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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI
ROSENI GUIMARÃES CORRÊA DE MORAES
CULTURA MULTITELAS: Múltiplas histórias em uma rede de telas conectadas
SÃO PAULO 2016
ROSENI GUIMARÃES CORRÊA DE MORAES
CULTURA MULTITELAS: Múltiplas histórias em uma rede de telas conectadas
Dissertação de Mestrado apresentada à Banca Examinadora, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre do Programa de Mestrado em Comunicação, área de concentração em Comunicação Audiovisual da Universidade Anhembi Morumbi, sob a orientação do Prof. Dr. Vicente Gosciola.
SÃO PAULO 2016
ROSENI GUIMARÃES CORRÊA DE MORAES
CULTURA MULTITELAS: Múltiplas histórias em uma rede de telas conectadas
Dissertação de Mestrado apresentada à Banca Examinadora, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre do Programa de Mestrado em Comunicação, área de concentração em Comunicação Audiovisual da Universidade Anhembi Morumbi, sob a orientação do Prof. Dr. Vicente Gosciola.
Aprovado em ----/-----/-----
Prof. Dr. Vicente Gosciola
Profa. Dra. Maria Ignês Carlos Magno
Prof. Dr. Roberto Gondo Macedo
Para Meu marido Marcio e meus filhos Caio, André e Bruno. Só com vocês, meus amores, é que tudo faz sentido. Meu irmão Rubens Aires. Por esta e por todas as nossas outras vidas juntos. Meus pais, Rubens (in memoriam) e Ruth. Essa foi para e por vocês. Tomara que
continuem sempre se orgulhando de mim.
AGRADECIMENTOS
Tenho muitos motivos para agradecer, porém quero destacar alguns casos em
especial.
A todos os anjos que foram colocados ao meu lado, para ajudar, apoiar, salvar, cobrir,
iluminar, acalmar e principalmente não me deixar sair dos trilhos.
A dois queridos amigos que influenciaram diretamente a minha dissertação. Carlos
William, por me apresentar ao mundo multitela, e Fabiano Pereira por nunca me deixar
esquecer que a tecnologia não é tudo, acreditando, incansavelmente, que eu
conseguiria mostrar isso aqui.
Ao Prof. Dr. Renato Pucci Júnior por sua dedicação, estímulo e exemplo. Aprendi tanto
com você, meu querido mestre! Pena que eu perdi a aula sobre o Columbo.
À Prof. Dra. Maria Ignês Carlos Magno. Baixinha e tímida, ela vira um gigante quando
está ensinando. Obrigada por cada palavra e pelo sorriso que a acompanha.
À Prof Dra. Sheila Schvarzman e ao Prof. Dr. Luiz Vadico por excelentes momentos
na disciplina obrigatória.
Ao meu orientador Prof. Dr. Vicente Gosciola, por ser uma inspiração constante, além
de sua generosidade e carinho me apoiando em todos os momentos. Terá para
sempre a minha admiração pela pessoa, pelo pesquisador e pelo mestre que me
conduziu no início desse caminho sem fim que é a produção de conhecimento.
Ao Prof. Dr. Luiz Alberto B. de Farias meu diretor favorito, meu amigo querido, minha
referência profissional, e simplesmente um ser humano maravilhoso. Impossível ficar
cinco minutos ao seu lado e não aprender alguma coisa nova.
Resumo
As transformações tecnológicas digitais têm provocado mudanças na forma do público
interagir com o mundo a sua volta. A farta disponibilidade de dispositivos móveis tem
propiciado aos indivíduos que nunca se desconectem e, portanto, aproveitem as
características das várias telas oferecidas. O presente estudo pretende identificar as
relações entre as evoluções tecnológicas e o uso que se faz delas, focando
especificamente os processos comunicacionais organizados por múltiplas telas,
fenômeno cada vez mais comum no mundo contemporâneo. Diante disso, nosso
objetivo aqui é mapear a evolução da distribuição de conteúdo em telas, observando
o desenvolvimento tecnológico da tela luminosa desde seu surgimento até o
desdobramento nas diversas telas disponíveis. Essa condução justifica-se pelo fato
de que comungamos a era da tela total, uma mutação cultural que está em curso,
afetando cada vez mais, não só a comunicação, como a própria existência humana.
As telas têm ganhado cada vez mais importância nas nossas atividades diárias, assim
como continuam se desenvolvendo no sentido da convergência, intercomunicação e
interconexão. Elas mediam nossas relações com o mundo e interferem na nossa
maneira de contar histórias. Dessa forma, uma dinâmica transmidiática também pode
ser estudada à medida em que as telas fazem parte das várias plataformas de
distribuição de conteúdo e de acordo com suas peculiaridades podem contar parte de
uma história. Conclui-se que as telas disponibilizadas em todas as dimensões afetam
nosso cotidiano e nos fazem dar sentido ao mundo em que vivemos.
Palavras Chave: telas, multitela, tecnologia, dispositivos móveis, comunicação
Abstract
Digital technological transformations have led to changes in the way the public interact
with the world around them. The easy availability of mobile devices has allowed
individuals who never disconnect and, therefore, take advantage of the characteristics
of the various screens offered. This study aims to identify the relationship between
technological developments and the use made of them, specifically focusing on the
communication processes organized by multiple screens, increasingly common
phenomenon in the contemporary world. In that way, our goal here is to map the
evolution of content distribution on screens, watching the technological development
of the luminous screen since its inception to deployment in the various screens
available. This is justified by the fact that we share the era of the total screen, a cultural
mutation that is ongoing, increasingly affecting not only communication, as human
existence itself. The screens have gained increasing importance in our daily activities,
and they continue developing towards convergence, interconnection and
intercommunication. They mediate our relationships with the world and interfere in our
way of telling stories. Thus, a transmedia dynamic could also be studied, once screens
can be considered part of various content distribution platforms and in accordance with
its peculiarities tell part of a story. We conclude that the screens available in all
dimensions affect our daily lives and take us to find a sense to the world we live in.
Keywords: screens, multi-screen, technology, mobile devices, communication.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Placa comemorativa da primeira transmissão de TV. ............................... 17
Figura 2 - A Evolução da resolução da TV. ............................................................... 17
Figura 3 - Aparelho de TV dos anos 30. .................................................................... 18
Figura 4 - ENIAC o primeiro computador eletromecânico ......................................... 21
Figura 5 - IBM 7094 o grande sucesso da segunda geração .................................... 22
Figura 6 - O Apple II .................................................................................................. 23
Figura 7 - A primeira videoconferência da história .................................................... 24
Figura 8 - Smalltalk ................................................................................................... 25
Figura 9 - Sistema operacional 1.0 do Lisa ............................................................... 26
Figura 10 - Primeira versão do Microsoft Windows ................................................... 27
Figura 11 - Aqua, uma interface do Macintosh .......................................................... 28
Figura 12 - Windows 7 .............................................................................................. 28
Figura 13 - O Compiz e o efeito 3D ........................................................................... 29
Figura 14 - Osborne 1 o primeiro computador portátil ............................................... 30
Figura 15 - Compaq Portable .................................................................................... 30
Figura 16 - Epson HX-20 ........................................................................................... 31
Figura 17 - O primeiro notebook dobrável ................................................................. 31
Figura 18 - JOGO OXO ............................................................................................. 34
Figura 19 - Ralph Baer e sua Brown Box .................................................................. 35
Figura 20 - Galaxy Game Machine ............................................................................ 36
Figura 21 – Game Boy .............................................................................................. 37
Figura 22 - Cena do game The last of us .................................................................. 39
Figura 23 - IBM Simon 1993 ...................................................................................... 41
Figura 24 - Ericsson R380 – o primeiro smartphone ................................................. 41
Figura 25 - O Nokia 5110 e o jogo Snake ................................................................. 42
Figura 26 - Motorola Razr V3 .................................................................................... 43
Figura 27 - Les affiches un goguette – Os pôsteres estáticos ................................... 55
Figura 28 - Les affiches un goguette - Os pôsteres ganham vida ............................ 55
Figura 29 - Lindsay Lohan em The parent trap ......................................................... 56
Figura 30 - Sixty cameras against the war ................................................................ 57
Figura 31 - Sugar Water ............................................................................................ 58
Figura 32 - Kinoautomat ............................................................................................ 59
Figura 33 - Circle Vision ............................................................................................ 61
Figura 34 - We are Young ......................................................................................... 62
Figura 35 - Labyrinth – 1967 ..................................................................................... 63
Figura 36 - Diopolyecran ........................................................................................... 63
Figura 37 - Pôster da animação Minions (2015) ........................................................ 87
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Dispositivo preferido para acessar diferentes tipos de conteúdo digital ... 71
Tabela 2 - Frequência de acesso a conteúdo digital ................................................. 72
Tabela 3 - Reclamações de consumidores que assistem vídeos na internet ............ 73
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 - Uso de telas Brasil de 2012 à 2016 ......................................................... 70
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 13
1 A tela dentro da história: de uma tela ao tudo-tela. ....................................... 16
1.1 De olho na tela ............................................................................................. 16
1.1.1 A Televisão ............................................................................................ 16
1.1.2 O Computador ....................................................................................... 20
1.1.2.1 A Interface Gráfica com o Usuário (GUI) ............................................ 23
1.1.2.2 Os notebooks ..................................................................................... 29
1.1.2.3 Algumas reflexões sobre o computador ............................................. 32
1.1.3 Os Videogames ..................................................................................... 34
1.1.4 Os smartphones .................................................................................... 40
1.2 A tela e suas relações com o corpo e as sensações ................................... 46
1.2.1 A interatividade ...................................................................................... 46
1.2.2 A materialidade da Comunicação .......................................................... 47
1.3 A tela na era da comunicação instantânea e fragmentada .......................... 49
2 A divisão da tela: da sala de cinema à mobilidade e interatividade ............. 54
2.1 Split Screen: uma tela, múltiplas divisões. ................................................... 56
2.2 Multi screen: A Expo 67 e suas múltiplas telas. ........................................... 60
2.3 Second Screen: telas conectadas ................................................................ 64
2.4 Um olhar sobre o novo mundo multitelas. .................................................... 66
3 Múltiplas histórias em uma rede de telas conectadas .................................. 77
3.1 Storytelling: contar e recontar histórias ........................................................ 80
3.1.1 Os contos de fadas recontados em versões contemporâneas. ............. 81
3.1.2 As flexi-narratives e a atenção do telespectador. .................................. 84
3.2 Transmidia Storytelling - construir universos ......................................... 86
3.3 Fan Fiction: os fãs ganham as telas ......................................................... 89
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 91
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................................... 94
APÊNDICE 1 – A internet das coisas .................................................................. 98
ANEXOS .............................................................................................................. 100
13
INTRODUÇÃO
As décadas que fecharam o século XX ficaram marcadas por acelerar os
avanços na tecnologia, bem como pelo subsequente desenvolvimento de todos os
tipos de comunicação. Das mudanças políticas e sociais à tecnologia mais avançada,
o centro das transformações sempre esteve focado numa curiosidade incansável e na
necessidade que moveu o homem.
Sob essa perspectiva, neste estudo, pretendo identificar as relações entre os
avanços tecnológicos dos meios de comunicação e o uso de múltiplas telas, um
fenômeno contemporâneo. Sendo assim, o objetivo desta pesquisa é mapear o
desenvolvimento da divisão do conteúdo comunicacional em múltiplas telas, de forma
a avaliar, os aspectos que envolvem os saltos evolutivos da tecnologia começando
pelo surgimento da tela do cinema até o seu desmembramento em várias outras telas.
Nesse cenário, as mudanças que levam à evolução humana não parecem dar
sinais de redução, portanto é preciso aceitar a mudança como um fator constante.
Uma vez que um screenager1 interage com o universo a sua volta de uma forma
diametralmente oposta à de seu avô, algumas questões permeiam esta pesquisa. Por
que tem funcionado no mundo de hoje a condição de pessoas lerem, assistirem e
ouvirem simultaneamente, conteúdo disperso por telas dos mais variados dispositivos
de comunicação e entretenimento? Onde teria começado essa tendência? Como teria
se desenvolvido? E como se apresenta no contexto atual? Nossa hipótese de resposta
a essas perguntas, encontra-se na complexidade do mundo contemporâneo,
permeado pela velocidade e fragmentação das mensagens. Penso que o contexto em
que vivemos faz com que as pessoas recorram à tecnologia para conseguirem dar
sentido às transformações profundas pelas quais estamos passando.
Ao falar em tecnologia assumo aqui o conceito proposto por Álvaro Vieira Pinto
no sentido de que ela abrange “o conjunto de todas as técnicas de que dispõe uma
determinada sociedade, em qualquer fase histórica de seu desenvolvimento” (PINTO,
2005 p.219). Julgo que para aquilo a que este estudo se propõe esta definição será
suficiente para sustentar minhas análises, uma vez que quando me refiro à tecnologia
1 Screenager é um termo cunhado por Douglas Rushkoff e que significa a criança nascida numa cultura mediada pela televisão e pelo computador (RUSHKOFF, 1999 p. 9)
14
pretendo me ater àquela que se refere aos dispositivos que de alguma forma têm
relação com a tela luminosa.
Para entender o funcionamento do mundo contemporâneo no que tange ao uso
de múltiplas telas, foi preciso fazer um breve resgate histórico em busca da evolução
tecnológica do dispositivo luminoso que mudou a maneira como o mundo entendia o
entretenimento. No primeiro capítulo é possível acompanhar a evolução tecnológica
dos meios de comunicação, tomando por base a condução descrita por Asa Briggs e
Peter Burke (2006) quando se propuseram a fazer um estudo social da mídia. Nesse
capítulo são contemplados os meios de comunicação que estão relacionados à uma
tela, tais como: a televisão, o computador - desdobrado no nascer da interface gráfica
com o usuário, e o notebook – assim como o videogame e os smartphones. Conhecer
os aspectos históricos que levaram ao desenvolvimento desses meios, é uma jornada
esclarecedora, principalmente quando os analisamos à luz de algumas considerações
de Marshal McLuhan. As discussões seguem contemplando os fatores que dizem
respeito à interatividade e sua relação com a materialidade da comunicação,
fundamentada em Hans Ulrich Gumbrecht (1998), um de seus principais articuladores.
Também é observado o andamento da comunicação linear até a comunicação
fragmentada do mundo contemporâneo, contando com a ajuda de Zygmunt Baumann
(2001), Douglas Rushkoff (1999), André Gorz (2005) para entender como chegamos
até a proliferação dos dispositivos móveis, além de Vilém Flusser (2008) e seus
estudos sobre as tecno-imagens.
O capítulo 2 focaliza a divisão do conteúdo em múltiplas telas, tendo como base
algumas pesquisas sobre o uso de várias telas simultaneamente. Dessa forma,
buscamos informações em Institutos de Pesquisa confiáveis, como o Nielsen
Researches, e a Accenture consultoria em tecnologia. Além disso analisamos uma
pesquisa realizada pela Microsoft em 2014, que aborda diretamente o assunto aqui
pesquisado. Para isso, contamos com a contribuição de Jean Baudrillard (2011),
Henry Jenkins (2008) e Judy Ungar Franks (2011), que nos permitiram entender de
que maneira procuramos dar algum sentido ao mundo à nossa volta, em meio à
complexidade contemporânea. Também foram observadas as formas de divisão do
conteúdo entre as telas e descritas as experiências feitas com múltiplas telas na Expo
67 no Canadá.
No capítulo 3, estudamos as telas sob o ponto de vista da conexão. A formação
de redes digitais é analisada sob a tutela de Massimo di Felice e Ronaldo Lemos
15
(2014). O impacto das novas conformações do nosso cotidiano, decorrentes dos
avanços na tecnologia digital, é demonstrado por meio de algumas estratégias da
indústria do entretenimento para despertar a atenção do público. As novas mídias e o
panorama midiático contemporâneo são pensados em conjunto com Henry Jenkins
(2008) e Vicente Gosciola (2003), que nos levam a conhecer os elementos que
caracterizam uma narrativa transmídia. Por sua vez, contemplamos as estruturas
narrativas complexas, bem como a forte participação dos fãs no processo de contar
histórias.
Por fim, acredito que com esse estudo, possamos contribuir para que mais
pessoas se concentrem nas implicações da sedimentação da cultura telânica proposta
por Gilles Lipovetsky (2009). Estamos em meio a um processo de transição,
acompanhando de perto as mudanças provocadas no cenário midiático, que estão
nos afetando diariamente. Observar a evolução das telas é, também entender como
a comunicação vem estabelecendo novos paradigmas.
16
1 A tela dentro da história: de uma tela ao tudo-tela.
1.1 De olho na tela
O século XX trouxe consigo uma novidade que modificaria o mundo e o
comportamento das pessoas em relação ao entretenimento. O cinema surge como
uma inovação e nasce a partir “de um dispositivo de imagem radicalmente inédito e
moderno: a tela ou o ecrã. Não mais a cena teatral ou a tela do quadro, mas o ecrã
luminoso, a grande tela, a tela onde a vida se dá a ver em seu movimento. ”
(LIPOVETSKY, 2009 p.11).
Durante a segunda metade do século XX surgiram novas técnicas de difusão
da imagem e estas acrescentaram outras telas à tela branca do cinema. A televisão
nos anos 50 iniciou esse processo penetrando nos lares; nas décadas seguintes o
computador, os videogames, a Internet, a World Wide Web, os smartphones, as
máquinas fotográficas digitais, o GPS e os tablets, acrescentaram uma nova dimensão
à maneira como nos relacionamos com o entretenimento e com o mundo.
.
A Televisão
As histórias do rádio e da televisão tiveram uma relação muito próxima por
tratarem da transmissão de imagens e palavras. As grandes corporações que já
haviam trabalhado com o rádio, também passaram a controlar a produção de imagens
nas telas da televisão na época de seu surgimento em escala comercial.
O cientista escocês John Logie Bardie é considerado o inventor da televisão
mecânica. Ele foi o criador de um sistema composto por um disco giratório perfurado,
no qual luzes de néon se ascendiam na parte de trás em resposta ao sinal de uma
estação de rádio que capturava as imagens por meio de um disco semelhante. Havia
então, muita interferência sonora, ainda assim, esse foi considerado o primeiro
aparelho a reproduzir imagens em movimento com 32 linhas de resolução. A
resolução de uma imagem determina o seu grau de detalhamento. Quanto mais alta
a resolução, mais detalhes podem ser percebidos nela. Em 1924, Baird conseguiu
realizar uma experiência bastante incipiente transmitindo uma imagem trêmula a uma
distância de 10 pés. Em 26 de Janeiro de 1926 fez uma exibição pública em um
17
laboratório, na frente dos membros da Royal Institution e de um jornalista do jornal
americano TheTimes.
Figura 1 - Placa comemorativa da primeira transmissão de TV.
Disponível em http://www.telegraph.co.uk/technology/google/google-doodle/12121474/Who-invented-the-television-John-Logie-Baird-created-the-TV-in-1926.html. Acesso em 31/01/2016
Em 1928 a imagem do Gato Félix, era utilizada para ajustar os aparelhos de
transmissão, uma vez que seu desenho, feito em preto e branco, era perfeito para
regular os equipamentos que tinham acabado ser inventados. A figura do gato, feita
em papel, era transmitida durante duas horas por dia e as imagens recebidas eram
de apenas dois centímetros de altura.
Figura 2 - A Evolução da resolução da TV.
Disponível em http://www.felixthecat.com/history.html. Acesso em 20/07/2015.
A televisão mecânica não teve uma vida muito longa, sendo substituída pela
televisão eletrônica ainda na década de 1930. A partir daí a resolução da imagem
evoluiu significativamente, chegando até 405 linhas.
Por volta de 1930 quase nenhum país possuía canais de televisão regulares,
apesar da palavra televisão ter sido inventada em 1900 na França e as experiências
18
de desenvolvimento da tecnologia necessária para sua existência remontassem ao
século XIX. Ainda assim, essa década foi crucial para seu aprimoramento. Em 1939 a
televisão foi exposta para o público na Feira Mundial de Nova York, mas somente em
1941, quando os Estados Unidos entraram na Segunda Guerra Mundial, a NBC e a
CBS começaram a fazer algumas transmissões regulares, porém bastante limitadas.
Nesse período, as telas de TV, tinham em média cinco polegadas, ou seja, era muito
difícil assistir qualquer transmissão.
