Biondi, A. O Brasil Privatizado (2)

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    O Brasilprivatizado II

    Aloysio Biondi

    O assalto das privatizaes continua

    BRAS I L URGENTE

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    NO RIA, CHORE - Que tal voc comprar uma rede delanchonetes ou uma rede de postos de gasolina para pagar em dezanos, a preo de banana pois o antigo dono resolveu vender porque

    estava, segundo as ms lnguas, precisando de dinheiro? E depois, daa dois ou trs anos, o vendedor to bonzinho, to bonzinho, sem terrecebido ainda as prestaes de oito ou sete anos oferecer dinheiroemprestado, muito dinheiro, a juros baixssimos, de pai para filho,para voc comprar os concorrentes e ficar sozinho no mercado?Absurdo? Afinal, o vendedor no estava quebrado? No ria. Chore.Foi isso que aconteceu no Brasil, com a venda de empresas estatais

    a grupos privilegiados.Quer dizer: o governo dizia que o Tesouro estava quebrado, usavaessa desculpa para doar as estatais e depois arrumava dinheiro paraos compradores. Ou seja, a mesma coisa que voc, depois decomprar as lanchonetes e postos de gasolina, ainda receber a visitado vendedor que, to otrio, to otrio, vem oferecer novoemprstimo para ampliar os negcios...

    EMCINCOOUSEISANOS, CLONESMALDITOSDOSINTELECTUAISDEONTEMDESTRURAMOQUEHAVIASIDOCONSTRUDOAOLONGODEDCADAS.DESTRURAMMAIS. DESTRURAMOSONHO,A ALMA NACIONAL.

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    O Brasilprivatizado II

    O assalto das privatizaes continua

    Aloysio Biondi

    EDITORA FUNDAO PERSEU ABRAMO

    3a reimpresso

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    FUNDAO PERSEU ABRAMOInstituda pelo Diretrio Nacional

    do Partido dos Trabalhadores em maio de 1996.

    DIRETORIAHamilton Pereira (presidente) Ricardo de Azevedo (vice-presidente)

    Selma Rocha (diretora) Flvio Jorge Rodrigues da Silva (diretor)

    EDITORAFUNDAO PERSEU ABRAMO

    COORDENAO EDITORIALFlamarion Maus

    EDITORAASSISTENTECandice Quinelato Baptista

    ASSISTENTE EDITORIALViviane Akemi Uemura

    SELEODETEXTOSEORGANIZAOAntnio Biondi Flamarion Maus

    REVISOMaurcio Balthazar Leal Mrcio Guimares de Arajo

    CAPA, ILUSTRAESEPROJETOGRFICOGilberto Maringoni

    EDITORAOELETRNICAAugusto Gomes

    1a edio: setembro de 20003a reimpresso: agosto de 2003

    Todos os direitos reservados

    Editora Fundao Perseu AbramoRua Francisco Cruz, 224 CEP 04117-091 So Paulo SP BrasilTelefone: (11) 5571-4299 Fax: (11) 5571-0910

    Na Internet: http://www.efpa.com.br Correio eletrnico: [email protected]

    Copyright 2000 by Esplio de Aloysio BiondiISBN 85-86469-38-6

    Nota do Editor

    Este volume contm o texto integral da primeira ediodesta obra, publicada em setembro de 2000.

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)(Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

    Biondi, Aloysio, 1936-2000.

    O Brasil privatizado II: o assalto das privatizaes continua / Aloysio

    Biondi. So Paulo : Editora Fundao Perseu Abramo, 2003. (Coleo Brasil

    Urgente)

    Bibliografia

    ISBN 85-86469-38-6

    1. Privatizao Brasil I. Ttulo. II. Ttulo: O assalo das privatizaes

    continua. III. Srie.

    03-4577 CDD-338.9250981

    ndices para catlogo sistemtico:1. Brasil: Privatizaes: Poltica econmica: Economia 338.9250981

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    Prefcio Antnio Biondi ................................................. 5

    Homenagem

    Aloysio Biondi, doutor em tudo,

    por W ashington Novaes ............................................................ 8

    Queremos o Brasil de volta ............................................... 11

    A morte da alma nacional ......................................................... 11

    O pesadelo do Real .................................................................... 15

    Queremos o Brasil de volta ....................................................... 18Grato por me assaltares ............................................................ 20

    A Vale do Rio Doce, retrato de um pas ................................... 22

    Que no se repita em 2000 ...................................................... 25

    A bomba do ano ...................................................................... 26

    A hora do Congresso ................................................................. 28

    O Congresso e os palhaos ........................................................ 29

    O petrleo deles ............................................................... 32

    Voc no acha errado? .............................................................. 32

    O petrleo deles ...................................................................... 34

    Depois do petrleo, o dilvio .................................................... 35

    A Mega-Mega Sena do petrleo. Roubada. ............................. 38

    Emprego e crescimento, promessas ......................................... 41

    O silncio das oposies ............................................................ 43

    O petrleo (at que enfim) deles ........................................... 44

    O Riocentro da Petrobrs .......................................................... 47

    Um escndalo tenebroso .......................................................... 51

    E l se vai o petrleo ................................................................. 53

    Aplausos e CPIs ......................................................................... 55

    Sumrio

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    Energia, o caos programado .............................................. 57

    Era uma vez um clone ............................................................... 57

    Por detrs das notcias .............................................................. 59

    Diferena entre Covas e Itamar ................................................ 60A sua casa, sem luz ................................................................... 62

    Bancos e rombos............................................................... 64

    Bancos e truques ........................................................................ 64

    Privatizao, a falsa sada ......................................................... 66

    Rombos, Covas e os paulistas ................................................ 68

    Nosso dinheiro pelo ralo ........................................................... 70

    Cusparada nos paulistas ............................................................ 71

    Os gerentes desonestos .............................................................. 73

    O Congresso desperta ................................................................ 74

    Direitos na lata do lixo .............................................................. 75

    As provas do crime .................................................................... 77

    O rombo da Caixa ................................................................... 78

    Como falsificar balanos ........................................................... 80

    Pedgios e deboches ........................................................... 82

    Afinal, somos coitadinhos? ........................................................ 82

    O ministro e os imbecis ............................................................ 84

    Pedgios e deboches .................................................................. 85

    Crime sem castigo? .................................................................... 87

    Eles so despreocupados ........................................................... 88

    Hora de descruzar os braos ............................................. 90

    Hora de descruzar os braos .................................................... 90

    Mudana e esperana ................................................................ 94

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    Prefcio

    A publicao de O Brasil Privat izado II: O assalto das pr ivati-zaes con tinua poderia ser justificada de vrias formas. A maisimediata seria simplesmente dizer: O Aloysio j havia acertadocom a Editora Fundao Perseu Abramo uma continuao do pri-meiro. Alm disso, ele at j preparara um roteiro, apontando ostemas que seriam abordados, e estava pronto para comear o tra-balho o que verdade.

    Poderamos tambm lembrar que o tema continua a ser de im-portncia fundamental na discusso da poltica econmica, dosrumos e do futuro do pas. Embora muita coisa tenha mudadoaps O Brasil Privat izado Um balano do desm onte do Estado,

    publicado em abril de 1999, vrias distores no processo de pri-vatizao foram mantidas. O favorecimento a grupos especficos;a utilizao de recursos do BNDES; os prejuzos que o governo, opovo, a classe mdia, os agricultores, como dizia Biondi, tinhamcom o saneamento das empresas que eram privatizadas; a im-portao macia de peas por parte das multinacionais que com-pravam as estatais; as remessas de lucro para o exterior. Todas

    essas caractersticas do processo, que se mantiveram praticamenteinalteradas, o autor pretendia discutir neste segundo livro maisespecificamente com relao ao setor energtico, sobretudo no quediz respeito ao petrleo, e aos bancos estatais.

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    A necessidade da publicao, seja do ponto de vista profissio-nal, seja sob a tica da pertinncia do assunto, no justificaria detodo, porm, que esse volume chegasse a pblico.

    Alm de continuao do primeiro trabalho, O Brasil Privat izadoII tem como principal justificativa realizar uma homenagem aBiondi. Homenagem essa em parte bastante difcil, pela qualida-de e quantidade de artigos que ele escrevera sobre o tema aps olivro inicial. Pela ausncia do jornalista, amigo e pai. Pela dificul-dade em se trabalhar sem ele e, ao mesmo tempo, tentar pensarum pouco como ele, imaginar como ele gostaria que o livro fosse,

    que tabelas montaria, como analisaria os dados, como relaciona-ria as informaes. No nos demos o direito de fazer tais anlises,sabamo-nos incapazes. Haveria, alis, algum capaz de realizaresse trabalho como ele?

    Contentamo-nos em fazer uma coletnea de artigos sobre o tema,mas entendemos que a homenagem no seria plena se no trou-xesse textos do autor que revelassem mais sobre sua relao como Brasil, com nosso povo, com a vida. Que revelassem algo maissobre quem era Aloysio Biondi.

    O livro tem tambm um pouco essa funo, sobretudo sua pri-meira parte. Mostra muito do sonho que Biondi nutria em relaoao pas o sonho sempre presente nas palavras do mestre CelsoFurtado e que se revelava em cada artigo de Aloysio, em cadaao, em cada gesto.

    Mostrava-se nas mais de 14 horas, 16 horas que chegava a tra-

    balhar diariamente. Na alimentao, ora leve, regrada, como umcaldo de fub para no causar moleza e diminuir o ritmo fren-tico de trabalho , ora nem to regrada, como um cachorro-quen-te na rua para conciliar com a pressa, com a dificuldade finan-ceira ou com a desorganizao passageira. Tudo isso est presen-te, e escondido, em cada artigo do livro.

    Artigos tambm nascidos, por exemplo, da constatao do des-

    caso do governo com os bancos estatais, revelado at no tama-nho das filas que se avolumavam em diversas agncias do Bancodo Brasil. Textos surgidos a partir dos pedgios que brotavamnas rodovias privatizadas entre Campinas e Agua, em So Pau-

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    lo, e que ele tinha de enfrentar toda vez que ia a So Jos do RioPardo, sua cidade de criao. Alm das estradas onde nem si-nal das melhorias prometidas se via , Biondi indignava-se com

    a cebola despejada na beira da estrada: Descaso do governo como agricultor.

    Aloysio viajava pelo pas quase sempre por terra no s pelomedo que nutria por voar. Muitas vezes, seus longos passeios denibus justificavam-se de forma mais forte. Em certas ocasies,era o nico momento que possua para ler seus jornais, atualizarsua leitura, seus dados, seus inseparveis recortes. Sem suas lei-

    turas cotidianas e sem essa atualizao, seria impossvel Biondiapontar, com tanta antecedncia, a importncia que o petrleodesempenharia no atual momento da economia mundial. Seriaimpossvel explicitar, tambm, a importncia dos poos descober-tos pela Petrobrs na Bacia de Campos. Sem seus recortes sobre oassunto, contaria somente com uma preocupao antiga, surgidade suas leituras de Monteiro Lobato.

