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CAPÍTULO 7 Pressupostos processuais Sumário · 1 . Pressuposto processual: noções gerais - 2. Pressupostos de existência e requis itos de val idade - 3. Alguns "mitos" sobre os pressupostos processuais - 4. A cl assificação proposta - 5. Pressupostos p ro- cessuais subjetivos: 5.1. Capacidade de ser parte; 5.2. Existência de ó rgão invest ido de jurisd ição; 5.3. Pres- suposto processual objetivo: a existência de ato in ic ial do proce dimento que introduza o objeto da decisão - 6. Requis itos processuais subjetivos de validade: 6.1. Capac idade processual; 6.1.1. Generalidades; 6.1.2. Possíveis consequências da inc apacidade processual; 6.2. Capacidade processual das pessoas casadas: 6.2.1. Consideração introdutória; 6.2.2. Capacidade processual dos cônjuges nas ações reais imobil iárias: 6.2.2.1. O art. 1 .647 do Código Civil; 6.2.2.2. A restrição da capacidade processual; 6.2.2.3. Forma e prova do consenti- mento; 6.2.2.4. Aplicação à união estável documentada; 6.2.2.5. O controle da ilegitimidade processu al do cônjuge; 6.2.2.6. Suprimento judicial do consentimento ( art. 74 do CPC e a rt. 1 .648 do Código Civil); 6.2.3. Dívidas solidárias e lit isconsórcio necessá rio entre os cônjuges (incisos l i e 111 do § 1• do art. 73 do CPC); 6.3. O curador especial; 6.4. Capacidade postul atóri a: 6.4.1. Generalidades; 6.4.2. Ato praticado por advogado sem procuração; 6.4.3. A procuração; 6.5. Competência; 6.6. Imparci alidade - 7. Requisito processual objetivo intrínseco: respeito ao fo rmalismo processual - 8. Requisitos processua is objetivos extrínsecos e negativos - 9. A legit imação para agir e o interesse processu al: 9.1. Observação introdutória; 9.2. O art. 17 do CPC; 9.3. Legitimação para agir: 9.3.1. Noção; 9.3.2. Classificação; 9.3. 3. Substituição processual ou legitimação extraordinária; 9.3.4. Fonte normativa da legitimação extraord inária: 9.3.4.1. Generalidades; 9.3.4.2. A le- gitimação extraordiná ria negoc iai; 9.3.5. Substituição processual e sucessão processua l; 9.3.6. Substituição processual e representação processual; 9.3.7. Legitimidade ordinária como questão de mérito; 9.4. O inte- resse de agir: 9.4.1. Generalidades; 9.4.2. O interesse-utilidade; 9.4.3. O interesse-necessidade e as ações necessárias; 9.4. 4. 1nteresse de agir nas ações decla rató rias; 9.4.5. O denominado interesse-adequação; 9.5. A teoria da asserção: exame da legitimidade e do interesse de agir à luz do que foi afirmado pela pa rte - 10. As diversas posições juríd icas que um sujeito pode assumir em um mesmo pr ocesso: a dinamic idade das capacidades processuais, do interesse processual e da legitimidade. 1. PRESSUPOSTO PROCESSUAL: NOÇÕES G ERAIS O desenvolvimento teórico da categoria "pressupostos processuais " deve-se a Oskar Bülow' e tem origem na identificação do processo como conjunto de relações jurídicas distintas daquela que constitui o seu objeto. Assim como o reconhecimento da relação jurídica deduzida (a cujo respeito discutem os litigantes)' pressupõe a verificação de certos fatos, "também o sur- gimento da relação jurídica processual, analogamente, depende da presença de determinados elementos, que condiciona m, e m termos globais, a existência. Tais seriam os pressupostos processuais".3 1. La teoria de las excepciones procesales y los presupuestos procesales. Trad. Miguel Angel Rosas Lichtschein. Buenos Aires: Ediciones jurídicas Europa-América, 1964, p. 04-09. 2. Os "pressupostos processuais " devem ser observados, também e obviamente, no s procedimentos de jurisdi- ção voluntária. (GRECO, Leonardo. jurisdição voluntária moderna. São Paulo: Dialética, 2003 , p. 44-45). 3. MOREIRA, José Carlos Barbosa. "Sobre pressupostos processuais". Temas de direito processual civil - Quarta série. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 84. 309

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CAPÍTULO 7

Pressupostos processuais Sumário · 1 . Pressuposto processua l : noções gerais - 2. Pressupostos de existência e requisitos de val idade

- 3 . Alguns "mitos" sobre os pressupostos processuais - 4. A classificação proposta - 5. Pressupostos pro­

cessuais subjetivos: 5. 1 . Capacidade de ser parte; 5.2. Existência de órgão investido de jurisd ição; 5.3. Pres­

suposto p rocessual objetivo: a existência de ato inic ia l do procedimento que introduza o objeto da decisão

- 6. Requisitos processuais subjetivos de va l idade: 6. 1 . Capacidade processual; 6.1 . 1 . Genera l idades; 6 . 1 .2. Possíveis consequências da incapacidade processual; 6.2. Capacidade processual das pessoas casadas: 6.2. 1 . Consideração introdutória; 6.2.2. Capacidade processua l dos cônjuges nas ações reais imobi l iárias: 6.2.2 . 1 . O

a rt. 1 .647 do Código Civi l; 6.2.2.2. A restrição da capacidade processual ; 6.2.2.3. Forma e prova do consenti­

mento; 6.2.2 .4. Apl icação à união estável documentada; 6.2.2.5. O controle da i legitimidade processual do

cônjuge; 6.2.2.6. Suprimento judicial do consentimento (art. 74 do CPC e art. 1 .648 do Código Civi l ) ; 6 .2.3 . D ívidas sol idárias e litisconsórcio necessário entre os cônjuges ( incisos l i e 1 1 1 do § 1• do a rt. 73 do CPC); 6.3. O

curador especial; 6.4. Capacidade postulatória: 6.4. 1 . Genera l idades; 6.4.2. Ato praticado por advogado sem

procuração; 6.4.3 . A procuração; 6.5. Competência; 6.6. Imparcial idade - 7. Requ isito processual objetivo

intrínseco: respeito ao formalismo processual - 8. Requ isitos processuais objetivos extrínsecos e negativos

- 9. A legitimação para agir e o interesse processual : 9. 1 . Observação introdutória; 9.2. O art. 17 do CPC;

9.3. Leg itimação para agir: 9.3 . 1 . Noção; 9.3 .2 . Classificação; 9 .3 .3 . Substituição processua l ou legitimação extraord inária; 9.3.4. Fonte normativa da legitimação extraordinária: 9.3.4. 1 . Genera l idades; 9.3.4.2. A le­gitimação extraord inária negociai; 9.3 .5 . Substituição processual e sucessão processual ; 9.3.6. Substitu ição processua l e representação processual; 9 .3 .7 . Leg itimidade ord inária como questão de mérito; 9.4. O inte­resse de agir : 9.4. 1 . Genera l idades; 9.4.2. O interesse-uti l idade; 9.4.3. O interesse-necessidade e as ações

necessárias; 9.4.4. 1 nteresse de ag ir nas ações declaratórias; 9.4.5. O denominado interesse-adequação; 9.5.

A teoria da asserção: exame da legitimidade e do interesse de agir à luz do que foi afirmado pela pa rte - 1 0. As diversas posições juríd icas que um sujeito pode assumir em um mesmo processo: a d inamicidade das capacidades processuais, do interesse processual e da legitimidade.

1 . PRESSU POSTO PROCESSUAL: NOÇÕES GERAIS

O desenvolvi mento teór ico da categoria " p ressu postos p rocessua is" deve-se a Oskar Bü low' e tem o rigem na ident i fi cação do p rocesso como conj u nto de re lações j u ríd i cas d i st i n tas daq ue la q u e const i tu i o seu o bjeto.

Ass i m como o recon hec imento da re lação j u ríd ica deduzida (a cujo respe ito d iscutem os l i t igantes)' p ressupõe a ve rifi cação de certos fatos, "tam bém o s u r­g i mento da re lação j u ríd i ca p rocessua l , ana logamente, depende da p resença de dete rm inados e lementos, q u e cond i c i onam, em te rmos g lo bais , a exi stên cia . Tai s se r iam os p ressu postos p rocessua is" . 3

1 . La teoria de las excepciones procesa les y los presupuestos procesales. Trad. M igue l Angel Rosas L ichtsche i n . Buenos A i r es : Ed i c iones j u ríd i cas Eu ropa-Améri ca, 1 964, p . 04-09.

2. Os "p ressu postos p rocessua is" devem ser observados, também e obviamente, nos p roced imentos de j u ri sd i ­ção vo l u ntár ia. (GRECO, Leonardo . jurisdição volun tária moderna. São Pau l o : D ia léti ca, 2003 , p . 44-45).

3. MORE I RA, José Car los Barbosa. "Sobre pressu postos p rocessuais" . Temas de direito processual civil - Quarta série. São Pau lo : Saraiva, 1 989, p. 84.

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F R E D I E D I D I E R J R .

A expressão n ão é do agrado de todos, mas, de u m modo geral , t em s i d o ut i ­l i zada pe la dout ri na b ras i l e i ra.

No entanto, convém uma advertênc ia . Co locam-se sob essa ru b rica tantas e tão d iversas f igu ras, com tantos e tão diversos efeitos, q u e há quem cr it iq ue, se­veramente, a existênc ia dessa catego ria de pensamento . De fato, "quando se d iz, porém, q u e determ i nado req u i s ito é um p ressu posto p rocessua l , a r igo r é pouq uís­s imo o q u e se f ica sabendo a seu respeito . Que se cu ida de maté r ia refe rente ao p rocesso, a ser aprec iada p re l im i narmente ao mé rito - e só . (. .. ) É cômodo, sem d úvida, fa la r de ' p ressu postos p rocessuais ' , nos esquemas d idát icos; e não ap re­senta maior i n conven i ente, desde que se tome o cu idado de pôr os p i ngos nos is" . 4

Pressupostos p rocessuais são todos os e l ementos de existê ncia, os req u i s itos de val idade e as cond i ções de ef icácia do p roced imento, q ue é ato-complexo de for­mação sucessiva, confo rme vi mos no capítu l o i ntrodutó r io deste vo l u m e do Curso.

Há pressu postos do p roced i mento pr inc i pa l , do p roced imento i n ci dental e do p roced i mento recu rsa l . No rmal mente, a doutr i na cost uma refe ri r aos p ressu postos de existênc ia e aos req u i s i tos de val i dade, não t ratando dos fato res de efi các ia . Os l i m ites deste trabal h o não perm item que se vá m u ito a lém d i sso .

Por isso, exam i nemos os p ressu postos de exi stênc ia e os req u i s i tos de val i ­

dade.

2. PRESSU POSTOS DE EXISTÊNCIA E REQU ISITOS DE VALIDADE

Cost uma-se falar em p ressu postos de exi stên cia e de val idade .

A term i no logia me rece uma correção técn i ca. Pressu posto é aq u i l o que p rece­

de ao ato e se co loca como e lemento i nd i spensáve l para a sua existên cia j u rídica;

req u is ito é tudo quanto i ntegra a estrutu ra do ato e diz res peito à sua val i dade,

como já foi visto no p rime i ro capítu l o . Ass im , é mais técn i co falar em req u i s itos de

val idade, em vez de " p ressu postos de val i dade" .

" P ressu postos p rocessuais" é denom inação que se deveria rese rvar apenas

aos p ressu postos de exi stê nc ia . 5 Sucede q ue " p ressu postos p rocessua is" é expres­

são consagrada na doutr i na, na le i (vide o i n ci so IV do art. 485 do CPC) e na j u ri s ­

p rudênc ia .

4 . MORE IRA, José Carlos Barbosa. "Sobre p ressupostos p rocessua is" . Temas d e direito processual civil - Quarta

série. São Pau lo : Saraiva, 1 989, p . 93 .

5 . Segue-se , ass im , a term i no l og ia adotada po r José Or lando Rocha de Carva lho , em p r imoroso trabal ho, que é

le i tu ra ob rigatór ia sobre o tema: Teoria dos pressupostos e dos requisitos processuais. R io de jane i ro : Lumen

j u ris, 2005 .

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

É possíve l , ass i m , fa la r em " p ressu postos p rocessua i s" la to sensu, com o l ocução q u e eng l oba tanto os req u i s i tos de va l i dade c o m o os p ressu postos p ro ­cessua i s s tricto sensu (som e nte aq ue l e s conce rnentes à exi stênc ia do p rocesso) . A ut i l i zação da expressão " p ressu postos p rocessua i s" (en t re aspas) i n d i ca refe­rênc i a aos p ressu postos p rocessua i s am p lamente cons i de rados .

o processo é u m feixe de re lações j u ríd i cas, do ponto de vista da ef icácia, e u m p roced i m e nto, do ponto de vista da existênc ia . Como e m toda relação j u ríd i ca, i m põe-se a coexistênc ia de e l ementos s u bjetivos (suje itos) e o bj etivos (fato j u ríd ico e o bjeto) .

Os s uje itos p r i nc i pa is do p rocesso são as partes (auto r e réu) e o Estado-j u i z . Para q ue o p rocesso exista, basta que a lguém postu l e perante u m ó rgão que esteja i nvestido de j u ri sd ição : a existênc ia de u m autor (suje ito q u e p rat iq ue o ato i nau ­gu ral, q ue ten h a persona l idade j u d ic iá ria) e de um ó rgão i nvest ido de j u r isd ição com p l eta o e l emento su bjetivo do p rocesso. o p rocesso existe sem réu ; para e l e, po rém , só te rá efi cácia, somente poderá p rod uz i r a lg uma consequênc ia j u ríd i ca, se fo r va l i damente c i tado (art. 3 1 2 do CPC) .

Os e l ementos objet ivos de uma re lação j u ríd ica são o fato j u ríd i co e o objeto . O fato j u ríd i co que i n stau ra a re lação j u ríd ica p rocessua l é o ato i naugu ra l (ato postu lató r io q u e i ntroduz o objeto liti3ioso do p rocesso) de a lguém com persona l i ­dade j ud i c iár ia perante ó rgão i nvestido de j u r i sd ição, confo rme p revê o a rt . 3 1 2 do CPC . O obj eto l i t ig ioso do p rocesso é o o bjeto da p restação j u ri sd i c iona l so l i c itada n esse ato, no rma lmente des ignado de demanda . P reench idos esses e l ementos, o p rocesso existe.

É possível q u e, em bora exista p rocesso, a um determ i nado ato p rocessua l falte um p ressu posto de existênc ia j u ríd ica, como oco rre com a sentença p rofer ida po r não-j u iz ou u m a que não possua dec isão. N esses casos, o p rocesso existe, mas o ato (sentença) é que não p reencheu os e l ementos mín imos do seu s u po rte fát ico, o que i m pede a sua exi stênc ia j u ríd ica. Pode-se fa lar, portan to, em pressupostos de existência de cada um dos a tos jurídicos processuais que compõem o procedimen to, independen temen te da existência da relação jurídica processual .

Exi stente o p rocesso, é possível d i scuti r sob re a ad m i ss i b i l idade (va l idade) de todo o p roced i mento (ato j u ríd ico com p lexo) ou, especif icadamente, de cada um dos atos j u ríd icos que nele são p raticados . Não se pode, po rém , d iscut i r a val idade da re lação j u ríd ica p rocessua l : re lação j u ríd ica é efe ito de fato j u ríd i co, ou existe ou não existe; apenas os atos j u ríd icos podem ser i nvál idos , conforme já se d isse ­pode-se, n o entanto, q u esti o nar a val idade do p roced i m ento, q u e é u m ato j u ríd i co com p lexo de fo rmação sucess iva.

Sur3em, então, os requisitos de va lidade do processo. Como todo ato j u ríd ico, o p roced imento tam bém tem os seus requ i s i tos de val idade : a fo rma do ato deve

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F R E D I E D I D I E R J R .

ser respe itada bem como o s su je itos (j u iz e partes) hão de s e r capazes . 6 o desa­tend imento dos req u i s itos de va l i dade de um ato j u ríd ico p rocessua l i so lado não i nviab i l i za, a p ri n cíp io , todo o p roced imento; pode dar azo apenas à decretação de n u l i dade do ato j u ríd ico p rocessua l defeituoso .

Na verdade, q uando se d iz " p rocesso i nvál i do", está-se d iante de uma conse­q uênc ia ( i nva l i dade) que deco rre de u m defeito n o fato j u ríd ico que lhe deu causa ou de um fato supe rven i e nte que d iga respeito aos e l ementos daq ue le ato o rig i ná­r io - e q u e i m peça o p rossegu i mento do p rocesso para a so l ução do o bj eto l i t ig ioso .

O ato j u ríd ico i n ic ia l pode se r vá l ido e, a inda ass im , se r decretada a i nadm is ­s i b i l i dade do p roced imento . É q u e, confo rme visto, a val idade de u m ato-co m p lexo pode ser i nvest igada d u rante toda a execução desse ato, q u e é com posto por vár ios atos . Mas somente com p romete rão o proced i mento, e por isso podem ser cons i ­de rados req u i s itos p rocessuais , os fa tos que di3am respeito à demanda ori3inária: relacionados ao autor, ao juízo ou ao objeto liti3ioso.

Nem todo ato p rocessual defe ituoso pode red u ndar em um ju ízo de i nad m iss i ­b i l idade do p rocesso: é p rec iso que o defeito deste ato i m peça que o objeto liti3ioso seja ap rec iado - e i sso só acontece q uando o ato p rocessua l está dent ro da cade ia de atos do p roced i mento p r i nci pa l , estrutu rado para dar res posta ao q uanto foi de­mandado. Se n ão com p rometer a ap reciação do mérito do p roced imento pr inc i pa l , não poderá se r cons ide rado req u i s ito de val i dade do p rocesso: ou será um req u i s ito de val i dade do ato p rocessua l i so ladamente cons iderado, ou será req u i s ito de ad­m i ss i b i l i dade de um p roced imento i n c identa l o u recu rsal .

U m exem p lo ta lvez seja esc larecedor. A com petênc ia é req u i s ito de val i dade do p rocesso (" p ressuposto p rocessua l" de val i dade) . A com petência para a reconven ­ção, p roced imento i n ci dental , não é " p ressuposto p rocessua l" de val i dade, em bora seja u m req u i s i to de ad m i ss i b i l idade do i n c idente do p rocesso: a i n co m petênc ia do j u ízo para ap rec iar a reconvenção não i m pede que e l e ap rec ie a demanda p ri n c i pa l .

3. ALGUNS 11MITOS11 SOBRE OS PRESSU POSTOS PROCESSUAIS

Há, a i nda, ci n co " m itos" sob re os p ressu postos p rocessuais q u e devem ser com batidos .

1 ) Nem toda fa lta de pressuposto processual leva ao juízo de admissibilidade

do processo . Basta pensar na i n com petênc ia, cujo recon h ec imento l eva à rem essa

dos autos ao j uízo com petente, e no i m ped i mento ou suspe ição, cu jo reco n h ec i ­

mento l eva à remessa dos autos ao j u iz su bst ituto (art. 1 46, §5o , CPC) .

6 . N o q u e se refere ao j u iz, fala-se de com petência, em vez de capacidade .

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

2) Nem toda fa lta de pressuposto processual pode ser conhecida de ofício . Basta pensar na i n com petênc ia re lativa (art . 64, § 1 o; art. 3 3 7 , § so, CPC), na existênc ia de convenção de arb itragem (art . 3 37 , § so, CPC) e n a falta de auto rização do cônj uge para a p ro pos i tu ra da ação real imob i l i ár ia (art . 1 . 6so, Código C iv i l ) .

3) Nem toda fa lta de pressuposto processual pode ser conhecida a qua lquer tempo ou wau de jurisdição. Basta pensar na a legação de convenção de arb i t ragem e na al egação de falta de c itação; se o réu contestar e não a s a legar, há p rec lusão.

4) Nem toda falta de pressuposto processual é defeito que não pode ser cor­rigido. Ao contrár io, a regra é a de q u e se deve ap l i car, ao exame dos p ressu postos p rocessuais , o s i stema de i nval idades do CPC, segu ndo o qual se deve bu scar, sem p re, a correção do defeito p rocessua l , mesmo q u e se t rate da falta de u m p ressu posto p rocessua l . Rem etemos o l e itor aos capítu los sob re as no rmas fu nda­mentais do p rocesso civi l ( p ri n cíp io da p rimaz ia da decisão de mé rito) e i nval idades p rocessua is .

5) Nem toda fa lta de um pressuposto processual impede a decisão de mérito. O art. 488 do CPC é c laro ao determ i nar q ue, mesmo havendo u m defeito no p roces­so, o j u iz não deve levá- lo em cons ide ração, se a causa pude r ser j u lgada no mérito em favor daq ue le que se benef ic iar ia com a decisão de i nad m iss i b i l idade . Ass im , se a peti ção fo r i n epta em razão da existênc ia de um pedido indeterminado (art. 3 30, § 1 o, 1 1 , CPC), mas a demanda pude r se r j u l gada i m p rocedente, o j u i z deve ignorar o defeito e j u lgar o mérito .

4. A CLASSIF ICAÇÃO PROPOSTA

Existem i n ú meras c lass if icações dos " p ressu postos p rocessua is" , a lgu mas bastante con hec idas, como a de Ga lena de Lacerda. ? Todas e las têm o o bjetivo de fac i l i tar a v isua l ização das d iversas f igu ras encartáve i s sob esta ru b rica . Toma-se a c lass if i cação de José Or lando Rocha de Carva l ho com o base,8 não apenas po r ser a ma is coerente, mas po rq u e se rep uta o t raba l ho q u e mais bem ident i f icou as d iver­sas n uances da q uestão .

Sucede q ue, a part i r do Código de P rocesso Civi l de 201 s, houve a necess idade de serem fe i tos a lgu n s aj u stes n esta s istemat ização .

N ão há ma io res i n conven ientes e m segu i r esta ou aq ue la c lass i f icação: isto é o que menos i m po rta. O o perado r deve atentar, no entanto, para as conseq u ­ências advi ndas do des respe ito a este o u aq ue le " p ressu posto" : se i nval i dade o u

7 . Despacho saneador. Porto Alegre: L ivraria S u l i na, 1 953 , p . 6 o e segs. 8 . Teoria dos pressupostos e dos requisitos processuais. R io de jane i ro : Lu men j u ris , 2005.

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F R E D I E D I D I E R J R .

i n existên c ia; se afeta todo o p roced i mento ou apenas u m(ns) ato(s) i so lado(s) . Feita a advertênc ia, e is a c lass i f icação p roposta, com algu mas adaptações .

"Pressupostos

processuais"

Pressupostos de existência

Req u isitos de validade

{ J u iz - Órgão i nvest ido de j u r isdição Su bjetivos

Parte - Capac idade de ser parte

O bjetivos - Existênc ia de demanda

Su bjetivos

O bjetivos

{ J u iz - Com petênc ia e i m parc ia l idade

Partes - capacidade p rocessua l , capacidade postu latór ia e legit i m idade ad causam

l lntr�nsecos - res peito ao forma l i smo p rocessual

Extnnsecos • negativos: i n existência de perempção, l i t i spen­

dência, co isa j u lgada ou convenção de arbitragem • posit ivo: i nteresse de agi r

5. PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS SUBJ ETIVOS

5.1 . Capacidade de ser parte

A capacidade de ser parte é a pe rsona l idade j ud i c iár ia : apt idão para, em tese, ser sujeito de uma re lação j u ríd ica p rocessua l ( p rocesso)9 ou assu m i r u m a s i tuação j u ríd ica p rocessual (autor, réu , ass i stente etc . ) . 1 0

De la são dotados todos aq ue les que ten ham persona l idade civi l - ou seja, aq ue les q u e podem ser suje i tos de uma re lação j u ríd ica mater ia l , com o as pesso­as natu rai s e as j u rídi cas -, com o tam bém o nasc i t u ro, o condomín io , o nondum conceptus,, a soc iedade de fato,, sociedade não -person if icada e soc i edade i rregu ­lar ' 3 - as t rês f igu ras estão reu n idas sob a ru b rica soc iedade em com u m, art. 986

9 . M I RAN DA, Franc i sco Cavalcant i Pontes de . Comentários ao Códi30 de Processo Civil. 5' ed . R io de jane i ro : Fo­

rense, 1 997, t . I , p . 222; ROSENBERG, Leo. Tra tado de derecho procesaf civil. Buenos Aires : Ed ic iones j u r íd icas

E u ropa-America, 1 955 , t . 11 , p . 230 . 1 0. M ELLO, Marcos Bernardes de . "Achegas para uma teor ia das capac idades em d i re ito" . Revista de Direito Priva­

do. São Pau l o : RT, 200 1 , n . 03, p . 26. 1 1 . Art. 1 . 799, I , do Código Civi l . Ver, sobre a capacidade de ser parte do nondum conceptus, MELLO, Marcos Bernardes

de. " Achegas para uma teoria das capacidades em d i re ito". Revista de Direito Privado. São Pau lo : RT, 200 1 , n . 03, p . 27 . 1 2 . Es ta noção ab rangente adm ite a capac idade de ser parte a centros acadêm icos ou grêm ios estudant is não i ns ­

c ritos no Cartór io de Pessoas j u ríd i cas, a lém de aos m ov imentos socia is o rgan izados como o MST (Movi mento dos Sem-Terra).

1 3 . "A d i st i nção ent re soc iedade i rregu lar e soc iedade não person if icada cons iste em que essa é uma soc iedade regu la rmente const ituída, mas a inda não i nsc rita no reg istro d e pessoas j u ríd icas, enq uanto aque la é so­c iedade em que seu ato constitutivo não pode ser reg istrado por víc i o i n sanáve l . D i fere a inda da chamada

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

do Cód igo Civi l - , os en tes fo rmais (com o o espó l i o, massa fa l i da, h e rança jacente etc.) , as com u n idades i ndígenas ou gru pos tr iba is ' 4 e os ó rgãos púb l icos (M i n i stér io P ú b l i co, PROCON, Tri b u na l de Contas etc . ) . ' 5

A capac idade de se r parte deco rre da garant ia da i nasfastab i l i dade do Pode r j u d ic iá rio , p revista no i n c iso XXXV do a rt . so da CF/88.

Trata-se de noção abso l uta: não há a lguém q u e ten ha m eia capac idade de ser parte; ou se tem ou não se tem persona l i dade j u d ic iária .

A i n capacidade de se r parte pode ser argu ida a q ua l que r tem po, po i s "enquanto não cessa a aparente relação j u ríd ica p rocessua l em q u e f igurou o mo rto, o u o n u n ca exist ido, o u a soc iedade i n existente, é possível ped i r- se a ext i n ção do processo" ' 6 •

Não se exige, para que o p rocesso exi sta, a capacidade de ser parte do réu . N em m e s m o a existênc ia de réu ident i f icado na petição i n ic ia l pode s e r cons iderada um p ressu posto de existênc ia do p rocesso.

P rime i ro, po rq u e há p rocesso sem réu, como oco rre em d ive rsas h i póteses de j u ri sd i ção vo l u ntár ia (ped ido de a lteração de nome, por exe m p lo) .

Segu ndo , po rque o p rocesso nasce com a demanda, e não com a p resença do réu em j uízo .

Te rce i ro, po rque caso o autor p roponha demanda sem i n d icar o réu , o magis­t rado o i nt imará para regu la rizar a peti ção i n ic ia l e, depo i s, se não o f izer, exti ngu i rá o p rocesso po r defeito do i n st rumento da demanda .

A exi stênc ia do réu é fundamental para a ef icácia do p rocesso em face de le, n ão para a existênc ia dessa mesma re lação j u ríd ica. D iante da i n exi stênc ia de réu , deve o magistrado, sem aná l i se do mé rito, exti ngu i r o p rocesso, q ue j á existe, po r falta de req u i s ito p rocessua l de val idade, q u e é a form u lação co rreta da demanda. A existênc ia do réu é fu ndamental para a efi các ia da sentença contra e l e p rofer ida: se o réu já estava m o rto, e não foi p rovidenciada a sucessão, a sentença será i n ef i caz para os s ucessores . A existênc ia de réu é tam bém fundamental para a existênc ia

soc iedade de fato, u m a vez q u e essa se caracter iza po r n ã o t e r natu reza j u ríd i ca, mas, po r s e r grupo de

pessoas q u e, em bora desenvolvam at iv idade com objetivo comum, não têm intenção de soc iedade". (MELLO, Marcos Bernardes de. "Achegas para uma teoria das capacidades em d i re i to" . Revista de Direito Privado. São Pau lo : RT, 200 1 . n . 03, p . 26 . )

1 4. Art . 37 da Lei n . 6 .00 1 / 1 973 (Estatuto do Índ io) : "Os grupos t r iba is ou com u n idades i nd ígenas são partes le · gít i mas para a defesa dos seus d i reitos em j u ízo, cabendo - l hes, n o caso, a ass istênc ia do M i n istér io Púb l i co Federal ou do ó rgão de p roteção ao índ io" .

1 5 . Por i sso , é co rreto afi rmar q u e há um n ú m e ro maior daq ue les q u e podem se r parte do que daque les q u e são pessoas. O con ju nto daq ue les que podem s e r parte contém o conjunto daq u eles q u e t ê m persona l idade j u ríd ica de d i re ito mater ia l (são pessoas : fís ica ou j u rídica).

1 6 . M I RAN DA, Franc isco Cavalcant i Pontes de . Comentários ao Códiso de Processo Civil. 5' ed. R io de jane i ro : Fo· rense, 1 997 , t . I , p . 238 .

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do ato p rocessual c itação, q u e o t em com o e l emento de exi stênc ia : é p ressu posto de existênc ia do ato c itação . Se o réu falece após a sua c itação, é caso de p roceder à sucessão p rocessua l , na fo rma do art . 1 1 0 do CPC . Tudo o que foi d i to ap l i ca-se à ext i nção de pessoa j u ríd i ca, q u e equ ivale à sua mo rte .

