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90 ______ Ética e estética. Não como polaridade, mas como diferença Karl Heinz Bohrer ISSN 2178-1737 Ética e estética. Não como polaridade, mas como diferença 1 Karl Heinz Bohrer Professor Emérito da Universidade de Bielefield Alemanha Resumo: Esse ensaio discute a tensão entre ética e estética (que corresponde à oposição da filosofia da arte e da teoria estética) com a ajuda de três pensadores, que interiorizaram a experiência romântico-moderna, sem que se tornassem suspeitos de qualquer idealismo: Kierkegaard, Musil, Adorno. Palavras-chave: Estética; Ética; Kierkegaard; Musil; Adorno Abstract: This essay discusses the tension between Ethics and Esthetics (which corresponds to the opposition of Philosophy of Arts and Esthetic Theory) helped by three thinkers, who interiorized the modern, Romantic experience, without any suspicion of any idealism: Kiierkegaard, Musil, Adorno. Key-words: Esthetics; Ethics; Kierkegaard; Musil; Adorno. Sempre foi e ainda é um a priori da filosofia, a suposição de que estética e ética têm que ter alguma coisa a ver uma com a outra. Nisso a seguiram e seguem os poetas com perfil filosófico. A frase de Schiller “a intenção louvável de buscar o que é moralmente bom como finalidade suprema (intenção esta que produziu, defendeu e protegeu na arte muitas mediocridades), causou também na teoria muitos estragos semelhantes.” (Über den Grund des Vernügens na tragischen Gegenständen ( Sobre a razão do prazer com coisas trágicas) – esta frase não deveria ser tomada como líquida e certa! 1 Karl Heinz Bohrer, Die Grenzen des Aesthetischen, Hanser, Munich-Viena, 1998, pp. 160-170. Tradução de Kathrin Rosenfield e Lawrence Flores Pereira. Philia&Filia, Porto Alegre, vol. 02, n° 1, jan./jul. 2013 A Tradução Poética em Múltiplas Dimensões

BOHRER, Karl_ética Estética en Protugues

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    tica e esttica. No como

    polaridade, mas como diferena

    Karl Heinz Bohrer

    ISSN 2178-1737

    tica e esttica. No como polaridade, mas como diferena1

    Karl Heinz Bohrer

    Professor Emrito da Universidade de BielefieldAlemanha

    Resumo: Esse ensaio discute a tenso entre tica e esttica (que corresponde oposio da filosofia da arte e da teoria esttica) com a ajuda de trs pensadores, que interiorizaram a experincia romntico-moderna, sem que se tornassem suspeitos de qualquer idealismo: Kierkegaard, Musil, Adorno.Palavras-chave: Esttica; tica; Kierkegaard; Musil; Adorno

    Abstract: This essay discusses the tension between Ethics and Esthetics (which corresponds to the opposition of Philosophy of Arts and Esthetic Theory) helped by three thinkers, who interiorized the modern, Romantic experience, without any suspicion of any idealism: Kiierkegaard, Musil, Adorno. Key-words: Esthetics; Ethics; Kierkegaard; Musil; Adorno.

    Sempre foi e ainda um a priori da filosofia, a suposio de que esttica e tica tm que ter alguma coisa a ver uma com a outra. Nisso a seguiram e seguem os

    poetas com perfil filosfico. A frase de Schiller a inteno louvvel de buscar o que moralmente bom como finalidade suprema (inteno esta que produziu, defendeu e protegeu na arte muitas mediocridades), causou tambm na teoria muitos estragos semelhantes. (ber den Grund des Verngens na tragischen Gegenstnden (Sobre a razo do prazer com coisas trgicas) esta frase no deveria ser tomada como lquida e certa!

    1 Karl Heinz Bohrer, Die Grenzen des Aesthetischen, Hanser, Munich-Viena, 1998, pp. 160-170.

    Traduo de Kathrin Rosenfield e Lawrence Flores Pereira.

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    O idealismo alemo muito falou sobre a autonomia do esttico enquanto diferena e alteridade do tico, mas, quem olha mais de perto, ver que, nesta tradio dominante do pensamento, o tico nunca se descolou, nunca se soltou da esttica. A determinao schilleriana do sublime e do sentimental, o conceito de uma nova mitologia de Schelling, o critrio hegeliano do esprito e, finalmente, o Programa de Sistema do Idealismo Alemo so teorizaes que contm todas esta restrio tornada padro do esttico em nome de um regulativo tico. A poetologia romntica passou, na verdade, despercebida por esse discurso genrico sobre o elo entre as duas esferas, discurso que se prolonga at as construes tericas dos anos 1970 e 80.