    Todos esses artigos, todas essas questes, s sero capazes, po-rm, de explicar em parte quem foi Aloysio Biondi. Sua indigna-o, sempre lembrada, insubstituvel, nica. Assim como im-possvel explicar sua essncia, que era a alegria com que vivia eque foi, muitas vezes, esquecida por aqueles que dele lembravam.

    Sua fora, sua alegria de viver, sua capacidade de procurar veras coisas por um lado positivo, de buscar enxergar perspectivas,jamais podero ser entendidas na plenitude sem sua presena.

    Alm da leitura do livro que aqui apresentamos, lembrando de tudoo que Biondi foi e ser, cumpre a ns, agora, cobrir parte do vaziodeixado. Reconhecer sua ausncia e torn-lo presente por meio detoda essa fora que ele nos deixou. Daqui para frente, a melhorforma de dar continuidade a seu trabalho, a sua fora, ser sermostodos um pouco Aloysios. Tarefa difcil, mas fundamental.

    ANTNIO BIONDISetembro de 2000

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    Homenagem

    Aloysio Biondi, doutor em tudo*

    Washington NovaesJornalista e ambientalista.

    Com Aloysio Biondi desaparece um tipo raro de jornalista com-petente, experiente, apaixonado, detentor de um acervo impres-sionante de informaes sobre o Brasil e, principalmente, sobre asua economia. Ao mesmo tempo, extremamente pessoal, distantede ideologias, refratrio a grupos, poderes, convenincias, meios-termos. Nada disso o prendia nem ditava sua conduta jornalstica seguia apenas sua conscincia, ao preo que fosse.

    Sempre foi assim. Conheci-o em 1956, quando fiz teste para re-visor da Folha da Manh, me da atual Folha de S. Paulo. Porestranho que parea, ele era subchefe da Diviso de Sucursais,Correspondentes e Representantes, qual a reviso era subordi-nada. E era ele quem supervisionava os testes.

    Um ms depois, chamou-me para trabalhar como redator denotcias do interior do Estado uma pedreira, j que nos obriga-

    va a tornar interessantes informaes passadas em meia dzia delinhas pelos correspondentes. Aloysio era rigorosssimo, manda-va reescrever muitas vezes a mesma notcia que tinha de sairclara, elegante, impecvel, sem gerndios.

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    Embora muito moo tinha pouco mais de 20 anos nessa po-ca , j era apontado como prodgio desde sua cidade de origem,So Jos do Rio Pardo (260 km ao norte de So Paulo)**, onde

    assombrou uma banca julgadora com seus conhecimentos sobreEuclydes da Cunha e Os Sertes na olimpada literria que se rea-lizava todos os anos em homenagem ao escritor, que viveu ali umtempo.

    Na Folha tambm era considerado um prodgio. Mrio MazzeiGuimares, ento redator-chefe, admirava-se com a qualidade doseditoriais que Aloysio produzia sobre temas do interior do Esta-

    do, revelando um conhecimento e uma maturidade que seriamsua marca pela vida afora.Depois, correu mundo, muitas redaes, voltou Folha com

    Cludio Abramo, mudou-se para o Rio, onde nos reencontramos em uma das muitas vezes na revista Viso. Samos de l porcausa de um atrito com o jovem ento ministro da Fazenda, Del-fim Neto, a quem Aloysio, como editor de economia, criticava du-ramente pela poltica de abertura desregrada das importaes epelo endividamento externo. J ento o pas sofria com essas coi-sas e Aloysio no se conformava, enfurecia-se com cada nmeroque descobria.

    Fomos, juntos, fundar uma revista econmica Fator que sdurou trs nmeros, sufocada pelo Ato Institucional no 5. Na capado primeiro nmero, uma foto do ator Joel Barcellos com a bocaentupida de dlares. Feroz, como Aloysio, que a planejara.

    Reencontramo-nos no Correio da Manh, onde fizemos juntos oDiretor Econmico, um caderno dirio, de muito xito e vida bre-ve, tais as resistncias que levantou no governo e em outras reas.

    Aloysio voltou para So Paulo, onde fez um longo priplo porredaes, ora como editor de economia, ora como diretor de re-dao. Sempre com o mesmo estilo, a mesma flama.

    Em uma de suas passagens pela Folha, travou memorvel pol-

    mica com os chamados economistas de esquerda, inconforma-dos porque em plena ditadura ele escrevia e teimava, fiel a suasinformaes e interpretaes, que a economia brasileira estava serecuperando da crise do endividamento do incio dos anos 1980.

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    At de louco foi chamado. E por escrito. O tempo provou que arazo estava com ele.

    Teve duas passagens breves por Goinia outros reencontros,

    outras tentativas de enxergar o Brasil de outras formas, de outrosngulos, outras abrangncias , como teve outras passagens poroutras redaes paulistas. E por uma coluna semanal na Folha,que marcou poca por sua coragem, independncia e lucidez apontando solitariamente desde o incio, por exemplo, os errosque vo encalacrando o atual governo federal.

    Seu testamento talvez seja o pequeno e formidvel livro sobre

    as privatizaes [O Brasil priva tizado], em que, baseado no seufantstico acervo pessoal de informaes e na prodigiosa mem-ria, dissecou os erros do processo, os favorecimentos inaceitveis,os prejuzos para o pas e para os cidados que, com seu esforo,ao longo de dcadas, construram o patrimnio alienado.

    A Fundao Csper Lbero, onde ensinava jornalismo nos lti-mos tempos para alegria de tantos jovens , em boa hora lheconcedeu um ttulo de doutor, pelo notrio saber. Era, de fato,doutor em jornalismo, doutor em economia, doutor em Brasil,doutor em dignidade.

    Far uma falta enorme. Como jornalista. Como cidado. Comopai. Como professor. Como amigo alegre que gostava de cantarnas noites bomias. Muito raramente, at voltava ao piano da ju-ventude, s vezes para acompanhar sua linda filha Beatriz, minhaafilhada querida.

    Acreditem ou no, eu lia o jornal na manh de ontem quandome assustei com um beija-flor perdido, que entrara de sbito ese debatia com os vidros da janela do meu escritrio em Goinia.Foi exatamente na hora em que o Aloysio morreu. Era ele, tenhocerteza.

    (*) Artigo publicado na Folha de S. Paulo em 22/07/00.

    (**) Aloysio Biondi nasceu em Caconde (So Paulo), mas foi cria-do desde cedo em So Jos do Rio Pardo.

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    Queremoso Brasil de volta

    A morte da alma nacionalBundas, no 13, 7 a 13/09/99

    Reverencialmente, peo licena ao mestre Celso Furtado pararepeti-lo: Nunca estivemos to distantes do pas com que sonha-mos um dia. Uma pequena frase. Capaz, porm, de detonar umturbilho de lembranas, emoes e expectativas, dos dias em queo Brasil era um pas e tinha sonhos. Um povo que sonhava virarPovo. Estudantes, intelectuais, empresrios, trabalhadores, agri-

    cultores, classe mdia envolvidos no debate pelo desenvolvimen-to, conscientes, todos, de que havia um preo a pagar, resistnciasa enfrentar. Inimigos, interesses externos a vencer. Um pas comalma, sonhos.

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    Durante 40, 45 anos, houve crises de todos os tipos. Mas haviao amanh, a promessa do amanh. A busca do amanh. Um lugarno mundo. Na dcada de 1950, com a economia resumida prati-

    camente a caf, acar, algodo e outros produtos agrcolas, o paslanou-se loucura de buscar a industrializao. Sem dlares paraimportar mquinas e equipamentos, pois os preos dos produtosagrcolas estavam de rastros no mercado mundial, estrangulandopases pobres como o Brasil. Mesmo assim, o pas ousou. Era apoca em que os intelectuais e formadores de opinio escreviamlivros, artigos, teses sobre e contra as polticas de estrangulamen-

    to que os pases ricos impunham a pases como o Brasil. Ou fa-ziam msicas, peas teatrais, filmes sobre a realidade brasileira.Reforavam a alma brasileira. O sonho realizvel. Ser que donaRuth Cardoso se lembra disso?

    Chegou a dcada de 1960 e, com ela, o golpe militar inspiradopelos Estados Unidos, desvios de rota que, no entanto, no conse-guiram enterrar de vez os sonhos de construo de um pas... Aalma nacional resistia. Veio a crise do petrleo, no comeo dosanos 1970, e o pas, que produzia 130 mil barris por dia e consu-mia 1,3 milho de barris por dia, mergulhou novamente no abis-mo da falta de dlares, na recesso, no avano da misria.

    Um pas quebrado, com total falta de dlares, mas que insis-tia em sonhar com um amanh. Em nome desse sonho, novamen-te, a populao pagou a conta. O governo contraiu dvidas fabulo-sas, criou impostos, apertou o cinto e o crnio dos brasileiros, para

    canalizar o dinheiro disponvel dos impostos ou emprstimos paramontar indstrias capazes de fornecer produtos que ainda eramimportados, de ao a alumnio, de celulose a petroqumicos, demquinas a sistemas de telecomunicaes. Substituir importaespara economizar dlares, necessrios para a compra do petrleo,ainda no descoberto em grande escala no territrio brasileiro.

    Para atender a todas essas novas indstrias, era preciso tam-

    bm construir usinas, as Itaipus, rodovias, ferrovias (o Brasil che-gou a produzir 5 mil vages por ano, com encomendas do gover-no), sistemas de telecomunicaes. Mais aperto de cinto, maisimpostos, menos dinheiro para as questes sociais, nunca esque-

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    cidas nem mesmo nos debates e escritos dos economistas ou deempresrios. Mas havia a esperana do amanh. O sonho, de quefala mestre Furtado, de um pas economicamente forte exatamente

    por dispor de todos os recursos naturais para isso, mas tambmcapaz, ao atingir esse estgio, de maior justia social, de extinoda misria. Habitado por um Povo. Orgulhoso de si. Solidrio,porque se reconhecendo no outro.

    No comeo dos anos 1990, o sonho estava ao alcance da mo, oAmanh chegava. O Brasil conquistara uma posio entre as dezmaiores economias do mundo. Melhor ainda: o Brasil nadava em

    dlares, porque era capaz de realizar exportaes muito maioresdo que as importaes. Poucos se lembram disso hoje, mas o Bra-sil tinha um dos maiores saldos comerciais positivos (exportaesmenos importaes) do mundo, na casa dos 10 bilhes a 15 bi-lhes de dlares por ano. Tinha dlares seus, no precisava maisde emprstimos ou de capital das multinacionais para realizarinvestimentos e manter a economia em expanso para criao deempregos e soluo dos problemas do seu Povo.

