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UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS CAMPUS ARAPIRACA UNIDADE EDUCACIONAL PALMEIRA DOS INDIOS CURSO DE PSICOLOGIA LUDMYLA ROSALIE ALVES DE LEMOS AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E POSSIBILIDADES DE INTERVENÇÃO A PARTIR DE UMA REVISÃO DE LITERATURA PALMEIRA DOS ÍNDIOS 2020

AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

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Page 1: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS

CAMPUS ARAPIRACA

UNIDADE EDUCACIONAL PALMEIRA DOS INDIOS

CURSO DE PSICOLOGIA

LUDMYLA ROSALIE ALVES DE LEMOS

AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E POSSIBILIDADES

DE INTERVENÇÃO A PARTIR DE UMA REVISÃO DE LITERATURA

PALMEIRA DOS ÍNDIOS

2020

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Ludmyla Rosalie Alves de Lemos

Autismo, comunicação e linguagem: estratégias e possibilidades de intervenção a

partir de uma revisão de literatura

Trabalho de Conclusão de Curso - TCC apresentado a Universidade Federal de Alagoas – UFAL, Campus de Arapiraca, Unidade Educacional Palmeira dos Índios, como requisito parcial para a obtenção do título de graduação em Psicologia.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Danielle Oliveira da Nóbrega.

PALMEIRA DOS ÍNDIOS

2020

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Catalogação na fonte

Universidade Federal de Alagoas

Biblioteca Unidade Palmeira dos Índios

Divisão de Tratamento Técnico

Bibliotecária Responsável: Kassandra Kallyna Nunes de Souza (CRB-4: 1844)

L556a Lemos, Ludmyla Rosalie Alves de

Autismo, comunicação e linguagem: estratégias e possibilidades de

intervenção a partir de uma revisão de literatura/ Ludmyla Rosalie Alves de

Lemos, 2020.

80 f.

Orientadora: Danielle Oliveira da Nóbrega.

Monografia (Graduação em Psicologia) – Universidade Federal de

Alagoas. Campus Arapiraca. Unidade Educacional de Palmeira dos Índios.

Palmeira dos Índios, 2020.

Bibliografia: f. 75 – 80

1. Psicologia. 2. Autismo. 3. Transtorno do espectro autista. 4. Autismo

– comunicação. I. Nóbrega, Danielle Oliveira da. III. Título.

CDU: 159.9

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AGRADECIMENTOS

A Deus, por ter me permitido trilhar todos os caminhos que passei, sendo meu

amparo e minha força nos momentos bons e ruins. Gratidão por cada experiência

vivida ao longo desses anos e por todas as bênçãos que Ele me concedeu.

Minha mãe, Cida, que viveu esse sonho comigo muito antes da minha entrada

na universidade. Minha maior incentivadora e quem esteve ao meu lado em cada

manhã em que eu ia à faculdade. Desde o princípio, fazendo o possível e o

impossível para que eu tivesse uma boa educação e que um dia eu conquistasse

minha graduação. Para ela, agradeço por tudo que fez e faz por mim.

Minha família, por todas as orações, por todas as vezes que torceram por

mim e vibraram com minhas conquistas. Meu pai, Aroldo. Meus irmãos, Fábio e

Murilo. Minhas avós, tia e primas. Serei eternamente grata por terem estado ao meu

lado nessa jornada.

Meu namorado, Efrain, por cada vez que me disse ―quanto maior o sacrifício,

maior a bênção‖, por todas as suas orações e pelas vezes que me ouviu reclamar,

desabafar e sentiu comigo um pouquinho do amor que eu pude ter ao longo de

tantas experiências vivenciadas. Sempre grata pelo seu incentivo e por todas as

vezes que acreditou em mim e no meu sonho. Estendo também meu agradecimento

a sua família por todo carinho e orações que tiveram comigo ao longo desses anos.

A minha amiga, Brenda, que não só torceu por mim como viveu esses 5 anos

ao meu lado. Entre as tristezas, alegrias e medos esteve ao meu lado sendo um

grande conforto. Ao meu lado nas aulas, trabalhos, eventos, cursos e, por fim, em

uma experiência que nos enriqueceu muito enquanto futuras profissionais: a clínica-

escola. Entre trocas e muito companheirismo, partilhamos juntas a vida acadêmica e

muito em breve a profissional.

Para Karol, agradeço pela sua amizade, pela sua atenção e cuidado todas as

vezes que me ouviu e que me incentivou. Uma amizade que nasceu nos corredores

da UFAL e se estendeu para a vida. Entre risadas e desabafos, partilhamos muitos

momentos nas idas e vindas de Palmeira, acompanhando e torcendo uma pela

outra, em cada progresso que a universidade nos permitia.

Page 6: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

Às Psicolindas, por terem sido o melhor grupo de amigas que eu pude ter.

Brenda, Yara, Deb, Fran, Kerol, Socorro, Mary, Emille, Luzia, Amanda e Tam. A

UFAL colocou a maioria de vocês na minha vida e serei sempre grata por cada

manhã que vocês foram um suporte e um alívio para a nossa rotina universitária,

com vocês o fardo se tornou mais leve e mais divertido. Obrigada por tantos risos e

experiências, sem vocês minha permanência na UFAL não teria sido a mesma.

Minha professora e orientadora, Professora Danielle, uma mulher que admiro

enquanto pessoa e profissional. Seu olhar e suas experiências despertam em mim

sensibilidade e respeito pelo outro. Me acompanha desde meu primeiro estágio,

partilhando seu conhecimento, vivências e permitindo que eu encontrasse a minha

grande paixão na Psicologia.

Uma dessas experiências e diria que a mais especial e significativa foi o meu

contato com todas as crianças com TEA do meu Estágio Básico 1 e, em especial, a

minha inserção no Grupinho Aquarela. Lá encontrei seis crianças que me motivaram

a ser uma melhor profissional e a defender sempre os direitos da pessoa com

deficiência. Para vocês: Allysson, Arthur, Gabriel, Matheus, Pedro Gabriel e

Pedro Silva dedico esse trabalho e agradeço pelo o tanto que vocês me

ensinam, a vivência do TEA com vocês ressignificou meu olhar, minha prática

e me deu muito mais motivação.

A psicóloga Luana por ter partilhado comigo seu amor pela Psicologia e pelo

TEA. Suas experiências, sua prática e seu carinho me inspiram. Carregarei comigo e

em minha prática profissional muito do que vivenciei e aprendi com você, primeiro no

grupinho e depois a cada sexta-feira.

Por fim, agradeço a todas as pessoas que direta ou indiretamente estiveram

comigo ao longo dessa caminhada. Aos meus professores, por todo o conhecimento

que me possibilitaram ao longo desses anos, ressignifiquei meu olhar para o ser

humano e para a singularidade de cada um. Sei que não sou a mesma do início de

minha formação e agradeço por tudo e todos que contribuíram para que esse sonho

acontecesse.

Page 7: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

É tão lindo!

Não precisa mudar

É tão lindo!

Deixa assim como está

E eu adoro e agora

Eu quero poder lhe falar

Dessa amizade que nasceu

Você e eu!

Nós e você!

Vocês e eu!

E é tão lindo!...

(Al Kasha / Edgard Poças / Joel Hirschhorn)

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RESUMO

O referido trabalho trata-se de uma pesquisa bibliográfica de cunho qualitativo, amparada na Psicologia Histórico-cultural, tendo como objetivo geral compreender, a partir de literaturas encontradas na Revista Brasileira de Educação Especial, quais estratégias utilizadas no trabalho terapêutico e educacional direcionadas ao desenvolvimento da linguagem e comunicação de pessoas com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA). A pesquisa foi realizada através de fontes bibliográficas encontradas na Revista Brasileira de Educação Especial disposta no portal Scielo, no ano de 2019, do dia 09 de julho ao dia 12 de agosto. Para a efetuação da mesma, foram utilizados os descritores: ―Autismo‖; ―Transtorno do Espectro do Autismo‖; ―Transtorno do Espectro Autista‖; e ―Autista‖. No total, encontrou-se 38 artigos científicos, sendo que apenas 7 foram selecionados, pois discutiam a problemática em foco. Com isso, tendo a técnica de análise de conteúdo como ferramenta para análise, foram levantadas duas categorias: 1) linguagem, comunicação e o TEA: que traz discussões encontradas nas literaturas acerca das concepções de linguagem e comunicação e aponta que dificuldades nesses âmbitos impedem a interação social da pessoa com TEA e 2) estratégias e resultados: as práticas terapêuticas e educacionais descritas nos artigos envolviam Comunicação Alternativa e Ampliada (CAA), o Picture Exchange Communication System (PECS), Modelagem em vídeo (MV) e, por fim, a utilização de fotografias pessoais como recurso terapêutico em que buscaram trabalhar histórias de vida enfocando a mediação. Com os resultados obtidos, concluiu-se que existem muitas possibilidades estratégicas de incluir a pessoa com TEA com dificuldade ou ausência de fala nos diversos contextos vivenciados por ela. A partir dessas estratégias e considerando a ótica da Psicologia Histórico-cultural, compreendemos que os sujeitos se desenvolvem através das relações sociais, históricas e culturais, fundamentais para a sua comunicação e interação social. Assim, nessa perspectiva, a mediação do outro tende a facilitar esse processo de aquisição da linguagem e comunicação, propiciando situações de interações sociais.

Palavras-chave: Transtorno do Espectro Autista. Linguagem e Comunicação. Comunicação Alternativa e Ampliada. Psicologia Histórico-cultural.

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ABSTRACT

The referred work deals with a qualitative bibliographic research, based on Historical-Cultural Psychology, with the general objective of understanding, from the literature shown in the Revista Brasileira de Educação Especial, which statistics are used in the therapeutic and educational work directed to the development of language and communication of people with Autism Spectrum Disorder (ASD). A research was carried out through bibliographic sources found in the Revista Brasileira de Educação Especial, disabled in the Scielo portal, in 2019, from July 9 to August 12. To effect the same, for the accomplishment of the same the descriptors: "Autism"; ―Autism Spectrum Disorder‖; ―Autistic Spectrum Disorder‖; and "Autistic". In total, 38 articles were found, but only 7 were selected, since they deal with the problematic in focus. Since then, having content analysis as a research technique, two categories of analysis have been created: 1) language, communication and ASD: which brings discussions about literature related to concepts of language and communication and shows what are the differences between individuals prevented from social interaction of the person with ASD and 2) strategies and results: as therapeutic and educational practices described in the articles involved Alternative and Extended Communication (CAA), the Picture Exchange Communication System (PECS), Video Modeling (MV) and, finally, using personal photographs as a therapeutic resource in which to seek to work life stories involving mediation. With the results obtained, he concluded that there are many strategic possibilities of including a person with ASD with difficulty or absence of speech in different contexts experienced by him. From these strategies and considering the perspective of historical-cultural psychology, we understand that individuals develop through social, historical and cultural relations, which are fundamental for their communication and social interaction. Thus, in this perspective, mediation in another way facilitates the process of language and communication acquisition, providing situations of social interactions.

Keywords: Autistic Spectrum Disorder. Language and Communication. Alternative and Extended Communication. Historical-cultural psychology.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AEE Atendimento Educacional Especializado

APAE Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais

AV Automodelagem em vídeo

CAA Comunicação Alternativa Ampliada

CID-10 Código internacional de doenças

CSA Comunicação suplementar e/ou alternativa

DSM-V Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 5ª

edição

LB Linha de base

MV Modelagem em vídeo

MVO Modelagem em vídeo com outros como modelo

MVPV Modelagem em vídeo a partir do ponto de vista

PAS Participantes alunos

PEA Perturbação do Espectro do Autismo

PECS Picture Exchange Communications System

PFS Participantes familiares

PROCAAF Programa de Comunicação de Alternativa e Ampliada Familiar

SCIELO Scientific Eletronic Library Online

TEA Transtorno do Espectro Autista

TGD Transtornos globais do desenvolvimento

ZDP Zona de desenvolvimento proximal

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 11

2 PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL: HISTORICIDADE E

FUNDAMENTOS

16

3 O TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA: CONSTRUÇÃO

HISTÓRICA DO CONCEITO E A VISÃO DA PSICOLOGIA

HISTÓRICO-CULTURAL

26

3.1 O TEA em uma leitura da Psicologia Histórico-cultural 32

4 PERCURSOS METODOLÓGICOS 40

5 ENTRE O TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA, A

LINGUAGEM E A COMUNICAÇÃO ALTERNATIVA: UMA

ANÁLISE DE LITERATURA

46

5.1 Categoria 1: Linguagem, comunicação e o TEA 47

5.2 Categoria 2: Estratégias e resultados 59

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 70

REFERÊNCIAS 75

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11

1 INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como tema a linguagem e a comunicação da pessoa com

Transtorno do Espectro Autista (TEA). O interesse pela temática surgiu mediante a

vivência da pesquisadora em sua experiência de Estágio Básico 1, no centro de

reabilitação Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE), quando pode

estagiar com crianças com TEA.

E, também, devido a esse interesse, ocorreu sua inserção em um projeto de

extensão intitulado ―(Inter)ações e (Con)vivências: promoção de inclusão de crianças

com Transtorno do Espectro do Autismo‖. O projeto de extensão surgiu no ano de

2017 e justifica-se pela necessidade de promover ações que viabilizem a inclusão

social de pessoas com deficiência e, em específico, com TEA. Desse modo, o

projeto em tela insere-se na temática da reabilitação da pessoa com TEA e tem o

intuito de atuar no processo de reabilitação de crianças com TEA, promovendo

situações de mediação simbólica que sejam favoráveis para o desenvolvimento

desses sujeitos.

Assim sendo, dada a inserção no projeto de extensão com crianças com TEA

e diante do contato com a realidade de cada criança, a pesquisadora pode perceber

a singularidade encontrada nessa síndrome, como também perceber novas

maneiras de comunicação que até então não eram percebidas por ela.

O trabalho com essas crianças suscitou um novo olhar para o TEA e as

discussões de caso abriram portas para buscar compreender melhor como a

comunicação e linguagem perpassam o desenvolvimento do sujeito com TEA.

Desse modo, a pretensão deste trabalho é contribuir com essa demanda para que

intervenções posteriores focadas na linguagem e na comunicação sejam

desenvolvidas.

O TEA é uma condição que pode afetar as mais diversas áreas do

desenvolvimento. Apresenta-se em intensidade e formas variadas e, dentre as áreas

prejudicadas, estão: interação social, comunicação, comportamentos restritos e

repetitivos. Devido a esses comprometimentos, pessoas com TEA podem envolver-

se em ecolalias, não atribuir funcionalidade a brincadeiras, como por exemplo,

brincar apenas observando a roda de um carro girar. Também questões motoras e

sensoriais estão dentro das dificuldades enfrentadas pelo sujeito com TEA.

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12

Atualmente, o referido transtorno é concebido como uma deficiência. Tal

definição ocorreu no ano de 2012 e, desde então, esses indivíduos passam a ter

seus direitos assegurados, conforme consta a Lei nº 12.764, de 27 de dezembro de

2012, que diz:

§ 1º Para os efeitos desta Lei, é considerada pessoa com transtorno do espectro autista aquela portadora de síndrome clínica caracterizada na forma dos seguintes incisos I ou II: I - deficiência persistente e clinicamente significativa da comunicação e da interação sociais, manifestada por deficiência marcada de comunicação verbal e não verbal usada para interação social; ausência de reciprocidade social; falência em desenvolver e manter relações apropriadas ao seu nível de desenvolvimento; II - padrões restritivos e repetitivos de comportamentos, interesses e atividades, manifestados por comportamentos motores ou verbais estereotipados ou por comportamentos sensoriais incomuns; excessiva aderência a rotinas e padrões de comportamento ritualizados; interesses restritos e fixos (BRASIL, 2012, p. 1).

Como se observa nessa definição, uma das questões que circunscrevem o

tema abordado são as dificuldades de comunicação que ganham relevância pelo

fato do sujeito com TEA ter dificuldades significativas na interação social. Sua

ausência ou comprometimento originam uma série de obstáculos no

desenvolvimento desse sujeito.

A linguagem verbal é a forma de comunicação mais comum entre as pessoas.

Nota-se que pessoas que não usam esse canal de comunicação tendem a sair de

um padrão que ocasiona a muitos obstáculos em seu contato com o outro (GOMES,

2018). A dificuldade de compreender a linguagem e de compartilhar sentidos com a

pessoa com TEA pode gerar no outro um baixo investimento em estabelecer

relações interpessoais, o que interfere diretamente no processo de aprendizagem

desse sujeito que está em constante constituição.

De todo modo, tornam-se cada vez mais visíveis instituições que atendem ao

público de pessoas com TEA, seja em prol do trabalho do terapêutico ou educativo,

mas, no geral, a sociedade está passiva a esse contato o que implica na busca em

conhecer mais sobre esse transtorno para assim se fazer uma melhor inclusão

dessas pessoas, possibilitando seu desenvolvimento biopsicossocial.

Diante desse panorama, todos os âmbitos que recebem pessoas com TEA

entram em contato com as dificuldades de linguagem e comunicação presentes na

grande maioria dos quadros clínicos, fazendo necessários profissionais das mais

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diversas áreas que estejam aptos para atuar com as diferentes realidades e formas

de aprendizagem.

O fato de que nem todas as pessoas são capazes de verbalizar ou fazer uso

da fala de modo que seja de fácil compreensão geral provocou a possibilidade da

criação de sistemas de comunicação que visassem suplementar essa fala ausente

ou prejudicada. Nesse sentido, a Comunicação Alternativa Ampliada (CAA) surge

para suprir essa demanda e, como parte dessas possibilidades, outros recursos

também foram surgindo com o mesmo objetivo. O trabalho terapêutico e educativo

passou a fazer uso de muitos desses meios como ponte de acesso à comunicação

com a pessoa com TEA. No entanto, com o número crescente de métodos e

técnicas disponibilizadas, seu uso, em certos contextos, passou a ser utilizado de

forma mecânica e sem a devida adaptação e contextualização.

Diante disso, anunciamos nosso objeto de estudo: quais as estratégias

utilizadas no trabalho terapêutico e educacional direcionadas ao desenvolvimento da

linguagem e comunicação de pessoas com TEA? Faremos isso a partir de uma

análise bibliográfica da Revista Brasileira de Educação Especial. Desse modo temos

como objetivo geral: compreender, a partir de literaturas encontradas na Revista

Brasileira de Educação Especial, quais estratégias utilizadas no trabalho terapêutico

e educacional direcionadas ao desenvolvimento da linguagem e comunicação de

pessoas com TEA. E como objetivos específicos: compreender as concepções de

linguagem e comunicação encontradas nas literaturas; analisar a importância da

linguagem e comunicação no desenvolvimento da pessoa com TEA; e identificar

estratégias interventivas no tocante à linguagem e à comunicação.

Para corresponder aos referidos objetivos, escolhemos a pesquisa

bibliográfica de cunho qualitativo, ancorada em uma das correntes teóricas da

Psicologia que enfoca um olhar dialético para o ser humano e seu comportamento.

Desse modo, o referencial teórico escolhido foi a Psicologia Histórico-cultural que

carrega consigo uma perspectiva crítica devido a seus fundamentos epistemológicos

e teóricos. Concebe o sujeito como um ser ativo, social e histórico (BOCK, 2001).

Através desse entendimento, traz consigo o importante papel da linguagem como

mediador essencial na interação da pessoa com o meio em que vive.

