24
Universidade Federal do Pará – UFPA Instituto de Letras e Comunicação – ILC Faculdade de Comunicação – FACOM Curso de graduação em Comunicação Social George Luiz Miranda da Silva Hojodrines Rodrigues de Lima Jobson Murilo Barbosa Marinho José Ricardo Valente Mendes Lidyane Braga Albim Maria Jessica Rodrigues de Lima Sérgio do Espírito Santo Ferreira Júnior TIPOS DE CONHECIMENTO: O Conhecimento Religioso

Conhecimento Religioso

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Conhecimento Religioso

Universidade Federal do Pará – UFPAInstituto de Letras e Comunicação – ILCFaculdade de Comunicação – FACOM

Curso de graduação em Comunicação Social

George Luiz Miranda da Silva

Hojodrines Rodrigues de Lima

Jobson Murilo Barbosa Marinho

José Ricardo Valente Mendes

Lidyane Braga Albim

Maria Jessica Rodrigues de Lima

Sérgio do Espírito Santo Ferreira Júnior

TIPOS DE CONHECIMENTO:

O Conhecimento Religioso

BELÉM/PA

2013

Page 2: Conhecimento Religioso

George Luiz Miranda

Hojodrines Rodrigues de Lima

Jobson Murilo Barbosa Marinho

José Ricardo Valente Mendes

Lidyane Braga Albim

Maria Jessica Rodrigues de Lima

Sérgio do Espírito Santo Ferreira Júnior

TIPOS DE CONHECIMENTO:

O Conhecimento Religioso

Texto apresentado à disciplina Metodologia e

Elaboração de Projetos, ministrada pela Prof.ª

Esp. Rosa Cardoso, para obtenção parcial de nota

no curso de graduação em Comunicação Social –

Habilitação em Jornalismo, da Universidade

Federal do Pará – UFPA.

BELÉM/PA

2013

Page 3: Conhecimento Religioso

Definição

Baseado em verdades consideradas indiscutíveis, o Conhecimento Religioso – ou

teológico – apóia-se em doutrinas sagradas, por terem sido reveladas pelo sobrenatural. É um

conhecimento sistemático do mundo – contém origem, significado, finalidade e destino –

como obra de um criador divino. Suas evidências não podem ser comprovadas, pois ficam

implícitas no campo da fé. Ou seja, a confiança que os indivíduos depositam no

Conhecimento Religioso torna-se um ato de fé e a visão de mundo é interpretada como

decorrente do ato de um criador divino.

Religiosidade, Sagrado e Religião

Excetuada das atividades ligadas diretamente à sobrevivência do ser humano, a

religião é uma das atividades culturais mais antigas da humanidade e existe em todas as

culturas. Isso se deve ao fato de sermos simplesmente humanos, diferentes das outras espécies

de seres da natureza e favorecidos de consciência. No entanto, o homem percebe que não é o

criador das coisas da natureza, já que esta é algo que nasce independente da ação humana.

Isso leva o indivíduo a crer em forças superiores a força humana. Daí surge a crença na(s)

divindade(s).

O homem, como ser consciente, irá descobrir a morte. O ser humano é capaz de

associar o presente com o passado e o futuro, por meio do tempo e da memória. Ou seja, ele é

consciente de que um dia nasceu e poderá desaparecer, isto é, morrer. Ainda assim, o

indivíduo não está conformado com a ideia de término com a morte e passará a pensar para

onde irá depois que morrer. Deste modo, passa a crer numa vida futura.

Como uma qualidade do indivíduo, a religiosidade é caracterizada pela disposição ou

tendência do mesmo, para prosseguir a sua própria religião ou a integrar-se às coisas sagradas.

A crença em divindades e em vida após a morte caracteriza o centro da religiosidade e nos

leva a entender a essência do sagrado.

O sagrado é a experiência da presença de um poder ou de uma força sobrenatural que

habita algum ser (planta, animal, humano) ou coisas (objetos, elementos da natureza, etc.). É

caracterizado pela prática simbólica da diferença entre os seres, superioridade de alguns sobre

outros, do poder de algum sobre outro.