    Foi ontem, e est tudo to distante. A servio de outros pases, ogoverno escancarou o mercado s importaes e s multinacio-nais. Feiticeiros malditos transformaram o saldo positivo da ba-lana comercial em um rombo permanente, deram vantagensna cobrana de impostos sobre a remessa de juros e de lucros,estimulando o envio de dlares para o exterior, elevaram os jurospara cobrir os rombos criados, quebraram assim a Unio, os

    estados, os municpios. Destruram a indstria e a agricultura.Em cinco ou seis anos, clones malditos dos intelectuais de on-

    tem destruram o que havia sido construdo ao longo de dcadas.Destruram mais. Destruram o sonho, a Alma Nacional. O quesomos hoje? Um quintal dos pases ricos? No. Somos um curral.Bovinos ruminando babosamente enquanto o vizinho do lado, otrabalhador, o funcionrio pblico, o aposentado, o agricultor, o

    empresrio, todos, um a um, so arrastados para o grande mata-douro em que o pas se transformou, com suas mil formas de abatecomo o desemprego, os cortes na aposentadoria, as falsas refor-mas do funcionalismo, a falncia, as importaes. Bovinos rumi-

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    nando no curral, enquanto empresas de todos os portes soengolidas por grupos estrangeiros e at o petrleo, ou os camposmais fabulosos de petrleo do mundo, com poos capazes de pro-

    duzir 10 mil barris por dia, cada um, so entregues a preo sim-blico s multinacionais.

    Em cinco anos, o governo Fernando Henrique Cardoso no des-truiu apenas a economia nacional, tornando-a dependente do ex-terior. Seu crime mais hediondo foi destruir a Alma Nacional, osonho coletivo. Para isso, e com a ajuda dos meios de comunica-o, jogou o consumidor contra os empresrios nacionais, esses

    aproveitadores; o contribuinte contra os funcionrios pblicos,esses marajs; o pobre contra os agricultores, esses caloteiros;a opinio pblica contra os aposentados, esses vagabundos.

    No governo FHC, o brasileiro foi levado a esquecer que, em qual-quer pas do mundo, a sociedade s pode funcionar com base emobjetivos que atendam aos interesses e necessidades de todos ou, mais claramente, no se pode, por exemplo, ter uma polticade importao indiscriminada, a pretexto de beneficiar o consu-midor, sem provocar desemprego e quebra de empresas. Ou, alongo prazo, desemprego generalizado.

    Com o jogo perverso de estimular a busca de pretensas vanta-gens individuais, o governo FHC destruiu a busca de objetivos co-letivos. Destruiu a Alma Nacional, o Projeto Nacional. A violentadesnacionalizao sofrida pelo Brasil em sua economia vaieternizar a remessa de lucros, dividendos, juros para o exterior.

    Isto , vai torn-lo totalmente dependente da boa vontade dosgovernos de pases ricos em fornecer dlares e, portanto, de or-dens e autorizaes desses governos de pases ricos. Uma espciede colnia, mesmo, como alertou o economista Celso Furtado, empalestra que encerrou com sua frase, arrasadora para quem viveuo Brasil de 1950 para c: Nunca estivemos to distantes do Brasilcom que um dia sonhamos. Mesmo sem t-lo consultado a respei-

    to, uma sugesto: escreva a frase de Furtado em um pedao depapel e a releia todos os dias. Ou faa decalques com ela. Sugiraque seus amigos faam o mesmo. E comece a agir. Ainda h tem-po de ressuscitar a Alma Nacional, antes que o Brasil vire colnia.

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    O pesadelo do RealFolha de S. Paulo, 27/06/99

    A Cemig [Centrais Eltricas de Minas Gerais], estatal mineirada rea de energia, foi parcialmente privatizada, com a venda deum tero de seu capital a um grupo norte-americano. Ela teve umlucro de 390 milhes de reais no ano passado. Vai aplicar essedinheiro em projetos de expanso? No. Vai entregar nada maisnada menos de 97,5% daquele valor aos seus acionistas, sob a for-ma de dividendos. Uma deciso do grupo norte-americano que,

    apesar de possuir apenas um tero das aes da empresa, passoua tomar todas as deliberaes, graas a um acordo de acionistasadotado pelo governo FHC na privatizao de vrias estatais. Ob-viamente, o grupo norte-americano remeter sua parte para amatriz.

    A indstria Dako produzia h dcadas foges populares, de bai-xo preo, dominando esse mercado com centenas de milhares deunidades vendidas a cada ano. Foi comprada por um grande gru-po multinacional, e os foges, embora simplrrimos, sem nenhu-ma sofisticao tecnolgica (sempre usada como pretexto parajustificar a chegada de mltis e suas importaes), passaram autilizar 100% de peas importadas. As exportaes das multina-cionais da rea automobilstica caram 50% a 60% neste ano, en-quanto as exportaes do setor, no Mxico, cresceram 20% e,ateno, as exportaes das empresas automobilsticas coreanas

    para os Estados Unidos avanaram de 30% a 40%.Os casos da Cemig, da Dako, da indstria automobilstica, me-

    ros exemplos do que acontece em todas as reas da economia,mostram uma brutal realidade para a qual a sociedade brasilei-ra ainda no acordou: o Brasil j se tornou um pas invivel.Voltou a ser o mesmo pas da dcada de 1950, preso na armadi-lha do chamado estrangulamento cambial, isto , incapaz de pro-

    duzir os dlares de que precisa para pagar suas importaes edemais compromissos com o exterior. Qualquer outra avaliaodo Plano Real, a esta altura, absolutamente ociosa: o Brasil jest com o futuro comprometido. J foi colocado em um beco

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    sem sada pela poltica de terra arrasada a que se deu o nomede Plano Real.

    Sem futuro

    H cinco anos, as multinacionais instaladas no pas remetiamde 600 a 700 milhes de dolres, como lucros e dividendos, parasuas matrizes. Por ano. No ms passado, essas mesmas remessaschegaram aos 580 milhes de dolres, isto , em um nico ms,tanto quanto se mandava para o exterior em um ano. Resultado:

    as remessas chegam hoje aos 6 bilhes ou 7 bilhes de dolresanuais, ou dez vezes mais que a cifra de pocas recentes. Um saltoequivalente, de dez vezes, aconteceu com as remessas de dlarespara pagar a tecnologia comprada pelas multinacionais, quepassaram dos 160 milhes para 1,7 bilho de dolres por ano.Todos esses rombos, note-se, somente devem crescer nos prxi-mos anos, j que mal comeou, por exemplo, a remessa de lucrosdas mltis que compraram as estatais do setor de energia eltricaou telefonia...

    E j que a recesso reduziu por ora os lucros das mltis quecompraram as Dakos, as redes de supermercados, as pequenasfbricas de raes, de salsichas e outros produtos altamente sofis-ticados como esses... Enquanto economistas e lderes empresa-riais mergulhavam no falso debate em torno da ncora cambial ede juros, um fenmeno permanente, a desnacionalizao e o

    conseqente estrangulamento cambial , avanava tragicamen-te, afundando o pas em problemas insolveis. essa questo quea sociedade, lideranas polticas e empresariais precisam discutircom urgncia.

    De m os atadas

    As remessas de dlares, como visto, explodem. As importaesno caem, por causa das mltis que compram at as peas defoges populares. As exportaes no sobem, exatamente por-que as matrizes das multinacionais determinam qual a filial, de

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    que pas, vai abastecer determinada regio do mercado mundial(ao contrrio das empresas nacionais, como no caso da Coria,que defendem os interesses do seu prprio pas, isto , brigam

    para exportar porque sabem que seu pas precisa dos dlares daexportao...).

    Nunca houve um Plano, Real ou com qualquer outro nome, nogoverno FHC. Houve uma inteno de estabilizar a moeda, que deucerto at por motivos acidentais. O que houve, realmente, foi abrutal e estpida adoo do chamado modelo neoliberal, com oescancaramento da economia e a destruio de todos os mecanis-

    mos capazes de proteger a produo nacional. Nem a agriculturaescapou dessa poltica de terra arrasada, arruinando-se os agri-cultores com a extino da poltica de compra de colheitas e ga-rantia de preos mnimos. Neste exato momento, os preos dofeijo esto 60% mais baixos que no ano passado e as cotaes doarroz 15% inferiores... Nem renda agrcola, nem consumo parareduzir a recesso, como o governo e os analistas polianas pre-viam e insistem em prever... Um otimismo delirante que, segura-mente, foi uma das grandes pragas que assolaram o Brasil nosltimos anos, com previses de resultados favorveis que nuncase concretizaram, oriundas no apenas de figuras do governo comoPedro Malan, Antnio Kandir, Gustavo Franco, mas tambm delderes empresariais e polticos, absolutamente sabujos, alm ob-viamente dos auto-intitulados analistas tcnicos, tambm co-nhecidos como jornalistas chapa-rosa.

    Autnticos polianas, por convenincia ou incompetncia, quefalam em resgate da credibilidade do pas, fingindo no estarvendo que, nos emprstimos obtidos pelas empresas e pelo go-verno brasileiro nas ltimas semanas, os bancos esto cobrandoas maiores taxas de juros de todos os tempos. Segundo dadosque o prprio Banco Central divulgou esta semana, em maio es-ses emprstimos arcaram com uma sobretaxa de 7,68%, acima

    das taxas de juros do governo dos Estados Unidos. No ano passa-do, essa sobretaxa era de 3,76%. Essa duplicao o termmetroexato da desconfiana dos banqueiros em relao ao Brasil. Naltima tera-feira, a Celesc fechou um emprstimo com a taxa

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    em exorbitantes 16,5%... Onde o Brasil vai buscar dlares parapagar esses nveis de juros, sobre uma dvida de 250 bilhes dedolres? O Real foi um delrio otimista. Que vai virar um pesade-

    lo. Permanente.

    Queremos o Brasil de voltaBundas, no 28, 21/12/99 a 03/01/00

    Est todos os dias nos jornais: empresas telefnicas recompramsuas aes, energticas recompram suas aes, siderrgicas

    recompram suas aes... O que isso vai provocar na vida dos bra-sileiros comuns? O que isso vai trazer para o pas? Resposta: oatoleiro final. O extermnio do povo brasileiro. A menos, claro,que o Congresso acorde e imponha limites ao do presidenteFernando Henrique.

    Em portugus claro, qual o significado dessas recompras deaes? Como sempre, muito simples. Os grupos multinacionais,nos leiles de privatizao, na verdade compraram s 15%, 20%,30% das aes das antigas estatais, isto , passaram a ser donossomente de uma fatia de 15%, 20%, 30%. Logicamente, passa-ram a ter direito, tambm, a fatias equivalentes, de 15%, 20%,30% dos lucros que remetem, em dlares, para suas matrizes lfora.

    Agora, o que est acontecendo? Esses grupos, que compraramo direito de mandar nas estatais, esto fazendo propostas maci-

    as para comprar as aes de milhares, ou dezenas de milhares,de pequenos, mdios, grandes acionistas, isto , cidados brasi-leiros que possuam essas aes, alguns deles h muitos e muitosanos. Ento, isso: recompra, no caso, apenas uma expressotcnica, ou malandra, para dizer que a empresa, ou o grupocontrolador, est comprando de volta aes que o pblico haviaadquirido ao longo do tempo.

    Isso uma catstrofe, a mdio prazo. Um suicdio, a mdio pra-zo. No h nenhum exagero na afirmao. Basta fazer contas. preciso fazer contas. O Congresso precisa fazer contas, para tiraro pas desse caminho suicida. Veja-se bem: as remessas de lucros

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    e dividendos das multinacionais para as matrizes no passavamdos 700 milhes (com eme) de dlares, no comeo dos anos 1990.Com o incio da abertura da economia, no governo Collor, elas

    passaram para a faixa de 2,4 bilhes no comeo do mandato deFHC. Em 1997, j haviam chegado aos 7 bilhes de dlares, isto ,triplicado no governo FHC e crescido dez vezes em relao aos va-lores histricos.