Nesse sentido à linguagem, esta é compreendida como central no

desenvolvimento humano. Interfere e transforma as significações do que é

apreendido no processo social e histórico de cada sujeito. Trata-se de um processo

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14

constitutivo complexo e considerado o principal mediador no desenvolvimento das

funções psicológicas superiores. Funciona como instrumento da comunicação,

planejamento e autorregulação (ALVES, 2006).

Com relação a comunicação este conceito diz respeito a um processo

complexo de transmissão de informações, em que se pode partilhar desejos e

necessidades. Ocorre em contextos naturais e cotidianos da vida do sujeito, sendo a

comunicação verbal o meio de comunicação mais utilizado entre os seres humanos.

Todavia não existe apenas essa forma de comunicação fazendo-se necessário

pensar em formas alternativas que busquem suplementar ou substituir essa prática,

a fim de que todos possam desenvolver-se e que tenham a possibilidade de exprimir

seus pensamentos e sentimentos (ORRÚ, 2012).

Orrú (2012) discorre sobre as ideias de Vigotsky sobre o processo de

aquisição de linguagem, afirmando que esse movimento se efetiva no processo

social, ou seja, partindo do externo para, aos poucos, transformar-se em um sistema

de signos internalizado. A autora explica que a cultura e a mediação semiótica são

assuntos centrais na obra do autor, estando constantemente relacionadas ao

desenvolvimento do sujeito e a outros processos, que se efetuam através dessa

mediação e serão detalhados nos capítulos subsequentes.

Assim, como justificativa desse trabalho, pontuamos a necessidade de

provocar reflexões em torno dessa temática, visando pensar a pessoa com TEA a

partir de sua singularidade e considerar suas potencialidades. Nesse sentido, é

preciso buscar métodos e técnicas que ofereçam situações favoráveis de mediações

e, nesse contato com o outro, estar apto para significar todas as ações, propiciando

uma troca de experiências e sentidos.

É válido ressaltar que não existe uma única estratégia em busca desse

objetivo, um único método ou técnica. Tampouco acredita-se que uma técnica,

reproduzida mecanicamente, irá ser a mais válida. Visto que, quando se discute

sobre o espectro, implica perceber que não existe uma única forma de ser, mas sim

múltiplas formas de vivenciá-lo. Logo, por mais que seja unânime saber que a

linguagem e comunicação precisam ser trabalhadas em toda e qualquer relação

desse sujeito, a forma de intervir não será a única para todos que possuem TEA.

Para a Psicologia, a relevância do estudo justifica-se pela possibilidade de

discutir esses aspectos no âmbito da profissão, o que pode provocar no profissional

uma inquietação para modificar sua prática. Como estudante e futura profissional, tal

Page 16: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

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pesquisa é importante por fornecer informações que implicam em um olhar mais

sensível e também a perspectiva de outros desdobramentos de pesquisas. Pensar o

TEA como uma condição que não existe para limitar a pessoa, mas sim para romper

com as barreiras que são postas pela sociedade e mostrar todas as possibilidades

de vivências da pessoa no mundo.

Este trabalho está dividido em seis partes e quatro capítulos, uma parte diz

respeito à Introdução e outra às Considerações Finais. Nesta primeira parte, é

possível observar a problemática da pesquisa, os objetivos e justificativa dessa

pesquisa e também o referencial teórico escolhido para dar suporte às ideias

construídas.

O primeiro capítulo discute o referencial teórico escolhido, bem como discorre

sobre seus fundamentos epistemológicos e teóricos.

O segundo capítulo aborda um registro histórico do TEA, traçando uma linha

do tempo desde a descoberta desse transtorno até os dias atuais. Nesse

levantamento, abarcou-se conceito, características, causas e critérios utilizados em

prol de um diagnóstico. Também foi possível realizar uma leitura do TEA sob a ótica

da Psicologia Histórico-cultural.

No terceiro capítulo, são apresentados os procedimentos metodológicos

utilizados nessa pesquisa. Tem-se aqui uma breve introdução sobre os sete artigos

selecionados, a partir do banco de dados da Revista Brasileira de Educação

Especial.

No quarto e último capítulo, é retratada a análise referente à pesquisa, na

qual utilizou-se a técnica de análise de conteúdo (BARDIN, 2004) discutindo os

dados encontrados, que foram distribuídos em duas categorias: 1) linguagem,

comunicação e o TEA; e 2) estratégias e resultados.

Por fim, temos as considerações finais que retomam os objetivos dessa

pesquisa para assim refletir sobre o que foi encontrado a partir das análises

realizadas.

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16

2 PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL: HISTORICIDADE E FUNDAMENTOS

O referido capítulo trata dos principais conceitos e fundamentos da Psicologia

Sócio-histórica, fazendo uso da Psicologia Histórico-cultural como abordagem para o

desenvolvimento desse trabalho. A mesma será a norteadora para que haja um

entendimento acerca de diversos aspectos que envolvem o Transtorno do Espectro

Autista (TEA). Essa perspectiva oferece grandes contribuições para o

desenvolvimento e inclusão de crianças com TEA, pois faz uma leitura de ser

humano que, a partir de suas relações sociais, da mediação com o outro e da

linguagem, é ativo, social e histórico em seu processo de desenvolvimento e de sua

aprendizagem.

Essa corrente teórica conta com a contribuição do trabalho de Vygotsky

(1896-1934), que trouxe em suas postulações possibilidades de superação das

visões dicotômicas até então existentes em meio às abordagens da Psicologia.

Nesse sentido, propõe uma crítica à visão reducionista muito difundida na época, em

que o comportamento humano era explicado como algo inerente de origem interna

ou externa ao homem. A Psicologia Sócio-histórica incentiva uma Psicologia de

caráter dialético, fundamentada no marxismo e adotando o materialismo histórico e

dialético como filosofia, teoria e método (BOCK, 2001).

De acordo com Lucci (2006), o momento pelo qual Vygotsky surge no cenário

da Psicologia fundamentando suas ideias foi quando a revolução socialista, que

ocorreu na Rússia, em 1917, estava em seu ápice, um momento pelo qual a

população passava por uma série de dificuldades econômicas, escassez de

alimentos e um grande número de pessoas que foram vitimadas com doenças, tais

como o próprio Vygotsky, que sofrera de tuberculose. Mesmo com a vitória da

revolução, a Rússia estava enfrentando um momento conturbado, no qual os novos

dirigentes do país tinham como objetivo implantar um novo modelo de governo que

tivesse como fundamento a teoria marxista, visando ao surgimento de uma nova

sociedade e também à criação de uma nova ciência.

Assim, o momento em que Vygotsky surgiu no cenário russo foi muito propício

à ocasião, quando um novo modelo de sociedade estava sendo impresso, fazendo

com que fosse necessária a construção de uma nova visão de homem. Também foi

uma fase em que a Psicologia passou a ser utilizada para análise de problemas com

uma solução prática. Em meio a sua formação humanista e sua bagagem cultural,

Page 18: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

17

Vygotsky tinha as ferramentas necessárias para contribuir com essa nova proposta,

oferecendo suas contribuições para as áreas da Educação, Pedologia (ciência da

criança) e para Psicologia (LUCCI, 2006).

Todavia, vale frisar que com o endurecimento do regime soviético, a

Psicologia passou por uma série de restrições durante o governo de Stalin, período

em que os testes psicológicos foram banidos, assim como a Psicologia que era

voltada para as áreas da educação e indústria. As obras do próprio Vygotsky, nessa

época já falecido, eram tidas como parte de uma lista negra e eram proibidas de

serem difundidas. Apenas em 1953, com a morte de Stalin, que a obra elaborada e

aplicada por Vygotsky pode ser reintegrada e difundida (LUCCI, 2006).

No que diz respeito às contribuições de Vygostsky no desenvolvimento da

Psicologia, Lucci (2006) explicita que o psicólogo buscou romper com as ideias que

existiam na época nesse campo do saber psicológico. Conforme o autor, havia uma

dicotomia entre uma psicologia mentalista e uma naturalista, o que implica um

dualismo entre mente-corpo, natureza-cultura e consciência-atividade, cujas divisões

permaneciam acentuadas sem haver uma abordagem que as superasse e

explicasse o nascimento das funções psicológicas humanas. Essa dicotomia dita por

Vygotsky torna-se clara quando o mesmo elencou a variedade de objetos de estudo

encontrados pelas abordagens em Psicologia, tais como: o inconsciente

(Psicanálise), o comportamento (Behaviorismo) e o Psiquismo e suas propriedades

(Gestalt). Assim sendo, ele propôs uma nova Psicologia que se baseava no método

e princípios do materialismo histórico dialético, ou seja, uma teoria marxista do

funcionamento intelectual humano (LUCCI, 2006).

Tal dicotomia está presente, inclusive, no nascedouro da Psicologia científica.

De acordo com Bock (2001), a Psicologia tornou-se ciência, em 1875, a partir das

contribuições de Wundt, com seu objeto de estudo sendo a experiência consciente.

Mas, ainda que com toda a contribuição que sua obra ofereceu, o mesmo não

conseguiu superar as questões dicotômicas que estavam em torno da Psicologia da

época, propondo duas psicologias: uma Psicologia Experimental e uma Psicologia

Social. Para ele, sendo um recurso para resolver as questões que estariam ligadas

ao natural e social; autonomia e determinação; interno e externo. Entretanto,

nenhuma delas conseguiu superar a perspectiva determinista e mecanicista

presente em seus pressupostos. Logo, a compreensão do fenômeno psicológico

permanecia insuficiente mantendo-se uma visão dicotômica.

Page 19: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

18

Em meio ao cenário em que se encontrava a Psicologia, Vygotsky, buscou

superar o dualismo da época, aderindo ao materialismo histórico e dialético, sendo a

base epistemológica de suas formulações (BOCK, 2001).

Para compreender o método utilizado por Marx e aderido por Vygotsky, é

válido salientar que, segundo Martins (2008), Marx parte do princípio de que a

realidade e tudo o que a constitui é de caráter material, sendo anterior à consciência.

Esse método de pensar a realidade a torna objetiva e real, assim, tudo o que

consiste nela, incluindo as sensações, ideias, conceitos, etc. emergem a partir da

materialidade do real. Nesse processo, o mundo objetivo é captado pelos sentidos e

representado pela consciência a quem irá tornar compreensível.

De acordo com Alves (2010, p. 1) a definição de materialismo para Marx é:

Materialismo é toda concepção filosófica que aponta a matéria como substância primeira e última de qualquer ser, coisa ou fenômeno do universo. Para os materialistas, a única realidade é a matéria em movimento, que, por sua riqueza e complexidade, pode compor tanto a pedra quanto os extremamente variados reinos animal e vegetal, e produzir efeitos surpreendentes como a luz, o som, a emoção e a consciência. O materialismo contrapõe-se ao idealismo, cujo elemento primordial é a ideia, o pensamento ou o espírito.

Seguindo esse caminho, o materialismo histórico tem como objetivo as

transformações econômicas e sociais, que se determinam a partir dos meios de

produção, enquanto a dialética posta por Marx é considerada a filosofia do

materialismo histórico, a parte teórica desse processo. O materialismo dialético

compreende que não existe essas concepções dualistas entre os âmbitos: sociais e

individuais, objetividade-subjetividade, interno-externo (ALVES, 2010).

Assim sendo, ainda conforme Alves (2010, p. 1),

Os princípios fundamentais do materialismo dialético são quatro: (1) a história da filosofia, que aparece como uma sucessão de doutrinas filosóficas contraditórias, dissimula um processo em que se enfrentam o princípio idealista e o princípio materialista; (2) o ser determina a consciência e não inversamente; (3) toda a matéria é essencialmente dialética, e o contrário da dialética é a metafísica, que entende a matéria como estática e anistórica; (4) a dialética é o estudo da contradição na essência mesma das coisas.

Nesta concepção, a história é movimento e não estática, inclui todo o

processo da constituição do ser e o que há em sua volta. Assim, o sujeito é

considerado como um ser social e histórico e a dialética presente nesse movimento

Page 20: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

19

se colocam como a lógica pela qual ele deve ser compreendido. O materialismo

histórico dialético, então, é considerado a epistemologia marxiana.

Vygotsky, em seus trabalhos, formulou suas ideias trazendo o social como

condição fundamental para a compreensão do desenvolvimento humano,

conduzindo elementos em sua obra que auxiliassem para tal compreensão. O ponto

de partida em suas ideias foi seu estudo acerca das funções psicológicas dos

indivíduos, as quais classificou em elementares, de origem biológica, e superiores,

de base sociocultural. Nesse sentindo, as funções psicológicas elementares estão

presentes nas crianças e nos animais; são determinadas pelas ações involuntárias,

reações imediatas e sofrem controle do meio externo. Já as funções superiores

ocorrem a partir do meio social, estando presentes apenas no homem. Por isso,

Vygotsky considera as ações psíquicas de origem sociocultural, pois há uma

interação do sujeito tanto no âmbito cultural, quanto no social (LUCCI, 2006).

Em ―A Formação Social da Mente‖, Vygotsky (1991) fala sobre como ocorreu

o processo de desenvolvimento de sua compreensão sobre as funções psicológicas.

Para o autor, foi de grande responsabilidade tratar sobre tais questões,

considerando cenário que a Psicologia se encontrava. A princípio, deveria incluir em

suas postulações uma abordagem que explicasse e que fosse possível haver uma

descrição das funções psicológicas superiores, de um modo a ser aceitável para as

ciências naturais. Desse modo, precisava também trazer um caráter científico a suas

ideias e, para isso, o estudioso buscou identificar os mecanismos cerebrais

subjacentes a uma função, sem perder a historicidade que embasou toda a sua

obra. Os métodos e princípios do materialismo dialético foram utilizados por ele

como o meio para solucionar os paradoxos presentes na Psicologia. Assim, sua

concepção sobre os processos psicológicos superiores esteve ancorada nessa

perspectiva e tais fenômenos foram compreendidos como processos de movimento

e mudança.

Em síntese, temos que o social e o cultural são características fundamentais

na obra de Vygotsky, além disso, o caráter histórico usado para explicar o

desenvolvimento humano em suas obras foi o que o diferiu tanto das outras

perspectivas de sua época (SIRGADO, 2000). Tais aspectos são pertinentes a sua

lei geral do desenvolvimento cultural. Sobre essa lei, Vygotsky explana que:

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20

Um processo interpessoal é transformado num processo intrapessoal. Todas as funções no desenvolvimento da criança aparecem duas vezes: primeiro, no nível social, e, depois, no nível individual; primeiro, entre pessoas (interpsicológica), e, depois, no interior da criança (intrapsicológica). Isso se aplica igualmente para a atenção voluntária, para a memória lógica e para a formação de conceitos. Todas as funções superiores originam-se das relações reais entre indivíduos humanos (VYGOTSKY, 1991, p. 41).

Lucci (2006) explica que o sujeito tem o desenvolvimento mental a partir da

interiorização das funções psicológicas, o que não acontece naturalmente e não é

apenas um processo de mudança do externo para o interno, mas diz respeito ao

processo pelo qual o interno é constituído, não seguindo um caminho único,

universal e independente do desenvolvimento cultural. A origem e o

desenvolvimento desse processo superior são sociais e mantêm três categorias de

mediadores que são: os signos e instrumentos; atividades individuais e relações

interpessoais.

O homem, na sua condição de um ser histórico e cultural é ativo e moldado

pela própria cultura que cria. Ao longo do tempo, o fazer humano se modifica,

caminhando de acordo com as demandas emergentes e as necessidades humanas.

As relações interpessoais são um fator determinante na vida do indivíduo, pois é a

partir da relação com o outro e por ela própria que ele é determinado. Logo, o

biológico e o social tornam-se características que se interligam nesse processo de

desenvolvimento (LUCCI, 2006).

Para Vygotsky, o desenvolvimento de habilidades para a concretização de

funções específicas e também a gênese da sociedade ocorrem a partir do trabalho,

que é tido como a atividade humana (LUCCI, 2006). Ancorado nas concepções

postas por Marx, Vygotsky afirma que os homens são formados através do trabalho.

Nessa relação, eles se objetivam e transferem características que são próprias

deles, como físicas e psíquicas, nos produtos de seu trabalho. É por meio do

trabalho que as relações sociais se internalizam e dão efeito ao desenvolvimento

psíquico (CASTRO, 2013).

Inspirado no conceito de trabalho de Marx e Engels, Sirgado (1990) elenca o

conceito de atividade, sendo este considerado um conceito fundamental na

construção da Psicologia Sócio-histórica e que está presente tanto nas ideias de

Vygotsky, como de Leontiev, este último sendo seu principal idealizador. Tem

Page 22: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

21

relação com a questão da consciência, já que a mesma é vista surgindo a partir do

processo de atividade humana.

O que nos torna únicos e diferentes dos animais é o fato de que a atividade

humana, sendo mediadora das relações do homem com a natureza, é uma atividade

criadora. Assim, ao agir sobre a natureza externa, o homem também é transformado

por ela. Nesse sentido, há três elementos compondo o modelo de atividade de

trabalho, que são: o sujeito ativo, o objeto e o mediador. A partir do objeto concebido

pelo trabalho é que se constitui a objetivação, ou seja, a concretização e a

internalização, do trabalho do homem.

Para Oliveira (2010), atividade refere-se a uma determinada mediação entre

homem e natureza, sendo esta última já modificada pelo trabalho humano. Não se

restringe apenas aos limites biológicos, ou seja, além de ser transformador da

natureza, o homem também está a ser modificado por ela, não se limitando a

satisfazer suas necessidades biológicas, mas sim, buscando dirigir-se pelas leis

histórico-culturais.

Aguiar (2001) também aborda o conceito de atividade e fala sobre o processo

de construção do fenômeno psicológico. Este é compreendido como a ―[...] atividade

do homem de registrar a experiência e a relação que mantém com o ambiente

sociocultural‖ (AGUIAR, 2001, p. 96). Para a autora, a relação do homem com o

mundo, seja a de interferir nesse mundo e também ser afetado por ele, permite ao

sujeito a construção de seus registros. O homem passa a se relacionar com o

mundo objetivo, coletivo, social e cultural e, a partir desses fatores, que se constitui

como ser humano. Assim, o fenômeno psicológico constitui-se por meio de toda

essa relação sociocultural que o homem está sujeito.

De acordo com Sirgado (1990), foi a partir do conceito de atividade que

Vygotsky elaborou o ponto indispensável de sua teoria acerca do funcionamento

psicológico: a mediação semiótica ou mediação simbólica. O conceito de mediação,

para Oliveira (1997, p. 26), é ―o processo de intervenção de um elemento

intermediário numa relação; a relação deixa, então, de ser direta e passa a ser

mediada por esse elemento‖. Para a autora, no decorrer de nossas experiências,

vamos atribuindo mais sentido às relações mediadas, fazendo com que estas se

tornem mais complexas, assim, ao longo do percurso do indivíduo, as relações

mediadas passam a predominar sobre as relações diretas. Vygotsky, em suas obras,

expõe a ideia de que a relação do homem com o mundo não é direta, mas sim

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22

mediada. E, ainda sobre mediação, Vygotsky elenca dois tipos de mediadores: os

instrumentos e os signos.

