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ATA DA AUDIÊNCIA PÚBLICA DO MINISTÉRIO DA CULTURA PARA DISCUTIR O CICLO DE DEBATES: QUESTÕES DO LIVRO E DA LEITURA, REALIZADA NOS DIAS 14 E 15 DE NOVEMBRO DE 2008, NO CENTRO DE CONVENÇÕES – FORTALEZA-CE. DIA 14 SRA. MILEIDE FLORES (Coordenadora de Mercado Editorial): Bom-dia senhoras e senhores. Este ciclo de debates do Livro e da Leitura terá uma programação paralela a VIII Bienal Internacional do Livro do Ceará. Para compor a Mesa, o Ministério da Cultura, chamamos a Tarciana Portela, representando o Ministério da Cultura Regional-Nordeste; Secretário da Cultura do Estado do Ceará, Auto Filho, aqui representando o Fórum de Secretários de Cultura do Nordeste; Secretário-Executivo do Plano Nacional do Livro e da Leitura, Castilho; representando o MEC, Carlos Rabelo; representando a Associação da Câmara Cearense do Livro, Sandra Lima; Câmara Brasileira do Livro, Roseli; Ednilson Xavier, aqui representando a Associação Nacional de Livrarias; Glauber Siqueira, da Funjon. Passamos a palavra para a Tarciana Portela. SRA. TARCIANA PORTELA: Bom-dia a todas e a todos os presentes. Esta atividade é uma ação muito desejada pelos diversos setores da região, em particular os editores e livreiros. Existe uma necessidade, e precisa ser respondida, é a da defesa da diversidade cultura no país do ponto de vista do livro como instrumento dessa veiculação e dessa diversidade, de um quadro editorial muito complicado, digamos assim, no país. São as grandes editoras amarradas nas distribuidoras, e as grandes editoras cada vez mais internacionalizadas. Como fazer a defesa dessa adversidade? Essa ação é uma provocação da Câmara Cearense do Livro e do Piauí. A Lucinéia Santos é do Conselho Estadual de ATA DA AUDIÊNCIA PÚBLICA DO MINISTÉRIO DA CULTURA, PARA DEBATER A QUESTÃO DO LIVRO E DA LEITURA, REALIZADA NO DIA 15 DE NOVEMBRO DE 2008, NO CENTRO DE CONVENÇÕES. DIVISÃO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E ANAIS DA ALEC. 1

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ATA DA AUDIÊNCIA PÚBLICA DO MINISTÉRIO DA CULTURA, PARA DEBATER A QUESTÃO DO LIVRO E DA LEITURA, REALIZADA NO DIA 15 DE NOVEMBRO DE 2008, NO CENTRO DE CONVENÇÕES

ATA DA AUDIÊNCIA PÚBLICA DO MINISTÉRIO DA CULTURA PARA DISCUTIR O CICLO DE DEBATES: QUESTÕES DO LIVRO E DA LEITURA, REALIZADA NOS DIAS 14 E 15 DE NOVEMBRO DE 2008, NO CENTRO DE CONVENÇÕES – FORTALEZA-CE.

DIA 14

SRA. MILEIDE FLORES (Coordenadora de Mercado Editorial): Bom-dia senhoras e senhores. Este ciclo de debates do Livro e da Leitura terá uma programação paralela a VIII Bienal Internacional do Livro do Ceará.

Para compor a Mesa, o Ministério da Cultura, chamamos a Tarciana Portela, representando o Ministério da Cultura Regional-Nordeste; Secretário da Cultura do Estado do Ceará, Auto Filho, aqui representando o Fórum de Secretários de Cultura do Nordeste; Secretário-Executivo do Plano Nacional do Livro e da Leitura, Castilho; representando o MEC, Carlos Rabelo; representando a Associação da Câmara Cearense do Livro, Sandra Lima; Câmara Brasileira do Livro, Roseli; Ednilson Xavier, aqui representando a Associação Nacional de Livrarias; Glauber Siqueira, da Funjon.

Passamos a palavra para a Tarciana Portela.

SRA. TARCIANA PORTELA: Bom-dia a todas e a todos os presentes. Esta atividade é uma ação muito desejada pelos diversos setores da região, em particular os editores e livreiros.

Existe uma necessidade, e precisa ser respondida, é a da defesa da diversidade cultura no país do ponto de vista do livro como instrumento dessa veiculação e dessa diversidade, de um quadro editorial muito complicado, digamos assim, no país. São as grandes editoras amarradas nas distribuidoras, e as grandes editoras cada vez mais internacionalizadas. Como fazer a defesa dessa adversidade?

Essa ação é uma provocação da Câmara Cearense do Livro e do Piauí. A Lucinéia Santos é do Conselho Estadual de Cultura do Piauí e organizadora da Feira do Livro do Piauí, na Editora Dom Quixote.

Agradecemos a presença de todos. Isso é fruto de uma ação conjunto do Ministério e do Fórum de Secretários de Cultura da Região.

Informamos que serão dois dias de debates e discussões. O Jeferson Assunção foi convocado pelo Ministro Juca Ferreira, tendo que viajar para Portugal, mas será representado pelo Castilho, que é do Plano Nacional do Livro e Leitura.

A Vilma Nóbrega, da Câmara Setorial do Livro e Leitura, de Alagoas, não pôde vir para fechar o Projeto da Biblioteca de Referência.

Infelizmente, por problemas de saúde na família, a Rejane, Secretária Municipal de Educação em Afogados da Ingazeira. Ela foi uma das finalistas do prêmio de uma leitura narrada numa experiência no município do semi-árido.

Quanto ao Cristiano Neto, ocorreu também um imprevisto, e não pôde chegar hoje, virá amanhã.

Teremos muitos desafios nesses dois dias. Os objetivos desse encontro são os temas a serem abordados e, também, que todos se conheçam. Nós estamos trabalhando numa rede regional em prol do livro e da leitura.

Passamos a palavra ao Secretário de Cultura do Ceará, Professor Auto Filho.

SR. FRANCISCO AUTO FILHO: Bom-dia a todos e a todas. Eu ia dizer umas coisas para o Ministério da Cultura e para o Ministério da Educação ouvir.

Antes, saudar a todos vocês; dizer que é uma alegria para o Ceará recebê-los. Nós do Nordeste esperamos formular propostas concretas para o Ministério da Cultura, o Ministério da Educação e para a nossa relação enquanto região, enquanto editores, livreiros, escritores e agentes públicos. Portanto, sejam bem-vindos e bem-vindas.

A Mileide usou uma palavra e eu quero só fazer uma pequena correção. Este não é um evento paralelo ao da Bienal. Este é um dos mais importantes eventos estruturantes da Bienal. A nossa Bienal pretende não só fazer a divulgação do livro, como o Galeno gosta de chamar “o povo do livro”, também para discutir as grandes políticas.

A mensagem que eu gostaria de levar para o Ministério da Cultura e para o Ministério da Educação é que é preciso cumprir a constituição brasileira, é preciso combater as disparidades regionais, e entre as disparidades estão às culturais, chegando a ser discriminação cultural no Nordeste. Contra isso nós vamos combater, vamos lutar. Criamos o Fórum de Secretários para fazer isso, mas deixando claro que nós apoiamos a política cultura do governo Lula. Particularmente eu trabalho no Plano Nacional do Livro e da Leitura, que tem essa figura extraordinária, esse grande dirigente e articulador, o companheiro Castilho.

Nós do Ceará somos partícipes e admiradores do grande trabalho do Ministro Fernando Haddad, do Plano Nacional de Educação. Eu que sou velho professor, pela primeira vez vejo que tem um governo com um plano consistente, formulado com uma visão de totalidade com visão de futuro. Portanto, eu sou um grande admirador do Ministério da Educação. No entanto, a admiração se faz verdadeiramente justa e séria, quando nós também identificamos as lacunas, as discussões, os silêncios e as descriminações. O Nordeste é descriminado na cultura; o Nordeste é descriminado no terreno da produção e da aquisição de livros.

Em 2006, 86% dos recursos da Cultura foram para Rio, São Paulo e Minas, 2,7% para o Nordeste. Isto é inconstitucional, e a constituição estabelece a obrigação da União, a obrigação das empresas públicas em combater as disparidades regionais. Isso é inaceitável. Por conta disso, gerou-se a criação do Fórum de Secretários do Nordeste para combater essa política de integração regional e de combate às disparidades. Sabemos que no Ministério da Cultura e da Educação nós temos companheiros e companheiras que são como nós, a começar pelos Ministros, mas nós queremos ver o discurso efetivado. Eu acho que daqui nós podemos tirar grandes resultados para ajudar os companheiros e companheiras do governo federal a fazer com mais intensidade a correção dessas disparidades. Muito obrigado. Sejam bem-vindos. (Aplausos).

SRA. ROSELI (Câmara Brasileira do Livro): Bom-dia a todos. Fico muito feliz de estar aqui. Saudar a Mesa, o nosso anfitrião Secretário Auto, e o Castilho, o Xavier, a Tarciana, a Sandra.

Como disse o professor Auto, esse é um evento estrutural. Existe aqui um mercado editorial imenso e o Sul não sabe, porque as coisas só acontecem no eixo São Paulo-Rio de Janeiro. Eu vejo a necessidade de eventos estrutural como essa Bienal e outros tantos eventos que estão acontecendo. Ao chegarmos, o pessoal de São Paulo e os demais, nós ficamos impressionados de ver a beleza, a riqueza que é a cultura daqui.

De verdade, esses são os únicos eventos que não vendem a alma para ninguém, são os eventos racionais de verdade, porque representam verdadeiramente o Brasil. Eu fico encantada porque é o Brasil. Reverencio-me aos eventos daqui.

Eventos como esses precisam acontecer visando, principalmente, o fortalecimento do mercado editorial regional. O mercado editorial daqui precisa ter distribuição pelo Brasil todo. Eu fico muito feliz de estar aqui, muito feliz mesmo. (Aplausos).

SRA. SANDRA LIMA (Câmara Cearense do Livro): Bom-dia a todos. Cumprimentando a Mesa em nome do Secretário Auto Filho.

Desejo realmente que tenhamos lucidez, e que a gente consiga sair amanhã com algo fundamentado, para que realmente esse nosso empenho tenha o êxito no qual estamos procurando. (Aplausos).

SR. JOSÉ CASTILHO (Plano Nacional do Livro E Leitura): Meu bom-dia a todos e a todas. É um prazer imenso estar aqui novamente. Sinto-me gratificante em recuperar as energias com a energia do Ceará. A Editora Regional Nordeste é um exemplo, do ponto de vista da luta e da perseverança pelas coisas da cultura brasileira, como bem disse a Roseli, que representa de fato o Brasil.

Além do prazer de estar, eu queira lembrar a todos o seguinte: quem tem medo dos grandes desafios, principalmente na nossa área, é quem não tem conteúdo. O Nordeste tem um enorme conteúdo.

