Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

Embed Size (px)

Citation preview

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    1/41

    ~~. ~~~if}w~ 1 1 A d o tf~tA o

    FIC"A CATALOGRAFICA. CIPBra~U. CatalOl1ariio.na./onteSind.cato NaclolUll d08 Edllore~ de Livros, RJ.

    Melo, Luis Gonzala de:M485a Antropololla cultural: Inlc l~io, t eor la e temasI ~~p~a de Mello. - Petr6polls. Vozes, 1987.

    BlbllolralJa.1. Anlropologla cultural I,Titulo.

    coo - 3 1 1 0COU - 39

    LUIZ G ONZAG A DE M ELLO

    A NT RO PO LO GIA C U LT UR ALIniciac;ao, Teoria e Temas

    " ED ITORAY VOZESPetr6polis

    2002

    \

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    2/41

    CapItulo V IEVOLUCIONISMO CULTURAL

    1. Unhas 0eraIs do Evoludonismo2. 0 EvoIudonIsmo Cultural: Repreaent.ant.

    3. 0 Evoludonlsmo Cultural: Prtndpels earacterfstlcas4. 0 Neo-Evoluclonlsmo

    5. 0 Evolucionismo Vlsto por Outro Angulo

    cl\lm!rQPo!olll'~, e rn , el lS prim6rdlos, dtpendt cia Up"MaO dedols Irnper!aIIsmos. 0 Imper lallsmo do m, t, ,;odo 1I. (>I'OlJr l- ~ d.ten, dQII Tt:

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    3/41

    1. LlNHAS GERAIS DO EVOLUCIONISMOQuando se fala de evolucionismo pensa-se, automatica-mente, em Darwin, na selec;ao natural das especles, na so-brevlvencla dos mais fortes e na origem do homem. Talvezse possa dlzer que a ldela de evolucao foi a ldela dornlnantedo seculo XIX. Ela fol a nota dominante do c1ima intelectualde todo 0 mundo cientifico. Darwin",portanto, nao foi 0 'unicea pensar em termos de evoluc;ao. Na. antiguidade classlca ospensadores preocuparam-se com 0 problema da origem dohomem e do universo, do movimento e da transformacao.

    Nao apenas se aventou a Idela da evolucao, mas tam berna da lnvolucao, Exemplo disso sao as teorias mitico-religio-'sas do Oriente - a concepc;ap do progresso negativo - quese reportavam a uma epoca de ouro. No Genesis, caso maisconhecido, podemos ver urn exemplo dessas teorlas: 0 ho-mem teria sido criado 'com uma inteligencia fulgurante ecom muitas outras prerrogativas e teria encontrado em seucaminho a decadencla pelo pecado original. Sao exernplos, tambern os poemas eplcos da India . .ria Persla e na Sumeriaeles tarnbern se flzerarn presentes, Essas teorias estao per-meadas de seudoslsmo. Entre' n o s , "alnda. hoje, entre pessoasde idade mais avanc;ada, e cornum se ouvir falar de u~a.,.-epoca esplendorosa e de abundancla: no tempo em que seamarrava cachorro com 'l ingii ic;a, no dizer popular. Ao. quetudo indica, e urna' llip6tese e nao uma afirmac;ao, tals. teo-.r ias saudosistas tiveram suas origens em sociedades decaden-tes em relac;ao a urn memento hist6rico anterior. Esta ,hip6-,tese poderia se prestar .rnulto ,bern a uma pesqulsa sobre ahist6ria do pensarnento. social. _._."

    20 0

    I ',III

    Ainda na antigiiidade classica nao faltaram as teoriassobre a evolucao e com marcas evidentes de otimismo comrelac;ao ao futuro da humanidade. A teoria do progresso cir-cular e urn exemplo disso. Esta, na expressao de Eva M.Lakatos,e , . . sustenta que a hist6ria da humanidade passapor ciclos: as cultures atravessam uma serle de estagiossucessivos, voltando ao ponto original e recomec;ando 0clclo (escritos indianos; doutrina 'budlsta; doutrina dos

    est6icos gregos e fil6sofos romanos, especialmente MarcoAurelio. ''Bern mais otimista sao as concepcoes de urn progressolinear e vertical. Nomes ligados a essas concepcoes: 0 poetagrego Hesiodo e 0 do poeta e fi l6sofo romano Lucreclo,Na Idade Media nota-se 0 mesmo dlepesao. De urn ladeo pessimismo de Santo Agostinho e do outro 0 fil6sofo socialdo seculo XIV, '0 iuabe Ibn Khaldun com sua teoria da evo-luc;ao social em espiral. ,De modo geral, contudo, pode-se dlzer que 0 germe dasteorias evolucionistas que alcanc;ou 0 seu auge no seculoXIX esta no proprio rnetodo cientifico e na filosofia que 0

    . inspirou. 0 llurnlnlsmo serviu de base ao cresclrnento pos-terior de todas as teorias evoluclonlstas por urn processo deassoclacao. Se 0 homem era capaz de, acumular conhecimen-to atraves do metoda cientifico, bern poderia tarnbern au-mentar 0 gn~u de eflclencla de suas aplicaC;5es. No fundo,chegara a epoca em 'que todos os estudiesos passaram a acre-ditar, senao na Atlantida de Bacon do passado, ao menosna Atlantida do Futuro que 0 hornern estava construlndo,lenta e penosamente. Entre esses crentes podem ser citados:Turgot, Condorcet, .Auguste Comte,' Herbert Spencer, Hob-house e tantos outros. . Como se..ve, 0 evoluclonlsmo, embora nao Fosse essa ainten~ao dos. seus seguidores, representou, ate certo ponto,a maniFesta~ao de Fedos estudiosos na capacidade do homemde fazer uma hist6ria cada vez mals grandiosa. Essa Fe, as.vezes, restrlnqla-se a cepacldade do homem Fazer hist6riaembora, multes yezes,' com imperfeic;5es. De qualquer modo,,~esmo quando 0 homem agisse .mal, 0 faria em virtude do

    t. E~. Marl. !:.AKATOS. Sodologl. '0 . . .. 1, p. 260.L .. . . . . . - . . - - " 2 0 1.,

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    4/41

    nao-uso ou do mau uso de sua capacidade. Nesse cllrna eque brotou e criou raizes tambern 0 evolucionismo no estudodo fen6meno cultural. 0 mesmo se diga do evolucionismona biologia e em outras disciplinas cientificas.Outro fator que nao se deve esquecer e que veio cerro-borar toda essa linha do pensamento cientifico da epoca foia revolucao industrial. Enquanto a clencla fazia progressosfabulosos, nao menos expressivos eram os resultados obtidospela revolu~ao industrial. A produtividade e a capacidade de

    padronizaceo da industria veio baratear consideravelmente osbens. A crescente urbaniza~ao tarnbem nao e de se despre-zar como fator que veio beneficiar 0 avanc;o e 0 progressoquer cientifico quer tecnlco. A partir do seculo XVIl a Eu-ropa presenciou urn crescimento em varies. frentes: cresci-mento da producao, da populadio, dos conhecimentos, daconcentracao dernoqraftca e dos horizontes. Tudo isso serviucomo uma especie de dernonstracao da capacidade evolu-tiva do homem.

    A proposlte do desenvolvimento urbano, autores ha quea ele se referem como uma verdadeira revoluceo. Ela teriasucedido it revolucao agricola e antecedido it propria revo-luc;ao industrial. Ainda a respeito da grande significac;ao dofen6meno urbano e velida a observacao de Gideon Sjoberg,que diz:.

    cA cidade de diversas maneiras funcionava como urnincentivo ao progresso .. Muitas das primeiras cidades sur-giram em entradas importantes; novas Idelas e lnvencoes,naturalmente, convergiam para ela, 0 simples fato deurn grande nurnero de especialistas encontrar-se concen-trado em u"!'a pequena area incentivava a inovac;ao, naoapenas tecnlca, mas tarnbern as ldelas religiosas, flloso-ficas e cientiftcas."Embora nosso interesse espec'Sco seja 0 evolucionismoc~lt~ral, nada impede que registremos a presence do evolu-

    ciorusrno na antropologia. 0 nome mais importante nestecam~o foi, com certeza, 0 de Charles Darwin, que em 1859pubhcava seu mais famoso livro, A Origem das Espedes.Nesta obr~ ele expos 0 conjunto de suas ldelas a respeitoda evolw;ao de todas as especles, Tratou da selec;ao natural2. Gideon SJOBERG. Origem e EYOIUC; 1o Ias Cl dades. p. 43.

    20 2

    da sobrevivencte dos mais fortes e fixou os conceitos de evo-luc;ao, de sobrevivencla e de funC;ao. Neste livro 0 autor es-creveu: cEstou convencido, enfim, que a seleC;ao natural terndesempenhado 0 principal papel na modificac;ao das espe-cles, posto que outros agentes ten ham dela partilhado igual-mente. aTarnbem nao menos importante foi 0 nome de Monetde Lamarck, btologo eminente, tido como 0 fundador da teo-ria da evoluc;ao e anterior a Darwin. Uma das ldeias maisconhecidas de Lamarck e a que se refere it afirmaC;ao deque a func;ao cria 0 orgao. Esta ldela foi asslm enunciadapor ele:

    cA necessidade cria 0 orgao necessarto e 0 uso 0fortifica e 0 aumenta consideravelmente; a falta de uso,ao contrario, conduz it atrofia, ao desaparecimento doorgao inutib. verdade que estas ldeles nao foram aplicadas por La-marck ao homem, principal mente devido aos preconceitos co-muns da epoca. Contudo, mais tarde suas ldelas foram am-plamente utilizadas mesmo sem virem ligadas ao seu nome.Esta observaC;ao tern 0 merlto de chamar a atenc;ao para '0aspecto coletivo do conhecimento humano. Isso vern a pro-posito da aflrmac;ao de que 0 evolucionismo cultural , isto e ,o evolucionismo da antropologia cultural, nao deriva do evo-lucionismo bloloqlco de Darwin, de Lamarck e de tantos ou-tros. Naturalmente, e fadl adrnltlr-se esta lndependencta. Con-tudo, e forcoso reconhecer a vizlnhanc;a e 0 parentesco dasideias tanto do evolucionismo blol6glco como do cultural.Nao e impertinente lembrar que 0 evolucionismo da etnolo-gia utllizou-se muito das col aborac;i5es da antropologla, dearqueologia hlstertca. Desnecessarlo tambeme chamar a eten-c;ao para 0 desenvolvimento paralelo dos dois ramos da an-

    tropologia: a fisica e a cultural.

    2. 0 EVOLUCIONISMO CULTURAL: REPRESENTANTESo periodo de construc;ao da antropologia foi dominado,inteiramente, pela orientac;ao evolucionista. Pode-se dizer que

    3. Charl es DARWIN. Or IGem . . &1*1_. p. 5.4. Georges OLIVER. EI Hombre y 18 Evoluc l6 n. p . 42 .203

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    5/41

    o evolucionismo era uma forma otimista de encarar a reall-dade humana. Tern razao Evans-Pritchard quando observaque as antropoloqos do seculo passado erarn liberais era-cionalistas e criam sobretudo no progresso, isto e, nas rnu-dances materia is, politicas, socia is e filos6ficas que se esta-yam processando na Inglaterra vitoriana. Este mesmo autoracrescenta que elndustrlal lsmo, democracia, clencla etc., erarnconceitos aceltavets par s i mesmos. E vai rnais alern 0 autorquando diz a respelto d e' antropologia social rnoderna:

    Na realidade, em que pese a opiniao de muitos dosque se dedicam a ela, hil que se reconhecer que a an-tropoloqla social modema, encarada em seu aspecto teo-rico, e conservadora: tnteressa-se mais par aquilo queproduza equilibrio e integra~ao na sociedade do que pel aconfeccao de escalas e etapas de progresso.Interessava, pais, ao evolucionismo nascente nao provara evolu~ao ou a progresso, mas apenas mostrar como istoacontecera au acontecia. Embora a preocupacao desses estu-diosos Fosse estabelecer as IInhas gerais desse progresso ma-terial, acreditavam que, voltando as olhos ao passado, teriamsubsldios para determinar como a hist6ria da cultura humana

    se cornporterla, Preocupa-os descobrir as leis gerais do pro-gresso humano. Parece correto concluir que eles nao pro-curavam provar a exlstencla da evolucdo, Ao contrario, estaapresentava-se como urn dado; restava-lhes a tarefa de de-terminar como lsso ocorria. Queriam descobrir as leis geraisda evolu'Sao cultural do homem. Par isso se pode dizer quea evolucionismo cul tural foi, na verdade, fruto de sua epoca,De certo modo se pede dizer que a seculo XIX foi urn seculode euforia e otirnismo e a seculo XX, uma epoca de certomedo e apreensao pelos carnlnhos que tomaram os avancestecno!6gicos, principal mente nos paises desenvolvidos.Edward B. Tylor e considerado a pal da etnologia parter sldo ele 0 primeiro a tentar sisternatizar a estudo dacultura. Contudo, isto nao signiHca que esta ldela de evolucaonao tivesse sido ja aventada por outros estudiosos. Mitchell ,em seu Didonario de Sodolaglia' apresenta no verbete eva-lU!jao sodal,. varios names que podem ser tornados comoprecursores do evok.lcionismo cultura l da etnologia.5 . E. E . EVANS-PRITCHARD. Ant ropolog la Soda l, e. 37.6 . 0 . Duncan M.ITCHELL.DldOll ll rlo cI Sodologla. p. 125/8.

