da Faculdade de Medicina e do Ambulatórioapresentaram importante trabalho intitulado “a Doença de Chagasna Bahia”, posteriormente publicado pela UFBA.

Essa apresentação despertou grande interesse no plenário, ecomo decorrência, nos comentários, o congressista Dr. ReinaldoChiaverini, de São Paulo, propôs que a SBC mandasse imprimirum folheto a ser enviado a todos os médicos do Brasil, destacandoa importância da Doença de Chagas no Brasil.

A enorme significação desse problema, já evidenciado nasreuniões anteriores da SBC, no Rio de Janeiro (1945) e BeloHorizonte (1946), estimulou o Dr. Jairo Ramos, de São Paulo, aapresentar na Assembléia Geral de encerramento deste Congresso,em 7 de julho de 1947, uma moção, que foi aprovada porunanimidade, e que cito textualmente, a seguir, pela grandesignificação histórica.

“Considerando a importância fundamental do conhecimentoexato da Doença de Chagas, que a SBC e as diversas instituiçõesde saúde do Brasil forneçam dados sobre a freqüência da doença,orientação que servia de padrão a critérios clínicos a seremadotados.

Que se obtenha dos serviços públicos dotação orçamentáriapara avaliação desse mal, afim de instruir os médicos de todo oBrasil a respeito da doença, e que se consiga do Governo Federal aimpressão de um folheto com esses esclarecimentos”

Nascia aí, e em Salvador, a definitiva compreensão da severarealidade que era a Doença de Chagas, e a evidencia formal de suaenorme seriedade.

Este primeiro Congresso Nacional de Cardiologia desenroladoem Salvador, foi o estímulo que faltava, a mola propulsora, para ahistórica iniciativa que surgia logo a seguir.

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Em 12 de julho de 1947, nas dependências do Ambulatório doHospital Santa Isabel, fundamos a Sociedade Baiana deCardiologia, hoje denominada – por determinação estatutárias – deSociedade de Cardiologia do Estado da Bahia, nesse momento jáfestejando 53 anos de existência.

Mas méritos para o Dr. Adriano Pondé, grande impulsionadorda iniciativa, e que foi naturalmente eleito nosso primeiropresidente.

Foram ademais, sócios fundadores, os médicos HervalBittencourt, Rubem Tabacof, José Moreira Ferreira, Renato deMoraes Sena, Lídia Paraguassu, Luiz Ramos de Queiróz, LucilioCobas Costa, Renato Lobo e Cícero Adolpho da Silva. Além dosacadêmicos Anita Franco, Roberto Figueira Santos, Almir Freire eHalil Medauar.

Já funcionando, agora, como um corpo único, a Sociedade e oAmbulatório tiveram mérito, então, de pela primeira vez, enviaruma representação da Bahia a um Congresso Nacional deCardiologia.

Graças à ajuda de Dr. Octávio Mangabeira, que eraGovernador do Estado ( e paciente do Dr. Adriano), os Drs. HervalBittencourt e Rubem Tabacof participaram da 5ª Reunião Anual daSociedade Brasileira de Cardiologia, realizada em julho de 1948,em Porto Alegre, Rio Grande do Sul.

E vejam mais o que conseguimos, naquela época, pobres,pobres, pobres, mas corajosos e entusiasmados.

De 11 a 26 de outubro de 1948, a Sociedade e o Ambulatóriopromoveram um curso de atualização em eletrocardiografia clínica,ministrado pelo médico baiano Dr. Augusto Mascarenhas, radicadoem São Paulo e que naquela época era assistente do Prof. JairoRamos, da Escola Paulista de Medicina. O tema do curso foi “ aeletrocardiografia como método auxiliar em Cardiologia”.

Este curso, que deve ser considerado como pioneiro e deamplo valor histórico em nosso meio, teve um sucesso semprecedentes e uma assistência numerosa, já estimulada face aoambiente médico da época e à peculiaridade do assunto.

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A Sociedade Baiana de Cardiologia funcionou no HospitalSanta Isabel, juntamente com o Ambulatório Prado Valadares, atéfins de 1948, quando as duas entidades foram gradativamentesendo desativadas, naquele local.

Dr. Adriano Pondé foi assim, o grande precursou daCardiologia na Bahia. O indiscutível pioneiro.

