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Universidade Estadual de Maringá 12 a 14 de Junho de 2013
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AS POLÍTICAS DO BANCO MUNDIAL E DO BID PARA A
EDUCAÇÃO
SABBI, Volmir (UEM)
AZEVEDO, Mário Luiz Neves de (Orientador/UEM)
Introdução
A década de 1990 foi o período de maior hegemonia das ideias neoliberais na
América Latina. A condição periférica da economia da região em relação ao sistema de
produção capitalista mundial permitiu que a região ficasse mais sujeita a imposições e
influências de diretrizes emanadas dos países centrais a partir de os organismos
multilaterais de financiamento, como o Banco Mundial (BM) e o Banco Interamericano
de Desenvolvimento (BID). Nesse período essas ideias foram largamente utilizadas em
função, também, da concordância ideológica apresentada pela maioria dos governos da
região durante o período.
O processo de convencimento, dos governos e das populações periféricas, em
relação à necessidade de adoção das reformas propostas pelo sistema capitalista mundial
envolve diversos atores e instituições. Dentre as instituições, os organismos
multilaterais de financiamento desempenham um papel importante pela amplitude de
sua influência que acontece de diversas formas: a) elaborando estudos e pesquisas que
corroborem suas ideologias e dissimulem seus reais interesses; b) disponibilizando
empréstimos somente na condição de realização das reformas indicadas; c) realizando
um convencimento público da validade de suas orientações, utilizando a mídia local e as
demais instituições ideológicas sob influência da classe dominante; d) servindo de
avalista da conformidade da gestão dos governos, condição necessária para a obtenção
de empréstimos no sistema financeiro internacional.
As orientações dos organismos multilaterais de financiamento dirigem-se aos
diversos setores da gestão pública, inclusive à educação, que nos interessa neste
trabalho. Na década de 1990 a educação brasileira teve uma alteração legal de grande
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dimensão. As reformas feitas na legislação, de cunho neoliberal, foram executadas
através da LDB (BRASIL, 1996) e do Decreto 2.208/97 (BRASIL, 1997). O Decreto
2.208/97 teve um impacto de grande magnitude no ensino médio brasileiro na medida
em que através dele foi separado o ensino médio entre profissionalizante e
propedêutico, num movimento de retrocesso à dualidade histórica, onde alguns são
preparados para ser dirigentes enquanto outros são treinados para o trabalho.
Este trabalho se propõe a levantar algumas ideias dos principais organismos
multilaterais de financiamento atuantes no Brasil na década de 1990, o BM e o BID,
para que se possa perceber em que medida suas ideias estavam presentes no projeto das
reformas educacionais do período. Nesse período o BID emprestou 50% dos recursos
que financiaram o Programa de Expansão da Educação Profissional (PROEP),
empréstimo que teve relação com a reforma da educação de nível médio.
O documento do BM utilizado neste trabalho é o Prioridades y estrategias para
la educación.1 Esta escolha deveu-se ao fato de este documento ser o mais citado em
artigos e análises publicadas sobre as políticas educacionais do Banco durante a década
de 1990.
Para fazermos a análise das ideias do BID, utilizamos dois documentos do
Banco. O primeiro, Reforma de la educación primaria y secundaria en America Latina
y el Caribe, de junho de 2000, é significativo a ponto de o Banco afirmar no prólogo da
publicação que “Este documento resume a experiência até o momento e fornece um
conjunto de objetivos e estratégias para orientar o BID no apoio à educação primária e
secundária na próxima década.” (BID, 2000). O segundo documento chama-se La
educación como catalizador del progresso: La contribuição del Banco Interamericano
de Desarrollo (BID, 1998).
Esse trabalho é parte de uma pesquisa realizada pelo autor sobre a influência da
ideologia do Banco Mundial nas políticas educacionais de uma instituição de ensino
tecnológica federal. (SABBI, 2000).
1 Este documento teve sua primeira edição publicada em inglês em agosto de 1996 e a primeira edição em espanhol publicada em janeiro de 1996.
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A visão de educação do BM e do BID e a defesa das reformas
A visão que o BID tem da função da educação já está expressa no título do
segundo documento estudado, que, a exemplo do BM, acredita ser a educação elemento
vital no desenvolvimento econômico, na redução da pobreza e na diminuição da
desigualdade. (BID, 1998, p.1). Os papéis desempenhados pela educação na sociedade moderna são variados. Primeiro, porque não há dúvida e que a educação é a chave para o desenvolvimento econômico por meio de seu impacto na redução da pobreza e da desigualdade de renda. (BID, 2000, p.11).