    Esses nmeros em si j so alarmantes. E, o que pior, eles de-vero avanar ainda mais explosivamente daqui para a frente,puxados pelo ritmo das privatizaes, com as estatais entregues a

    grupos estrangeiros e pelo processo de desnacionalizao daeconomia em geral. As perspectivas j eram sombrias, com umasangria de bilhes de dlares todos os anos, para todo o sempre,colocando o Brasil na posio de colnia obrigada a encher os co-fres da Corte e sujeita a retaliaes, sanes quando no conse-guisse quitar os compromissos isto , sujeita a crises e recessesperidicas.

    Pois o futuro est ficando ainda mais negro. uma questo dearitmtica, como qualquer criana pode ver: se a situao j erainsustentvel com remessas de 15%, 20%, 30% dos lucros, o queacontecer com remessas de 80%, 90%, 100%, como resultado darecompra de aes nessa proporo? O governo FHC est cego.Ou no. O Congresso precisa intervir, estabelecendo limites paraessa desnacionalizao das ex-estatais.

    Alm da sangria de dlares, esse processo tem outra conseqn-

    cia trgica para o futuro do pas: por incrvel que parea, ele agra-va a j terrvel concentrao da renda, ou eterniza a pobreza e amisria no pas, impedindo tambm o crescimento econmico, acriao de empregos etc., em um crculo vicioso interminvel.Como assim? Basta olhar o que acontece nos Estados Unidos enos pases ricos em geral: milhes de famlias de classe mdia etrabalhadores possuem aes, e parte de sua renda vem dos divi-

    dendos pagos por essas empresas, ou mesmo da valorizao des-sas aes nas Bolsas. Isto , a populao compartilha os resulta-dos do funcionamento da economia, dos negcios das empresas.No custa lembrar que o surto de prosperidade dos Estados Uni-

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    dos atribudo, em grande parte, ao enriquecimento das fam-lias, nos ltimos trs anos, em funo da alta nas Bolsas, levandoo consumidor a um forte consumismo com base nessa renda

    extra.No Brasil est ocorrendo o contrrio. O povo brasileiro, os mi-

    lhes de acionistas esto sendo expulsos das empresas construdascom o trabalho nacional. Todas as fontes de produo, todas asfontes de riqueza, esto ficando nas mos de grupos multinacio-nais que, veja-se s a imensa contradio esquecida, tm mi-lhes de acionistas em seus pases.

    Tudo o que est acontecendo no Brasil, no governo FHC, exa-tamente o contrrio do que ocorre no resto do mundo. O pasest sendo literalmente escravizado pelas Cortes. O povo brasi-leiro est sendo literalmente escravizado para produzir lucros paraos povos dos pases ricos. Para no ficar nenhuma dvida sobreesse relacionamento Corte-Colnia: h trs semanas, foi instaladana Espanha uma Bolsa de Valores especial, anexa Bolsa de Va-lores tradicional. Seu objetivo? Negociar somente aes de empre-sas energticas e telefnicas cujo controle foi comprado princi-palmente por espanhis e portugueses durante o processo de pri-vatizao. um domnio ostensivo, um escarro em nossas caras:nem as aes das empresas brasileiras sero mais negociadas nasBolsas do Brasil. Tambm, pra qu? Escravo no tem dinheiro paracomprar aes, mesmo. Pedido ao Congresso Nacional, ou melhor,a Papai Noel: Queremos nosso Brasil de volta.

    Grato por me assaltaresDirio Popular, 13/03/00

    Que tal voc comprar uma rede de lanchonetes ou uma rede depostos de gasolina para pagar em dez anos, a preo de banana que o antigo dono resolveu vender porque estava, segundo as ms-

    lnguas, precisando de dinheiro? E depois, da a dois ou trs anos,o vendedor, to bonzinho, to bonzinho, sem ter recebido aindaas prestaes de oito ou sete anos, oferecer dinheiro emprestado,muito dinheiro, a juros baixssimos, de pai para filho, para voc

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    comprar concorrentes e ficar sozinho no mercado? Absurdo? Afi-nal, o vendedor no estava quebrado? No ria. Chore. isso queest acontecendo no Brasil, com a venda de empresas estatais a

    grupos privilegiados.Nos leiles de privatizao, o prprio governo, por meio do banco

    dos grampos, o BNDES, vendeu moedas podres (ttulos antigosdo governo) aos compradores, para eles entregarem de volta aoTesouro, como pagamento pelas estatais, com um detalhe: asmoedas podres podiam ser pagas em dez anos, a juros baixssimos.

    Um negcio da China, ou um assalto ao patrimnio do povo bra-

    sileiro, com empresrios e banqueiros recebendo, de graa, em-presas que valiam bilhes de reais. Mas as negociatas no parame no pararam por a at hoje. O mesmo BNDES, isto , o governo,a quem os compradores ficaram devendo rios de dinheiro, aca-ba emprestando, aos mesmos devedores, outros rios de dinheiro,para eles investirem, ampliarem os negcios.

    Quer dizer: o governo diz que o Tesouro est quebrado, usa essadesculpa para doar as estatais e depois arruma dinheiro para oscompradores. Ou seja, a mesma coisa que voc, depois de com-prar as lanchonetes e os postos de gasolina, ainda receber a visitado vendedor que, to otrio, to otrio, vem oferecer novo em-prstimo para ampliar os negcios...

    Mas as negociatas no param por a. Passados uns dois ou trsanos, isto , apesar de haver prestaes de mais sete ou oito anosa serem pagas, o governo, por meio do mesmo BNDES, oferece ou-

    tros rios de dinheiro para os grupos que viraram donos das es-tatais. Para qu? Agora, para eles comprarem empresas menores,ou formarem cartis em alguns setores. Para no parecer escan-daloso demais, o BNDES inventa um monte de desculpas: diz que preciso reorganizar, por exemplo, os setores de petroqumica,papel, celulose, siderurgia, para criar empresas de grande porteexigidas pela globalizao.

    a negociata da negociata da negociata, com os mesmos gru-pos de sempre, os donos do pas, recebendo estatais de graa, re-cebendo emprstimos para ampli-las, recebendo emprstimospara virar cartis, sempre devendo rios de dinheiro e beneficiados

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    gostosamente com juros muito mais baixos do que os pagos pelosmilhes de empresrios comuns, com a diferena paga pelo Te-souro, isto , por toda a sociedade.

    A opinio pblica e o Congresso continuam passivos diante des-sas aberraes. S falta dizerem ao governo FHC: Obrigado porme assaltares.

    A Vale do Rio Doce, retrato de um pasBundas, no 41, 28/03 a 03/04/00

    Classe mdia e trabalhadores pagam at 27,5% de Imposto deRenda sobre tudo o que ganham isto , sem o direito de des-contar as despesas feitas para trabalhar, ter renda. Abatimen-tos? S ridculos valores para mensalidades escolares, despesasmdicas, dependentes. A Vale do Rio Doce, ex-estatal portento-sa, dona de outras 30 empresas das reas de minerao, nave-gao, portos, celulose, madeira, doada por FHC a um grupo lide-rado pelo sr. Steinbruck, teve um lucro de 1,25 bilho de reais em1999, para um faturamento de 4,4 bilhes de reais. Quanto vaipagar de Imposto de Renda? Segure-se na cadeira: mseros 5 (c-i-n-c-o) milhes de reais. Ou menos de 0,5% do lucro, ou 0,125%do faturamento...

    Como isso possvel? O secretrio da Receita Federal, EverardoMaciel, j havia dado uma pista sobre aberraes como essa, aodepor no Congresso Nacional em meados do ano passado, na CPI

    sobre o socorro do Banco Central a bancos quebrados, na crise doReal em janeiro de 1999. Maciel, to srio que vivem pedindo suademisso, apontou distores na cobrana dos impostos no Bra-sil, fazendo revelaes inacreditveis, que em outros pases der-rubariam governos.

    Primeiro: foi ele quem mostrou que o governo estava perdendobilhes de reais, em impostos, com as privatizaes. Como? Por-

    que o gio, ou diferena entre o preo pedido pelo governo, nosleiles, e o preo oferecido pelo comprador, devolvido peloTesouro, sob a forma de abatimento no Imposto de Renda. Se-gundo: Maciel revelou ao Congresso que metade das 500 maiores

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    empresas do Brasil no pagam um tosto de Imposto de Renda, ea outra metade paga em mdia apenas 5%. Por qu? Sonegao?No. H brechas na lei, disse ele, de forma diplomtica, mas

    que na verdade so privilgios e vantagens oferecidos pelo gover-no FHC s grandes empresas e aos bancos, para reduzir o impostodevido. O balano da Vale, com 0,5% de Imposto de Renda sobreo lucro, um retrato do Brasil de FHC/Malan, que aumenta im-postos e corta verbas para as reas sociais em nome do equilbriodo Tesouro e abre buracos no Tesouro para favorecer os gruposde elite. Mas ele mostra muito, muito mais, sobre este Brasil.

    Mentiras e despudor

    Ele mostra, por exemplo, que realmente as elites perderam qual-quer trao de vergonha em matria de mentir opinio pblica e de assaltar o cidado brasileiro. Na poca da publicao do ba-lano, os donos da Vale divulgaram anncio de pgina inteiranos jornais, alardeando novos recordes, e surgiram entrevistasde seus diretores e editoriais exaltando a eficincia da admi-nistrao privada e as vantagens da privatizao. tudo men-tira descarada, pois a Vale andou de marcha r em 1999 edeveria ser obrigada a publicar outro anncio, se retratando, porimposio do Conar [Conselho Nacional de Auto-Regulamenta-o Publicitria], que cuida de tica em propaganda, ou da CVM[Comisso de Valores Mobilirios], que deveria evitar propagan-

    da enganosa de empresas com aes em Bolsas.Os recuos da Vale so mostrados no prprio balano: houve

    queda em todas as atividades da Vale e coligadas, a saber, venda eexportao de minrios, transporte ferrovirio, terminais portu-rios, transporte martimo (excees, segundo o balano destaca:papel e celulose, siderurgia e alumnio). O anncio diz a verdadeem um caso, isto , quando aponta que o lucro de 1,25 bilho

    recorde apesar da queda, que ele omite, nas operaes. Explica-o para o aparente paradoxo: eficincia administrativa? Nada aver. Basicamente, o lucro da Vale foi provocado por uma coisamuito diferente: a desvalorizao do Real no comeo de 1999, que

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    aumentou em mais 50% a quantidade de reais recebida na trocade cada dlar obtido nas exportaes de minrios que na verda-de tambm caram, de 2,7 bilhes para 2,3 bilhes de dlares.

