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Investigação, 14(1):30-33, 2015 ISSN 21774780 30 Revista INVESTIGAÇÃO medicina veterinária RELATO DE CASOS | RESUMO Dentre as causas de dilatações esofágicas em cães, o divertículo esofágico (DE) é uma doença rara, tanto em humanos quanto em animais. A instituição do manejo terapêutico-nutricional adequado é a chave para se garantir qualidade de vida ao paciente, seja na forma de tratamento de suporte, ou associado à correção cirúrgica da alteração esofágica. Descrevem-se aqui dois casos de cães com dilatação esofágica, cuja suspeita diagnóstica recaiu sobre DE torácicos, que evoluíram satisfatoriamente com tratamento clínico-nutricional, sem a necessidade de intervenção cirúrgica. Palavras-chave: Caninos, regurgitação, megaesôfago, divertículo esofágico, manejo nutricional. ABSTRACT Sofia Borin-Crivellenti 1 , 2 , 3 *, Amanda Cristiane Ondani3, Letícia Tortola3, Thassila Cáccia Feragi Cintra3, Fábio Nelson Gava3, Mariana Cristina Hoeppner Rondelli3, Aulus Cavalieri Carciofi3, Júlio Carlos Canola 3 , Mirela Tinucci-Costa3, Aureo Evangelista Santana3, Ricardo Lima Salomão1, Mariana Rodrigues Vieira2, Matheus Bernades Olivio2, Elisandra Ramos Lemos2. TRATAMENTO CONSERVADOR DE DILATAÇÕES ESOFÁGICAS EM CÃES Conservative management of canine esophageal dila- tation - case reports Among the causes of esophageal dilatation esophageal diverticulum (ED) is a rare disease in both humans and animals. An appropriate therapeutic and nutritional management, associated or not with surgical repair of esophageal alteration is the key to ensuring quality of life for the patient. These are cases reports describing dogs with esophageal dilatation suspected by thoracic ED which were satisfactorily treated with clinical and nutritional treatment without surgical intervention. Keywords: Dogs, regurgitation, nutritional management. 1. Programa de Pós-graduação em Ciência Animal, Universidade de Franca (UNIFRAN), Franca, São, Paulo, Brasil. Autor corres- pondente: sofi[email protected] 2. Curso de Medicina Veterinária, Universidade de Franca (UNIFRAN), Franca, São Paulo, Brasil. 3. Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária (DCCV), Universidade Estadual Paulista (Unesp), Câmpus de Jaboticabal, São Paulo, Brasil.l. Investigação, 14(1):30-33, 2015 Clínica e Cirurgia de Pequenos Animais ABSTRACT

Dilatação Esofágica Em Cães

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Clínica de Pequenos animais

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Page 1: Dilatação Esofágica Em Cães

Investigação, 14(1):30-33, 2015

ISSN 21774780

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Revista

INVESTIGAÇÃOmedicina veterinária

RELATO DE CASOS |

RESUMO

Dentre as causas de dilatações esofágicas em cães, o divertículo esofágico (DE) é uma doença rara, tanto em humanos quanto em animais. A instituição do manejo terapêutico-nutricional adequado é a chave para se garantir qualidade de vida ao paciente, seja na forma de tratamento de suporte, ou associado à correção cirúrgica da alteração esofágica. Descrevem-se aqui dois casos de cães com dilatação esofágica, cuja suspeita diagnóstica recaiu sobre DE torácicos, que evoluíram satisfatoriamente com tratamento clínico-nutricional, sem a necessidade de intervenção cirúrgica.

Palavras-chave: Caninos, regurgitação, megaesôfago, divertículo esofágico, manejo nutricional. ABSTRACT

Sofi a Borin-Crivellenti1,2,3*, Amanda Cristiane Ondani3, Letícia Tortola3, Thassila Cáccia

Feragi Cintra3, Fábio Nelson Gava3, Mariana Cristina Hoeppner Rondelli3, Aulus Cavalieri

Carciofi 3, Júlio Carlos Canola3, Mirela Tinucci-Costa3, Aureo Evangelista Santana3, Ricardo

Lima Salomão1, Mariana Rodrigues Vieira2, Matheus Bernades Olivio2, Elisandra Ramos

Lemos2.

TRATAMENTO CONSERVADOR DE DILATAÇÕES ESOFÁGICAS

EM CÃESConservative management of canine esophageal dila-

tation - case reports

Among the causes of esophageal dilatation esophageal diverticulum (ED) is a rare disease in both humans and animals. An appropriate therapeutic and nutritional management, associated or not with surgical repair of esophageal alteration is the key to ensuring quality of life for the patient. These are cases reports describing dogs with esophageal dilatation suspected by thoracic ED which were satisfactorily treated

with clinical and nutritional treatment without surgical intervention.