Apresentando diversos levantamentos estatísticos que demonstram o baixo
desempenho dos estudantes latino-americanos em provas de matemática, ciências e
leitura e a existência de maiores desigualdades de escolaridade entre ricos e pobres, em
comparação com estudantes de outras partes do mundo, o BID defende a necessidade de
uma reforma urgente na educação da America Latina e Caribe. (BID, 2000, p.6-12,
p.14). Esta reforma educacional teria como objetivo a melhora da qualidade e da
eqüidade no ensino.
A definição de políticas educativas, de acordo com o BM, deve ter como
metodologia principal a análise econômica. a análise econômica da educação em geral, e a análise da taxa de rentabilidade, em particular, constitui um instrumento de diagnóstico com o qual se inicia o processo de definição de prioridades e considerar outros meios para a consecução dos objetivos dentro de uma abordagem setorial. (BANCO MUNDIAL, 1996, p.104).
Segundo o BM, os países em desenvolvimento teriam pela frente quatro desafios
fundamentais: o acesso, a eqüidade, a qualidade e a redução da distância entre a reforma
educativa e a reforma das estruturas econômicas. Para vencer esses desafios, o BM
recomendava uma reforma urgente no sistema educativo dos países em
desenvolvimento.
A seguir, serão apresentadas algumas das principais ideias de reforma propostas
pelo BM e BID, nos seus documentos de políticas educacionais.
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1. A prioridade para a educação básica
A educação básica, para o BM, é a que “proporciona os conhecimentos,
capacidades e atitudes essenciais para funcionar eficazmente na sociedade.” (BANCO
MUNDIAL, 1996, p.107). Essas competências básicas estariam relacionadas com a
expressão oral, conhecimentos de computação, atitude para comunicar-se e para
resolver problemas para “permitir às pessoas adquirir capacidades e conhecimentos
específicos para o emprego no local de trabalho.” (idem). Esse nível básico requer,
normalmente, para o BM em torno de oito anos de instrução.
Essa concepção de educação básica de caráter bastante restrito afasta-se da
concepção determinada, em 1990, na Conferência Mundial sobre Educação para Todos,
em Jomtien. Nessa proposta mais ampliada, a educação básica incluiria igualmente a
crianças, jovens e adultos e compreendendo tanto os instrumentos essenciais para a aprendizagem (como a leitura e a escrita, a expressão oral, o cálculo, a solução de problemas), quanto os conteúdos básicos da aprendizagem (como conhecimentos, habilidades, valores e atitudes), necessários para que os seres humanos possam sobreviver, desenvolver plenamente suas potencialidades, viver e trabalhar com dignidade, participar plenamente do desenvolvimento, melhorar a qualidade de vida, tomar decisões fundamentadas e continuar aprendendo. (UNESCO, 1998, Art.1).
Para o BM, “A educação básica deveria ser a primeira prioridade para o gasto
público em educação nos países que não conseguiram uma matrícula quase universal no
nível primário e secundário de ciclo básico.” (BANCO MUNDIAL, 1996, p.4). O
Banco defende o investimento na educação, especialmente a básica (primária e
secundária de primeiro ciclo), pois a mesma “leva a acumulação de capital humano, que
é um fator chave para o crescimento econômico sustentável e o aumento de renda [...],
contribui para reduzir a pobreza e aumentar a produtividade do trabalho dos pobres,
reduzir a natalidade e melhorar a saúde” (idem, p.21). Vozes que se elevam contra essa
priorização fracionária, afirmam
que é um erro separar a educação básica da educação universitária, pois devem ser concebidos como um continuum integrado que vise a crescente autonomia relativa do país no plano produtivo assim como no plano da pesquisa científica e do desenvolvimento tecnológico. Acrescentam que a pesquisa é fundamental para a elevação da
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qualidade tanto da educação quanto do desenvolvimento. (ARRUDA, 1998, p.58-9).
Com esse argumento de investimento prioritário em educação básica que, a
primeira vista, poderia ser uma atitude justificável sob o ponto de vista humanitário ou
econômico, o BM, ao invés de sustentar uma política de ampliação dos recursos
destinados à educação, impõe, através da sua influência nas políticas setoriais, uma
redistribuição dos escassos recursos destinados à educação, dos níveis superiores para a
educação básica.
