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CONCILIADOR E A COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA CONCILIATOR AND NONVIOLENT COMMUNICATION
Aline Gisele Araújo Miranda de Morais Conciliadora, colaboradora no CEJUSC-Brasília. Estagiária da Defensoria Pública do Distrito Federal, graduanda em Direito pelas
Faculdades Integradas Promove de Brasília. Contato: [email protected].
Resumo: A comunicação não-violenta é uma técnica de linguagem, a qual visa capacitar o
indivíduo em habilidade de linguagem e em comunicação para manter a compassividade.
Verifica-se que, em sessão de conciliação, a linguagem verbal e não-verbal utilizada pelo
conciliador, muitas vezes sem o treinamento adequado, se torna inadequada; como
consequência, sem perspectiva de desenvolver um processo colaborativo com as partes, que,
ás vezes, possui uma imagem de um judiciário frio e distante da população, em uma audiência
de conciliação. Diante dessa perspectiva, questionou-se se, para a conciliação, é realmente
importante o uso de uma linguagem não-violenta. Além disso, como essa linguagem poderia
ser aplicada em negociação entre pessoas em conflito a fim de compreender suas posições e
a encontrar soluções que se compatibilizam aos seus interesses e necessidades. Logo, o
objetivo geral foi analisar as técnicas da comunicação não-violenta (CNV) em sessão de
conciliação. Isso por meio de estudo de caso, ao longo de 6 (seis) sessões de conciliações.
No fim, verificou-se a relevância desse método comunicacional para a eficácia da
conciliação, ao se abordar seus quatro componentes: observação, sentimento, necessidades e
pedido.
Palavras-chave: comunicação não-violenta; sessão de conciliação; técnicas de linguagem.
Abstract: The nonviolent communication is a technique which aims to empower a person in
language and communication skills to maintain compassion. It is verified that, in a
Conciliation Committee, the verbal and non-verbal language used by the conciliator,
oftentimes, without a proper training, becomes inappropriate. As a consequence, without
perspective to develop a collaborative process with those involved, it sometimes holds a
strong image of a cold and distant Judicial System, in a Conciliation Committee. Facing this
perspective, it was questioned that, it is quite important the use of a non-violent language in
a conciliation. Furthermore, how this language could be applied in trade between people in
conflict in order to understand their positions and find solutions that make compatible to their
interests and needs. Above all, the general objective was to analize the non-violent
communication techniques in a Conciliation Committee. It was done by a study case over 6
(six) conciliation committees. In the end, it was found the importance of this communication
method for an effective reconciliation, by addressing its four components: observation,
feelings, needs and request.
Keywords: Nonviolent Communication; conciliation session; language techniques
Sumário: Introdução. 1. Conciliação. 1.1. Comunicação não-violenta. 1.2. A relação do
conciliador com a comunicação não-violenta como técnica de linguagem. 1.3. A
aplicabilidade da comunicação não-violenta na sessão de conciliação. 2. Metodologia. 2.1.
Universo de pesquisa. 2.2. Plano de Análise. 3. Análise e discussão dos dados. Conclusão.
Referências Bibliográficas
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Introdução:
A comunicação não-violenta (CNV) é uma técnica de linguagem, que visa treinar o
indivíduo em habilidade de linguagem e comunicação para manter a compassividade. A CNV
possui quatro componentes: observação, sentimento, necessidades e pedido, os quais serão
explicitados ao longo do presente estudo.
O presente estudo tratou sobre a aplicabilidade dessa comunicação não-violenta (CNV)
em sessão de conciliação por intermédio de um conciliador. Isso porque verificou-se que, em
sessão de conciliação, a linguagem verbal e não-verbal utilizada pelo conciliador, que muitas
vezes sem o treinamento adequado, tornou-se inadequada e/ou até mesmo incompreendida.
Assim, sem perspectiva de desenvolver um processo colaborativo na audiência de
conciliação; consequentemente, prejudicando o processo conciliatório, verifica-se que o
conciliador treinado e conhecedor dessa técnica, a torna um meio eficaz, para que a sessão
de conciliação seja esclarecedora, harmoniosa e eficiente.
Diante desta perspectiva, questiona-se que se, para a conciliação, é importante o uso de
uma linguagem não-violenta? Como essa linguagem poderia ser aplicada em negociação
entre pessoas em conflito, para compreender suas posições e para encontrar soluções que se
compatibilizam aos interesses e necessidades?
O objetivo geral foi compreender a aplicabilidade de uma comunicação não-violenta.
Para alcançar esse objetivo, escolheu-se como método o estudo de caso, em que se observou
6 (seis) sessões de conciliações.
Os resultados demostraram que a aplicação da linguagem não-violenta traz às sessões de
conciliações harmonização e humanização, em que as partes saem satisfeitas, pacificadas,
mesmo que se efetive um “termo de acordo”. Logo, há uma efetiva harmonização social das
partes.
1. Conciliação
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em sua Resolução nº 125, conceitua a conciliação
como um dos mecanismos para solucionar problemas jurídicos e conflitos de interesses.
Além disso, auxilia os serviços prestados nos processos judiciais. É uma das vias de solução
de conflitos, consensuais, a qual também está inserida a mediação. (Azevedo, 2013, p.319)
3
Segundo Azevedo (2013, p.86), a conciliação pode ser definida como um processo
autocompositivo célere, em que as partes ou os interessados são auxiliados por um terceiro,
neutro à lide, para prestar-lhes auxílio, utilizando-se de técnicas adequadas. Sena (2007, p.2)
traz o conceito com maior profundidade:1
A conciliação entendida em um conceito muito mais amplo do que o
“acordo”, significando entendimento, recomposição de relações
desarmônicas, empoderamento, capacitação, desarme de espírito,
ajustamento de interesses. Em dizer psicanalítico: apaziguamento.”
As controvérsias, os conflitos são recorrentes nas relações entre os seres humanos. Os
conflitos, geralmente, representam desentendimentos e podem gerar resistências a posições
alheias. Como resultado disso, pode causar o desrespeito, a insatisfação pessoal, oposições
de interesses e bloqueios. Nessa perspectiva, para auxiliá-los, é necessário um tratamento
adequado, pois envolvem aspectos filosóficos, psicológicos, existenciais e jurídicos (Gabbay,
2013, p.7), sendo possível, então, muitas vezes, o reestabelecimento do diálogo pacífico.