Keywords: Dogs, regurgitation, nutritional management.

1. Programa de Pós-graduação em Ciência Animal, Universidade de Franca (UNIFRAN), Franca, São, Paulo, Brasil. Autor corres-pondente: sofi [email protected]

2. Curso de Medicina Veterinária, Universidade de Franca (UNIFRAN), Franca, São Paulo, Brasil.

3. Departamento de Clínica e Cirurgia Veterinária (DCCV), Universidade Estadual Paulista (Unesp), Câmpus de Jaboticabal, São Paulo, Brasil.l.

Investigação, 14(1):30-33, 2015

Clínica e Cirurgia de Pequenos Animais

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INTRODUÇÃO

A regurgitação é uma queixa frequentemente relatada por proprietários de pequenos animais e é o sinal mais comum de doença esofágica. As principais causas de regurgitação em cães são anomalias dos anéis vasculares, corpo estranho e dilatações esofágicas (JOHNSON & SHERDING, 2003); dentre as quais se destacam o megaesôfago, a hérnia hiatal e o divertículo esofágico (WASHABAU, 2013).Os relatos em tela abordam intervenções clínicas e nutricionais como tratamento em dois cães com suspeita diagnóstica de divertículo esofágico.

RESULTADOS

RELATO DE CASOS

Foram atendidos no Hospital Veterinário da UNESP, Câmpus de Jaboticabal, um cão macho de 8 anos, raça Teckel (caso 1) e uma fêmea jovem adulta sem defi nição racial (caso 2) pesando, respectivamente 9,0 kg e 2,7 kg, com histórico de regurgitação. O primeiro animal alimentava-se de ração super premium cães adultos sem alterações de apetite, o segundo alimentava-se de dieta caseira (arroz e frango) apresentando apetite voraz (Figuras 1 e 3). Os exames laboratoriais de rotina revelaram-se normais no primeiro, e o segundo paciente manifestou hipoproteinemia e hipoalbuminemia.

Figura 1: Vista dorsal (1A) e lateral (1B) do canino da raça Teckel evi-denciando perda de massa corporal (escore corporal 4/1-9). UNESP - Jaboticabal, 2008.

Figura 2 : Esofafgograma sugestivo de Divertículo esofágico. (2A)

Projeção látero-lateral direita com dilatação e desvio ventral em porção do esôfago torácico cranial (seta vermelha). (2B) Projeção ventro-dorsal com dilatação e retenção do meio de contraste em esôfago torácico cranial (chave amarela). UNESP - Jaboticabal, 2008.

Figura 3 : Vista lateral (3A) e dorsal (3B) evidenciando caquexia (es-core corporal 1/1-9). UNESP - Jaboticabal, 2008

Figura 2 : Projeções látero-laterais direitas sugestivas de divertícu-lo esofágico: (4A) Radiografi a simples demonstrando aumento de radiopacidade (seta vermelha) em região torácica cranial. (4B) Eso-fagograma em demonstrando porção esofágica dilatada (seta azul). UNESP - Jaboticabal, 2008.

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Os exames radiográfi cos simples revelaram aumento de radiopacidade localizada na região torácica cranial e dilatações esofágicas próximas à entrada dos tórax, confi rmadas pelo exame radiográfi co contrastado (sulfato de bário 100% VO, 3 g/kg), o qual revelou a extensão das dilatações esofágicas através da retenção do meio de contraste e desvio dos lúmens esofágicos em região torácica cranial (Figuras 2 e 4)

O cão Teckel recebeu tratamento clínico e nutricional, baseado em cloridrato de ranitidina 2 mg/kg, VO, BID durante 5 dias e suporte nutricional com dieta líquida a base de ração super premium de elevada digestibilidade, alto teor de energia e de proteína (EM= 3,7 kcal/g de alimento), dividida em 4 refeições diárias oferecidas em posição bipedal pélvica, com quantidade calculada por meio da equação 105 x (massa corporal em kg)0,75 (NRC, 2006). A cadela SRD recebeu o mesmo tratamento medicamentoso ao anterior, porém acrescido de mesalazina 10 mg/kg, por via retal, BID, durante 15 dias.ser justifi cado pela maior presença de corpo lúteo. Diante do seu grave quadro nutricional institui-se a nutrição parenteral parcial durante 2 dias. Em seguida foi prescrita ração super premium para cães fi lhotes dividida em 6 refeições diárias (NRC, 2006), adotando-se o mesmo manejo descrito anteriormente, além do fornecimento de meio ovo cozido ao dia durante um mês.