A prioridade na educação da primeira infância é defendida, também, pelo BID,
com o argumento de que esse investimento traz grandes benefícios, pois “reduz a
desigualdade, melhora a saúde e inclusive pode ter um impacto em longo prazo para
aumentar a possibilidade de obter emprego e reduzir a criminalidade.” (BID, 2000,
p.23). A educação também aqui é colocada como determinante do processo econômico
e social. Para o BID, o desemprego e a desigualdade social são problemas que poderiam
ser resolvidos por meio da educação da população, como se esses fenômenos sociais
não fossem resultado de um sistema econômico que, pela sua própria natureza, produz a
desigualdade.
Esta orientação do BID de priorizar a educação básica e secundária atende a
orientação formulada pelos Presidentes reunidos em Santiago do Chile em abril de
19982, quando foi colocado no Plano de Ação que “instaram o BID a que colabore com
os países membros a incrementar para mais de o dobro durante os próximos três anos, o
aporte de novos empréstimos para a educação primária e secundária em comparação
com os aportes dos últimos três anos.” (BID, 2000, p.50).
O BID, ciente da ampla aceitação popular que tem a proposta de defesa da
educação básica, utiliza os meios de comunicação de massa como estratégia de
convencimento sobre a necessidade de realização das reformas educacionais de acordo
com suas orientações.
2 O documento do BID (2000) não explicita claramente quais eram os Presidentes que participaram do referido encontro em Santiago do Chile. O documento Educational change in Latin America and the Caribbean (BANCO MUNDIAL, 1999) afirma no seu prefácio que esse encontro foi em abril de 1998 n Cúpula das Américas II, que reuniu os presidentes dos países americanos.
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O Banco apoiará a educação primária e secundária para obter um amplo apoio social às reformas tanto de parte dos interessadaos tradicionais como dos que não são: estudantes, pais, professores e autoridades educacionais e também as ONGs, empresas privadas, os meios de comunicação de massa e outros. (BID, 2000, p.47).
O BM tem estimulado os países a priorizar o investimento em educação básica
com o argumento de que a taxa de retorno nesse nível de ensino é maior do que nos
demais, gerando maior renda e reduzindo a pobreza. Segundo o Banco, As altas taxas de rentabilidade calculadas para a educação básica na maioria dos países em desenvolvimento indicam claramente que os investimentos destinados a melhorar a matrícula e as taxas de retenção na educação básica devem merecer, em geral, a prioridade mais alta nos países que ainda não alcançaram a educação básica universal. (BANCO MUNDIAL, 1996, p.10).
A argumentação econômica, utilizada para justificar a prioridade na educação
básica, orienta-se no aumento relativo na renda das pessoas, resultante do investimento
em educação. Segundo essa argumentação, o investimento de determinado valor na
educação de uma pessoa analfabeta traria um aumento de renda pessoal
proporcionalmente maior do que se esse valor fosse aplicado na pós-graduação. A soma
dos ganhos pessoais conduziria a um incremento maior na renda nacional. Tal
justificativa seria fortalecida pelo fato desse investimento beneficiar a população
pertencente ao grupo mais carente.
A idéia conduz também a uma falácia evidente: num mundo no qual apenas um terço da população vai conseguir integrar-se ao mercado formal de trabalho, quando efetivamente entrarem no mercado de forma massiva os que hoje são alunos, uma proporção muito alta irá ficar desocupada ou irá concorrer entre si, diminuindo os salários. Em outras palavras: para poder tornar efetivo esse maior benefício privado e social (supondo-se que fosse efetivamente superior) é necessário um desenvolvimento que garanta um crescimento adequado da demanda por trabalho, o que, por sua vez, exigiria investir em outros níveis de educação e em outros setores econômicos, assim como estimular outras instituições além do mercado. (CORAGGIO, 1998, p. 106-7).
O BM aceita o investimento nos demais níveis de ensino apenas após o
desenvolvimento completo da educação básica. “A educação básica deveria constituir
geralmente uma prioridade para o gasto público em educação nos países que ainda não
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alcançaram uma matrícula quase universal na educação básica.” (BANCO MUNDIAL,
1996, p.61). Agindo assim, o Banco despreza a inter-relação e a sinergia entre os vários
níveis do sistema. “Um bom ensino secundário e uma boa universidade são, de fato,
condição de qualidade da própria educação básica, já que nesses níveis formam-se os
professores e/ou os professores dos professores quem têm sob sua responsabilidade a
educação básica.” (TORRES, 1998, p.181).
