14
Pobreza, Desigualdade de renda e Crescimento econômico no Brasil nas últimas duas décadas Regilda da Costa e Silva Menezes   [email protected] João Policarpo [email protected] RESUMO A desigualdade no Brasil apresenta uma trajetória de suave queda desde 1993. Este art ig o mos tra que o pa ís apr ese ntou uma red ão considerável na pob rez a, especialme nte nos últimos anos. Percebe-se nesta avaliação que a força para esta redução está na redução da desigualdade de renda e não no crescimento econômico do país. Conclui-se que os programas de transferência de renda que se intensificaram a partir de 2003 certamente desempenharam um papel bastante relevante para a redução da pobreza no Brasil. PALAVRAS CHAVE. Desigualdade de renda, Pobreza e Crescimento econômico.

artigo economia novo

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: artigo economia novo

8/7/2019 artigo economia novo

http://slidepdf.com/reader/full/artigo-economia-novo 1/14

Pobreza, Desigualdade de renda e Crescimentoeconômico no Brasil nas últimas duas décadas

Regilda da Costa e Silva Menezes

  [email protected] 

João Policarpo

[email protected] 

RESUMO

A desigualdade no Brasil apresenta uma trajetória de suave queda desde 1993.Este artigo mostra que o país apresentou uma redução considerável na pobreza,especialmente nos últimos anos. Percebe-se nesta avaliação que a força para esta reduçãoestá na redução da desigualdade de renda e não no crescimento econômico do país.Conclui-se que os programas de transferência de renda que se intensificaram a partir de2003 certamente desempenharam um papel bastante relevante para a redução da pobrezano Brasil.

PALAVRAS CHAVE. Desigualdade de renda, Pobreza e Crescimento econômico.

Page 2: artigo economia novo

8/7/2019 artigo economia novo

http://slidepdf.com/reader/full/artigo-economia-novo 2/14

1. Introdução

Desde  os  primórdios  do  processo  de  desenvolvimento  brasileiro,  o

crescimento econômico tem gerado condições extremas de desigualdades sociais, que semanifestam entre regiões, estados, meio rural e o meio urbano, entre centro e periferia eentre as raças. Essa disparidade econômica se reflete especialmente sobre a qualidade devida da população: expectativa de vida, mortalidade infantil e analfabetismo, dentreoutros aspectos. Anos mais recentes, a desigualdade de renda no Brasil pode ser atribuídaa  fatores  estruturais  sócio-econômicos,  como  a  elevada  concentração  da  riquemobiliária e imobiliária agravada pelo declínio dos salários reais e à persistência dosaltos juros.

Na  economia  existem  relações  que  levam  a  exploração  do  trabalho  concentração da riqueza nas mãos de poucos. Na política, a população é excluída das

decisões  governamentais. Até  1930, a produção  brasileira  era  predominantementeagrária, que coexistia com o esquema agrário-exportado, sendo o Brasil exportador dematéria prima, as indústrias eram pouquíssimas, mesmo tendo ocorrido, neste período,um verdadeiro “surto industrial”. A industrialização no Brasil, a partir da década de 30,criou condições para a acumulação capitalista, evidenciado não só pela redefinição dopapel estatal quanto a interferência na economia, mas também pela implantação deindústrias  voltadas  para  a   produção  de  máquinas,  equipamentos,  etc.  A polítieconômica,  estando  em  prática,  não  se  voltava  para  a  criação,  e  sim  desenvolvimento dos setores de produção, que economizam mão-de-obra, resultandoassim em desemprego.

O propósito deste artigo é verificar a relação entre desigualdade de renda, pobrezae crescimento econômico no Brasil nas últimas duas décadas. O presente artigo estáorganizado da seguinte forma: Na segunda seção faz-se uma apresentação dos aspectosteóricos do crescimento econômico na desigualdade de renda do Brasil. A Terceira seçãoapresenta a evolução da desigualdade da renda e da pobreza no Brasil no períodoestabelecido. A quarta seção discute a evolução recente da pobreza e da desigualdade. Aquinta seção mostra o comportamento do Brasil em termos de desigualdade de renda epobreza durante as crises enfrentadas. Em seguida, apresentam-se as conclusões doartigo.