    20 4

    Salnt-Sirnon (1760.1825). par exemplo, aflrmara em v a -rias obras que h o ! l uma seqGencia evolutlva atraves da qualdeve passar toda humanldade, distinguindo tres fases de ati-vidade mental: a eonJetural, a semiconjetural e a posltlya.Auguste Comte (1798-1870) apresentou. esquema seme-Ihante. Falava de urn estado primitlvo ou teo\6gico, de urnintermediluio , que denomlnou de metaftslco, e de urn ter-celro, batlzado como cientlflco ou posltivo. Segundo ele, todesas sociedades atravessarn esses t[t~S estados.Outro nome de realce, neste campo, fol 0 de HerbertSpencer (1820-1903). "Spencer tinha elaborado a propria teo-ria da evolU(;ao social antes da pubUcaC;ao de Wallace e Dar-win, rnals viu nas suas contribuic;oes a blologia 0 apolo para-lelo do qual necessttava. A classics expressso esobrevlven-

    cia dos mals aptos pertence a Spencer e nao a Darwin.'Htl outros nomes como 0 de Henry Maine (1622-1888)que estudou a evolu~ao da organiza

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    6/41

    merito de proceder a slsternat lzacao das ideias evolucionis-tas a respeito da cultura. Nao menos importante foi 0 nomede Lewis Morgan, que em 1878 publicava 0 seu Iivro maisimportante Ancient Society, em terras americanas. 0 grandernerito dele fol ter side urn dos primeiros a reallzar trabalhoou pesquisa de campo. Ocupou-se do estudo da organizac;aosocial e lancou ideias vigorosas a respeito da distinc;ao doequipamento material, da organizac;ao social e da simbologia.Serviu de lnspiracao a pensadores de correntes paradoxalmen-te contrarlas. A seu respeito 'escreveu Maurice Friedman: '

    Ja fizemos men

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    7/41

    12. lulz Gonzaga de MELlO A Alu islo SAlES JR. Int rocluc ;1o I Antropologl . Cui.1unII. p. 30.13. Robel1 K. MERTON. SocIoIogI.: Teor l. e EsIrutunI. p, 61.

    Montesquieu nem atribuir a propria hist6ria (0 petrlrnonlocultural) 0 principio dessa dlnamica ou ao menos a causa daacelerac.;80do processo dinarnlco da cultura.Todavia, e de se conslderar urna particularidade obser-vada na definic;ao de culture de Tylor: nela se pode verificarque 0 fator aprendizagem esta presente e ate mereceu relevo.Nela Tylor fala de urn fenerneno eadqulrido pelo homemcomo membro de uma socledades, Como se ve, 0 fundadorda antropologia cultural nao despreza 0 fator transrnlssao naculture, Outre autor que poe em relevo a forc.;a da culturecomo fenemeno quase que responsavel pela pr6pria dinamicae Morgan quando atribui ao aspecto material ou tecnlco acausa da transformac.;ao da organizac;ao social e do posteriortransforrnacao do equipamento simb611co.Mas, em todo case,parece ponto pacifico, por parte de todes os evolucionistas, 0reconhecimento do primado ci a invenc;ao como respcnsavelpelas transfonna9Ses culturais. Oito Isto de outra rnanelra, 0evolucionismo emprestava maior relevo, em seus estudos, anatureza, ao equipamento biopsiquico do hornern em ope-sic.;aoa ac;ao hlstorlca. De resto, convern observar que os evo-lucionistas nao querlam negar a lrnportancla de outros fato-res sobre 0 fenorneno da cultura, tais como solo, cllma, osproprios feitos culturais dos horneris etc. Quer nos parecerque 0 problema e de fundo rnetodoloqlco, pois 0 interesse daescola era estudar e expllcar como ocorria 0 Ienomeno daevolucao, que era por ele acelta como urn dado com formade axioma. Dai 0 caminho palmilhado pelo evoludonlsmo naescolha de temas: origem da cultura, sua evoluc.;aoou etapespercorridas, fixaC;aonos estudos da religlao, do direito, da or-ganizaC;ao familiar etc.A amplitude do seu objeto, embora tenha concorrldo parauma certa falta de rigor metodoloqlco, permitlu, no entanto,o desenvolvimento acelerado de atividades cientiflcas que vie-ram arnpllar 0 conhecimento do passado do homem. Exem-plo destas atividades e 0 progresso conseguldo pela paleon-tologia e pela arqueologla historlca. Doutro lado, tern urnefeito pslcologlco muito salutar no que se refere a aberturada mentalidade dos intelectuais e dos religiosos no estudocientifico do homem e da culture. Uma especle de desrnlstl-ficac.;aoda realidade humana. 0 estudo do homem e de suacultura passou a ser menos compromissado com os dogmasreligiosos.

    nhecimenlo, crenca, arte, moral, lei, costumes e vanas outrasaptidoes e habitos adqulridos pelo hornern como membro deurna socledade;" Como se pode ver, nesta defini

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    8/41

    b) 0 fator tempo: Uma das crlticas mais acentuadas Iel-tas a corrente evolucionista esta, precisamente, na ecusacaode que ela nao levou em conslderacao merecida 0 Fator tem-po. De certo modo, os evolucionistas procuraram criar urntempo novo, isto e , 0 tempo cultural: as fases ou estaqlos deevolucao. De sorte que 0 que importava nao era tanto 10'calizar determinado povo na escala cujo cri terio era 0 estaqlode cultura vivido pelo povo em questao. Dai se justificar autiliza

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    9/41

    De resto, procede a observa~ao de Evans Pritchard' quan-do escreveu:Vemos pols que, apesar de toda sua lnslstencia so-bre a necessidade do empirismo no estudo das lnstltul-~oes sociais, os antropoloqos do seculo XIX eram apenasurn pouco menos dlaletlcos, teorlcos e doqrnatlcos queos fllosofos morais do seculo anterior. Estes se preocupa-yam apenas em sustentar suas construcoes hlpotetlcas

    com urn nurnero suficiente de fatos concretes: ao con-trarlo, os investigadores dos quais nos ocupamos, apesarde nao 0 aplicarem na pratlca, estavarn convencidos danecessidade deste apolo. "Como se pode depreender, as falhas do metodo cornpa-rativo utilizado pelos evolucionistas, repetlrnos, nao estao nametodologia, isto e, na concepcdo teorica do rnetodo, mas nasua epllcacao, No entanto, 0 esforc;o e a teorizac;ao metodo-logica desses pioneiros da etnologia valeu como abertura de

    uma picada para aqueles que os sucederam.d) Principais temas e c.onceitos: Os principais temas depreocupacao dos evolucionistas foram as lnstltulcdes religio-sas e as instltuicoes familiares. Paralelamente se ocuparam

    tarnbern de instltulcoes [uridlcas e dos aspectos da culturamaterial, como foi 0 caso de Morgan. Em qualquer dos temasa preocupacao central era demonstrar como a cultura obe-dece a uma evolucao universal e unilinear. A hlstorla dogenero humano, di;ia Morgan, e unlca em sua origem, unlcaem sua experiencla e unlca no seu progresses ."o fato de encarar os denominados povos prlrnltlvosscomo populecao potencial ldentlca aos povos civilizados, ven-do-os como povos que se retardaram na evolucao cultural -caracterizados por certo apego aos valores e as instituic;oesdo passado - levou os evolucionistas a fixarem sua atenc;aono estudo do exetlco, Curiosa mente, esta marca ainda perdu-ra na tradic;ao acadernlca da antropologia cultural. Mesmoquando os antropoloqos resolvem estudar fenornenos con-ternporaneos, em geral, se fixam nos seus aspectos excep-cionais e, ate certo ponto, exotlcos. A justificativa do estudodos povos eprlmltlvos e 0 aproveitamento desses na com-15. E . E. EVANSPRITCHARD. Anlropologla SocIa l, p . 37.16. Ralph L BEAlS Y Harty HOIJEk. Inlroduad6n a .. Anlropologla, p. 705.

    212

    preensao melhor dos povos, e.m geral, esta na propria teoriaevolucionista da unilinearidade do fenorneno cultural. Talvezesta concepcao tenha medrado em oposic;ao as te~rias reels-tas ou arlanas.lneqavel, sem duvlda, foi a lnfluencla dos estudos rea-lizados por alguns expoentes da teoria evolucionista na an-tropologia. Veja-se 0 caso de urn Morgan, cujo esquema de

    evolucao cultural ainda hoje e utilizado para c1assificar a cul-tura de povos desconhecidos. Quem desconhece hoje 0 seuesquema, onde s~ fala de povos selvagens, barbaros e civi-Iizados? Quase nlnquern. Teve ele ainda 0 rnerlto de dlstln-guir no seu estudo a respeito da organizac;ao social (sistemasde parentesco) tres aspectos da cultura: 0 equipamento tee-nico (aspectos materiais da cultural. a organizac;ao social, emsi, e a nomenclatura ou equipamento simb6lico. Chamou aatenc;ao para 0 aspecto dlnarnlco e determinante do equl-pamento tecnlco que quando mudado procurava a transfor-mac;ao da organizac;ao social e, posteriormente, a transfor-mac;ao do equipamento simb6lico ou a nomenclatura. Alias,este esquema, ao que parece, foi fruto de observacoes em-pirlcas, Tao estimulante foi sua visao teo rica aue veio elaservir de inspirac;ao as teorias do materialismo "historico, deurn lado, e as teorias funcionalistas americanas, de outro. Seulivro A Sodedade Antiga, publica do em 1877, continua urnclasslco da etnologia.

    Urn outro autor que ainda hoje e citado e tornado comourn marco nos estudos das lnstltulcoes religiosas e Sir JamesFrazer. Seu nome vern sempre a tona quando se parte parao estudo da religiao e da magia. Estabeleceu 0 paralelo entrereligiao e ciencla. Tratou dos varlos tipos de magia e pene-trou fundo no intrincado campo das instituic;oes religiosas. Osprimeiros estudos sobre 0 totemismo, sobre 0 animismo esobre outros temas das Instltulcoes religiosas foram objetode preocupacao tarnbern de Tylor.Em suma, podemos relacionar alguns dos prlnctpals con-ceitos introduzidos pelos evolucionistas e que ainda hoje per-duram na etnologia: Cultura, sistema de parentesco, sobrevi-venclas, aderenclas, evolucao cultural, religiao, magia slrnpa-tica, por contato, terminologia de parentesco, totemismo, cia,tribo, fratria, descendencla patrilinear ou matrilinear, e tantos

    '1 I

    213 q

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    10/41

    outros. Como se ve 0 evolucionismo pode apresentar muitasfalhas no seu metodo de estudo e nas teorias apresentadas,mas tern 0 seu lugar de realce no quadro da antropologia.

