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Cultura · de assas no Século

Cultura de Massas no século XX - Edgar Morin

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Cultura de Massas no século XX - Edgar Morin

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  • Cultura de assas no Sculo

    ~{~ost

  • 9 edio/4" reimpresso - 2007

    Traduzido de: L'Esprit du Temps

    Copyright 1962, by Editions Bernard Grasset

    CIP-Brasil. Catalogao-nu-fonte Sindicnto Nacional

  • SUMRIO

    Prefcio Terceira Edio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7

    PRIMEIRA PARTE: A INTEGRAAO CULTURAL

    I. UM TERCEIRO PROBLEMA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13 II. A INDSTRIA CULTURAL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22

    III. O GRANDE PBLICO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35 IV. A ARTE E A MDIA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48 V. O GRANDE CRACKING . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53

    VI. UMA CULTURA DE LAZER . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67 VII. OS CAMPOS ESTTICOS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77

    SEGUNDA PARTE: UMA MITOLOGIA MODERNA

    VIII. SIMPATIA E HAPPY END . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 91 IX. OS VASOS COMUNICANTES . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 98 X . OS OLIMPIANOS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 105

    XI. O REVLVER . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 110 XII. O EROS QUOTIDIANO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 119

    XIII. A FELICIDADE . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 125 XIV. O AMOR . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 131 XV. A PROMOAO DOS VALORES FEMININOS .. . .... 139

    XVI. JUVENTUDE . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 147 XVII. A CULTURA PLANETRIA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 158

    XVIII. O ESPRITO DO TEMPO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 166

    INTRODUO A BIBLIOGRAFIA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 185

    J>rimeira parte: A CULTURA DE MASSA . . . . . . . . . . . . . . . . . . 188

    Segunda parte: AS COMUNICAES DE MASSA . . . . . . . . . . . 198

  • NOTA DO TRADUTOR

    Ao fazer a traduo procurei escolher as expresses que melhor traduzissem o pensamento do autor, mas mantive; na medida do poss-vel, as particularidades de seu estilo. Assim, algumas palavras apa-recem em portugus com uma forma, primeira vista, inadequada. Isso s se verifica nos casos em que a preservao da irregularidade no prejudica a compreenso do texto. o caso, por exemplo, de fantomatiqll e - traduzido por fantasmtico - palavra imxistente tanto em francs quanto em portugus. Muitos p 2rguntaro p::ir que no empreguei o termo fantasmagrico e a esses respondo que se fosse essa a inteno do autor, ele teria usado em francs a palavra fa nt.asmagorique, de uso corrente no idioma.

  • Neurose: meio termo entre um distrbio da mente e a realidade, concesso a que uma pessoa se acomoda, em troca de um fantasma, um mito ou um rito.

    PREF CIO TERCEIRA EDIO Este livro, escrito em 1960/1, apareceu em 1962. Nada teria que suprimir, e muito que acrescentar. Efetivamente, os anos de 60 foram marcados por uma

    transformao da configurao cultural nas nossas socie-dades, que, obviamente, afeta a cultura de massas:

    Efetivamente, muitas das caractersticas que assinalei neste livro ainda persistem hoje. Mas o "esprito do tempo" j outro.

    O eixo da cultura de mliLssas deslocou-se. Seu campo ampliou-se, penetrando cada vez mais intimamente na vida cotidiana, no lar, no casal, na famlia, na casa, no auto-mvel, nas frias. A mitologia da felicidade tornou-se a problemtica da felicidade. Traos e focos de "contracul-tura", e mesmo de "revoluo cultural" formaram-se no underground, margem da cultura de consumo, porm tambm penetrando-a, irrigando-a. A cultura de massas tende, a um tempo, a deslocar-se e a integrar ("recuperar", como se diz) as correntes desintegradoras.

    A maior parte dos meus estudos de "sociologia do pre-sente", de 1963 a 1973, tem relao com essas transfor-maes. Do aparecimento de uma nova "subcultura" juve-nil (o j;e-ye-ye) aos impulsos californianos de uma "revo-luo cultural" ocidental, passando pelas revoltas de estu-dantes. Da "promoo dos valores femininos" "nova feminilidade" e ao "novo feminismo". Do neo-arcasmo e

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  • do novo naturismo s "utopias concretas'', dos clubes de frias e do movimento ecolgico, Dos .obstculos e das dificuldades opostas ao bem-estar aos sintomas de uma crise em profundidade da civilizao burguesa.

    Ao passo que a sociologia oficial acreditava trabalhar no solo cada vez mais .slido da "sociedade industrial'', eu me tornava cada vez mais sensvel s presses dos ciclo-nes que se formav.m sombra. O que era desprezado como epifenmenos aberrantes ou ridculos representava, para mim, desvios geradores de novas tendncias. Onde se viam fogos de palha, enxergava eu erupes que revela-vam desestruturaes em profundidade no ncleo cultural de nossas sociedades.

    No tenho por que me envergonhar do que escrevi em 1962, em um texto publicado em 19651 : "Sem dvida, prepara-se uma crise gigantesca, crise de fundo do indi-vidualismo burgus, crise da civilizao: o beatnik j de-nuncia, em sua recusa voluntria da eomodidade norte-americana, a inquietao que lhe causa o bem-estar; a expresso d-Olce. vita j se tornou para os abastados sin-nimo de desolao". E, em 1966, lia-se, no final de um estudo da comuna de Plodemet2:

    "Ser que se vero aparecer as dificuldades do bem-estar, ignoradas por um povo que apenas chegou aos pri-meiros estgios de uma conquista, que ainda conhece as dificuldades do desconforto e a lembrana das- antigas servides?

    "Ser que se vero aparecer as dificuldades da vida privada e a irrupo dos problemas do casal, problemas que so silenciados ou escondidos onde quer que surjam?

    "Ser que se alargar o vazio que j aflora entre os jovens no lazer e at durante as frias?

    "Ser que se ver o mpeto martirizante de inquietu-des que hoje em dia apenas se entremostram e so trans-feridos a um futuro indeterminado ou a um cogumelo atmico?

    "Ser R.Ue s assistir a um impulso mais ardente para a esponta~eidade, a alegria, a plenitude, outrora circuns-

    1 Introduo a uma poltica do Homem, Le Seuil, 1965. 2 Comuna na Frana: A Metamorfose de.Plodemet, Fayard, 1967.

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  • critas s festas e que hoje se insinuam timidamente nos divertimentos e nas frias?

    "Veremos a crise? A muda? O fim da civilizao bur-guesa?

    A partir de agora, os novos fermentos culturais esto ' operando e em seu lugar. Entramos em uma poca em que se tornou bastante claro que a cultura se coloca em termos problemticos.

    Assim, a este volume se segue um segundo tomo, no qual esto articulados e integrado& meus estudos dos anos 62/73.

    E.M. Abril de 1974

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  • PRIMEIRA PARTE

    A INTEGRAO CULTURAL

  • 1 Um Terceiro Problema

    No comeo do sculo XX, o poder industrial estendeu-se por todo o globo terrestre. A colonizao da Africa, a dominao da Asia chegam a seu apogeu. Eis que comea nas feiras de amostras e mquinas de niqueis a segunda industrializao: a que se processa nas imagens e nos sonhos. A segunda colonizao, no mais horizontal, mas desta vez vertical, penetra na grande reserva que a alma humana. A alma a nova Africa que comea a agitar os circuitos dos cinemas. Cinqenta anos m,ais tarde um prodigioso sistema nervoso se . constituiu n grande corpo planetrio: as ~palavras e imagens saam aos oo,rbotes dos teletipos, das rotativas, das pelculas, das fitas ma._g-nticas, d as antenas de- rdio e de televiso; tf qe _roda, navega, voa, transporta jorriafs 'e revistas; no h uma mofcul' de"'ar~g~e no' vibre com as mensagens qe um aparelho ,ou um gesto tornam logo audveis e visveis.

    A segunda indstrializao, que passa a ser a indus-trializao do esprito, e a segunda colonizao que passa a dizer respeito alma progridem no decorrer do sculo XX. Atravs delas, opera-se esse progresso ininterrupto da tcnica, no mais unicamente votado organizao ex-terior, mas penetrando no domnio interior do homem e a derramando mercadorias culturais. No h dvida de qu j o livro, o ]ornai :ran-; rtiercdorias-;- mas a cultura e a vida pr~V:-da nu'ca- haviam ~entrado - "'"' ta!Pnfo~no

    "E"fl'- . -- - '91--........ ~ .... ~,~..., ~ ....,.,. :;r. . :..-...' .......... _ ..,.,.._, circmto comercial e industriai-, -nurrea os murmrms- do

    mnd-~_:- antigamen'te suspiros de fantasmas, cochichos de fadas, anes e duendes, palavras de gnios e de deuses, hoje em dia msicas, palavras, filmes levados atravs de ondas - no haviam sido ao mesmo tempo fabricados in-dustrialmente e vendidos comercialmente. Essas noyas

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  • mercadorias so as mais humanas d~ todas, po~- vedem a vrejo os e9tplasmas de , hum~idad_e, _ os amores e os md.os _romanceados, os fatos variados do corao e da alma. "'.-,.;.

    Os problemas colocados por essa estranha noosfera, que flutua na corrente da civilizao, se encontram entre os terceiros problemas que emergem no meio do sculo XX. Estes passam rapidamente da periferia para o centro das interrogaes contemporneas. No se deixam reduzir s respostas j prontas. S podem ser levantados por um pensamento em movimento. esse o caso daquilo que pode ser considerado como uma Terceira'Clfr7' rhmda: da

    iIEP~~~~-, ciologia americana-detecta, reconhece a Terceira Cultura e a domina: mass culture.

    Cultura de mssa, isto , produzida segundo as normas macias da fabricao industrial; propaganda pelas tc-nicas c:ie difuso macia (que um estranho neologismo anglo-latino chama de mass media); destinando-se a uma -~ massa social, isto , um aglomerado gigantesco de indiv-

    )' duas compreendidos aqum e alm das estruturas internas ! da sociedade (classes, famlia, etc.). \ _ O termo cultura de massa, como os termos sociedade

    industrial ou sociedade de massa (mass-society) do qual ele o equivalente cultural, privilegia excessivamente um dos ncleos da vda social; as sociedades modernas podem ser consideradas no s industriais e macias, mas tam-bm tcnicas, burocrticas, capitalistas, de classes, burgue-sas, individualistas ... A noo de massa a priori dema-siadamente limitada.

    A noo de cultura pode parecer a priori demasiada-mente extensa, se a tomarmos no sentido prprio, etno-grfico e histrico, muito nobre se a tomarmos no sentido derivado e requintado do humanismo cultivado.

    Uma cultura_ orienta, desenvolve, domestica certas vir-tualidades humanas, mas inibe mi probe outras. H r-;tos de cultura que sao universais-,c omo' a proibio do incesto, mas as regras e as modalidades desta proibio diferen-ciam-se segundo as culturas. Em outras palavras, h, de

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  • um lado, uma "cultura" que define, em relao natu-reza, as qualidades propriamente humanas do ser biol-gico chamado homem, e, de outro lado, culturas parti-culares segundo as pocas e as sociedades.

    Podemos adiantar que uma cUwa cons.titui~ll!Il cor-p~ ~C:~~P.1~xo~ 4~,-~_g:r,pi~~~- ~H,!19~19~, fl"i~os e_ P?~gens, que penetram o md1v1duo em sua mtinndade, estruturam os instintos; orientam as""emoeS.'Esi l>erittao 's. efetua segiid; tro'cs" mntars~tl=projeo e de identificao po-larizadas nos smbolos, mitos e imagens da cultura como nas personalidades mticas ou reais que encarnam os va-lores (os ancestrais, os heris, os deuses). Uma cultura fornece pontos de apoio imaginrios vida prtica, pontos de apoio praticas vida imaginria; ela alimenta o ser semi-rel, semi-imaginrio, que cada um secreta no inte-rior 4El.).! (~E.~~}LmaL 9 . Se! semi-real, semi-imaginrio que cada um secreta no exterior .e sr e no qual se. envolve (sua Q~t@!iade).

    Assim, R cultura nacional, desde a escola, nos imerge nas experincias mtico-vividas do passado, ligando-nos por relaes de identificao e projeo aos heris da ptria (Vercingetrix, Jeanne D'Arc), os quais tambm se identi-ficam com o grande corpo invisvel, mas vivo, que atravs dos sculos de provaes e vitrias assume a figura ma-terna (a Me-Ptria, a quem devemos amor) . e paterna (o Estado, a quem devemos obedincia) . A cultura reli-giosa se baseia na identificao com o deus que salva, e com a grande comunidade maternal-paternal que cons-titui a Igreja. Mais sutilmente, ou antes, de modo mais difuso, a cultura humanista procura um saber e uma sen-sibilidade, um sistema de atitudes afetivas e intelectuais, por meio do , comrcio das obras literrias, em que os heris do teatro e do romance, as efuses subjetivas dos poetas e das reflexes dos moralistas desempenham, de modo atenuado, o papel de heris das antigas mitologias e de sbios das antigas sociedades.