O BID, a exemplo do Banco Mundial, também afirma serem prioritários os
financiamentos para a educação básica e secundária em detrimento da superior. “O
Banco apoiará todos os setores da educação, ainda que não retorne a etapas anteriores
em que a maioria dos empréstimos se canalizavam para o nível superior. (BID, 2000,
p.45).
2. A qualidade e a eqüidade
A qualidade da educação para o BM pode ser medida pelo valor agregado da
escolaridade. Este valor, sem questionar a validade, o sentido, os métodos de ensino
daquilo que se ensina, consiste “na aquisição de mais conhecimentos e o aumento das
probabilidades de desempenhar uma atividade geradora de renda.” (BANCO
MUNDIAL, 1996, p. 50).
Para se atingir a qualidade e para que as escolas tenham eficiência em termos de
custo por diplomado seria necessário, segundo o BM, investir nos insumos mais
determinantes de um aprendizado efetivo que, no ensino de primeiro grau, foram, em
ordem de prioridade, assim relacionados pelo Banco: (1) bibliotecas; (2) tempo de
instrução; (3) tarefas de casa; (4) livros didáticos; (5) conhecimentos do professor; (6)
experiência do professor; (7) laboratórios; (8) salário do professor; (9) tamanho da
classe. (TORRES, 1998, p.134).
De acordo com a sua escala de prioridades, o BM recomenda investir nos
primeiros itens de seu rol, especificamente em três deles: aumentar o tempo de
instrução, proporcionar livros didáticos e melhorar o conhecimento dos professores
através da capacitação em serviço e ensino a distância. De acordo com essa mesma
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escala, o Banco desestimula investir nos últimos: laboratórios, salário do professor e
tamanho da classe.
O BID considera que para a melhoria da qualidade e eqüidade na educação faz-
se necessário uma análise de alguns elementos que considera críticos: professores,
materiais de ensino, tecnologia de instrução, gestão e educação básica.
Vamos verificar a postura adotada por esses organismos de financiamento diante
de alguns desses insumos educacionais.
3. Os professores
Com relação à formação dos professores, o BID afirma que “A formação dos
professores na região caracteriza-se por baixos padrões, aprendizagem deficiente das
matérias e falta de treinamento prático.” (BID, 2000, p.16).
A questão da formação em serviço parece estar meio dúbia para o BID.
Defendida por alguns autores3, que são referência para o BID e BM, é vista, em um
momento, com restrição, pois esta forma até pode ser utilizada para “ensinar aos
professores a última moda pedagógica ou a última reforma do programa de estudos, não
para levar a cabo uma avaliação das características do bom professor para assim
melhorar o ensino na sala de aula.” (BID, 2000, p.17). Em outro momento, no entanto, o
documento analisado afirma que “Em vista de sua importância, o Banco aumentará
consideravelmente seu apoio financeiro ao treinamento dos professores, que podem
realizar-se antes e durante o período de serviço.” (BID, 2000, p.45).
O BM aconselha melhorar o conhecimento dos professores privilegiando a
capacitação em serviço sobre a formação inicial e estimulando as modalidades a
distância. “Os programas de educação à distância para formação pedagógica em serviço
(e anterior ao serviço) são muitas vezes mais eficaz em função dos custos que os
programas de ensino presencial.” (BANCO MUNDIAL, 1996, p.92). Para compensar os
3 LOCKHEED & VERSPOOR, Improving Primare Education in Developing Contries, é citado pelo BID (BID, 2000, p.17). Este autor é citado também no Documento do BM (1996), quando este recomenda a formação em serviço.
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baixos níveis de formação docente, o Banco recomenda, também, proporcionar livros
didáticos, vistos como expressão operativa do currículo.
A questão da remuneração dos professores não é abordada com mais
profundidade pelo BID. O Banco limita-se a afirmar que os salários devem ser
condizentes com a formação dos professores para que se possa atrair e manter bons
profissionais, o que melhora o nível de ensino. O valor desses salários deve se orientar
pela remuneração de profissionais equivalentes empregados no setor privado, isto é,
pelo mercado.
O sindicato dos professores, como tem ideias divergentes dos bancos e uma
história de luta contrária aos interesses desses, são acusados, pelo BID, de
corporativistas e de concentrarem
suas atividades, quase exclusivamente, em temas salariais, muitas vezes com motivações políticas. É rara a ocasião em que os sindicatos ressaltam as condições de trabalho dos professores, prestam atenção ao desenvolvimento profissional ou se preocupam por melhorar o ensino. (BID, 2000, p.17).