Esta superioridade e poder são sentidos pelo indivíduo como espantosos, admiráveis,

misteriosos, desejáveis e temidos. O ser potente possui uma qualidade específica, que pode

Page 4: Conhecimento Religioso

ser boa ou má (pode trazer benefícios ou malefícios) e que o separa ou distingue de todos os

outros seres.

Com a sacralização há a ruptura qualitativa entre o humano e o sobrenatural, pois o ser

superior é dotado de uma força sobrehumana e o homem se julga incapaz de realizá-la.

Todavia, o sagrado faz nascer amor, devoção, ódio, admiração e respeito (como

temor). A partir daí surge o sentimento religioso e a experiência da religião. Contudo, a

religião presume a diferença entre o natural e o sobrenatural e surge para religar o “sentimento

de separação entre os humanos e o sagrado, mesmo que este habite nos humanos e na

natureza”. (CHAUÍ, 2008, p.253).

Quanto à religião, de acordo com a etmologia da palavra, significa "vínculo, ligação".

É o vínculo entre o profano e o sagrado, ou seja, a ligação entre a natureza e as divindades.

A religião é um processo relacional desenvolvido entre o homem e os poderes por ele

considerados sobrehumanos, no qual se estabelece uma dependência ou uma relação de

dependência. O ser humano irá expressar essa relação por meio de emoções como confiança e

temor, e também por meio de ações (cultos ou atividades pré-estabelecidas, rituais ou reuniões

solenes e festividades).

A maioria das religiões busca mostrar por meio de simbologia o vínculo entre o

homem e Deus. No judaísmo, por exemplo, fala-se da Arca da Aliança e do arco-íris como

símbolo e sinal, respectivamente, da aliança entre Deus (YHWH) e a humanidade.

“Por meio da sacralização e consagração, a religião cria a ideia de espaço sagrado”.

(CHAUÍ, 2008, p.254). São exemplos de locais sagrados: o céu, o monte Olimpo (Grécia), o

muro das Lamentações (Israel) e a cidade de Meca (Arábia Saudita).

A religião é a demonstração de que a consciência humana registra a sua relação com o

sobrenatural, expressando a sua convicção nos poderes que lhes são transcendentes. Esta

transcendência é tão forte que se sobressai na cultura humana.

Muitas pessoas cometem equívoco ao confundirem religião com sistema religiosos. O

sistema religioso a institucionalização da religião e do sagrado. Os templos, congregações,

igrejas e centros religiosos não são a religião, mas sim um sistema religioso, já que a religião

é um processo pessoal.

A relação do criador cósmico com a criatura deixa uma relação subentendida ao ser

humano. E é esta relação que é verdadeiramente a religião.

Aspectos do Conhecimento Religioso à Luz da Filosofia

Page 5: Conhecimento Religioso

O conhecimento religioso pressupõe muitos processos intelectivo-culturais, que se

relacionam com o desenvolvimento da percepção humana do mundo que o circunda e de si

mesmo enquanto individual e coletivo, em cuja base está a fé. E partindo dos já citados pontos

da religiosidade, do sagrado e da religião, deve-se ressaltar os aspectos componentes desse

tipo de conhecimento, bem como as suas funções sociais, pois a sua configuração abrange os

vários domínios de que se ocupa não só a religião, mas também a filosofia.

Dentre esses aspectos, o de imediata caracterização é o estabelecimento da relação

entre o homem e o divino, que se pode condensar na figura de um nume ou mesmo de forças

ou energias, cujo poder aja sobre os vários âmbitos da realidade. Mas para além da figura

divina representada ou exemplificada, uma noção importante se desenvolve para caracterizar

a natureza dessas divindades, pois, de acordo com Andrade (s/d, p. 72), a sua existência e

domínio são plenos, porque se constituem como algo absoluto, de que toda a realidade é

provinda, além de serem propiciadores da capacidade intelectiva do homem, de modo que

todo o conhecimento e sua apreensão perpassam pela intuição e inspiração divinas. Além

disso, no rito religioso e na elaboração do relacionamento com o deus, busca-se um

estreitamento entre o ser divino absoluto o espírito do homem, em uma introspecção

transcendental.

