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1 A ABORDAGEM EM APLs E O DESENVOLVIMENTO REGIONAL/LOCAL: REFLEXÕES SOBRE AS CONEXÕES DESTE DEBATE Carina Aparecida Barbosa Mendes Chaves 1 Valdênia Apolinário 2 RESUMO: O presente artigo analisa conexões entre a abordagem em Arranjos Produtivos Locais (APLs), enunciada pela Rede de Pesquisa em Sistemas e Arranjos Produtivos e Inovativos Locais (RedeSist/IE/UFRJ), e o desenvolvimento regional/local. A preocupação central de pesquisa é revelar alguns antecedentes teóricos do enfoque em APLs, contidos no ‘debate regional’ que se constrói ao longo do século XX. A metodologia inclui uma pesquisa secundária que revisa autores que tratam do ‘debate regional’, com destaque para a experiência brasileira, bem como sobre o enfoque em APLs, tendo por base o seu conceito e preocupações. Os resultados demonstram que a abordagem em APLs sintetiza inúmeros aspectos ressaltados pelo ‘novo’ debate regional, a exemplo das características estruturais e endógenas como reveladoras de cada espaço, e ainda, da importância das interações entre os atores sociais para o desempenho de dado território e das atividades ali presentes. Palavras-chaves: Arranjos Produtivos Locais (APLs). Desenvolvimento regional/local. Debate regional 1 Estudante do Curso de Graduação em Economia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC). 2 Profa. do Departamento de Economia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e do Programa de Pós-Graduação em Economia (UFRN). Economista. Doutora em Engenharia de Produção pela COPPE/UFRJ e Pesquisadora Associada da RedeSist (IE/UFRJ).

Chaves, c.a.b.m. a Abordagem Em Apls e o Desenvolvimento Regionallocal Reflexões Sobre as Conexões Deste Debate

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A ABORDAGEM EM APLs E O DESENVOLVIMENTO REGIONAL/LOCAL: REFLEXÕES SOBRE AS CONEXÕES DESTE DEBATE

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    A ABORDAGEM EM APLs E O DESENVOLVIMENTO REGIONAL/LOCAL: REFLEXES SOBRE AS CONEXES DESTE DEBATE

    Carina Aparecida Barbosa Mendes Chaves1 Valdnia Apolinrio2

    RESUMO: O presente artigo analisa conexes entre a abordagem em Arranjos Produtivos Locais (APLs), enunciada pela Rede de Pesquisa em Sistemas e Arranjos Produtivos e Inovativos Locais (RedeSist/IE/UFRJ), e o desenvolvimento regional/local. A preocupao central de pesquisa revelar alguns antecedentes tericos do enfoque em APLs, contidos no debate regional que se constri ao longo do sculo XX. A metodologia inclui uma pesquisa secundria que revisa autores que tratam do debate regional, com destaque para a experincia brasileira, bem como sobre o enfoque em APLs, tendo por base o seu conceito e preocupaes. Os resultados demonstram que a abordagem em APLs sintetiza inmeros aspectos ressaltados pelo novo debate regional, a exemplo das caractersticas estruturais e endgenas como reveladoras de cada espao, e ainda, da importncia das interaes entre os atores sociais para o desempenho de dado territrio e das atividades ali presentes.

    Palavras-chaves: Arranjos Produtivos Locais (APLs). Desenvolvimento regional/local. Debate regional

    1 Estudante do Curso de Graduao em Economia pela Universidade Federal do Rio Grande do

    Norte (UFRN). Bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciao Cientfica (PIBIC). 2 Profa. do Departamento de Economia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e

    do Programa de Ps-Graduao em Economia (UFRN). Economista. Doutora em Engenharia de Produo pela COPPE/UFRJ e Pesquisadora Associada da RedeSist (IE/UFRJ).

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    1. Introduo

    O tema desenvolvimento tem retornado a agenda de discusso de inmeros

    atores como governos, empresas, instituies de ensino/pesquisa/financiamento,

    sociedade civil. Neste debate e de maneira crescente, preocupaes em como

    crescer desenvolvendo o territrio e gerando melhorias na qualidade de vida da

    populao tm estado nas pautas de debates, sobretudo em projetos

    governamentais.

    No Brasil, a abordagem em Arranjos Produtivos e Inovativos Locais (ASPILs),

    que se popularizou a partir do jargo Arranjo Produtivo Local (APL), vem

    contribuindo com este debate.

    O presente artigo tem como objetivo refletir sobre as conexes existentes

    entre a abordagem em APLs enunciada pela Rede de Pesquisa em Sistemas e

    Arranjos Produtivos e Inovativos Locais (RedeSist)3e o debate sobre o

    desenvolvimento regional.

    Este artigo contm trs sees, alm desta Introduo. Na segunda seo

    resgatado o debate regional e sua correlao com desenvolvimento em dado

    espao. Na terceira seo apresentada a abordagem em Arranjos Produtivos

    Locais (APLs). Por fim so apresentadas as Consideraes Finais.

    2. O debate regional e desenvolvimento territorial: reflexes iniciais

    Aps a Segunda Guerra Mundial ganha fora a cincia regional4, que rene

    diversas contribuies das cincias sociais, incluindo os economistas.