Lembrar a vocês que nós estamos numa luta também que não é apenas do Nordeste ou de outra região que não seja o Sudeste se afirmar no Brasil. Nós estamos numa luta, pelo menos parte do Brasil, para se firmar nele próprio e em relação aos grandes conglomerados internacionais que estão cada vez mais presentes, uns de uma maneira, outros de outra. O que falta justamente é acomodarmos de maneira conseqüente aquilo que todo mundo fala, mas é muito difícil realizar, é a tal da bibliodiversidade, a manutenção das culturas de todos os povos e, ao mesmo tempo, a internacionalização que é um fato irreversível.

Há dez ou doze anos, o Peter era Presidente da Feira do Livro, e fez uma afirmação fundamental, eu considero como certo divisor de águas no mundo editorial mundial, quando ele admitiu publicamente que os Conselhos Editoriais tinham mudado das salas dos Conselhos Editorias para a sala das Bolsas de Valores, e a função do editor tinha mudado radicalmente nessa luta pela sobrevivência.

Lembrar que a luta pela sobrevivência é daqueles que são editores, que acreditam nessa profissão, são daqueles autores que ainda não se venderam pelas ingerências do mercado, são as políticas públicas que ainda entendo que nós temos um trabalho global e acolhedor, de todas as tendências mantendo as adversidades.

Eu acho que nós estamos juntos numa briga muito importante, muito interessante, e eu tenho certeza que com o conteúdo que todos nós temos, principalmente numa região tão rica quanto o Nordeste, nós vamos vencer. Muito obrigado. (Aplausos).

SR. CARLOS ALBERTO XAVIER (MEC): Muito bom-dia a todos os participantes da Mesa. Atualmente sou assessor do Ministro da Educação Fernando Haddad, depois de ter exercido muitos cargos na Cultura e na Educação, como Diretor do IPHAN, Secretário, Chefe de Gabinete da Cultura e Educação. Atualmente, eu acho que sou juiz de paz desse casal que se separou há vinte anos: a Cultura e a Educação. Eu não faço outra coisa a não ser tentar a reconciliação desse casal que deixou ao relento os seus filhos, que são as escolas, os professores, o desporto.

O Galeno há de lembrar que fizemos durante uns dois anos reuniões, todo mês, tentando essa reconciliação. O fruto disso é o Plano Nacional do Livro e da Leitura.

Está acontecendo em Brasília uma reunião de todos esses elementos que são carentes. Há um mito criado há mais de vinte anos, com a separação do Ministério da Cultura, do Desporto, da Ciência e Tecnologia do Ministério da Educação, o quadro moderno é outro, mas a função é a mesma. A Educação ficou desprovida, ficou carente de todos esses assuntos que saíram de lá: dança, música, teatro, museu, patrimônio, livro, leitura, parece que não é parte do Ministério da Educação. Então, daí a necessidade de se estabelecer estruturalmente, como disse a Roseli, mecanismo de aproximação dessas duas áreas.

Como a gente vai fazer o ideal de Anísio Teixeira, o de fazer uma escola integral com utilidade de só ensinar Português, Matemática, História e Ciência no horário da sala de aula, e todos os outros assuntos que formam um cidadão, nos demais momentos do calendário escolar.

Esse é o trabalho que eu venho fazendo no MEC. Fico muito satisfeito de ver aqui numa reunião em plena segunda-feira; estivemos no Rio Grande do Norte, na Bahia, em Belo Horizonte, em todos os lugares há um esforço de compreensão da complexidade do mundo atual.

O Ministério da Educação quando tinha tudo reunido, tinha o INL (Instituto Nacional do Livro e da Leitura) e não tínhamos o Setor Editorial como termos hoje. Portanto, a organização da Educação e da Cultura tem que ser diferente, já que o mundo é complexo e diferente, e as tecnologias modernas estão aí para serem usadas e não estão usando ainda concretamente.

Então, eu bato palmas para todas essas iniciativas. Muitas vezes a gente fala para uma platéia pequena no primeiro momento, depois vai aumentando, mas nós temos que olhar para o foco. O foco, o Fernando Haddad deu para o Plano de Desenvolvimento da Educação, que é orientar todos os esforços e recursos dos estados, municípios e da União para a melhoria da educação. Esse é o fato. Esse fato não é nada moderno, é de 1930, quando foi criado o Ministério da Educação. É bom sempre fazer essa reflexão. Em 508 anos de Brasil, o Ministério da Educação ainda não fez 80 anos, é de 1930. Nós começamos com 80% de analfabetos. Nós temos hoje, talvez, 11% de analfabetos. Nós temos analfabetos funcionais, nós temos que incluir milhares de pessoas além das que estão nas escolas. Nós temos 55 milhões de pessoas nas escolas, mas nós temos outro tanto que precisariam de mais escolas e também não têm.

Então, qualquer esforço para competir para esse foco, esse sentido da administração pública, aliás, é esse o “A” de Administração, é gerir num determinado sentido, e o sentido é a Educação. Portanto, todos os esforços deveriam convergir com esse foco. Parabéns a todos. Muito obrigado. (Aplausos).

SRA. MILEIDE FLORES: Eu gostaria de comunicar que esse Ciclo de Debates está sendo gravado e taquigrafado. Agradecer ao deputado Lula Morais pela interferência junto ao Presidente da Assembléia Legislativa Domingos Filho, pela liberação das taquigrafas.

Agradecer ao Ministério da Cultura, ao Ministério da Educação, ao Secretário do Fórum de Cultura do Nordeste, ao Secretário de Cultura do Estado do Ceará, o Sindilivros e a Câmara Cearense, que realmente fizeram um esforço imenso para em uma semana fecharmos a pauta deste Ciclo de Debates.

SRA. TARCIANA PORTELA: Vamos desfazer a Mesa e passar para o primeiro palestrante Galeno Amorim, para falar sobre os Retratos Da Leitura No Brasil, mas dando uns recortes aí nos dados do Nordeste. Galeno, ah sim, Mileide vai fazer os agradecimentos aqui.

SR. GALENO AMORIM (Observatório do Livro e da Literatura): Bom-dia a todos e a todas aqui presentes. É motivo de muita alegria voltar ao Cará, voltar a essa Bienal maravilhosa, e discutir, apresentar dados, exibir diagnósticos que podem ser utilizados a todos os setores envolvidos na questão do livro, da leitura no Brasil, para refletir, repensar caminhos, ações, e assim buscar formas para produzir mais e mais avanços nesta questão tão importante e tão cara para todos nós que militamos e temos algum tipo de responsabilidade na área, como governo, como empresas, enfim, militantes e trabalhadores dessa grande causa.

Mostrarei retratos da leitura no Brasil, estudos que foram feitos pelo Instituto Pró-Livro, com o apoio das entidades do livro, a CBL, SNEL, Abrelivros, foi coordenado por mim no Observatório do Livro e da Leitura, e executado pelo Ibope. Eu diria que foi o maior estudo feito até hoje no Brasil, por conta da abrangência que acabou tendo.

Durante esse período de realização constatamos e confirmamos algumas convicções, mas outras, alguns mitos precisam ser repensados.

O Retrato da Leitura no Brasil mostrou, por exemplo, que o brasileiro está lendo um pouco mais, talvez seja menos do que nós gostaríamos, e de fato é.

Mostrou outras questões também. Trouxe notícias boas, trouxe notícias ruins. Uma noticia boa foi ter reafirmado o seguinte, quando o estado faz bem a sua parte, cumpre bem a sua lição de casa os resultados acontecem. Isso também vale para a sociedade, isso também vale para o setor privado. No entanto, existem outras dificuldades. A escola é um grande formador de leitor, um palco muito privilegiado da formação de leitor, portanto, lê duas vezes mais do que aquele que já saiu da escola, mas pode estar falhando na tarefa de formar leitores que gostem de ler e que continuem a fazer isso, mesmo depois que estiverem fora dela.

Outro dado bastante interessante é que as políticas públicas, os programas sociais do governo têm um papel fundamental em tudo, e também na questão da leitura.

Os índices de leitura mostram que em alguns setores da população, em algumas regiões, em algumas faixas etárias são bem maiores do que em outros. Isso está bastante ligado à questão das políticas publicas. O fato de programas de governo - e aí eu faço uma referência direta aos programas de aquisição de livro do MEC – há, evidentemente, sempre o que ser discutido, o que avançar, mas inegavelmente algo importantíssimo para expansão da leitura no nosso país, mais gente lendo mais.

Esse estudo também revela algo que vai nos ajudar a fortalecer as nossas lutas, os nossos discursos para o aperfeiçoamento das políticas públicas. Percebe-se, por exemplo, que o Brasil ainda carece de uma política mais rigorosa para dar o acesso gratuito ao livro, via biblioteca pública.

O estudo mostra, por exemplo, que as pessoas conhecem sim a existência da biblioteca. No entanto, são poucas as pessoas que vão às bibliotecas, apenas 10%. Isso acontece basicamente porque durante a vida escolar há uma freqüência maior à biblioteca, ainda assim, um número considerável de estudantes simplesmente não vai a biblioteca pública municipal, o que mostra uma dicotomia entre a biblioteca escolar e a biblioteca pública municipal, algo que precisa ser revisto, algo que precisa gerar alguns avanços para utilizar isso.

Alguns países desenvolvidos, os países que ostentam índices importantes de leitura não conseguiram resolver a questão da democratização do acesso à leitura apenas pelo mercado. O mercado tem sim um papel extraordinário para dar acesso à leitura. No entanto, um país como o nosso não se pode dar ao luxo de esperar que essa questão seja resolvida absolutamente pelo mercado. É preciso que nós tenhamos políticas públicas. As políticas públicas passam necessariamente pela via de acesso que é a biblioteca, no entanto, acontece uma situação no mínimo curiosa, as pessoas que vãos às bibliotecas tendem avaliá-las bem - isso acontece em vários setores. Quando o Maurício, o nosso amigo do Ibope que está aqui, pergunta para as pessoas que freqüentam o SUS (Serviço Único de Saúde) sobre a sua qualidade, elas dizem: “É bom”. Mas uma investigação um pouco mais profunda vai mostrar deficiências, carências e a necessidade de gerar avanços para melhorar o atendimento à Saúde. Na área da biblioteca acontece da mesma maneira.

Como as pessoas percebem a leitura? Como a leitura é no imaginário coletivo? O cidadão brasileiro responde basicamente o seguinte: “A leitura é questão de conhecimento para a vida”, 42% das pessoas responderam isso; outros: “conhecimento para se atualizar profissionalmente”, 17% da população responderam isso; ou então, “para a escola, para a faculdade”, e um dentre cada dez brasileiros responderam dessa forma. Outro grupo respondeu, correspondendo a 8%, que “ler é uma atividade interessante”; outros 2% disseram que “ler é uma atividade prazerosa”.

O importante é que o estudo mostrou que entre três em cada quatro pessoas associam leitura a valores positivos.

Essa pesquisa foi feita em todos os estados brasileiros, em mais de cinco mil domicílios, representando 92% da população. É uma pesquisa de opinião. Então, politicamente correto sempre está presente. Às vezes, não é uma coisa politicamente correta dizer que não gosta de ler; que livro não serve para nada; que leitura não vale à pena e tal. Então, há que se considerar isso na hora de avaliar, na hora de receber esse tipo de informação.