A ele devemos o nascimento e a consolidação da especialidadeem nosso Estado.

Que a história guarde seu nome e que as faturas geraçõeshonrem o seu exemplo.

Rubem Tabacof(Ex- Presidente da Sociedade Brasileira de Cardiologia)

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Impressões

Não creio exagerar impressões ao transmitir o que penso sobreAdriano de Azevedo Pondé: Médico, de saber científico legitimadono terreno da Medicina Interna, notadamente, no âmbito dasdoenças cardíacas, distinguiu-se como propedeuta meticuloso,clínico experiente e de assinalada dedicação ao enfermo. Professor,salientou-se como detentor de apreciável cultura humanística. Nocampo da produção científica pode ser apontado como pioneiro nasinvestigações sobre a Doença de Chagas, em nosso meio.

Justas e oportunas as homenagens que lhe são prestadas no seucentenário de nascimento.

Salvador, 02/04/01

Ruy Machado da SilvaMembro da Academia de Medicina da Bahia

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Prof. Dr. ADRIANO DE AZEVEDO PONDÉ

“Só espero que vocês estudem para ser bons médicos”. Comestas palavras e um sorriso nos lábios, o Prof. Pondé, recebeu a nóspequeno grupo de estudantes, que estávamos ingressando naFaculdade de Medicina, naquele começo do ano de 1949. Fomosem comissão visitar o PROF. PONDÉ, catedrático da 1a. ClinicaMedica, já funcionando no recém inaugurado Hospital dasClinicas. Esta comissão representava um pequeno grupo decolegas aprovados no Concurso Vestibular, que na época erarealizado na própria Faculdade de Medicina, portanto a decisão dematricular os alunos “excedentes”dependia de uma aprovação daCongregação da Faculdade, portanto a visita aos professorescatedráticos era muito importante para que eles conhecessem osjovens estudantes aprovados no vestibular e que desejavamaprender medicina. Fomos ao Hospital das Clinicas, que estavanovo, com poucas clinicas em funcionamento, mas a 1a. ClinicaMedica do Prof. Adriano Pondé, já estava em plenofuncionamento. Fomos encontrar o Prof. Pondé na Biblioteca doHospital, dirigida por Nevolanda Soares, estava lendo um trabalhocientifico em microfilme; ficamos maravilhados com a tecnologiado aparelho que permitia a leitura de microfilmes e com a bondosarecepção do Prof. Pondé, a nós um pequeno grupo de calouros, queainda estávamos recebendo os trotes na Faculdade de Medicina doTerreiro de Jesus. As palavras do Prof. Pondé, de incentivo,dizendo que só esperava que estudássemos para ser bons médicos,eram um aval positivo de voto favorável aos 18 estudantesexcedentes ao numero de vagas. Aquele grupo não decepcionou ao

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Prof. Pondé e pouco mais tarde em 1953, já no 5o. ano demedicina, todos éramos alunos do Prof. Adriano Pondé, na 1a.Cadeira de Clinica Médica. O Prof. Adriano Pondé na época eraconsiderado o mais famoso cardiologista da Bahia, ilustreprofessor de Clinica Medica, com aulas em torno do leito dospacientes, com exames físicos, radiologia e exames de laboratório;era conceituado e respeitado por todos, alunos e professores. Comseu valioso trabalho no Hospital das Clinicas, criou na Bahia, umaverdadeira escola de cardiologia, tendo como discípulos ecolaboradores Anita Franco, Angelina Pelosi, Renato Sena, Prof.Leocadio, José Augusto Barreto, (este hoje professor decardiologia em Aracaju), entre outros. Médicos formados na Bahia,quando iam fazer residência médica em outros estados ou mesmono exterior, chamavam atenção o elevado conhecimento de clinicamedica, esta admiração era fruto do aprendizado com AdrianoPondé, César Araújo, José Silveira e Augusto Mascarenhas. Todosem sua época considerados grandes mestres da medicina, e quemuito contribuíram para o elevado conceito da Faculdade deMedicina da Universidade da Bahia, nas décadas de 50, 60 e 70.