Muitos não consideram o judiciário como um meio natural para se enfrentar um conflito.
No entanto, essa já não é mais uma realidade no judiciário brasileiro, pois o número de
demandas judiciais cresce ao longo dos anos, conforme relatório do Conselho Nacional de
Justiça (2013):
De acordo com a pesquisa, o estoque de casos pendentes de julgamento no
início de 2012 era de 64 milhões de processos. Somados aos 28,2 milhões
de casos que ingressaram ao longo do ano, chega-se ao total de 92,2 milhões
de processos em tramitação em 2012, número 4,3% maior que o do ano
anterior. O relatório indica que houve aumento nos números de processos
baixados, sentenças e decisões proferidas, chegando-se a patamares
semelhantes à demanda. No ano passado, o número de processos baixados
(solucionados) cresceu 7,5% e chegou a 27,8 milhões de processos, e o
número de sentenças ou decisões proferidas foi 4,7% maior (24,7 milhões).2
Para dar maior vasão a essas demandas, o judiciário aplica, cada vez mais, meios
alternativos de resoluções de conflitos, como: mediação, conciliação, os quais, embora ainda
1 SENA, Adriana Goulart de. Juízo Conciliatório Trabalhista. Tribunal Regional do Trabalho 3ª Região.
Disponível em:<http://www.trt3.jus.br/escola/download/revista/rev_75/Adriana_Sena.pdf>. Acesso em 06
de maio de 2016. 2 Conselho Nacional de Justiça. Número de processos em trâmite no Judiciário cresce 10% em quatro
anos. Brasília, 15 out. 2013. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/26625-numero-de-
processos-em-tramite-no-judiciario-cresce-10-em-quatro-anos>. Acesso em: 06 de maio de 2016.
4
tímidos, trazem resultados satisfatórios em países desenvolvidos comparados aos
subdesenvolvidos, como pontua Milício (2006) em sua publicação:
Enquanto nos países desenvolvidos o percentual de acordos em conflitos é
de 80% a 82%, em países subdesenvolvidos é de 30% a 35%, apontam
pesquisas de entidades internacionais. Para incentivar a resolução de
litígios por meio da conciliação, no Brasil, o Conselho Nacional de Justiça
instituiu o dia 8 de dezembro como o Dia Nacional da Conciliação. A
intenção é estimular juízes e mostrar à população a importância da
conciliação na solução de conflitos que, geralmente, demoram anos para
serem julgados.
Observa-se, assim, que parece ser uma questão cultural, uma vez que os advogados são
levados a ser litigantes ante as demandas de seus clientes, porque os juízes, muitas vezes,
pelo volume de demandas, não dispõem de tempo para aplicar técnicas da conciliação.
Mesmo, ela sendo um meio relevante o qual reduziria significativamente os número de
processos. Todavia, Grinover (2008, p.22) aduz que há um interesse na retomada pela
autocomposição:
Se é certo que, durante um longo período, a heterocomposição e a
autocomposição foram consideradas instrumentos próprios das sociedades
primitivas e tribais, enquanto o processo jurisdicional representava
insuperável conquista da civilização, ressurge hoje o interesse pelas vias
alternativas ao processo, capazes de evitá-lo ou encurtá-lo, conquanto não
o excluam necessariamente.
Anteriormente, a conciliação era uma prática mais intensa na Justiça do Trabalho e no
âmbito dos juizados especiais nas causas de menor complexidade (Pelizzoli, 2012, p.151),
previsto constitucionalmente e regulados pela lei nº 9.099/05. Todavia, essa prática veio
alcançando, embora timidamente, outros ritos processuais (sumário, ordinário) embora esses
ritos não mais existam no Código de Processo Civil (CPC) vigente, a lei nº13.105/15.
A lei nº 13.105/15 trouxe, com maior amplitude, os meios alternativos de resolução dos
conflitos, como: a conciliação, mediação, além de como devem ser regidas. Logo, enfatiza a
importância autocomposição (Pereira, 2015). O artigo nº 165 da lei nº 13.105/15 (Brasil,
2015, p.1), aduz que a conciliação ou mediação deverá ser estimulada pelos magistrados,
pelos advogados, pelos defensores públicos e pelos membros do Ministério Público,
vejamos:
Art. 3º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a
direito. §1º É permitida a arbitragem, na forma da lei.
5
§2º O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos
conflitos. §3º A conciliação, a mediação e outros Método de solução consensual de
conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores
públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do
processo judicial. (Grifo nosso)
Para uma maior adesão à autocomposição, o código trouxe penalidades, em que a
ausência injustificada das partes na audiência de conciliação ou de mediação é tida como ato
atentatório à dignidade da justiça; como resultado, há uma pena com multa de até 2% da
vantagem econômica pretendida ou do valor da causa. Esses valores serão revertidos em
favor da União ou do Estado, nos termos do artigo nº 334, § (parágrafo) 8º, da lei nº 13.105/15
(Brasil, 2015, p.16):
§ 8o O não comparecimento injustificado do autor ou do réu à audiência de
conciliação é considerado ato atentatório à dignidade da justiça e será
sancionado com multa de até dois por cento da vantagem econômica
pretendida ou do valor da causa, revertida em favor da União ou do Estado.
Logo, verifica-se a relevância da autocomposição para a sociedade. Entretanto, ter-se-á
alguns conflitos em que a sua resolução se dará somente através do poder judiciário, como
por exemplo, em demandas que envolvam direitos indisponíveis, os quais não permitem
transações (Gabbay, 2013, p.49).
Na prática, em sessão de conciliação, as partes dialogam sobre o conflito que estão
vivenciando; expõem suas versões da lide. Dessas exposições, são pontuadas as questões, os
interesses e os sentimentos de cada um com fito da restauração da comunicação entre as
partes; assim, uma possível solução para o conflito, de maneira que elas alcancem um
consenso. Logo, há um estímulo para construir um resultado que seja plausível para ambas
as partes por meio de ações comunicativas (Azevedo, 2013, p. 102).