Outro ainda é o caráter que o conhecimento religioso assume, tanto em forma mística

ou mais metafísica, como oriundo da revelação ou iluminação. De modo que só é dado ao

homem conhecer a natureza, ele próprio e o deus, quando a divindade possibilita isso,

mediante alguns processos de que participa a fé. O conhecimento, portanto não vem do

exercício da racionalidade do homem, antes é fruto da manifestação divina; são verdades

dogmáticas, verdades plenas da fé, em que o homem deve crer por serem de origem superior,

pois “o que se revela é a vontade do deus, na qual o crente confia e cujos desígnios ele

cumpre” (CHAUÍ, 2012, p. 320).

As noções de forma e matéria de que o deus se constitui também são características

que fazem parte do discurso das inferências desse tipo de conhecimento, pois a relação do

homem com o exterior se molda a como o deus está inserido ou não no mundo físico. De

acordo com Chauí (2012, p 326), os objetos e seres sagrados e divinos podem ser imanentes

ou transcendentes ao mundo, à realidade que o ser humano percebe. O caráter da imanência,

muito relacionado com o panteísmo (crença apregoa a existência da divindade em toda a

natureza, que é a própria divindade), explica que as deidades são seres que se identificam com

os existentes no mundo tangível, de modo que se assemelha (não na imagem ou na aparência,

antes nos princípios regedores do universo) e subsiste neles. A transcendência divina consiste

Page 6: Conhecimento Religioso

na separação dos deuses do mundo dos humanos, pela qual eles vivem em outro, sagrado, e do

qual governam todos os homens; nesse tipo de crença, a manifestação divina ocorre segundo a

aparição do próprio deus, material ou imaterialmente, ao homem, a quem fala e propaga a sua

mensagem. A relação nesse caso é importante porque se vai operar um processo subjetivo que

é muito forte, quando o próprio deus for o emissor de um vaticínio ou palavra sacra, pois a

tendência à crença nela é potencializada.

E uma das implicações diretas desse último aspecto é a manutenção e difusão da lei

divina na religião e na sociedade. E a propósito desse processo, Chauí afirma:

“A vontade divina pode tornar-se parcialmente conhecida dos humanos sob a forma

de leis, isto é, decretos, mandamentos, ordenamentos, comandos emanados da

divindade. Assim como a ordem do mundo decorre dos decretos divinos, isto é, da

lei ordenadora à qual nenhum ser escapa, também o mundo humano está submetido

a mandamentos divinos, dos quais os mais conhecidos, na cultura ocidental, são os

Dez Mandamentos, dados por Jeová a Moisés. Também são de origem divina as

Doze Tábuas da Lei que fundaram a república romana, como eram de origem divina

as leis gregas explicitadas na Ilíada e na Odisseia de Homero, bem como nas

tragédias.” (2012, p. 321)

Assim, os muitos postulados provindos da esfera divina são decretos objeto de

reverência, temor e obediência, e são transmitidos por meio da escrita ou da oralidade,

cristalizando-se como ordenanças, promessas ou ensinamento do deus para o homem,

passando a integrar o ideário religioso coletivo.