O Prof. Pondé era amigo do Reitor Prof. Edgard Santos, e feznotar ao mesmo, da necessidade de uma boa orientação nutricionale dietética para os pacientes internados no Hospital das Clinicas,daí nasceu a idéia da criação da Escola de Nutrição, da qual o Prof.Adriano Pondé foi professor e diretor por muitos anos. Esta escolacontribue até hoje na boa formação de nutricionistas, as quais têmsido de papel relevante não só na área médica, mas também nossetores industrial e comercial.

Fui aluno do Prof. Pondé na Cadeira de Clinica Médica, ondetodos o consideravam e respeitavam.Mais tarde trabalhando noLaboratório de Anatomia Patológica do Hospital das Clinicas, onde

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colaborava com o Prof. Zilton Andrade, que era e é até hoje grandeestudioso da patologia da Doença de Chagas, tivemos oportunidadede conhecer mais de perto o conhecimento do cardiologista Prof.Adriano Pondé, nas discussões clinico-patologicas. Ao nosso ver oProf. Pondé muito contribuiu para o elevado conceito da medicinada Bahia, portanto consideramos muito justa esta homenagem quelhe prestam seus ex-alunos, colaboradores e amigos, neste 26 deJunho de 2001, data do seu centenário de nascimento.

Sergio Santana FilhoLivre Docente de Anatomia Patológica, Faculdade de Medicina, UFBa.

Prof. Adjunto de Anatomia Patológica ,FAMED,UFBA(aposentado)Ex-Fellow Memorial and Sloan-Kettering Câncer Center, Nova York

Coordenador de Anatomia Patologica do Hospital Aliança

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Ao Mestre Prof. ADRIANO,modesta homenagem do mais humilde

de seus discípulos

(discurso poético, convidandooProf. Adriano Ponde a ser um

dos homenagedos da Turma de 1951)

Mestre talhado pra o labor insanoFugindo aos gozos de os colher na vidaSustenta a flama da Ciência erguidaOnde cintila o pensamento ufano

Furtou-se à sorte de um viver profanoLançou-se em breve com clalor à lidaBuscando a vida ter na palma erguidaLevando um penso ao sofrimento humano

A idéia lança com simplicidadeA um campo mais fecundo a experênciaGermina, brota, cresce uma verdade

E as idéias surgindo em turbilhãoJá triunfos erguendo na CiênciaSão granadas de luz na escuridão

26.05.511a Clínica Médica do Hospital das Clínicas

Silvio de Alcântara VieiraMédico

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Relembrando o Vulto Singulardo Prof. ADRIANO DE AZEVEDO PONDÉ

Comemora-se o centenário de nascimento do grande médico eprofessor Adriano de Azevedo Pondé.

A Bahia está assistindo a uma série de centenários de ilustresfilhos, o que faz lembrar a existência de uma geração deintelectuais, que se foram, fazendo falta e que precisam serrelembrados como incentivo a novas gerações. É sabido que háuma tradição baiana de inteligência e de ilustres intelectuais.Salienta-se o fato do âmbito da Faculdade de Medicina, quesempre foi orgulho de nossa terra.

Entre os vultos que já se foram e que precisam serrelembrados, está o de Adriano Pondé, professor emérito de clínicamédica, da Faculdade de Medicina da Universidade Federal daBahia.

Destacou-se ele, principalmente, pela sua figura humana,refletindo bondade e conquistando uma simpatia singular entrequantos com ele conviveram.

Na qualidade de professor de clínica médica, travou relaçõesdesse tipo com os docentes. Todavia, pela sua formaçãoprofissional, conseguiu um lugar definitivo de médico, com umaclientela que ele soube manter, impondo-se pela sua competência epelos laços de amizade que soube fazer.

O Professor Adriano Pondé integrou a equipe de ClementinoSilva e manteve a sua projeção como um dos mais eficientescolaboradores de Edgar Santos, que foi o grande realizador danossa Universidade e desenvolveu um Projeto até hoje digno deelogios e que vem continuando a ser executado pelos seussucessores, como é o caso de Honir Rocha.

Colaborador de Edgar Santos, posso testemunhar que ohomenageado conviveu com Ele e privou de sua intimidade, o que

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me permite dizer: tudo que Edgar fez pela Universidade foi objetode entendimento e colaboração com Adriano Pondé.