1.1 Comunicação não-violenta
Marshall B. Rosenberg, americano, PhD em psicologia clínica pela Universidade de
Wisconsin – Madison, percussor dessa metodologia, orientado pelo professor Carl Rogers,
que, por meio de suas pesquisas, desenvolveu um manual didático que apresenta a
metodologia de sua teoria. O que levou Rosenberg a iniciar a desenvolver essa teoria foi o
trabalhar em escolas e universidades que abandonavam a segregação racial (Rosenberg,
2006, p. 19). Ao longo de sua jornada promoveu diversas oficinas e treinamentos de
6
comunicação não-violenta para milhares de pessoas, além de programas de paz em lugares
atingidos pela guerra como Croácia, Sri Lanka, Sérvia, dentre outros (Rosenberg, 2006, p.
284 e 285).
Para ele, a comunicação não-violenta é um processo de linguagem, que está em constante
aprimoramento: “ela oferece uma estrutura básica e um conjunto de habilidades para abordar
os problemas humanos, desde os relacionamentos mais íntimos até conflitos políticos
globais” (Rosenberg, 2006, p.284). A proposta da comunicação não violenta é treinar o
indivíduo, em habilidade de linguagem e em comunicação, para manter a compassividade.
Ademais, que essa comunicação seja em consciente, empática e não automatizada.
Consoante ao estudioso, para se rever a maneira o qual nos expressamos e escutamos, é
necessário a divisão da CNV em duas partes: 1º) expressando-se honestamente por meio dos
componentes; 2º) recebendo empaticamente as mensagens por meio dos quatro componentes.
Isso acontece com base em quatro componentes:
Ela nos guia no processo de reformular a maneira pela qual nos
expressamos e escutamos os outros, mediante a concentração em quatro
áreas: o que observamos, o que sentimos, do que necessitamos, e o que
pedimos para enriquecer nossa vida. (Grifo nosso) (ROSENBERG, 2006,
pg. 32)
O primeiro componente da CNV é a observação, como dita Rosenberg (2006, p. 57). É a
distinção entre observar e avaliar. Em não se emitir nenhum juízo de valor ao que se ouve,
ou vê, o que é extremamente dificultoso fazer observações isentas de julgamento. As
avaliações, julgamentos moralizadores, comparações podem gerar, no ser humano, emoções
intensas, positivas ou negativas, porém, em sua maioria, a perspectiva é negativa.
Geralmente, essas emoções são recebidas como críticas, o que causa uma resistência ao que
lhe é dito. Assim, para o estudioso, deve-se evitar os exageros de linguagens como nunca,
sempre, jamais, demais, etc., pois denotam avaliações.
O segundo componente da CNV é a expressão dos sentimentos. Nesse componente,
também, há que se distinguir os sentimentos de opiniões. Segundo Rosenberg (2006, p. 63),
o nosso repertório de palavras para rotular os outros costuma ser maior do que o vocabulário
para descrever claramente nossos estados emocionais. Pelizzoli (2012, p. 44), aponta a
importância da expressão de sentimentos:
7
A vantagem para a pessoa que usa este modelo, é que começa a criar um
grau maior de confiança junto a seus próximo ou em seus grupos, e agora
não mais tanto a necessidade de esconder certas coisas. Pode operar com
mais transparência (...).
Aqui é necessário nomear os sentimentos com clareza, para que possamos nos conectar
mais facilidade com os outros, como pontua Rosenberg (2006, p. 76). Expressar nossa
vulnerabilidade, com mais humanidade, ajuda na aproximação das pessoas, no diálogo.
Exemplo: “Sinto que sou má pagadora”. Nesse caso, não se pode inferir, pontualmente, uma
expressão de sentimento. Mas, reformulando, com sentimento, poderia ser: “Estou me
sentindo desapontada comigo por não honrar minhas dívidas”. A expressão “sentir-se
desapontada” permite inferir sentimento.
O reconhecimento das necessidades que estão envoltos em nossos sentimentos é o
terceiro componente da CNV. Aceitar a responsabilidade pelo que sentimos, já que os
sentimentos são frutos daquilo que se escolhe receber a respeito do que os outros dizem ou
fazem. Isso pode, sim, ser um estímulo, contudo nunca a causa de sentimentos, como aduz
Rosenberg (2006, p. 79). Especificamente, os seres humanos têm dificuldades de receber
mensagens negativas, sendo verbal ou não. Ao recebê-las, tem-se as seguintes opções:
primeiramente, culpar a si próprio, o que gera vergonha, depressão; a segunda opção, culpar
os outros, o que pode estimular a raiva; a terceira opção é a consciência a respeito dos
sentimentos e necessidades; a quarta opção é focar nas necessidades e nos sentimentos dos
outros.
As necessidades expressas indiretamente; avaliações; e comparações tendem a ser vistas
como uma crítica e certamente acarretará numa posição de autodefesa. Rosenberg (2006, p.
84) ensina que “quanto mais diretamente conseguirmos conectar nossos sentimentos a nossas
próprias necessidades, mais fácil será para os outros reagirem a estas com compaixão”.
Acrescenta, ainda, o estudioso, que no trajeto da responsabilização emocional, têm-se
três fases que podemos passar ou não por elas: são a fase “escravidão emocional”, em que
acredita-se que somos responsáveis pelos sentimentos alheios (Rosenberg, 2006, p.92); a fase
“ranzinza”, em que não se admite que nos importamos com as necessidades e sentimentos
alheios; e a fase de “libertação emocional”, na qual somos responsáveis por nossos
sentimentos, e não pelos sentimentos alheios e se tem consciência que nossas necessidades
não serão atendidas à custa alheias.
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O último componente da CNV é o pedido, o primeiro ponto é dizer o que se quer e não o
que não se quer; fazer pedidos em linguagem positiva; formular frases de ações concretas e
evitar pedidos vagos, abstratos, ser direito e preciso. Os pedidos também devem ser
formulados com cautela, para se ter consciência do que se pede, é o pedido consciente.
Apenas o sentimento expresso não é suficiente, há que se ter cautela, como dita Rosenberg
(2006, p. 110-111):
É ainda mais comum que ao falar simplesmente não tenhamos consciência
do que estamos pedindo quando falamos. Conversamos com os outros ou
falamos a eles sem saber como estabelecer um diálogo em conjunto com
eles. Jogamos palavras e usamos a presença dos outros como se fossem uma
cesta de lixo.