5.2. Existência de órgão investido de jurisdição

A i nvesti du ra na função j u risd ic ional é p ressu posto de existênc ia do p rocesso e dos atos j u rídicos p rocessuais do j u iz (decisões, despachos, co lheita de provas etc .) .

Cons iderar-se-á i n ex istente o p rocesso se a demanda fo r aj u izada perante não­-j u i z e decisão pro latada por não-j u i z é uma não-dec i são, é apenas um s i m u lacro a q u e não se pode e m p restar qua l que r efi cácia j u ríd ica. São exem p los de não-j uízes : aq ue le que não foi i nvest ido de j u r isd ição pe la posse n o cargo, em v i rtude de no­meação ou concu rso; aq ue le q ue, em bora ten h a p restado concu rso o u ten h a s ido nomeado, a i nda não tomou posse; o magistrado aposentado ou em d i spon i b i l idade; aq ue le que não foi des ignado como árb itro pe la convenção de arb itragem .

Cum pre l embrar q ue, conforme visto no capítu lo sobre com petênc ia, para algu ns autores a " i n com petênc ia const itucional" i m p l i ca i n existênc ia de j u ri sd ição e, portan­to, a decisão porventura p ro latada ser ia a non judice (uma não-sentença, pois) .

5.3. Pressuposto processual objetivo: a existência de ato inicial do procedi­mento que introduza o objeto da decisão

O terce i ro pressu posto p rocessua l é a exi stênc ia de demanda, q u e n esse caso deve ser com p reend ida como cont i nente (o ato de ped i r) e não como conteúdo (aq u i l o que se pede) .

O ato de ped i r é necessár io para a i n stau ração do p rocesso - é o seu fa to jurídi­

co . Ao d i r ig i r-se ao Poder j u d ic iário , o auto r dá o rigem ao p rocesso (art. 3 1 2 do CPC);

a sua demanda de l i m ita a prestação j u ri sd i c iona l , q ue tem o ped ido e a causa de

ped i r como os e l ementos do seu o bjeto l i t ig ioso . Se o ato i n i c ia l não trouxer ped ido

(art . 3 30, I , c/c § 1 0, I , do CPC), o caso é de exti n ção do p rocesso por i nad m i ss i b i l i ­

dade do p roced imento, em razão de defeito do ato i n i c ia l .

6. REQU IS ITOS PROCESSUAIS SUBJETIVOS DE VALIDADE

6.1 . Capacidade processual

6. 7 . 7. Generalidades

A capacidade p rocessua l é a apt idão para p raticar atos p rocessua is i n dependen ­temente de ass istê nc ia ou rep resentação (pais , tutor, c u rador etc.), pessoal mente,

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

ou po r pessoas i nd i cadas pe la le i , ta is como o sínd i co, ad m i n i st rador j u d ic ia l , i nven ­tar iante etc. (art. 7 5 do CPC) . ' 7 "A capacidade p rocessua l o u de estar em j uízo d i z res peito à p rát i ca e a recepção eficazes de atos p rocessuais , a começar pe l a peti ção e a c itação, isto é, ao ped i r e ao ser c i tado" ' 8 •

A capac idade processua l p ressu põe a capacidade de se r parte . É possível ter capac idade de se r parte e não ter capac idade p rocessua l ; a recíp roca, porém , não é verdade i ra .

Há u m a estreita re lação entre a capacidade p rocessua l e a capac idade mater ia l (capac idade de exe rcíc io) , conforme demonst ra a regra do a rt . 70 do CPC . N o entan ­to, são capacidades autônomas e d i st i n tas ' 9 • O sujeito pode ser processua lmen te ca­

paz e ma teria lmente incapaz ou processualmen te incapaz e materia lmen te capaz.

Há i n capacidade p u ramente p rocessua l , com o nos casos do i n ci so 1 1 do art. 72 do CPC, q u e i m põem a n o meação de cu rado r espec ia l . Isso tam bém oco rre nos casos das rest r ições à capacidade p rocessual das pessoas casadas, exam inadas mais à frente .

Nada i m pede, tam bém, que a l e i cr ie s i tuações de i n capacidade mater ia l e capacidade p rocessual p l e na, com o aq ue la q u e há até bem pouco tem po oco rr ia no âm bito dos j u izados Espec ia is : confer ia-se capacidade p rocessua l p l ena ao ma io r de dezoito anos , q ue, até jane i ro de 2003, i n ício da vigênc ia do Cód igo Civi l de 2002, e ra re lat ivamente i n capaz. O i n capaz sem rep resentante, por exe m p lo, tem capacidade p rocessua l para pedir a des ignação de um cu rador especia l q u e o rep resente (art. 72, I , do CPC); o i nterdito tem capac idade processua l para ped i r o levantamento da i n terd i ção (art. 7 56, § 1 o, CPC)20• Do mesmo modo, um c idadão-e le i tor com dezesseis anos, em bora relativamente i n capaz n o âmb ito civi l , tem p l ena capacidade p roces­sual para o aj u izamento de uma ação popu lar.

As pessoas j u ríd icas p rec isam estar regu la rmente "p resentadas" e m j u ízo (art. 75 do CPC); n ão se trata de rep resentação, razão pe la qual é "grave equ ívoco a afi r­mação de q u e as pessoas j u ríd icas ser iam p rocessua lmente i n capazes" . 2 1 Os casos

17 . M E LLO, Marcos Bernardes de . "Achegas para uma teor ia das capacidades e m d i re i to" . Revis ta de Direito Priva­do. São Pau l o : RT, 200 1 , n . 03, p . 3 1 .

1 8 . M I RAN DA, Franc isco Cava lcant i Pontes de . Comentários a o Códi3o de Processo Civil. 5 • ed. R i o d e j ane i ro : Foren­se, 1 997, t . I , p . 238 . Ver, tam bém, ROSENBERG, Leo. Tratado de derecho procesal civil. Buenos A i res : Ed ic iones j u ri d i cas E u ro pa-Amer ica, 1 955 , t . 1 1 , p . 241 .

1 9 . Percebeu o ponto, fazendo refe rênc ia a s i tuações pecu l i a res do d i re ito ital iano, P I SAN I , And rea P roto. Lezioni di diritto processuale civile. 4• ed . Napol i : jovene Ed itore, 2002, p . 303 .

20. M I RAN DA, Franc isco Cavalcant i Pontes de . Comentários ao Códi3o de Processo Civil. 2• ed . R io de jane i ro : Fo­rense, 2008, t . XVI, p . 299 e 3 2 5 .

2 1 . M ELLO, Marcos Bernardes de . "Achegas para uma teor ia das capacidades em d i re i to" . Revista de Direito Priva­do. São Pau l o : RT, 200 1 , n. 03, p. 3 1 . Também ass im , M I RAN DA, Francisco Cavalcant i Pontes de . Comentários ao Códi30 de Processo Civil. 5• ed . R io de jane i ro : Forense, 1 997, t . I, p. 239 .

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F R E D I E D t D I E R J R .

do art. 7 5 do C P C i n d icam tanto h i póteses de rep resentação (V, V I , V i l , IX e X I ) como de p resentação ( 1 , 1 1 , 1 1 1 , IV, V I , V I I I , X) .

"Obse rve-se q ue, na com parênc ia da parte por um ó rgão, não se t rata de representação, m as de presentação . O ó rgão p resenta a pessoa j u ríd i ca : os atos p rocessua i s do ó rgão são atos de la, e n ão de representante . (. . . ) De modo q u e h á a p resen tação (de d i re i to m ater ia l ) e a rep resentação p rocessua l , n ecessari ame nte sem atua­ção em causa p róp ria : o ó rgão p resenta, m ater ia l men te; e, p roces ­s ua lm ente , tam bém p resenta .

As pessoas j u rídi cas . . . p rec isam ter ó rgãos, tanto q uanto as pessoas fís i cas p rec isam ter boca, ou, se não podem fa lar, mãos, ou out ro ó rgão, pe lo q ua l expr i mam o pensamento o u o sent i mento . O ó rgão da pessoa fís ica - a boca, por exem p lo - fá- la presente a uma reu n i ão, na p raça púb l i ca, no teatro, no tabe l i onato, ou no j uízo. A p resença pode bem se r com a s imp les assi natu ra, se a pessoa fís ica não pode o u não q ue r fa lar . . . Os d i reto res das pessoas j u ríd i cas que ass i nam a dec laração u n i l ate ral de vontade, o u a dec laração b i l atera l ou m u lt i la­tera l de vontade, não estão a p rat icar ato seu, pelo q ua l rep resentem a pessoa j u ríd ica. Estão a p resentá- las, a fazê- l as p resentes" ."

A rep resentação do espó l i o é feita pe lo i nventar iante ( i n ci so V I do art . 7 5 ) . Quando o i nventar iante fo r dativo (art . 6 1 7 , V I I I , CPC), "os sucessores do fa lec ido se rão i nt imados no p rocesso n o q ua l o espó l io se ja parte" (§ 1 ° do art . 7 5 do CPC) . A ressalva me rece uma exp l i cação : nos casos de i nventar iante dativo, os he rde i ros são i n t imados para poder acom panhar o andamento do p rocesso e, ass im , poder f isca l izar a atuação do i nventariante, q ue é pessoa estran ha à famí l ia .

A soc iedade ou associação i rregu lares se rão p resentadas em j uízo pe la pessoa a quem couber a ad m i n i st ração de seus bens (art. 7 5, V I I I , CPC) . Registre-se que o CPC atua l acrescenta as associações de fato, a lém das soc i edades; opção co rreta: n em todo agru pamento de fato tem f i nal i dade l u c rativa (soci edade); os m ovi mentos sociais e ent idades de rep resentação estudant i l podem ser exem p los de associa­ções de fato . Para evitar abuso do d i reito por parte desses entes despersona l i zados, p roíbe-se q ue, uma vez demandados, opon ham, como defesa, a i rregu lar idade de

sua p róp ria constit u i ção (art. 7 5 , § 2°, CPC) . É regra que p rotege a boa-fé p rocessual , como se observa faci l m ente.

Consoante o d i sposto no § 3° do art . 75 do CPC, "o gerente da f i l ia l ou agên ­

c ia p resu m e-se auto r izado pe l a pessoa j u ríd ica estrange i ra a receber c i tação para

q ua lq ue r p rocesso" .

2 2 . M I RAN DA, Franc isco Cavalcant i Pontes d e . Comentários a o Códi!JO d e Processo Civil. 5 e d . R i o de jane i ro : Fore n ­

s e , 1 997, t . I , p . 2 1 9 -220.

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Os Estados e o D i str ito Fede ral poderão aj ustar com p ro m isso recíp roco para p rática de ato p rocessua l po r seus p rocu rado res em favo r de outro ente federado, med iante convên i o fi rmado pe las respectivas p rocu rado rias (art . 75 , §4° , CPC) . H á, aq u i , bom exemp l o de n egóc io j u ríd ico p rocessua l .

Os §§ 1 o e 2° do art. 242 do CPC cu idam de s i tuação em que se p res u m e a re­p resentação p rocessual do réu : a) na ausênc ia do réu , é possíve l citá- l o na pessoa do seu mandatár io, ad m i n i st rado r, p reposto o u gerente, q uando a ação se o rig i na r de atos po r e les p rati cados; b) na ausênc ia do locado r, q ue sai u do B ras i l sem c ien ­t i f icar o locatár io de q u e de ixou, na loca l idade em que se s i tua o imóvel , p rocu rador com poder para receber c itação, é possível citá- l o na pessoa do ad m i n istrado r do i m óve l encarregado de receber os a lugué is .

C ita-se o c u rador des ignado, com nomeação restrita à causa, q uando o réu sofrer de a lgu m d is tú rb io ou estive r i m poss i b i l i tado de receber a citação (art. 245, § 5°, CPC) .

O s entes despersona l izados, q u e são ad m it idos co m o parte, m as q u e não constam do ro l do art. 75 , se rão rep resentados ou p resentados em j u ízo por aq ue ­l a pessoa que exe rça as fu nções de ad m i n i st ração, gerên c ia, d i reção, l i d e ran ça, conforme se con state no caso con c reto . Exe m p los : a Câmara de Ve reado res se rá p resentada po r seu p res idente; a fac u ldade, po r seu d i reto r; a t r i bo o u gru po t r i ­ba l , pe l o seu caci q u e etc .

6. 1 .2. Possíveis consequências da incapacidade processual

A capacidade p rocessua l é req u i s ito de val idade dos atos p rocessua is e a sua falta é sem p re sanáve l , n a fo rma do art . 76 do CPC .

D ian te de u m a i n capacidade p rocessua l , deve o ó rgão j u ri sd i c iona l conceder p razo razoável para que seja sanado o vício (art. 76, caput, CPC) .

A não co rreção da i n capacidade p rocessua l gera conseq uênc ias d ive rsas, con­fo rme se t rate do autor (ext i n ção do p rocesso, se fo r ú n ico; em caso de l it isconsór­c io , exc l u i - se o autor i n capaz), réu (p rossegu imento do p rocesso à sua reve l ia) e terce i ro (exc l u são do p rocesso), confo rme o art. 76, § 1 o, CPC . O regramento ap l i ca­-se, i n c l us ive, em grau de recu rso (art. 76, § 2°, CPC) : se a i n capacidade p rocessua l ao reco rrente não fo r s u p rida, o recu rso não será con hec ido; se a i n capacidade p rocessua l do recorrido não for s u p rida, as suas contrarrazões de recu rso serão desentran h adas dos autos do p rocesso.

N ão é co rreto, po is , afi rmar, perem pto r iamente, que a i n capacidade p rocessua l de q ualq ue r das partes red u nda na ext i n ção do p rocesso sem reso l ução do mé rito . Somen te a capacidade processual do autor pode ser vista como requisito processual de todo o procedimen to, pois a sua falta pode i m p l i car a exti n ção do p rocesso.

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A l é m d isso, deve-se l emb rar, confo rme será d ito no capítu l o sob re i n ­val idades p rocessuais , q u e há uma tendênc ia doutr i nár ia no sent ido de ap l icar aos " p ressu postos p rocessua is" o s istema das i nval idades do CPC, que veda a dec retação de n u l i dade se não h ouver p rej uízo. Ass i m , por exem plo , se o autor i n capaz não regu la riza sua rep resen ­tação processua l , mas é possível aco l h e r o s e u ped ido , não deve o magistrado exti ngu i r o processo sem exame de mé rito (art. 76, § 1 o, I , do CPC): deve aco l h e r o ped ido , determ i nando a cor reção do defeito de rep resentação apenas para a i n stânc ia recu rsa l , po rq ue a ausênc ia de rep resentação não causou p rej uízo ao demandante (a i n capacida­de é uma forma de p rotege r o i n capaz, l emb re-se) .

6.2. Capacidade processual das pessoas casadas

6.2. 1 . Consideração introdutória

O casamento é fato j u ríd ico q u e repercute de fo rma bastante s ign i f icativa no p rocesso civi l , ma i s especif icamente em re lação à capacidade p rocessua l das pes­soas casadas.

Essa capacidade p rocessua l possu i regramento p róp ri o : arts . 7 3 -74 do CPC.

Há re lação, no part icu lar, ent re o Código Civi l e o Código de P rocesso. Os arts . 7 3 -74 do CPC apenas repercutem o regramento já cont ido na legis lação mater ia l nos arts . 1 . 643 a 1 .648 do Código Civi l .

6.2.2. Capacidade processual dos cônjuges nas ações reais imobiliárias

6.2.2. 1 . O art. 1 .647 do Código Civil

o art igo 1 . 647 do Código Civi l ' 3 cu ida h i póteses de i l egit i m idade ( i n capacidade

para p rát ica de dete rm i n ado ato) : não tem o cônj uge legit im idade para, sem auto­

rização do outro, p rat icar os atos a l i arro lados .

I nteressa, neste momento, o i n c iso 1 1 desse art igo, que restri nge a capac idade

p rocessua l das pessoas casadas nas demandas rea is i mob i l i ár ias: a part ic i pação de

am bos os cônj uges, n essas h i póteses, é exig ida .

Essa restri ção da capacidade v isa protege r o patri môn i o imob i l i á ri o fam i l iar.

2 3 . Art. 1 . 647. " Ressa lvado o d i s posto no art. 1 . 648, n enhum dos cônj uges pode, sem autorização do outro, exceto

no regi me da separação abso l uta: 1 - a l ienar ou gravar de ônus real os bens i m óveis; l i - p le itear, como autor

ou réu, ace rca desses bens ou d i reitos; ( . . . )"

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6.2.2.2. A restrição da capacidade processual

O i n c iso 1 1 do art. 1 . 647 do Cód igo Civi l tem c u n h o e m i nen temente p rocessua l . Cu ida da capacidade p rocessua l das pessoas casadas, no po lo ativo, e da exigênc ia de l i t i sconsó rc io pass ivo, nas causas re l ac i onadas a d i re itos rea is imob i l iá r ios . O i n ­c iso tam bém se ap l ica à s causas q u e versam sob re d i re itos reais imob i l i ár ios sob re a co isa a l h e ia, po r força do i n ciso I deste mesmo art igo, q u e a e les faz refe rênc ia ("gravar de ônus rea l") . '4

Confo rme ressalvado no caput do art igo 1 . 647 do Código Civi l , não se ap l ica a exigên cia de part ic i pação do consorte q uando o casamento se de r em regi me de se­paração abso l uta de bens (arts . 1 68 7 - 1 688 do Código Civi l ) , l egal ou convenc ional ' s . "As vedações são ap l i cávei s aos regi mes de bens de com u n hão parc ia l , de com u ­n h ão un iversal e de part i c i pação fi na l de aq uestos" (art. 1 . 656 do Cód igo Civ i l)'6-'7, no ú lt imo caso se não houver acordo p ré- n u pc ia l em out ro sent ido - o acordo p ré- n u pc ia l pode ter ef icác ia p rocessua l , ao d i sc i p l i n ar, nesta parte, a capacidade p rocessua l do cônj uge; nesse sen tido, será um nesócio jurídico processual .

Trata-se de uma m udança p romovida pe lo Código C iv i l de 2002: é q ue, de aco r­do com o Código C ivi l de 1 9 1 6, havia exigênc ia de consent i m ento p révio do cônj uge para a p rát ica dos atos e n u merados n o art. 2 3 5 do código revogado, qualquer que fosse o resime de bens.

Em ha rmon i a com o Cód igo Civi l , o caput do art . 7 3 ex ige o consent i mento do cônj uge para a p ropos it u ra de ação que verse sob re d i re i to rea l , ressa lvada a hipó tese de o casamen to ser em resime de separação absoluta - repete-se o texto do Cód igo Civi l .

O côn juge somente p o d e demandar em j u ízo sob re u m d i reito real imob i l i ár io se o out ro lhe de r auto rização neste sent ido (art . 7 3 , caput, CPC) . "A locução legal é amp la e ab range, a l ém das ações d i retamente re laci onadas aos d i re itos rea is

24 . N E RY ) r. , Ne l son e N ERY, Rosa Mar ia . Códi30 de Processo Civil comentado e le3islação processual civil extrava-8ante em vi3or. 6• ed. São Pau lo : RT, 2002, p . 286.

25. THEODORO ) r. , H u m berto. O Novo Códi3o Civil e as re3ras heterotópicas de natureza processual. D ispon íve l e m : http://www.abdpc .org . b r/artigos/art ig052 . h tm , consu ltado em 22 . 1 0 . 2004, às 1 1 ho4. M igue l Real e tam bém entende q u e se não devem t ratar d i st intamente os regi mes da separação ob rigatór ia e da separação conven­c iona l (Estudos preliminares do Códi3o Civil. São Pau lo : RT, 2003 , p . 62·63) . Retif ica-se, ass im , o entend imento defend ido em D I D I E R ) r. , F red ie . Rewas processuais no Novo Códi30 Civil. São Pau lo : Saraiva, 2004, p . 1 1 7 - já na segu nda ed ição desta ob ra não consta mais a pos ição q u e restri nge a ressalva à separação convenc iona l .

26 . A r t . 1 . 656 do Cód igo Civi l : " No pacto ante n u pc ia l , que adotar o reg ime de part ic i pação f ina l nos aq uestos, poder-se-á convenc ionar a l iv re d i s pos ição dos bens imóveis , desde que part i cu lares".

27. LÔBO, Pau lo . Códi30 Civil Comentado. São Pau lo : Atlas, 2003, v. XVI, p . 258; PE IXOTO, Ravi de Mede i ros . " Res­tr ições à atuação p rocessua l dos cônjuges à l uz do art. 10 do CPC e das i n f l uênc ias do Código Civi l " . Revista Dialética de Direito Processual . São Pau l o : D ia lét ica, 201 3 , n. 1 2 1 , p . 1 45 . Em sent ido contrár io, N E RY ) r. , Ne l son e N ERY, Rosa Mar ia . Códi30 de Processo Civil comentado e le3islação processual civil extrava3ante em vi3or. 6• ed . São Pau lo : RT, 2002, p . 285 .

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F R E D I E D I D I E R J R .

cata logados" no Código Civi l , "q ua isq uer out ras, a i n da q u e i nd i retamente re lac io­nadas com aq ue les d i re itos", como as ações envolvendo h i poteca, a demo l itó ria, a d iv isória, a n u n ciação de ob ra nova etc . '8

Não é caso de litisconsórcio a tivo necessário, f igu ra, a l i ás , q ue não exi ste - n i n ­g u é m pode s e r ob rigado a demandar em ju ízo somente s e out rem tam bém ass im o desejar (art . 1 1 5 , par. ú n . , CPC) . '9 Trata-se de no rma q u e tem o objetivo de i ntegrar a capacidade p rocessua l ativa do côn juge demandante . "Dado o conse nti m ento i n eq uívoco, somente o cônj uge q u e i ngressa com a ação é parte ativa; o q u e outor­gou o consent i mento não é parte na causa" . Nada i m pede, porém, a fo rmação do l i t i sconsó rc io ativo, q u e é facu ltat ivo.

Quando a causa versar sob re d i reito real imob i l iár io , na co isa p róp ria ou em co isa a l he ia, am bos os cônj uges devem ser c itados (art . 73, § 1 °, I e IV, CPC) .30 Aq u i , d iversamente, trata-se de hipó tese de litisconsórcio passivo necessário .

O Código Civi l não cu idou do p rob lema da partic i pação dos cônj uges nas ações possessó rias (q ue não são demandas reais, pois o d i reito à p roteção possessór ia não é d i reito real , embora m u itas vezes com os d i re itos reais se re lacione) . O CPC t rata do assu nto no §2o do art . 7 3 : a partici pação do cônjuge, nestes casos, se restri nge às s i tuações de com posse e às causas que disserem respeito a ato por am bos p raticado. 3 '

H á duas o bservações i m po rtantes a fazer em torno desse §2° : a) em re lação ao po lo ativo, refe re-se exc lus ivamente às ações possessó rias imob i l i á rias, em bora não haja menção a essa q ua l idade no texto legal , q ue foi i nt rod uz ido pe la refo rma de 1 994 e mant ido no CPC atua l , exatamente para esc larecer a exten são do caput e do § 1 ° do art. 1 0 do CPC- 1 97 3, idênt icos aos co rrespondentes caput e § 1 o do art . 7 3 do C P C atua l , à s ações possessórias - e esses d i s pos it ivos, c o m o visto, somente s e refe rem à s ações imob i l i á rias; b) fala o d i s pos it ivo em " part ic i pação do côn juge", locução que deve ser i n terpretada à l uz dos outros e n u n ciados do art . 73 : n o po lo

28 . ASS IS , Araken de . "Su p r imento da i n capacidade p rocessual e da i n capacidade postu lató r ia". Doutrina e prática do processo civil contemporâneo. São Pau l o : RT, 200 1 , p. 1 27 .

2 9 . Em sentido contrário, cons iderando o caso c o m o d e l i t i sconsórc io necessár io, D IAS, Mar ia Beren ice . Manual de

direito das famílias. 6 . Ed. São Pau lo : RT, 20 1 0, p. 228. No sent ido do texto, ALV IM , The reza. O direito processual

de estar em juízo . São Pau lo : RT, 1 996, p . 27 -4 1 ; BARB I , Celso Agríco la . Comentários ao códi!Jo de processo civil.

10 ed. Rio de jane i ro : Forense , 1 998, v. 1 , p . 93; THEODORO J R . , H u m berto. Curso de direito processual civil. 42

ed . R io de jane i ro : Forense, 2005, v. 1 , p . 76; D I NAMARCO, Márc ia Conce ição Alves. " Lit isconsó rc io necessár io

ativo". O terceiro no processo civil brasileiro e assuntos correlatos: Estudos em homenagem ao Professor Athos

Gusmão Carne i ro . D ID I ER JR . , Fred ie et ali (Coords.) . São Pau lo : Saraiva, 201 0, p . 378-379 .

30. "A p revisão abrange tam bém as h i póteses de víncu los e restr ições i m postos pe lo testado r ou pe lo doador,

como i n al i enab i l idade, i m penho rab i l i dade e i n comun icab i l i dade . . . Aq u i não se trata de ação fundada em

d i re ito real, po is a causa de ped i r está restrita aos fatos q ue, no entende r do autor, reve lem a existênc ia ou

o d i reito à const i tu ição ou ext i nção de u m desses ônus . A p retensão não tem fundamento em d i re ito real" .

(BEDAQU E, José Roberto dos Santos. Códi!JO de Processo Civil In terpretado, c i t . p . 72 . )

3 1 . § 20 do ar t . 7 3 do CPC: " Nas ações possessór ias, a parti c i pação do cônjuge do autor ou do réu somente é

i nd i spensável nas h i póteses de composse ou de ato por am bos p rat icados".

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

at ivo, a " part ic i pação do cônj uge" dar-se-á pe lo consent i m ento;3 ' no po lo pass ivo, será exig ido o l i t i sconsórc io necessári o .

Nos casos menc ionados, poderá o cônj uge q u e não fo i o uvido : a) i ng ressar no p rocesso e ped i r a an u lação dos atos até então p rat i cados; b) aj u izar ação resc isór ia (art . 966, V, do CPC), se a demanda t ive r s ido aj u izada pe lo outro cônj uge sem o seu consent i m ento e já houve r trâns ito em j u l gado; c) aj u izar querela nullita tis (art . 525, § 1 °, I , CPC), se não t iver s ido c itado em ação rea l o u possessór ia imob i l i ár ia p ro posta contra o seu côn juge . 33

As restr ições ap l i cam-se a am bos os côn juges, sem q ua lque r d i st i n ção entre mar ido e m u l h e r.

Deve o art igo ser i nte rp retado restrit ivamente, porq ue se t rata de no rma q u e l i m ita o exe rcíc io de d i re i tos . 34

6.2.2.3. Forma e prova do consentimento

A le i não p revê fo rma para o consenti mento - diversamente do q u e fez com a ap rovação (art. 1 . 649, par. ún . , Cód igo Civi l ) , que é u m consent i mento conced ido poster i o rmente à p rát ica do ato.

O consentimento prévio é, a pri n cípio, ato de forma l ivre (art . 1 07 do Cód igo Civi l ) .

N ada i m pede, por exe m p lo, que a autor ização para a p ropositu ra de ação real imob i l iár ia (art . 1 . 647, 1 1 , Código Civi l ) seja dada na p róp ria peti ção i n ic ia l , e i s q ue, em re lação à p rova do consenti m ento, se ap l i ca a regra do a rt . 2 20 do Cód igo C iv i l , segu ndo a q ual "a an uênc ia o u a auto rização de o ut rem, n ecessár ia à val i dade de u m ato, p rovar-se-á do mesmo m odo q u e este, e constará, sempre q u e se possa, do p róp rio i n st ru mento" .

Há, po rém, o utros m e ios de p rova, por exem p lo : a) ass i natu ra da p rocu ração para o advogado que atuará na cau sa; b) docu mento cr iado com essa exc l us iva f i na l idade, q u e se rá anexado à pet ição i n ic ia l .

6.2.2.4. Aplicação à união estável documentada

Os arts . 7 3 - 74 se ap l i cam à u n ião estáve l com p rovada (art. 7 3 , § 3o, CPC) . Com p rovada é, aq u i , a u n ião estáve l regist rada, o q ue é possível nos termos do

3 2 . Em sent ido d iverso, para q u e m o d i sposit ivo contemp la " u m d o s poucos casos de l i t i sconsórc io necessár io at ivo", BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Código de Processo Civil in terpretado, c it . p . J3 .

33 . Sob re o cab imento, nestes casos de l i t isconsorte n ecessário não-c itado, de querela nullita tis e até mesmo de ação resc isó ria, ver FABRÍC IO, Adroaldo Fu rtado . "Réu reve l não citado, querela nullita tis e ação resc isór ia" . I n : Ensaios de direito processual . R io de jane i ro : Forense, 2003 . p . 243-268.

34. LÔBO, Pau lo . Código Civil Comentado. São Pau lo : At las, 2003, v . XVI , p . 258 .

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F R E D I E D I D I E R J R .

Provi mento n . 37/20 1 4 do Conse l ho Naci ona l de j u st iça. Ad m ite-se o regi stro da u n ião estáve l fo rmal izada por escri t u ra púb l i ca ou recon h ec ida por dec i são j ud i c ia l .

O registro da u n ião estáve l é facu ltat ivo. Como todo regi stro, sua ut i l i dade ma io r é dar pub l i c idade a terce i ros e, ass i m, resguardar a segu rança j u ríd ica.

A d i sso lução da u n ião estáve l não pode se r regi strada - esse registro não p ressu põe o p révio regi stro da exi stênc ia da u n ião estável (art. 7o do Provi mento n. 37/20 1 4 do CN J ) .

Não se pode ace itar a ap l i cação do d i spos it ivo à u n ião estável com p rovada por q ua lq ue r modo .

A exp l i cação é s im p les .

O tercei ro, neste caso, f icaria bem desprotegido, em razão da ausênc ia de regis­tro da un ião estáve l . Não se nega q ue, na s i tuação, haverá um conf l i to de i nteresses entre duas pessoas que podem estar de boa-fé: o terce i ro e o com pan he i ro enganado. Um dos do is haveria de ser p rest ig iado. No caso, p rotege-se o te rce i ro .