    Isto est na natureza da coisa. Ao que parece, coloca-se como problema terico insolvel, para o pensamento conceitual-discursivo, a suposio de que possamos traar uma fronteira entre esttica e tica tal como o fez a literatura

    romntica-moderna. Mesmo assim, essa possvel separao impe-se no mximo como um reconhecimento prtico. E, de fato, a separao das duas esferas que se processou aos olhos de todos na arte ps-romntica no contm a prova de que h uma diferena absoluta e teoricamente aceitvel [entre o tico e o esttico], mesmo quando devemos partir do fato de que a teoria, por exemplo na figura do historiador das ideias, ignorou at mesmo a separao que teve lugar. No entanto, uma reflexo que trate com seriedade essa diferena (entre o tico e o esttico) precisa deixar para trs essa cegueira com relao aos fenmenos estticos. Ela deve partir da aporia terica [inerente ao fato] que esttica e tica, enquanto duas formas do esprito, no podem ser mediadas e no tm condies de conexo.

    No gostaria de perseguir essa questo retomando o debate (que terminou, ao que bem me lembro, com uma troca de tiros em Hornberg) entre ticos veteranos e juvenis. Gostaria antes de observar a tenso entre tica e esttica (que corresponde oposio da filosofia da arte e da teoria esttica) com a ajuda de trs pensadores, que interiorizaram a experincia romntico-moderna, sem que se tornassem suspeitos de qualquer idealismo: Kierkegaard, Musil, Adorno.

    No um acaso que esses trs pensadores da esttica, que deixarem em posio subordinada o argumento tico em comparao s colocaes idealistas e

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    histrico-filosficas, so todos influenciados por uma Imaginao do maligno (embora os trs queiram manter um a priori tico); a imaginao do maligno consiste, na definio de Bataille, em uma dispensa da categoria do futuro e numa disposio momentnea. O fato de que os trs mantenham o a priori tico torna particularmente frteis os problemas que surgem dali. Estes fomentaro nosso interesse que visa a dissolver o elo [entre o tico e o esttico]. No incio estavam as frases cheias de engodo de Schiller, que tivemos que inverter. Naquilo que segue comearemos com as frases de Kierkegard, Musil e Adorno a favor do argumento tico, que inverteremos de modo anlogo.

    A Stimmung (atmosfera, tonalidade) de Kierkegaard

    Quando algum define o belo como aquilo que traz em si mesmo sua teleologia2, mas cita depois os exemplos da moa ou da natureza ou da obra de arte, comeo realmente a suspeitar que toda essa conversa de que tudo isso teria em si mesmo sua teleologia no passa de uma iluso (Entweder-Oder II)

    Kierkegaard identifica, na sua explicao dessa afirmao, o conceito teleologia com o movimento. Ele introduz esse sinnimo para provar que movimento e histria esto necessariamente implicados e que, conseqentemente, as esferas da natureza e da arte desde sempre esto sendo transcendidas em direo liberdade. Isto significa que o esttico se encontraria necessariamente dentro da tica e que a insistncia do pensador da esttica no conceito da teleologia em si mesma representaria uma contradio do pensamento.

    Ao mesmo tempo, entretanto, ele concede posio contrria de que ao conceito de beleza faltaria, ao que parece, o movimento, uma vez que o belo natural est a de repente e que o belo artstico de qualquer forma no conteria nenhum movimento, j que este acontece em mim. Com esta concesso (embora meramente ttica) da imobilidade e da imediatez3, isto , da autorreferncia do 2 Cf. Kant, Critica do Juizo

    3 Bewegungslosigkeit und Unvermitteltheit

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    esttico, Kierkegaard distingue o belo natural e o belo artstico, estranhamente, em modos transcendentais distintos est colocado o fundamento conceitual que assegura que, numa estado de percepo esttico de fato nunca sua esfera nunca transposta.