    Como veremos, a cult.ura de massa . uma cultura : ela ,.,, __ ..,~~-~~ --:- _.~ 'i,~ ..,_;;, ~~~~-...:~.,...;:: - ~

    consJituium corpo .de. sinbolo~.JP,itos _e_ Imagens _cnce"t-nentii~i' vida=p:fti"'~"vci'im~gi!j"ria : 'ffi"'"sit~m-de -

    -"'::; "'':vr.~p;/:.,','!:

  • cultura nacional, cultUra humanista, cultura religiosa, e entra em concorrncia com estas culturas.

    As soci~dades mQdexnas so p

  • \!!','

    OsjE,teleqtuJti~~ atiI_an:i ~' cu!tura de n:ass~~ no~ J_nfer-nos infraculturais. Uma atitude "humanista""' deplora a invaso dos stibp rodutos culturais da indstria moderna, dos subprodutos industriais da cultura moderna. Uma ati-tude de direita tende a consider-la como divertimento de ilotas, barbarismo plebeu. Foi a partir da vulgata marxista que se delineou uma crtica de "esquerda", que considera a cultura de massa como barbitrico (o novo pio do povo) ou mistificao deliberada (o capitalismo desvia as massas de seus verdadeiros problemas)~Mas profunda-menfe mr'kst~ a cr tica da 'nova alienao da civiliza-o burguesa: na falsa cultura a alienao do homem no se restringe apenas ao trabalho, mas atinge o consumo e os lazeres. Eu tornarei a tratar desses temas, claro, mas gostaria, primeiramente, de observar aqui que, por mais diferentes que sejam as origens dos desprezos humanistas , de direita e esquerda, a cultura de massa considerada como mer_adoria culfural _ordinria, feia, ou, como se diz nos Estados Uq!dos :"'_lf,.il !i.!Jl:. Pond,o. enJ_r,e" J21i~pts~~,s1ualquer juzo de v aJor, pfj~ms diagp.osticar uma resistncia glob'aC'Cia ""cfss..-nteietlii'' " ~ufva~da". =-~----

    !.'3"- ~~ " '"'"'i''""~ :;...-.- .~ -"""' ........ :., .. '"-No so os intelectuais que faze m essa cultura; os

    primeiros autores de filmes eram estrangeiros, os jornais se desenvolveram fora das esferas gloriosas da criao literria; rdio e televiso foram o refgio dos jornalistas ou comediantes fracassados. certo que progressivamente os intelectuais foram atrados, chamados, para as salas de redao, os estdios de rdio, os escritrios dos pro-dutores de filmes. Muitos encontraram a uma profisso. Mas estes intelectuais so empregados pela indstria cul-tural. S realizam por acaso, ou aps lutas extenuantes, os projetos que trazem em si. E!U c;:i,sos.:,:~tremos,_ o lutor separado de sua illr_a: esta no malS su bra. A cria-

    - w~~~ --.., .... ~ - 1~---~ .:..-- ~- - """"' - ,.,.,_ ~u-OO es:i;nagdf- ~~a =m:~l!O: Stroheim, Welles, vni-dos, so rejeitados pelo sistema, uma vez que no se dobram.

    A inteligentsia lite.rria despojada peio advento de um mundo cultur a n=qual a criao deslocada. Pro-testa tanto mais contra a industrializao do esprito quan-to participa, parcialmente em pequena escala, desta in-dustrializao.

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  • No s de uma espolia.o g_ue sofre a inteligentsia. lf: toda .uma concepo da cultura~ -da arte~que "'achinc -lhada pela interVeiio das tcnicas industriais, -cm pela determinao mercantil e a orientao consumidora da GUltura de massa. . ..

    Ao mecenarismo sucede o mercenarismo. O capitalis-mo instala suas sucursais no corao da grande reserva cultural. A reao da inteligentsia tamg.m uma reao contra o imperialismo do capital e o re,ifo lo lucro.

    Enfim, a orientao consumidora destri a autonomia e a hierarquia esttica prprias da cultura cultivada . .:,:N?

    ~~:~~~a:~~ !.!!~ffe~.~-~~~ -~~~ des.,co11Ji~11Ldft5te el)tr~ ~- -~~.~ ',;;""N~m retirada solitria, nem ritos cerimoniais opem

    . a cultura de massa vida quotidiana. Ela consumida no decorrer das horas .. Os valores artsticos. no se diferen-ciam qualitativamente no seio do consumo corrente : os jukebox oferecem ao mesmo tempo Armstrong e Brenda Lee, Brassens e Dalida, as lengalengas e as melodias. En-contramos o mesmo ecletismo no rdio, na televiso e no cinema. Este universo pQ._ govern~do, regulauientaP.o

    ...,_,~,,.:.: - .,.._ . ...;...; ' """"' ~" ~r,"i .-,:;;,,. -~ ... :- " - ~~-;'!, 3"_ ... _ ........ _ ~-,.;,: ~$~ -"-pela polcia do gosto, -a ferarqfa do belb, a . alf_11dega d'7Htica estetica :a s'"' revisls~s'jorlli's-".e ... crian'S:"'"os pi6'gramas- de .. rdio, e, salvo exceo, os filmes no so mais governados pela crtica "cultivada" do que o consu-mo dos legumes, detergentes ou mquinas de lavar. O produto cultural est estritamente determinado por seu

    ' .... :< - ~:.- :.-:-,i;e.-' - . . -...... . , ~ -"- ~ .. t~._.,-.,1 ;\ ~ - ....... ~ ~ c1uter industrial de uin~ ldo, seu car.ter de consumao diria de outro_, sem poder'' emergir para - .. utnmii "'es-

    -' '~ V '"; ..:! ".'t"l"1"~' ttica. Ele no policiado, nem filtrado, nem estruturado pela .Arte, "valor suprmo da cultur dos cults ..

    \;o>; --~ - .~...... -- -- ~'' " ..

  • se_ q_:'cajj;o _la art~" nj.o esconde ._m_uitas vezes UJ.Il comr-cici:fili12egic,fu!com s o bras. . - -

    Tudo -que inovador sempre se ope s normas domi-nantes da cultura. Essa observao que vale para a cultu-ra de massa no vale tambm para a cultura cultivada? De Rousseau o autodidata a Rousseau o .alfandegrio, de Rimbaud ao surrealismo, um "revisionismo" cultural con-testa os cnones e os gpstos da alta cultura, abre est-tica o que parecia trivial ou infantil.

    Foi a vanguarda da cultura que, primeiramente, amou e integrou Chaplin, Hammet, o jazz e a cano das ruas. Inversamente, desdenha-se com altivez a cultura de massa nos lugares onde reinam~ os esnbismos estticos, as r-ceitas li1e rri,s;: os ta.lentos .afetado~, as vulgaridades con-vencinais. H um filistinismo dos "cultos" que tem ori-gem na mesma estereotipia vulgar que os padres despre-zados da cultura de massa. E jus.tamente no momento em_gue elas parecem opostas ao mximo, que "alta cu!tura" e ".c~ultura de massa'; ' se rlinem, uma pelo seu aristocra-tismo v4lgar, outra i;>ela sua vulgaridade sedenta. de stan-ding,. Isto foi bem. analisado por !farold Roserri~erg: ;pe fato, o anticonceito de kitsch . uni .kitscfi acrescido."

    .,J1-r - - ~' ' ..Qii.. >;;,,:_ -~ ., ~ - - ~. ' - - ;..;o: - - - - .,. ' -Quando M~, Doc~l,d fala contra o kitsch, parece falar do ponto de vista da arte, quando fala da arte, suas idias so kitsch. E esta frmula-chave: "U_m dos aspectos da

    cul~~ra d.e massa a .crtica "kitschista" do ]dtsch. "~ Meu objetivo aqui no exaltar a cultura de massa,

    mas diminuir a "cultura cultivada", no s para me pro-piciar algumas satisfaes sadomasoquistas, das quais so apreciadores os intelectuais, mas para fazer, literalmente, explodir a praa forte - o Montsgur - de onde temos o hbito de contemplar esses problemas, e tambm, restabe-lecer o debate em campo aberto. Ser que meu propsito sensvel? Qualquer que seja o fenmeno estudado, precio prim~i[~gierite que ~ observador se ~stude, pois o observador ou pertur_b _o f~nm-erro observado, ou nele se pro]ej; de- algum modo. Seja o que for que empreenda-mos no domnio das inCias humanas, o primeiro passo deve ser de auto-anlise, de autocrtica. Como intelectual

    2 HAROLD R-OSEI\llSERG, P(Jpular culture and K i tsch Criticism , em D issent. Inverno de 1958, pgs. 15-16.

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  • atacando o problema da cultura, , em primeiro lugar, minha concepo da cultura que est em jogo. Como pes-soa culta dirigindo-me a pessoas cultas, exatamente essa "cultura" comum que devo primeiramente colocar em questo. H tais resistncias psicolgicas e sociolgicas no interior do que podemos chamar em bloco (de modo su-perficial se queremos abranger o conjunto dos problemas, de modo verdico no caso particular aqui focalizado) a classe intelectual, sua reao a tal ponto garantida e homognea que para l primeiramente que necessrio levar a discrdia. O problema preliminar a ser circuns-crito seria o seguinte: em que medida estamos ns mes-mos comprometidos com um sistema de defesa s vezes inconsciente, mas sempre incontestvel contra um pro-cesso que tende destruio dos intelectuais que somos?

    Isso nos leva a reexaminar e autocriticar nossa noo tica ou esttica de cultura, e recomear a partir de uma cultura em imerso histrica e sociolgica: a cultura de massa nos coloca problemas mal formalizados, mal emer-sos. O termo cultura de massa no pode ele mesmo desig-nar essa cultura que emerge com fronteiras ainda fluidas, profundamente ligada s tcnicas e indstria, assim como alma e vida quotidiana. So os diferentes estratos de nossas sociedades e de nossa civilizao que esto em jogo na nova cultura. Somos remetidos diretamente ao com-plexo globaJ..

    Mtodo

    Desde ento, o mtodo de acesso se delineia. Mtodo autocrtico e mtodo da totalidade. O mtodo da totali-dade engloba o mtodo autocrtico porque tende no s a encarar um fenmeno em suas interdependncias, mas, tambm, a encarar o prprio observador no sistema de relaes. O mtodo autocrtico, desentulhando o moralis-mo altivo e a agressividade frustrada, e o anti-kitsch de-sembocam naturalmente no mtodo da totalidade. De uma s vez, podemos evitar o sociologismo abstrato, burocr-tico, do investigador interrompido em sua pesquisa, que se contenta em isolar este ou aquele setor, sem tentar descobrir o que une os setores uns aos outros.

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  • importante, tambm, que o observador participe do objeto de sua observao; preiso, num certo sentido, apreciar d cinema, gostar de introduzir uma moeda num

    jukebo:, dvertir-se com caa-nqueis, acompanhar as gar-tids espo'rtivas, no rdio, na televiso, cantarolar o ltimo sucess. "p re'Ciso ser um pouco da mult~do, dos bailes, dos~basb'iues, dos jogos coletivos. preciso conhecer esse mund Srrse sentir' _um estranho nele. preciso gQstar de flanar -n

  • 2 A Indstria Cultural

    As invenes tcnicas foram necessrias para que a cultura industrial se tornasse possvel: o cinematgrafo e o telgrafo sem fio, principalmente. Essas tcnicas foram utilizadas com freqente surpresa de seus inventores: o cinematgrafo, aparelho destinado a registrar o movimen-to,. foi absorvido pelo espetculo, o sonho e o lazer; o T.S.F., primeiramente de uso utilitrio, foi por sua vez absorvido pelo jogo, a msica e o divertimento. O vento que assim as arrasta em direo cultura o vento do lucro capitalista. para e pelo lucro que se desenvolvem as novas artes tcnicas. No h dvida de que, sem o impulso prodigioso do esprito capitalista, essas invenes no teriam conhecido um desenvolvimento to radical e maciamente orientado. Contudo, uma vez dado esse im-pulso, o movimento ultrapassa o capitalismo propriamen-te dito: nos comeos do Estado Sovietico, Lenine e Trotsky reconheceram a importncia social do cinema. A indstria cultural se desenvolve em todos os regimes, tanto no qua-dro do Estado quanto no da iniciativa privada.