É q u e, se não há registro da exi stênc ia da u n ião estável , embo ra a p u b l i c idade da relação seja u m req u i s i to para a conf igu ração desta ent idade fam i l i a r, real men ­t e torna-se d i fíc i l a o tercei ro p roteger-se de eventua is p rej u ízos, não se podendo ap l i car esse regi me p rocessua l espec ia l aos com pan he i ros . 35 O p rob l ema aumenta de taman ho q uando se percebem as d i fi cu ldades de estabe lecer, com p reci são, os l im ites tem po ra is da u n ião estáve l - desde q uando a re lação pode ser cons iderada como j u r id i camente tute lada, a exigi r a parti c ipação do com panhe i ro na p rát ica dos menc i onados atos ? A segu rança j u ríd i ca f ica sob remodo com p romet ida . Nesse caso, assegu ra-se ao com pan he i ro(a) p rej ud i cado o d i reito de regresso contra a sua com pan he i ra(o) .

6.2.2.5. O controle da ilegitimidade processual do cônjuge

De acordo com art . 1 . 649 do Código Civi l , somente o cônj uge p rete ri do tem legit i m i dade para p le itear a i nval i dação do ato p rat i cado sem o seu consent i mento . 36 Não pode o magistrado i nval idar a demanda sem que o cônj uge p rete r ido o p ro­voque - e isso mesmo se o réu apontar a fa l ta de com p rovação do con sent i mento .

35 . BEDAQ U E, J o sé Roberto dos Santos. Código de Processo Civil interpretado, c it . , p . 7 1 ; TEPED I N O, G ustavo, BARBO­

ZA, H e l oísa H e l e n a, M O RAES, Mar ia Ce l i n a Bod i n de (coord . ) . CódiBO Civil Interpretado conforme a Constituição

da República. R io de Jane i ro : Renovar, 2004, v. 1 , p. 455 -456 .

36 . Art . 1 . 649 do Cód igo C iv i l : "A fa lta de auto rização, não s u p rida pe lo j u iz, q uando necessár ia (art . 1 . 647), tornará

anu lável o ato p raticado, podendo o outro côn juge p le i tear- l h e a anu lação, até dois anos depo is de termi nada

a sociedade conj uga l" .

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

O CPC não cu idou do assu nto .

É p rec iso conj ugar o Cód igo Civi l e o D i re ito P rocessua l .

Não p rovado o consent i mento, deve o j u iz i n t imar pessoa lmente o côn juge su postamente p reteri do para, que rendo, man ifestar-se sob re a questão . O s i l ênc io do cônj uge i m porta consent i mento se não respond ida essa i n t imação (art. 1 1 1 do Cód igo Civi l ) .

Em bora o j u iz não possa i nval idar ex ofticio o ato, tem o dever de p rovocar o cônj uge supostamente p rete r ido, cujo s i l ênc io é i nterpretado como consent imento tácito . O cônj uge poderá, ai nda, rat if icar os atos p rati cados ou n egar expressamente o con sent i mento, q uando então o p rocesso poderá ser exti nto sem exame do mé ri ­t o , em razão da sua i nval i dação.

6.2.2.6. Suprimento judicial do consentimento (art. 74 do CPC e art. 7 .648 do Código Civil)

O magistrado poderá s up ri r o consenti mento de u m dos cônj uges, se houver recusa sem j u sto motivo ou q uando fo r i m possível ao cônj uge concedê- la (art. 1 . 648 do Cód igo Civi l 37 e art . 74 do CPC) .

Não há como conce i tuar, abstratamente, o que seja j u sto motivo . Será n o caso conc reto, d iante das pecu l i ar idades da s i tuação que se lhe ap resenta, que o j u iz ave r iguará a re levânc ia do motivo da recusa do consent i mentoY

A i m poss i b i l i dade de concessão do consent i mento, n o entanto, é s i tuação o bjetiva: toda vez que um dos cônj uges não pude r dar o conse nti mento, em razão de i m poss i b i l idade fís i ca, permanente ou tem po rár ia, poderá o magi strado su p ri r a outorga. É o q u e pode ocorrer quando u m dos cônj uges est iver g ravemente e nfe rmo ou desaparec ido, ou q uando u m de les estive r servi ndo o país em u ma gue rra.

O ped ido de sup rimento j ud ic ia l da outo rga se rá p rocessado de acordo com as regras da j u r isd ição vo l u ntár ia. Adotar-se-á o p roced i m e nto regu lado nos arts . 7 1 9 - 725 do CPC . O out ro cônj uge deverá ser c i tado, sob pena de n u l i dade, po is é i nteressado (art. 7 2 1 do CPC) . Quando não pude r man i festar-se (caso de i m poss i b i ­l i dade de con cessão da auto rização, por exem plo) , deverá o magistrado nomear- l h e c u rador espec ia l , a fi m de resguardar os seus i n teresses (art. 7 2 , CPC, ap l i cado po r

3 7 · Art. 1 .648 do Código Civi l : "Cabe a o ju iz, n o s casos d o artigo antecedente, sup r i r a outo rga, q uando um dos cônjuges a denegue sem motivo j u sto, ou l h e se ja i m possível concedê- la" .

38 . Tam bém neste sent ido, S I LVA, Regi na Beatr iz Tavares da. Novo Códi!Jo Civil Comentado. São Pau lo : Saraiva, 2002. p . 1 .461 . E is os exe m p los de Pau lo Lôbo: a) q uando se p rova que o ato é vantajoso ou necessár io para am bos os côn juges ou para a famíl ia; b) q uando o ato de l i b e ra l idade (fiança, aval e doação) não leva a r iscos desarrazoados ao patri môn i o fam i l i a r (Códi!Jo Civil Comentado, p . 258).

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F R E D I E D I D I E R J R .

ana logia) . Da dec isão q u e conceder o u negar o ped ido, caberá ape lação (art. 7 24, CPC) . Em s i tuações de u rgênc ia, é possível a concessão de tute la p rovi só ria .

Cabe ao magi strado (j uízo s i ngu lar) com com petên cia mater ia l para as causas de famí l ia o su p ri m ento do consent i mento .

C u m pre advert i r, porém, que a com petência terr i tor ia l será a do dom icí l i o do côn juge que se recusa ou está i m poss i b i l i tado de fo rnecer o consent i mento (ap l i cação ana lógica do d i s posto no art . 46 do CPC). Esse ped ido de s u p ri mento deve se r fe i to antes do aj u izamento do p rocesso, no rma l mente; em caso de u rgên ­c ia, é possíve l o aj u izamento sem o s u p ri mento, ped i ndo ao j u iz da causa p razo para com p rová- lo . Se o j uízo com petente para a causa tam bém o fo r para s up ri r o consent i mento, nada i m pede q u e, já na peti ção i n i c ia l , se peça o s u p rimento da outorga. N este caso, i m p resci ndível a i n stau ração de um i n cidente p rocessua l , em que seja o uvido o outro cônj uge - q uando isso fo r possíve l . Esse i n c idente deve suspender o p rocesso .

6.2.3. Dívidas solidárias e litisconsórcio necessário entre os cônjuges (incisos 11 e

111 do § 7 o do art. 73 do CPC)

Os i n c isos 1 1 e 1 1 1 do § 1 ° do art . 7 3 do CPC t razem d uas regras q u e reve lam u m a desarmon i a ent re o d i re ito processua l e o d i re ito mate r ia l : i m põem o l i t i sconsó rc io n ecessár io pass ivo en t re os côn juges, q uando deman dados por dívidas so l i dár ias .

A so l i dar iedade pass iva dos cônj uges, nos casos p revistos naq ue les i n c isos, possu i um regramento p rocessua l d iverso daq ue le p revisto para a gene ra l i dade das ob rigações so l i dár ias : o c redor não pode esco l h e r um dos devedores para deman ­dar, sendo e les casados en t re s i - ret i ra-se, aq u i , o benefíc io do art. 2 7 5 do Código Civi l . 39 o CPC i m põe o l i t i sconsórc io n ecessár io sem norma de d i re i to mater ia l q u e dê q ua lq ue r i n d i cação nesse sent ido .

E i s as h i p óteses .

P ri m ei ramente, o i n ci so 1 1 i m põe o l i t i sconsó rc io q uando se tratar de demanda

resu ltante de fatos q u e d igam respeito a am bos os cônj uges ou de atos p rat i cados

por e les . São causas de responsab i l i dade civi l . O art . 942 do Cód igo Civi l p revê a res­

ponsab i l i dade so l i dár ia de todos os coauto res da ofensa.40 H á so l i dari edade passiva

39 . Art. 275 do Cód igo Civi l : "O c redo r tem d i re ito a exig i r e receber de u m ou de algu ns dos devedores, parc ia l

ou tota lmente, a dív ida comum; se o pagamento t iver s ido parc ia l , todos os demais devedores cont i nuam

ob ri gados so l i dar iamente pe lo resto".

40. Art. 942 do Código Civi l : "Os bens do responsável pe la ofensa ou v io lação do d i reito de o utrem f icam suje itos

à reparação do dano causado; e, se a ofensa t iver ma is de u m autor, todos responderão so l idar iamente pela

reparação. Parásrafo único . São so l idar iamente responsávei s com os auto res os co-autores e as pessoas de­

s ignadas no art . 932" .

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

por fo rça de le i (art . 265 do Cód igo C iv i l ) , mas o fato de os coauto res se re m casados ent re s i redefi ne o regi m e j u ríd ico p rocessual dessa o b rigação so l i dária, ret i rando do c redor o benefíc io do art . 2 7 5 do Código C iv i l , i m pondo o l i t i sconsórc io n ecessár io .4 '

Ago ra, o i n c i so 1 1 1 .

A o mesmo tem po em q ue s u b m ete o cônj uge à necess idade de consent i ­mento p révio do o utro, para a p rática de certos atos (art. 1 . 647 do Cód igo C iv i l ) , a leg is lação cu idou de especif icar a lgu ns atos q u e podem ser p rati cados sem a vên i a con juga l (art . 1 . 643 do Código Civi i )Y Trata-se de atos re laci o nados à ad m i n i st ração da econom ia doméstica.

Esta perm issão ap l i ca-se a q ualq ue r regi m e de bens . C ria-se u m a p resunção legal iure et de iure de q u e o côn juge está, n esses casos, autorizado pe lo outro cônj uge a contrai r dívidas . "Assi m , não pode o out ro cônj uge a legar a falta de sua auto rização, q uando f icarem evidenc iadas as despesas de econom ia domésti ca, que e le e os demais memb ros da famí l ia foram desti natári os . N ão se i n c l uem as despe­sas s u ntuárias o u supé rf l uas, a i nda que tendo desti n o o lar conj ugal , po is não se enq uad ram na econom ia doméstica cot id iana" . 43

O art . 1 . 644 do Código Civi l44 cr ia u m a regra de so l i dar iedade legal (art. 265 do Código Civi l ) ent re os côn juges, com re lação às dívidas contraídas para os f i n s de ad m i n i stração da econom ia doméstica.

N os casos de cob rança de tais d ív idas, cont raídas a bem da famí l ia, em razão da so l i dar iedade l egal e da regra do art . 73 , § 1 °, 1 1 1 , CPC, exige-se a fo rmação de l it i scon sórc io pass ivo n ecessár io ent re os côn juges, para q u e se possam ati ng i r os bens de am bos os cônjuges . Como observa Pau lo Lôbo, "essa no rma, em con ju nto com os arts . 1 . 659, IV, e 1 . 664, en ce rram as h i póteses nas q ua is o patri môn i o co­m u m responde po r dívidas contraídas por um dos cônj uges" .45 Embora so l i dár ia a dív ida, nesses casos os devedores-cônj uges devem ser demandados conj u ntamen ­te , e não i so ladamente .

A falta de c i tação de um de les i m pede que a sentença lhe possa p rod uz i r q ua l ­quer efeito, em bora possa se r executada em face do cônj uge já citado (o caso aq u i é de l i t isconsórc io necessár io s i m p les) .

4 1 . " Não fossem os auto res casados, a responsab i l idade so l idár ia tornar ia desnecessár ia a formação do l i t i scon·

sórc io (CC, a rt . 942) . A existênc ia da soc iedade conj ugal, todavia, afasta a facu ldade de esco l ha confer ida ao credor pelo leg is lador mate r ia l" . (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. CódiBO de Processo Civil In terpretado, c it . , p . ] 1 .)

42 . Art . 1 .643 do Código Civi l : "Podem os cônjuges, i ndependentemente de autorização um do outro : I - com p rar, a inda a créd ito, as coisas n ecessár ias à econom ia domésti ca; 11 - obter, po r e m p rést imo, as q u ant ias q u e a aq u i s ição dessas co i sas possa exig i r" .

43 . LÔBO, Pau lo , Códiso Civil Comentado. São Pau l o : At las , 2003, v . XVI, p . 252 . 44 . Art . 1 .644. "As dívidas contraídas para os f ins do artigo antecedente ob rigam so l idar iamente am bos os cônjuges". 45 . LÔBO, Pau l o . Códiso Civil Comentado, p . 252 .

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F R E D I E D I D I E R J R .

6.3. O curador especial

A i n capaci dade p rocessua l deve ser s u p rida, em a lgu mas s i tuações (art. 72 do CPC), pela des ignação de um rep resentante p rocessua l ad hoc denom i nado curador especia l .

Para o co rreto en tend imento da i n tegração da capacidade p rocessua l nessas h i póteses, i m põem-se esc larec imentos sob re os segu i n tes pontos : a) h i póteses em q u e ele deve ser n omeado; b) q ual a natu reza j u ríd ica do cu rador espec ia l ; c) a razão de ser do i n st i tuto; d) q ua is os l im ites tem pora is da sua atuação; e) de q u e poderes e le está i nvest ido ; f) q ue m pode s e r c u rador espec ia l .

a) Nos casos e m que houve r ré u - revel c itado fi ctam ente (por ed i ta l ou por c itação com ho ra ce rta), réu reve l p reso, parte i n capaz cujos i n teresses se choq uem co m os do rep resentante legal ou q u e não o te n h a, deve o j u iz nomear, até mesmo ex officio, 4 6 u m curador espec ia l para p roteger e resguardar seus i n teresses (art . 7 2 , I e 1 1 , do CPC) .

Há s i tuações em que há i n capac idade p rocessual , a despeito da existênc ia de ca­pacidade de d i reito materia l . A autonom ia da re lação j u ríd i ca p rocessual autoriza que se ident ifi que alguém com i n capacidade apenas para a prática de atos p rocessua is .

P ri me i ro, o i n c iso I do art . 7 2 do CPC .

N omeia-se o c u rador espec ia l para a parte i n capaz ( i n capac idade abso l uta ou re lativa) civi l : q ue r po rq u e não possu i rep resentante, quer porq ue está em l i tígio com e le . A nomeação de cu rador especia l não s u p re a i n capacidade m ater ia l ; o re­p resentante é des ignado para o s up ri mento da i n capacidade processua l .

Convém advert i r q u e a nom eação do cu rador espec ia l , nessas causas, não d i s­pensa a i n tervenção do M i n istér io Pú b l i co como f iscal da o rdem j u ríd i ca, f undada no i n c iso 1 1 do art . 1 78 do CPC . Se houver i n capazes e m am bos os polos da re lação p rocessua l , i m põe-se a nomeação do cu rador espec ia l para am bas as partesY A nomeação de cu rador espec ia l para o i n capaz tam bém deve ser ap l i cada às pessoas j u rídi cas e aos entes fo rmais, q uando o ó rgão q u e a p resente ou a pessoa q u e a rep resente não puder p rat icar os atos processua is n ecessár ios à sua defesa48 •

Nos casos do i n c iso 1 1 do art . 7 2, o cu rador vem rep resentar em j uízo suje i to capaz m ateri a lmente, m as i n capaz p rocessua lmente . Trata-se de i n capacidade p u ra­mente p rocessua l . o q u e j u st i f ica a cu rate la espec ia l é a ausênc ia fís ica do réu reve l ,

46 . M I RANDA, F ranc i sco Cavalcant i Pontes de . Comentários ao Códi30 de Processo Civil. 5 ' ed . R io de jane i ro : Fo­

rense, 1 997 , t . 1, p. 2 59 . 47 . ALV IM, ]osé Manoe l Arruda. Manual de Direito Processual Civil. 8• ed . São Pau lo : RT, 2003, v. 2, p. 43 .

48. ROCCO, Ugo. Tra tado di Diritto Procesuale Civile. To r i no : Un i one Ti pográfico Ed itr ice To r i nense, 1 957, v . 2, p .

1 3 1 . O ar t . 78 do Cód igo de P rocesso C iv i l i ta l iano cogita a nomeação de cu rador espec ia l às associações não

reco n hecidas

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

se ja porque foi c itado f ictamente, seja po rq ue está p reso . Reputa-se q ue, em am bas as s i tuações, se en contra o demandado em pos ição de fragi l i dade para defender-se em j u ízo.49 A n o meação de c u rado r espec ia l é uma técn i ca para eq u i l i b rar o d i re ito de ação e o d i re ito de defesa. 50

A nomeação do c u rador espec ia l para o ré u - revel c itado f ictamente "deve-se à i n ce rteza q uanto a ter o ato ati ng ido seu escopo"Y N esse caso, h ave rá reve l i a sem efeitos da reve l ia, po is o réu - reve l será defend ido pe lo representante des ig­nado pe lo j u iz - t rata-se de mais u m a h i pótese, a lém daq ue las p revistas n o art. 345 do CPC, em q u e não se p roduz a p resunção de verac idade das afi rmações de fato fei tas pe lo autor, a despe ito da reve l ia do réu Y Se o réu-revel com parecer, a p resença do c u rador espec ia l torna-se desnecessár ia, cessando a sua atuação. Se a reve l i a deco rreu de c itação i nvál i da, a atuação do c u rado r espec ia l não tem apt idão de co rr ig i r o defeito,53 que poderá ser argu ido por querela nul lita tis (arts . 525, § 1 o, I , e 5 35 , I , CPC) .

O mesmo rac iocín io se ap l i ca à des ignação de cu rador especia l ao réu revel p reso . Não basta estar p reso; é p rec iso q ue o réu te n h a s ido reve l - i n ova-se em re lação ao CPC- 1 973 , q u e d i spen sava a reve l i a do réu p reso para a nomeação do c u rador espec ia l .

Em q ua lque r dos do is casos, se o revel t iver con st ituído advogado, cessam as f unções do c u rador espec ia l - parte f i na l do i n c iso 1 1 do art . 72 .

b) O c u rador espec ia l é re p resentante j ud i c ia l , e não mater ia l ; 54 sua atuação se restr i nge aos l i m ites do p rocesso : e n caixa-se a f igu ra n a teor ia da rep resenta­ção . Trata-se de um re p resentante ad hoc nomeado pelo m agi strado, com o objet i -

4 9 . Ovíd io Bapti sta t e m visão u m pouco d ive rsa, n ã o cons iderando ser caso de i n capacidade : " N a s h i póteses do i n c . 1 1 do art . 9 ° , o j u iz não s u p re a i n capacidade do réu p reso ou do reve l , mas apenas sua ocas iona l i m pos­s i b i l idade de fazerem-se rep resentar no processo. E les pode rão ser i ncapazes, não todavia po r estarem presos ou tornarem-se revéis" . (Comentários ao Códiso de Processo Civil. São Pau l o : RT, 2000, v. 1 , p . 85 . )

50. MAR INON I , Lu iz Gu i l herme. Novas linhas do processo civil. 3' ed . São Pau lo : Ma lhe i ros Ed. , 1 999, p . 248. 5 1 . BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Códiso de Processo Civil In terpretado, cit . p . 65 . Ass im, com amp las refe rên­

c ias, FARIAS, Cr ist iano Chaves de. "A atividade p rocessual do cu rador especia l e a defesa do revel c i tado ficta­mente (garantia do contrad itór io)". Revista de Direito Processual Civil. Curit iba: Gênes is , 200 1 , n. 1 9, p . 32 -37 .

5 2 . MORE I RA, José Car los Barbosa. O novo processo civil brasileiro. 22 ed . R io de jane i ro : Forense, 2002 , p . 99 . E n u nc iado n . 17 do V Encontro Nac iona l dos Tri bu na is de A lçada : " Não se ap l i ca o efeito da reve l i a, d i s posto no art. 3 1 9 do CPC, ao reve l que tenha sido citado por edita l ou por ho ra certa". O enu nc iado se refere a artigo do CPC- 1 973 , correspondente ao atua l art. 344.

53. MORE I RA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro, cit., p . 29 1 - 292 .

54. Araken de Ass i s defende q ue, em casos de i ncapacidade absol uta ou re lativa, o magistrado deve part i r para a so lução logo no âm bito do d i reito material , asseverando q ue, "dotado o ju iz da demanda de competência em razão da matéria, p roverá de modo permanente, compromissando tutor ou cu rador para o i ncapaz, e, ass im , cortando o p rob lema pe la raiz. Esta p rovidênc ia é út i l e p roveitosa i nc l usive fo ra do p rocesso". ("Su pr imento da i ncapacidade p rocessual e da i n capacidade postu latória", p . 1 33) José Augusto De lgado defende q ue, se o j uízo não for com petente para nomear o cu rador def in itivo, deverá ser o rdenado que se p roceda a essa nomeação no ju ízo com petente. ("Sujeitos do p rocesso". Revista de Processo. São Pau lo : RT, 1 983, n. 30, p . 92 .) .

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F R E O I E D I D I E R J R .

v o de c u i d a r d o s i n te resses do i n capaz p rocessua l d u rante o p rocesso, e somente d u rante o p rocesso . Daí a den o m i n ação c u rador à l i d e . "O c u rador à l i de, q u e se nome i a ao p rocess ua l m ente i n capaz, re p resenta-o, o u o ass iste, até q ue i n gres­se o rep resentante lega l" . 5 5 Como se trata de meio de i n tegração de capac idade p rocessua l po r i m pos i ção lega l , a fa l ta de des ignação do c u rador espec ia l , nestes casos, i m p l i ca n u l i dade do p roced i m ento desde então .

Vale fr isar que a falta de nomeação do c u rador nada tem a ver com i nval i dade da c itação, que de resto lhe é anteri o r; não se pode i nval idar um ato po r conta de um fato que lhe é su perven iente . Dessa forma, mesmo que se ja caso de nomeação de cu rador especia l e não haja essa nomeação, a citação p roduz i rá os efeitos q u e l h e são p róp riosY

É i m po rtante observar, como fez Cal mon de Passos, q ue o exercíc io da cu rate la espec ia l é um m ú n us, do q ua l deve des i n c umb i r-se o c u rador, sob pena de res­ponsab i l i dade func iona l - basta l em b rar q u e a f unção é no rma lmente exe rc ida por agente p ú b l i co, quer o defenso r p úb l i co, como regra, quer o memb ro do M i n i stér io P ú b l i co . O m agi strado poderá, i n c l u sive, des ignar o utro c u rador espec ia l , para su bs­t i t u i r o p rime i ro que se com po rtar de mane i ra neg l igente57 •

c) Essa representação p rocessua l do c u rador p rocessua l v isa regu lar izar o p rocesso: i) i n tegrando a capacidade p rocessua l de i n capaz que não ten h a rep re­sentante ou cujos i n te resses estejam em choque com os do seu rep resentante; ii) garanti ndo a par idade de armas e eq u i l i b rando o contraditór io, q uando atua na defesa do demandado reve l , nas h i póteses do i n c iso 1 1 do art . 72 , q u e são i n capazes p rocessua is .

d) A cu rate la espec ia l é sem pre tem porár ia : no máxi mo, du rará até o t râns ito em j u lgado da decisão fi na l . Contudo é possíve l q u e, ao lo ngo da l i t i s pendênc ia, não seja ma is n ecessár ia a i n tegração da capacidade, em razão de fato s u pe rven i ente que torne a parte capaz: cessação da i n capac idade, nomeação do rep resentante legal , apareci mento do réu reve l , constitu i ção de advogado pe lo réu reve l etc .

e) O cu rador espec ia l não é parte no p rocesso, nem mesmo q uando apresenta em bargos à execução (en u n ciado 1 96 da s ú m u la do STJ) , 58 postu la tute la caute lar ou

55 - M I RAN DA, F ranc isco Cavalcant i Pontes de . Comen tários ao Códi80 de Processo Civil. 5' ed . R io de jane i ro : Fo·

rense, 1 997, t . 1 , p . 246. Ass i m , tam bém, S I LVA, Ovíd i o Bapti sta da . Comentários ao Códi80 de Processo Civil.

São Pau lo : RT, 2000, v. 1 , p. 85 .

56 . Nesse sent ido , fazendo refe rênc ia a outros j u l gados, cf . : ST) , 2• T., REsp n . 1 . 306 . 3 3 1 /MG, re i . M in . Mauro Cam­

pbel l , j . em OJ .08 .20 1 2 , p ub l icado no D)e de 1 4 .08.20 1 2 .

5 7 - PASSOS, )osé Joaq u im Cal mon d e . Comentários a o Códi80 d e Processo Civil. 8 • e d . Rio de jane i ro : Forense, 1 998,

v. 3, p . 380. 58 . Corretamente, BERNARDI , Líg ia Maria. O curador especial no Códi80 de Processo Civil, cit . , p . 8; ST) , 4 T., RMS n.

1 . 768/RL j . 2 3 .03 . 1 993, pub l icado no DJ de 1 9 .04. 1 993, re i . M i n . Athos Carne i ro . Contra, entendendo que o cu rador

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

i m petra mandado de segu rança contra ato j ud i c ia l . 59 Parte é o rep resentado, cuja i n ­capacidade foi regu lar izada c o m a nomeação do cu rador espec ia l . O curador especia l é u m rep resentante p rocessual 60•

Suas f unções são bas icamente defen sivas.6 ' Não se l h e perm ite a p ro pos i tu ­ra de reconvenção ou fo rmu lação de ped ido contraposto; am bas são demandas, não possuem f unção defens iva.6' Nem m esmo a den u n c iação da l ide nos casos de evicção (art . 1 2 5 , I , CPC) é perm it ida, q ue de resto não é p ressu posto do d i re ito de regresso (art. 1 2 5 , par. ú n . , CPC). Tendo em vista q u e o chamamento ao p rocesso n ão é exercíc io do d i re ito de ação, mas s im p les convocação para formação de l it i s ­consórc io pass ivo, pode o c u rador espec ia l p ro movê- lo .63

o cu rador especia l está auto rizado a, tendo em vista o d i sposto no parágrafo ú n ico do art. 34 1 do CPC, fo rm u lar defesa gené rica : não tem o ônus da i m pugnação especif icada dos fatos afi rmados na pet ição i n ic ia l , exatamente por não ter, a p ri n ­cíp io , contato c o m a parte .

Não está autorizado, porém, a d i spo r do d i re ito mater ia l d iscut ido : t rans ig i r, ren u nc iar o u recon hecer a p rocedência do ped ido64•

Não pode o auto r des ist i r da demanda (art. 485, VI I I , CPC) sem q u e o cons i nta o réu rep resentado pelo c u rador espec ia l , mesmo nos casos de reve l ia : a defesa ap resentada pelo cu rador faz o réu p resente em j u ízo, razão pela q ua l é i m p resci n ­d íve l o consent imento do réu, rep resentado pe lo c u rado r especia l , à p roposta de revogação da demanda feita pe lo au to r (art. 485 , § 4°, CPC) .

especial é su bstituto processual , GRECO, Leonardo. Teoria da ação no processo civil. São Pau lo : D ia lética, 2003, p . 4 1 .

5 9 . Poderes q u e l h e são confer idos, vi sto q ue, s e m a poss i b i l idade de p rat icar tais atos processuais , a defesa d o cu rate lado f icar ia deveras p rej ud i cada. Ver, c o m razão, ASS IS , Araken d e . "Sup r imento d a i n capacidade p roces­sua l e da i n capacidade postu lató r ia". Doutrina e prática do processo civil contemporâneo. São Pau l o : RT, 200 1 , p . 1 3 1 . Também ass im, STL 4 T. , R M S n . 1 . 768/RL j . 23 .03 . 1 993, pub l i cado no D J de 1 9 .04. 1 993, re i . M i n . Athos Carnei ro, em que se reconheceu a poss i b i l i dade de manejo tam bém de ações cautelares e de denunc iação da l ide .

6o. Em sent ido diverso, para quem "o curador à l i de não é parte, nem representa. É órgão p rotectivo" . (M IRAN DA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. 5 ed. Rio de jane i ro : Forense, 1 997, t . 1 , p . 263.)

6 1 . ASSIS, Araken de . "Suprimento da i n capacidade p rocessual e da i n capacidade postu latór ia" . Doutrina e prática do processo civil contemporâneo. São Pau lo : RT, 200 1 , p . 1 3 1 .

62 . BEDAQUE, j osé Roberto dos Santos. Código de Processo Civil In terpretado, c it . p . 67 . Cont ra, entendendo possí­vel o aj u izamento de reconvenção, ASS IS , Araken de. "Sup r imento da i n capacidade processual e da i n capaci ­dade postu latór ia". Doutrina e prática do processo civil contemporâneo, c it . , p . 1 3 1 ; BERNARD I , Lígia Mar ia. O curador especia l no Código de Processo Civil, c it . , p. 29, q u e confere amp los poderes ao cu rador espec ia l .

6 3 . BEDAQUE, José Roberto dos Santos . Código de Processo Civil In terpretado, cit . p . 67 . Arruda Alv im não adm ite a poss ib i l i dade de reconvenção e denunciação da lide, mas reconhece a possi b i l i dade de o cu rador especia l interpor em bargos de tercei ro, que também é uma demanda e chamar ao processo (ALV IM, José Manoe l Arruda. Manual de Direito Processual Civil. 8 ed. São Pau lo : RT, 2003, v. 2, p . 45) .

64. Amp lamente, FAR IAS, Cr ist iano Chaves de . "A atividade processual do c u rador especia l e a defesa do revel citado fictamente (garant ia do contraditór io)", c it . , p . 34- 37 .

