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03/12/2014 Acordão do Supremo Tribunal Administrativo http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/e821630724cdc0d880257d6d003d717b?OpenDocument&ExpandSection=1#_Section1 1/21 Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo Processo: 0398/12 Data do Acordão: 08102014 Tribunal: 2 SECÇÃO Relator: ISABEL MARQUES DA SILVA Descritores: OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL REPOSIÇÃO DE QUANTIAS PRESCRIÇÃO AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO Sumário: I Tendo o TJUE decidido, em reenvio prejudicial, que a aplicação de um prazo de prescrição de vinte anos excede o que é necessário para atingir o objetivo de proteção dos interesses financeiros da União, não pode manterse a decisão recorrida que julgou aplicável à prescrição da obrigação de reposição de quantias indevidamente recebidas provenientes de Fundos Comunitários o prazo ordinário de prescrição de 20 anos. II Nos termos do art. 3º, n.º 1 do Regulamento (CE/Euratom) 2988/95, o prazo de prescrição do procedimento visando a aplicação de sanções e a restituição de ajudas comunitárias irregulares, no âmbito da política agrícola comum, é de quatro anos, prazo este aplicável ao caso dos autos por inexistir no direito interno um prazo especialmente previsto para o efeito. III Não permitindo a matéria de facto que foi dada como assente pelo tribunal de 1.ª instância aferir da prescrição da obrigação de reposição das quantias indevidamente recebidas à luz do disposto no n.º 1 do artigo 3.º do Regulamento 2988/95, designadamente por se desconhecer a data em que foi praticada a infracção ou que teve lugar a exportação, impõese a anulação oficiosa do julgado e o regresso dos autos à 1.ª instância para nova decisão, precedida da fixação da pertinente matéria de facto. Nº Convencional: JSTA000P18021 Nº do Documento: SA2201410080398 Data de Entrada: 13042012 Recorrente: A............, LDA Recorrido 1: IFAP INST DE FINANCIAMENTO DA AGRICULTURA E PESCAS, IP Votação: UNANIMIDADE Aditamento: Texto Integral Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: Relatório 1 – A…………, Lda, com os sinais dos autos, recorre para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal

Data do Acordão: 08102014 Tribunal: 2 SECÇÃO Acórdão do … · 2014. 12. 3. · subjacentes tanto ao ordenamento jurídico interno, como ao ordenamento jurídico comunitário

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Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal AdministrativoProcesso: 0398/12Data do Acordão: 08­10­2014Tribunal: 2 SECÇÃORelator: ISABEL MARQUES DA SILVADescritores: OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL

REPOSIÇÃO DE QUANTIASPRESCRIÇÃOAMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO

Sumário: I ­ Tendo o TJUE decidido, em reenvio prejudicial, que aaplicação de um prazo de prescrição de vinte anos excede oque é necessário para atingir o objetivo de proteção dosinteresses financeiros da União, não pode manter­se adecisão recorrida que julgou aplicável à prescrição daobrigação de reposição de quantias indevidamente recebidasprovenientes de Fundos Comunitários o prazo ordinário deprescrição de 20 anos.II ­ Nos termos do art. 3º, n.º 1 do Regulamento(CE/Euratom) 2988/95, o prazo de prescrição doprocedimento visando a aplicação de sanções e a restituiçãode ajudas comunitárias irregulares, no âmbito da políticaagrícola comum, é de quatro anos, prazo este aplicável aocaso dos autos por inexistir no direito interno um prazoespecialmente previsto para o efeito.III ­ Não permitindo a matéria de facto que foi dada comoassente pelo tribunal de 1.ª instância aferir da prescrição daobrigação de reposição das quantias indevidamenterecebidas à luz do disposto no n.º 1 do artigo 3.º doRegulamento 2988/95, designadamente por se desconhecera data em que foi praticada a infracção ou que teve lugar aexportação, impõe­se a anulação oficiosa do julgado e oregresso dos autos à 1.ª instância para nova decisão,precedida da fixação da pertinente matéria de facto.

Nº Convencional: JSTA000P18021Nº do Documento: SA2201410080398Data de Entrada: 13­04­2012Recorrente: A............, LDARecorrido 1: IFAP ­ INST DE FINANCIAMENTO DA AGRICULTURA E PESCAS, IPVotação: UNANIMIDADEAditamento:

Texto Integral

Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do SupremoTribunal Administrativo:

­ Relatório­1 – A…………, Lda, com os sinais dos autos, recorre paraeste Supremo Tribunal da sentença do Tribunal

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Administrativo e Fiscal de Viseu, de 28 de Dezembro de2011, que julgou totalmente improcedente a oposição por sideduzida à execução n.º 2704200501011529, instaurada pordívidas ao INGA respeitantes a subsídios atribuídos noâmbito das Restituições à Exportação de Vinho, campanhade 1995, apresentando as seguintes conclusões:A. O presente recurso vem interposto da sentença proferidapelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que julgouimprocedente a oposição à execução fiscal n.o2704200501011529, em particular, porque aplicou o prazogeral ordinário de prescrição de vinte anos ao procedimentopara reposição de quantias relativas a restituições àsexportações de vinho realizadas na campanha de 1995,recebidas alegadamente de forma indevidaB. A aplicação do prazo ordinário de prescrição de vinte anosao domínio da reposição de restituições à exportação devinho da campanha de 1995 é contrária à legislaçãocomunitária com aplicação directa no ordenamentoportuguês e, bem assim, aos princípios da segurançajurídica, da não discriminação dos litígios comunitáriosrelativamente aos litígios nacionais e da proporcionalidade,subjacentes tanto ao ordenamento jurídico interno, como aoordenamento jurídico comunitário. C. Ao adoptar este Regulamento n.o 2988/95 e, emparticular, o seu artigo 3.°, n.º 1, o legislador comunitáriopretendeu instituir uma regra geral de prescrição aplicávelnessa matéria mediante o qual renunciou, voluntariamente, àpossibilidade de recuperar somas indevidamente recebidasdo orçamento comunitário após o decurso do período dequatro anos, período durante o qual as autoridades dosEstados­Membros, actuando em nome e por conta doorçamento comunitário, deveriam recuperar (ou deveriam terrecuperado) essas vantagens indevidamente obtidas.D. No caso dos presentes autos, estamos perante umaalegada irregularidade cometida pela A…………, aquandodas exportações em causa no ano de 1995 (decorrente danão apresentação dos registos obrigatórios nos termos dasregras comunitárias, nomeadamente de loteamento, misturase aumento do título alcoométrico) que, lesando o orçamentodo FEOGA­Garantia, determina a reposição da quantiarecebida a título de restituições à exportação de vinho nessacampanha, ou seja, estamos perante uma situaçãosubsumível ao campo de aplicação do mencionadoRegulamento n.º 2988/95 e respectivo prazo de prescriçãodo procedimento de quatro anos a contar da data em que foipraticada a irregularidade.