Oliveira (1997, p. 29) aborda que ―o instrumento é um elemento interposto

entre o trabalhador e o objeto de seu trabalho, ampliando as possibilidades de

transformação da natureza‖. Desse modo, pode-se afirmar que o instrumento é

utilizado quando se pretende alcançar certo objetivo, com isso, ele se torna um

mediador social entre a relação indivíduo e mundo. São elementos externos ao

sujeito, ou seja, sua função é provocar uma mudança nos objetos. Já em relação

aos signos, Vygotsky os intitula de instrumentos psicológicos, sendo uma ferramenta

que está relacionada ao interior do indivíduo, auxiliando em seus processos

psicológicos.

Quanto ao uso desse sistema simbólico, há uma mudança indispensável que

ocorre que é o processo de internalização, que significa ―[...] a reconstrução interna

de uma operação externa‖ (VYGOTSKY, 1991, p. 40).

Ainda sobre o processo de internalização, Cole e Scribner (1991, p. 11)

afirmaram que:

Vygotsky acreditava que a internalização dos sistemas de signos produzidos culturalmente provoca transformações comportamentais e estabelece um elo de ligação entre as formas iniciais e tardias do desenvolvimento individual. Assim, para Vygotsky, na melhor tradição de Marx e Engels, o mecanismo de mudança individual ao longo do desenvolvimento tem sua raiz na sociedade e na cultura.

Para Lucci (2006), a linguagem é o principal mediador social, tendo grande

importância e influência para o desenvolvimento das funções psicológicas

superiores. Atua sendo um sistema simbólico, que está envolto na história social do

homem, e age organizando os signos em estruturas complexas. Também funciona

como instrumento de comunicação, planejamento e autorregulação. Tal função

comunicativa permite ao indivíduo conectar-se ao mundo externo, onde terá a

possibilidade de ressignificar informações, conceitos e significados.

Oliveira (1997) aborda que o desenvolvimento da linguagem e as relações

que a mesma tem com o pensamento são temas crucias na obra de Vygotsky. A

necessidade de comunicação que há no sujeito é o que viabiliza o desenvolvimento

da linguagem. Há um percurso necessário para que o ser humano saia do aspecto

tão somente biológico para se transformar em um ser de caráter sócio histórico. Para

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23

isso, é necessário o uso da linguagem como um sistema de signos aliado ao

surgimento do pensamento verbal. Ambos conceitos têm forte relação para o

desenvolvimento do indivíduo e, em específico, ao da criança. Dessa forma,

Quando os processos de desenvolvimento do pensamento e da linguagem se unem, surgindo, então, o pensamento verbal e a linguagem racional, o ser humano passa a ter a possibilidade de um modo de funcionamento psicológico mais sofisticado, mediado pelo sistema simbólico da linguagem (OLIVEIRA, 1997, p. 47).

Orrú (2012), ao falar sobre pensamento e linguagem, aborda a relação entre a

atividade produtiva do ser humano e sua atividade cognitiva, em que a primeira

refere-se aos saberes históricos produzidos pelos homens que se convertem em

saberes do próprio indivíduo através da atividade cognitiva. Em meio a esse

processo, há a linguagem sendo mediadora e formadora da consciência. Ainda, a

autora afirma que ―A linguagem é, portanto, um instrumento da consciência com o

atributo de compor, controlar e planejar o pensamento em uma função de

intercambio social‖ (ORRÚ, 2012, p. 93).

Dentro dessa linha, Orrú (2012) aborda a relação que há entre a linguagem e

o pensamento e percebe-se a importância que a linguagem tem nesse processo e o

quanto é responsável pela transformação e o desenvolvimento do pensamento.

Sobre a relação da aprendizagem nesse processo, a autora elenca que:

Para tais processos, concorre a aprendizagem, que ocorre mediante a transformação construtiva de pensamentos, sentimentos e ações, envolvendo uma interação entre conhecimentos preliminares e conhecimentos novos que constroem outros significados psicológicos, resultantes em outras ações, pensamentos e linguagem (ORRÚ, 2012, p. 96).

Nessa perspectiva, Vygotsky teve como tema central de suas obras questões

que estavam relacionadas com o desenvolvimento humano, o aprendizado e a

relação entre desenvolvimento e aprendizado. Em seu percurso, levou muitas de

suas contribuições para a Psicologia e sempre apontou a relevância dos processos

de aprendizagem e o quanto estes se relacionam ao desenvolvimento das funções

psicológicas superiores. Atribui relevância ao papel do outro nesse processo de

aprendizado e também à necessidade que o sujeito tem de situações que propiciem

seu desenvolvimento. Para melhor compreender a relação que há entre

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24

desenvolvimento e aprendizado, Vygotsky formulou o conceito de zona de

desenvolvimento proximal - ZDP (OLIVEIRA, 1997).

Segundo Isaia (1998), o conceito de zona de desenvolvimento proximal

desenvolvido por Vygotsky busca compreender a assimilação entre a dimensão do

real e potencial do desenvolvimento humano, levando em consideração não só

aquilo que o sujeito já saiba e que já tenha internalizado, mas fundamentalmente

aquilo que ainda pode vir a aprender, através da mediação e das relações com o

outro. Dessa maneira, com a mediação semiótica, o uso de instrumentos e o auxílio

da relação cultural entre o social e o individual é que o respectivo conceito se

concretiza.

Como salienta Vygotsky (1991), a ZDP, ou seja, aquilo que o indivíduo e, em

específico, a criança podem vir a realizar, é um instrumento para desenvolver o

trabalho de psicólogos e educadores. Ela viabiliza o conhecimento de como ocorre o

curso interno do desenvolvimento, do quanto a criança já se desenvolveu e do

quanto ainda pode vir a se desenvolver.

Assim, caminhando para a compreensão do desenvolvimento da pessoa com

TEA e fazendo uma leitura da deficiência sob a ótica da perspectiva sócio-histórica,

Vygotsky trouxe diversas elucidações sobre essa área, tendo como ponto central

seu entendimento sobre a ZDP. Conforme Costa (2006), o autor centraliza seu

trabalho nas possibilidades do sujeito e não em seus défices. Desse modo, buscou

ampliar seu olhar se dispondo a trazer grandes contribuições para a temática. O

conceito de ZDP mostra que, a partir da mediação do outro, sejam estes pais,

amigos, professores, o sujeito terá condições de produzir melhor do que sozinha.

Esse processo revela que a criança tem possibilidades de desenvolver o que até

então não realizava.

De acordo com Vygotsky (2011), a partir da distinção entre as duas esferas

do desenvolvimento, a natural e a cultural, foi que houve um novo modo de pensar

as questões referentes à educação, enfatizando a concepção dialética do

desenvolvimento da criança. Por um longo período, o desenvolvimento da criança foi

tido por uma linha linear, como explicou Vygotsky (2011, p. 867):

Toda a nossa cultura é calculada para a pessoa dotada de certos órgãos – mão, olho, ouvido – e de certas funções cerebrais. Todos os nossos instrumentos, toda a técnica, todos os signos e símbolos são calculados para um tipo normal de pessoa. E daqui surge aquela ilusão de convergência, de passagem natural das formas naturais às culturais, que,

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de fato, não é possível pela própria natureza das coisas e a qual tentamos revelar em seu verdadeiro conteúdo.

Os casos de desenvolvimento de pessoas com deficiências possibilitam

perceber com nitidez a diferença entre o desenvolvimento cultural e o natural, sendo

o primeiro, um caminho para a educação da criança com deficiência. Assim,

caminhos indiretos são construídos, proporcionando o desenvolvimento dessa

criança através de um aparato fisiológico que, por vezes, pode ser diferente do tido

como natural.

Por muito tempo, todo o olhar da Psicologia para a criança com deficiência

deu-se a partir de uma visão de perda, das faltas que a deficiência acometia nela.

Entretanto, para substituir esse entendimento, elabora-se outro olhar, que analisa a

dinâmica da criança com deficiência e seu desenvolvimento, partindo da

compreensão dessas perdas e faltas, mas também buscando enxergar para além,

obtendo estímulos para caminhos alternativos de desenvolvimento (VYGOTSKY,

2011).

Mediante a compreensão e o estudo das ideias de Vygotsky sobre a

deficiência e todo o aparato que sua teoria pode oferecer acerca do

desenvolvimento da criança com deficiência, em específico, da criança com TEA, é

que esse trabalho está pautado. Assim, no próximo capítulo, serão discutidos os

principais conceitos e definições que estão envoltos no Transtorno do Espectro

Autista, fazendo uma ponte com a teoria de Vygotsky, a partir da perspectiva sócio-

histórica de desenvolvimento e buscando um maior entendimento sobre o respectivo

transtorno.

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26

3 O TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA: CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DO

CONCEITO E A VISÃO DA PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL

Neste capítulo, será realizado um remonte histórico acerca do TEA,

abrangendo a origem do termo, o início dos estudos sobre o conceito, sua definição,

características, causas e os aspectos utilizados para chegar ao diagnóstico,

abordando, assim, as principais características que circundam essa síndrome,

tomando como referencial a perspectiva da Psicologia Histórico-cultural.

De acordo Silva, Gaiato e Reveles (2012), o autismo configura-se como um

dos Transtornos Globais do Desenvolvimento Infantil, manifestando-se antes dos 3

anos de idade e que perdura por toda a vida. Todavia, o uso desse termo é anterior

ao sentido atual. Segundo Orrú (2012), a palavra autismo é de origem grega (autós),

cujo significado é por si mesmo, fazendo menção aos comportamentos humanos

que são centrados em si mesmos.

Assim, o termo ―autismo‖ foi implementado pela primeira vez na psiquiatria

por Plouller, em 1906, com a discrição de indicativo clínico de isolamento em alguns

casos (BRASIL, 2013). Já conforme descrito por Stelzer (2010), as primeiras

descrições a respeito do ―autismo‖ foram introduzidas pelo médico psiquiatra Eugen

Bleuler (1857-1939), o qual introduziu na literatura médica o termo ―autismo‖. A

princípio, era utilizado para falar sobre pessoas com muitas dificuldades para

interagir com as outras e com muita tendência ao isolamento. O significado que

Bleuler tinha sobre o autismo difere muito do que encontramos nos dias atuais já

que para ele o autismo tinha correlação com a esquizofrenia.

Na década de 1940, o psiquiatra austríaco, Léo Kanner foi o primeiro a

discordar da definição colocada por Bleuler, assumindo, em suas publicações, que o

autismo era uma condição diferente da esquizofrenia. Redirecionou seus estudos

para as crianças que ele observou ter comportamentos atípicos, com a presença de

estereotipias e dificuldades na interação social (ORRÚ, 2012).

Em 1943, descreveu o caso de 11 crianças que apresentavam características

marcantes de distúrbio do desenvolvimento, publicando um informe intitulado por:

―Alterações autistas do contato afetivo‖. Kanner destacou-se como o primeiro médico

a publicar uma análise detalhada sobre o que nomeou de ―Distúrbios Autístico do

Contato Afetivo‖. Nesse estudo de caso, conseguiu perceber e detalhar algumas

características que se apresentavam, tais como dificuldades em estabelecer

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27

relações interpessoais, comportamentos repetitivos, prejuízos na linguagem e uma

sequência limitada de atividades ritualizadas (ORRÚ, 2012).

Orrú (2012, p. 19) explica que:

Kanner diferenciava o distúrbio autístico do grupo das esquizofrenias, discordando do que fora afirmado por Bleuler em 1911, por entender não se tratar de uma doença independente e, sim, de mais um dos sintomas da esquizofrenia. Bleuler enfatizava a ―deteriorização emocional‖ no quadro clínico da esquizofrenia, ressaltando, no autismo, mais o distúrbio com relação à realidade do que ao contato afetivo. Todavia, Kanner, desde o início, constatou que, apesar de o esquizofrênico se isolar do mundo, havia uma grande diferença em relação ao autista, pois este jamais conseguiu, sequer, penetrar nesse mundo mencionado por Bleuler.

Em 1956, Kanner elencou dois sinais básicos como indicativos do quadro: o

isolamento e a imutabilidade; e também confirmou a natureza inata desse distúrbio.

Desde então, têm sido adotadas as mais diversas denominações e sendo descritas

por diferentes sinais e sintomas mediante a classificação diagnóstica utilizada, mas

sempre aderindo aos dois pontos explicitados por Kanner (BRASIL, 2013).

Em 1944, Hans Asperger, um pediatra austríaco, cujo interesse era na área

de educação especial, fez a descrição do caso de quatro crianças que possuíam

dificuldades em se integrar em grupos. É válido salientar que Asperger não teve

conhecimento sobre as obras publicadas por Léo Kanner sobre o autismo infantil,

denominando a condição como uma ―psiquiatria autística‖ que se apresentava um

transtorno estável de personalidade caracterizados pelo isolamento social.

Em suas observações, notou que as crianças apresentavam uma pobreza

notável na comunicação não-verbal, uma empatia pobre e uma tendência a

intelectualizar as emoções, uma fala prolixa e uma linguagem que tendia ao

formalismo. Diferentemente do estudo de caso realizado por Kanner, as crianças

observadas por Asperger não eram tão retraídas ou alheias, elas também

desenvolviam, às vezes precocemente, uma linguagem altamente correta (KLIN,

2008).

De acordo com Belisário Filho e Cunha (2010), as descrições de Asperger

foram publicadas em alemão, logo no pós-guerra, não sendo traduzidas para outro

idioma, sendo provavelmente um dos motivos pelo qual suas obras terem sido

desconhecidas por de parte do tempo. Apenas na década de 1980 que seus

trabalhos foram reconhecidos e o médico tido como um dos pioneiros nas pesquisas

sobre o autismo.

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28

As observações realizadas por Kanner e Asperger apresentavam tanto pontos

convergentes como divergentes. Percebe-se que a preocupação maior de Asperger

foi com os aspectos educacionais dessas crianças, o que não foi pontuado nas

postulações realizadas por Léo Kanner. Já como critérios semelhantes, ambos

perceberam nas crianças que observaram a ausência ou dificuldades na

comunicação e linguagem (BELISÁRIO FILHO; CUNHA, 2010).

Mediante os estudos realizados por Hans Asperger foi que teve origem o que

mais adiante foi intitulado de transtorno de Asperger. Com base no Manual de

Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, 4ª edição do DSM-IV, as

características do transtorno de Asperger são: prejuízos na interação social e no

desenvolvimento de padrões repetitivos de comportamentos, interesses e atividades.

Nesse caso, não se observa atrasos significativos na linguagem, no

desenvolvimento cognitivo, nas habilidades de autoajuda e comportamento

adaptativo (BELISÁRIO FILHO; CUNHA, 2010).

Ainda conforme Belisário Filho e Cunha (2010) há a possibilidade de que o

transtorno de Asperger seja mais tardio para aparecer e ser identificado,

apresentando-se mais fortemente manifestado no período escolar onde as

dificuldades de interação tornam-se mais evidentes. Quando chegam na vida adulta,

essas pessoas podem apresentar dificuldades com a empatia e modulação da

interação social.

Na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas

Relacionados à Saúde (CID 10), o TEA é abordado como um transtorno invasivo do

desenvolvimento que é percebido pela presença de comprometimentos, ou seja, um

desenvolvimento atípico que se manifesta até os 3 anos de idade. As três áreas

prejudicadas são: 1) interação social; 2) comunicação; e 3) comportamento restrito e

repetitivo. Algo que também vem sendo percebido é a incidência maior em meninos

do que em meninas. Somado aos comprometimentos citados, há também problemas

como: medo/fobias, perturbações de sono e alimentação, ataques de briga e

agressão, autolesões (ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE, 1998).

Já o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM-V

(AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014), aborda o conceito de autismo

da seguinte forma:

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29

O transtorno do espectro autista caracteriza-se por déficits persistentes na comunicação social e na interação social em múltiplos contextos, incluindo déficits na reciprocidade social, em comportamentos não verbais de comunicação usados para interação social e em habilidades para desenvolver, manter e compreender relacionamentos. Além dos déficits na comunicação social, o diagnóstico do transtorno do espectro autista requer a presença de padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades. Considerando que os sintomas mudam com o desenvolvimento, podendo ser mascarados por mecanismos compensatórios, os critérios diagnósticos podem ser preenchidos com base em informações retrospectivas, embora a apresentação atual deva causar prejuízo significativo (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014, p. 31-32).

Desse modo, observa-se que a compreensão de autismo vem se modificando

com o passar dos anos. Por muito tempo, o transtorno autista, transtorno de

Asperger e o transtorno global do desenvolvimento eram compreendidos

separadamente. Já o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais –

DSM-V apresentou uma junção desses três transtornos, pois avaliou os prejuízos

que vão de leves aos mais graves em áreas de comunicação social, interação e

comportamentos restritivos e repetitivos e passou a agrupá-los em um contínuo, não

sendo mais necessário haver a distinção entre os três (AMERICAN PSYCHIATRIC

ASSOCIATON, 2014).

O TEA, conforme consta nas Diretrizes de Atenção à Reabilitação da Pessoa

com Transtornos do Espectro do Autismo (TEA), passou a pertencer a um grupo de

Transtornos Globais (ou invasivos) do Desenvolvimento (TGD) e, ainda mais

recente, denominaram-se o Transtorno do Espectro do Autismo sendo apenas parte

dos TGD (BRASIL, 2014).

O conceito de Transtornos Globais do Desenvolvimento surge no final dos

anos 1960, através dos trabalhos de M. Rutter e D. Cohen, autores que, através de

suas contribuições, traduziram o autismo como sendo um transtorno do

desenvolvimento. Através desse modelo explicativo, o autismo deixou de ser

compreendido como uma psicose infantil, como foi compreendida ao longo de anos

(BELISÁRIO FILHO; CUNHA 2010). Mais recentemente, segundo as Diretrizes de

Atenção à Reabilitação da Pessoa com Transtornos do Espectro do Autismo (TEA),

denominaram-se os transtornos do espectro do autismo, para se referir a apenas

uma parte dos TGD: o autismo, a síndrome de Asperger e o transtorno global do

desenvolvimento sem outra especificação (BRASIL, 2014).

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30

Com relação às causas do autismo, sendo esse um questionamento muito

feito – principalmente quando os pais e/ou responsáveis pela criança se deparam

com o diagnóstico – ainda continua sendo um dos pontos de maior discussão a

respeito do quadro. Ao longo do tempo, várias teorias já foram elencadas sobre o

seu porque, algumas já foram descartadas, como a da ―mãe geladeira‖, descrita e

defendida por Kanner. Nessa ideia, o autor atribuía à mãe o papel de principal

responsável pela síndrome apresentada na criança. Sua justificativa era a de que ele

acreditava que os comportamentos e comprometimentos que a criança apresentava

se davam devido a um ambiente frio e sem afeto, resultando no desenvolvimento

atípico da criança (ANDRADE, 2012).

O autor Sacks (1995), em seu livro ―Um antropólogo em marte: sete histórias

paradoxais‖, também aborda algumas das teorias que já fizeram parte da

compreensão dos motivos causais do TEA. Segundo Sacks,

Que a disposição para o autismo seja biológica é algo que não está mais em questão, nem as provas cada vez maiores de que ele seja, em alguns casos, genético. Geneticamente, o autismo é heterogêneo — por vezes dominante, por outras recessivo. Ele é mais comum nos homens - A forma genética pode ser associada, no indivíduo ou na família afetada, a outros distúrbios genéticos, como dislexia, distúrbios de déficit de atenção, distúrbio obsessivo-compulsivo ou síndrome de Tourette. Mas o autismo também pode ser adquirido, o que foi percebido pela primeira vez nos anos 60, com a epidemia de rubéola, quando um grande número de bebês cujas mães tiveram a doença durante a gravidez acabaram desenvolvendo-o. Ainda não se sabe se as chamadas formas regressivas do autismo — por vezes com perdas abruptas de linguagem e comportamento social em crianças entre os dois e quatro anos que anteriormente vinham se desenvolvendo de uma forma relativamente normal — são causadas geneticamente ou pelo meio. O autismo pode ser uma consequência de problemas metabólicos (como a fenilcetonúria) ou mecânicos (como o hidrocefalia). O autismo, ou as síndromes com características autistas, pode aparecer mesmo durante a vida adulta, embora raramente, em especial após certas formas de encefalite (SACKS, 1995, p. 168).