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F R E D I E D t D I E R J R .

f) A cu rate la espec ia l será exe rc ida, em regra, pe la Defensoria P úb l i ca (art. 7 2 , par. ú n . , CPC) . Repete-se, n o CPC, o d i s posto n o art . 4°, XV I , da Lei Co m p l ementar n. 80/ 1 994, q u e at ri b u i u , expressamen te, as f u n ções da cu rate la espec ia l à Defe n ­so ria P ú b l i ca .

Som ente se não h o uver Defen sor ia P ú b l i ca n a loca l i dade, deve rá o ju iz atri ­b u i r o m ú n us a " qua l q ue r advogado, ex ofticio ou a req ue ri mento da parte ou do M i n i stér io P ú b l i co", 65 o u , a i nda, a q ua lq ue r pessoa capaz66 e a lfabet izada67 •

N omeada pessoa capaz que não seja advogado, deve rá o cu rador espec ia l const itu i r advogado para regu lar izar a capac idade postu latória - razão ma is do q u e bastante para j u st if icar a recomendação de q u e o m agistrado deva des ignar a lguém q u e, a lém de poder rep resentar p rocessual mente o i n capaz, possa tam bém su p ri r a sua capacidade postu l atór ia . 68

N o m eado u m advogado para o exe rc 1 c 1 o do m ú n us , nada i m pede q u e e l e s u bstabe leça as ta refas de advogado a out ro patro no ; não poderá, po rém , de l egar a f u n ção de re p resentação do i n capaz p rocessua l , q u e é i n de l egáve l , po rq uanto f u n ção p ú b l i ca . Não podem ser confu nd idas as f u n ções do advogado, re p resentan ­te q u e s u p re a i n capac idade postu lató ria, com as do c u rador espec ia l , q u e s u p re a i n capac i dade processua l , em bo ra possam ser exerc idas pe la mesma pessoa69•

É possíve l , em bora ten h a de ser vi sto como a lgo excepc ionalíss i m o, q ue oco rra a s i tuação de o M i n i stér io P úb l i co ter de f unc ionar como cu rador espec ia l - nomea­do ex vi do art. 72, 1 1 , CPC, em caso de réu - reve l citado por ed ital ou por ho ra certa ­e como f iscal da ordem j u ríd ica. Nesta c i rc unstânc ia, do is ó rgãos m i n i ster ia is devem atuar no fe i to, u m para o exe rcíc io de cada função, e i s que "a ativi dade i m parcia l do f iscal da le i é i n conc i l iável com a do cu rador ad fitem, q u e fa la por uma parte'?

65 . ASS IS , Araken de . "Su p r imento da i n capacidade processua l e da i n capacidade postulatór ia". Doutrina e prática

do processo civil contemporâneo. São Pau lo : RT, 200 1 , p. 1 3 2- 1 3 3 . Também ass i m , MACHADO, Antôn io C láud io

da Costa. A intervenção do Ministério Púb lico no processo civil, p . 1 46.

66. Contra, entendendo que somente bacharel em d i reito pode ser c u rador espec ia l , ALV IM, josé Manoe l Arruda.

Manual de Direito Processual Civil. 8• ed . São Pau lo : RT, 2003, v. 2, p. 47 .

67 . M I RAN DA, F ranc isco Cavalcant i Pontes de . Comentários ao Códiso de Processo Civil. 5 ed . R io de jane i ro : Foren­

se, 1 997 , t . 1 , p . 257 . 68. Ass im , BEDAQUE, j osé Roberto dos Santos. Códiso de Processo Civil In terpretado, c i t . p . 65 .

69. "Su rgem os p rob lemas de ser cu rado r es pecia l pessoa que é advogado e de não o ser. N o p r ime i ro caso, o

c u rador espec ia l func iona como cu rador es pecia l e como advogado; no segu ndo, tem de contratar advogado

para que o rep resente . As c i r cunstâncias mais freq uentes mostram que o j u i z deve nomear c u rador espec ia l

quem é advogado; e. 3 . , cu rador espec ia l ter ia de se pôr a par de negócios do cu rate lado e p rovi denc iar q uanto

a hono rár ios advocatíc ios e outras p rovi dênc ias relativas ao processo". ( M I RAN DA, Francisco Cavalcant i Pontes

de . comentários ao Códiso de Processo Civil, t . 1 , cit . , p . 255) . c u m pre advert i r q ue, atual m e nte, a função da

cu rate la espec ia l cabe ao defenso r pú b l i co . 70. FABRÍC IO, Adroa ldo Fu rtado. Comentários ao Códiso de Processo Civil. 7' ed . R io de jane i ro : Forense , 1 995 , v . 8 ,

t . 3, p . 520. Tam bém ass im , ALVI M, josé Manoe l Ar ruda . Manual de Direito Processual Civil. 8 ed . São Pau lo : RT, 2003, v. 2, p . 49. Sobre a controvertida q uestão da i ntervenção de mais de u m ó rgão m i n i ster ia l , com bastante

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

Essa s i tuação, no entanto, d if ic i l mente ocorrerá, tendo e m vista a regra q u e atri bu i à Defensor ia P úb l i ca o m ú n us .

6.4. Capacidade postulatória

6.4. 1 . Generalidades

Por f im , o ú lt imo " p ressu posto p rocessua l" re lac ionado às partes : a capac ida­de postu lató r ia o u postu lac i ona l (ius postulandi).

Já se vi u q u e os atos p rocessua is exigem u m espec ia l t i po de capacidade de exe rcíc io denom i nado de capacidade p rocessua l : não basta s i m p lesmente a capac i ­dade para a p rática de atos mater ia is para que se possam p raticar val i damente os atos p rocessuais , que exigem capac idade específ ica.

A lgu ns atos p rocessuais , po rém , além da capacidade p rocessua l , exigem do s uje i to uma capacidade técn i ca, sem a q ual não é possíve l a sua rea l ização vál i da . É como se a capacidade, req u i s i to i n d i s pen sáve l à p rát i ca dos atos j u ríd icos, fosse b i part ida : a) capacidade p rocessua l ; b) capac idade técn i ca . A essa capacidade téc­n i ca dá-se o nome de capacidade postu lató r ia . F r ise-se : há atos p rocessua is q u e n ã o exigem a capacidade técn ica, ( p o r exem p lo , o ato de testemun har e o ato de i n d i car bens à penho ra); a capacidade postu lató r ia somente é exig ida para a p rática de a lguns atos p rocessuais , os postu latór ios (pe los q uais se so l ic ita do Estado-j u i z a lgu ma p rovidên cia) .

A capacidade postu lac i ona l ab range a capacidade de ped i r e de res ponder. Têm - na os advogados regu la rmente i n sc ritos na O rdem dos Advogados do B ras i l , os defensores p ú b l icos e os memb ros do M i n istér io Púb l i co e, em a lgu ns casos, as p ró p rias pessoas não-advogadas, como nas h i póteses dos j u izados Espec ia is Cíve i s (causas i n fer io res a v inte sa lários -mín i mos), das causas t raba l h i stas e do habeas corpus.

O ped ido de concessão de "med idas p rotetivas de u rgênc ia", pe la m u l he r q u e se a lega víti ma de vio l ência doméstica e fam i l i a r, pode se r fo rm u lado diretamente pela s u posta ofend ida, q u e, para tanto, tem capacidade postu latór ia . Não é neces­sár io que esteja aco m panhada de advogado ou defenso r p ú b l i co (art . 1 9, caput e § 1 °, e art . 27 , am bos da Le i 1 1 . 340/2oo6, Le i M aria da Pen h a) . 7 ' A capacidade postu latór ia é conced ida à m u l h e r, neste caso, apenas para form u lar a demanda

p roveito, Antôn i o C láud io da Costa Machado, Intervenção d o Ministério Público no Processo Civil Brasileiro, p . 570-575 ·

7 1 . Art. 27 da Lei n. 1 1 . 340(2006: " Em todos os atos p rocessuais , cíve is e c ri m i na is , a m u l h e r em s ituação de v io lênc ia doméstica e fam i l ia r deverá estar acom pan hada de advogado, ressalvado o p revisto n o art. 19 desta Lei " .

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F R E D I E D I D I E R J R .

das "med idas protetivas de u rgênc ia" (arts . 2 2 - 24 da Lei n . 1 1 . 340/2006); n ão a tem , po rém , para o acom pan hamento do p rocesso a part i r daí . Segue-se, ass im , o m ode lo da le i de a l imentos (art. 2° da Lei 5 -478/ 1 968) _ 7 2 Receb ida a demanda, após exam inada a poss i b i l idade de con cessão de m ed ida l i m i n ar, deve o j u iz dete rm ina r a i n tegração da capac idade postu l atór ia da auto ra, seja pe la const it u i ção de u m ad­vogado, seja pela des ignação de um defensor p ú b l i co (art . 1 8, 1 1 , Lei 1 1 . 340/2oo6) .1 3

As pessoas não advogadas p rec isam, po rtanto, i n tegrar a sua i n capacidade postu latória, nomeando um rep resentante j ud i c ia l : o advogado .

Como se t rata de u m req u i s ito de val i dade, é p rec iso pensar a capacidade postu latór ia à l uz do s istema de i nval idação dos atos p rocessuais , q ue, confo rme exam inado em capítu l o p róp rio , i m pede a decretação da i nval idade se do defeito do ato não decorrer p rej uízo . Busca-se, sem p re, o ap roveitamento do ato p rocessua l .

E m s u m a, a fa l ta de capac idade post u l atór ia é caso de n u l i dade do ato . O caso é regu l ado pe lo art . 4° do EOAB: "São n u l os os atos p rivativos de advogados p rat i cados po r pessoa não i n se r i da na OAB, sem p rej uízo das san ções c iv is , pena i s e ad m i n i st rativas" . O caso é de i nva l i dade, po i s se r advo3ado é req u i s i to para a p rát i ca do ato - todo req u i s i to de va l idade é u m dado q u e tem de se r coevo à formação do ato j u ríd ico para q u e e l e possa p rod uz i r os efeitos p rete n d idos .

A falta de capac idade postu l atór ia do auto r i m p l i ca ext i nção do p rocesso, se não for sanada; a do réu , o p rossegu imento do p rocesso à sua reve l i a; a do tercei ro, a sua reve l i a ou a sua exc l usão da causa (art. 76, CPC) . Ma is uma vez, somente a capacidade postu latór ia do autor pode ser vista como req u i s i to de ad m i ss i b i l idade do p roced i mento . A capac idade postu lató r ia do réu o u do terce i ro é req u i s ito de val i dade dos atos postu lató r ios que p raticare m . Como se t rata de capacidade, b i fu r­cação da capacidade p rocessua l exig ida para a p rática de a lgu ns atos p rocessuais , é req u i s i to de val idade (art . 1 04, Cód igo Civi l ) dos atos p rocessua is .

O estagiár io é, j u ri d i camente, um relativamente i n capaz: possu i re­

lativa capac idade postu lató ria, pois pode p rat icar os atos p rivat ivos

da advocacia assist ido por um advogado - e a i nda há atos q u e pode

p rat icar sozi n ho . É o q u e d i spõe o art. 29 do Regu lamento Geral do

Estatuto da Advocacia e da OAB (EOAB)74•

72. "Art . 20. o credor, pessoal mente, ou por i ntermédio de advogado, d i r ig i r·se·á ao ju iz com petente, q ua l i f ican·

do·se, e exporá suas necess i dades, p rovando, apenas, o parentesco ou a obr igação de a l imentar do devedor,

i nd icando seu nome e sob renome, res idênc ia ou local de traba lho , p rof issão e natu ra l idade, q u anto gan ha

aproxi madamente ou os recu rsos de q u e d i spõe" .

7 3 . "Art . 1 8 . Receb ido o expediente com o ped ido da ofend ida, caberá ao j u iz, no p razo de 48 (q uarenta e o i to)

ho ras : ( . . . ) 1 1 - determ inar o encam i n hamento da ofend ida ao ó rgão de ass istênc ia j ud ic iár ia, q uando fo r o

caso" . 74. "Art. 29. Os atos de advocacia, p revistos n o Art . 1 ° do Estatuto, podem ser su bscr itos po r estagiár io i nscr ito

na OAB, e m conj u nto com o advogado ou o defensor púb l i co . § 1° O estag iár io i n scr ito na OAB pode p rat icar

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

Parti ndo dessas duas p rem i ssas, a SD I 1 do TST conso l i dou a O J n . 3 1 9, cu jo texto me rece tran scr ição: "Representação regu lar. Estagiári o . Ha­b i l itação poster i o r. Vál idos são os atos p raticados por estagiár io se, e ntre o su bstabe lec i mento e a i n terpos ição do recu rso, sob reve io a hab i l itação, do en tão estagiár io , para atuar como advogado" .

A p rocu ração outorgada a u m estagiár io deve ser ap roveitada como

i n st ru m e nto da rep resentação j ud i c ia l , se o estagiár io , ao tem po da p rática do ato, já e ra advogado; não há n ecess idade de nova p ro­cu ração, pe lo fato de o estagiár io te r adq u i rido a p lena capac idade postu l ató ria, com a hab i l itação para o exe rcíc i o da advocacia.

6.4.2. Ato praticado por advogado sem procuração

H á out ra q uestão, porém , q u e me rece cu idadoso exame .

É a s i tuação do advogado q u e postu la sem p rocu ração. N esse caso, o ato foi p rat i cado por q u e m poderia p rat i cá- lo , ou seja, um advogado . Não há incapacidade postulatória . O q u e não há é a p rova da representação vo luntária, negóc io j u ríd i co q u e, no caso, se rve para a i n tegração da i n capac idade técn i ca da parte .

Em s i tuações ass im , o ato não é n u lo . H á i n ef icác ia re lativa do p rocesso ou do ato em re lação àq ue le que su postamente ser ia a parte, mas que não outorgou o i n stru mento de representação.75 "A falta de poderes não dete rm ina n u l i dade, n em existênc ia" . 76 Trata-se de ato cuja efi cácia em re lação ao su posto rep resentado s u b­m ete-se a u m a cond ição l egal suspen siva: a ratif i cação. Não há falta de capacidade postu lató ria, po is o ato foi p rat icado po r um advogado, que a tem; o víc io é na rep resentação, que não restou com p rovada. É ap l i cação d i reta do q uanto d i s posto no a rt . 662 do Cód igo Civi l . 7 7

O advogado pode postu lar sem p rocu ração, para evitar p recl usão, p rescri ção ou decadênc ia, ou para p raticar ato cons ide rado u rgente (art . 1 04, caput, CPC) .

i so ladamente os segu i ntes atos, sob a responsab i l i dade do advogado : I - ret irar e devolve r autos em cartó r io, ass i nando a respect iva carga; l i - obter j u nto aos esc rivães e chefes de secretarias cert idões de peças ou autos de p rocessos em cu rso ou f i ndos; 1 1 1 - ass i na r pet ições de j u ntada de documentos a p rocessos j ud i c ia is ou ad­

m i n i st rativos. § 2• Para o exe rcíc io de atos ext raj ud ic ia is , o estagiár io pode com parecer i so ladamente, quando receber autorização ou s u bstabe lec imento do advogado" .

7 5 . Cor retamente i dent if icando a q uestão como at i n ente ao p lano da eficácia, DEMARCH I , ) u l iana. "Ato p rocessual j u ri d icamente i n ex istente - mecan i smos pred ispostos pe lo s istema para a dec laração da i n existênc ia j u ríd i ­ca". Revista Dialética de Direito Processual. São Pau lo : D ia lét ica, 2004, n . 1 3 , p . 52 . Tam bém ass i m José Mar ia

Teshe i ne r: " . . . a sentença acaso p rofe r ida se rá i n efi caz com re lação a quem pod ia ter rat if icado a i n ic ia l , mas não o fez. I n ef icácia dec larável a q ua lque r tem po, i ndependentemente de ação resci sór ia" . (Pressupostos processuais e nulidades no processo civil. São Pau lo : Saraiva, 2000, p . 284).

76. M I RAN DA, Franc isco Cavalcant i Pontes de. Tra tado de direito privado, t. 4, cit., p . 2 7 . n . Ar t . 662 do Cód igo Civi l : "Os atos p rati cados po r quem não tenha mandato, ou o tenha sem poderes suf i c ien ­

tes , são i n ef i cazes em relação àq ue le em cujo nome foram p rat i cados, sa lvo se este os rat if i car" . Trata-se de consagração de entend i m e nto doutr i nár io, e q u e corri g i u as confusões q u e antes rei navam sob re o tema.

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F R E D I E D I D I E R J R .

Quando post u la s em p rocu ração, o advogado se ob riga a ap resentar a p rocu ração em q u i nze d ias, p ro rrogáve is por igua l período (art. 1 04, § 1 o, CPC) . Se não o f izer, e sendo advogado do autor, o p rocesso será ext i nto sem exame do méri to . A s i tuação é s im i lar à do p rocesso i n stau rado por uma parte i l egít ima : é como se o advogado, q u e não foi autorizado a demandar, est ivesse p l e iteando em j uízo d i re i to a l he io , sem que t ivesse legit i mação extrao rd i n ár ia para tanto; é como se o advogado fosse o autor, não o seu p retenso rep resentado.

Caso não j u nte a p rocu ração rat if i cando a sua co ndu ta, "o ato não rat i f i cado será cons ide rado i n efi caz relativamente àq ue l e em cujo nome foi p rat i cado, respon ­dendo o advogado pe las despesas e perdas e danos" (art. 1 04, §2o, CPC) . Rep rodu ­z-se, ass im , a regra do art. 662 do Cód igo Civi l .

O parágrafo ú n ico do art. 37 do CPC- 1 97 3 afi rmava q ue a não- rat i f i ­cação dos atos p rat icados por advogado sem p rocu ração i m po rtava havê- los por i n existe ntes . A part i r do texto legal , havia q uem de­fe ndesse, e não e ram poucos78, q ue a capac idade postu lató r ia se ria " p ressu posto p rocessua l" de existê nc ia .

O Su peri o r Tri bu na l de j u st iça acol heu a term i n o log ia no e n u n ciado 1 1 5 da s úm u la da sua j u ri s p rudênc ia p redom i nante : "Na i n stânc ia es­pec ia l é i n existente recu rso i n te rposto por advogado sem procu ração nos autos" - a p ropósito, o r igo r desse e n u n ciado era man ifesto: não há p reocu pação com a q ua l i dade das dec isões, mas apenas com a rap idez com q u e são p rofe r idas; não há razão para im pedi r-se a rat i ­fi cação do ato em sede de t r i b u na l . A confu são e ra evidente. Não se t ratava de incapacidade postula tória, mas de s im p les não comp rova­ção da rep resentação j ud i c ia l . Mesmo assi m, não se ria caso de i n ex is ­tên cia, mas de i n ef icácia re lativa. O advogado ser ia res ponsab i l izado

78 . Apenas para dar a d imensão do tamanho do prob lema, : N E RY ) R . , Ne l son e N ERY, Rosa Mar ia de And rade. Códi·

30 de Processo Civil comen tado e le3islação extrava3an te. 1 , . ed . São Pau lo : RT, 201 0, p. 258; WAM B I ER, Te resa

Arruda Alvi m . Nulidades do processo e da sen tença. 4' ed. São Pau lo : RT, 1 998, p . 284-285; ALV IM , José Manoe l

de Arruda. Manual de Direito Processual Civil. 1 0' ed. São Pau lo : RT, 2006, v . 1 , p . 478 ; WAM B I ER, Lu iz Rodr igues;

ALM E I DA, F lávio Renato Corre ia de; TALAM I N I , Eduardo. Curso avançado de processo civil. 8• ed . São Pau lo : RT,

2006, v. 1 , p . 20 1 ; ALV IM , Ed uardo Arruda. Curso de direito processual civil. São Pau lo : RT, 1 999, v. 1 , p . 1 7 2 - 1 73 ;

FORNAC IAR I ) R . , C l ito. Da reconvenção no direito processual civil brasileiro. 2• ed . São Pau lo : Saraiva, 1 983, p .

1 04 - 1 05; GONÇALVES. Marcus Vi n i c i u s R ios . Novo curso de direito processual civil. 4' ed . São Pau lo : Saraiva,

2007, v. 1, p . 1 08- 1 09; GUERRA, Marce lo L ima . Execução forçada: contro le de admiss i b i l idade . 2' ed. São Pau lo :

336

RT, 1 998, p . 1 2 3; MORE IRA, A lberto Cam i fía. Defesa sem embar3os de executado: exceção de p ré-execut iv idade.

2• ed . São Pau lo : Saraiva, 2000, p . 79-80; DANTAS, Marcelo Navarro R ibe i ro . Mandado de se3urança coletivo:

l eg i t imação ativa. São Pau lo : Saraiva, 2000, p. 64; MONTENEGRO F I LHO, M i sae l . Curso de direito processual civil:

teor ia ge ral do p rocesso e p rocesso de conhec imento. 6• ed . São Pau l o : Atlas, 201 0, v. 1 , p. 257 ; LOPES, João

Batista. Curso de direito processual civil. São Pau lo : At las, 2005, p . 1 03; P I ZZOL, Patríc ia M i randa . A competência

no processo civil. São Pau l o : RT, 2003, p. 1 2 5 ; P E R E I RA, Rosa l i n a P. C. R o d r i g u e s . Ações prejudiciais à execução. São Pau lo : Saraiva, 200 1 , p . 1 7 1 - 1 7 2; CARPENA, Márcio Louzada. Do processo cautelar moderno. 2• ed. Rio de

jane i ro : Forense, 2005, p . 1 2 5 . Afi rmando ser a capac idade postu lató r ia um req u i sito p ré- p rocessual , anter ior,

i n c l u s ive, aos pressu postos de exi stênc ia do p rocesso, ALV IM , The reza. O direito processual de estar em juízo.

São Pau lo : RT, 1 996, p. 7 2 .

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

pe las pe rdas e danos , em razão da exti n ção do processo i n stau rado sem q u e lhe ten ha s ido outorgada a p rocu ração: se o p rocesso não exist isse j u rid i camente, se ria i n con cebível e i l ógico co locar a ext i nção do "nada j u ríd ico" como supo rte fát ico do deve r de i nden izar. Ad m i t i r ratif i cação de ato i n existente é, no mín i m o, u m a cont rad ição lógi ca79•

O CPC atual resolve o p rob l ema e encer ra a d i scussão. O e n u nc iado n . 1 1 5 do STJ está, então, s u pe rado e merece se r cance lado80•

6.4.3. A procuração

A procu ração é o i n stru mento da rep resentação j ud ic ia l vo l u ntária . O advogado deve apresentá- la ao postu la r em j u ízo (art. 1 04, CPC; art . 5°, Lei n. 8 .906/ 1 994) . É, ass im , um dos documentos i n d ispensávei s à p ropos i tu ra da ação .

Os advogados púb l i cos estão d i spensados da ap resentação da p rocu ração (art. 9°, Lei n. 9 .469/ 1 997), po i s a rep resentação j ud ic ia l l hes é confer ida pela le i q u e fixou a s f unções do s e u cargo . O defenso r p ú b l i co está auto rizado a postu la r sem p rocu ração, ressalvada a p ráti ca de atos que exijam poderes espec ia is (art . 44, X I , Le i Comp l ementar 80/ 1 994) .

A p rocu ração pode ser outorgada por i n stru mento p ú b l i co ou part i cu la r, deve ser ass i nada pe la parte outorgante (art . 1 05, p rime i ra parte, CPC) e conter a i n d i ­cação do l ugar onde f o i passada, a q ua l ifi cação do outorgante e do outorgado, a data e o o bj etivo da outorga com a des ignação e a extensão dos poderes confer idos (art . 654, § 1 °, Cód igo Civi l ) . N ão há necess idade de reco n h ec imento, em cartó r io, da ass i natu ra do outorgante.

Nada i m pede a outorga de poderes de rep resentação o ra l mente, em aud iênc ia; n esse caso, deve rá constar da ata da aud iênc ia a o utorga de poderes .

A procu ração pode ser ass inada d igitalmente, na fo rma da le i (art . 1 05, § 1 °, CPC) .

A p rocu ração deverá conter o nome do advogado, seu n úme ro de i n scr i ção na O rdem dos Advogados do B ras i l e e ndereço com p leto (art. 1 05, § 2o, CPC) . Se o o uto rgado i n tegrar soc iedade de advogados, a p rocu ração tam bém deve rá conter o nome desta, seu n úme ro de registro na O rdem dos Advogados do B ras i l e ende reço com p leto (art . 1 05, § 3o, CPC) .

A rep resentação j ud i c ia l é outorgada com a apos i ção, na p rocu ração, dos po­deres serais para o foro, ou c láusu l a ad judicia. Essa c láusu la negoc ia i hab i l i ta o

79. Tam bém neste sent ido, DEMARCH I , j u l iana . "Ato p rocessua l j u r id icamente i n existente - mecan i smos pred ispos­tos pe lo s istema para a dec laração da i n existênc ia j u ríd ica", c i t . , p . 52 .

8o . Nesse sent ido , e n u nciado n . 83 do Fó rum Permanente de P rocessua l i stas C iv i s : " F ica supe rado o E nu nc iado 1 1 5 da S ú m u la do STJ após a ent rada em v igor do N CPC".

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F R E D I E D I D I E R J R .

advogado à p ráti ca da gene ra l idade d o s atos p rocessuais , ressa lvados apenas aq ue ­les q u e exigem poder especial .

Poder de represen tação especia l é aq ue le q u e deve constar expressamente da p rocu ração . São poderes para a p rát i ca de atos de d i spos ição de d i re itos e, por isso, devem aparecer exp ressamente no i n stru mento da rep resentação j ud i c ia l . A i n ter­p retação dessas c láusu las espec ia is deve ser restrit iva (art . 1 1 4 do Cód igo Civi l ) .

O a rt . 1 05 do CPC, parte fi na l , e n u mera os atos que exigem expressa auto riza­ção na p rocu ração: receber c itação, confessar, recon h ecer a p rocedênc ia do ped ido , t ran s ig i r, des ist i r, ren u n cia r ao d i re ito sobre o q ual se funda a ação, receber, dar q u itação, f i rmar com p rom i sso e ass i na r dec laração de h i possuf ic i ênc ia econôm i ca.

Salvo d i s posição expressa em sent ido contrár io constante do p róp ri o i n st ru ­m ento, a p rocu ração outorgada na fase de con h ec imento é efi caz para todas as fases do p rocesso, i n c l u s ive para o c um pri m ento de sentença (art. 1 05, §4o, CPC) .

A parte que revogar o mandato outorgado a seu advogado const i tu i rá, no mes­m o ato, outro que ass u m a o patrocín io da causa (art. 1 1 1 , caput, CPC) . Não sendo const ituído n ovo procu rador no p razo de q u i nze d ias, o j u iz determ i nará p razo para o s u pri m ento da i n capacidade postu l ató ria, nos termos do art. 76 do CPC, exam i na­do l i n h as atrás (art . 1 1 1 , par. ú n . , CPC) .

O advogado poderá ren u n ciar ao mandato a q ualq ue r tem po, p rovando, q u e com u n icou a ren ú nc ia a o mandante, a f i m de q u e este n o me ie sucessor (art . 1 1 2, caput, CPC) . D i spensa-se essa com u n i cação, q uando a p rocu ração t iver s ido ou ­to rgada a vár ios advogados e a parte cont i n uar rep resentada por out ro, apesar da ren ú nc ia (art. 1 1 2, § 2o, CPC) . D u rante os dez d ias segu i ntes, o advogado cont i n uará a rep resentar o mandante, desde q u e necessár io para l h e evitar p rej u ízo (art . 1 1 2, § 1 o, CPC) . O advogado deixará a rep resentação se, nesse i nterstíc io , fo r s u bst ituído (art . 5°, § 3°, Lei n . 8 . 906/ 1 994) .

6.5. Competência

A com petênc ia do ó rgão j u ri sd i c io na l é req u i s ito de val i dade do p roced i m e nto

q u e o ó rfão j u ri sd i c iona l porventu ra vi e r a cond uz i r e, por conseq uência, da dec i são

q u e vi e r a p rofe ri r. A com petênc ia foi estudada em capít u l o específ ico, para onde

rem etemos o le i tor.

6.6. Imparcialidade

A i m parc ia l idade é req u i s i to p rocessua l de val i dade; po rtanto, o ato do j u iz par­

c ia l é ato q u e pode ser i nval idado. Há do is graus de parc ia l idade : o i m ped i mento e a

suspe ição . A parcia l i dade é víc io q u e não gera a ext i n ção do p rocesso: ver if icado o

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

i m ped imento ou a suspe ição do magi strado, os autos do p rocesso devem ser reme­t i dos ao seu subst ituto legal . Os atos dec isór ios p rati cados devem ser i nval i dados .

O regi me j u ríd ico da argu ição de i m ped i mento ou su spe i ção do j u iz se rá exa­m i n ado em capítu l o p róp rio , neste vo l u m e do Curso.

Convém l emb rar, por opo rt uno, q u e a i m parc ia l idade e a com petênc ia são p res­su postos p rocessuais re lat ivos ao ó rgão j u lgado r que derivam da garant ia fu nda­menta l do d i re ito ao j u iz nat u ral , confo rme exam i nado n o capítu l o sob re j u ri sd i ção.

7. REQUIS ITO PROCESSUAL OBJ ETIVO I NTRÍNSECO: RESPEITO AO FORMA­LISMO PROCESSUAL

Os req u i s i tos i n t rínsecos de val idade podem ser reu n idos sob a segu i nte ru b ri ­ca : respeito ao fo rmal i smo p rocessua l .

Cons idera-se forma l i smo p rocessua l a tota l i dade fo rmal do p rocesso, "com ­p reendendo não s ó a fo rma, ou a s fo rmal idades, mas espec ia l mente a de l im itação dos poderes, facu ldades e deveres dos suje itos p rocessua is , coordenação da sua ativ idade, o rdenação do p roced imento e o rgan ização do p rocesso, com vistas a q u e sejam at i ng idas a s suas fi na l idades p rimo rd ia i s" .8 '

Como conj u nto das regras q u e d isc i p l i nam a atividade p rocessua l , o forma l i s ­mo exerce pape l fundamental no contexto do estudo do p rocesso.