    Mas houve outros macetes, tpicos do Brasil de FHC, que tambmincharam os lucros da Vale. Ela ganhou 350 milhes de reais por-que previu a queda do real e especulou com o dlar (operaes dehedge). Alm disso, ela e algumas de suas coligadas receberam devolta nada menos que 340 milhes de reais do... Imposto de Renda,graas principalmente a devolues concedidas como incentivopara a compra ou fuso de empresas, inclusive nas privatizaes

    (outra brecha qual Everardo Maciel fez referncia).Ah, sim, o grupo Vale do Rio Doce acumulou emprstimos aquidentro e no exterior no total equivalente de 4,4 bilhes de reais,dos quais 1,05 bilho l fora com o aval do Tesouro (que, segundoo governo FHC, no tinha condies de levantar emprstimos noexterior, e, no entanto, aceito como fiador dos novos donos-sem-dinheiro-e-sem-pudor da Vale). Desses emprstimos, diz obalano, apenas 250 milhes de reais arcaram com taxas de jurossuperiores a 11% ao ano o que significa que os lucros da Valeesto sendo engordados, tambm, com juros baixos (as empresasem geral pagam 40% ao ano no Brasil) no exterior, graas ao avaldo governo, ou aqui dentro, graas a emprstimos de pai para fi-lho do banco estatal BNDES.

    Com lucros to fantsticos, os novos donos da Vale segui-ram a tradio da empresa poca em que era estatal, realizan-

    do investimentos para reforar estrategicamente sua posio nomercado mundial, inclusive com pesquisas de novas jazidas ou para melhoria dos servios ferrovirios, porturio, de navega-o martima, que tambm lhes foram doados na privatizao?No. A Vale cortou seus investimentos em 25%, de 420 milhespara 350 milhes de reais (a empresa, sempre marotamente, alar-deia um investimento recorde de l bilho porm, para este ano...).

    Os gastos com pesquisa ficaram em ridculos 46 milhes de reais.O que os donos da Vale fizeram com o dinheiro do lucro? Em-bolsaram nada menos de 70%, algo como 850 milhes de reais,pagos a eles mesmos, como juros sobre o capital prprio que

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    tambm outra brecha, tem incentivos do Imposto deRenda.

    O balano da Companhia Vale do Rio Doce mostra recuos da

    empresa e progresso financeiro para os donos custa detodos os brasileiros, de quem, no final das contas, saem o dinhei-ro do Imposto de Renda, a diferena de juros do BNDES, o custo dadesvalorizao do Real. Um retrato da privatizao e da polticatributria e de crdito, favorveis aos grandes grupos, do governoFHC. E o Congresso, hein?

    Que no se repita em 2000Dirio Popular, 02/01/00

    Ironias da Histria. O discurso do presidente da Repblica navirada do milnio procura exaltar os 500 anos do Brasil, desta-cando as conquistas do povo brasileiro ao longo dos tempos. Eleaponta, como motivo de orgulho, o fato de o Brasil ter-se destaca-do, no mundo, como criador de tecnologia para a fabricao deavies, exportados para todos os pases, e tambm por ocupar aliderana, em todo o mundo, na criao de tcnicas e equipamen-tos para pesquisar e explorar petrleo no fundo do mar. Pareceat mais uma das brincadeiras do bem-humorado presidente bra-sileiro. Por qu? Nos dois casos, a faanha foi executada por duasempresas estatais, a Petrobrs e a Embraer, ao longo de dcadas,com tcnicos nacionais e recursos financeiros nem sempre fceis

    de obter (o BNDES, que hoje empresta para multinacionais, h anosno realiza emprstimos a estatais).

    Assim, no mnimo uma contradio engraada, se no fossetrgica, que seus mritos sejam reconhecidos (mas sem citar seusnomes) exatamente por quem vem destruindo as empresas esta-tais brasileiras. Um presidente da Repblica que, para implan-tar a privatizao desejada pelos pases ricos e seus banqueiros e

    multinacionais, patrocinou ao longo dos ltimos quatro anos umaintensa campanha de manipulao da opinio pblica, com a re-petio de um sem-nmero de mentiras para desmoralizar asestatais...

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    A ironia ainda maior porque, neste exato momento, a Embraer,que j foi privatizada, corre o risco de ser entregue a grupos fran-ceses, provocando reaes e crise na Aeronutica. Da mesma for-

    ma que, segundo entrevistas recentes do presidente da AgnciaNacional do Petrleo e genro do presidente FHC, David Zylbersz-tajn, a destruio da Petrobrs vai ser acelerada j neste ms dejaneiro. Aps entregar a multinacionais campos fabulosos de pe-trleo descobertos pela Petrobrs, o governo FHC vai encolher aempresa, obrigando-a a vender ou ceder refinarias, postos de dis-tribuio, gasodutos e oleodutos.

    Um plano antinacional, do qual os brasileiros certamente notm motivos para se orgulhar nos 500 anos do pas. Alis, o presi-dente da Repblica destaca tambm que o Brasil foi um dos cincopases que apresentaram as maiores taxas de crescimento econ-mico nos ltimos 50 anos. Decididamente, ele estava disposto acontar anedotas para tentar fazer o brasileiro rir na virada domilnio. Ao falar nos ltimos 50 anos, Fernando Henrique Car-doso, estrategicamente, evitou falar nos ltimos cinco anos, aque-les de seu governo. Cinco anos em que a indstria brasileira, porcausa do escancaramento do mercado, regrediu tanto, tanto, quevrios setores cortaram a produo em 30% a 50%. E o setor in-dustrial como um todo cortou o nmero de trabalhadores em nadamenos de um tero, de 6,6 milhes para 4,5 milhes. O Brasil deque FHC falou no existe mais. Era um pas com um projeto nacio-nal. Foi assassinado pelo socilogo amigo dos pases ricos.

    A bomba do anoDirio Popular, 18/01/00

    No se espante. As afirmaes abaixo so do ex-ministro LuizCarlos Bresser Pereira, em artigo-bomba publicado domingo: Escancaramento do mercado No percebemos que o libera-

    lismo econmico muito bonito em teoria, mas que, na prtica,nenhum pas desenvolvido o pratica integralmente. Desnacionalizao Os pases ricos defendem o neoliberalis-mo, mas eles no esto dispostos a ver suas empresas e seus ban-

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    cos serem desnacionalizados de forma vexatria (sic, sic, sic) comoaconteceu com o Brasil... Nacionalismo Os franceses defendem suas empresas, os in-

    gleses defendem suas empresas, at os americanos, que em prin-cpio no precisariam, defendem suas empresas. No impedemsistematicamente que estrangeiros as comprem, mas tambm noabrem suas portas... Entreguismo Enquanto isso, ns permitimos a desnacionali-zao de grandes empresas brasileiras e de grandes bancos. Deci-didamente, enlouquecemos (sic, sic, sic).

    Entreguistas O princpio seguido pelos pases ricos nessamatria simples: faa como eu digo, no como eu fao. E o prin-cpio adotado por nossas elites igualmente simples: Fao comoeles dizem que eu devo fazer, no como eles fazem.

    Espantoso, no? Amigo pessoal do presidente da Repblica,Bresser Pereira confirma, em linguagem indignada, todas as crti-cas que as oposies tm apresentado, nos ltimos anos, ao go-verno FHC. Ajudado pelos deformadores de opinio, veculos e jor-nalistas, o governo despejou uma enxurrada de mentiras sobre asociedade. Fez uma verdadeira lavagem cerebral para justificaro escancaramento s importaes, a destruio de milhes deempregos, a quebra de milhares de empresas, a dvida espantosado Tesouro, a falncia das prefeituras e estados, o assalto contraos aposentados e funcionrios pblicos, as privatizaes vergo-nhosas, s claras ou s escondidas, de empresas gigantescas como

    a Telebrs, a Vale do Rio Doce, a Cesp paulista e a Petrobrs, emfranco esquartejamento. Agora um ex-ministro diz que nadadisso acontece nos pases ricos. Eles defendem seus empresrios,seus trabalhadores, seus interesses nacionais. Decididamente,enlouquecemos, brada Bresser.

    Como explicar as crticas violentas partidas de um cidado quefoi cmplice de todo esse processo de destruio da economia bra-

    sileira e do prprio pas chamado Brasil, transformado em colniade segunda classe de franceses, espanhis, portugueses e norte-americanos? O artigo, sob o ttulo Banespa e interesse nacional(Folha de S. Paulo, domingo), aparentemente reflete o desagrado

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    dos banqueiros brasileiros diante das facilidades que o governoFHC vem criando para entregar o banco paulista a banqueirosinternacionais. ingenuidade, porm, acreditar que Bresser est

    meramente fazendo o jogo dos banqueiros brasileiros (de resto,tambm entreguistas). O artigo, de leitura obrigatria, um ver-dadeiro manifesto contra o assalto internacional ao Brasil, coman-dado pelo governo FHC. Seguramente, Bresser no est falandosozinho. apenas o porta-voz. H fumaa no ar.

    A hora do Congresso

    Dirio Popular, 24/04/00

    O governo dos Estados Unidos, h poucos dias, enviou emiss-rios ao Mxico, a pedido de empresas norte-americanas. Motivo:o governo mexicano privatizou apenas parcialmente os serviostelefnicos no pas, e as chamadas interurbanas e internacionaiscontinuaram a ser monoplio da Telmex, a telefnica estatal del, equivalente Telebrs brasileira, e que continua a dominar 70%do mercado. O que desejam as empresas norte-americanas? Que-rem maiores facilidades e menores preos para usar as redes deservios locais.

    H poucas semanas, foi a vez de a Unio Europia ter um vio-lento duelo com os Estados Unidos, na reunio de cpula dospases ricos, com o governo Clinton esperneando contra os su-cessivos adiamentos adotados pelos governos europeus na pol-

    tica de privatizao e abertura de mercados de dois setores: trans-portes martimos e areos, e energia eltrica. A reunio termi-nou sem que Clinton arrancasse nenhum compromisso concre-to por parte de seus aliados ricos. Da mesma forma que, em ja-neiro, os prprios pases europeus protestavam contra a Frana,que vem retardando a privatizao do setor de energia eltrica,dominado pela estatal EDF, mantendo as proibies para a atua-

    o at mesmo das empresas energticas dos pases com os quaisela busca a formao de um mercado nico, a Unio Europia, echega a ter uma moeda nica, o euro. O que esse noticirio todomostra? Como voc j deve ter concludo, mostra que o Brasil

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    caiu, ou foi jogado, em um autntico conto-do-vigrio, pelo go-verno FHC.

    A privatizao indiscriminada de setores como energia e teleco-

    municaes no ocorreu no resto do mundo afora nem mesmono Mxico, apesar de suas fortes ligaes com os Estados Unidos.Aqui, o patrimnio acumulado durante dcadas, ou sculos, custado povo brasileiro, foi entregue a preos vergonhosamente baixosprincipalmente a multinacionais dos pases ricos, que continuama privilegiar suas estatais ou a manter seus mercados fechados agrupos de outros pases. Um novo lance desse verdadeiro assalto

    contra o Brasil e o povo brasileiro est sendo confirmado para oms de junho, com a fixao da data para novos leiles destinadosa vender, a preo de banana, reas fantsticas de produo depetrleo descobertas pela Petrobrs, principalmente no litoral, nachamada plataforma submarina.