Outro ponto importante do pedido é verificar se a mensagem enviada foi recebida com
clareza. Para isso, deve-se pedir que o receptor repita a mensagem, pois, caso contrário,
iniciar-se-á conversas improdutivas, desperdiçando um tempo considerável. É importante
certificarmos como a mensagem foi recebida, de modo a tudo ficar esclarecido, claro, sem
qualquer dúvida. Caso não fique claro a mensagens, ter-se-á a oportunidade de reformulá-la
(Rosenberg, 2006, p.114).
Diferenciar pedidos de exigências, pois, geralmente, quando um pedido é entendido como
uma exigência, o receptor tende a se rebelar, ou não se submeter. Isso pode gerar insatisfação
e até mesmo o descumprimento do pedido. Segundo Rosenberg (2006, 121), “é um pedido
se a pessoa que pediu oferece em seguida sua empatia para com as necessidades da outra
pessoa”, ou seja, o pedido pode vir a ser atendido quando se oferece empatia.
1.2 A relação do conciliador com a comunicação não-violenta como técnica de
linguagem.
O código de processo civil trouxe a previsão de como devem ser as atuações dos
conciliadores e mediadores. Estão aludidas a partir do artigo 165 da lei nº 13.105/2015. Em
seu artigo 167, §1º, aduz que o conciliador deverá preencher o requisito de capacitação
mínima, por meio de curso parametrizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Pelo
CNJ, são oferecidos diversos cursos o qual incentiva a utilização de técnicas negociais para
aprimoração da autocomposição, dentre elas a comunicação não-violenta. A exemplo desse
curso oferecido, em 2015, para formação de instrutores em oficinas de parentalidade:
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Também são apresentadas as oficinas de pais, crianças e adolescentes e os
resultados práticos das oficinas para a harmonização das relações
familiares. Os instrutores aprendem ainda sobre como lidar com algumas
situações que podem surgir durante as oficinas e são apresentados conceitos
de alienação parental, comunicação não violenta e empatia. (Grifo nosso)3
Os cursos oferecem, além da técnica de linguagem comunicação não-violenta, outras
técnicas como: ações de promoção da paz; meios alternativos de resolução de conflitos;
conflitos e seus aspectos positivos e negativos.
O conciliador, é um terceiro, isento, capacitado, que atua como um facilitador da
comunicação entre as partes. Segundo Gabbay (2013, p. 62), ele aproxima o diálogo, o que
pode abrir espaço para uma conversa com humanidade, compaixão e empatia. É essencial
uma preparação do conciliador, a qual é um processo constante de aprimoramento de suas
habilidades e técnicas para se ter um leque maior de táticas e estratégias.
O conciliador deve ter habilidade em negociação. Essa habilidade faz com que as partes
busquem um equilíbrio, em que ambas as partes venham a ceder um pouco dos seus
interesses, e sendo possível cheguem a um acordo (Gabbay, 2013, p. 20).
No momento da conciliação, o conciliador deverá identificar quais as questões trazidas
pelas partes. Nesse momento, verificar-se-á os pontos controvertidos e pontuar-se-á os
interesses de cada um (Azevedo, 2013, p. 153). Há, então, uma ponte entre as partes, a qual
é o conciliador. Ele tomará a mensagem emitida pelas partes e a parafraseará com intuito de
que a mensagem emitida não soe de uma forma a produzir resistência da parte contrária. O
ato de se parafrasear auxilia que o conteúdo seja transmitido sem intervenções pessoais
(Rosenberg, 2006, p.145).
Existem alguns princípios fundamentais contidos na Resolução nº 125 do Conselho
Nacional de Justiça, os quais alicerçam a atuação do conciliador (Gabbay, 2013, p. 50): (i)
Decisão Informada: é a garantia, às partes, para ser informadas dos acordos que serão
efetuados ou dos procedimentos; (ii) Confidencialidade: é o sigilo das informações expostas,
salvo autorização expressa das partes, afronta à ordem pública ou às leis vigentes, em que o
conciliador e observadores não podem servir como testemunhas do caso, nem atuar como
advogado dos envolvidos; (iv) Princípio da Imparcialidade: em que o conciliador deverá agir
3 BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. CNJ oferece curso de formação para instrutores em oficinas de
parentalidade. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/80525-cnj-oferece-curso-de-formacao-
para-instrutores-em-oficinas-de-parentalidade>. Acesso em 08 de maio de 2016.
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com imparcialidade, sem preferências, ou seja, seus valores e conceitos não devem interferir
perante as partes; (v) Princípio da independência e Autonomia: é a garantia dos conciliadores
atuarem com liberdade, pode-se recusar, suspender ou interromper a sessão se não atenderem
os requisitos mínimos; (vi) Princípio do Empoderamento: em que o conciliador estimula a
prática da autocomposição pelas partes, expondo seus benefícios; (vii) Princípio do Respeito
à Ordem Pública e às Leis Vigentes: o conciliador adverte as partes para não pactuarem
acordo ou procedam com atitudes, que violem a ordem pública ou infrinjam as leis vigentes.
1.3 A aplicabilidade da comunicação não-violenta na sessão de conciliação.
O conflito sempre estará no meio da sociedade, de acordo com Azevedo (2013, p. 39). O
estudioso preceitua como “[...]um fenômeno negativo nas relações sociais que proporciona
perdas para, ao menos, uma das partes envolvidas.”. Desta forma, o conflito é visto de forma
negativa. Porém, é de fundamental importância da normalização do conflito pelo conciliador,
em que fará observações e solicitará para que as partes vejam por uma outra perspectiva. Isso
através da comunicação não-violenta, pois insere que “a partir do momento em que se
percebe o conflito como um fenômeno natural na relação de quaisquer seres vivos é que é
possível se perceber o conflito de forma positiva”.
A teoria do conflito, no Manual de Mediação, organizado por Azevedo (2013, p.202), é
um ponto a ser visto minuciosamente, porque direciona a como lidar com o conflito e
normalizá-lo. Indica, ainda, que “para tanto, mostra-se recomendável que o mediador tenha
um discurso voltado a normalizar o conflito e estimular as partes a perceber tal conflito como
uma oportunidade de melhoria da relação entre elas e com terceiros”. Aclara que esta
normalização seja feita, preferencialmente, na declaração de abertura.