De acordo com o pensamento de Car los A lbe rto Alvaro de O l ivei ra, podem ser c i tadas a lgu mas funções do fo rmal i smo p rocessua l : a) i n d i car as fro ntei ras para o começo e o f im do p rocesso; b) c i rcu nsc reve r o m ater ia l p rocessual q u e poderá se r formado; c) estabe lecer dent ro de q ua is l im ites devem cooperar e agi r as pessoas atuantes no p rocesso para o seu desenvo lvi m ento; d) e m p restar p revi s i b i l idade ao p roced imen to; e) disc i p l i na r o poder do j u iz, atuando com o garant ia de l i be rdade contra o arbítr io dos ó rgãos que exe rcem o poder do Estado, po is "a rea l i zação do p roced i mento de ixada ao s im p les q ue re r do j u iz, de acordo com as necess idades do caso conc reto, acarretar ia a poss i b i l i dade de deseq u i l íbr io ent re o poder j ud ic ia l e o d i reito das partes; "82 f) contro le dos eventua is excessos de u m a parte em face da out ra, atuando po r consegu i nte como poderoso fato r de igualação (pe lo menos fo r­mal) dos contendo res ent re s i , seja no p lano no rmativo, i m pondo u m a d i st ri bu i ção eq u i l i b rada dos poderes das partes, seja no p lano de fato, i m pondo a par idade de armas, garant i ndo o exe rcíc io b i l ate ral dos d i re itos; 3) formação e val o rização do mater ia l fát ico de i m po rtânc ia para a decisão da causa; e, a i nda, h) determ i nar

8 1 . O LIVE I RA, Car los A lbe rto Alvaro. Do formalismo no processo civil. S ã o Pau l o : Saraiva, 1 997, p . o6/o7 . 82 . O LIVE IRA, Car los A lberto Alvaro. Do formalismo no processo civil. São Pau l o : Saraiva, 1 997 , p . 07 -08.

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f R E D I E D I D I E R J R .

como, q uando e quai s os j u lgados podem adq u i ri r a i m utab i l i dade caracte ríst ica d a co isa j u lgada. 83

Não há confu nd i r-se, embo ra a homoním ia, o fo rma l i smo de q u e se t rata com o forma l i smo feti che da forma; este ú lt imo , na verdade, deformação daq ue le .

Pode -se d izer que o fo rmal i smo res ponde às pergu ntas: como f unci ona (o p rocesso) e q uais são as regras do j ogo. Trata-se - em l i n guagem s im p les - do regu lamento da d i sputa. O cerne do fo rmal i smo p rocessua l está no p roced imento -esp i n h a do rsa l , na fe l i z exp ressão de Car los A lbe rto Alvaro de O l ivei ra. 84

Por isso, o desrespeito ao fo rma l i smo p rocessua l i m p l i ca i nval i dade do ato j u ríd ico p rocessual ou do p roced i mento . É d ifíc i l imag inar u m a h i pótese em q u e o desrespeito a u m destes req u i s itos i m porte imedia tamente a ext i n ção do p rocesso (art . 485, IV, do CPC) . S ubmet idos que estão ao s i stema de i nval i dades, sem p re deve rá buscar-se o ap roveitamento dos atos p rocessua is ou a sanação do vício ; somente se i m possíve l a co rreção ou o ap roveitamento é que o ato não deve ser aceito e, se for o caso, o p rocesso ser ext into .

É m u ito i m portante adve rt i r: a n u l idade somente poderá ser decretada após a i nvesti gação da existênc ia de efetivo p rej u ízo e desde que obedec idas, a i nda, com r igor, as d iversas regras q u e com põem o s i stema de n u l i dades do CPC (arts . 276 - 283) , cu jo o bjet ivo p r i n ci pa l é exatamente o de evitar a decretação das n u l i ­dades . Re lac i ona r os req u i s i tos de va l idade com o s i stema de n u l i dades do CPC é abso l utamente fundame ntal para q u e se faça a co rreta i n terpretação dos d i spos i ­t ivos l egai s .

Ass im , exem p l if icativamente, podem ser citados os segui ntes req u isitos objet i ­vos i ntrínsecos de val idade : a) peti ção i n i c ia l apta; b) com u n icação dos atos p roces­suais, i nc l us ive e pri n ci pa lmente a citação; c) respeito ao p ri n cíp io do contraditór io; d) obed iênc ia ao proced imento, como, por exem p lo, a necessidade de i nt imação da parte para man i festar-se sobre docu mento j u ntado ao p rocesso pela outra; e) esco l ha correta do p roced imento.

8. REQUIS ITOS PROCESSUAI S OBJ ETIVOS EXTRÍN SECOS E N EGATIVOS

Os req u i s i tos objet ivos ext rín secos podem ser positivos, como o i n te resse de

agi r, exam i nado mais adiante, ou ne3ativos.

83 . o formal i smo, conforme conceito exposto, é construído de modo a q u e o p rocesso atinja os f i n s para os q uais

foi cr iado. A inda de acordo com o pensamento de Car los A lbe rto Alvaro de O l ivei ra, podem ser a l i n hados, como

f i n s - e, por consequência, valores, visto o i negável ent re laçamento ent re estas noções - os segu i ntes: j u st i ça,

paz soc ia l , segu rança e efet iv idade (O formalismo no processo civil, p. 65 -73) .

84. Do formalismo no processo civil. São Pau lo : Saraiva, 1 997 , p . 1 1 1 .

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

São cons ide rados n egativos aq ue les fatos que não podem ocorrer para q u e o p roced i mento se i n stau re va l i damente . São fatos estran hos a o p rocesso (daí o adjetivo "extrín seco"), q u e, u m a vez existentes, i m pedem a sua fo rmação vál ida .

Não se trata de s im p les req u i s i to do ato j u ríd ico p rocessual ; na verdade, é req u i s i to de val i dade do p ró p r io p rocesso. Conforme ve remos no capítu l o sob re as i nval i dades p rocessuais , de acordo com a teor ia das i nval i dades u m ato pode ser defeituoso po r fatos que lhe são anter iores ou contempo râneos : no caso, o ato com p lexo p roced imento já nasce v ic iado por fatos q u e l h e antecedem .

A p ri n cíp io , são víc ios i n sanáve i s . 85 Por isso, o reco n h ec imento d a existênc ia de a lgu m desses fatos i nevitave lmente l evará à ext i nção do p rocesso sem exame do mé rito - salvo se d i sse r res peito a apenas parce la da demanda ( l i t i spendênc ia parc ia l , p . ex.) , h i pótese em que haverá i nad m iss i b i l i dade parc ia l , sem a ext i nção do p rocesso, q u e p rossegu i rá em re lação à parce la restante .

A c i rc un stânc ia de a existênc ia de um desses fatos l evar à exti n ção do p roces­so é um dos motivos q u e levou o leg is lador a dar- l h es tratamento no rmativo d i s ­t i nto em re lação aos outros "p ressu postos p rocessua is" : deu - l h es i n c isos p róp rios (V e V I l ) n o ro l do art. 485 , ret i rando-os da i n cidênc ia da regra geral do i n c i so IV do mesmo art igo .

São exem plos : a i n existência de l i t is pendência, a i nexistênc ia de coisa j u lgada, a i n existênc ia de perem pção (art. 486, § 3o, CPC) e a i nexistência de convenção de arbitragem .

Também é "p ressuposto p rocessua l" negativo, específico para as demandas e m que s e pretende o recon h ec imento de domín io (ações petitórias), a i n existênc ia d e p rocesso possessório em que s e d iscuta esse domín io : não pode estar pendente demanda possessória em que se d iscuta domín io, para que prossiga a ação petitó ria aj u izada tendo em vista o mesmo o bjeto (art . 557 do CPC)86•

O art. 1 1 do Estatuto da C idade87 d i spõe q u e, na pendênc ia da ação de usu ­capião espec ia l u rbana, f icarão sob restadas q uaisq uer out ras ações, pet itór ias ou possessó rias, q u e venham a ser p ropostas re lat ivam ente ao i m óve l usucap iendo . A i n ex istênc ia de p rocesso de usucap ião espec ia l u rbana se torna p ressu posto p ro ­cessua l negativo (ext rín seco) de val i dade das demandas petitó rias e possessó rias

85 . D iz ·se a p r i ncíp io , po is , como veremos no capítu l o sobre a ext i nção do p rocesso, se a causa da ext i nção do p rocesso desaparecer (p . ex . : o p rocesso q u e estava pendente, e q u e autor izou a ext inção po r l i t i spendência, foi ext into sem exame do mé rito), desaparece o ób i ce para a repropos it u ra da demanda.

86. FABRÍC IO, Adroaldo Fu rtado . Comentários ao Códi:3o de Processo Civil. 7' ed . R io de jane i ro : Forense, 1 995, v. 8, t . 3 , p . 386.

87 . "Na pendênc ia da ação de usucap ião espec ia l u rbana, f icarão sob restadas q ua i squer out ras ações, pet itór ias ou possessó rias, que ven ham a ser propostas re lativamente ao i móvel usucap iendo" .

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F R E D I E D I D I E R J R .

q u e d igam res peito ao i m óvel u s ucap iendo . Adapta-se, aq u i , a ide ia j á p revista para as ações possessór ias .

9. A LEGITIMAÇÃO PARA AGI R E O I NTERESSE PROCESSUAL

9.1 . Observação introdutória

No capítu l o sobre a teor ia da ação, v imos q u e o CPC atua l não ma is se vale da catego ria "cond i ção da ação" como gênero, de q u e são espéc ies a legitimidade ad causam e o in teresse de agir.

O CPC conti n ua a regu lar essas espéc ies de req u is i to de adm i s s i b i l idade do p rocesso, não mais sob a rub rica "cond ição da ação" . Ao e n u merar as h i póteses de exti n ção do processo sem resolução do mérito, o CPC, no i nc iso V I do art. 483, menci ona a i l egit im idade e a falta de i nteresse p rocessua l .

Su bsomem -se, en tão, à trad i c iona l e consagrada categor ia dos " p ressu postos p rocessua is" , guarda-ch uva que ab range todos os req u i s itos de ad m i s s i b i l i dade de u m p rocesso88 •

O estudo desses req u i s itos p rocessuais passa a se r feito conj u ntamente com o dos demais p ressu postos p rocessua is .

A legit i m idade ad causam é h i pótese de req u i s i to de adm iss i b i l i dade su bjetivo re laci onado às partes; o i nteresse de agi r, req u i s ito objet ivo ext rínseco pos i t ivo .

9.2. O art. 1 7 do CPC

O art. 1 7 do CPC diz o segu i nte : " Para postu la r em j uízo é necessár io te r i n te­resse e legit i m idade" .

É p rec iso faze r a lgu mas observações sobre esse d i s pos it ivo.

a) Esse art igo corresponde ao art. 3° do CPC- 1 973 , q ue, porém, t i n h a redação um pouco d i ferente: " Para p ropo r ou contestar ação é n ecessár io ter i nteresse e legit i m i dade" .

A m udança é sut i l , mas cons ide ráve l .

In teresse e legitimidade são exig idos para q ua lq ue r postu lação em j u ízo, não apenas para a p ropos i tu ra da demanda ou ap resentação da res pect iva defesa.

Tam bém se exigem o i nteresse e a legit i m idade para reco rre r, argu i r i m ped i ­m e nto ou suspe ição do j u iz, chamar ao p rocesso, suscitar os i n cidentes p rocessua is (conf l i to de com petênc ia, i n cidente de reso l ução de demandas repetit ivas etc . ) etc.

88. J á exam inava a legit i mação ad causam como p ressu posto processual , ASS IS , Araken de . "Su bst i tu i ção p roces­

sual" . Revista Dia lética de Direito Processual. São Pau lo : D ia lét i ca, 2003, n . 09, p . 9-

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

A redação do e nu nciado tam bém aj uda a com p reende r a dinamicidade das posições processuais. O suje ito pode ter l egit i m idade para um ato e não a ter para o out ro; pode não ter i n teresse para a lgo e tê- l o para out ra co isa; pode não ter, o rig i na riamente, l egit i m idade e, tem pos depo is , essa legit i m idade ser adq u i rida - o mesmo pode oco rrer com o i n teresse de agi r. As pos ições p rocessuais são d i nâm i ­cas. O tema será exam inado em i t em ma is à f rente .

b) A postu l ação p rocessua l ex ige o utros req u i s itos, a lém do i nteresse e da leg it im idade . É p rec iso que a parte p reencha os demais req u i s itos p rocessua is s u b­jet ivos (capac idade p rocessua l e capac idade postu latória) e o bjetivos ( i n t rín secos e ext rínsecos negativos) . O art. 1 7 do CPC não exaure, portan to, as exisências formais da postulação .

9.3. Legitimação para agir

9.3. 1 . Noção

A todos é garant ido o d i reito consti tuc iona l de p rovocar a ativi dade j u ri sd ic io ­na l . Mas n i nguém está auto rizado a levar a j u ízo, de modo efi caz, toda e q ualq ue r p retensão, re laci onada a q ua lq ue r o bj eto l it ig ioso . I m põe-se a exi stênc ia de u m vín ­cu l o entre os su jeitos da demanda e a s i tuação j u ríd ica afi rmada, q u e l h es autorize a ger i r o p rocesso em q u e esta será d i scut ida .

S u rge, en tão, a noção de legit i m i dade ad causam.

A legit i m idade para agi r (ad causam petendi ou ad asendum) é req u i s i to de ad m iss i b i l i dade q ue se p rec isa i nvest igar n o e l emento su bjetivo da demanda : os suje itos. Não basta q ue se p reencham os " p ressu postos p rocessua is" su bjetivos para que a parte possa atuar regu la rmente em j uízo . É n ecessár io, a i nda, q u e os su je i tos da demanda estejam em dete rm i nada s i tuação j u ríd ica que l h es auto r ize a conduzi r o p rocesso em q u e se d iscuta aq ue la relação j u ríd ica de d i re ito mater ia l ded uz ida em j uízo .

É a "pe rt i nência su bjetiva da ação", segu ndo cé leb re defi n i ção dout ri nár ia89 •

A esse poder, confe ri do pe la le i , dá-se o nome de l egit i m idade ad causam ou capacidade de conduz i r o p rocesso. Parte legíti m a é aq ue la que se e n cont ra em pos ição p rocessua l (auto r o u réu) co i n ci dente com a s i tuação legit i madora, "decor­rente de ce rta p revisão l egal , relativamente àq ue la pessoa e perante o respectivo o bj eto l i t ig ioso"90•

89. BUZAID, Alfredo. Asravo de petição no sistema do Código de Processo Civil. 2• ed. São Pau lo : Saraiva, 1 956, p . 89. 90. ASSIS, Araken de . "Su bstitu i ção p rocessua l" . Revista Dia lética de Direito Processual. São Pau lo : D ia lét i ca, 2003,

n . 09, p . 9 . Em sent ido bastante seme lhante, José Car los Barbosa More i ra, que reputa a leg it imação como a "co inc idênc ia ent re a s i tuação j u ríd ica de uma pessoa, tal como resu lta da postu lação fo rmu lada perante o

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F R E D I E D I D I E R J R .

Para exe m p l i f i car : se a lguém p retende obter u m a i nden ização de outrem , é necessár io q u e o autor seja aq ue le q u e está na pos ição j u ríd ica de vantagem e o réu seja o t i tu lar, ao menos em tese, do dever de i n den izar.

Essa noção reve la os p r i nc i pa is aspectos da l egit i m i dade ad causam: a) trata­-se de u m a s i tuação j u ríd ica regu lada pe la l e i ("s i tuação leg it i mante"; "esq uemas abstratos"; "mode lo i dea l" , nas exp ressões no rma lmente usadas pe la doutr i na) ; b) é qual i dade j u ríd ica q u e se refere a am bas as partes do p rocesso (auto r e ré u);9 ' c) afe re -se d iante do o bjeto l i t ig ioso, a re lação j u ríd ica su bstanc ia l deduz ida - "toda leg it i m idade baseia-se em regras de d i reito mater ia l "/' em bora se exam i ne à luz da s i tuação afi rmada no i n stru m ento da demanda.9 3

A leg it i m i dade ad causam é b i l ateral , pois o autor está l egit i mado para p ropor ação em face daque l e réu , e não em face de outro. " Pode-se d izer, n o q u e tange à leg it i m idade do réu , q u e não const i tu i e la no rma lmente u m a legit i m i dade autôno­ma e desvi n cu l ada daq ue la do autor. Ambos são leg it imados quando i n ser idos na mesma re lação j u ríd i co -p rocessua l emergente da p retensão. Da mesma forma, se ­rão am bos carentes de l egit i m idade q uando u m de les est iver a l he io a ta l re lação"94•

9.3.2. Classificação

A p ri n c i pa l c lass if i cação da l egit i mação ad causam é a que a d iv ide em le-8itimação ordinária e le3itimação extraordinária . Trata-se de c lass if i cação q u e se baseia na relação ent re o legit i mado e o objeto l i t ig ioso do p rocesso.

Há l egit i mação o rd i nár ia q uando houver co rrespondênc ia en tre a s i tuação le­g it i mante e as s i tuações j u ríd i cas s ubmet idas à ap reciação do j u iz . "Co i n c idem as f igu ras das partes com os polos da re lação j u ríd i ca, mater ia l ou p rocessua l , real ou apenas afi rmada, ret ratada no pedido i n i c i a l " . 95 Legiti mado o rd i nár io é aq ue le q u e defende em j uízo i n te resse própr io . " A regra geral da legit i m i dade somente poder ia

res i d i r na co rrespo ndênc ia dos f igu rantes do p rocesso com os suje i tos da l ide" .96

órgão j ud i cia l , e a s ituação leg it imante p revista na le i para a pos ição processual que a essa pessoa se atri bu i ,

ou q u e e la mesma p retende assu m i r" . ("Apontamentos para u m estudo s istemático da leg it i mação extrao rdi ­

nár ia" . Revis ta dos Tribunais. São Pau l o : RT, 1 969, n . 404, p . 09- 1 0 .)

9 1 . A parte i legít ima é tão parte quanto a legít ima . A legit i m i dade é q ua l idade j u rídica que não const i tu i a f igu ra

de parte, "mas a u nge de j u ri d i c i dade processual , tornando-a parte legít ima para a deci são fi na l " . (ARMEL I N ,

Dona ldo . Le3itimidade para a3ir no direito processual civil brasileiro, p . 85 ) Tanto é ass i m que o réu , que é

parte, tem leg i t im idade para a legar a sua própr ia i l egit i m idade.

92 . ASSIS, Araken de . "Subst i tu ição p rocessua l " . Revista Dia lética de Direito Processual. São Pau l o : D ia lética, 2003, n . 09, p . 1 0 .

9 3 - ARMEL IN , Dona ldo . Le3itimidade para a3ir no direito processual civil brasileiro, p. 94- 1 00; BEDAQUE , José Rober­

to dos Santos. " P ressu postos p rocessuais e cond ições da ação" . ]ustitia. São Pau lo : s/ed. 1 99 1 , out-dez, n . 53 ,

p . 57 ·59 -94- ARMEL IN , Dona ldo . Le3itimidade para a3ir no direito processual civil brasileiro, p . 103 .

95 - ARM EL I N , Dona ldo . Le3itimidade para a3ir no direito processual civil brasileiro, p . 1 1 7 .

96 . ASS IS , Araken de . "Subst itu i ção p rocessua l" , p. 1 2 .

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

Há lesitimação extraordinária (su bst itu i ção p rocessua l ou l egi t imação anôma­la) q uando não h o uver correspondênc ia total en tre a s i tuação l egit i mante e as s i tua­ções j u rídi cas s ubmet idas à ap reciação do órgão j u lgador. Lesitimado extraordinário é aquele que defende em nome próprio in teresse de outro sujeito de direito .

É possíve l q ue, nestes casos, o o bjeto l i t ig ioso também l h e d i ga respeito, q uando então o legit i mado reu n i rá as s i tuações j u ríd i cas de legit i mado ord inár io (defende d i re ito também seu) e extrao rd i n ár io (defende d i re ito também de out ro);97 é o q ue acontece, p . ex. , com os condôm i nos, na ação reivi nd i cató r ia do bem, art. 1 . 3 1 4 do Cód igo Civ i l . En fi m , na lesitimação extraordinária confere-se a a lsuém o poder de conduzir processo que versa sobre direito do qual não é titular ou do qual não é titular exclusivo.

Há leg i t i mação extrao rd i nár ia autônoma q uando o leg i t i mado ext rao rd i nár io está auto r izado a cond uz i r o p rocesso i n dependentemente da part ic i pação do titu la r do d i reito l i t ig ioso . "O contraditó r io tem -se como regu larmente i n stau rado com a só p resença, no p rocesso, do legit i mado ext rao rd i nár io" . 98 É o caso da ad m i n i st rado ra de consórc io , q u e é su bst it uta p rocessua l do grupo de consórc io (soc iedade não person if i cada), nos termos do art . 3° da Le i n . 1 1 . 795/2008.

Há leg it i mação ext rao rd i nár ia subordinada q uando a p resença do t i tu lar da re lação j u ríd ica controve rt ida no p rocesso é essenc ia l para a regu lar idade do con ­t rad itó ri o . Reserva-se ao leg it i mado extraord i nár io a poss i b i l i dade de coadj uvar o leg it i mado o rd i nár io, ass u m i ndo " pos ições p rocessua is acessór ias" . Trata-se de le­g it i mação extrao rd i nár ia que auto riza ao terce i ro, estran h o ao objeto l i t ig ioso, a part ic i pação no p rocesso como ass istente do legit i mado o rd i nár io .99 No rma lmente, a leg it i mação s u bord i n ada é at ri b uída a t itu la r de re lação j u ríd i ca d i st i nta da q u e se d i scute, mas que manten ha n exo de i nterdependênc ia c o m esta. O assi stente s im p les é exem p lo de legit i mado ext raord i nár io s ubo rd i nado (art . 1 2 1 , par. ú n . CPC) .

Em out ras s i t uações, a legit i m idade subo rd i n ada é at ri bu ída ao p ró p r io t i tu la r do d i re ito l i t ig ioso, com o acontece nas h i póteses de lesitimação extraordinária ex­clusiva, q u e são raras, mas existem (ex . : leg it i mação extrao rd i nár ia do agente f id u ­c iár io para a defesa dos d i re itos dos debenturistas, art. 68 , § 3o, da Le i n . 6 .404/ 1 976) ; a d i st i nção entre as s i tuações é q ue, n este ú lt i mo caso, o t i tu lar do d i re ito l i t ig ioso poderá i n te rvi r como ass istente l i t i sconso rc ia l (art . 1 8, par. ú n . CPC) 1 00 - é h i pótese de legit i mação ord inár ia s ubo rd i nada" .

97 . ARM ELI N , Dona ldo . Lesitimidade para asir no direito processual civil brasileiro, p. 1 1 9· 1 20 . 98. MORE I RA, ) o sé Car los Barbosa. Apon tamen tos para um estudo sistemático da lesitimação extraordinária, p . 1 0 . 99. MORE I RA, )osé Car los Barbosa. Apontamentos para um estudo sis temático da lesitimação extraordinária, p .

1 0 · 1 2 . Também ass im , D I NAMARCO, Când ido Range i . Instituições de Direito Processual Civil, v . 2 , p . 3 1 1 . 1 00 . Também ass im , antes d o CPC atual , ASS IS , Araken de . "Substituição processual", cit . , p . 1 3 ; D I D I E R ) r. , F red ie .

Recurso de terceiro. São Pau lo : RT, 2002, p . 1 05 .

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F R E D I E D I D I E R J R .

A legit i mação pode se r tam bém c lass if icada em exclusiva e concorren te

Há legit i mação exclusiva q uando o contraditór io somente pude r ser cons ide ­rado regu la r e eficazmente fo rmado com a p resença de u m determ i nado su je i to de d i reito - atri bu i - se o poder j u ríd ico a apenas u m suje ito .

Há legit i mação concorrente ou co le3itimação q uando mais de um suje ito de d i reito est iver autor izado a d iscut i r em ju ízo dete rm i nada s i tuação j u ríd ica. Há es­tre i ta re lação entre o l i t i sconsó rc io u n itár io e a co legit i mação . Para que duas ou ma is pessoas estejam em ju ízo, no mesmo po lo do p rocesso, d iscut i ndo a mesma re lação j u ríd ica mater ia l ( l i t i sconsó rc io un itár io), é p rec iso q u e am bas ten ham leg i ­t i m idade, o u seja, é p rec iso que sejam colegit i madas. Sob re o l it isconsórc io u n itár io, ve r capítu l o sob re l i t i sconsó rc io , mais à frente .

A l egit i mação pode tam bém ser c lass if icada em iso lada ou simples, quando o legit i mado pude r estar no processo soz i n ho , e legit i m ação conjunta ou complexa, q uando houver necess idade de fo rmação do l it i sconsó rc io ' 0 ' . A legit i mação conjun ta somente pode operar-se n o po lo pass ivo, po is não existe o l i t i sconsórc io necessár io at ivo, como tam bém será exam inado adiante, no capítu l o sob re o l it i sconsórc io .

É possíve l , tam bém, d ivi d i r a leg it im idade em total, q uando exi st i r para todo o p rocesso, e parcia l, q uando se re lac ionar a a lgum i n cidente, a "c ie rtos trám ites y f i nes determ i nados q u e no se re laci onan con la deci s i ón sobre la l i t i s", ' 0' como ocorre, por exem plo , com a legit i mação passiva do j u i z/perito/promotor para a a le­gação de suspe i ção o u i m ped imento .

F i na lmente, a legit i m idade pode ser d ivid ida em ori3inária, verif icada à l uz da demanda i n ic ia l , e derivada, que é "decorrente daq ue la e resu ltante de s i tuações de sucessão na t i tu lar idade do d i reito alegado no pedido e na q ua l idade de parte p rocessua l" . ' 0 3 A legit i mação extrao rd i nár ia do a l i enante da coisa l i t ig i osa, q ue pode permanecer no processo na defesa do i nteresse do adq u i ren te, é exe m p lo de leg i ­t imação de rivada (art. 1 09, § 1 °, CPC) .

9.3.3. Substituição processual ou legitimação extraordinária

Parte da doutr i na nac iona l tem por s i n ôn i mas as des ignações "substitu i ção

p rocessua l" e " l egit i mação ext rao rd i nária" .

1 0 1 . D I NAMARCO, Când i do Range i . Instituições de Direito Processual Civil, v . 2 , p . 3 1 2 . " . . . a leg i t i m i dade o rd i nár ia

d e cada co leg i t i mado está c h u m bada à dos demais , d e modo a só se c o m p l etar com o concu rso d e todos

os leg i t imados . . . " . Tam b é m ass i m , ARMEL I N , Dona ldo . Le!Jitimidade para a!Jir no direito processual civil

brasileiro, p. 1 1 9; GRAN DA, P iedad Gonzá lez . E/ litisconsórcio necesario en e / proceso civil. G ranada: Ed i to r ia l

Comares , 1 996, p . 92 -93 .

1 02 . ECHAN DÍA, Devis . Teoría !Jeneral de/ proceso. 3' ed . Buenos A i res : Ed itor ia l U n ivers idad, s/a, p. 262 .

1 03 . ARMEL IN , Dona ldo . Le!Jitimidade para a!Jir no direito processual civil brasileiro, p . 1 20.

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

H á, n o entanto, q ue m defenda acepção ma is restrita à "su bsti tu i ção p roces­sua l " . Segundo essa co rrente, a subst i tu i ção p rocessua l ser ia apenas u m a espéc ie do gêne ro " l egit i mação extraord i nár ia" e exist i ri a q uando oco rresse uma efetiva su bstitu i ção do legit i mado o rd i nár io pe lo l egit i mado extrao rd i nár io, nos casos de le ­g it imação extrao rd i nár ia autônoma e exc l usiva o u nas h i póteses de l egit i mação au ­tônoma conco rre nte, em que o legit i mado extrao rd i nário age em razão da o m issão do legit imado o rd i nár io, q u e não part ic i pou do p rocesso como l it isconsorte . Nessa l i n ha, não se ad m ite a coexistênc ia de s u bsti tu i ção p rocessua l e l i t isconsó rc io . ' 04

Anotado o apu ro técn i co, não vemos ma iores i n conven i e ntes em q u e se ado­tem am bas as exp ressões como s i n ô n imas e esta é a opção deste Curso .

Convém s i n tetizar as p r i nc i pa is caracte ríst icas da l egit i mação extrao rd i nária, a lém daq ue les j á exam i nadas .

São e las .

a) O subst ituído tem o d i re ito de i ntervi r no p rocesso conduz ido pe lo su bst i ­tuto . Essa i nterven ção dar-se-á na q ua l i dade de assisten te litisconsorcia l (art . 1 8, par. ú n . , CPC) .

b) O su bst ituto p rocessual pode i ntervi r, como ass istente l i t isconso rc ia l , nas causas de que faça parte o s u bstitu ído . O par. ú n . do art . 996 exp ressamente perm i ­te o recu rso de tercei ro subst ituto p rocessua l .

c) O leg it imado extrao rd i nár io atua no p rocesso na q ua l i dade de parte, e não de rep resentante, f icando s u bmet ido, em razão d isso, ao reg ime j u ríd ico da parte . Atua em nome p róp rio , defendendo d i reito a l he i o . H á i n co i n cidênc ia, portanto, e n ­t re a s partes da demanda e as partes do l i tíg io . Em razão d isso, é em re lação ao su bstituto q u e se exam i na o p reen c h imento dos req u i s i tos p rocessuais s u bjetivos . 1 05 A i m parcia l i dade do magistrado, po rém , pode se r ave r iguada e m re lação a am bos : s u bst ituto o u su bst ituído ' 06 •

d) A s u bst itu ição p rocessua l pode ocorrer tanto no po lo passivo'07 q u anto no po lo ativo da demanda, m u ito em bora as preocu pações da doutr ina se ten ham con ­centrado na legit i mação ext rao rd i nár ia ativa.