Atualmente, é considerado uma síndrome neuropsiquiátrica. Ainda que não

haja ao certo sua origem etiológica definida, fatores neurobiológicos, genéticos e

fatores de risco psicossociais são apontados, de acordo com estudos, estando

associados ao TEA. Dentre os sinais e sintomas que se expressam nesse caso

clínico, nem todos se apresentam de forma generalizada nos indivíduos, entretanto,

as características de invariabilidade de condutas e isolamento, estão sempre

presentes (BRASIL, 2014).

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31

Em relação ao diagnóstico, constata-se que, com o DSM-V, houve uma

mudança no que se diz respeito ao que foi chamado de tríade autística: interação

social, comunicação e comportamento restrito e repetitivo. Mediante ao manual

citado, são observadas apenas duas categorias: 1) Déficits de comunicação e

interação social; e 2) padrões repetitivos e restritos de comportamentos, interesses e

atividades. São esses os critérios utilizados, atualmente, para compor o diagnóstico

de TEA (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATON, 2014).

Esse processo de diagnóstico é essencialmente clínico e torna-se mais

efetivo quando realizado por equipe multidisciplinar que deve compor, no mínimo,

um médico psiquiatra ou neurologista, psicólogo e fonoaudiólogo, havendo um

compartilhamento de saberes cada qual com suas especificidades. Também é

necessário uma entrevista com os pais ou cuidadores, na qual são colhidas

informações que percorrem desde a gestação até a idade atual da criança. Por fim,

há a observação direta do comportamento quando são avaliados os critérios já

explicitados de interação social, linguagem e comunicação (BRASIL, 2013).

Atualmente, a classificação oficial do autismo é realizada tendo como fonte os

critérios encontrados no CID-10, somados com os do DSM-V. Assim, fazendo uso

desses dois recursos e com todos os outros passos é possível ter mais eficiência e

confiança nesse diagnóstico.

No decorrer de cada leitura e tendo em vista cada momento histórico

vivenciado pelo autismo, percebe-se a singularidade que há em cada indivíduo que

possui esse diagnóstico e o quanto ele ainda é um fenômeno novo. Não há uma

razão única para afirmar sua causa, nem mesmo uma única forma de se manifestar.

Tal como descrito por Silva (2019, p. 28):

O TEA não deve ser circunscrito à ideia de um transtorno, mas sim uma condição do sujeito, uma possibilidade de seu ser no mundo. Para tanto, aponta-se a necessidade de uma perspectiva crítica que considere os sujeitos, independente de pensar somente em causas e sintomas de transtornos como algo que limite o desenvolvimento desses indivíduos.

Concordando com Silva, na próxima seção, buscaremos traçar algumas

ideias sobre uma visão da Psicologia Histórico-cultural do TEA, a partir de

discussões acerca do conceito de deficiência, em especial no âmbito da inclusão.

Page 33: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

32

3.1 O TEA em uma leitura da Psicologia Histórico-cultural

Para entender o TEA em uma visão crítica, é necessária uma elucidação de

dois pensamentos sobre do que viria a ser deficiência. A discussão em torno da

concepção de deficiência é algo que vem acontecendo já há um bom tempo,

havendo inúmeras problematizações sobre o tópico e diferentes formas de concebê-

la. Em uma sociedade fortemente alicerçada em um modelo normalizante de se

pensar, torna-se indispensável discussões que fomentem uma visão que coloquem o

sujeito com deficiência sendo alguém capaz de se desenvolver com as adequações

necessárias.

De acordo com Diniz (2003), em grande parte do tempo, a deficiência passou

a ser unicamente compreendida através do modelo médico que se trata de uma

lógica biologicista, na qual a lesão do sujeito é apenas vista como uma perda, que o

limita integralmente. A necessidade de um modelo que se opusesse a essa lógica

tão normatizante surgiu quando o modelo social se estruturou em contraposição

esse entendimento medicalizante.

O modelo social da deficiência estruturou-se em oposição ao que ficou conhecido como modelo médico da deficiência, isto é, aquele que reconhecia na lesão a primeira causa da desigualdade social e das desvantagens vivenciadas pelos deficientes, ignorando o papel das estruturas sociais para a opressão dos deficientes (DINIZ, 2003, p. 2).

Através do modelo social, a concepção de deficiência começa a ser vista por

um outro viés, pois, para o modelo social, a produção da deficiência vai estar

relacionada à estrutura social, enquanto para o modelo médico, estará

essencialmente no indivíduo. Originalmente, o modelo social partia de dois

pressupostos: um deles era a ideia de que a limitação do sujeito para desenvolver-

se não estava unicamente na lesão que o mesmo viesse a ter, mas sim nas

barreiras que eram postas a ele; e a segunda era a ideia de que, com a retirada

dessas barreiras, em específico as sociais, o sujeito poderia desenvolver sua

independência (DINIZ, 2003).

Sobre a discussão que há em torno do conceito de deficiência e,

considerando as dimensões biopsicossociais, foi promulgado, no ano de 2007, o

texto da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

No decorrer do documento da Convenção, são nítidas as mudanças que ocorreram

Page 34: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

33

com a transição de uma concepção pautada em um modelo médico para um modelo

social (BRASIL, 2009).

A deficiência, tal como consta no documento da Convenção, é compreendida

como:

[...] um conceito em evolução e que a deficiência resulta da interação entre pessoas com deficiência e as barreiras devidas às atitudes e ao ambiente que impedem a plena e efetiva participação dessas pessoas na sociedade em igualdade de oportunidades com as demais pessoas (BRASIL, 2009, p. 1-2).

Porquanto a pessoa com deficiência passa a não ser mais compreendida

como alguém reduzida a sua lesão, mas sim, como alguém dotado de possibilidades

e habilidades a serem desenvolvidas. O fator limitante redireciona-se para as

barreiras ambientais em que a pessoa está inserida, suscitando a necessidade de

políticas públicas que possam efetuar a acessibilidade e a equiparação de

oportunidades.

Assim sendo, a presença de uma deficiência não implica no fato de que o

sujeito deva ser considerado doente, o documento da Convenção aproxima-se do

modelo social de se pensar a deficiência, tendo como propósito ―[...] proteger e

assegurar o exercício pleno e equitativo de todos os direitos humanos e liberdades

fundamentais por todas as pessoas com deficiência e promover o respeito pela sua

dignidade inerente‖ (BRASIL, 2009, p. 3)

Com os olhares voltados para a sociedade, é possível perceber o quão

limitante ela vem sendo para uma pessoa com deficiência, cerceando a

possibilidade da mesma desenvolver-se nas condições adequadas. Reconhecendo

a deficiência como uma construção social, é possível perceber a relação que há

entre o sujeito em sua condição e a sua relação sócio-histórica e cultural (SILVA,

2019).

Consoante a tal reconhecimento, a Psicologia Histórico-cultural traz em suas

ideias contribuições para o assunto que está sendo abordado, como vimos

brevemente no capítulo anterior. Nuernberg (2008) aborda a diferenciação que

Vygotsky fez ao tratar sobre deficiências, distinguindo-as em duas categorias:

primária e secundária. A primeira tem origem na dimensão orgânica e a segunda

envolve os aspectos psicossociais. No que concerne às limitações secundárias,

nota-se a relação cultural que remete ao fato de o elemento cultural ser construído e

Page 35: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

34

pautado em função de um padrão de normalidade, que resulta em todas as barreiras

existentes, sejam elas sociais, culturais, profissionalizantes e educacionais da

pessoa com deficiência. Desse modo,

Cria-se, assim, um círculo vicioso no qual, ao não se acreditar na capacidade de aprender das pessoas com deficiência, não lhe são ofertadas condições para superarem suas dificuldades. Em conseqüência [sic], elas ficam condenadas aos limites intelectuais inerentes à deficiência, tomados assim como fatos consumados e independentes das condições educacionais de que dispõem (NUERNBERG, 2008, p. 309).

Mesmo com tantas barreiras, as pessoas com deficiência podem se

desenvolver, em muitos casos, adotando vias alternativas de desenvolvimento,

possibilitado pela compensação social, conceito elaborado por Vygotsky. A

compensação social consiste na reação do sujeito com deficiência em superar as

limitações que lhe são postas, utilizando-se da mediação simbólica. O autor faz uma

leitura entre questões sociais e culturais. E instiga áreas, em especial a da

educação, a criar oportunidades para que a compensação social possa ocorrer de

forma efetiva e objetiva (NUERNBERG, 2008).

O próprio Vygotsky (2011, p. 869) cita sobre o conceito de compensação e, já

em sua época, nota-se que ele sempre trazia em suas obras que era possível

compreender a deficiência para além de seu caráter primário. Atribuindo grande

enfoque para o desenvolvimento cultural e tudo o que dele pode se ter como

oportunidades.

O olhar tradicional partia da ideia de que o defeito significa menos, falha, deficiência, limita e estreita o desenvolvimento da criança, o qual era caracterizado, antes de mais nada, pelo ângulo da perda dessa ou daquela função. Toda a psicologia da criança anormal foi construída, em geral, pelo método da subtração das funções perdidas em relação à psicologia da criança normal. Para substituir essa compreensão, surge outra, que examina a dinâmica do desenvolvimento da criança com deficiência partindo da posição fundamental de que o defeito exerce uma dupla influência em seu desenvolvimento. Por um lado, ele é uma deficiência e atua diretamente como tal, produzindo falhas, obstáculos, dificuldades na adaptação da criança. Por outro lado, exatamente porque o defeito produz obstáculos e dificuldades no desenvolvimento e rompe o equilíbrio normal, ele serve de estímulo ao desenvolvimento de caminhos alternativos de adaptação, indiretos, os quais substituem ou superpõem funções que buscam compensar a deficiência e conduzir todo o sistema de equilíbrio rompido a uma nova ordem.

Page 36: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

35

Em consonância com o que foi exposto por Orrú (2012), as pessoas com

deficiência ao longo da história foram colocadas à margem da sociedade,

encontrando sempre barreiras que as impediam de se desenvolver e sendo alvos de

adjetivos que as limitavam e rotulavam como pessoas incapazes e doentes. Tudo

mediante a uma cultura que criou seus parâmetros de referência em um modelo

perfeito. Historicamente, a deficiência foi associada às mais diversas causas, sendo

vinculada a manifestações sobrenaturais, penalizações de cunho religioso até as

concepções atuais. Pelos caminhos percorridos, é possível acompanhar o modo que

a pessoa com deficiência foi sendo tratada e percebida, estando distante sobre o

conhecimento dos direitos do cidadão.

Esse padrão normalizante de ditar como se deve ser é algo que vem sendo

muito discutido. Amaral (1998) faz uma análise sobre o que viria a ser uma diferença

significativa, diferença física e deficiência. Para ela, uma diferença significativa diz

respeito a determinadas características do sujeito que desviam do que é socialmente

construído como normal ou ideal e que causam tensão ou conflito em um dado

grupo. Em suas reflexões, a autora considera que a deficiência, como uma diferença

significativa, não deve ser considerada de forma pejorativa ou patológica. Ao

contrário:

Penso que se abstrairmos ou mesmo ―desconstruirmos‖ a conotação pejorativa das palavras: significativamente diferente, divergente, desviante, anormal, deficiente e pensarmos nos parâmetros que as produzem, poderemos nos debruçar sobre elas para melhor contextualizar os critérios empregados para sua eleição com designativas de algo ou alguém. Ou seja, penso que devemos reconhecer que normalidade e anormalidade existem (e por isso abstenho-me de usar aspas), mas o que efetivamente interessa na experiência do cotidiano é problematizar os parâmetros que definem tanto uma como outra. Penso também que a partir da exploração e do questionamento desses parâmetros pode-se pensar a anormalidade de forma inovadora: não mais e somente como patologia – seja individual ou social – mas como expressão da diversidade da natureza e da condição humana, seja qual for o critério utilizado (AMARAL, 1998, p. 15, grifos da autora).

No caso do TEA, também é patente essa associação, como se as

características apresentadas pelo indivíduo fossem um traço de uma patologia.

Todavia, assim como Amaral (1998), entendemos que se trata mais de uma

condição do sujeito.

Assim, o TEA, tal como conhecido nos dias atuais, abarca diversos

comportamentos atípicos, que se manifestam em cada indivíduo de forma singular,

Page 37: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

36

sendo marcado por três níveis que vão medir a intensidade desses comportamentos:

leve, moderado e severo.

Ainda que com leis que já buscavam efetivar o direito das pessoas com

deficiência, o TEA, por um espaço de tempo, não era considerado dentro dessas leis

por não ser concebido como uma deficiência. Como mencionamos na Introdução,

apenas no ano de 2012, com a Lei de nº 12.764, de 27 de dezembro de 2012, que

as pessoas com o Transtorno do Espectro do Autismo obtiveram esse lugar,

passando a ter seus direitos reservados e podendo usufruir das políticas de inclusão

destinadas às pessoas com deficiência.

Antes de tudo e tal como posto por Orrú (2012), com toda a diversidade de

comportamento atípicos e da maneira pela qual podem se apresentar em cada

sujeito, pode-se perceber que quando o processo de intervenção precoce é

planejado seguindo os parâmetros de uma equipe multidisciplinar que vão em busca

de desenvolver uma avaliação contínua, há uma maior chance da pessoa com

autismo desenvolver-se de maneira a reduzir os impactos que o TEA possa

oferecer.

Dentre o quadro de comportamentos e dificuldades que o TEA engloba, há de

um modo muito marcante, os déficits de comunicação e linguagem. A evolução de

sistemas simbólicos para os mais complexos ou abstratos, inerentes à linguagem,

contribui para o melhor desenvolvimento e ajustamento social do sujeito, permitindo

que ele possa melhor interagir com os demais. Culturalmente, é a partir da

linguagem que o sujeito irá desenvolver suas habilidades sociais, entretanto, é na

linguagem e comunicação em que se converge o maior obstáculo no autismo,

mesmo ainda havendo pessoas autistas que conseguem desenvolver suas

habilidades de conversação (ORRÚ, 2012). Sobre isso, o DSM-V afirma que:

Déficits verbais e não verbais na comunicação social têm manifestações variadas, dependendo da idade, do nível intelectual e da capacidade linguística do indivíduo, bem como de outros fatores, como história de tratamento e apoio atual. Muitos indivíduos têm déficits de linguagem, as quais variam de ausência total da fala, passando por atrasos na linguagem, compreensão reduzida da fala, fala em eco até linguagem explicitamente literal ou afetada. Mesmo quando habilidades linguísticas formais (p. ex., vocabulário, gramática) estão intactas, o uso da linguagem para comunicação social recíproca está prejudicado no transtorno do espectro autista (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014, p. 53).

Page 38: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

37

Ancoradas nas concepções e critérios do DSM-V e CID-10, materiais

utilizados para o diagnóstico do TEA, compreendemos que pessoas com autismo de

graus leves a severos podem manifestar suas capacidades limitadas no

desenvolvimento de sua linguagem. É ressaltado, embasado em estudos

neurológicos, que ambientes ruidosos e barulhentos podem incomodar e causar

danos à comunicação. Também, a questão social em que se insere a pessoa com

TEA tem oferecido grandes considerações a respeito das dificuldades ou da

ausência da interação social. Em uma sociedade marcada pelo grande estigma e

preconceito que circundam a pessoa com deficiência, nota-se uma prática de

imposição de um padrão normatizante de contato para com o outro, o que resulta

em uma visão reduzida para todo o potencial que a pessoa com deficiência venha a

ter (ORRÚ, 2012).

O desconhecimento relativo ao desenvolvimento da pessoa com TEA

percorre não só o senso comum, como a áreas educacionais e até mesmo a área

clínica. Sobre a questão da educação da pessoa com TEA, abre-se a necessidade

de repensar a educação tal como ela está ainda sendo compreendida, devendo o

desenvolvimento da linguagem estar como eixo principal em um projeto pedagógico.

Reforçamos ainda mais a importância que a linguagem tem na vida do sujeito, a

partir dela que temos a comunicação, que pode ocorrer de múltiplas formas, seja

através de uma linguagem falada, escrita ou codificada.

A função comunicativa da linguagem ocorre a fim de que tais pessoas

consigam expressar seus sentimentos, pensamentos. Como um recurso para

aqueles que possuem prejuízos nessas habilidades, foi desenvolvido a

Comunicação Suplementar e/ou Alternativa (CSA), que são uma forma de construir

símbolos que podem ser de representações visuais, auditivas ou táteis com o

objetivo de ―[...] favorecer a capacidade das pessoas no estabelecimento e na

manutenção da interação social e possibilidade da comunicação‖ (ORRÚ, 2012, p.

68). O CSA pode ser uma ponte de acesso para professores, familiares e

profissionais.

Em uma perspectiva histórico-cultural, não se exclui a importância da

participação do outro nesse processo da constituição da linguagem no

desenvolvimento da pessoa com TEA. É, pois, na relação com o outro que o sujeito

irá se desenvolver, constituir-se enquanto ser e quando irá se apropriar da cultura. A

linguagem, assim, para além da função comunicativa, implica diretamente para o

Page 39: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

38

desenvolvimento das funções psicológicas superiores, destaca-se em seu papel

fundamental na vida do sujeito que o possibilita a ter uma participação efetiva no

mundo social. Desse modo, através dela, o indivíduo irá significar o mundo

sociocultural em que está inserido tanto como a si mesmo (CHIOTE, 2013).

Diante da criança com TEA e analisando as questões de linguagem e

dificuldades de comunicação, nota-se que o papel do outro na vida da criança se

limita, enquanto o outro também limita suas ações para com a criança. Seguindo a

leitura de Vygostky acerca da deficiência secundária, a relação que porventura se

estabelece com o outro passa a ser algo sem sentido ou com sentidos restritos da

criança para com o outro e com ela mesmo. Aqui, ressalta-se a importância que

esses sentidos produzidos têm na vida do sujeito, estando diretamente ligados a

como que o indivíduo irá organizar e orientar suas ações (CHIOTE, 2013).

É notório que as concepções hegemônicas do TEA estão relacionadas às

noções de desvio e anormalidade, descrevendo o sujeito unicamente pelo seu

diagnóstico. Cessar com essas concepções requer um novo olhar para a pessoa

com TEA que busque o rompimento da visão estigmatizante que a deficiência tem e

direcione um olhar para as possibilidades que há em cada indivíduo. Concordamos

com Chiote (2013) quando afirma que é preciso considerar a criança com TEA a

partir de seu meio social, situando-a a partir do que ela pensa, sente e da forma com

que representa o mundo. O desenvolvimento, tal como já explicitado, não acontece

de forma independente da vida social, o outro tem papel constitutivo na vida do

sujeito, tanto como a linguagem.