Figura 3 - Aparelho de TV dos anos 30.
Disponível em: http://ibxk.com.br/materias/2397/5594.jpg?w=700. Acesso em 20/07/2015
Ao longo do tempo, a resolução das imagens melhorou consideravelmente,
passando das 60 linhas para até 405. Os Estados Unidos, bem como a Europa eram
qualificados como os líderes nos avanços tecnológicos, e em 1937, o desfile da
coroação do Rei George VI foi assistido por mais de cinquenta mil pessoas em
Londres, na Inglaterra, por isso é considerado a primeira transmissão ao vivo da
história da televisão.
Nos anos 1940, foi realizada a primeira transmissão em cores que se tem
notícia e as transmissões esportivas e os primeiros telejornais começaram a ganhar
destaque, mas somente na década de 1950 a televisão ganhou os lares americanos,
conforme destacam Asa Briggs e Peter Burke:
19
Com a oferta de poucos programas, a produção de aparelhos cresceu consideravelmente entre 1947 e 1952, de 178 mil para 15 milhões; em 1952 havia mais de 20 milhões de aparelhos em uso. Mais de um terço da população norte-americana tinha um: os dados para 1948 eram de 0,4%, com significativa proporção de aparelhos em bares, não em casas. (BRIGGS; BURKE, 2006, p. 234)
Em 1948 a Revista Business Week se referiu à televisão como “o mais recente
e valorizado bem de luxo do cidadão comum” (apud BRIGGS; BURKE, 2006, p. 234).
Começava então a formação de uma audiência de massa, e desta vez um evento a
ser destacado é a coroação da rainha Elizabeth II em 1953, vista por cerca de 20
milhões de pessoas.
Marshall McLuhan afirma em seu livro A Galáxia de Gutenberg, escrito em
1962, que até o surgimento da televisão vivíamos numa era em que o conhecimento
era entendido apenas na dimensão escrita. Para o autor, a transmissão oral do
conhecimento, por meio de lendas, histórias e tradições foi substancialmente
transformada com o advento da imprensa. Ao mesmo tempo que ampliava o acesso
ao conhecimento também reduzia a comunicação à condição escrita.
McLuhan buscava compreender os esforços do homem em desenvolver-se e
adaptar o mundo às suas necessidades, assim como procurava entender de que
maneira a criação de tecnologias lhes aprimoravam os sentidos, e que tipos de efeitos
sociais e psicológicos poderiam ser desenvolvidos consequentemente. Para ele a
tecnologia não é apenas um conjunto de novas invenções e sim os meios pelos quais
as pessoas são reinventadas. Foi nesta obra que ele cunhou o termo Aldeia Global
que se refere a um espaço de convergência onde a comunicação seria diretamente
afetada pelas novas tecnologias e passaria a ser exercida de maneira direta e sem
barreiras. Dessa forma, haveria uma interconexão das mídias de massa que gerariam
uma cultura global, portanto, com a evolução da tecnologia da informação o mundo
se transformaria numa pequena aldeia com dimensões globais onde todos poderiam
conversar e até os menores fatos alcançariam tais dimensões. Como paradigma da
Aldeia Global, o autor destacou a televisão, já que este era o meio de comunicação
de massa que estava sendo integrado por satélite e por isso ganhava alcance
internacional.
O conceito de Aldeia Global foi duramente criticado chegando a ser
considerado utópico para a época. McLuhan entendia que nessa aldeia global haveria
não só uma interligação geográfica mundial, mas também uma colaboração na luta
20
por ideiais comuns. Em meio à Guerra Fria e uma possível destruição nuclear, essa
visão parecia otimista demais. No entanto, com o aperfeiçoamento dos computadores
e a chegada da Internet, a antiga ideia tornou-se plausível, principalmente se
considerarmos como a rede causou mudanças no aspecto relativo ao comportamento
social.
O Computador
Os computadores que usamos hoje são decorrentes de uma evolução que
levou muitas décadas para chegar aonde está, e até o momento não há como
enxergar um final para esse desenvolvimento. Se pensarmos nas últimas novidades
desse campo, imaginar as máquinas que iniciaram a era da informática parece uma
empreitada ainda mais complexa.
As primeiras máquinas de computar começaram a ser idealizadas no século
XVII e em geral tinham a função fazer cálculos básicos como somar, subtrair,
multiplicar e dividir. A principal diferença entre elas e um computador de uso geral é
que aqueles aparelhos não eram programáveis. A função de programar surgiu a partir
da necessidade de que as máquinas de tecer produzissem padrões de cores
diferentes. Assim, no século XVIII, foram criados mecanismos com essa finalidade, e
para tanto usavam cartões perfurados. Esta ideia levou matemáticos a desenvolverem
calculadoras controladas por cartões.
Um tipo de computador eletromecânico foi construído em 1936 por Konrad
Zuze, mas foi somente na Segunda Guerra Mundial que nasceram os computadores
parecidos com os atuais. O, por exemplo, ENIAC (Eletronic Numeric Integrator And
Calculator) foi desenvolvido para fazer cálculos de trajetórias balísticas e por isso o
governo americano o manteve em segredo até o final da guerra. Não havia, naquela
época, uma linguagem padronizada de programação, portanto, era necessário
reprogramar os computadores, da chamada primeira geração, toda vez houvesse um
novo problema a ser calculado. O ENIAC pesava 30 toneladas e usava 18 mil válvulas.
21
Figura 4 - ENIAC o primeiro computador eletromecânico
Disponível em: http://www.computerhistory.org/revolution/birth-of-the-computer/4/78/316.
Acesso em 20/07/2016
A chamada primeira geração de computadores foi de 1940 até 1959. Eles eram
muito grandes e constantemente acometidos por superaquecimento, pois utilizavam
válvulas elétricas que possibilitavam a amplificação e troca de sinais por meio de
pulsos, ou seja, cada válvula acesa ou apagada representava uma instrução. Essas
válvulas precisavam ser trocadas com bastante frequência, o que acarretava um alto
custo de manutenção e tornava essas máquinas pouco rentáveis. Sendo assim estava
se tornando cada dia mais urgente substituir as válvulas elétricas por uma nova
tecnologia que não provocasse esse aquecimento excessivo.
Foi então que os transistores, que haviam sido criados em 1947 nos
laboratórios da empresa Bell Telephone, foram incorporados aos painéis de uma nova
geração de computadores. Uma das principais consequências da substituição das
válvulas pelos transistores, foi a significativa redução nas dimensões das máquinas,
tonando os computadores da segunda geração (1959-1965) aproximadamente cem
vezes menores que os anteriores. Considerado um grande avanço, o IBM 7094 foi o
computador de maior sucesso da segunda geração, pesando 890 kg.
22
Figura 5 - IBM 7094 o grande sucesso da segunda geração
Disponível em http://www-03.ibm.com/ibm/history/exhibits/mainframe/mainframe_PP7094.html Acesso em 20/07/2016
Os transistores também tornaram as máquinas mais econômicas no que diz
respeito ao consumo energético, bem como no que se referia aos preços das peças.
Isso se deve ao fato de serem fabricados a partir do silício, elemento químico
encontrado abundantemente na natureza. Materiais feitos com silício têm
condutividade elétrica maior do que a de um isolante e menor do que um condutor,
por isso foram chamados de semicondutores. Foi esse novo componente que
assegurou um considerável incremento na velocidade e no desempenho dos
computadores da terceira geração, entre 1965 e 1970, fazendo com que eles
pudessem realizar mais tarefas em espaços de tempo mais curtos. Nesse período
apareceram os primeiros monitores e os equipamentos ficaram mais acessíveis.
Porém é na quarta geração (1970 até hoje) que encontramos computadores
mais próximos dos que usamos atualmente, pois foram os primeiros a serem
denominados microcomputadores, pelo fato de pesarem menos de 20 kg. Os
microprocessadores2 foram os agentes da redução das dimensões das máquinas. Os
computadores pessoais começaram a ser comercializados apenas na metade da
década de 1970 e foi com base neles que personagens como Bill Gates e Steve Jobs
criaram as máquinas que iriam modificar nosso modo de vida.
2 Microprocessador é o circuito integrado responsável pelos cálculos matemáticos que viabilizam as ações de um computador.
23
Em 1976 Steve Jobs, Steve Wozniac e Ronald Wayne criaram a Apple
Computer, Inc. com o objetivo de popularizar os computadores pessoais entre
usuários que não dominavam as especificidades da informática. O Apple 1 foi o projeto
pioneiro, mas foi seu sucessor, o Apple II que apresentou um grande avanço.
Modificações em seu sistema permitiam a utilização de processadores de texto,
planilhas eletrônicas e bancos de dados, além de uma interface gráfica para alguns
softwares. A Apple também abriu a era dos mouses na computação pessoal, assim
como dos sistemas operacionais gráficos com o projeto Macintosh, que inspirou sua
principal concorrente, a Microsoft a lançar o Windows.
Figura 6 - O Apple II
Disponível em: http://www.vintage-computer.com/apple_ii_plus.shtml . Acesso em 24/07/2016.
1.1.2.1 A Interface Gráfica com o Usuário (GUI - Graphical User Interface)
De acordo com o Dicionário Michaelis, uma Interface Gráfica com o Usuário é
o campo onde acontece a comunicação entre um sistema operacional e o usuário
“que lhe permite utilizar listas de menus e ícones para eleger comandos, iniciar
programas, ver listas de arquivos, entre outros.”. A idealização de uma interface como
essa, começou muito antes que houvesse a tecnologia necessária para sua
implementação, uma vez que a interação entre homem e máquina sempre foi uma
24
preocupação para a indústria da informática. Ao longo de algumas décadas essa
interação evoluiu da interpretação de linhas de comando, em modo texto, para
desktops que aceitam comandos de voz ou gestos de forma a simplificar a utilização
dos computadores, tornando-a mais intuitiva.
Dois eventos podem ser evidenciados como iniciadores do processo de
desenvolvimento da GUI. O primeiro deles aconteceu com Vannevar Bush, em 1945,
que imaginou uma máquina, chamada Memex, capaz de armazenar uma grande
quantidade de informação, além de relacioná-las, oferecendo uma forma fácil de
encontrá-las no meio de tantos dados. O segundo teve lugar em 1963, quando Ivan
E. Sutherland criou o Sketchpad, um editor gráfico que permitia o uso de objetos que
podiam se mover de maneira independente uns dos outros.
Inspirado nesses dois trabalhos o engenheiro elétrico Douglas Engelbart
pensou em usar os computadores para ampliar a inteligência humana. Para ele, se as
informações estivessem dispostas em uma tela, o usuário de um computador poderia
se organizar de forma gráfica e transitar entre uma informação e outra toda vez que
sentisse necessidade. Uma de suas inovações, demonstrada numa apresentação em
1968, foi um periférico que é considerado o primeiro modelo de mouse, além de outras
como o hipertexto e a comunicação por rede. Engelbart fez uma demonstração onde
duas pessoas que estavam em locais diferentes, compartilhavam uma tela e podiam
trabalhar de forma conjunta.
Figura 7 - A primeira videoconferência da história
Disponível em: http://dougengelbart.org/events/1968-demo-highlights.html. Acesso em 24/07/2016.
25
Foi no início da década de 1970, com a criação da Smalltalk uma linguagem de
programação e ambiente com uma interface gráfica diferenciada, que as janelas e os
ícones ganharam os computadores pessoais dando a eles elementos mais próximos
do que conhecemos hoje. As janelas possuíam bordas e por isso tinham seus próprios
títulos o que permitia sua identificação e redimensionamento. Nessa mesma época
surgiram os ícones, as barras de rolagem, as caixas de diálogo e os botões de opção.
Figura 8 - Smalltalk
Disponível em: http://www.computerhistory.org/revolution/input-output/14/347/1859. Acesso em 24/07/2016
Quando a Apple contratou ex-funcionários da Xerox PARC (Palo Alto Research
Center) pode desenvolver o computador pessoal Lisa, em 1978, dando um importante
passo na história das GUI. O Lisa foi um projeto revolucionário para a época. Lançado
em 1983, foi o primeiro PC (Personal Computer) a ter um mouse e uma interface
gráfica. A equipe de desenvolvedores projetou uma interface baseada em ícones em
que cada um deles indicava um documento ou uma aplicação, e criou a primeira barra
de menu desdobrável (pull-down) que acomodava todos os menus nas primeiras
linhas da tela.
26
Figura 9 - Sistema operacional 1.0 do Lisa
Disponível em http://www.guidebookgallery.org/screenshots/lisaos10. Acesso em 24/07/2016.
O Lisa trouxe ainda as marcas de verificação que destacavam os elementos do
menu que estavam ativados, os atalhos de teclado para os comandos mais usados e
principalmente o ícone da Lixeira de forma que os arquivos fossem arrastados para
ela para serem removidos mais tarde. O mouse passou a ter apenas um botão e como
eram exigidas pelo menos duas ações para cada ícone, uma para selecioná-lo e outra
para executar o comando, a empresa desenvolveu o duplo clique.
Steve Jobs cuidava pessoalmente do projeto Lisa, porém teve que se desligar
dele por questões internas da empresa. Em janeiro de 1981 o executivo da Apple
ingressou no projeto Macintosh, cuja ideia original de Jef Raskin, era lançar um
computador de baixo custo que utilizasse hardware de baixo desempenho. No
entanto, Jobs redesenhou o projeto de forma que o Macintosh utilizasse o mesmo
processador do Lisa e a Apple decidiu elevar o preço do produto para cobrir os
investimentos que fizera em marketing, mudando radicalmente o segmento de
atuação do produto.
A partir daí outras interfaces surgiram acrescentando detalhes que se
consolidariam nos recursos atuais, porém todas elas partiriam do conceito de janelas
que dá nome ao sistema operacional da Microsoft. É apropriado lembrar que a
Microsoft prestou serviços de forma terceirizada para a Apple o que proporcionou a
ela a possibilidade de testar os modelos ainda em desenvolvimento do Macintosh.
27
Possivelmente essa oportunidade foi uma inspiração para a empresa lançar a primeira
versão do Windows em 1983.
Figura 10 - Primeira versão do Microsoft Windows
Disponível em: http://tech.firstpost.com/news-analysis/windows-turns-30-a-look-at-all-the-microsoft-windows-oses-275874.html. Acesso em 26/07/2016
O Windows tornou-se bastante popular com o lançamento das versões 3.0 e
3.1 em 1990 e 1992, respectivamente. Mesmo sem ter alguns recursos que o
Macintosh já possuía, essas duas versões do Windows venderam milhões de cópias
e posteriormente com o lançamento do Windows 95, a Microsoft se consolidaria como
líder de mercado e o seu sistema operacional como um software mundialmente
conhecido.
Em 2000 a Apple lançou a Aqua, uma interface para o Macintosh que
possibilitava que as janelas fossem redesenhadas e redimensionadas de maneira
muito rápida e imperceptível aos olhos. Além disso a Aqua trouxe efeitos de animação
quando os programas eram minimizados. Em versões posteriores a Apple lançou o
efeito Exposé3 que mudou a forma como o usuário alternava entre as janelas abertas
na área de trabalho.
3 O Exposé é um recurso que facilita o acesso às janelas que estão abertas. Ver: https://support.apple.com/pt-br/HT201741
28
Figura 11 - Aqua, uma interface do Macintosh
Disponível em http://www.cultofmac.com/87889/how-mac-os-x-came-to-be-exclusive-10th-anniversary-story/. Acesso em 24/07/2016
Em 2006 a Microsoft inovou e com o lançamento do Windows Vista apresentou
o Aero, recurso responsável pelos efeitos de sombra e transparência na área de
trabalho, mas foi com o Windows 7, lançado em 2009 que a interface foi aprimorada
e ainda ganhou suporte a telas touchscreen e multitouch.
Figura 12 - Windows 7
Disponível em https://spsexton.files.wordpress.com/2008/11/install-2.jpg. Acesso em 27/07/2016
O Windows 7 ganhou efeitos 3D semelhantes aos oferecidos pelo Compiz,
interface do Linux, sendo que ele próprio se inspirou no Exposé do Macintosh.
29
Figura 13 - O Compiz e o efeito 3D
Disponível em: http://wiki.compiz.org/. Acesso em 26/07/2016
Os efeitos 3D têm aparecido recorrentemente nas interfaces gráficas e estas,
por sua vez, começam a se adaptar aos dispositivos pessoais e operados por toque
na tela.
1.1.2.2 Os notebooks
Ao analisarmos a evolução da informática podemos perceber que seus avanços
seguem de maneira inversamente proporcional ao tamanho que seus componentes
ocupam, portanto seria possível imaginar que não demoraria para que os
computadores se transformassem em peças portáteis. Os laptops surgiram como
objetos de luxo e foram rapidamente incorporados a um mercado que tinha condições
de absorvê-los. Diferentes de um computador de mesa, os laptops foram projetados
para serem utilizados por quem precisava transportá-los. Quando os computadores
começaram a se tornar pessoais de fato, seja pela variedade de modelos ofertada ou
pela redução dos custos, uma quantidade significativa dos consumidores era formada
por empresários e também por pessoas que precisavam viajar frequentemente. A
ideia de acoplar uma bateria a esses equipamentos tornaria possível levá-los consigo.
Em 1981 Adam Osborne lançou um computador portátil inspirado no Xerox
Note Taker, um protótipo de computador pessoal, desenvolvido pela Xerox PARC em
1978. Ainda que não tenha sido produzido em escala o Xerox Note Taker, influenciou
diretamente a criação do Osborne 1 e do Compac Portable.
30
O Osborne 1 tinha uma tela de 5”, pesava cerca de 12 kg, não tinha uma
bateria interna, ou seja, tinha que ser ligado à tomada, e foi desenvolvido para caber
embaixo do banco de um avião. Foram vendidas aproximadamente 10 mil unidades,
porém ele não tinha nenhuma compatibilidade com os desktops da época, por isso a
entrada de concorrentes nesse mercado levou Adam Osborne à falência.
Figura 14 - Osborne 1 o primeiro computador portátil
Disponível em http://www.oldcomputers.net/osborne.html . Acesso em 26/07/2016
Por sua vez a Compaq lançou, em 1982, um computador portátil que era
compatível com os PCs da IBM, já que estes eram referência no mercado de desktops
naquele momento. O Compaq Portable pesava 12,5 Kg, contava com CPU, memória
RAM de 128 KB, disco de 320 KB e um monitor CRT de 9 polegadas, o que permitia
instalar o DOS (Disk Operating System), um sistema operacional bastante utilizado
entre 1980 e 1990. Esse foi o destaque para promover a marca.
Figura 15 - Compaq Portable
Disponível em http://www.oldcomputers.net/compaqi.html. Acesso em 28/07/2016
31
Nesse mesmo ano a Epson ingressou de maneira inovadora nesse segmento
com o Epson HX-20, cujas dimensões eram as de um caderno (notebook em inglês).
Suas medidas se aproximavam de uma folha de papel A4 e ele pesava
aproximadamente 1,5 kg. Possuía uma tela de LCD com resolução de 120 x 32 pixels
e 16 KB de memória RAM.
Figura 16 - Epson HX-20
Disponível em http://www.oldcomputers.net/hx-20.html. Acesso em 28/07/2016.
Era um momento em que várias empresas alavancavam o mercado dos
portáteis não só em relação à tecnologia, mas também oferecendo modelos e
formatos bastante variados. Foi nessa época que a Radio Shack lançou o TRS-80
model 200, o primeiro notebook dobrável como um caderno.
Figura 17 - O primeiro notebook dobrável
Disponível em http://www.oldcomputers.net/trs200.html. Acesso em 28/07/2016
32
Na década de 1990 os notebooks iniciaram um ciclo de avanços tecnológicos
com o SLT/286 da Compaq que foi o pioneiro nas telas VGA, a única capaz de
reproduzir 256 cores, diferente dos outros equipamentos que tinham telas
monocromáticas. A NEC lançou, em 1994 o primeiro computador portátil com 2 cm de
espessura, 1,6 kg e um processador bastante potente. Em 1999 a Apple inaugurou a
era sem fio da internet com o lançamento do iBook e assim os notebooks foram
ganhando configurações cada vez mais parecidas com os desktops.