    Dois sistemas

    Nos sistemas ditos socialistas, o Estado senhor abso-luto, censor, diretor, produtor. A ideologia do Estado pode, portanto, desempenhar um papel capital.

    No entanto, mesmo nos Estados Unidos, a iniciativa privada nunca fica inteiramente entregue sua prpria evoluo: o Estado , pelo menos, po!qia.

    Do Estado-soberaho cultura-! a Estado-polcia h urna gama de situaes intermedirias. Na Frana, por

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  • exemplo, o F.stado s interfere na imprensa para dar auto-rizao prvia, mas tem sob sua proteo a agncia nacio-nal de infonnao (A.F.P.); no cinema, ele autoriza e pro-be, subvenciona em parte a indstria do filme, controla uma sociedade de produo; no rdio, ocupa um monop-lio de direito, mas tolera a concorrncia eficaz de emisso-ras perifricas (Luxemburgo, Europa n.0 1, Monte Carla, Andorra); na televiso, esfora-se por manter seu mono-plio.

    Os contedo~ c~turais diferem mais ou menos radical-mente segndo o. tip de interv~no do Estado - negativo (ceJ18ura, ontroJe) ou positivo (orientao, doxnesticao, pol!(~.~~b) ~-segi:in.kgo ' carter liberar oq a~toritrio- da inter.Venp, .s~gtgldO q t~p de Estad in~~rvenieiile:' -'

    No levando em conta essas variveis, pode-se dizer que se h igualmente a preocupao de atingir o maior p-blico possvel.no sistema privado (busca do mximo lu-cro) e no sistema do Estado (interesse poltico e ideol-

    . .L gico), o sistema privado quer, antes de tudo, agradar ao consumidor. Ele far tudo para recrear, divertir, dentro dos limites da censura. O sistema de Estado quer conven-cer, educar: por wn lado, tende a propagar uma ideologia que pode aborrecer ou irritar, por outro lado, no esti-nmlado pelo lucro e pode propor valores de "alta cultura" (palestras cientficas, msica erudita, obras clssicas). O sisteP,la g rivado vivo, porque divertido. Quer adaptr sua "c\q.tui a ct'plJ.pJicg_. Oj:ste.lfi!i .d Estdo:. afta(::lo~ for-ada. Quer~dptar public 'Sua= cwtura. Jf; :a aifrriativa

    entt~ '~""ve11-gvernanti._ deserotizad4 ~ A,nastci - e pin;;.uli:qy~~e.I.1~rabi: ~o~~ l~'Qi>S:; ~

    Sendo preciS colocar o problema em termos norma-tivos, no existe, a meu ver, escolha a fazer entre o sis-tema de Estado e o sistema privado, mas a necessidade de instituir uma nova combinao.

    Enquanto isso, na concorrncia, no seio de uma mesma nao, entre sistema privado e sistema de Estado (para o rdio, a televiso e o cinema) que os aspectos mais inquietantes de um e de outro tm as melhores opor-tunidades de se neutralizarem, e que seus aspectos mais interessantes (irivestimento cultural no sistema de Estado, consumo cultural imediato no sistema privado) podem

    23

  • desenvolver-se. Isso, bem entendido, colocado abstrata-mente.

    No examinarei neste ensaio o problema dos apndices culturais da poltica de Estado, nem o sistema cultural dito "socialista", ainda que, com exceo feita China, exista em seu seio penetrao de elementos da cultura de massa americana. O objeto de meu estudo so os pro-cessos culturais que se desenvolveram fora da esfera de orientao estatal (religiosa ou pedaggica) sob o impulso primeiro do capitalismo privado e que podem, de resto , se difundir com o tempo at nos sistemas culturais esta-tais. Para 'evitar qualque.:r: confsci,"empregari -o termo de Ct!ltUra ihdu,st_rial par design OS caracteres -comuns a tofos ssistiii'as: pifvados ou de Estad, de Oest .... e de Leste, reservando o termo de cultra de mass~ --p"'r a cultura industrial dominante no ''oes e~~"';.~:;;f,~:~ . --

    Produo-Criao: o modelo burocrtic-'industrial

    Em um e em outro caso, por mais diferentes que sejam os contedos culturais, h concentrao da inds-tria cultural.

    A imprensa, o rdio, a televiso, o cinema so inds-trias ligeiras pelo aparelhamento produtor, so ultraligei-ras pela mercadoria produzida: esta fica gravada sobre a folha do jornal, sobre a pelcula cinematogrfica. voa sobre as ondas e, no momento do consumo, torna-se impalpvel, uma vez que esse consumo psquico. Entretanto, essa indstria ultraligeira est organizada segundo o modelo da indstria de maior concentrao tcnica e econmiea. No quadro privado, alguns grandes grupos de imprensa, algumas grandes cadeias de rdio e televiso, algumas so-ciedades cinematogrficas concentram em seu poder o aparelhamento {rotativas, estdios) e dominam as comu-nicaes de massa. No quadro pblico, o Estado que assegura a concentrao.

    A essa concentrao tcnica corresponde uma concen-trao burocrtica. Um jornal, uma estao de rdio e de televiso so burocraticamente organizados. A organiza-

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  • o burocrtica filtra a idia criadora, submete-a a exame antes que ela chegue s mos daquele que decide - o pro-dutor, o redator-chefe. Este decide em funo de conside-raes annimas: a rentabilidade eventual do assunto pro-posto (iniciativa privada), sua oportunidade poltica (Es-tado), em seguida remete o projeto para as mos de tc-nicos que o submetem a suas prprias . manipulaes. Em um e outro sistema, o "poder cultural", aquele do autor da cano, do artigo, do projeto de filme, da idia radio-fnica se encontra imprensado entre o poder burocrtico e o poder tcnico.

    A concentrao tcnico-burocrtica pesa universal-mente .sqbre . a produo cultural de massa. Donde a ten- ~ 1 1 dI}cia despersonalizao da criao, predominncia da organizao racional '"e p:rodo (tcnica, comercial, po-ltica f sh~re a inveno, desintegrao do poder cultural.

    No entanto, essa tendncia exi_gida pelo sistema indus-triaJ.,R~~?,

  • res antitticos: burocracia-inven~o, ?padro-individuali-dade.:i ""-;- .,.,._. ~ '""". ~ ~ ~ " ~--Esse paradoxo de tal ordem que se pode perguntar

    de que modo possvel uma organizao burocrtico-in-dustrial da cultura. Essa possibilidade reside, sem dvida, na prpria -estrutura do imaginrio. O imaginrio se es-trutura segundo arqutipos: existem figurinos-modelo do esprito humano que ordenam os sonhos e, particularmen-te, os sonhos racionalizados que so os temas mticos ou romanescos. Regras, convenes, gneros artsticos impem estruturas exteriores s obras, enquanto situaes-tipo e personagens.,tipo lhes fornecem as estruturas internas. A anlise estrutural nos mostra que se pode reduzir os mitos a estruturas matemticas. Ora, toda estrutura cons-tante pode se conciliar com a norma industrial. A ind s"ttia

    c\!lBt';:fil..~~E~~fill~--.1.,~~!:l~fl~J:~~~~~!.:~ ~;.~j,~~~~~!,-mzandn os grandes temas. i:omanescos,.J azen,Cio cllcl)es dqs arqtletipos~ein"'stretipos: ~~---- = . .._.,,~,,.,,,< .. -e ..

    - .......... ~"i ,-'!-1,-~ ...... :.:.w;;,.: -.., ,..., .-fll,.;..-..;..

    -~~ Pra!i~i:t!J..lfillte, . fabric~-se _fQJil'l!~S ~eQ.timenta.is em cadeia, partir de crts modelos tornados cnscfe"ntes e racionalizios. Tambm ~corao pode se r--_po1 em

    ...... :1

  • De qualquer maneira, h, varivel segundo as inds-trias, um limite concentrao absoluta. Se, por exemplo, o mesmo truste de sabo (Lever) levado no s a lanar concorrentemente sobre o mercado vrias marcas de de-tergente (Orno, Rinso, Sunil, Tide, Persil), mas ainda a dotar cada marca de uma certa autonomia, principalmen-te na organizao da publicidade, porque existe, mesmo nesse nvel elementar, uma necessidde de variedade .e in-dividualidade no onsutn9. e porque "'a mxima eficCi co-mer2if se encontr _riessa ~fqrn.m estranha, mas rel,ativa.: mente.descentralizadora de autoconcorrncia.

    -o mite oncentrao aparece' bem mais nitidamen-te na indstria cultural. Se h concentrao na escala financeira no s concebvel, mas freqente (por exem-plo, vrios jornais concorrentes .dependem, de fato, do mesmo oligoplio, como France-Soir e Paris-Presse) , a concentrao em um s jornal, uma s emissora de rdio, um s organismo de produo cinematogrfica contradiz demais as necessidades de variedade e de individualidade, a flexibilidade minima de jogo que vitalmente necess-ria indstria cultural.

    O equilbrio concentrao-descentralizao, at mes-mo concentrao-concorrncia, se estabelece e se modifica em funo de mltiplos fatores. Donde as estruturas de produo luridas e moventes. Na Frana, por exemplo, aps a crise de 1931, os trustes de cinema desmoronaram; a produo se fragmentou m pequenas ~irmas indepen-dentes; somente a distribuio ficou conrtolada em algu-mas grandes sociedades que, por efeito retrospectivo de reconcentrao relativa, controlam freqentemente a pro-duo por avano sobre receitas.- Nos Estados Unidos. aps a concorrncia da televiso, as grandes sociedades como a Fox se descentralizaram, deixando as responsabili-dades de individuao a produtores semi-independentes.

    Em outras palavras, o sistema, cada vez que fora-do a isso, tende a voltar ao clima de concorrncia do capitalisJli9 anterior. Do mesmo modo, cada vez que foradQ a isso, se deixa penetrar por antdotos eontra o burocratismo. No sistema de Estado, de uma outra ma .. nefra, mantm-se permanentemente grandes resistncias antiburocrticas: estas se 'tomam virulentas desde que uma brecha racha o sistema; em alguns casos, as possi-

    ; 27

  • bilidades criadoras dos autores podem ser maiores do que no sistema capitalista, uma vez que as consideraes a respeito de lucro comercial so secundrias nesse tipo de sistema. Foi o caso do cinema polons de 1955 a 1957.

    o equilbrio - e o desequilbrio - entre -as foras contrrias burocrticas e antiburocrticas depende igual-mente do prprio produto. A irnprensa de massa mais burocratizada do que no cinema, porque a originalidade e a individualidade j lhe so pr-fabricadas pelo aconte-cimento, porque o ritmo de publicao dirio ou semanal, e porque a leitura de um jornal est ligada a fortes h-bitos. O filme deve, cada vez, encontrar Q seu pblico, e, acima de tudo, deve tentar, cada vz, uma sntese ~ dcil do_ padro e do original: o padro se beneficia: do suces-.so passado e o original a garantia . do- novo sUcess, ma.S o j conhCido corre o risco de ~fatigar enquanto o novo corre o risco de desagradar. por isso que o cinema pro-cura a vedete que tine o arqutipo ao indiy idual :~-,,p~rtir da, compreende-se que a vedete seja O melhor anti-risco da cultura de massa, e principalmente, d cinema.

    "' - Em-'cada caso', portanto, s estabelece uma relao es-pecfica entre a lgica industrial-burocrtica-monopolstica-centralizadora-padronizadora e a contralgica individualis-ta-inventiva-concorrencial-autonomista-inovadora. Essa co-nexo complexa pode ser alterada por qualquer modifica-o que afete um s de seus aspectos. uma relao _ de for~s submetida_s ao conjwito das fa_:r:a& &oc~!is as qais mediatizam a relao entre d utof e. s~u pblico; dess_a conexcf'aeJ oras ~eperide;' fllmente, a riqueza ar stiea

    ...--.:- ,._,;

  • integra os Bressons e os Brassens, os Faulkners e os Welles, ora sufocando-os, ora desabrochando-os.

    Em. outras palavras, a . indstria_ cultural precisa de Ulll_ e.Iho_do _i].~egativo_ pfa flcionr positivamente. Esse eltrodo negativo vem a ser uma certa l!b_erdade no seio de estruturas rgidas. Essa

  • Marc Raboy e Dan Barry. . . Do mesmo modo o destino de Tarzan passa de mo em mo. Tambm assim, na Fran-a, os Pieds-Nickels, feitos por diversos desenhistas, de-pois da morte de Forton, atualmente o so por Pellos. O novo coletivismo, porm, no fez nada mais que se recon-ciliar com as formas primitivas da arte. Pel- pi:4neira vez na histria, a ci!visQ ,industrial. do tr.!loballi gue faz su,rgir, a unidade_ da cria,o aitsti~ . omo-" 'mantifatura faz surgir o troalh6 att~sanal. ~ ""'~~ -7."