2. Aspectos teóricos do crescimento econômico na desigualdade de renda

A relação sistemática mais consistente entre desigualdade de renda e crescimentoeconômico foi realizada por Kuznets (1995), o qual encontrou uma relação positiva docrescimento econômico na distribuição da renda, verificando assim um padrão na formade  um  “U”  invertido.  Segundo  o  autor,  este  comportamento  é  explicado  inevitabilidade de uma maior concentração de renda nos períodos iniciais de crescimento,acompanhada subseqüentemente por seu declínio.

De uma forma mais detalhada, foi observado pelo o autor que o crescimento

econômico era acompanhado por uma tendência de menor participação do setor agrícolae uma expansão da industrialização e urbanização. A distribuição de renda da população

Page 3: artigo economia novo

8/7/2019 artigo economia novo

http://slidepdf.com/reader/full/artigo-economia-novo 3/14

total, na sua forma mais simples, poderia ser vista como uma combinação da distribuiçãode renda da população do setor rural e urbano com as seguintes características: (1) arenda per capita média da população rural é usualmente menor que a da população

urbana; (2) a desigualdade nas participações percentuais dentro da distribuição dapopulação rural é menor que a da população urbana. Assim, tudo mais mantido constante,um aumento da ponderação da população urbana significa um acréscimo da participaçãodos mais desiguais nos dois componentes da distribuição. Por outro lado, a diferença narenda per capita entre a população rural e a urbana não se reduz necessariamente noprocesso de crescimento econômico; pelo contrário, ela tende a aumentar.

Kuznets (1957) baseou suas idéias em ilustrações numéricas. Mais adianteRobinson (1976) investiga essas idéias realizando algumas suposições mais solidas arespeito do processo de desenvolvimento econômico. Ele constatou que nos estágiosiniciais de desenvolvimento econômico a desigualdade de renda tende a apresentar uma

relação direta com o crescimento econômico. Isso seria resultado de mudanças naalocação  de  recursos  de  setores  menos  produtivos  para  setores  mais  produtiprincipalmente em relação à mão-de-obra. Nos últimos estágios de desenvolvimento, arelação entre desigualdade de renda e crescimento econômico tende a ser inversa, emrazão dos rendimentos decrescentes de escala naqueles setores mais produtivos. Assim, arelação entre a desigualdade de renda e a taxa de crescimento da renda seria representadapor um “U” invertido.

Outros estudos relacionam o aumento da desigualdade de renda no processo decrescimento econômico com a tecnologia. Isto porque os setores mais ricos utilizamtécnicas mais recentes enquanto setores mais pobres tendem a usar tecnologias mais

antigas. Neste contexto, inovações tecnológicas tendem inicialmente a aumentar adesigualdade de renda entre setores que incorporaram novas tecnologias com aqueles queutilizam tecnologias antigas. Isto ocorre  devido, principalmente, ao aumento nos ganhosde produtividade e rendimentos nos primeiros segmentos. Porém, à medida que maispessoas qualificadas se transferem para os setores favorecidos, a desigualdade tende adiminuir  (GALOR & TSIDDON,1997; HELPMAN,1997).

A relação de Kuznets é significante, porém ela explica pouco da variação nadesigualdade entre os países através do tempo (PAPANEK & KYN, 1986). Foi sugeridoque através dos dados em séries de tempo há uma relação fraca (ANAND & KANBUR,1993). Outros afirmam que a curva de Kuznets se ajusta melhor para amostras de países

de forma pontual (SQUIRI & ZOU, 1998).

No trabalho de BARRO (2000), o autor mostrou que a curva de Kuznetsapresenta certa regularidade empírica, através do tempo, mesmo entre os países. Porém,há uma semelhança com os resultados anteriores: ela explica relativamente pouco davariação na desigualdade entre países através do tempo. Barro (2000) argumentou que oelevado grau de desigualdade incentiva cada vez mais a redistribuição de renda por meiode políticas públicas. Por outro lado, existe a possibilidade de que tais políticas deredistribuição causem mais distorções no mercado e contribuam para a diminuição doinvestimento. Sendo assim, ele concluiu que a taxa de crescimento da economia poderiaser atingida negativamente pela desigualdade de renda da população.