    Aqui se mostra em que sentido o debate tico-esttico oculta um debate bem mais essencial: trata-se da discusso do problema metodolgico de saber se a compreenso esttica tem a estrutura de uma postergao infinita ou no. to somente o posicionamento do estado esttico no contexto da coeso da vida (posicionamento determinado por motivos pedaggicos e cultur-crticos), que possibilita a Kierkegaard de duvidar da teleologia em si mesma. Trata-se de um posicionamento do qual ele precisa partir no marco epistemolgico e histrico-filosfico. Mas isto significaria to somente que, no fundo, no existiria o puramente esttico, a experincia esttica pura o que no diz nada do seu conceito potencial.

    Justamente pelo fato de Kierkegaard aceitar teoricamente o poder da autonomia esttica, ele precisa desviar [e defender-se da] sua prxis. ... no que diz respeito poesia e arte, quero te lembrar o que j observei antes, isto , que elas oferecem somente uma conciliao imperfeita com a vida. A teoria kierkegaardiana de um equilbrio entre o esttico e o tico funciona apenas como uma doutrina social individual e como psicologia da personalidade. Kierkegaard fala no fundo no da oposio entre o esttico e o tico, mas da diferena entre o homem esttico e o homem tico; e ele deduz dessa diferena um alerta contra o homem esttico.

    Enquanto pensador da esttica, Kierkegaard deriva sua representao da arte do paradigma amoral da literatura romntica, identificado por Hegel como alheio ao esprito. Tambm seu conceito filosfico da angstia, introduzido mais tarde, resulta do romntico-moderno. Sua crtica do conceito da autonomia esttica parte, portanto, de uma dicotomia radical do esttico e do tico, abismo este que ele pode transpor to somente como terico da realidade. O modo como ele compreende o esttico enquanto pensador da esttica fornece justamente a fundamentao mais radical da imediatez da esfera esttica. Sua frase: a essncia do esttico pode explicar somente aquele que est acima do esttico, ou seja, aquele que vive eticamente, fornece a mediao somente como prxis, no como teoria.

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    Sem entrar aqui nas caractersticas da determinao da esttica kierkegaardiana que surgem na sua descrio da conscincia esttica, devemos entretanto nomear as duas mais importantes das suas categorias: a Stimmung (atmosfera, tonalidade) e o momentanesmo. Enquanto modos temporais, estas categorias esto intimamente ligadas, por assim dizer, como o lado subjetivo e o objetivo do mesmo elemento, que foi mencionado como o teorema de Bataille da falta de futuro do maligno isto , de uma imaginao associal. A Stimmung, na qual a continuidade potencial da forma de experincia dissolve-se para a conscincia esttica na prpria presena (prsentisch auflst), idntica com a conscincia esttica como tal (diferente do caso da Stimmung do pensador tico). A Stimmung esttica no pode ser destacada enquanto objeto de um sujeito soberano que dela disporia, mas ela este sujeito (esttico) por inteiro.

    Do ponto de vista conceitual, Kierkegaard antecipa aqui aquela indiferenciao do sujeito esttico enquanto sujeito que no se deixa integrar socialmente, sobre a qual Musil refletir mais tarde nos seus dirios e que fora Kafka a pronunciar a seguinte frase: no [se trata de] um pendor para a escritura... nenhum pendor, porm inteiramente eu mesmo. (Carta a Felice, 24/07/1913)4

    Pertence imediatez do esttico a intensidade do momento; esta, incapaz de um auto-esclarecimento do tico, sujeita ao modo da tristeza (Schwermut), ao qual Kierkegaard atribui a conotao do inexplicvel e do infinito. verdade que essas qualidades so na origem pensadas como as caractersticas scio-psicolgicas do Mal du Sicle; mas elas so tambm discernveis como as caractersticas poetolgicas mais importantes da esttica ps-romntica de Baudelaire. A tentativa de Kierkegaard para integrar o estado esttico no a priori tico fracassa, em ultima anlise, devido ao seu instinto lmpido [que fareja] a esfera esttica no-medivel.

    Os meios e quartos tons de Robert MusilDesde a minha juventude, considerei o esttico como tico (Tagebcher,

    Heft 30). O que queria dizer Musil, o que ele podia dizer com esta integrao do 4 Nota d. T.: Kafka como Musil concebem escrever no mais como atividade do escritor (que este

    pode exercer ou no) mas como aquilo que o constitui por inteiro.