    A grande rte""'mve,"' rte industrial tpica, o cinema, nstituiu uma diviso de trabalho rigorosa, anloga quela que se passa numa fbrica, desde a entrada da matria bruta at a sada do produto acabado; a ~pa-prim'- Q.o filme o -~crj,Qt 9u~_.!QPl.!1e que deve ser adaptfo;~a" ca-dei""-cimea com- os adaptadores, os cenaristas, os dialo-gistas, s vezes at especialistas em gag ou em human touch, depois o realizador intervm ao mesmo tempo que o decorador, o operador, o engenheiro de som, e, final-mente, o msico e o montador do acabamento obra co-letiva. verdade que o realizador aparece como autor do filme, mas este o produto de uma criao concebida se-gundo as normas especializadas de produo.

    A diviso do trabalho se estende, inegavelmente, aos demais setores da criao industrial : a. produo televisada obedece s mesmas regras, ainda que em grau menor do que a produo cinematogrfica. J a produo radiof-nica obedece de modo diverso, segundo as emisses, a essa diviso de trabalho. Na imprensa peridica e, s vezes, diria, o trabalho redacional sobre a informao bruta (despachos de agncia, comunicaes de correspondentes) , a colocao em linguagem que constitui o rewriting, teste-munham a planificao da diviso racional do trabalho em detrimento do antigo jornalismo.

    Essa diviso de trabalho tomado coletivo um aspecw geral da racionalizao que chama o sisterh industrial, racionalizao que comea na fabricao dos produtos, se segue nos planejamentos de produo, de distribuio, e

    . ter:rtlina nos estudos do mercado cultural. A essa racionalizao corresponde a padronizao : a

    padronizao impe ao produto cultural verdadeiros mol-des espao-temporais: o filme deve ter, aproximadamente, 2.500m de pelcula, isto , cobrir uma hora e meia; os

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  • artigos de jornais devem comportar um determinado n-mero de sinais fixando antecipadamente suas dimenses; os programas de rdio so cronometrados. Na imprensa, a padronizao do estilo se d no rewriting. Os grandes te-mas do imaginrio (romances, filmes) so, eles mesmos. em certo sentido, arqutipos e esteretipos constitudos em padro. Nesse sentido, segundo as palavras de Wright Mills em White. Collar, "a frmula substitui a forma".

    A diviso do trabalho, porm, no , de modo nenhum, incompatvel com a individualizao da obra : ela j pro-duziu suas obras-primas no cinema, se bem que, efetiva-mente, as condies ideais da criao sejam aquelas em que o criador possa assumir, ao mesmo tempo, as diversas funes industrialmente separadas (a idia, o cenrio, a realizao e a montagem) . A padronizao em si mesm no ocasiona, necessariamente, a desindividualizao; ela pode ser o equivalente industrial das "regras" clssicas da arte, como as trs unidades que impunham as formas e os temas. Os constrangimentos objetivos ou sufocam, ou, ao contrrio, aumentam a obra de arte. O western no mais rgido que a tragdia clssica e seus temas cannicos permitem as variaes, mais requintadas, da Cavalgada Fntstica a Bronco, High Noon, Shane, Johnny Guitar, Rio Bravo.

    Portanto, ner a _diviso dp tr~b.alho nem a paqroni-zao ~o, em si, obstculos individualizao .da obra. Na reafd~cfe. -'-s ~tendem a sufoc-la -e aument la ao mesmo tempo: quanto mais a . indstria cultural se desenvolve, mai~.-~1a n1"'t?.r;,c'::ltidlil';fqO,-~m~ta:;r'tam,enCa '-. "'""~~~~...,.,,.,~"li"'~~-~ "" . ....,. -...r~-- ........ -.. ..... - -~~--~*"!t'l"'!i-~ padu>.~F .e"~"~~,ip,giyiji~~-: No foi em ses comeos de artesanato que Hollywood fez apelo aos escritores de talento para seus roteirbs; no momento do apogeu do sistema industrial que a usina de sonhos prende Faulkner por contrato ou compra os direitos de :Hemingway. Esse impulso em direo ao grande escritor que traz mximo de individuao ao mesmo tempo . contraditrio, porque, apenas contratado, Faulkner se viu, salvo uma exceo, na impossibilidade de escrever cenrios faulknerianos e se limitou a fazer floreios sobre temas padres.

    ~1!ls9}UL~ P~~~Y!''s, __ a.""tj!~lt!~~~ .R~ftr.~~~9~~~~iIJ31

  • O impulso no sentido da individuao no se traduz somente pelo apelo ao eltrodo negativo (o "criador"), ele se efetua pelo refgio em superindividualidades, as ve-detes. A presena de uma vedete superindividualiza o filme. A imprensa consome e cria sem cessar vedetes calcadas sobre o modelo de estrelas de cinema: as Elizabeth, Mar-garet, Bobet, Coppi, Hergog, Bombard, Rubirosa. As ve-detes so personalidades estruturadas (padronizadas) e in-dividualizadas, ao mesmo tempo, e, assim, seu hieratismo resolve, da melhor maneira, a contradio fundamental. Isto pode ser um dos meios essenciais da vedetizao ( so-bre o qual no insisti suficientement em meu livro a res-peito das estrelas) .

    Entre esses dois plos de individualizao, a vedete e o autor (cenarista ou realizador de filme, de emisso, redator do artigo) , funciona uma dialtica na maioria das vezes repulsiva. Quanto mais aumenta a individualidade da vedete, mais diminui a do autor e vice,.versa. Na maioria das vezes a vedete tem precedncia sobre o autor. Diz-se "um filme de Gabin;'. A individualidade do autor esma-gada pela da vedete. Esta individualidade se afirma num filme sem vedetes.

    Podemos abordar aqui o problema do autor, que a in-dstria cultural utiliza e engana ao mesmo tempo em sua trplice qualidade de artista, de intelectual e de criador.

    A indstria cultural atrai e prende por salrios muito altos os jornalistas e escritores de talento: ela, porm, no faz frutificttr seno a parte desse talento concilivel com os padr~s. co,11:~J!~J.Y-;.~~ .,., ~:ti~pto,_ z;o,,. ~ew ... .,.dJ2.._ .rr1~~-',da cultura mdustrrnl, . uma . . mtelzgentsza cnaaora, sobre a

    q~~-~n~~~7Ji-,g.io~sJrm~cl~-a;.~.Y!~~9::915~2a:J~9~.e r;;pro-craci. cujas i:>ss1bilictaaes sao subdesenvlvJ.as. o copy-aeil;"nmmmente,~ '",:fbrm'' s""'Vh'fura~ct"~ Margaret no France--:Dimanche. Conta o 17 de Outubro como um suspense em que Lenine seria o terceiro homem. O rotei-rista constri descuidadamente roteiros que ele despreza. Um Dassin se submete Lollobrigida para rodar La.Loi, um Lazlo Benedeck, para escapar ao silncio, aceita a ni-nharia convencional de um script. E assim vemos freqen-temente autores que dizem: "Isso no meu filme, fui obrigado a aceitar esta vedete, - tive que aceitar este happy end, - fui forado a fazer este artigo mas no o

    32

  • assinarei, - realmente preciso que eu diga isso neste programa de ~dio". No seto. da..._fil9stria cultural ,.s.$ """l'!lul-ti:Qlica: g _ ator~o -~~~ ~ eqv_ergo~do de s~ _ ob.J~ mas tam,bm ,neganup que sua obra seJa obra sua. O autor n,;@"?fiLJ:AA..is se ~ic!,entft-icr..:.pom,;. sue:-.'. lir:. En,tr l!lbos crio.u".'se. uma extraordinria reptlsa. :f;p.to., d~.smafce a

    - ~ .. ~ "

  • filmes marginais, feitos com um mnimo de despesas nos progriiS''j5erifricos do rdio e de televiso, nos jornais ~J~,!}.l>J!s9-llmi1~i!9 Inversamente, a paaron1zaao restrin-ge a parte da inveno (levando-se em conta a1gumas gran-des excees) no setor fechado da indstria cu1tura1, o setor ultraconcentrdo, ~o setor' one ftlnciona a tendncia ap consu:rno~ ru,i:!r~mo. ---'"' .,.,. - ~- "''

    - 1). - -~ _., ..-~~

    34

  • 3 O Grande Pblico

    Mesmo fora da procura de lucro, todo sistema indus-trial tende ao crescimento, e toda p_,.roduo de massa des-tinada ao consumo tem SU& .prRra jgica, qe - a de m~:

    '!_~~ ,,_.._,~""" - ,e V

    xirno.~ortsutn_o. ~~A illaustria cultural no escapa a essa lei. Mais que isso, nos sus setores os mais concentrados, os mais din-micos, ela tende ao pblico universal.

    Revistas como Li/e ou Paris-Match, grandes jornais ilustrados como o France.-Soir, superprodues de Holly-wood ou grandes co-produes cosmopqlitas se dirigem e::e-

    ~-. -~ ......... - - .;\ ~ ... :-,..._;,;.;; ~., '"'\. . ~ .. - ;o, ;:.. tivamente a todos e a ningum, s ,diferentes idaes, aos

    ~ """"u:'. , .l" ili'- .. ~~~~;p.; ~J..-",. ~ '.lia~~ !';,...,..,., dois sexos, s diversas cfasses da socidade, is .Q.i., ao . con-jull}Sf'~~ .. u' .. p,tolico ifacionr e, evnttrar!nente, ao pb llco m~p.iaJ.

    A procura de um pblico variado implica a procura de variedade na informao ou no imaginrio; a a pro-cura de um grande pblico implica a procura de um de-nominador comum. ...,., __

    Um semanrio como Paris-Match ou Li/e tende siste- ?'-maticamente ao ecletismo: num mesmo nmero h espiri- ~, ! tualidade e erotismo, religio, esportes, humor, poltica, " 1 jogos, viagens, explorao, arte, vida privada de vedetes ou princesas, etc. . . Os filmes-padro tendem igualmente a oferecer amor, ao, humor, erotismo em doses variveis; misturam os contedos viris (agressivos) e femininos (sen-timentais), os temas juvenis e os temas adultos. A varie-dade, no sei.o de um jornal, de um filme, de um progra-ma de rdio, visa a satisfazer todos os interesses e gostos .. , de modo a obter o mximo de consumo.

    Essa variedade , ao mesmo tempo, uma variedade sistematizada, homogeneizada (a palavra de Dwight Mac

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  • Donald), segundo normas comuns. O.~estilo si:rpples .-. c~aro, direto do opy:-,Ao mesmo tempo, porm, uma linguagem homogenei.-zada (ainda que uma infindade de formas fossem poss-veis) exprime esses temas. O rdio tende ao sincretismo variando a srie de canes e programas, mas o conjunto homogeneizado no estilo da apresentao dita radiof-nica. A grande imprensa e a revista ilustrada tendem ao sincretismo se esforando por satisfazer toda a gama de interesses, mas por meio de uma retrica permanente.

    O sincretismo tende a unificar numa certa medida os dois setores da cultura industrial : o setor da informao e o setor do romanesco. Nq~setor da informao, m~ito procurado o sensacionalismo (isto e: ess Taixa de -real onde o inesperado; .o biza:rro, o ~homicdio, o Cidente, a aventura irrompem n vida quotidiana) e . s ved es, que parecem viver .. ''.o ixo d.a realidade quofi.ian."" Tud que na vida real se assemelh ao rmiSc u ao sonho privilegiado. Mais que isso, a informao se reveste de ele-

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  • mentos romanescos, freqentemente inventados, ou ima-ginados pelos jornalistas (amores de vedetes e.de prince-sas). Inversamente, no setor imaginrio, o realismo do-mina, isto , as aes e intrigas romanescas que tm as aparncias da realidade. A cultura de massa animada por esse duplo movimento do imaginrio arremedando o real e do real pegando as cores do imaginrio. Essa dupla contaminao do real e do imaginrio (o filme A Princesa. e o Plebeu assemelha-se realidade e os amores de Mar: garet assemelham-se . ao filme) , esse prodigioso e supremo sincretismo se inscreve na busca do mximo de consumo e do cultura de massa um de seus caracteres funda-mentais.

    O novo pblico

    No comeo do sculo XX, as barreiras das classes sociais, das idades. do nvel de educao delimitavam as zonas respectivas de cultura. A imprensa de opinio se diferenava grandemente da imprensa de informao, a imprensa burguesa da imprensa popular, a imprensa sria da imprensa fcil. A literatura popular era solidamente estruturada segundo os modelos melodramticos ou ro-cambolescos. A literatura infantil era rosa ou verde, ro-mances para crianas quietas ou para imaginaes viajan-tes. O cinema nascente era um espetculo estrangeiro.