Page 4: artigo economia novo

8/7/2019 artigo economia novo

http://slidepdf.com/reader/full/artigo-economia-novo 4/14

3. Evolução da desigualdade de renda e da pobreza no Brasil no períodode 1990 a 2009

3.1  Desigualdade de renda e pobreza

Em  uma  trajetória  de  instabilidade  econômica  aliada  a  taxas  de  inflcrescentes terminou o ciclo de crescimento no início dos anos 80, em um contextocaracterizado por uma crise internacional e outra relativa ao financiamento externo dopaís. A taxa de desemprego elevada dos anos 1981-83 conheceu uma tendência de quedasistemática a partir de 1994. Se por um lado, o problema da ocupação foi caracterizado pelamaior informalidade, observava-se, por outro, que o baixo crescimento teve implicaçõesimportantes  sobre  os  rendimentos.  O  movimento  explosivo  dos  preços  teve  efeidiferenciados sobre os rendimentos da população. Os segmentos de renda média e altaconseguiram proteger seus níveis de renda tanto pelo mercado de trabalho como pelasoportunidades de preservação do poder de compra dos rendimentos criados pelo mercado

financeiro. Ao contrário, o segmento de baixa renda não teve as mesmas possibilidades,conhecendo uma perda de renda importante ao longo do período. Assim, na segunda metadedos 80 se restabeleceu a tendência de deterioração da distribuição de renda conhecida desde adécada de 60.

Os anos 90 estabeleceram uma nova dinâmica para a distribuição de renda,diferente daquela encontrada para as décadas anteriores. As alterações da distribuição derenda nos anos 70 se fizeram em um contexto de aumento acelerado do nível de ocupação.Apesar da crise dos anos 80, o mercado de trabalho conheceu uma recuperação ponderáveldo nível de ocupação na segunda metade da década. A situação encontrada para os anos 90é  muito  diferente.  A política  de  abertura  comercial  em  uma  situação  de  

crescimento, que preponderou em diversos anos do período, produziu quedas importantesdo nível de emprego formal, fazendo com que o mercado de trabalho passasse a conviver com uma crescente informalidade e desemprego. Ao mesmo tempo, o movimentoinflacionário  explosivo  do  início  da  década  foi  sucedido  por  outro  movimestabilidade dos preços. Se a inflação crescente teve um papel importante para adeterioração da distribuição de renda nos primeiros anos da década, a estabilidade depreço contribuiu para a reversão desta tendência.

Com o fim da inflação em 1994 houve significativa redução da pobreza eexpansão dos rendimentos, entretanto, o baixo crescimento econômico, a reduçãosignificativa do emprego industrial e a estagnação do emprego formal, impediram que os

efeitos positivos da estabilização dos preços sobre as rendas mais baixas pudessemperdurar.

Em 2010, o Bird (Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento)afirmou que o país avançou na redução da pobreza e distribuição de renda. Segundo aentidade, apesar da desigualdade social ser ainda elevada, conseguiu-se reduzir a taxa depobreza de 40% em 1990 para 9,1% em 2006, graças à avanços perpetrados pelosgovernos Collor, Itamar, FHC e Lula. Os maiores motivos para a redução teriam sido ainflação baixa e os programas de transferência de renda.

No mesmo ano,  Rocha (2009) mostrou que o porcentual de pobres caiu demaneira  sustentável  no  Brasil  entre  2004  e  2008,  durante  o  governo  Lulevantamento, que teve como base os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de

Page 5: artigo economia novo

8/7/2019 artigo economia novo

http://slidepdf.com/reader/full/artigo-economia-novo 5/14

Domicílios (PNAD) do IBGE apontou que a proporção de pobres no País caiu de 33,2%para 22,9% no período pesquisado.

Os países quanto a sua incidência de pobreza absoluta podem ser classificados emdois grupos: primeiramente aqueles nos quais a renda nacional é insuficiente paragarantir o mínimo considerado indispensável a cada um de seus cidadãos. Desse modo, arenda per  capitaé baixa e a pobreza absoluta inevitável quaisquer que sejam ascondições de sua distribuição. O segundo grupo, aqueles onde a pobreza absoluta aindapersiste, ou seja, aqueles em que o produto nacional é suficientemente elevado paragarantir o mínimo necessário a todos, de modo que a pobreza resulta da má distribuiçãode renda. No segundo grupo está o Brasil, onde sua incidência de pobreza absoluta nodecorre da forte desigualdade na distribuição de rendimentos.