Outro ponto, na declaração de abertura, é deixar claro às partes do que se trata a
conciliação/mediação, para evitar quaisquer expectativas contrárias: o papel do conciliador
“o fato de não ter poder decisório e ser imparcial; a relevância da vontade dos envolvidos; a
proposta de falar e escutar mutuamente; a possibilidade de realização de sessões individuais
(privadas); e o sigilo” (Gabbay, 2013, p. 66). Podem ser feitos observações aos advogados e
agradecimentos às partes pela disponibilidade em conciliar. Caso haja possibilidades,
poderão chegar a um acordo (Azevedo, 2013, p. 119).
11
Iniciada a conciliação, com a técnica da comunicação não-violenta, a tendência é fluir
um diálogo respeitoso, proveitoso. Importa ressaltar que, por mais importante que sejam os
advogados diligentes em favor de seus clientes, é de grande valia que as partes exponham
seus argumentos, que o conciliador incentive-as com o “empoderamento” como pontua
Azevedo (2013, p.100):
Um dos benefícios mais mencionados consiste no empoderamento das
partes. “Empoderamento” é a tradução do termo em inglês empowerment
significa a busca pela restauração do senso de valor e poder da parte
para que esta esteja apta a melhor dirimir futuros conflitos. Outra
vantagem da mediação consiste na oportunidade para as partes falarem
sobre seus sentimentos em um ambiente neutro. Com isso, permite-se
compreender o ponto de vista da outra parte por meio da exposição de sua
versão dos fatos, com a facilitação pelo mediador. (Grifo nosso)
Todo esse processo requer atenção por parte do conciliador na linguagem verbal e não-
verbal, dele e das partes envolvidas. Sempre sinalizando ouvir as partes e advogados; olhar
para eles enquanto falam e etc., pois seu modo de se comunicar influencia as partes, como
pontua Azevedo (2013, p.180):
O mediador deve estar sempre atento à comunicação não verbal. O
mediador é um modelo de comportamento para as partes e está, a todo o
momento, ajustando a forma como as partes agem no processo por meio de
suas próprias atitudes. Seus gestos, seu modo de se comunicar e seu
semblante influenciam as partes. Os gestos, se bem utilizados, podem
evitar situações desagradáveis ou repetições desnecessárias. Não devem
transparecer preocupações pessoais, mau humor ou tampouco deve-se
fixar o olhar sempre em um mesmo participante. Devem ser evitados
gestos bruscos ou hostis. (Grifo nosso)
O Manual do Conciliador pontua as técnicas da comunicação não-violenta, sendo: 1)
observar e expressar honestamente a ação, sem avaliações, não generalizando; 2) expor com
honestidade os sentimentos em relação ao que está sendo discutido; 3) expressar as próprias
necessidades e 4) fazer o pedido claro, não genérico, direito, porém, sem imposições;
verifica-se que a probabilidade da escuta ser acolhida com empatia será maior (Rosenberg,
2006, p.133). Elementos esses que farão parte da nossa análise.
Para o uso da comunicação não-violenta e seus quatro componentes, não é necessário que
as partes saibam sobre essa técnica, já que, na troca de mensagens entre as partes, os
conciliadores poderão reformular o que está sendo discutido sob uma nova perspectiva, um
novo olhar com o intuito de que as partes percebam o processo de uma forma positiva e
construtiva (Pelizzoli, 2012, p. 102).
12
2. Metodologia
O método escolhido para alcançar o objetivo é o Estudo de Caso, que é a pesquisa em
campo. Ele consiste na observação dos fatos tal como ocorrem espontaneamente, na coleta
de dados e no registro de variáveis presumivelmente relevantes para ulteriores análises (Ruiz,
2002, p.50)
2.1 Universo de pesquisa
Foram assistidas seis sessões de conciliações, sendo três sessões por conciliador(a)
aplicando a comunicação não-violenta e três sessões sem a aplicação da linguagem não-
violenta. As conciliações foram nomeadas de CCNV (conciliação e comunicação não-
violenta) 1, CCNV 2, CCNV 3, CCNV 4, CCNV 5, CCNV 6. Assim, após as observações,
teceram-se comparações entre as conciliações, que serão apresentadas no próximo item.
2.2 Plano de Análise
Ao longo do estudo, foram analisadas seis sessões de conciliação feitas em 3 centros de
conciliações em Brasília, utilizando-se do método estudo de caso. Como instrumento, usou-
se de gravações, de observações e de coleta do termo de consentimento livre e
esclarecimento, assinado pelos participantes, resguardando o sigilo das informações. Dessa
maneira, não constará nenhum nome, identificação das partes. Nas sessões, observaram-se
os seguintes questionamentos para conduzir as observações in locu, baseados na
comunicação não-violenta:
I. Houve recepção adequada das partes?
II. Houve declaração de abertura?
III. As partes escutaram sem interrupções?
IV. Houve interferência do conciliador para elogiar ou apaziguar as partes, estabelecimento
da empatia?
V. Houve parafraseamento no resumo por parte do conciliador entre as partes?
VI. Houve expressão não-verbal, ou seja, comportamento corporal adequado ou inadequado?
VII. Algum dos componentes (observação, expressão de sentimentos, reconhecimentos de
necessidade, pedido) foi utilizado na declaração de abertura, no resumo da conciliação pelo
conciliador ou pelas partes?
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A partir desses questionamentos, verificou-se se os quatro elementos da CNV foram
atendidos: 1) observação, 2) sentimentos, 3) necessidades e 4) pedido. Os resultados e análise
serão explanados a seguir.
3. Análise e discussão dos dados.
Sessão CCNV1: Lide do âmbito cível (taxas condominiais) - nesta conciliação, houve a
recepção adequada das partes pelo conciliador; a declaração de abertura pontuou todos os
termos, porém sem explicar detalhadamente; as partes já haviam participado de outras
sessões e já conheciam as regras, o conciliador pediu que as partes respeitassem o momento
de fala de cada um; as partes dialogaram sem interrupções; o requerido fez um pedido direto
e claro, sem expressão de quaisquer sentimento e necessidade, solicitou o “parcelamento da
dívida”, que prontamente foi rejeitado, no entanto, após expor suas necessidades, houve uma
retórica positiva por parte do requerente “como seria a proposta do parcelamento”, ou seja,
houve uma mudança por parte dele que a princípio havia rejeitado a proposta. A requerida
formulou seu pedido sendo bem específica “gostaria que fossem 3 (três) parcelas, com a
primeira para 30 (trinta) dias”, tendo seu pedido aceito pela parte requerente, formalizando o
acordo. Não foi necessário interrupções por parte do conciliador, pois o diálogo entre as
partes fluiu naturalmente. Foi necessário apenas a confirmação dos dados que iriam constar
no acordo.