    4. 0 NEOEVOLUCIONISMOo evolucionismo cultural nao iria morrer com 0 seculoXIX. No segundo quartel do seculo atual renascia 0 evolu-cionismo cultural atraves de nomes eminentes como 0 de Ste-

    wart Leslie White, Chi Ide e tantos outros. Para White, porexemplo, 0 erro baslco dos que atacaram 0 evolucionismoe que nao conseguirarn distinguir entre evoluC;ao da cultura ehlstorla cultural dos povos. Os evolucionistas desenvolverarnformulas que vinham dizer que urn trace ou complexo cultu-ral B surgiu de urn trace ou complexo cultural A e que sedesenvolveu no trace ou complexo cultural C ou caminha paraele. Noutras palavras, descrevem urn processo da cultura abase de etapas de desenvolvlmentos. n

    Para os neo-evolucionistas 0 estudo da evoluC;ao culturale slnonlrnc do estudo do processo tecnlco ou tecnoloqlco. 0hornern, como todos os animais, explora 0 meio ambientepara obter uma forma de preservar a vida e garantir a perpe-tuac;ao da especle. A tarefa da antropologia nao sera apenasconstatar a sequencia do desenvolvimento, mas especificar osseus fatores determinantes.

    Leslie White assim formula a lei basica da evolucao cul-tural:A cultura se desenvolve quando a quantidade deenergia de que dispcSe 0 homem per capita, ou por ano,aumenta; ou na rnedlda em que aumenta a eflcacla dosmeios tecnoloqlcos para aplicar esta energia ao trabalho;ou ao incrementar-se ambos os fatores simultaneamen-tes. ,.

    White segue 0 esquema de Morgan, embora os criteriospara a deterrnlnacao dos estagios da evoluc;ao sejam dife-rentes. Assim, para ele, 0 estagio de selvageria caracter lza-sepelo uso e acesso a energia do proprio corpo e, raramente,da energia do fogo, do vento e da agua. Ja 0 estado de bar-17. Melville J. HERSKOVITS . Anl ropologla Cul tu ra l. t omo I I. p . 2 87.1 8. Ralph L. BEALS y Har ry HOIJR . Op. cit. p . 7 23.

    21 4

    barle e reconhecido pelo usa de anima is domestlcos e pelocultivo das plantas. Ao contrarlo do que pretendia Morgan,nao seria 0 usa do alfabeto que teria determinado a novaetapa - 0 estaqlo de civilizac;ao - mas a descoberta e 0usa da maqulna a vapor. Estas e outras ldelas de White foramexpostas pela primeira vez em seu livro Energy and Evolutionof Culture, em 1943.Bern significativa e a posic;ao de outre neo-evolucionista,Gordon Childe. Alias, existem do i s livros seus traduzidos parao portuques e lanc;ados pela Zahar Editores com os seguintestitulos: A Evolu~ao Cultural do Homem e 0 Que Aconteceuna Hist6ria, correspondentes aos titulos originais: Man MakesHimself e What Happened In History, respectivamente. A se-guir apresentamos urn trecho de Childe que serviril para ilus-trar a dlmensao do seu pensamento teorico:

    As varia,:;oes htstorlcas podem ser julgadas pelasproporcoes em que ajudararn nossa especle a sobrevlvere multiplicar-se. Trata-se de urn crlterio expressavel emnurneros populacionals. Encontramos, na hist6ria, fatasaos quais este crlterio nurnertco e epllcavel diretamente.o exernplo mais obvlo e a Revoluc;ao lndustrlals naGra-Bretanha. Estlmetivas da populacao desde a pestenegra ate 0 seculo XIV. Calculos fidedlgnos dao uma po-pUlac;ao de 4.160.221. em 1570, 5.773.646, em 1670, e6.517 .035, em 1750. E entfio, com a Revoluc;ao Industrial,comec;ao dramittico aumento para 16.345.646, em 1801,e 27.533.755, em 1851.o efeito desses nurneros sera ainda mals impressio-nante se forem tais cifras colccades nurn papel quadrl-culado (ver fig. 1) para dar urn graflco, ou uma curvaFig. 1

    Graffeoda popula~ao 20calculada para aGra-Bretanha:1500 - 1800 10

    ~/~ /.,-

    - _ . . . . . . _ . . . .1500

    21 51600 1700 1800

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    11/41

    populacional. A direc;ao geral da Iinha e quase reta ate1750, sem ser afetada pelas revolucoes politicas e movi-mentes rel igiosos dos seculos XVI e XVII, que tanto sedestacararn nos velhos livros de hlstcrie.

    Entre 1750 e 1800 a Iinha sobe num angulo de .3Qo.As profundas rncdiflcacoes na cultura material e no equl-pamento, as novas forc;as socials da producao, a reorga-nizac;ao econornlca, que tern 0 nome de Revolucao In-dustrial, reagiram contra a totalidade do' povo brltanlco,como nenhum outro fa to religioso ou politico. Urn doseFeitos foi, evidentemente, tornar possivel 0 aumento gi-gantesco em seus numeros. 0 povo multiplicou-se comonunca antes da chegada dos saxoes. A julgar pel os pa-droes bioloqlcos acima sugeridos, a Revolucao Industrialfoi urn ex ito. Facilitou a sobrevlvencia e multipllcacao daespecie em questao. I .Como se pode perceber, nao existe diferenc;a substancialentre 0 evolucionismo prirnltlvo e 0 neo-evolucionismo. Apreocupacao baslca continua sendo 0 estudo das grandes Ii-nhas do fenerneno cultural. Nota-se ate 0 recrudescimento napreocupacao em dar relevo ao aspecto material da cultura,

    ao aspecto tecnlco como sendo responsavel pela evolucdomais acelerada de alguns segmentos da especle humana.Contudo, convern observar e Fazer uma restric;ao ao racioclnloteorlco dos evolucionistas. Segundo Childe, os neo-evolucio-nistas tomam 0 aspecto material por se tratar de urn elemen-to rnensuravel e de fikil constatacao. Mas poder-se-ia con-tra-argumentar que talvez esta fixac;ao seja decorrente dasimples impossibilidade de provar a exlstencla de evclucao norestante dos aspectos da cultura. Como mostrar e demonstrarque tenha havido evolucao na organizac;ao social? Como,igualmente, provar a evolucao nas pratlcas e doutrinas reli-giosas? Nao e facil tarnbern demonstrar que os aspectos po-liticos tenham evoluido. Tern razao Eric Wolf ao afirmar quectodas as tentativas, por exemplo, para descrever as formasde contagem de descendencia como tendo sofrido urn pro-cesso de cumulacao progressiva, desde a promiscuidade pri-mitiva ate as formas matrilinear e patrilinear e a forma bila-teral, tern falhado. E conclui: cAs formas de matrimonio e19. V . Gonion CHILDE. A Evolul il o Cultwal do HomQll'l, p. 211.

    216

    filiac;ao nao sao cumulativas; podem ser substituidas umaspel as outras ou existir como componentes alternativas domesmo grupo."Mas nao so. Outras restricoes podemos apresentar 80pensamento evolucionista. Veja-se 0 caso do aumento popu-lacional tldo e havido como indicador de malar capacitac;aotecnlco-cultural, Sera que podemos aceitar isto como fadli-dade? Cremos que a assunto exige algumas constderecoes.Observa-se, por exemplo, hoje, que nao sao as regi6es rnalspopulosas do globo aquelas mais desenvolvidas. Ao contra-

    rio, sao os paises pobres que detern as rna is altas tax as decresclmento populacional.No interior das nac;6es pobres erlcas observa-se tarnbern que nas camadas mats pobres das po-pulacoes e onde estao as families mais numerosas. Talvez, Gor-don Childe respondesse que, tais populacces sejam as bene-ficiiuias do progresso geral da especle humane. Em certo sen-tido, isto e verdade, porquanto nessas populac;oes 0 que verncrescendo nao e a taxa de natalidade, mas a diminuic;ao dataxa de mortalldade decorrente dos beneficlos de aplicac;aodes descobertas medlcas e da pratlca de uma medicina pre-ventiva com 0 usa de substiincias e defensivos descobertosnos ultlrnos cern anos. Considerando a humanidade como urntodo, Childe diria que 0 fato de os pobres terem urn nurnerode flIhos mais elevado vern demonstrar que isto decorre, cons-ciente ou inconscientemente, da necessidade de cornpensacaodas altas taxas de mortalidade. Em outras palavras, a baixaexpectativa de vida levaria estas populacoes a terem uma taxade natalidade elevada.

    As considerac;5es aclrne vern tornar patente aquilo queja fol dito: nao se pode julgar a teoria evolucionlsta apltcan-do-a a casos partlculares, Afinal, a perspective do evolucio-nismo e universalista e nao regionalista. Poroutro lado, neose pode negar que 0 evolucionismo tocou nurn .ponto funda-mental que polarizou as atenc;5es dos teorlcos des ci~ndassociais. Referimo-nos ao problema da Irnportancla do equlpa-mento tecnico ou das condlcoes materiais de vida como fatordlnarnlco de cultura. Contude, apesar disso, Morgan nao des-prezou a irnportancla das ldelas como 0 principio motor dasmudancas, embora visse no arcabouc;o tecnoloqlco 0 respon-savel pela organizac;ao social e pela nomenclatura ou con-20. ErIc R. WOLF. 0 Estudo de EvolUlilo, p. 86/7.

    217

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    12/41

    junto sirnbolico. Ou seja, os meios de producao seriam pro-dutos da mente humana; em seguida, se tornariam agentesde mudanca de outros niveis do fenorneno cultural.

    5. 0 EVOLUCIONISMO VISTO POR OUTRO ANGULOA antropologia nascente pode ser vista de forma dife-

    rente daquela que foi tratada ate agora. Referimo-nos a vlsaoou a analise marxista. Nao deixa de ser muito interessante aanalise feita por Jean-Marie Auzias a respeito da antropologianascente denominada por ele de antropologia colonialista emoposic;ao a antropologia marxista.

    Em seu Iivro Antropologia ContemporAnea, este autor dizo seguinte:

    A antropologia, em seus prirnordios, depende daexpansao de dois imperialismos. 0 imperialismo do mer-cado apropria-se da terra, dos recursos e dos homens.o imperialismo da hlstorla apropria-se de urn espaco con-ceptual novo: 0 homem nao hlstorico, aquele de quemnao falam os documentos escritos. A historla e 0 caso-limite da fisica em que as mesmas causas nao reprodu-zem jamais os mesmos efeitos, porque as mesmas cau-sas nao se reproduzem jamais. Desde Montesquieu, pro-curam-se leis, a force, nas sociedades humanas. Alerndisso, voltam-se todos para a noc;ao fortemente ideoloql-ca de civilizac;ao."o autor em questao defende que a orientac;ao da nova

    ciencla denominada etnologia foi fruto da hlstoria. Nao vemosdificuldades de aceitar tal assertiva. Contudo, ja foi visto queoutros autores atribuem 0 nascimento da etnologia ao fato degrupos de intelectuais se terem sensibilizado com a situac;aoprecaria dos povos colonizados por seus governos constitui-dos. Movidos por isso teriam resolvido criar entidades filan-troplcas voltadas para a defesa desses povos tidos como sel-vagens. No caso, os intelectuais e aqueles humanistas repre-sentariam uma rea

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    13/41

    America, os her6is serao pouco a pouco os massacrado-res de Custer, Apaches, Cheyennes e Crows. Na Europao africano ou malaio contlnuardo a ser por muito tempoo alibi da consclencia colonial. Sera mister cern anos, ouquase, para que Morgan seja traduzido para 0 frances,fornecendo-nos urn modele da antropologia da descolo-niza~ao interior. Retorno de Morgan, que e tarnbern urnretorno a Marx."Dentro desta 6tica, nao tern maior lrnportancla a distin-

    ~ao entre evolucionistas, difusionistas e funcionalistas. Mes-mo nao desprezando esta colonizacao, e forcoso admitir queas ortentacoes te6ricas da antropologia apresentam diferen-~as sensiveis. Naturalmente, sob angulo diferente como 0 deAuzias, pode-se dizer que tais dlferencas sao de pouca monta.r: mister, no caso, frieza na analise. Aqui nao interessa 0comprometimento com esta ou aquela orlentacao te6rica. De-fendemos, isto sim, a validade de todas as teorias em antro-pologia. Na verdade, esta validade e relativa. Cada teoria evallda dentro dos para metros e dos objetivos a que se propoe,De nada adlantera 0 evolucionismo para a lnterpretacao dahist6ria cultural de uma sociedade particular. Por outre lado,parece correto afirmar que pouco ou nada adlantara a orien-ta~ao historicista ou difusionista para 0 conhecimento dos uni-versais da cultura. E assim por diante.

