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ANÁLISE DOS CONTEÚDOS DESENVOLVIDOS NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA EM ESCOLAS PÚBLICAS DE GRÃO-PARÁ/SC
* Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Sul de Santa Catarina – UNISUL.** Mestre em Ciências do Movimento Humano pela Universidade do Estado de Santa Catarina – UFSC*** Acadêmica de Educação Física do Centro Universitário Barriga Verde - UNIBAVE
João Fabrício Guimara Somariva*Diego Itibere Cunha Vasconcellos**
Andreza Kuhnen Perin***[email protected]
Resumo: A pesquisa objetiva analisar os conteúdos e métodos utilizados na Educação Física escolar. Estudo de caráter exploratório, de natureza quali-quanti com população composta por quatro professores de Educação Física de escolas públicas de Grão-Pará/SC, escolhidos aleatoriamente. A coleta de dados foi por meio de questionário semiaberto e observação de aulas, nas quais foram registradas a organização e metodologia na abordagem dos conteúdos. Os resultados evidenciam que o esporte é o principal conteúdo de ensino das aulas. Assim, devemos reavaliar os critérios utilizados na escolha dos conteúdos. A organização do conhecimento da Educação Física pode oportunizar ao aluno experiências variadas dos fenômenos da cultura corporal e trazer benefícios ao seu desenvolvimento.
Palavras-chave: Educação Física. Práticas Pedagógicas. Conteúdo. Metodologia.
INTRODUÇÃO
Há algumas décadas que o debate em torno das propostas da Educação
Física vem evoluindo na tentativa de superar o paradigma tecnicista. Muitas das
reflexões realizadas indicam que o caminho passa pela reestruturação e
sistematização dos conteúdos dessa área de ensino. Dessa forma, poderíamos
como afirma Kunz (1994), acabar com a “bagunça interna” da disciplina. Para o
autor há a necessidade da organização de um “programa mínimo” onde os
conteúdos sejam hierarquizados com objetivos claramente definidos.
Mesmo havendo esforços contínuos para legitimar a Educação Física na
escola e ampliar suas formas de manifestações, ainda persiste a prática exclusiva
do conteúdo “esporte”, que se restringe apenas a modalidades que possuem
prestígio social (CASTELLANI FILHO et al., 2009). Betti (1999) ressalta que os
cursos de graduação em Educação Física incluem disciplinas como a dança, a
capoeira, atividades expressivas, mas que, ao chegar à escola, são pouco utilizadas
pelos professores.
A análise da Educação Física no âmbito escolar é definida por Castellani Filho
et al. (2009, p. 50) como “[...] uma prática pedagógica que, no âmbito escolar,
tematiza formas de atividades expressivas corporais como: jogo, esporte, dança e
ginástica, formas estas que configuram uma área de conhecimento que podemos
chamar de cultura corporal”. Neste contexto, Oliveira (2008) elenca a Educação
Física com o compromisso em estudar o homem em movimento. Ainda, destaca a
ginástica, o jogo, o esporte a capoeira e a dança como instrumentos para cumprir os
seus objetivos.
Considerando o propósito de elucidar a Educação Física em sua dimensão
escolar Gonçalves (2007), refere-se a ela como sendo uma prática sistemática de
atividades físicas, desportivas ou lúdicas existindo nesta uma relação dialética com
as mais variadas modalidades de ciências. Nessa busca incansável por uma
educação transformadora, coerente na sua práxis e que privilegie o aprendizado dos
alunos, agregando conhecimento e dando-lhes autonomia para discernir sobre suas
decisões, Bracht (1992, p. 52) concentra atenção no significado e nos ensinamentos
da Educação Física:
[...] educaria no sentido de instrumentalizar o individuo para ocupar de forma autônoma seu tempo livre também com atividades corporais de movimento (com as consequências orgânicas, motoras, psíquicas e de qualidade de vida postuladas para as atividades corporais de movimento), de instrumentalizar o individuo para entender e se posicionar criticamente frente a nossa cultura corporal/movimento, e educaria no sentido de desenvolver uma sociabilidade composta de valores que permitam um enfrentamento crítico com os valores dominantes.
O debate das propostas críticas para a Educação Física já alcançou sua
maioridade, mas poucas mudanças foram até então observadas na prática. O
modelo vigente ainda concentra seu propósito em normatizar, disciplinar e
uniformizar. A sua função "educativa" no âmbito escolar foi e tem sido
hegemonicamente, aquela de reforçar os papéis sociais exigidos para a manutenção
do sistema, instrumentalizando os movimentos para as tarefas "essenciais" na
escola (SOARES, 1993).
Vê-se então que para os referidos autores, a Educação Física tem o intuito de
orientar e auxiliar na formação de indivíduos com capacidade de pensar e agir em
bem próprio e socialmente, utilizando-se do movimento humano como ferramenta de
combate a qualquer tipo de exclusão e individualismo.