Nessa sessão, pode-se observar que não foram utilizados os quatros componentes:
observação, sentimentos, necessidades e pedido, mas apenas dois componentes: Necessidade
e Pedido. No primeiro momento, a parte fez o Pedido sem demonstrar sua necessidade;
consequentemente, categoricamente negado. Depois, ela expressou sua Necessidade com
clareza e formulação do pedido específico. Então, nesse momento, houve um acolhimento
por parte do requerente. Enfim, chegou-se a um acordo construído pelas partes.
A expressão não-verbal do conciliador foi adequada, porque sinalizou ouvir as partes. Da
mesma forma, entre as partes. Durante o registro do acordo, as partes estabelecem um diálogo
sobre o dia a dia, proporcionando um ambiente harmonioso. Isso corrobora com o que diz
Rosenberg (2006, p. 106), que “Além de utilizarmos uma linguagem positiva, devemos evitar
frases vagas, abstratas ou ambíguas e formular nossas solicitações na forma de ações
concretas que os outros possam realizar”.
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Sessão CCNV 2: Lide no âmbito cível (seguro) – nesta sessão houve recepção adequada das
partes; uma declaração de abertura, em que pontuava todos os pontos da conciliação, além
de elogio aos advogados. A conciliadora pediu que as partes respeitassem o momento de fala
de cada um. Deu-se início ao diálogo, as partes o fizeram sem interrupções. Não foi
necessário a despolarização das partes, pois estavam tranquilas, respeitando-se. Houve
interrupção do conciliador para fazer algumas perguntas, mas sem necessidade de paráfrase.
A expressão não-não verbal do conciliador e da partes mostraram-se adequadas, todos
sinalizaram atenção ao que era dito no diálogo.
Todavia, os quatro componentes da comunicação não-violenta não foram utilizados,
houve apenas a exposição da lide e o pedido genérico.
Discutiram-se os procedimentos em razão do não acordo entre as partes, e a sessão foi
reduzida a termo. Durante o procedimento, as partes dialogaram pacificamente.
Fica claro a relevância do uso da CNV, desenvolvida por Rosenberg, que enfatiza para o
uso dessa linguagem deve-se estar conscientes da forma específica de honestidade que se
deseja receber, e se faça esse pedido de honestidade em linguagem objetiva (2006, p.116).
Sessão CCNV 3: Lide no âmbito familiar (alimentos e regulamentação do horário de visitas)
- A conciliadora deu início a conciliação, em que já havia pontuado os termos da conciliação
em sessão anterior e foram passados alguns exercícios (sobre a comunicação, incluindo a
não-violenta) indicados pela conciliadora, já que as partes se mostravam bastante
polarizadas. Retomou-se a sessão e deu-se início ao diálogo entre as partes. A parte requerida
iniciou o diálogo, expondo seus argumentos. A conciliadora interviu, fazendo algumas
perguntas à parte requerente e ao requerido. Após essas perguntas, houve um resumo
parafraseado do já tinha sido dito.
Durante todo o procedimento, a comunicação não-verbal, por parte da conciliadora, foi
adequada, sempre sinalizava ouvir às partes. Porém, esse modelo não foi seguido, pois a
partes não se olhavam, miravam apenas para a conciliadora e para o advogado do requerido.
No decorrer do diálogo, a conciliadora sempre se impunha e solicitava que as partes
aguardassem a vez de cada um falar. Nesse ínterin, fez algumas pontuações, perguntado com
clareza o que era pleiteado. As partes estavam polarizadas, chegaram a fazer imposições:
(nestes exemplo a requerente alegava que, além do trabalho o requerido, detinha de uma
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empresa, sendo possível majorar a porcentagem dos valor a título de alimentos, o requerido
expôs que não era possível atender o pedido): - “só eu sei o que estou passando, posso
apresentar todas as dívidas (...) todas as despesas, as dívidas atrasadas, porque não consigo
mais manter o projeto (empresa)”; - “fecha empresa”.
No decorrer, o requerido fez observações, expressou seus sentimentos, expôs suas
necessidades com vulnerabilidade, porém o pedido não era claro. A parte requerente fazia
juízo de valor de suas observações, expressava opiniões ao invés dos sentimentos, expôs suas
necessidades com vulnerabilidade e não fez seu pedido claro, ou seja, era genérico,
polarizava o diálogo.
A conciliadora parafraseava todo o diálogo, “deixe-me ver se estou entendo” e colocava
o que foi dito de uma forma diferente, mais branda, expondo claramente o pedido.
Percebendo a polarização das partes, a conciliadora solicitou oportunamente uma sessão
individual (privada), em que esclareceu que falaria com cada parte individualmente,
resguardando a confidencialidade. Ademais, que só exporia o que foi discutido na sessão
privada caso a parte autorizasse.
Fez a sessão individual pontualmente com as duas partes: fez o “teste de realidade”, a
“inversão de papéis” (empatia) com ambas as partes, em que pediu que se colocassem no
lugar do outro. Também, pontuou novamente a comunicação não-violenta entre eles: “vamos
fazer uma coisa, a gente vai tentar fazer uma linguagem produtiva e não agressiva(...) vamos
evitar o juízo de valor de um em relação ao outro, pois isso prejudica a comunicação, é um
exercício que a gente têm que fazer, tá?! (..) e fazer o exercício quando vocês estiverem
juntos pensar, o que eu posso tirar para melhorar minha comunicação e que me possa fazer
compreender melhor” também “vamos mudar um pouquinho a linguagem se a gente coloca
assim “você vai ter que” a gente já gera uma animosidade contra o lado ne?!, olha a gente
está em uma situação que a gente precisa da parceria juntos, é falar a mesma coisa de uma
outra forma, porque isso melhora a comunicação”, advogado do requerido falando para seu
cliente: “essa questão da linguagem é muito importante, cuidado com a linguagem, não é só
um mero detalhe, uma questão trivial não, é o diferencial, pra conseguir um acordo, se dizer
uma palavra errada já mela tudo!” conciliadora para a parte: “olha o cuidado verbal”.