Um dado interessante que veio, mostra que entre as crianças com idade de dez anos, a leitura como prazer é o mais citado pelos entrevistados.

Um entre cada três brasileiros diz que conhece alguém que venceu na vida graças à leitura. É um dado importante, eu diria até que surpreendeu muita gente. Só que é um lado de um copo que tem água pela metade, esse é o lado cheio do copo, e o lado vazio, embora seja um pouco melhor do que se esperava, também exibe uma situação que não é das melhores. Ele diz, por exemplo, que dois entre cada três brasileiros não conhecem ninguém no país que tenha vencido na vida porque lia. É algo que merece registro. É preciso atentar em relação a isso.

No tempo livre, os brasileiros disseram que assistiam televisão. É a coisa que o brasileiro mais faz: ouve música, descansa, ouve rádio. Ler aparece entre as cinco primeiras respostas dadas pela população. Aparece mais que cinema, mais que teatro; mas é preciso ir à praia, ao campo passear e tal, mas é preciso também perceber que essas outras coisas não estão acessíveis quanto ao livro, quanto à leitura.

O Brasil tem 95 milhões de leitores. Como chegamos a esse número? Esse número é composto e representa 55% da população estudada, portanto, é composto por pessoas divididas nas várias regiões do país; é composto por pessoas com diferentes escolaridades. É importante citar que metade desses 95 milhões são pessoas que estão nas escolas e leram livros recomendados pelas escolas. Não significa que é um livro didático apenas, mas é um livro de poesia, de contos, de romance, de história e também livro didático.

Temos 48 milhões de pessoas que lêem e estando fora das escolas e se compõe da seguinte maneira: sete milhões estavam lendo a Bíblia. Quem são os demais? Sete milhões têm até a antiga 4ª Série do Fundamental; dez têm até a antiga 8ª; quinze, até o Ensino Médio; oito têm o Ensino Superior.

Onde estão os leitores de língua no Brasil? Os sete milhões estão no Norte. O Nordeste é o estado que tem números absolutos, é o segundo maior número de leitores, 24 milhões; 43 milhões estão no Sudeste; 13 milhões estão no Sul, e 7 milhões estão na região Centro-Oeste.

Um dado interessante. No Nordeste, metade da população se declara leitora. O Nordeste representa 25%. Um entre cada quatro leitores existentes no Brasil está no Nordeste. Aqui no Nordeste, 59% quem gosta de ler com freqüência; 50% dois em cada três que dizem que gosta de ler, afirmam que fazem isso com freqüência.

Dentre àquelas pessoas que têm o Ensino Superior, esse número chega a 82%, ou seja, leitores do Nordeste que terminaram a faculdade, oito em cada dez dizem que são leitores de livros.

Na classe A e B, esse número vai a 74% leitores. Isso é o que se chama de “Taxa de Penetração da Leitura”. É interessante notar que o Nordeste é a região do Brasil onde esse dado é o mais forte, lidera no país o índice de pessoas que têm formação universitária e a maior parte delas continuaram a ler. Nas outras regiões do Brasil isso foi diminuindo. É um dado importante na região.

O estudo mostrou, por exemplo, que está profundamente ligada a questão da leitura à renda, à classe social e à escolaridade. Mostra que dentre as pessoas que fizeram só a 4ª Série, menos de 40% são leitores. As pessoas que terminaram um Curso Superior, esse número chega a 92%. Isso mostra que, à medida que vão se acumulando anos de vida escolar o cidadão vai se tornando mais leitor. No entanto, traz um dado extremamente preocupante, porque mostra que 8% de todas as pessoas no Brasil que passaram pela faculdade deram adeus aos livros.

Na classe D e E a quantidade de pessoas que continuam lendo é de 44%. Na classe “A” sobe para 86%.

Se observarmos esse mesmo dado por idade, várias pessoas dizem o seguinte: “daqui a alguns anos, quando eu me aposentar, quando eu correr um pouco menos; acho que eu vou ler um pouco mais aqueles livros que estão parados na minha estante”.

O estudo mostrou outra coisa: isso acaba não acontecendo. Pode até acontecer para algumas pessoas, mas para o conjunto da população não é assim.

Então, crianças de menos de dez anos, duas em cada três estão lendo. Na hora que vai para onze, treze anos, por aí, sobe para 85%. Já melhora bem. É um dado bom. O ruim é olhar do outro lado e perceber que 15% dos nossos adolescentes não estão lendo livros. É um dado preocupante. Isso vai diminuindo. Quando passa dos 60 anos cai para só um entre cada quatro pessoas é leitora. Na hora que passa dos 70 anos esse número cai, só dois em cada dez pessoas.

Os leitores gostam de ler o quê? Quarenta e cinco por cento gosta de a Bíblia. Nós resolvemos considerar um dos gêneros, tamanha a presença da leitura da Bíblia no universo estudado. Depois da Bíblia vêm os livros didáticos, em seguida, os romances. A literatura infantil vem na seqüência, e a poesia - um dado que surpreendeu muita gente – porque ela aparece entre os cinco mais lidos pela população; desbancou, por exemplo, auto-ajuda, biografias, livros técnicos, os religiosos.

Os escritores brasileiros mais admirados quem são? Monteiro Lobato, que não há muitos anos por conta de questões judiciais, brigas, família, editora e tal, voltou a ser editado recentemente e lidera a lista.

A preferência por Lobato aparece em todas as faixas etárias, dos cinco aos setenta anos. Depois a gente sai por aí perguntando para as pessoas, e vai entender que realmente ele teve um papel importante. Por exemplo, o segundo livro que mais marcou a vida das pessoas, depois da Bíblia, evidentemente, aparece dez vezes mais, por sinal, é um livro que não existe: O Sítio do Pica-Pau Amarelo. As pessoas se referem a ele para falar de algum livro de Lobato que marcou a sua vida, mas ele não existe. Isso é significativo, por causa do seriado na televisão.

Eu perguntei, por conta de um blog que eu mantenho na internet e trata do assunto, para muita gente, inclusive para o Ministro Gil, para pessoas famosas, desconhecidas, empresários, artistas, jogador de futebol, lutador de Box: qual o livro que marcou você? Por quê? O livro mais importante do ex-ministro Gilberto Gil, que é um grande leitor, lê diferentes gêneros, é o livro “As Invenções de Narizinho”. Esse livro deve ter marcado alguns de nós aqui. Então, Lobato e seus livros estão fortemente presentes, enquanto importância nesse imaginário.

Entre os autores brasileiros mais admirados pelo público? Existem os autores de auto-ajuda, autores religiosos, autores de livros infantis, de clássicos e de livros contemporâneos. Só lembrando que Paulo Coelho é o segundo mais admirado brasileiro. Alguns clássicos brasileiros: Jorge Amado, Machado de Assis; temos poetas como Vinícius de Morais, Cicília Meireles, Drumont, José de Alencar. Infantis: Ruth Rocha, Ziraldo; Religiosos: Chico Xavier, Gaspareto; o bispo Edir Macedo tinha acabado de lançar um livro; Graciliano, Raquel de Queiroz, Veríssimo (pai e filho), Clarisse, Manuel Bandeira.

Entre os livros que as pessoas dizem que marcaram a sua vida também está presente. Existem vários blocos que atendem os vários públicos. Por exemplo, os infantis, desde “Os Três Porquinhos, Branca de Neve, Cinderela e o Sítio do Pica-Pau Amarelo” até livros que foram mais presentes na nossa adolescência e juventude, como: Iracema, Romeu e Julieta, Poliana, Gabriela Cravo e Canela, A Moreninha, Peter Pan, Vidas Secas, alguns contemporâneos como Carandiru, o Segredo ou livros que nos tocaram em algum momento: Ilha Perdida, Meu Pé de Laranja Lima, O Código da Vinci é muito recente.

As pessoas que lêem livros dedicam menos de duas horas, em média, a leitura no Brasil. Quem lidera isso? Em números absolutos podem ser poucos, talvez venha por aí um novo tipo de leitor. Os leitores gostam de ler em silencio, principalmente. Nove entre cada dez que tem mais de 40 anos fazem isso. Jovens começam a cada vez mais ler ouvindo música, aos dezesseis, dezessete anos isso explode. As crianças lêem cada vez mais assistindo a televisão.

Os leitores de textos na internet, embora sendo minoria, eles são os que dedicam mais tempo da sua semana à leitura, quase duas horas e meia.

Logo depois dos livros recomendados pela escola, vem o áudio-livro, duas horas e onze minutos, e começa a mostrar que tem alguma coisa nova acontecendo por aí.

As pessoas muito embora saibam com clareza, especialmente os estudantes que estão na escola têm que ler, no entanto, não atrelam a questão da leitura à obrigatoriedade. Quando se pergunta: qual a sua obrigação para ler um livro? As pessoas dizem o seguinte: 63% dizem que lêem por prazer, por gostar ou por algum tipo de necessidade, não há obrigatoriedade. O que é necessidade? De repente a pessoa está com um dilema existencial e quer ler um belo poema ou um livro que trate daquele tipo de coisa, porque vai fazer bem. Esse tipo aparece com mais força. Em seguida é “atualização cultural, conhecimentos gerais”. A exigência escolar aparece em terceiro lugar, 43% dos brasileiros leitores dizem isso. Motivos religiosos 26%; atualização profissional 23%.

Um dado que vale a pena registrar e direi o motivo. As mulheres brasileiras leitoras são mais que os homens, 55% dos leitores brasileiros são do sexo feminino; elas gostam de fazer mais isso no seu tempo livro, e fazem isso com maior freqüência quando sobra um tempo. Lêem praticamente todos os gêneros. Os homens aparecem na frente só naquela leitura mais pragmática, como um livro técnico, de sociologia, um livro de ciências políticas. Esse tipo de leitura, nós colocamos aqui numa única categoria, as outras dez as mulheres dão show de bola nos homens.

Por que é interessante esse dado entre outras razões? Quando se pergunta para o leitor de hoje: quem era a pessoa que mais te influenciava ou mais te influenciou a ler quando estava nesse processo? Elas respondem: “a minha mãe”. A mãe aparece na frente do professor, e o pai aparece em terceiro lugar. Quando juntamos tudo isso, percebemos que o Brasil é um país de uma população de leitores jovens. A mulher tem essa proximidade bem maior que os homens em relação aos livros, portanto, elas são as grandes influenciadoras.

Quando se pergunta para as crianças de hoje, três em cada quatro crianças falam o seguinte: “minha mãe me influenciou para que eu me tornasse um leitor”.

Um dado interessante. Aqui no Nordeste como o no Norte, as mulheres tem um papel mais relevante, percebe-se que elas estão mais presentes na formação dos futuros leitores.

O que influencia escolher para se comprar um livro pelo seu tema? Sessenta e três por cento dos brasileiros compram por conta do tema; 46% por conta do título do livro. Mas aparece um número interessante, 43% compram por conta daquele famoso boca-a-boca, dica de outra pessoa. Tipo, dica da vendedora da Livraria; dica de um professor na escola; dica de um amigo. Por exemplo, posso dizer que li um livro e gostei, então, a pessoa compra.