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E. O Tribunal de Justiça da União Europeia, chamado apronunciar­se pelas instâncias jurisprudenciais dos diferentesEstados­Membros, tem plasmado o entendimento de que talprazo de prescrição de quatro anos para o procedimentodecorrente da prática de qualquer irregularidade que ponhaem causa os interesses financeiros das ComunidadesEuropeias se aplica às medidas administrativas derecuperação de uma restituição à exportação, como a dospresentes autos ­ cf. Ac da 2.a Secção do TJUE, de29.01.2009 Josef Vosdíng Schlacht. F. Considerando que: (i) os Regulamentos comunitários têmaplicação directa no ordenamento jurídico interno ­ cf. artigo8.°, n.º 4 da CRP e artigo 189° do Tratado CE ­; (ii) que oTJUE aplica, sem margem para dúvidas, o prazoprescricional previsto no artigo 3.º, n.o 1, do Regulamento2988/95 às medidas administrativas que visam arecuperação de uma restituição à exportação; (iii) e queinexiste, no ordenamento jurídico interno, qualquerdisposição especial que, ao abrigo da possibilidadeestabelecida no n.º 3 do artigo 3.º do mesmo Regulamento,preveja um prazo específico para a prescrição aplicável a umdomínio como o do reembolso das restituições à exportaçãoindevidamente recebidas em prejuízo de fundoscomunitários, não pode senão concluir­se que o prazo deprescrição previsto no mencionado Regulamento deverá teraplicação ao caso dos autos. G. Depois da entrada em vigor no ordenamento jurídicoportuguês da regra de prescrição geral e de efeito directoprevista no artigo 3.º, n.º 1, do Regulamento n.o 2988/95 –que supriu a falta de uma regra específica nessa matéria noordenamento português –, não poderia continuar a seraplicada na actuação contra qualquer irregularidade naacepção do referido Regulamento e na falta de umadisposição legislativa nacional que obrigasse a procederinternamente assim, uma regra de prescrição geral doCódigo Civil. H. As dívidas em questão encontram­se constituídas em dataanterior à vigência do Regulamento n.o 2988/95. I. Ainda que se aceitasse a aplicação do prazo ordinário deprescrição de vinte anos à reposição das restituições àexportação de vinho em questão ­ que, como adiante sedemonstrará, não se aceita ­, sempre seria de chamar àcolação a regra prevista no artigo 297.°, n.º 1, do CódigoCivil: é que estando a correr o prazo prescricional de vinteanos, em 26 de Dezembro de 1995 entrou em vigor, com

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aplicação directa no ordenamento jurídico português, o prazoprescricional de quatro anos previsto no artigo 3.°, n.o 1, doRegulamento n.º 2988/95.J. Segundo o disposto no artigo 297.º do CC, o prazo maiscurto de prescrição vai aplicar­se ao prazo em curso,contando­se o novo prazo a partir da entrada em vigor danova lei (a não ser que, segundo a lei antiga, faltasse menostempo para o prazo se completar, o que não se verifica). K. Considerando que o Regulamento n.o 2988/95 entrou emvigor em 26.12.1995 (cf. artigo 11.° do mencionado Regulamento)e que as irregularidades que determinam a reposiçãoocorreram nas exportações realizadas no ano de 1995 (cf.procedimento administrativo junto aos autos e alínea A) dos factosconsiderados provados pelo Tribunal a quo), o novo prazoprescricional de quatro anos terminou em 26.12.1999 (quatroanos após a entrada em vigor do Regulamento n.º 2988/95),enquanto que a decisão administrativa de reposição daquantia em questão nos autos foi proferida somente a21.07.2004 (cf. alínea B dos factos provados), razão pela qual seencontrava já transcorrido ­ há muito ­ o respectivo prazoprescricional, o que não podia senão ser declarado nospresentes autos, e ora se requer a este Venerando Tribunal.L. Ainda que se admitisse que esse prazo ordinário deprescrição de vinte anos correspondia ao prazo deprescrição estabelecido pelo legislador português ao abrigoda possibilidade prevista no n.o 3 do artigo 3.° doRegulamento n.o 2988/95 ­ no que não se concede e apenasse admite como mera hipótese de raciocínio ­ sempre esteprazo seria atentatório do princípio da segurança jurídica, daproporcionalidade e da não discriminação dos litígioscomunitários relativamente aos litígios nacionais, quevigoram e subjazem tanto ao ordenamento jurídico interno,como ao ordenamento comunitário. M. O princípio da segurança jurídica exige, no contexto deuma actuação contra uma irregularidade lesiva dosinteresses financeiros da União Europeia e que dê origem auma medida administrativa a determinar o reembolso, pelooperador, das restituições à exportação indevidamenterecebidas, que a situação desse operador não sejaindefinidamente susceptível de ser posta em causa e que,consequentemente, seja aplicado um prazo de prescrição àpossibilidade de actuação contra essa irregularidade.N. Para cumprir a sua função de garantir a segurançajurídica, esse prazo aplicado deve ser conhecidoantecipadamente ou, pelo menos, deve ser suficientemente

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previsível para o destinatário – cf. Ac. da 4.ª Secção doTJUE, de 05.05.2011, junto como doc. 1.O. A prática jurisprudencial em Portugal – que tem vindo aaplicar à reposição de restituições à exportação similares àsdos presentes autos o prazo geral de prescrição de vinteanos (e não o prazo de prescrição de cinco anos previstointernamente para a reposição de dinheiros públicos,constante do DL n.º 155/92) –, não é anterior ao ano daprática da irregularidade aqui em causa, desconhecendo­se,com efeito, qualquer Acórdão deste Venerando Tribunalnesse sentido proferido nos anos de 1994, 1995 ou mesmoem anos posteriores da década de 90.P. A prática de aplicar à reposição de restituições àexportação não o prazo específico de reposição de dinheirospúblicos previsto no artigo 40.º do DL n.º 155/92 – como eraem larga medida expectável e como era práticarelativamente à atribuição de outros subsídios públicos nãoexclusivamente comunitários ­, mas o prazo geral deprescrição previsto no CC, viola o princípio da segurançajurídica, pelo menos em relação às condutas que, como ados presentes autos, são anteriores ao primeiro dosAcórdãos internos que plasmou tal entendimento, razão pelaqual tal prática e aplicação não poderiam vigorar noordenamento interno nos moldes explicados.De todo o modo, Q. Ainda que não se entenda que a prática de aplicar o prazogeral de prescrição previsto no direito civil comum éatentatória da segurança jurídica, nos moldes que se deixoudito, sempre a aplicação de tal prazo de vinte anos ofende oprincípio da proporcionalidade, subjacente aosordenamentos jurídicos português e comunitário e discriminaflagrantemente os litígios comunitários dos litígios nacionaisnesta matéria.R. Mediante a adopção do artigo 3.º, n.º 1, do Regulamento2988/95 (e sem prejuízo do n.º 3 desse artigo), o legisladorcomunitário entendeu reduzir voluntariamente para quatroanos o período durante o qual as autoridades dos Estados­Membros, actuando em nome e por conta do orçamentocomunitário, deveriam recuperar ou deveriam ter recuperadoas vantagens indevidamente obtidas pelos operadoresnacionais de cada Estado, consagrando, inclusivamente, queesse prazo poderá igualmente ser reduzido pelas legislaçõesinternas para três anos. – cf. artigo 3.º n.º 1, in fine, domencionado Regulamento.S. Relativamente aos dinheiros que são seus e por sigeridos, a União Europeia entendeu consolidar na ordem