O advogado foi bastante colaborativo, fez o uso da comunicação não-violenta,
pontuando, para as duas partes, não só para seu cliente (requerido), a necessidade de sempre
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pensar no que seria resolvido daquele momento em diante, não voltando a questões passadas.
Aplicado todas as técnicas da comunicação não-violenta nas sessões individuais pela
conciliadora, retornando à sessão conjunta, as partes aplicaram o que foi dito, embora sem
comunicação não-verbal. Respeitaram-se; como resultado, fizeram um acordo parcial, o qual
foi reduzido a termo.
As partes construíram o resultado da sessão e saíram satisfeitas. Como Rosenberg (2006,
p.284) afirma, o uso da CNV permite que as pessoas sejam capacitadas a se envolverem em
um diálogo, de modo que elaborem suas próprias soluções de forma satisfatórias (2006,
p.284).
Sessão CCNV 4: Lide no âmbito cível (danos morais) - Houve recepção adequada das partes.
Iniciou-se a sessão de conciliação. O conciliador fez uma breve declaração de abertura, mas
não pontuou todos os termos da declaração de abertura; pediu cordialidade para as partes,
para que um não interrompesse o outro, que aguardassem a vez da fala. Deu-se, então, início
a sessão. As partes dialogaram respeitosamente; estabeleceram uma comunicação não-verbal
adequada, sem interrupções.
A parte requerente expôs os fatos, onde o objetivo era indenização por danos morais por
ser importunada por uma cobrança. Adicionou que tentou, por vezes, pegar um boleto para
pagamento, pois não podia ir fisicamente ao banco, mas a instituição não enviou o boleto
nem deu outros meios para fazer o pagamento. Fez a observação, todavia não expressou seus
sentimentos corretamente: “as pessoas me atrapalhando no trabalho onde não dá pra
atender telefone, me cobrando, e liga, liga pra minha casa, liga não sei pra onde”. A parte
requerida expôs sua retórica, expôs sua necessidade e seu pedido, em que aclararam que
precisava do pagamento; logo, não poderiam indenizá-la por essa situação.
O conciliador fez o resumo do que as partes disseram, fez poucas perguntas sem
objetividade. Novamente as partes dialogaram. Não foi necessária a intervenção do
conciliador, já que as partes não estavam polarizadas. Confirmou com as partes o pedido de
cada um, porém não fez o uso da comunicação não-violenta. Encerrou-se, assim, a sessão e
a reduziu a termo. Para Rosenberg (2006, p.26), é importante que o conciliador saiba abordar
essa técnica de linguagem (CNV) para que o diálogo seja produtivo:
“À medida que mantivermos nossa atenção concentrada nessas áreas e
ajudarmos os outros a fazerem o mesmo, estabeleceremos um fluxo de
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comunicação dos dois lados, até a compaixão se manifestar naturalmente:
o que estou observando, sentindo e do que estou necessitando; o que estou
pedindo para enriquecer minha vida; o que você está observando, sentindo
e do que está necessitando; o que você está pedindo para enriquecer sua
vida”.
Sessão CCNV 5: Lide no âmbito familiar (alimentos) - As partes foram recepcionadas
devidamente. O conciliador iniciou com a declaração de abertura. “Empoderou” as partes,
porquanto estavam desacompanhadas de advogados. Esclareceu sobre o princípio da
confidencialidade, em que nada do que eles conversarem seria colocado na ata. Isso deixou
as partes bem livres para dialogarem. Pontuou, ademais, sobre as sessões individuais: que
caso houvesse alguma questão delicada, que não quisessem que o outro ouvisse, ou se ele
achasse necessário esclarecer algum ponto, poderiam solicitar a sessão individual, onde seria
resguardado o sigilo. Pediu as parte que respeitassem o momento da fala de cada um, fez um
pedido claro “a gente não vai usar “termos feios”, a gente não vai xingar (...) não vamos
entrar em situações que não tem como ser resolvidas nesse momento, a gente vai se
preocupar mais no foco que é necessidade da filha de vocês, quando a senhora terminar de
falar, a senhora vai devolver a gentiliza de se manter em silêncio, que o senhor fará durante
toda a fala dela, caso necessário o senhora anotará tudo aquilo nesse papel do que o senhor
descordou da fala dela e de maneira serena e tranquila vão responder as perguntas que
serão feitas”.
Esclareceu que eles não assumiram qualquer compromisso de fazer um acordo. Deu-se
início ao diálogo entre as partes, com uma pergunta do conciliador. A parte requerente deu
início a fala, começando com um juízo de valor, expos os sua vulnerabilidade e sentimentos
“aconteceram umas coisas desagradáveis aí, ele fala que ela não é filha dela, e isso me dói
muito, é fácil fazer filho e jogar na cara que não é, e o pior que não é só ele os amigos, a
esposa, eu passo com minha filha os amigos ficam tudo olhando com a cara feia (...) ele
nunca foi, no começo até que ele ajudou um pouco, mas depois ele não ligava mais(...) e
também pra acabar com essa palhaçada de ficar falando que não é filha dele”, a parte jorrou
a emoção (chorou) com a voz embargada, mas continuou a expor os fatos.
Para abrandar, o conciliador fez perguntas à requerente, a qual foi se acalmando aos
poucos. Passou a palavra para o requerido e fez anotações do que a requerente havia dito.
Posteriormente, deu sua versão dos fatos. Também fez perguntas para o requerido.
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A expressão não-verbal do conciliador e das partes foi adequada. O conciliador
parafraseou todo o diálogo no resumo, por meio da comunicação não-violenta.
Fez um “teste de realidade” como requerente. As partes finalizaram o acordo. Ressalta-
se que as partes não estavam polarizadas. Ao final o conciliador pontuou “que a partir disso
vocês consigam construir uma comunicação melhor que vise o bem-estar da ...(filha)”. Pediu
que as partes aguardassem a redução a termo do acordo. Logo em seguida, assinaram. O
conciliador agradeceu as partes e encerrou a sessão.