O desenvolvimento cultural, como já citado anteriormente, é fundamental na

vida do sujeito. Ao situar uma criança com deficiência sem pensar em estratégias de

inclusão que viabilizem seu melhor desenvolvimento, coloca-se em risco o acesso

ao seu contato com a cultura e tudo o que dela se obtém. Atualmente, o TEA passou

a ter várias formas de intervenção com profissionais de áreas diversas, contando

com recursos que viabilizem a reabilitação do sujeito. Algumas dessas alternativas

de intervenção, embora possuam efetividade em certos aspectos, muitas vezes

excluem a importância do desenvolvimento a partir do social, do contexto em que

cada indivíduo se insere, o que resulta na ausência de situações significativas que

possibilitem a internalização do que se é experienciado (CHIOTE, 2013).

Desse modo, a análise do contexto no qual a pessoa com TEA está inserida,

revela que o desconhecimento leva ao atraso na evolução de qualidade de vida

Page 40: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

39

dessas pessoas. O olhar limitado impede de ver o potencial que cada um possui e a

capacidade de desenvolver suas habilidades com as condições que lhe são

necessárias.

Page 41: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

40

4 PERCURSOS METODOLÓGICOS

A presente pesquisa surgiu a partir do interesse em analisar como a

linguagem e comunicação de pessoas com o Transtorno do Espectro Autista (TEA)

vêm sendo abordadas e discutidas na Revista de Educação Especial Brasileira e

quais estratégias de intervenção nesse âmbito vêm sendo mais difundidas. Desse

modo, trata-se de uma pesquisa exploratória, pois, conforme Gonsalves (2005),

busca um desenvolvimento maior sobre determinada temática, propiciando um

esclarecimento de ideias de algo pouco explorado, contribuindo como uma pesquisa

de base para que, posteriormente, haja um suporte para investigações mais

elaboradas.

Nesse sentido, para atender aos objetivos traçados, optou-se por uma

pesquisa de caráter bibliográfico e qualitativo, na qual foi realizada uma revisão de

trabalhos já publicados que discutissem sobre comunicação e linguagem de pessoas

com TEA. Nessa pesquisa, enfocamos, nos artigos científicos encontrados, os

métodos de trabalho e a concepção que vem sendo publicada sobre a comunicação

e linguagem da pessoa com TEA.

No tocante à pesquisa qualitativa, Minayo, Deslandes e Gomes (2002)

explicam que ela trabalha com um universo de significados que não podem ser

quantificados, também com motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes. Tal

abordagem direciona seu aprofundamento no mundo dos significados das ações e

das relações humanas. Assim, o referido método de pesquisa torna-se abrangente

para valorizar a singularidade humana.

Amaral (2007) fala sobre a pesquisa bibliográfica e a situa como sendo uma

etapa fundamental para o desenvolvimento de um estudo, que tem respaldo no

levantamento, fichamento e arquivo de informações que serão integradas à

pesquisa. Nesse sentido, ―a pesquisa bibliográfica implica em um conjunto ordenado

de procedimentos de busca por soluções, atento ao objeto de estudo, e que, por

isso, não pode ser aleatório‖ (LIMA; MIOTO, 2007, p. 38).

A pesquisa bibliográfica permite ao pesquisador entrar em contato com uma

vasta quantidade de materiais dispostos em diversas plataformas de pesquisas e

livros, que contribuem para o desenvolvimento de novos estudos. Também é válido

Page 42: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

41

para ver a evolução de estipulado tema no decorrer dos anos, servindo como ponto

de partida para novas concepções.

Em suma, esse método de pesquisa torna-se relevante, pois permite uma

maneira singular de se conceber e avaliar a realidade. Fazendo um levantamento, a

partir dos artigos científicos encontrados, esse método ajudou na organização desse

trabalho para que fosse possível realizar um melhor desenho de como se constituiu

o trajeto metodológico percorrido.

A pesquisa bibliográfica foi desenvolvida através de artigos científicos já

publicados na plataforma de busca Scientific Eletronic Library Online (Scielo).

Iniciou-se no dia 09 de julho até o dia 12 de agosto do ano de 2019, em um dos

periódicos do Scielo, a Revista Brasileira de Educação Especial, que se constitui de

uma coletânea de artigos que buscam aprofundar questões de teoria e práxis

referentes à produção científica brasileira sobre assuntos correlacionados às

pessoas com deficiência. Para a busca, foram usados os seguintes descritores:

―Autismo‖, ―Transtorno do Espectro do Autismo‖, ―Transtorno do Espectro Autista‖ e

―Autista‖. Esses descritores foram escolhidos, uma vez que se referem ao nosso

objeto de estudo. Não houve filtro para o espaço de tempo das publicações de modo

a abranger uma quantidade maior de trabalhos.

Desse modo, emergiram alguns trabalhos que tratam dessa temática, no

entanto, nem todos aqueles que surgiram foram utilizados, uma vez que não

atendiam ao critério de abordar diretamente a comunicação e a linguagem. No total,

o resultado obtido foi de 38 artigos científicos, porém, apenas 6 foram selecionados

para análise por corresponderem ao critério para a fundamentação e produção

desse trabalho.

Após a filtragem dos artigos encontrados, foi realizada uma leitura

pormenorizada dos mesmos. Com isso, foi possível elaborar fichamentos que

serviriam de base para a construção da análise desse trabalho. No quadro 1, estão

dispostas as informações concernentes aos artigos analisados, com os títulos, ano

de publicação, autores das obras e o tipo de pesquisa realizada.

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42

Quadro 1: Artigos selecionados na pesquisa bibliográfica

Título Ano Autores (as) Tipo de Pesquisa

Características e especificidades da comunicação social na perturbação do Espectro

do Autismo.

2016 Reis; Pereira;

Almeida

Bibliográfica

A constituição da subjetividade de adolescentes autistas: um olhar para as histórias

de vida.

2010 Baragollo;

Panhoca

De campo

Comunicação alternativa e ampliada para educandos com autismo: considerações

metodológicas.

2010 Nunes; Nunes

Sobrinho

Bibliográfica

Avaliação de um programa de comunicação alternativa e ampliada para mães de

adolescentes com autismo

2010 Walter;

Almeida

De campo

Revisão de estudos sobre o Picture Exchange Communications System (PECS) para

o ensino de linguagem a indivíduos com autismo e outras dificuldades de fala.

2013 Mizael; Aillo Bibliográfica

As Contribuições do Uso da Comunicação Alternativa no Processo de Inclusão

Escolar de um Aluno com Transtorno do Espectro do Autismo

2016 Togashi;

Walter

De campo

Modelagem em vídeo para o ensino de habilidades de comunicação a indivíduos

com autismo: revisão de estudos

2017 Rodrigues;

Almeida

Bibliográfica

Fonte: a autora

Page 44: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

43

A seguir, a fim de contextualizar os artigos analisados, expomos um breve

resumo de suas discussões.

Reis, Pereira e Almeida (2016) analisaram as ―Características e

Especificidades da Comunicação Social na Perturbação do Espectro do Autismo‖,

fazendo uma leitura da comunicação e linguagem a partir do discurso, pragmática,

prosódia, sintaxe, morfologia e semântica da criança com TEA. Nesse caminho,

seguem os critérios dispostos no DSM-V e ainda confrontam as diferentes

perspectivas que embasam os argumentos contidos neste manual.

Bagarollo e Panhoca (2010) fazem um relato de pesquisa intitulado ―A

Constituição da Subjetividade de adolescentes autistas: um olhar para histórias de

vida‖. Os objetivos desse trabalho foram o de analisar processos dialógicos de cinco

adolescentes autistas cujo enfoque era: indícios de experiências vivenciadas no

cotidiano e dizeres sociais impregnados nos discursos orais desses adolescentes.

Para alcançar seu objetivo, fizeram uso de fotografias pessoais e o trabalho com

histórias de vida.

Adentrando na temática da Comunicação Alternativa e Ampliada (CAA),

Nunes e Nunes Sobrinho (2010), em seu estudo denominado ―Comunicação

alternativa e ampliada para educandos com autismo: considerações metodológicas‖,

porpõem-se a analisar um acervo composto por 56 trabalhos científicos que tinham

como tema central a CAA com o público voltado para educandos do autismo. Seu

objetivo foi o de mensurar o que vem funcionando no atendimento à pessoa com

TEA, podendo ser um parâmetro de efetividade para aqueles que buscam

modalidades diversas de intervenções.

Walter e Almeida (2010), em seu estudo de caso intitulado ―Avaliação de um

programa de comunicação alternativa e ampliada para mães de adolescentes com

autismo‖, buscaram avaliar os efeitos de um programa de CAA no contexto familiar

de pessoas com autismo. A pesquisa contou com seis participantes, compondo esse

número estavam mães e seus respectivos filhos que precisariam ter o diagnóstico de

autismo e ser não verbal ou ter ausência de uma fala funcional. Cientes da

importância da família no convívio do sujeito, pretendeu-se capacitar familiares para

o uso de CAA com seus filhos autistas. O método se deu em três etapas,

envolvendo duas fases para o experimento: linha de base e intervenção.

Ainda referente a esse sistema de comunicação, Mizael e Aiello (2013) em

sua pesquisa ―Revisão de estudos sobre o Picture Exchange Communication

Page 45: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

44

System (PECS) para o ensino de linguagem a indivíduos com autismo e outras

dificuldades de fala‖ realizaram uma revisão de literaturas brasileiras e estrangeiras

sobre o estado da arte do PECS, investigando o que vem sendo pesquisado, os

resultados e novos direcionamentos.

Togashi e Walter (2016) discutem em ―As Contribuições do Uso da

Comunicação Alternativa no Processo de Inclusão Escolar de um Aluno com

Transtorno do Espectro do Autismo‖ a importância que essa técnica oferece para o

processo de inclusão escolar, sendo a comunicação um fator essencial para o

melhor desenvolvimento de um aluno com TEA. A pesquisa ocorreu em duas

etapas: a primeira aconteceu em uma sala de recursos no município do Rio de

Janeiro e os participantes dessa pesquisa foram a professora e o aluno com TEA. Já

a segunda fase ocorrera entre o mesmo aluno, sua professora e uma estagiária de

sua sala de aula regular.

Para finalizar, Rodrigues e Almeida (2017), em sua discussão acerca das

limitações na comunicação de pessoas com TEA, buscaram revisar literaturas que

discutissem sobre ―Modelagem em Vídeo para o Ensino de Habilidades de

Comunicação a Indivíduos com Autismo: Revisão de Estudos‖. Dessa forma, o

objetivo dessa revisão foi o de discutir os resultados das intervenções que

programaram a modelagem em vídeo (MV) no ensino de habilidades de

comunicação para sujeitos com TEA.

Como método de análise dos artigos selecionados, optamos por utilizar a

análise de conteúdo. A mesma contribui para o processo de análise, pois ―toma em

consideração as significações (conteúdo), eventualmente a sua forma e a

distribuição destes conteúdos e formas (índices formais e análise de co-ocorrência)‖

(BARDIN, 2004, p. 38). Assim, é requerido ao analista delimitar o seu objetivo para

efetuar sua busca e, a partir dos dados colhidos, ele poderá compreender os

significados dos itens descobertos, tomando como base o contexto analisado. É um

trabalho com as palavras, as significações destas, no qual o pesquisador se debruça

sobre aquilo que está por trás das palavras.

Diante do material produzido, trabalhamos com categorias definidas a priori.

Assim, as leituras dos materiais obtidos foram norteadas por essas definições, de

modo a atender os objetivos dessa pesquisa.

De acordo com Bardin (2004, p. 32), a categorização

Page 46: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

45

É o método das categorias, espécie de gavetas ou rubricas significativas que permitem a classificação dos elementos de significação constitutivos da mensagem. É portanto um método taxonómico [sic] bem concebido para satisfazer os colecionadores preocupados em introduzir uma ordem, segundo certos critérios, na desordem aparente.

A respeito dos sete trabalhos encontrados, foram elaboradas duas categorias,

a saber: 1) linguagem, comunicação e o TEA; 2) estratégias e resultados. As

seguintes categorias foram escolhidas, pois atendem aos objetivos do presente

trabalho que intenciona discutir como vem sendo trabalhadas e discutidas a

comunicação e a linguagem em pessoas com TEA. No próximo capítulo,

discutiremos cada categoria à luz de nossos pressupostos teóricos.

Page 47: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

46

5 ENTRE O TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA, A LINGUAGEM E A

COMUNICAÇÃO ALTERNATIVA: UMA ANÁLISE DE LITERATURA

O referido capítulo irá apresentar os resultados obtidos na pesquisa

bibliográfica, expondo uma discussão sobre como vêm sendo trabalhados e

compreendidos os conceitos de linguagem e comunicação com o sujeito com TEA,

com foco nos artigos dispostos na Revista Brasileira de Educação Especial.

O DSM-V, ao falar sobre o Transtorno do Espectro Autista, enfatiza as

dificuldades e prejuízos que circundam os indivíduos com o respectivo diagnóstico.

A dificuldade no desenvolvimento da fala ou das habilidades comunicativas é um

dos critérios que norteia o diagnóstico desse transtorno. A partir desse critério,

decorrem as complicações quanto à interação social que se manifestam nos mais

diversos contextos.

Para além dessas ideias, o atual estudo emergiu com a questão: quais as

estratégias utilizadas no trabalho terapêutico e educacional direcionadas ao

desenvolvimento da linguagem e comunicação de pessoas com TEA? Denota

relevância para a população, pois, embora muito venha sendo discutido sobre a

temática, ainda é uma dificuldade trabalhar com essa questão.

Os défices de comunicação e de linguagem têm sido foco de preocupação

nos estudos sobre o desenvolvimento de pessoas com TEA. Esses conceitos são

tidos como fundamentais para o processo constitutivo do ser humano, já que é

através da linguagem que o sujeito interage social e culturalmente. Contudo, são

nesses dois conceitos que a pessoa com TEA enfrenta suas maiores dificuldades.

Os critérios dispostos no DSM-V e CID-10 retratam as dificuldades e as limitações,

suscitando olhares que se direcionam para estudos e intervenções (ORRÚ, 2012).

Assim, os próximos tópicos irão se delinear voltados para a discussão do que já vem

sendo produzido sobre esta temática.

A seguir, serão discutidas as duas categorias de análise, explicitando e

discutindo-as: 1) linguagem, comunicação e o TEA; 2) estratégias e resultados.

Diante dessas categorias, é possível obter as informações encontradas nos

artigos científicos, sejam elas por meio de estudos de caso ou pesquisas de cunho

bibliográfico. Nelas, vai ficar patente observar a linguagem e a comunicação sendo

compreendidas através de formas mais mecanizadas e também observar a

Page 48: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

47

importância de entender a linguagem como um elemento mediacional do

desenvolvimento do sujeito. Por sua vez, os trabalhos analisados concordam com a

ideia de que a linguagem é fundamental no processo de desenvolvimento da pessoa

com TEA.

E na categoria que trata das estratégias e resultados, observa-se que a

grande maioria da literatura fez uso de métodos e técnicas de Comunicação

Alternativa e Ampliada (CAA) como ponte de acesso ao trabalho do

desenvolvimento da comunicação ausente ou prejudicada da pessoa com TEA.

5.1 Categoria 1: Linguagem, comunicação e o TEA

Esta categoria trata das concepções de linguagem e de comunicação,

explícitas ou implícitas, encontradas nos artigos pesquisados. Com o intuito de

compreendermos tais conceitos, apresentaremos, a seguir, uma discussão e análise

sobre a temática por meio da literatura pesquisada. Nesta seção e como ponto de

partida, discutiremos os entendimentos de linguagem e comunicação que vêm

sendo utilizados na literatura, a partir das respectivas concepções teóricas de cada

estudo. Mediante a intrínseca relação entre linguagem e comunicação, este capítulo

também irá realizar uma análise norteada pela abordagem histórico-cultural.

Embasados nos critérios dispostos no DSM-V, Reis, Pereira e Almeida

(2016) descreveram e problematizaram as “Características da Comunicação

Social na Perturbação do Espectro do Autismo (PEA)”. Com isso, os autores

destacaram a fusão da interação social com a comunicação, validando sua

importância para a definição e intervenção em crianças com PEA1. Também se

dispuseram a realizar um confronto com as diferentes perspectivas que subsidiam

argumentos e críticas à classificação proposta pelo DSM-V, tendo em vista que o

mesmo sofrera alterações nas características diagnósticas do PEA.

Os autores mencionados não apresentam, especificamente, suas concepções

de comunicação e linguagem, no entanto, conceituam o uso da linguagem como

1 Como forma de respeitar as opções dos autores dos textos analisados, daremos preferência a

manter os termos trabalhados por eles. Assim, como no texto de Reis, Pereira e Almeida (2016), eles se utilizam de Perturbação do Espectro do Autismo (PEA), nas citações a esse texto, manteremos tal nomenclatura.

Page 49: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

48

uma ferramenta para a comunicação e elencam as características e dificuldades que

a criança com PEA terão nesses dois âmbitos. E é por esse caminho que iremos

buscar compreender a comunicação e a linguagem neste texto.

De acordo com Reis, Pereira e Almeida (2016), crianças com PEA

apresentam graves alterações não só de linguagem, mas de comunicação.

Independente da idade e do nível de desenvolvimento em que a criança esteja, as

alterações na comunicação social são reconhecidas. Tais dificuldades são evidentes

ao perceber os níveis de compreensão do processamento verbal e não-verbal e

também ao nível da expressão que corresponde à utilização do gesto natural,

codificado e da uso da palavra como ferramenta para a comunicação com o outro.

Diante do exposto, percebe-se que as formas comunicativas mais utilizadas

são formas pré-simbólicas não convencionais, o que oferece poucas possibilidades

de intenções comunicativas. Assim, os autores explanam que a comunicação de

crianças com PEA, em grande parte do tempo, é utilizada para pedir objetos, pedir e

rejeitar ações, ou seja, regular o comportamento do outro e não com intenções de

interação social (REIS; PEREIRA; ALMEIDA, 2016).

Prosseguindo em sua análise, os autores discutem sobre como o processo de

aquisição de linguagem em uma criança com PEA acontece de forma lenta,

revelando suas singularidades ao se apresentar. Em alguns casos, a linguagem se

desenvolve dentro padrão previsto para a idade, semelhante às crianças típicas,

porém, em dado momento ocorre o que os autores chamaram de ―regressão da

linguagem‖. Sobre isso, explanam que ―Geralmente, a regressão é um processo

gradual onde a criança não aprende palavras novas e falha no envolvimento

comunicativo durante as rotinas diárias em que participou no passado‖ (REIS;

PEREIRA; ALMEIDA, 2016, p. 4).

Acerca das especificidades da linguagem, os autores fazem uma análise a

partir de competências do discurso, da pragmática, da prosódia, da sintaxe, da

morfologia e da semântica da criança com PEA. Para melhor compreender tais

competências, fazem uma escrita explicativa de cada uma. Quanto ao conceito da

pragmática, este se refere ao uso da linguagem como uma ferramenta para a

comunicação, em específico, de como que a linguagem é empregada no contexto

em interações sociais. Conforme expresso nas palavras de Reis, Pereira e Almeida

(2016, p. 330):

Page 50: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

49

A pragmática compreende tanto as funções linguísticas tais como o registro (alterando o discurso dependendo de quem está a falar e para quem), negociação dos turnos de comunicação (turn-taking) e a escolha de expressões referenciais (―um‖ em vez de ―o‖) assim como funções não-linguísticas, tais como contacto ocular, linguagem corporal e expressões faciais.