Essa forma de chegar até a leitura aumenta a participação conforme a renda e a escolaridade, ou seja, as pessoas lêem mais. Mas as pessoas que têm menor escolaridade são levadas um pouco mais pelo autor. O que não deixa de ser uma escolha inteligente e pragmática. Eu li um livro do autor fulano de tal. Daí se interessa por pegar outro livro daquele cara, porque não vou correr o risco tanto de me decepcionar, de me frustrar. Então, é uma escolha. Não tendo um conhecimento ou um pouco mais de informações, que é pragmática e é acertada para muita gente.

Como os leitores lêem? A maior parte das pessoas lê apenas trechos ou capítulos de um livro, 55% disseram isso. É importante notar que aqui se encaixa crônica, poesia, livro técnico, coletâneas, a Bíblia e algum tipo de leitura que permite isso.

Livro inteiro de uma só vez. Trinta e oito por cento lêem assim; 16% lêem o mesmo livro mais de uma vez; 11% partes desse livro mais de uma vez; 11% pulam páginas; outros 7% mais de um livro ao mesmo tempo. Enfim, existem as várias formas, e o leitor sempre tem esse direito.

As pessoas lêem principalmente em casa, em seguida a sala de aula. A Biblioteca aparece com apenas 12%.

Um dado que a gente sempre se pergunta quando esse tipo de pesquisa é mostrado, e o meio de transporte coletivo? “Uma vez viajei pelo exterior e tal, vi que o pessoal lendo no metrô e tal”. Aqui entre nós não existe muito isso, é algo feito em apenas por 5% da população: ônibus, metrô e o transporte coletivo.

Influência. Quando as pessoas perguntam para o leitor de hoje: Quando você era criança e estava virando leitor, lembra-se de algum adulto lendo para você? Quando se faz essa pergunta para quem é leitor, dois entre cada três respondem que “sim, lembram da mãe, do pai, da professora, da avó, do irmão mais velho”. Mas quando se faz essa mesma pergunta para quem não virou leitor, isso se inverte, dois em cada três falam que “não, nunca se lembra disso ou dificilmente via alguém lendo”.

Para quem atua no mercado, existe um dado interessante, perguntamos: você ganhava livros de presentes quando estava virando leitor? Entre os leitores de hoje, um pouquinho mais da metade desse tipo de leitor dizia que “sim, ganhava”. Quando se faz essa mesma pergunta para o não-leitor, aí o número dispara, e 85% falam: “Nunca ganhei um livro nessa fase da minha vida”. Então, talvez esses dados nos animem a fazer algumas campanhas, algumas abordagens.

Dia 12 de outubro, Dia da Criança, São Paulo comemora o Dia Estadual da Leitura. Existe uma lei a ser aprovada no Congresso para acontecer nacionalmente. A gente precisa estar ligada para isso, porque o Brasil é o 8º maior produtor de livro do planeta, só que a metade deles nas mãos de 10% da população apenas. Um entre cada cinco livros que estão nas casas das pessoas, estão nas mãos de 1% só da população. É um tipo de concentração bem mais grave que a concentração de renda no nosso país. Quase uma entre cada dez casas no Brasil não tem um livro, não sabe nem a cor de um livro. Esse dado é preocupante. Em média, cada casa tem aí 25 livros.

Como as pessoas chegam aos livros? Emprestados por outras pessoas. Lidera junto com as livrarias em primeiro lugar, é a via de acesso para 45% das pessoas, livros comprados e livros emprestados. Depois disso vêm os livros emprestados por bibliotecas municipais e escolares. Em 4º lugar vêm os livros presenteados. Daí a gente percebe que tem alguma coisa começando a mudar no meio desse caminho, 24%, depois vem os livros distribuídos pelos governos, pelas escolas em 20%, é um dado relevantes.

Quem faz o quê? A classe “E” compra pouco livro, só 27%. A classe “A” 73%. Quando acontece o empréstimo de pessoa a pessoa, isso é uma coisa que está presente, com exceção da classe “A”, mas em todas as classes sócias as pessoas têm essa prática do empréstimo de livro. É aí que acontece algo que vem ajudando a mudar o cenário da leitura no país.

Se na classe A, nós temos só 3% das pessoas que chegam aos livros porque o governo distribui, na classe D esse número aumenta até chegar a 40% na classe E. É o papel das políticas sociais do estado brasileiro.

As pessoas começam a chegar aos livros porque compram só depois dos 25 anos. Lógico que está numa idade da População Economicamente Ativa (PEA) um pouco mais consolidada. Dos cinco anos até os vinte e poucos anos, esse canal é principalmente a biblioteca, depois a moçada some da biblioteca. É uma idade escolar que chega aos livros porque o governo distribui.

O Brasil tem, em média, número de livros comprados pela população de 1.2 livros por habitante/ano. Se a gente considerar só aquele que compra, e são 36 milhões de brasileiros que compram livros, nós temos uma média de 5.4 livros adquiridos por ano.

Lembrado que para conseguir esses dados os pesquisadores não foram na casa dos leitores pedirem nota fiscal, não foram na livraria confirmar.

O importante que se diga é que o consumo cresce conforme a renda e escolaridade da população.

Por que as pessoas não lêem? O Brasil embora tenha 95 milhões de leitores, é a parte cheia do copo d’água, existe a outra parte vazia que é muito séria. Setenta e sete milhões de pessoas, ou seja, mais que a maior parte dos países do mundo não ler. Quando perguntamos, eles não tinham lido nenhum um único livro nos três meses anterior ao estudo. Uma parte disso, seis milhões por aí, ainda estava lendo a Bíblia. Quatro milhões e meio de pessoas desse público não lêem nada, mas também lêem a Bíblia.

Os não-leitores são pessoas mais velhas e tem baixa ou nenhuma escolaridade, eles estão na pirâmide social por classe e por renda. Por que as pessoas dizem que não lêem? A maior parte fala que não lê porque lê muito devagar. Vinte e oito milhões de brasileiros dão essa resposta. Doze milhões dizem: “eu não compreendo a maior parte do que eu leio”; outro tanto, 20 milhões falam: “eu ano tenho paciência para ler, por isso que eu não leio”; 12 milhões falam: “eu não consigo me concentrar”.

Se pegarmos todas essas informações e traduzirmos de outra maneira, a única forma seria: analfabetismo funcional. As pessoas tendem a responder algum tipo de explicação, mas se traduz em analfabetismo funcional.

Quem não lê por deficiência física como a baixa visão. Existem 15 milhões (não totalmente cegas), mas com baixa visão, e que acaba não lendo. No entanto, nesse índice existe uma população muito grande, quase metade, que não tem nenhum tipo de problema. E por que elas não lêem? Quem pode ler não lê principalmente porque diz que não tem tempo para fazer isso. Vinte e tantos milhões de pessoas falam isso. Dentre eles existem os que não são alfabetizados ainda, ou são crianças que ainda não dominam as habilidades. No entanto, existem outros 21 milhões que dizem que não lêem por desinteresse, porque não gostam mesmo de fazer isso. Doze milhões preferem outras atividades. Só 7% falam que não lêem porque não têm dinheiro. Isso pode ser traduzido como: o livro é caro; estou sem dinheiro agora; estou desempregado, enfim, algumas questões ligadas a isso. Alguns por falta de biblioteca, outros porque não têm costume.

Com isso, o Brasil está produzindo nos dias atuais o seguinte indicador: quase cinco livros lidos por habitante/ano, para ser exato: 4.7. É importante notar que estão dentro aqui sim os livros indicados pela escola. Não são apenas os didáticos.

O número de livros lidos fora da escola é 1.3; dentro da escola 3.4, ou seja, a maior parte do que se lê no Brasil, desses 95 milhões de leitores, é por conta de a escola falar: “tem que ler”, ou então falar: “leia esse livro que é bacana”, ou criar estratégias para que isso aconteça.

O homem lê 4.1 livros por ano. A mulher lê 5.3. Na escola lê mais ou menos a mesma coisa. Onde está a diferença? Quando pára de estudar, aí o homem se distancia dos livros e as mulheres continuam lendo. É mais que o dobro, fora da escola, mulher e homem.

Por região. Nós temos um número que mostra uma diferença de leitura por região, eu falei que era 4.7 o Brasil. O Sul aparece com 5.5, o estado que mais lê; Sudeste com 4.9; Centro-Oeste com 4.5. A região que tem o índice mais baixo é o Norte com 3,9. O Nordeste aparece com 4.2 livros lidos por habitante/ano.

Onde está o grande problema? Está fora da escola. Se analisar cada uma das regiões, vê-se que o Norte e o Nordeste, entre os livros que são sugeridos nas escolas, lêem mais que o Sul, Sudeste e o Centro-Oeste.

Com relação aos livros e os professores que já deixaram a escola, aí acontece uma situação que não é das melhores. No Norte, por exemplo, esse número de livros lidos por habitante ano cai para 0.2. Se comparar com o Sul, que é 1.8, o Sudeste que é 1.9, a diferença chega a oito ou dez vezes mais a leitura. O Nordeste tem um índice de 0.6 fora da escola. Aí despenca um pouco.

Esse mesmo recorte visto por idade mostra: até aos dez anos - e talvez estejamos derrubando um dos velhos mitos -, nós adultos, do alto da nossa sabedoria, às vezes a gente chega e diz assim: você não diz nada, não quer saber de ler, só quer saber de videogame, internet, MSN; a gente que lê, lia, e tal. O estudo, no entanto, mostrou outra coisa, não é bem assim, pelo menos falando de média e não de casos isolados. Até os dez anos esse índice de leitura fica em torno de sete livros lidos por habitante/ano. Talvez alguns digam: “ah, mas aqueles livrinhos fininhos de vinte e poucas páginas”... É o livro apropriado para essa faixa etária. Até os 11 aos 13 anos esse número passa de oito livros lidos por adolescente ano. Depois dos 14 até aos 17 se estabiliza, fica entre seis e sete livros lidos por habitantes ano, são livros maiores, 200 páginas ou mais.

Onde começa a acontecer o problema? Depois dos 18 já cai para quatro, e um pouquinho. Depois dos 25 cai para três e alguma coisa. Aos 50 diminui pouco mais; depois dos 60 cai para menos de dois; depois dos 70 cai para um livro lido por habitante/ano.

Escolaridade. Quem tem o ensino superior concluído lê duas vezes mais do que aquele que tem só até a 4ª Série do Ensino Fundamental. Isso visto por outro ângulo, quem está na escola lê o dobro de quem já saiu dela.

Quem tem um salário mínimo por renda lê menos de quatro livros por habitante/ano. Quem ganha mais de dez fica em oito, mais que o dobro. Esse é outro dado que tem muito a ver com a questão de qualidade de bibliotecas e ausência de livrarias em pequenas cidades e em certas regiões do país.

Quem mora em cidade grande, com mais de 500 mil habitantes lê mais do que quem mora numa cidade pequena. Quem mora em cidade com menos de 50 mil habitantes são os que menos lêem no Brasil.