    Segundo Diniz (2009), at ento a preocupao central sobre a questo

    regional era a localizao das atividades. Todavia, a crise de 1929 fez emergir o

    tema das desigualdades regionais e uma nova concepo do papel do Estado,

    reposicionando o debate sobre a questo regional.

    At a Segunda Guerra Mundial, a questo regional era predominantemente tratada como uma matria de localizao das atividades agrcolas e industriais, conforme comprovamos clssicos trabalhos de Von Thunen (1816: 1966), Weber (1907: 1969) e Losch (1933: 1954) ou da oferta de servios e da consequente hierarquia das centralidades urbanas, na formulao de Christaller (1939: 1966). [...] A crise de 1929, ao provocar generalizada recesso econmica no mundo capitalista, colocou s claras o

    3 www.redesist.ie.ufrj.br

    4 Para fins metodolgicos neste estudo os termos cincia regional, teoria regional, questo regional,

    debate regional, economia regional sero tratados como sinnimos.

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    problema das desigualdades regionais na maioria dos pases industrializados, as quais vinham se formando desde o sculo anterior, mas no eram explicitadas. A tomada de conscincia dessas desigualdades e a mudana na concepo do papel do Estado, com a revoluo keynesiana e o avano das tcnicas e prticas de planejamento, promoveram a criao de polticas de reduo das desigualdades regionais e de reordenamento do territrio em vrios pases, com a criao de instituies especficas para a implementao dessas polticas. (DINIZ, 2009, p. 228-229)

    oportuno relembrar brevemente que a teoria neoclssica defendia, mesmo

    diante das inflexes capitalistas do perodo, uma economia em que o Estado

    ausente e o livre mercado como sendo capaz de gerar o equilbrio entre oferta e

    demanda, tanto em se tratando de mercadorias como o nvel de emprego da

    populao. Nessa teoria tambm estava presente a tese da maximizao dos lucros

    das empresas e a utilidade maximizada pelos indivduos obtendo, atravs de

    clculos matemticos, a perfeita harmonia da economia. Entretanto, com a ruptura

    liberal, as teorias keynesianas se solidificam e emergem acompanhadas tambm

    por uma responsabilidade com o bem-estar social como condio para a

    reconstituio da demanda efetiva. Tal teoria tambm demonstra as inflexes que

    podem se instalar na economia na ausncia de um Estado que oriente os rumos dos

    mercados e decises dos agentes econmicos. Nesta perspectiva, a partir de ento

    o Estado, em vrias naes, passou a intervir de maneira significativa em suas

    economias.

    Conforme Diniz (2009), os esforos de uma interveno planejada visando o

    desenvolvimento regional em pases como Estados Unidos, Itlia, Frana e

    Inglaterra aps a Segunda Guerra, e mesmo ligeiramente antes desta, tambm

    foram assimilados por outras naes:

    A generalizao das polticas regionais nos pases centrais foi assimilada pelos pases perifricos. Na Amrica Latina, a maioria dos pases criou programas especficos de desenvolvimento regional, a exemplo dos programas de fronteira e de bacias, no Mxico; da regio de Guayana, na Venezuela; do Cuyo e da Patagnia, na Argentina. [...] Ao lado da continuao e da generalizao das polticas de desenvolvimento regional, foi desenvolvido grande esforo de interpretao terica sobre a questo das desigualdades regionais e da concentrao, bem como de metodologias e tcnicas de planejamento e de interveno pblica. Esse esforo pode ser sintetizado no que ficou conhecido como duas escolas de pensamento. Uma delas resgatou a tradio germnica das teorias da localizao e adaptou-a ao pensamento econmico neoclssico, clssico, constituindo a chamada cincia regional. [...] A outra escola foi desenvolvida na Frana, sob liderana de Franois Perroux. Partindo da noo de economia dominante e empresa dominante e dos efeitos interindustriais, foi desenvolvido o conceito de polo de crescimento e do papel central da empresa motriz para o crescimento desses polos. Na sua concepo de empresa motriz, Perroux havia recebido forte influncia de Schumpeter, com o conceito de inovao, j que Perroux havia traduzido,

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    em 1935, a Teoria do Desenvolvimento Econmico, de Schumpeter, do alemo para o francs. (DINIZ, 2009, p. 230 e 231).

    De acordo com Clemente (1994), o conceito de espao que foi estabelecido

    por Perroux vai alm do espao restrito da matemtica e faz meno ao espao

    econmico, que contm vrias relaes como de produo, tributao, investimento,

    migrao, dentre outros.

    Indo alm e conforme Lastres e Cassiolato (2005), nas noes de plo de

    crescimento e desenvolvimento de Perroux, j se reconhecia a importncia do

    ambiente, dos atores sociais e suas interaes.