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    esttico e do tico? Pois, como j observamos acima, Musil trabalhou em direo a uma potica do no-consciente, criando nas reflexes dos seus dirios um vnculo ntimo com sua prosa inicial. O ncleo desta potica do no-consciente est muito afastado do iluminismo de Freud e da filosofia da linguagem de Wittgenstein e consiste na separao absoluta das esferas esttica e tica. De qualquer forma, o que est no incio [destas reflexes] a influncia do esteticismo de dAnnunzio e de Nietzsche, um ponto de partida sobre o qual Musil reflete de maneira autocrtica.

    Em todo caso, as notcias dos primeiros anos 1930 tornam clara uma tematizao do esttico enquanto tico, que aparece como uma reviso da separao inicialmente clara, de forma que a frase com a qual comeamos, biograficamente esclarecedora, trata de algo que no to claro, e recebe um complemento que tem a marca de uma tese analtica: o afeto que imputamos (unterlegen) ao objeto esttico tem parentesco com o afeto tico.

    Quando Musil estava s voltas com essas consideraes, o Nacional-socialismo atraiu simultaneamente o seu interesse crtico. A relevncia social da sua prpria temtica, em si mesma to esotrica, e os elementos ideolgicos dos seus motivos recebem agora maior explicitao e uma reflexo mais intensa do que jamais antes. Embora Musil saiba, como Schiller (que ele l nesse sentido) que a m literatura ou a m arte no ficam melhores graas boa inclinao ou inteno (Tagebcher, Heft 30), ele simultaneamente procura deixar claro (na forma de longas fichas de leitura do socialista religioso suo, Robert Lejeune, Honor Daumier. Der Kmpfer und Knstler) que uma contemplao meramente esttica de uma obra como a do artista francs, com seu vis eminentemente social e crtico, tem que ser considerada como imprpria, de alguma maneira.

    As opinies de Lejeune, citadas por Musil [afirmam], de que a grande arte (Dostoievski, Tolstoi) exerce seu fascnio no devido aos seus elementos estticos, mas graas aos ticos: pois testemunham de uma f e anunciam uma verdade, [desembocando na afirmao de que] seriam precisamente tais valores que ultrapassam tudo o que meramente esttico e levando concluso de que uma separao das duas esferas esttica e tica levaria a um esteticismo estril. Essas opinies podem ser identificadas como uma linha de argumentao muito difundida

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    da integrao forma-contedo (esttica = tica), que Musil leva aqui metodologicamente muito a srio. De seu modo ele at a afirma, pois suas frases iniciais sobre a unidade do esttico e do tico mantm-se no mbito da obra de Lejeune.

    No entanto, como no caso de Kierkegaard, a vontade de assumir uma postura social a me do pensamento tico - muito mais do que a autoacusao do pensador da esttica poderia ser uma prova convincente. Num primeiro momento, Musil reduz o conceito da tica a um esquema moral de engajamento social o que contradiz a sua inteno original. Pois nos primeiros anos da dcada de 1920 ele distingue rigorosamente entre o homem tico e o moralista. O moralista pertence postura

    da lgica, da filosofia sistemtica e da ordem social. O homem tico, ao contrrio, assume o ensasmo, a mstica e o estoicismo uma oposio que aparece alhures na

    forma da dicotomia criativo no-criativo (TB Heft 8); o no-criativo possui as qualidades do verdadeiro, legal, voltado realidade, socivel; o criativo o indeterminado, transverdadeiro, translegal e associal.

    Essas sries de oposies, que lembram tambm, nas suas implicaes, as distines de Richard Rorty entre o homem metafsico e o irnico, estabelecem nada mais e nada menos que a separao radical entre os mbitos do tico e do esttico que aqui investigamos: Musil compreende, ao que ficou claro, a tica, isto , o criativo (enquanto distintos da moral e do no-criativo) precisamente como a conscincia esttica! Ele no des-define o esttico [para confundi-lo com] algo tico-social, como se tenta de fazer neste momento precisamente no discurso ps-moderno da esttica (cf. o conceito do sublime em W. Welsch).

    Em Musil, encontramos, ao contrrio uma verso esttica, rica de consequncias, de todo e qualquer contedo idestico (ideellen Gehalts). No se trata de um programa artstico forado por uma atitude imbuda de proceder a decises. Trata-se antes (e isto constitui na nossa questo um argumento decisivo) de uma consequncia necessria resultando da clivagem sempre j dada que coloca a conscincia esttica da fala literria distncia de toda forma discursiva comum.