    Essas barreiras no esto abolldas. Novas estratifica-es foram formadas: . uma imprensa feminina e uma im-prensa infantil se desenvolvem depois de cinq4enta anos e criam para si pblicos especficos.

    Essas novas estratificaes no devem mascarar o di-namismo fundamental da cultura de massa. A partir da dcada dos 30, primeiramente nos Estados Unidos e depois nos pases ocidentais, emerge um novo tipo de imprensa, de rdio, de cinema, cujo carter prprio o de se dirigir a todos. H~Q Fnma o __ nascimento do Paris-Sair, .dirio dirigindo-se tanto aos cultos como aos incU'ltos, aos bur-

    ~~ ~--' y -~. ...............~ '"" . ~ ~ .. gueses como aos populares, aos homens como s mulheres, aos_Joietjcctno ao:S ' ~:Itjos; o ,.. Paris-Soir--tem =em vista a universalidade e, de fato; alcana. Ele no abarca todos os leitores, mas abrange ieitores de todas as ordens, cie

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  • todas as categorias. Depois, h a transformao do Matcn de revista esportiva em revista para todos, pai do atual Paris-Match, que tambm busca a universalidade. Parale-lamente, cria-se a Radio-Cit, o Paris-Sair radiofnico. A Radio-Cit cria um novo plo de atrao, um estilo din-mico de variedades. Nesse meo tempo o cinema passa do espetculo estrangeiro a espetculo de todos. . . .

    A guerra, a ocupao esgotam a cultura de massa, de-pois o movimento se recupera e hoje, com Rdio-Lu-xemburgo e Europa n.0 1, com o France-Soir, Paris-Match, Jours de Frnce, com os filmes de vedetes e as grandes produes, pode-se constatar que o setor mais dinmico, mais concentrado da indstria cultural ao mesmo tempo aquele que efetivamente criou e ganhou "o grande pblico", a "massa", isto , as camadas sociais, as idades e os sexos diferentes.

    Concorrentemente se desenvolvem a imprensa infantil e a imprensa feminina. A grande cadeia internacional Ope-ra Mundi cria na Frana a nova imprensa infantil com Tarzan e a nova imprensa feminina com Confidences. De-pois essas duas imprensas conquistam para a cultura de massa o mundo infantil e o mundo feminino. E, vista mais de perto, a imprensa feminina no se ope masculina. A grande imprensa no masculina, ela feminino-mas-culina como veremos mais adiante. A imprensa feminina se especializa maciamente nos contedos femininos dilu-dos ou circunscritos na imprensa masculino-feminina.

    A }mprensa infantil, literalmente criada pela inl.stria CUltll,ral,. e' que '.flre sc""' atlmente orii Mickey_, ''. l'l'1bn, Spirou, o{. Flintstones, se "especiJ.lz rios onteds"' in-

    , .... ~;e.> - .~,-. ~ . -~ .. ~!.lt.;:.~

    fantis que por a, na imprensa adulta, esto. diludos os 'ircyn15critos (pgina das ~ crianas,_ quadrilhos',j ogs).

    ~~~fuic~k ela ,ao mesmo.,,"tertipo u,!Ila, .:Pre~"'rao.,:p,~~ a 1mpr53nsa Jlo .!Pundo ad_ulto. ...., A existncia de uma imprensa infantil de massa . o sinal de que uma mesma estrutura industrial comanda a imprensa inafntil e a imprensa adulta. Esses sinais de dife-renciaao so, portanto, tambm elementos de comuni-cao. Ao mesmo tempo, o fosso que separa o mundo in-fantil do mundo dos adultos tende a desaparecer: a grande imprensa para adultos est impregnada de contedos in-fantis (principalmente a invaso das histrias em quadri-38

  • nhos) e m~Jtiplicou o emp,rego da !magem (fotos e dese-nhos), isto , de uma linguagem imediatamente inteligvel e a1r~ent~ :P.~r.a -l:gri1s;a; a9., .. 1E;.S.IJ10 ~fawpo ,' .. .~J_IJ.prensa infant ir 'tornou-se um instrumento d~ aprendizagem para

    ~ ~~""'. ..

  • sas, e filmes com caractersticas viris, violentas, agress~vas: ele produz filmes sincretizados, nos quais o contedo sen-timental se mistura com o contedo violento.

    H, portanto, uma tendncia ao mixage4 de contedos de iilteresses femininos e masculinos, com uma ligeira do-minante feminina no interior desse mixage e, fora dele, uma imprensa feminina especializada em economia doms-tica, moda e assuntos amorosos.

    A cultura tradicional, a cultura humanista se detinham nas fronteiras das classes: o mundo campons e operrio, mesmo quando entrou no circuito da cultura primria, da alfabetizao, ficou margem das humanidades: o .. tea-tro era e continua a~ser .... um privilgio de 4 consumo burgils. ~ "' ;o. ~ . ,..~ ........ ~ '...,..,.. - .... ___ ..........,.. 1". A cultura camponesa ainda permanecia folclrica nas pri-meiras dcadas do sculo XX. Da mesma maneira, a cul-tura operria se achava fechada nos subrbios industriais ou ento era elaborada no interior dos sindicatos ou parti-dos socialistas.

    Ora, o cinema foi o primeiro a reunir em seus circui-tos os espectadores de todas as classes sociais urbanas e mesmo camponesas. Os inquritos nos Estados Unidos, In-glaterra e Frana nos indicam que a percentagem de fre-qncia para as classes sociais aproximadamente a mes-ma. ~~Qi,i>. .~~E..~!~~ul~ . ~SJ?..()rti_y~si ~Y~~~.c:JJ:renaram um pblico sado de toda' s camadas da.,Qciedade .

    .:. -- - . ~-..:.;.:..~ - _ - ~-~"-'-:.-' ~--...-- 'l':!IJle A partir da dcada dos 30, o raaio irrigou rapidamente todo o campo social. A televiso tomou impulso tanto nos lares populares quanto nos ricos. Enfim, a grande im-prensa de informao no estilo France-Soir, as grandes re-vistas ilustradas no gnero Paris-Miatch se difundiram, de-sigualmen.te, verdade, mas incontestavelmente, em todas as bancas.

    As Jronteiras _ _ulturais so abolidas no mercado co-mum das mass media. Na verdade '"'s e'strtilles"s o

    r~R~~~L~~~s ~9~.!ill~t!2f s!~;J\i~:ii~"1~~~,:21ii~frfif~e ~f~ifl;t~11i~fci~}[~~ttar?i~~y~!1d~ff_~S~~x~t~~~~ _;.:1'(~,,;..;;o;..1,'?';(,i1'~~'.--~"""'.-i-~:A;' _;,._ ~.:.. < '"'"""'~~V\...;~-~,,r.-:-~ ~.:.:,_;,l,:'~_ .,'!..;>.;,.' . .;;.~ _ ...... - ~~.....,.._~. a ~!leflJE:l,.-!is !?}as~~.,~9~~~s : x.2s P.!2~~,~;1!,1!1,~."~~S~,~g,2,~~9' 4 Gravao simultnea, dos diversos sons necessrios, sobre a trilha sonora de um filme. - N.T.

    40

  • cin~m~..,.~~ ~r~ !}W} 4~JAPJ~ ... 2.Qll~~!!Lgg_nt-~J!B~, ~uitos.so1!1~s!" t!is '" 111\!ltas~ y~~~ . ~~""'Qs. WJl~~os.

    "bs ouvintes de rdio se diferenciam pela escolha das estaes e dos programas e essa derenciao de gostos tambm uma diferenciao social parcial. As revistas so difundidas muitas vezes segundo as estraticaes sociais: a France-Dimanche mais popular, Noir et Blanc menos popular que Paris-Match. A Paris-Presse mais burguesa, Le Monde mais intelectual que France-Soir; os""~~tig;~_JlOdem ser ~R~Ci~os .de ;naneira qif~.r:ente pe~o o~r~rig ou pelo burgus nos mesmos jornais, II).as ,,,Paris-Match, Fran-

    ~~" - b_o:,. ...... - ~~ ...... ~ ~ ~ ' ce-:S_oir p~~L.J!1.!.,~ep~_.!!l ~os _,grancyes_ vecul9s_~_9muns &,_ tQda~ as clsses.

    _.Sgum pensar que nos Estados Unidos e na Europa Ocidental s classes ou categorias sociais permanecem se-paradas no trabalho por relaes de autoridade ou relaes de vendedor a comprador, separadas no habitat por quar-teires ou blocos (isso, ainda, apesar das novas unidades de alojamento), pode-se adiantar que a cultura industrial o nico grande. terreno de comunicao entre as ai.asses sociais: o operrio e o patro cantarolaro Piaf ou Dalida, tero visto o mesmo programa na TV, tero seguido as mesmas sries desenhadas do France-Soir, tero (quase no mesmo instante) visto o mesmo filme. E se algum pensa nos lazeres comuns com temporadas de frias comuns para operrios, empregados, "quadros", comerciantes (perma-nece a diferena entre o lugarejo de barracas e as casas de campo), j s_e pode _Rerceber que a .nova cultura se pro-longa .no, sen.ticto ci~ .. um 'ho"ingeneiz'.o ... de ost'Umes.

    "' Esse movlmento tanfh 1is mportante qunto se-gue o sentido de uma evoluo sociolgica: a formao de uma gigantesca camada salarial, no ocidente industrial, para onde confluem, de um lado, o antigo proletariado operrio que tem acesso a um nvel de vida consumidor e a seguros sociais, de outro lado, a antiga classe mdia que se escoa no salariado moderno (pequenos artesos, pequenos proprietrios, pequenos comerciantes que se tor-nam quadros; empregados, assalariados nos grandes con-juntos industriais, comerciais ou administrativos).

    Esse novo "salariado" permanece heterogneo: mlti-plos compartimentos so mantidos ou construdos entre os diferentes status sociais: os funcionrios pblicos re-

    41

  • cusam a identificar-se com os operrios, os operrios per-manecem' com sua conscincia de classe, a fbrica conti-nua sendo o ,gueto da civilizao industrial. l?I~~tg!2,_cQ:r:1-ve!!_Q.~s, _hierarquias, !~i vindic9-Q~A_ e_ssa grande camada assalariad~. M~s, J? 9:-~~ iL hgmo~.~~eza. na~ ap~na~
  • lares. Ela - quando consideramos as classes da socieda-de, quando consideramos os estatutos sociais no seio do novo sa_lariado - o lugar-comum, o meio de comunicao entre esses diferentes estratos e as diferentes classes. Em certos centros de frias, como o clube Mediteriane, j se podem encontrar operrios, empregados, quadros, tcni-cos, fisicamente misturados, e no mais apenas imagina-riamente. confundidos no isolamento do ouvinte de rdio, da leitura do jornal ou da sala escura.

    Pode-se tambm, como Leo Bogart, adiantar que "o nivelamento das diferenas sociais faz parte da padroniza-o dos gost.os e interesses aos quais as mass media do uma expresso e para a qual contribuem".6 Abordamos a, ainda uma vez, uni problema de fundo . Fiquemos, porm, no momento, na verificao .do carter sincretizante e ho-mogeneizante da cultura industrial.

    Esse uarter se verifica, enfim, sobre o plano das na-es. A tendncia homogeneizante ao mesmo tempo uma tendncia cosmopolita, que tende a enfraquecer as dife-renciaes culturai~ nacionais em prol de uma cultura das grandes reas transnacionais. A cultura industrial, no seu setor mais c9ncentrado, mais din.Inico~~ J est rganizada de mod~internaionI. As grandes cadeias de imprensa como opera Mund a cadeia Del Duca fornecem mate-riais que so adaptados para mltiplos idiomas, principal-mente no domnio dos comics e da imprensa amorosa. O cine.ma de_H9llywood visa no apenas ao pblico am.eric-no, ms o pblico 'rriund.al, e 'h. mais de ranos as agn-

    .... .~1,o.lt;\...._...,._ - ~-....... , , ,,>;-;' ,.._ , ;. - ~ ~:f:r~ t . -- ' ' ~

    cia,s especializads eliminam os temas suscetveis de cho-carem as.l >Iatia& rpias,-asiticas ouafrican s. Ao mes-mo tempo~S'fosenvoive ~um novo cinema estruturalmente cosmopolita, o cinema de co-produo, reunindo no ape-nas capitais, mas vedetes, autores, tcnicos de diversos pa-ses. o caso, por exemplo, de Barrage contre le Pacifique, co-produo franco-talo-americana, que foi rodada na Tai-lndia por um diretor francs, baseado numa adaptao americana feita por Irving Shaw do romance francs de Marguerite Duras, com vedetes italiana (Silvana Mangano) e americana (Anthony Perkins).