A legit i mação extrao rd i nár ia passiva é assu nto de m u ita i m po rtânc ia p rática . E i s a lgun s exem p los de ap l i cação desse i n st i tuto :

1 04. ARMEL I N , Dona l do . Lesitimidade para asir no direito processual civil brasileiro, p . 1 32- 1 33 . 1 05 . CAMPOS J R . , E ph ra im d e . Substituição processual. São Pau l o : RT, 1 985, p . 7 4 ; ASS IS , Araken de . "Subst itu i ção

p rocessua l" , cit., p . 2 1 .

1 06 . CAMPOS J R . , E ph ra im de. Substituição processual, p . 75; ASS IS , Araken de. "Su bstitu i ção p rocessua l" , c i t . , p . 2 1 ; C I NTRA, Antôn i o Car los de Araújo. "Estudo sobre a su bstitu i ção p rocessual no d i re ito bras i l e i ro" . Revista dos Tribunais. São Pau l o : RT, 1 972 , n. 438, p . 30.

1 07 . FORNACIAR I J R. , C l ito. Da reconvenção no direito processual civil brasileiro . São Pau lo : Saraiva, 1 983, p . 9 1 .

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F R E D I E D I D I E R J R .

i) no exame da ad m i ss i b i l i dade da reco nvenção p roposta por ré u em de­manda aj u izada po r s ubst ituto p rocessua l : se rá ad m i ssível a reconven ­ção se o subst ituto-auto r tam bém tive r legit i m idade extrao rd i nár ia pas­s iva (art . 343, §6o, CPC);

ii) na so lução do i n tr i n cado p rob l ema da legit i m idade do su bst ituto p roces­sual passivo para a legar as exceções su bstanc ia i s (contrad i reitos); '08

iii) no apri mo ramento do i n teressantíss i mo tema das "ações co letivas pas­sivas" (defendam class action), q u e são aq ue las em q u e se afi rma a existênc ia de s ituações j u ríd i cas co letivas pass ivas (deve res co l etivos, por exe m p lo; ver capítu l o sob re p rocesso co letivo passivo no v. 4 deste Curso);

iv) na ap l i cação do i n st ituto consagrado no art . 1 . 228, §§ 4o e so, do Código C iv i l ;

v) na so l ução do l i t isconsó rc io m u lt i t ud i nár io pass ivo, q ue só i ocorrer em demandas possessór ias .

e) Salvo d i spos ição legal em sent ido contrár io (ver, p . ex., art . 274 do Cód igo Civi l , ' 09 e art. 1 03 do CDC), a co isa j u lgada porventu ra s u rg ida em processo conduz i ­do por leg it i mado extrao rd i nár io estenderá os seus efeitos ao su bst ituído . "0 Trata-se

1 08 . Exam inando os do i s l ados da q u estão, ARMEL IN , Dona l do . Le3itimidade para a3ir no direito processual civil brasileiro, c it . , p. 1 35; ASSIS, Araken de . "Su bstitu ição processual" , c it . , p . 2 1 .

1 09 . Art . 274 do Código Civi l : " O j u lgamento contrár io a u m dos credo res so l i dár ios não at i n ge o s demais , mas o j u lgamento favo ráve l ap rove ita- l hes, sem p rej uízo de exceção pessoal que o devedor tenha d i re ito de i nvocar em re lação a q ua lquer de les ." .

1 1 0 . "O q u e caracte riza a legit i m idade extraord i nár ia, não só no p rocesso, como, tam bém, nos demais campos do d i reito, é a poss i b i l i dade de atos do ass i m legit i mado i nf luírem na esfera patri mon ia l a l he ia". (ARM EL IN , Dona ldo . Le3itimidade para a3ir no direito processual civil brasileiro, p . 1 28) . Também ass i m : C H I OVEN DA, G i u ­seppe . Instituições de Direito Processual Civil. Camp i nas : Bookse l l e r, 1 998, v . 1 , p . 502; C I NTRA, Antôn i o Car los de Araújo. " Estudo sobre a su bstitu i ção p rocessual n o d i re ito b ras i l e i ro" . Revista dos Tribunais. São Pau lo :

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RT, 1 972 , n. 438; OL IVE I RA jr., Waldemar Mariz de O l ivei ra. Substituição Processual. São Pau lo : RT, 1 97 1 , p . 1 69; DELGADO, José Augusto. "Aspectos controvert idos da su bsti tu i ção processua l" . Revista de Processo. São Pau lo : RT, 1 987, n . 47 , p . 1 3; N E RY j r. , Ne l son ; N ERY, Rosa. Códi3o de Processo Civil comentado. 1 1 ' ed . São Pau lo : RT, 201 1 , p. 1 93; MAR I NON I , Lu iz Gu i l herme; M IT I D I ERO, Dan ie l . Códi3o de Processo Civil comentado arti3o por arti-30. São Pau lo : RT, 2008, p . 1 0 1 ; BENEDUZ I , Renato Resende . " Legit i m i dade extraord i nár ia convenc iona l" . Revis ta Brasileira de Direito Processual. Belo Ho rizonte : Foru m, 201 4, n. 86, p. 1 36 . Em sent ido d iverso, não admi t i ndo a regra de extensão da co i sa j u lgada ao s u bstituído, q u e somente oco rre em h i póteses específicas, em respeito ao devido p rocesso legal , TALAM IN I , Eduardo. " Partes, tercei ros e co isa j u lgada (os l i m ites s ubj etivos da co isa j u lgada)" . Aspectos po lêmicos e atuais sobre os terceiros no processo civil e assuntos afins. Fred ie D i d i e r J r. e Te resa Arruda Alv im Wam b ie r (coo rd . ) . São Pau lo : RT, 2004, p. 222 - 225 . Para o autor, a lgu ns cr i tér ios devem ser observados para que ha ja essa extensão: "( i) se o su je ito teve a p révia opo rtun idade de exe rce r a ação e não o fez, é razoável que , em certos casos, a le i at r ibua a leg it i m idade a outrem para atuar e m j u ízo e v incu la r

o su bst ituído . . . ; ( i i ) se o su je i to t i nha (ou, conforme parâmetros de razoável d i l i gênc ia, dever ia ter) c iênc ia

do p rocesso em que ocor r ia su bstit u i ção, também é legít imo q u e a co isa j u l gada o at i nja, ( i i i ) espec ia l mente

nessa segu nda h i pótese, a extensão da co isa j u l gada ao su bstituído f ica a inda cond ic ionada à poss i b i l i dade

de e le , q uerendo, part i c ipar do p rocesso como assistente". (ob . c it . , p . 223 -224) Também ass i m , ARAGÃO, Egas

D i rceu Mon iz de. Sentença e coisa jul3ada. Rio de Jane i ro, 1 992, p . 302.

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

da p ri n c i pa l ut i l i dade da su bst itu i ção p rocessua l . É, portanto, s i tuação que re lativiza o art. 506 do CPC . ' ,

A l iás, ressa lvadas a s s i tuações em que o legit i mado extraord i nár io tam bém possu i legit i mação ord i nár ia, os efe itos da dec i são j ud i c ia l re percut i rão d i retamente apenas na esfera j u ríd ica do subst ituído, em bora o su bst ituto f iq ue s u b m et ido ao que foi dec id i do . Ao subst ituto, no entanto, não escaparão as conseq uênc ias da s u cum bência, f i cando , ass im , responsáve l po r custas e hono rár ios advocatíc ios,.

f) O s u bst ituto p rocessua l tam bém pode se r suje ito pass ivo de sanções p roces­suais , como a p u n i ção pe la l i t igânc ia de má-fé, ' ' 3 e de med idas coercit ivas, como a m u lta j ud i c ia l .

3) Quanto aos poderes p rocessuais , o s u bst ituto p rocessua l tem, o rd i nar ia­mente, apenas aq ue les re lac ionados à gestão do p rocesso, não lhe sendo atri bu ­ídos poderes de d i spos ição do d i re ito m ater ia l d i scut ido . " Parece co rreto atri b u i r a o su bst ituto a a legação de todas a s exceções e defesas i n t rínsecas a o a lcance d a s u bst i tu ição" . 1 1 4 A le i , ou o negócio j u ríd i co, contudo, poderá au mentar ou d i m i n u i r o ro l destes poderes.

h) A i n exi stê nc ia de legit i mação extraord i n ár ia não l eva à reso l u ção do mé rito da causa, confo rme apontado aci ma . Trata-se de aná l i se p u ramente do d i re i to de condução do p rocesso, sem q u e haja i nvestigação dos fundamentos da demanda. 1 1 5 H á reje i ção da demanda por i nad m i s s i b i l i dade, na fo rma do a rt . 485, V I , do CPC .

Por isso a legitimação extraordinária é claramente um requisito de va lidade do processo.

Sem p re q u e possíve l , deve o ó rgão j u ri sd i c i ona l , em vez de exti ngu i r o p ro­cesso em razão da fa lta de legit i mação extrao rd i nária, tentar p rocede r à s ucessão p rocessua l , com a troca do su je ito por a lguém q u e seja leg it i mado (ord i n ár io o u extrao rd i n ár io) . C o m isso, p rest ig ia-se a dec isão de mé rito . Ap l i ca-se, po r ana log ia, o regramento já existente no âmb ito do p rocesso co letivo (art. 5o, § 3o, da Lei n . 7 · 347/1 9Ss) .

1 1 1 . Para Leonardo G reco, a co i sa j u l gada, o r i unda de p rocesso conduz ido por s u bstituto processual , somente se estende ao su bstituído secundum even tum litis e in utilibus (Teoria da ação no processo civil. São Pau lo : D ia lética, 2003, p . 4 1 ) .

1 1 2 . ARMEL IN , Dona ldo . LeBitimidade para aBir no direito processual civil brasileiro, p . 1 34; ASS IS , Araken d e . "Substituição processual", p . 22 . Ve r, porém, art . 1 8 da L e i n . 7 . 347/ 1 985: " N a s ações de q u e t rata esta le i , não haverá adiantamento de custas, emo l umentos, hono rár ios pe ric ia is e q uaisq uer outras despesas, nem condenação da associação auto ra, salvo com p rovada má-fé, em hono rár ios de advogado" .

1 1 3 . ASSIS, Araken de . "Substituição processual", p . 2 2 . 1 1 4 . ASSIS, Araken de . "Substituição processual", p . 2 1 .

1 1 5 . " N i nguém s e atreverá a reputar respeitante a o mé rito eventual j u ízo q uanto à i n existênc ia, em dete rm i nado caso concreto, do títu lo legal para a lguém p le itear em j u ízo d i re ito a lhe io" . (ASS IS , Araken de . "Substituição processual", p. 1 o).

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F R E D I E D I D I E R J R .

9.3.4. Fonte normativa da legitimação extraordinária

9.3.4. 7 . Generalidades

A legit i mação extrao rd i nár ia deve ser en carada como a lgo excepc iona l e deve deco rre r de autorização do ordenamento jurídico (art. 1 8 do CPC) - não ma is da " l e i " como exig ia o art. 6 o do CPC-7 3"6 •

O CPC atua l adotou ant iga l i ção doutr i nár ia"7 , segu ndo a q ual se ria possível a at ri bu i ção de le3itimação extraordinária sem p revisão expressa na le i , desde q u e seja possíve l i dent if i cá- la n o ordenamento jurídico, visto como s istema. A i n sp i ração leg is lativa é c lara e me rece registro.

Além dos exe m p los já citados, há out ros i n ú meros casos de l egit i mação ex­t raord i nária q ue decorrem da l e i : i) legit i m ação para as ações co letivas (art . 5o da Lei n. 7 . 347/ 1 985; art . 82 do CDC); ii) legit i mação para a p ro posit u ra das ações de contro le concentrado de consti tuc iona l idade (art. 1 03, CF I 1 988); i i i) l eg it i mação para i m petração do mandado de segu rança do te rcei ro ti tu la r de d i re ito l íq u i do e ce rto q u e depende do exe rcício do d i reito por outrem (art. 3°, Lei n. 1 2 . 0 1 6/2009); iv) l egit i mação do denunciado à lide para defende r os i n teresses do denu nc iante em re lação ao adversár io com u m (arts . 1 2 7 - 1 28, CPC); v) le3itimação do M i n i stér io Pú ­b l i co para o aj u izamento de ação de i nvestigação de pate rn idade (art . 2°, §4°, L e i n . 8 . 560/ 1 992) ; vi) legit imação d o cap itão d o navio para ped i r arresto, c o m o objetivo de garant i r o pagamento do frete (art. 527 do Cód igo Come rc ia l) ; vi) leg it i mação do c redor e do M i n i stér io P ú b l ico para p ropor ação revocató r ia fa l imentar - su bsti tuem a massa fal i da (art . 1 3 2 da Le i n . 1 1 . 1 0 1 /2005); vii) leg it i mação para i m petração do habeas corpus (art. 654 do Cód igo de Processo Pena l ) ; viii) legit i mação do c redo r so l i dár io para a ação de cob rança ou de execução da o b rigação so l i dár ia (art. 267 do Cód igo C iv i l ) ; ix) no p rocesso de d i sso lução parc ia l de soc i edade, se todos os sóc ios forem citados, a soc iedade não será c itada, mas f i ca s u bmet ida à co isa j u lgada (art. 601 , par. ú n . , CPC) - há u m a legit i mação ext rao rd i n ár ia pass iva con ju nta de todos os sóc ios , em defesa dos i nteresses da soc iedade etc.

Sob a vigência do CPC- 1 973 , e ra pacíf ico o entend imento de que não se ad m it ia le3itimação extraordinária de ori3em ne8ocia / :" 8 por u m n egócio j u ríd ico, não se po-

1 1 6 . Art. 6 ' , CPC- 1 97 3 : "N i nguém poderá p le itear, e m nome próprio , d i reito a l he i o , salvo quando autorizado por l e i " . 1 1 7 . ARRUDA ALV IM N ETTO, j osé Manoe l de . Códiso de Processo Civil Comentado. São Pau lo : RT, 1 975 , v . 1 , p . 426;

MORE I RA, José Car los Barbosa. " Notas sob re o prob lema da efet iv idade do p rocesso" . Temas de Direito Proces· sua! Civil - terceira série. São Pau lo : Saraiva, 1 984, p. 33, nota 7. ZAN ETI j r. , He rmes . "A legit i mação conglobante nas ações co letivas: a su bstit u i ção processual decorrente do ordenamento j u ríd ico" . In : Araken de Ass is ; Edu­ardo Arruda Alvim; Ne lson N e ry ) r.; Rodr igo M azzei; Te resa Arruda Alvim Wam b i e r; Thereza Alvi m (Coord.) . Direito Civil e processo: estudos em homenasem ao Professor Arruda Alvim. São Pau lo : Revista dos Tri bunais, 2007, p . 859·866; N E RY j r. , Ne l son ; N ERY, Rosa . Códiso de Processo Civil comentado. 1 1 • ed . São Pau lo : RT, 201 1 . p . 1 90.

1 1 8 . ALV IM N ETTO, José Manoel Arruda. " I m poss i b i l idade de s u bstit u ição processual vo l u ntár ia face ao Código de P rocesso Civi l " . Revista de Processo. São Pau lo : RT, 1 977, n . 5, p . 2 1 5 · 225 ; N ERY j r. , Ne l son ; N ERY, Rosa . Códiso

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

deria atri b u i r a a lguém a legit i mação para defende r i nteresses de outrem em j uízo . I sso porq u e o a rt . 6o do CPC- 1 97 3 reputava a le i , e apenas e la, a fonte no rmativa de leg it imação extrao rd i ná ria .

A s i tuação ago ra parece ser d i fere nte.

O art . 1 8 do CPC exige, para at ri bu i ção da legit i mação extrao rd i nária, auto riza­ção do "ordenamento j u ríd ico", e não mais da l e i . Não bastasse isso, o art. 1 90 do CPC con sagrou a at i p ic idade da n egociação sob re o p rocesso - o tem a é t ratado no capítu l o sob re a teor ia do s fatos j u ríd icos processua is .

9.3.4.2. A legitimação extraordinária negociai

Ne3ócio jurídico é fonte de no rma j u ríd ica e, por isso m es mo, tam bém com põe o ordenamento jurídico1 1 9• Ne3ócio jurídico pode ser fon te normativa da le3itimação extraordinária.

Este n egóc io j u ríd ico é p rocessua l , po is at ri b u i a a lguém o pode r de conduz i r val idamente u m p rocesso .

Não há q ua lq ue r obstácu lo no rmativo a priori para a le3itimação extraordiná­ria de ori3em ne8ocial . E, ass im sendo, o d i reito p rocessua l c ivi l bras i l e i ro passa a perm i t i r a le3itimação extraordinária a típica, de o rigem n egocia i .

M as é p rec iso fazer a lgu mas cons ide rações .

Em p rime i ro l ugar, a so l u ção do p rob lema é d ive rsa, se se t ratar de legit i mação extrao rd i n ár ia ativa ou pass iva.

a) A negociação sobre legit imação extraord i nár ia ativa é mais s imp les e não exi­ge n enhum outro req u is ito, além dos exig idos para os negócios p rocessuais em gera l .

A negoc iação pode ser para transferir ao te rcei ro a le3itimidade ou apenas para estender a e l e essa legit i m idade.

É possível a ampliação da le3itimação a tiva, perm it i ndo que te rcei ro também ten h a legit i m idade para defende r, em j uízo, d i re ito a l he io . C ria -se, aq u i , u m a le8iti­mação extraordinária concorren te.

É possíve l , tam bém, n egociação para transferir a le3itimidade ad causam para u m te rcei ro, sem transfe r i r o p róp rio d i reito, perm it i ndo q u e esse te rce i ro possa i r a j uízo, em nome p róp rio , defende r d i reito a lhe io - perten cente àq ue le q u e l h e atri b u i

d e Processo Civil comen tado. 1 , . ed . São Pau l o : RT, 201 1 , p . 1 90; MAR I NON I , Lu iz G u i l herme; M ITI D I E RO, Dan i e l . Código de Processo Civil comentado artigo por artigo. São Pau lo : RT, 2008, p . 1 0 1 .

1 1 9 . KELSEN, Hans . Teoria Pura do Direito. João Bapti sta Machado (trad.) 6• ed . São Pau l o : Mart i ns Fontes, 2000, p. 284-290; PEDROSO, Anton i o Car los de Campos . Normas jurídicas individua lizadas - teoria e aplicação. São

Pau lo : Saraiva, 1 993, p . 2 1 - 24; 35 -43 .

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F R E D I E D I D I E R J R .

negocia l mente a legit i m idade extrao rd i nária . Nesse caso, teremos u m a le3itimação extraordinária exclusiva decorrente de um ne3ócio jurídico: somente esse terce i ro poder ia p ropo r a demanda . Não há ó b ice a lgu m : se o t i tu la r do d i re ito pode trans ­fe ri r o p róp rio d i re ito ao te rcei ro ("pode o mais") , pode transfe ri r apenas a legit i m i ­dade ad causam, q u e é uma s i tuação j u ríd ica q u e l h e pe rte n ce ("pode o menos") .

Essa tran sferênc ia i m p l i ca verdade i ra re n ú nc ia dessa pos ição j u rídi ca, por isso há de ser i n terpretada restrit ivamente (art. 1 1 4 do Código Civi l ) . Ass im , n o s i l ênc io , o negócio há de ser i n terpretado como se o suje i to apenas q u isesse estender a le ­git i mação ativa, e não transfer i - la .

A negociação ass u m i rá n uances diversas, se se t ratar de le3itimação para a defesa de direito relativo (suje ito pass ivo determ i n ado; d i reito de crédito, por exem p lo) ou para a defesa de direito absoluto (suj eito passivo i n dete rm i nado; p ro­p riedade i n te lectua l , por exem p lo) .

No p rime i ro caso, é razoável ap l i car, por ana logia, a lgu mas regras sob re a cessão de c réd ito (arts . 286- 296, Código Civi l ) . Não apenas pe lo dever de informar, dever anexo decorrente do pri n cíp io da boa-fé contratua l . Em certa med ida, a t rans ­fe rênc ia da l egit i m idade para cobrar a p restação devida é uma tran sfo rmação do conteúdo de u m contrato : fez-se o n egóc io com a i n fo rmação de que determinada pessoa, e apenas e la, i r ia a j uízo d iscut i r eventua l i n ad i m p lemento.

Ass im , a atri bu i ção negocia i de legit imação extrao rd i nár ia é i n efi caz em re la­ção ao futuro réu, se este não fo r not if icado; "mas por notif i cado se tem o devedo r q ue, em escrito púb l i co ou part i c u lar, se dec larou c iente da cessão feita" (art. 290 do Código Civi l , ap l i cado por ana logia) . Aceita-se, a i nda, q ua lque r me io de prova da notif i cação 1 20; o que o art. 290 do Cód igo Civi l faz é p res u m i - l a nesses casos . Demais d i sso, todas as defesas q u e o réu poderia opo r ao le3itimado ordinário poderá opo r ao l egit i mado extrao rd i nár io negocia i (art . 294 do Código Civi l , ap l i cado por ana lo ­g ia) ' 2 1 . O futu ro réu tem o d i re ito de ser c ient if icado do negócio, embo ra não faça parte de le n em prec ise auto rizá- l o .

N o caso de legit imação extrao rd i n ária para direitos absolutos, não há q ua lq ue r n ecess idade de notif i cação do fut u ro réu, q ue, de resto, é desco n h ec ido, po is será aq ue le q u e v ier a p rat icar o i l íc ito extracontratua l . O réu não faz parte do negócio

p rocessua l e nem p rec isa de le tomar c iên c ia . Até porq ue não se sabe q uem será o réu . Aq ue le q u e v io lar o d i reito abso l uto poderá ser demandado por quem ten h a

legit i mação para tanto, o rd i nár ia ou extrao rd i n ár ia .

1 20. Como bem apontou Anton i o do Passo Cabral , em conversa travada com o autor. 1 2 1 . Art. 294 do Código Civi l : "O devedor pode opo r ao cess ionár io as exceções que l he com pet i rem, bem como as

q ue, no momento em que ve io a ter conhec im ento da cessão, t i nha contra o cedente".

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

Um exemplo pode ajudar. I m agi n e uma n egociação e m p resar ia l em q u e u m a soc iedade tran sfere para out ra soc iedade a tota l i dade da sua part ic i pação soc i etária em uma terce i ra soc iedade (objeto do ne ­góc io) . Mas não há transferênc ia da t i tu lar idade das patentes de q u e essa terce i ra soc iedade (objeto do negócio) e ra prop r ietár ia . Em bora não tran sfi ra a p rop riedade das patentes, a vendedora atri b u i à com­p radora a legit i m idade de defende r essas patentes em j u ízo . Le&iti­mação extraordinária, portanto : a emp resa comprado ra defende rá em j u ízo as patentes da em presa vendedora"' .

Outro exemplo. Nos j u izados Espec iais, o com pareci mento do autor, à aud iênc ia de conc i l i ação, é ob rigatór io; se o autor não com parecer, o processo é ext i n to sem exame do mérito (art. 5 1 , I , Lei n . 9 .099/1 995) . H á pessoas que têm sérias d i f i c u l dades de com parecer à aud iênc ia de conc i l iação, mas são ob rigadas a i sso . Basta pensar em pessoas idosas, o u mu ito doentes, o u com d i fi c u l dades de locomoção, ou cuja p rof issão exige viagens con stantes etc. É com u m q u e pessoas m u i to doentes se val ham dos j u izados para o bter p rovidênc ia de u rgênc ia re lac i onada ao d i re ito à saúde ; e la está acamada e n ão tem como com parecer à aud i ên c ia; m u ita vez a so l u ção é s imp lesmente ad iar sine die a rea l ização da aud iên c ia, tudo para c um pr i r o d i s posto na Le i dos j u izados, q ue, nesse aspecto, d i f i cu lta o acesso à j u st iça. Pois a le&itimação extraordinária ne3ocial reso lveria esse problema: o l e ­git imado extrao rd i n ár io não só com parece r ia à aud iênc ia, como autor, como também conduz i ria todo o restante do p rocesso.

Mais um exemplo. Contrato de a l i enação de imóve l . O a l i enante se com p romete a propor ação reivi nd i cató r ia desse imóvel em face de um atua l ocu pante . Com a a l i enação, a p rop riedade se transfere e, ass im , a l egit imação o rd i n ár ia do a l ienante desparece. Cogita-se, e n ­tão, q ue, n o cont rato de a l i enação, o adq u i rente atri b ua ao a l i enante a legit i mação extrao rd i nár ia para a p ropos it u ra dessa ação real"3 •

É i m po rtante lem b rar: o negócio é para a transfe rê n c ia de l egit i mação ad causam at iva. Não se cu ida de transferência do direito - n ão se trata, portanto, de cessão de crédito . Não há transfe rênc ia da s i tuação j u ríd ica mater ia l , en f i m .

b) Bem d iferente é a atri bu i ção n egocia i de legit i mação extrao rd i n ár ia passiva.

N ão pode o futu ro ré u transferir s ua leg it imação pass iva a um terce i ro . O u seja, n ão pode o ré u , pe rmanece n d o t i tu lar de u m a s i tuação j u ríd ica pass iva ( u m

1 22 . Ao que parece, fo i isso o que aconteceu n a venda d a Motoro la pe lo Google à Lenovo: Google f icou com as patentes da Motoro la, mas permit i u que a Lenovo, que passaria a ser dona da Moto rola, p udesse defendê- las e m ju ízo (http : //og lobo .g lobo .co m/sociedade/tecno logia/goog le-app l e-o- rest0- 1 1 495305?top ico=pedro-doria .)

1 23 . BEN EDUZ I , Renato Resende. " Legit i m idade extrao rd i ná ria convenc iona l " . Revista Brasileira de Direito Processu­al. Belo Ho rizonte : Foru m , 201 4, n. 86, p . 1 38 .

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F R E D I E D I D I E R J R .

dever o b rigac iona l , po r exe m p lo) , at ri b u i r a u m terce i ro a leg i t i m ação para defe n ­de r s e u s i n teresses e m j u ízo . Ser ia u m a espéc ie de tu3a do p rocesso, i l íc ita p o r p rej u d i ca r o t i t u l a r da s i tuação j u ríd i ca ativa ( o fut u ro autor) . Não se admite que a l3uém disponha de uma situação jurídica passiva por simp les manifestação de sua vontade 1 24 •

Nada i m pede, porém , que o futu ro autor part i c ipe desse negóc io p rocessua l e conco rde com a at ri bu i ção de leg it i m ação extrao rd i nár ia pass iva a u m terce i ro . P re­ench idos os req u i s i tos gerais da negociação p rocessua l , não se v is l u m bra q ua lq ue r p rob l ema: o suje i to conco rdou em demanda r contra esse tercei ro, q u e defende rá e m j uízo i nteresses de a lguém q u e concordou em l h e atri b u i r essa leg it i mação ex­t rao rd i n ár ia . Ap l i ca-se aq u i , por ana logia, a regra da assu n ção de dív ida, permi t ida com a conco rdânc ia expressa do c redor (art . 299 do Cód igo Civi l )"5 •

Pode o futu ro réu , n o en tanto, ampliar a legit i mação passiva, atri b u i ndo a te rcei ro l egit i mação ext rao rd i n ár ia para defende r seus i n teresses em j uízo . N esse caso, não há q ualq ue r p rej uízo para o autor, que nem p rec isa ser n otif i cado des­sa negociação . I sso porq ue, havendo le3itimação passiva concorren te, esco l he rá o autor cont ra q uem q uer demandar. A amp l i ação dos legit i mados passivos somente benef ic ia o autor. A not if i cação do futu ro autor é, na verdade, u m ô n u s do fut u ro réu : é do seu i n teresse que o futu ro autor sa iba que pode p ropor a demanda contra u m a te rcei ra pessoa.

Um exem p lo . Pode o locado r atri b u i r à ad m i n i st rado ra do imóve l , com q uem mantém cont rato, a legit i mação ext rao rd i n ár ia para tam bém poder ser ré em ação de revisão do valo r dos a l ugue res ou de ação re novató r ia .

Outro exemplo. Uma soc iedade e m p resár ia adq u i re out ra. Os a l i e ­nantes responsab i l izam-se pe las condenações i m postas à soc iedade a l i enada, mesmo após a a l i enação . Em razão d isso , a l i enantes e ad­q u i ren tes reso lvem atri b u i r aos a l i enantes a legit i m i dade extraord i ­nár ia para defende r os d i reitos da soc iedade, mesmo após a venda -atri b u ição de legit i m idade bem i nteressante e ú t i l , po is as a l i enantes, como responsáve is , poderão, ao defende r os i n teresses da soc iedade

a l i enada, ev i tar futu ra responsab i l i zação"6• Note q ue, no caso, há

ampliação da le3itimação passiva.

1 24. Em sent ido d ive rso, para quem é possível a transferênc ia da legit i mação pass iva, desde q u e haja p révia e

s im p les comun i cação ao adversário, BENEDUZ I , Renato Resende . " Legit i m idade extrao rd i nár ia convenc iona l " .

Revis ta Brasileira de Direito Processual. Be lo Ho rizonte: Fo rum, 20 1 4, n . 86 , p . 1 34.

1 2 5 . Art. 299 do Código Civi l : "É facu ltado a terceiro assu m i r a ob r igação do devedor, com o consenti mento expresso

do credor, f icando exone rado o devedor p r im itivo, salvo se aquele, ao tempo da assunção, e ra i n solvente e o

credor o igno rava".

1 26 . B ENEDUZ I , Renato Resende . " Legi t im idade extraord i nár ia convenc iona l" . Revista Brasileira de Direito Processu­

a l. Belo Ho r izonte: Forum, 201 4, n. 86, p . 1 38 .

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

A amp l i ação da legit i m ação pass iva, com a at ri bu i ção de legit imação extrao rd i ­nári a a u m tercei ro, não perm ite que q ua lque r dos possíve i s réus, uma vez deman ­dado , chame ao processo (arts . 1 30- 1 32 , CPC) o o ut ro legit i mado . Há, aq u i , apenas co legit i mação; não há, nesse caso, so l i dar iedade pass iva na ob rigação d i scut ida .