    O comportamento dos outros pases exige a ateno do Con-gresso Nacional, que, nos ltimos anos, de forma desavisada, deucarta branca ao governo FHC para as privatizaes, enganadocom as afirmaes de que essa era uma tendncia mundial. Aindah tempo para impedir novos negcios da China. Melhor aindaseria a criao de uma CPI [Comisso Parlamentar de Inqurito]para investigar se as privatizaes feitas no foram um jogo decartas marcadas, com operaes combinadas h muito tempo,como ficou evidente com a total entrega, pelo BNDES, do controleda Ligth EDF francesa e da Eletropaulo AES norte-americana,

    h poucas semanas. Esse tipo de combinao, se ocorreu, tem umnome.

    O Congresso e os palhaosDirio Popular, 03/10/99

    Eles so mesmo umas gracinhas. Olhe bem: agora voc v os

    homens do FMI, do Banco Mundial, do governo Clinton, todos adizer que tudo que eles mandaram governos de pases submissoscomo o do Brasil fazerem com sua economia estava errado. Vocno est morrendo de rir com essa anedota histrica, que foi a tal

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    da globalizao e da abertura de mercado? Ahhh, voc entono tem senso de humor.

    Olha o que diz o economista John Williamson, considerado o

    pai do plano para adotar o tal modelo neoliberal na AmricaLatina, um programa tambm conhecido como Consenso deWashington. As reformas que tm roubado os direitos de mi-lhes de trabalhadores eram mesmo necessrias? Ahhh, diz o an-jinho Williamson em entrevista ao jornalista Fernando Canzian,eu nunca pretendi [...] que os pases fizessem reformas por todosos lados. Privatizaes? Ahhh, seus benefcios dependem muito

    da maneira como elas so realizadas. Muitas foram altamentebenficas, outras nem tanto. Liberdade para as multinacionais eos capitais estrangeiros? Ateno, ateno ao que Williamson diz:essa liberdade para os capitais tambm foi prematura, com a atra-o de fortes investimentos de curto prazo. Essas duas coisas emparticular esto por trs da crise que o Brasil enfrenta hoje. No de matar de rir? No. Voc tem razo: de chorar de raiva. Essapoltica destruiu o pas chamado Brasil. Criou milhes de desem-pregados, quebrou milhares de empresas, destruiu a agricultura,aumentou a fome e a mortalidade. Quebrou o Tesouro. Pior ain-da: desnacionalizou completamente a economia, comprometen-do o futuro, com a venda de empresas pblicas ou privadas a gru-pos estrangeiros a preos de banana. Uma desnacionalizao quecompromete o prprio futuro, repita-se, porque significa quemultinacionais passaro a remeter bilhes de dlares para suas

    matrizes para todo o sempre, sangrando o povo brasileiro. Fo-mos tratados como palhaos, imbecis que soltavam foguetes parapolticas que nos transformavam em colnias. E continuamos sen-do tratados como palhaos, imbecis pelos Williamsons, Camdes-sus, Clintons da vida, quando eles debochadamente dizem queforam mal entendidos, o ritmo podia ser outro, as reformas deve-riam ser mais graduais, as privatizaes mais bem pensadas. Es-

    to nos fazendo de palhaos, sim, assumindo ares de anjo.Ora, ao longo de todos os ltimos anos, FMI, Banco Mundial,

    governo Clinton, banqueiros, economistas famosos ridiculariza-vam as crticas das oposies e batiam palmas, diziam maravilhas

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    das decises do governo FHC. Estavam por trs delas. Agora quecolocaram o Brasil de quatro, fingem que no tm nada com isso?Esto debochando. uma nova enganao, para oferecer ajuda

    e roubar o pouco que restou a este pas. hora de o CongressoNacional impedir nova aliana entre o governo FHC e os assaltan-tes internacionais. Queremos o Brasil de volta.

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    O petrleo deles

    Voc no acha errado?Dirio Popular, 20/01/00

    Voc v todos os dias, nos jornais e na TV, manchetes sobre asso-ciaes entre gigantescas multinacionais, que se juntam ou se fun-dem em uma nica empresa, que vira uma das maiores do mundono setor, ou uma gigante de tantos e tantos bilhes de dlares,certo? Trata-se de uma tendncia mundial, dizem os analistas. Coma globalizao, com a informtica, os negcios hoje so feitos em

    todas as partes do mundo, exigindo empresas tambm gigantes-cas para vencer a concorrncia, explicam os mesmos analistas.

    Nenhum setor tem escapado dessas fuses ou associaes. Comovoc tem visto, elas so anunciadas, todos os dias, juntando ban-

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    cos, laboratrios farmacuticos, empresas de informtica, telef-nicas ou companhias petrolferas. A tendncia mundial , por-tanto, a formao de empresas gigantescas.

    No Brasil, o prprio governo FHC tem permitido que multina-cionais comprem bancos e empresas brasileiras exatamente comesse argumento: o caminho para enfrentar a concorrncia mun-dial. Por isso mesmo, o que voc acha da notcia de que o governoFHC vai forar a Petrobrs a vender suas refinarias, gasodutos eoleodutos, bem como seus postos de gasolina, a grupos privados,isto , s multinacionais? Ou melhor, o que voc acha da desculpa

    que o governo FHC est usando para esse desmonte da Petrobrs?Qual a desculpa? Por incrvel que parea, o presidente da Agn-cia Nacional de Petrleo, o genro de FHC, David Zylbersztajn, dizque a Petrobrs grande demais, precisa abrir mo de uma par-te de seus negcios.

    Voc no acha que isso uma contradio total com o que estocorrendo no resto do mundo, ou, como visto, tambm no Bra-sil? Por que o governo faz isso, tenta reduzir a Petrobrs, umaempresa que se tornou gigantesca graas a bilhes e bilhes dereais de investimentos realizados com o dinheiro dos trabalha-dores, da classe mdia, dos empresrios e dos agricultores bra-sileiros?

    Preste ateno, muita ateno: esquea se voc simpatiza ou nocom as empresas estatais, se voc simpatiza ou no com aPetrobrs. O que est sendo, mais uma vez, dado de presente a

    grupos estrangeiros o dinheiro, seu e de 160 milhes de brasilei-ros, o patrimnio, seu e de 160 milhes de brasileiros, umaverdadeira mina de ouro que pertence a voc e a 160 milhes debrasileiros e que a Petrobrs apenas administra.

    O senhor Zylbersztajn diz que preciso reduzir o monoplioda Petrobrs, criar concorrncia. Diante da tendncia mundialde gigantismo, o argumento uma grande mentira. Mas, alm

    disso, o mercado brasileiro est aberto para as multinacionais ougrupos brasileiros explorarem o petrleo, em todas as etapas. Elesque desembolsem bilhes para construir refinarias, oleodutos,gasodutos, ou descobrir petrleo.

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    Voc acha certo eles ganharem de presente, a preo de banana,tudo o que foi feito ao longo de dcadas com o dinheiro de gera-es de brasileiros? O que o Congresso deve fazer?

    O petrleo delesDirio Popular, 17/02/00

    O Brasil est gastando mais algumas centenas de milhes dedlares, todos os meses, por causa da disparada dos preos dopetrleo no mercado mundial. Explicao: o pas consome 1,7

    milho de barris por dia, sob a forma de gasolina e outros com-bustveis, mas a produo da Petrobrs, embora venha crescen-do at 10% ao ano, ainda est na faixa de 1,2 milho de barrispor dia. Cria-se, assim, a necessidade de importar a diferenade 500 mil barris por dia a preos que aumentam o rombo dedlares.

    Agora, ateno: o governo e alguns de seus aliados esto apro-veitando esse novo problema para, mais uma vez, defender a ado-o de medidas que so um verdadeiro assalto contra o povo bra-sileiro. Como sempre, seus argumentos so mentiras incrveis. Empoucas palavras, como voc j deve ter visto, o assalto em anda-mento assim: Descobertas O governo confessa que a Petrobrs j descobriu,ao longo de anos e anos, jazidas (reservas) fantsticas de petr-leo, da ordem de bilhes e bilhes de barris, principalmente no

    fundo do mar (plataforma submarina). Dinheiro Agora, diz o governo, h necessidade de muito di-nheiro, bilhes de reais, para comprar equipamentos e perfuraros poos para extrair o petrleo descoberto. Pressa Segundo eles, a Petrobrs no teria esses recursos, e opas tem pressa, precisa aumentar a produo de petrleo rapida-mente, para evitar os gastos de dlares com a importao. A solu-

    o? Aceitar scios para a Petrobrs, na explorao de campospetrolferos e outras atividades. E pior ainda: vender em leiles,principalmente s multinacionais, reas imensas onde a Petrobrsdescobriu petrleo.

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    Na verdade, o governo FHC est usando a nova crise do petrleopara enganar a opinio pblica. Usando a desculpa da pressapara executar um assalto histrico contra o povo brasileiro.

    Nesse assalto, governo e aliados dizem at que a Petrobrs culpada de o Brasil depender de petrleo importado, porque noteve competncia para produzir o suficiente para atender ao con-sumo. muito cinismo: todos estes anos, o governo FHC, ao fazercortes no oramento, proibiu a Petrobrs de investir mais de 2,5bilhes de reais na compra dos equipamentos para abrir os poose produzir o petrleo.

    Enquanto isso, o mesmo governo FHC mandava a Telebrs des-pejar 7,5 bilhes de dolres por ano, em 1996 e 1997, ou 15 bi-lhes de dolres em apenas dois anos, na ampliao das redes esistemas de telefones do pas. O triplo dos gastos de 5 bilhesde reais permitidos Petrobrs, roubados dos contribuintes, poiso governo FHC j estava preparando a privatizao das empre-sas telefnicas, e gastou aquela dinheirama para entregar tudopraticamente pronto, com o nosso dinheiro, para os compra-dores faturarem. Se o Brasil hoje est importando petrleo, aculpa no da Petrobrs. do governo FHC e seus crimes delesa-ptria.

    Depois do petrleo, o dilvioCaros Am igos, no 30, set. 1999

    Em meados de agosto [de 1999], quando o real j havia comea-do a despencar outra vez, um grande banco internacional, o INGBarings, divulgou relatrio aconselhando seus clientes investido-res a venderem os ttulos do governo e de empresas brasileiras.Motivo: o risco de calote, j que a dvida do Tesouro passa dos400 bilhes de reais e, como os juros aqui dentro esto (estavam)na casa dos 22%, isso significa uma carga de juros de uns 90 bi-

    lhes a 100 bilhes de reais por ano. Ou, arredondando, uns 10bilhes de reais por ms. Impossvel pagar. Tudo o que o governofaz emitir papagaios novos, isto , apenas aumenta a dvida.Explosivamente.

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    A iniciativa agressiva do Barings escondida pela imprensaptria, como sempre apenas tornou pblica a desconfiana queos banqueiros internacionais continuaram a alimentar em rela-

    o ao Brasil. Desmentindo totalmente a famosa reconquista dacredibilidade internacional alardeada pelo governo e seus porta-vozes, no primeiro semestre do ano os bancos internacionais em-prestaram apenas 3,5 bilhes de dlares a empresas brasileiras(isto , as nacionais e tambm as multinacionais). Ou, ateno,cinco vezes menos que os 17,5 bilhes de dlares concedidos emigual perodo de 1998.