    Esta suposio inscrita na teoria de Musil pode ser esclarecida, para terminarmos, com uma indicao dicotomia esttica-tica. A experincia esttica

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    proporcionada pela proposio potica de que fala Musil no repousa na coisa conceitual, mas nas associaes subliminares, aluses, meios e quartos tons (Heft 5). Em outras palavras: ela repousa no numa verdade que comunicada, mas numa atmosfera ou tonalidade (Stimmung).

    Trata-se daquela atmosfera da fala metafrica, cuja ciso do significado espiritual tanto mais definitiva quanto mais ela desconhece o tertium comparationis. Essa atmosfera remete tanto ao descrdito kierkegaardiano do tico, quanto anuncia a teoria de Julia Kristeva da subverso semitica do discurso simblico (= tico). Embora o homem tico em Musil se esforce para conceder ao argumento tico uma qualidade esttica, este impulso dissolve-se, olhando mais de perto, diante do reconhecimento inexorvel de que a linguagem esttica intraduzvel. Nesse nvel, no se trata mais de saber se uma dissonncia entre o tico e o esttico seria desejvel ou no: a dissonncia resulta do simples diagnstico semntico, aqum de qualquer pr e contra moral.

    A apario de Adorno (167 ss.)

    Todas as questes estticas terminam em questes sobre o contedo de verdade das obras de arte.... Essa proposio central da Teoria esttica de Adorno poderia ser lido como uma frmula bsica da conciliao de esttica e tica. Em todo caso, ela parece contrariar a determinao puramente esttica da atmosfera (Stimmung) e dos quartos tons, uma vez que parece insistir na tese de que arte contrariamente idia de Hegel pode expressar a verdade no sentido filosfico, embora seja na forma da negatividade.

    A esttica de Adorno , portanto, lida sempre de novo no sentido de uma integrao do tico (= esprito) e do esttico (= letra) (K. Sauerland, Wellmer, W. Welsch). No entanto, essas leituras resultam mais no argumento de um noli-me-tangere intelectual, do que na clarificao da pergunta se no centro da Teoria esttica de Adorno realmente aconteceria uma conciliao de ambas as esferas. (Tambm Martin Seel e Ch. Menke salvam Adorno no mbito integracionista, apesar de suas respectivas criticas escola da integrao: Seel recorre ao conceito do

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    esttico da superao (A arte da ciso), Menke unio da hermenutica e da esttica da negatividade (A soberania da arte). So at agora os dois nicos crticos da escola racional que fizeram face ao desafio do esttico). Tambm aqui nos limitamos a uma breve aluso [ questo de saber] em que medida a frase citada acima no satisfaz uma conciliao, porm vale apenas como uma afirmao

    defensiva.

    importante para a argumentao tica que seja mantida de alguma maneira a coeso com a concepo da arte na filosofia idealista. conhecido, entretanto, que Adorno rompeu essa coeso, na medida em que ele recolocou o belo natural, que o idealismo [hegeliano] recalcara, no centro da Teoria esttica. Diante deste reconhecimento, hoje corriqueiro, porm inovador ainda h vinte anos, o elo entre o tico e o esttico no pode ser nada alm de um espao recreativo do Verdadeiro, Belo e Bom, isto , uma recada ilegtima na filosofia da identidade portanto a identificao do universo das formas estticas com os princpios da eticidade.

    Na medida em que Adorno representou, para alm da apario do belo natural, a prpria mais-valia esttica da arte, ele chegou categoria que recobre a atmosfera (stimmung de Kierkegaard) e os quartos tons de Musil, categoria essa, que no permite mais um cmputo tico. Trata-se da categoria do momento repentino da expresso. O que Adorno esboa nas passagens centrais do primeiro quarto da Teoria esttica, a dissoluo definitiva daquele endeusamento do conceito [elevado ] em ideia, que se torna quase necessrio e inevitvel onde mantido um elo entre o esttico e o tico. A dissoluo tem amplas consequncias. Pois o pavor mtico, que Nietzsche evoca melancolicamente com uma aluso ao seu elo originrio

    com a arte, apreendido agora de modo afirmativo enquanto epifania atravs do uso do conceito de um terror anterior ao mundo [humano], e isto no sentido da interpretao que Valery faz da obra de arte enquanto apario. (Ch. Menke, que observa esse procedimento como categoria relevante, emprega toda a sua brilhante lgica do de um lado - de outro ladopara eliminar esse fato inquietante).