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jurídica as irregularidades cometidas pelos operadoreseconómicos por força da consagração de um prazo deprescrição de quatro anos, com possibilidade,inclusivamente, de ser reduzido para três anos.T. A percepção nos diferentes Estados­Membros do períodode tempo necessário e suficiente para uma administraçãodiligente actuar contra irregularidades cometidas pelos seusagentes económicos em prejuízo dos orçamentoscomunitários ou mesmo nacionais é diferente.U. O legislador português, sopesando as características danossa administração pública e a tradição jurídica interna,considerou precisamente que o prazo que era razoável paraque a sua administração actuasse contra irregularidadescometidas pelos seus nacionais em prejuízo do orçamentonacional era o prazo de cinco anos – cf. art. 40.º, n.º 1, doDecreto­Lei n.º 155/92, de 28 de Julho.V. Para restituição dos dinheiros públicos que saíram doscofres do Estado Português, o legislador nacional tem pornecessário apenas um prazo de cinco anos para aadministração actuar, e vem admitir­se que, para arestituição de dinheiros públicos comunitários em questão, seaplique internamente um prazo geral de prescrição de vinteanos, sem consagração legislativa expressa nesse sentido,quando a própria União europeia, “titular” desse alegadocrédito a repor, considera que quatro (ou mesmo três anos)se mostram adequados para a prescrição de tais dívidas.W. As regras previstas pelo direito nacional relativamente àrecuperação de auxílios comunitários indevidos não podeconsagrar um regime que venha a ser discriminatóriorelativamente aos processos destinados a solucionar litígiosnacionais do mesmo tipo (v., neste sentido, acórdãos de 21 deSetembro de 1983, Deutsche Milchkontor e o., 205/82 a 215/82,Recueil, p. 2633, n.º 19, de 12 de Maio de 1998, Steff – HoulbergExport e o., C­366/95, Colect., p.I­2661, n.º 15, de 16 de Julho de1998, Delmühle e Schmidt Söhne, C­298/96, Colect., p. I­4767, n.º24, ou de 19 de Setembro de 2002, Huber, C­336/00, Colect., p. I –7699, n.º 55).X. Ao consagrar­se um prazo de cinco anos para aadministração nacional actuar e recuperar dinheiros públicosnacionais indevidamente recebidos e, simultaneamente, aodeterminar­se (ainda que por via de prática jurisprudencial,um prazo de vinte anos para essa mesma administraçãoactuar e recuperar dinheiros públicos comunitáriosindevidamente recebidos consagra­se um regimediscriminatório relativamente aos processos destinados asolucionar litígios nacionais e comunitários do mesmo tipo.Y. A prática de aplicar o prazo geral de prescrição de vinte

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anos à reposição de restituições à exportação – consagradapela sentença ora posta em crise – viola o mencionadoprincípio da não discriminação dos processos internosdestinados a solucionar litígios nacionais e comunitários domesmo tipo, não podendo, em consequência, ser mantida.Por outro lado, Z. «Um prazo nacional de prescrição “mais longo”, naacepção do artigo 3.º, n.º 3, do regulamento 2988/95, nãodeve, nomeadamente, ir manifestamente além do necessáriopara atingir o objectivo de protecção dos interessesfinanceiros da União» ­ cf. parágrafo 38 do doc. 1.AA. À luz do objectivo de protecção dos interessesfinanceiros da União, para o qual o legislador da Uniãoentendeu que um prazo de prescrição de quatro anos (oumesmo de três) era suficiente para permitir às autoridadesnacionais a actuação contra uma irregularidade lesiva dosinteresses financeiros e que pode levar à adopção de umamedida como a recuperação de um benefício indevidamenterecebido, afigura­se que dar a essas autoridades um prazode vinte anos vai além do necessário a uma administraçãodiligente. – cf. parágrafo 43 do doc. 1.BB. A administração portuguesa tem um dever geral dediligência na verificação da regularidade dos pagamentosque efectua e que pesam no orçamento da União, uma vezque os Estados­Membros devem respeitar o dever dediligência geral que o artigo 4.º, n.º 3, da EU, que implica quedevem tomar as medidas destinadas a remediar asirregularidades com prontidão.CC. Admitir a possibilidade de os Estados­Membrosconcederem à sua administração um período para agir tãolongo como o que é proporcionado por um prazo deprescrição de vinte anos poderia, de certa forma, encorajar ainércia das autoridades nacionais no combate àsirregularidades na acepção do artigo 1.º do Regulamento n.º2988/95, expondo os operadores, por um lado, a um longoperíodo de incerteza jurídica e, por outro, ao risco de já nãoterem a possibilidade de fazer a prova da regularidade dasoperações em causa após esse período. – cf. parágrafos 44e 45 do doc. 1; E, pior, colocando o Estado Português aadmitir a nível comunitário que a sua administração é poucodiligente, necessitando de vinte anos para verificar aregularidade dos pagamentos efectuados (e, eventualmente,concluir pela reposição dos subsídios comunitários recebidospelos operadores nacionais), falta de diligência que neminternamente, perante os cidadãos nacionais e em relaçãoaos dinheiros públicos dos cofres do Estado Português,