    22. JeanMarte AUZIAS. Op. cit., p. 31/2.22 0

    Capitulo VIIDIFUSIONISMO:ESCOLAS HISTORICO-CUL TURAIS

    1. Unhas Gerais do Difuslonlsmo2. Dlfusionismo Ingles3. DifusionismoAIemAo

    4. Escola Americana ou Difusionismo Amerloano5. Configuradonlsmo

    ...0 maten al p ara D recooslru

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    14/41

    1. LlNHAS GERAIS DO DIFUSIONISMOo difusionismo, conhecido tarnbern como historicismo

    engloba varies tendencies teorlcas da antropologia cultural:Sobressaem 0 denominado difusionismo inqles, a escola deVlena e a escola americana. Esta ultima, por exemplo, abrigaalgumas orlentacoes particulares que Ihe emprestam um ce-rater de continuidade que Ihe e peculiar. Dentro do esquemade Penniman, 0 difusionismo, em geral, esta dentro do pe-riodo de critica. Em que pese a precariedade de situar crone-logicamente as orientacoes teorices da 'Intropologia ou dequalquer ramo cientifico, pode-se dizer q:Je 0 movimento c ifusionista encontrou sell auge no periodo de 1900 a 1930.Alias, este periodo e denominado por Paul Mercier de perio-do das descobertas. Antes de considerar cada escola em par-ticular, talvez seja proveitoso tecer algumas conslderacoes ge-rais sobre 0 periodo em questao ou, mais especificamente,sobre a rnudance de Qrientac;ao dos estudos etnoloqlcos ocor-rida apes 0 arrefecimento do movimento evolucionista e quemarcara a constltulceo da antropologia cultural.

    a) 0 difusionismo pode ser visto como um movimentode reac;ao it ortentacao evolucionista dominante na etnologiad~sde 0_ seu nascimento. Esta reac;ao nao atingira apenas aortentacao geral teorica, mas etlnqira tarnbem os procedl-mentos rnetodoloqicos, Isto, contudo, nao significa que 0 dl-fusionismo passe a rejeitar completamente os conceitos ba-sicos constituidos e construidos pelo evolucionismo. Demais,e de notar que 0 difusionismo repousa, de certo modo, embases comuns ao evolucionismo. A preocupacao de um e deoutro e explicar a cultura como fenorneno universal e huma-

    222

    no; interessa-lhes explicar 0 aspecto dlacronlco e nao 0 slncre-nico, isto e , urn e outre procurarn expllcar 0 fenorneno da cul-tura atraves da variavel tempo. Uma coisa deve ficar clara:entre um e outro ha pontos em comum e pontos de diver-gencia.

    b) 0 difusionismo busca, antes de tudo, uma explicac;aohistorlca para explicar as semelhanc;as existentes entre as cul-turas particulares. Conforme observe com muita propriedade,alias, Werner Stark:

    cA palavra 'historiclsmo' denote uma teoria segundoa qual a essencla dos fenemenos de sociedade e da cul-tura consiste no seu carater dlnarntco e de desenvolvi-mento. Isto deve ser nitidamente distinto da outra dou-trina superficialmente semelhante. 0 evolucionismo euma teoria da natureza mals do que da sociedade e daculture. Este pensa em termos de uma lei natural daevolucao: 0 historicismo poe ao lnves 0 destaque sobrea realidade humana e sobre 0 trabalho humano . 'Stark bate numa tecla importantissima para a compreen-

    sao tanto do evolucionismo como do difusionismo (historicis-mo). 0 primeiro da relevo ao fenorneno da invenc;ao, 0 se-gundo ao fenorneno da dlfuseo e dos contatos entre os povos.Ambos, no entanto, acreditam que a compreensao do feno-meno culture repousa sobre 0 seu carater dlnarnlco. Osdifusionistas passararn aver na explicac;ao evolucionista dacultura uma forte marca de apriorismo, muita especulacsoe pouca clencia. Advogaram, em contrapartida, uma rnudan-c;a nos rnetodos da etnologia.

    c) Uma marca forte do difusionismo, em geral, foi a preo-cupacao de tornar os metodos da antropologia cultural malsrigorosos, mais cientificos. Isto levou-o a desenvolver a pes-quisa de campo com intensidade conslderavel,

    De certo modo, poder-se-la dizer que este periodo e 0periodo, por excelencla, da etnografia. Com isso se quer porem retevo 0 fato de os antropcloqos terem partido para acoleta de dados no campo com todo empenho. Alguns che-garam a dizer que havia urqencte em coletar dados e Infor-mac;6es sobre os povos prlmitivos antes que os mesmos de-saparecessem ou fossematlngidos pela civllJzac;ao. Boa parte1 . Werner STARK. Slorlclsmo. p. 275.

    223

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    15/41

    dos antropoloqcs entenderam que, ao rnenos por enquanto,o mais importante era coletar os dadose nao explicar 0 fe -nomen a cultural. Este ultimo poderia esperar algum tempo.No momenta, a lrnportante era coletar a maximo de Infer-ma~6es que proplclassern, rna i s tarde, elementos suficientesque perrnltlssern as eleboracoes teorlcas,d) Esta mudanga de Mtica levou a antropologia culturala desenvolver varlas tecnicas de pesquisa, prlnclpalmente, aobservacao participante. lndlretarnente, 0 estudo ou pesqutsade campo, junto a povos primltivos, levou os entropolegos a

    eprender varies idiomas antes desccnhecldos. Este fato, porsua vez, veio favorecer 0 Incremento de OUtTO ramo da entre-pologia cultural, a lingGlstica. Esta rnarce tarnbern val ca-racterizar 0 funcionalisrno de Malinowski e de Redcllffe-Brown.e) Em surna, a abordagem htstorlclsta na antropologianao so acarretou uma nova interpretac;ao do fenerneno cui-turel, como Foi visto, mas velo convencer seus defensores danecessidade de mudar 0 proprio senttdo ou foco de estudo.Isto teve lugar, princlpalmertte, na escola americana, onde sepassou a dar relevo ao estudo das cultures particulares e naoa cultura universal. JlI nao se procurava estudar a culture nas

    sues origens e em todas as partes formando uma grande unl-dade comum a todos os hornens; agora, 0 relevo era dadoas cultures particulares. Isto, sem duvida, perrnltlu maior se-guran4!a nas lnformacces e urn mater conhecimento de fe-nernenos, ate 6Sora, relegados a urn segundo plano. Estefato talvez explique 0 surgimento de outras tendencies tee-ricas na antropologia cultural, leis como 0 pslcclogtsrno, 0funclonalisrnc e 0 estruturalismo.A seguir, se procurara constderar as principals orienta-~6es dlfusionlstas, separadamente. Uma edvertencla, contudo,aqul se faz necessaria. Importa nao esquecer que, apesar dese falar de urn periodo difuslonista, no caso, ingl~, austriaco

    e americana; nao signlfica que durante trinta enos to tenhadomina do 0 historicismo. De modo algum. Na propria Ingla-terra nao cessam abruptamente as estudos evoluclonlstas,

    22 4

    2. DIFUSIONISMO INGLeS'Quando se trata desta escole, Herskovits resume em

    poucas palavras o significado dela para a hist6ria da entre-pologia: Foi a ultima a aparecer (isto e , il lUme des escolasde orienta~ao hlstertclsta) no cenarlo antropolegtco, e a prt-meira a salr, epeser de as controversies por ela engendredasterem sido tao calorosas como nenhurna outre na hlstoria daantropologia. Seu fundador foi 0 ingles Grafton Elliot Smith que, de

    initio, nao passava de urn anatomista especiaJizado no estudode cerebros. Tendo ido ao Egito estudar 0 cerebro de mumlas,entrou em contato com os resquiclos da antiga cultura egip-cia. Desse contato resultou urn enorme entusiasmo pela cul-tura daquele povo. Este seu entusiasmo inic:ial levou-o a con-siderar 0 fenorneno do paralellsmo cultural. Comec;ou a per-ceber traces culturais semelhantes aos da cultura egipcia an-tiga em tudo quanta foi civiliza~ao. Porern, esta escola pas-sou a defender a difusao como 0 principal motor da dlnamicacultural. Foi ela levada a isso talvez ao verificar qufio dificil ea inova4!ao ou a cria~ao de novos valores culturals,Esta escola surgiu pelos idos da segunda decade desteseculo, Nao foi Smith, apesar de fundador da escola, quemmelhor expos esta teoria, tarnbem conhecida como teorla he-Iiolitica ou pan-eqipcla. Foi Perry quem melhor expos a tesecentral desta teoria em seu Iivro The Children of the Sun. Se~gundo ele, a civilizac;ao ou a cultura de todo 0 mundo rno-demo era basicamente a mesma por conta da dlfusao. Paraos seguidores desta escola nao interessava a alegac;ao de quea forma pirarnidal do templo rnala nao podia ser uma coplada pirarnide egipcia em virtude da dlstancla geografica. Naoadiantava alegar fenorneno do paralelismo para justificaralgumas semelhanc;as. Esta escola ficou conheclda e nota-billzada por seu rnetodo acienlifico e por sua especulacao fan-tasiosa. Em prlnciplo, 0 metoda historico por eles defendido

    e aceitavel. Nunca, porern, 0 procedimento inescrupuloso dernanipulacao de lnformacoes inseguras e duvidosas que, emvez de justificarem as hipoteses levantadas, eram por estasgarantidas.2. Este t6pico foi redlgido em 1913 pelo autor e figura na Introdu. ;. lo a "ntropologlaCultural. Recife. Rota G. ComunlcD~io. 1913. p. 104/6.3. Melville J. HERSKOVITS. Antropologla Cultural. lomo II. p. 320.

    22 5

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    16/41

    Os defensores desta teoria se esqueceram do rigor cro-noloqlco dos acontecimentos conslderados, bern como da lm-praticabilidade de suas afirmac;5e~. tend? em vi~ta a. preca-riedade dos meios de comunicac;ao da epoca, Nmguem, emsa consclencla, pensaria em negar a lrnportancla do fenerne-no da difusao cultural. Outra coisa e 0 radicalismo Incense-qiiente demonstrado por Smith no trecho que segue:Outro grupo de antropoloqos acredita que a clvlll-zac;ao se desenvolveu durante toda sua historia. de urn

    modo muito semelhante ao que sabemos se esta efetu-ando atualmente, isto e , por dltusao. Sa bern o s que nocaso de toda invenc;ao modern a, efetuada num lugar de-terminado, logo se difundiu sobre uma area cada vezmaior ate que todo individuo, em qualquer lugar domundo onde se esta fazendo usc dessa particular inven-c;ao, e , dlreta ou indiretamente, devedor de urn ho~emque, num lugar particular, foi original mente responsavelpelo initio desse processes. Uma colsa e admitir a dlfusao, outra e torna-la como ex-plicac;ao unica das sernelhances entre cultures distintas. Smithnao considerou 0 fato de que a lrnportancla da dlfusao cul-

    tural e tanto maior quanta mais perfeitos se tornarem osmeios de cornunlcacao. A reclproca tarnbern parece verda-deira: quanta mais rustlcos os meios de comunlcacao tantorna i s saliente se torna 0 papel da invenc;ao na dina mica cul-tural. Alias, nao so 0 fenorneno da dlfussc cresce de lrnpor-tancia com 0 aprimoramento dos meios de cornunlcacao:tam bern 0 fenorneno da lnvencao, em geral, e 0 da inovac;aoe da reformulacao ou reelaboracao crescem de lrnportanclacom aquele aprimoramento. Demais, 0 difusionismo tern con-tra si urn fato siqnlflcatlvo, destacado pelo funcionalismo: aadoc;ao de traces culturais por determinado povo nem sern-pre significa pura copla, normalmente redunda numa re-elaboracao.

    3. DIFUSIONISMO ALEMAOt: . tambern conhecida como escola hlstcrtco-culturab ouainda como escola de Vlena, Os nomes mats expressivos l i-

    4 . Mf!lv ll lf !J. HERSKOVITS. op. cit. t omo I I. p. 322.22 6

    gados a essa escola sao Fr. Ratzel, L. Fro~enius, '!'. :oy, F.Graebner e 0 Pe. Schmidt. Tratando do metoda hlsterico-cul-tural, Keesing assim se expressa:Graebner, urn dos seus principais fundadores, con-siderava 0 grande objetivo desse rnetodo a determina-c;ao hlstcrlca das combinac;5es de elementos baslcos cha-mados Kulturkrelse, que entram na tessltura do desen-volvimento cultural do mundo. Urn Kulturkreis simples,chamado em outras linguas ora ccomplexo de culture,ora ecirculo de cultures, e urn conjunto de trac;os asso-ciados com urn sentido, que podem ser lsolados e lden-tificados na hlstorla da cultura. Os prlmeiros KulturkreJseforam encontrados mediante urna comparac;ao e umaanalise meticulosa de culture que parecem ser as rnalsprimit ivas. Para este flrn, diziam os cultural ls tas-hlstorlcis-tas, a 'forma inadequada' e 0 melhor crlterlo de relac;ao- muito rna is importante, por exemplo, do que a rno-derna contigiiidade ou proxlrntdade."