Os sindicatos da América Latina não teriam conseguido, ainda segundo o Banco,
que o público se identifique com suas posições em função de que esses organismos
terem trabalhado muito pouco em prol de reformas que aumentem o rendimento escolar
das crianças ou melhorem a eficácia das escolas. (BID, 2000, p.42).
Com relação ao salário dos professores, o BID afirma que os estudos indicam
claramente que “o investimento em materiais de ensino rende uma utilidade maior que o
aumento dos salários dos professores ou a redução do número de estudantes por
professor.” (BID, 2000, p.19).
A questão salarial dos professores é considerada, pelo BM, pouco importante
para a melhoria da qualidade (penúltimo da escala de prioridades). Os professores
costumam ser vistos, pelo BM, como um sindicato magisterial que lembra reivindicação
salarial, corporativismo e greve. Os professores “são vistos [pelo Banco] como
problema antes que recurso, ‘insumo’ educativo necessário, porém, caro, complexo e
difícil de lidar” (TORRES, 1998, p. 161).
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Os professores são, geralmente, o maior grupo de empregados públicos nos países em desenvolvimento. Devido a que o financiamento e a administração da educação estão normalmente a cargo do governo central, os sindicatos de professores são importantes protagonistas no âmbito político nacional. [...] Quando os governos não chegam a um acordo com as poderosas centrais sindicais com respeito às condições de emprego dos professores, a ação coletiva pode perturbar a educação e, por vezes, culminam em uma paralisia política. (BANCO MUNDIAL, 1996, p.153).
As ideias do BM e do BID a respeito da remuneração dos professores e do papel
dos sindicatos expõem o seu caráter classista e a sua posição de defesa dos interesses do
capital internacional.
4. O uso da tecnologia na educação
A tecnologia da informação desempenha um papel importante na forma como ocorre o processo de mudança educacional, ampliando o acesso a nova informação, facilitando as investigações e prendendo o interesse e a atenção do estudante. Além disso, através da tecnologia, a educação pode chegar a populações que normalmente estão fora do alcance das instituições tradicionais. (BID, 1998, p.6).
O investimento em educação a distância por rádio e televisão teria alcançado,
segundo o BID, um impacto positivo sobre a qualidade, eqüidade e acesso em vários
países da região. Esses programas seriam exitosos e eficientes desde o ponto de vista de
custo. Através da educação a distância, por rádio e televisão, seria possível estender a
educação a populações distantes, o que seria custoso fazer pelos meios convencionais e
facilitaria o treinamento de grupos de pessoas em “destrezas específicas (como o
treinamento de professores em serviço). Neste último caso, um instrutor bem
qualificado pode ensinar desde uma localidade central, a uma grande quantidade de
estudantes ou trabalhadores em tarefas especializadas”. (BID, 2000, p.19-20).
Na década de 1990, o investimento em computadores e internet no processo
ensino/aprendizagem na educação primária e secundária, no entanto, não se mostraria
muito vantajoso em função do substancial volume de recursos necessários que o tornaria
desinteressante segundo a análise do custo-eficiência daquele período. (BID, 2000,
p.20). A utilização de computadores precisaria estar ligada ao treinamento de
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professores e ao desenvolvimento de programas específicos para o ensino dos
conteúdos. Segundo o Banco, ensino usando o computador deveria ser desenvolvido
inicialmente como projeto piloto, isto é, de menor envergadura para que se possa avaliar
os resultados e definir formas mais eficientes para projetos futuros mais amplos. A
conclusão do BID sobre ser ou não vantajosa a utilização da tecnologia na educação,
orienta-se primordialmente por uma avaliação do custo. É possível que, recentemente,
os bancos tenham alterado sua posição em relação a essa temática em função da
popularização da informática e o barateamento relativo dos equipamentos.
A infraestrutura não era considerada um insumo importante para o BM, pois “Os
edifícios escolares não são de todo necessários para obter os resultados acadêmicos
desejados.” (BANCO MUNDIAL, 1996, p.64). Para minimizar custos, neste item, o
BM recomenda compartilhar custos com as famílias e comunidades. O BID também não
considera as despesas com construção como importantes, pois no seu financiamento
para o PROEP não foi permitida a realização de investimento neste item.