Isso confirma que se o conciliador ao declarar pontualmente sua declaração de abertura,
explicando-lhes como se desenvolve; as regras que deverão ser seguidas, deixando-as
confortáveis com o processo, evitam-se futuros questionamentos quanto ao seu
desenvolvimento, exatamente como ocorrera, (Azevedo, 2013, p.117).
Sessão CCNV 6: Lide no âmbito criminal (injúria – lesão corporal leve) – Conciliadora
recepcionou, adequadamente, as partes e não fez declaração de abertura. Não disse seu nome,
não esclareceu nada sobre o que seria a conciliação. Deu a palavra à vítima a fim de que
desse sua versão dos fatos, que estava muito tranquilo quanto ao seu relato. O suposto autor
dos fatos estava polarizado, nitidamente trêmulo, não conseguia fazer um discurso conexo
devido à sua alteração. Percebendo a polarização da parte, a conciliadora pediu que fosse
feita sessão privada (individual), esclareceu para a parte o seu papel; o que era a conciliação
em parte; fez a sugestão de um acordo. Estando sozinha com a parte (suposta vítima),
esclareceu a sugestão feita anteriormente “acordo de boa convivência”, que aceitou.
Posteriormente, fez a mesma com a outra parte (suposta autora), que não compreendeu o
procedimento e o papel dele na lide - não sabia que era suposto autor, acreditava ser a vítima-
, que foi esclarecido em parte.
Não houve interrupções, nem elogios pelo conciliador no diálogo. As partes dialogaram
sem interrupções. Houve comunicação não-verbal adequada por parte da conciliadora com
as partes, porém não foi estabelecido contato visual entre eles.
Nessa conciliação, não houve o uso da comunicação não-violenta nem das técnicas da
conciliação. Além disso, não houve resumo da conciliação nem parafraseamento do diálogo.
As partes assinaram o acordo. Porém, não houve o reestabelecimento do diálogo, o que seria
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importante, pois havia um vínculo entre eles (eram vizinhos de loja). Nada mais foi dito,
encerrou-se a conciliação.
Diante desse contexto, ficou evidente a importância da declaração de abertura, que não
houve. Por isso, deixou as partes desconfortáveis. Azevedo pontua sua importância ao dizer
que é na fase de abertura que o conciliador mostra como será sua condução no processo: deve
portar-se de forma a dar às partes o sentimento de confiança em sua pessoa; demonstrar
imparcialidade, que, ao conversar, olhe para cada uma das partes de modo equilibrado e
calmo; agir como um educador e definidor do tom, que deverá ser apresentado durante seu
desenvolvimento, (2013, p.117).
Nessa perspectiva de análise, verificou-se que as conciliações que utilizaram a
comunicação não-violenta foram a CCNV 1, 3 e 5. Ao fazer uma comparação com as demais
conciliações que não utilizaram essa técnica de linguagem, aferiu-se que as sessões, em que
houve a aplicação da técnica, foram amplamente esclarecedoras, porquanto: houve os
estabelecimento de um diálogo produtivo; até mesmo as sessões em que as partes estavam
polarizadas, como foi o caso da CCNV 3, ficou nítido a importância em conhecer essa
técnica.
Acresce-se que, nessas sessões, se apresentaram como um ambiente livre para as partes
falarem pelo caminho da compaixão, da humanidade, ou seja, atentou-se as necessidades de
cada um. A reeducação da linguagem, mesmo que momentânea, em sessão, é uma semente
que se planta para uma comunicação não-violenta. Ademais, teve-se como validação, ao
esforço que fizeram, elogios pela construção do acordo. Isso valoriza o quão é simples e
importante o diálogo sem a interferência de um estranho. Logo, é possível, futuramente, o
reestabelecimento do diálogo.
Em contrapartida, nas sessões CCNV 2, 4 e 6, não houve a aplicabilidade da técnica. Por
causa disso, o diálogo ficou aberto, amplo, sem objetividade. Muitas vezes, não houve
esclarecimento do que viria a ser a conciliação, o que retirou das partes a oportunidade de
dialogarem com maior liberdade; não houve espaço para perguntas. Foi um diálogo
improdutivo, que, embora houvesse um acordo, que foi o caso da CCNV 6, não houve o
reestabelecimento do diálogo, apesar do vínculo (parental) entre as partes.
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Logo, percebe-se que a comunicação não-violenta quando inserida durante toda a sessão
de conciliação, desde o esclarecimento do que é a sessão de conciliação, feita na declaração
de abertura, deixa claro às partes todo o procedimento. Ciente do procedimento, evita-se
desconforto ou dúvida, que geram reflexo na atitudes das partes.
Verifica-se que as sessões em que houve o uso da técnica de linguagem, tem em comum
uma aproximação maior das partes e/ou reestabelecimento do vínculo e em oposição as
sessões que em não foi utilizado a técnica temos em comum um diálogo improdutivo, sem
aproximação das partes.
Conclusão
A aplicabilidade dessa técnica deve ser constantemente aprimorada para surtir melhores
resultados. Estudar essa técnica de linguagem, além de proporcionar um ambiente produtivo,
restaurativo, ensina o conciliador a se abster do “conflito” propriamente dito; assim, aplicar
as técnicas dessa linguagem, sem o envolvimento emocional. Isso porque conduz a
neutralidade, pois sabe-se que as partes já vêm envoltas de sentimentos; por isso, não
vislumbram soluções para o conflito.
Constata-se que aplicação da linguagem não-violenta possui uma maior eficácia nas
sessões de conciliações e demonstra a satisfação do reestabelecimento da comunicação
através dessa linguagem não-violenta. Além disso, independentemente de acordo entre as
partes, é reestabelecida uma efetiva harmonização social das partes, restaurando a relação
social das partes, humanizando o processo e possibilitando que as partes sintam-se ouvidas a
partir das técnicas da comunicação não-violenta.
Os resultados da pesquisa demonstram o quão relevante é comunicação não-violenta, em
que as partes tiveram a oportunidade, através de um conciliador, de ter um diálogo
humanizado, sensível e direto. A comunicação é o meio pelo qual nos relacionamos, que vem
se desgastando ao longo dos anos, mas, que se bem colocada, pode ser bem eficaz aquilo que
se pretende obter.
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