Já nos anos 2000, dois modelos foram muito importantes nessa trajetória – o
Sting 917X2 lançado em 2005, foi o primeiro a receber configurações mais robustas
capazes de suportar grandes games em um notebook, e o MacBook Pro (2006) que
já está na terceira geração. A tendência é que os computadores portáteis continuem
incorporando mais tecnologia e fiquem ainda menores. O mercado será apresentado
a monitores flexíveis com a espessura de uma folha de papel, holografia e teclados
ultrassensíveis, tudo para melhorar a portabilidade para o usuário.
1.1.2.3 Algumas reflexões sobre o computador
Para Steven Johnson, autor de livros sobre ciência e tecnologia, a invenção do
mouse por Engelbart possibilitou o manuseio direto dos elementos virtuais do
computador e criou uma espécie de dinamismo. Invertemos o processo tradicional,
deixando de dizer ao computador o que ele deveria fazer e passamos a executar
essas tarefas no momento em que podíamos arrastar ícones pela tela apenas clicando
neles. Isso fez com que os computadores deixassem de ser apenas máquinas, ou
ferramentas a serem manuseadas, para se tornarem um novo universo de interações
para o qual seríamos transportados.
Um dos grandes desafios dessa transição era traduzir a informação digital,
baseada no código binário de zeros e uns, para a formação de imagens na tela que
concretizassem e representassem esse cyber espaço para os seres humanos. Isso
foi resolvido com a criação da interface gráfica, ou “softwares que dão forma à
interação entre usuário e computador” (JOHNSON,2001). A interface faz o papel de
tradutor, intermediando essa relação, fazendo com que ambas as partes se entendam
de maneira semântica. Daí a importância do design nesse contexto, conforme destaca
Steven Johnson:
33
[...] diríamos que a interface consiste em clicar um mouse em certos objetos para ativá-los, clicar em direções para movê-los, clicar e arrastar para interagir com eles. Sem dúvida é disso que se trata. Mas minha definição, [...] pressupõe que a interface é na realidade todo o mundo imaginário de alavancas, canos, caldeiras, insetos e pessoas conectados – amarrados entre si pelas regras que governam esse pequeno mundo. Isso para mim é uma interface em seu modo de arte elevada (JOHNSON, 2001 p.5).
A invenção das janelas foi um momento muito importante para a informática,
chegando a dividir a história em dois momentos, antes e depois delas. De certa forma
elas foram projetadas para “representar modos – e, mais importante, uma maneira de
alternar entre modos. ” (JOHNSON, 2001). Com várias janelas abertas é possível
trabalhar em programas ou arquivos diferentes, passando assim de um modo para
outro sem dificuldade, apenas clicando na área pertinente. O conceito de janelas
acabou por superar a ideia de modos, tornando-se parte do cotidiano de um grande
número de pessoas.
Segundo Johnson a passagem da linha de comando para as variadas
possibilidades da janela, coincide com o caminho trilhado pela filosofia ocidental: “da
verdade estável, unificada de Kant e Descartes para o relativismo e a ambiguidade de
Nietzsche e Deleuze. “ (JOHNSON, 2001). As janelas foram desenhadas para serem
práticas, alteráveis, redimensionáveis e conseguem nos possibilitar uma melhor
visualização no espaço virtual. Por serem tão dinâmicas ajudaram a aumentar o
número de informações com as quais lidamos e possibilitaram a execução de
múltiplas tarefas.
Dessa forma a tela passou a contar com níveis de profundidade e também ficou
múltipla. Steven Johnson acredita que o surgimento das janelas acompanhou a
habilidade natural do ser humano fazer várias tarefas ao mesmo tempo e que as elas
não criaram uma nova consciência, mas “[...] nos permitiu aplicar a consciência que
já tínhamos ao espaço-informação na tela. “ (JOHNSON, 2001).
Johnson afirma ainda, que os videogames transformaram nossa experiência
com as interfaces dos desktops, dando-lhes três dimensões e aproximando-as da
arquitetura. Construir mundos virtuais repletos de detalhes é também uma forma de
auto expressão e a maneira de compartilhar esses mundos caracteriza a formação de
comunidades. O que poderia ser um jogo aparentemente simples acabaria por
transformar nossa percepção do espaço-informação.
34
Os Videogames
A história dos jogos eletrônicos teve início na década de 1950, quando alguns
acadêmicos começaram a projetar jogos simples, simuladores e programas de
inteligência artificial como parte de suas pesquisas em ciência da computação. Em
1951 um computador chamado NIMROD foi criado com o intuito de executar um jogo
adaptado do chinês Jianshizi, batizado de Nim. Em 1952 o professor A. S. Douglas
desenvolveu o OXO como parte de sua tese de doutorado. Era um típico jogo da velha
que pode ser considerado o primeiro a de fato utilizar um vídeo como interface para
visualização das jogadas.
Figura 18 - JOGO OXO
Disponível em http://contembits.com.br/historia/jogos/1952-OXO.aspx. Acesso em 30/07/2016
Em 1958 William Higinbothan criou o Tennis for Two usando um osciloscópio4
como tela. A ideia de Higinbothan surgiu ao analisar o manual de instruções de um
computador analógico e se deparar com a informação de que era possível reproduzir
vários tipos de curvas na tela desse instrumento. Essas curvas permitiam fazer a
demonstração de efeitos de gravitação de objetos como foguetes, balas ou bolas
quicando. Ao ver o resultado de uma bola batendo ele se lembrou de uma partida de
tênis. Em 1962 a criação do Spacewar, um jogo que tinha como objetivo atirar em
algo, lançou a ideia de múltiplos jogadores, porém como não havia computadores de
4 Nota da autora: O osciloscópio é um instrumento que transforma sinais periódicos em imagens tridimensionais na tela. Ver Anexo 1
35
uso doméstico naquele momento, não foi possível torna-lo comercialmente viável. O
Spacewar serviu de base para outros desenvolvedores posteriormente.
Um ano bastante importante para o mercado de videogames foi 1968, pois
Ralph Baer lançou o primeiro console que os tiraria dos laboratórios, com
equipamentos de alto custo, e popularizaria seu uso. A Brown Box foi o primeiro
sistema eletrônico de entretenimento compatível com os televisores domésticos.
Dessa forma os usuários poderiam transformar sua televisão em um aparelho
interativo, uma vez que havia 12 títulos disponíveis como jogos de tiro ou ping pong.
Ralph Baer patenteou sua invenção e após alguns anos vendeu-a para a empresa
Magnavox que, com esta patente, seguiu recebendo direitos de outros fabricantes de
consoles domésticos.
Figura 19 - Ralph Baer e sua Brown Box
Disponível em http://www.avclub.com/article/rip-ralph-baer-inventor-first-home-video-game-cons-212706. Acesso em 28/07/2016
Os jogos eletrônicos ganhavam cada vez mais adeptos e o ano de 1971
inaugurou a era dos jogos arcade. Esse tipo de jogo, também chamado jogo de
Fliperama, é caracterizado por ser um jogo eletrônico instalado em estabelecimentos
de entretenimento. O Galaxy Game, lançado nesse mesmo ano, foi instalado na
Universidade de Stanford e ficou conhecido como o primeiro videogame operado por
moedas.
36
Figura 20 - Galaxy Game Machine
Disponível em http://infolab.stanford.edu/pub/voy/museum/pictures/display/5-GG-machine.htm Acesso em 31/07/2016
A década de 1970 foi muito importante para os videogames. A Atari, empresa
que transformou a indústria do entretenimento, lançou o Pong, um jogo simples (na
tela via-se apenas uma bola de um pixel e duas linhas verticais) que apresentava
alguns atrativos que nenhum outro jogo tinha. Ele trouxe inovações por ser multiplayer
e oferecer a possibilidade de disputa contra o computador, além de ter regras de fácil
compreensão. Para pontuar era necessário acertar a bolinha com uma raquete virtual
e para vencer era necessário fazer pontos antes do adversário. Um protótipo chamado
de Pong Arcade foi instalado em um bar e com o sucesso da experiência a Atari
espalhou muitas dessas máquinas pelo país. Isso criou uma oportunidade para outras
empresas lançarem jogos semelhantes e aproveitarem os caminhos abertos para
esse novo segmento. A empresa também conseguiu, com a ajuda de parceiros
estrangeiros, ultrapassar as fronteiras do país e vendeu milhares de máquinas por
todo o mundo em 1973. As portas foram abertas para uma indústria que se tornaria
bilionária. O modelo multiplayer transformou o comportamento dos jovens que
procuravam diversão e se sentiam desafiados pela competição. O game Space
Invaders introduziu a marcação de high score, levando as pessoas a jogarem com o
objetivo de quebrar recordes. O sucesso dos jogos arcade era tanto que as máquinas
invadiram supermercados, clubes e lanchonetes, seguindo assim até 1990 quando os
consoles domésticos ganharam os lares do público.
37
Em 1980 a Mattel lança um concorrente direto dos consoles da Atari, o
Intellivision que apresentava gráficos melhores e acessórios arrojados como
sintetizador de voz, teclado que transformava o console em um computador, e um
cabo que possibilitava a conexão com a TV a cabo. Nessa época os computadores
pessoais estavam ganhando destaque e se tornaram a melhor plataforma para os
jogos, uma vez que ofereciam melhores gráficos e efeitos sonoros, eram mais rápidos
e possuíam mais memória do que os consoles. Como os consoles já não
apresentavam grandes inovações foram perdendo espaço no mercado, levando o
segmento à uma forte recessão. Em 1985, com uma estratégia de marketing para
reposicionar seu console, a Nintendo mudou o nome do produto e lançou jogos que
se tornariam bastante conhecidos, tais como Super Mario Bros, The Legend of Zelda,
tornando-se líder de vendas nesse mercado, naquele momento. Em 1989, o
lançamento do Game Boy, uma versão de mão do console da Nintendo, traria uma
tela de LCD em preto e branco e conquistaria os jogadores com o Tetris, jogo que o
acompanhava.
Figura 21 – Game Boy
Disponível em http://content.time.com/time/specials/2007/article/0,28804,1638782_1638778_1638765,00.html.
Acesso em 31/08/2016.
Nos anos 1990 o mercado de games ficava cada vez mais concorrido e isso
impulsionava os avanços tecnológicos em cada lançamento, assim como tonava os
consumidores cada vez mais exigentes. Em 2000 a Sony lança no Japão, na América
do Norte e na Europa, o PlayStation2 que além de funcionar como um aparelho de
38
DVD, também tinha conexão rápida com a internet. Em 2001 a Microsoft entrou no
segmento com o lançamento do XBOX, aproveitando a tecnologia dos computadores.
Os consoles modernos modificaram o perfil dos gamers. Os mais antigos como
o Atari, eram preferidos por homens, em geral adolescentes ou jovens adultos,
atraídos pela tecnologia. Já, a partir do Nintendo 64, lançado em 1996, uma gama
maior de pessoas começou a se interessar pelos videogames. Por sua vez, consoles
como XBOX e Nintendo Wii, alcançaram um público que não tinha relação direta com
a tecnologia, ou mesmo com jogos eletrônicos, pois ofereciam opções com assuntos
voltados ao cotidiano das pessoas. Os consoles passaram a ser uma alternativa para
ações de rotina - de lazer, entretenimento e até estilo de vida - oferecendo jogos de
dança, esportes e bandas de rock. Sendo assim, qualquer pessoa passa a ser um
gamer potencial, pois há produtos disponíveis para vários perfis no mercado.
A aceleração dos avanços tecnológicos indica que a evolução dos jogos
eletrônicos continuará a crescer. Alguns especialistas têm a perspectiva de que o
armazenamento na nuvem e a oferta de jogos por streaming5 seja o futuro próximo,
ainda que problemas como pirataria e monetização precisem de soluções factíveis.
Novas tecnologias que possibilitaram o uso de gráficos ultrarrealistas pelos games,
têm buscado levar a experiência do jogador próxima do real. A captura de movimentos
e expressões de atores reais é uma técnica que tem feito muito sucesso no universo
dos games. Alguns jogos chegam a parecer filmes interativos onde a história é tão
importante quanto o jogo em si, proporcionando ao gamer uma experiência mais
intensa do que a de um espectador de um filme, assim como mais envolvente do que
um jogo comum.
A franquia The Walking Dead, que faz sucesso como série televisiva, foi
transformada em game e segue o formato dos quadrinhos, porém a narrativa é
diferente e está sujeita às decisões do jogador que pode alterar o rumo da história. O
jogo Untill Dawn (2015), faz com que o jogador se sinta em um filme de terror e o
obriga a tomar decisões difíceis que podem causar a morte de outro personagem. No
jogo Beyond: Two souls, dois atores bastante conhecidos, Ellen Page e Willem Dafoe
interpretam os personagens principais. O jogo The last of us, tem cenários detalhados
que buscam estimular a atenção do jogador. Além de ganhar alguns prêmios, o game
5 Nota da autora: Streaming é um modo de reproduzir uma mídia sem que ela seja armazenada na máquina do usuário, ou seja, ela é reproduzida à medida em que é recebida.
39
também foi indicado a vários outros em 2013 e 2014, tais como Melhor Jogo do Ano,
Melhor Enredo e Estúdio do Ano.
Figura 22 - Cena do game The last of us
Disponível em http://www.gamerevolution.com/cheats/the-last-of-us#/slide/4 Acesso em 02/08/2016
Para Patrícia Marks Greenfield (1988 p.106), uma educadora que discute os
efeitos dos meios de comunicação eletrônicos no desenvolvimento do raciocínio, os
videogames têm seu próprio padrão de pontos fortes e fracos. Segundo ela:
É possível que, antes do advento dos videogames, a geração criada na era do cinema e da televisão se encontrasse num dilema: o meio mais ativo de expressão, a escrita, não possuía a qualidade do dinamismo visual. A televisão tinha dinamismo, mas impedia a participação do espectador. Os videogames são o primeiro meio que combina dinamismo visual com uma participação ativa por parte da criança. (GREENFIELD, 1988 p. 88)
Os jogos eletrônicos, exigem muito mais que coordenação viso-motora. Por sua
complexidade, alcançam níveis impossíveis de atingir nos jogos convencionais.
Resultados de pesquisas (RIVERO, 2012) apontam que os videogames influenciam o
comportamento dos jogadores, mas também atuam no desenvolvimento de várias
funções cognitivas como por exemplo: atenção seletiva, percepção espacial,
flexibilidade cognitiva, processamento de informações e atenção auditiva. É possível
afirmar que alguns tipos de jogos podem ter uma relação causal com o campo da
40
reabilitação neuropsicológica em se tratando do treino cognitivo. À medida em que se
puder desenvolver jogos que treinem funções cognitivas específicas será possível
conceber um conjunto de exercícios que atuem sobre mais ferramentas de
estimulação importantes tais como: engajamento, recompensas efetivas, diversão,
entre outras, considerando-se o fato de que podem ser praticados nos ambientes
terapêutico e doméstico.
Os padrões de comportamento e interação entre as pessoas e os dispositivos,
têm sido modificados pelas novas tecnologias. A popularização dos games tem
caminhado lado a lado com a evolução tecnológica dos smartphones. Uma vez que
esses aparelhos estão cada vez mais modernos e comuns na vida das pessoas, os
games passaram também a fazer parte desse cotidiano e serem ainda mais
acessados nos telefones inteligentes, do que na época dos consoles portáteis.
Os smartphones
A intenção de conferir outras funcionalidades aos telefones não era nova, mas
transformá-los em aparelhos inteligentes tornou-se popular na década de 1990.
Telefones que pudessem desempenhar múltiplas tarefas foram idealizados ainda na
década de 1980, porém era necessário esperar o desenvolvimento da tecnologia
necessária para tornar isso possível. Naquela época eram poucas as funções
adicionadas, porém os smartphones contemporâneos continuam evoluindo e tornam-
se dispositivos cada vez mais potentes.
O primeiro a combinar as propriedades de um celular com as de um PDA6 foi o
IBM Simon lançado em 1993. Era um aparelho que possuía tela monocromática de
toque com resolução de 163x293 pixels, calendário, fuso-horário mundial e conseguia
acessar e-mails.
6 PDA: Personal Digital Assistant.
41
Figura 23 - IBM Simon 1993
Disponível em: http://appsonmob.com/landlines-mobiles-to-smartphones/. Acesso em 02/08/2016
Porém, foi o Ericsson R380 que concretizou o nome smartphone, uma vez que
foi o primeiro a ser comercializado com essa designação. Lançado em 2000, foi
também o primeiro aparelho móvel a rodar o OS Symbian, sistema operacional móvel
projetado pela Nokia. Além de ser bastante leve, também tinha dimensões que se
enquadravam nos padrões dos celulares tradicionais.
Figura 24 - Ericsson R380 – o primeiro smartphone
Disponível em: http://www.geek.com/hwswrev/pda/ericr380/. Acesso em 02/08/2016
42
Entretanto, o que caracteriza os smartphones atuais são as telas sensíveis ao
toque. Em geral elas ocupam a maior parte frontal dos aparelhos e permitem aos
usuários acesso à várias possibilidades, pois podem fazer também a função de
teclado, controle de games, controle remoto de aparelhos eletrônicos, etc. Porém,
isso nem sempre foi assim. Há algum tempo, as telas eram limitadas a mostrar
informações básicas como o número que estava sendo chamado e o tempo de
duração da ligação. Foi no final da década de 1980 que os telefones móveis ganharam
as primeiras telas e aparelhos como o Samsung SH100 e Motorola MicroTAC
chegaram ao mercado indicando alguma inovação nesse segmento.
No início da década de 1990 as telas eram de LED e não ofereciam informações
muito complexas. Em 1994, quando os fabricantes começaram a incorporar as
matrizes de LCD para compor seus aparelhos, surgiram as telas com informações
gráficas, ainda numa fase inicial, porém ultrapassavam os limites da exibição
numérica. É nesse momento que indicadores de mensagens, status de bateria e
outras informações tornam-se populares. Dois anos depois, já era possível ter
aparelhos que tivessem telas com suporte a imagens monocromáticas que exibiam
pequenos mapas e outras composições com pixels independentes. O ano de 1998
ficou marcado pelo lançamento do Nokia 5110 que seria um dos destaques dessa
etapa na evolução da tecnologia de displays, pois trazia uma tela com suporte para
cinco linhas de informações e o jogo Snake.
Figura 25 - O Nokia 5110 e o jogo Snake
Disponível em: http://blog.vidadesilicio.com.br/arduino/display-lcd-nokia-5110/. Acesso em 02/08/2016
43
Em 2002 é lançado comercialmente o primeiro smartphone com tela colorida.
O Nokia 3510i contava com a tecnologia CSTN (Color Super-Twisted Nematic) – um
tipo de LCD comum nas primeiras versões de smartphones – além de trazer ícones,
papeis de parede, matriz passiva e garantia de menor consumo de energia. Nesse
mesmo ano a empresa ainda lançou o Nokia 7650 com a tecnologia TFT (Thin Film
Transistor)7 que permite mais velocidade e qualidade nas imagens exibidas pelos
smartphones. Displays TFT têm matriz ativa, ou seja, possuem transistores
independentes para cada pixel exibido e são utilizados até hoje.
Com o Razr V3, lançado em 2004, a Motorola mostrou aos fabricantes do
segmento a necessidade de investir em telas com melhor qualidade e eficiência se
quisessem integrar câmeras digitais aos telefones móveis. Mas seria o iPhone da
Apple que marcaria um salto evolutivo nos smartphones: telas capacitivas e aparelhos
fulltouch.
Figura 26 - Motorola Razr V3
Disponível em: http://www.gsmarena.com/motorola_razr_v3-pictures-853.php. Acesso em 02/08/2016
Existem dois tipos de telas touch: as resistivas e as capacitivas. Uma tela
resistiva oferece menor precisão em relação ao reconhecimento do toque, pois é
formada por várias camadas. À medida em que a tela é pressionada essas camadas
fazem contato e informam ao sistema operacional as coordenadas da posição. Esse
tipo de tela necessita de uma pressão mais intensa e, como o desempenho dos
7 TFT (Thin Film Transistor): Transístor de Película Fina em tradução literal.
44
aparelhos fica mais lento, isso pode comprometer a eficiência em algumas atividades
como jogos, por exemplo.
As telas capacitivas, como o nome indica, usam um capacitor com duas placas
separadas por um isolante que pode ser o ar. Quando o dedo toca a tela o capacitor
informa ao sistema a posição exata que foi acionada, por meio de uma troca de
elétrons. Desta forma, uma tela capacitiva consegue trabalhar com informações de
várias posições ao mesmo tempo, além de reconhecer movimentos feitos nela e poder
chegar a até 100% de precisão.