Assim, tanto a pragmática, como o discurso requerem uma compreensão

mais estrutural da linguagem e como se usa essa estrutura no decorrer das

interações sociais. Há estudos que comprovam que as crianças com PEA têm

dificuldades no discurso do tipo conversacional que se perpetuam até na idade

adulta.

Ligada com a pragmática está à prosódia, que vai se referir aos aspectos

fonológicos da língua e diz respeito à pausa durante um diálogo, à entonação, à

duração, velocidade da fala e segmentação do fluxo do discurso. Para melhor

explicitar, Reis, Pereira e Almeida (2016, p. 331) afirmam que:

A prosódia é, pois, fundamental para a aquisição da estrutura da língua materna em idades precoces bem como para a comunicação em geral ao longo do ciclo de vida, com implicações evidentes a nível social e profissional. A este nível, todas as crianças com PEA apresentam dificuldades e, por isso, evidenciam menores capacidades para usar a prosódia de forma a resolver ambiguidades sintáticas.

Prosseguindo em Reis, Pereira e Almeida (2016) sobre as competências de

linguagem, há ainda a sintaxe, morfologia e a semântica. A sintaxe, considerado o

domínio mais complexo do núcleo linguístico, diz respeito à combinação de palavras

utilizadas nas frases. Em crianças com PEA, de acordo com alguns estudos citados

pelos autores em tela, percebe-se uma linguagem cuja estrutura gramatical é mais

rígida.

Ao nível da morfologia, os autores já citados anteriormente revelam existir

poucos estudos significativos sobre essa competência. No entanto, ao comparar a

outras crianças com atrasos de linguagem, percebe-se que as crianças com PEA

apresentam atrasos na produção de morfemas. Por fim, quanto à semântica das

palavras, ou seja, o conhecimento de seus significados, crianças com PEA também

apresentam dificuldades quanto a esse desempenho. Conforme Reis, Pereira e

Almeida (2016, p. 328)

[…] mesmo quando a criança com PEA adquiriu tanto a forma lexical como a semântica, mantém um nível de competência comunicativa muito

Page 51: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

50

primitivo, pela sua incapacidade de acrescentar novas informações e estender tópicos de conversação a vários turnos comunicativos. Estes comprometimentos conversacionais provêm da pobre consciência de que as pessoas comunicam não apenas para atingir ―objetivos‖, mas também pela simples troca de informação.

Em suma, o primeiro estudo que analisamos aponta que os défices nas

competências da linguagem acabam gerando uma barreira interpessoal que tende a

interferir na comunicação da criança com PEA. Sinaliza-se a importância da

comunicação e da linguagem como uma ferramenta que permita a essas pessoas

manter uma relação interpessoal com o outro.

Fazendo uma relação com autores fundamentados na Psicologia Histórico-

cultural, destacamos os escritos de Orrú (2012). A autora sintetiza algumas das

dificuldades de comunicação que a pessoa com TEA venha a ter, tais como: puxar,

empurrar ou conduzir o outro em busca de algo que seja o seu desejo; expressões

por meio de uma ou duas palavras, ao invés de frases; tendência ao monólogo; uma

fala que não condiz com o contexto da conversação; dificuldades na compreensão

de frases; mímicas e gesticulações; ausência ou pouco contato visual; dificuldade de

compressão em conteúdos abstratos.

Sobre isso, concordamos com a autora quando explica que tais dificuldades

recorrentes interferem não só no processo constitutivo do sujeito, como também em

suas relações interpessoais que demandem o uso da linguagem (ORRÚ, 2012).

Chiote (2013) aborda também sobre as dificuldades de linguagem da criança

com autismo e aponta que esta é marcada por suas estereotipias, dentre elas, há a

ecolalia. As ecolalias correspondem a repetições imediatas ou tardias de palavras.

Muitas vezes, essa repetição tardia ou imediata é interpretada com estranhamento

por parte das pessoas e, em muitos casos, como algo que é apenas derivado do

diagnóstico do TEA.

Saliente-se que há algumas orientações teóricas que preveem a necessidade

de extinguir a ecolalia pela sua não funcionalidade. Sobre a ecolalia, os autores

argumentam que

Embora a ecolalia possa não facilitar o desenvolvimento gramatical, parece ter uma função comunicativa parcial (EIGSTI et al., 2011). Prizant e Duchan (1981) descobriram que mais de 33% do discurso ecolálico produzido pelas crianças da amostra do seu estudo tinham uma função de ―turn-taking‖ e 25% uma função declarativa Para além da ecolalia, indivíduos com PEA inventam frequentemente novas palavras (neologismos) que não são utilizados em crianças com desenvolvimento típico e que geralmente têm

Page 52: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

51

um significado idiossincrático específico (EIGSTI et al., 2011). (REIS; PEREIRA; ALMEIDA, 2016, p. 329).

Com efeito, amparadas em Chiote (2013) e na abordagem histórico-cultural,

compreendemos que esse pensamento acaba minimizando o valor simbólico e a

função comunicativa que as ecolalias podem oferecer. Considerando a relevância da

mediação simbólica na interação entre pessoas e que tal interação proporciona a

formação das funções psicológicas superiores e da subjetividade, a ecolalia não é

necessariamente um elemento a ser desprezado na medida em que ela pode ser

utilizada como uma ferramenta de acesso à comunicação e ao universo simbólico do

sujeito.

Chiote (2013) remete a esse conceito de mediação como uma tríade na

relação, ou seja, um processo no qual dois sujeitos precisam da intervenção de um

terceiro elemento para se relacionarem, não havendo uma relação direta, mas sim

mediada. Isto é, a relação estabelecida com o outro não é direta, seguindo desse

preceito, mas mediada pelos instrumentos, pelos signos e pelo o outro que nos

constitui, tal como preconiza Vygotsky. A linguagem, como sistema simbólico,

assume uma importância fundamental em todo o processo de desenvolvimento do

sujeito. Assim, torna-se necessário analisar as interações e as práticas inclusivas

que interferem na vida da pessoa com TEA.

Nesse sentido, a ecolalia configura-se como um elemento dessa relação.

Com ela, pode-se buscar construir, junto com os sujeitos, sentidos sobre suas ações

de modo a atingir o que Chiote (2013, p. 46) explica:

Os processos de convencionalização de sentidos que perpassa os gestos e as palavras das crianças estão inter-relacionado com a interpretação que o adulto faz deles e com o modo como a criança se apropria do sentido produzido na dinâmica interativa. Investir nos processos de significação é apostar que é possível compartilhar sentidos com a criança com Autismo, significando suas ações ao mesmo tempo em que a orienta para aquilo que se espera da criança em determinadas situações.

Caminhando nessa perspectiva, em outro trabalho analisado (BAGAROLLO;

PANHOCA, 2010), que teve como título “A constituição da subjetividade de

adolescentes autistas: um olhar para as histórias de vida”, foi identificado o uso

do referencial teórico histórico-cultural. As autoras desenvolveram uma pesquisa de

campo cujo objetivo foi analisar processos dialógicos de cinco adolescentes autistas,

tendo como foco: indícios de experiências que eles vivenciam no cotidiano e dizeres

Page 53: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

52

sociais impregnados em seus discursos orais, buscando subsídios para o processo

terapêutico de tais sujeitos.

A intervenção proposta parte do trabalho de fonoaudiólogos, sendo essa uma

das áreas atuantes em sujeitos com TEA. Optou-se pelo trabalho com histórias de

vida para poder conhecer a realidade de cada participante a partir de sua própria

fala. Esta escolha justificou-se mediante a abrangência de possibilidades de

atuações terapêuticas que podem derivar da referida pesquisa.

As narrativas que compõem o trabalho não foram organizadas previamente,

cada participante estava livre para decidir sobre o que iria falar. Os assuntos foram

organizados e explorados pela terapeuta através das fotografias da própria história

de vida deles. Durante o diálogo, os sujeitos participantes assumiram a posse da

palavra, a iniciativa, o direcionamento e o domínio da temática (BAGAROLLO;

PANHOCA, 2010).

As autoras delinearam seu relato de pesquisa pensando a linguagem a partir

da ótica histórico-cultural, como já mencionado. Desse modo, a linguagem é posta

ocupando uma centralidade no sujeito, não sendo possível haver funcionamento

humano fora do seu domínio. Isto é,

Estando, então, a linguagem no centro do humano, todas as suas formas de manifestações se tornam alavancas para o desenvolvimento dos sujeitos, pois o sujeito, ao fazer uso da linguagem para comunicação, passa a se inserir cada vez mais na rede de relações sociais e, assim, mantendo-se no movimento dialético da constituição humana (VIGOTSKI, 2000; PINO, 2005). (BAGAROLLO; PANHOCA, 2010, p. 233)

Seguindo essa compreensão da linguagem, Lucci (2006) ratifica aspectos que

discutimos neste trabalho, ou seja, que a linguagem é considerada o principal

mediador na formação e desenvolvimento das funções psicológicas superiores e,

por isso, apresenta tamanha relevância. Também tem direta influência no processo

de constituição do sujeito. Vygotsky debruçou-se em sua obra a discorrer não só

sobre a origem da linguagem, mas também sobre sua direta ligação com o

desenvolvimento do pensamento.

Ainda sobre a importância da linguagem, Lucci (2006, p. 9) explicita:

Em suma, a linguagem constitui o sistema de mediação simbólica que funciona como instrumento de comunicação, planejamento e auto-regulação. É justamente pela sua função comunicativa que o indivíduo se apropria do mundo externo, pois é pela comunicação estabelecida na

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53

interação que ocorrem ―negociações‖, reinterpretações das informações, dos conceitos e significados.

Como expõe a citação, a linguagem possui várias finalidades e, dentre elas,

há a função comunicativa, cuja intenção é a de expressar, transmitir e de receber

informações, seja através da linguagem falada, escrita ou codificada por meio de

signos ou símbolos (ORRÚ, 2012).

Ainda de acordo com Orrú (2012), o meio de comunicação mais usado pelos

seres humanos é o verbal, entretanto, nem todas as pessoas se adéquam a esse

modelo. Pensando a linguagem a partir da sua função comunicativa como descrita,

suscitou-se a necessidade da criação de sistemas que supram essa carência em

pessoas com défices nesse critério. Para essa finalidade e afim de que essas

pessoas possam exprimir seus pensamentos e sentimentos, foram desenvolvidos

métodos de Comunicação Suplementar e/ou Alternativa (CSA).

Em sua maioria, os artigos reunidos discutiram o uso de métodos e técnicas

da Comunicação Alternativa Ampliada (CAA), fazendo uma leitura da importância da

linguagem na vida do indivíduo com TEA a partir dessa ferramenta. Dentre os

estudos analisados, temos o de Nunes e Nunes Sobrinho (2010), intitulado

“Comunicação alternativa e ampliada para educandos com autismo:

considerações metodológicas”.

Os autores realizaram uma revisão de literatura com o objetivo de analisar as

características metodológicas de 56 artigos científicos focados na temática da CAA

para alunos com TEA. Embora não explicitem suas concepções em relação aos

conceitos linguagem e comunicação, validam a necessidade e importância de que

haja métodos e técnicas que possam complementar e substituir a linguagem oral

comprometida ou ausente.

Com isso, assinalam a CAA como uma prática promissora. Desse modo, com

base nos resultados colhidos na pesquisa, os autores buscaram identificar as

melhores práticas adotadas pelos programas de intervenção para a população de

pessoas com TEA.

Ainda sobre o uso da CAA, Walter e Almeida (2010), no artigo intitulado

―Avaliação de um programa de comunicação alternativa e ampliada para mães

de adolescentes com autismo”, realizaram um relato de pesquisa, no qual

buscaram avaliar os efeitos de um programa de CAA no contexto familiar de

pessoas com autismo. O estudo dispôs de seis participantes, sendo três

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54

participantes familiares (Pfs), representados pelas mães, e seus respectivos filhos,

chamados de participantes alunos (Pas), com diagnóstico de autismo não-verbal

e/ou fala não funcional.

As autoras sustentaram a ideia de que é preciso refletir formas de tratamento

e metodologias de ensino voltadas para as pessoas autistas não somente no

contexto escolar, mas, principalmente, em suas casas junto a seus familiares. Sobre

a comunicação, afirmam que ―É preciso buscar formas de comunicação que sejam

funcionais e que possam ser generalizadas não somente em relação ao contexto

onde a pessoa está inserida, mas que sejam compreendidas e úteis por toda a

família‖ (WALTER; ALMEIDA, 2010, p. 430).

Sobre o uso da CAA, Walter e Almeida (2010, p. 430) discorrem:

Quando se fala em comunicação alternativa, há muito mais em jogo que uma mera prancha de símbolos ou um sistema computadorizado. A comunicação alternativa fundamenta-se na ideia de possibilitar à pessoa com deficiência o uso da linguagem e de instrumentos que lhe permitam superar o obstáculo da disfunção e ter acesso, seja como for, ao desempenho comunicativo.

Com efeito, concordamos com as autoras da importância de visualizar a CAA

para além de sua função comunicativa. Nessa direção, retomamos as relações entre

pensamento e linguagem na perspectiva vigotskiana na medida em que, como

discutimos, a linguagem possui função central na constituição do sujeito, em

específico, a função constitutiva das funções psicológicas superiores.

A respeito dessa relação, Orrú (2012) reproduz que o pensamento não é

apenas expresso através das palavras, mas é a partir delas que passa a existir.

Embora haja essa relação entre pensamento e palavra, ambos possuem diferentes

movimentos. O pensamento se diferencia da palavra, pois é um reflexo generalizado

da realidade que se concretiza através da linguagem, enquanto a palavra traz

consigo uma característica de abstração. Embora haja distinções, ambos se

complementam nesse processo de expressão de um pensamento.

Desse modo, a linguagem vai muito além de sua função comunicativa, ela é,

também, organizadora, planejadora de ação e reguladora de comportamentos.

Embora seja de grande utilidade o uso dos métodos de comunicação alternativa no

trabalho com pessoas que possuam ausência da fala, é primordial que haja um

diálogo e uma ação mediadora com os sujeitos. Para além de um trabalho que

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55

priorize o treino de habilidades comunicativas, é vital a existência de uma relação

que vise a constituição do sujeito que se dá por meio da linguagem, da interação

social e da contextualização histórica (ORRÚ, 2012). Como explica Orrú,

[...] a CSA é utilizada como um mediador semiótico à construção do signo, para auxiliar a construção da linguagem que traz consigo possibilidade de produção de significações, gerada na relação com o outro, em ambientes culturalmente contextualizados (ORRÚ, 2012, p. 76-77).

Conforme demonstra Orrú (2012), a participação do outro tem vital

importância no processo de aprendizagem do sujeito. Esse processo de aquisição

da linguagem tem sua gênese na interação e nas relações sociais do sujeito. Padilha

(2000), fazendo também uma leitura acerca dos escritos de Vygotsky, afirma que

uma palavra sem significado é apenas um som vazio. No entanto, é a partir dessas

relações sociais que os significados vão se construindo.

Mizael e Aillo (2013), no texto intitulado “Revisão de estudos sobre o

Picture Exchange Communication System (PECS) para o ensino de linguagem

a indivíduos com autismo e outras dificuldades de fala”, também contribuem

com estudos sobre o uso da CAA no processo do ensino de linguagem a indivíduos

com autismo e outras dificuldades de fala. Sua pesquisa apresentou como objetivos

revisar as literaturas brasileiras e estrangeiras sobre o estado da arte do Picture

Exchange Communication System (PECS) como um instrumento de ensino da

linguagem, apontar o que tem sido pesquisado, assim como os resultados que mais

foram encontrados e propor direções para novos estudos.

O PECS destaca a relação interpessoal, na qual ocorre um ato comunicativo

entre o sujeito com dificuldades ou ausência total de fala e outra pessoa, através de

trocas de figuras. Para que ocorra a efetivação desse sistema, o treino com o PECS

se desenvolve em seis fases (melhor detalhadas na segunda categoria), que se

delineiam entre fazer pedidos através das trocas de figuras por itens desejados até a

emissão de comentários espontâneos (MIZAEL; AILLO, 2013).

As autoras em tela, cientes dos comprometimentos na comunicação,

advindos do TEA e dos prejuízos que isso oferece à interação social, tratam a

comunicação como uma peça chave para que haja a relação com os outros, logo,

métodos alternativos cujo objetivo é o ensino da linguagem tornam-se essenciais

para essas pessoas.

Page 57: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

56

Embora existam diversos programas de CAA para indivíduos com TEA, não

há, até o momento, um guia que defina qual o sistema de comunicação que vá ser

mais efetivo para cada situação. É a partir dessa problemática que as autoras

defendem o incentivo às pesquisas de revisão bibliográfica, pois, por meio de

estudos já produzidos, será possível observar quais os ganhos e o que há para

melhorar (MIZAEL; AILLO, 2013).

Togashi e Walter (2016), cujo título do trabalho é “As Contribuições do Uso

da Comunicação Alternativa no Processo de Inclusão Escolar de um Aluno

com Transtorno do Espectro do Autismo”, também discutiram sobre o uso do

sistema do PECS em pessoas com TEA, abordando os ganhos que essa alternativa

tem no processo de inclusão escolar dessas pessoas. Essa pesquisa apresentou

como objetivo verificar a eficácia e continuidade do uso do PECS-Adaptado 2pela

professora do Atendimento Educacional Especializado (AEE) com seu aluno com

TEA. As autoras buscaram descrever um relato de pesquisa, no qual se deu com a

observação do participante.

Sobre a comunicação, as autoras apontaram como uma etapa importante no

processo de inclusão e também como algo essencial para o desenvolvimento social

e cognitivo de sujeitos com TEA com ausência ou dificuldades na fala. Com isso, as

autoras defenderam o uso da CAA como um meio de estabelecer a comunicação de

pessoas com TEA.

Para elas, a CAA abrange o uso de sistemas e recursos alternativos de

comunicação, sendo uma subárea da Tecnologia Assistiva, fundamental para

pessoas que não possuem fala funcional.

Ainda, Togashi e Walter (2016, p. 353) conceituam o PECS como:

Um sistema de Comunicação Alternativa e Ampliada, cuja utilização é feita partir de trocas de figuras (cartões de comunicação), ou seja, troca-se o cartão de comunicação que está em poder do usuário pelo item desejado por ele, podendo ser um objeto, a solicitação de alguma ação, ou até mesmo a demonstração de algum sentimento ou sensações, a fim de efetivar a comunicação com seu interlocutor.

Ao discutir a questão do uso do PECS com a pessoa com TEA, na

perspectiva histórico-cultural, é preciso pensar a todo instante na ação mediadora e

2 O termo PECS-Adaptado indica que ocorreram modificações em relação ao PECS original contendo

adaptações implementadas, no entanto, o objetivo final é o mesmo.

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57

em sua importância. Nesse sentido, o outro interlocutor precisa solidificar suas

ações repletas de intencionalidade, favorecendo, a partir da relação dual e dialógica,

uma utilização contextualizada.

Quando a pessoa com TEA faz uso de um quadro de figuras para comunicar

o que deseja, dentro de circunstâncias concretas de acontecimentos e ações,

encontramos uma possibilidade real em seu desenvolvimento sociocultural.