A partir da análise desses aspectos, cabe explanar, ainda que rapidamente, a respeito

das funções que se encontram no conhecimento religioso, que são os processos que advêm da

mistificação do mundo e da simbolização, inerentes à religião, é possível destacar, de acordo

com Chauí (2012, p. 328), as seguintes funções que essa espécie de conhecimento possui: a da

explicação das origens e da realidade, pois um dos seus propósitos primeiros é de clarificar

como se originou tudo, desde os deuses, perpassando pela natureza, até os sentimentos do

homem, mediante a ação sobrenatural do absoluto, que rege e ordena a realidade; a

justificação da ordem estabelecida entre os homens, pois também irá propor valores que

vigerão no meio social, além de estabelecer normas para a vida moral do homem e legitimar a

hierarquização social, por meio da afirmação da existência de hierarquia das criaturas e das

instituições; além do fornecimento de perspectivas de vida após a morte, sendo esse um fator

demasiado relevante, pois vai dar sentido ajudar a superar o tabu da morte, fornecendo como

Page 7: Conhecimento Religioso

que um consolo aos adoradores do deus, pois lhes possibilita viver no mesmo plano e estado

da deidade ou ainda a libertação das penas terrenas.

De fato todas essas asserções são inerentes tanto ao rito quanto aos sentimentos e

convicções envolvidos da religião. E todas elas têm uma natureza metafísica, ainda que não se

caracterize como tal, bastante forte, de que se pode aprender, conforma a afirmação, que,

“como doutrinas práticas, fundamentadas na revelação, os dogmas religiosos cuidam de dar

explicações adequadas aos problemas de ordem metafísica suscitados no homem a respeito da

essência da natureza e da significação da existência” (ANDRADE, s/d, p. 84). Pretende, pois,

essa modalidade de conhecimento uma reelaboração da realidade e das relações entre os entes

que a compõem, buscando no divinal os pressupostos com os quais se elucidem e por meio do

qual se dissipem todas as dúvidas e incertezas que o homem nutre em seu espírito.

Religião e Mitologia

Alguns usam os termos mito e mitologia para ilustrar histórias de uma ou mais

religiões como algo falso ou duvidoso. Enquanto quase todos os dicionários incluem essa

definição, mito nem sempre significa que uma história é falsa, tampouco verdadeira. O termo

é constantemente utilizado nesse sentido de descrever religiões criadas pelas sociedades

antigas, cujos ritos estão quase extintos. Muitas pessoas não consideram as histórias sobre a

origem e acontecidos, como contadores de mitos; eles veem seus textos sagrados como

possuindo verdades religiosas, inspiradas divinamente, mas não repassadas em linguagens

humanas. Outros separam suas crenças de histórias similares de outras culturas e se referem a

estas como história. Essas pessoas se opõem ao uso da palavra “mito” para descrever suas

crenças.

Para o propósito desse texto, a palavra mitologia é usada para se referir a histórias,

que, enquanto podem ou não serem factuais, revelam verdades fundamentais e pensamentos

sobre a natureza humana, através do frequente uso de arquétipos. Também é necessário frisar

que as histórias discutidas expressam pontos de vista e crenças de um país, um período no

tempo, cultura e/ou religião a qual lhes deu à luz. Uma pessoa pode falar de mitologia judaica,

mitologia cristã ou mesmo mitologia islâmica, cada uma descrevendo os elementos míticos

nessas religiões, sem se referir à veracidade sobre a sua história.

Podemos então concordar que a religião, enquanto um sistema que institui uma relação

com o divino, que liga a humanidade e a divindade, acaba por se transformar numa instituição

que regula o modo como o homem utiliza o sagrado para se aproximar (ou não) do divino.

Page 8: Conhecimento Religioso

A mitologia, naturalmente, refere o conjunto dos mitos, unidos por uma cultura. A que

nos interessa é a "cultura religiosa" ou a "cultura da divindade", se é que lhe podemos dar esse

nome. Interessam-nos os mitos religiosos que respondem a questões fundamentais da

existência humana e da realidade, dando uma razão aos porquês, enquanto define os cosmos.

Assim, temos os mitos religiosos dos gregos e, por semelhança, dos romanos unidos na

mitologia greco-romana, mesmo sabendo que, a partir de certa data, esses mitos passaram a

ser encarados não como expressão religiosa, mas como expressão de verdades transmitidas

através de aventuras fantásticas, tradicionalmente associadas a deuses. Temos também a

mitologia nórdica, ameríndia, maia ou aborígene, entre muitas outras, cujos mitos revelam o

pensamento religioso e cultural. E temos a mitologia judaico-cristã, onde o mito surge

frequentemente como ponto de fé, como se não fosse a Bíblia a detentora da verdade

histórica.