    A proposlto desta escola, escrevemos em 1973 0 seguinte:0 que distingue 0 difusionismo alernao do ingles e,

    preclsarnente, 0 procedimento metodol6gico da utilizac;aode lnformacoes seguras. Partiram para estudos mais con-cretos e palpavels. A maior contrlbulcao desta escolapara a antropologia, em geral, fol, com certeza, de cunhometodologlco. Ao contrarlo da escola precedente, nao secontentaram em identificar semelhanc;as culturais em duasculturas particulares e dai concluir ter havido dlfusao ne-cessariamente. Foi este senso de critica com relac;ao itssernelhancas culturais que levou Graebner a crlar certoscrlterlos de analise. 'Esses criterlos, comenta Herskovlts,cham ados por ele (Graebner) crlterlos de forma e quan-tidade, sao baslcos em todos os estudos de transrnlssaode cultura. Seu significado e perfeitamente simples. Quan-do as sernelhancas sao manifestas nas cultures de do isgrupos diferentes, nosso juizo quanta it probabilidade deque tenham derivado de uma s6 Fonte de origem depen-de de seu numero e complexidade. Quanto maior for 0nurnero de semelhances, maiores serao as probabilidades

    I.

    5 . F~l Ix KEESING. Ant ro po logla Cul tural , v ol . I I, p. 238.

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    17/41

    de ter havido ernprestlmos: e 0 que se da com rela~ao aonumero e 0 mesmo que se da com rela~ao a complexi-dade de urn elernento dado' (Herskovits, op. clt., 2q to-mo, p. 327).

    Outra grande contrlbulcjio desta escola, tambern ll-gada a lnterpretacso dos traces de culture semelhantes,foi 0 charnado crtterlo da forma inadequada. Crlterio esteque conslste em dar mais lmportancla, na analise deformes dos traces culturais, aquelas formas menos im-portantes ou dlspensavels. Isto quer dizer 0 seguinte: naanalise de determinado artefato, por exemplo, urn barcoou uma piroga, 0 mais importante para se descobrir pos-sivel liga~ao entre este barco e outre existente noutraarea nao vai ser sua forma concave, pois esta Ihe e ne-cessaria para permanecer a flor d'agua. As formas maisimportantes para a analise difusionista vao corresponderIi comparacao das formas dispensavels e ate lnadequa-das que figuram nos barcos. Se houver colncldencla, porexemplo, nos ornamentos ou no formato completamen-te inadequado no que diz respeito aos principios de na-vegabilidade (formato quadrado, por exemplo), entaoesta forma torna-se significativa para a analise.

    Vale salientar que com esta escola comecararn os es-tudos de campo, as pesquisas empiricas. t exemplo 0trabalho realizado por Koppers e Gusinde na Terra doFogo. Foi tarnbern esta escola que abriu carnlnho paraos estudos ecoloqicos.

    Nao podemos julgar esta escola pela teoria extre-mista do Pe. Wilhelm Schmidt. Este foi difusionista ex-tremado e sua teoria tinha urn que de misticismo. Istoem virtude de reconhecer dois tipos de causalldade cul-tural. A causahdade extern a seria construida de forcesque agem de fora sobre 0 homem, e interna, das forcesque ele proprio, de dentro, exerce. Schmidt nao so acre-ditou em seu rnetodo htstorlco-culturel, como tambernachava possivel a reconstrucao de toda a hlstorla da cul-turas. Hit alguns pontos que aproximam muito esta escola do

    evolucionismo. Em primeiro lugar, 0 objeto de estudo da an-6. Lutz Gonzaga de MEllO e AluTsto SALES. Inlr~1o 6 Anlropologla Culturel, Re-cife. Rot a G. Comunlca~l o. 1973. p. 106/ 7.

    22 8

    tropologia ainda continua sendo a culture universal, a cul-tura como Ienorneno humano. Ate entao nao se pensou emconcentrar 0 estudo antropoloqlco nas culturas partlculares,Os problemas discutidos com mais freqiiencla ainda sao: 0problema do paralelismo ou converqencla, as origens do fe-norneno cultural, a exlstencia de sobrevlvencla.

    Em segundo lugar, os difusionistas europeus (escola deViena e escola Inglesa) ainda continuam presos as pesquisasde gabinete, tal como os seus colegas evolucionlstas. Advo-gavam mais rigor rnetodologico e pregavam a pesquisa decampo, mas as condlcoes nao permitiram par em pratlca suasconvlccoes, Poucas foram as pesquisas de campo.

    Em terceiro lugar, tanto 0 funcionalismo como 0 dlfuslo-nismo europeus traziam a rnarca da denominada antropolo-gia colonial, na expressao de Jean-Marie Auzias, que, a pro-poslto, diz 0 seguinte:

    A antropologia, em seus prlmordlos, depende daexpanseo de dois imperialismos. 0 imperialismo de mer-cado aproprla-se da terra, dos recursos e dos homens. 0imperialismo da hlstorla apropria-se de urn especo con-ceptual novo: 0 homem nao historlco, aquele de quemnao falam os documentos escritos. A hlstoria e 0 caso-limite da fisica em que as mesmas causas nao repro-duzem jamais os mesmos efeitos, porque as mesmascauses nao se reproduzem jamais. Desde Montesquieuprocuram-se leis, a force, nas sociedades humanas. Alerndisso, voltam-se todos para a no

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    18/41

    sobrevlvenclas culturais que correspondem, no tempo cultu-ral, a uma fase ja vivida pelos sagazes europeus ecivillzadoss.Era pols urn dever, uma obrigac;ao dos europeus ajudar ospovos prirnltivos a alcancarern a clvlllzacao. 0 difusionismotarnbern nao ficava atras. No momenta em que defendiam 0processo de dlfusao como 0 caminho mais eficiente de pro-gresso e de civilizac;ao, defendendo, portanto, a necessidadede copiar e fortalecer os contatos dos menos civilizados comos centres de cultura, e facll perceber 0 significado deste pen-samento. A colonlzaceo assim tarnbem encontrava uma fortejustificativa para a ac;ao interventiva e a perpetuacao da es-poliac;ao colonlalista.Agora coloque-se a questao: qual 0 efeito destes pen-samentos assimilados pela intelligentsia dos paises coloni-zados, ainda hoje? Uma coisa se pode constatar, de imedia-to: a ocorrencia do impossivel, 0 surgimento de povos semconsciencia nacional, cultural. As vezes, se tern a impressaode que 0 fenorneno do etnocentrismo inexiste nos povos decolonlzacao europela. Nao e raro se discutir se existe ou naouma cultura brasileira... Realmente, conhecendo 0 processode colonlzacao pelo qual passamos e sentindo as marcas pro-fundas que ele deixou na cultura nacional brasllelra, enten-de-se por que muitos de nos tern vergonha de ser brasileiro.Nosso pensamento e europeu, nossos padroes tambern, Acos-tumou-se 0 Brasil a copiar e a macaquear. Nosso intelectualso e born quando formado fora, no exterior. Nao importaque ele fique por fora... 0 Brasil tern uma hlstorla extro-vertida, uma economia extrovertida, e todo extrovertido. Fal-ta-Ihe consciencia e identidade. E bern de notar que tal cons-tatac;ao nao e movida por urn xenofobismo radical. Trata-seapenas de uma vlsao critica que procura ver nao apenas ahistoria dita, mas tarnbern a historla nao dita.

    4. ESCOLA AMERICANA OU DIFUSIONISMOAMERICANO'o historicismo ou difusionismo teve, na versao americanacomo principal mentor Franz Boas. A principal caracteristicadesta escola foi, talvez, ter delimitado 0 campo de estudo da

    8. 0 Item em questlio 101 esc rl to em 1973 e agora val revlsto e com pequenos re oparos; ver Luiz Gonzaga de Mello e Alulslo Sales Jr. Introclu~lo i\ Antropologl.Cultu ri li . Rec if e. Rota G. Comunlc lI~io. 1973. p. 1075.23 0

    antropologia. Segundo seus seguidores, a culture e por de-mais complexa para permitir urn levantamento hlst6rico com-pleto e de carater universal, Razao pela qual optaram peloestudo de areas delirnitadas e, de preferencla, pequenas. Des-ta forma, erqurnentevarn, torna-se mals facil e segura 0 es-tudo hlstorlco-cultural. Foi esta consciencia, com certeza, quelevou a escola americana a urn eperfelcoamento metodol6gico.Deu-se preferencla as lnforrnacoes e dados primilrios. Valedizer que a prioridade absoluta foi dada aos estudos e pes-quisas de campo.Em principia, nao desprezavam a possibilidade de urn es-tudo universal da cultura nem 0 rnetodo comparativo. Nega-vam, e com veernencia, fa sse possivel po-lo em priltica noestaqio em que se encontrava a antropologia .. Achavarn que,antes de se partir para tal realizac;ao, mister serla reellzerem-se numerosos estudos de pequenas comunidades; destarteseria possivel, futuramente, proceder-se a urn estudo maisvasto.

    Por outro lado, .a delimitac;ao do estudo antropol6gicorealizado pel a escola americana, transformando cada povoprimltlvo (tribo, cia ou federacao) em unidade de estudo,permitiu a criac;ao de urn leque mais amplo de temas de es-tudo. Isto redundou em urn aprofundamento do estudo euma ampliac;ao de temas. Por isso, foi esta escola, provavel-mente, a que rnals contribulu para a teoria antropologica noque se refere a produc;ao de pesquisas de campo e a somade materialcoletado. Era opin.iao corrente entre osantrop6-logos americanos da epoca (1900-1930), que a antropologladeveria dedlcer-se aoestudo des fases mais recentes da hls-torla da cultura dos povos: influencla do rnelo fislco-geogra-fico, os contatos culturais, a eridoculturacao, a aculturac;ao.enfirn, 0 estudo da formac;ao do povoestudCldo, tudo issoatraves da informa()ao e observacao diretas do pesquisador.

    E facit sentir tal orlentacao, no texto de Franz Boas. re-colhido de seu livro Race, Language & Culture, ci tado abaixo:0 material para a reconstrugao de culture e sernpremais fraqrnentarlo porque as mats amplos e rnals lmpor-tantes aspectos de cultura nao deixam trac;os ria terra;linguagem. organizac;ao social. religiao - em resurno,tudo 0 que nao e material - desaparecem com a vidade cada gerac;ao. A informac;ao hist6rica e avaliada ape-

    23 1

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    19/41

    nas at raves das fases mais recentes de vida cultural e erestrita aqueles povos que possuem a arte de escrevere cujos registros podemos ler. Mesmo esta lnforrnacao einsufidente porque muitos aspectos de culture nao en-contram expressao em literatura.Na paqina seguinte, 0 autor chama a atenl)ao para 0problema da difusao da cultura que vern dificultar ainda maiso estudo historico de determinada culture.Tanto Boas como os seus seguidores serao criticados pe-los fundonalistas que defendem a tese de que, para a com-

    preensao da culture, 0 levantamento hlstorlco nao e lndls-pensavel. Para estes, 0 fato de determinados traces de umaculture terem origens diversas nao vai modlflcar a cornpre-ensao da mesma. Esta critlca tambern atinge os evoluclonls-tas. Entendemos que a querela deriva da propria disputaecadernica, mas quer nos parecer que tal critica incorre emrna colocacso do problema. 0 que se pode dizer e que ospropositos dos evolucionistas e dos difusionistas sao diversosdaqueles defendidos pelo funcionalismo. Enquanto os prlmel-ros se preocupavam com a expllcacao dlacronica, 0 funclo-nalismo abracara a explicacao slncronica. Outro problema berndiverso e se uns e outros lograram alcencar as metas a quese propuseram.Convcrn notar, porem, que, muito cedo, os representan-tes desta escola perceberam que a dlfusao nao e urn proces-so mecanlco e lnexoravel: bern ao contrarlo, supoe uma ela-bora~ao assaz comp!exa por parte do povo que adota certostraces ou complexos culturais. A proposlto, veja-se 0 quediz Boas:

    A lmportancla da difusdo foi tao firmemente esta-belecida pel a investigal)ao da culture material norte-arne-ricana, cerlrnonlas, arte, mitologia, assim como pelo es-tudo das formas culturais africanas e pelo da pre-historiada Europa, que nao podemos negar sua exlstencla no de-senvolvimento de qualquer tipo cultural local. Nao so seprovou objetivamente por meio de estudos comparati-vos, como tarnbern 0 investigador de campo tern am-pi as provas das maneiras de atuar da dlfusao. Sabemos

    9. Fnmz BOAS. R a o ; < = . l.&!IQuag.e~nd elllhlre. Ntw York. The MumllllBn C,gmpo ny.1!140. p. 250.23 2

    de Casas em que urn 56 Indtvlduo tntroduztu toda urnaserle de mitos Irnpcrtantes, Pademos mencionar, comoexernplo disso, eIende da origem do COIVO, a qual seencontra numa s6trIbo na regiao setentrlonal da ilha deVancouver, Aindae do conhecimento de alguns indJvl-duos que esta lenda fol iotroduzlda per urn homem quefor~ durante m.uitosanos escravo no Alasce, e que pes-tenormenle fO .1 resgatedo por seus amlgos. Tcdavle, 0mito e narrado regularmente como parte do cicio docorvo, embora repudlado par todas as tribes vlzlnhas ...A introduc;ao de ncves tdetas nao se deve de forma al-guma considerar como resultante puramente mecanlcade adil)oes ao padrao cultural, mas ao mesmo tempocomo urn importante estimulo de novos desenvolvimen-tos internos. Urn estudo puramente indutivo dos fene-menos etnlcos leva a conclusao de que tipos culturaismesclados geografica ou historicamente situados comolntermedlartos entre dois extremos fornecem provas dadlfusaos, J.Muitos foram os seguidores de Franz Boa.s. Entre outrospodem sercltadas Alfred Kroeber, Clark Wissler, P. Radin, E.Sapir, Ruth Benedict, .Margareth Mead e tantos outres, Istona;o significa que estes tantos outros dlsdpulos de Boas se-

    Quiram religiosamente seus ensinamentossem deles se dis.tanclar~m. Ao contra rio, cada umenveredou per urn campodeterrmnado, sem contudo desprezar 0 nueleo dos errslna-mentos do mestre. Asslm, alguns enveredaram pelos dorni,nios de linguIstica, outros penetrararn nos estudos de culturee persanaHdade e rnais outros, no dominic da antropaJogia daarte e das formas.Clark Wissler, por exemplo, notabilizou-se por seus es-tudo~ sobre areas culturals, Neste tlpo deestudoo enfoque

    prlnctpal era 0 estudo das relao;oes entre 0 meio ea culture,~uitos forarn o.s . pesquisadores que fizerarn usa deste expe-diente metodologlco para, digamos, mapeamento da culture ..Conhecidas sao as areas cuiturals do conflnente africano de-llrrtltadas par Herskovlts e Hambly. 0 chamado metoda deClark Wissler teve tarnbem rnutta lrnportancla no Brasil. Porslnal, se se flzer urna visao retrospecttva dos estudos antra.poJ6gicos no nesso Pais, se podera verlflcar que dominam1O. Fl'lnz BOAS. op. en., p. 291.

    23 3

    i

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    20/41

    notadamente os estudos de aculturaceo, os de relacoes ra-clals, Digno de nota e a dlvlsao do Brasil em areas culturaisindigenas realizadas por Eduardo Galvao. nKroeber, por sua vez, ficou conhecido por sua monogra-fia The Super Organic (1917), onde afirma que a cultura eurn fen6meno sui generis, que se comporta segundo suasproprlas leis, formando assim uma especle de heranca super-orqanlca passivel de ser estudada separadamente dos indlvi-duos que sao seus possuidores e iniciadores."Se, de urn lado, Kroeber pode parecer ter dado poucalmportancla ao carater psicoloqlco do processo cultural, 0rnesmo nao aconteceu a Franz Boas, como observa Hers-kovits:

    Era sobretudo, para Boas e os que com ele con-cordavam, de maxima lrnportancla que os fatores psico-loqlcos em que se apoiava 0 emprestlrno nao deixassemde estar a todo momenta presentes. lsto, dlzlam, dever-se-ia fazer mesmo quando estes proprlos fatores nao sepudessem estudar, como ocorre nos povos agrafos, quenao deixaram registros hlstorlcoss ."Numa tentativa de avaliaC;ao desta escola, muitos criticam

    o cariiter descritivo de que ela se revestiu, ao ponto de trans-formar a etnologia em etnografia. C afa com que os sequi-dares desta escola se embrenharam nas pesquisas de campoparece ter sua expllcacao numa preocupacso exagerada pardocumentar tudo que Fosse passive} sabre as povos prlmttl-vos, antes que estes viessem a desaparecer, ao contato coma civilizaC;ao... Tern razao Costa Pinto em identificar distor-c;oes no en sino da antropologia no Brasil e na sua aplicac;aoaos problemas nacionais. Este autor critica duramente esteculturallsmo que fez, nos Estados Unldos, e fez, aqui no Bra-sil, os alunos brincarern de antropcloqos nos famosos estudosde comunidade. 0 professor Costa Pinto juntou iI critica umtrecho de Kroeber que vern citado a seguir:

    Grande nurnero de estudos de comunidade, que sedifundiram em certa epoca em grande escala, represen-tau uma oportunidade, forcada per jovens diplomados, depasser, 'no campo', por uma prova de fogo, que Ihes per-11. Darcy RIBEIRO. Os IneillS a O"III~, p. 452.12. fl!lIx M. KEESING. Op. eu., vel, I, p. 234.13. J. Melvi ll e HERSKOVITS. Op. ci t. , t omo I I, p. 3 32 .

    23 4

    mltisse, de alguma forma, v;lver experienclas iguais aque-las que revestiarn de certa legenda herolca as seu.s pro-fessores, antropoloqos de gera;oes passadas, que flea ramfamosos estudando povos exonces em lugares distantes.E como nao era possivel a todos estes pos-graduadosmanter carevanas e expedic;oes para irem a uma tlha doPacifico Sui ou ao interior de urna floresta tropical, to-mavam urn trern de suburbia e lam estudar as habltan-tes de uma pequena cldade vlzinha 'como se fossem prl-mltlvos'. E as mais velhos que dai retirassem, dos rela-tertos desta 'antropologia de veraneio', a que acaso fosse, ltu ' "possivel para compreender a ... cu ras.Embora concordemos com 0 professor Costa Pinto, ha-vemos de ser menos duros com a antropologia, 0 problemarnals serio nao e tanto 0 anacronismo da antropologia e asua lnepcla no trato dos problemas moder~o~; mas 0 pr~ble-rna afeto 130 caso presente diz respeito, prmclpalmente, a an-tropologla acadernlca de nossas universidades. ~es~e. sentido,a crltlca deve atlnglr, pratlcamente, todas as dlsctpllnas rnl-nlstradas nos curses de clenclas socials nao apllcadas. Nossosalunos nao tern campo de estaqlo e, por vezes, 0 proprio

    curso nao as prepare para 0 desempenho de uma profis-sao. 0 fato acarreta urn conjunto de problemas que provo-cam urn descompasso muito grande entre os problemas es-tudados nas universidades e os problemas rea is. As pesquisasnao encontram urn apoio financelro e por isso se veem nacontlnqencla de transformarem-se. em sim~le~. slmu~acro depesqutsa dest1tulda do carater pratico e utllitano. Nao causaespanto, portanto, que a falta de financiamento Ae . de urnautiliza~ao rnals efetlva dos conheclmentos acadernlcos aosproblemas nacionais,a universidade brasllelra, notadamentenos departamentos de clencias hurnanas, tenha s~ tornadoapenas repetidora dos rrabalhos e estudos. acadernicos ~all-zados nos paises rlcos e de tradh;ao clentiflca. Como dlsse-mos, 0 problema nao e da antropol~gi.a ne,:" d: nenhumaclencla, em particular, e slrn, da propna uOlversldade. Estaprecise juntar a sua tarefa de tra~smit!r ~onhecime~to umaoutra tarefa fundamental: produzir clencia, conheclmentos.Para tanto e imprescindivel promover pesquisas. 56 asslrn14. L. A. COSTA PINTO. Sodol ogla DesenvoI vlmento, p. 87.

    23 5

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    21/41

    sera possivel uma atualizac;ao, uma adaptac;ao e uma cons-truc;ao cientifica para as nossas necessidades.Com relac;ao ao problema de a escola americana ter-setornado uma antropologia descritiva, ha a considerar 0 se-guinte. Primeiro, parece valldo 0 intento dos estudiosos daepoca de coletar 0 maximo de docurnentacao, mesmo emforma predominantemente descritiva; afinal, bern melhor ecoletar material e documenta-lo bern, sem teorizar, do queteorizar em profusao sem nenhum dado ou fato a mao. Se-gundo, 0 fato mesmo de muitos estudiosos se lancarern itcoleta de dados culturais levou-os a anresenta-los de maneirasistematica: isto permitiu, e 0 tempo encarreqou-se de provar,que a escola de Boas Fosse antes de tudo uma antropologiaheuristica, estimulante e sugestiva. Novos estudos dentro daantropologia surgiram em decorrencla deste ani em coletar

    inforrnacoes sobre culturas diferentes. Foram novos temas,novas abordagens, novas fronteiras que surgiram.Mesmo nao sendo nosso proposlto tratar das varies ori-

    entacoes teorlcas menores dentro da antropologia, fica regis-trado, a seguir, 0 que escrevernos sobre 0 configuracionis-mo, em 1973."

    5. CONFIGURACIONISMOTratamos do configuracionismo, aqui, porque ele repre-senta, sob certo aspecto, urn prolongamento do proprio his-

    toricismo ou difusionismo america no. Prolongamento porquerepresenta uma abordagem tarnbern de culturas particulares,cada uma delas vista, na expressao de Franz Boas, comouma unidade singular e como um problema individual. IIMesmo 0 enfoque tipico de configuracionismo ja exlstlano historicismo de Boas, embora nao com tanto realce. Nalntroducao ao Iivro de Ruth Benedict, Boas diz textual mente:

    Nos devemos entender 0 individuo como vivendoem sua cultura; e a culture como vivida pel os individuos.o interesse por estes problemas s6cio-psicol6gicos nao ede modo algurn oposto a abordagem hlstorlcas. II15. Lui z GonzaAa de MELLO e Aluislo SALES JR. OD. ci t., p. 110/2.16. Franz BOAS. Introduction, em Ruth BENEDICT. Patterns o r Culture, p. XIII.17. Franz BOAS. Op. cit., p. XIV.

    236 1

    o que ira diferenciar a abordagem historicista da culturadaquela adotada pelo funcionallsmo e pelo estruturalismo naoe, exatamente, a preocupacao de estudar culturas parttcula-res como urn todo, mas, principal mente, 0 modo ou 0 metododeste estudo. 0 historicismo defende a necessidade de urnareconstrucao hist6rica da cultura para bern cornpreende-la. Aocontrarto, 0 funcionalismo e 0 estruturalismo acham dlspen-savel esta reconstrucao e afirma ser possivel 0 conhecimentode dada cultura atraves de uma analise de sua situac;ao pre-sente. 0 configuracionismo tentou encontrar explicac;iio paraa individualidade ou especificidade das culturas particulares.Tanto a Ruth Benedict como a Sapir urn fato despertou-Ihesa atenc;ao: urn mesmo trace cultural tornado por ernprestlmopor duas culturas distintas pode sofrer transformacoes nestefenorneno de adoc;ao.

    Sapir, inicialmente, ocupou-se do estudo da linguagem.Neste ele descobriu que cada lingua possui uma maneira deser, uma forma integrada ou uma habilidade caracteristicaque Ihe permite expresser certas coisas melhor do que outras.Segundo ele, a culture tambern forma urn todo com umaconfigurac;iio inconsciente que, geralmente, niio e comuni-cada a mente. Esta configuraC;ao corresponde a urn arranjoque Ihe e proprio e Ihe fomece uma maneira tipica de ser,quase - isto ele nao afirma explicitamente - uma per-sonalidade.