Os pacientes foram acompanhados por contato telefônico durante 2 anos, e ambos mantiveram-se em bom estado geral. Segundo informações dos proprietários, o manejo dietético foi mantido, os cães recuperaram a massa corporal e não apresentam mais regurgitação.

DISCUSSÃO

CONCLUSÕES

O divertículo esofágico é uma rar condição em pequenos animais, e consiste em uma dilatação localizada no esôfago, de tamanho variável, formado pela parede total ou parcial do esôfago, com uma cavidade em fundo de saco que se comunica com a luz do órgão (OKANO et al., 2000; MONTAÑO et al., 2003).

Os sinais clínicos do DE resultam da compactação de alimentos ou retenção de líquidos na evaginação esofágica. Como verifi cado nos casos aqui descritos, lesões de diversas gravidades podem resultar em odinofagia, náusea, regurgitação, engasgos, anorexia, perda de peso progressiva (STROMBECK, 1978; LEIB & HALL, 1984; TWEDT, 1997; HEDLUND, 2002).

O exame radiográfi co, considerado o método mais fi dedigno para o diagnóstico da dilatação esofágica, o qual é elaborado pelos sinais encontrados em radiografi as simples e contrastada (GONZALEZ, 1992). O sulfato de bário, por produzir melhor cobertura da superfície mucosa, foi o meio de contraste utilizado. A endoscopia, apesar de ser uma ferramenta útil (TWEDT, 1997) deve ser empregada quando se suspeitar de associação com neoplasias, e deve-se realizar com cautela, devido aos riscos de ruptura esofágica (OKANO et al., 2000).

Apesar da correção cirúrgica da alteração por meio da diverticulectomia ser citada como a principal medida terapêutica (TWEDT, 1997), e o tratamento clínico-nutricional empregado em ambos os casos mostrou-se satisfatoriamente efi ciente.

A nutrição parenteral é utilizada em pacientes críticos e consiste em suprir as necessidades nutricionais, por via intravenosa, evitando a subnutrição (CARCIOFI et al., 2009). A suspensão da alimentação por 24 a 72 horas é uma prática comum nos distúrbios gastrintestinais, e nestes casos o equilíbrio

hidroeletrolítico deve ser mantido pela via parenteral (HALL, 1996), e logo se obtenha o controle da regurgitação, o animal deve voltar a ser alimentado, como adotado nos pacientes deste relato. A dieta foi reintroduzida gradualmente, em pequenas e frequentes refeições, durante um período de 4 a 7 dias, utilizando um alimento de elevada digestibilidade e moderada quantidade de fi bras, conforme recomendações de outros autores (GUILFORD & MATZ, 2003; CARCIOFI, 2007).

Vale salientar que ambos os animais não apresentavam regurgitação após ingestão hídrica, o que auxiliou sobremaneira no sucesso terapêutico com a dieta líquida. Ademais, a quantidade adequada de alimento, associada à periodicidade e a posição de administração, também se somam importantes fatores ao manejo clínico-nutricional.

Uma cuidadosa história clínica, exame físico detalhado e exames de imagem são essenciais na suspeita diagnóstica de DE. Procedimentos cirúrgicos corretivos nem sempre resultam em reversão do processo. O manejo clínico e nutricional, por sua vez, esta ao alcance de todos os clínicos e quando bem formulado e aplicado, pode signifi car a estabilização e a recuperação do paciente.

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REFERÊNCIAS

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Carciofi A.C. et al. 2009. Suporte nutricional parenteral no paciente crítico. Revista Clínica Veterinária, 78:52-60.

Gonzales, J.R.M. 1992. Estudo radiográfi co das afecções esofágicas em cães. Dissertação (Mestrado em Medicina Veterinária – Área de concentração: Clínica e Cirurgia Animal) – Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade de São Paulo.

Guilford W.G. & Matz M. E. 2003. The nutritional management of 1gastrointestinal tract disorders in companion animals. New Zealand Veterinary Journal, 51(6): 284-291.

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Hedlund C.S. 2002. Cirurgia do Sistema Digestório. In: Fossum T.W. Cirurgia de Pequenos Animais. São Paulo: Roca, pp. 222-405.

Johnson, S.E. & sherding, R.G. 2003. Esofagopatias e Distúrbios de Engolição. In: Birchard, S.J. (ED) Clinica de Pequenos Animais. 2.ed. Sao Paulo: Roca, pp. 791- 809.

Montaño J.L.L. et al. 2003. Divertículos esofágicos. Comunicación de 2 divertículos de Zenker. Revista Cubana de Cirugía, 42,(2): 0-0 (online).

National Research Council, NRC. 2006. Nutrient requirements of dogs. Washington: National Academy Press, pp. 398.