Na verdade, os mitos religiosos surgem frequentemente nas mitologias em diferentes

seções, de acordo com a sua temática. De um modo muito geral, podemos encontrar três tipos

de mitos religiosos, respondendo a diferentes questões: mitos sobre um ou mais deuses; mitos

sobre o mundo; mitos sobre o homem.

Com estes três tipos de mitos, a mitologia religiosa de uma comunidade consegue

explicar não só a existência do mundo e do homem, como o seu aspecto, as corretas relações

entre os seres (ou pelo menos a razão das atuais relações), a diferença entre o Bem e o Mal

(ou entre o moral e imoral), as relações a estabelecer com os deuses e as suas consequências.

As cerimônias religiosas, também chamadas de ritos, seguem determinadas regras, um

padrão de ações, a que se chama ritual. E o conjunto destes ritos, no seu padrão ritual, é

chamado de culto, palavra cuja origem latina, cultivare, significa cultivar, tanto os campos

como o espírito. E o culto, com as sua cerimônias rituais, reflete a tradição e os costumes.

Conhecimento Religioso e Arte

A arte como conhecemos hoje teve seus primórdios influenciados pela religião.

Surgida de um processo que nasceu no interior dos cultos e para servi-los, passou pela criação

da linguagem, a instituição do trabalho e da própria religião, a sociabilização através da vida

em comunidade, o estabelecimento do poder religioso como autoridade, a sacralização e a

ritualização da vida (nascer, morrer / plantar, colher, etc.).

Instituída na forma mecânica (artesanato, agricultura, costura), a arte posteriormente

tornou-se um elemento de culto. Pinturas, esculturas, danças e músicas eram chamadas

Page 9: Conhecimento Religioso

fetiches, sendo vistas como a encarnação dos próprios deuses nelas, e os artistas, chamados

feiticeiros por as manipularem.

Nesse contexto, o artista ou artífice, artesão, não possuía vontade própria para produzir

suas artes, pois elas estavam inseridas no ritual de culto aos deuses e, portanto, eram

determinadas pelas autoridades religiosas.

Além disso, recebiam educação especial para serem iniciados nas técnicas e segredos

das artes com o intuito de torná-los mais que fabricantes de objetos para o culto, mas,

também, oficiantes dele, já que a matéria-prima e a ciência de como usá-los provinha dos

deuses e era um dom humano usado para eles.

Tempos depois, mesmo com a desvinculação de um trabalho do outro, o detentor da

autoridade religiosa somente realizava as cerimônias (cultos), os artistas e suas artes ainda

serviam a religião através da criação e produção de joias, vestuários, templos, catedrais,

estátuas, gravuras, etc., encomendados pelos oficiantes dos cultos. E, esses estabeleciam as

regras para a fabricação, forma e cor, de tudo.

Séculos mais tarde, a arte conseguiu a autonomia da religião, mas, passou a submeter-

se á autoridade política que encomendava dos artistas edifícios, mobiliários, joias, entre

outros.

Só aconteceu uma real autonomia das artes da religião e da política, quando o modo de

produção capitalista interveio nas relações existentes até então, tornando-as laicas e jogando-

as no mercado. Assim, depois de desvencilhada do valor de culto e da autoridade política, a

arte foi aprisionada pelo valor de mercado.

Religião na contemporaneidade: os meios de comunicação como púlpito para a difusão

do conhecimento religioso

Contrariando a racionalidade a respeito do sobrenatural proveniente do iluminismo,

vemos que na pós-modernidade as questões relativas à espiritualidade continuam a repercutir,

por exemplo, por meio dos best sellers com personagens angélicos ou diabólicos ou pela

mídia que exibe diferentes religiões buscando responder às dúvidas da sociedade acerca do

mundo espiritual.