    6 The Age of Telcvision, p g . 5.

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  • Todo filme subtitulado j cosmopolita. Todo filme dublado um estranho produto cosmopolitizado cuja ln-gua foi retirada para ser substituda por outra. Ele no obedece s leis da traduo, como o livro, mas s leis da hibridao industrial.

    A cultura industrial adapta temas folclricos locais transformando-os em temas cosmopolitas, como o western, o jazz, os .ritmos tropicais (samba, mambo, ch-ch-ch, etc.). Pegando esse impulso cosmopolita, ela favorece, por um lado, os sincretismos culturais (filmes de co-produo, transplantao para uma rea de cultura de temas prove-nientes de uma outra rea cultural) e, por outro lado, os temas "antropolgicos", isto , adaptados a um denoln.ina-dor comum de humanidade.

    Esse cosmopolitismo se irradia a partir de um plo de desenvolvimento que domina todos os outros: os Es,... tados Unidos. Foi l que nasceu a cultura de massa. l que se encontra concentrado seu mximo de potncia e energia mundializante.

    A cultura industrial se desenvQlve po pla~o do merca-: . 11 do mundil. tia.f sua formidvel tendncia a si.pcr~tsnoJ J J "ectetsmo e a homog~neizao, seu fluxo_imag~~ llco, lf . ~ esttico, atenta contra as carreiras locais, tnicas,, .sociais,

    11 ' I!cJon~is, de idade, sexo, educao; ela separa dos ,. f~~clo-i i:~s e d~s tr~~~es te~as. que ~l~ universaliza, ela ir}ve:ita ten:ias imediatamente universais.

    En._contramos novamente o problema do denominador # comm, do homem ao mesmo tempo ~"mio" -~ '7.iiiver-

    :i \' sT;~-:~ss," ~o~~l>":~,~-(~ri"la~q,,, id~_~i ~-~strat~ poJ-.. Utro, s~!lcr~tico e mltiplo da cultura de mssa~ "

    ...:~

    O homem mdio

    Qual esse homem universal? o homem puro e simples, isto , o grau de humanidade comum a todos os homens? Sim e no. Sim, no sentido em que se trata do homem imaginrio, que em toda a parte responde s imagens pela identificao ou projeo. Sim, se se trata do homem-criana que se encontra em todo homem, curio-so, gostando do jogo, do divertimento, do mito do conto. Sim, se se trata do homem que em toda parte dispe de

    44

  • um tronco_comum de razo pe:i;:.ceptiva, de ROSsibilidades de "~ecifra_~ot ,.,~e intEl!}.g~~iti-: , . --.-~ .. ~ --.

    - Nesl?e ~ent1do, o homem media e uma espcie de an-thropos univeri:;al. "' '

    ~-A ifigagen.Ladaptada a esse anthropos ,,.. .. a ... audi.ovi-sual, lingliagem de quat ro ins1ii;unentos : imgem, so.m mu-sical; palavr; escrita. Llnguagem" tanto mais 'acessvel na med ida 'errtcfuee eYivolvimerit politriico d todas:s lin-gu~~ds .. Lfnguagem7 ~~mfijp.; que_:J;lf_~~dsenvolve tanto_ e mais sobre o tecido do imaginrio e do jogo que sobre o tecio .. ctVl ~prtica. dr.a;~ ii"s- frorite'irS ..gue separam . os

    -,111' ~> ..... ~ . , .- ' - ... ~ -~-' -~- .,.,~.... ... _,....;;-., ~- . ~ ' rem~~ .. }!I]~&;n!~1~~3;g, ~t.~P,~,..Jlmd~, q1fer~n elll~Ilte da-qu_~!~ que ""spram os remos a erra. "m j 10'1pem ~P-Qd"e mais fcilrhent&'"pl'tieip::tr'ias 'lendas de um o fra civi-

    -'-\-,~-1', - .,.,.. z- , -::-;, - ~: ' - _ -., , . _ __,..:...'" -~ - ~ --:-~-;,,,.,._~ , lizto do qu"'Se aqflptat a vida desta givilizao. -

    Assinl,'"e'""Sb'bre .,..esss"'fund:amntos antropolgicos que ' se apia a tendnci!'L da culttit '""de massa universalidade. Ela reve l e des perta tima universalidade primeira .

    ~ ~' >. - .. ,....,~:- '!. ,. 1 Ao mesmo tempo, porem, ela .cria uma nova umversar !idade a partir de elementos culturais particulares civili-zao moderna e, singularmente, civilizao americana. E por isso que o homem universal no apenas o homem comum a todos os homens. E o homem novo que desen-volve uma civilizao nova que tende universalidade.

    A tendncia universalidade se funde, portanto, no apenas sobre o anthropos elementar, mas sobre a corrente dominante da era planetria.

    O consumo cultural Em certo sentido aplicam-se as palavras de Marx: "a

    produo cria o consumidor . . . A produo produz no s um objeto para o sujeito, mas tambm um sujeito para o objeto."7

    De fato, a produo cultural cria o pblico de massa, o pblico universal: Ao mesmo tempo, porm, ela redes-cobre o que estava subjacente: um tronco humano comum ao pblico de massa.

    Em outro sentido, a produo cultural determinada pelo prprio mercado. Por esse trao, igualmente, ela se

    7 Contribution la critique de l' conomie poli tique, Apndice.

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  • diferencia fundamentalmente das outras culturas: estas utilizam tambm, e cada vez mais, as mass media (impres-so, filme, programas de rdio ou televiso), mas tem um carter normativo: so impostas, pedaggica ou autorita-riamente (na escola, no catecismo, na caserna), sob forma de injunes ou proibies. A cultura de massa, no uni-verso capitalista, no imposta pelas instituies sociais, ela depende da indstria e do comrcio, ela proposta.8 Ela se sujeita aos tabus (da religio, do Estado, etc.), mas no os cria; ela prope modelos, mas no ordena nada. Passa sempre pela mediao do proqut.o vendvel e por ~;~~-.e ~ ~~ .... ~ _..,,. ........ -- ._. - -. J!S;>- . .... ~ isso mesmo toma emprestadas certas caractenstlcas do prodto vendver;~como de :se dobrar 1e( ct mrado,

    fa-sfetf~~ e da: proc~ra .. _~lj I~Lf.~.mdjlleri!al a, ~~~fi}~rado. Da sua relativa elasticidade. 4,.cultura de massa o

    ~ ~ ~ ,,..~, :-

  • tempo, podemos considerar que ao longo dos anos os temas que desabrocham ou desfalecem, evoluem ou se estabilizam no cinema, na imprensa, no rdio ou na televiso tradu-zem uma certa dialtica da relao produo-consumo.

    No se pode colocar a alternativa, simplista: a im-prensa (ou o cinema, ou o rdio etc.) que faz o pblico, ou o pblico que faz a imprensa?

    A cultura de massa imposta do exterior ao pblico (e lhe fabrica pseudonecessidades, pseudo-interesses) ou reflete as necessidades do pblico? evidente que o verda-deiro problema o da dialtica entre o sistema de produ-o cultural e as necessidades culturais dos consumidores. Essa dialtica muito complexa, pois, por um lado, o -que chamamos de pblico uma resultante econmica abstrata da lei da oferta e da procura ( o "pblico mdio ideal" do qual falei) e, por outro lado, os constrangimentos do Estado (censura) e as regras do sistema industrial capi-talista pesam sobre o carter mesmo desse dilogo.

    A cultura de massa , 2ortanto, o~nroduto de .uma dia-ltica pi d'O:."cnsfii:Il."ci tr o ie 'Un -iitic -glo-bal(u~---e a 'yef"gcffciCiteffi s_ -ttajflee~-."~~;--

  • 4 A Arte e a Mdia

    Recapitulemos agora, do ponto de vista das conseqn-cias artsticas, os dados focalizados at aqui.

    De um lado, um impulso em direo ao conformismo e o produto padro, de outro lado, um impulso em direo criao artstica e livre inveno.

    No primeiro sentido h o Estado, seja ele censor ou patro. Existe a estrutura tcnico-burocrtica que sempre um fator de conformismo.10 Existe a estrutura industrial que sempre um fator de padronizao. Existe a economia capitalista que tnde procura do mximo de pblico com as conseqncias j examinadas: homogeneizao, fabri-cao de uma cultura para a nova camada salarial. O p-blico mesmo, tomado como uma massa annima, concebi-do sob o aspecto de um homem mdio abstrato, um fator de conformismo. Os fatores de conformismo agem, portanto, do cume at a base do sistema, em todos os escales.

    Mas igualmente em todos os escales que encontra-mos os antdotos. O Estado pode isentar a arte dos cons-trangimentos do lucro, donde a possibilidade tanto de uma arte santuria como o Alexandre Newski de Eisenstein, como de uma arte de pesquisa como os filmes de McLarren na National Film Board of Canada. O capitalismo privado pode isentar a arte dos constrangimentos do Estado. Por outro lado, a criao pode utilizar todas as falhas do gran-de sistema estatal ou capitalista-industrial, todos os fra-

    10 Para WHYTE, o "trabalho em equipe", segundo as noqnas. de or-ganizao gerencial moderna, ele prprio um fator de peso do con-formismo (cf. L'homme et l'organisation).

    48

  • cassos da grande mquina. Pode-se dizer que no sistema capitalista, o produtor cosmopolita, o judeuzinho Pinia que ficou milhardrio, desempenha papel progressivo em relao ao administrador, ao homem de negcios, ao ban-queiro "normal". As vezes, ele corre riscos cuja importn-cia sua falta de cultura no pode medir, s vezes confia em empreendimentos insensatos, cuja rentabilidade pensa pressentir. Os cinemas americano ,;e francs ainda no se burocratizram inteiramente, eles ainda se ressentem de suas origens, e ainda tm alguma coisa do antigo sistema arriscado e improvisado, sem ideologia e sem preconceitos conformistas. Ainda h qualquer coisa de judeu no cinema, isto , qualquer coisa de no conforme, de no totalmente adaptado e integrado. Em regra geral, tudo que persiste do antigo setor selvagem e savana da sociedade industrial, tudo que se mant~~ na ~oncor:ncia !avo:ece sempre a~- ~"~ ~ guma .aber.tura .. rigm a. l e .in.yen.t: .. va. Al~. m_ . d. _1~s.o,~._ .. ~.~---~.n. E;_g. e .. S_i-.. ~.,~1., .. '.' dade~~1:.~ c~n;iad~ sa~~al, ~.9.Ytse fl!m~e ~"'-11},~~tnaJi' , ~ i c~~t~r,ru~t~,,.IJ:l:_JJ ~i;,iq:J.~rm,~nt!i\,o, _pQnc~rn~-~~J;>Ie-:J: -~ ; f ~, ma~J\lll~tam_e_ll~P?E1~~~~...Qa.,,~a~~~~e. Cont. .. ~. li_ .. ~ -~ .. :. vocam entao nao apenas simples divertimentos, mas con-f 1 m ~ tedos que colocam em xeque. o ser humano profundo. \i!" '1 -~

    , portanto, um sistema bem menos rgido que se apre-senta primeira vista: est, em certo sentido, fundamen-talmente dependente da inveno e da criao que esto, todavia, sob sua dependncia; as resistncias, as aspira-es e a criatividade do grupo intelectual podem funcionar no interior do sistema. A inteligentsia nem sempre radi-calmente vencida em sua luta pela expresso autntica e pela liberdade de criao.

    E por isso que, ao mesmo tempo que fabrica e pa-droniza, o sistema tambm permite que o cinema seja uma arte. No prprio seio da produo em srie, h jogos para adultos, jornais de crianas, canes da moda, folhetins, comics, os "Sign Furax" e os "Super-Crtin de la Terre'', ricos em fantasia, humor ou poesia.

    Enfim, a indstria cultural no produz apenas clichs ou monstros. A indstria de Estado e o capitalismo privado no esterilizam toda a criao. Apenas, no seu ponto ex-tremo de rigidez poltica ou religiosa, o sistema de Estado pode, durante algum tempo, talvez longo demais, anular quase totalmente a expresso independente.