5. O tamanho da classe
A questão do tamanho da classe é abordada pelo BM segundo um enfoque
puramente econômico, sem nenhum tipo de avaliação de cunho pedagógico. As escolas dos países de renda baixa e média poderiam economizar custos e melhorar a aprendizagem aumentando o coeficiente professor-alunos. Utilizariam, assim, menos professores e poderiam alocar os recursos para outros insumos que melhoram o rendimento, como os livros didáticos e a formação em serviço dos professores. (BANCO MUNDIAL, 1996, p.64).
O BM cita ainda estudos onde se conclui que o tamanho da classe não tem
incidência significativa sobre o rendimento escolar dos alunos. Assim, o BM recomenda
aos países em desenvolvimento que não empenhem esforços em reduzir o tamanho da
classe.
O BID não assume abertamente sua posição pelo aumento do número de alunos
na classe, mas cita, em seu documento, diversos estudos que chegaram a essa conclusão.
Os estudos citados (Jiménez, 1996, sobre a Republica Dominicana; Swope, 1998; Fe y
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Alegría) concluem que os custos dos alunos na educação privada é menor que na
pública e com um melhor resultado de aprendizado dos alunos e credita esse fato, entre
outros fatores, a uma proporção mais alta de professores por estudante. (BID, 2000,
p.33). Outro trabalho citado pelo BID (Schiefelbein et al, 1998) faz estudos sobre os
custos de várias intervenções de escolas primárias da região, concluindo que essas
intervenções, freqüentemente, não são eficazes. A sugestão do Banco é que os países da América Latina devem questionar seriamente algumas intervenções sumamente onerosas que têm pouco impacto na aprendizagem. Algumas delas são o uso de computadores em larga escala (em vez de projetos-piloto), redução na proporção entre professores e estudantes sem as mudanças correspondentes em pedagogia e aumento nos salários.” (BID, 2000, p.34).
O BID afirma ainda que “A proporção de alunos por professor é
indubitavelmente o elemento mais importante que afeta os custos unitários.” (BID,
2000, p.35), demonstrando que sua análise, a exemplo do Banco Mundial, orienta-se
sob o enfoque economicista. O Banco afirma ainda que estudos internacionais sobre o
efeito do tamanho da classe na aprendizagem trazem resultados ambíguos, mas é fato
certo que a Coréia, com uma proporção de 40 alunos por professor, tem mostrado
desempenho, em provas internacionais, muito superiores à América Latina, que tem
uma taxa de 16 alunos por professor. Colocada esta questão desta forma, o BID
demonstra sua visão restrita ao fazer a análise, isolando apenas algumas variáveis e
forçando uma relação entre elas, desprezando a inter-relação que existe entre o conjunto
de variáveis que fazem parte do processo educacional.
6. Tempo de instrução
Para melhorar a educação deve-se, também, aumentar o tempo que se dedica ao
ensino nas aulas. O BID afirma que o tempo destinado à educação nos vários países da
América Latina e Caribe, com exceção dos países que falam inglês no Caribe, é
insuficiente para uma educação de qualidade. (BID, 2000, p.29). Para embasar esta
afirmação o Banco compara o tempo de instrução diária e anual dos países da região
com o dos países desenvolvidos.
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Para aumentar o tempo de instrução sem precisar de novas construções
resultantes do turno dobrado, o Banco sugere alternativas de menor custo: “aumentar a
duração do ano escolar, reduzir as folgas prolongadas e dar aos estudantes mais tarefas,
as quais, segundo muitos estudos, têm um impacto positivo no rendimento do aluno.”
(BID, 2000, p.35).
O BM, também, recomenda aumentar o tempo de instrução, através da
prolongação do ano escolar, da flexibilização e adequação dos horários, e da atribuição
de tarefas de casa; A quantidade de tempo efetivo dedicado a aprendizagem está relacionada sistematicamente com os resultados. Os estudantes dos países de renda baixa e média têm menos horas de instrução em sala de aula que os dos países da OCDE, como consequência do ano escolar mais curto, dos fechamentos imprevistos das escolas, das ausências de professores e alunos e de perturbações diversas. (BANCO MUNDIAL, 1996, p.8)
7. A descentralização
Os sistemas educativos da América se caracterizam, segundo o BID, por uma
excessiva centralização. A autonomia permite aos servidores escolares “responder
melhor diante dos desafios institucionais e satisfazer melhor as necessidades dos
interessados finais, os estudantes e seus pais.” (BID, 1998, p.3).