    As noes de plos de crescimento e plos de desenvolvimento foram difundidas, nas dcadas de 1960 e 1970, tendo sido largamente adotadas nas prticas de planejamento regional em vrias partes do mundo. De acordo com os trabalhos do economista francs Franois Perroux (1955:164), o crescimento no surge em toda a parte ao mesmo tempo; manifesta-se com intensidades variveis em pontos ou plos de crescimento; propaga-se segundo vias diferentes e com efeitos finais variveis no conjunto da economia. Perroux trabalhou com a idia de que as economias nacionais compem-se de zonas ativas, ou seja, plos capazes de dinamizar setores relacionados; e de zonas passivas, cujo dinamismo decorre de condies externas. Nos plos de crescimento (englobando um conjunto de atores, empresas ou segmentos), determinadas atividades econmicas dominantes tm a capacidade de alavancar a expanso de outros conjuntos de atividades em determinadas regies. J o plo de desenvolvimento, segundo Perroux, tem a capacidade de engendrar uma mudana qualitativa nas estruturas econmicas e sociais.J se reconhecia ento que o comportamento econmico est incrustado em instituies, normas e valores, territorialmente moldados, destacando-se que as interaes entre atores so subordinadas a relaes de poder. (LASTRES E CASSIOLATO, 2005, p. 20) (Grifos nossos).

    Ainda refletindo as bases do debate regional Amaral Filho (2008) afirma que

    at a dcada de 1980 os princpios da cincia regional regeram os projetos de

    desenvolvimento das economias, em especial a teoria estruturalista no Brasil e na

    Amrica Latina, sendo portanto, as indstrias movidas para os locais que

    proporcionassem vantagens em relao a mo de obra, matria-prima e at mesmo

    mercado consumidor.

    At meados da dcada de 1980, a cincia econmica regional era orientada pelos princpios estabelecidos pela escola alem, que considerava a distncia e o custo de transporte, em relao aos mercados consumidores e fornecedores, como elementos centrais na determinao da alocao espacial dos fatores e da trajetria regional (para uma viso geral ver Diniz &Crocco, 2006). Alm disso, considerava tambm os espaos geogrficos homogneos, no apresentando vantagens e desvantagens em termos absolutos ou relativos. At final dos anos 1970, esses princpios orientaram as polticas de desenvolvimento regional, com influncia, inclusive, sobre as teorias de Plos de Crescimento (Perroux, 1973), que no tinham um

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    vnculo ntimo com a escola alem. Esses eram os princpios cannicos que predominavam at ento. (AMARAL FILHO, 2008, p. 3)

    Entretanto, segundo Amaral Filho (2008), a partir de ento h uma reviravolta

    na economia em mbito mundial, o que abala os projetos e pensamentos tericos

    em vigor. O autor enumera fenmenos que, a partir do que denomina ser uma

    grande transformao ocorrida na economia, do uma nova caracterstica

    dinmica de desenvolvimento regional. Em suas palavras:

    Os responsveis por esse deslocamento de paradigma esto concentrados em cinco elementos interligados: (i) a crise do planejamento e da interveno centralizadores; (ii) reestruturao dos mercados; (iii) megametropolizao, seguida pela emergncia de megaproblemas urbanos; (iv) globalizao e abertura econmica e (v) tecnologia da informao e telecomunicaes-TI&T. Esses elementos fizeram com que o fator distncia ou custo de transporte, se tornasse um fator adicional, e no nico, para explicar e apoiar o desenvolvimento regional, ou para explicar a desconstruo dos espaos constitudos. Diante desse novo quadro Paul Krugman e, principalmente, gegrafos como Ron Martin (1995) colocam que alm do custo do transporte, fatores como a histria e o protagonismo local e regional so importantes para o desenvolvimento regional. Nessa mesma linha, outras correntes das escolas evolucionistas e institucionalista passaram a reforar o surgimento de novos conceitos e teorias sobre a economia regional, ganhando destaque fatores endgenos no desenvolvimento local e regional (AMARAL FILHO, 2001 apud AMARAL FILHO, 2008, p. 4). (Grifos nossos)

    Segundo Amaral Filho (2008) todas estas transformaes findam por conferir

    uma valorizao dos territrios/locais, isto porque com o processo de

    descentralizao do Estado, se passa a dividir funes com governos estaduais e

    municipais, repartindo entre os entes a responsabilidade pelo desenvolvimento. O

    autor tambm destaca a descentralizao e desconcentrao da produo que

    ocorre nos anos 1980 e 1990 buscando diminuir os custos de produo das

    empresas em todo o mundo. Com isso as pequenas empresas so inseridas como

    uma expanso das grandes empresas e corporaes. Em conseqncia, no

    somente as grandes empresas protagonizam o desenvolvimento local, mas tambm

    as pequenas empresas comeam a ganhar evidncia. Outra ocorrncia que confere

    protagonismo ao territrio/local a questo do inchao desordenado dos centros

    urbanos, deixando-os carentes de oferta de servios pblicos necessrios

    instalao e manuteno de empresas nestas localidades. Isso tem feito com que

    empresas migrem para territrios mais distantes destes centros metropolitanos e,

    ainda segundo Amaral Filho (2008), esta relocalizao tem sido positiva para locais

    mais afastados que tm sido contemplados com projetos de desenvolvimento.