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admite, prevendo que cinco anos serão suficientes para aactuação da sua administração na reposição dos seusdinheiros públicos.DD. «O princípio da proporcionalidade opõe­se, no âmbito dautilização pelos Estados­Membros da faculdade que lhes édada pelo artigo 3.º, n.º 3, do Regulamento n.º 2988/95 àaplicação de um prazo de prescrição de trinta (vinte) anos aocontencioso relativo ao reembolso de restituiçõesindevidamente recebidas.» ­ cf. parágrafo 47 do doc. 1EE. No caso da aplicação de um prazo de prescrição dedireito comum ao contencioso relativo ao reembolso derestituições indevidamente recebidas antes da entrada emvigor do Regulamento n.º 2988/95 se revelardesproporcionada em face do objectivo de protecção dosinteresses financeiros da União, essa regra deve serafastada e o prazo geral de prescrição previsto no artigo 3.º,n.º 1, do Regulamento n.º 2988/95, tem vocação para seraplicado na medida em que também se dirige àsirregularidades cometidas antes da entrada em vigor desseregulamento e começa a correr na data da prática dairregularidade em causa – cf. parágrafo 51 do doc. 1.FF. Ao julgar que, “in casu”, se tinha por não verificada aprescrição do procedimento de reposição de restituições àexportação, por à mesma se aplicar o prazo geral ordináriode vinte anos, o Tribunal “a quo” violou o disposto no artigo8.º, n.º 4, da CRP, 3.º, n.º 1, do Regulamento n.º 2988/95,297.º n.º 1 do CC e, bem assim, os princípios da segurançajurídica, da não discriminação dos processos destinados asolucionar litígios comunitários relativamente aos litígiosnacionais e da proporcionalidade, que vigoram e subjazemtanto ao ordenamento jurídico interno, como ao ordenamentocomunitário.Termos em que deverá o presente recurso proceder,revogando­se a sentença recorrida.Mais se requer, nos termos do art. 267º do Tratado deFuncionamento da União Europeia, que a instância sejadesde já suspensa e o reenvio do processo ao Tribunal deJustiça da União Europeia para que esta instância sepronuncie sobre as seguintes questões prejudiciais:

· A possibilidade de adopção de um “prazo mais longo”,prevista no n.º 3 do artigo 3.º do Regulamento n.º 2988/95,pode ser exercida por um Estado­Membro nos casos em quetal prazo mais longo não está previsto numa disposiçãoexpressa e específica relativa ao reembolso de restituições àexportação, resultando, ao invés, da aplicação

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jurisprudencial a essas situações de um prazo geral deprescrição previsto no direito interno do Estado­Membro, queabrange todos os casos de prescrição não reguladosespecificamente?Em caso afirmativo,· A aplicação nesses termos, por um estado­membro, de umprazo de prescrição de vinte anos para a reposição derestituições à exportação oriundas de fundos comunitáriosofende o princípio da segurança jurídica?· A aplicação nesses termos, por um Estado­membro, de umprazo de prescrição de vinte anos para a reposição derestituições às exportações oriundas de fundos comunitáriosé discriminatória relativamente aos processos destinados asolucionar litígios nacionais do mesmo tipo, considerandoque a legislação nacional prevê, para a reposição dedinheiros públicos oriundos do Orçamento do Estadonacional um prazo de apenas cinco anos para aadministração nacional actuar e recuperar tais dinheirospúblicos nacionais indevidamente recebidos?· A aplicação nesses termos, por um Estado­membro, de umprazo de prescrição de vinte anos para a reposição derestituições à exportação oriundas de fundos comunitáriosvai para além do necessário a uma administração diligente,violando o princípio da proporcionalidade, atendendo a queinternamente é previsto um prazo de prescrição de cincoanos para a reposição de dinheiros públicos nacionais e anível comunitário é estabelecido, para esse efeito, no artigo3.º, n.º 1, do Regulamento n.º 2988/95 um prazo deprescrição de quatro anos (que pode ser reduzido para três)?

2 – Contra­alegou a recorrida, concluindo nos termosseguintes: A. A sentença ora recorrida não merece censura. B. O fundamento principal ora trazido à discussão pelaRecorrente, por via do qual aquele sustenta a aplicação doprazo de prescrição de quatro anos previsto no Regulamento(CE) EURATOM n.º 2988/95 do Conselho, de 18 deDezembro de 1995, nunca foi alvo de discussão da demandano Tribunal a quo, e, por essa razão, não poderia ter sido(como não foi) alvo de apreciação por parte da doutasentença em crise.C. Mutatis mutandis, quanto aos demais fundamentosapresentados pela Recorrente, como a alegada violação peloRecorrido do princípio da segurança jurídica e do princípio daproporcionalidade, os quais são apresentados pela

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Recorrente como decorrência da não aplicação do prazo deprescrição previsto e regulado no Regulamento (CE,EURATOM) n.º 2988/95, do Conselho, de 18 de Dezembrode 1995.D. Embora o objecto do recurso seja delimitado pelas suasconclusões, nos termos dos artigos 684°, nº 3 e 690°, nº 1 doCódigo de Processo Civil, os recursos não se destinam, aapreciar questões novas, mas sim a impugnar decisõesproferidas anteriormente, e obviamente, com identidade comaquele que foi o objecto da decisão.E. Constituindo a citada invocação do Regulamento (CE)EURATOM n.º 2988/95 do Conselho, de 18 de Dezembro de1995 e os vícios de violação de princípios, uma novadiscussão, não vertida no peticionado e argumentativo doRecorrente, deve, salvo melhor entendimento, o DoutoTribunal ad quem abster­se, face ao âmbito do presenteRecurso, do seu conhecimento.

Sem conceder e por dever de patrocínio e de cautela,sempre se dirá que,

F. O Regulamento EURATOM tem como objecto específicoregular o prazo de prescrição para a recuperação de ajudascomunitárias, ou seja, regular o procedimento administrativoem si mesmo, aplicando­se à relação entre a ComunidadeEuropeia e o Recorrido enquanto organismo pagador deajudas comunitárias,

G. Não se aplicando à relação entre o Recorrido enquantoorganismo pagador de ajudas comunitárias e a Recorrenteenquanto beneficiária de ajudas apuradas comoindevidamente atribuídas.

H. Ainda que a Recorrente tivesse alegado a prescrição doprocedimento da recuperação de ajudas comunitárias aoabrigo de tal Regulamento – o que, reitera­se, não fez –, aobrigação de reembolsar os montantes indevidamenterecebidos consubstancia uma "medida", nos termos do artigo4.° do Regulamento (designadamente, a prevista no 1.°travessão do n.º 1), e não uma "sanção administrativa", naacepção do artigo n.º 5 do mesmo.

I. Não havendo, neste Regulamento, sido instituído nenhumprazo prescricional relativamente às "medidas" previstas noartigo 4º, afigura­se dever concluir que o respectivo prazo deprescrição é o prazo geral ordinário de 20 anos, nos termosdo artigo 309º do Código Civil.