Como justificativa para a necessidade da descentralização, o BMA afirma que
A maioria dos sistemas de educação é administrada diretamente pelo governo central ou estatal, que dedica um esforço considerável em ocupar-se de questões como negociação dos salários dos professores, programas de construção de escolas e reformas curriculares. Esta administração central, que abarca inclusive os insumos da educação e os meios de aprendizagem, deixa pouco lugar para a flexibilidade que promove uma aprendizagem efetiva em salda de aula. (BANCO MUNDIAL, 1996, p.6-7).
Em função das razões apresentadas, o BM recomenda aos governos um esforço
no sentido de acelerar a descentralização mantendo, no entanto, ainda centralizadas “o
estabelecimento de normas, o fornecimento dos insumos que tenham demonstrado
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melhorar os resultados, a adoção de estratégias flexíveis para a aquisição e uso dos
insumos e a vigilância do rendimento.” (BANCO MUNDIAL, 1996, p.7).
O BID, por outro lado, alerta para os riscos advindos da descentralização, entre
eles são citados: a perda de controle das políticas por parte das autoridades nacionais, o
aumento das desigualdades entre as regiões e a “captura” das políticas por parte de
grupos de interesse. Para que a descentralização obtenha sucesso, algumas atividades
devem ficar a cargo do governo central, entre elas o Banco cita: a fixação de normas,
desenho de políticas, informação e avaliação. (BID, 1998, p.4).
Para implementar a autonomia das instituições escolares, O BM recomenda
medidas financeiras e administrativas. As medidas financeiras propostas são: a) o uso de impostos locais e centrais; b) a participação das comunidades locais nos custos; c) alocação de subsídios globais para as comunidades e para as escolas sem restrições à alocação de recursos; d) cobrar taxas na educação superior; e) fomentar a diversificação das receitas; f) certificados e empréstimos educativos; g) financiamento baseado em resultados e qualidade. (BANCO MUNDIAL, 1996, p.14-5).
As medidas administrativas são sugeridas para a direção e para os professores.
Para a direção é proposto que gozem de autoridade para definir assuntos como “alocar
recursos, contratar ou dispensar pessoal, e determinar questões tais como calendário,
horário escolar e língua de instrução”. Para os professores “propõe-se que tenham
autonomia para definir as práticas de aula, embora dentro de certos limites fornecidos
por um currículo nacional, sujeito a normas e padrões, exames, avaliações de
aprendizagem e supervisão de ensino” (BANCO MUNDIAL, 1996, p.14).
A descentralização é vista pelo BID, a exemplo do BM, como uma forma de
passar a responsabilidade da manutenção e provimento do ensino para as comunidades
locais, aliviando o Estado do ônus com o setor educativo, de acordo com a ideologia
neoliberal do Estado-mínimo. A descentralização pode ser utilizada, também, como
uma forma de desmontar “grupos de interesses”, como o sindicato dos professores ou as
organizações estudantis, que se mostram fortes enquanto conseguem trabalhar unidos. O
desmembramento das escolas em unidades independentes, com administrações e
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interesses próprios, tenderia a tirar a força de ação conjunta própria das organizações de
luta sindical e política.
é evidente que a descentralização poderia ser um instrumento adequado para a reforma educacional ao liberar as iniciativas locais, canalizar fundos adicionais originados em fontes locais, comprometer novos interessados ou desmantelar grupos de interesse surgidos dos excessos do centralismo, o que pode ser de valor por si só. (BID, 2000, p.21).
A participação dos pais e da comunidade é considerada ponto chave para o
processo de descentralização. Com o aumento do poder e da participação da
comunidade local sobre as questões financeiras “aumentará a participação dos pais nas
escolas de seus filhos, obrigando aos professores e administradores a aumentar a
qualidade, melhorar a educação e usar os recursos mais eficientemente.” (BID, 2000,
p.22).
8. Participação dos pais e da comunidade
A participação pode acontecer, segundo o BM, em “três âmbitos: (a) a
contribuição econômica para a sustentação da infra-estrutura escolar; (b) os critérios de
seleção da escola; e (c) um maior envolvimento na gestão escolar;”. Quatro “riscos” são
atribuídos à maior participação das famílias no âmbito escolar: “(a) uma maior
dificuldade para impulsionar objetivos nacionais amplos; (b) incremento da segregação
social; (c) estímulo à desigualdade (ao depender das condições econômicas da
comunidade e das famílias); (d) limitações derivadas da falta de informação e educação
dos pais.” (BANCO MUNDIAL, 1996, p.13-4). A participação da comunidade pode
acontecer através de ONGs. a participação das ONGs na subministração da educação deverá ser considerada como outro elemento da descentralização, um complemento ao papel do Estado [...] é necessário propiciar um ambiente que facilite a participação do setor privado na operação de instituições educativas, tenham estas fins lucrativos ou operem como serviço social. (HUSAIN4 apud TORRES, 1998, p.137)
4 HUSAIN, Discurso pronunciado na sessão inaugural do PROMEDLAC V, realizado em Santiago do
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A ideia de participação da comunidade expressa como “um complemento do
papel do Estado” indica a tendência de descompromisso educacional do Estado,
reduzindo os custos com esse setor e a ampliação dessa frente de atuação para a
exploração privada da educação e a montagem de um sistema educacional calcado em
valores e procedimentos próprios do sistema capitalista.