    Acrescenta que a globalizao assistida desde a dcada de 1990 tambm tem dado

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    uma nova trajetria ao desenvolvimento das naes, pois com a mobilidade dos

    investimentos existe uma concorrncia para a captura do capital, assim como o

    interesse das empresas de deslocar seus investimentos para locais que lhe

    propiciem menores custos de produo. Por ltimo, a tecnologia da informao e

    telecomunicaes tem exercido forte influncia na mudana do cenrio econmico.

    Essa tecnologia fez desaparecer em alguns setores a distncia fsica que impunha

    barreiras a alguns processos de descentralizao produtiva, alm de servir de

    propaganda e aproximao com clientes.

    Ainda segundo o autor o padro de acumulao antes vigente foi quebrado e

    uma nova dinmica territorial tem sido desenvolvida, passando de um padro de

    produo em massa (fordista) para um padro de produo flexvel. Neste novo

    padro as pequenas e mdias empresas tm sido realadas e captadas,

    principalmente aquelas que tm um constante esforo em inovao e so flexveis,

    estando inseridas nas redes de comunicao. Paralelamente, os territrios que

    sejam inovadores, flexveis e estejam afastados dos grandes centros urbanos tm

    muito potencial dentro da nova perspectiva da cincia regional, conclui Amaral

    Filho, (2008).

    Logo, a partir desta percepo, empresas de outros portes e territrios

    inovadores, ainda quando distantes dos centros dinmicos, tambm ganham

    relevncia.

    De acordo com Amaral Filho (2008), enquanto a teoria regional antiga no se

    importava com as especificidades do territrio, considerados homogneos, para as

    novas teorias regionais a dinmica que move o desenvolvimento territorial leva em

    considerao, alm de aspectos fsicos e geogrficos, a questo de estrutura e

    infraestrutura e aspectos culturais e histricos.

    [...] Com as transformaes estruturais e a emergncia das novas teorias regionais a questo territorial passa a ocupar um lugar central no destino das regies. Ou seja, enquanto a teoria convencional abstraia o territrio em seus modelos, na medida em que considerava as realidades e paisagens territoriais como espaos homogneos, as novas teorias regionais o coloca como ncora do processo de desenvolvimento. Neste caso, no s a geografia fsica tem importncia, mas as estruturas e infra-estruturas, a populao, as relaes sociais e as instituies, estas entendidas como tradies, cultura e regras de conduta, passam a ter um papel preponderante. [...] Trata-se portanto de uma dimenso entendida como territrio vivido, ativo, protagonista, no lugar do territrio passivo, tomador de decises vindas de fora para dentro. Esta dimenso desponta como um contraponto ao centralismo econmico e politico-administrativo, bem como ao processo de globalizao. Por esta razo ganhou espao dentro dos novos conceitos, teorias e teses sobre a Questo Regional, a abordagem

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    endgena, no lugar da abordagem exgena, o que trouxe para o centro da discusso o territrio, e todos os seus componentes estruturantes. (AMARAL FILHO, 2008, p. 9).

    O autor tambm deixa claro que na atualidade os protagonistas locais tambm

    so importantes agentes no desenho de polticas de desenvolvimento local/regional,

    quando declara:

    As descentralizaes poltico-administrativas juntamente com a descentralizao produtiva, conferiram ao territrio e ao local uma autonomia relativa mais elevada que no passado. No lugar de, apenas, receber polticas, programas e projetos de desenvolvimento j prontos do governo central, o desenvolvimento local ou regional passa a receber, cada vez mais, influncias dos protagonistas locais. (AMARAL FILHO, 2008, p. 9)

    Assim, nesse ambiente de mudana de cenrio econmico onde se repensa

    e se perseguem novas teorias, que as interaes locais e o seu protagonismo

    destacam-se pelas vantagens que podem ser estimuladas, a exemplo da

    cooperao, inovao, dentre outras.

    2.1 O debate regional no Brasil: destaques

    No Brasil a industrializao se deu no fim do sculo XIX e incio do sculo XX,

    que com a crise de superproduo de caf ganha maior impulso, pois h uma

    migrao dos capitais advindos dos cafezais para as nascentes indstrias

    brasileiras. A esta poca a regio Sudeste j dispunha no apenas destes capitais

    que se reorientavam para o setor industrial, mas tambm da mo-de-obra

    necessria para essa industrializao, que assim como a infraestrutura que antes

    davam suporte a produo de caf, nesse momento passam a dar amparo

    indstria que emerge.

    Com o desenvolvimento da indstria brasileira assiste-se tambm o

    crescimento e desenvolvimento desses centros industriais. Os centros urbanos

    passam a receber um grande contingente da populao advinda dos cafezais, que

    vo para as cidades em busca de empregos. Assim a indstria passa a ser nessas

    regies a fora motriz para o desenvolvimento. Porm, desde os seus primrdios,

    essa industrializao ficou concentrada na regio Sul e Sudeste do pas, excluindo

    as demais regies deste processo.

    A partir dos anos 1950 h no Brasil um despertar para a questo do

    desenvolvimento desigual e, no governo de Juscelino Kubitscheck, feita uma

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    anlise de como combater essa disparidade e levar crescimento econmico tambm

    para as outras regies.