As pessoas normalmente perguntam: O Brasil lê mais ou lê menos? Piorou ou melhorou? A primeira coisa é dizer que mudou a metodologia. Fizemos uma edição dessa pesquisa, em 2000, e a edição mostrava alguns dados. Foi feita com quem? Só com pessoas com mais de 15 anos de idade, elas tinham pelo menos seis anos de escola. Não pegava crianças de cinco, seis anos; não pegava que estava na Educação de Jovens e Adultos. Não ouvia os não-leitores. Por quê? Quais as razões de você não gostar de ler? Era preciso perguntar para eles.

Na pesquisa atual não, a metodologia foi construída para a América Latina e o Caribe, com um organismo ligado a Unesco. O Brasil pediu que isso fosse feito e foi o primeiro país a incrementar, mostrou que no mesmo grupo social, ou seja, gente com mais de 15 anos de idade, com mais de três anos de escola, lá atrás, no ano 2000, lia 1.8 livros por habitante/ano. Acostumamos a dizer que esses 1.8 é o índice de leitura no Brasil. Não. Um ponto oito é o índice de leitura de pessoas com mais de 15 anos e com mais de três anos de escola. Esse mesmo grupo deu o seguinte dado oito anos depois: 3.7, ou seja, aumentou.

E aí, a gente está vivendo num país cor-de-rosa? Não é exatamente assim. Têm algumas razões para isso ter acontecido. Por exemplo, a educação no Brasil está acontecendo de uma maneira importante, ainda temos críticas, temos muito que avançar, não se pode negar isso. Nós temos mais de 60 milhões de pessoas nas escolas. Mas principalmente ocorre uma coisa: as pessoas no Brasil que tem a formação do Ensino Médio o número aumento. Em 2000 eram 28 milhões; 2007 temos 40 milhões. Nós ganhamos 12 milhões de pessoas com Ensino Médio.

Ensino Superior. Tínhamos dez milhões de pessoas com a faculdade concluída. Hoje nós temos 15 milhões. São dados que ajudam a tentar entender, mas são suficientes? Não. Eu diria que o Programa do Livro Gratuito para o Ensino Médio, que começou agora, em pouco tempo, o Nordeste começou um pouco antes, mas no Brasil como um todo começou recentemente, é um dos responsáveis de alguma maneira, principalmente nessa faixa etária.

Por fim, dizer algo importantíssimo que tem acontecido na atual década: a mobilização maior da sociedade, ou seja, mais gente, mais escolas, mais universidades, mais empresas lançando editais para apoiar projetos de leitura. Quem de vocês atua nessa área sabe que era uma loucura chegar cinco, dez anos atrás para uma empresa e dizer: “Eu estou com um projeto legal de leitura, você poderia apoiar e tal”. O cara olhava e dizia: “Mais um sujeito louco que está aparecendo aqui para pegar o meu dinheiro, quando na verdade eu quero investir em outras coisas que me dê mais resultado”.

Hoje esse quadro já começa a se inverter de maneira muito interessante: mobilização da militância, os livreiros, os editores, os governos municipais, os estados, local, tudo isso contribuiu para mudar esse quadro. Mas não é nada cor-de-rosa. É preciso avançar e muito.

Essa pesquisa foi publicada recentemente na forma de um livro, chamada “Retratos da Editora do Brasil”; está disponível na bienal. Mostra por classe social, idades, por diversos recortes de jornais e ainda tem muito que andar. Parece que a gente está no caminho certo, talvez falte um pouquinho de velocidade. Mas, eventos como esses mostra que a gente está num bom caminho, e que muita gente está querendo fazer isso acontecer. Obrigado. (Aplausos).

SRA. MILEIDE FLORES: Quem agradece somos nós.

A próxima Mesa será a de “Organização Política das Categorias dos Estados Nordestinos”. Pensou-se em discutir o mapeamento das instituições governamentais ou não e das empresas de setores editoriais e livreiros, da necessidade de criação em todos os Estados, das Câmaras Estaduais do Livro. É um tema em discussão no Ministério a questão das Câmaras Regionais, respeitando, é claro, as nossas particularidades culturais.

A importância da participação de Secretários de Cultura e Educação da região na avaliação contínua das ações e recursos governamentais voltadas para a leitura. Mobilizando as representantes regionais, no Nordeste, nessas câmaras; mapeamento do mercado consumidor; mapeamento das bienais, feiras e outros eventos literários nacionais e internacionais.

Então, essa Mesa foi composta com esse pensamento. Não quer dizer que ela seja fechada a esse pensamento. Está aberta a amplos debates.

Agradecemos a presença dos representantes de todos os estados nordestinos. Esse é o nosso grande objetivo.

Registrar a presença da Elza Ferreira, assessora de comunicação da prefeitura de Maracanaú. Ao perceber alguns problemas no seu município, ela entrou com o projeto de Agente Comunitário da Leitura.

Composição da Mesa: Organização Políticas das Categorias dos Estados Nordestinos, o Castilho, é Coordenador do Plano Nacional do Livro e Leitura; Sandra Lima, Presidenta da Câmara Cearense do Livro; Cinéas Santos, Presidente da Fundação Quixote e Salão do Livro, do Piauí; Alberto Donato é da Câmara Baiana do Livro, e será o mediador nesta Mesa.

SR. ALBERTO DONATO: Boa-tarde a todos e a todas. Como estive na convenção anterior, hoje estou percebendo que houve um crescimento muito grande de participantes. Parabéns ao pessoal de Fortaleza por essa luta.

Passamos a palavra para a Sandra Lima, Presidenta da Câmara Cearense do Livro.

SRA. SANDRA LIMA: Bom-dia a todos novamente. Em maio iniciamos a definição da pauta para este trabalho, quando fomos convidados a participar de uma videoconferência. Como não conhecíamos o nosso mercado, ou seja, a nossa cadeia produtiva, daí se perceber a necessidade de se fazer esse mapeamento. Eu falo desde a produção dos autores, inclusive tem até uma instituição de produtores independestes; nós temos as gráficas, as editoras.

Existia no Ceará 687 editoras, na verdade, elas não são vistas, tipo fantasmas. A partir deste conhecimento definiremos alguns rumos concretos. Nós estamos procurando a “velocidade” que o Galeno acabou de mencionar.

Percebemos que os nossos problemas são praticamente iguais, só muda o fundo, mas a figura é a mesma. Ou seja, não nos conhecermos; não conhecermos a nossa produção, literatura infanto-juvenil, livro de tal professor; como estão as nossas tiragens atualmente; existe um lançamento; vende-se cem ou duzentos exemplares e os demais ficam encalhados na livraria; consignação e o autor não consegue receber. Então, é uma problemática muito delicada. Daí a importância do mapeamento.

Há dois anos nós conseguimos fazer um censo da indústria gráfica aqui, e agora nós vamos incluir “os estados”, para sabermos o que temos e o que somos, porque até então não sabemos.

Portanto, nessa discussão, nós queremos receber as contribuições de vocês para se buscar soluções.

A Câmara Cearense do Livro é uma instituição recente, foi fundada pelo meu marido, e faleceu há dois anos. Viemos de São Paulo. Quando chegamos aqui, ele percebeu essa necessidade de se criar uma instituição como uma Câmara que trouxesse uma solidez de focar os problemas editorais. Essa é a finalidade da Câmara Cearense do Livro.

Com o seu falecimento, eu assumi a Câmara. É um processo lento porque não é a minha área, daí receber a contribuição dos amigos e amigas. Como eu trabalhei na Associação Brasileira da Indústria Gráfica e no Sindicato da Indústria Gráfica, trouxe esse know how, também por ser editora há dez anos e por participar desse processo das dificuldades que se tem como editor, então, ficou mais fácil para mim esse entendimento num todo.

Eu não consigo imaginar essa cadeia solta, mas toda amarrada.

O Sindicato da Indústria Gráfica, no nosso estado, é muito atuante, tem todo apoio da FIEC (Federação da Indústria do Estado do Ceará). Qualquer decisão tomada aqui o Sindicato estará nos apoiando.

Quem participa da Câmara. Existe um Conselho Fiscal, um Conselho Deliberativo; temos uns quarenta a cinqüenta editores associados.

O bom aqui do Ceará é a amizade que nós temos, todos se conhecem, portanto, existe uma interação entre nós.

Queremos sair daqui com algo concreto para um futuro bem próximo gerarmos uma convenção e transformar tudo isso em políticas públicas. Essa é a nossa idéia, o nosso foco. Obrigada. (Aplausos).

SR. ALBERTO DONATO: Obrigado, Sandra. Passamos a palavra para o Professor Sinéas Santos.

SR. SINEAS SANTOS: Bom-dia. Irmãos e irmãs, essas questões comentadas aqui sempre me preocuparam, e já faz algum tempo. Eu venho discutindo isso com a Tarciana, com alguns companheiros nas minhas andanças. As questões praticamente são as mesmas, elas são nacionais. Mas no Nordeste elas ganham características bem mais marcantes.

O maior de todos os problemas, e não tenho receio de afirmar: problema da distribuição. Um país com as dimensões que nós temos, é complicado para se veicular uma mercadoria, cuja rotatividade não é a do sabão em pó nem a do macarrão. O processo do livro é bem mais lento e completo, efetivamente. Então, a distribuição é o grande nó.

No Brasil existem duas ou três editoras que têm um sistema de distribuição eficiente e funciona relativamente bem.

A segunda questão que eu acho extremamente grave é a do custo da impressão. Nós trabalhamos com edições mínimas, ínfimas. Quem trabalha nesse ramo sabe que quanto menor a edição, mais elevado o custo. Nós trabalhamos com edições muito pequenas.

Temos uma questão muito séria, é adoção do livro na escola, do livro produzido no nordeste. Isso é extremamente grave, porque a indústria do sul e sudeste monopoliza praticamente a produção do livro didático, a ponto de desconhecer as realidades regionais, e isso vai está na contramão de tudo que estamos falando aqui.

O MEC trabalha no sentido de regionalizar, mas quem edita o livro e impõe uma visão de mundo para a criança da escola do nordeste não está produzindo livro no Nordeste.

Eu passei por uma experiência muito curiosa. Ano passado a Editora Atlas lançou um livro chamado “Tudo é linguagem”, são três autoras da Universidade de São Paulo. São quatro volumes, e corresponde de 5ª a 8ª Série. No terceiro volume há uma seção chamada “Memórias”, é uma espécie de apêndice. E lá estão alguns autores que produziram os textos em caráter memorialista, mas transfigurados com caráter literários. Gilberto Gil está lá; Nilton Nascimento esta lá; Manuel de Barros, o Patativa do Assaré. E não sei por que cargas d’água eu estou lá no meio dessas feras, inclusive, estou perto do Graciliano Ramos, que eu o amo demais, por isso estou honrado.