    49

  • Entre o plo de onirismo desenfreado e o plo de pa-pronizao estereotipada se desenvolve uma grande cor-rente cultural mdia onde se atrofiam os impulsos mais inventivos, mas onde se purificam os padres mais gros-seiros. H um enfraquecimento constante nos Estados Uni-dos, na Inglaterra, na Frana, de jornais e revistas de baixo nvel em benefcio dos de nvel mdio. Mediocridade no sentido mais exato da palavra, isto , qualidade do que mdio, e '1no tanto no sentido do termo tornado pejorati-vo. As guas baixas sobem e as guas altas descem. "Voc no notou que nossos jornalistas ficam sempre melhores e nossos poetas sempre piores?", pe na boca de Arnheim, Robert Musil em L'Homme sans Qualits. 11 Efetivamente, os padres se enchem de talento, mas sufocam o gnio . Um copy-desk do Paris-Match escreve melhor que Henri Bar~ deaux, mas no saberia ser Andr Breton.

    A qualidade literria e, sobretudo, a qualidade tcnica sobem na cultura industrializada (qualidade redacional dos artigos, qualidade das imagens cinematogrficas, qua-lidade das emisses radiofnicas) , mas os canais de irri-gao seguem implacavelmente os grandes traados do sis-tema. Em todo lugar a qualidade Boussac substitui de uma s vez a antiga mercadoria ordinria e o velho artigo feito mo. Em todo lugar, o nylon substitui os velhos tecidos de algodo e a seda natural. O acabamento industrial explica essa subida e essa baixa qualitativa. A subida qua-litativa dos padres no responde mais aos critrios aris-tocrticos de oposio da qualidade quantidade: ela nas-ce da prpria quantidade. Por exemplo, a qualidade dos westerns provm tambm de sua quantidade, sto ', de uma longa tradio de produo em srie. Ao mesmo tempo, o "gnio" tende a ser integrado na medida em que curio-sidade, novidade, esquisitice, escndalo. Cocteau e Picasso fazem parte da galeria das vedetes com Diste!, Margaret, Bardot. O ~,gnio"~ ,,E_~ ~< T~E:~" '.' aJta cp~W!JL,,'.: ,~-~JJ-:log: marca alta da cultura ae massa.

    "'$; ~, ~ , ""' ~ .. ~;-~,.~

    '"'"A corrente mdia tfiurifa e nivela, mistura e homoge-neiza, levando Van Gogh e Jean Nohain. Favorece as est-tics mdias, as poesias mdias, os. talentos mdios, as

    11 L'Homme sa11s Qualits, t . II, pg-. 436.

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  • inteligncias mdias, as bobagens mdias. J!kq1a~ .. ~ .. ~l!ltllra 1 i ~ de E;!~~ lll~~ ~m~~-!&~i.t~~~~,g~~~2,E~~~~ue lli1 f =~~~g~:~~~~~~es~>~~E~~~~~irT.~if~i-~ 11~~~;1~~~~iii .~ i ~ mei.q 'raturCd'.e'Jfo"f~~o. ~?s9@facie"n~ 'c!{i~~~ct~s"e11- l l f volye~~"iift)}li'f'~I1\~~~m.q~~~-nrvr:ae .J;-1~dfos, ~: ~. ~ ct(;},,.Jpcr ae vil!ltrrl: .~. - ""'$ii$'-~'""& " "4""''~"'"""", ... ~ l ~

    Mas"~a cortent'--principal no a nica. Ao mesmo tem-po se constitui uma contracorrente na franja da indstria cultural. Ainda que a corr.ente mdia tenha xito em mistu-rar o padro e o indvidual, a contracorrente se apresenta como o negativo da corrente dominante.

    A corrente principal de Hollywood mostra o happy end, a felicidade, o xito; a contracorrente, aquela que vai da Morte de um Caixeiro-V'iajante, a No Down Payment, mostra o fracasso, a loucura, a degradao. As redes nega-tivas so ao mesmo tempo sempre secundrias e sempre presentes. Assim ns vemos que a contradio fundamen-tal a seguinte : o sistema tende a secretar continuamente seus prprios antdotos, e tende continuamente a impedi-los de agir: essa contradio se neutraliza na corrente m-dia que ao mesmo tempo a corrente principal; ela se afia na oposio entre a contracorrente negativa e a corrente principal, mas a corrente negativa tende a ser repelida para a periferia.

    E, finalmente; h .a_ terceira corrente, a corrente negra, ~ a corrente em gue ferinent.mas 'prgtintas e as "'contesta- ,1[

    e~ iuncimentais: qu permanece ff da indstria cul- ~ tural : :eStpode usllrpar -em - part;' alapt~- a si:. tornar ~con~um~~is puJ:>li____~J:p~pte''""cert}f'' asp~'to~, ~ig~m~_s, de ' Marx, Nietzsche, R1mbaud, Freud, Breton; "Peret, Artaud, -~

    ma,~ i,~"'P~i:C>~enada, o antiprton da' cutur a, ,su r- ~'-dium,,, ficam de fora . .......,., -

    ""'-"' ,.. -~-""(i'"

    Mas o qu? O que existia antes da cultura de massa? Holderlin, Novalis, Rimbaud, eram eles reconhecidos en-quanto vivos? O conformismo burgus, a mediocridade ar-rogante no reinavam nas letras e nas artes? Antes dos gerentes da grande empresa, dos produtores de cinema, dos burocratas do rdio, no havia os acadmicos, as per-sonalidades gabaritadas, os sales literrios . . . A velha "alta cultura" tinha horror ao que revolucionava as idias e as formas. Os criadores se esgotavam sem impor sua

    51

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  • 5 O Grande "Cracking''

    Os discos long playing e o rdio multiplicam Bach e Alban Berg.12 Os livros de bolso 1n.ultiplicam Malraux, Ca-mus, Sartre. As reprooues nmrtlplican Piero della Fran-cesca, Masaccio, Czanne ou Picasso. Em outras :p~avras, a cultura cultivada se democratiza pelo livro .barato, o

    "b'>'":.,1.~11;.,,_ .o;(, ..... _._.,,,_,._s- ' '~ ~. '~ ._ '...:.>,: ~-~ '"' ' . -i . .... ~ discQ, ~ r~rd_uao. -

    H, port'ilt~uma zona onde a distino entre a cul tura e a cultura de massa se torna puramente formal : A Condio Hurruma, A Nusea ou A Peste entram na cultura de massa sem deixar, contudo, a cultura cultivada.

    Essa democratizao da cultura cultivada efetiva-mente uma das correntes da cultura de massa, mas, como veremos mais adiante, no a corrente principal nem a corrente especica.

    Por outr.o lado, se essa d~:rocratiz~~o _multiplicadora das obras"' anunCia_tLv~z lima integrao futur- das duas corre ntes, ria tenta cm:itr s privilgios da alt cultura. Esta, pei~sras ... mesmas -QQde se . d a .democrtizo, mant m ) mi" setor rese~vacio no qual . detm o monoplio da atil;lida(ll}.,,e'C., __ original. Os livros de boISo s aparecem depois de transcorrido certo tempo em favor da primeira edio. O disco no suprime a cerimnia que o concerto. A reproduo do quadro no reduz em nada o valor mitifi-cado do original.

    A alta cultura resiste integrao, s vezes cultivando valores mticos como a assinatura do artista embaixo do seu quadro, se bem que a reproduo, no estgfo de perfei-

    12 20 milhes de discos de Toscanini vendidos de 1920 a 1955; 60 mi-lhes de discos de Mozart de 1903 a 1955.

    53

  • o a que chegou, possa anular o valor do original, do mesmo modo que um prottipo automobilstico perde todo o valor. a partir da fabricao em srie. Mas culturalmente, a reproduo, pelo contrrio, supervaloriza o original. Isso significa que, em certo sentido, essa mitificao pode ser considei:ada como uma resistncia invaso conquistadora da cultura de massa.

    Por sua vez, a cultura industrial no faz seno multi-... -~ ......... """ .._,..-,,;.,., - ' . " ....,.,,.,,., ~., " . .. ! - ~ ....

    g~iS~!'-se P'l!,t~ t sim;>.J.~s~,ent.e .: Jreqentem:~nte J!an~o~a segypao suas prprias normas- aquilo que vai buscar nas

    - ~--"' ::...-i - ..,, li,!;- .. li;;.:.;.,;. _ ,., . ~ "" ~ ~ ....., ~-- - .. reservas de alta cultura. 1',o mesmo . tempo que repugna alta cultta~aesprest~iar seus valres~' a cilltura indus-

    """"'-"'~ "-' r . _ri..; "' -~ . ..... _ e .. ~ ..- lt"!' --trial tende a mtegrar be!R_.dema1s em seus moles as for-

    ~:.., .,., . ~ -1" - --r.....,.._ ,,q. 'if:t.'J:"" - A - .....,._ ~(:;> f' '!):~ __,.,..,_~_. :qi~,s e ~ - contedos",de g,ue se apropri~: H portanto, ao ldi "'aencratizao propriamente fta (multiplicao pura e simple1?), unia vulgarizao (transformao tendo em vista a multiplicao) : um estudo de Chopin, depois de tratamento adequado, vira uma melodia de jukebox; uma melodia de Beethoven vira.. um ch-ch-ch cantado por Dalida; o Vermelho e o Negro no simplesmente tra-duzido da linguagem do romance para a linguagem do filme, ele adaptado para o grande pblico, isto , vulga-rizado. 0

  • ) Essa tendncia simplificadora. no provm da expres- ~

    so cinematogrfica em si mesma (por serem diferentes, os recursos artsticos do cinema no so menores que os t:. . .., do romance; por serem subdesenvolvidos seus recursos in- .~ telectuais, no so menos equivalentes), mas da natureza -~. presente da cultura de massa. Al_~:i .. E-is~.q . a, m~.m~. yglga- !. ,

    riz~~ fY{l,Q,iOQa ng,. s~ntido jpver~o . doJ ilme ~o rmance dele sado. ' ,.;.~

    ""-.t\: tendncia simplificao muitas vezes est em p de igualdade com a tendncia ao maniquesmo; polariza-se mais . nitidamente que na obra original o antagonismo entre o bem e o mal; acentuam-se traos simpticos .e tra"." os antipticos, a fim de aumentar a participao afetiva do espectador, tanto no seu apego pelos heris; como na sua repulsa pelos maus.

    A atualizao introduz a psicologia e a dramatizao moderna no seio de obra do passado. Pr exemplo, os fil-mes sobre os mrtires cristos estaro centrados sobre uma hist1ria de amor entre uma bela crist e um centurio romano, o filme Theodora mostra-nos- o grande amor da imperatriz C.2 Bizncio, o fara egpcio beijar na boca sua bela esposa, o amor moderno triunfar na antiguidade mais remota. Mais radical que a atualizao, a modernizao opera a transferncia pura e simples da ao do passado para o tempo presente: As Ligaes Amorosas so trans-plantadas para 1960.

    _ s~g;B!iV-%P~

  • -pulado por Vadim. Ela ap:r:ova o long playing ,mas condena as vulgaridades para jukebox. Contudo, fidelidade e trai-o em relao obra, popularizao e degradao da cul-tura se desenvolvem no interior de uma mesma corrente.

    O prolongamento cultural: o romance burgus

    Se tomamos um pouco de distncia, co_nstatamos que a cultura de massa no est em ruptura radical com as culturas literrias anteriores. Ela herdeira de um mo-vimento que comea com a tipografia. A tipografia inau-gura o que poderamos chamar de pleo-cultura de massa, no sentido de que ela atrai um lento movimento de demo-cratizao da cultura clssica (greco-latina-crist) e que ela sustenta a oultura burguesa.

    O movimento secular de democratizao da cultura escrita se efetua por etapas, mas sob o signo de uma tripla correlao : um progresso de burguesia corresponde pro-moo do romance e promoo da mulhe:r;.

    no sculo XVII que se afirma um duplo impulso romanesco do qual ainda no separamos . bem a relao dialtica : uma espcie de dualidade cultural parece opor a literatura aristocrtica (a do romance quimrico como L'Astre) nova literatura burguesa realista e terra-a-terra como a que inaugura o Romance burgus de F\Ire-tiere. Atravs de Boileau e Moliere que ridicularizam os romances de Mlle. da Scudry, femmes savantes e prcieu-ses ridicules, o burgus Crysale que reivindica orgulho-same_nte os direitos prosaicos do que j poderamos quase ohamar de realismo. Os romances de amor aventurosos, viagens no mapa da Ternura,13 sem dvida, ancestrais da imprensa amorosa, fogem, pelo contrrio_, .da vida prosaica e burguesa. Mas trata-se, a, de duas respostas para o mesmo prosasmo real. Na verdade, a cavalaria est bem morta e porque ela est morta, que sonhadores aristo-cratas e afetados burgueses empreendem sonhos romanes-

    1 :i Repr('Sentao, por meio de acidentes geogrficos, das vrias eta-pas do caminho que todo amante deve seguir no decorrer da aventura amorosa ~ elahorada por Mll e. de Scudry. - N. T.