    Ao discorrer sobre essa fase desenvolvimentista ocorrida no Brasil, Queiroz

    (2011) destaca que o desenvolvimento econmico era pensado como uma

    necessidade para os governos, como forma de sarem do estado de calamidade. Da

    ento a importncia da teoria trazida por Celso Furtado e pelos estruturalistas sobre

    o desenvolvimento econmico. Na reflexo desta escola terica existe a

    necessidade de uma mudana estrutural que produza e absorva o progresso

    tcnico, sendo o Estado a fora motriz desse fenmeno. Celso Furtado parte de

    ideias schumpeterianas acerca de inovaes como o fator impulsionador da

    economia e introduz nela o processo de acumulao, inevitvel ao sistema

    capitalista. Queiroz (2011) ainda enfatiza que para Furtado o crescimento no seria

    suficiente, caso no houvesse uma concomitante mudana nas formas de produo,

    de distribuio e utilizao da renda.

    Sobre a importncia de Celso Furtado na requalificao do debate regional

    Apolinrio e Silva (2012, p. 204) afirmam:

    O Brasil apresenta uma longa trajetria de polticas de desenvolvimento regional, tais polticas, em seus primrdios, estavam essencialmente voltadas para os aspectos hdricos (solo e gua), particularmente do Nordeste. [...] precisamente com Celso Furtado, nos anos 1950, que o debate sobre o desenvolvimento regional requalificado e fica evidenciado, por meio do Relatrio do Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN), que o problema do Nordeste ultrapassava a questo da seca e, portanto, que o projeto de desenvolvimento da regio deveria estar vinculado ao projeto de desenvolvimento do prprio pas.

    Com vistas ao desenvolvimento do Nordeste criada uma comisso

    conhecida como Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN)

    que, comandada por Celso Furtado, objetivava remodelar as estruturas produtivas

    da regio nordestina, pois partia do diagnstico de que havia em sua economia um

    grande atraso em relao regio Sudeste, o que resultava em desigualdade social,

    econmica e infraestrutural.

    No documento emitido pelo GTDN (1967), as observaes sobre a regio

    apontavam para um debilitado ritmo de crescimento se comparado ao Sudeste e

    uma discrepncia de renda entre o Centro-sul e o Nordeste brasileiro. A economia

    do Nordeste estava ancorada no setor exportador, seguindo assim as variaes que

    alteravam o total das exportaes. Havia tambm o problema da seca que castigava

    grande parte do territrio nordestino, havendo um ndice pluviomtrico muito

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    instvel, o que atingia de forma dramtica populaes que viviam da agricultura,

    precisamente da agricultura de subsistncia. Alm dos problemas destacados

    anteriormente, o GTDN tambm evidencia como obstculos ao desenvolvimento

    nordestino a escassez relativa de terras arveis, a concentrao de renda na

    economia aucareira, a predominncia do setor de subsistncia na pecuria e setor

    privado que transferia recursos na procura de investimentos mais rentveis e a forte

    transferncia de renda da economia exportadora do Nordeste para o Centro-Sul.

    Diante de tais desafios ao desenvolvimento justificava-se assim a interveno

    estatal na regio na expectativa de alterar as fronteiras e o modo de produo

    agrcola, como tambm na inteno de que o Nordeste superasse o seu grande

    atraso econmico e tecnolgico para com a regio Sudeste, desenvolvendo em seu

    territrio um centro industrial autnomo. (ARAJO, 1981).

    Visando ampliar as condies para se estabelecer um centro industrial no

    Nordeste criada a Superintendncia do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE),

    juntamente com esforos para a implantao de indstrias na regio Norte, com a

    criao da Superintendncia do Desenvolvimento da Amaznia (SUDAM) e

    estmulos de ocupao da regio Centro-Oeste. Devido aos incentivos fiscais

    recebidos (34/18 FINOR e iseno do imposto sobre a renda), o Nordeste

    brasileiro recebeu investimentos de empresas locais, nacionais e multinacionais,

    alm das estatais.

    Todo esse esforo para diminuir a desigualdade no territrio brasileiro e gerar

    centros dinmicos para alm da regio Sul e Sudeste coexiste com o

    desenvolvimento da cincia regional em outras partes do mundo. Neste sentido

    Andrade (1987), baseado nos conceitos de Perroux, explica que em diversas regies

    vo existir plos de desenvolvimento, que so pontos dispersos no pas que vo

    impulsionar a economia da regio, no qual existir uma indstria motriz que

    teoricamente conduziria o crescimento do seu entorno, sendo s vezes induzidas

    por polticas de planificao. A partir dessa ideia, os plos na regio Nordeste

    exerceriam influncia ao seu derredor, sendo sua indstria motriz a responsvel por

    fazer surgir concentrao de capitais que, ao se renovarem constantemente, fariam

    com que essa indstria fosse capaz de absorver a grande massa de mo de obra

    que se instalavam nos precrios centros urbanos e assim dinamizaria a vida da

    regio. Alm disto, a aglomerao de pessoas estimularia o setor tercirio, a

    agricultura e pecuria para dar suporte populao que vai residir no local. Esses

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    plos, portanto, tambm iriam criar a necessidade de estradas e toda uma

    infraestrutura que atenderia as necessidades de comunicao e locomoo, o que

    faria com que surgissem as zonas de desenvolvimento que so vrios polos ligados

    uns aos outros.