De acordo com a problemática apresentada, este estudo teve como objetivo
analisar os conteúdos utilizados na educação física e evidenciar os critérios
utilizados para a escolha dos conteúdos utilizados pelos professores nas escolas
públicas de Grão-Pará /SC.
MÉTODO
Para o desenvolvimento deste trabalho de natureza qualitativa/quantitativa,
optou-se pela pesquisa exploratória que consiste apenas no levantamento de dados
da realidade estudada, sem a preocupação de interpretar, analisar ou explicar o
objeto de estudo (SANTOS, 2009).
Dos seis professores da rede publica de ensino do município que atuam na
Educação Física, apenas quatro possuem formação específica na área, que foi o
critério de exclusão adotado para justificar a não participação dos outros dois. Os
participantes apresentaram idade entre 19 e 45 anos.
O instrumento utilizado para a coleta de dados foi composto por dois
momentos distintos. Na primeira etapa foi aplicado um questionário semiaberto, com
8 perguntas, sendo 2 fechadas e 6 abertas ao grupo escolhido. Na etapa seguinte,
foi realizada uma observação direta das aulas de cada professor, das quais
registramos a organização do conhecimento (conteúdos) e suas abordagens
metodológicas.
Os resultados foram tratados com estatística descritiva, através da análise de
freqüência absoluta e percentual das respostas. Os resultados obtidos com o
questionário foram analisados e confrontados com a descrição das aulas
observadas.
APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Tabela 1: Planejamento, escolha e finalidades dos conteúdos nas aulas Educação Física
Freq. %Planejamento das aulas Diariamente - - Semanalmente 03 75,0 Mensalmente 01 25,0
Critérios para escolha dos conteúdos PCN 01 25,0
Características das turmas 02 50,0 Escolha dos alunos, estrutura física 01 25,0
Conteúdos atendem às necessidades dos alunos Sim 02 50,0 Não 01 25,0 Parcialmente 01 25,0
Segundo as respostas encontradas, 75% dos professores planejam suas
aulas semanalmente e 25% mensalmente. Contudo, durante a observação das aulas
destes docentes não percebemos qualquer ação que evidenciasse algum tipo de
planejamento para a aula.
Quando perguntamos aos professores quais os critérios que utilizavam para
escolher os conteúdos para suas aulas, os mesmos citaram como referência os
PCNs, as características das turmas, a escolha dos alunos e a estrutura física para
as aulas.
Percebemos que um dos entrevistados diz utilizar os Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCNs), já os demais acreditam que as aulas de Educação Física devam
ser elaboradas de acordo com as características ou habilidades mais desenvolvidas
pelos alunos e principalmente pelas atividades prediletas.
Perguntamos aos docentes quais eram seus maiores objetivos em relação ao
ensino. Os professores elencaram objetivos como: participação, socialização,
cooperação, inclusão e pensamento reflexivo. Também obtivemos respostas que
evidenciam objetivos tradicionais reprodutivistas, como: “[...] desenvolver ao máximo
as capacidades físicas, para quem sabe, torná-los esportistas profissionais [...]”.
Este relato evidencia que ainda existem professores apoiados na concepção
“esportivista”, com objetivos voltados à aptidão física, estimulando ao aluno que
alcance o rendimento máximo de sua capacidade física. Os professores selecionam
o esporte como conteúdo principal pelo simples exercício do alto rendimento
(SOARES et al, 1992).
Quando indagamos aos professores se existem conteúdos que gostariam de
desenvolver, mas não tiveram oportunidade, todos responderam que
afirmativamente. Porém, justificaram-se pela inexistência de espaço físico adequado
e os materiais serem precários, entretanto, na observação constatamos que o
ambiente físico é amplo e coberto e existem diversos materiais guardados em caixas
que não são usados. É uma postura equivocada de quem tem a função de tornar
possível a produção de conhecimento junto com uma clientela cada vez mais
curiosa e desafiadora.
Ao questionar se os conteúdos utilizados são suficientes para desenvolver
todas as potencialidades de seus alunos, dois dos entrevistados afirmam que os
conteúdos pedagógicos trabalhados nas aulas de Educação Física são suficientes
para que os alunos desenvolvam suas capacidades e potencialidades. Outro
entrevistado acredita que os conteúdos que trabalha não são suficientes e, ainda,
temos outra resposta que diz atingir de forma parcial as potencialidades dos seus
alunos.
Comparando as respostas com o observado, é perceptível que os
entrevistados possuem consciência de suas responsabilidades enquanto
educadores, mas não esboçam nenhuma reação para mudar, reorganizar e
transformar suas práticas pedagógicas. Medina (2010) acredita que para mudar
esse quadro é necessária uma nova consciência.