Porém, ainda que no século XXI as questões acerca do sobrenatural continuem a ser

debatidas, a religião na pós-modernidade teve a sua incumbência de explicar o mundo

descaracterizada. Agora diversas instituições com diferentes explicações de mundo coexistem

numa mesma sociedade, e o indivíduo adere àquela que mais corresponde aos seus anseios

Page 10: Conhecimento Religioso

particulares. Como explica o filósofo e mestre em Ciência da Religião Luther King Santana:

“Com o fim da função da religião como ordenadora do cosmos, entramos numa situação de

pluralismo onde todas as instituições podem explicar e fundamentar a realidade”

(SANTANA, 2005 p. 54). Assim, a religião na pós-modernidade responde às necessidades

individuais, e não mais a explicações genéricas orientadas a toda a sociedade.

Em meio a esse pluralismo de instituições (religiosas ou não) que podem elucidar a

compreensão das coisas ou mesmo do sobrenatural, as religiões passam a utilizar os meios de

comunicação para divulgar o conhecimento religioso, muitas vezes usando estratégias de

persuasão e marketing tal como uma empresa que busca vender um produto.

Para melhor exemplificar essa relação entre mídia e difusão do conhecimento religioso

na pós-modernidade, usarei como exemplo o segmento cristão no Brasil, em especial o

evangélico, nas suas relações com os sistemas de telecomunicação (rádio e televisão).

O início das transmissões de programas evangélicos no Brasil se deu em 1940, e a

Igreja Adventista do Sétimo Dia foi a pioneira a nível nacional, transmitindo no rádio o

programa A voz da profecia. Nas décadas posteriores, a difusão midiática do segmento

evangélico se fortaleceu ainda mais. Alguns fatores podem ser citados como facilitadores

desse fortalecimento da participação evangélica na mídia, como: 1) o fim da ditadura militar,

que abriu espaço para bancadas evangélicas no governo e facilitou a concessão de canais de

rádio e TV para esses grupos; 2) o fortalecimento da TV, que se tornou um dos maiores

veículos de comunicação do país; 3) A substituição dos programas religiosos importados dos

EUA por programas nacionais e 4) O aumento da população evangélica no Brasil, o que

justificou um aumento de mídia especializada para este grupo.

Assim, a difusão do conhecimento religioso ganha maiores proporções, não mais se

limitando às paredes do templo religioso, mas entrando nos lares da audiência através dos

meios de comunicação de massa, especialmente o rádio e a televisão. Como explica Sidnei

Budke:

“De fato, as inúmeras expressões de fé atuantes no Brasil transparecem não se

contentar mais com suas reuniões, missas e cultos semanais, enfim, encontros

restritos aos seus membros. A pós-modernidade, juntamente com o avanço da

tecnologia, aponta a mídia como o caminho de sucesso para qualquer mercado,

empreendimento e programação” (BUDKE, 2005 p. 44)

Page 11: Conhecimento Religioso

Para ter uma ideia do tamanho da difusão de mensagens religiosas que a mídia

proporciona, podemos usar as estatísticas. Segundo o Ibope, os níveis de audiência dos

programas religiosos, apesar de distantes dos níveis atingidos pelas novelas exibidas em

horário nobre na Rede Globo, alcançam uma parcela de público fiel e considerável. Um

programa como o Show da fé, exibido em horário nobre na Rede Bandeirantes, já chegou à

audiência de 320 mil aparelhos eletrônicos recebendo o sinal. No caso da Igreja Internacional

da Graça de Deus (responsável pelo programa Show da fé), esse número corresponde a 20

vezes mais pessoas em relação ao número de frequentadores dos seus templos (BUDKE, 2005

p. 49). Assim, a mídia se configura como um novo púlpito para a difusão do conhecimento

teológico.