    De fato, a partir das aes promovidas pela SUDENE, o Nordeste passou a

    comportar uma indstria de transformao que outrora no existia neste espao, ou

    seja, houve uma interveno planejada na regio. Entretanto, de uma maneira geral

    as polticas implementadas enfatizaram apenas o setor industrial e o local era visto

    como receptor passivo de investimentos exgenos, que teoricamente irradiariam o

    desenvolvimento na regio como um todo. Desta forma, a industrializao se fez,

    porm de forma concentrada, com destaque para os estados da Bahia, Pernambuco

    e Cear, em particular as suas Regies Metropolitanas.

    Conforme Apolinrio e Silva (2012), nos anos 1980 e 1990 h um

    esvaziamento dos esforos de desenvolvimento regional no Brasil, sobretudo em

    razo da nfase no controle inflacionrio. Todavia, imerso nas transformaes

    porque passa o capitalismo no limiar no sculo XXI, seus desafios e oportunidades;

    e, j tendo sido conquistada a estabilizao monetria, reinicia-se mais

    recentemente um debate sobre os novos requisitos para o desenvolvimento,

    momento em que a abordagem em Arranjo Produtivo Local (APL) surge no pas e

    ganha visibilidade.

    3. A abordagem em Arranjos Produtivos Locais

    O tema desenvolvimento tem atualmente levantado uma srie de

    discusses. Neste debate e de maneira crescente, preocupaes em como crescer

    desenvolvendo o territrio e gerando melhoria de vida da populao tm estado nas

    pautas de debates e em projetos governamentais.

    No Brasil, a abordagem em Arranjos Produtivos e Inovativos Locais (ASPILs),

    que se popularizou a partir do jargo Arranjo Produtivo Local (APL), tem se

    destacado neste debate que busca orientar e promover o desenvolvimento

    local/regional e gerar ocupao e renda no pas, ao permitir a reflexo sobre novos

    requisitos para o desenvolvimento, ao destacar o papel central da inovao diante

    de um novo paradigma tecno-produtivo, assim como do aprendizado institucional, o

    capital social. (APOLINRIO e SILVA, 2012, p. 205).

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    Segundo Apolinrio e Silva (2012, p. 207) no tema APLs o Brasil apresenta

    uma rica experincia, nascida pelo menos desde fins dos anos 1990, com

    destaque para programas e editais que atingiram variadas regies e estados a partir,

    por exemplo, das Plataformas Tecnolgicas; dos Editais Promos/Lombardia que

    apoiavam distritos industriais e MPEs; do Programa de Desenvolvimento Local e

    Sustentvel (Dlis); do Programa de Apoio Competitividade das Micro e Pequenas

    Empresas (Procompi); do Programa de Apoio Competitividade dos Arranjos

    Produtivos Locais (PROAPL), dentre outros. As autoras concluem que:

    Todas estas experincias dignas de nota estimularam uma inclinao para uma nova abordagem do desenvolvimento, fundamentada no todo ou em parte, no protagonismo dos atores locais, no fortalecimento do capital social, nas potencialidades regionais/locais e na relevncia da cooperao/aprendizado/inovao como condicionantes da sustentabilidade dos sistemas produtivos. Este registro importante porque at a dcada de 2000 predominava no Norte e no Nordeste, como poltica de desenvolvimento regional, a atrao de investimentos de grande porte fundada em incentivos fiscais, que embora tenha sido responsvel em muitos aspectos por sua industrializao, ainda permanecia conservadora quanto aos demais atores, reas e atividades [...]. (APOLINRIO E SILVA, 2012, p. 207-208).

    O termo Arranjo Produtivo Local (APL) foi desenvolvido no final da dcada de

    1990 pela Rede de Pesquisa em Sistemas e Arranjos Produtivos e Inovativos Locais

    (RedeSist)5.

    Conforme Cassiolato, Lastres e Stallivieri (2008, p. 14) o enfoque em Arranjos

    Produtivos Locais abrange:

    Conjuntos de atores econmicos, polticos e sociais e suas interaes, incluindo: empresas produtoras de bens e servios finais e fornecedoras de matrias-primas, equipamentos e outros insumos; distribuidoras e comercializadoras; trabalhadores e consumidores; organizaes voltadas a formao e treinamento de recursos humanos, informao, pesquisa, desenvolvimento e engenharia; apoio, regulao e financiamento; cooperativas, associaes, sindicatos e demais rgos de representao.

    Segundo Apolinrio e Silva (2012, p. 205), o enfoque em APLs desenvolvido

    pela RedeSist:

    [...] se nutre de fontes tericas reconhecidas, a exemplo da abordagem sistmica da escola estruturalista latino-americana, das externalidades marshallianas, da inovao schumpeteriana, dos processos e aprendizagem evolucionistas, das aes coletivas institucionalistas e de abordagens da nova geografia.