É i m po rtante l emb rar : o negócio é para ampliação de legit i mação ad causam

pass iva. Não se cu ida de transferência da dívida - não se t rata, portanto, de assun ­ção de dívida. Não há tran sfe rênc ia da s i tuação j u ríd ica mater ia l , en fi m .

c) Nada i m pede q u e o s contratantes i n s i ram no contrato c láus u la q u e vede a tran sfe rên cia ou amp l i ação da legit imação ad causam .

d) Le3itimação extraordinária ne3ocia l não é novidade e m n ossa h i stór ia .

No CPC- 1 939 havia uma h i pótese típica de n egóc io p rocessua l , e m q u e se at r i ­b uía a a lguém a l egit i mação extrao rd i nár ia para a defesa de d i reito de o ut rem em j uízo . I sso acontec ia no chamamento à autoria . U ma parte convocava u m tercei ro para sucedê- la em j u ízo; se esse te rce i ro aceitasse essa p rovocação, haver ia suces­são p rocessua l : e i s o negóc io p rocessua l .

O chamamento à autoria era espéc ie de i n tervenção de tercei ro q u e exist ia à época. A parte chamava o tercei ro q u e lhe havia transfe r ido a co isa ou o d i re ito real, que e ra o bjeto do p rocesso; se esse terceiro-chamado aceitasse o chamamen ­to , ass u m i ria a causa, no l ugar do chaman te, para defender os i n teresses deste em j uízo . O chamamento à autor ia poder ia redundar, então, em u m a sucessão p roces­sual , com a t roca de su je itos do p rocesso, transfo rmando-se o tercei ro em parte para a defesa dos i nteresses da parte q ue provocou a sua i n tervenção (art . 95 , § 1 o, e art . 97 , CPC- 1 939)"7 •

A s i tuação aí e ra ai nda mais grave, pois , feito o chamamento pelo réu , o auto r e ra obri3ado a demandar contra o legit i mado extraord i nár io passivo (chamado), caso ele aceitasse o chamamento à autoria (art. 97 , parte inicia l, CPC- 1 939) .

e) A atri b u i ção de leg it i mação ext rao rd i nár ia negoc ia i , d u rante o p rocesso já i n stau rado, some nte é possíve l com a conco rdânc ia de am bas as partes . I sso po r­q u e haver ia s ucessão p rocessua l , caso h o uvesse a m u dança n egocia i do leg it i m a­do . Esse fe nômeno está regu lado pe lo a rt . 1 09 do CPC, q u e exige o consent i mento de todos .

1 27 . Art. 95 do CPC/ 1 939 : "Aque l e q u e demandar o u contra quem se demandar ace rca de co isa ou d i reito real, poderá chamar à autor ia a pessoa de quem h ouve a coisa ou o d i reito real, afi m de resguardar-se dos r iscos da evicção. §1° Se fo r o autor, not if i cará o a l i enante, na i n stau ração do j u ízo, para assum i r a d i reção da causa e mod if icar a petição i n i c ia l . " Art. 97 do CPC/ 1 939 : "Vi ndo a j uízo o denunc iado. receberá o p rocesso no estado em q ue este se achar, e a causa com e le p rossegu i rá, sendo defeso ao autor l it igar com o denunciante" .

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F R E D I E D I D I E R J R .

9.3.5. Substituição processual e sucessão processual

Não se pode confu nd i r a substituição processual com a sucessão processual. Há sucessão processual q uando um suje ito sucede outro no p rocesso, ass u m i ndo a sua pos ição processua l . Há u m a t roca de suje i tos no p rocesso, u m a m udança s u bjetiva da re lação j u ríd ica p rocessua l . Na substituição processua l, não há troca de suje itos; na verdade, não há q ua lque r alte ração da re lação p rocessua l . Oco rre q u e um suje i to tem o poder ( legit i m idade) de estar leg it i mamente em um processo defendendo i n teresse de outre m .

A sucessão processual pode dar-se em razão da mo rte (art. 1 1 o , CPC), as­s um i ndo a pos ição p rocessua l o espó l i o ou os he rde i ros do de cujus. Tam bém há sucessão processual q uando oco rre incorporação de u m a pessoa j u ríd ica por out ra, ass u m i ndo aq ue la que i n corporou, ou fusão de pessoas j u ríd i cas, gerando u m a nova pessoa j u ríd ica q u e ass u m i rá a pos ição p rocessua l daq ue la q u e se exti n gu i u .

A sucessão processual tam bém pode oco rre r vo luntariamen te, n o caso de alie­nação da coisa litis iosa (art . 1 09 do CPC), na q ual o adq u i rente/cess i onár io pode suceder o a l i enante/cedente, caso cons i nta a parte adve rsár ia .

9.3.6. Substituição processual e representação processual

Não se pode confu nd i r, ai n da, a substituição processual com a representação processual.

Há representação processual q uando um suje ito está em juízo em nome a l he io

defendendo i n teresse a l he io . O represen tan te processua l não é parte; parte é o

rep resentado . Note q u e o substituto processua l é parte; o substituído não é parte

p rocessua l , em bo ra os seus i n te resses j u ríd icos estejam sendo d i scut idos em j uízo .

o subst ituto p rocessua l age em nome próprio defendendo in teresse a lheio. O repre­

sen tante processual atua em j u ízo para su p ri r a i n capac idade processua l da parte .

Em uma ação de a l i m entos p roposta por um fi l h o i n capaz, o pai ou mãe pode

ser o seu represen tan te processual . A parte é o i n capaz; o pai ou a mãe pode ser

apenas o seu representante, e não o seu su bst i tuto p rocessua l .

9.3.7. Legitimidade ordinária como questão de mérito

Ao demandar, a parte afi rma uma s i tuação j u ríd i ca mater ia l , q u e co m porá

o mérito do p rocesso . De duas, u m a: a) ou a parte afi rma ser t i tu la r, i so lada ou

con ju ntamente, da s i tuação j u ríd ica l i t ig i osa; b) ou a parte afi rma s i tuação j u ríd i ca

l i t ig iosa pertencente a out ro s uje ito de d i re i to .

Não há uma tercei ra s i tuação possíve l .

No primeiro caso (a), está-se d iante da lesitimação ordinária .

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

Tam bé m aq u i , de duas, u ma:

i) ou a afi rmação é p rocedente, e aí a parte será recon h ec ida como t itu lar da s i tuação j u ríd ica l i t ig iosa e o mérito da causa, exam i nado, o que não s ign if ica neces­sariamente q ue estará sendo reso lvido : é que nem sempre basta o reco n h ec imento da t i tu lar idade do d i re ito afi rmado para q ue a vitó r ia seja a lcan çada, pois a outra parte pode ter u m contradi reito, como a p rescr i ção, q u e neutra l iza a ef icácia da p re­ten são mater ia l do autor. A legitimidade ordinária é pressuposto para o acolhimento do pedido, não para o seu exame.

ii) ou a afi rmação é i m p rocedente, q uando então o ó rgão j u ri sd i c iona l dec la­rará que a s i tuação j u ríd ica l i t ig iosa não l he pertence . Se a parte não for t i tu lar da s i tuação j u ríd ica l it ig iosa, a decisão é necessariamente de mé rito: o ó rgão j u ri sd i ­c i onal exam i na o m ér ito da causa (s i tuação j u ríd i ca l i t ig iosa), para reco n h ecer q u e a parte não t i tu lariza a pos ição j u ríd ica afi rmada ( a pos ição de c redor o u possu ido r, por exemp lo) . o j u iz reso lve rá o mé rito da causa, j u lgando i m p rocedente o ped ido fo rm u lado (art . 487, I , CPC) . O ju iz dec i d i rá que aquela determinada situação liti­giosa não perten ce àq ue la parte - o q u e não s ign if i ca, obviamente, q u e não possa perten cer a out ra pessoa.

Um exem p lo . J oão p ropõe ação possessó ria, afi rmando-se t itu la r de d i re i to à p roteção da posse. Se o j u iz recon h ece que e l e não é titular de direito à proteção da posse, estará deci d i ndo o mé rito da causa, j u lgando i m p rocedente o ped ido form u lado .

O utro exemp lo . josé p ropõe ação de cobrança, afi rmando-se t i tu lar de d i re i to de créd i to . Se o ó rgão j u ri sd ic iona l reconhece que e le não é titular do direito de crédito, estará deci d i ndo o mé rito da causa, j u lgando i m p rocedente o pedido form u lado .

Ma is um exemp l o . Anton i o p l e i te ia verba de natu reza trabal h i sta, afi rmando-se e m p regado do réu . Se o ó rgão j u ri sd i c iona l reconhece q u e e l e não é titular do direito trabalhista, estará dec i d i ndo o mé rito da causa, j u lgando i m p rocedente o ped ido form u lado, po r não ser e le e m p regado"8 •

Em todas as s i tuações, há dec i são de mé rito, i n d iscut ive lmente .

Não é esse, porém, o en tendimento majoritário na doutrina brasileira .

Costuma-se segu i r a t rad ição do pensamento de E n rico Tu l l i o Li ebman"9, q u e p rocu ra separar a aná l i se da l egit i m idade ad causam d a aná l i se do mérito da causa.

1 28 . OL IVE IRA, M i lton More i ra de . " I n existência da Re lação de E m p rego: Carênc ia ou I m p rocedênc ia da Ação ." Revis­ta Brasileira de Direito Processual . U beraba: Forense , 1 984, n. 42, p . 57 -86 .

1 29 . L I EBMAN, En r ico Tu l l i o . "O Despacho Saneador e o j u lgamento do Mér i to" . Revista Forense . R io de jane i ro : Forense, n . 1 04.

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F R E D I E D I D I E R J R .

O i n c iso V I do art. 485 do CPC p rescreve q u e a ilegitimidade é caso de ext i n ­ção do p rocesso sem reso l ução do mé ri to . Na p rát i ca, a tentativa se reve lou vã, ao menos nos casos de legitimação ordinária : a d i st i nção é i m possível e, por i sso, o réu , ao afi rmar a "ilegitimidade do autor, por não ser credor", em segu ida afi rma a "improcedência do pedido do autor, já que ele não tem o crédito que postula ". Ou seja, d iz-se a mesma coi sa, com palavras d ive rsas .

Lem b ra Lu iz G u i l h e rme Mari n o n i "o verdadei ro pân ico q ue toma conta dos operado res j u ríd icos q uando se defro ntam com casos como o da ação reivi nd i cató r ia, n a q ua l o j u iz, após a i n strução, verif ica que o autor não é prop rietári o . "

O q u e dever ia o magistrado, nestas s i tuações, faze r? Exti ngu i r o p ro­cesso sem reso l ução do mérito, po r i l egit i m idade, ta l como a letra do i n c iso VI do art. 485 do CPC recomenda, ou j u lgá- l o imp roceden te, porq ue o autor não tem o d i reito mater ia l afi rmado?

"Podemos d izer, sem medo de er ra r, que a teor ia que aceita que o caso é de carênc ia de ação está m u ito ma is perto do con cret i smo do q ue pode i m agi na r" ' l0 •

No segundo caso (b), está-se d iante da legitimação extraordinária . Tam bém aq u i , de duas, uma :

i) ou a afi rmação é p rocedente, e a í a parte será recon h ec ida com o legit i mada para a condução vál ida daque l e p rocesso, sem q ue com isso o ó rgão j u ri sd i c iona l p rec ise fazer q ualq ue r cons ide ração sobre a s i tuação j u ríd ica l i t ig iosa, o mé rito da causa . O j u iz se l im ita a d izer que foi p reench i do u m req u i s ito para que e l e possa exam i nar o que foi pedido; uma barre i ra p rocessua l terá s ido venc ida . Não há, aqui, decisão de mérito.

ii) ou a afi rmação é i m p rocedente, q uando en tão o ó rgão j u ri sd i c iona l dec lara­rá que a parte não tem auto rização para a cond ução do p rocesso em q u e se d i scute aquela determinada s i tuação j u ríd ica l i t ig iosa; tam bém aq u i , não há dec i são sob re a s i tuação l i t ig i osa, q ue não foi exam i nada. O j u iz se l i m ita a d izer q u e o ped ido

não poderá ser exam i nado, po is quem o form u l ou não poderia tê- l o feito . Não há,

igualmen te, decisão de mérito .

Enfi m , o i n ciso V I do art . 485, CPC, que auto riza a exti nção do p rocesso sem resolução do mérito, po r ausênc ia de leg it im idade, deve ser com p reend ido com o se d i ssesse respeito apenas à falta de legit i m idade extrao rd i nária, po is a falta d e

1 30. Novas linhas do processo civil. 3' ed . São Pau lo : Ma l he i ros Ed . , 200 1 , p . 2 1 1 . Cons iderando a alegação de i nexi stênc ia de víncu l o e m p regatíc io como de mérito, e não de admiss i b i l i dade ( i legit i m i dade para agi r), OU· VE I RA, M i l ton Mo re i ra de . " I n existênc ia da Re lação de E m p rego: Carênc ia ou I m p rocedênc ia da Ação ." Revis ta Brasileira de Direito Processual . Uberaba: Forense, 1 984, n. 42, p. 57·86.

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

l egit i m i dade o rd i nár ia equ ivale à não t i tu lar idade do d i re ito d iscut ido, h i p ótese c la ­ra de i m p rocedênc ia do ped ido nos termos do i n c iso I do art . 487 do CPC .

9.4. O interesse de agir

9.4. 1 . Generalidades

O i nteresse de agi r é req u is ito p rocessual q ue deve ser exam i nado em d uas d imensões: necessidade e utilidade da tute la j u ri sd i c iona l .

Há q uem acrescente, a inda, uma terceira d imensão: a "adeq uação do reméd io j ud ic ia l ou p roced i m ento" como e l emento n ecessár io à conf igu ração do i n teresse de agi r. Não se adota essa pos ição, po is p roced imento é dado estra n ho à aná l i se da demanda e, ademais , eventua l equívoco na esco l h a do p roced imento é sem p re sanáve l ' 3 ' , o q ue não é possíve l nos casos de falta de ut i l idade ou de n ecess idade.

O i n teresse de agi r é um req u i s ito p rocessua l extrínseco positivo : é fato q u e deve exist i r para q ue a i n stau ração do p rocesso se dê val i damente. Se po r acaso

faltar i nteresse de agi r, o ped ido não se rá exam i nado .

Am bas as d i mensões devem ser exam inadas à l uz da s i tuação j u ríd ica l i t ig iosa s u bmet ida a j uízo ' 32 - espec i f icamente, ao menos n o caso da n ecess idade, na causa de ped i r remota1 3 3 •

A constatação do i n teresse de agi r faz-se, s emp re, in concreto, à luz da s i tu ­ação narrada no i n stru mento da demanda . N ão há como i n dagar, em abstrato, se há ou não i n teresse de agi r, po is e le sem p re estará re laci onado a uma dete rm i nada demanda j ud i c ia l .

O con ceito de in teresse de agi r é u m conceito jurídico fundamen tal, e não j u ríd ico- pos it ivo, "exatamente porq ue não deco rre de u m específi co o rdenamento j u ríd i co, não variando de acordo com as defi n i ções emp regadas por cada s i stema no rmativo, sendo , ao contrár io, u n i fo rme e constante em todos os o rdenamentos . Se sua i n observânc ia acarretará a exti n ção do p rocesso sem ou com j u lgamento de mé rito, é p rob l ema q ue, rea lmente, será d isc i p l i n ado por cada o rdenamento j u rí­d i co . Só q u e tal p rob lema se i n sere no âm bito dos efeitos, das conseq uênc ias, dos consectár ios da ausênc ia do i nteresse de agi r, não d izendo respe ito ao seu conce i ­to" . ' 34 Trata-se de conceito fo rmu lado pe la c iênc ia j u ríd ica p rocessua l ' 35 .

1 3 1 . Adota a concepção tr ipartite do in te resse de agi r D I NAMARCO, Când ido Range i . Instituições d e Direito Proces-sual Civil. São Pau lo : Mal h e i ros Ed . , 200 1 , v. I, p . 302-303 .

1 32 . L I EBMAN, En r ico Tu l l i o . Manual de Direito Processual Civil. 2 ed . R io de jane i ro : Forense, 1 986, v. I , p . 1 5 5 . 1 3 3 . TUCC I , José Rogér io C ruz e . A causa petendi no direito processual civil brasileiro, cit., p . 1 7 3 . 1 34. CUN HA, Leonardo José Carne i ro . Interesse de a3ir na ação declaratória. Cu r it iba: ] u ruá, 2002, p . 8o-8 1 . 1 3 5 . CUN HA, Leonardo ]os é Carne i ro . Interesse de a3ir na ação declara tória, c it . , p . 8 1 .

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F R E D I E D I D I E R J R .

Cabe d i sti ngu i r, antes de exam i nar os aspectos do i n te resse de agi r, o i n te resse s u bstancia l do interesse p rocessua l .

O i n te resse p rocessua l "se d i st i ngue do i n te resse su bstanc ia l , para cuja p ro­teção se i ntenta a ação, da mesma mane i ra como se d i st i nguem os do is d i re itos co rres pondentes: o su bstanc ia l q u e se afi rma perte ncer ao autor e o p rocessua l q u e se exerce para a tute la do p rime i ro . I n teresse de agi r é , p o r isso, u m i n teresse p ro­cessua l , sec u ndár io e i n strumental com relação ao i n te resse su bstanc ia l p r imár io; tem por objeto o p rovi mento que se pede ao j u iz como meio para obter a sati sfação de um i n teresse p r imár io lesado pe lo com po rtamento da parte contrária, ou, ma is gene ricamente, pe la s i tuação de fato objetivamente existente" . ' l6

9.4.2. O interesse-utilidade

Há utilidade sem pre q u e o p rocesso pude r p rop i c iar ao demandante o resu lta­do favo rável p retend ido; sem pre q u e o p rocesso puder resu l tar em a lgu m p roveito ao demandante .

A p rovidênc ia j u ri sd i c iona l reputa-se út i l na medida em q ue, "por sua natu ­reza, verdade i ramente se reve le - sem pre em tese - apta a tute lar, de mane i ra tão com p leta q uanto possíve l , a s i tuação j u ríd ica do req ue rente". ' 37 Exp l i ca Când ido D i namarco : "Sem anteve r no p rovi mento p retend ido a capacidade de ofe recer essa espécie de vantagem a quem o postu la, n ega-se a ordem j u ríd ica a em it i - l o e, ma is que isso, n ega-se a desenvo lve r aq ue las ativi dades o rd i n ar iamente p red ispostas à sua em i ssão (p rocesso, p roced imento, ativi dade j u ri sd i c iona l )" . ' 38

É por isso q u e se afi rma, com razão, q u e há falta de i n te resse p rocessua l q uando não mais fo r possíve l a obtenção daq ue le res u ltado al mejado - fa la -se em "pe rda do objeto" da causa . É o que acontece, p . ex . , q uando o c u m primen to da o b ri gação se deu antes da citação do réu - se o adi m p l emento se deu após a cita­ção, o caso não é de perda do objeto (fa lta de i n te resse), mas de recon heci mento da procedênc ia do pedido (art . 487, 1 1 1 , "a", CPC) .

Tam bém falta uti l i dade na execução, q uando o val o r do crédito exeq uendo, de tão ínf i mo, fo r absorvido pe las custas do p rocesso de execução (art . 836 , do CPC) .

O leg is lador b ras i l e i ro ad m ite haver i nteresse -uti l i dade na p reten são processu ­a l à s im p les dec laração (art. 1 9, CPC), mesmo q uando já fo r possíve l o aj u izamento de ação condenatór ia (art. 20, CPC), confo rme exam i nado no capítu l o sob re a teor ia da ação .

1 36 . L I EBMAN, E n ri co Tu l l i o . Manual de Direito Processual Civil. 2• ed . R io de jane i ro : Forense, 1 986, v. I, p. 1 54- 1 5 5 . 1 37 . MORE IRA, josé Carlos Barbosa. "Ação dec larató ria e i nteresse". Direito processual civil (ensaios e pareceres).

Rio de jane i ro : Borsoi , 1 97 1 , p. 1 7 ; L I EBMAN, En r ico Tu l l i o . Manual de Direito Processual Civil. 2 ed. Rio de ja­

ne i ro : Forense, 1 986, v. I , p . 1 5 5 .

1 38 . D I NAMARCO, Cândido Range i . Execução civil. 7• ed. São Pau lo : Mal h e i ros Ed . , 2000, p . 402.

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P R E S S U P O S TO S P R O C E S S U A I S

9.4.3. O interesse-necessidade e as ações necessárias

O exame da "necess idade da j u risd ição" fundamenta-se na prem issa de que a j u ri sd i ção tem de ser en carada como ú lt i ma fo rma de so lução de conf l i to .

Esse pensamento só é correto, ent retanto, para as s i tuações em que se p reten ­de exercitar, pe lo p rocesso, d i reitos a u m a p restação (ob rigac ionais, reais e perso­na líss i mos), po is há a poss i b i l i dade de c um pri m ento espontâneo da p restação . Per­ceba-se, a i nda, q u e a p retensão pena l somente pode ser exercitada pe lo p rocesso. Se não houve r me ios para a sati sfação vo l u ntária, há necess idade da j u r isd ição' 39 •

No j u lgamento do RE n. 63 1 . 240, em 27.08.201 4, o STF entendeu que é necessário o prévio req uerimento admin i strativo antes de o segu rado recorrer à justiça para a concessão de benefício previdenciário. Sem esse prévio req uerimento, faltaria i nteresse de agi r. Se o req uerimento admi ­n istrativo for negado, total ou parcia lmente, bem como q uando não for apreciado pelo I NSS no prazo de q uarenta e ci nco dias, poderá o segu­rado propor a ação perante o j ud iciário. O STF não exige o esgotamento ad m i n i strativo da controvérsia, mas exige o p révio req uer imento, nos termos do voto do re lator, M i n . Roberto Barroso: "Negado o benefício, não há impedimento ao segu rado para que i ngresse no j ud iciár io antes que eventual recu rso seja examinado pela autarq uia". O STF, contudo, considerou não haver necessidade de formu lação de req uerimento admi ­n istrativo prévio para que o segu rado i ngresse jud icialmente com pedi­dos de revisão de benefícios, a não ser nos casos em que seja necessária a apreciação de matéria de fato. Acrescentou ainda que a exigência de req uerimento prévio também não se apl ica nos casos em q ue a pos ição do I NSS seja notoriamente contrária ao d i reito postu lado.

A 2• Seção do STJ , ao ap rec iar, de acordo com p roced i mento de recu rsos repetit ivos, o REsp n . 1 . 349.45 3 -MS, Rei . Min . Lu is Fel ipe Salomão, j . em 1 0 . 1 2 . 20 1 4, D je 2 .2 .201 5, decid iu "a propositura de ação cautelar de exi­b ição de docu mentos bancários (có pias e segunda via de documentos) é cabível como medida preparatória a fim de i n stru i r a ação pr inci pal, bastando a demonstração da existência de relação j u rídica entre as partes, a comprovação de prévio pedido à instituição financeira não a tendido em prazo razoável e o pagamento do custo do serviço con­forme p revisão contratual e n o rmatização da autoridade monetária".

Há, no entanto, as chamadas "ações constitutivas necessárias" : são demandas em que se afi rma um d i reito que somente pode ser real izado em juízo, já que o bem da vida ou o estado j u ríd ico que se p retende obter somente pode ser alcançado por inter­médio do Poder j ud iciário. Por exem plo : a interdição de uma pessoa somente pode ser decretada pelo Poder j ud iciário; a ação de interdição é, por isso, uma ação necessária.

1 39. I dent if icou o ponto, com p rec isão, D I NAMARCO, Când ido Rangei . Execução civil, p . 397-398.

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F R E O I E D I D I E R J R .

É o que acontece, ai nda, com boa parte das h i póteses de j u risdição vo l untária, 1 40 com as ações de anu lação de contrato, falência, 1 41 rescisória de sentença etc. Nesses casos, o exame da "necessidade", para a verificação do interesse, é d ispensáve l, pois está in re ipsa. 1 4' Nas ações necessárias, há presunção absol uta da necessidade de i r a j uízo .

Nas ações "condenatór ias" (cons ide radas como todas aq ue las em que se bus ­ca a cert if i cação e efetivação de u m a dete rm i nada p restação), o auto r deve afi rmar a existê nc ia do fato con stitutivo do seu d i reito (causa ativa), bem como do fato v io lado r desse d i re ito - para a conf igu ração do i n teresse, basta a afi rmação da le ­são , po is a verif icação da sua existênc ia é q uestão de mé rito . 1 43 Se se t ratar de ação p reventiva, anteri o r à v io lação, é necessár io a legar, a lém do fato constitutivo do d i reito, a ameaça/r isco/perigo de v io lação a esse d i re i to .

Nas ações constitutivas não necessárias, o autor deve afi rmar o di reito à mod ifica­ção j u rídica que se pretende efetivar; ou seja, o autor deve afi rmar a existência de u m d i reito potestativo e a necessidade d e efetivá- lo através d a atuação d o Poder jud iciário.

Sob re o exame da necessidade nos casos em que o leg is lador exige o esgota­m ento ad m i n i strativo da controvérsia, ve r o item sobre o p ri n cíp io da i n afastab i l i ­dade da j u ri sd i ção, no capítu l o respectivo, neste vol u m e do Curso.

9.4.4. Interesse de agir nas ações declaratórias

Os ma io res p rob l emas re lac i onados ao i n te resse de agi r con centram-se no estudo da ação meramente dec larató r ia 144•

O leg is lador b ras i l e i ro ad m ite haver i nte resse- ut i l i dade na pretensão à s im ­p l e s dec laração (ações me ramente dec larató rias), q uando o que se busca é apenas a obten ção da certeza j u ríd ica (com a co isa j u lgada mate ria l) , nas h i póteses de

1 40. "Na j u r isd ição volu ntária, ( . . . ) o in teresse de agi r deco rrer ia normal mente da própr ia l e i q ue subord ina a

val idade ou a eficác ia de u m ato da vida p rivada ao conhec imento, à homo logação, autor ização ou ap rovação

j ud ic ia l , i m ped indo que o req uerente a lcance o objetivo j u ríd ico a lmejado sem a concorrênc ia da cognição ou

da vontade estatal man ifestadas através do ó rgão ju r i sd ic iona l" . (GRECO, Leonardo. Teoria da ação no processo

civil. São Pau lo : D ialét i ca, 2003, p. 34-35) .

1 4 1 . Co rretamente identif icando a fa lênc ia como ação constitut iva necessár ia , CUN HA, Leonardo )osé Carne i ro .

In teresse de agir na ação declara tória. Cu r it iba: ) u ruá, 2002, p . 87 .

1 42 . "Em casos ass im , o p rocesso é o ú n ico me io de obter a efetivação das s i tuações d itadas pe lo d i re ito mate r ia l .

( . . . ) As p retensões necessar iamente su je itas a exame j ud ic ia l para que possam ser satisfeitas são aq ue las que

se refe rem a d i reitos e i n te resses regidos por no rmas de extrema i nd i s pon i b i l i dade" (C I NTRA, Antôn io Car los

Araújo, D I NAMARCO, Cândido Rangel e GR I NOVER, Ada Pe l legri n i . Teoria gera l do processo. 1 7• ed . São Pau lo :

Mal he i ros, 200 1 , p . 3 1 ) . Ve r, tam bém, TUCC I , )osé Rogér io Cruz e . A causa petendi no direito processual civil

brasileiro. 2• ed . São Pau l o : RT, 2002. p. 1 74. 1 43 . Tam bém assim, CUNHA, Leonardo José Carneiro. tnceresse de agir na ação declararória. Curit iba: J u ruá, 2002. p . 88.

1 44. Sobre o tema, amp lamente, CARVALHO, José Or lando Rocha de . Ação declaratória. Rio de Jane i ro : Forense, 2002,

p . 227 - 229; CUN HA, Leonardo )osé Carne i ro . In teresse de agir na ação declaratória . Cu r i t iba : ) u ruá, 2002; S I LVA

N ETO, Franc isco Antôn i o de Barros e. A an tecipação da tutela nos processos declaratórios. Porto Alegre: Sergio

Anton i o Fabr is Ed itor, 2005, p .85 -9 1 .

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P R E S S U P O S T O S P R O C E S S U A I S

cont rovérs ia q u anto à existên c ia (ou modo de ser) de re lação j u ríd ica ou autent ic i ­dade ou fa l s idade de docu m ento (art . 1 9, CPC) .

Cabe ao demandante demonstrar a necess idade de i n tervenção do j u d ic iár io , em razão da contrové rsia concreta (dúv ida) que se estabe l ece sob re a existênc ia de uma s i tuação j u ríd i ca. O i nteresse de agi r reve la-se na existênc ia de i n ce rteza q uan ­to à s i tuação j u ríd ica (ou à autent ic idade do docu mento) q u e se busca dec larar. Se a i n ce rteza nem fo r afi rmada pe lo autor, o p rocesso deve ser ext into sem exame do mé rito - antes, porém, o auto r deve ser i n t i mado para corrig i r a peti ção i n i c ia l .

Se o auto r não af i rma a i n ce rteza, mas o réu é citado e n ega a exis­tência da re lação j u ríd ica (na dec larató r ia pos i t iva) o u afi rma a exis­tênc ia dela (na dec larató r ia n egativa), o p rob l ema desaparece e o mé rito do p rocesso deverá ser exam i nado ' 45 •

Não é s i m p les, porém, a so l ução do p rob l ema da falta de i n teresse de agi r na ação dec laratór ia . O tem a fo i exam i nado longamente por ]osé Roberto dos Santos Bedaq ue ' 46

Se, n o caso de u m a ação dec laratór ia positiva, o réu l i m ita-se a n egar a exi s­tência de cont rové rs ia - sem negar a existênc ia da re lação j u ríd ica que se busca dec larar -, s u rge a dúvida sob re q ual se r ia a me l h o r so l ução para o p rob l ema .