    claro que Adorno impede qualquer explicao da obra de arte que recorra a uma origem mtica e filosfico-originria (No artefato, o pavor se libera do engodo

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    mtico de ser-em-si, sem que ele seja, entretanto, nivelado ao seu esprito subjetivo). Mas isto no diz respeito ao seu reconhecimento radical do carter momentneo contingente do esttico, que est aqui em jogo. Nisso, Adorno coloca-se contra uma compreenso tico-conteudstica da arte, tal como ela aparece, por exemplo, na polmica de George Steiner contra Mallarm. A frase que acabamos de citar sobre o artefato est no fio da navalha: pois, de um lado, ela concede ao esttico um ser-outro enigmtico, que no se deixa esclarecer pela razo moderna, por outro lado, libera-o insistentemente da suspeita de uma origem obscura. Essa origem sombria atribuda ao esttico, por exemplo, pela teoria da arte simbolista e ritualstica dos Neo-romnticos, e Nietzsche suspeito de ser o seu ancestral. Mas isso apenas comprova o quanto o Adorno tardio afastou-se da funcionalizao social e utpica da arte (Vor-schein Theorie), que representa o reduto preferido dos seus limitados alunos razo pela qual Jrgen Habermas lhe d um lugar (alis, com toda razo) entre os escritores da burguesia crist.

    Mas Adorno no fornece a explicao se e como o enigma do momento da apario esttica pode realmente estar suspenso no contedo de verdade. O fato que o enigma esttico desafia e requer uma interpretao, ainda no implica que ele possa ser esclarecido e dissolvido (entrtselt) pela razo que interpreta.

    A construo simtrica que Adorno opera com a fenomenalidade momentanstica e o contedo de verdade , sem dvida, um mandamento de conciliao entre as esferas esttica e tica. Mas esse mandamento parece ser colocado ex post factu e no se deixa deduzir de sua intuio tardia da esttica do terror. Futuramente, teremos que ler a Teoria esttica de modo ainda mais contraditrio, a fim de aprendermos a distinguir o que h a de avanado e o que de convencional.

    Numa distncia de trs pocas e de trs maneiras diversas, Kierkegaard, Musil e Adorno permitiram observar o trabalho desempenhado pelo argumento tico. Os trs so pensadores com eminentes talentos estticos (diferentemente do que a regra na filosofia da arte acadmica). Assim, o conflito entre o tico e o esttico no foi levado a uma harmonizao, embora o postulado do tico tenha-se tornado mais e mais truculento por razes histricas. reversvel tambm a objeo metodolgica

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    segundo a qual eles seriam demasiadamente estticos (esteticistas no sentido da autoacusao de Kierkegaard), e que isso os impediria de julgar adequadamente o esttico e sua relao com o tico.

    Atravs de nossas observaes, chegamos concluso que a conciliao do tico com o esttico funciona, ou pode ser exigida, somente no plano da teoria da sociedade e da filosofia da histria. Mais ainda, mostrou-se que isso tampouco uma oposio fundamental que Kierkegaard tivesse diagnosticado a partir das suas premissas, mas que se trata antes de uma diferena que no pode ser apreendida simetricamente. Teremos que soprar no ouvido da elevada pedagogia artstica: eles no tm nada a ver um com ou outro.

    As fronteiras do esttico. Contra o hedonismo da aisthetis (pp. 171 ss.)

    I. Crtica da de-definio5 do esttico

    Um terror paira sobre a regio: a aceitao do esttico. A esfera, que, ainda h uma dcada, foi honestamente considerada como inacessvel a um discurso genrico, parece agora ter tornado proeminente sua voz . Isto significa ou que a sociedade, isto , sua capacidade perceptiva, modificou-se radicalmente, ou que h ai um equvoco. Vou perseguir a ltima hiptese e a chamo: as fronteiras do esttico. Falarei, para comear, de uma falsa atualidade do esttico, depois sobre a necessidade histrica do discurso esttico e, por final, sobre a problemtica da assim chamada autorreferncia que a surge.