    As autoras tambm argumentam que o APL uma forma de olhar dada

    atividade e o seu entorno e, ao mesmo tempo, um espao concreto para a

    5 www.redesist.ie.ufrj.br

  • 12

    implementao de polticas. Tambm acrescentam que esta abordagem considera

    os agentes econmicos e institucionais em torno de dada atividade e territrio, com

    destaque para as suas singularidades, cultura e histria, bem como a teia de

    vnculos que ocorrem mesmo fora do local, mas dentro daquele sistema.

    (APOLINRIO e SILVA, 2012, p. 205).

    Logo, o conceito APL contempla uma srie de atores econmicos, sociais e

    polticos que, segundo Cassiolato e Matos (2012), mantm relao entre as

    atividades econmicas e o territrio, que exercem suas atividades nos diferentes

    setores econmicos e exprimem vnculos, podendo ser estes formais ou informais.

    Nessa interao o aprendizado, a inovao e o conhecimento tcito fluem, podendo

    resultar em diferenciais competitivos.

    Ainda quanto ao conceito de APL, Apolinrio e Silva (2010, p. 35 e 2012, p.

    207) advertem que necessrio desmitificar o termo visando usufruir da sua

    riqueza. Neste sentido, afirmam que APLs no se referem a pequenas e mdias

    empresas ou atividades sem expresso tecnolgica e econmica, nem tampouco

    uma fase por qual passa um agrupamento de empresas, mas, os APLs podem

    abranger atividades intensivas em tecnologia e capital, podendo englobar empresas

    bem sucedidas nacionalmente e internacionalmente, constituindo-se assim em uma

    importante ferramenta de anlise e de implementao de polticas de

    desenvolvimento.

    Amaral Filho (2011, p. 190), por sua vez, destaca que os Arranjos Produtivos

    Locais tm seu prprio percurso e que isso no deve ser confundido com estgios

    at chegar ao avanado, mas seu trajeto tem relao com sua histria e com o [...]

    grau de complexidade apresentado por cada um deles.... Tambm afirma que as

    mltiplas caractersticas sero decorrentes de construes histricas, complexidade

    de articulaes entre agentes e instituies sociais, entre outros.

    Desta forma, a abordagem em Arranjo Produtivo Local sugerida pela

    RedeSist mostra-se sistmica por permitir uma viso global de todos os atores que

    se envolvem em dada atividade, como os que produzem, comercializam, fornecem,

    distribuem, rgos que do apoio, promovem, ensinam, pesquisam, regulam,

    financiam, dentre outros. Porm, a complexidade do conceito relaciona-se no

    apenas ao nmero de vnculos que pode envolver, mas tambm ao fato de tais

    interaes nem sempre estarem limitadas ao local geograficamente definido (ex:

  • 13

    municpio), podendo inclusive manter relaes estaduais, regionais, nacionais e at

    internacionais. (APOLINRIO e SILVA, 2012).

    Nesta mesma perspectiva, Amaral Filho (2011) afirma que de modo geral

    esses arranjos esto relacionados a um territrio. Isso se deve a localizao de

    algum bem natural, aglomerao de empresas ou mesmo a um enraizamento

    cultural. Portanto, o local aquele que por vivncia e pela sua histria exerce

    influncia sobre os agentes que nele operam e configuram as instituies que

    viabilizam seu funcionamento. Chama-se ateno para a forma de se analisar a

    localidade, pois ela no est necessariamente definida, podendo envolver relaes

    que esto fora da concentrao.

    Assim, a abordagem em APLs da RedeSist, nfase particular dada s

    relaes que existem entre os diversos atores econmicos e institucionais (no

    econmicos) de uma determinada atividade e o aprendizado e inovaes

    decorrentes das interaes que ocorrem nestes arranjos produtivos.

    As especificidades de cada arranjo podem ser aclaradas a partir, por

    exemplo, da valorizao da histria e cultura enraizada em cada arranjo. Portanto, o

    enfoque no APL, segundo LIRA (2012), pode revelar as especificidades locacionais,

    alm de demonstrar os desafios e oportunidades das polticas voltadas a cada

    arranjo.

    Outro importante elemento dos arranjos produtivos locais o capital social,

    pois de forma explcita ou de maneira subentendida, atravs da confiana e

    baseado nas instituies (organizaes ou mecanismos de controle social como

    valores, normas), que pode haver um aumento da eficincia coletiva. Alm do mais,

    dessa confiana e cooperao que pode se estabelecer entre os agentes e

    favorecer aes coletivas, esforos de inovao tambm podem ser estimulados.