    Sapir achava born 0principio metodol6gico de que a cul-tura e urn dodo superorqanlcos impessoal. Porern, como ob-servou Keesing: . .. este ponto de vista torna-se urn obstaculo senea longo prazo ao estudo mais dlnarnlco da 'genese edesenvolvimento das conflquracoes culturals', 0 motivee que as conftquracoes culturais 'ilaO podem ser realis-ticamente separadas das organizac;oes de ldelas e senti-mentos que constituem 0 individuo'. A chamada cultura

    de urn gn.:?o, como e geralmente tratada pelo antro-poloqo, e essencialmente uma !ista sistematica de pa-droes de comportamento que 'podem ser i1ustrados naconduta mesma de todas ou da maio ria dos individuosem causa'. Mas 0 'locus real' desses 'processos que,quando abstraidos em uma totalidade, constituem umaculture' nao esta na 'continuidade teorice de seres hu-23 7

    , 9 . J

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    22/41

    manos conheclda por socledade', pols 0 termo 'socleda-de' e ele pr6prio uma construcao cultural ....A representante do configuracionismo mais conhecidatalvez seja Ruth Benedict que foi tarnbem dlsclpula de Boas,como Sapir. De certo modo os configuracionistas nao despre-zam a cultura. Apenas reconhecem os individuos como su-jei tos e objetos da cultura. Desta forma, as caracteristicas dosindividuos deveriam ser ldenticas as caracteristicas da culturaa que pertencem. Assim como, no individuo, nao existem se-paradamente principios religiosos, econornlcos, politicos, ju-ridicos etc., mas uma resultante, uma configurac;ao de todosos principles, tambern, na cultura, existe urn todo harrnonlo-so, uma conflquracao, urn genio:., urn est ilo de ser que dirigee conforma 0 comportamento de todos os membros destacultura. Benedict tomou de ernprestlrno os conceitos psico-16gicos de Nietzsche e Spengler para classlflcar as culturasem do is tipos principais: tipo apolineo e tipo dionisiaco. 0primeiro corresponderia aquelas culturas extrovertidas: eacen-tuando formas externas de comportamento, ritualistas, con-formistas, desconfiadas do individualismo, evitando excessos,mostrando comedimento ... j ja as culturas dionisiacas se-

    riam as introvertidas: intensamente individualistas, agressi-vas, apreciadoras da experlencla violenta, motivadas mais peloindividuo do que pelo grupo. toComo observa Jacobs, eela (Benedict) fala de uma con-figurac;ao como urn padrao cultural . urn termo infeliz porqueele nao expressa Iiteralmente 0 que ela tern em mente." Nosseus estudos, Ruth Benedict ut ilizou conceltos como pad roesculturais, orlentacoes da culture, objetivos e molas mestrasemocionais e intelectuais da cultura, etc. Quem estuda RuthBenedict pode perceber, perfeitamente, que ela nao se res-tringe a urn extremismo incompativel com 0 proprio metodocientifico. Ela aceita a orlenteceo boasiana, mas acrescenta-

    Ihe elementos novos. Ate certo ponte, ela aceita tarnbem ele-mentos do funcionalismo (a inter-relacao de elementos cul-turais), embora critique Malinowski por nao ter dado 0 me-recido enfoque ao todo cultural .

    18. Fe lix KEESING. Anl ro polog la Cul tu ra l. vo l. I , p . 2 49.19. Felix KEESINO. Op. cit., vol. I, p. 251.20. Melvi ll e JACOBS. Pa ttBn In Cul tu ra l Anthropology, p. 36 .

    23 8

    Capitulo VIIIFUNCIONALISMO

    1. Considera9)es Gerais2. 0 Funclonallsmo de Malinowski

    2.1 Pressupostos e Fundamentos da Teorla Malinowskiana2.2 0 Estudo das lnstltulcoes

    3. 0 Funclonalismo de Radcliffe-Brown4. Em Conclusio

    "Minh" IndH"ren~n pelo pll.SSlldo e SUB reconsUtul~60 1160 e, per-tanio, Lima questao de pret~r lt o, por 8ulm dbe,. 0 p

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    23/41

    1. CONSIDERA

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    24/41

    Alguns consideram Radcliffe-Brown 0 classlco, emcontraste com 0 rornantico Malinowski. Na verdade, eletambern era urn homem de extremos, obcecado pela sua

    mensagem; tal como Malinowski, era urn egomaniaco eurn dogmatico. Ambos tinharn pretens6es a urn statusaristocratlco e ate mesmo de super-hornens, e crelo serslntornatico de suas semelhanc;as essenciais e comuns ex-centricidades 0 fato de serem ambos valetudlnarlos. Emsuma, os dols homens viam-se como profetas. Mas, ondeMalinowski era todo arrebatamento caudaloso, Radcliffe-Brown disciplinava 0 seu fluxo, guiado por sua Inque-brantavel adesao, ainda que urn tanto ingenua, aos ca-nones das clenclas naturais do comec;o do seculos,"o fato e que ambos atrairam urn born nurnero de dis-cipulos a sua volta, cada urn exercendo seu magnetismo deuma forma particular. Ainda com a finalidade de esclareceras semelhanc;as e as diferenc;as entre os dois representantesrnaxlmos do funcionalismo na antropologia, e por acreditarque tal colocac;ao podera, igualmente, facilitar a cornpreenssoda relac;ao existente entre 0 funcionalismo de urn e de outre,apresentamos a seguir a opiniao de Hortense Powdermakera respeito:

    0 meu palpite e que pelo menos uma parte da di-ferenc;a entre a obra de Malinowski e a de Radcliffe-Brown poderia ser correlacionada com as suas personali-dades. Radcliffe-Brown, em nitido contraste com Malino-wski, parecla estar mais distante da vida, modern a outribal, e sem laces estreitos de familia... Suas relac;6escom os homens, ainda em comparacac com Malinowski,pareciam ser mais faceis do que com as mulheres. Alerndisso, Radcliffe-Brown tinha discipulos na verdadeira acep-c;ao da palavra. Os alunos de Malinowski aprendiam dele,mas tambern disc:utiam, repllcavarn-lhe e faziam pladasa respeito dele. Ele queria lealdade (todos tinham queestar de seu lado) mas nao reverencla. .. Radcliffe-Brown,por outro lado, reunia a sua volta urn grupo de jovensdisdpulos que Ihe rendiam c:ulto. Jamais ouvi qualquerdeles ataca-lo a socapa ou rldlcularlza-lo. Hoje, algunsdesses antropoloqos brltanlcos, agora de meia ldade, pa-recem comungar num culto de ancestral.'

    criar urn procedimento academlco classico na formac;ao dosantrop61ogos. Depois de Malinowski, ficou sendo comum, aquantos desejassem enveredar na tarreira acedernlca da an-tropologia, lnlcla-la junto aos povos primitivos, numa especiede estaqlo. S6 ap6s este ebatlsmos e que 0 proflsslonal sesentia animado a penetrar no maqlsterlo. A pr6pria cornunl-dade cientifica inglesa exigia este ritual.As Iinhas gerais do funcionalismo, a bern da verdade, naoprovern dos seus dois representantes maxlrnos, Malinowski eRadcliffe-Brown. Ao contra rio, esta corrente de pensamentoantropol6gico teve uma tradic;ao quase secular. Suas ralzesestao Iigadas aos nomes de Spencer, Durkheim e, de modogeral, a tradic;ao francesa. Alguns chegam a falar de umaexpllcacao sociol6gica ao se referir ao func:ionalismo na an-tropologia. No entanto, como ressalta muito bern Lucy Mair,Malinowski introduziu em seu arcebouco te6rico elementospslcoloqlcos, Assim expressa-se ela:

    0 trabalho dos socioloqos franceses influenciou osdois principais antropoloqos ingleses do seculo XX, Ma-linowski e Radcliffe-Brown, cujas teorias estao integradasno corpo de pensamento da antropologia contemporaneaque sao melhor tratadas no c:ontexto dos problemasatuais. As teorias de Malinowski apoiavam-se rna is napsicologia do que as de Radcliffe-Brown, para quem 0conceito de estrutura social era rnais fundamental , acorn-panhavam muito de perto as pegadas de Durkheim.Note-se que 0 funcionalismo na antropologia inglesa as-sumiu a aura de uma revolucao academlca. Nao se po desubestimar 0 vigor desta escola, contudo, seu sucesso deveu-se, em parte, as personalidades de seus dois principais men-tores, Malinowski e Radcliffe-Brown. Tanto urn como outroestavam longe de serem modestos e humildes. Ambos eramvaidosos e t inham consclencla da lmportancla da nova orlen-

    tac;ao que propunham a velha etnografia inglesa. Para seter uma idela desses dois personagens, veja-se 0 que dizKuper:

    3 . Lucy MAIR. Int ro duo ;I I0 Ant ro po logla Soc Ia l, p. 34 .4. Adam KUPER. Antr0p6l ogos e Antr opol ogla SocI al. p. 34.5. Adam Kuper. Op. cit. p. 22.

    24 2 24 3

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    25/41

    Em suma, visando a uma melhor compreensao desta es-cola nas suas duas orientac;oes principais, aqui, tam bern ve-1~-e":I0s ~m separado. Com isso, acreditamos que 0 assuntoflcara rna IS clare e mais sistematico.

    2. 0 FUNCIONALISMO DE MALINOWSKIMalinowski foi muito mais expliclto na sistematizac;ao deseu pensamento teo rico do que Radcliffe-Brown. Em lin has

    gerais, pode-se dizer que ele deu continuidade ao pensamen-to antropoloqlco lnqles, Malinowski era nolones natural deCracovla, nascldo em 1884, e filho de u.;, disti~to linguista,professor de filosofia eslava na Universidade Jageloniana.Teve ~ma educacao esmerada. Explica-se, ate certo ponto, avocac;ao antropoloqlca de Malinowski: seu pai era uma espe-cie ,de folclorlsta e etnoqrafo com trabalhos publicados sobrea . hn~ua polonesa e seus dialetos populates. Fez curso deciencras exatas e, por ocaslao do doutoramento, teve oportu-nidade. d~ ler 0 livr? de Frazer: The Golden Bough. Segundoele propno, esta leltura e que 0 teria convertido ao estudoda. antropologia. Ainda foi estudar em Leipzig, dando prosse-gUlmento aos seus estudos de fisica e quimica. Nesta mesmacidade comec;ou a estudar pslcoloqia experimental sob a orl-entac;ao de Wundt e hlstorla econornica com Bucher. Confor-n:'e o~serva Kuper, a importancia desses do i s anos em Leip-zig nao deve ser subestimada. Wundt, em particular, era umainfluencla de peso; ja fora mestre de Durkheim e de Boas,e e~ta,~a su~ament~ i~teressado em antropoloqla. Para seter ldela da lmportancla dessa influencla, veja-se 0 que dizKuper:

    A V61kerpsychologie dizia respeito a cultura, 'aque-les produtos mentais que sao criados por uma cornunl-dade de vida humana e que, portanto, sao lnexpllcavelsem ter~os de m:ra c~nsciencia individ~al, uma vez quepressupoem a ac;ao recrproca de muitos. Uma concepcaoque estava relacionada com a nocao de 'consclencla co-letiva' de Durkheim. Wundt era contrarlo a que se des-crevesse 0 desenvolvimento de urn fenerneno cultural emisolamento, quer se tratasse de Iinguagem, mito ou reli-giao, po is as 'varlas expressdes menta is, sobretudo em

    244

    seus estaqlos in icia is, estao de tal modo interligadas quedificilmente sao separavels umas das outras', A linguageme lnfluenclada pelo mito, a arte e urn fator no desenvol-vimento do mito e os usos e costumes sao por toda aparte sustentados por concepcoes rnltoloqlcas."Mesmo reconhecendo que as linhas gerais do pensamentode Malinowski a respelto do funcionalismo j6 estivessem de-llneedas par ocastao de sua transferencla para a LondonSchool of Economics, em 1910, acreditamos que nao seja in-

    correto dizer, como foi dito, que seu pensamento apresentacerta continuidade no pensamento antropoloqlco inqles. Istoe tanto rna is valldo, quando consideramos os andamentos epressupostos da teo ria malinowskiana. Na exposiC;ao sobre aabordagem funclonalista de Malinowski, seguiremos suas pe-gadas no texto de seu livro posturno: Uma Teoria Cientificada Cultura, publicado em 1944, dols anos depois da morte doautor, ocorrida a 16 de maio de 1942.