O primeiro iPhone, lançado em 2007 trazia uma tela que ocupava a maior parte
da frente, mostrava todas as funções e era o meio de controlar o aparelho. O que
parece normal hoje, era bastante ousado naquele momento e levou outros fabricantes
a lançarem aparelhos semelhantes. Em 2009 a Samsung traz para os smartphones
as telas AMOLED8. Esse tipo de tela que combina as matrizes ativas do TFT com
elementos orgânicos, oferece cores mais vivas e contrastes com mais qualidade, já
que pode desativar pixels específicos. No ano seguinte a empresa apresenta o Super-
AMOLED, cujos eletrodos responsáveis pela interpretação dos comandos são
depositados diretamente na tela, não em painéis secundários. Essa tecnologia
proporciona melhor visibilidade em ambientes externos, uma vez que os contrastes
são ampliados. Ainda em 2010, a Apple apresentou a tecnologia IPS, ou Super-TFT,
que oferece maior ângulo de visão e imagens com cores mais vivas. Assim estava
inaugurada a era das super-resoluções, que agora estão em busca do 8K, ou ultra-
alta definição (UHD). As telas flexíveis também aparecem como uma tendência não
muito distante. Samsung e LG, já têm aparelhos que apresentam características que
devem abrir as portas para uma nova geração de smartphones.
Vilém Flusser (2008) estuda as consequências culturais e socioambientais
decorrentes da disseminação das tecno-imagens, ou seja, a imagem pós-escrita que
ultrapassa os planos e superfícies e se forma por meio de pontos e pixels. Segundo
do autor este tipo de imagem demonstra um aparente retorno a uma
bidimensionalidade, porém “ela não é feita de duas dimensões como os suportes que
a transmitem, as telas de televisores, de painéis, de monitores. Uma vez que é feita
de pontos, é nulodimensional, é da ordem do grau zero do espaço. ” (FLUSSER, 2008,
8 AMOLED: Active-Matrix Organic Light-Emitting Diode = Matriz Ativa de Diodo Orgânico Emissor de Luz em tradução literal.
45
p.9). A partir deste raciocínio, Flusser constrói uma reflexão sobre a era das tecno-
imagens, sugerindo que tudo tenderia ao grau zero do espaço, onde se daria a
aparência das coisas constituída “por pontos de dimensão zero, entidades sem
corporeidade.”. É possível traduzir tal pensamento ao ressaltar o poder das teclas para
o homem contemporâneo. Como observa Vilém Flusser (2008), as teclas estão em
todos os lugares e é por meio delas que fazemos funcionar grandes e complexas
engrenagens que não entendemos como se processam. Para o autor:
[...] as teclas se movem num tipo de tempo medido por dimensões que não
correspondem às medidas do tempo cotidiano, ou seja: as teclas se movimentam no universo ínfimo dos pontos, no universo do infinitamente pequeno. São elas dispositivos que traduzem o infinitamente pequeno para a região na qual o homem é a medida das coisas. (FLUSSER, 2008, p.40)
Sobre a ideia de dimensão, Flusser (2008 p.40) afirma ainda que há três níveis
que estruturam o mundo que nos cerca: o das dimensões nucleares, o das dimensões
humanas e o das dimensões cósmicas e que ao usarmos uma tecla estamos vivendo
uma nova revolução cultural, que seria, sob certo ponto de vista: “[...] a submissão da
mão e do olho à ponta do dedo: a submissão do trabalho, da ideologia e da teoria à
criação livre.”. É, portanto, apropriado lembrar que o autor pensa que há dois tipos de
teclas, as que publicam o que é privado e as que privatizam o que é público e que
uma vez que os limites entre tais significados se desmancharam somos obrigados a
rever estas categorias históricas.
Neste sucinto mapeamento é possível observar que as inovações tecnológicas
não aconteceram de forma encadeada, uma após a outra, ou ainda uma como
consequência da outra. Suas histórias se misturam e se sobrepõem guiadas pela
curiosidade intrínseca ao ser humano que vem tentando incessantemente modificar o
mundo a sua volta. Observar a participação da tela como fio condutor deste estudo
nos dá a dimensão de sua evolução e influência em nosso cotidiano, bem como a
possibilidade de refletir sobre sua ubiquidade, conforme destaca Gilles Lipovetsky:
Em menos de meio século passamos da tela-espetáculo à tela comunicação, de uma tela ao tudo-tela. Por muito tempo a tela de cinema foi a única e a incomparável; agora ela se funde numa galáxia cujas dimensões são infinitas: chegamos à época da tela global. Tela em todo lugar e a todo momento, nas lojas e nos aeroportos, nos restaurantes e bares, no metrô, nos carros e nos
46
aviões; tela de todas as dimensões, tela plana, tela cheia e minitela portátil; tela sobre nós, tela que carregamos conosco; tela para fazer tudo. Tela de vídeo, tela em miniatura, tela gráfica, tela nômade, tela tátil: o século que começa é o da tela onipresente e multiforme, planetária e multimidiática (LIPOVETSKY, 2009 p. 11-12)
Em destaque, a tela tátil à qual Lipovetsky se refere, tem se tornado uma
constante em nossas vidas, e vem despertando cada vez mais sensações de poder e
controle sobre nossa participação no processo comunicacional que nos mantém
coesos como sociedades.
1.2 A tela e suas relações com o corpo e as sensações
A grande mudança contemporânea se caracteriza por englobar diferentes
processos dentro de uma mesma dinâmica, incluindo-se a tecnologia, a economia, a
cultura, os meios de comunicação, e tudo o mais. As relações entre as pessoas e o
mundo têm sido, cada vez mais, mediadas por interfaces que se concretizam por meio
de suportes físicos, como a tela, e também estimulam a interação.
A interatividade
É comum nos deparamos com uma confusão no uso das palavras interatividade
e interação, porém, apesar de se relacionarem elas não têm o mesmo significado.
Interatividade, segundo o dicionário Michaelis9, “é um sistema de comunicação que
possibilita a interação”. Por sua vez o conceito de interação, mais abrangente, diz
respeito ao ato de reciprocidade entre dois corpos, ou ainda, alguma atividade
compartilhada. Com a disseminação dos dispositivos móveis e pessoais, assim como
evolução da tecnologia nos novos meios de comunicação, a interatividade se
popularizou e está intimamente ligada à comunicação digital, ainda que possa ser
encontrada em outras áreas do conhecimento e tenha significados pertinentes a cada
uma delas.
Marco Silva (1998) explica que o conceito de interatividade é recente, já que
não há registro dele nos dicionários de informática antes dos anos 80. Por sua vez o
conceito de interação vem de longe:
9 Ver http://michaelis.uol.com.br/busca?id=0LG44.
47
Na física refere-se ao comportamento de partículas cujo movimento é alterado pelo movimento de outras partículas. Em sociologia e psicologia social a premissa é: nenhuma ação humana ou social existe separada da interação. O conceito de interação social foi usado pelos interacionistas a partir do início do século XX. Designa a influência recíproca dos atos de pessoas ou grupos. (SILVA, 1998)
No campo da comunicação e das novas tecnologias Vicente Gosciola (2003)
considera a interatividade “um recurso de troca ou de comunicação de conhecimento,
de ideia, de expressão artística, de sentimento.”. Para Henry Jenkins (2008), a
interatividade difere da participação, ainda que as palavras sejam recorrentemente
utilizadas de forma indistinta:
A interatividade refere-se ao modo como as novas tecnologias foram planejadas para responder ao feedback do consumidor. Pode-se imaginar diferentes graus de interatividade possibilitados por diferentes tecnologias de comunicação, desde a televisão, que nos permite mudar de canal, até videogames, que podem permitir aos usuários interferir no universo representado. [...] A participação, por outro lado, é moldada pelos protocolos culturais e sociais. Assim, por exemplo, o quanto se pode conversar num cinema é determinado mais pela tolerância das plateias de diferentes subculturas ou contextos nacionais do que por alguma propriedade inerente ao cinema em si. (JENKINS, 2008, p. 182)
Pode-se dizer que o homem está deixando de ser a referência de medida das
coisas, dando lugar à tecnologia. Sendo assim, a interatividade está diretamente
ligada ao suporte físico que transmite a mensagem. De acordo com as características
oferecidas pela base material em cada oportunidade de interação, teremos uma
resposta diferente. Cada experiência interativa, será também uma experiência
corporal, seja na sala de cinema diante uma tela de grandes dimensões, ou com um
dispositivo na palma da mão.
A materialidade da Comunicação
As novas tecnologias da comunicação e informação têm se constituído num
campo de reflexão cada vez mais interessante. A interação entre corpo e máquina,
entre o real e o virtual, sugere uma imersão na teoria das materialidades de forma a
entender uma relação que, definitivamente, vem se estreitando. Falar sobre
materialidades da comunicação significa admitir que todo ato de comunicação
48
implique na exigência de um suporte material para que possa, de fato, efetivar-se.
Apesar desta ideia parecer extremamente comum, devemos lembrar que a
materialidade do meio de transmissão pode influenciar, ou mesmo determinar a
estruturação da mensagem. Para Jacques Derrida “não há signo linguístico antes da
escritura” (apud FELINTO, 2015), ou seja, o que é material é determinante para o
significado. Para Hans Ulrich Gumbrecht, o principal articulador das materialidades da
comunicação, “[...] a emergência de sentido somente ocorre através do concurso de
formas materiais. ” (GUMBRECHT, 1998, p.18). Isso significa que as condições
concretas em que uma mensagem é articulada e transmitida, influem diretamente na
peculiaridade de sua produção e recepção. Segundo o autor:
[...] não é verdade, por exemplo, que a transição do uso da máquina de
escrever para o computador exige do usuário muito mais do que uma acomodação automática a uma técnica diferente de registro? Não se trata somente de uma técnica exterior ao processo cognitivo [...]. (GUMBRECHT, 1998, p.18)
Gumbrecht lembra que no período medieval não existia a figura do leitor, e sim
a de ouvintes, que eram envolvidos em experiências que se passavam em palcos nos
quais se dava a narração, e que dependiam da gestualidade corporal do narrador e
da formação cultural do público receptor. Portanto o corpo torna-se um componente
primordial de materialidade. Para Karl Ludwig Pfeiffer “[...] a comunicação é encarada
menos como uma troca de significados, de ideias sobre [algo], e mais como uma
performance posta em movimento por meio de vários significantes materializados. ”
(apud FELINTO, 2015).
Dentro deste contexto, ao pensarmos na tela como elemento da materialidade
da comunicação é válido ressaltar o pensamento de Marcia Tiburi (2011) quando ela
diz que: “a tela [da televisão] é uma prótese existencial, mais do que simplesmente
estética”, pois é através dela que o ser humano passa a ser telespectador, ou seja,
assume uma posição definida, numa nova maneira de entender o cotidiano modificado
pelas possibilidades tecnológicas. Já para Susan Buck-Morss (2009) a tela [do
cinema] é “prótese de cognição”, pois a coletividade do século XX constrói sua
identidade na base da imagem e não da palavra, experimentando verdades
universais, dando poder à prótese cinemática, bem como tornando sua característica
de cognição, um órgão de doutrinamento.
49
1.3 A tela na era da comunicação instantânea e fragmentada
As mudanças culturais impulsionadas pela evolução tecnológica digital
resultam num processo mais ativo dos indivíduos que cada vez mais detém o poder
de participação em suas mãos. Esse processo está centrado na inclusão do público
em geral como produtor de conteúdo e tem impelido as pessoas a se manterem
continuamente conectadas, pois agora fazem parte de um mundo mais amplo,
complexo, sem fronteiras físicas ou temporais, que os coloca onde quiserem no
momento que quiserem.
A comunicação tem tido um papel de destaque na maneira como a sociedade
se mantém organizada e associada à tecnologia digital, tem provocado mudanças
significativas na maneira como nos comportamos e estabelecemos relações com
outras pessoas. Daí a urgência em observar constantemente a forma como nos
comunicamos e construímos nossa percepção do mundo a nossa volta. Estamos
sendo, cada vez mais, arrebatados por uma grande quantidade de informações e
nossa interação com o mundo caminha continuamente no sentido do que é voltado
para o grupo. Inteligência coletiva, compra coletiva, cultura participativa, cultura
colaborativa, são conceitos que ocupam lugar de destaque nos estudos das relações
humanas. O ser humano, como um ser gregário, se ocupa em agrupar-se de acordo
com seus interesses e tem encontrado possibilidades incontáveis no âmbito da
tecnologia digital.
Segundo estudo da União Internacional de Telecomunicações (UIT) mais de
50% da população mundial terá acesso à internet até 2017. De acordo com o relatório
The State of Broadband 201410 o crescimento da banda larga móvel em smartphones
e tablets foi o mais rápido da tecnologia na história da humanidade. Nessa sociedade
hiperconectada, em que tempo e espaço ganham novas dimensões, além de os
relacionamentos serem diretamente afetados - já que as relações com pessoas que
tenham interesses comuns ultrapassam os limites geográficos - também
testemunhamos que o público compartilha experiências, declara sua opinião sobre
qualquer assunto, recomenda conteúdos ou ainda os condena, aumentando assim
sua responsabilidade pelo conteúdo que produz. Clay Shirky, um estudioso sobre o
10 Disponível em http://unesdoc.unesco.org/images/0023/002346/234675e.pdf . Acesso em 22/02/2015.
50
impacto da internet na sociedade, afirma que “a revolução não acontece quando a
sociedade adota novas ferramentas. Acontece quando a sociedade adota novos
comportamentos. ” (SHIRKY, 2011).
Não obstante, tecnologia e comunicação não são conceitos que surgiram
recentemente, porém a discussão sobre seu impacto na sociedade vem ganhando
cada vez mais adeptos principalmente depois que os meios digitais se popularizaram
por meio da internet, da world wide web e do surgimento dos dispositivos pessoais
como PC, smartphones, tablets e, etc.
Quando entendemos o ser humano como um ser social, podemos perceber
sinais de sua necessidade de produzir conteúdos que expressem suas percepções,
desejos, movimento e tudo o mais que envolve a complexidade da vida na Terra como
a conhecemos. É possível perceber isso estudando a evolução das produções
humanas desde a arte rupestre até o compartilhamento de conteúdo nas plataformas
digitais.
Sob o aspecto histórico podemos observar contextos que influenciam as
relações estabelecidas entre os homens. Na chamada era do hardware (BAUMAN,
2001) o que prevalecia eram as máquinas pesadas, as fábricas cercadas de muros
com equipes cada vez maiores, as locomotivas poderosas, os transatlânticos
gigantescos e a conquista do espaço era o principal objetivo. O território era a marca
da riqueza pessoal e, portanto, estava entre as maiores obsessões dos homens que
o disputavam através das guerras. “Os impérios se espalhavam, preenchendo todas
as fissuras do globo: apenas outros impérios de força igual ou superior impunham
limites à sua expansão. ” (BAUMAN, 2001 p.132). Assim, as relações sociais eram
baseadas na proximidade física e nas limitações geográficas como descreve o autor:
A aventura e a felicidade, a riqueza e o poder eram conceitos geográficos ou “propriedades territoriais” – atados a seus lugares, inamovíveis e intransferíveis. Isso exigia muros impenetráveis e postos avançados rigorosos, guardas de fronteiras em permanente vigília e localização secreta. (BAUMAN, 2001, p.133)
Por sua vez, o tempo era pautado pela premissa da rotinização que tinha a
função de manter o lugar como um todo, tornando-o compacto e homogêneo. Para
conquistar o espaço era preciso controlar o tempo e isso significava, antes de tudo,
moderar seu dinamismo inerente, ou seja, uniformizá-lo e coordená-lo. Esse
entendimento de tempo fazia com que as relações humanas estivessem diretamente
51
ligadas ao espaço onde ocorriam, reforçando a lógica que a ciência estabeleceu para
os conceitos de tempo e espaço.
Uma grande transformação ocorre com o advento do “[...] capitalismo de
software e da modernidade ‘leve’. ” (BAUMAN, 2001 p. 135). A organização da
sociedade busca a adaptação a um mundo que passa a ser percebido como
complexo, múltiplo e rápido, uma vez que no contexto do software tudo acontece numa
velocidade que foge à nossa capacidade de controle e acompanhamento. No
cotidiano da velocidade da luz, questiona-se a diferença entre “lá” e “aqui”, pois o
espaço já não pode ser percebido como um fator limitante. Zygmunt Bauman (2001,
p. 136) declara que: “A mudança em questão é a nova irrelevância do espaço
disfarçada de aniquilação do tempo. ”, e ainda afirma que “[...] essa mudança começa
a ter impacto na condição da existência humana”. As noções de tempo e espaço
passam a ser questionadas se pensarmos que o espaço já não é um fator
determinante para que aconteça uma ação e todos os seus efeitos, pois pode-se
chegar aos lugares mais longínquos sem perder nenhum tempo. As distâncias podem
ser percorridas através de sinais eletrônicos e as relações humanas passam a ser
estabelecidas num contexto de espaço e tempo que desafia os conceitos pré-
estabelecidos pela ciência. A instantaneidade do tempo desvaloriza a importância do
espaço, já que todas as suas partes podem ser alcançadas no mesmo momento.
Isto resulta num mundo que está propenso a constantes e intensas mudanças.
Segundo Douglas Rushkoff (1999, p.9) “o grau de mudança a que as três últimas
gerações se submeteram se compara com o de espécies em mutação.”. Como
consequência acontece o que Rushkoff (1999, p.23) denomina como “a queda do
pensamento linear e a ascensão do caos”.
E o que quer dizer isso? O ser humano é capaz de lidar com uma certa
quantidade de mudanças lineares ou incrementais. Da mesma forma que a água
aquece gradualmente, também podemos aceitar algum aumento da temperatura. Se
observarmos a Europa do período pré-renascentista perceberemos que não houve
nenhuma crise de grandes proporções enquanto a Igreja ganhava cada vez mais
poder. Por outro lado, quando as mudanças atingem níveis mais profundos,
disseminam um amplo conjunto de problemas decorrentes delas, e nesse caso
podemos lembrar do choque social causado por Copérnico quando ele revelou que
nossa percepção da realidade estava errada ao desenvolver sua teoria sobre o
heliocentrismo.
52
A sociedade também tem seus limites e depois de longas mudanças lineares,
ou aquelas mais radicais, tende a passar por uma mudança de estado, porém, os
indivíduos só aceitam essas mudanças se isso for absolutamente necessário, ou seja,
quando a maneira como entendemos o mundo passar a ser muito diferente da
experiência com a realidade ao seu redor. Isso significa que só podemos aceitar um
pouco de mudança de cada vez.
A era moderna nos proporcionou experimentar a descontinuidade. As novas
tecnologias e a comunicação de massa criaram a necessidade de encontrarmos
novas formas de lidar com o grande fluxo de acontecimentos e informações daquele
cotidiano. Ao enfocar a descontinuidade acabamos por descobrir uma nova maneira
de entender o mundo a nossa volta, ou seja, o caos. O Caos, portanto, não é somente
a desordem “[...] é a ordem mais profunda dentro de sistemas aparentemente
aleatórios e não-lineares. Caos é o caráter da descontinuidade”. (RUSHKOFF,1999,
p. 32).
Dessa forma, todo desenvolvimento imposto pelo avanço da tecnologia, nos
leva a produzir um número de ideias correspondente a esse salto evolutivo, o que faz
com que tenhamos que aumentar nossa capacidade de processar novas ideias, novos
pensamentos e novos comportamentos.
À medida que o avanço da tecnologia anuncia uma nova era de maior facilidade
de comunicação e acesso à informação, assim como novas formas para transmiti-las,
surge o que Richard Adler chama de economia da atenção:
Como nossa capacidade de produzir e distribuir informações aumentou, somos bombardeados por milhares delas sob a forma de textos, imagens e sons todos os dias. O mercado está saturado de mensagens, todas competindo por nossa atenção. Nesse ambiente, a atenção torna-se uma mercadoria rara. (ADLER, 2002)
Na disputa acirrada pela atenção, os meios de comunicação tradicionais abrem
espaço para a interatividade e os indivíduos passam a ter a capacidade de procurar
informações que lhes interessem, filtrando aquelas que não querem ver ou ouvir,
ganhando o poder de controlar as mensagens que recebe e direcionando a demanda
para seus interesses.