    Na teoria econmica, uma das primeiras contribuies quanto s vantagens

    das interaes em dada localidade podem ser encontradas em Marshall (1996), que

    escreve em fins do sculo XIX e incio do sculo XX. Em sua obra: Princpios de

    Economia, Alfred Marshall frisa a importncia da teoria desenvolvida por Adam

    Smith sobre a diviso do trabalho, mostrando a relevncia dela na organizao

    industrial como meio garantidor de sobrevivncia, desde que seja feito bom uso dos

    recursos que esse ambiente lhe proporciona. Marshall (1996, p. 293-294) faz uma

    analogia entre a organizao fsica dos animais superiores e a organizao social,

    especialmente a industrial e discorre que tero maior xito os organismos mais

  • 14

    capazes de se aproveitarem das vantagens que o seu meio oferece. O autor

    acrescenta que nessa organizao, cada agente prioriza o bem coletivo entendendo

    que para que haja resultados positivos para si, o conjunto precisa estar em

    harmonia, pois qualquer dano causado em uma das partes afetar tambm a si,

    assim aquelas raas cujos membros se entreajudam sem receber recompensa

    direta alguma, so as mais aptas no s a progredir, mas tambm a ter grande

    nmero de descendentes que herdam seus hbitos benficos e sobrevivem aquelas

    mais bem adaptadas coletivamente a se utilizarem do seu meio ambiente.

    (MARSHALL, 1996, p. 295-296).

    A abordagem em APLs de grande importncia para orientar e promover

    polticas que intentem o desenvolvimento territorial, com implicaes sobre a

    gerao de emprego e renda no pas. No entanto, admoesta-se que aes de

    estmulos aos APLs no tm o papel de substituir as polticas regionais, mas

    servem para auxiliar no desenho e no desenvolvimento de novas polticas.

    (APOLINRIO E SILVA, 2010).

    O aprendizado e a inovao so componentes importantes para o

    desempenho dos arranjos produtivos. O aprendizado numa organizao industrial

    um importante ativo. Esse aprendizado est definido de dois modos, sendo eles: o

    conhecimento codificado e o conhecimento tcito. O conhecimento codificado

    aquele que pode ser transmitido, arquivado e tambm reproduzido. Ele transmitido

    atravs de livros, manuais, banco de dados, informativos, dentre outros. O

    conhecimento tcito imaterial. Ele adquirido atravs de experincias e

    habilidades. Esse conhecimento, ao contrrio dos que podem ser transmitidos pelos

    manuais, difcil de ser repassado, a no ser pela vivncia com pessoas que

    tenham j experincia. O conhecimento tcito se constitui uma importante vantagem

    competitiva das empresas. (LASTRES E CASSIOLATO, 2005).

    Marshall (1996) tambm destaca o papel do aprendizado e da histria que

    est consolidada em cada ambiente, dando nfase s indstrias especializadas e

    concentradas em dado local, onde o conhecimento passado de gerao em

    gerao e o saber transmitido, mesmo de forma involuntria, aos seus membros.

    Sobre este assunto o autor discorre:

    [...] Os segredos da profisso deixam de ser segredos, e, por assim dizer, ficam soltos no ar, de modo que as crianas absorvem inconscientemente grande nmero deles. Aprecia-se devidamente um trabalho bem-feito, discutem-se imediatamente os mritos de inventos e melhorias na maquinaria, nos mtodos e na organizao geral da empresa. Se um lana

  • 15

    uma idia nova, ela imediatamente adotada por outros, que a combinam com sugestes prprias e, assim, essa idia se torna uma fonte de outras idias novas. Acabam por surgir, nas proximidades desse local, atividades subsidirias que fornecem indstria principal instrumentos e matrias-primas, organizam seu comrcio e, por muitos meios, lhe proporcionam economia de material. (Marshall, 1996, p. 320)

    Assim Marshall (1996) enfatiza a importncia do aprendizado que est

    vinculado histria de cada organizao industrial, assim como a relevncia da

    cooperao e inovao entre os agentes. Este aprendizado est presente em todo o

    processo e tem grande influncia sobre um sistema produtivo.

    A inovao, por sua vez, tambm tem a importncia destacada por

    Schumpeter (1984), sendo ela o motor do desenvolvimento capitalista, que

    dinmico e est em constante evoluo. Segundo o autor a inovao entendida

    como mudanas no modo de agir, nos produtos, na forma de organizar, ou ainda, a

    abertura de um novo mercado ou a introduo de uma nova matria-prima.

    Com base nisto possvel afirmar que as empresas esto em constante

    processo de desenvolvimento de inovaes, na medida em que para produzir estas

    interagem e aprendem entre si e com os demais agentes econmicos e

    institucionais. Em conseqncia, tal dinmica pode se traduzir em lucros e

    vantagens para as empresas, com possveis transbordamentos para os arranjos que

    as sustentam.

    4. Consideraes Finais

    A reviso terica sobre o debate regional demonstrou haver inmeras

    correlaes entre a abordagem em Arranjos Produtivos Locais (APLs) sistematizada

    pela RedeSist e os requisitos para o desenvolvimento regional/local, sintetizados no

    novo debate regional.

    O enfoque em APLs refora a importncia do ambiente, dos atores sociais e

    suas interaes para o desempenho de uma dada atividade econmica. Alm do

    que, o territrio que abriga este sistema no visto homogeneamente, mas levando-

    se em considerao a sua estrutura econmica, social, cultural e histrica.

    Neste sentido, um grande desafio das polticas de desenvolvimento atingir

    tambm diversos APLs existentes no pas, oportunizando a gerao de emprego e

    renda em variados espaos e atividades. No menos importante o estmulo

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    continuado inovao, requisito indispensvel para dinamizar os sistemas

    produtivos.

    REFERNCIAS

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  • 17

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