Para a obtenção dos  indicadores  de pobreza apresentados  a seguir  foram

utilizadas, a cada ano, 24 linhas de pobreza localmente específicas, com o objetivo delevar em conta os diferenciais de estrutura de consumo e de preços nas diferentes regiõese áreas urbanas, rurais e metropolitanas no país. As linhas de pobreza se baseiam noconsumo observado entre populações de baixa renda em cada região e área de residência,e seus valores são atualizados anualmente de acordo com a variação local de preços por grupo de produtos.

O indicador de pobreza mais usual é a proporção de pobres na população total.Observa-se no gráfico 1 que após a queda que se seguiu ao Plano Real, quando declinoude forma abrupta de 44,1% em 1993, para 33,2% em 1995, a proporção ficoupraticamente no mesmo patamar, apenas oscilando em função dos ciclos de curto prazo

que, devido a determinantes diversos (internos e externos) afetaram a economia. Comoconseqüência, em 2004, a proporção de pobres verificada para o país como um todo sesituava exatamente no mesmo nível de 1995 - 33,2% -, depois de ter atingido um pico em2003. A partir de então, com a retomada da atividade econômica de forma sustentada, aproporção de pobres declina todos os anos, atingindo mínimos históricos a cada anodesde 2005. A proporção de pobres atingida em 2008, 22,7%, corresponde a um declíniomédio de 2,6 pontos percentuais anualmente desde 2004.

É interessante observar que o aumento relativamente forte dos preços alimentaresnos anos de 2007 e 2008 foi incapaz de interromper a tendência de redução da pobreza, jáque estes aumentos foram largamente compensados por ganhos de renda, tanto devido a

melhorias no mercado de trabalho quanto na expansão das transferências previdenciáriase assistenciais. Ademais, a participação da alimentação no orçamento das famíliasdiminui continuamente, sendo que, mesmo dentre as famílias pobres, já deixou há muitode  ser  o  grupo  de  despesa  mais  importante,  pelo  menos  nas  áreas  urmetropolitanas.

Page 6: artigo economia novo

8/7/2019 artigo economia novo

http://slidepdf.com/reader/full/artigo-economia-novo 6/14

Gráfico 1: Evolução da pobreza de 1990 a 2008

3.2 Coeficiente de gini

O coeficiente de gini é uma medida utilizada para calcular a desigualdade dedistribuição de renda, mas pode ser usada para qualquer distribuição. Ele consiste em umnúmero entre 0 e 1, onde 0 corresponde à completa igualdade de renda (onde todos têm amesma renda) e 1 corresponde à completa desigualdade (onde uma pessoa tem toda a

renda, e as demais nada têm). O índice de Gini é o coeficiente expresso em pontospercentuais (é igual ao coeficiente multiplicado por 100).Enquanto o coeficiente de Gini é majoritariamente usado para mensurar a

desigualdade de renda, pode ser também usado para mensurar a desigualdade de riqueza.Esse uso requer que ninguém tenha uma riqueza líquida negativa.

onde:

G = coeficiente de GiniX = proporção acumulada da variável "população"Y = proporção acumulada da variável "renda"

Page 7: artigo economia novo

8/7/2019 artigo economia novo

http://slidepdf.com/reader/full/artigo-economia-novo 7/14

Coeficiente de gini no período de 1990 a 2009

0

0.1

0.2

0.3

0.4

0.5

0.6

0.7

1990

1992

1994

1996

1998

2000

2002

2004

2006

2008

Período

Gráfico 2: Coeficiente de gini de 1990 a 2009

Observa-se no gráfico 2 que a desigualdade de renda no Brasil apresenta umatrajetória de suave queda desde 1993. Porém, a partir de 2001, ela caiu de forma muitorápida, favorecendo de forma intensa todos os brasileiros mais pobres. É importantedestacar que apesar de ainda ocupar uma posição negativa de destaque entre os paísescom maiores índices de desigualdade do mundo, o Brasil atingiu, em 2006, o nível mais

baixo de desigualdade de renda dos últimos 30 anos.Analisando o coeficiente de gini com o de outros países, percebe-se que poucos

foram os países que reduziram o coeficiente de gini, uma das medidas de desigualdademais utilizadas, a uma velocidade superior à brasileira entre 2001 e 2005. Neste período,o Coeficiente de Gini caiu 4,6%, passando de 0,594 em 2001 para 0,566 em 2005. Essaqueda significativa permite que o ritmo da diminuição da desigualdade brasileira sejavisto como um dos mais acelerados do mundo. Porém, mesmo com essa queda, o Brasilultrapassou apenas 5% dos países no ranking mundial de desigualdade. Ainda seriamnecessários mais de 20 anos para que fosse atingido um patamar semelhante à média dospaíses com o mesmo nível de desenvolvimento.