    Conversando com um historiador conhecido, diretor de uma instituio de pesquisa interdisciplinar renomada, falamos dos interesses de poltica universitria dos governos estaduais, tentei sublinhar que as cincias da arte e da literatura so subvencionadas cada vez menos como cincias da arte e mais e mais enquanto cincias histrico-sociais. No havia como remover nessa conversa a objeo decidida de que a situao geral ter-se-ia modificado a favor de um crescente interesse esttico. A razo desse impasse foi que havia a o choque de duas 5 O termo Entgrenzung implica a supresso de limites ntidos que definem o ncleo ou o campo

    prprio do esttico

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    concepes radicalmente diversas do esttico: enquanto eu mesmo entendia por esttico as qualidades expressivas de uma obra de arte, uma cincia da literatura que procede como cincia da arte, ou seja um mtodo que investiga essas qualidades de expresso, o historiador entendia por esttica justamente uma de-definio do conceito de obra de arte - mais do que isto, ele no estava realmente interessado em arte e literatura, mas em uma qualidade de vida hedonista, que ele defendia como o interesse decidido daquele governo de estado.

    O que tinha que ser clarificado nessa oposio, uma atualidade do esttico que, sem dvida predomina e que corre o risco de perder o ncleo substancial do discurso esttico ao voltar-se para a sua dedefinio motivada por interesses moral-filosficos, social-emancipatrios ou hedonistico-culturais. PARA ESSA DEDEFINIO DO ESTTICO EXISTEM CONCEITOS PERCEPTIVOS MUITO DIVERSOS: POR EXEMPLO A SOCIEDade da experincia de Gerhard Schulze ou Ser-sujeito Hoje de Wolfgang Welsch. Formulaes sintomticas em linguagem cotidiana dizem: cultura poltica, cultura de discusso, cultura do lazer. O sufixo cultura sempre necessrio, provavelmente devido ao perfil da sociedade pequeno-burguesa de classe mdia do tipo repblica federativa alem, para a qual o momento enigmtico-elitista do propriamente esttico evaporou aos poucos. No se trata, porm, aqui da entoar uma lamentao de crtica da cultura ou de pessimismo cultural, mas, muito pelo contrrio, trata-se de uma aceitao adequada da atualidade do esttico que se tornou historicamente necessria. Por isto, devemos considerar onde esta [aceitao] aparece de modo errado e onde de modo certo.

    As duas palavras mgicas de uma atualidade errada do esttico no sentido ps-moderno (como devemos acrescentar imediatamente) so: contexto e primado da imagem. Ambos conceitos funcionam tanto como modelos tericos como enquanto prxis do negcio cientfico e cultural. Quanto ao conceito contexto: Quando o renomado historiador da arte Wolfgang Kemp advoga a favor do contexto que seria hiper-relevante enquanto conceito histrico-artstico, j que somente graas a ele poderia ser revertido o isolamento da obra de arte enquanto objeto de museu e de investigaes cientficas (isolamento este, que se absolutizou ao longo do sculo XIX), de forma que a arte possa de novo ser devolvida a um

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    universo cultural e social originalmente muito mais complexo ento [esta reivindicao] tem sua plausibilidade metodolgica. O problema desta recomendao de dedefinio aparece entretanto, quando a relao ambiente-obra literalmente equiparada com o modelo dos web-sistemas e, alm disto, com um patos histrico-filosfico bastante tpido (assim trabalha a histria). Seja como for, sempre se tenta de tornar calculvel algo difcil de quantificar ou seja o fenmeno esttico -, recorrendo para tanto a componentes extra-estticos que sempre se oferecem medio e quantificao. At ai porm no alm alcana esse modelo terico. Na prtica, o negcio europeu das exposio fornece exemplos particularmente impressionantes para a atualizao errada do esttico: pois este negcio prospera tanto e faz brotar flores to coloridas-e-lucrativas to somente devido ao fato que se oferece a um pblico maior simplificando a arte na embalagem maior da histria da cultura. O que ocorre uma popularizao do esttico, cujo sentimento mais importante a eliminao do risco diante da sociedade, tal como Sabine Fabio argumentou de modo pertinente. Isto favorece precisamente aquele conceito hedonstico-igualitrio da esttica que tanto impressionou o historiador sociolgico que mencionamos no incio deste ensaio quando ele considerava a poltica cientfica e cultural do governo do estado. O estado fatual de uma estetizao do mundo vivido corre na direo de uma concepo higinica da arte, que aceita tranquilamente que sejam absorvidos pela arte os elementos irracionais e provocadores no seio de uma sociedade de progresso moderna, para ter, assim, maior facilidade de absorv-los num programa racional: a esfera da arte adequada a esfera da no-arte de modo simtrico e funcional. Estabelecer um contexto sempre significa no sentido esttico-terico e no sentido estratgico e poltico cultural, tentar operar uma dedefinio do esttico [com a seguinte caracterstica]: assegurar uma aceitao junto a uma maioria de consumidores que [a princpio] no est aberta para o esttico, mas que, devido s alteraes profissionais e salariais, veio a considerar o assim chamado esttico como uma qualidade de prestigio e de distino.