    2.1 PRESSUPOSTOS E FUNDAMENTOS DATEORIA MALINOWSKIANAFoi visto que 0 evolucionismo definiu a cultura comoproduto da natureza humana, isto e, reconhecla-se comofi!ha da unidade psiquica do homem. Ja 0 difusionismo

    procurou mostrar a exlstencla de urn certo determinismo cul-tural. Embora nao negasse a autoria humana da cultura, eracomo se esta, uma vez criada, se lancasse contra seu criadore passasse a dornlna-lo nas pessoas dos seus descendentes.Malinowski procurou resolver 0 problema, ainda hoje, pre-sente na teoria antropcloqlca do blnornlo natureza e cultura.Ele percebeu, c1aramente, 0 problema que afligiu a evo-lucionistas e difusionistas. Ele nao deu razdo nem a uns nema outros, acatou a ambos, ate certo ponte. Este procedlmen-

    to. aparenternente ambiguo, levou-o, por urn lado, a urn certopsicologismo subjacente a explicac;ao evolucionista e, poroutre, a urn culturalismo ou socioiogismo lnerente ao histo-rlclsmo, Contudo, afastou-se de ambos no que respelta aperspectiva cronologlca; sua visao era slncrenlca.6, Adam KUPER. op. cit" p. 22.

    245

    n" :- :(~ 'I~.

    CI(I~

    r ;

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    26/41

    Para nosso autor, a natureza humana era entendidaassim:o::Podemos definir a expressao 'natureza humane' pelofato de que todos os homens tern de comer, resplrar,dormir, procriar e eliminar a materia rejeitada por seusorganismos onde quer que vivam e qualquer que seja 0tipo de civilizac;ao que pratiquem.Por natureza hurnana, portanto, exprlrnlrnos 0 deter-minismo bioloqlco que irnpoe a toda clvlllzacao e a todos

    os indivlduos a realizac;ao de func;6es corporais tais comorespirar, dormir, repousar, nutrir-se, excretar .e reprodu-zin,'

    Este e ponte de partida utilizado pelo autor. 0 proprioconcerto de culture val apeiar-se no concelto de natureza hu-mana. Ou seJa, exlste uma situac;ao concreta dada, aquelaem que os hornens pertencem a uma 'especie animal e, comotal, -portadores de necessidades biol6gicas a serem satisfeitas.o determlnismo de que fala ele e 0 'que se prende ao tatolrretorqulvel- de que as cultures poderao assurnlr formas asmais variadas, mas deverao, necessaria mente, ser aptas a sa-tlsfazer essas necessldades baslcas, bloloqlcas, Este fato e sig- .nlllcativo para a cornpreensac do fenerneno culture. Veja-seo que entende Malinowski pelo fenorneno da culture, 0 autorcOJ'!'lec;apor mostrar que 0 fenorneno da cultura e cO todointegral constltuido par Implementos e bens de consume, porcartes ccnstltuclorrals para os varies agrupamentos socials, porldeias e oficios humanos, por crenc;as e costumes. Ate al, tudecomo se dlsse desde a definic;ao descrltiva de Tylor . DeixernosMaUnowski mesmo expllcar 0 que ere entende pelo termo:

    , .Os seres humanos sao uma especte animal.' Estaosujeitos a condlcoes elernentares- que. t e r n de ser aten-dldas de modo, que os indlvlduos possam sobrevlver, araC;a continuar e as organismos em corilurito ser manti-dos em cQndiC;6es' de funclonernento, Ademais com suabagagem de artefatos e. sLia capacldade para produzl-Iose apreclil:-Ios,: 0 h,P, [llem' cria urn ambiente secundarle.Nada de novo ,f-Oidito ate' agora. e defi~ic;oes semel ban-tes de culture. tern sldo .prefertdas e apetfelcoadas. Tlra-rernos, todavia, uma eu dues conclusoes adtclonals, "

    7. Bronislaw MALINOWSKI. Um. Tearl. Clentlfla d . Cultu rl l. ,2' edl~io. p. 76. . -,.-"'24 6

    'II

    Em prirneiro lugar, e claro que a satisfac;ao das ne -cess ida des orqanlcas ou baslcas do homem e da raC;a eurn conjunto minimo de condlcoes impostas a cada cul-tura. Os problemas apresentados pelas necessidades nutri-tivas, reprodutivas e hlglenicas do homem devem ser re-solvidos. Eles sao solucionados pel a construcao de urnnovo ambiente, secundario ou artificial. Este ambiente,que nao e mais nem menos do que a cultura propria-mente dita, tern de ser permanentemente reproduzido,mantido e administrado. Isto cria 0 que podia ser des-crito, no sentido mais amplo da expressao, como urnnovo padrao de vida, que depende do nivel cultural dacomunidade, do ambiente e da eflclencla do grupo. Urnpadrao cultural, contudo, significa que novas necessida-des se lmpoern e novos Imperatives OU determinantes saoinculcados ao cornporternento humano. A tradic;ao cul-tural, e , claro, tern de ser transmitida de cada gerac;aopara a geraC;ao seguinte. Os rnetodos e mecanismos decarater educaclcnal devem existir em toda cultura. A or-dem e a lei tern.de ser rnantidas, uma vez que a coope-ra~ao e a essencia de toda- realizaejao cultural. Em todacoinunidade devem existir dlsposlcoes para a sancao decostumes, etlca e leis. 0 substrato da culture tern de serrenovado e mantido em condlcoes de funcionamento. Porisso algumas formes de org~nlzac;ao econornlca sao In-dlspensavels, mesrno rias cultures mals prlrnltlvas."

    . _. .Toda a teorie- mallnowskiana repousa nesses dois concel-tos: natureza, humaaa e culture, especle de dols mundos con-jugados, .ondeflca dificil, -por vezes, distinguir 0 que e naturezahumana e 0 que e cultura. Trata-se de urn rnundo basico eprlmarlo que e sucedldo por urn outro mundo secundarlo ouderivado. Ambos crlam condlcoes de sobrevivencia e apresen-tam tarnbern ameaces is sobrevlvencla humana. De certomodo, a cultura, que se urn mundo artificial criado pelo ho-mem e para' 0 homem, e tarnbem uma extensao do mundonatural .. Com tudo isso nao quer dizer que Malinowski en-tenda .que a' antropologia devesse ocupar-se do estudo da na-.tureza humane e j ' par extensao, tarnbern da cultura. Isto nao.Ele foi ':1m daqueles: que achava ser lndlspensavel delimitar8: Bronislaw' MALINOWSKI. Op.'It.; p. 42,._

    2 A 7

    melhor 0 objeto de antropologia. Dizia ser pretenslosa a an-

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    27/41

    tropalogia ao se proper estudar 0 hornern como urn todo. Paroutra lado, mesmo vendo a culture como objeto da antropo-logia, em termos concretos de estudo, advogou a lrnperiosi-dade de se estudar as instituic;6es como unidades naturals delnvestlqacac. Aceltava como vallda a preocupacao evolucio-nista e difusionista de adotar 0 metoda comparative, masiembrava que 0 investlgador etnoqraftco nao pode fazerobservaC;6es, C I. menos que saiba a que e relevante e essenciale esteja, desse modo, capacitado a desprezar as aconteel-mentos estranhos e fortultcs. E conclula, dizendo: A cotacientlFica de todo trabalho antropoloqico consiste na teorlada cultura, com referenda BO metoda de observacao de cam-po e a signiFicac;ao de cultura como processo e produtos."Fique reg istrada a dosagem de eKplicac;ao psicologicaexistente no funcionalismo de Malinowski. Ele contudo, langede neqa-lo, llrnlta-se a [ustiflcar 0 fato, mostrando que seuposicJonamento fai . propcsitalrnente, ecletlce::Por agora, podemos permltir-nos adotar uma pers-pectlva universal e mesmo ecletica e adrnltlr que as es-colas e tendsnctes de antropolcqta, ao seguirem em parteseus proprlos proqrarnas mats au menos ambiciosos, e aoelaborarem, em parte, rnetodos, teorlas e principles a fimde executar esses programas, aperFej~oaram uma estru-tura respeltavel, em bora nao totalmente harmoniosa."

    Apesar desta fundamenta~ao psicol6gica, Malinowski naose encontra tao distante assim de Durkheim e, por extensao,de Radcliffe-Brown. Isto e tanto rnals valtdo quando deixamosde lado 0 aspecto propriamente teorleo e consideramos 0 as-pecto, principal mente, metodologico. Como a mestre frances,ele definiu concretamente 0 estudo da antropologia como aestudo das Instituic;6es. Talvez se possa apontar como falhanele urn certo exclusivismo ou isolacionismo no estudo dainstltul\80, nao procedendo urna analise de inter-rela~ao dasvartas instituisoes entre st. Preocupou-se em demasia no con-slderar a totalldade institutional, dando-lhe uma certa au-tonomla.Em suma, ainda no seu aspecto geral, se pode acrescen-tar que 0 funcionalismo de Malinowski traz em seu bojo uma

    9. Bronislaw MALINOWSKI. Op. cit . p. 15.10. Bronislaw MALINOWSKI. Op. ctt., p. 32.

    248

    marca comum it escola americana, de longa tradic;ao, qualseja aquela de dar lugar de relevo it culture material. Veja-se,mais adiante, sua Ideia com respeito it ferramenta, em par-ticular, e it cultura, em geral, como prolongamento da ana-tomia humana.Em conclusao ao presente item, relaclonarnos abaixo 0que a proprio Malinowski considerou axiomas gerais do fun-cionalismo:

    A. A culture e essencialmente uma aparelhageminstrumental pela qual 0 homem e colocado numa posl-sao melhor para lidar com os problemas especiflcos con-cretos que se Ihe deparam em seu ambiente, no curso dasatisfac;ao de suas necessidades.

    B. e urn sistema de objetos, atividades e atitudes,no qual parte existe como meio para urn fim.C. e uma integral na qual os varies elementos saointerdependentes.D. Essas atividades e objetos organizados em tornode tarefas importantes e vita i s, em instltulcoes tais comoa familia, 0 cUi, a comunidade local, a tribo e as equipesorganizadas de cooperacao econernlce, politica, legal e

    atividade educacional.E. Do ponto de vista dlnarnlco, ou seja, no tocanteao tipo de atividade, a culture pede ser anallsada numaserle de aspectos tais como educac;ao. controle social, eco-nornla, sistemas de conhecimento, crenca e moralidade,e tambem modos de expressao criadora e artistica:t."

    2.2 0 ESTUDO DAS INSTITUI

  • 5/12/2018 Antropologia Cultural - Iniciacao-Teoria e Temas

    28/41

    de objetividade e precrsao na escolha das categorias de ana-lise. t: : 0 que se pode depreender dos trechos abaixo:Se 0 funcionellsrno Fosse simplesmente a tendenclapara considerar como entrelacadas as atitudes maqlcase econornicas, para cornpreender que elas fazem parte daestrutura social e que devemos correlaclona-las rnais emais, este seria na verdade urn deslize teorlco em dire-~ao ao totalitarismo cientiflco de que ele tern sido fre-quentemente acusado. Nao ha duvlda tam bern que em

    clencla tanto devemos isolar como fazer relacoes. 0 fun-cionalismo nos conduziria ao lodacal de relacionar e con-tra-relaclonar objetos se nao pudessernos apontar algunsisolados ou unidades que contern os limites naturais decoordenacao e correlacao. Eu sugiro que tais isolados na-turais existem e que deveriam tornar-se 0 alicerce dequalquer analise cultural profunda.A unidade funcional que charnel de institui~ao dife-re de complexo de culture ou complexo de traces, quan-do definido como composto de elementos que nao se si-tuam em qualquer rela~ao necessaria. Com efeito, a uni-dade funcional e concrete, ou seja, pode ser observada

    como urn agrupamento social deflnldo."Essa mesma preocupacac teve, na sociologia, Durkheimao definir 0 fato social como coisa. Aqui esta a prova doque dissemos, antes, sobre a lnfluencia positivista sofrida pornosso autor. Se de urn lade sua fundamentacao te6rica e nl-tidamente pslcoloqlsta, 0 modele de analise por ele apresen-tado e positivista ou sociol6gico.Mali