    Esses dados e fatos ressuscitam a pergunta: por que o FMI e Clintoninsistem em ser tolerantes com o Brasil, mantendo polticas de apoioao pas, mesmo quando evidente que a situao econmica conti-nua em franca deteriorao e sem possibilidade de reverso (nin-gum consegue pagar juros de 10 bilhes de reais por ms)?

    A nica resposta possvel continua a mesma, a saber: FMI e Es-tados Unidos esto apenas esticando a corda do governo FHC, ten-tando adiar o ponto de ruptura que fortaleceria a oposio, comum objetivo: conseguir que, antes do dilvio, novas privatizaesinsensatas sejam feitas. Ou, mais precisamente, que haja novasdesnacionalizaes nos setores de explorao do petrleo e gera-o de energia eltrica (ateno, repetindo: o governo dos Esta-dos Unidos no vendeu suas empresas de energia eltrica, ao con-trrio do que se pensa).

    Para quem torce o nariz a essa hiptese, classificando-a de de-

    masiado fantasiosa: o governo FHC, como quem no quer nada, janunciou uma nova rodada de leiles para vender as reas doterritrio nacional em que a Petrobrs descobriu jazidas fabulo-sas de petrleo. O novo leilo est programado para daqui a pou-co, outubro [de 1999] e inclui tambm os campos de petrleosubmarinos, o que no estava previsto.

    Vergonha vergonhosa

    O brasileiro tem vergonha de parecer ufanista, na base do por-que-me-orgulho-do-meu-pas. Talvez por isso o brasileiro no te-

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    nha colocado na cabea, at hoje, que o Brasil tem realmente oscampos de petrleo mais fantsticos do mundo. Parece vergonhosofalar nisso. Na plataforma submarina, no fundo do mar, h jazi-

    das descobertas pela Petrobrs em fase de explorao e que tmpoos capazes de produzir 10 mil barris por dia. Cada poo. umnmero fantstico, sim, um recorde mundial, sim, e que somen-te encontra concorrentes, com poos capazes de produzir 7 mil, 8mil barris por dia, no Ir, no Kuwait, no Iraque... O que significam10 mil barris por dia? A 20 dlares o barril, isso significa ofaturamento de 200 mil dlares, em um nico poo. Em um dia.

    Ou 6 milhes de dlares por ms. Ou 70 milhes de dlares porano. Por poo. Uma das jazidas da Petrobrs na bacia de Campos,estado do Rio, tem 25 poos funcionando, o que significa que eles,multiplicados pelos 70 milhes de dlares faturados em cada poo,rendem 1,75 bilho (bilho, com a letra b, por ano). Ou, para ar-redondar, 2 bilhes de dlares por ano. Ou, ainda, o equivalente a4 bilhes de reais por ano.

    Respire fundo agora: so esses campos de petrleo absoluta-mente fantsticos, os mais produtivos do mundo, que o governoFHC j comeou a doar s multinacionais, com a ajuda da impren-sa. No primeiro leilo, realizado h poucas semanas, o presidenteda Agncia Nacional de Petrleo do governo FHC, David Zylbersz-tajn, teve a brbara coragem (ou outro nome qualquer) de pedirum preo simblico de 50 mil a 150 mil ( mil, com a letraeme, mesmo) reais s compradoras dessas reas.

    O governo usou uma desculpa para tentar justificar esses pre-os srdidos: o mercado mundial estaria em baixa, com superofertade petrleo. Acontece que desde janeiro os preos do petrleo du-plicaram d-u-p-l-i-c-a-r-a-m de 10 dlares para 20 dlares obarril, fenmeno que merecia manchetes e que nem sequer foi no-ticiado ao longo de meses pela grande imprensa (faa voc mes-mo um teste, com seus amigos e sua famlia: verifique quantos

    ficaram sabendo dessa duplicao).A verdade foi escondida para que a sociedade no discutisse os

    preos pedidos pelo governo ou, o que seria mais importanteainda, discutisse a prpria poltica de privatizao do petrleo

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    nacional. Mais claramente: se as jazidas so as mais fantsticasdo mundo, se os lucros que elas vo proporcionar so fabulosos,por que o governo FHC no vende aes da Petrobrs a milhes de

    brasileiros, juntando-se dinheiro para acelerar as exploraes egerar dlares com a exportao de petrleo? Qual o problema?Clinton e o FMI no deixam?

    Ah, sim: no primeiro leilo, algumas jazidas foram compradaspor 150 milhes de reais, isto , mil vezes o preo de 150 mil reaispedido pelo governo. A imprensa apresentou esse resultado comoalgo fantstico. No . Continua a ser ninharia. Esmola para povo

    ndio. Basta ver que esses campos petrolferos podem faturar 2bilhes de dlares, ou 4 bilhes de reais, por ano. Em um ano.Contra 150 milhes de reais. Uma nica vez.

    As oposies precisam mobilizar a sociedade brasileira contra onovo assalto ao petrleo nacional programado pelo governo FHC,por Clinton, pelo FMI. Os nmeros, escandalosamente denuncia-dores, esto a.

    PS O presidente FHC diz que a economia est estvel, o IBGEdiz que o PIB est estvel... A indstria paulista j havia recuado7% no semestre e desabou 15% em julho na comparao com1998. Setores com maior queda? Telecomunicaes e equipa-mentos para energia eltrica. Isto , as multinacionais com-pradoras das antigas estatais continuam a importar tudo. De-sempregam, aqui dentro. E continuam a torrar dlares, afun-

    dando ainda mais o Brasil. A desnacionalizao levou o Brasilde volta ao passado. Voltou a ser uma republiqueta dependen-te. Ou colnia?

    A Mega-Mega Sena do petrleo. Roubada.Caros Am igos, no 36, mar. 2000

    Nunca demais repetir: o brasileiro ficou bilionrio, outrilionrio, e no sabe. No exagero, no. Em fevereiro do anopassado, o campo de Marlim, explorado pela Petrobrs na baciade Campos, produzia 200 mil barris de petrleo. Por dia. Um ni-

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    co campo. Agora, em janeiro de 2000, o mesmo campo produziu400 mil barris por dia.

    Qual o faturamento da Petrobrs, do governo brasileiro, com

    essa produo fantstica? fcil fazer as contas: 400 mil barrispor dia significam 12 milhes de barris por ms, ou algo como 150milhes de barris por ano. Ao preo atual de 30 dlares o barril,so 4,5 bilhes (com a letra b) de dlares por ano, ou 9 bilhes dereais por ano. Mesmo que o preo atual, que est exagerado, ve-nha a cair para 25 dlares o barril, o faturamento chegar a 3,75bilhes de dlares, ou 7,5 bilhes de reais.

    Cifras fantsticas que vo ser duplicadas em poucos meses, poisos estudos da Petrobrs mostraram que as reservas da regio per-mitem dobrar o nmero de poos perfurados. Sero, portanto, uns18 bilhes de reais de faturamento por ano e com uma margemde lucro fantstica. Por qu? Os poos da plataforma brasileiratm uma produo tambm espantosa, igual obtida nos camposdo Ir, do Iraque, da Arbia Saudita, com 7 mil a 10 mil barrisproduzidos por dia. Em cada poo. Assim, mesmo calculando to-dos os investimentos feitos, o custo de produo de cada barrilno passa de 2,5 a 3 dlares, o que significa um lucro de 27 dla-res por barril, ou 1.000%, isto , dez vezes o custo, por barril...

    Somente nesse campo de Marlim, portanto, o povo brasileiropode faturar 18 bilhes de reais, o equivalente a um ms e meio daarrecadao federal. E h muitos outros campos de petrleo nolitoral brasileiro, j descobertos pela Petrobrs, a serem explora-

    dos. Alguma dvida diante da afirmao? Ento, s relembrarque, em janeiro, o presidente da Repblica fez questo de anun-ciar pessoalmente (precisava de marketing otimista) a desco-berta de um megacampo, Roncador, mais ao sul do litoralfluminense, e j situado na bacia de Santos (formao geolgicaequivalente da bacia de Campos e que, apesar do nome, se es-tende at o litoral do Rio).

    O que isso significa? Que Marlim e Roncador, juntos, feitos osmesmos clculos, podem oferecer um faturamento de 36 bilhes(com b) de reais por ano, cobrindo, sozinhos, mais de quatro me-ses de todas as despesas do governo federal (deixando de lado os

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    juros, como o FMI faz). E por quanto tempo esses campos poderoser explorados, com essa produo e esse faturamento? De 15 a 20anos, representando portanto, multiplicando-se pelo valor de 36

    bilhes de faturamento anual, de 540 bilhes a 720 bilhes de reais.De meio trilho a trs quartos de trilho. Uma fortuna. Uma fbu-la em apenas dois campos do litoral. Uma enxurrada de reais edlares que poderiam, se usados para tirar o Brasil das mos doFMI e dos credores internacionais, como recurso para investir, vol-tar a crescer, resolver problemas sociais, criar empregos. Voltar aser um pas, e no uma colnia-capacho dos pases ricos.

    No h exagero nenhum, portanto, em gritar aos quatro ventosque o povo brasileiro, com as reservas de petrleo e, mais ainda,com os campos fantsticos descobertos pela Petrobrs, tirou aMega-Mega Sena. Virou trilionrio. Mas no sabe disso. O povono sabe, o Congresso no sabe. Por isso o governo FHC prepara-se para nova rodada de leiles destinados a entregar o petrleobrasileiro a multinacionais. Ou, mesmo, j vem entregando inde-centemente o petrleo descoberto pela Petrobrs, que pertenceefetivamente a cada cidado brasileiro, a meia dzia de empres-rios nacionais e banqueiros nacionais e estrangeiros. Exemplo? Ofantstico campo de Marlim, com sua produo de 400 mil bar-ris/dia, por exemplo, foi repartido agora com meia dzia de s-cios que se juntaram em uma empresa de fundo de quintal para...fornecer parte do dinheiro necessrio para duplicar a produo.Essa operao j seria um assalto contra a sociedade brasileira,

    mesmo que os scios realmente desembolsassem a cifra de 1,5bilho de reais para financiar sua parte no projeto de exploraode Marlim. Nem isso existe. A empresoca de fundo de quintal temum capital fajuto de 200 milhes de reais e foi formada comonarrado em nosso livrinho O Brasil priva tizado apenas... paratomar 1,2 bilho de reais emprestados no exterior, que obviamen-te a prpria Petrobrs poderia obter. Um negcio da China, um

    assalto: uma mina de ouro, capaz de faturar centenas de bilhesde reais, entregue por 200 tostesinhos fajutos.