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J. E o TJCE já se pronunciou sobre esta questão, fazendo­oem termos absolutamente claros e inequívocos, no sentidode que no que respeita à prescrição do procedimento (artigo4.°, n.º 1, 1.° parágrafo), estatui o Regulamento, que o prazode prescrição é de quatro anos, podendo também osEstados­membros conservar a possibilidade de aplicar umprazo mais longo (artigo 3.°, n.º 3).

K. Esta norma é absolutamente clara.

L. Estatui que o prazo de prescrição é o estabelecido naslegislações nacionais dos Estados­membros, desde queestes sejam superiores a quatro anos (vd. decisões dereenvio prejudicial de 23 de Setembro de 1999 (processo C­278/07) e de 13 de Outubro de 1999 (processos C­279/07 eC­280/07),

M. Daqui se conclui que, ao nível comunitário, não se previunenhuma forma de fiscalização no que respeita tanto aosprazos de prescrição derrogatórios aplicados pelos Estados­Membros ao abrigo dessa disposição como aos sectores emque estes decidiram aplicar esses prazos, sendo aplicável asnormas aplicáveis de prescrição são as do «estatutosubstantivo» do crédito, ou seja, no caso, as normasemergentes do Código Civil (CC).

N. O que é, aliás, suportado no que tem sido o entendimentoperfilhado pelos Tribunais competentes, que no queconcerne à prescrição dos subsídios atribuídos pelos extintosIFADAP e INGA, acordam que o prazo de prescrição é o de20 anos, nos termos do artigo 309.° do CC e contado nostermos da 2a parte do nº 1 do artigo 306.° do mesmo Código(cfr., neste sentido, os Acórdãos do STA, 1.ª Secção, de 22/10/2008e de 17/12/2008 e de 9/06/2010, proferidos nos recursos nºs 601/08e 599/08, 0185/2010, respectivamente) .

O. É infundada a alegada aplicação retroactiva da lei maisfavorável constante do n.º 2 do Reg. (CE EURATOM) n°2988/95, do Conselho, de 18 de Dezembro de 1995,porquanto, não está em causa aplicar uma "sanção"administrativa mais favorável.

P. O caso em apreço respeita a um projecto do ano de 1995,anterior, portanto, à entrada em vigor do aludidoRegulamento.

Q. Relativamente ao princípio da segurança jurídica,saliente­se que a Ajuda em causa é co­financiada pela

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Comunidade Europeia, pelo que a natureza das verbasenvolvidas impõe, ou melhor, obriga a que o IFAP, IP tenhade cumprir as suas atribuições e competências, agindosempre de forma vinculada e nunca de forma arbitrária.

R. O juiz nacional é o juiz comum do contencioso comunitárioe deve, ao abrigo do princípio da aplicação descentralizadado Direito Comunitário, assegura na ordem interna, orespeito por todas as normas e princípios de DireitoComunitário.

S. Ao juiz nacional, porque directamente vinculado àobservância dos princípios da aplicabilidade directa e doprimado do direito comunitário (Ac. Van Gend en Loos, Ac.Costa/Enel, Ac. Simmentahl), incumbe a obrigação de aplicarintegralmente este, deixando inaplicada qualquer disposiçãoeventualmente contrária da lei nacional, quer esta sejaanterior, quer seja posterior à regra comunitária.

T. As legislações nacionais, não podem excluir arecuperação de ajudas indevidamente concedidas,principalmente se foi apurado nos termos legais oincumprimento de legislação nacional e comunitária.

U. Pois que o Recorrido, face ao incumprimento detectado,apenas decidiu em cumprimento da legislação comunitária enacional, quanto aos factos em causa, sem outro fim que nãofosse a reposição da legalidade e a recuperação da ajudaindevidamente paga, relativamente a quem se demonstrounão ter direito à mesma, por não reunir os requisitosessenciais para a atribuição daquela.

V. Não havendo, igualmente do princípio daproporcionalidade, pois que a actuação do Recorrido foi pois,determinada pelo poder­dever que incumbe ao mesmo,exigindo a devolução da totalidade da ajuda recebida, umavez que a Recorrente não reunia os requisitos de quedependia a sua concessão

W. O princípio da proporcionalidade supõe a existência deum direito subjectivo constituído na esfera jurídica dosparticulares ou de interesses legalmente protegidos e arealização de um fim de interesse público que haja de colidircom aqueles direito ou interesses. ­ (artigo 5.°, n.º 2 CPA).

X. Ora, no caso não se verificam estes requisitos, tratando­se simplesmente de um acto de recuperação de ajudasvinculado (ao primado do direito comunitário) face a

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irregularidades praticadas pela Recorrente.

Y. Sendo este principio condicionante da actividadeadministrativa, não descortina o Recorrido, em que seconcretiza a sua violação no acto em recurso, uma vez que afixação das condições de elegibilidade exigidas aoscandidatos às ajudas é o resultado da actividade legislativaque, como é óbvio, não está nas atribuições do Recorrido.

Z. Relativamente ao envio do processo ao Tribunal deJustiça da Comunidade, por via de reenvio prejudicial, já sepronunciou o STA, sobre idêntica matéria [Acórdão proferidoa 9/06/2010, Processo n.º 0185/2010], no sentido de que"esse reenvio apenas era obrigatório no caso de sobre essaquestão não haver decisão interpretativa anterior desseTribunal ou de a norma em causa não suscitar qualquerdúvida razoável (teoria do acto claro) ­ cfr. Acórdãos Cilfit, de6/10/1982 e Intermodal, de 15/9/2005; Acórdão do STA (1.a

Secção) de 2/10/2008, recurso n.0 601/08 (. . .) relativamenteà questão em análise, não só há decisões interpretativas doTJC (cfr. Acórdãos de 29/1/2009, proferidos nos processosn.ºs 278/07, 278/08 e 178/09, publicados no Jornal Oficial daUnião Europeia de 21/3/2009, citados no AcórdãoRecorrido), como essa questão não apresenta dúvidas deinterpretação razoáveis, como se evidenciará nos númerosseguintes. Por isso, não se procederá ao pretendido reenvioprejudicial.

E é com base na motivação que aqui se apresentou, eatentas as conclusões formuladas que, com o superiorsuprimento de V. Exas. deverá ser julgado improcedente orecurso apresentado, confirmando­se na íntegra a doutasentença recorrida, com o que se fará a costumadaJUSTIÇA!