Mas ao mesmo tempo aquilo me incomodou muito, porque no Piauí existem autores que eu não tenho a competência de amarrar as suas sandálias. Então, por que eu estava ali e não outros determinados autores. E comecei a me questionar e a me angustiar de certa forma. E aí aconteceu um fenômeno estranho. A imprensa procurou a me procurar, as escolas procuram a me procurar, os meninos a me entrevistar, as emissoras de televisão, e comecei a me sentir incomodado com aquilo porque era de um provincianismo a toda prova. Mas depois eu fiz uma reflexão e conclui que era a primeira vez que um autor do Piauí aparecia num livro nacional. Isso para a auto-estima desse povo vocês estão longe de imaginar algo que representa. Você pega um livro didático da literatura brasileira, quem são os autores cearenses que aparecem lá? A literatura cearense só vai até Alencar. A literatura do Pernambuco, Manuel Bandeira e João Cabral de Melo Neto. A literatura da Paraíba é José Lins do Rego; e do Sergipe, eu nem lembro quando foi à última vez que eu ouvi falar de algum autor do Sergipe, se é que ouvi alguma vez. Por isso é que nós queremos construir uma oficina. Mas que tipo de oficina nós vamos construir negando a nossa existência até física? No caso do Piauí a situação é tão grave, que já houve um livro lançado no Paraná, por tal Ari Herculano, que o Piauí não constava no mapa. Isso mostra que nós não existimos na literatura, nós não existimos na história, é só pegar os livros de história utilizados nas escolas e verão que não existe a Batalha do Jenipapo, onde morreram centenas de cearenses que estavam combatendo com os piauienses. Foi no Piauí que se garantiu a unidade nacional. Essa Batalha do Jenipapo não consta nos livros didáticos nem de 3º Grau.

Então, nós não estamos na literatura, não estamos na história e, acidentalmente, não estamos nem na geografia. Isso tem implicações terríveis no processo de formação da nossa identidade.

O nosso livro não é adotado na escola, porque as grandes editoras monopolizaram o mercado de uma forma muito esperta. Para cada dois livros produzidos para o aluno é produzido um livro para o professor. Só que o aluno vai pagar, porque esse livro tem custo.

O livro chamado “Manual do Professor”, eu considero a maior de todas as pragas existentes na educação brasileira, porque já traz o texto selecionado pelo autor; as questões formuladas pelo autor e as respostas que o autor crer conveniente. O papel do professor é administrar esse livro em sala de aula, ele não precisa fazer nada. Ele abre o livro, manda o aluno ler e, se porventura o aluno ousar discordar da resposta que existe naquele Manual, mesmo que esteja correta a interpretação do aluno, não vale.

Eu pergunto a vocês: E nós entramos onde? Não bastasse isso, nós não nos conhecemos. O nordeste não sabe onde fica o nordeste. Nós não nos conhecemos. Nós estamos aqui olhando uns para os outros, alguns pela primeira vez. Nós nunca nos vimos. Estou vendo o Tarcísio, e o conheci no Pernambuco há trinta anos fazendo esse negócio e, de repente, eu não sei o que o Tarcísio está fazendo mais; se o Tarcísio não sabe se eu existo.

Encontro aqui o Adalberto, que tem uma belíssima gráfica em Imperatriz, e não sabia da existência desse rapaz, embora já nos conhecêssemos de outros carnavais, mas eu não sabia que esse cara estava mexendo com livro nem que tinha uma editora de tamanha importância. Ou seja, além de não termos um espaço institucional, nós não temos uma linha de comunicação, nós não temos mecanismos de nos conhecermos.

Para complicar mais, os nossos autores contemporâneos não têm espaço nas feiras realizadas nem nos nossos estados. Eu realizo uma feira no Piauí e chamo as pessoas que eu, supostamente, acredito que sejam aquelas que os participantes da minha feira querem conhecer. Eu percorro todas essas feiras, eu percorri todas, os autores são os mesmos; alguns são meus amigos amados e amáveis. Lá está o Moacir Scliar - está em todas; Ignácio de Loyola Brandão, em todas; Affonso Romano de Santana, todas; Antônio Cechin, todas. Eles estão nas nossas festas. Nós não estamos nem na nossa festa nem na festa deles. E quando é que nós vamos ter uma cara? E por que eu sou tão bom como qualquer um deles ou até melhor! Eu não sou modesto não. Mas eu sou tão bom ou melhor do que a maioria deles. Mas esse cara mora no Piauí. Quem é esse cara? O que ele faz? Ele vai atrair dez pessoas para ouvi-lo? Seguramente, não!

A questão é: Por que não criamos uma instituição mínima, leve. Eu insisto no leve porque quanto mais burocrático mais a coisa não anda. Mas uma instituição mínima e leve. Primeiro, que nos cadastre. Todos que tiver numa editora com CNPJ, nós vamos colocar o cadastro dessa figura. Vamos formular um catálogo geral. O que você tem? E vamos fazer essa ligação nas nossas feiras. Nós temos cadeira cativa! Feira do Ceará, e alguém do Maranhão, do Piauí e do Rio Grande do Norte para desfrutar o espaço com os outros que vêem de fora dizer as mesmas coisas que nós ouvimos quinhentas vezes.

Nós precisamos bombardear as Secretarias de Educação e de Cultura com e-mails. Vamos criar boletins, vamos criar uma revista, vamos criar mecanismos para o nosso produto ser conhecido! Ao contrário de ser uma atividade penosa, dolorosa e que a gente só não larga porque livro e cocaína vicia. Muito Obrigado. (Aplausos).

SR. ALBERTO DONATO: Obrigado, Sineas. Passamos a palavra ao Castilho.

SR. JOSÉ CASTILHO (PNLL): Primeiro lugar, minha solidariedade ao Professor Sineas. Eu creio que é exatamente através da indignação que as coisas se movem. Então, a partir disso, colocarei uma posição que não é muito comum nas minhas apresentações dos últimos anos, como Secretário-Executivo, para vocês terem uma idéia, de falar um pouco a partir do Ministério da Cultura, apenas.

O Jéferson Assunção nos solicitou para acompanhar o Ministro numa missão também muito importante, com a possibilidade de se criar um plano dos países da língua portuguesa: O Livro e Leitura.

Então, preparei algumas questões que eu acho importante.

Primeiro. O Plano Nacional do Livro e da Leitura é o foco desse debate, com a presença muito forte da sociedade, mas, na verdade, o Ministério da Cultura tem primado nessa gestão por um debate muito importante com a sociedade. É um debate que ao contrário como foi divulgado no início da primeira gestão do governo Lula, ainda com o Ministro Gil, esse instrumento de ouvir a sociedade de maneira permanente, qualifica as políticas públicas e, também, dá aquela idéia que predominava, infelizmente, em períodos anteriores, de que a cultura poderia ser feita nos gabinetes em Brasília e depois descer pela nação. O que se mostrou de maneira desastrosa e uma desarticulação impressionante no Ministério.

Na área do Livro e Leitura começou com o desmonte do governo Collor, do Instituto Nacional do Livro; passou pela verificação da criada Secretaria Nacional do Livro, que tentou cumprir, de certa forma, com esse trabalho até que em 2003, 2004 e 2005. Não mais ouvimos falar de Livro e Leitura nem qualquer escrito dentro do Ministério da Cultura.

Essa requalificação da análise do Livro e da Leitura está passando por esse instrumento de diálogo.

Anteontem, eu tive a oportunidade de assistir, em São Paulo, o Teatro Cultural comandado pelo próprio Ivo Ferreira, com quinhentas pessoas. Foi um diálogo muito franco e importante por parte do Ministro, o que incentiva a colocar, com toda clareza, as questões solicitadas. Está previsto o Ministro passar por todos os estados, no sentido de dialogar sobre todos os programas de Cultura do Ministério.

Do ponto de vista da questão regional, lembrar que o Ministério da Cultura está adicionando seus programas, sempre dentro do sentido de ter o diálogo como instrumento de qualificação.

Primeiro. Na elaboração das políticas públicas há uma constante realização de Seminários Nacional de Cultura, e passou por quase todos os Estados.

Segundo. Estão sendo solicitados para participar das fases de elaboração a Avaliação e Acompanhamento das ações e do “Mais Cultura”, são as oficinas de Cultura dos estados. Um dos capitães dessa iniciativa e percorreu os estados brasileiros é o cearense Fabiano Santos.

Então, o acompanhamento, a elaboração, a avaliação das ações do “Mais Cultura” a serem aplicados em 2009 e 2010, já que as aplicações em 2008 são apenas parciais, iniciais desse processo, estão sendo requalificadas com os estados.

Está sendo estudado no Ministério a “re-estadualização das ações do livro e da leitura”. Nesse contexto, vai caber aos estados o planejamento e a execução das ações de acordo com as realidades locais. Os estados lançaram os editais para licitação, o que certamente vai ter um impacto dentro da economia regional. Com a habilidade de se construir editais adequados, a começar pelo governo federal, passando pelos estados e, também pelo setor produtivo, talvez comece a envolver algumas questões com absoluta justiça, que o Professor Sineas aponta: atender a bibliografia local e os autores locais.

Lembro a vocês que está em jogo mais de dois bilhões de reais para as compras de livros para as bibliotecas e sua modernização, etc. É um número até banal para a Educação, mas para o Ministério da Cultura é algo absolutamente inédito.

Então, o Fundo da Estadualização é importante se for acompanhado e participado pelos agentes locais de todos os estados brasileiros.

É importante saber com relação a outras possibilidades que concorre com o número do orçamento do Ministério da Cultura, com financiamentos de atividades culturais, inclusive do Livro e da Leitura, principalmente pelo Programa Mais Cultura.

Por exemplo, em 2001, a captação de recursos incentivados pela Lei Rouanet, chegou a um máximo, em toda a sua existência, de trinta milhões de reais para a área do livro e da leitura, e teve a isenção fiscal. O que é sempre importante frisar, e é o óbvio, que isso é dinheiro público. A Lei Rouanet é isenção fiscal, é renúncia fiscal, é renúncia de pagamento de impostos e vai para o financiamento da Cultura. Em 2006, essa captação saltou para noventa milhões de reais. Em 2007 subiu para cento e cinco milhões de reais. Em 2008, até julho, já tinha gastado cinqüenta e dois milhões de reais. Desse montante, se pegar os montantes de 2007, dos cento e cinco milhões de reais captados, noventa e quatro milhões foram para edição de livros. Até julho de 2008, dos cinqüenta e dois milhões captados, quarenta milhões foram para edição de livros.

É uma forma de financiamento, muitas vezes, até distorcida dentro das finalidades da Lei Rouanet, mas é poderosa. Não esqueçam dessa forma de financiamento nessa reorganização institucional, nessa rede que está sendo proposta pela Sandra (do Mapeamento), quanto pelo Professor Sineas, de em muitos locais patrocinarem a produção local, porque isso é um instrumento poderoso. É um dinheiro que não sai do bolso do patrocinador. No caso da edição de livros e de eventos culturais em relação ao livro, recebem um benefício de 100% de dedução no Imposto de Renda.

Então, um dos movimentos políticos a ser feito não apenas em termos de governo federal, mas também da região, essa importante fonte de financiamento, parece-me ser a Lei Rouanet.