Nos momentos mais difíceis da administração universitária,quando Edgar enfrentou a oposição política e a rebeldia estudantil,sempre contou com a colaboração inseparável do homenageado.

Além de Professor Emérito de Medicina, atuou junto aosÓrgãos Superiores da Universidade, participando ativamente doConselho Universitário, seja quando Reitor Interino, seja quandovice-reitor. Foi nessa oportunidade que atuei, juntamente com Ele,na qualidade de Representante dos Docentes Livres. Ohomenageado manifestava-se com extrema prudência e a suapalavra era ouvida e seguida por todos os Membros do ConselhoUniversitário, que não se deixavam levar pela paixão política, mastinham em mente o funcionamento da mesma Universidade e tudofaziam para evitar a solução de continuidade que decorreria dasgreves.

Atesto que a opinião de Adriano Pondé sempre foi para mimuma bússola por onde me orientava e tenho a dizer que, sempre,Ele foi seguido pelos seus pares em benefício da comunidadeuniversitária.

Em várias gestões, inclusive na de Albérico Fraga, foi vice-reitor. Testemunho, no particular, a sua lealdade e o seuaconselhamento equilibrado.

Rememoro a crise política da Universidade, quando, em todo oPaís, o ensino universitário foi convulsionado e a classe estudantil,ardorosamente, reivindicava uma reforma, que terminou por sefazer, nas condições possíveis, implantando-se o sistema aindahoje vigente. Adriano Pondé colaborou, no particular da reformauniversitária, seja aperfeiçoando as propostas em discussão, sejaajudando na interpretação dos textos básicos que o Ministério daEducação condicionava a todas as Universidades, visandouniformizar o Ensino Superior do Brasil.

A consciência profissional de Adriano Pondé evoluiu para queEle propalasse a necessidade de se especializar o conhecimento dotratamento dietético de seus pacientes. Assim, Ele lançou a

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necessidade da Universidade ministrar o Curso de Nutricionismo,permitindo aos pacientes, correlatamente com a terapêuticamédica, uma dieta a ser ministrada compativelmente. Foi tamanhoo entusiasmo de Adriano Pondé pelo Curso de Nutricionismo, quecontou com o apoio de Edgar Santos e dos demais reitoressubsequentes, permitindo a institucionalização do Curso deNutricionismo, que aí está esplendoroso e qualifica o ensino danossa Universidade Federal.

Não resta dúvida, que o entusiasmo, o prestígio do fundadordo curso, são a causa do seu êxito. Nestas condições, muito deve oensino superior médico na Bahia a Adriano Pondé, pela criação doCurso de Nutricionismo.

Enquanto teve condições de atuar na vida universitária, ohomenageado sempre se distinguiu e recebeu o apoio de quantostestemunhavam a sua atuação. Agora, quando recebe aconsagração de seu centenário, todas estas razões são trazidas àtona, para que as novas gerações saibam que Ele foi dos vultosmais eloquentes da vida intelectual e sempre pôde prestar acolaboração para a construção desse grande edifício, que é aUFBA, que o seu colega e grande amigo Edgar Santos realizou,sempre com o seu conselho e o seu prestígio.

Tenho consciência de que quase tudo quanto aqui declareipude testemunhar, pois a vida me permitiu, ainda que em ramodiverso do conhecimento, atuar universitariamente sobre a suaindiscutível liderança.

As novas gerações precisam conhecer o grande papel deAdriano Pondé e manifestar o seu reconhecimento, com o que sefará sempre justiça a um dos homens públicos mais dignos denossa Terra.

Sylvio Santos FariaAmigo

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Uma modesta lembrança do MestreAdriano de Azevedo Pondé

Amoroso, afávelDoutor eméritoRespeitador da vidaInteligência brilhanteAmigo fielNotável pela simplicidadeO homem íntegro

Deus o criou para grandes coisasE o filho correspondeu, com sabedoria

AutênticoZelosoEmpreendedorVerdadeiroExemplo de vidaDedicaçãoOlhar para o futuro

PacíficoOrganizadoNaturalDistintoÉ essa a minha visão do Mestre

Beatriz Alfredoda 1a Turma da Escola de Nutrição

Acróstico despertado durante a vivência em27 de junho de 2001