Enquanto os profissionais de Educação Física não abrirem os olhos procurando penetrar em sua realidade de forma concreta por meio da reflexão crítica e da ação, não serão capazes de promover conscientemente o homem a níveis mais altos de vida, e contribuir, assim, com sua parcela para a realização da sociedade e das pessoas em busca de sua própria felicidade individual e coletiva (p.66)
Perguntamos também sobre a sequência didática. Os docentes entraram em
contradição, quando confrontamos o relatado no questionário ao que foi observado
durante as aulas. Como mostra a Tabela 2, na maioria das sequências didáticas
relatadas, os professores disseram realizar um momento de conversa inicial e
posteriormente à atividade principal ou explicação das regras, fato estes não
comprovados nas observações das aulas.
Tabela 2 - Sequência didática dos professoresProfessor A Professor B Professor C Professor D
Conversa na sala Não especificou Conversa Chamada
Aquecimento
corporalExplicação sobre as
regrasAtividade planejada
Atividade principal Pré-desportivo ou jogo Retorno à
propriamente dito sala
Volta à calma Volta à calma
ConversaExplicação sobre as
regras
Muito dos professores de Educação Física que já possuem certa experiência
profissional substituem a ação de organizar e planejar pelo tempo de atuação na
área, afirmando que é função apenas para quem está começando (BOSSLE, 2002.
p. 37).
No último questionamento perguntamos qual o grau de importância de cada
conteúdo apresentado: esporte, jogo, dança, luta, ginástica, atividade rítmica,
capoeira e brincadeiras. Os resultados seguem abaixo.
Tabela 2 – Grau de importância e utilização dos conteúdos
ConteúdoGrau de importância
atribuído pelos docentes (0-10)
Utilização do conteúdo pelos docentes (%)
Brincadeira 10,00 25,0 Esporte 9,75 100,0 Jogo 9,50 75,0 Ginástica 9,00 25,0 Lutas 7,75 25,0 Dança 6,50 25,0
Na análise desta amostragem percebemos que para a maioria dos
professores os conteúdos apresentados no questionário tem grande importância no
desenvolvimento das aulas de Educação Física. Porém, quando confrontamos a
resposta do questionário com o que vimos nas aulas observadas notamos que do
total de professores entrevistados, somente um realiza todos os conteúdos
elencados no questionário. Sendo que os demais professores utilizavam apenas o
esporte como conteúdo.
Quando nos referimos aos conteúdos ministrados percebemos uma
ocorrência maior do conteúdo esporte nas aulas de Educação Física. Este fato seria
apenas uma mera constatação se além do esporte, outras formas de conhecimento
também estivessem presentes em suas aulas, mas, o que se evidência é uma
supremacia do esporte em contraposição à ocorrência mínima das demais
manifestações da cultura corporal.
Para explicar a conduta dos professores que elencam o esporte como
conteúdo hegemônico nos apoiamos nas palavras de Bracht (2005):
“[...] o esporte é a cultura corporal do movimento que é funcional para a atual hegemonia. Para reforçar essa hipótese podemos, entre outros argumentos, indicar a tendência à esportivização da cultura corporal de movimento. Outras razões seriam, por exemplo, a possibilidade de sua comercialização, seu caráter de espetáculo que acentua sua afinidade com os meios de comunicação de massa etc.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Vimos nas escolas investigadas que o esporte é o principal conteúdo de
ensino das aulas de Educação Física, restringindo as possibilidades de
aprendizagem dos alunos em relação aos demais conteúdos, bloqueando chances
de outros tipos de manifestações do movimento humano. Quando a Educação Física
se fundamenta apenas na prática esportiva, o objetivo se limita ao de selecionar,
sobrepujar e comparar desempenhos individuais.
Torna-se oportuno que os professores reavaliem os critérios elencados por
eles para a escolha dos conteúdos quanto a sua atuação, dessa forma a prática da
Educação Física dará um passo importante para sua legitimação na escola.
Temos que ressaltar que um dos professores entrevistados trabalha de forma
coerente ao que citou em suas respostas. Este analisa o ambiente escolar e elenca
o objetivo a ser alcançado, auxiliando os alunos no cotidiano e promovendo uma
Educação Física capaz de transformações sociais reais.
Para que a Educação Física tenha um célebre e renomado caminho, é
necessária a multiplicação de professores determinados, capazes e que
compreendam a importância de sua profissão na sociedade, pois, o professor deve
traçar caminhos e objetivos que tragam mudanças consideráveis para a trajetória da
disciplina.
Contudo o professor tem a responsabilidade de criar as situações mais
adequadas para suscitar novos desafios aos alunos. O papel do docente é mediar e
intervir buscando mediar conhecimento por meio de sua prática, estimulando o aluno
a descobrir conceitos e noções por meio dos saberes.
REFERÊNCIAS
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