As imagens técnicas passam a ter novo significado e não precisam mais ser
consumidas de forma passiva, a tela passa a ser uma forma de refletir a própria
história, além de projetar sua identidade. A partir disso podemos entender o
53
estabelecimento de novos parâmetros, conforme Andre Gorz destaca: “uma inversão
fundamental se opera: não é mais o homem que é posto a serviço do desenvolvimento
da produção; é a produção que é posta a serviço do desenvolvimento humano, ou
seja, da produção de si. ” (GORZ, 2005).
Algumas questões são recorrentes nos dias atuais no que diz respeito ao tipo
de produção de uma imagem técnica. É uma fotografia? Foi produzida por meio de
computação gráfica? Foi retocada com a ajuda de softwares específicos para tanto?
Para Baudrilard (2011) os simulacros substituem o real e nossa percepção é
constantemente bombardeada por imagens virtuais. Como a maior parte dessas
imagens, além de ser reproduzida, pode também ser modificada pelos meios
eletrônicos, passamos a duvidar delas, principalmente aquelas que nos causam
estranheza, ou seja as imagens técnicas já não carregam mais o estatuto de verdade
que lhes era conferido no passado.
De fato, o crescimento exponencial das novas tecnologias da comunicação,
revolucionaram o cotidiano dos seres humanos legitimando os prazeres do consumo.
A proliferação das telas e o surgimento de uma cultura telânica (LIPOVETSKY, 2009),
têm causado efeitos diretamente ligados às condições da existência humana. Embora
estejamos vivendo numa sociedade hiperconectada, cada vez mais ligada por redes,
em muitos aspectos ainda há poucas reflexões sobre como os telespectadores são
levados a viver neste contexto, por isso entender a divisão das telas e a distribuição
do conteúdo entre elas, pode nos dar uma boa ideia de como chegamos até aqui.
54
2 A divisão da tela: da sala de cinema à mobilidade e interatividade
Não é incomum encontrar pessoas que responsabilizem os avanços da
tecnologia por todas as mudanças que estamos vivendo na contemporaneidade.
Penso que o ser humano carrega dentro de si as perspectivas de seu futuro e caminha
no sentido de tornar possível aquilo que imagina, transforma isso em conteúdo e usa
a tecnologia para realizá-lo.
Sob a perspectiva da comunicação audiovisual, quando olhamos para o início
do século XX, encontramos experiências que podem ilustrar esse pensamento. As
primeiras exibições do cinema buscavam retratar a realidade. Em 1895, o clássico
L’Arrivée d’un train en gare de La Ciotat, reproduzia na tela uma cena cotidiana e
mostrava um trem chegando à estação. Causou grande comoção, não só pela
inovação tecnológica, mas também por fazer com que o mundo olhasse a realidade
sob outro prisma.
Com George Méliès, e sua experiência como mágico, foi possível experimentar
efeitos que produziriam sensações diferentes no público que assistia seus filmes.
Numa de suas mais conhecidas obras fílmicas, Le Voyage dans la lune (Viagem à
Lua, 1902), o cineasta usou recursos simples, com o que ele chamou de “cenas
artificialmente arranjadas” encenadas na frente de uma câmera fixa. A ilusão de um
foguete sendo enviado ao espaço, foi criada com um movimento artificial da lua e não
com uma câmera em movimento.
Em 1903, Edwin S. Porter, um cameraman que trabalhou na equipe de Thomas
Edison, experimentou uma nova forma de contar estórias em seu filme Life of na
american fireman, que retratava um dia na vida de um bombeiro americano. Para
mostrar o bombeiro em ação, combatendo o fogo no local, Edwin construiu uma
narrativa cinematográfica que mostrava o interior de uma casa em chamas, onde uma
mulher pedia socorro numa janela e logo depois desmaiava na cama. Em seguida,
uma escada aparecia do lado de fora da janela, um bombeiro chegava para salvá-la,
assim como salvar seu filho e extinguir o fogo. Logo depois ele corta para uma cena
externa de uma casa em chamas que mostra a mesma sequência de fatos vista
anteriormente, agora sob outro ponto de vista. Isto mostra a capacidade que a edição
tem de criar uma unidade imaginária de lugar e evento, considerando-se que as cenas
foram filmadas separadamente, em locais bastante distantes.
55
Alguns anos mais tarde, em Les Affiches un Goguette (1906) George Méliès, já
trabalhava com recursos visuais um pouco mais complexos, mostrando na tela
pôsteres que ganhavam vida. No início o filme mostra a tela quase inteiramente
tomada por um painel dividido em pôsteres diversos: um homem cozinhando, uma
mulher se maquiando, outro servindo vinho, etc.
Figura 27 - Les affiches un goguette – Os pôsteres estáticos
Disponível em http://dvdtoile.com/Film.php?id=12690. Acesso em 30/10/2015
Em seguida, atores tomam o lugar das figuras. Não só dão vida às imagens
antes estáticas, mas também interagem uns com os outros, levando o público a ver
na tela, várias situações ocorrendo concomitantemente.
Figura 28 - Les affiches un goguette - Os pôsteres ganham vida
Disponível em http://dvdtoile.com/Film.php?id=12690. Acesso em 30/10/2015
56
Apenas um ano depois, em Le tunnel sous la Manche de 1907, Méliès
apresenta uma narrativa inteira acontecendo em uma tela dividida ao meio, sendo que
o público parecia estar assistindo dois filmes ao mesmo tempo. Mais tarde esse
recurso de edição seria chamado de split screen e bastante utilizado no cinema.
2.1 Split Screen: uma tela, múltiplas divisões.
No âmbito da produção para cinema e vídeo o termo split screen se refere à
uma tela dividida que pode exibir duas ou mais imagens simultaneamente, o que de
certa forma rompe a ideia ilusória de que a tela tenha que reproduzir a realidade de
maneira análoga ao olho humano. Antes da disseminação da tecnologia digital, na
década de 1990, para dividir o conteúdo dentro da tela, era preciso usar uma
impressora óptica, ter duas ou mais ações filmadas separadamente e combiná-las no
mesmo negativo. As possibilidades que se abriram com a chegada da tecnologia
digital, fizeram com que o recurso de split screen ficasse mais fácil de ser executado
e tivesse seu uso expandido.
No cinema e na televisão o split screen permite que um ator apareça duas
vezes na mesma cena. Uma técnica utilizada para representar gêmeos como é
possível ver em vários filmes, desde os mais antigos como Maravilha Man (1945) até
um exemplo mais popular como The parent trap (1998) com Lindsay Lohan
representando Hallie e Annie.
Figura 29 - Lindsay Lohan em The parent trap
Disponível em : https://jovemedivertida.wordpress.com/2014/12/19/operacao-cupido/.
Acesso em:30/10/2015.
57
Este recurso também tem sido utilizado em várias outras situações para
conduzir uma narrativa audiovisual não-linear, ou multilinear, pelo encadeamento de
telas em projeção simultânea.
No cinema, existem inúmeros exemplos de filmes que fazem uso de uma tela
dividida. Como exemplo, podemos destacar: Napoléon (1927) de Abel Gance, dividiu
a tela em três partes; Sisters (1973) de Brian de Palma, incorporou o recurso ao estilo
de filmagem do cineasta; Timecode (2000) de Mike Figgis divide a tela em quatro
partes e conta uma história de acordo com quatro pontos de vista diferentes.
Há experiências em vídeo que merecem ser ressaltadas como é o caso de Sixty
cameras against the war (2003) de Julie Tallen que tem momentos onde a tela é
dividida em até sessenta cenas simultâneas.
Figura 30 - Sixty cameras against the war
Disponível em: https://archive.org/details/SixtyCamerasAgainstTheWar
Acesso em 01/05/2016
De acordo com o site que hospeda o vídeo, no dia 15 de fevereiro de 2003,
houve uma manifestação, na cidade de Nova Iorque, contra a guerra do Iraque.
Centenas de milhares de ativistas da paz foram às ruas da cidade para pedir o fim da
guerra. Durante o evento, sessenta videomakers presentes nas ruas onde a
manifestação tinha lugar, registraram os acontecimentos daquele dia. Depois de
58
editado, o vídeo intercala momentos onde a tela é dividia em várias cenas e então é
possível acompanhar os manifestantes e suas reivindicações.
Em casos como esse, o espectador está exposto à várias cenas ao mesmo
tempo e desloca sua atenção de acordo com seus parâmetros de escolha, ou aquele
onde o áudio se sobressai. Segundo Vicente Gosciola:
[...] a múltipla narração nos aproxima da vida de maneira incomparável à câmera subjetiva e às técnicas de edição. A multiexposição de conteúdos em obras hipermidiáticas, por esse ponto de vista, tem muita relação com a realidade do usuário que recebe informações simultâneas e que se vê obrigado a prestar atenção em apenas uma ou em um agrupamento delas. (GOSCIOLA, 2003 p. 118).
Nos vídeos de música, o split screen foi utilizado de maneira bastante criativa.
Um exemplo pode ser visto no clip Sugar Water (1996) do grupo Cibo Matto, onde de
um lado da tela temos a história contada normalmente e do outro lado, a mesma
história reproduzida de trás para frente.
Figura 31 - Sugar Water
Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=EN9auBn6Jys.
Acesso em 10/07/2016.
A televisão também tem usado largamente o recurso da tela dividida para que
os telespectadores possam acompanhar eventos, noticiários ou esportes
simultaneamente, quando há mais de um fato ocorrendo ao mesmo tempo.
A chegada dos laserdiscs, um tipo de vídeo doméstico com armazenamento
em disco óptico, e dos leitores de discos a laser, o primeiro dispositivo de reprodução
59
de vídeo não-linear ou de acesso aleatório, inaugurou um novo momento. O fato de
que um leitor de laserdisc poderia saltar para qualquer capítulo instantaneamente (ao
invés de prosseguir em um caminho linear do início ao fim como o videotape) fez com
que jogos com enredos ramificados pudessem ser construídos a partir de capítulos
de vídeo da mesma forma que os livros do tipo Escolha Sua Própria Aventura podem
ser lidos em páginas fora de ordem, ou a forma como um filme interativo é construído
sendo possível escolher caminhos a partir de uma teia de narrativas interligadas.
Um exemplo de filme interativo no cinema foi Kinoautomat (Clovek a jeho dum)
que foi escrito e dirigido por Radúz Cincera. De acordo com Jeffrey Stanton este filme
tcheco foi apresentado pela primeira vez na Expo 67, em Montreal11.
Figura 32 - Kinoautomat
Disponível em: http://www.westland.net/expo67/map-docs/cinema.htm .
Acesso em 05/05/2015.
O filme foi exibido para um público de apenas 127 pessoas em uma sala
pequena. Parou em cinco pontos na trama e o público foi convidado a votar para
decidir de que maneira o herói deveria agir. Enquanto isso, o ator apareceu ao vivo
no local da transmissão e apelou ao público para ajudar a resolver seus problemas.
Em cada ponto de decisão, o espectador era convidado a pressionar um botão
vermelho ou verde ao lado dele, para dar sequência à história. Os votos foram
11 Ver http://www.westland.net/expo67/map-docs/cinema.htm . Acesso em 05/05/2015.
60
registrados pelo número do assento na borda em torno da tela, de maneira que cada
espectador pudesse ver o seu próprio voto contado.
2.2 Multi screen: A Expo 67 e suas múltiplas telas.
Experiências importantes com várias telas aconteceram na 1967 International
and Universal Exposition. A Expo 67, como é mais conhecida, teve lugar em Montreal
no Canadá. De acordo com o CPDOC/FGV12:
As exposições internacionais condensaram o que o século XIX entendeu como modernidade: o progresso construído sobre a ciência e a indústria; a liberdade entendida como livre mercado; o cosmopolitismo baseado na ideia de que o conhecimento humano e a produção seriam transnacionais, objetivos e sem limites. As cidades onde as exposições foram montadas - Londres, Paris, Chicago, entre outras - foram os epicentros da modernidade. Aí se chegou ao estágio mais avançado da civilização ocidental, que convivia com os problemas advindos da desigualdade e da marginalização de grande parcela da população. As exposições universais queriam ser um retrato em miniatura desse mundo moderno avançado, composto de espetáculos nos campos da ciência, das artes, da arquitetura, dos costumes e da tecnologia. A ideia era mostrar e ensinar as virtudes do tempo presente e confirmar a previsão de um futuro excepcional. A torre Eiffel, o palácio de cristal e a roda gigante eram os símbolos visíveis do avanço tecnológico exibido nas feiras mundiais.13
Os pavilhões da Expo 67 exibiram centenas de filmes, porém os que fizeram
mais sucesso foram os que utilizavam de mais de uma tela. Não era a primeira vez
que se apresentava cinema multitela numa feira mundial, porém a Expo 67
proporcionou aos espectadores uma nova maneira de ver o cinema. Quando duas
imagens são projetadas lado a lado na mesma tela, o olho humano combina e
compara essas imagens e a mente cria uma nova interpretação, maior do que as duas
partes. A Expo 67 obrigou o espectador a olhar para vários assuntos sob uma nova
perspectiva, ampliando sua imaginação e fazendo-os participar da experiência visual
em lugar de apenas assisti-la.
O filme mais popular nessa exposição foi Canada 67 que foi encomendado
pelas empresas de telefonia canadenses e feito pelo Walt Disney Studios. Com
duração de vinte e dois minutos foi exibido em Circle-Vision 360 graus, onde cerca de
12 CPDOC/FGV - Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil / Fundação Getúlio Vargas 13 Disponível em: http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/AEraVargas1/anos20/CentenarioIndependencia/ExposicoesUniversais
61
1.500 pessoas ficaram em uma sala cercadas por nove telas de cinema de grande
porte. Nove projetores, escondidos no espaço entre as telas, projetaram uma imagem
completamente circular, enquanto doze canais de som sincronizados envolveram o
público.
Figura 33 - Circle Vision
Disponível em: http://www.westland.net/expo67/map-docs/cinema.htm . Acesso em 10/07/2016.
Não foi possível ver tudo o que foi apresentado, porém a experiência foi
marcante, uma vez que os espectadores tiveram sensações que não haviam
experimentado antes no cinema. Numa das cenas, enquanto o filme mostrava que
estavam sobrevoando as cataratas do Niagara, a projeção dá a entender que o avião
está se inclinando e as pessoas se seguraram para não cair.
Também na Expo 67, o filme We are Young de Francis Thompson e Alexander
Hammid, dois diretores que já haviam ganhado um Oscar por To be alive exibido na
Exposição universal de 1964, tratava da maneira como jovens adolescentes
encaravam a vida. Foi exibido em seis telas com imagens que representavam o
universo adolescente, como bandas de rock, dança, motocicletas, jogos, etc. A forma
não usual de exibição do filme, chamou muito a atenção do público. Uma das
62
sequências mostrava uma motocicleta, repetida em todas as telas e dando a sensação
que estava correndo na direção do espectador. Em outra sequência, jovens
dançarinos foram mostrados nas seis telas de maneira que as pessoas puderam vê-
los de seis maneiras diferentes.
Figura 34 - We are Young
Disponível em: http://www.westland.net/expo67/map-docs/cinema.htm .
Acesso em 10/07/2016
Ainda na Expo 67, para o filme Labyrinth de Roman Kroitor, foi construído um
prédio de cinco andares, com o objetivo de proporcionar uma experiência
cinematográfica inédita. O público era conduzido através de um labirinto de rampas
na forma elíptica e podiam assistir ao filme em uma tela vertical de cerca de quinze
metros de altura.
Também foram usadas várias salas, sendo que o filme começou no andar
debaixo com o nascimento de um bebê. À medida que o bebê cresce no filme, outras
experiências também vão acontecendo. Com cenas desbotadas, os espectadores
foram conduzidos à uma outra sala, por corredores sinuosos, um labirinto escuro e
espelhado. Estes corredores levaram à uma outra sala onde foram usadas cinco telas,
dispostas em forma de cruz, para mostrar cinco cenas diferentes.
63
Figura 35 - Labyrinth – 1967
Disponível em: http://www.westland.net/expo67/map-docs/cinema.htm . Acesso em 10/07/2016
O Pavilhão da Checoslováquia ofereceu ainda, uma experiência audiovisual
bastante interessante para o público da Expo 67. Chamada de Diopolyecran a
instalação reuniu as pessoas em uma sala que, sentadas no chão acarpetado,
assistiram a uma exibição de slides projetados do interior de 112 cubos. Eles
formaram uma tela plana, com características tridimensionais, e durante onze minutos
o público assistiu uma apresentação de aproximadamente 15 mil slides.
Figura 36 - Diopolyecran
Disponível em: http://www.westland.net/expo67/map-docs/cinema.htm. Acesso em 10/07/2016
64
Enquanto essas experiências com múltiplas telas aconteciam, a tecnologia
evoluía, proporcionando novas possibilidades de comunicação, como vimos no
capítulo anterior. Por sua vez, a tela que progressivamente ganhava mais espaço no
cotidiano das pessoas, também se apropriava do conteúdo, disponibilizando-o a
qualquer tempo ou lugar. Um público mais participativo, em conjunto com dispositivos
móveis cada vez mais popularizados e portáteis, descobre novas oportunidades para
usar esses equipamentos a seu favor.
2.3 Second Screen: telas conectadas
As primeiras considerações sobre o uso sequencial ou simultâneo de várias
telas pelo público em geral, surgiram a partir do conceito de second screen. Uma
segunda tela diz respeito à utilização de um device14 que tem a função de proporcionar
uma experiência melhorada do conteúdo de outro dispositivo, e em geral apresenta
recursos interativos durante a exibição de um conteúdo linear, como por exemplo um
programa de televisão. Esse conteúdo pode ser oferecido dentro de um aplicativo
especial ou como destaques em vídeo em tempo real, nas redes sociais.
Vários estudos têm mostrado um grande número de pessoas que utilizam
algum outro tipo de dispositivo enquanto assistem televisão. Eles também mostram
uma maior frequência de uso do tablet ou smartphone ao assistir televisão, assim
como outros estudos destacam que há um percentual crescente de posts com
comentários nas redes sociais, sobre o conteúdo que está sendo assistido na
televisão.
É possível elencar muitas aplicações para uma segunda tela. Para exemplificar
podemos citar: transmissões esportivas com informações adicionais para aplicativos
para smartphones; programas de TV com tweets15 e comentários em tempo real;
aplicativos que estendem as informações de conteúdo; shows que disponibilizam em
seus sites, conteúdo dedicado exclusivamente para a segunda tela; console de jogos
de videogame com dados extras, como um mapa ou informações estratégicas que
podem ser sincronizadas com o conteúdo que está sendo visto no dispositivo portátil;
aplicativos de recomendação e descoberta de programas de TV com guias
apropriados como EPG (Eletronic Program Guides).
14 Device é um dispositivo móvel como um smartphone ou tablet. 15 Postagens feitas através da Rede Social Twitter.
65
Organizadores de conferências e reuniões de negócios estão incorporando a
segunda tela em seus eventos de forma a aprofundar o envolvimento do público. De
acordo com o 2014 Trend Tracker, a terceira lista anual das 50 melhores tendências
em eventos, produzido pela Global Experience Specialists (GES)16, a segunda tela foi
um fenômeno que esteve em bastante evidência em 2014. Segundo Robin Stapley,
VP-design e criativo da GES:
[...]os participantes estão tão colados aos seus dispositivos, mesmo enquanto assistem a uma apresentação ao vivo, ou em casa, na televisão, que as empresas estão fornecendo-lhes uma ferramenta de engajamento simultâneo que pode ser acessada em seus dispositivos. (2014 Trend Tracker, p.6)
Alguns softwares permitem que apresentadores de uma conferência
compartilhem slides e apresentações em tempo real, dessa maneira os participantes
podem segui-los com seus dispositivos na mão. Oferecer a segunda tela em
conferências transforma dispositivos pessoais em uma parte integrante da experiência
que o evento proporciona e transforma o público de ouvintes passivos em seguidores
ativos que se envolvem com os palestrantes e outros participantes.