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  • cos nos quais desabrocha a grande mitologia do amor sublime. A vida prosaica comea e chama, por um lado, os grandes sonhos compensadores de l'Astre, por outro, o novo realismo. Desde o sculo XVI o Don Quixote de Cervantes colocava rto segundo grau de ironia a contra-dio entre o sonho sublime e a realidade simples.

    No sculo XVII, o romance esquartejado entre os dois plos da quimera e do realismo, mas logo esses dois plos vo operar uma eletrlise de onde sair o romance moderno. Os temas de amor sero extrados dos romances de cavalaria (que se enfraquecer) para serem integrados no romance burgus que deixar de ser cnico e caricatu-ral para ficar realista. Dessa dupla transfuso que comea com La Princesse de eleves, no quadro aristocrtico, e que se ampliar at o quadro burgus nascer o romance bur-gus moderno no sculo XIX, romance de relaes, con-flitos, problemas entre os indivduos no seio de sua socie- dade, onde o amor desempenha um papel essencial.

    Albert Thibaudet ps em destaque os progressos cor-relativos ao sculo XIX da burguesia, da democracia, da mulher, do romance.14 Um momento-chave desse processo Madame Bovary. Em Madame Bovary,.~ a consumidora tpica do romance, a . burguesa ...... ffa, s e_ t~rria"" herona tpic~ d-. rpm,arce~ Emma se aborrece, soriha oin ~o amor, no pode satsfazer-se com a vida montona de provncia. E i::io romanesco que ela procura a sada e isto intervir em sua vida de modo pattico e irrisrio; ela viver esse grande amor, que.ao mesmo tempo ser uma pardia de amor, mas essa pardia ter sido vivida amargamente, a tal ponto que se transformar em tragdia e se resolv_er na morte. Pela primeira vez, to radicalmente desde Don

    Quixot~, mas dessa vez no plano feminino e burgus, oj>ro-ces.g_~"}~~~t}l~~o qJl.e_une,._9 l.titor -~),eit~ra) _.!J.9 Jl~ri (a h~rO:U) 00 r Q_,mf!.nce ~ impu1s1onado aj.e -~;..J!~:fn'rta~o: a QyJ;gy~_sonha!9J:a ~e _t~!l- 1;1. ,hen>r}.,a~do rfp~ne, ep-quanto a nrona do romance se. tornou o sonh.adra leitora

    - ... ~. ~ ....,, _..,., - ~ ....... ~-- ' ~....._, ' l!X"JZ" "":t'.. :~ ......... :,"' .. - -.;::-: bl!rfil!esa. Madaine Bovary o Don QUixote. do romance burgus. Don Quixote e Emma Bovary se matam a querer idealizar o mundo e se tornam as testemunhas nas quais se identificam um com o outro, o que R~n Girard chama

    ,....:: ... ,. . ::..- -.. "'

    14 Histoire de la lit trature franaise, Par is, Stock, 1930.

    57 r

  • ?e.~..W~~tir~ _ :9~;nt,ica,~~ ve:.~~4~-"'rODf.~E~s~:~5 ~,,~;s viY.;~rr1 es_s~~-y1fia -. h.fl?~~,ia, seffi!,:Qmric~ ~~911-y~ai1 , ou.,.!t;~~. o dilogo entre o. rom!,npe~ moiernQ...;.,e se' leitor .. . Q,.,.. cte.Urio del~s~ai'"rfasr J~i:1:.E?V~;%~d~a .,: t.r~g,,_dio_~~lo burgues, onde q amor 1'eal . se cnoca com o real, sem po-der ' frn-8iigyr_~ lo: Q'U.1xte-permriec~ci- amnt pl\nico

    :--i-

    '"!

    O romance popular

    No sculo XIX a corrente mais significativa do roman-ce burgus tende a criar uma relao bovarista entre a

    15 Mensonge romm1tique et vrit romanesque., PariB, Grasset, 1961

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  • obra e o leitor (sobretudo a leitora) enquanto surge e se desenvolve o romance popular.

    O imaginrio popular - o dos contos de r'sero, narra-es de saltimbancos, da tradio orai - se fixa na tipo-grafia a partir do sculo XVIII. So os romances de venda ambulante, levados ele casa em casa . pelos mercadores er-rantes , nos quais. se encontram contos da fadas, lendas, narraes maravilhqsas do folclore e nos quais se introdu-zem os temas, beirando 'o fantstico, do romance negro ingls . Nesse imaginrio popular, o extraordinrio mais

    a1imentad" cu"f'Citfia7i,ist'ft:::''g"rf~P:fe~'"''ie'pro1eKo doiffinams :c'.rY:enfe~tcfe :-"identifi'9 , ... "'c"'Ilt~~r

  • irrigam as grandes , cidades prosaicas, o rebulio do desco-nhecido submerge as noites das capitais, aventureiros de-senfreados reinam sobre as sombras da cidade, mendican-tes e vagabundos. Desse estranho casamento do realismo e J!9;:u.-~~~~?--~~~~~ a~nJ,,rav~~s_ p,:opi~r:P:cm_~fsias, essas dras-pnmasfioJe e'ftl dia desco i'c1as que so os Misteres de Paris, Le Juif Errant, de Eugene Sue, Le.s Mis-teres de Londres, de Paul Fval, Les Aventures de Rocam-bole, de Ponson du Terrail, sem falar nesses romances "histricos" que transformam a histria como a Ilada transformava a conquista de Tria, mas sem fazerem in-tervir os deuses (a srie dos Dumas, O Corcunda de Notre Dame, de Paul Fval, Les Pardaillari, de Michel Zvaco, etc.).

    Diversamente da tendncil:J. burnuesa (que vai em di-reo do psicologismo, '"-os co11-fJifos-.de sentiments' e de caracteres, dramas ou comdias triangular~s ao espso, do amante e da mulher adltera) a orrente~,popular perma-

    ~ - ~ . ~ ~:.(~ N;Yi>-' nece fiel aos temas melodramticos (mistrio do nasci-mento, substituio de crianas, padr~stos~'-e. mdrastas, identidades falsas, disfarces, ssias, gmeos, "rechaos ex-traordinl-ios, falsas mortes, perseguio ia inricia), herdeiros da mais antig e universal tradio . do }magin-rio (a tragdia grega, o drama elisabetano), rrias adaptada ao quadro urbano moderno. No comeo do_ -s~cuO:, ., a diferenciao entre as duas corrente.. se precisa, .. tanto mais que durante os trinta primeiros an_os do s~Gulo a corrente popular que ser integrada no cinema e no fo-lhetim barato. ,.

    A cultura-industrial nascente - imprensa popular e cinema mudo - no faz seno investir na corrente do imaginrio popular. Nenhuma ruptura, portanto. Os ro-mances-folhetins e os filmes folhetinescos se multiplicam sobre os mesmos modelos. E efetivamente, o pblico das primeiras dcadas do cinema o pblico popular, o mes-mo que o dos folhetins de grande tiragem.

    Mas desde 1920, e sobretudo a partir de 1930, os temas do imaginrio burgus se desenvolvem (paixo el'l-tre uma mulher casada e um amante, indivduo que quer se afirmar em sua vida privada e que busca o sucesso, ate-nuao ou desaparecimento dos caracteres melodratnti-

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  • cos da intriga em benefcio do realismo) . No seno por vo~ta de 19~-~j~~,~,.s.ug:_,coz:n~~ ft _Sf! o:r~~}rn~ E;~t~5io_s Umdos, a partir dessas-du"S correntes e com a c;outnl5m-

    3J:I"/~"' """'' ~ ..., ... .;... .. ~ . -.r ~"' ~~i--""I; - __ ,.... ~;i;.,.;.. _, ..::;:::::'"""~ .:-"7!'

    g. d!_E;le;tp~JJt~ IiP.Y.9.~~ 1fJP.~sJn_g,eti~!E~., , ,Q\le . \'.~i ?a.L cultura de massa suas carac,tensficas ortgmais. Porque, desdit"nto emergem -os -novcis desenvolvments que mo-dificam as condies de vida das classes populares, os no-vos quadros da civilizao tcnica.

    Assim os contedos da cultura de massa no foram fabricados artificialmente. A cultura de massa, em certo sen,llilo - o sentido indicado -acima' -'-, .. a. ... herdeira,'e a contip~.9,ra do mQYimento c_ultJJ.r~! jias sQ~edjl.des oci-dentais. Nft__ ,uUura ~de I!lassa vo c;onfl:y.lr, _a"'s.,du11s_ ~ouentes com as guas freqentemente misturadas, e, no entanto,

    fof!:enfnte :,=~ifr~n2.efjs_,,J~qgo que ::indu~I~ali_ia'C;o da cultu~a~ ~pa:r:_ec~: _a ~9~E~IJ,t~ .. I?P?~~a,.r~ ~ - a_ c..or.re,.p~bu~gu_~sa, a primeira dohlmando, de m1c10, a segunda se Clesenvol-vendo em seguida. A cultura d~ massa integra esses,.con-tel}.dos, mas_,_para,, logo desinfegr-ls ' operar uma nova. metamorfose.

    Os contedos da cultura impressa do sculo XIX con-correm para a cultura de massa do sculo XX; alimentam-na, e nela se metamorfoseiam progressivamente. Sem que-rer no momento examinar essa metamorfose em si mesma, preciso, contudo, examinar as conseqncias culturais oriundas diretamente das inovaes tcnicas que condicio-naram a nova cultura: a rapidez das transmisses do jornal moderno, a implantao das salas de cinema nas cidades e depois no campo e, sobretudo, a telecomunicao que operam rdio e televiso toi:n,.agi a cultura de~ ql.a~a__Q!lipresente. Ela est em toc,ia parte para~'todos, acompanha at~ o' solit_;io que j'V, sell. trans1str a tircoio. . --

    ,_ Esse dupl carter de extenso e" de intensificao em relao cultura impressa marca a etapa que separa uma industrializao evoluda e generalizada de uma industria-lizao primitiva e restrita. Mas essa diferena quantita-tiva ao criar um mercado universal, a possibilidade de atender a um pblico global a cada instante, cria de um mesmo golpe as condies de uma diferenciao qualitativa.

    Uma outra diferenciao qualitativa aparece com o cinema, o rdio, a televiso. O impresso um sinal abs-

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  • >

    ..

    .

    trato: a imagem impressa imvel. O filme, a televiso, o rdio reproduzem diretamente a vida em seu movimento real.

    Podemos, portanto, prolongar aqui uma proposio antecedente: a cultura impressa se integra na cultura in-

    ) ~ - -.,~,..~ -... ~~~ - - -~ dustrial, no para nel_se destruir, :rnas -par~ _nela se me-~ ... ~ ;,. ~ ~ - ~ _.. - .~ .... ~- - ~ ~-....,._, ... tamo~rfsear.- Essa metamorfose se d a partir do carter n~v9}rJii~q_>_ :ee19~:.pog_er .. ~ jn_!~~ifia~t~.,-~9-e 'xtns,o ilimitada das mas.s media e, mais largamente; p1 fiova

    civf~"o . qe criou essa -extenso "'e essa fotensific o (a-ivilizao tcnica) e que, a9 l'l}~smo tempq, criada por es~a extenso ~ ess'a intensl.ficao. Ela se dlgual-mente a: prtir do arter 'nov o das t cnicas que trazem o movimento real, a presena viva.

    Os folclores, as culturas do hic e do nunc

    Pelo movimento real e a presena viva, a cultura de massa reencontra um carter d_a cultura pr-impressa, fol-clrica ou ainda arcaica: a presena visvel dos seres e das coisas, a presena permanente do mundo invisvel. Os cantos, danas, jogos, ritmos do rdio, da televiso, do cinema ressuscitam o universo das festas, danas, jogos, ritmos dos velhos folclores. Os doubles da tela e do vdeo, as vozes radiofnicas so um pouco como esses espritos fantasmas, gnios que perseguiam permanentemente o ho-mem arcaico e se reencarnavam em suas festas. A presena viva, humana, a expresso viva dos gestos, mmicas, vozes, a participao coletiva so reintroduzidas na cultura in-dustrial ainda que fossem escorraadas pela cultura im-pressa. Mas, em revanche, a cultura de massa quebra a unidade da cultura arcaica na qual num mesmo lugar todos participavam ao mesmo tempo como atores e espectado-res da festa, do rito, da cerimnia. Ela separa fisicamente espectadores e atores. O espectador s participa fisica-mente do espetculo televisado, do filme, do programa de rdio; e mesmo nos grandes espetculos esportivos, se ele est presente fisicamente, no joga.

    Do mesmo modo, a "festa'', momento su