Entre 2001 e 2005, ocorreu no Brasil um crescimento anual de 0,9% da rendanacional. O destaque, porém, foi que os mais ricos tiveram sua renda diminuída. Pelosdados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a taxa de crescimentoanual da renda dos 10% e 20% mais ricos foi negativa (-0,3% e -0,1%, respectivamente),enquanto a taxa de crescimento da renda dos 10% mais pobres atingiu 8% ao ano nomesmo período.

Page 8: artigo economia novo

8/7/2019 artigo economia novo

http://slidepdf.com/reader/full/artigo-economia-novo 8/14

Além de observarmos uma queda na desigualdade, houve crescimento robusto darenda domiciliar per capita, que cresceu 5,1% de 2007 para 2008, passando de R$ 563para R$ 591. Também, houve crescimento ao longo de toda a distribuição de renda. O

Gráfico 3 mostra o crescimento da renda, centésimo a centésimo, em 2008 com relaçãoaos quatro anos entre 2004 e 2007. A curva preta mostra a taxa de crescimento entre 2007e 2008. Além de haver crescimento para todos os centésimos, este crescimento foi maior para os centésimos mais pobres, cuja renda cresceu entre 10% e 24%, que para oscentésimos mais ricos, cuja renda cresceu menos que 4%. Assim, a renda sobe paratodos, mas sobe mais para os que têm menos.

Gráfico 3: Taxa de Crescimento da Renda por Centésimo entre 2008 e 2004, 2005, 2006, e

2007

A curva azul mostra que de 2004 a 2008 o ganho de renda dos centésimos

superiores foi em torno de 20%. Nada desprezível, mas bem inferior aos 40% para osdois décimos inferiores na distribuição de renda.

4. Evolução recente da pobreza e da desigualdade no Brasil

Analisando o Brasil em termos de desigualdade de renda antes do século 20,percebe-se que o país apresentou uma elevada desigualdade de renda, sem nenhumatendência à queda até o final do século vinte. A vontade de combater a desigualdade nãoimpediu que a pobreza fosse reduzida de forma significativa, tal como ocorreu na década

de setenta ou durante o Plano Real.Na ausência de reduções na desigualdade, a pobreza cai devido exclusivamente

Page 9: artigo economia novo

8/7/2019 artigo economia novo

http://slidepdf.com/reader/full/artigo-economia-novo 9/14

ao crescimento econômico e, por isso, cai sempre menos do que se poderia esperar deepisódios que combinam crescimento com redução na desigualdade.

Desde o início do novo milênio, o cenário se alterou. A despeito de flutuações nataxa de crescimento do país, o grau de desigualdade de renda declinou de formaacelerada e sistemática.

O   período   2001-2005   foi   fortemente   marcado   por   duas   transformaçõesapreciáveis na economia e na sociedade, com impactos positivos na distribuição de rendabrasileira. Primeiramente, houve crescimento econômico,  ainda que modesto. Emsegundo lugar, a desigualdade diminuiu significativamente. Essas duas transformaçõesforam responsáveis também pela queda na pobreza e na extrema pobreza. A porcentagemde pobres e também a de extremamente pobres caíram cerca de 4,5 pontos percentuais,respectivamente. O fato interessante e novo nesta estatística é que ao contrário de

períodos anteriores da história, a queda nos índices de pobreza foi devido a queda nadesigualdade e não o crescimento econômico.

É importante destacar que estamos assistindo no Brasil a uma excepcionalexpansão do acesso da população a uma ampla variedade de oportunidades. Fenômenoesse particularmente mais acentuado entre os grupos mais vulneráveis. Portanto, não é sóa desigualdade de renda que vem melhorando, mas também a desigualdade em diversostipos de oportunidades.