As esferas do governo federal que estão trabalhando com o livro e a leitura. Como tudo foi praticamente dizimado da “Era Collor” até aos governos posteriores, nós estamos exatamente numa fase de reconstrução dessa institucionalidade. Essa mesma desarticulação constatada na região Nordeste está no Brasil. Quando se constata uma articulação em determinado estado em relação às questões institucionais em uma determinada área da cultura, tão importante e tradicional como é a política pública da leitura, tem que ter a ocupação do espaço por aqueles que acabam determinando o que deve ser feito no âmbito nacional no Ministério da Cultura e, às vezes, até em outros Ministérios. No caso, houve uma ocupação do espaço com tendência de políticas editoriais de publicação de livros, com privilegiamento de alguns lugares na área do livro e da leitura, pelas grandes editoras que acabam ditando o espaço que o Ministério não ocupava. Então, nós estamos resgatando essa institucionalidade.

Então, é importante esclarecer qual é o papel da Biblioteca Nacional nesse contexto; qual é o papel da Coordenadoria Geral do Livro e Leitura; qual o papel do Plano Nacional do Livro e Leitura dentro disso.

Do ponto de vista do diálogo institucional que nós devemos ter com o Ministério da Cultura, a Fundação de Biblioteca Nacional ainda responde legalmente por todas as ações do livro e da leitura no Brasil.

O que se constatou dentro da questão ainda do Ministro Gil, e continua na gestão do Ministro Juca Ferreira, é que a Biblioteca Nacional ficou, dentro das suas atribuições, aberta para um novo momento do livro e da leitura no Brasil. Nós estamos já com um movimento crescente, bastante interessante e novo, do ponto de vista da União, em torno do Plano Nacional do Livro e da Leitura, com metas ambiciosas, mas que se refletem num crescimento - e aí eu falo em nível nacional e não internacional - da indústria editorial, a mais cotada, na última pesquisa, inclusive com o índice da lucratividade; se reflete num mundo exponencial de feiras e encontros de livros de leitura pelo país todo; se reflete principalmente nesse regresso.

Nesse novo mandato do Presidente Lula, dos quatro bilhões e setecentos milhões de reais que o Ministério da Cultura tem para o Programa Mais Cultura, mais da metade disso é para o livro e leitura.

Eu desafio a qualquer um de vocês a achar uma única linha sobre livro e leitura, em qualquer documento do Ministério, a não ser as referências honrosas a Biblioteca Nacional, e eu digo que é um salto muito grande.

Então não há apenas cultura. Há programas visando à institucionalização, há também um programa visando à recuperação das bibliotecas, centrando, portanto, no leitor e no acesso coletivo às obras dos nossos autores. Enfim, há toda uma reformulação.

Para que isso pudesse ocorrer, ou seja, criar a Biblioteca Nacional, dentro dessa dificuldade do novo momento, a Coordenadoria Geral do Livro e Leitura, foi puxada, digamos assim, provisoriamente, até que se tivesse uma nova institucionalidade, para o gabinete do Ministro, para a Secretaria Executiva do Ministério.

Então, o Jéferson e eu estamos justamente articulando essas políticas; fazendo execução de ações da modernização das bibliotecas. A Biblioteca Nacional, cada vez mais, passa a assumir fortemente o seu trabalho essencial, que é a conservação do patrimônio, fiscalização do acervo, sistema nacional de bibliotecas públicas, enfim, em execução das importações e modernizações das bibliotecas do Programa Mais Cultura.

Quanto ao Plano Nacional do Livro e Leitura, pela repercussão e absoluta presença que está tendo em muitos espaços em estados brasileiros, é alvo de articulação política, de diálogo permanente, principalmente entre a Cultura e a Educação, e o padrinho-casamenteiro é o Carlos Xavier, como ele já se auto-intitulou, com muita justiça.

Essa relação do Plano Nacional do Livro e Leitura nunca é execução de políticas, mas elaboração, articulação, aproximação.

Quando o Professor Sineas falava da questão absolutamente pertinente, o da adoção de livros didáticos com imagens lá do Sul e Sudeste, e lembro-me de uma edição da Branca de Neve, que não tinha um único negro ou mulato, por exemplo. Eu fui procurar as causas desse edital, tinha sido impresso por uma grande multinacional na Suécia, e foi para o mundo todo. Aqui só trocaram as legendas, e o resto ficou igual. Já anotei aqui uma tarefa pessoal e uma promessa, aliás, eu não faço promessa para ninguém, mas para mostrar como eu vou fazer com o meu trabalho, o de colocar as questões; levar a preocupação e as reivindicações.

Então, o Plano tem essa institucionalidade e essa função. Espero que continue tendo, seja qual for à institucionalidade que se construa. Obrigado. (Aplausos).

SR. ALBERTO DONATO: Passamos para as perguntas. Vamos começar com Íris Borges.

SRA. IRIS BORGES: Sou de Brasília. Sou Vice-Presidente da Câmara Brasileira do Livro e sou distribuidora de livros.

Dizer para o Professor Sineas, depois de tudo isso que ele falou, Piauí no ano passado ficou em primeiro lugar na prova Brasília. Li na revista da GOL, um grande empresário argentino, de entretenimento, estranhando como o brasileiro prefere ir para fora do Brasil e não para o Nordeste. Parece que o brasileiro está começando a ter essa percepção do seu lugar, onde está.

É chocante ouvir falar a quantidade de editoras. É importante se ter esse real mapeamento, saber quem é editor e quem é gráfico. É estranho também que entre seiscentos e oitenta e sete editoras tenha poucos sócios na Câmara. Vamos fazer uma campanha para o fortalecimento nas Câmaras e, também, a ausência do distribuidor na Câmara.

Quando fui Presidenta, eu percebia como era importante a cadeia inteira estar presente. E na Câmara Brasileira do Livro também, a própria diretoria mostra o distribuidor, o livreiro e o editor.

O problema das edições pequenas e das editoras grandes monopolizarem as edições. O jeito de quebrar isso é fortalecendo a cultura local. Então, a coisa mais rica que o Nordeste tem é o que representa a sua cultura. O Nordeste marcar presença com as suas publicações e a sua distribuição.

O grande problema no Brasil não é a publicação, mas a distribuição. Sou distribuidora há trinta e dois anos e sinto essa dificuldade.

Então, eu quero deixar para a Mesa essa reflexão. Obrigada. (Aplausos).

SR. ALBERTO DONATO: Eu queria acrescentar à sua fala quanto ao fortalecimento das entidades. Se não houver o fortalecimento das entidades, haverá sempre problemas a serem enfrentados. Isoladamente, eu creio que as editoras estão em dificuldades, mas se elas se agruparem, eu creio que...

SRA. IRIS BORGES: E mais, fazendo vinculação com o Ministério da Cultura, com o Ministério da Educação, as entidades se juntando começa a ter força. Obrigada!

SR. EDNILSON XAVIER (Vice-Presidente da Associação Nacional de Livrarias): Bom-dia a todos. Eu participo do grupo Cortez, o que para mim é uma honra muito grande.

Sou Vice-Presidente da Associação Nacional de Livrarias, vim aqui representar o Vitor Tavares, nosso Presidente.

Gostaria de falar em cima da realidade que vivemos hoje no Brasil. Ouvimos na fala da Sandra que são 687 editoras. Claro que é possível que dentre esse número muitas sejam realmente gráficas, nem conheçam a cadeia produtiva do livro. Percebemos o quanto o mercado está dessintonizado, quer dizer, muitas editoras e pouquíssimas livrarias. Recentemente foi lançado o Anuário Nacional de Livrarias, e está inclusive numa banquinha ao lado.

A grande concentração também das livrarias acontecem no Centro-Sul. Praticamente 80% são nessas regiões. Talvez um reflexo do “Retratos de leitura no Brasil”, e no Norte e Nordeste é uma coisa preocupante.

Primeiramente parabenizar a Mileide por essa discussão interessantíssima; vejo que não tem muitos livreiros aqui, têm bem mais editores. Mas é importante que o mercado se conscientize disso. Nós estamos hoje num momento mágico em termos de entidades. Também reconheço que o Nordeste precisa ser bem representado. Concordo com o Professor Sineas, de que é preciso criar uma Central, enfim, representando o Nordeste e se manifeste, busque. O momento é mágico porque as entidades estão unidas e focando no livro e na leitura.

Dizer que ANL (Associação Nacional de Livrarias) está se levantando com muita dedicação, com muita batalha e muita luta a Lei do Fomento ao Livro e à Leitura, que hoje classificamos com esse lema, visto que além do preço fixo e do preço único é uma coisa um tanto quanto difícil de entender no mercado.

Pergunto: A Câmara Cearense do Livro tem idéia de quantas livrarias têm no Ceará?

SRA. MILEIDE FLORES: Se a editora não souber onde vai botar os livros, fica complicado. Eu queria fazer também alguns questionamentos em torno dos problemas de livrarias; de quantas livrarias, das questões de livraria dentro das políticas públicas que está sendo estabelecida no Brasil. O próprio Ministério da Cultura, na Mesa em Brasília, quando no Seminário promovido pelo Deputado Marcelo Almeida, houve uma dificuldade muito grande. Eu acredito que na próxima Mesa vai ser um debate gostoso, até por conta disso. Nós vamos fazer um levantamento do “por que não nos respondem”? Será que é porque não nos conhecem? Será que é porque não sabem a existência da livraria ou porque queremos existir?

Eu sinto essa dificuldade de respostas muito grande, por isso que as políticas nos mencionam na fala, mas não na ação. Quando se vê o montante desse dinheiro de compras de livros, nós percebemos isso dentro do nosso segmento. Não chega ao nosso segmento. Por isso, talvez, que desenvolvimento na cadeia editorial esteja mais importante e crescente, enquanto que na livraria não. Nós temos 52% de compra (eu acho que seja o último dado), o governo é o maior comprador de livros, e passa por cima de nossas cabeças. Nós não temos uma política de formação que favoreça ao livreiro. Nós não temos um curso. Quando falamos num Curso de Formação de Livreiros, nos remontam aos cursos já existentes que são cursos para editores, para ilustrador e nunca é para a gente.

Está na hora de começar a ler a história das livrarias, e a perceber porque devemos existir, para denominar de “política pública”.

Se nos balizarmos pelos dados da JUCEC (Junta Comercial do Estado do Ceará), no Estado do Ceará existem 1.800 livrarias, mas contamos realmente com 93, porque há uma distorção entre como se inscreve, se cadastra junto à Junta Comercial, que muitas vezes eu sou livreira, porque quero botar aquele livro didático na minha mercearia do final do ano, e aí eu me cadastro como livraria, mas não exerço a função de livraria.

Foi colocada agora no Anuário de Livrarias que foi elaborado pela ANL. Noventa e três livrarias no Estado, dessas, somente cinqüenta e nove são sindicalizadas; muitas são papelarias. No Sindicato existem três dimensões de livrarias: A livraria; câmara da livraria mista, são as livrarias que nós chamamos rotineiramente de didáticas, é a que tem o livro, mas o foco essencial, 90% da sua venda é no livro didático; e a papelaria. As papelarias também têm o foco da sua venda 90% e 10% de livraria.

Então, nós temos esses três segmentos dentro do sindicato.

SR. ALBERTO DONATO: Ok. Vamos passar a resposta desses blocos.

SRA. SANDRA LIMA (Câmara Cearense do Livro): Para esclarecer. Nós temos a Adelce (Associação dos Distribuidores e Editores Cearenses). Percebe-se a dificuldade de se conseguir juntar realmente todas essas instituições. Seria muito interessante que todos caminhassem na mesma direção apenas numa instituição, porque assim se juntaria forças.