3 ­ O Excelentíssimo Procurador­Geral Adjunto junto desteTribunal emitiu parecer nos seguintes termos:Objecto do recurso: sentença declaratória da improcedênciada oposição deduzida no processo de execução fiscal n.º2704200501011529 (SF Tondela)

Fundamentação1. Reenvio prejudicialO reenvio prejudicial suscitando a intervenção do TJUEsobre a validade e interpretação dos actos adoptados pelasinstituições, órgãos ou organismos da União justifica­sequando não haja qualquer anterior decisão do tribunal

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apreciando a questão decidenda ou quando a interpretaçãodas normas comunitárias controvertidas suscite dúvidarazoável (teoria do acto claro; art. 267º TFUE, anterior art.234º do TCE)No caso concreto o reenvio prejudicial deve ser recusado emconsequência da prolação de decisões interpretativas doTJUE sobre a questão em análise, no sentido posteriormenteadoptado no acórdão sumariado (acórdãos 278/07, 278/08 e178/09 proferidos em 29.01.2009 publicados no Jornal Oficialda União Europeia de 21.03.2009) 2. Prescrição da dívida exequendaA questão decidenda foi apreciada e resolvida emjurisprudência pacífica do STA vertida nos acórdãos STA­SCA 22.10.2008 processo nº 601/08; 17.12.2008 processo nº599/08; 9.06.2010 processo nº 185/10)Merecendo a adesão do Ministério Público transcreve­se,nas componentes relevantes, o sumário doutrinário do últimoacórdão citado:I. As ajudas comunitárias concedidas à exportação de vinhossão financiadas pelo orçamento da Comunidade, através doFundo Europeu de Garantia Agrícola da Comunidade(FEOGA), Secção Garantia [artigo 1.º, n.ºs 1, alínea a) e 2,alínea b) do Regulamento (CEE) n.º 729/70, do Conselho, de21 de Abril de 1970]. (…)III. O reembolso das quantias indevidamente recebidas pelosbeneficiários dessas ajudas, incluindo a sua prescrição, éregulado pela legislação nacional [artigos 1.º, n.º 1, 2.º, n.º 4,3.º, n.ºs 1 e 4 e 4.º, n.º 1, primeiro parágrafo do Regulamento(CEE) n.º 2988/95, do Conselho, de 18 de Dezembro de1955]. IV. Não se estando, assim, perante dinheiros públicos, aentrar nos cofres do Estado português mas sim nos cofres daUnião Europeia (…) o prazo da prescrição desse reembolsonão é o estabelecido no artigo 40.º do DL n.º 155/92, de 28de Junho, mas antes o prazo geral estabelecido no artigo309.º do C. Civil .3. Princípio da segurança jurídica e princípio daproporcionalidadeO Ministério Público sufraga, com a reserva infra enunciada,o entendimento de que a adopção do prazo de prescrição de20 anos para reembolso das quantias indevidamenterecebidas pelos beneficiários das ajudas comunitárias nãoviola os princípios constitucionais em epígrafe, por adesãoaos fundamentos expressos pela entidade recorrida,condensadas nas conclusões Q/Y (fls. 518/519)

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Não obstante, impressiona o argumento expendido pelarecorrente de que a distinção entre o prazo geral deprescrição de 20 anos para o reembolso de dinheirospúblicos comunitários indevidamente recebidos (adoptadopela jurisprudência nacional), e o prazo de 5 anos para oreembolso de dinheiros públicos nacionais indevidamenterecebidos (art. 40 DL nº 155/92, 28 Junho), carece defundamento material bastante e pode configurar violação doprincípio constitucional da igualdade (art. 13º CRP)Aponta neste sentido uma diferenciação de regimes jurídicosapenas radicada nas diferentes categorias institucionais dasentidades que proporcionam as prestações (Estado/UniãoEuropeia) e que ignora o denominador comum dosinteresses públicos por elas prosseguidosConclusãoO recurso não merece provimento.A sentença impugnada deve ser confirmada.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.­ Fundamentação­

4 – Matéria de factoNa sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseuobjecto do recurso foram dados como provados os seguintesfactos:A) A execução fiscal de que estes autos dependem,execução fiscal n.º 27042005010111529, foi instaurada em01­09­2005, tendo como base certidão de dívida emitida peloINGA, em 16­06­2005, respeitante a subsídios atribuídos noâmbito das Restituições à Exportação de Vinho, campanhade 1995, reportada aos DU`s n.ºs 501898, 511356, 514809 e501980, no montante de € 634 995,78, “quantia que obeneficiário recebeu, mas a que não tinha direito por nãoreunir as condições previstas na legislação aplicável,determinando­se, em consequência, a reposição da quantiaindevidamente recebida …”, cfr. docs. de fls. 76 aqui dado porreproduzido o mesmo se dizendo dos demais infra referidos;B) A “reposição da quantia indevidamente recebida” foidecidida em 21 de Julho de 2004, no processo n.º 1208/2001IRV, processo onde a Oponente exerceu audiência prévia,tendo apresentado argumentação muito próxima daapresentada nestes autos, vide fls. 77 a 100;C) Na decisão vinda de aludir, comunicada à Oponente nodia seguinte, na parte final, referiu­se que a devedora tinha oprazo de trinta dias contados da notificação, para procederao pagamento voluntário e, findo o referido prazo, sem quepagamento haja, “será o montante em dívida compensado

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nos termos legais, com créditos que lhe venham a seratribuídos, seguindo­se na falta ou insuficiência destes, ainstauração do processo de execução fiscal …”, idem anterior,parte final;D) Da execução foi a executada citada em 21­07­2005 mas,porque o Órgão de execução Fiscal verificou que com acitação “não foram juntos os documentos que aacompanhavam, e o cálculo dos juros encontra­se incorrecto,foi ordenada a repetição da citação “sem contudo retirar valorjurídico e administrativo à citação anterior…” realizada em 26de agosto de 2005, vide fls. 101 a 103;E) Na sequência da primeira citação apresentou petiçãoinicial em 19 de agosto de 2005 e, por via da segundaapresentou nova petição inicial em 22 de Setembro de 2005,cfr. fls. 1 e segs. e 107 e segs.

5 – Do conhecimento da prescrição da obrigatoriedade dereposição das quantias indevidamente recebidas e doreenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça da UniãoEuropeiaPor Acórdão deste STA de 17 de Abril de 2013, proferido nospresentes autos de recurso, foi decidido que a questão daalegada prescrição da obrigatoriedade de reposição dasquantias recebidas à luz do disposto no n.º 1 do artigo 3.º doRegulamento n.º 2988/95, do Conselho, não constituíaquestão nova que o Tribunal de recurso não devesseconhecer, pois a recorrente invocara na sua petição inicial deoposição “a prescrição da obrigatoriedade de reposição dasquantias recebidas” em face do disposto no n.º 1 do artigo40.º do DL n.º 155/92, de 28 de Julho, constituindo ainvocação, ex novo no recurso, do disposto no n.º 1 do artigo3.º do Regulamento n.º 2988/95, num novo argumento, quenão numa nova questão, acrescendo que a alegada violaçãode normas comunitárias é matéria de conhecimento oficioso(cfr. Acórdão de 17/4/2013, a fls. 550 dos autos).