O progresso brasileiro em distribuição de renda alcançado entre 2001 e 2008 éinegável. A renda per capita de todos os décimos cresceu e entre os mais pobres, o

crescimento foi mais acelerado (veja gráfico 4). Como conseqüência, houve redução nadesigualdade de renda e na pobreza

Page 10: artigo economia novo

8/7/2019 artigo economia novo

http://slidepdf.com/reader/full/artigo-economia-novo 10/14

Gráfico 4 : Taxa de Crescimento médio da renda domiciliar per capita por décimos da

distribuição nos últimos 6 anos

Em 2008, as mudanças foram ainda mais intensas e equalizantes (veja gráfico 5).De fato, no período 2001-08, enquanto a renda familiar per capita da população comoum todo cresceu 2,8% ao ano, entre os 10% mais pobres cresceu quase três vezes maisrápido (8,1% ao ano) e entre os 10% mais ricos cresceu à metade (1,4% ao ano). A taxade crescimento da renda dos 10% mais pobres foi mais de cinco vezes a dos 10% maisricos.

Gráfico 5 : Taxa de Crescimento médio da renda domiciliar per capita por décimos da

distribuição no último ano: Brasil, 2007 e 2008

Os programas de transferência de renda que se intensificaram a partir de 2003certamente desempenharam um papel bastante relevante para a redução da pobreza noBrasil. Estimativas do IPEA  sugerem que cerca de um quarto da queda na desigualdadese deve a eles. Esses programas são focalizados, ou seja, orientados para os mais pobres:

a) 52% dos beneficiários dos programas de transferência de renda estão entre os 20%mais pobres da população, isto é, em famílias de renda per capita abaixo de um terçode salário mínimo;

b) cerca de 70% dos beneficiários pertencem a famílias cuja renda per capita é inferior a 25% do salário mínimo;

Page 11: artigo economia novo

8/7/2019 artigo economia novo

http://slidepdf.com/reader/full/artigo-economia-novo 11/14

c) 91% dos beneficiários estão na metade mais pobre da população (abaixo de R$ 208 em2004);

d) 95% dos beneficiários estão em famílias de renda per capita abaixo de um saláriomínimo.

De todos os programas sociais implementados no Brasil, o mais bem focalizado éo Bolsa-Família, que nasceu da unificação de quatro programas em 2004, e tem comobase  certas  condicionalidades,  como  a  manutenção  das  crianças  na  escola  obrigatoriedade de exames de saúde para as mães. Com esse grau de objetividade, oBolsa-Família rompe com uma tradição de dispersão e falso universalismo de inúmerosprogramas sociais brasileiros e eleva em muito o grau de sua eficiência, já que atingeefetivamente os mais pobres.

Através de algumas simulações do IPEA, pode-se concluir que se a desigualdadeentre 2001 e 2005 no Brasil não tivesse se reduzido, a pobreza teria caído apenas 1,2pontos percentuais ao invés dos 4,5 pontos percentuais realmente registrados no mesmoperíodo. Ou seja, 73% da queda na pobreza e 85% da queda na extrema pobreza devem-se à redução na desigualdade.

Por outro lado, se nesse período, o Brasil contasse apenas com o crescimento daeconomia para alcançar a mesma redução na pobreza, teria sido necessário aumentar arenda de todas as famílias em 14,5%. E, para alcançar a mesma queda na extremapobreza, seria necessário um crescimento de 22%. Ainda segundo o IPEA, um pontopercentual de redução na desigualdade praticamente substitui dois pontos percentuais de

crescimento para combater a pobreza.

Percebe-se que estas relações são relevantes para um país como o Brasil, quevem  apresentando  um  nível  de  crescimento  baixo  nas  últimas  duas  décadascrescimento na renda per capita no período 2001-2005 foi muito lento. O PIB cresceucerca de 3,5%, ou 0,9% ao ano. Portanto, isso significa que a pobreza não teria diminuídode forma expressiva se a desigualdade tivesse permanecido inalterada.