    Com isto, cheguei ao segundo conceito da dedefinio do esttico: o primado da imagem. Tambm aqui temos a ver com um teorema impressionante. Paul Virilio, por exemplo, explicou numa conversa com Fred Forest: acontece que

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    palavras no so modelos. Na minha opinio, modelos so imagens. Claro que h modelos de comportamento. Claro que tem modelos da sensibilidade, mas eu recuso a ideia da palavra como modelo. Por isto, meu afastamento da semntica, da semitica e da semiologia. Como explicao, Virilio fornece a identificao enftica: no sou um homem acadmico. Quando escrevo, visualizo o que escrevo. E quando no vejo nada, no consigo pensar. No tenho interesse numa crtica da esttica de Virilio, que um tema de outra ordem e que me interessa devido categoria do tempo6. Quero apenas discernir o que o primado da imagem implica aqui com infalvel previsibilidade: uma mistura dos meios de conhecimentos com a tendncia de dissolver em nome de uma maior imediatez a esttica da construo literria (devido aos sinais primariamente cognitivos do literrio, sinais que evidentemente so compreendidos como uma limitao e definio). Com certeza, a grande carreira internacional da pintura rhenana, cujo nome Novos Fauves j alude ao efeito de pura imageidade, pertence diretamente a esse movimento artstico que favorece o primado da imagem. A esttica imagtica que h uma dcada encenou isto com renovadas reivindicaes vanguardistas a obra de arte total teatral de Robert Wilson. Se reconhecermos na obra de Wilson o pluralismo mtico (acreditado to somente na verso do cenrio teatral) no sentido de uma simultaneidade imaginada como um projeto critico nos planos epistemolgico e histrico, e que tem a sua origem na crtica da racionalidade especfica doa recentes tericos da percepo (Arnheim), ento a ociosidade (Beliebigkeit) do excesso de cenrio no teatro da Alemanha ocidental , h muito, uma conveno banal. Voltando ao nosso problema, o que acontece ai? Uma dedefinio da significao esttica que visivelmente no mais confiada, nem acreditada significao das palavras [mas que compensada por um luxo excessivo de cenrio]. O favorecimento mais poderoso, porque 6 Lyotard sobre B. Newman; Ao deixar para trs as formas do realismo social dos anos 30, Pollock

    pode ter concordado com Newman em que as telas dos expressionistas abstratos eram compostas de imagens cuja realidade evidente por si mesma e que so desprovidas dos arrimos e muletas que evocam associaes com imagens fora de moda, ao mesmo tempo sublimes e belas Barnett Newman: The Sublime is Now [Modernismo em disputa 52[a vontade natural do homem de expressar nas artes sua realo com o absoluto foi confundida com o absolutismo da criao perfeita e equivocadamente identificada com o fetichismo da qualidade.a vontade natural do homem de expressar nas artes sua realo com o absoluto foi confundida com o absolutismo da criao perfeita e equivocadamente identificada com o fetichismo da qualidade.Yves Klein contra a representao e contra Malevitsch que usa a cor como representao, no como pura e concreta experincia imediata -: Bohrer 182

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    teoricamente exigente, da imagem provavelmente a esttica dos meios eletrnicos, que promovida enfaticamente pelos seus pensadores precoces, Vilem Flusser e Peter Weibel. Eles merecem ateno ao lado da teorizao acadmica da aparncia digital, justamente pelo fato que sua crtica radical da esttica tradicional, entre Hegel e Heidegger, detecta no fenmeno esttico as categorias verdadeiramente relevantes (em particular algumas que dizem respeito conscincia esttica do tempo).

    Recebido em 05 de julho de 2013.

    Aprovado em 18 de setembro de 2013.

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