Foi igualmente decidido submeter ao Tribunal de Justiça daUnião Europeia um pedido de pronúncia, a título prejudicial,sobre as seguintes questões, suspendendo­se a instânciaaté tal pronúncia:

«1.ª – O prazo de prescrição do procedimento previsto no n.º1 do artigo 3.º do Regulamento (CE, Euratom) n.º 2988/95 doConselho, de 18 de Dezembro de 1995, relativo à protecçãodos interesses financeiros das Comunidades Europeias,aplica­se apenas à relação entre a Comunidade Europeia e orecorrido enquanto organismo pagador de ajudas

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comunitárias ou também à relação entre o recorridoenquanto organismo pagador de ajudas comunitárias e arecorrente enquanto beneficiária de ajudas apuradas comoindevidamente atribuídas?

2.ª – Caso se conclua que o prazo previsto no n.º 1 do artigo3.º do Regulamento é igualmente aplicável à relação entre oorganismo pagador das ajudas e a beneficiária das ajudasapuradas como indevidamente atribuídas, deve entender­seque tal prazo é apenas aplicável quando em causa estejamsanções administrativas, na acepção do artigo 5.º doRegulamento (CE, Euratom) n.º 2988/95 do Conselho, de 18de Dezembro de 1995 ou também quando em causa estejam“medidas administrativas”, na acepção do n.º 1 do artigo 4.ºdo mesmo Regulamento, em especial a de reembolsar osmontantes indevidamente recebidos?»

Por Acórdão do passado dia 17 de Setembro, proferido noprocesso C­341/13, cuja cópia autenticada consta de fls. 610a 627 dos autos, o Tribunal de Justiça veio responder àsquestões que lhe foram submetidas nos seguintes termos(fls. 626 dos autos):«1) O artigo 3.º do Regulamento (CE, Euratom) n.º 2988/95do Conselho, de 18 de dezembro de 1995, relativo àprotecção dos interesses financeiros das ComunidadesEuropeias, deve ser interpretado no sentido de que se aplicaaos procedimentos instaurados pelas autoridades nacionaiscontra beneficiários de ajudas da União na sequência deirregularidades verificadas pelo organismo nacionalresponsável pelo pagamento das restituições à exportaçãono âmbito do Fundo Europeu de Orientação e GarantiaAgrícola (FEOGA).2) O prazo de prescrição previsto no artigo 3.º, n.º 1, primeiroparágrafo, do Regulamento n.º 2988/95 aplica­se não apenasaos procedimentos por irregularidades que conduzem àaplicação de sanções administrativas, na aceção do artigo5.º deste regulamento, como também aos procedimentos queconduzem à adoção de medidas administrativas, na aceçãodo artigo 4.º do referido regulamento. Embora o artigo 3.º, n.º3, do mesmo regulamento permita que os Estados­Membrosapliquem prazos de prescrição mais longos do que os dequatro ou três anos previstos no n.º 1, primeiro parágrafo,deste artigo, resultantes de disposições de direito comumanteriores à adoção do referido regulamento, a aplicação deum prazo de prescrição de vinte anos excede o que énecessário para atingir o objetivo de proteção dos interesses

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financeiros da União.»

Importa, agora, decidir do mérito do recurso.

6. Da prescrição da obrigatoriedade de reposição dasquantias indevidamente recebidas pelo oponenteA sentença recorrida, a fls. 357 a 362 dos autos, julgoutotalmente improcedente a oposição deduzida pela orarecorrente, fundamentando o decidido quanto à prescriçãoda obrigatoriedade de reposição das quantias recebidas nainaplicabilidade do prazo de 5 anos previsto no n.º 1 do artigo40.º do DL n.º 155/92 de 28 de Julho e a aplicação, ao invés,do prazo de prescrição ordinário de 20 anos previsto noCódigo Civil, conforme jurisprudência uniforme deste STAproferida em caso idêntico para o qual remete.A decisão perfilhada na sentença recorrida é plenamenteconforme à jurisprudência da 2.ª Secção deste SupremoTribunal Administrativo, que, como bem diz o ExcelentíssimoProcurador­Geral Adjunto no seu parecer junto aos autos esupra transcrito tem uniformemente adoptado oentendimento de que o prazo da prescrição desse reembolsonão é o estabelecido no artigo 40.º do DL n.º 155/92, de 28de Junho, mas antes o prazo geral estabelecido no artigo309.º do C. Civil .Este entendimento não pode, porém, hoje manter­se.Decidiu o TJUE em resposta à segunda questão que lhe foicolocada por este STA no pedido de pronúncia que lhe foidirigido, que embora o artigo 3.º, n.º 3 do Regulamento n.º2988/95 permita que os Estados­Membros apliquem prazosde prescrição mais longos do que os de quatro ou três anosprevistos no n.º 1, primeiro parágrafo, deste artigo,resultantes de disposições de direito comum anteriores àadoção do referido regulamento, a aplicação de um prazo deprescrição de vinte anos excede o que é necessário paraatingir o objetivo de proteção dos interesses financeiros daUnião, razão pela qual a sua aplicação seria ofensiva doprincípio da proporcionalidade.Resulta, igualmente, da decisão do TJUE, que não háobstáculo material à aplicação do prazo de 4 anos previstono n.º 1 do artigo 3.º do Regulamento, pois que, em respostaà primeira questão colocada, ficou consignado que: «O artigo3.º do Regulamento (CE, Euratom) n.º 2988/95 do Conselho,de 18 de Dezembro de 1995, relativo à protecção dosinteresses financeiros das Comunidades Europeias, deve serinterpretado no sentido de que se aplica aos procedimentosinstaurados pelas autoridades nacionais contra beneficiários