Dessa forma é possível entender como a cultura participativa está cada vez
transformando o cotidiano das pessoas. Segundo Henry Jenkins:
A expressão cultura participativa contrasta com noções mais antigas sobre a passividade dos espectadores dos meios de comunicação. Em vez de falar sobre produtores e consumidores de mídia como ocupantes de papeis separados, podemos agora considerá-los como participantes interagindo de acordo com um novo conjunto de regras, que nenhum de nós entende por completo. (JENKINS, 2008 p.28)
Dentro dessa perspectiva, entende-se que o público passa a exercer um novo
papel, pois deixa de consumir conteúdos prontos e torna-se um agente que cria novas
ideias. Essa mudança na lógica de circulação do conteúdo, indica que o caminho
segue na direção de um sistema onde o público elabora, redesenha, reinventa e
compartilha assuntos de maneiras inéditas a todo instante.
16 Empresa de Eventos de Marketing Global.
66
2.4 Um olhar sobre o novo mundo multitelas.
Mas como é possível determinar qual é a segunda tela que está sendo utilizada
por uma pessoa? De fato, não é, pois este é um fator subjetivo que parte da
importância dada a cada device no momento do uso. Além disso, como as pessoas
têm vários dispositivos, podem dedicar a eles a importância que acharem que devem
no momento que o estão utilizando. Entende-se, portanto que cada tela está apta a
promover um tipo de experiência diferente para cada usuário.
Em 2014 a Microsoft, realizou a pesquisa Telas e Multitelas17 que resultou num
estudo sobre a relação dos usuários com telas diferentes, entre elas, TV, notebook ou
desktop, videogame, smartphone e tablet, além de analisar de que maneira as
pessoas combinam essas telas em suas atividades cotidianas. Publicada em 2015,
essa pesquisa chegou aos resultados que veremos a seguir.
Há algum tempo, nosso comportamento on-line era fragmentado e estávamos
habituados, no âmbito digital, com atividades que eram pensadas de forma separada:
estudar, compartilhar, comprar, ler, etc. Com a evolução tecnológica essas atividades
passaram a ser experimentadas de maneira simultânea, ou seja, tudo pode acontecer
ao mesmo tempo, no momento em que um evento acontece.
A maior parte de nossa exposição aos meios de comunicação acontece através
de telas, mas o que pode ser esperado de cada tela? O que elas podem oferecer de
melhor para que a experiência do público se dê de forma efetiva? Para responder a
isso é necessário entender as características de cada tela associadas ao que ela pode
potencialmente oferecer, como mostra a pesquisa da Microsoft.
A TV ainda é considerada a primeira tela quando se trata de assistir uma
programação em casa. Isto se dá por seu grau de importância histórico, bem como
sua abrangência em termos de audiência entre um público mais velho. Por ser
essencialmente um dispositivo doméstico, a televisão também é, em geral, associada
a momentos de relaxamento e descontração.
O desktop e o notebook oferecem uma possibilidade de adquirir conhecimento
e por isto estão diretamente ligados à sensação de poder, além de permitir a interação,
o que reforça esse sentimento. Esse tipo de tela, permite que se faça mais de uma
atividade simultaneamente, e por isso se caracteriza como uma tela muito mais ativa,
17 Disponível em: https://www.eventials.com/iabbrasil/telas-multitelas/. Acesso em 16/05/2015.
67
possibilitando que o usuário faça pesquisas, busque informação adicional, acesse
qualquer tipo de conteúdo que lhe interesse.
Com o smartphone prevalece a mobilidade. O fato de ser um dispositivo
essencialmente pessoal o transforma numa tela que permite uma relação emocional,
o que nos leva a pressupor que os conteúdos acessados por esse dispositivo estão
diretamente ligados à interação e à individualidade. Destaca-se entre o público mais
jovem e está intrinsecamente ligado ao seu estilo de vida.
Por sua vez, o tablet tem características similares ao smartphone, porém o que
se sobressai é a experiência que este tipo de dispositivo pode proporcionar. Entre
essas experiências está o fato que a tela tátil tem uma área maior e traz um conforto
superior para a realização de algumas atividades.
Já no videogame o que conta é o envolvimento. Seja nos jogos on-line, off-line,
single player ou multiplayer, o destaque é para a imersão, que ganha uma grande
importância. Este device ainda remete ao prazer da conquista, pois há vários desafios
a serem vencidos, tanto em relação aos oponentes, quanto no que diz respeito aos
objetivos pessoais de cada jogador.
O que vemos aqui é que cada tela parece ter uma vocação, porém é importante
ressaltar que seu uso é contextual, sendo assim depende de onde estamos, com
quem estamos e principalmente o que estamos vendo. Esse limiar entre o uso de cada
tela, está cada vez menos aparente e progressivamente mais sujeito às mudanças
circunstanciais às quais vivemos expostos.
Além disso, a pesquisa ressalta como essas telas podem ser combinadas para
potencializar suas características individuais. Sob esse ponto de vista esse estudo da
Microsoft identificou quatro macros categorias que podem ser observadas com mais
atenção:
a) Distração e multitarefa: aqui as telas são acessadas simultaneamente,
porém não precisam tratar do mesmo tema, e a atenção do público é dividida
entre elas;
b) Teia de Investigação: nesse caso as telas podem ser simultâneas ou
sequenciais, no entanto a principal característica é que os temas estão
necessariamente relacionados, o que destaca elementos como a
curiosidade e a descoberta;
68
c) Teia Social: com a premissa de colocar o usuário nas funções de conexão e
compartilhamento, essa categoria remete às redes sociais e é possível
observar o uso de telas simultâneas, sendo que os temas estão
relacionados;
d) Quantum18: essa categoria está ligada à realização de uma tarefa que pode
ser iniciada em uma tela e terminada em outra. A mudança de tela não tem
um único motivo, portanto pode estar relacionada a uma atitude do usuário,
ou simplesmente a uma limitação técnica do dispositivo ou local visitado.
Está sujeito ao contexto, porém os temas estão relacionados e o uso das
telas é, em geral, sequencial.
A pesquisa mostra ainda que 82% dos respondentes considera o uso das várias
telas uma forma de serem mais eficientes naquilo que fazem, e 65% entende que essa
multiplicidade de telas é o único jeito de fazer tudo que precisam. Esses dois
resultados, demonstram como as pessoas estão convivendo com as rápidas
transformações contemporâneas, e tratando de se adaptar a elas.
Segundo uma pesquisa do Instituto de Pesquisas Nielsen, intitulada Screen
Wars19 e publicada em março de 2015, as pessoas gostam da liberdade de estarem
conectadas a qualquer hora e qualquer lugar e isto representa um desafio na busca
da atenção do público em geral, uma vez que o conteúdo está fragmentado em vários
formatos. O instituto entrevistou 30.000 pessoas on-line, em sessenta países, para
entender como o panorama digital está mudando e interferindo diretamente na
maneira como, onde e porque assistimos programações audiovisuais.
Quase 70% dos respondentes acha que as interações pessoais estão sendo
substituídas pelas interações on-line, assim como quase metade deles prefere assistir
programas que estejam atrelados a alguma rede social. Os smartphones são os
aparelhos mais lembrados quando se trata de mobilidade, e os assuntos pelos quais
essas pessoas mais se interessam tendem para as categorias de cuidados com a
saúde, educação, gastronomia e finanças pessoais. Cerca de 60% pensa, ainda, que
as maiores telas são as melhores para assistir programações em vídeo.
18 Nota da Autora: Aqui a palavra Quantum se apropria do significado utilizado pela Física e que quer dizer descontinuidade. 19 Disponível em http://www.nielsen.com/us/en/insights/reports/2015/screen-wars-the-battle-for-eye-space-in-a-tv-everywhere-world.html.
69
As pessoas têm usado seus devices para usos como a construção ou
manutenção de relacionamentos, busca de informações, e também para
entretenimento. Isso significa, ficar em contato com a família ou amigos, saber das
notícias em geral, pesquisar assuntos específicos de seu interesse, além de tirar ou
ver fotos, ver vídeos ou simplesmente ouvir música.
Nessa pesquisa também é possível ter uma ideia de preferências por gênero
de programação, e telas mais utilizadas quando o espectador está em casa ou em
movimento. Numa análise por gênero de programação, a televisão aparece como
preferência em várias categorias, como noticiários, shows de variedades,
documentários, programas de culinária, reality shows, entre outros, porém o
computador assume a liderança quando se trata de assistir vídeos de curta duração20.
Não obstante, a pesquisa mostra também as telas preferidas dependendo do
local ou da atividade praticada num determinado momento. Para as atividades mais
domésticas, como passar um tempo com a família, cozinhar ou comer, a televisão é a
tela preferida, porém no caso de passar o tempo sozinho ou com amigos em casa a
televisão divide a preferência com o computador. Para as atividades fora de casa, os
telefones móveis são os preferidos.21
De acordo com o Consumer Barometer22 o percentual de pessoas com acesso
à internet no Brasil passou de 40% em 2012 para 64% em 2016, sendo que 58%
acessam a rede mundial diariamente. Mais de 95% do público pesquisado utiliza a
TV, seguida dos telefones móveis (básicos e smartphones) que são mencionados por
89% dos respondentes. A pesquisa também mostra que além dos dispositivos mais
comumente citados, como desktop, notebook e tablet, aparecem ainda, as TVs com
internet habilitada (smartv), os dispositivos digitais para salvar ou gravar programas
de TV, assim como os dispositivos digitais para transmitir conteúdo da internet na tela
da TV.23
Seguindo as tendências do uso de simultâneo de dispositivos, é possível
constatar que quando os pesquisados são perguntados a respeito da última vez que
usaram um dispositivo enquanto assistiam TV, que mais de 80% deles menciona o
20 Ver Anexo 2 21 Ver Anexo 3 22 Nota da autora: O Consumer Barometer é uma ferramenta on-line oferecida pelo Google, que fornece informações sobre como as pessoas usam a internet ao redor do mundo. Disponível em: https://www.consumerbarometer.com/en/. 23 Ver Anexo 4
70
smartphone, seguido do computador e do tablet. Conforme mostra o gráfico a seguir,
o uso de telas simultâneas no Brasil, ganhou expressão desde 2012, principalmente
no que se refere ao uso de duas telas.
Gráfico 1 - Uso de telas Brasil de 2012 à 2016
Fonte: Gráfico desenvolvido pela autora com base na ferramenta
Consumer Barometer. Disponível em:
https://www.consumerbarometer.com/en/trending/?countryCode=BR&category=TRN-NOFILTER-ALL
Acesso em 01/08/2016
Em 2015, a empresa de consultoria Accenture24, publicou o Digital Video and
the Connected Consumer, onde se pode constatar mudanças que impactam o cenário
global de consumo de vídeos.
Segundo esse estudo, a maneira como o público consome vídeos, está
passando por transformações rapidamente. O consumo de vídeos de curta duração
em dispositivos conectados à internet tem ganhado muito espaço nesse cenário. Por
exemplo, o número de horas que as pessoas passam assistindo esse tipo de vídeo
no Youtube, tem crescido 50% a cada ano, sendo que metade dessas pessoas fazem
isso usando dispositivos móveis. Da mesma forma, a audiência de longas metragens
e programas de TV, tem migrado da televisão para outros dispositivos digitais como
24 A Accenture é uma empresa de consultoria em tecnologia que também oferece pesquisas nessa área. Ver: www.accenture.com.
31
36
2931 31
8
1517
2426
0 3 4 8 9
2012 2013 2014 2015 2016
Evolução percentual do uso de telas simultâneas no Brasil
apenas uma tela duas telas três telas
71
os computadores, smartphones e tablets. A figura a seguir mostra que, no ano de
2015, a TV perdeu 13% de sua audiência de programas de TV e filmes, assim como
os programas esportivos perderam 10% de sua audiência na TV.
Tabela 1 - Dispositivo preferido para acessar diferentes tipos de conteúdo digital
Fonte: Digital Video and the Connected Consumer 2015
Essa mudança tem acontecido de maneira transversal em todas as faixas
etárias. Apesar de ser muito mais veloz no grupo dos jovens, ela também é
considerável para o público mais velho.
Esse estudo também aponta que pelo menos 87% do público pesquisado, usa
um outro device enquanto está assistindo TV, entre eles, os smartphones, tablets,
notebooks, leitores de e-book e consoles de game. Isso significa que o uso de pelo
menos uma segunda tela, está instalado como um elemento importante nesse cenário
e deveria ser considerado pelos produtores de conteúdo.
Há que se considerar ainda, algumas implicações locais. Na América do Norte
a TV perdeu menos audiência em comparação aos números globais, ainda que esse
estudo mostre que o público está propenso a passar mais tempo, explorando a internet
ou assistindo filmes por streaming.
72
O consumo de conteúdo on-line, não se restringe apenas aos nativos digitais.
O estudo mostra que tem se tornado uma norma geral, uma vez que 78% dos
respondentes tem assistido vídeo clipes on-line, diariamente ou semanalmente,
enquanto, 76% tem assistido programas de TV ou filmes em aplicativos específicos.
Tabela 2 - Frequência de acesso a conteúdo digital
Fonte: Digital Video and the Connected Consumer 2015
À medida em que a oferta de acesso e conteúdo on-line cresce, também
aumenta a exigência em relação às características dos serviços oferecidos. O que tem
acontecido, é que há um crescente número de público assistindo algum tipo de
programação on-line, enquanto a qualidade das experiências de transmissão se
movimenta no sentido inverso.
O quadro a seguir, mostra os principais motivos de reclamação dos
consumidores de programas de TV, longas metragens ou programas esportivos
quando são acessados em dispositivos conectados à internet. Quase 90% dos
respondentes assistem esses tipos de programas em algum tipo de tela que não seja
a da TV e reclamam da publicidade on-line, do carregamento do vídeo e das
interrupções durante a exibição do conteúdo que estão assistindo, em função da baixa
qualidade do serviço prestado.
73
Tabela 3 - Reclamações de consumidores que assistem vídeos na internet
Fonte: Digital Video and the Connected Consumer 2015
A Accenture também publicou outro estudo, em abril de 2016, que trata de cinco
tendências em relação aos screenagers. Vivendo num mundo hiperconectado e
hiperacelerado, eles se relacionam cotidianamente através das telas de seus devices.
Isso está criando uma série de novas experiências, novos serviços, novas
oportunidades, assim como novos negócios que estão reconfigurando as indústrias,
as relações pessoais e comerciais, bem como a forma de entender o mundo
contemporâneo.
Uma vez que a oferta de novos dispositivos inteligentes está aumentando, a
caraterística mais evidenciada desse público, é a expectativa por inovações, pois eles
parecem estar sempre esperando por algo novo para lidar com os desafios constantes
impostos pela vida contemporânea, assim como pelo mercado, no que tange ao
aspecto do consumo.
A primeira tendência levantada por esse estudo da Accenture, é o efeito
multiplicador. Se a maneira de se relacionar com o mundo a sua volta se dá por meio
74
de seus dispositivos, é compreensível que eles aproveitem as características de cada
equipamento para potencializar essas relações. Assim, eles multiplicam o número de
devices, para que possam também multiplicar o número de experiências em seu
cotidiano. De maneira geral, essa tendência mostra que além das atividades que já se
tornaram comuns como postar fotos, jogar ou assistir vídeos, os screenagers também
estão usando seus dispositivos para realizar pagamentos, e fazer cursos on-line.
Enquanto 87% do público pesquisado, usa aplicativos em dispositivos móveis para se
comunicar, 81% assiste filmes e séries por streaming, e 69% joga algum tipo de game
on-line.
A segunda tendência identificada pelo estudo em questão, trata da chegada da
internet a outros equipamentos além dos eletrônicos já disponíveis. A chamada IoT -
Internet of things25, ou internet das coisas. Apesar de ainda estar numa fase de
desenvolvimento, a internet está chegando aos carros, geladeiras, relógios, etc., e
conforme a tecnologia avança, ocupará todos os espaços que conseguir. Os
screenagers são os principais elementos que adotam novos hábitos nesse sentido e
que podem disseminar seu uso.
Em terceiro lugar aparecem as transmissões propriamente ditas onde
destacam-se três pontos importantes, tais como as questões relacionadas à
privacidade, à segurança e à qualidade do serviço. À medida em que a evolução da
tecnologia viabiliza experiências mais amplas, essas questões se tornam prioridades
e geram uma atenção especial por parte desse público.
A quarta tendência, diz respeito ao fato que os screenagers estão cada vez
mais maduros, sofisticados e seletivos em relação à sua vivência digital, portanto não
estão dispostos a aceitar nada que não os faça felizes. Certamente esse grupo estará
no centro de todas as inovações que estão por vir.
Por sua vez, a quinta tendência evidencia uma característica desse público.
Uma vez que estão no centro das atenções e que usam a tecnologia para estarem
mais informados, a vida dos screenagers será cada vez mais pautada pela confiança
e pelo aspecto emocional. Para se engajarem em uma causa, ou pagarem por
qualquer serviço ou informação, o foco estará naquilo que eles acreditam.
As quatro pesquisas que acabamos de acompanhar, focalizam sobremaneira
as implicações de uma impactante mudança cultural decorrente da evolução
25 Ver Apêndice 1
75
tecnológica e da revolução digital. A digitalização tem invadido todos os setores da
economia mundial, e de acordo com o Digital Economic Value Index (Accenture,
janeiro de 2016), foi responsável por 22% do PIB mundial em 2015 com uma previsão
de passar para 25% até 2020. Conhecemos diariamente novas tecnologias, novas
respostas e formas de fazer algo, além do consequente aumento das informações e
conteúdos gerados por elas. A rapidez e as múltiplas tarefas ganham cada vez mais
destaque em nosso cotidiano, provocando um repensar de modelos, expectativas e
organização daquilo que fazíamos de maneira habitual.
Jean Baudrillard reflete sobre a condição humana nesse contexto e destaca
alguns aspectos importantes. Para o autor:
As máquinas só produzem máquinas. Isso é cada vez mais verdadeiro na medida do aperfeiçoamento das tecnologias virtuais. Num certo nível maquinal, de imersão na maquinaria virtual, não há mais distinção homem/máquina: a máquina situa-se dos dois lados da interface. Talvez não sejamos mais do que espaços pertencentes a ela – o homem transformado em realidade virtual da máquina, seu operador espetacular, o que corresponde à essência da tela. Há um para além do espelho, mas não o além-tela. (BAUDRILLARD, 2011, p. 130).
Não obstante, num mundo multifacetado e multitarefa, é preciso criar valor e
significado para as mensagens, uma vez que estamos vivendo um modelo
participativo de cultura onde o público tem poder de compartilhar e remixar conteúdos
de mídia de maneiras que antes não poderiam ser imaginadas (JENKINS; FORD;
GREEN, 2014). Tornou-se, portanto, imprescindível conceber mensagens que
tenham sentido para quem as recebe.
Para Judy Ungar Franks (2011 p.18) estamos desenvolvendo uma série de
mecanismos para dar sentido e propósito ao mundo à nossa volta, uma vez que tudo
parece ter entrado num estado caótico, já que uma parte das pessoas ainda tem
dificuldade para conseguir acompanhar a velocidade das mudanças contemporâneas.
Nesse ritmo acelerado, fica evidente que à medida em que um avanço tecnológico
nos é apresentado, desviamos nossa atenção para o que está por vir, nos
esquecemos que a tecnologia é transitória e que em breve aparecerá outra novidade.
Para a autora, a tecnologia causou grandes mudanças no cenário dos meios
de comunicação e mudou várias regras que antes eram pensadas de forma linear.
Porém, de acordo com Franks (2011) a tecnologia não é, de fato, o epicentro dessas
mudanças. Ela afirma que o fenômeno transformador é impulsionado pelo
comportamento humano. Cada vez que uma nova mídia aparece, achamos um
76
espaço para ela e criamos uma nova função ou relação para o meio que já existia. Um
exemplo, usado por Franks, é a revolução causada pelo advento da imprensa de
Gutenberg. A autora sugere que por mais impactante e transformadora que essa
invenção tenha sido, alterando o cenário comunicacional para sempre, a página
impressa ofereceu um valor crítico, porém não substituiu uma das formas mais antigas
formas de comunicação humana, que é a palavra falada, ou a comunicação oral.
Ainda que a tecnologia digital esteja afetando diretamente a maneira como nos
comunicamos, considero que a essência humana esteja salvaguardada no poder dos
seres humanos de criar e contar histórias.