    A Mega-Mega Sena ganha pelo povo brasileiro, e que seria suaredeno, est sendo literalmente tungada pelo governo FHC. O

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    Congresso Nacional no pode continuar impassvel diante dessasaberraes. O povo brasileiro tem o direito de partilhar direta-mente os lucros da explorao do seu petrleo, por meio de vrios

    caminhos, dos quais dois podem ser prontamente lembrados aoscongressistas: utilizao de 6 bilhes de reais esquecidos emcontas do FGTS e que foram reunidos em um fundo congelado (aPetrobrs teria bilhes para investir e os rendimentos das aesda empresa, no caso, pertenceriam ao FGTS, isto , a todos os tra-balhadores que contribuem para o fundo). A outra alternativa, di-ferente de proposta j cogitada pelo governo, a venda de aes

    novas, relativas a um aumento de capital da empresa, para mi-lhes de brasileiros, com um sistema igual ao adotado porMargaret Thatcher na Inglaterra: vendas a prestao com garan-tia de recompra pelo governo. A esperana, hoje, est no Congres-so, pois os sindicatos, como o dos petroleiros, e entidades como aAepet (Associao dos Engenheiros da Petrobrs), que tradicio-nalmente tomavam posio diante dos desmandos do governo,esto estranhamente silenciosos. Muito, muito estranhamente.Mesmo.

    Emprego e crescimento, promessasDirio Popular, 27/09/99

    Muita gente ficou animada com as novas promessas feitas pelopresidente da Repblica, de criar empregos e garantir um forte

    crescimento para a economia, talvez de at 4%, para o prximoano. H possibilidade de atingir essas metas, realmente? Respos-ta: se o governo FHC no mudar radicalmente sua poltica econ-mica, a resposta um no total. E, infelizmente, nada indicaque o presidente FHC esteja seguindo nessa direo, tanto que seuotimismo se baseia, mais uma vez, em expectativas fajutas. Paraele, o crescimento econmico no ano 2000 seria puxado basica-

    mente pelos investimentos gigantescos que devero ser feitos nabusca e explorao de petrleo, tanto pela Petrobrs como pelasmultinacionais que ganharam reas petrolferas nos recentesleiles.

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    Esses projetos, na casa dos 7 a 10 bilhes de reais a serem inves-tidos por ano, poderiam, efetivamente, representar encomendasmacias para a indstria nacional de equipamentos e seus forne-

    cedores de peas, componentes, matrias-primas, bem como con-tratos para firmas brasileiras de engenharia, consultoria, serviosdiversos. Se tudo isso acontecesse, o setor petrolfero poderia in-jetar algum vapor na economia, com efeitos benficos se esten-dendo para outros setores, garantindo uma melhora na oferta deempregos e algum crescimento econmico.

    Na prtica, porm, a histria totalmente diferente. O presi-

    dente FHC parece no saber, ou finge no saber, que nos prprioscontratos combinados nos leiles as multinacionais j se recusa-ram a comprar equipamentos nacionais, isto , assumiram o com-promisso de encomendar apenas 5% a 15% do total aqui dentro.Vo importar 85% a 95% dos equipamentos, alm de, obviamen-te, utilizar empresas de consultoria e engenharia de seus pases.Vale dizer: o governo FHC repete as mesmas monstruosidades lesa-Brasil que adotou em relao s empresas de energia e s telefni-cas privatizadas, que esto importando maciamente. Tanto quea indstria nacional de mquinas e equipamentos, j destroadapor importaes desde a posse de FHC, sofreu nova queda de nadamenos de 25% em sua produo, nos oito primeiros meses desteano. A derrocada atingiu tambm as indstrias fornecedoras da-queles dois setores, com nova queda de 15% em julho ltimo.

    Em resumo: por causa do escancaramento s importaes com-

    binado com o prprio governo FHC, mesmo os investimentos empetrleo no tero papel decisivo na reduo da recesso e na cria-o de empregos.

    Ao contrrio: suas importaes vo agravar ainda mais a faltade dlares e a fraqueza do Real.

    PS Alis, tolice fazer previses para o ano 2000. Com o rom-

    bo do Tesouro, provocado pelos juros de 10 bilhes de reais porms, a economia e o Real devero enfrentar violentas turbuln-cias mais cedo do que se imagina.

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    O silncio das oposiesDirio Popular, 18/02/00

    A situao do povo brasileiro melhoraria rapidamente. Classemdia, trabalhadores, empresrios e agricultores teriam uma ren-da extra. A economia poderia crescer, criando mais empregos,renda, impostos. Haveria mais dlares, evitando o crescimentoda dvida com os banqueiros internacionais e a desnacionalizaoda economia, perigosa porque aumenta as remessas de lucros paraos pases ricos, comprometendo o prprio futuro do pas. Todos

    esses avanos poderiam ser conquistados, sem nenhum milagre,pelo Brasil.Como? Aumentando rapidamente a produo de petrleo, o que

    plenamente possvel porque a Petrobrs fez fabulosas descober-tas nos ltimos anos, isto , j se sabe onde existem bilhes debarris de petrleo para serem extrados. Basta, apenas, destinarrecursos para montagem de sondas e equipamentos similares, paracomear a produo. Onde buscar dinheiro para um programa deinvestimentos macios na extrao de petrleo? A resposta b-via, quando so analisados os lucros fantsticos que esse negciopode oferecer ao povo brasileiro: os preos do petrleo subiram200% no mercado mundial e as empresas do setor, como aPetrobrs, triplicaram seus lucros no ano passado.

    Alm do mais, ateno, ateno: no caso do Brasil, no existenenhum risco de no descobrir petrleo, de perder dinheiro com

    pesquisas que levam anos. E mais ainda: as reservas descobertasso fantsticas, a ponto de um nico poo no litoral, na bacia deCampos ou na de Santos, ser capaz de produzir 10 mil barris pordia. Cada poo. Diante desses dados todos, pode-se agora respon-der pergunta: onde buscar dinheiro para a arrancada na produ-o? O caminho bvio : lanar uma campanha intensa para ven-der aes populao, transformando milhes de brasileiros em

    acionistas da Petrobrs sem deixar de lado, tambm, a hiptesede o Tesouro usar aes da empresa para pagar dvidas que eleacumulou junto ao FGTS [Fundo de Garantia por Tempo de Servi-o], PIS [Plano de Integrao Social], Pasep [Programa de Forma-

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    o do Patrimnio do Servidor Pblico] etc., que so fundos querenem dinheiro dos trabalhadores. Alm de permitir a explora-o do petrleo, essa frmula atingiria outro objetivo: aumenta-

    ria a renda de milhes de famlias brasileiras, graas participa-o nos lucros da Petrobrs, exatamente como acontece nos pa-ses ricos, onde a populao acionista das grandes empresas. Ogoverno FHC est fazendo exatamente o contrrio: vai realizarnovos leiles para entregar o petrleo descoberto pela Petrobrsa grupos privilegiados e, principalmente, s multinacionais. svoltas com um sem-nmero de aberraes praticadas pelo gover-

    no, as oposies silenciam ou esboam reaes demasiado tmi-das diante desse novo assalto. A questo do petrleo deveria ga-nhar prioridade absoluta, neste momento, por todos os efeitosapontados. preciso que a sociedade entenda o que est aconte-cendo. hora de ir s ruas. Brigar em frente s Bolsas de Valoresnos dias de leilo no ao poltica. Cheira a mera encenao.Quem est ganhando?

    O petrleo (at que enfim) delesBundas, no 52, 13 a 19/06/00

    Chega a trilhes de dlares, trilhes mesmo, o maior assalto queum pas j sofreu nos tempos recentes e que certamente foi come-morado com foguetrio e champanhe nas capitais dos pases ri-cos. Sob o comando do senhor David Zylbsersztajn, presidente da

    Agncia Nacional do Petrleo, o governo FHC realizou leiles paraentregar todas as principais reas produtoras de petrleo do pas,doando-as a grupos multinacionais e colocando o setor sob con-trole daqueles pases ricos. Ser muita ingratido se as metrpo-les no condecorarem Zylbersztajn e FHC l fora, tal a habilidadecom que conseguiram cumprir sua misso lesa-ptria, sem ne-nhuma reao por parte da sociedade.

    Tambm a grande imprensa, certamente, no pode deixar deser homenageada, em reconhecimento ao silncio total que man-teve durante meses sobre o assunto, evitando publicar reporta-gens e anlises que mostrassem as cifras fabulosas envolvidas, a

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    incrvel capacidade de produo dos campos petrolferos brasilei-ros e o papel que a explorao do petrleo poderia desempenharna estratgia para retirar o Brasil do atoleiro em que foi atirado

    pela poltica neoliberal de FHC. Nos leiles do dia 7 de junho, FHCno doou apenas o petrleo, vendeu o futuro do pas. Eis um bre-ve roteiro para entender o fantstico assalto: Os trilhes como disse um diretor da Petrobrs durante osleiles, as reas petrolferas do litoral brasileiro, sobretudo as dasbacias de Campos e Santos, tm, cada uma, reservas de 1 a 3 bi-lhes de barris. s fazer as contas: com o barril de petrleo a 30

    dlares, isto significa que cada um desses campos petrolferos vale,ou pode faturar, de 30 bilhes a 90 bilhes de dlares, ou de 60bilhes a 180 bilhes de reais. Cada campo. Vale dizer, os vrioscampos j estudados e agora doados valem trilhes, sim. Os tostes o governo FHC pediu, como preo mnimo paraesses campos, as cifras simblicas de 50 mil, 100 mil ou 300 milreais. Nos leiles, houve lotes vendidos a 5 milhes, 10 milhesou no mximo 120 milhes... Isto , o Brasil vendeu por tos-tes jazidas de petrleo que valem 30 bilhes, ou 60 bilhes, ou90 bilhes... No h outro nome a dar a isso, a no ser assaltohistrico. Os poos fabulosos preciso repetir: o povo brasileiro no sabe,nunca foi informado, que o Brasil tem, em seu litoral, os camposde petrleo mais fabulosos do mundo, igualados somente pelosexistentes nos pases rabes, como Kuwait, Ir, Iraque, Arbia

    Saudita... So campos onde cada poo cada poo, repita-se pode produzir 7 mil, 8 mil, 10 mil barris por dia e cujas reservaschegam a 1 bilho ou 2 bilhes ou 3 bilhes de barris. Para compa-rao: nos Estados Unidos, a produo predominante de 100barris/dia por poo. Os lucros fantsticos repete-se muito a mentira de que a pro-duo nesses campos, no fundo do mar, muito cara, por causa

    dos equipamentos exigidos. mentira, das grossas. A produode cada barril fica em apenas 2,5 a 3 dlares. Isto , com o barrilvendido a 25 ou 30 dlares, o lucro de 900%. Nove vezes. Umcampo com faturamento de 4 bilhes de reais, portanto, oferece

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    um lucro de 3,6 bilhes de reais, por ano. Um campo com 3 bi-lhes de barris oferece um lucro de 75 bilhes a 81 bilhes de reaisao longo de sua explorao.

    O cerco todas essas reas foram pesquisadas e estudadas du-rante dcadas pela Petrobrs, que ganhou o ttulo de campemundial em pesquisas de fundo do mar, dado por instituies in-ternacionais. Muita gente no entende como ela perdeu essas reasou, mais ainda, por que ela agora participou dos leiles, nos quaiscomprou oito das 24 leiloadas. simples: em 1996, o CongressoNacional aprovou a quebra do monoplio estatal na explorao

    do petrleo, autorizando empresas privadas a ingressarem no se-tor. As riquezas do subsolo so na verdade de propriedade daUnio, do povo, que concede a empresas o direito de explor-las,em troca do pagamen