Participação para o BID parece ser o envolvimento dos atores locais apenas para
a implementação das reformas criadas pelo Banco. A implementação dessas reformas
depende de líderes que busquem o consenso ente os vários setores da comunidade, pois
serão eles que “terão de interpretar e aplicar as reformas. Para ter êxito, a reforma deve
procurar o compromisso e a participação dos interessados.” (BID, 1998, p.9, grifos do
autor).
Para buscar o “consenso” em torno da reforma, o Banco sugere recorrer ao
diálogo político e ao marketing. O documento afirma, inclusive, que “recentes projetos
do BID têm incluído componentes de propaganda social e pesquisas de opinião pública
e processos de construção de consenso, como um aspecto chave da preparação e
execução de projetos de educação.” (BID, 1998, p.9). Assim, o processo de construção
do consenso, adotado pelo BID, se parece mais com um convencimento ou isolamento
das parcelas da população resistentes à mudança, sem considerar a hipótese de colocar
em discussão a proposta si. “A propaganda social é um meio de obter a colaboração da
sociedade civil e, em particular, a dos pais. [...] no processo da reforma educativa se tem
que destinar fundos para desenhar e executar atividades de propaganda social de
maneira efetiva.” (BID, 2000, p.42).
A busca de informações e a avaliação são atividades muito citadas e valorizadas
no processo de implementação das reformas. Levantamentos estatísticos e avaliações
são importantes para o processo de tomada de decisões e, “ao mesmo tempo permitir
comparações entre países, regiões e inclusive entre escolas” (BID, 1998, p.4). Essas
comparações, ao mesmo tempo em que fornecem um referencial de resultado para
Chile em jun.1993. O Proyect Majeur dans le domaine de l'education en Amerique Latine et les Caraibes (PROMEDLAC) é um projeto, realizado pela Unesco, que reúne a cada dois anos os ministros da educação da América Latina e Caribe.
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orientar o processo de tomada de decisões, desenvolvem ou estimulam o espírito
competitivo, que se contrapõe ao da solidariedade.
Conclusões
A análise das ideias educacionais do BID em conjunto com as do BM mostra a
existência de grande semelhança nos seus referenciais ideológicos, na definição das
políticas para a educação, nos seus receituários educativos e nos mecanismos de
influência junto aos governos que buscam financiamento junto a esses bancos.
As políticas públicas defendidas por esses organismos multilaterais de
financiamento, expressas em seus principais documentos publicados na década de 1990,
revelam uma proximidade conceitual e ideológica entre as mesmas e de conteúdo
coincidente com as principais diretrizes das reformas educacionais ocorridas no Brasil e
na América Latina durante o período.
Esses documentos analisados mostram que o BM e o BID fizeram uma
propaganda intensa para o convencimento sobre a necessidade de reformas educacionais
na América Latina. As análises dos bancos citados sobrevalorizam o papel da educação
na sociedade, apresentando-a como chave para o desenvolvimento econômico por meio
de seu impacto na redução da pobreza e da desigualdade de renda.
As principais ideias de reforma propostas, de viés economicista e referencial
ideológico neoliberal, podem agrupar-se em: alocação de recursos com prioridade para a
educação básica; descentralizar a administração das escolas e compartilhar os seus
custos com a sociedade local, reduzindo os gastos governamentais com educação; ao
governo caberia fixar, primordialmente, padrões e monitorar o desempenho;
investimento prioritário em equipamentos e materiais escolares; pouca importância para
o salário dos professores; aumento do tempo de instrução; educação à distância; uso da
tecnologia como instrumento educacional; aumento do tamanho das classes e do
número de alunos por professor. Para o convencimento sobre a necessidade das
reformas propostas pelos bancos seriam utilizados, dentre outros, as pesquisas de
opinião e os veículos de comunicação de massa.
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