A princípio, as religiões usavam os suportes midiáticos com o único propósito de

transmitir a sua espiritualidade ao público. Porém, com o passar do tempo, o foco vai

mudando da transmissão de um credo para ocupar-se também de fatores mercadológicos

como a audiência, o número de adeptos à mensagem pregada e o estimulo ao consumo de

bens simbólicos e materiais produzidos pelas redes de comunicação religiosas.

Essa lógica voltada ao mercado traz á linguagem e estrutura das religiões na pós-

modernidade um caráter mais empresarial. Os meios de comunicações são usados não só para

conseguir a adesão de fiéis, mas também para conseguir clientes.

Além de denominações, líderes religiosos e igrejas autônomas, surgem também no

“mercado” religioso as chamadas Mídias Empresarial-Religiosas (MER’s), que se situam na

interseção entre os campos empresarial e o religioso. Usando estratégias de marketing, as

MER’s produzem bens simbólicos que visam atender aos interesses e necessidades

individuais da audiência. Esses bens são direcionados não a uma denominação religiosa

específica, mas a todas que compartilham de pensamentos e linguagens semelhantes.

A exemplo dos evangélicos, é comum que a linguagem empregada no conteúdo de

produtos como CDs, livros, DVDs, programas de rádio e TV não seja identificada como de

uma denominação específica, mas de todas as denominações que se proclamam como

protestantes. Essa linguagem que identifica os produtos advindos da mídia evangélica como

comuns a todos os protestantes, também é genérica o suficiente para abarcar as necessidades

individuais do público com mensagens que se aplicam quase que igualmente a uma grande

parcela dos fiéis.

Diante do exposto, percebe-se que a mídia tem um papel importante para a

compreensão da difusão do conhecimento religioso na pós-modernidade, bem como das

consequências dessa difusão em campos sociais como o econômico e o político.

Page 12: Conhecimento Religioso

Religião na contemporaneidade: conhecimento religioso e política

A Constituição Brasileira de 1988 é clara quanto à laicidade do Estado que impede (ao

menos na teoria) o beneficiamento de credos religiosos, sem exceção. Pode-se observar o Art.

19.

Art. 19. É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I - estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o

funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência

ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público;

(BRASIL, 1988)

Em tese, seria a garantia de neutralidade do Estado brasileiro quanto aos aspectos de

cunho religioso. No entanto, é cada vez mais presente a influência das religiões nas decisões

do governo, em especial os pentecostais e evangélicos, cuja denominação abarca pentecostais

e protestantes históricos. O sociólogo Ricardo Mariano, da Pontifícia Universidade Católica

do Rio grande do Sul (PUC-RS), durante o 34º Encontro Anual da Associação Nacional de

Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), realizado na cidade de Caxambu-

MG, no período de 25 a 29 de outubro de 2010, defendeu que a democracia do país deve

“levar em consideração a participação e presença desses grupos (eleitorado pentecostal) na

política partidária nacional, nas alianças e barganhas que fazem com candidatos, partidos e

governantes”.

Ele defende que a participação recente e crescente de religiosos na política

(especifique-se aqui os pentecostais) é fruto dos boatos de que a Igreja Católica limitaria a

liberdade religiosa ante a Assembleia Constituinte, em 1986, o que justificou o apoio destes

grupos ao Estado laico.

Há de se destacar que alguns artigos da Constituição refletem a influência da religião

nas leis brasileiras. Eis alguns exemplos:

Art. 5º

(...) VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o

livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos

locais de culto e a suas liturgias;

Page 13: Conhecimento Religioso

VII - é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas

entidades civis e militares de internação coletiva;

VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de

convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação

legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;

Art. 210. ...

§ 1º - O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários

normais das escolas públicas de ensino fundamental.

Art. 226. ...

