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Curso de Filosofia da Ciência I Olavo de Carvalho Colonial Heights, VA, U.S.A, 10 a 15 de maio de 2010 Pela desenvoltura com que jornalistas e políticos usam da palavra "ciência" para revestir de autoridade ameaçadora qualquer estupidez nova ou antiga que tencionem impingir ao público, bem como pela candura devota com que este se curva ante a imponência mágica de todo "fato científico comprovado", dir-se-ia que, entre tantas incertezas, entre tantas questões controversas e abstrusas que atordoam a inteligência humana, a única certeza tranqüila e improblemática, o único porto seguro, é o conceito de "ciência". Sim, quando o foco de tantas discussões é saber se tal ou qual idéia é ciência ou pseudociência, ciência ou crendice, ciência ou ideologia, ciência ou mito, etc., o que está subentendido aí é que todos sabem o que seja ciência, só restando decidir se esse conceito se aplica ou não a determinados conteúdos. A ciência paira acima da controvérsia, tal como a regra de um jogo, uma vez iniciada a disputa, permanece intacta e soberana até o desenlace final da partida. No entanto, quem quer que não se contente com o uso popular da palavra e busque entender seriamente -- ou, se quiserem, "cientificamente" -- o que é ciência, percebe que poucos conceitos são tão encrencados, nebulosos e controversos quanto esse. Sabe também que esclarecê-lo é uma das tarefas mais urgentes do nosso tempo, dada a importância crescente e avassaladora do papel que desde há uns quatro séculos as atividades científicas desempenham na indústria, nas finanças, na administração pública, na saúde, na educação, na alta cultura e até na vida privada. Não é intelectualmente saudável que uma força agente, à qual se atribui a autoria dos feitos mais espetaculares e às vezes a responsabilidade dos crimes mais hediondos, permaneça sem rosto nem identidade, ocultando-se por trás de uma variedade de máscaras provisórias que, se permitem assinalar onde ela está, não ajudam nem um pouco a dizer o que ela é.

Curso de Filosofia da Ciência I

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Curso de Filosofia da Ciência I

Olavo de CarvalhoColonial Heights, VA, U.S.A, 10 a 15 de maio de 2010

Pela desenvoltura com que jornalistas e políticos usam da palavra "ciência" para revestir de autoridade ameaçadora qualquer estupidez nova ou antiga que tencionem impingir ao público, bem como pela candura devota com que este se curva ante a imponência mágica de todo "fato científico comprovado", dir-se-ia que, entre tantas incertezas, entre tantas questões controversas e abstrusas que atordoam a inteligência humana, a única certeza tranqüila e improblemática, o único porto seguro, é o conceito de "ciência". Sim, quando o foco de tantas discussões é saber se tal ou qual idéia é ciência ou pseudociência, ciência ou crendice, ciência ou ideologia, ciência ou mito, etc., o que está subentendido aí é que todos sabem o que seja ciência, só restando decidir se esse conceito se aplica ou não a determinados conteúdos. A ciência paira acima da controvérsia, tal como a regra de um jogo, uma vez iniciada a disputa, permanece intacta e soberana até o desenlace final da partida.

No entanto, quem quer que não se contente com o uso popular da palavra e busque entender seriamente -- ou, se quiserem, "cientificamente" -- o que é ciência, percebe que poucos conceitos são tão encrencados, nebulosos e controversos quanto esse. Sabe também que esclarecê-lo é uma das tarefas mais urgentes do nosso tempo, dada a importância crescente e avassaladora do papel que desde há uns quatro séculos as atividades científicas desempenham na indústria, nas finanças, na administração pública, na saúde, na educação, na alta cultura e até na vida privada.

Não é intelectualmente saudável que uma força agente, à qual se atribui a autoria dos feitos mais espetaculares e às vezes a responsabilidade dos crimes mais hediondos, permaneça sem rosto nem identidade, ocultando-se por trás de uma variedade de máscaras provisórias que, se permitem assinalar onde ela está, não ajudam nem um pouco a dizer o que ela é.

Este curso, se não tem a ambição de resolver o enigma integralmente, pretende ao menos indicar quais as linhas de investigação que têm de ser seguidas para isso, bem como desbastar os erros e confusões mais habituais que têm infectado de nebulosa irracionalidade um campo de discussões que, pela sua própria ambição de servir de modelo ao julgamento de tudo o mais, deveria ser -- em vez de apenas fingir que é --o mais claro e límpido de todos.

O roteiro do curso é o seguinte:

Aula 1 - Colocação do problema. A ciência como agente político no quadro da Nova Ordem Mundial. O conceito atual da ciência como fundamento de toda autoridade pública. A expansão concomitante da fraude científica em escala planetária. Necessidade de uma discussão. Método histórico e método analítico (o enfoque analítico ficará para o curso Filosofia da Ciência II).

Aula 2. A idéia pura de ciência em Platão. A montagem aristotélica do sistema das ciências.

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Aula 3. Estrutura do sistema das ciências na Idade Média.

Aula 4. Surgimento da "ciência moderna" concomitantemente ao ressurgimento do ocultismo. Aspectos mágicos da "matematização do mundo" em Newton e Descartes.

Aula 5. O Iluminismo. Trevas ocultistas na Idade das Luzes.

Aula 6. Marxismo, relativismo, desconstrucionismo. A crise de cientificidade das ciências segundo Edmund Husserl. O estado atual da questão.

16 de dezembro de 2009