Recentemente foi criada outra associação, a dos Escritores Cearenses. Ou seja, existe na mesma cadeia várias instituições. Com isso, elas se fragmentam e não crescem. Essa é uma das grandes dificuldades que nós temos aqui.

SR. CARLOS XAVIER (MEC): Eu queria reforçar em relação ao mapeamento das ações. O Plano Nacional do Livro e da Leitura, no início, foi extremamente criticado, diziam que ele só queria saber de compilações... Isso é absolutamente fundamental. Hoje, nós temos certeza que existem pelo menos setecentas ações permanentes e importantes de livro e leitura no país. A gente sabe que está fazendo o quê; ainda falta muito para cadastrar. Isso foi base inclusive para a elaboração e a qualificação de políticas públicas, como foram anunciados. Por que investir em biblioteca comunitária como está agora no Mais Cultura? Porque eles são os pontos de leitura. Nós percebemos que existem milhares de bibliotecas comunitárias atuantes e são fundamentais no processo.

Então, em relação ao mapeamento isso fantástico.

Segundo. Quando se fala “livraria”, as coisas começam a entrar num terreno meio pantanoso. É aquele tipo de coisa: todo mundo elogia, todos acham ótimo, mas é o setor menos equacionado. Talvez, até pela nossa tradição cultural na área da indústria do livro, nós tenhamos nas livrarias realmente o elo mais fraco dentro dessa cadeia economicamente falando. Ao mesmo tempo, eu só entendo que as livrarias terão um poder maior de fogo a partir do momento em que elas tiverem uma proposta ousada, unida e que possa ser uma bandeira nacional para a união de todos. Por exemplo, a questão do preço fixo. Volto a dizer, creio que precisa um pouco mais de unidade daqueles que estão unidos e jogar isso como uma bandeira de aglutinação.

Eu acredito que falta para as livrarias, como não falta, por exemplo, para o setor editorial, como não falta para os autores, uma bandeira que possa unir nacionalmente numa luta política mesmo. Não vamos deixar de enfrentar a luta política. Se alguma coisa que aconteceu até agora com o livro pela leitura, foi o enfrentamento político da questão, que neste momento é muito importante essa transformação que nós estamos passando.

Apenas uma informação. Semana passada, num congresso do CEPAL, no Chile, e pela primeira vez também eu vejo um nível internacional, pelo menos ibero-americano, uma moção pelas livrarias, assinada em conjunto por todos os representantes de editoras, livreiros, produtores culturais, membros de governo, etc. e tal. Os vários itens estão recomendando políticas públicas, e um deles é justamente incentivar e apoiar a formação de livrarias físicas e digitais, partes fundamentais de políticas de acesso à leitura, etc. etc.

Então, é um reconhecimento importante também contratar com esse movimento de livrarias que existem em todo mundo ibero-americano.

SR. ALBERTO DONATO: Eu queria complementar e colocar um pouco mais de gasolina na fogueira: eu creio que novamente o governo está investindo errado. Está investindo milhões em formação de bibliotecas com acervo único nacional. Eu acho que parte de todo esse investimento teria que ser visado para as livrarias. E sem livrarias regionais fortalecidas nas entidades, acredito que as próximas discussões vão ser de história das livrarias e não sobre as livrarias.

SR. CARLOS XAVIER (MEC): Uma réplica necessária porque é importante esclarecer.

São dois momentos do Programa Mais Cultura e tem que ser colocado. O centro realmente é a aplicação da absoluta, maioria dos recursos na modernização das bibliotecas. O governo está investindo no acesso público à leitura por intermédio das bibliotecas.

O segundo é como que esse acervo vai ser comprado. Nessa primeira fase do ano de 2008, que está apenas uma pequena parte, são quatro mil e quinhentas bibliotecas que serão modernizadas até 2010. Estão sendo modernizadas, este ano, apenas quatrocentas e dez. Então, para esse ano, tudo foi feito dentro das regras já existentes, com listagem da Biblioteca Nacional, etc. e tal.

O Ministério pretende, e está sendo fruto desse diálogo do Programa Mais Cultura em cada um dos estados - é importante que isso fique claro – é exatamente essa estadualização das compras e a aplicação do programa e, portanto, das compras. É importante que isso fique bem claro. Se não está bem entendido, espero a oportunidade para dizer novamente.

A proposta do Ministério é essa estadualização das compras com a participação e abertura de editais feitas pelos estados com a participação da sociedade, com esse diálogo com a sociedade, de forma a que essas instruções que você apontou, sejam adequadas.

Então, não podemos confundir a prioridade que o Ministério está dando nas bibliotecas com o processo de aplicação dessa prioridade que vai refletir nas livrarias, nos autores locais, etc., etc. É isso aí.

SR. ALBERTO DONATO: Trinta segundos para a tréplica. Como eu disse que a primeira morte das livrarias foi pela compra pelo Programa Nacional do Livro Didático, eu acho que mataram aí umas dez mil livrarias, o governo matou nessa jogada.

A segunda pode ser o PNDE. Então, cada programa que a gente assiste, vê-se o enforcamento das livrarias. Isso não tem sido percebido. Claro que o espaço vai sendo ocupado pelos players nacionais e internacionais. É só essa gasolina que eu quero colocar. O perigo é se não houver tempo de fazer as coletivas regionais.

Para dar continuidade, usarão da palavra: Adalberto, Alexandre e José Arteiro.

SR. ADALBERTO FRANKLIN: Sou da Ética Editora, fica no Sul do Maranhão, com cerca de trezentos títulos publicados (mais ou menos), e cem títulos em catálogos atualmente. É uma editora regional. A nossa área de atuação é mais Sul do Maranhão, Sul do Pará, Norte do Tocantins.

Eu nunca vendi para os governos nesses tipos de programa, por exemplo, para bibliotecas. A única vez que na escolha do livro entraram títulos nossos, foram quarenta e dois títulos no ano passado, para o governo do Maranhão, e foram retirados da licitação dois dias antes da decisão, todos os títulos, para favorecer exatamente um livro publicado no Sul e Sudeste.

O processo que nos preocupa é a fragilidade das pequenas editoras que é muito grande. Em vez de ter um acesso ao financiamento, a gente tem que bancar os livros. O autor regional dificilmente tem condições de bancar a si mesmo, mesmo assim a gente vê a persistência no Maranhão, no Piauí e outros estados mais pobres, onde a gente vê esse número de editores-autores, porque uma grande editora nunca vai publicar um livro regional, porque não é interessante para ele um livro que só vende no Maranhão, que só vende no Piauí. Esse é o nosso grande dilema realmente, porque tira do mercado exatamente esse item regional.

Neste ano, o governo do Maranhão fez duas ou três licitações para as suas bibliotecas, no estado todo. Nenhum livro do Maranhão o estado incluiu.

Eu creio que não adianta falar em “estadualização das compras”, se na escolha do livro não há obrigatoriedade do livro regional ser contemplado.

É um processo complexo esse, porque eu não sei se está no programa essa questão do livro regional. Essa identidade cultural em que o Sineas falava é fundamental. Ela só acontece se o livro regional for adotado, ou seja, ele chegar às escolas. A adoção do livro nacional é uma aberração para a diversidade cultural brasileira, porque está homogeneizando as pessoas com a característica do Sul. É um globo que se avassala por sobre as culturas regionais, porque ensina aos estudantes, às pessoas a pensarem com a cabeça de quem está no Sul.

Os nossos livros têm chegado mais às faculdades, porque o livro para o Ensino Superior, o Ensino do 3º Grau tem mais entrada, não está tão cartelizado, por exemplo, quanto no Ensino Médio e Fundamental, que é cartel dos mais absurdos que existem no Brasil. Nenhum autor regional entra no Ensino Médio fora as grandes editoras. Isso é preocupante e destrói essa cadeia do livro regional completamente, porque inviabiliza economicamente.

O Sineas disse: Isso é um vício, como a cocaína.

Isso é um vício! Eu entrei criança nessa cadeia. Vim da geração dos meus pais e entrei na área gráfica com onze anos de idade. Prende realmente, e é cadeia.

O Wilson é um desses autores e editores que pensam em se sustentar realmente dentro de um mercado que está restrito, num trabalho muito bom. Esse é um processo que nós temos que discutir, porque quem sofre não é só o autor, mas toda a cadeia, do autor ao livreiro. É um processo realmente complicado. Eu queria deixar esse levantamento.

Eu tenho algumas dúvidas: continua sendo essa abertura para quê? Os governos estaduais, por exemplo, quando vão suprir suas bibliotecas, se têm toda essa abertura, ou seja, o dinheiro chega à mão deles e continuam comprando só do Sul!

O Maranhão tem uma rede chamada de Farol da Educação, são mais de cento e vinte bibliotecas escolares em todo o estado, e não compram livros regionais.

Houve agora um absurdo, a Associação dos Livreiros fez uma denúncia, isso há menos de um mês, no Ministério Público. Por quê? A relação de livros era um crime, juridicamente falando, porque colocava todos os livros adotados a R$20,00, livros que não chegam a R$7,00, às vezes em alguns casos, a maioria livros de domínio público. Foi um absurdo. A licitação era de dois milhões de reais, praticamente quase todos os livros direcionados para uma editora. Verificamos que parte daqueles livros aquela editora não tinha publicado, quer dizer, parece que ia publicar depois.

Então, essas coisas absurdas a gente vê acontecer no meio. Por quê? O poder de escolha, de direcionamento das licitações é uma coisa que fere a economia e quem trabalha nesse meio. Desculpe o desabafo.

SR. ALEXANDRE SANTOS (Pernambuco): Inicialmente, eu quero reafirmar as palavras do professor Sineas Santos, porque traduz o pensamento de todos os nordestinos. Se algum intelectual brasileiro omite o Piauí do mapa, é porque não conhece o Brasil e, se o conhece, é mal-intencionado. Suas preocupações são as nossas.

Gostaria de me referir à Câmara Setorial.

Concordo com o nosso companheiro do Ministério, quando diz que antes do Governo Lula, não se falava em livro, não se falava em nada. Realmente é uma verdade.

Então, nós temos que parabenizar esse esforço e, naturalmente, canalizar as nossas preocupações por melhorar.

A Câmara Setorial do Livro e da Leitura, apesar das intenções apresentadas, de forma alguma traduz o pensamento nacional. O fato de incorporar na Câmara pessoas representantes de entidades que no nome apresenta o nome brasileiro nacional, não significa de forma alguma que a representação nacional esteja garantida.

Lembro que as entidades cujo nome começa com Câmara Brasileira, Associação Nacional, via de regra tem que ser de São Paulo ou Rio de Janeiro ou, no máximo, Belo Horizonte. Acredito que nós temos que pensar seriamente em apresentar uma proposta, porque esse tipo de entendimento seja revisto, sob pena das nossas Câmaras Setoriais não representar o país, representar apenas uma de nossas regiões. Então, é importante e creio que não tem nenhum tipo habilitação de fato nacional.

Com