Portanto, esse processo não irá se resumir apenas a um treino de habilidades, mas

sim ter como enfoque o desenvolvimento da linguagem pautado em suas funções

interacionais com o outro e consigo (ORRÚ, 2012).

Outra maneira de suplementar a comunicação e trabalhar o que Rodrigues e

Almeida (2017), chamaram de ―habilidades de comunicação‖ é a prática da

Modelagem em Vídeo (MV). As autoras, no artigo “Modelagem em Vídeo para o

Ensino de Habilidades de Comunicação a Indivíduos com Autismo: Revisão de

Estudos”, realizaram uma revisão de literatura cujo objetivo foi discutir os resultados

das intervenções que implementaram a MV para ensinar habilidades de

comunicação para indivíduos com TEA.

Utilizando como fonte de dados o Portal de Periódico da CAPES, com

descritores específicos, afirmam que as características de linguagem das pessoas

com TEA devem ser observadas e consideradas, pensando em intervenções que

estejam voltadas para o desenvolvimento dessas habilidades de comunicação.

Ainda, elencam o quanto essas habilidades comunicativas estão vinculadas às

habilidades sociais, atribuindo vital importância à comunicação.

Foram utilizados três critérios de inclusão dos artigos, sendo eles: a) utilizar a

modelagem em vídeo isoladamente, associada a outra intervenção ou como parte

de um pacote de tratamentos, como variável independente; b) habilidades de

comunicação deveriam fazer parte da variável independente; c) todos os estudos

deveriam ter como participantes pessoas com TEA. Desse modo, buscaram

enfatizar os ganhos que essas pessoas tinham em suas habilidades de

comunicação através do uso da MV.

Essa prática de MV é ancorada na visão de que pessoas com TEA são

favorecidas a responder melhor as estratégias de ensino por meio de pistas visuais,

logo, refere-se à imitação de determinados comportamentos ou habilidades

demonstradas através de vídeos por adultos ou pares. A partir das habilidades

comunicativas, busca-se trabalhar as dificuldades associadas ao diagnóstico, como

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58

contato visual, iniciativa comunicativa, expressões faciais, gestos, dentre outras

(RODRIGUES; ALMEIDA, 2017).

Orrú (2012) discorre sobre a relação do desenvolvimento e aprendizagem,

tecendo algumas observações sobre a perspectiva comportamental de compreensão

da aprendizagem. Primeiramente, em prol do condicionamento de habilidades e

comportamentos, um objetivo é proposto e, para alcançá-lo, emprega-se uma

técnica de análise de tarefas, partindo da lógica de estabelecer uma sequência de

aprendizagem. Todos os conteúdos são reduzidos para ocorrer o condicionamento

do sujeito e, assim, a memorização reprodutiva de comportamentos, que, por vezes,

tendem a ser vazios de sentidos e significados.

A autora considera que essa concepção de aprendizagem distancia-se do que

Vygotsky estudou. Para ele, nos processos que se referem ao desenvolvimento e à

aprendizagem, os sujeitos são ativos, ou seja, transformam sua realidade, como a si

mesmos. Essa relação dialética que há entre sujeito e mundo ocorre através das

mediações, nas quais o sujeito irá internalizando e significando o mundo a sua volta

(ORRÚ, 2012).

Ainda de acordo com Orrú (2012), os signos internalizados são marcas

externas de tudo o que está nesse plano, objetos, situações e eventos que ocorrem

no mundo real. Ao longo do processo de desenvolvimento, o indivíduo, através da

atividade mediada, passa a ter conteúdos mentais que tomam esse lugar,

considerados os principais mediadores da relação homem e mundo.

Com efeito, Vygotsky elucida que o processo de internalização implica uma

série de transformações, previstas na lei do desenvolvimento cultural. O autor, ao

propor a referida lei, postula que um processo interpessoal transforma-se em um

processo intrapessoal. Ou seja, as funções que se manifestam no desenvolvimento

da criança primeiro acontecem no nível social, para assim, ocorrer na esfera

individual (VYGOTSKY, 1991). Em outras palavras,

A transformação de um processo interpessoal num processo intrapessoal é o resultado de uma longa série de eventos ocorridos ao longo do desenvolvimento. O processo, sendo transformado, continua a existir e a mudar como uma forma externa de atividade por um longo período de tempo, antes de internalizar-se definitivamente. Para muitas funções, o estágio de signos externos dura para sempre, ou seja, é o estágio final do desenvolvimento (VYGOTSKY, 1991, p. 41).

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59

Desse modo, tal processo não se dá apenas no plano individual de cada

sujeito, mas sim passam a ser compartilhadas por um conjunto de pessoas de um

grupo social, favorecendo a comunicação e potencializando interações sociais. Isto,

por fim, irá fornecer os subsídios para o desenvolvimento psicológico do indivíduo.

Assim, a linguagem, como um dos principais sistemas simbólicos, exerce papel

fundamental na comunicação, o que está diretamente ligado a esse processo de

significações compartilhadas (OLIVEIRA, 1997).

Com os dados descritos aqui, notificamos a importância de discutir os

conceitos de linguagem e comunicação da pessoa com TEA, tendo em vista que são

critérios para um diagnóstico por serem uma das maiores dificuldades desse

transtorno. Foram apontadas várias possibilidades em prol de suplementar os

défices da linguagem e da comunicação. Indo além disso, é preciso considerar que a

linguagem constitui-se como mediador fundamental na constituição do sujeito e de

suas funções psicológicas superiores.

Considerando isso, vale ressaltar, agora, que é necessário também pensar

em estratégias para seu uso e quais seus respectivos resultados, é o que veremos

adiante.

5.2 Categoria 2: Estratégias e resultados

Nesta sessão, discutiremos as várias estratégias encontradas na literatura em

relação ao trabalho com a pessoa com TEA com dificuldades ou ausência de

comunicação e linguagem. Dentre as ações apontadas como estratégias, estão:

Comunicação Alternativa e Ampliada (CAA), Picture Exchange Communication

System (PECS), Modelagem em vídeo (MV) e o trabalho com as histórias de vida

dos sujeitos e a utilização de fotografias pessoais como recurso terapêutico.

Com a proposta de uma revisão de literatura sobre as características da

comunicação social na Perturbação do Espectro do Autismo (PEA), Reis, Pereira e

Almeida (2016) tratam acerca das adequações e do desenvolvimento de

competências comunicativas, explanando algumas possibilidades de intervenções.

Em síntese, os autores defendem um conjunto de práticas que servirão de

estratégias no trabalho com a pessoa com PEA, tais como: o trabalho de uma

Page 61: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

60

equipe de diferentes áreas disciplinares aliado ao apoio da família, que se

constituem como eixos importantes em todo o processo de acompanhamento da

criança com TEA; plano individual de intervenção precoce; focar na funcionalidade

das intervenções na vida da criança; capacitações tanto de familiares como da

equipe de profissionais e também práticas de intervenção individualizadas e

sensíveis às prioridades da criança e diversidade de cada família (REIS; PEREIRA;

ALMEIDA, 2016).

Com isso, concluem que

Em síntese, este conjunto de práticas sustenta a importância de uma intervenção o mais precoce possível, realizada nos contextos naturais, da criança e da sua família, que objetive a potencialização de níveis de envolvimento e participação da criança; promotores de oportunidades de aprendizagem e de desenvolvimento das suas competências comunicativas e sociais (REIS; PEREIRA; ALMEIDA, 2016, p. 333).

Nesse sentido, compreendemos que as oportunidades de aprendizagem

podem ser exploradas com mediações na Zona de Desenvolvimento Proximal

(ZDP). Conforme Vygotsky (1991, p. 58)

Ela é a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes.

Vygotsky (1991) compreende que o trabalho na ZDP proporciona um olhar da

aprendizagem em perspectiva, ou seja, trabalha-se com o potencial do sujeito, com

o seu vir-a-ser. Para tanto, a mediação simbólica faz-se essencial na medida em que

a interação com o outro impulsiona o processo de aprendizagem do sujeito, criando

novas ZDP.

Ao dar sequência com as outras discussões encontradas nos artigos

utilizados para a realização deste estudo, visualizamos intervenções com o uso de

outros recursos, tais como a CAA e o PECS. Alguns autores discutiram sobre essas

duas ferramentas de comunicação.

Retomamos o estudo desenvolvido por Nunes e Nunes Sobrinho (2010)

quanto ao uso de CAA, que realizaram uma revisão de literatura sobre esse tema. A

busca dos artigos seguiu os seguintes critérios: tipo de CAA, delineamento de

Page 62: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

61

pesquisa, número de participantes envolvidos, variáveis dependentes e

independentes, medidas de generalização, manutenção e validade social.

Dentre esses estudos, constatou-se que 18 fizeram uso de sistemas manuais

de língua de sinais; 26 utilizaram sistemas pictográficos de comunicação; 9 sobre o

uso de sistemas assistidos com acionadores de voz e 3 utilizaram sistemas híbridos,

contendo mais de uma modalidade de CAA (NUNES; NUNES SOBRINHO, 2010).

Outro trabalho envolvendo o uso de CAA foi desenvolvido por Walter e

Almeida (2010), que buscou realizar uma avaliação de um programa de CAA para

mães de adolescentes com autismo. O procedimento experimental ocorreu em duas

fases: linha de base (LB) e intervenção. O processo de intervenção contou com a

capacitação teórica e prática das mães, incluindo a aplicação, utilização e

manutenção do uso da CAA com os filhos no ambiente familiar. Esse programa

recebeu o nome de ProCAAF (Programa de Comunicação de Alternativa e Ampliada

Familiar).

Para concretude desse objetivo de pesquisa foram elaboradas, pelas

pesquisadoras, as seguintes etapas: conhecimento das necessidades comunicativas

das mães; observação dos comportamentos comunicativos dos filhos no contexto

familiar e registro de desempenho no uso da CAA pelas mães e pelos filhos. Para

atingir essas etapas, fizeram uso de questionários visando conhecer qual o padrão

comunicativo dos filhos, observação, filmagem e coletados os registros realizados

pelas mães referentes ao desempenho em porcentagem dos níveis de auxílio

oferecidos aos filhos e sua independência para utilizar a CAA.

Com os dados coletados no decorrer de um ano, Walter e Almeida (2010)

sinalizam o desempenho dos familiares e dos participantes com TEA em utilizar a

CAA em casa para comunicar seus desejos, necessidades e suas emoções.

O estudo realizado por Walter e Almeida (2010) permite ao leitor visualizar a

importância que a família tem no desenvolvimento da linguagem no indivíduo com

TEA. A vivência do TEA não é apenas do sujeito, mas também de seus familiares.

Ante ao impacto causado pelo diagnóstico de TEA, a atuação do psicólogo nesse

trabalho aliado aos familiares torna-se fundamental. Assim, foi analisado que os

programas de orientação aos familiares que ocorrem em parceria com profissionais

têm maior possibilidade no desenvolvimento de pessoas com autismo, promovendo

mudanças significativas.

Page 63: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

62

A família é considerada o núcleo básico de apoio social do indivíduo, tem vital

importância em contribuir na formação do sujeito e possibilitar um desenvolvimento

social, emocional, cognitivo, etc. Familiares de pessoas com deficiência passam por

diversas mudanças em suas vidas, havendo repercussões que demandam um

ajustamento para a nova realidade (PADUA; RODRIGUES, 2013).

Padua e Rodrigues (2013, p. 2323) explanam que:

Assim, a família é compreendida como um sistema onde cada membro influencia e afeta os outros. Ela, enquanto um grupo, tem seu funcionamento regular que permite uma certa estabilidade e regularidade para garantir o bem estar dos membros. As eventuais mudanças que podem ocorrer dentro do contexto familiar provocam um desequilíbrio nas relações e desafiam ao grupo adaptar-se a nova situação.

Portanto, pensar no trabalho com a pessoa com deficiência é também pensar

sobre a importância que familiares e cuidadores possuem nesse processo de

desenvolvimento, sendo uma estratégia fundamental. Logo, conforme Vygotsky

(2003), é no meio familiar que a criança irá aprender a significar e apreender suas

ações, no qual estarão a todo o momento internalizando signos e símbolos que

servirão de mediadores na organização do pensamento e no desenvolvimento das

funções psicológicas superiores.

Outro estudo sobre CAA, por sua vez, explora o emprego do PECS. As

autoras Mizael e Aillo (2013), através de sua pesquisa bibliográfica revisaram

outros estudos que abordavam o PECS no ensino a linguagem em pessoas com

TEA e outras dificuldades de fala. Essa alternativa ressalta a relação interpessoal e

permite haver uma relação comunicativa entre duas pessoas, através de trocas de

figuras.

Conforme as autoras, o PECS é desenvolvido em seis fases de treinos: 1)

fazer pedidos através da troca de figuras pelo item desejado; 2) ir até a prancha de

comunicação, apanhar a referida figura e entregá-la para um adulto; 3) discriminar

entre as figuras; 4) solicitar itens, utilizando várias palavras em frases simples,

fixadas na tábua de comunicação; 5) responder a pergunta ―o que você quer?‖; 6)

emitir comentários espontâneos.

O estudo se delineou com quatro artigos encontrados na literatura estrangeira

e seis na literatura brasileira. A análise se desenvolveu com os seguintes critérios:

número de participantes, delineamento de pesquisa, duração do estudo, setting,

Page 64: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

63

fases implementadas, resultados encontrados, fidedignidade inter-observador e de

procedimento, validade social, manutenção e generalização. Em ambas as

literaturas, o PECS evidenciou-se como uma ferramenta eficaz no ensino de

linguagem a indivíduos com autismo, podendo observar também uma maior

incidência de vocalizações com intenções comunicativas ou até mesmo a fala

funcional (MIZAEL; AIELLO, 2013).

Togashi e Walter (2016) também trazem as considerações realizadas em

seu estudo de caso sobre as contribuições da CAA na inclusão escolar de uma

criança com TEA. A pretensão era introduzir o uso do sistema PECS – Adaptado

junto aos alunos com TEA, atuando no AEE. Ocorreram em sete sessões, que foram

analisados a partir do protocolo de registro dos níveis oferecidos nas fases do

PECS.

Embora se tenha um baixo número de pesquisas que envolvam o uso das

CAA voltadas para o público com TEA, as autoras argumentam que a prática tem

mostrado um histórico de sucesso em seu uso, com resultados positivos e com uma

significativa melhora no desenvolvimento da comunicação e da linguagem.

Para tanto, a pesquisa do referido estudo desenvolveu-se em duas etapas:

capacitação de 35 professores de AEE e verificação e acompanhamento da

aplicação do referido sistema por quatro professoras selecionadas após o curso de

capacitação e que atendiam alunos com TEA sem fala funcional. A partir dos

questionamentos que surgiram com o término da pesquisa é que foi desenvolvido o

trabalho em análise, dividido em dois estudos: o Estudo I, foram apresentados os

dados do Follow-up da investigação maior e o Estudo II, foi destinado a descrever o

processo de introdução e utilização do PECS-Adaptado no ambiente da escola

regular.

Do Estudo I, participaram um aluno com TEA e uma professora da sala de

AEE. Esse estudo aconteceu na sala de recursos de uma escola regular da rede

municipal do Rio de Janeiro. Foram utilizados filmadora digital, câmera fotográfica

digital e fichas de anotações do PECS-Adaptado. Havia o Relatório de Observação e

também foi confeccionado o material de CAA para o uso do aluno, em formato de

cartões que tinham dois tamanhos diferentes, utilizando figuras do PECS, uma

prancha móvel e um painel que ficava fixo na parede e um álbum de comunicação.

As sessões de follow-up ocorreram no espaço de tempo de cinco meses, com

duração das sessões variando de 12 a 21 minutos. Foram realizadas atividades

Page 65: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

64

pedagógicas que promoviam interação da professora com o aluno através do uso do

PECS. Em seguida, como análise de dados, foi feito o uso de um modelo de

protocolo de registro de PECS-Adaptado, no qual foi avaliado os níveis do apoio que

foram oferecidos ao aluno e observando a independência do mesmo em buscar

seus itens de interesse. Mediante a essa observação é que era possível ao aluno

avançar nas fases do PECS-Adaptado (Fase 1 à Fase 5).

Já o Estudo II objetivou analisar as interações comunicativas do aluno com

TEA em sua sala de aula regular e verificar os efeitos da utilização das CAA no

contexto escolar. Teve como participantes o mesmo aluno da pesquisa anterior, sua

atual professora da classe regular e uma estagiária contratada para trabalhar

diretamente com o aluno em questão. Realizada em uma sala de aula do ensino

fundamental, foram desenvolvidas quatro sessões de Linha de Base, três sessões

de capacitação da professora e estagiária sobre o uso de CAA e do PECS-Adaptado

e seis sessões de Intervenção, dispostas em um período de oito meses.

Na Linha de Base, foi observado como se desenvolviam as relações sociais

do aluno e também de suas professoras, as atividades propostas pela professora e

como ocorria a interação comunicativa entre eles. No período da intervenção,

ocorreu a capacitação da professora e da estagiária. Após esse momento, ambas

passaram a trabalhar com o aluno a partir de atividades pedagógicas, em que foi

observado os momentos de interação entre o aluno e suas interlocutoras.

Os resultados da pesquisa realizada por Togashi e Walter (2016) indicaram

continuidade do uso de PECS-Adaptado pela professora, uma maior interação

comunicativa do aluno com a estagiária durante as intervenções, finalizando com a

generalização do uso do PECS-Adaptado na sala de aula regular. Assim, conclui-se

que a comunicação é um dos fatores fundamentais quando se fala em inclusão

escolar e que, com o seu auxílio, tende a ocorrer de forma mais efetiva.

Considerando os escritos da abordagem histórico-cultural, destacamos que a

atividade do professor é fundamental para o desenvolvimento do sujeito com TEA.

Chiote (2013) frisa que, no espaço escolar, é preciso perceber o sujeito em sua

condição de constituição. Assim, a aprendizagem da criança com autismo deve ser

voltada para os processos de significação em que a criança precisa ser

ressignificada para além do diagnóstico. A interação social com os outros colegas

pode ajudar nesse processo em prol de desenvolver habilidades e conhecimentos.

Page 66: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

65

Como mencionamos anteriormente, Chiote (2013) explica que se deve

trabalhar nos processos de significação, ou seja, é preciso o compartilhamento de

sentidos com a criança com TEA.

Isso implica uma compreensão da CAA que não se reduza a um olhar

instrumental de comunicação. Sobre isso, Orrú argumenta:

Se a forma de trabalho fosse a de expor o símbolo fora do contexto real, objetivando a memorização e a troca do símbolo com a ação e/ou objeto, teríamos aqui uma proposta do exercício do treino de habilidades. Estando ausente a intencionalidade da construção de significado e de sentido, este último se encontra no porquê de ação estar sendo realizada (ORRÚ, 2012, p. 122).

Assim, de acordo com a abordagem histórico-cultural, é preciso atuar na

construção contextualizada da comunicação. Ao pensar o desenvolvimento da

pessoa com TEA, deve-se, então, também produzir relações entre a linguagem e o

pensamento.