77
3 Múltiplas histórias em uma rede de telas conectadas
Como vimos no capítulo anterior, a tecnologia digital tem possibilitado o
desenvolvimento de uma nova estrutura comunicacional que transcende a simples
distribuição de uma informação e possibilita a criação de conexões entre pessoas,
dispositivos, bancos de dados e, em breve, entre tudo o mais que existe.
Como resultado, há uma transformação na lógica da interlocução unilateral
antiga, uma vez que passamos a ter vários envolvidos nesse processo, que agora
produzem, compartilham e têm acesso a todo tipo de conteúdo.
Nesse sentido, podemos observar que em todos os setores, a sociedade está
passando por modificações resultantes desse novo arcabouço informacional
multifacetado e participativo. Como consequência disso, criou-se uma estrutura de
redes que tem transformado a economia, a educação, a política, bem como
influenciado diretamente a cultura e nosso cotidiano.
A tecnologia digital, associada à popularização da internet, disseminou a ideia
desse tipo de rede. Isso se deu, pelo fato de facilitar o acesso à informação, à
produção de conteúdo, à expressão de opinião, de forma que pudéssemos estar
ligados por interesses comuns. Esse fenômeno tem impactado a forma como
entendemos a contemporaneidade e lidamos com a realidade cotidiana.
Massimo Di Felice (2014) explica que as inovações tecnológico-comunicativas
desencadeiam um processo disruptivo. O autor exemplifica este fato, citando que a
introdução do alfabeto para humanidade, foi muito mais que a possibilidade de uma
nova forma de se comunicar. Ela de fato, mudou a maneira como aquelas pessoas se
relacionavam entre elas e com o mundo a sua volta. Di Felice segue este raciocínio
com outro exemplo, ao lembrar que McLuhan destacava as diferenças entre os
homens, antes e depois da invenção da tipografia. O homem tipográfico é aquele que
conhece o mundo através da leitura e por isso, cria um tipo de inteligência e
organização do pensamento formadas pela escritura, pela sequência de linhas,
capítulos e parágrafos.
Por conseguinte, nesse novo contexto das redes, há que se considerar a
existência de uma nova “arquitetura informativa inovadora” (LEMOS;DI FELICE,
2014), que rompe com alguns processos anteriores e que também proporciona uma
nova maneira de compreendermos o mundo. Ainda segundo Di Felice (2014):
78
O conhecimento, como o estamos construindo agora, baseia-se no diálogo; não está, portanto, predeterminado, mas deve ser construído colaborativamente. A internet, decerto, está mais próxima da construção do conhecimento por meio do diálogo[...], só que o diálogo pelas redes não ocorre apenas entre humanos. Nada mais será como antes. Os problemas já não serão resolvidos do mesmo modo. [...]O mesmo problema que herdamos do passado, poderá ser enfrentado hoje, de outra maneira, que é esta maneira em rede, colaborativa, coletiva, conectiva. (LEMOS; DI FELICE, 2014, p.11)
Para Ronaldo Lemos (2014) vivemos numa sociedade que foi organizada em
torno do texto, no entanto ele está deixando de ser o eixo central em nossa forma de
nos comunicarmos. O autor destaca a relevância que as imagens, o som e o
audiovisual vêm ganhando numa sociedade cada vez mais multimídia e acrescenta
que isso está causando impacto na maneira como nos relacionamos e “na forma como
a mídia ocupa e coordena espaços da vida”. Ademais, cada vez que acontece alguma
transformação no ambiente midiático que nos envolve, esse fenômeno leva a uma
mudança de vida, à qual temos que nos adaptar.
Para Di Felice (2014) as redes, constituídas por meio da internet, abrem espaço
para formas complexas de distribuição da informação, pois não obedecem a lógica de
um simples repasse. Suas principais características estão na possibilidade de que as
informações sejam acessadas de qualquer ponto da rede e que “a totalidade das
informações esteja acessível a todos, independentemente de onde é acessada a
rede”. Além disso, essa constatação parece reforçar o fato de que, pela ótica da
tecnologia, se torna inviável a manutenção de pressupostos centrais. Isso é o que
Jean-François Lyotard definiu como metanarrativas, ou seja, grandes narrativas
totalizantes que explicam o mundo a partir de uma perspectiva central. A
complexidade contemporânea aponta para um caminho mais pluralizado, no “qual
sempre cabe outro ponto de vista, sempre é possível acessar outro link, ou
acrescentar mais uma informação.”. Sendo assim, se adotarmos um enfoque
geopolítico, não será possível pensar na centralidade do Ocidente. Apesar do
Ocidente ter sido palco de grandes avanços e grandes momentos da história, essa
nova conformação de acesso à informação, nos oferece a oportunidade de também
entender o mundo à luz de uma perspectiva extraocidental.
Mais do que isso, “estamos no momento de pensar transnacionalmente”
(JENKINS; FORD; GREEN, 2014), pois, a propagabilidade das mensagens tem
colaborado para que aumente consideravelmente a capacidade das pessoas, de
analisar e difundir qualquer tipo de conteúdo. Isso significa, que os criadores de um
79
conteúdo, podem decidir por uma divulgação em meios de comunicação mais
participativos, ou mais informacionais, no entanto “em toda parte, o conteúdo de mídia
de massa continua a ser aquele que se espalha para mais longe, de forma mais ampla
e de maneira mais rápida. ” (JENKINS; FORD; GREEN, 2014). De acordo com os
autores:
A “propagabilidade” se refere ao potencial – técnico e cultural – de os públicos compartilharem conteúdos por motivos próprios, às vezes com a permissão dos detentores dos direitos autorais, às vezes contra o desejo deles. [...] Não estamos interessados em criar um novo termo da moda. Em vez disso, queremos desafiar os leitores a refletir sobre as metáforas que todos usamos quando falamos sobre conteúdos que se movimentam através do cenário cultural[...]. (JENKINS; FORD; GREEN, 2014, p.26)
Esse cenário nos leva a tornar nosso repertório de conhecimentos mais rico,
influencia nossa visão de mundo e, nesse contexto de rede, nos faz compreender que
estamos caminhando cada dia mais para uma diversidade interpretativa, assim como
uma riqueza de significação. Diante disso, é possível entender que a evolução
tecnológica digital, que nos predispõe a olhar o mundo através das telas oferecidas
pela disseminação dos dispositivos pessoais, também age diretamente sobre a forma
como contamos histórias. Vicente Gosciola afirma:
As novas tecnologias de comunicação e de informação, ou as novas mídias, abriram-se também para as possibilidades de contar histórias. Assim como no caso do cinema, no período inicial do contar histórias através das novas mídias, as histórias eram simples. Porém, agora, elas são contadas de maneira complexa, isto é, graças aos recursos das novas mídias, podem ser apresentadas por diversos pontos de vista, com histórias paralelas, com possibilidades de interferência na narrativa, com opções de continuidade ou descontinuidade da narrativa e muito mais. (GOSCIOLA, 2003, p.19)
O crescente acesso às novas tecnologias, assim como as estratégias utilizadas
no mundo do entretenimento para contar ou recontar uma história, aumentam o poder
de participação do público, assim como estimulam e favorecem o seu engajamento.
As grandes corporações que detém os meios de comunicação de massa mais
tradicionais, já não podem pensar de maneira isolada, pois a participação ativa do
público é um caminho sem volta.
80
3.1 Storytelling: contar e recontar histórias
Os seres humanos vêm contando histórias desde que aprenderam a se
comunicar. Alguns antropólogos afirmam que é nossa capacidade de contar histórias
que nos separou de outros primatas ao longo da evolução. Com o surgimento da
escrita, da imprensa e dos meios de comunicação eletrônicos, elas puderam ser
transcritas, gravadas e compartilhadas em todas as partes do planeta.
Histórias já experimentaram todos os tipos materiais para correr o mundo.
Foram arranhadas, pintadas e esculpidas, em madeira, pedra, peles e papel.
Percorreram um longo caminho até poderem ser armazenadas em arquivos digitais,
e ainda assim, continuam sendo contadas da maneira mais simples, por meio de
contadores de histórias. Algumas, sobrevivem ao tempo, e permanecem na memória
sem se ocupar de nenhum desses suportes, sendo contadas através das gerações.
As histórias contemporâneas têm um alcance ilimitado. Estendem-se para além
de seus contornos tradicionais, como a mitologia, as lendas, os contos populares, as
fábulas, os contos de fadas, entre outros, e chegam aos níveis mais pessoais,
ultrapassando as barreiras culturais, para serem contadas nas redes sociais. Cada
novo meio de comunicação, ou nova tecnologia que surge, representa um espaço fértil
para que novas histórias sejam criadas ou consumidas.
Na contemporaneidade, criam-se, por meio de novas ferramentas, inúmeras
oportunidades de interagir com os mais diversos tipos de histórias, seja
individualmente, ou em grupo. Videogames cada vez mais sofisticados e digitalizados,
conduzem os jogadores à uma imersão em mundos expandidos, paralelos, maiores
do que o mundo em que vivemos. Histórias que antes eram imaginadas, agora podem
ser experimentadas de maneiras interativas. Quanto maior o envolvimento do público
com a história, maior será seu engajamento e sua atenção ao que está sendo contado.
Um exemplo que ilustra esse pensamento, é o que tem acontecido com os contos de
fada, que estão buscando novos caminhos para atender públicos com mais acesso à
informação e com expectativas diferentes das gerações anteriores.
81
Os contos de fadas recontados em versões contemporâneas.
No final do século dezenove já era possível encontrar produções de cinema
baseadas em contos de fada, ainda que Cendrillon26 (Cinderela) de 1899 tenha
apenas seis minutos de duração. Ao longo do século XX vários contos de fada
ganharam vida no cinema e foram eternizados como clássicos pelas mãos de Walt
Disney. Branca de Neve e os Sete Anões (1937), Pinóquio (1940), Fantasia (1942),
Cinderela (1950), Alice no país das Maravilhas (1951), Peter Pan (1953), A Dama e o
Vagabundo (1955) e também, A Bela Adormecida (1959), são alguns deles,
conhecidos mundialmente.
A Bela Adormecida foi o décimo sexto filme animado dos estúdios Disney e o
último filme de contos de fadas realizado por Walt Disney, que faleceu em 1966. Foi
filmado em 70 mm, um privilégio que poucos filmes puderam ter, pois era uma
novidade na época. Foi o último filme da Disney pintado à mão, processo que seria
substituído pela xerografia logo depois. O roteiro foi adaptado a partir do conto de
fadas La Belle au bois dormant de Charles Perrault e recebeu o nome de A Bela
Adormecida em referência ao balé do russo Piotr Ilych Tchaikovsky. Todas as músicas
do filme foram tocadas pela orquestra Sinfônica de Berlim e são arranjos e adaptações
das obras de Tchaikovsky.
De todos os filmes baseados em contos de fadas e lançados até 1959 pelos
estúdios Disney, A Bela Adormecida também se diferenciou, pois Felipe foi o primeiro
príncipe a ter um nome. Os nomes dos personagens eram bastante importantes, pois
seriam usados nas filmagens da pré-produção, com atores de verdade que serviam
como referência para os artistas de animação. A atriz Audrey Hepburn inspirou a
silhueta esbelta da Princesa Aurora e algumas das ideias da história de A Bela
Adormecida foram sugestões que, na verdade, não puderam ser usadas em Branca
de Neve e os Sete Anões de 1937, por serem tecnicamente complexas demais para
os anos 30. O filme reestreou nos cinemas em 1970, 1979, 1986 e 1995, porém a
Disney só voltou a produzir animações baseadas em contos de fadas em 1989 com o
lançamento de A Pequena Sereia.
26 Disponível em http://www.youtube.com/watch?v=QO4jtZU2LXU. Acesso em 05/01/2015.
82
Com os avanços da tecnologia e maior acesso à informação pelo público,
parecia inevitável buscar um novo caminho. De acordo com Mittell:
As transformações tecnológicas distantes da tela da televisão também impactaram a narrativa televisiva. A ubiquidade da internet permitiu que os fãs adotassem uma inteligência coletiva na busca de informações, interpretações e discussões narrativas complexas que convidam à participação e ao engajamento[...]. [...] Ainda que nenhuma destas inovações tecnológicas tenha provocado diretamente o surgimento da complexidade narrativa, o incentivo e as possibilidades que elas abriram tanto para a indústria midiática quanto para espectadores, acabaram por permitir o sucesso de muitos destes programas. (MITTEL, 2012 p.35).
Dessa forma, o mundo do entretenimento tem desenvolvido várias estratégias
no sentido de promover e fixar suas histórias. Argumentos inéditos estão cada vez
mais escassos e apenas refilmar antigas histórias com novos efeitos especiais e
superproduções já deixou de ser uma opção para um público ávido por novidades e
com acesso a todo tipo de informação. Some-se às exigências tecnológicas o
conhecimento disponível na palma mão e teremos um público multifacetado, exigente,
que busca explicações, que é participativo e onipresente. A narrativa27 ganha
destaque, a história28 pode ser revista, repensada, prolongada, ou seja, recontada.
Fica claro como os processos de construção dessas narrativas estão ganhando maior
complexidade, uma vez que a geração que vive na cultura digital está mudando a
forma como contamos as histórias (ROSE, 2011)
Em 2014 os estúdios Disney lançaram o longa metragem Malévola,
protagonizado por Angelina Jolie que recebeu uma assustadora caracterização para
o papel. O filme revela os acontecimentos que tornaram endurecido o coração da fada
Malévola e a levaram a amaldiçoar Aurora quando ainda era um bebê, ou seja, a
história por trás da história. Assim como ele, Encantada (2007), Alice no País das
maravilhas (2010), A Garota da Capa Vermelha (2011), Branca de Neve e o Caçador
(2012), Espelho Espelho Meu (2012), João e Maria Caçadores de Bruxas (2013) e
Jack o Caçador de Gigantes (2013) também são exemplos de como o cinema tem
buscado novas formas de contar as histórias que conhecemos desde pequenos.
27 Entende-se narrativa como o discurso ou texto narrativo em que se plasma a história e que equivale ao produto do ato da narração (REIS, 2000). 28 A história corresponde à realidade evocada pelo texto narrativo (REIS, 2000).
83
Cada um desses filmes, reconta uma história que aprendemos em outra época,
agora com um novo ponto de vista, sob uma nova perspectiva, com a inserção de
elementos modernos, ou com novas configurações. É também o caso da televisão,
com a série Once Upon a Time (2011) que revisita o universo dos contos de fada,
colocando os personagens dos clássicos da infância, em situações totalmente
atípicas, inesperadas e imprevisíveis, transitando entre realidades alternadas que dão
sentido à trama.
A televisão americana, por sua vez, segue o mesmo caminho do cinema
transformando o modo como as narrativas operam em suas produções. Segundo
Jenkins:
Nos anos 1960, quase todos os episódios das séries de horário nobre eram totalmente autônomos e completos, introduzindo uma crise temporária na vida dos protagonistas, mas tendo que terminar mais ou menos como tinham começado. (JENKINS, 2008 p.161).
Nas décadas de 1970 e 1980, vários produtores de televisão já pensavam em
expandir a complexidade narrativa da televisão episódica, porém as grandes redes
resistiam, uma vez que achavam que o público não se lembraria do que viu nos
episódios anteriores. Nos anos 1990 - com a chegada de equipamentos como o
videocassete que dava aos telespectadores a possibilidade de gravação, e da internet
que oferecia resumos a quem quisesse recordar os pontos chave do enredo – muitas
dessas dúvidas foram dirimidas e as séries televisivas americanas foram
impulsionadas na direção de arcos de história29 que se desenvolviam ao longo da
temporada, ou que evoluíam durante múltiplas temporadas. Já para Esquenazi:
[...] temos que reconhecer que a exploração americana do campo das séries continua a ser incomparável. Tanto no plano dos modelos de produção, da invenção narrativa e genérica, da consciência de questões culturais, políticas, feministas, econômicas e sociais, como no da exploração de territórios ficcionais inéditos, as séries televisivas americanas continuam à frente das outras produções nacionais, que, em muitos casos, as copiam. (ESQUENAZI, 2010, p.11)
A evolução tecnológica das produções audiovisuais resulta em narrativas
complexas e apresentam estratégias de storytelling que prendem os espectadores
pelos detalhes, estimulando a busca de informações além do programa para que se
29 Assumo aqui, para de arco de história, a definição de Jenkins (2008 p.330): ”estrutura narrativa televisiva em que roteiros secundários são desenvolvidos em múltiplos episódios, às vezes até em uma temporada inteira, ou em casos extremos, durante toda a série.”.
84
possa entender a história, bem como opinar, propor, descobrir ainda mais, ou seja
participar de forma ativa dos efeitos criados pelo assunto que se está acompanhando.
As narrativas modernas desenvolvidas nesse campo, criam engajamento no
público em um contexto contemporâneo e, como num ARG Alternate Reality Game
(Jogo de Realidade Alternada), faz com esse público experimente a possibilidade de
ver seus personagens favoritos em situações diferentes das que estão acostumados.
Dessa forma é possível exemplificar como a complexidade narrativa na ficção
seriada televisiva, que vem sendo articulada principalmente nas duas últimas
décadas, tem resultado num maior nível de exigência da atenção do espectador. Os
novos formatos seriados e episódicos encontram um público que se envolve de forma
mais ativa, mais participativa e que, portanto, está engajado em entender os detalhes
da fruição de seus programas favoritos.
As flexi-narratives e a atenção do telespectador.
De acordo com Jonathan Bignell (2005) as duas estruturas narrativas mais
comuns na televisão, eram as séries e as formas seriadas. As formas seriadas
consistem numa história em desenvolvimento que é dividida em várias partes. No
Brasil temos um exemplo disso nas novelas, que giram em torno de uma trama
principal e chegam ao final após alguns meses. Por sua vez, as séries se caracterizam
pelo fato de que nelas, a ambientação e os personagens de base não mudam, porém,
novas histórias envolvendo os personagens centrais, são apresentadas a cada
episódio inédito.
Na televisão contemporânea podemos ver frequentemente a fusão das
características das séries que apresentam uma única configuração, e a apresentação
de novas histórias em cada episódio, com o desenvolvimento de personagens e
histórias como ocorre nas formas seriadas. A combinação dessas duas estruturas é o
que Robin Nelson chamou, em 1997, de flexi-narratives, e que tem se multiplicado
significativamente nas últimas décadas. Nelson (1997) afirma que as soap operas
americanas da década de 1970, já apresentavam múltiplas narrativas, bem como,
múltiplos personagens, porém ele define dois programas como os precursores das
flexi-narratives: Mary Tyler Moore Show, apresentado no Brasil com o mesmo nome,
e Hill Streets Blue, conhecido no Brasil como Chumbo Grosso.
85
Isso se deve ao fato de que naquela época, a atenção dos telespectadores
adultos já estava começando a diminuir, portanto, surgiu a necessidade de investir em
novas formas de se aproximar do público e conquistar sua atenção. As emissoras
estavam deixando de se importar com a quantidade de telespectadores e saíam em
busca de uma audiência mais qualificada. O público, por sua vez, tinha ficado mais
exigente, motivado pelo desenvolvimento da liberdade cultural, assim como os
movimentos a favor dos direitos civis, da década de 1960, associado aos movimentos
feministas do início da década de 1970.
Esse novo cenário, despertou a necessidade de oferecer uma programação
adulta mais sofisticada, que prendesse a atenção dos telespectadores e aumentasse
a sua concentração. Pode-se dizer, então, que as flexi-narratives conseguem
despertar o interesse de públicos variados, pois conquistam as pessoas que assistem
regularmente e estão dispostas a acompanhar uma narrativa seriada, tanto quanto o
telespectador ocasional que assiste eventualmente e se satisfaz com a narrativa
encerrada naquele mesmo episódio.
Cada vez mais, os espectadores são conclamados a usarem uma gama maior
de habilidades cognitivas para poderem interpretar as histórias que acompanham.
Narrativas mais complexas exigem mais atenção do público, porém dão em troca um
treino intenso para o desenvolvimento de uma maior capacidade de observação, de
resolução de problemas e da busca de conhecimento, além de motivar o engajamento.
O público já não se limita apenas a receber o conteúdo que lhe interessa. Ele participa,
discute, questiona, aprende e ensina. Compartilha suas opiniões e fazem questão de
serem notados.