Paes de Barros (2007) através de suas simulações, mostra que se a desigualdadetivesse se mantido, a redução na proporção de pobres teria sido de apenas 1,2 pontospercentuais e na de extremamente pobres, de 0,6 pontos percentuais. O estudo mostra

ainda que a contribuição da redução no grau de desigualdade é ainda maior para aextrema  pobreza:  no  caso  brasileiro,  85%  da  queda  recente na  proporção  extremamente pobres deve-se à redução no grau de desigualdade.

5. Comportamento do Brasil em termos de desigualdade de renda epobreza durante as crises enfrentadas

Observa-se que o Brasil conseguiu diminuir a pobreza e a desigualdade nasprincipais metrópoles, mesmo diante dos reflexos da crise financeira internacional na

economia. A constatação faz  parte  do estudo Desigualdade  e Pobreza  no BrasilMetropolitano Durante a Crise Internacional: Primeiros Resultados, realizado pelo

Page 12: artigo economia novo

8/7/2019 artigo economia novo

http://slidepdf.com/reader/full/artigo-economia-novo 12/14

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Este estudo teve como objetivo avaliar a evolução dos índices de desigualdade e

pobreza no Brasil em seis regiões metropolitanas: Recife, Salvador, Belo Horizonte, Riode Janeiro, São Paulo e Porto Alegre. A expectativa de que a queda na produção e noemprego se repetiria em variáveis sociais, como ocorreu em outros períodos de crise, noentanto, não se confirmou.

Ao contrário do que aconteceu nos períodos de crise considerados no estudo – 1982a 1983; 1989 a 1990; e 1998 a 1999, quando a inflexão econômica implicou aumento dapobreza nas regiões metropolitanas nacionais – não se observou crescimento na taxa depobreza nem mesmo após o último trimestre de 2008, período em que os efeitos da criseinternacional começaram a atingir o país.

Após ter aumentado entre agosto de 2002 e abril de 2003, a taxa de pobreza doBrasil metropolitano apresentou tendência de queda. Em março de 2002, 18,5 milhões debrasileiros estavam em situação de pobreza. Em junho de 2009 esse número haviabaixado para 14,4 milhões. A diferença, de 4 milhões de pessoas, configura queda de26,8% da taxa de pobreza, que passou de 42,5% para 31,1% no período.

No período de março de 2002 e junho de 2009, a região metropolitana que registroumaior queda no número de pobres (1,4 milhão) foi a do Rio de Janeiro, seguida por SãoPaulo (1,3 milhão) e Belo Horizonte (600 mil pessoas). Recife e de Salvador, que detêmas maiores taxas, retiraram da condição de pobreza 100 mil e 200 mil pessoas,respectivamente.

As regiões metropolitanas que diminuíram mais rapidamente a taxa de pobrezaforam Belo Horizonte (35,5%), Porto Alegre (33,6%) e Rio de Janeiro (31,2%). Quedasmenos intensas do que as da média nacional no período (26,8%) foram registradas emSão Paulo (25,2%), Salvador (23,9%) e Recife (14,1%). Recife, por sinal, foi a regiãometropolitana com a mais alta taxa de pobreza em junho de 2009 (51,1%). Na outraponta, está Porto Alegre, com a menor taxa (25,7%).

No conjunto das regiões analisadas, a taxa de pobreza caiu 2,8%, passando de31,9% para 31%, na comparação entre outubro de 2007 a junho de 2008 e outubro de2008 a junho de 2009. A maior queda ocorreu na região metropolitana de São Paulo (-

3,9%), e a menor, na do Rio de Janeiro (-1,3%).Recife teve queda de 1,9%, Salvador ePorto Alegre, de 3,3%, e Belo Horizonte, de 3,5%.

De acordo com o Ipea, as trajetórias convergentes de redução da desigualdadetambém não foram interrompidas nesse período, para o conjunto das seis regiõesmetropolitanas antes e durante a crise internacional. Se for feita uma comparação damédia da desigualdade no período de outubro de 2007 a junho de 2008 com o de outubrode 2008 a junho de 2009, o índice de Gini apresentou queda de 0,4%, passando de 0,5044para 0,5026. O índice é adotado pelo Ipea e varia de zero a 1, indicando maior desigualdade à medida que o valor se aproxima de 1.