No que vem tratar da linguagem da pessoa com TEA, Orrú (2010) tece

críticas ao trabalho dentro de uma perspectiva mecanicista que desconsidere a

concepção simbólica do sujeito. As CAA, tidas a partir da abordagem histórico-

cultural, não irão buscar apenas uma proposta de trabalho de modificação de

comportamento, por meio de treino de habilidades ou de resgate de uma

comunicação funcional. Compreende-se que, através da ação mediadora presente

nas CAA, é possível apresentar situações que estejam repletas de significados. Sem

a existência de sentidos e significados, não haverá interação social e,

consequentemente, o desenvolvimento da linguagem. Nas palavras de Orrú,

O diferencial do uso da CSA, a partir da abordagem histórico-cultural, está, justamente, em não realizar trocas de objetos por CSA, de maneira mecânica e descontextualizada, mas em inserir este sistema nas experiências e nos contextos em seu cotidiano, na perspectiva da produção de sentidos (ORRÚ, 2012, p. 126).

Além disso, destacamos a mediação na construção da identidade do sujeito,

nos casos de ausência da fala ou de dificuldades na mesma. Aqui, o papel do outro

segue sendo de vital importância nos processos mediacionais.

Segundo Chiote (2013), essa mediação deve ser alicerçada em processos

compensatórios, que busquem explorar as possibilidades de cada sujeito e que os

impulsionem a interagir com os outros e com o meio. Através desse conceito, o

Page 67: AUTISMO, COMUNICAÇÃO E LINGUAGEM: ESTRATÉGIAS E

66

profissional não mais olhará para um sujeito com deficiência sob a ótica de suas

perdas e limitações, mas sim se voltando para seus pontos fortes e suas

possibilidades.

Outra estratégia encontrada na intervenção e trabalho com o sujeito com TEA

é a Modelagem em Vídeo como um recurso para o ensino de habilidades de

comunicação. Rodrigues e Almeida (2017) explicam essa prática como um recurso

baseado em evidências para o público de pessoas com TEA, tendo em vista que

esse grupo de pessoas responde melhor às estratégias de ensino por meio de pistas

visuais. A partir dessa compreensão que as autoras se dispuseram a avaliar os

resultados dessa intervenção.

Essa técnica consiste na imitação de alguns comportamentos ou habilidades

que são ilustradas por meio de vídeos por um adulto ou pares. O procedimento

acontece com uma pessoa sendo convidada a assistir ao vídeo, enquanto um adulto

ou par modela uma habilidade a ser desenvolvida dentro de um contexto de

atividade. Estímulos e reforços são oferecidos em busca do objetivo até que a

pessoa imite o comportamento do modelo com a oportunidade de desempenhar as

habilidades em vídeo (RODRIGUES; ALMEIDA, 2017).

Existem três tipos básicos de intervenções em MV que são: 1) modelagem em

vídeo com outros como modelo (MVO), ou seja, é preciso o uso de um adulto ou par

como modelo que podem ser conhecidos ou não pelo aprendiz; 2) automodelagem

em vídeo (AV) utiliza o aprendiz como o modelo, pois, assim, ele visualiza a si

próprio desempenhando determinada tarefa; e 3) modelagem em vídeo a partir do

ponto de vista (MVPV), que é filmado na perspectiva da primeira pessoa e é

elaborado com a filmadora na altura do ombro de uma pessoa, o que trará a

impressão de que acontece através dos olhos do aprendiz e somente suas mãos

são visíveis no vídeo, que realizam o comportamento alvo.

O estudo em análise pode sumarizar intervenções que empregaram a MV no

ensino de habilidades de comunicação avaliaram critérios como duração de vídeo,

generalização por meio de ambientes, materiais, pessoas e estímulos. Fizeram parte

dos estudos pessoas com idade de 3 a 36 anos, destes, apenas um apresentava

diagnóstico de síndrome de Down, os demais eram todos com TEA. Os estudos

foram conduzidos em sua maioria em escolas especiais. Todas as variáveis do

estudo estavam relacionadas a habilidades de comunicação agrupadas em seis:

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67

expressões faciais, fazer pedidos por meio da CAA, a fala, gestos, entonação e

contato visual.

Com a coleta de todos os critérios de avaliação, perceberam que essa prática

é eficaz no ensino de habilidades de comunicação por meio da MV. Os resultados

apoiam o uso da modelagem em vídeo na reabilitação de crianças com TEA. No

entanto, devem-se considerar as particularidades diagnósticas desta população para

que assim a intervenção seja mais eficaz (RODRIGUES; ALMEIDA, 2017).

Levando em consideração que cada sujeito apresenta características e níveis

diferentes de TEA, quando se trata de incluir, faz-se necessário que haja um modelo

interventivo singular para cada situação. De acordo com Orrú (2012), a maneira pela

qual o sujeito é assistido em seu meio social, familiar e cultural, também irá

influenciar diretamente em seu desenvolvimento. Esses sujeitos possuem sua

subjetividade e sua singularidade que vão sendo constituídas de forma dialética com

o meio social que vivem. Assim, é a partir das mediações dispostas nas relações

que a pessoa com TEA irá encontrar os caminhos para sua subjetividade.

Desse modo, compreendemos que, conforme Chiote (2013), em muitos casos

a pessoa com TEA é reduzida ao transtorno, restringindo as possibilidades

educativas às práticas de reabilitação e adequação social. Devemos situar esse

público a partir de como ele é significado e constituído pelo outro, porém, é preciso

percebê-lo em sua singularidade, como um sujeito que pensa, deseja, sente e

representa o mundo de maneira ímpar.

A última estratégia apontada está na pesquisa de Bagarollo e Panhoca

(2010), que buscou analisar o processo dialógico de adolescentes autistas por meio

do uso de fotografias. A escolha desse método se deu mediante a preocupação com

os detalhes dos episódios focais, já que é através das situações vivenciadas

anteriormente que o sujeito poderá emergir novas formas de desenvolvimento. No

diálogo estabelecido durante as sessões e através dos retratos, os adolescentes

tiveram o poder da palavra, a iniciativa de fala e o domínio sobre o que cada uma

daquelas imagens retratava.

Sobre a escolha pelo o uso de fotografias, as autoras afirmam que:

Além disso, as fotografias tiveram a função de signo mediador da memória, permitindo que o sujeito recordasse situações vivenciadas, trazendo-as e expandindo-as durante as sessões. O uso de retratos possibilitou o exercício de um funcionamento mediado da memória, de caráter superior,

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68

ultrapassando os limites de uma recordação imediata e instintiva. (BAGAROLLO; PANHOCA, 2010, p. 248)

As fotografias foram utilizadas como um signo mediador da memória na vida

dos três adolescentes. A partir das imagens, o terapeuta pode estabelecer junto a

eles um resgate de suas memórias, discorrendo e expandindo as informações que

foram sendo trazidas. Desse modo, essa estratégia terapêutica foi utilizada como

uma forma de imersão da linguagem e manutenção do diálogo. É pela linguagem, tal

como dito por Chiote (2013), que o sujeito é inserido no mundo cultural e simbólico,

sendo ela o nosso sistema simbólico mais importante, pois permite ao outro ter uma

participação na vida social e também é considerado um modo de perceber o mundo,

de relacionar-se e constituir-se a partir dele.

A terapeuta/pesquisadora participava ativamente dos diálogos, auxiliando no

relato dos fatos. A todo o momento a presença desta se fez necessária para

promover a manutenção do diálogo, nesse caso se a mesma estivesse apenas

ouvindo, provavelmente, o relato seria encerrado rapidamente (BAGAROLLO;

PANHOCA, 2010).

Esse estudo corrobora como a presença do outro permite ao sujeito a

possibilidade de internalizar novos conceitos. Assim como dito por Chiote (2013), tal

presença tem papel fundamental no processo de desenvolvimento humano, já que,

com a inserção do sujeito na cultura, ocorre um processo dual de mediação que é

caracterizada pelo signo e pelo outro.

A inserção na cultura também propicia esse desenvolvimento e, assim,

Bagarollo e Panhoca (2010) evidenciam a partir das ações trazidas por um dos

sujeitos sua inserção cultural cercada de significações, de conceitos e de material

artístico. Em algumas situações, ficaram explícitas o uso de ecolalias, entretanto,

diferente do que é difundido, esse episódio permitiu compreender que o sujeito da

pesquisa faz uso deste tipo de fala para manter o diálogo, responder às questões do

terapeuta e continuar o relato.

Também, pode-se perceber que essa repetição se dá mediante a uma falta de

repertório linguístico para que haja a continuidade da interação. Desse modo, essa

prática pode ser considerada como uma estratégia linguística que, por meio dessas

circunstâncias, possibilitam a interação e manutenção da conversação.

Por fim, tomamos as conclusões das autoras acerca desse relato de pesquisa

para estabelecer a conclusão do atual capítulo e permitir a relação com as

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69

Considerações Finais, uma vez que suas conclusões unem-se à nossa perspectiva

quanto às intervenções sobre TEA no tocante à linguagem e a comunicação.

Nessa direção, as autoras concluíram que, dentro da perspectiva histórico-

cultural, o trabalho fonoaudiológico, assim como as demais áreas que perpassam o

trabalho terapêutico, deve voltar-se não para a reabilitação, mas para o

conhecimento do meio social em que esses sujeitos vivem, permitindo assim a

construção de novas significações, apropriação de si mesmo e vivências sociais e

culturais. A relação com o outro e, em específico com sujeitos com TEA, deve ser

realizada em um espaço onde a mediação seja especializada e direcionada. Dessa

maneira, considerando a singularidade e o modo de funcionar de cada um é que

será possível haver essa relação.

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70

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo deste trabalho, dedicamo-nos à literatura científica acerca da

compreensão sobre os conceitos de linguagem e comunicação no TEA e quais as

formas interventivas utilizadas para esse público, em específico, para aqueles que

possuam dificuldades ou ausência da fala. Desse modo, quanto ao nosso objetivo

geral, que foi compreender, a partir de literaturas encontradas na Revista Brasileira

de Educação Especial, quais estratégias utilizadas no trabalho terapêutico e

educacional direcionadas ao desenvolvimento da linguagem e comunicação de

pessoas com TEA, constatou-se um somatório de produções científicas sobre a

temática.

Além disso, seguindo os objetivos específicos, que são compreender as

concepções de linguagem e comunicação encontradas nas literaturas; analisar a

importância da linguagem e comunicação no desenvolvimento da pessoa com TEA;

e identificar estratégias interventivas no tocante à linguagem e à comunicação, ficou

evidente, com o desenvolvimento desta pesquisa, uma concordância de perspectiva

na maioria das literaturas.

Assim, cientes das dificuldades dispostas nesses quesitos, os autores

concordam que as dificuldades de linguagem e comunicação podem gerar uma

barreira interpessoal na relação com o outro, impedindo a interação social da pessoa

com TEA. Embora algumas literaturas não tenham deixado de forma mais explícita

sua definição para linguagem e comunicação, não negaram sua importância no

desenvolvimento social e cognitivo do sujeito com TEA, também partilharam do

entendimento de que embora a linguagem mais utilizada seja a oral está não é a

única forma de possível. Na realidade da pessoa com TEA, esta pode desenvolver

sua linguagem para além da oral e assim comunicar-se por outras vias.

Correlacionando com a Psicologia Histórico-cultural, a linguagem assume

papel central no desenvolvimento humano, embora uma das funções da linguagem

seja a comunicação, que possui extrema relevância, sua importância não se resume

a isso, pois também temos a linguagem como mediadora para o desenvolvimento do

sujeito, de suas funções psicológicas superiores e reguladora de comportamentos.

Dado o seu destaque no desenvolvimento humano em grande parte das

literaturas analisadas pode-se encontrar métodos e técnicas complementares ou

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71

substitutos da linguagem oral comprometida ou ausente, validando sua necessidade

e relevância.

Diante disso, conforme analisado, dentre as práticas voltadas para o público

com TEA com o objetivo de suplementar ou substituir a comunicação, estão: o uso

da CAA apresentado de múltiplas formas e, em meio a essas formas, o uso do

PECS, um sistema de comunicação por troca de figuras; e modelagem em vídeo.

Também verificamos a presença fundamental de práticas que envolviam mediação,

como o trabalho com histórias de vida tido a partir do uso de fotografias.

Contemplamos, ao longo das análises, que muitas estratégias eram voltadas

para o uso da CAA como ferramenta para estabelecer a comunicação e a interação.

Por certo, a literatura revelou que esses métodos são eficazes e muito utilizados no

trabalho com pessoas com TEA e com prejuízos ou ausência na comunicação.

Entretanto, ressaltamos que o uso desses métodos deve visar à participação ativa

do sujeito nesse processo e a sua interação social efetuada através da mediação do

outro, que irá se concretizar por meio de relações sociais, histórica e culturalmente

dadas.

Nessa perspectiva, cabe ao profissional estabelecer estratégias interventivas

que ressaltem um processo de aprendizagem, em que esteja atenta para não reduzir

o sujeito com TEA à reprodução de comportamentos mecânicos e vazios de

sentidos e significados, mas que este seja visto como um ser ativo em seu próprio

processo de aprendizagem a partir do desenvolvimento da linguagem. A valer,

consideramos importante estabelecer relações que propiciem a aquisição da

linguagem no sujeito e, deste modo, estará simbolizando e internalizando elementos

da sua cultura.

Algumas pontes de discussões foram averiguadas no decorrer das análises.

Em meio a elas, foi observada a importância que a comunicação desempenha no

processo de inclusão do aluno com TEA em seu contexto escolar. Em um dos

materiais analisados, demonstrou-se a carência de formações continuadas voltadas

para educadores que atuem com pessoas com TEA com dificuldades de

comunicação e em que o uso de algum método suplementar seja preciso. Assim,

quanto aos programas de inclusão, faz-se necessário o apoio ao contexto

educacional e aos professores de pessoas com TEA.

Também encontramos textos que ressaltaram a importância de um conjunto

de práticas que sustentassem uma intervenção o mais precoce possível, que fosse

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72

realizada em contextos naturais do indivíduo, como exemplo o contexto familiar. Em

um estudo que teve como objetivo avaliar os efeitos de um programa de CAA no

contexto familiar de pessoas com TEA, foi possível perceber a relevância de incluir

esse núcleo em prol do desenvolvimento dessas pessoas e pensar em técnicas que

estejam alinhadas às reais necessidades dos familiares no contexto familiar. Essa

percepção parte da compreensão sobre a família e, nesse estudo, voltamos os

olhares para familiares de pessoas com deficiência. A família tem significativa

contribuição no desenvolvimento do sujeito com TEA, pois é nesse meio em que irá

significar e contextualizar suas próprias ações.

Ainda com o desenvolvimento de nosso estudo, notou-se um rigor em

pesquisas que priorizaram analisar as CAA em busca das melhores práticas

adotadas pelos programas de intervenção fundamentando a análise em critérios

mais técnicos onde o sujeito era tido apenas como um participante de determinados

experimentos retidos em grupos de controle. Em meio a esse cenário, foram

levantadas questões como a importância de observar a singularidade contida no

diagnóstico do TEA e que cada método ou técnica precisa ser avaliado a partir

dessa singularidade e realidade de cada um. Embora pesquisas com rigor científico

se façam necessárias, esse olhar para o sujeito que pensa, sente e tem seus

próprios anseios precisa ser fortemente considerados.

Com a pesquisa, foi possível avaliar que a comunicação perpassa todo o

desenvolvimento do sujeito com TEA e que é unânime em cada trabalho sua

importância. Também foi visto como resultados que muitas literaturas defendem o

uso de estratégias de intervenção que estejam fundamentadas no uso de métodos e

técnicas de CAA sendo este considerado um recurso útil no ensino e na tentativa de

estabelecer uma comunicação com a pessoa com TEA que merece um olhar e um

incentivo maior para o desenvolvimento de pesquisas.

Diante desse caminho, temos que a abordagem histórico-cultural compreende

que é através da linguagem e da comunicação que o sujeito irá interagir de modo

social e cultural. Neste caminho, define sua própria identidade ao passo que se

envolve nessas relações já que é através das relações sociais que o

desenvolvimento humano irá se delinear. Como observamos, a mediação simbólica,

proposta por Vygotsky, contribui muito no que diz respeito à constituição da

linguagem de sujeitos com TEA. Desse modo, instrumentos utilizados nesse

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73

processo de ensino e de aprendizagem, tal como a CAA são efetivados quando há

essa relação mediacional com o outro e com o meio.

Como foi dito anteriormente, em ambos os conceitos discutidos nessa

pesquisa é que reside o maior obstáculo acometido em razão do próprio diagnóstico

do TEA. No entanto, o desenvolvimento da linguagem e da comunicação não

depende apenas do sujeito, nem do profissional que o acompanha, seja terapêutico

ou educador, mas também das relações estabelecidas em todo o contexto cultural e

social. Profissionais qualificados também somam nesse processo desde que

busquem ser mediadores na aprendizagem desses sujeitos.

É indispensável o desenvolvimento da sensibilidade no profissional que

trabalha com uma pessoa com TEA. Enquanto profissional, este precisa buscar

compreender a individualidade de cada sujeito para assim estabelecer e desenvolver

a comunicação destes. O estudo contínuo desses profissionais permite abranger a

ideia de não ver o sujeito com TEA apenas como alguém com défice, mas de

enxergá-lo como uma pessoa que é ativa em seu processo de ensino e

aprendizagem e em constante transformação. Nesse sentido, é preciso

compreender que fazer uso da CAA é permitir que esse sujeito esteja tendo como

mediador esse método, na produção de seus sentidos e significados. É necessário

investir, por meio da compensação, em caminhos alternativos que busquem quebrar

as barreiras que lhe são postas e enxergá-lo diante de suas possibilidades,

contribuindo para que seu desenvolvimento cultural aconteça.

Diante disso, destacamos a necessidade da realização de outros trabalhos,

como pesquisas interventivas, que busquem a colaboração de professores,

familiares, terapeutas e afins, saindo da literatura bibliográfica em direção de

pesquisas de campo, para que, posteriormente, os resultados obtidos possam ser

utilizados como caminhos possíveis de atuação. Esse tipo de pesquisa propicia

enormes ganhos no conhecimento do TEA e na importância que a linguagem e a

comunicação oferecem na vida desse público, colaborando com a elaboração das

melhores formas de intervenção no conhecimento dessas áreas, como também em

formas de estabelecer relações.

Tais estudo permitem, ainda que aos poucos, compreender a devida

importância que é atribuída a esses conceitos e sair da visão de não considerar o

sujeito em seu processo de aprendizagem e nem de validar as formas comunicativas

que já possua. Assim, poderiam ser abertos espaços para que todos os que façam

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74

parte da vida da pessoa com TEA o tenham em sua singularidade e participação

ativa em seu desenvolvimento e aprendizagem.

Concluímos que esta pesquisa não traz pontos finais, mas sim busca

provocar uma inquietação para estudos posteriores. Para finalizar, preferimos

destacar a relevância atribuída aos conceitos de linguagem e comunicação e sua

contribuição no desenvolvimento do sujeito com TEA. Também, salientamos que são

conceitos fundamentais para que haja relações interpessoais entre esse público.

Cientes das barreiras encontradas, notificamos estratégias interventivas que

buscam amparar essa área que, por vezes, é prejudicada ou ausente. Para isso,

práticas precisam ser pensadas através da realidade de cada indivíduo. Ainda,

entendemos que profissionais e educadores são ferramentas importantes nesse

processo, no entanto, familiares também precisam ser incluídos na busca de

melhores estratégias e como uma ponte em busca do desenvolvimento desse

sujeito. Já que as relações sociais, históricas e culturais perpassam a vida do ser

humano e são constitutivas da subjetividade destes, ressaltamos que a sociedade

em geral precisa estar consciente de seu papel em prol de incluir a pessoa com

TEA.

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