Em uma i nterpretação mais r igo rosa, uma vez com p rovada a assertiva do réu, poder-se- ia afi rmar a i n existên c ia de i n teresse de agi r, o que l evaria o p rocesso a ser exti nto sem exame do mé rito (art. 485 , V I , CPC) . Ou talvez à i m procedência, tendo e m vista a i n existênc ia do direito ao reconhecimen to da situação jurídica. N ão pare­ce ser essa a me l ho r so l ução : se não há d úvida sobre a re lação j u ríd i ca, deve o j u iz dec lará- la existe nte, evitando, com isso, futu ros quest io namentos - n ote que o réu recon h eceu a existê nc ia da re lação j u ríd i ca, afi rmando, i n c l u s ive, que jamais a havia q u esti onado . Mas como não consegu i u demonstrar a n ecess idade da i ntervenção j u ri sd ic iona l , deve o autor arcar com as verbas da sucum bênc ia - pagamento das despesas p rocessuais e dos hono rár ios advocatíc ios ' 47 •

Se a re lação j u ríd i ca q u e se busca dec larar existe, tam bém existe o d i reito ao reco n h ec imento, q ue de la é conteúdo . Assi m , rea lmente, a so l ução mais j u sta é o j u lgamento de p rocedênc ia do ped ido , com a condenação do autor ao pagamento das ve rbas da sucum bênc ia .

1 45 . BEDAQUE, J o sé Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 2• ed . São Pau lo Mal h e i ros Ed . , 2009, p . 3 1 8 .

1 46 . BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 2• ed. São Pau l o Mal he i ros Ed . , 2009.

1 47 . Adere-se à so l ução de BEDAQUE , José Roberto dos Santos . Efetividade do processo e técnica processual. 2• ed . São Pau l o Ma lhe i ros Ed. , 2009, p . 3 1 8 . Tam bém n este sent ido , BOM F IM , Dan ie la Santos . A causa de pedir à luz da teoria do fato jurídico. D issertação de m estrado. Un ivers idade Federal da Bahia, P rograma de Pós-graduação em D i re ito, 20 1 2, p . 1 48· 1 49.

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F R E D I E D I D I E R J R .

o rac iocín io é seme l hante para a ação dec larató r ia ne3a tiva : se o réu n egar a contrové rsia, reconhecendo a i n exi stê ncia da re lação j u ríd i ca, deve o j u iz j u lgar p ro­cedente o ped ido, condenando o autor ao pagamento das verbas da sucum bênc ia .

9.4.5. O denominado interesse-adequação

A po lêm ica sobre o i n teresse-adequação resu me-se na pergu nta feita por ]osé Or lando Rocha de Carva l ho : "adeq uação é fo rma ou demonst ração de i n teresse?" ' 48 Sob re o tema, convém t ranscrever a c láss ica observação q u e Barbosa Mo re i ra fez a Când ido D i namarco, q uando este defend ia o ral mente a sua tese de l ivre-docênc ia, a respe ito do eq uívoco de ana l i sar o i nteresse p rocessua l a parti r da adeq uação:

"Abe rra até do bom-senso afi rmar que uma pessoa não tem interesse em determ inada providência só porq ue se uti l ize da via i nadeq uada. Pode inc lus ive acontecer que a própria esco lha da via inadeq uada seja uma conseq uência do i nteresse part icu larmente i ntenso; se alguém re­que r a execução sem títu lo, não será possível enxergar-se aí uma ten­tativa, i legítima embora, de satisfaze r i n teresse tão-premente, aos o l hos do t itular, que l he pareça i n com patível com os i ncômodos e delongas da prévia cogn ição? Seria antes o caso de falar em excesso do que em falta de i nteresse ... " ' 49

Ademais , adequação "é termo q u e não guarda q u alq uer corre lação com o vocábu lo i n teresse. (. . . ) Em q u e sent ido a adeq uação poderia cr iar i nteresse para a lguém? Poder ia exist i r i n teresse apenas porq u e existe adeq uação? Até q u e po nto a falta de adeq uação pode i n d i car, o u p res u m i r, falta de i n teresse de agi r?" ' 50

Fala-se q u e o autor deve i n d icar o proced imento e o ti po de deci são adeq uados àq u i lo que p retende .

Em re lação à adeq uação do p rovi mento (do ped ido) ao f im a lmejado, a s i ­tuação ou é : a ) de i m poss i b i l idade j u ríd ica de aco l h ime nto do ped ido , l evando à i m p rocedênc ia; b) ou o p róp rio s i stema ad m ite a f ungi b i l i dade (art. 554 do CPC), como de resto deve ria ser a regra; c) ou o caso é de e rro de nome, co rr igíve l pe lo p ró p r io j u iz; d) ou não sendo possível a correção pe lo j u iz, deve rá e le determ i nar a a lteração do ped ido, conforme, a l i ás, autor iza o art. 321 do CPC . ' 5 ' - ' 52

Exam i nemos, ago ra, a esco l h a do proced imento adeq uado.

1 48 . CARVALHO, J o s é Or lando Rocha de . Ação declara tória, cit., p . 6 1 . 1 49 . D I NAMARCO, Când ido . Execução Civil. 7 ' e d . São Pau lo : Ma lhe i ros Ed . , 2ooo, p . 405-406, nota 1 09. 1 50 . CARVALHO, José Or lando Rocha de . Ação declaratória, cit . , p . 62-63 . 1 5 1 . Ver as observações, m u ito bem postas, de G RECO, Leonardo . Teoria da ação no processo civil, p . 3 7 . 1 5 2 . Em bora adm ita o i nteresse-adequação, Rodr igo da Cunha Li ma F re i re tece cons iderações bastante seme lhantes

às nossas, q uanto à poss i b i l idade de sanação, pe lo magistrado, da i nadeq uação do p rovi mento/proced imento (Condições da ação - enfoque sobre o interesse de a8ir. 2• ed . São Pau lo : RT, 200 1 , p . 1 44 - 1 45) .

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PRES SUP O S T O S PRO C E S SUA I S

O processo, em seu aspecto formal , é p roced imento . O exame da adeq uação do p roced imento é um exame da sua val idade . ' 53 N ada diz res peito ao exe rcíc io do d i reito de ação, à demanda .

Não há e rro de esco l ha do p roced imento q ue não possa ser corr ig ido, por ma is d i sc repantes que sejam o p roced imento i n devidamente esco l h i do e aq ue le q ue se reputa correto. Um exemp l o talvez s i rva para expor o p rob lema : se o caso não é de mandado de segu rança, pode o j u iz dete rm inar a emenda da petição i n ic ia l , para q u e o auto r p rovidenc ie a adeq uação do i n stru m ento da demanda ao p roced imento co rreto (art. 283 c/c art. 321, CPC) .

9.5. A teoria da asserção: exame da legitimidade e do interesse de agir à luz do que foi afirmado pela parte

Na vigênc ia do CPC-1973, o i n teresse de agi r e a legit im idade ad causam eram t ratados como condições da ação - e ra ass i m que o cód igo anter i o r se refe r ia a esses i n st i tutos . A poss i b i l i dade j u ríd ica do ped ido e ra, então, tam bém cons iderada como condição da ação . O CPC atua l não se vale mais dessa term i no l og ia, de resto equ ívoca, confo rme se d i sse no capítu l o sobre a teor ia da ação .

O §3o do art. 485 do CPC auto riza o j u iz a cont ro lar, ex officio e enq uanto d u rar a l i t i spendênc ia, a existênc ia de l egit i m idade e de i n teresse de agi r.

Como é possíve l o cont ro le a q ua l que r tem po dessas q uestões, tam bém ser ia possíve l p rod uz i r prova a respeito do p reench imento desses req u is i tos .

As d i fi cu l dades que no rma lmente se apresentavam na separação das ant iga­m ente chamadas "cond i ções da ação" do mérito da causa - sobretudo em re lação à l egit i mação o rd i nária, como visto - fizeram com que s u rg isse u m a con cepção doutri nár ia q ue buscava amen izar esses p rob l emas p ráti cos .

P ropôs-se, então, que a aná l ise das ant igas condições da ação (rectius: re­q u i s itos p rocessuais, conforme term i n o logia atua l) , como q uestões estranhas ao mérito da causa, ficasse restrita ao q uanto afi rmado pelo demandante.

Essa anál ise ser ia fe ita à l u z das afi rmações do demandante cont i das em sua postu lação i n ic ia l (in statu assertionis) . " Deve o j u iz rac ioc i nar ad m it i n do, p roviso­r iamente, e por h i pótese, que todas as afi rmações do autor são verdade i ras, para q u e se possa verif icar se estão p resentes as cond i ções da ação" . ' 54 "O q u e i m po rta é a afi rmação do autor, e não a co rrespondênc ia entre a afi rmação e a rea l idade, q u e já ser ia p rob lema de mérito" . ' ss

1 53 . Corretamente, GRECO, Leonardo. Teoria da ação no processo civil, c it . , p . 36 -37 . 1 54. CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. 8• ed . Rio de jane i ro: Lumen ) u ris, 2002. v . 1 , p . 1 27 . 1 55. MARI NON I , Lu iz Gu i l h erme . Novas linhas do processo civil. 3' ed. São Pau l o : Ma l he i ros Ed . , p . 2 12 . Também

ass im , BEDAQ U E, José Roberto dos Santos. "Pressupostos p rocessuais e cond i ções da ação" . )ustitia. São Pau l o : s/ed . , 1 99 1 , out-dez, n . 53 , p . 5 8 .

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F R E D I E D I D I E R J R .

N ão se tratar ia de u m j uízo de cogn ição s umária dessas questões, q u e permi t i ­r ia u m reexame pe lo magi strado, com base em cogn i ção exau riente. O j u ízo defi n i t i ­vo sobre a existênc ia desses req u i s itos far-se - ia nesse momento: se pos it ivo o j uízo de ad m i ss i b i l i dade, tudo o mais ser ia deci são de mérito, ressa lvados fatos supe rve­n i entes q u e determ i nassem a perda do req u i s ito . A dec i são sobre o p reench imento ou não desses req u i s itos, de acordo com esta teo ria, seria sempre defi n it iva .

Chama-se de teoria da asserção ou da prospettazione. '56

A ver if i cação do p reench i m ento desses req u i s itos d i spensar ia a p rodução de p rovas em j uízo; não haver ia necess idade de p rovar a " l egit i m idade ad causam" ou o " i nteresse de agi r", por exem p lo . Não ser ia p rec iso p roduz i r uma períc ia para aver iguar se há ou não " i nte resse de agi r" . Essa verif i cação ser ia feita apenas a part i r da afi rmação do demandante . Se, tomadas as afi rmações como ve rdade i ras, as "cond i ções da ação" estivessem p resentes, estaria dec id ida esta parte da ad­m i s s i b i l idade do p rocesso; futu ra demonst ração de q u e não há " l egit i m idade ad causam" ser ia prob l ema de mérito . Se, tomadas as afi rmações com o verdade i ras, esses req u i s itos não estivessem p resentes, o caso ser ia de ext i n ção do processo sem exame do mérito'5 7 •

Note que a teoria da asse rção pode ria ser ap l i cada mesmo após a defesa do réu . I magi ne q ue o réu a legasse a falta de legiti m idade ativa ad causam. Se o j u iz exam i nasse essa alegação apenas a parti r da afi rmação feita pe lo autor, a teoria da asserção estaria sendo ap l i cada. Não é, pois, o momento que a caracteriza, mas, sim,

a produção ou não de prova para a verificação do preenchimento desses requisitos.

Para q u e se possa entende r a ap l i cação dessa teo ria, a lgu ns exem p los são bem-vi ndos .

Se a lguém se afi rma fi l ho de outrem e, por isso, pede- l he a l i mentos, possu i

l egit i m idade ad causam, mesmo que se comp rove, poster iormente, a ausênc ia do

víncu lo de fi l i ação, q uando será caso de imp rocedência do pedido, dec isão de mérito.

Se o autor pretende a obten ção de ve rba devida contratua lmente, mas deman ­

da contra a lguém est ran ho ao contrato, da p róp ria esti pu l ação da causa de ped i r é

possíve l afe ri r a i l egit i m idade; o magi st rado, neste caso, i n deferi rá a peti ção i n i c ia l

sem exame do mérito.

Tivemos acesso a u m caso i nteressante . Um s uje i to emp restou d i ­

n he i ro a u m gerente de banco, seu am igo, q ue não cu mpri u a dív ida.

O m utuante demandou em face do Banco, afi rmando a cond i ção de

156. D I NAMARCO, Când ido Range i . Instituições d e Direito Processual Civil. São Pau lo : Ma lhe i ros E d . , 200 1 . v. 2, p .

3 14; CÂMARA, Alexand re F reitas. Lições de Direito Processual Civil. 8• ed . R io de jane i ro : Lumen j u ris , 2002, v . 1 ,

p . 127 ; VERDE, G iovan n i . Profili de/ processo civile, cit . , p . 165; COMOGL IO , Lu ig i Pao lo, FERR I , Con rado, TARU FFO,

M i che le . Lezioni sul processo civile. 2• ed . Bologna: M u l i no , 1998, p . 244-248.

1 57 . Apl i cando a teor ia da asse rção, STJ , 4' T., REsp n. 595. 1 88, Re i . M i n . Anton i o Car los Ferrei ra, j . em 22 . 1 1 . 20 1 1 .

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PRE S SUP O S T O S PRO C E S SUA I S

i n ad i m p lente do gerente e ped i n do a condenação do banco ao paga­m ento da dív ida. Note q u e da s im ples afi rmação feita pe lo deman ­dante, tomada como ve rdadei ra, a "legit i m idade ad causam" não está p resente, porq ue a re lação j u rídica afi rmada envolve o autor e o ge rente; o banco é, em relação a ela, u m estranho .

Essa conce pção gan hou fô lego e adeptos'58 • Când ido D i namarco, no entanto, f ie l defensor da concepção t rad i c iona l , rese rvou um item das suas "Instituições" somente para rebater os argu mentos q u e f i rmam a teor ia da asserção (ru b ricou-o de " repúd io à teor ia da asse rção")'59•

Este Curso não adota a teoria da asserção, ao menos não em sua versão completa.

a) A ausênc ia de i n teresse de agi r, evidente ou após a p rodução de p rova, não ge ra decisão de méri to . Se o processo é i n út i l ou desnecessár io, não perderá u m a dessas q ua l i dades apenas porque e l a se reve l ou após a fase i n strutó r ia . Não é p o r acaso q ue, na p rática, p rocessos são exti ntos s e m exame do mérito em razão d a "pe rda do objeto", constatada após p rova per ic ia l , p o r exemp l o .

A teoria é, porém, útil n a aná l i se i n i c ia l do i n te resse de agi r: no receb imento da peti ção i n i c ia l , antes de citar o réu , o exame do i n teresse p rocessua l deve ser feito in statu assertionis, exatamente como suger ido pe la teor ia da asserção . É um exce lente fi l t ro para demandas i n úte is ou desnecessárias - é por i sso que se adm ite o i n deferi m ento da peti ção i n ic ia l pela falta de i nteresse de agi r (art . 330, 111, CPC). Se, futu ramente, constatar a falta de i n teresse de agi r, o j u iz pode rá exti ngu i r o p rocesso sem reso l u ção do mé rito, com base n o i n c iso VI do art . 485 .

b) A ile3itimidade ordinária é, para esse Curso, sem p re uma deci são de i m p ro­cedê ncia, q ue r se ja e la macroscópica ("man ifestamente i l egít ima", como se refe re o i n ci so 11 do art. 330 do CPC), evidente à l u z do q uanto afi rmado pe la parte, q ue r se ten ha re levado apenas depo i s de de lo ngada fase probató r ia . Não há d i st i n ção .

1 58. WATANABE, Kazuo . Da co3nição no processo civil. São Pau lo : RT, 1 987, p. 63-65; YARSH EL, F lávio Lu iz . Tutela juris­dicional específica nas obri3ações de declaração de von tade. São Pau lo : Ma l he i ros Ed . , 1 993 , p. 1 1 2- 1 1 3 ; G RECO, Leonardo . A teoria da ação no processo civil. São Pau lo : D ia lét ica, 2003, p . 2 3 - 2 5; O processo de execução. Rio de jane i ro : Renovar, 1 999, v. 1, p . 3 20; MORE I RA, José Car los Barbosa. "Legit imação para agi r. I n defe r imento de petição i n i c ia l" . Temas de Direito Processual Civil - primeira série. São Pau lo : Saraiva, 1 977 , p . 2oo; BEDAQ U E, José Roberto dos Santos. " P ressu postos processuais e cond i ções da ação" . ]ustitia. São Pau lo : s/ed. 1 99 1 , out-dez, n . 5 3 , p . 54; ARENHART, Sérgio Cruz . Perfis d a tutela inibitória co letiva. São Pau l o : RT, 2003 , p . 2 33 - 2 34; CUN HA, Leonardo Carne i ro da. In teresse de a3ir na ação declara tória. Cu r i t iba: ] u ruá, 2002, p . 88; ASSIS, Araken de. "Su bst itu i ção p rocessua l" . Revista Dialética de Direito Processual. São Pau lo : D ia léti ca, 2003 , n. 09, p . 09- 1 0;

MARI NON I , Lu iz Gu i l he rme . Novas linhas do processo civil. 3' ed . São Pau lo : Ma l he i ros Ed . , 1 999, p. 2 1 1 . 1 59 . Segu ndo i nforma Machado G u i marães, o própr io L iebman chegou a afi rmar, e m conferênc ia p rofe r ida e m 1 949,

q u e "todo prob lema, que r de i n te resse processual , que r de legit i mação ad causam, deve ser proposto e reso lv ido adm iti ndo-se, p rovi sor iamente e em via h i potética, que as afi rmações do autor sejam verdadei ras; só nesta base é que se pode d i scut i r e reso lver a questão p u ra da leg it i mação ou do i nteresse. Que r isto d izer q ue, se da con­testação do réu s u rge a dúv ida sobre a verac idade das afi rmações fe itas pe lo autor e é necessár io fazer-se uma i n st rução, já não há mais u m prob lema de leg it imação ou de i n te resse, já é u m prob lema de mé r ito". ("Carênc ia de ação" . Estudos de direito processual civil. Rio de j ane i ro : Ed i tora j u ríd ica e U n iversitár ia, 1 969, p . 1 02 - 1 03) .

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FRE D I E D I D I ER JR .

c) A ilesi timidade extraordinária é sem p re uma q uestão de ad m iss i b i l i dade, q ue r seja evidente à luz do que afi rmado pelo demandante e dos documentos q u e j u ntou, que r isso apenas se ap resente após a fase de p rod ução de p rovas o ra is o u técn i cas . Em q ualq ue r d o s casos, a dec isão não será d e mérito, i ndependentem ente do last ro p robató r io em q u e se base ia ou do momento p rocessua l em q u e p rofe r ida. Não há, tam bém aq u i , d i st i n ção.

d) O prob lema da possibi lidade jurídica do pedido, ant iga "cond i ção da ação", u m a das causas do desenvolvi mento da teoria da asse rção no Bras i l , deve ser re­so lv ido co mo causa de i m p rocedênc ia l im i nar atíp ica. Sobre o tema, ve r capítu los sob re a teor ia da ação e sobre a i m p rocedênc ia l im i na r do ped ido , neste vo l u m e do Curso.

1 O. AS DIVERSAS POSIÇÕES J U RÍDICAS QUE UM SUJEITO PODE ASSUMI R EM UM MESMO PROCESSO: A DI NAMICIDADE DAS CAPACIDADES PROCESSU­AIS, DO I NTERESSE PROCESSUAL E DA LEGITIMIDADE

Conforme visto no capítu l o i n trod utó r io, o p rocesso é, em uma perspectiva, o

conjun to das relações jurídicas que se estabelecem en tre os diversos sujeitos pro­cessuais (partes, j u iz, auxi l i ares da j u st iça etc . ) . Essas re lações j u ríd icas p rocessua is fo rmam-se em d ive rsas comb i nações : auto r-j u i z, auto r- réu , j u iz - réu , autor-pe rito, j u iz -órgão do M i n i stér io Pú b l i co etc.

Por metonímia, pode-se afi rmar que essas re l ações j u rídi cas fo rmam uma única re lação j u ríd i ca, q u e tam bém se chamaria processo. Essa re lação j u ríd i ca é com posta por u m con ju nto de s i tuações j u rídi cas (d i re itos, deve res, com petênc ias,

capacidades, ônus etc . ) de q ue são t i tu lares todos os suje itos do p rocesso. É por

isso q u e se costuma afi rmar q u e o p rocesso é u m a re lação j u ríd ica complexa . As­

s im , talvez fosse mais adeq uado cons iderar o p rocesso, sob esse p risma, um feixe ' 60

de re lações j u ríd icas.

A complexidade da re lação j u ríd ica p rocessua l p roduz conseq uênc ias i n te res­

santes .

Em u m mesmo p rocesso, u m ú n ico s uj eito pode ass u m i r mais de uma pos ição

j u ríd ica p rocessua l .

Essa circunstância, que é ineren te ao fenômeno processual, faz com que a

análise das capacidades processuais, do in teresse de asir e da lesi timidade não se

restrinja à demanda: é preciso examiná-los ao lonso de toda a cadeia processual,

1 60 . CARNELUTII, Francesco. Diritto e processo. Napol i : Morano, 1 958, n. 20, p. 35; MONACCIAN I , Luigi . Azione e Le!Jittima­

zione. Mi lano: G iufffre, 1 9 5 1 , p. 46; FERNANDES, Antonio Scarance. Teoria Geral do Procedimento e o procedimento

no processo penal. São Pau lo: RT, 2005, p. 28; GRECO, Leonardo. Instituições de Processo Civil. 2• ed. Rio de Janeiro :

Forense, 201 0, v . 1 , p. 25 1 .

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PRES SUP O S T O S PRO C E S SUA I S

tendo em vista cada uma das relações processuais que se formam e que compõem o feixe de relações jurídicas que é o processo' 6 ' .

Algu n s exem plos .

a) A pos ição processua l do j u iz serve de exe m p lo . Em um mesmo p rocesso, o j u i z pode ass u m i r as pos ições de sujeito imparcia l, auto r de demandas i n cidenta is (p . ex. : conf l ito de com petênc ia) e réu de i n cidentes p rocessua is, com o na a rgu i ção de suspe ição e de i m ped imento . Exatam ente po r conta desta variedade de pos ições p rocessuais que podem ser t i tu lar izadas pe lo j u iz em um mesmo processo, e le pode reco rrer do acó rdão q ue o cons idere i m ped ido ou man ifestam ente suspeito e o con ­d e n e a o pagamento das custas p rocessuais (art. 1 46, §so, CPC) ' 6' .

Exatamente por isso, tam bém, tem o ju iz capacidade postulatória para apresen ­tar a s ua defesa no i n cidente de argu ição de suspe ição ou i m ped imento, mas não tem essa mesma capacidade postu latór ia para i nterpor recu rso contra essa decisão.

b) Em uma ação popu lar ou em uma ação de i m p rob idade ad m i n i st rativa, a pessoa j u ríd ica de d i reito p úb l i co pode se r i n i c ia l mente posta como ré, mas, depo i s, ped i r a sua m igração para o po lo ativo da demanda : ou seja, de ré pode tornar-se autora - s i tuação que já foi des ignada como i n tervenção m óvel da pessoa j u ríd ica de d i reito p úb l i co ' 6l.

c) O M i n i stér io P úb l i co pode ass u m i r d iversas pos ições j u ríd icas p rocessua is . Em um mesmo p rocesso, pode o M i n i stér io Púb l ico atuar como autor e f iscal da o rdem j u ríd i ca (art . 1 78 do CPC), pos i ções essen c ia l mente d i st i n tas. Por isso, é pos­síve l , por exem p lo , que um membro do M i n istér io Púb l ico Estadual possa fazer uma sustentação o ral perante o Su peri o r Tri b una l de j u st i ça, e nq uanto o Sub - p rocurado r, vi ncu lado ao M i n isté r io Púb l i co Fede ra l , e labora u m parecer sobre o mesmo caso, com pos ic i onamento contrár io ao defend ido por seu co lega estadua l ' 64 •

d) E m bo ra em pos ições p rocessua is o postas, auto r e réu podem form u lar re­q ue rimentos con ju ntos' 65, q uando então am bos aparecerão como req ue rentes : i)

1 61 . O assunto fo i t ratado com p r imazia e p rofu nd i dade por CABRAL, Anton io do Passo. "Despo lari zação do processo e "zonas de in te resse": sob re a m igração entre pelos da demanda". Reconstruindo a Teoria Gera l do Processo. Fred ie D i d i e r j r. (org.) . Salvador : Ed itora j u s Podivm, 201 2 .

1 62 . N E RY j r. , Ne l son ; N ERY, Rosa. Código de Processo Civil comentado. n• ed . São Pau lo : RT, 201 1 , p . 609. 1 63 . MAZZE I , Rodr igo. "A 'intervenção móvel' da pessoa j u ríd ica de d i reito pú b l i co na ação popu lar e ação de im­

prob idade adm i n i st rativa (art. 6•, § 3• , da LAP e art . 1 7 , § 3•, da L IA)" . F red ie D id ier j r. e Te resa Arruda Wam b ie r (coord . ) . Aspectos polêmicos e atuais sobre terceiros no processo civil e assuntos afins. São Pau lo : RT, 2007 . Sobre o tema, a i nda, CABRAL, Anton io do Passo. "Despo lar ização do processo e "zonas de i n te resse" : sob re a m ig ração ent re po los da demanda". Reconstruindo a Teoria Gera l do Processo. Fred ie D id i e r j r. (org.) . Salvador : Ed itora jus Podivm, 20 1 2 .

1 64. Sobre o assu nto, D I D I ER j r. , F red ie ; GOD I N H O, Robson Renault . "Questões atuais sobre as posições do Ministério Público no processo civil". Revista de Processo. São Pau lo : RT, 201 4, v. 234 .

1 65 . Sobre o tema, CABRAL, Anton i o do Passo . "Despo larização do p rocesso e "zonas de i nteresse": sob re a m ig ra­ção entre pelos da demanda", c i t . , p . 1 5 3 - 1 54.

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Page 62: CAPÍTULO Pressupostos processuais - …professor.pucgoias.edu.br/SiteDocente/admin/arquivosUpload/14701... · PRESSUPOSTOS PROCESSUAIS É possível, assim, falar em "pressupostos

FRE D I E D I D I ER JR .

p ro posta de aco rdo sobre o objeto l i t igioso; ii) p ro posta de acordo sob re o p ró p rio p rocesso (acordo atíp ico com base no art. 1 90 do CPC; acordo de suspensão do p rocesso, o rgan i zação consensua l do p rocesso etc.); iii) a legação conj u nta de e rro mater ia l na sentença - s i tuação q u e já p resenc ie i , em caso em q u e a sentença homo logató r ia de autocom pos ição i gno rava c láusu las fu ndamentais do acordo q ue havia s ido ce l eb rado e cujo i n st rumento estava nos autos.

e) Há negócios processua is ce lebrados con ju ntamente com o j u iz (ca lendário p rocessua l , p . ex.: art . 1 9 1 , CPC). j u iz, autor e réu , a despeito das suas pos ições p rocessua is i n i c ia is , serão partes de u m mesmo negócio p rocessua l . O u seja : em ­bora cada parte te n h a seu respectivo i nteresse p rocessua l e não se costu me falar e m in teresse processual do juiz, os t rês su je itos possuem o in teresse comum no agendamento da p rát ica dos atos p rocessua is .

f) O autor pode também ser réu , se houver reconvenção; neste caso , o réu se torna autor da reconvenção . Em um mesmo p rocesso, então, autor e réu assumem pos ições j u ríd i cas p rocessuais d i st i ntas, tendo em vi sta a s d i st i ntas re lações j u ríd i ­cas p rocessua is de q u e fazem parte .

3) O denun c iado à l ide (sob re a denu nc iação da l ide, ve r capítu l o sobre i nter­venção de te rcei ros) é, a u m só tem po, réu na den u nc iação da l i de, demanda i n ci ­dental , e litisconsorte unitário do denuncian te, na demanda p ri n ci pal (arts . 1 27 - 1 28, CPC). N ote-se : o denu nc iado se opõe ao den u n c iante na demanda i n c idental e é a l i ado de le na demanda p ri n c i pa l . I s so porq ue a vitór ia do den u nc iante na demanda p ri n ci pal i m p l i cará a vitór ia do den u n c iado na demanda i n cidenta l .

h) Out ro caso cu r ioso, tam bém re laci onado à den u n c iação da l ide . I m ag ine-se q ue, em uma ação em que se d i scute responsab i l idade civi l por ac idente de t rân­s i to , uma mesma segu radora ten h a s ido den u n c iada por am bas as partes - q ue, co i n c identemente, estão por e la segu radas . A segu rado ra estará na "estranha s i tua­

ção" de ser confrontada por do is i nteresses mater ia is i n com patíveis ; te rá, por i sso,

cond i ção, ao menos em tese, de ser l i t i sconsorte de am bas as partes, autor e réu ' 66 •

Em suma, as partes - e, a fo rt i o ri , todos os suje i tos p rocessuai s - podem assu ­

m i r d ive rsas pos ições j u ríd i cas em u m mesmo p rocesso.

o estudo dos p ressu postos p rocessuais não pode ignorar essa c i rcu n stânc ia . A

aná l i se de q ua lque r dos req u is itos p rocessua is deve p ressupo r a d i nam ic idade das

pos i ções j u ríd i cas p rocessua is e deve se r fe ita à luz de cada uma de las .

D i f ic i lmente, a l iás , have rá u m p rocesso em q u e o sujeito processua l permane­

ça em uma ú n ica pos i ção j u ríd ica d u rante toda a l i t i s pendência .

1 66 . CABRAL, Anton i o do Passo . "Despo larização do p rocesso e "zonas de i n teresse": sobre a m ig ração entre po los

da demanda", c it . , p . 1 56 .

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