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de ajudas da União na sequência de irregularidadesverificadas pelo organismo nacional responsável pelopagamento das restituições à exportação no âmbito doFundo Europeu de Orientação e Garantia Agrícola(FEOGA)».Deste modo, deve considerar­se aplicável ao caso dos autoso prazo de prescrição previsto no n.º 1 do artigo 3.º doRegulamento 2988/95, porquanto se trata de norma jurídicadirectamente aplicável na ordem jurídica interna (artigo 249.º,parágrafo 2.º CE e 8.º n.º 3 da Constituição) e porque nãoexiste no ordenamento jurídico nacional normaespecificamente aplicável que preveja prazo superior.Poder­se­ia equacionar a aplicação ao caso dos autos, poranalogia ou numa sua interpretação conforme aos princípiosdo Direito da União (como sugerido pela Comissão Europeianas suas Observações no processo C­341/13, números 74 a76), do prazo de prescrição de cinco anos previsto no artigo40.º do Decreto­Lei n.º 155/92, de 28 de Junho, aplicável àsreposições de dinheiros públicos que constituam despesascorrentes do Estado. Tal solução foi, porém, recentemente afastada pela 1.ªSecção deste STA, em Acórdão de 9 de Abril último (rec. n.º173/13), com base em duas ordens de razões que nosparecem de acolher e que são deste modo enunciadas: Emprimeiro lugar, porque esse concreto regime tem vindosucessivamente a ser afastado pela jurisprudência nacional –cfr. os acórdãos do STA, 1.ª Secção, de 22/10/2008, proc.601/08; de 17/12/2008, proc. 599/08; e de 9­6­2010, proc.185/10) ­ afastando assim o requisito da previsibilidadesuficiente. Em segundo lugar, porque o “princípio deequiparação das condições para recuperação de prestaçõesfinanceiras puramente nacionais” (que eventualmente podiaser invocado) tem sido aplicado em situações em que oDireito Comunitário não regula directamente o caso – cfr. ac.de 12 de Maio de 1998, processo C­366/95; acórdão de 16de Julho de 1998, proc. C­298/96. Aliás, este último acórdãoindica como fonte deste princípio o art. 5º do Tratado CE,segundo o qual compete aos Estado membros “(…)assegurar no seu território o cumprimento dasregulamentações comunitárias” (considerando 23). Daí que,logo no considerando seguinte, refira que “(…) os litígiosrelativos à recuperação de montantes indevidamente pagospor força do direito comunitário, na falta de disposiçõescomunitárias, devem ser decididas pelos órgãosjurisdicionais nacionais, sem prejuízo dos limites impostospelo direito comunitário, no sentido de que as vias previstas

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pelo direito nacional não podem, na prática, tornar impossívelou excessivamente difícil a aplicação da regulamentaçãocomunitária (…)”. Existindo norma expressa naregulamentação comunitária, directamente aplicável, oacolhimento, no direito interno, dessa norma não pode, demodo algum, gerar incumprimento ou ineficácia do direitocomunitário. Pelo contrário, tal acolhimento assegura aimposição efectiva do direito comunitário.Acresce que, a jurisprudência deste STA tem consideradoaplicável às restituições de incentivos financeiros nacionaissem natureza tributária não o prazo de cinco anos previstono artigo 40.º do Decreto­Lei n.º 155/92, antes o prazoordinário de prescrição de 20 anos previsto no Código Civil(cfr., por todos, o Acórdão da 2.ª Secção de 6 de Agostoúltimo, rec. n.º 807/14 e jurisprudência aí citada), daí que aaplicação do prazo de cinco anos previsto no artigo 40.º doDecreto­Lei n.º 155/92 não se traduza, na prática, emefectiva equiparação à solução consagrada peloordenamento jurídico nacional para situações semelhantespuramente internas.Haverá, pois, que aplicar à prescrição da obrigação derestituição das quantias indevidamente recebidas o prazo deprescrição de 4 anos previsto no artigo 3.º, n.º 1 doRegulamento (CE, Euratom) n.º 2988/95 do Conselho, de 18de Dezembro de 1995.Este Regulamento, que entrou em vigor no dia 26 deDezembro de 1995 (cfr. o seu artigo 11.º), estabelece no n.º1 do seu artigo 3.º que o prazo de prescrição doprocedimento, é de quatro anos a contar da data em que foipraticada a irregularidade, interrompendo­se tal prazo porqualquer ato, de que seja dado conhecimento à pessoa emcausa, emanado da autoridade competente, tendo em vistainstruir ou instaurar procedimento por irregularidade,correndo de novo idêntico prazo a contar de cadainterrupção, tendo, porém, a prescrição lugar o mais tardarna data em que termina um prazo igual ao dobro do prazo deprescrição sem que a autoridade competente tenha aplicadouma sanção, excepto nos casos em que o procedimentoadministrativo tenha sido suspenso em conformidade com on.º 1 do artigo 6.º.Ora, não consta do probatório fixado na sentença recorrida adata em que foi praticada a irregularidade que motivou aaplicação da medida administrativa de restituição dosubsídio, sequer a data em que se deu exportação do vinhoda campanha de 1995 a que se refere a alínea A) doprobatório fixado, importando apurar tal data pois que esta,

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se posterior à data da entrada em vigor do Regulamento,será a do termo inicial do prazo de prescrição. Comoimporta, igualmente, dar oportunidade às partes de invocarou rebater a invocação de eventuais causas de interrupçãoou suspensão do prazo de prescrição que tenham ocorridoentre a data da prática da infracção e a decisão do INGA dereposição da quantia indevidamente recebida, a que sereferem as alíneas B) e C) do probatório fixado, pois que taloportunidade não lhes foi dada até ao momento e importaobservar o princípio do contraditório e evitar decisões­surpresa.Atento a que esta Secção de Contencioso Tributário doSupremo Tribunal Administrativo apenas conhece de matériade direito nos processos inicialmente julgados pelos tribunaistributários de 1.ª instância (artigo 21.º, n.º 4 do ETAF),impõe­se ordenar a baixa dos autos ao Tribunal “a quo” paraque, após ampliação do probatório fixado nos termos suprareferidos, decida da prescrição da obrigação de reposiçãodas quantias indevidamente recebidas do INGA pelaoponente, provenientes de Fundos Comunitários, à luz dodisposto no artigo 3.º, n.º 1 do Regulamento (CE, Euratom)n.º 2988/95 do Conselho, de 18 de Dezembro de 1995.

­ Decisão ­7 – Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes daSecção de Contencioso Tributário do Supremo TribunalAdministrativo, em conceder provimento do recurso e, aoabrigo do disposto no n.º 3 do artigo 682.º do Código deProcesso Civil, anular a sentença recorrida no segmentoimpugnado para ser substituída por outra que, após anecessária ampliação do probatório fixado nos termos atrásapontados, decida da prescrição da obrigação de reposiçãodas quantias indevidamente recebidas pela oponente.

Custas pela recorrida, que contra­alegou.

Lisboa, 8 de Outubro de 2014. – Isabel Marques da Silva(relatora) – Pedro Delgado – Dulce Neto.