É possível perceber isso pela forma como se espalham pelo universo digital, a
criação de fóruns, comunidades, grupos de discussão, blogs, etc., com a intenção de
fomentar as discussões sobre enredos, fazer proposições e sugerir caminhos a serem
seguidos por personagens, além de descobrir mistérios ou dramas narrados nos
episódios ou temporadas. Por sua vez, os criadores dessas narrativas, procuram estar
bem próximos de seu público, oferecendo novas possibilidades de acesso às suas
histórias.
86
3.2 Transmidia Storytelling - construir universos
Para que haja uma dinâmica transmidiática, é preciso que uma narrativa
obedeça à alguns pressupostos segundo a definição de Henry Jenkins:
Histórias que se desenrolam em múltiplas plataformas midiáticas, cada uma delas contribuindo de forma distinta para nossa compreensão do universo; uma abordagem mais integrada do desenvolvimento de uma franquia do que os modelos baseados em textos originais e produtos acessórios. (JENKINS, 2008 p. 339)
Portanto, uma narrativa transmídia se desdobra em múltiplos suportes de
mídia. Ela se desenvolve de maneira transversal, de modo que cada meio possa
contribuir para o entendimento do todo, de acordo com suas próprias características.
Isso inclui formas diversas de participação na construção de histórias, sendo que cada
ponto de acesso ao conjunto, deve ser independente e autossuficiente.
Assim, uma história pode ser ter sido introduzida pelos quadrinhos, ser
expandida pelo cinema, ou pela televisão, até chegar a experimentações mais
imersivas como games, ou até atrações temáticas como parques de diversão. É
importante, que o público possa aprofundar seu conhecimento do universo narrativo,
à medida que acessa um novo meio, pois, caso contrário a redundância pode
desmotivá-lo, diminuindo seu interesse. Sem dúvida, há uma lógica econômica que
acompanha essa dinâmica, pois, o cinema e a televisão atingem públicos mais
diversificados, enquanto os games e quadrinhos alcançam segmentos mais
específicos. Quanto mais ampla a gama de oportunidades de acesso à história, maior
também será a capacidade de expansão de uma franquia.
Uma franquia de mídia diz respeito aos vários produtos midiáticos que podem
ser desenvolvidos a partir de uma narrativa que cria um universo próprio. Segundo a
Revista Geminis um exemplo clássico de franquia de mídia é o caso do Batman:
Criado em 1939 na revista de quadrinhos Detetive Comics, o homem-
morcego foi adaptado em inúmeras versões. Sua diegese (o mundo dado como real dentro da história) sangra os limites de uma única mídia. A narrativa de Batman, ou as “narrativas de Batman” formaram uma franquia disponibilizada em filmes, desenhos animados, seriados de televisão, dramatizações no rádio, videogames e criações de fãs (fan-fiction). 30
30 Revista Geminis – Comentários da Aula - Franquia Cinematográfica 1. Disponível em: http://www.geminis.ufscar.br/2012/05/comentarios-da-aula-franquia-cinematografic/. Acesso em 02/09/2106
87
As narrativas contemporâneas têm se tornado um campo bastante fértil para a
construção desses tipos de universos, já que diversidade tecnológica disponível,
oferece aos criadores amplas possibilidades de desenvolverem ambientes que não se
esgotam em uma única obra, ou em uma só mídia. Esses universos, em geral são
maiores do que a obra inicial, por vezes, maiores do que a própria franquia, pois
podem ser expandidos em diversos sentidos, conforme um novo elemento é
associado, como as propostas, sugestões, ou descobertas dos fãs. A sua concepção
segue caminhos próprios, pois depende das condições de mercado em que eles se
enquadram.
Na animação Meu Malvado Favorito (Despicable Me, 2010) os personagens
chamados de Minions, seres unicelulares amarelos que se comunicam por meio de
uma linguagem específica, fizeram tanto sucesso que ganharam uma animação
própria em 2015. Considerado um spin-off da animação de 2010, o filme Minons
(2015), conta a história que antecede o encontro dos pequenos seres amarelos, com
o personagem Gru do filme de 2010. Não obteve muito sucesso de crítica, porém
bateu recordes de bilheteria, conquistando tanto as crianças como adultos que, além
do filme, também consomem diversos tipos de produtos acessórios licenciados.
Figura 37 - Pôster da animação Minions (2015)
Disponível em: http://www.impawards.com/2015/minions.html. Acesso em 02/09/2016
88
Nos meios de comunicação, um spin-off é um programa de rádio, programa de
televisão, videogame, ou qualquer obra narrativa, derivada de uma ou mais obras já
existentes. A diferença de um spin-off para uma obra original é que ele se concentra,
em particular, mais detalhadamente em apenas um aspecto, por exemplo, concentra-
se mais em um tema especifico, personagem ou evento. Um spin-off pode ser
chamado de sequência quando ele existe no mesmo quadro cronológico de tempo
que seu trabalho de origem.
Os universos criados para uma narrativa, podem também, ganhar fãs em
diferentes gerações ao longo do tempo, como é o caso da franquia Pokémon. Seu
universo gira em torno de criaturas ficcionais que os seres humanos capturam e
treinam para que lutem uns contra os outros como um esporte. Criada em 1996, a
franquia se iniciou com jogos para o Game Boy da Nintendo. Hoje, a franquia se
desdobra em filmes, séries de televisão, jogos, cartas colecionáveis, mangás e
brinquedos. É considerada a segunda franquia de jogos mais lucrativa do mundo,
depois da franquia do jogo Mário que também pertence à Nintendo.
Existem mais de 700 Pokémons diferentes, cada um com possibilidades de
múltiplas evoluções, além de contar com diversos grupos de aliados e, também de
desafetos. Não há como conhecer todas as espécies por meio de uma única fonte,
isso deve ser feito através das experiências proporcionadas por cada mídia, o que
aumenta o repertório dos jogadores e estimula o compartilhamento das informações.
Os games que originaram a franquia Pokémon, eram do tipo RPG (Role-Playing
Games) e apresentavam elementos de estratégia. Esses jogos e suas, traduções,
sequência e remakes, ainda são considerados como referência pelos fãs da franquia.
Em julho de 2016, a The Pokémon Company em parceria com a Nintendo e Niantic
Inc., lançou, em alguns países, um jogo eletrônico, free-to-play, de realidade
aumentada desenvolvido para smartphones com as plataformas iOS e Android,
intitulado Pokémon GO. O jogo utiliza a câmera e o GPS dos dispositivos, e permite
que os Pokémons apareçam nas telas, como se estivessem no mundo real. Dessa
forma, os jogadores podem captura-los pelas ruas, dentro de casa, em parques e em
vários outros lugares. A ideia é obter o máximo de Pokémons possíveis, treiná-los, e
batalhar em conjunto com outros participantes em ginásios virtuais.
Ainda que o formato do jogo não seja inédito, desde o seu lançamento tem sido
frequente encontrar pelas ruas, grupos de jogadores de todas as idades, grudados
nos seus celulares à caça das criaturas virtuais, ou rodeando Pokestops, pontos
89
específicos de reabastecimento de Pokeballs, ferramenta necessária para captura-
los. Essa vivência, já ultrapassou os limites de seu universo, transformando-se em
jargão mesmo para quem não é jogador, ou fã da franquia.
3.3 Fan Fiction: os fãs ganham as telas
Os fãs são, geralmente os primeiros a aderirem a uma nova tecnologia que
envolva uma mídia quando há a possibilidade de utiliza-la em favor de seus universos
ficcionais preferidos. É comum que eles sejam inspirados a criar novas formas de
produção cultural sobre aquilo que gostam, de acordo com o acreditam, pesquisam
ou conhecem. Conforme destaca Henry Jenkins (2008 p.181): “os fãs são o segmento
mais ativo do público das mídias, aquele que se recusa a simplesmente aceitar o que
recebe, insistindo no direito de se tornar um participante pleno.”. Porém, esse não é
um fato novo dentro desse contexto. Os fãs, têm feito produções amadoras sobre suas
obras favoritas, há bastante tempo.
O que mudou, na verdade, foi que com a transformação do cenário midiático,
potencializada pelas novas tecnologias e pela formação de redes, essas produções
caseiras, ampliaram sua possibilidade de distribuição e aumentaram a visibilidade da
cultura dos fãs. Para Jenkins (2008 p. 335) o termo Fan fiction ou fanfic “se refere,
originalmente, a qualquer narração em prosa com histórias e personagens extraídos
dos conteúdos dos meios de comunicação de massa [...]”.
Quando Ben Affleck foi convidado para uma entrevista no programa do
apresentador americano Jimmy Kimmel em fevereiro de 2016, ele tinha a missão de
revelar uma cena que foi supostamente cortada do filme Batman X Superman: A
origem da Justiça (2015). O programa apresentou um vídeo31 produzido pelo
apresentador, que reproduzia uma das cenas do filme, com os personagens e atores
verdadeiros, porém, com a participação de Kimmel interferindo nos diálogos, com a
intervenção de Will Arnet, dublador que faz a voz original do personagem Batman na
animação Lego Batman, além de uma cena extra no final, de Matt Damon como o
personagem de Perdido em Marte (The Martian, 2015) ambientada no planeta. O
vídeo se espalhou pela internet, correu as redes sociais, e até setembro de 2016 tinha
31 Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=0Y8iRvQdSGA. Acesso em 02/09/2016.
90
mais de 14 milhões de visualizações no Youtube. Assim como esse, outras
intervenções são feitas pelos fãs que participam ativamente desse tipo de movimento.
Esse novo panorama onde estão inseridos os meios de comunicação de
massa, alterado pelas novas tecnologias, reafirma a crescente participação das
pessoas comuns, com contribuições de acordo com suas culturas. A convergência,
que Jenkins (2008) define como algo além das mudanças tecnológicas, “altera a lógica
pela qual a indústria midiática opera e pela qual os consumidores processam a notícia
e o entretenimento”.
Foi assim que as histórias conquistaram as telas que permeiam nosso
cotidiano, ultrapassando os limites técnicos, ganhando corpo e forma, caminhando
entre fios e bytes, assumindo proporções ainda maiores. Atravessam, mares,
continentes, embrenham-se pela rede mundial e instalam-se na nuvem sem que
sequer saibamos aonde foram parar. As histórias se multiplicam pelas redes e
podemos acompanhar a mesma história em várias telas; histórias complementares
em várias telas; histórias expandidas em várias histórias e distribuídas por várias telas;
histórias complementares ou expandidas em várias telas enquanto o público às
assiste e se comunica com seus amigos, fãs ou demais interessados.Enfim, o que
temos assistido a todo instante em nossas telas, são histórias diversas que saem da
experiência humana e ganham dimensões infinitas.
91
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Essa pesquisa teve, em toda sua extensão, como principal objeto de análise,
a tela luminosa, dada sua importância como inovação tecnológica apresentada pelo
século XX. Isso se deve ao fato de que acredito que aquela tela pode ser considerada
o início do processo de reconfiguração do panorama midiático que vivemos hoje, pois
a partir dali começamos a enxergar o mundo sob uma nova perspectiva. Deixamos de
olhar apenas o que estava a nossa volta, para ver, por meio da tela do cinema, um
mundo com novas dimensões, em princípio assustadoras, e depois cada vez mais
compreensível aos olhos e mentes humanas. Tal fato, nos levou a adotar uma
abordagem histórica, onde a tela é colocada em evidência para compreendermos a
divisão do conteúdo comunicacional em múltiplas telas, um fenômeno que tem sido
usual no cotidiano contemporâneo por um número cada vez maior de pessoas.
Um ponto de relevância para esse estudo são os saltos evolutivos em relação
à tecnologia, mapeados nessa pesquisa, uma vez que estão intimamente ligados às
experiências vividas por seus motivadores, em cada momento histórico. Experiências
essas, que se somaram a outras, independentemente de sua sincronicidade, podendo
acontecer simultaneamente ou em épocas completamente diferentes. Foi possível
então observar que percorremos um longo caminho, em um tempo cada vez mais
rápido, acelerado pelas possibilidades descobertas a cada passo dado em direção ao
futuro. Enquanto a tecnologia evoluía particularmente para cada dispositivo, as
exigências dos criadores de conteúdo também se faziam perceber. A tela do cinema
parecia pequena demais para George Méliès e sua vontade de transportar sua mágica
para ela, dessa forma, foi possível observar um ensaio da divisão da tela para mostrar
vários conteúdos simultaneamente. Assim como, a década de sessenta nos mostrou
novas possibilidades de uso da tela naquela exposição mundial em 1967, e logo
depois, com a primeira videoconferência da história, em 1968, a nos apontar o
caminho da era da conexão e da colaboração.
Se considerarmos que os seres humanos foram ficando mais exigentes, mais
experientes e mais inteligentes, neste estudo compreendemos porque o conteúdo já
não cabia numa tela só. Era preciso dividi-lo em outras telas para multiplicar seu
potencial e seu alcance. E cada uma delas se mostrou única, como se tivesse uma
vocação para nos atender no que precisássemos.
92
Um ponto que merece destaque é o fato de que à medida em que os
dispositivos ficavam menores e mais pessoais, as telas adquiriam também, mais
importância no nosso dia a dia. Mas, foi com a chegada da internet aos dispositivos,
tanto quanto a mobilidade, ou seja - a possibilidade de leva-los conosco - que as telas
ganharam um lugar definitivo nas nossas vidas. Passamos a nos conectar com tudo
que nos interessava, além de podermos trocar experiências, opiniões, conhecimento,
cultura, ou seja, tudo aquilo que imaginássemos. E dessa vez, além da tela nos fazer
ver o mundo em outra perspectiva, agora mais próxima, multiplicada e instantânea,
ela também nos mostrou para o mundo. Ganhamos visibilidade. No começo apenas
nosso texto, depois nossa voz, a seguir nossa imagem e finalmente tudo isso junto e
em tempo real.
Portanto, através do resgate histórico feito no primeiro capítulo, conseguimos
alcançar o objetivo deste trabalho, de estudar a tela sob uma perspectiva que
destacasse sua evolução tecnológica, para entendermos seus desdobramentos e sua
importância na distribuição do conteúdo dividido em múltiplas telas no contexto atual.
Os panoramas apresentados aqui, concentram informações que estão dispersas em
várias outras plataformas. Penso que esse conteúdo poderá ajudar as pessoas,
principalmente os mais jovens, a compreenderem a história dos meios de
comunicação com os quais convivemos na contemporaneidade.
Outro ponto bastante relevante para esse trabalho, dá-se através das
pesquisas estudadas no segundo capítulo. Os dados aqui apresentados, nos mostram
algumas das várias investigações comerciais no que diz respeito ao conhecimento, às
exigências e às tendências em relação ao público que faz uso das múltiplas telas. Há,
de fato, um número muito menor de pesquisas acadêmicas nesse âmbito, o que dá
verdadeiro significado ao propósito dessa pesquisa. Os levantamentos de
informações comerciais, propiciam, certamente, o lançamento de novos produtos,
desencadeiam o desenvolvimento de novas tecnologias, assim como indicam o que
deverá ser usado no futuro. Daí a importância dos estudos científicos a respeito desse
tema, para que possamos colocar os indivíduos no centro das reflexões que busquem
caminhos para que deixemos de ser conduzidos pelo status quo do consumo.
Por esse motivo, não foi em vão a escolha de estudar as possibilidades
oferecidas pela dinâmica transmídia, bem como as interações dos fãs com seus
universos ficcionais favoritos. Suas experiências ganharam e continuam ganhando
cada vez mais espaço nas redes, de maneira que desencadearam processos
93
comunicacionais ainda mais amplos. Por meio das múltiplas telas conectadas
passamos a manifestar nossas opiniões, estabelecer relacionamentos profissionais e
pessoais, nos agrupar em torno de interesses comuns, conhecer novas culturas,
reencontrar antigos amigos, colaborar com outros projetos, compartilhar ideias,
debater e descobrir as novas possibilidades que ainda irão surgir.
Considero, que foi possível observar nessa pesquisa as transformações
deflagradas com as inovações proporcionadas pela tecnologia digital, assim como
todas as suas consequências. Do ponto de vista das múltiplas telas, penso que isso
tem feito com que repensemos a existência humana e desenvolvamos uma nova
percepção de mundo, com base na construção de um novo tipo de conhecimento cada
vez menos impositivo e mais colaborativo. Essa seria, portanto, nossa maneira
contemporânea de dar sentido ao mundo que estamos reaprendendo a conhecer.
94
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APÊNDICE 1 – A internet das coisas
Segundo Paulo Henrique Pichini, presidente e CEO da Go2neXt Cloud
Computing Builder & Integrator, o termo IoT – Internet of Things ou Internet das coisas,
apresenta uma ampla gama de interpretações, porém de maneira geral ele se traduz
num processo de sensorização de coisas e pessoas. Para isso, estão sendo criados
e desenvolvidos sensores que possibilitem essa conexão com os meios de
comunicação. Alguns desses sensores já são conhecidos e utilizados pelo público em
geral, tais como o Bluetooth e o QR code, outros ainda estão sendo implementados à
medida que a tecnologia evolui.
Há uma série de estudos bastante complexos em andamento para definir qual
tipo de sensor é mais adequado para cada dispositivo, assim como para identificar o
que é esperado de cada tecnologia quando aplicada a um específico segmento.
De acordo com o Gartner, instituto norte-americano de pesquisas tecnológicas,
a cada segundo, 65 novos dispositivos32 se conectam à rede nos grandes mercados
globais.
Há que se destacar um tipo de tecnologia que está em evidência entre as
plataformas IoT, o Video Analytcs. Essa ferramenta tem a capacidade de analisar
automaticamente um vídeo para detectar e determinar eventos temporais e espaciais.
Entre outros usos, essa tecnologia tem sido utilizada para reconhecimento facial, ou
como sensor de movimento. Um exemplo é o Kinect, periférico do console de
videogame XBOX da Microsoft, que utiliza essa tecnologia em parte de sua função.
Vale ressaltar ainda, que, segundo Paulo Henrique, há um forte incremento na
substituição do tradicional tráfego de dados, voz e imagem na internet, pelo tráfego
de vídeo. A empresa Cisco, publicou um estudo em junho de 2016 que indica que até
2020, 80% do tráfego na internet será constituído por vídeos, assim como, cerca de
um milhão de minutos de conteúdo em vídeo será publicado na rede mundial. Isso
indica que as tecnologias baseadas em vídeo deverão predominar no que tange a
esse efeito de sensorização.
Soluções como o Video Analytics são capazes de identificar pessoas,
individualizá-las, segmentar por sexo e idade aproximada, detectar estado de humor
e então triangular esses dados com perfis dessa pessoa na internet, para acompanha-
la aonde quer ela vá.
32 Dados de Setembro/2016.
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Sendo assim, as tecnologias IoT quando aplicadas às pessoas, suscitam
discussões ainda mais complexas no que se refere à privacidade e segurança.
Conforme destaca Paulo Henrique Pichini:
A maior parte dos países, incluindo o Brasil, conta com legislação que protege o direito de divulgação na TV ou na internet de imagens em vídeo de uma pessoa. Não existe ainda nada parecido para evitar que a imagem em vídeo de uma pessoa – imagem coletada por dispositivos IoT – seja submetida a análises detalhadas para fins de mercado. 33
Em síntese, as pessoas estarão cada vez mais sujeitas às tecnologias de
sensorização e poderão ser rastreadas por câmeras inteligentes e ter seus dados
cruzados com suas informações pessoais que estão disponíveis nas redes sociais.
33 Disponível em: http://computerworld.com.br/cada-pessoa-e-um-sensor-iot . Acesso em 07/09/2016
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ANEXOS
ANEXO 1 - OSCILOSCÓPIO
FOTO OSCILOSCÓPIO ANALÓGICO
FOTO OSCILOSCÓPIO DIGITAL
Disponível em: http://paginas.fe.up.pt/~ee00264/equipamentos/osciloscopio.html
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ANEXO 2 – INFOGRÁFICO SCREEN WARS – Dispositivos preferidos
Fonte: Nielsen Global Digital Landscape Survey. 2014 p. 10
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ANEXO 3 – INFOGRÁFICO SCREEN WARS – Telas preferidas por atividade e
local.
Fonte: Nielsen Global Digital Landscape Survey. 2014 p. 12
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ANEXO 4 – CONSUMER BAROMETER – Dispositivos mais utilizados
Fonte: Connected Consumer Survey,2016.
Disponível em www.consumerbarometer.com