Em junho de 2009, o índice de Gini ficou em 0,493, com o menor patamar nas seisregiões metropolitanas. Entre janeiro (0,514) e junho de 2009, o índice de Gini caiu

Page 13: artigo economia novo

8/7/2019 artigo economia novo

http://slidepdf.com/reader/full/artigo-economia-novo 13/14

4,1%, a mais alta queda registrada desde o ano de 2002. Se o período analisado for demarço de 2002 (0,534) até junho de 2009, a queda foi de 7,6%. Se for considerado o mêsde mais alta medida de desigualdade, que foi dezembro de 2002 (0,545), a queda do

índice até junho de 2009 foi de 9,5%.

6. Considerações finais

Concluí-se que a redução da pobreza e principalmente da extrema pobreza noBrasil deve-se a redução da desigualdade de renda. Desta análise, pode-se dizer que ocrescimento econômico não contribuiu para a redução da pobreza no período avaliado.Percebe-se que mesmo o país em períodos de crise não se observou crescimento na taxade pobreza nem mesmo após o último trimestre de 2008, período em que os efeitos dacrise internacional começaram a atingir o país.

Em busca de explicação para os fatos concluídos nesta análise, encontra-se que osprogramas de transferência de renda que se intensificaram a partir de 2003 certamentedesempenharam um papel bastante relevante para a redução da pobreza no Brasil.

É importante salientar que também não se conclui a partir desta analise que ocrescimento   econômico   seja   irrelevante   no   combate   a   pobreza.   Sabe-se   que crescimento de uma economia é e continua sendo uma arma poderosa para superar osproblemas sociais do Brasil.

Portanto, faz-se necessário uma maior reflexão a respeito da qualidade docrescimento e das políticas sociais do Brasil para que se encontre um ponto de equilíbriotrazendo assim o bem estar para toda a população.

Referências:

ARNAND, S. e KANBUR, S. M. R. Inequality and development: a critique. Journal of 

Development Economics. V. 41, p.19-43, 1993.

BARRETO, F. A.; JORGE NETO, P. M.; TEBALDI, E. Desigualdade de renda ecrescimento econômico no nordeste brasileiro. Texto para Discussão, n. 37.CAEN/UFC,2001.

BARRO, R. Inequality and Growth in a Panel of Countries. Harvard University. 1999.

BARRO, R. Inequality and growth in a panel of Countries. Journal of Economic

Growth, v. 5, p.5-32, 2000.

BARRO, R e SALA-I-MARTIN, X. Economic Growth. New York: McGraw-Hill, 1999.

FERREIRA, F.; LITCHFIELD, J. Desigualdade, pobreza e bem-estar socialno Brasil– 1981/95. In: HENRIQUES, R. (Org.). Desigualdade e pobreza no Brasil.

Rio deJaneiro: Ipea, 2000. p. 49-80.

Page 14: artigo economia novo

8/7/2019 artigo economia novo

http://slidepdf.com/reader/full/artigo-economia-novo 14/14

GALEANO, E. e MATA, H. Diferenças regionais no crescimento econômico: umaanálise pela teoria do crescimento endógeno. In: Anais do Congresso da ANPEC. 2008.

HOFFMANN, R. Brasil, 2004: menos pobres e menos ricos. ParceriasEstratégicas.Brasília: Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), n. 22, p. 77-88, 2006a.Edição especial: análise sobre a Pesquisa Nacional por Amostra deDomicílios (Pnad2004)

KUZNETS, S. Economic growth and income inequality. American Economic Review,v.45, p. 1-28, 1957.

MANKIW, N.; ROMER, D.; WEIL, D.; A Contribution to the Empirics of EconomicGrowth. Quarterly Journal of Economics, v.107, p.407-437, May 1992.

MYRDAL, G. Economic theory and under-developed regions. London: GeraldDuckworth, 1958.

ROBINSON, S. A note on the U-Hypothesis relating income inequality and economicdevelopment, American Economic Review, v. 66(3), p.437-400, 1976.

ROMER, Paul M. Increasing returns and long run growth. Journal of Political

Economy,94, p. 1002-1037, oct. 1986.

SILVA, V. H. O. Crescimento econômico e equidade social nos municípios do Ceará:uma evidência empírica entre 1991e 2000. Texto para Discussão, n. 32. CAEN/UFC,2006.

SIMONSEN, M. H.; CYSNE, R. P. Macroeconomia. São Paulo: Editora Atlas, 1995.