(...) § 2º - O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei. (BRASIL, 1988)

Alguns casos recentes comprovam a grande influência que exercem sobre o Estado. A

Igreja Católica conseguiu junto ao governo brasileiro a concessão de facilidades de visto para

a entrada de mais de um milhão de jovens, oriundos de 158 países, para entrar no Brasil sem

nenhum gasto nos dias 23 a 28 de julho deste ano, visando a participação na Jornada Mundial

da Juventude (JMC). Segundo a Igreja, a iniciativa fomentará o turismo no país.

A CNBB (Confederação Nacional dos Bispos do Brasil) tentou inserir o presidente do

Tribunal de Justiça do Espírito Santo, Pedro Feu Rosa, no Supremo Tribunal Federal, para

ocupar a vaga deixada pelo ministro aposentado Ayres Britto. A intenção foi defender os

interesses da bancada religiosa por conta das decisões do STF quanto à aprovação da união

estável de casal gay e o aborto de fetos anencéfalos, cujos princípios vão de encontro aos

seus.

Há um terceiro exemplo a ser citado: a distribuição do Kit Anti-homofobia, criado por

ONGs pró-gays a pedido do Ministério da Educação (MEC). Ele continha cartilhas, posteres e

vídeos sobre homossexualismo. O Ministro da Educação, Fernando Haddad, chegou a

programar o inicio da distribuição nas escolas para o segundo semestre de 2011, apesar de não

ter sido aprovado por todas as comissões por conta de acusações de que o kit faria apologia à

homossexualidade ao invés de prevenir a homofobia. Por conta das pressões exercidas pela

bancada evangélica, que envolveu ameaças e protestos, a Presidenta Dilma Rousseff proibiu a

entrega do material. Dentre as sanções contra o governo, pode-se mencionar: a saída do

Page 14: Conhecimento Religioso

Ministro da Educação; CPI para apurar denúncias de irregularidades no MEC; e a obstrução

de todas as votações do plenário.

Quando houve eleições para Presidente da República em 2010, a pesquisa elaborada

pelo Datafolha mostrou que os pentecostais apoiaram muito mais o candidato do PSDB José

Serra em comparação à candidata eleita do PT Dilma Rousseff. Uma das considerações

apontadas pelo sociólogo Ricardo Mariano é a insatisfação daquele grupo em relação ao ex-

presidente Luís Inácio Lula da Silva, por este ter tido iniciativas como o plano nacional contra

a homofobia.

Page 15: Conhecimento Religioso

Referências

ANDRADE, Primo Nunes de. Filosofia e religião. In: Perspectiva filosófica e visão cosmológica: nos confins da Filosofia com a Religião e a Ciência. Primo Nunes de Andrade. Rio de Janeiro: Distribuidora Record. s/d.

BUDKE, Sidnei. Mídia e Religião: Das peregrinações ao universo das telecomunicações. Revista Eletrônica do Núcleo de Estudos e Pesquisa do Protestantismo (NEPP) da Escola Superior de Teologia. Volume 08, set.-dez. de 2005/ p. 43-56. <Disponível em: http://www3.est.edu.br/nepp/revista/008/ano04n3_03.pdf>

CHAUÍ, Marilena. A experiência do sagrado e a instituição da religião. In Convite à Filosofia. Marilena Chauí. 14ª ed. São Paulo: Editora Ática. 2012.

CHAUÍ, Marilena. O universo das artes. In Convite à Filosofia. Marilena Chauí. São Paulo: Editora Ática. 2008.

GONÇALO, Cláudio Manoel Nascimento; ALMEIDA, Davi Silva. A religião, a religiosidade e os sistemas religiosos. Disponível em: <http://www.ipepe.com.br/idebab.html>

SANTANA, Luther King de Andrade. Religião e Mercado: A Mídia Empresarial-Religiosa. Revista de estudos da Religião (REVER) N° 1/ p. 54-67. São Paulo: PUC, 2005. Disponível em: <http://www.pucsp.br/rever/rv1_2005/p_santana.pdf>

TERESA, Sara. A Religião, o Mito e a Mitologia. Disponível em: <http://criarmundos.do.sapo.pt/Mitologia/pesquisareligiomito002.html>